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Braz J Periodontol - September 2014 - volume 24 - issue 03

USO DE CÉLULAS-TRONCO NA ODONTOLOGIA:


realidade ou utopia?
Use of stem cells in dentistry: reality or utopia?

Renata dos Reis Feques1, Samantha Ariadne Alves de Freitas2, Antonio Luiz Amaral Pereira3, Adriana de Fátima Vasconcelos
Pereira4
1 Graduada em Odontologia, Universidade Federal do Maranhão.
2 Mestranda em Odontologia, Programa de Pós-Graduação, Universidade Federal do Maranhão.
3 Doutor, Professor Associado, Departamento de Odontologia II, Universidade Federal do Maranhão.
4 Doutora, Professora Adjunta, Departamento de Odontologia II, Universidade Federal do Maranhão.

Recebimento: 22/04/14 - Correção: 16/06/14 - Aceite: 04/09/14

RESUMO

A perda dental ainda é um grande problema na Odontologia. Entretanto, com novas pesquisas, uma proposta
de tratamento por meio do uso das células-tronco vem sendo utilizada para melhorar as funções do órgão dental.
Essas células trazem alternativas para regeneração dentino-pulpar, do tecido periodontal, óssea, da cartilagem
da articulação temporo-mandibular e o desenvolvimento da terceira dentição. As principais fontes são: células
mesenquimais presentes na região periodontal e na polpa dental, em especial de dentes decíduos, ainda folículo
dental e papila apical. Todas estas células apresentam capacidade proliferativa e regenerativa dos tecidos humanos,
sejam eles dentais ou não. Dessa forma, este trabalho teve o propósito de fazer uma revisão da literatura sobre a
ENGENHARIA TECIDUAL com enfoque para células-tronco quanto ao uso, fontes, vantagens e desvantagens, bem
como elucidar as reais aplicabilidades na Odontologia.
UNITERMOS: ENGENHARIA TECIDUAL; Células-tronco; Odontologia. R Periodontia 2014; 24:24-30.

INTRODUÇÃO um tipo celular altamente especializado. São divididas


em duas categorias: embrionárias e adultas. A vantagem
A ausência de dentes resulta em dificuldades de da célula tronco-adulta é o fato de ser autogênica e da
mastigação, fonação, comprometimento estético, alteração embrionária é a sua capacidade de proliferação e de
do bem-estar físico e psicológico do paciente. Para a diferenciação em diversos tipos celulares (Chen et al., 2012;
substituição na íntegra dos tecidos dentais perdidos, sob Rai et al., 2014).
o ponto de vista biológico, estético e funcional, além Na Odontologia, seu uso teve início com características
da indicação de próteses e implantes, a ENGENHARIA peculiares encontradas na polpa de dentes permanentes.
TECIDUAL por meio da utilização de células-tronco tem sido Estas células eram altamente proliferativas, clonogênicas e
sugerida como possibilidade de substituir um dente perdido apresentavam capacidade de autorrenovação e de gerar
por um órgão biológico capaz de representá-lo em todos os diferentes tecidos (Chen et al., 2012). São encontradas em
aspectos (Lymper et al., 2013). células mesenquimais presentes na região periodontal e na
O termo célula-tronco foi proposto, pela primeira vez polpa dental, em especial, de dentes decíduos, no folículo
em 1908, pelo histologista russo Alexandre Maximov que dental e na papila apical. Todas estas células apresentam
postulou a existência de células hematopoiéticas (Gronthos capacidade proliferativa e regenerativa dos tecidos humanos,
et al., 2000). sejam eles dentais ou não (Daltoé et al., 2010; Arakaki et
As células-tronco são indiferenciadas com grande al., 2012; Mathur et al., 2014).
capacidade de autorrenovação e produção de pelo menos Diante do exposto, o objetivo deste trabalho é realizar

