Você está na página 1de 531

Análise Econômica do Direito:

Resultado de Pesquisa do Graed

Grupo de Estudos em Análise Econômica do Direito


PUCPR

Organização geral: Prof. Dr. Oksandro Gonçalves


Organização científica: Miriam Olivia Knopik Ferraz,
Bruna Zilliotto, Ricardo Bazzanezze, Felipe de Poli
de Siqueira e Larissa Milkiewicz
Editoração científica: Ariê Scherreier Ferneda
Análise Econômica do Direito:
Resultado de Pesquisa do Graed

Grupo de Estudos em Análise Econômica do Direito


PUCPR

Organização geral: Prof. Dr. Oksandro Gonçalves


Organização científica: Miriam Olivia Knopik Ferraz,
Bruna Zilliotto, Ricardo Bazzanezze, Felipe de Poli
de Siqueira e Larissa Milkiewicz
Editoração científica: Ariê Scherreier Ferneda

Belo Horizonte, 2020


Editores: Jonathan Félix de Souza
Sandson Rotterdan
Editoração Eletrônica: Alex Andrade
Capa: Zwei Arts
Organização Geral: Prof. Dr. Oksandro Gonçalves
Organização Científica: Bruna Zilliotto, Felipe de Poli de Siqueira,
Larissa Milkiewicz, Miriam Olivia Knopik
Ferraz, Ricardo Bazzanezze
Editoração Científica: Ariê Scherreier Ferneda

A532

Análise econômica do direito: resultado de pesquisa do Graed: livro I. /


Organizado por Bruna Zilliotto, Felipe de Poli de Siqueira, Larissa Milkiewicz,
Miriam Olivia Knopik Ferraz, Oksandro Gonçalves, Ricardo Bazzanezze. -- Belo
Horizonte: Senso, 2020.
530 p.

ISBN: 978-65-80404-12-4
ISBN e-book: 978-65-80404-11-7

1. Direito e economia. I. Pansieri, Flávio. II. Madalena, Luís Henrique Braga.


III. Ferraz, Miriam Olivia Knopik.

CDD: 343.8107

Ficha Catalográfica elaborada por Niúra Ferreira e Barbosa - CRB/6 - 2377

Todos os direitos reservados à Editora Senso. Nenhuma parte da obra pode ser reproduzida,
adaptada, multiplicada ou divulgada de nenhuma forma (em particular por meios de reprografia
ou processos digitais) sem autorização expressa da editora, e em virtude da legislação em vigor.
Esta publicação segue as normas do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, Decreto nº
6.583, de 29 de setembro de 2008.

http://editorasenso.com
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Sumário

A AVALIAÇÃO EX POST DAS POLÍTICAS PÚBLICAS SOB UMA ANÁLISE ECONÔMI-


CA DO DIREITO ANTE A EDIÇÃO DA LINDB, LEI DAS AGÊNCIAS REGULADORAS
E LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA.............................................................................. 11
Gilberto Bonfim e Renato Maia de Faria

UNIFORMIZAÇÃO JURISPRUDENCIAL E RACIONALIDADE DO JULGADOR......... 34


Fernanda Huss Erzinger e Marcia Carla Pereira Ribeiro

A RECUPERAÇÃO DE EMPRESA: RACIONALIDADE ECONÔMICA DOS


AGENTES OU BENESSE DO ESTADO?.................................................................... 51
Felipe de Poli de Siqueira e Francieli Micheletto

ANÁLISE ECONÔMICA DA ATUAÇÃO PREVENTIVA DO CADE DIANTE DAS


JOINT VENTURES CONTRATUAIS........................................................................... 70
Kharem Kelm Herbst e Ana Luisa Lopes Gomes

A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO DA JOINT VENTURE COMO INSTRUMENTO


DE EFICIÊNCIA: ESTUDO DE CASO DA HYUNDAI E APTIV.............................. 90
Aron Vitor Fraiz Costa e Ricardo Bazzaneze

BRAZIL IS HEADING NORTH....................................................................................... 111


Andrei Lemisz Silverio dos Santos e Eduardo Oliveira Agustinho

FACTORING E EMPRESA SIMPLES DE CRÉDITO: ANÁLISE ECONÔMICA DOS


INCENTIVOS DESTAS FIGURAS JURÍDICAS........................................................ 131
Guilherme Helfenberger Galino Cassi e Rafael Henrique Reske

OS DESAFIOS DAS INSURTECHS NO BRASIL À LUZ DA ANÁLISE ECONÔMICA


DO DIREITO............................................................................................................. 156
Bruna Antunes Ziliotto e Luis Guilherme Badotti Linhares

5
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

A PREVISÃO CONTRATUAL DA INTEGRIDADE E DE CUMPRIMENTO COMO


DIFERENCIAL COMPETITIVO E ATIVO EMPRESARIAL..................................... 178
Bruno Fediuk de Castro e Lucas Hinckel Teider

A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE COMO UM VALOR DE CONCRETIZAÇÃO


À TRÍADE DA REVOLUÇÃO FRANCESA............................................................... 195
Laís Chuffi Rizardi

ANÁLISE ECONÔMICA DA EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E


DA COFINS: UMA INTERPRETAÇÃO À LUZ DA TEORIA DOS JOGOS............. 219
Gustavo Carvalho Kichileski e Fernanda Huss Erzinger

A IMPLEMENTAÇÃO DE INOVAÇÃO ABERTA NO SETOR DE ENERGIA: UM ESTUDO


DE CASO SOB A ÓTICA DA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO.......................241
Maria Eduarda Ferreira Piccoli e Lara Bonemer Rocha Floriani

LEI Nº 12.846/2013 - LEI ANTICORRUPÇÃO: O ACORDO DE LENIÊNCIA SOB UM


ENFOQUE DA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO.......................................... 262
Bruno Fediuk de Castro e Gilberto Bomfim

ANÁLISE ECONÔMICA DA PENA DE MULTA EM SEDE DE RESPONSABILIDADE


PENAL DA PESSOA JURÍDICA............................................................................... 285
Antônio Osmar Krelling Neto e Paulo Henrique Costa de Abreu Coelho

ANÁLISE ECONÔMICA DA TEORIA DOS JOGOS NO QUE CONCERNE A COLABORAÇÃO


PREMIADA DE “LÉO PINHEIRO” NA OPERAÇÃO LAVA JATO................................298
Isabela Carolina Machado de Lima e Lorena Pinto Gonçalves

O PAPEL DA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO E DA TEORIA DOS JOGOS


NO COMBATE AOS CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL
E DE LAVAGEM DE DINHEIRO.............................................................................. 315
Daiana Caye Reizes e Tiago Neu Jardim

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO E SISTEMA DE PREVIDÊNCIA...................... 339


Ariê Scherreier Ferneda, Danna Catharina Mascarello Luciani e Miriam Olivia Knopik Ferraz

6
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

DEPRESSÃO E ANSIEDADE: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA TRATAMENTO, EFEITO


NUDGE E APLICAÇÃO DA AED............................................................................. 356
Vagner França Florentino Junior

TRATAMENTO HOME CARE E ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: A CIÊNCIA A


SERVIÇO DA EFETIVAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS....................................... 374
Cristiane Luiza Riffel e Lairton Ribeiro de Oliveira

ANÁLISE ECONÔMICA DA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE PELA NÃO


SUBMISSÃO À PROCEDIMENTO DE COLETA DE CÉLULAS-TRONCO............ 396
Lorena Pinto Gonçalves e Miriam Olivia Knopik Ferraz

