Proessora Msc: Delma Pacheco Sicsú O Arcadismo – contextualização: A consciência histórica e crítica do arcadismo brasileiro CONFIGURAÇÃO DO SISTEMA LITERÁRIO
• A partir da metade do século XVIII já se pode falar pelo menos do esboço
de uma literatura como fato cultural configurado, não apenas como produções individuais de pouca repercussão.
• A consciência de grupo por parte dos intelectuais, o reconhecimento que
começou a existir de um passado literário local, o começo de maior receptividade por parte de públicos, embora débeis e pouco numerosos, começam a definir uma articulação dos fatos literários. Esta foi a importância decisiva do século XVIII, cuja base é o movimento das Academias e cujo coroamento será a plena consciência de autonomia no século XIX. • A Academia dos Renascidos, fundada em 1759 na Bahia, apresenta um significativo elemento novo: ela recruta sócios no Sul, mostrando que começava a haver articulações entre os homens cultos. A sua orientação ainda cabe dentro do espírito retórico, que já não predomina na Academia Científica, fundada em 1771 no Rio de Janeiro, não por magistrados e proprietários rurais, mas por médicos interessados no conhecimento racional da natureza e sua exploração para o bem coletivo. • Transformada em 1786 com o nome de Sociedade Literária, ela durou até 1795, quando foi fechada sob a alegação de que os seus membros pregavam doutrinas subversivas, baseadas em Rousseau, Mably e os enciclopedistas franceses. Já então os intelectuais da Colônia estavam acertando o passo com a Filosofia das Luzes, a que se ligou de certo modo a transformação estética conhecida em Portugal e no Brasil sob o nome de Arcadismo. Ela começou em Lisboa na Arcádia Lusitana (1756) e teve como objetivo combater o artificialismo, a falsa argúcia e o palavreado oco a que haviam chegado as tendências barrocas na sua fase de decadência. A exemplo dos clássicos franceses e dos árcades italianos, os seus membros procuravam uma dicção mais natural e se interessavam pela modernização da sociedade, do ensino, do governo. Na prática, permaneceu muito do espírito barroco, misturado à naturalidade e ao realismo No Brasil, o Arcadismo é contemporâneo da passagem do eixo político e econômico para o Sul. No Rio de Janeiro e nas cidades da Capitania das Minas Gerais ocorre o movimento cultural e literário mais característico na segunda metade do século XVIII e começo do século XIX, já ligados à crise do estatuto colonial e às aspirações de independência em relação à Metrópole. Alguns poetas arcádicos serão processados, presos, desterrados, devido à sua posição crítica em relação ao Governo Português e a projetos mais ou menos vagos de separação. • Esse momento é de amadurecimento para todo o Brasil, que finalmente adquire um contorno geográfico bem próximo do que tem hoje e vê núcleos de povoamento se espalharem por todas as regiões, embora a população fosse rala e continuasse concentrada no litoral e adjacências. Esse amadurecimento se reflete na quantidade de homens cultos que atuaram aqui e na Metrópole, – sacerdotes, naturalistas, administradores, matemáticos, poetas, publicistas, – formando o primeiro grande conjunto de brasileiros capazes de ombrear com os naturais de Portugal • Na literatura sobressai um grupo de poetas que nasceram ou viveram em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, quase todos marcados pelo espírito renovador da Arcádia Lusitana, e alguns deles realmente modernos pela escrita e a atitude mental. Comecemos por um mais velho, que não se ligou aos outros e foi sob muitos aspectos retardatários, pois adotou a maneira camoniana e não participou da Ilustração: o frade agostiniano José de Santa Rita Durão (1722-1784). O seu poema épico Caramuru (1781) é mesmo uma resposta ao pequeno poema Uraguai (1769), onde José Basílio da Gama (17411795) manifestava mentalidade ilustrada e anti-jesuítica. Ambos expunham pela primeira vez um novo modo de ver o confronto entre colonizadores e indígenas, maneira moderna em que sobressai o aspecto de choque das culturas, com um espírito de perplexidade ante a destruição da vida do índio, da qual a análise mostrara aos poetas a validade e adequação. Mas enquanto Basílio da Gama o fez de maneira inovadora, num pequeno poema carregado de modernidade para o tempo, Durão se apegou ao modelo tradicional dos Lusíadas, com a mesma oitava heróica de decassílabos, a mesma divisão em dez cantos, misturando a tradição renascentista a restos do estilo cultista • Comecemos por um mais velho, que não se ligou aos outros e foi sob muitos aspectos retardatários, pois adotou a maneira camoniana e não participou da Ilustração: o frade agostiniano José de Santa Rita Durão (1722-1784). O seu poema épico Caramuru (1781) é mesmo uma resposta ao pequeno poema Uraguai (1769), onde José Basílio da Gama (17411795) manifestava mentalidade ilustrada e anti-jesuítica. • Ambos expunham pela primeira vez um novo modo de ver o confronto entre colonizadores e indígenas, maneira moderna em que sobressai o aspecto de choque das culturas, com um espírito de perplexidade ante a destruição da vida do índio, da qual a análise mostrara aos poetas a validade e adequação. Mas enquanto Basílio da Gama o fez de maneira inovadora, num pequeno poema carregado de modernidade para o tempo, Durão se apegou ao modelo tradicional dos Lusíadas, com a mesma oitava heróica de decassílabos, a mesma divisão em dez cantos, misturando a tradição renascentista a restos do estilo cultista • Sob certo aspecto, o Caramuru é uma chave de abóbada formando par com a História, de Rocha Pita. Ele faz uma espécie de balanço da colonização, no momento em que iam aparecer as tendências nativistas mais atuantes, que levariam à Independência em 1822. E a sua matéria sintetiza as linhas temáticas que vimos acima: descrição hiperbólica da natureza; descrição da vida indígena; celebração da defesa do país contra invasores estrangeiros, vista como episódio da implantação da fé verdadeira, a católica, elemento central desse poema eminentemente religioso.
• O Uraguai é, ao contrário, moderno pelo laicismo, a solução formal e o espírito de
adesão à política do despotismo ilustrado, representado em Portugal pelo governo do Ministro Marquês de Pombal. A sua maneira de descrever o choque de culturas, fatal para a do índio, implica em relação a este uma adesão simpática e melancólica, que prenuncia o indianismo romântico e amaina a tonalidade épica em favor do lirismo. Apesar do tema heróico, também na forma predomina o lirismo, traduzido num verso branco fluente e melodioso, que parece matriz de versos românticos • Esses dois poetas foram considerados pelos românticos como fontes da poesia ―nacional‖, porque tomaram como personagem o indígena, que ia se tornando aos poucos uma espécie de símbolo da pátria. • As tendências ilustradas do governo de Pombal, de que Basílio da Gama foi adepto, tiveram a adesão de outros escritores brasileiros, que celebraram as suas reformas, como três poetas que conviveram em Minas e participaram dos projetos de separação política, conhecidos pelo nome de Inconfidência Mineira (1789): Cláudio Manuel da Costa, Alvarenga Peixoto e Tomás Antônio Gonzaga. O primeiro suicidou-se na prisão, os dois outros morreram exilados na África, sendo considerados precursores da Independência. Obrigada!!