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uma revisão da literatura sobre a ENGENHARIA TECIDUAL, potencial proliferativo (Gomes & Grinfeld, 2008; Cai et al.,
com enfoque para as células-tronco quanto ao uso, fontes, 2013; Keishi et al., 2014) .
vantagens e desvantagens, bem como esclarecer as reais De acordo com o ambiente, algumas destas células
aplicabilidades destas células na Odontologia. adultas são capazes de reprogramação genética para gerar
células especializadas características de outros tecidos (Horst
METODOLOGIA et al., 2012; Neel et al., 2014), como por exemplo, capacidade
das células-tronco pulpares em originar células adiposas
Foram consultadas as bases de dados Pubmed, Lilacs e (Souza, 2008).
Scielo, utilizando-se as palavras-chave na língua portuguesa Dentre as principais fontes de células-tronco na
como ENGENHARIA TECIDUAL, células-tronco e Odontologia, Odontologia, destacam-se polpa dental, ligamento
bem como na língua inglesa tissue engineering, stem cells e periodontal, dentes decíduos, folículo dental e papila apical
dentistry. (Tabela 1).
Foram encontrados 519 trabalhos sobre a temática e
foram incluídos 34 artigos de revisão e de pesquisa in vivo com Aplicação do uso de células-tronco na
animais de 2000 a 2014, bem como teses. Foram excluídos Odontologia
livros e artigos publicados em outro período de tempo.
Regeneração periodontal
RESULTADOS A ENGENHARIA TECIDUAL pode ser utilizada para
superar as limitações de terapias periodontais regenerativas
Os achados foram divididos em ENGENHARIA TECIDUAL e, desta forma, desenvolver uma regeneração mais confiável
e principais fontes de células-tronco na Odontologia e e previsível (Benatti et al., 2007). Uma técnica que vem sendo
aplicação na Odontologia. utilizada é a colonização de células-tronco na área afetada
(Chen et al., 2012). O objetivo desta regeneração seria
ENGENHARIA TECIDUAL e principais fontes de restaurar a ancoragem funcional dos dentes por meio de:
células-tronco na Odontologia restauração do ligamento periodontal, incluindo orientação
A ENGENHARIA TECIDUAL é o campo da ciência que e inserção das fibras de Sharpey entre o osso e a superfície
estuda a restauração funcional e fisiológica de estruturas radicular; formação de novo cemento por cementoblastos na
teciduais deterioradas ou perdidas decorrentes de doenças ou superfície radicular e restauração na altura óssea da junção
trauma. Está baseada em três princípios da biologia tecidual: amelo-cementária (Duan, 2011; Xiong, 2013).
células-tronco progenitoras, matriz extracelular (ou scaffold) Em um estudo, o transplante de células tronco
que mantém a estrutura do tecido e substâncias indutoras do mesenquimais da medula óssea foi realizado em cães para
crescimento e diferenciação celular (Chen et al., 2012; Huang tratar defeitos de furca classe III e comparado com animais
et al., 2013; Neel et al., 2014). controle que não receberam o transplante. Os cães foram
As células-tronco embrionárias são pluripotentes que sacrificados e os resultados mostraram que as células-tronco
apresentam capacidade de dar origem a maior parte das proporcionaram melhor regeneração tecidual (Chen et al.,
células e tecidos do organismo (Otsu et al., 2012). Sua função 2012).
biológica e natural é formar o embrião por completo. E para Células-tronco adultas presentes no ligamento
isso, elas utilizam duas de suas principais propriedades, a periodontal quando estimuladas podem se diferenciar em
auto-replicação e a diferenciação com a finalidade de formar células do tipo cementoblásticas e osteoblásticas. As células
cada órgão e tecido (Lymperi et al., 2013). foram transplantadas para ratos imunocomprometidos
As células-tronco adultas são indiferenciadas, sendo formando uma estrutura semelhante ao cemento/ligamento
encontradas nos tecidos responsáveis pela regeneração periodontal. Em defeitos criados cirurgicamente na região
tecidual durante sua existência. Entretanto, possuem como periodontal dos molares inferiores, as células se integraram
desvantagens o fato de não serem pluripotentes, por haver ao ligamento periodontal em duas das seis amostras e,
dificuldade em obtê-las, purificá-las e cultivá-las in vitro, ocasionalmente, uniram a superfície do osso alveolar ao dente
além de sua menor quantidade nos tecidos. Essas células (Rai et al., 2014).
vêm sendo identificadas na pele, rim, tecido adiposo e polpa
dental, entre outros, isto é, são células que têm poder de Regeneração dentino-pulpar
auto-renovação, diferenciação de múltiplas linhagens e alto Gronthos et al. (2000) identificaram uma população de