ANÁLISE ECONÔMICA DA PROIBIÇÃO DO ABORTO NO BRASIL......................... 419


Ariane Fonseca Dalazuana, Jéssica Fernanda Maciel da Silva e Fernanda Huss Erzinger

CONSEQUÊNCIAS DAS POLÍTICAS LGBTQI+ NAS EMPRESAS PELO VIÈS DA


ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO.................................................................... 436
Marcos Guilherme Rodrigues Mafra e Vinicius Ernesto dos Santos

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO E ECONOMIA COMPORTAMENTAL:


A RACIONALIDADE LIMITADA NO PROCESSO DE DECISÃO.......................... 451
Ariê Scherreier Ferneda e Pedro Andrade Guimarães Filho

PRISÃO ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA:


UMA ANÁLISE ECONÔMICA DOS GASTOS DO ERÁRIO PÚBLICO COM
PRESOS PROVISÓRIOS POSTERIORMENTE ABSOLVIDOS PELOS
TRIBUNAIS SUPERIORES........................................................................................ 466
Lincoln Machado Domingues e Roberta Martinic Cauduro

7
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

RESUMOS
O PRINCÍPIO DA MELHORIA DO ARCABOUÇO INSTITUCIONAL NOS PROJETOS .
DE REFORMA DA LEI 11.101/2005: UMA LEITURA A PARTIR DE DOUGLASS
NORTH...................................................................................................................... 487
Ademar Nitschke Júnior e João Paulo Atilio Godri

ANÁLISE ECONÔMICA DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS BASEADA


NAS PREFERÊNCIAS E ESTRATÉGIAS FALIMENTARES, DIANTE DA
ECONOMIA COMPORTAMENTAL.......................................................................... 490
Felipe de Poli de Siqueira e Gustavo de Oliveira Pedroso
SOCIEDADE LIMITADA: ANÁLISE DAS QUOTAS PREFERENCIAIS
NA PERSPECTIVA DO QUOTISTA MINORITÁRIO............................................... 493
Geovane Antunes Santos Oliveira e Igor Murilo de Andrade Lindner

O INSTITUTO DA GOLDEN SHARE NA FUSÃO EMBRAER-BOEING SOB A


PERSPECTIVA DA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO.................................... 496
Vitória Fornerolli Wisniewski e Ludmilla Batista Duarte

ANÁLISE ECONÔMICA DA SUCESSÃO EMPRESARIAL DO INCAPAZ


INDEPENDENTEMENTE DA AUTORIZAÇÃO JUDICIAL DO ARTIGO 974
DO CÓDIGO CIVIL.................................................................................................. 499
Luis Guilherme Badotti Linhares e Felipe de Poli de Siqueira

A FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO ANTES E DEPOIS DA LEI DA LIBERDADE


ECONÔMICA: A NOVA PERSPECTIVA DA LIBERDADE CONTRATUAL E DO
PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA............................................................. 501
Renata Maria Amatuzzi Köche

ANÁLISE ECONÔMICA DO SISTEMA TRIBUTÁRIO BRASILEIRO À LUZ DA


CURVA DE LAFFER.................................................................................................. 504
Sabrina Barbosa Paiva

APLICAÇÃO DA FÓRMULA DE LEARNED HAND NA VERIFICAÇÃO DE


EFICIÊNCIA ECONÔMICA DE PRECAUÇÃO NA ESFERA TRABALHISTA........ 506
Mariana Salles Andrade

8
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ANÁLISE ECONÔMICA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS HABITACIONAIS.................... 510


Artur Fleith Couto

INCENTIVOS FISCAIS À INOVAÇÃO NANOTECNOLÓGICA COMO INSTRUMENTO


AO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO SUSTENTÁVEL..................................... 512
Rudinei Jose Ortigara

O ACESSO SUSTENTÁVEL A ÁGUA EM PROL DA ECONOMIA................................. 520


Christina Wosch Brochonski
ANÁLISE ECONÔMICA DA LEI DO AUDIOVISUAL E DO FUNDO SETORIAL
DO AUDIOVISUAL NO ESTADO DA PARAÍBA..................................................... 524
Pablo Ruan Siqueira Lopes

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO PENAL E AS SANÇÕES PENAIS: É POSSÍVEL


UM PONTO ÓTIMO NA REPRIMENDA PENAL?.................................................. 528
Samuel Ebel Braga Ramos e Thômas Henrique de Souza Carvalho

9
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

A AVALIAÇÃO EX POST DAS POLÍTICAS


PÚBLICAS SOB UMA ANÁLISE ECONÔMICA
DO DIREITO ANTE A EDIÇÃO DA LINDB,
LEI DAS AGÊNCIAS REGULADORAS E LEI
DA LIBERDADE ECONÔMICA

Gilberto Bomfim1 e Renato Faria2

Resumo: A implementação de políticas públicas precisa


ser cada vez mais eficiente para conciliar a concretização
dos direitos sociais com a escassez de recursos orçamen-
tários. Nesse cenário, a avaliação da viabilidade da imple-
mentação de uma política pública deve começar por meio
da análise ex ante, a fim de verificar se ela responde a um
problema social ou econômico bem delimitado e perti-
nente. Conquanto seja requisito necessário, a análise ex
ante de uma política pública não se mostra suficiente. São
igualmente fundamentais o monitoramento e a avaliação
ex post da política pública de modo a verificar se o pro-
grama vem alcançando o objetivo almejado, aferir a sua
efetividade, constatar alterações necessárias e, até, reco-
nhecer a sua falibilidade. E uma análise da eficiência das
políticas públicas pode ser realizada pelo emprego efetivo
dos pressupostos das teorias econômicas para realizar a
interpretação do ordenamento jurídico em conformidade
com os postulados das escolhas racionais e da escassez
de recursos. Isso porque a grande dificuldade na imple-
mentação e avaliação de políticas públicas e leis em geral
é conseguir identificar se a intervenção provocou o efeito

1 Mestrando em Direito Econômico e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica do Pa-


raná (PUCPR). Procurador Federal. Membro da AGU/PGF/PF-PR. Email: g_bomfim@hotmail.com
2 Mestrando em Direito Econômico e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica do
Paraná (PUCPR). Promotor de Justiça. Membro do MPE/SC. Email: rmaiafaria@hotmail.com

10
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

desejado ou se esses efeitos não surgiram por força de


fatores externos. O problema que o artigo pretende apon-
tar é a necessidade de as políticas públicas serem ava-
liadas prévia, concomitante e posteriormente, sob a ótica
da análise econômica do direito. O objetivo do artigo é
demonstrar a obrigação de se ampliar e difundir a avalia-
ção ex post de políticas públicas a partir dos instrumentos
teóricos e empíricos da teoria econômica, com o objetivo
de proporcionar mais racionalidade a decisão política. A
metodologia utilizada será o método hipotético-dedutivo,
com uma abordagem qualitativa, buscando-se fomentar o
conhecimento dos instrumentos de regulação estatal como
ferramentas destinadas à implementação de políticas pú-
blicas. Ao final, pretende-se demonstrar que a análise ex
post é essencial para um adequado planejamento estatal
com base em um estudo de caso.
Palavras-chave: Políticas Públicas. Avaliação ex post. Aná-
lise Econômica do Direito. LINDB.

