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NOÇÕES DE PERÍCIA

AULA 6

Profª Sônia Regina Ribas Timi


CONVERSA INICIAL

O laudo pericial consiste em um relato feito pelo técnico ou especialista


designado pelo juiz para avaliar determinada situação dentro de sua área de
atuação. Sendo assim, o laudo consiste na apresentação das impressões
técnico-científicas do perito obtidas durante a análise da questão litigiosa.
Trata-se de um dos meios de prova em direito admitidos, que auxilia na
formação do convencimento do magistrado. Este, por sua vez, poderá acatá-lo
ou rejeitá-lo integral ou parcialmente, fazendo-o sempre de forma motivada.
O laudo pericial não se confunde com outros documentos, tais como o
parecer. Este pode ser definido em termos de resposta a uma consulta feita pelas
partes litigantes, razão pela qual é observado enquanto documento associado à
opinião do especialista sobre determinado tema.
Veremos, aqui, que a elaboração do laudo pericial deve atender a
determinados critérios. Por essa razão, precisa ser estruturado de modo a
apresentar, de forma clara e objetiva, os seguintes elementos.

• O objeto da perícia.
• A análise técnica ou científica promovida pelo perito indicado pelo juízo.
• A apresentação da metodologia aplicada.
• A indicação de respostas conclusivas aos quesitos formulados pelas
partes, assistentes técnicos, Ministério Público e magistrado.

Para cumprir tais formalidades, é certo que o perito deva agir de forma
atenta e meticulosa. Além disso, também deve se afastar do senso comum, de
forma que as conclusões apresentadas no laudo sejam revestidas de
imparcialidade e da tecnicidade esperada de sua atividade.
Feitas tais considerações iniciais, a partir de agora, nos dedicaremos ao
estudo dos elementos que compõem o laudo pericial, com o objetivo de
conhecer: (a) o que ele é; (b) como deve ser elaborado; (c) as metodologias de
trabalho; (d) como apresentar as respostas aos quesitos formulados; e os
modelos de laudos periciais.
Bons estudos!

TEMA 1 – LAUDO PERICIAL

1.1 Considerações introdutórias

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O laudo pericial é a prova que se quer obter através do requerimento para
a realização da perícia e consiste no “instrumento pelo qual o perito apresenta
seu trabalho técnico ao magistrado” (Müller; Timi; Heimoski, 2017, p. 125).
É importante mencionar que, por via de regra, o trabalho pericial consiste
na coleta de informações e/ou documentos, na análise das informações
apresentadas pelas partes nos autos, com o objetivo de conseguir solucionar as
questões ou os pontos controvertidos, tal como apresentados pelo magistrado
(Müller; Timi; Heimoski, 2017).
Por essa razão, as conclusões a serem apresentadas no laudo pericial
serão aquelas obtidas a partir da adoção das técnicas disponíveis aos peritos, a
saber: realização de exames, vistorias, indagações, investigações, arbitramento
de valores, avaliações e certificações.

1.2 Previsão legal

Até a publicação da Lei n. 13.105, não havia previsão legislativa


específica regulando a confecção deste documento na esfera civil. Esta
realidade só se modificou quando da publicação do Código de Processo Civil de
2015 (Lei n. 13.105), que, por meio do artigo 473, estabeleceu os requisitos para
a sua confecção.
Art. 473. O laudo pericial deverá conter:
I - a exposição do objeto da perícia;
II - a análise técnica ou científica realizada pelo perito;
III - a indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando
ser predominantemente aceito pelos especialistas da área do
conhecimento da qual se originou;
IV - resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz,
pelas partes e pelo órgão do Ministério Público.
§ 1º No laudo, o perito deve apresentar sua fundamentação em
linguagem simples e com coerência lógica, indicando como alcançou
suas conclusões.
§ 2º É vedado ao perito ultrapassar os limites de sua designação, bem
como emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou
científico do objeto da perícia.
§ 3º Para o desempenho de sua função, o perito e os assistentes
técnicos podem valer-se de todos os meios necessários, ouvindo
testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que
estejam em poder da parte, de terceiros ou em repartições públicas,
bem como instruir o laudo com planilhas, mapas, plantas, desenhos,
fotografias ou outros elementos necessários ao esclarecimento do
objeto da perícia.
1.3 Apresentação do laudo em juízo

A apresentação do laudo deve ocorrer em juízo, por meio de petição


escrita, a qual poderá ser protocolada em meio físico ou em meio digital

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(processo eletrônico). O documento deverá ser elaborado em língua portuguesa
e escrito com linguagem simples e coerente.
O laudo tem como objetivo esclarecer aos sujeitos processuais como foi
possível alcançar as conclusões descritas, razão pela qual deve ser objetivo e
elucidativo para as partes e para o magistrado. Para tanto, deverá ser elaborado
de forma completa e padronizada, contendo, para além dos requisitos
constantes do artigo 473 da Lei n. 13.105, os seguintes elementos.