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Tabela 1 – Considerações sobre as fontes de células-tronco na Odontologia

Fonte Consideração Referências

Polpa dental As células adultas identificadas na polpa dental são células


multipotentes e apresentam capacidade de se diferenciar Lymperi et al., 2013
em fibroblastos, componentes do tecido conjuntivo, e em Huang & Garcia-Godoy, 2014.
odontoblastos, envolvidos na formação da dentina.

Ligamento Foram identificadas na superfície radicular de dentes humanos Rai et al., 2014
periodontal extraídos e foram capazes de formar in vitro fibras colágenas
paralelas entre si, semelhantes às fibras de Sharpey. Estas
fibras puderam se conectar com estruturas cementóides e
formar a ligação funcional do cemento com o ligamento
periodontal.

Pode diferenciar-se em fibroblastos, cementoblastos e Wada et al., 2011


osteoblastos,sendo responsáveis pelo reparo tecidual

Dentes decíduos Estas células são similares àquelas encontradas no cordão Huang et al., 2013
umbilical. Parecem crescer mais rápido, além de apresentar
maior potencial em se diferenciar em outros tipos de células
do que as células-tronco adultas.

Quando comparadas às células-tronco, provenientes da Lymperi et al., 2013


medula óssea e da polpa de dentes permanentes, possuem
uma maior taxa de proliferação.

Podem ser uma fonte ideal de células-tronco pela facilidade Huang et al., 2013
de obtenção, além de serem utilizadas para reparar estruturas Neel et al., 2014
dentárias comprometidas e induzir à regeneração óssea.

São considerados como células-tronco multipotentes devido a Rai et al, 2014


sua capacidade de gerar cemento e tecido ósseo.

Células do folículo dental foram isoladas a partir de terceiros


molares e caracterizadas pela fixação rápida em cultura e
Folículo dental capacidade de formar nódulos calcificados in vitro. Estas Estrela et al., 2011
representam células de um tecido em desenvolvimento que
podem apresentar uma maior plasticidade do que as outras
células-tronco dentais.
Papila apical Estas células-tronco são fontes de odontoblastos, que Huang & Garcia-Godoy, 2014
produzem dentina primária para a raiz, que é mais organizada Rai et al., 2014
estruturalmente do que a dentina formada pelas
células-tronco da polpa de dentes decíduos e da polpa de
dentes permanentes.

células-tronco pós-natais em polpas de terceiros molares semelhante ao encontrado no dente normal. Estes achados
humanos, que apresentavam capacidade regenerativa. fornecem evidências de que células-tronco de polpa
Depois de transplantadas, foi obtido um tecido conjuntivo transplantadas podem não apenas dar origem à linhagem
semelhante ao complexo dentino–pulpar, composto de odontoblástica, mas também residirem no tecido conjuntivo
matriz mineralizada com túbulos e odontoblastos alinhados pulpar como células semelhantes a fibroblastos.
e tecido fibroso contendo vasos sanguíneos em um arranjo Nakashima & Akamine (2005) enfatizaram que a terapia