INTRODUÇÃO
Os meios adotados pelo Estado para a implementação
dos direitos dos cidadãos em busca dos objetivos funda-
mentais da República elencados no artigo 3ª da Constitui-
ção, de garantir o desenvolvimento, erradicar a pobreza e
reduzir as desigualdades sociais vêm sendo tema de deba-
te no Brasil, especialmente após as manifestações popula-
res que ocorrem por toda a América Latina.
As origens dos protestos verificados no Chile, Venezue-
la, Bolívia e Equador têm sido atribuída, essencialmente,
à incapacidade do sistema político-econômico em atender
a demandas sociais e executar medidas que promovam
desenvolvimento, mediante a implementação de políticas

11
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

públicas econômicas e sociais. Ocorre um questionamento


crescente sobre o tamanho e a eficiência do setor público.
Em que pese cada uma das manifestações na América La-
tina ter algumas características particulares, há um motivo
comum: trata-se da região de pior desempenho no mundo
em termos de desenvolvimento econômico.
As previsões econômicas do Fundo Monetário Interna-
cional indicam que a atividade econômica fraca no pri-
meiro semestre do ano de 2019 na América Latina reflete,
em grande parte, a elevada incerteza acerca das políticas
econômicas e sociais em algumas economias de grande
porte na região. Como se pode ver, é latente a necessida-
de de implementação de políticas públicas econômicas e
sociais eficientes com vistas a garantir o desenvolvimento,
a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades.
Contudo, há uma evidente escassez de recursos devido
ao baixo desempenho econômico dos países da América
Latina, entre eles o Brasil. Com efeito, a implementação
de políticas públicas precisa ser cada vez mais eficiente
para conciliar a concretização dos direitos sociais com a
escassez de recursos.
E uma análise da eficiência das políticas públicas pode
ser realizada pelo emprego efetivo dos pressupostos da
Análise Econômica do Direito – AED. De um modo ge-
ral, a AED utiliza-se das ferramentas próprias da economia
para realizar a interpretação do ordenamento jurídico em
conformidade com os postulados das escolhas racionais
e da escassez de recursos. Mostra-se, pois, uma maneira
efetiva de se compreender, no mundo dos fatos (ser), os
efeitos do ordenamento jurídico (dever ser), indicando as
consequências indesejáveis ou involuntárias que possam
ocorrer de cada decisão político e jurídica.

12
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Nessa toada, baseando-se no consequencialismo trazido


pela AED, a avaliação do impacto causado pela política pú-
blica e o monitoramento da eficiência no alcance dos obje-
tivos pretendidos pelo programa são fases imprescindíveis
para um planejamento estatal estável e eficiente. Conquanto
extremamente necessária, a avaliação ex ante de uma po-
lítica pública não se mostra suficiente. São igualmente fun-
damentais o monitoramento – controle concomitante – e a
avaliação ex post do impacto da política pública de modo a
verificar se o programa vem alcançando o objetivo almeja-
do, aferir a sua efetividade, constatar alterações necessárias
e, até, reconhecer a sua falibilidade.
O problema que o artigo pretende apontar é a necessi-
dade de as políticas públicas serem avaliadas prévia, con-
comitante e posteriormente, sob a ótica da análise eco-
nômica do direito. O objetivo do artigo é demonstrar a
obrigação de se ampliar e difundir a avaliação ex post de
políticas públicas a partir dos instrumentos teóricos e em-
píricos da teoria econômica, com o objetivo de proporcio-
nar mais racionalidade a decisão política
A metodologia utilizada será o método hipotético-dedu-
tivo, com uma abordagem qualitativa, buscando-se fomen-
tar o conhecimento dos instrumentos de regulação estatal
como ferramentas destinadas à implementação de políti-
cas públicas. No capítulo 1, será apresentada uma noção
de políticas públicas e sua forma de escolha pelo Poder
Público. No capítulo 2, serão analisados os fundamentos
que justificam a necessidade da avaliação de políticas pú-
blicas, especialmente a avaliação ex post, sob a ótica da
AED. No capítulo 3, será descortinado um caso em que
não foi feita a análise ex post e avaliada a efetividade da
política pública com base na AED.

13
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

POLÍTICAS PÚBLICAS E O
PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO
O estudo das políticas públicas como área do conhe-
cimento científico emergiu nos Estados Unidos com o
rompimento da tradição europeia que focava tão somente
no estudo do Estado e suas instituições e não nas ações
governamentais. Para Souza (2006, p.22) “O pressuposto
analítico que regeu a constituição e a consolidação dos es-
tudos sobre políticas públicas é o de que, em democracias
estáveis, aquilo que o governo faz ou deixa de fazer é pos-
sível de ser (a) formulado cientificamente e (b) analisado
por pesquisadores independentes”.
Uma das conceituações clássicas de políticas públicas é
a trazida por Harold D. Lasswell, no qual o autor estabe-
lece que a noção de políticas públicas advém da resposta
aos seguintes questionamentos: quem ganha o quê, por
quê e que diferença faz.
Na esteia desse pensamento, Souza (2006, p.25) resume
políticas públicas como “o campo do conhecimento que
busca, ao mesmo tempo, `colocar o governo em ação’ e/
ou analisar essa ação (variável independente) e, quando
necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas
ações (variável dependente)”.
De acordo com o Guia de Avaliação de Políticas Pú-
blicas da Presidência da República (BRASIL, 2018, p.14),
o termo “políticas públicas” é o “conjunto de programas
ou ações governamentais necessárias e suficientes, inte-
gradas e articuladas para a provisão de bens ou serviços à
sociedade, financiadas por recursos orçamentários ou por
benefícios de natureza tributária, creditícia e financeira”.
E a escolha política que decidirá o conjunto de progra-
mas ou ações que serão realizadas e colocarão o governo

14
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

em ação num dado momento político de um país podem


corresponder a uma política pública de Estado ou uma
política pública de governo.
Almeida (2016, s.p.) faz a distinção entre políticas de
Estado e de governo. Para o autor, políticas de Estado
seriam aquelas que envolvem diversas instituições e cuja
discussão passa por instâncias distantes de debate, envol-
vendo avaliações, análises de impacto, efeitos econômicos
ou orçamentários, bem como um cálculo de custo-benefí-
cio da política que se pretende implementar. As políticas
de governo são, por outro lado, aquelas determinadas de
maneira simplificada sobre a implementação de decisões
em resposta às demandas da agenda política. Essas deci-
sões podem até envolver escolhas complexas, “mas pode-
se dizer que o caminho entre a apresentação do problema
e a definição de uma política determinada (de governo)
é bem mais curto e simples, ficando geralmente no plano
administrativo” (ALMEIDA, 2016, s.p.).
Independentemente de ser uma política pública de
Estado ou governo, o fato é que o processo de tomada
de decisão pelo poder público para a implementação de
determinada política pública deve levar em consideração
uma análise do meio que será utilizado e seu impacto
social e econômico verificado com base no objetivo a ser
alcançado.
Sob uma perspectiva jurídica, o princípio da eficiência,
incluído na Constituição pela Emenda Constitucional 19,
de 1998, é o fundamento maior para a obrigatoriedade de
uma avaliação de impacto para a implementação, execu-
ção e manutenção de uma política pública. Isso porque,
evidentemente, uma análise de impacto pode aumentar a
eficiência dos recursos utilizados pelos gestores públicos,