• Número dos autos do processo.


• Número da Vara/Seção Judiciária em que os autos tramitam.
• Nome das partes e de seus representantes legais.
• Apresentação do perito.
• Sumário.
• Objetivo do laudo.
• Metodologia adotada.
• Respostas aos pontos controvertidos apontados pelo juiz.
• Resposta aos quesitos apresentados pelas partes.
• Conclusão.
• Anexos.
• Apêndices (se for o caso).

Os anexos geralmente correspondem aos documentos não elaborados


pelos peritos, que auxiliaram na elaboração do laudo. Os apêndices, por sua vez,
consistem nos documentos, planilhas ou figuras elaboradas pelo próprio perito e
que se tornam indispensáveis para a compreensão do laudo, razão pela qual
devem ser integrados ao documento.

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TEMA 2 – ESTRUTURA DO LAUDO

2.1 Apresentação do perito

A apresentação do perito tem como objetivo demonstrar às partes que o


perito designado pelo magistrado possui a qualificação e as competências
necessárias para produzir o laudo pericial. Para tanto, o perito deverá apresentar
nesse documento, de forma sucinta, o seu currículo, oportunidade em que
apontará os elementos de sua formação acadêmica e profissional.
A seguir, segue modelo de minicurrículo retirado do site pessoal desta
professora, apenas a título exemplificativo.

Figura 1 – Modelo de minicurrículo

Disponível em: <https://periciascalculosjudiciais.com.br/curriculodaperita/>. Acesso


em: 7 jun. 2022.

2.2 Sumário

O sumário é uma lista de tópicos, seções ou subdivisões de um trabalho.


Trata-se de um item opcional no laudo pericial, que serve para facilitar a
localização dos temas ou das matérias contidas no laudo.
A palavra “sumário” deverá estar centralizada, em letras maiúsculas,
negrito e com a mesma fonte utilizada nas demais seções do texto e cada item
do sumário deve remeter à página que aparece no texto.

Figura 2 – Modelo de sumário

Fonte: elaborado pela autora (2022).

2.3 Objetivo do laudo

A exposição dos objetivos da perícia é uma exigência da Lei n. 13.105.


Em linhas gerais, é possível afirmar que o principal objetivo de toda perícia é o
de assistir ao Juízo em relação aos quesitos e às questões técnicas colocadas
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em julgamento, buscando esclarecer as dúvidas e os conflitos apontados nos
autos.
Assim sendo, a definição de seu conteúdo dependerá da análise da
petição inicial e da contestação, bem como dos documentos que acompanham,
sem prejuízo da análise da decisão judicial que fixa os pontos controvertidos da
demanda.

Figura 3 – Esquema petição inicial, contestação e decisão judicial

CONTESTAÇÃO
•DOCUMENTOS •PONTOS
•DOCUMENTOS CONTROVERTIDOS

PETIÇÃO DECISÃO
INICIAL JUDICIAL

Fonte: Timi (2022).

A seguir, apresentamos um modelo de objetivo apresentado em juízo:

Figura 4 – Modelos de objetivo apresentado em juízo

Disponível em: <www.kronbergleiloes.com.br>. Acesso em: 7 jun. 2022.

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Fonte: Timi (2022).

TEMA 3 – ESTRUTURA DO LAUDO – Continuação

3.1 Metodologia de trabalho

O laudo deve conter um tópico específico destinado à apresentação da


metodologia empregada em sua confecção. O método científico “refere-se a um
aglomerado de regras básicas de como deve ser o procedimento a fim de
produzir conhecimento científico, quer um novo conhecimento, quer uma
correção (evolução) ou um aumento na área de incidência de conhecimentos
anteriormente existentes” (Müller; Timi; Hiemoski, 2017, p. 129). Em grande
parte das áreas em que as perícias são realizadas, é possível verificar que o
método “consiste em juntar evidências empíricas verificáveis” (Müller; Timi;
Hiemoski, 2017, p. 129).
A metodologia científica refere-se, portanto, aos passos comuns a todos
os métodos. E, muito embora os procedimentos possam variar a depender da
área da ciência a ser explorada pelo perito, é possível perceber a existência de
alguns elementos comuns.
A seguir, indicaremos um modelo de laudo pericial, no qual a descrição
da metodologia de trabalho é feita de forma bastante precisa, apenas como
exemplo.