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celular, utilizando células-tronco pulpares, poderia melhorar forma aos dentes. Estes moldes são feitos de polímeros
o capeamento pulpar convencional por ser uma reparação biodegradáveis, como por exemplo, o poliglicolato/ poli-
pulpar antiinflamatória e antibacteriana, além de induzir sua L-lactato (PGA/PLLA) e o poli-L-lactato-co-glicolato (PLGA)
diferenciação em odontoblastos, aumentando o potencial de (Daltoé et al., 2010; Huang & Garac- Godoy, 2014).
cicatrização e formação de dentina. O segundo passo é plaquear, sobre esses moldes, células
provenientes de germes dentais dissociados enzimaticamente,
Regeneração cartilagínea as quais foram cultivadas por seis dias. O conjunto moldeira/
Sequelas resultantes de injúrias articulares têm motivado células odontogênicas foi colocado no mento de ratos
o desenvolvimento de técnicas com o objetivo de regenerar imunocomprometidos, com a finalidade de que estas células
a cartilagem das articulações sinoviais, bem como a tivessem um lugar propício para o seu desenvolvimento. Após
reconstrução total dos côndilos, utilizando células-tronco. Isto 20-30 semanas, análises histológicas revelaram a formação de
pode ser explicado porque foi demonstrada a possibilidade de pequenas coroas dentais com evidente formação de esmalte,
regeneração de côndilos da articulação sinovial com ambos dentina e polpa dental (Young et al., 2012).
componentes ósseos e cartilagíneos em estudo com ratos Contudo, essa técnica apresenta alguns problemas,
(Huang et al., 2013). como o fato dos dentes formados não assumirem fielmente
Outra probabilidade de produção de cartilagem por meio o formato das moldeiras, e os moldes proporcionarem um
do cultivo in vitro, seria a utilização de matriz extracelular modelo estático de desenvolvimento (Daltoé et al., 2010).
( scaffold ) biodegradável que forneceria uma estrutura
tridimensional para o crescimento tecidual (Volponi & Sharpe, Técnica da recombinação tecidual
2013; Mathur et al., 2014). O objetivo é reproduzir na cavidade bucal de um indivíduo
adulto o desenvolvimento dental tal qual ele ocorre durante
Terceira dentição a embriogênese. Assim, por meio da recombinação, utiliza-se
Com os avanços nas pesquisas com células-tronco e no fontes celulares epiteliais (para dar origem ao esmalte dental)
desenvolvimento de técnicas de ENGENHARIA TECIDUAL, e mesenquimais (para formar dentina, polpa dental, ligamento
assume-se a possibilidade de, em um futuro próximo, periodontal e demais tecidos de suporte) (Ohazama et al.,
substituir um dente perdido por um órgão biológico capaz de 2010; Keishi et al., 2014).
representá-lo sob os aspectos biológico, estético e funcional As fontes epiteliais mais usadas provêm de epitélio
(Ohazama et al., 2010; Ferreira & Mostajo-Radji, 2013, Rai odontogênico da lâmina dental de embriões de ratos
et al., 2014). e camundongos, do tecido mesenquimal, do próprio
A expressão “desenvolvimento de terceira dentição” ectomesênquima subjacente ao epitélio odontogênico ou
refere-se à confecção de substitutos biológicos (biodentes) de outras fontes celulares mesenquimais não odontogênicas
para os dentes perdidos ou ausentes (Daltoé et al., 2010). como as da medula óssea (Duailibi et al., 2008; Ikeda et al.,
É um processo complexo pelo qual o dente se forma 2009) .
a partir de células embrionárias (Otsu et al., 2014). Os Entretanto, esta técnica apresenta alguns empecilhos, tais
eventos celulares que ocorrem na fase de desenvolvimento como encontrar substitutos celulares viáveis, principalmente
dental são determinados por informações genéticas, que de origem humana, como fontes celulares alternativas ao
ocorrem a partir de uma série de interações entre células epitélio e ao mesênquima de germes dentais em fases iniciais
epiteliais e mesenquimais. As células epiteliais formam de desenvolvimento; e controlar a forma dental (Ohazama
o órgão do esmalte, e as células que os rodeiam são as et al., 2010).
células mesenquimais. Estas interações envolvem proteínas
sinalizadoras e receptores específicos que, uma vez ativados, Construção dental “de novo”
iniciam o processo de desenvolvimento dental (Rai et al., 2014). As diferentes populações de células-tronco dentais e
Existem quatro técnicas utilizadas ou especuladas pelos não dentais (por exemplo, células-tronco da medula óssea)
cientistas para se confeccionar um biodente: a) uso de moldes possuem propriedades distintas. A ideia é aproveitar o melhor
biocompatíveis, b) recombinação tecidual, c) construção que cada fonte celular pode oferecer de si para formar os
dental “de novo” e d) indução da terceira dentição. diferentes tecidos que compõem o dente (Daltoé et al., 2010).
Assim, tem sido utilizadas células da papila apical para
Técnica do uso de moldes biocompatíveis formar dentina em conjunto com as células-tronco do
O primeiro passo é a confecção dos moldes que dariam ligamento periodontal (Huang & Garac-Gody, 2014).