15
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

reduzindo os riscos de uma tomada de decisão equivoca-


da, que poderia ser feita com base em informações super-
ficiais ou falsas.
Outros fundamentos jurídicos que podem ser invoca-
dos são o princípio da motivação constante do artigo 50
da Lei nº 9.784/1999 e a exigência de segurança jurídica
e eficiência na criação e na aplicação do direito público,
preconizada no artigo 1º da Lei nº 13.655/2018. Mais re-
centemente, em virtude da edição da Lei nº 13.848, de 25
de junho de 2019 (Lei Geral das Agências Reguladoras)
e da Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019 (Lei da
Liberdade Econômica) tornou-se ainda mais relevante a
ampla discussão acerca da Análise de Impacto aplicada às
políticas públicas.
Sob uma perspectiva lógica/fática, a análise de impacto
regulatório - AIR - “contribuiria para a redução do déficit
democrático, para a transparência, e facilitaria a respon-
sabilização”. Além dos evidentes benefícios vinculados à
publicidade, a “AIR serviria como subsídio para o proces-
so de tomada de decisão regulatória, permitiria o controle
político indireto e a concretização do planejamento eco-
nômico” (CARVALHO; CONDE, 2019, s.p.).
Sob uma perspectiva econômica, a avaliação de impacto
auxiliaria a escolher entre as alternativas possíveis a mais
eficiente para o aprimoramento das políticas públicas, “ao
assinalar as consequências involuntárias ou indesejáveis
das leis vigentes ou dos projetos de lei e propor reformas
práticas” (POSNER, 2010, p.8).
A OCDE assinala que o propósito da avaliação é deter-
minar a pertinência e alcance dos objetivos, a eficiência,
efetividade, impacto e sustentabilidade do desenvolvimen-
to. A avaliação deve proporcionar informação que seja

16
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

crível e útil para permitir a incorporação da experiência


adquirida no processo de tomada de decisão (TREVISAN;
VAN BELLEN, 2008, p.536). Assim, o correto direcionamen-
to da política pública, gerada a partir dessas informações,
permite que as decisões tomadas sejam mais eficientes.

A AVALIAÇÃO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS SOB A ÓTICA DA


ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO
A Análise Econômica do Direito (AED) não trata de um
objeto de estudo específico, mas de um método de inves-
tigação aplicado ao problema, qual seja, o método eco-
nômico. Na trilha desse entendimento clássico, a análise
econômica serve para compreender toda qualquer decisão
que verse sobre recursos escassos, baseando-se em duas
perguntas básicas: (i) quais as consequências de uma de-
terminada regra jurídica; e (ii) qual a regra jurídica que
deveria ser adotada para o caso (RIBEIRO, 2016, p.19-20).
A Análise Econômica do Direito parte da premissa de
que os agentes econômicos se comportam de forma ra-
cional, maximizando seus benefícios líquidos e utilizando
toda informação disponível em seu processo de tomada
de decisão, embora uma série de vieses cognitivos tem
sido apontada pela economia comportamental. Sob tal
perspectiva, a AED é um movimento que se filia ao con-
sequencialismo, isto é, as regras às quais nossa sociedade
se submete devem ser elaboradas, aplicadas e alteradas de
acordo com suas consequências no mundo real, e não por
julgamentos de valor desprovidos de fundamentos empíri-
cos (RIBEIRO, 2016, p.17-18).
Para Cardoso (2015, p.294), a análise consequencialista
do direito para a AED tem por objetivo alcançar soluções
eficientes na interpretação do direito, de modo que a apli-

17
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

cação das regras jurídicas esteja voltada para a máxima


satisfação ou bem-estar (utilidade) dos agentes ou indi-
víduos, gerando o menor custo na alocação de riquezas.
A inserção de um pensamento econômico a uma área
ampla como o direito tem por fim auxiliá-lo na sua própria
compreensão, dando e ele a fundamental (e tão neces-
sária) previsibilidade das relações postas (GONÇALVES,
2015, p.6). Nesse sentido, a abordagem da análise eco-
nômica propõe oferecer “um ponto de vista imparcial so-
bre temas jurídicos politicamente controversos” propondo
uma solução que favoreça apenas a eficiência (POSNER,
2010, p.11). Segundo Gico Jr. (2010, p.8), a AED é útil
ao propor “um instrumental teórico maduro que auxilia
a compreensão dos fatos sociais e, principalmente, como
os agentes sociais responderão a potenciais alterações em
suas estruturar de incentivos”.
Tendo como norte tais concepções teóricas, mostra-se
possível – e extremamente recomendável – utilizar-se da
análise econômica do direito para analisar proposições le-
gislativas e implementações de políticas públicas. Dito de
uma maneira mais pragmática, caso essas políticas aumen-
tem o bem-estar e promovam a eficiência, então deveriam
ser adotadas pelo governo.
Nesse contexto, a avaliação das políticas públicas surge
como pressuposto para a verificação do consequencialis-
mo. A elaboração, implementação e execução eficiente de
uma política pública, bem como sua eventual alteração
ou supressão, devem ser verificadas de acordo com suas
consequências empíricas no mundo real e não tão somen-
te com modelos teóricos e idealizados no seio do Poder
Legislativo, Executivo e até mesmo Judiciário.
Verificam-se, porém, na realidade pátria, sérias dificul-

18
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

dades na implementação efetiva desses instrumentos de


verificação concreta das políticas públicas. Para Trevisan e
van Bellen (2008, p.538) a escassez de análises é explica-
da tanto pela frágil institucionalização da área no Brasil (o
que faz com que a análise de políticas públicas continue
imersa nas questões analíticas tradicionalmente valoriza-
das pela ciência política), quanto pela “debilidade do cam-
po de estudos da administração pública no país”.
Todavia, a partir do advento da Lei 13.655/18 que in-
cluiu os artigos 20 a 30 na LINDB, é perceptível um movi-
mento legislativo expresso em direção ao consequencia-
lismo. Segundo o art.20 da LINDB, quaisquer decisões a
serem tomadas nas esferas judicial, administrativa e con-
troladora não serão tomadas apenas com base em valores
abstratos, sendo a análise de suas consequências práticas
requisito indispensável à sua validade. Alternativas devem
ser apresentadas e consideradas no momento da decisão,
cuja análise precisa, inclusive, fazer parte da sua motiva-
ção. Indo além sobre a necessidade de considerar o mun-
do fático nas decisões jurídicas, o artigo 22 exige que na
interpretação de normas sobre gestão pública sejam con-
siderados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e
as exigências das políticas públicas a seu cargo.
A exigência de análise de impacto das decisões gover-
namentais também foi tema da Lei das Agências Regula-
doras (Lei nº 13.848/2019). Alinhada com o que dispõe
a LINDB, determina a realização de Análise de Impacto
Regulatório (AIR) como condição precedente para adoção
ou alteração de atos normativos de interesse geral dos
agentes econômicos, consumidores ou usuários dos servi-
ços prestados (Atos de Interesse Geral).
Na mesma toada, o art. 5º da Lei da Liberdade Econô-