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Figura 5 - Metodologia

Fonte: Timi (2022).


TEMA 4 – ESTRUTURA DO LAUDO – Continuação

4.1 Resposta aos quesitos

Na sequência da elaboração do laudo, o perito deverá enfrentar os


quesitos apresentados nos autos, abrangendo com suas respostas os quesitos
apresentados por cada uma das partes (autor e réu) e pelo juízo.
A resposta deverá ser elaborada a partir da transcrição do
questionamento e a apresentação da devida resposta, tal como veremos:

Figura 6 – Quesitos

Fonte: Timi (2022).

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Fonte: Timi (2022).

Nesta oportunidade, devem ser evitadas respostas genéricas. Os quesitos


deverão ser respondidos de forma lógica e objetiva, cuja redação seja
compreensível até mesmo às pessoas sem o conhecimento técnico do perito.
O perito, nesse sentido, deverá evitar a aposição de respostas em termos
de “sim” e “não”, elaborando sua resposta, tendo em vista a imperatividade da
regra que impõe a fundamentação de seu entendimento e conclusões.

4.2 Utilização de materiais complementares

O perito poderá se valer de planilhas de cálculos, plantas, gráficos, fotos,


entre outros recursos para demonstrar as razões de seu convencimento. Por
razões de natureza estética, convencionou-se que esse material complementar
deva ser apresentado na forma de anexo ou apêndice – a depender do tipo de
material que se pretende anexar.
O anexo é destinado para a apresentação de documentos que não
tenham sido elaborados pelo perito. Já o apêndice consiste em todo o material
elaborado pelo perito.
Um cuidado adicional deve ser tomado em relação à conclusão e aos
resultados obtidos com a perícia, pois esses dados não devem ser apresentados
como anexo ou apêndices. Vale complementar que “nada mais cansativo para o
magistrado do que precisar buscar nos apêndices o resultado dos cálculos”
(Müller; Timi; Heimoski, 2017, p. 127).

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TEMA 5 – ESTRUTURA DO LAUDO – Continuação

5.1 Conclusão do laudo pericial

A última parte de um laudo pericial deve corresponder ao campo


destinado à apresentação da conclusão do perito.
Vale mencionar que se trata de um item indispensável, uma vez que,
quando não é apresentado de forma clara, é possível que o magistrado entenda
que o trabalho apresentado foi inconclusivo.
A conclusão apresentada deve ter os mesmos atributos mencionados em
relação à resposta aos quesitos. Por essa razão, precisa ser um texto claro e
objetivo escrito em língua portuguesa.
O conteúdo da conclusão deverá ser preciso e completo, razão pela qual
se torna desaconselhável a utilização de vocabulário excessivamente técnico,
de um lado, bem como a adoção de linguagem informal. Por exemplo, em uma
perícia que tem como objetivo indicar a veracidade de uma assinatura, a
conclusão deve afirmar se ela é (ou não) falsa.
Por fim, o laudo pericial tem como função auxiliar o juiz a encontrar
respostas, claras e conclusivas, sobre determinada questão.

5.1 Realização de novas perícias

Por via de regra, bastará a realização de uma perícia para que as partes
e o magistrado se convençam acerca da prova. Contudo, existem algumas
situações peculiares em que, uma ou ambas as partes, insatisfeitas com o laudo
pericial apresentado, requerem a realização de novo procedimento.
Como nos ensinam Müller, Timi e Heimoski (2017, p. 135), a parte que
apresenta tal requerimento deve ter consciência de que “uma perícia não
substitui outra” e que o juiz não se encontra vinculado a elas para formar o seu
convencimento acerca da demanda.
Por se tratar de uma questão de natureza técnico-científica e não mera
opinião, também não é incomum que a segunda perícia apresente os mesmos
resultados que a primeira. De certa forma, cabe às partes e aos seus
representantes legais compreenderem que é indevido o requerimento de uma

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nova perícia apenas porque não gostaram dos resultados da primeira (Müller;
Timi; Heimoski, 2017).