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Todavia, o grande impasse desta técnica consiste em diferenciar-se em outro tecido especializado é uma das
reunir as diferentes fontes celulares de tal maneira que características mais importantes desse tipo de célula (Kolya &
elas interajam harmonicamente entre si e reproduzam os Castanho, 2007). Isto ocorre quando as células são removidas
respectivos tecidos dentais com forma e função apropriadas de seus nichos originais e transplantadas para uma nova
(Daltoé et al., 2010). região, e desta forma elas podem se reprogramar e mudar
sua linha de produção como, por exemplo, células-tronco do
Indução da terceira dentição cérebro podem produzir células hematopoiéticas, e células
Apresenta a finalidade de descobrir mecanismos da medula óssea podem produzir células epiteliais (Rai et
biomoleculares capazes de induzir a odontogênese em tecidos al., 2014).
adultos e, então, estes possam ser aplicados no local onde A ENGENHARIA TECIDUAL tem sido proposta em diversas
se quer que ocorra a formação de um novo dente (Daltoé áreas da Odontologia para promover a regeneração dentária,
et al., 2010). especificamente em Endodontia, Periodontia e Cirurgia
Esta técnica ainda está longe de ser aplicada Craniofacial (Hau et al., 2006). Entretanto, deve ser enfatizado
clinicamente, devido à complexidade e quantidade de que a regeneração de um órgão dentário não é simples, pois
sinalizadores biomoleculares envolvidos no processo de cito seu desenvolvimento é determinado por interações complexas
e morfodiferenciação durante a odontogênese (Koussoulakou e inúmeros fatores de crescimento e, ainda, a diferenciação
et al., 2009). celular está ligada a mudanças morfológicas no decorrer da
formação do germe dentário (Rai et al., 2014). As células-
DISCUSSÃO tronco encontradas no ligamento periodontal são estimuladas
in vitro a diferenciarem-se em cementoblasto, representando
Existem diversas terapias para substituição dos órgãos uma possível função na regeneração periodontal (Wada et
dentários, todas elas baseadas em técnicas não-biológicas, al., 2011). Ao isolar células-tronco da polpa dentária a partir
podendo estar sujeitas a falhas. A perda dos dentes pode ser de terceiros molares humanos impactados foi observada a
compensada com métodos protéticos e uso de implantes em habilidade de formar uma estrutura semelhante ao complexo
pacientes que estejam parcial ou totalmente edentados. No dentino-pulpar (Gronthos et al., 2000).
entanto, muitos pacientes têm diferentes graus de dificuldade No entanto, ainda são necessários maiores conhecimentos
para se adaptarem a qualquer tipo de prótese, em razão de sobre isolamento de células-tronco, seus nichos, bem como
fatores anatômicos, fisiológicos, psicológicos, bem como os mecanismos moleculares de crescimento e diferenciação
protéticos (Lymperi et al.,2013; Huang & Garac-Godoy, 2014). celular, para que, desta forma, seja possível a utilização da
Outra possibilidade seria que o dente para substituição terapia celular na Odontologia (Chen et al., 2012; Volponi &
teria de ser feito a partir do tecido do próprio paciente e Sharpe, 2013; Mathur et al., 2014)
cultivado no próprio local do dente (Duailibi et al., 2008). Com Acredita-se que, em um futuro não muito distante, o
os avanços da ENGENHARIA TECIDUAL e células-tronco, essa uso de células-tronco represente um procedimento usual,
plausibilidade biológica se torna cada vez mais real (Ulmer et significando um grande avanço para o campo odontológico
al., 2010). (Alves et al., 2010). Deve ser ressaltado que um indivíduo
As células-tronco apresentam a capacidade de se auto- saudável perde 20 dentes decíduos que são naturalmente
reproduzirem, bem como gerar células diferenciadas de tipos esfoliados; a polpa de um dente permanente pode ser
especializados de tecidos (Duan et al., 2011) ou pelo menos de facilmente obtida em qualquer momento da vida; o tecido
um tipo celular altamente especializado e podem ser divididas periodontal pode ser acessado de maneira simples e os
em duas categorias: células-tronco embrionárias pluripotentes terceiros molares contendo tecidos embrionários (papila
e células-tronco adultas (Kolya & Castanho, 2007). apical e folículo dental) podem ser extraídos em um momento
De um modo geral, os estudos estão concentrados mais tardio da vida adulta, sem trazer qualquer morbidade
em células-tronco adultas, cujas principais fontes são: ao indivíduo. Assim, posteriormente, tais células poderão ser
medula óssea, sangue, córnea e retina, fígado, pele, trato usadas no tratamento de cáries, periodontites, tratamentos
gastrointestinal, pâncreas e polpa dental. Outras fontes são endodônticos, reparação alveolar, implantes dentários,
ligamento periodontal, folículo dental, papila apical e polpa aumento da altura do osso alveolar, reparação da cartilagem
de dentes decíduos (Huang & Garcia- Godoy, 2014; Neel et da articulação temporomandibular, bem como em outras
al., 2014). áreas do corpo humano.
A habilidade de uma célula-tronco adulta de um tecido