19
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

mica (Lei nº 13.874/2019) dispõe que a análise de impacto


regulatório deverá conter informações e dados sobre os
possíveis efeitos da norma proposta para verificar a razo-
abilidade do seu impacto econômico. Adotando premissas
da teoria econômica, a lei exige que as decisões governa-
mentais sejam avaliadas ex ante, concomitante e ex post,
tanto quantitativa quanto qualitativamente. A partir dessa
análise baseada em evidências empíricas, a norma fomen-
ta a adoção de critérios mais objetivos para que a modi-
ficação das normas seja ainda mais previsível e eficiente
(LALLO; VILA-NOVA, 2019, s.p.).
Como se nota, a análise do impacto da política pública
está no contexto de recentes alterações legislativas que
se preocupam com os efeitos concretos da regulação e
intervenção, o que é muito positivo quando se pretende
eficiência, uma vez que “é melhor atingir qualquer políti-
ca dado a um custo menor do que a um custo mais alto”
(COOTER; ULEN, 2010, p.26)
Importante frisar que a avaliação das políticas públi-
cas não tem o objetivo de substituir a decisão política do
governo, mas de subsidiar a fundamentação e orientar o
processo decisório com dados empíricos. Não obstante, a
análise também não pode ser encarada como apenas um
requisito formal do processo decisório, mas deve estrutu-
rar a tomada de decisão baseada em pesquisas e evidên-
cias, podendo demonstrar, inclusive, que a melhor opção
pode ser a não implementação do programa ou regula-
mentação e interferência.
De acordo com a Subchefia de Análise e Acompanha-
mento de Políticas Governamentais do governo federal, a
Análise de Impacto Regulatório pode ser definida como
um processo “sistemático de análise baseado em evidên-

20
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

cias, que busca avaliar, a partir da definição de um proble-


ma regulatório, os possíveis impactos das alternativas de
ação disponíveis para o alcance dos objetivos pretendidos,
tendo como finalidade orientar e subsidiar a tomada de
decisão” (BRASIL, 2017, s.p.).
A avaliação de políticas públicas, executada como um
processo sistemático, integrado e institucionalizado, tem
como premissa básica verificar a eficiência dos recursos
públicos e, quando necessário, identificar possibilidades
de aperfeiçoamento da ação estatal, com vistas à melhoria
dos processos, dos resultados e da gestão (BRASIL, 2018,
p.14). Possui, ao fim e ao cabo, o escopo magno de me-
lhorar a implementação das políticas públicas.
Ponderações qualificadas que produzam resultados
confiáveis possibilitam o aprimoramento de políticas e
justificam a alocação de recursos, já que evidenciam se os
resultados esperados estão sendo alcançados bem como
se os recursos estão sendo utilizados de modo eficiente.
Assim, no contexto das políticas públicas, essas análises
desempenham papel essencial na determinação e no al-
cance dos objetivos e das prioridades de governo.
A avaliação da viabilidade da implementação de uma
política pública deve começar por meio da análise ex ante
de seu impacto, a fim de verificar com fundamentos se
ela responde satisfatoriamente a um problema social ou
econômico bem delimitado e pertinente. Em função disso,
deve ser observado se há um objetivo claro de atuação do
Estado e se é proposto um desenho que possa ser alcan-
çado. É essencial que as políticas públicas contem com
essa análise ex ante de modo a racionalizar os recursos
públicos aplicados, bem como preservar o bem-estar da
sociedade. O fundamento da análise de impacto ex ante é

21
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

orientar a decisão para que ela recaia sobre a alternativa


mais efetiva, eficaz e eficiente.
Ocorre, contudo, que a análise de impacto não pode
se restringir à análise prévia. São iguais - ou ainda mais
fundamentais - o monitoramento e a avaliação ex post do
impacto da política pública de modo a verificar se o pro-
grama vem alcançando o objetivo almejado, aferir a sua
efetividade, constatar alterações necessárias e, até, reco-
nhecer a sua falibilidade.
O monitoramento é uma atividade realizada durante o
período de execução da política, para se identificar como
a intervenção evolui ao longo do tempo, por meio de da-
dos gerenciais do projeto sobre metas iniciais, indicadores
e resultados associados ao programa. Mostra-se necessário
para se dimensionar as metas de um projeto, os cami-
nhos que uma intervenção percorre e as métricas poten-
ciais para medir os efeitos na população-objetivo (RAMOS;
SCHABBACH, 2012, p.1.279). A avaliação e o monitora-
mento devem fazer parte, portanto, do desenvolvimento e
planejamento de uma intervenção desde o início.
Não obstante, na avaliação ex post o problema já está
evidenciado de maneira concreta, cabendo ao gestor ve-
rificar se o diagnóstico feito na avaliação ex ante estava
correto. A análise ex post necessita, pois, das informações
provenientes do monitoramento para, por meio da pon-
deração, realizar o julgamento que lhe cabe a respeito da
eficiência, eficácia e efetividade da política. Como se nota,
os estudos são complementares e indispensáveis para as-
segurar uma implementação bem-sucedida e a gestão res-
ponsável e transparente dos recursos públicos (THE GRE-
EN BOOK, 2018, p.58).
Com o objetivo de promover a análise de políticas pú-

22
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

blicas, o governo do Reino Unido publicou o Green Book,


guia de orientações sobre avaliação de políticas públicas.
O Green Book propõe que a avaliação das políticas públi-
cas deve ser dividida em 3 fases. A análise ex ante deve
reunir a base de evidências existente, identificar incertezas
(e assim, onde uma avaliação futura pode se concentrar)
e ajudar a reduzir o risco associado a uma intervenção an-
tes da implementação completa O monitoramento permite
que evidências emergentes informem ajustes contínuos à
intervenção e cientifiquem a implementação. Ele também
pode informar a entrega operacional subsequente. Por
fim, a análise ex post envolve uma avaliação do resultado
da intervenção e fornece uma avaliação sumária da apren-
dizagem adquirida ao longo de sua concepção e entrega
(THE GREEN BOOK, 2018, p.59).
De acordo com Tabak (2015, p.335) “a grande dificul-
dade na implementação e avaliação de políticas públicas e
leis em geral é conseguir identificar se a intervenção pro-
vocou o efeito desejado ou se esses efeitos não surgiram
por força de fatores externos, que fogem ao controle”. O
autor ainda cita o problema do viés de seleção: “aqueles
interessados em participar de uma política (sofrer inter-
venção) são mais motivados a participar do experimento
do que aqueles que não demonstraram esse interesse ini-
cialmente”. Daí a necessidade de se estabelecer uma polí-
tica de avaliação constante e institucionalizada.
Quando a avaliação se tornar um princípio geral do
ciclo da política para todos os tipos de intervenção estatal,
esta será inevitavelmente mais impositiva do que quan-
do se trata simplesmente de um instrumento de respon-
sabilização financeira limitado aos programas de despesas
(SMISMANS, 2017, p.14). Obviamente, não se deve olvi-

23
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

dar que a noção de sucesso ou fracasso de uma política


depende dos propósitos dessa política e das razões que
levaram o analista a avaliá-la.

CASO CONCRETO: INTERVENÇÃO ESTATAL QUE PROVO-


COU EFEITOS INDESEJADOS
O Município de Três Barras situa-se no estado de Santa
Catarina na região conhecida como o Planalto Norte. De
acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), no último senso, a população era de 18.129 habi-
tantes e, atualmente, está estimada em 19.275. A renda per
capita do município é de R$ 47.777,57 (quarenta e sete
mil, setecentos e setenta e sete reais e cinquenta e sete
centavos), ocupando o 333º lugar no ranking das maiores
rendas per capitas do Brasil e 19º no estado de Santa Ca-
tarina (IBGE, s.d).
Essa elevada renda por habitante decorre da existência
de diversas indústrias, mormente papeleiras. Não obstante
essa condição privilegiada de geração de riqueza, há diver-
sos problemas de distribuição de renda e grande parte dos
valores geradas no município não é reinvestida ne região.
Certo, porém, que parcela desses recursos ficam com
a Administração Pública municipal pelo recolhimento do
ISS, bem como pela participação do município no ICMS
gerado em seu território. Tal bonança tributária aliada aos
graves problemas de concentração de renda faz com que
a realidade local seja muito interessante para a análise das
políticas públicas.
Para fins desse artigo, optou-se por realizar um corte
epistemológico de modo a concentrar as atenções no Pro-
grama de Combate à Fome implementado pelo município,
tendo em conta o seu fácil enquadramento na noção de