NA PRÁTICA

Na notícia “Clínica deve indenizar por lesão que causou amputação de


dedo de idosa”, publicada no site Jusbrasil, vemos a importância do papel da
perícia, bem como a aplicação do princípio da livre convicção (motivada) do juiz.
Trata-se da manutenção da condenação de uma clínica de podologia em
segunda instância. Uma empresa prestadora de serviços estéticos teria
provocado uma lesão em uma paciente idosa e diabética durante um
atendimento de podologia. A lesão evoluiu para um quadro clínico no qual os
médicos entenderam que a amputação de um dos dedos do pé da autora se fez
necessária.
A clínica, em sua defesa, apresentou o argumento de ausência de nexo
de causalidade entre a lesão causada em sua clínica à vítima e a amputação,
e para tanto valeu-se das conclusões apresentadas no laudo pericial. Nesse
documento, o médico perito teria se posicionado no sentido de reconhecer a
inexistência de elementos de convicção capazes de justificar que o ferimento
causado na autora da demanda teria sido a razão pela qual teve de se submeter
à amputação do dedo.
O Tribunal, no entanto, também se valendo das conclusões apresentadas
no laudo pericial, entendeu que

A conclusão da perícia de que inexistem elementos para afirmar com


certeza onde e quando ocorreu o ferimento da autora não tem o condão
de corroborar a tese da clínica de que não houve o nexo causal.
(Jusbrasil, 2021, on-line)

A interpretação acerca da conclusão do perito, segundo os julgadores,


também deve passar pelo crivo da dinâmica processual. Nesse sentido,
entenderam que a parte ré (Clínica de podologia) não se esquivou do ônus
processual de comprovar a qualidade da prestação dos serviços prestados à
autora, a qual tinha uma doença que impede a adequada cicatrização de
ferimentos (diabetes).
Diante do caso, bem como da previsão legal de que a culpa da clínica é
de natureza objetiva, manteve-se a condenação ao pagamento de indenização
por danos morais e estéticos à vítima no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

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FINALIZANDO

Vimos ao longo de nossa caminhada que a atividade pericial é vinculada


às necessidades da produção de prova, ou seja, com a resolução de pontos
controvertidos em uma demanda judicial.
Sendo assim, é possível afirmar que a função do perito só termina quando
o magistrado reconhece como encerrada a fase de produção probatória, por
intermédio da competente decisão judicial.
O laudo pericial é um tipo de prova, produzido por especialista, que tem
por finalidade determinar a autoria e/ou a materialidade dos fatos controvertidos
em uma demanda judicial.
O documento deve ser elaborado por um perito designado pelo juízo e se
limitar a abranger o campo técnico-científico delimitado pelos quesitos, sem a
emissão de qualquer juízo pessoal ou opinião.
Uma das principais cautelas que o perito deve tomar, portanto, é o de
conseguir elaborar este documento da forma mais objetiva, clara e direta
possível.
A estrutura do laudo pericial é composta pelos seguintes elementos:

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Figura 7 – Estrutura do laudo pericial

ESTRUTURA NÚMERO DOS AUTOS


DO LAUDO
PERICIAL
NOME DAS PARTES

NOME DOS ADVOGADOS

APRESENTAÇÃO DO PERITO

SUMÁRIO

OBJETIVO

METODOLOGIA ADOTADA

RESPOSTAS AOS PONTOS CONTROVERTIDOS

CONCLUSÃO

ANEXO

APÊNDICES

Fonte: Timi (2022).

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REFERÊNCIAS

AGUIAR, João Luís; SOUZA, Edmilson de. Manual de procedimentos


periciais. Goiânia: Gráfica Art3, 2013.

BRASIL. Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.


Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-
2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 7 jun. 2022.

CARBONERA, Daiana. Clínica deve indenizar por lesão que causou


amputação de dedo de idosa. JusBrasil, 2021. Disponível em:
<https://daianacarbonera.jusbrasil.com.br/noticias/1277670311/clinica-deve-
indenizar-por-lesao-que-causou-amputacao-de-dedo-de-idosa>. Acesso em: 7
jun. 2022.

MÜLLER, Aderbal Nicolas; TIMI, Sônia Ribas; HEIMOSKI, Vânia Marcon.


Perícia contábil. São Paulo: Saraiva, 2017.

YEE, Zung Che. Perícia civil: manual prático. 3. ed. Curitiba: Juruá, 2011.

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