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CONCLUSÃO all functions of the tooth. These cells provide new alternatives
such as: regeneration of pulp-dentin, periodontal tissue and
Diante do exposto, torna-se lícito concluir que: temporomandibular joint cartilage and the development of
- a ENGENHARIA TECIDUAL tem proporcionado os third dentition. The main sources are: mesenchymal cells in
experimentos com células-tronco por seu fácil acesso e não the periodontium and dental pulp, especially in primary teeth,
serem órgãos vitais. even the dental follicle and the apical papilla. All these cells
- os dentes são considerados fontes peculiares e de suma have shown proliferative and regenerative capacity of human
importância quando comparados a outras fontes celulares; tissues, whether or not dental tissues. Thus, the aim of this
- as principais fontes de células-tronco na Odontologia study was to perform a literature review on tissue engineering
são polpa dental, ligamento periodontal, folículo dental, papila focusing on stem cells, their use, sources, advantages and
apical e polpa de dentes decíduos. disadvantages, as well as to clarify the real applicability in
Dentistry.
ABSTRACT
UNITERMS: Tissue engineering; Stem cells; Dentistry.
Tooth loss is still a major problem in Dentistry. However,
new treatments may be achieved by using stem cells to restore

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Curso de Odontologia – Departamento de Odontologia II
Av. Portugueses s/n, Campus do Bacanga
CEP: 65085-580 – São Luís – MA
Tel.: (98) 3272-8575
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30 An official publication of the Brazilian Society of Periodontology ISSN-0103-9393

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