24
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

política pública. Com efeito, constitui-se de um conjunto


ações governamentais, financiadas por recursos orçamen-
tários municipais, integradas e articuladas para a provisão
de bens (alimentos em forma de cesta básicas) à parcela
da sociedade três barrense com vistas a reduzir a fome e a
desigualdade social na região.
Inegável o amparo constitucional ao programa, princi-
palmente após a Emenda Constitucional nº 64/2010 que
incluiu o direito à alimentação como direito social a ser
velado pelo Estado, alterando o artigo 6º da Carta Magna.
Demais disso, o Texto Maior estabelece que o Estado De-
mocrático de Direito tem como fundamento a dignidade
da pessoa humana, bem como entre objetivos fundamen-
tais da República Federativa do Brasil. prevê a erradicação
da pobreza e da marginalização, bem como a redução das
desigualdades sociais e regionais (art. 3º, IV, CF/88).
Dessa forma, sob a perspectiva jurídica, uma avaliação
ex ante demonstra a pertinência do programa para as fi-
nalidades a que se destina. Ainda nesse estudo prévio, do
ponto de vista econômico, a eficiência do programa pa-
rece evidente porquanto a melhor distribuição de renda,
com a garantia de subsistência da população menos favo-
recida pelo recolhimento de tributos pelos contribuintes
mais abastados (sejam pessoas físicas ou jurídicas) parece
caminhar para uma solução economicamente viável.
Permanecendo no plano da análise prévia, as Leis Mu-
nicipais n° 1.777/95 e n° 2.247/02, estabelecerem uma
série de condicionantes para que os beneficiários sejam
comtemplados pela política pública de combate à fome.
Condicionantes estes que, inegavelmente, mostram-se de
elevada importância, tanto para o interesse público pri-
mário, quanto para o desenvolvimento social dos bene-

25
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ficiários. Entre os requisitos para o recebimento da ajuda


material do programa incluem-se: a) comprovação de ma-
trícula de todos os filhos em idade escolar e que apre-
sentam frequência mínima de 95% (noventa e cinco por
cento) dos dias letivos, além da obrigação mantê-los em
atividade no contraturno escolar em casa, evitando-se as-
sim que se transformem em “menores de rua”; b) apre-
sentação da caderneta de vacina dos filhos devidamente
em dia; c) apresentação atualizada por parte das mães de
comprovante do exame preventivo de câncer ginecológi-
co e de mama; d) implantação, com orientação de pessoal
técnico da Secretaria Municipal de Agricultura, de horta
caseira em cada residência beneficiada pelo programa; e)
realização de limpeza regular e mensal da área em frente
à residência; f) busca de tratamento adequado em caso
de verificação de embriaguez habitual em algum dos seus
membros da família beneficiada pela política pública; h)
tempo de residência mínima no município de três anos e
i) comprovação de renda familiar não superior a R$120,00
Do exposto, a análise ex ante parece indicar que a Po-
lítica Pública de Combate à fome instituída pelo Município
de Três Barras mostrava-se eficiente do ponto de vista eco-
nômico e justificável sob a perspectiva jurídica.
A realidade, contudo, apresentou-se de maneira com-
pletamente diversa. A ausência de monitoramento (con-
trole concomitante) e uma análise ex post evidenciam a
deficiência do programa que, apesar de bem-intenciona-
do e hipoteticamente eficiente, mostrou-se extremamente
contraproducente.
De proêmio, a ausência de uma fiscalização efetiva (mo-
nitoramento) do requisito de tempo de residência mínima
fez com que diversas famílias carentes migrassem para o

26
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

município. Sob o argumento humanitário e beneplácito


das autoridades constituídas, alguns integrantes da secre-
taria de assistência social passaram a garantir o benefício a
qualquer família que viesse a residir no município e apre-
sentasse vulnerabilidade social. A pobreza, portanto, au-
mentou ao invés de diminuir. A deficiência na verificação
sobre o requisito de renda familiar permitiu que muitos
utilizassem do programa como complementação de renda,
a ponto de vender os gêneros alimentícios que recebem.
Indo além, os requisitos da obrigatoriedade de matrícula
dos filhos, realização de horta familiar e limpeza regular
das casas e seus arredores não foram realizados e nem
exigidos, gerando uma cultura de comodismo e leniência3.
Nessa toada, o programa que, em sua essência deveria
ser temporário, tornou-se perene a ponto de estar em vi-
gor por mais de duas décadas, com o aumento contínuo e
vertiginoso dos seus beneficiados. Em 2002, segundo a Lei
2.247, o limite de beneficiados era 550 (quinhentas e cin-
quenta famílias), passando para 1.200 (um mil e duzentas)
no ano de 2012 (Lei 3012, de março de 2012). A simples
análise dessa evolução demonstra a falência e o caráter
assistencialista, e não desenvolvimentista, do programa.
Considerando-se o número médio de quatro integrantes
por família, no ano de 2012, poderiam ser beneficiados
pela Política Pública de combate à fome cerca de quatro
mil e oitocentas pessoas, representando 26,47% da popu-
lação três barrense.
O exemplo concreto demonstra que, apesar de hipotetica-
mente razoável e eficiente, a ausência de análise de impacto,
de monitoramento e análise ex post fere de morte o adequa-

3 Informações obtidas pelas oitivas realizadas no Inquérito Civil n 06.2019.00003967-0 que tramitou
na 3ª Promotoria de Justiça de Canoinhas.

27
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

do funcionamento de qualquer política pública. A presunção


de que os indivíduos agirão racionalmente – e de boa-fé- cor-
riqueiramente não se verifica e o enforcement decorrente de
uma análise posterior evidencia-se fundamental.
No caso em comento, os indivíduos que ultrapassaram a
barreira econômica para o recebimento das cestas básicas
simplesmente continuaram a postular a ajuda simplesmente
como forma de complementar a renda. Da mesma forma,
a ausência de fiscalização da implementação das hortas ca-
seiras não trouxe o desenvolvimento econômico e social à
família e a região, assim como a limpeza das vias públicas e
terrenos das residências não foi implementado, maculando
o interesse público e a proteção ao meio ambiente
Como se nota, o planejamento isolado mostra-se pouco
efetivo. O monitoramento e a análise ex post do impac-
to econômico das políticas públicas é um imperativo não
apenas de eficiência econômica, mas também de segurança
jurídica a fim de aliar o pressuposto econômico de escassez
de recursos aos objetivos da Constituição da República.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A evidente escassez de recursos orçamentários dispo-
níveis nos países em desenvolvimento, especialmente na
América Latina, para promover o desenvolvimento nacio-
nal, erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades, exige
uma implementação das políticas públicas cada vez mais
eficiente, com o intuito de conciliar a concretização dos
direitos sociais com essa limitação de recursos. O desafio
é dar maior efetividade aos recursos públicos, excluindo
gastos ineficientes ou improdutivos.
E baseando-se no consequencialismo trazido pela análi-
se econômica do direito, ratificado pela legislação recente

28
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

que prevê a análise de impacto sobre os possíveis efeitos da


decisão ou norma proposta para verificar sua razoabilidade,
e exige a avaliação de impacto regulatório para as inter-
venções estatais, tornou-se ainda mais relevante a ampla
discussão acerca da avaliação das políticas públicas e al-
guns instrumentos regulatórios que incluam monitoramen-
to, avaliação e cláusulas para revisões futuras, A avaliação
posterior foi estendida à ação regulatória e tornou-se uma
peça chave e prioritária para a administração pública.
A avaliação das políticas públicas certamente irá con-
tribuir para que seja alcançada a eficiência, estimulando
os setores sociais pretendidos, gerando empregos, cres-
cimento econômico e melhorando o ambiente social no
país. A motivação da decisão pela implementação da polí-
tica pública pode ficar mais evidente, trazendo benefícios
para reguladores e regulados, e podendo, ainda, auxiliar
eventual debate em sede judicial.
A avaliação ex ante das políticas públicas permite uma
análise do impacto que será causado pela implementação;
o monitoramento permitirá identificar problemas e falhas
durante a execução e possibilitará a correção dos rumos
ou ajustes na implementação; e a avaliação ex post permi-
tirá verificar se o objetivo almejado foi alcançado, aferir
a sua efetividade, constatar alterações necessárias e, até,
reconhecer a sua falibilidade.
As referências internacionais indicam que as avaliações
de políticas públicas devem ser executadas em caráter per-
manente e integradas ao ciclo de políticas públicas. Só com
a efetiva utilização dos resultados das avaliações na adoção
de medidas de melhoria na execução das políticas públicas
e no processo orçamentário e financeiro, que os princípios
de eficiência, efetividade e eficácia serão aplicados.

29
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

No Brasil a avaliação ex post tem sido primitivamente


utilizada nas decisões de natureza técnica, atraindo pouca
atenção política. Por meio da revisão bibliográfica e da
análise de caso concreto, este artigo pretendeu estimular
o desenvolvimento e a ampliação gradual e necessária da
avaliação ex post das políticas no âmbito nacional não com
a pretensão de esgotar o tema, mas com o objetivo de
conclamar o necessário debate.

REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Paulo Roberto. Sobre políticas de governo e políticas de Estado:
distinções necessárias. Instituto Millenium. Disponível em: <https://
www.institutomillenium.org.br/artigos/sobre-politicas-de-governo-e
-politicas-de-estado-distincoes-necessarias/ Acesso em: 20 nov. 2019.
BRASIL. Diretrizes Gerais da AIR, 2017. Disponível em: <file:///C:/
Users/Dell/Downloads/DIRETRIZES%20GERAIS%20AIR.pdf>.
Acesso em: 26 nov. 2019.
BRASIL. Ministério da Fazenda. Avaliação de Políticas Públicas:
Guia prático de análise ex post, volume 2/Casa Civil da Presidên-
cia da República. 2018. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/
portal/images/stories/PDFs/livros/livros/181218_avaliacao_de_po-
liticas_publicas_vol2_guia_expost.pdf>. Acesso em: 20 nov. 2019.
BRASIL. Ministério da Fazenda. Avaliação de Políticas Públicas:
Guia Prático de Análise Ex Ante. Volume 1/Casa Civil da Presidên-
cia da República. 2018. Disponível em: <https://www.cgu.gov.br/
Publicacoes/auditoria-e-fiscalizacao/arquivos/guia-analise-ex-ante.
pdf>. Acesso em 07 nov. 2019.
BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em di-
reito. In: Políticas públicas: reflexões sobre o conceito jurídico.
São Paulo: Saraiva, 2006, p. 1/49.
CARDOSO, Germano Bezzera. Análise econômica do direito, polí-
ticas públicas e consequências. Revista Jurídica da Presidên-
cia. Brasília v. 17 n. 112 Jun./Set. 2015 p. 293-313. Disponível em:
<https://revistajuridica.presidencia.gov.br/index.php/saj/article/
view/1115/1107>. Acesso em: 29 nov. 2019.

30
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

CARVALHO, Francisco. CONDE, Luiz Felipe. Análise de impacto re-


gulatório x MP da liberdade econômica x Lei geral das agên-
cias reguladoras. Disponível em: <https://www.migalhas.com.
br/dePeso/16,MI309359,41046-nalise+de+impacto+regulatorio+
x+MP+da+liberdade+economica+x+Lei>. Acesso em: 26 nov. 2019.
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Direito & Economia. 5ª ed. Porto
Alegre: Booman, 2010.
GICO JR., Ivo T. Metodologia e Epistemologia da Análise Econômica
do Direito. Economic analysis of law Review, v.1, n.1, p.7-33,
jan-jun/2010. Brasília: Universa. Disponível em: <https://revistas.
unifacs.br/index.php/redu/article/view/2794/2034>. Acesso em:
12 dez.2019.
GONÇALVES, Oksandro Osdival, SCHMIDT, Albano Francisco. Os
gastos do governo federal na área da educação entre 2009-
2014: uma análise econômica. XII Seminário Internacional de De-
mandas Sociais e Políticas Públicas na Sociedade Contemporânea.
CEPEJUR, 2015.
HOLMES, Stephen e SUNSTEIN, Cass R. O custo dos direitos. Por
que a liberdade depende dos impostos. Tradução Marcelo
Brandão Cipolla. São Paulo: WMF Martins Fontes, 1ª edição, 2019
LALLO, Fabio Di. VILA-NOVA, Daniel. Análise de impacto regulató-
rio na Lei da Liberdade Econômica. Revista Consultor Jurídico.
Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2019-set-03/opiniao
-impacto-regulatorio-lei-liberdade-economica?imprimir=1>. Acesso
em: 27 nov. 2019
POSNER, Richard. Fronteiras da Teoria do Direito. Tradução de
Evandro Ferreira e Silva, Jefferson Luiz Camargo, Paulo Salles e
Pedro SEtte-Câmara. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011.
RAMOS, M. P.; SCHABBACH, L. M. O estado da arte da avaliação de
políticas públicas: conceituação e exemplos de avaliação no Bra-
sil. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 46, n.
5, set./ out. 2012. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/
index.php/rap/article/view/7140/5692>. Acesso em: 29 nov. 2019.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é aná-
lise econômica do direito. Uma introdução. Belo Horizonte,
Fórum, 2016.184 p.
SMISMANS, Stijn. The Politicization of ex post Policy Evaluation in

31
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

the EU. European Journal of Law Reform 19 (1), pp. 74-96.


Ano: 2017. Disponível em: <https://orca.cf.ac.uk/100772/1/Evalua-
tion%20politicisation%20GREEN.pdf>. Acesso em: 29 nov. 2019.
SOUZA, Celina. Políticas públicas; uma revisão de literatura. Revista
Sociologia, Porto Alegre, ano 8, n. 16, jul-dez, 2006, p. 20-45. Dis-
ponível em: <http://www.scielo.br/pdf/soc/n16/a03n16>. Acesso
em: 29 nov. 2019.
TABAK, Benjamin Miranda. A Análise Econômica do Direito: Proposi-
ções legislativas e políticas públicas. Revista de Informação Legis-
lativa. Ano 52 Número 205 jan./mar. 2015. Disponível em: <https://
www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/509955/001035857.
pdf ?sequence=1&is Allowed=y. > Acesso em: 29 nov. 2019.
TREVISAN, A. P.; VAN BELLEN, H. M. Avaliação de políticas públicas:
uma revisão teórica de um campo em construção. Revista de Ad-
ministração Pública, Rio de Janeiro, v. 42, n. 3, p. 529-50, maio/
jun. 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rap/v42n3/
a05v42n3.pdf>. Acesso em: 29 nov.2019.
UNITED KINGDON. Her Majesty’s Treasury. The Green Book:
Central Government Guidance on Appraisal And Evaluation,
2018. Disponível em: <https://assets.publishing.service.gov.uk/go-
vernment/uploads/system/uploads/attachment_data/file/685903/
The_Green_Book.pdf >. Acesso em: 29 nov. 2019

32
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

UNIFORMIZAÇÃO JURISPRUDENCIAL E
RACIONALIDADE DO JULGADOR

Fernanda Huss Erzinger4 e Marcia Carla Pereira Ribeiro5

Resumo: O artigo, utilizando-se do método dedutivo e da


técnica bibliográfica, objetiva compreender, sob a justifica-
tiva da Economia Comportamental, a importância da utili-
zação dos mecanismos de uniformização de jurisprudência
pelo julgador ao proferir suas sentenças. Para tanto, descre-
ve as principais técnicas de consolidação jurisprudencial e
analisa o alto índice de decisões reformadas pelo Tribunal
Justiça do Estado do Paraná e pela Corte Superior. Discor-
re sobre a “Behavioral Economics”, seguimento da Análise
Econômica do Direito, concluindo, assim, que o magistrado
sofre influências externas e manifestações neurocognitivas
ao julgar, sendo que os métodos de padronização jurispru-
dencial se apresentam como ferramentas que garantem uma
tomada de decisão mais eficiente e racional.
Palavras-chave: Uniformização Jurisprudencial. Análise
Econômica do Direito. Economia Comportamental. Racio-
nalidade.

INTRODUÇÃO
Não é incomum na sociedade contemporânea observar
decisões judiciais totalmente diferentes, mas que versam
sobre a mesma questão de direito. Para tentar evitar tal
4 Mestranda em Direito no Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Direito da Pontifícia Uni-
versidade Católica do Paraná (PUC/PR). Especialista em Direito Contemporâneo com ênfase no
Novo Código de Processo Civil pela Universidade Cândido Mendes. Servidora pública no Tribunal
de Justiça do Estado do Paraná (TJ/PR).
5 Mestre e Doutora em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Professora titular do
Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR).
Professora Associada da Graduação e do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade
Federal do Paraná (UFPR). Advogada. Parecerista e Árbitra.

33
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

situação, o legislador criou mecanismos de uniformização


de jurisprudência, os quais foram amplamente descritos
na Lei 13.105, de 16 de março de 2015, conhecida como
Novo Código de Processo Civil Brasileiro (NCPC), e são de
observância obrigatória pelos juízes e tribunais.
O artigo procura entender, sob a justificativa da Eco-
nomia Comportamental, a importância da utilização dos
mecanismos de uniformização de jurisprudência pelo jul-
gador ao proferir suas decisões. Para tanto, descreve as
principais técnicas de consolidação jurisprudencial, essen-
ciais para a criação de um judiciário uníssono, coerente e
previsível, garantindo, desta forma, segurança jurídica e
igualdade aos jurisdicionados.
Em seguida, analisa-se o alto índice de decisões refor-
madas pelo Tribunal Justiça do Estado do Paraná, bem
como o número de acórdãos proferidos pela referida Cor-
te também modificados nos Tribunais Superiores.
Após, utilizando-se do método dedutivo e da técnica
bibliográfica, busca-se compreender, a partir do viés da
Behavioral, ramo da Análise Econômica do Direito, por
quais razões os mecanismos de estabilização se fazem ne-
cessários para a criação de decisões coesas e homogêneas.
Assim, percebe-se que o julgador, além de ser limitada-
mente racional, é influenciado por razões externas e ma-
nifestações neurocognitivas, como vieses e heurísticas, o
que pode desencadear decisum antagônico e destoante.

TÉCNICAS DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA


DO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO (À LUZ DO CÓDIGO
DE PROCESSO CIVIL DE 2015)
A falta de uniformidade nas decisões judiciais sobre
assuntos jurídicos semelhantes infringe dois direitos fun-

34
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

damentais previstos no art. 5º da Constituição Federal: a


segurança (jurídica) e a igualdade, considerados também,
no preâmbulo da Carta Magna, como valores supremos da
sociedade (BRASIL, 1988).
Na esfera judicial, o valor da segurança jurídica deve ser
garantido por meio da coerência e homogeneidade das de-
cisões do magistrado, seja na primeira, segunda instância ou
nos tribunais superiores. Contudo, não é incomum que haja,
em uma mesma base normativa, variadas interpretações, ge-
rando posicionamentos antagônicos e contraditórios.
Ademais, o pronunciamento de decisões opostas aos
jurisdicionados constitui afronta ao princípio da igualdade,
pois estes, diante de relações jurídicas semelhantes, espe-
ram receber soluções idênticas.
Quando o julgador não cumpre o dever de uniformiza-
ção da jurisprudência, contribui para a desestabilização do
sistema jurídico e para o aumento da insegurança jurídica,
o que é nocivo ao Direito, além de causar enorme preju-
ízo aos sistemas econômico, social e político (MARINONI,
2015, p. 148).
Visando a reverter esse contexto, uma das característi-
cas mais marcantes trazida pela Lei 13.105, de 16 de março
de 2015, Novo Código de Processo Civil (NCPC/2015), foi
a ampliação da força da jurisprudência para o deslinde das
demandas (BRASIL, 2015).
Uma das principais inovações do NCPC é a posição de
destaque que recebe o tratamento dado aos precedentes
judiciais e ao incidente de resolução de demandas repe-
titivas (IRDR), com a finalidade de garantir a igualdade e
segurança jurídicas e reduzir as decisões diferentes aplica-
das a casos similares.
O art. 926 da lei processual impõe, expressamente, o de-

35
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ver aos Tribunais de uniformizar sua jurisprudência, manten-


do-a “estável, integra e coerente” (BRASIL, 2015). Isso por-
que mostra-se inadmissível uma Corte de Justiça reconhecer
como possível e concomitantemente mais de um posiciona-
mento sobre matéria idêntica. Os tribunais são integrados por
diversos órgãos fracionários como Câmaras, Turmas, Órgãos
Especiais, dentre outros, mas, apesar das divisões funcionais,
são apenas uma única instituição judicante e, assim, devem
atuar em sua unidade a fim de adotarem apenas uma orien-
tação sobre questões jurídicas similares.
O art. 926, § 1º, do NCPC, determina a edição pelos
Tribunais de enunciados sumulares equivalentes à sua ju-
risprudência dominante, com o objetivo de a orientação
firmada ser seguida pelos seus próprios órgãos internos
e para que os demais juízes também observem o enten-
dimento ali consagrado. Busca-se, com a utilização das
súmulas, a supressão de divergências a fim de se alcançar
a uniformização da jurisprudência, a qual deverá observar
as circunstâncias fáticas (e não abstratas) que motivaram
a sua criação (§ 2º) (BRASIL, 2015). Neste sentido, Misael
Montenegro Filho (2018, p. 794) preleciona:
A melhor forma de manter a jurisprudência estável, ín-
tegra e coerente é através da aprovação de súmulas, que
retratam a consolidação do entendimento do tribunal a
respeito de matérias reiteradamente discutidas, que fo-
ram pacificadas em termos de julgamento, pelo menos de
modo predominante.
As súmulas aprovadas pelos tribunais não têm efeito vin-
culante, mas servem como orientação para os demais órgãos
que integram o Poder Judiciário, com a intenção de que
os julgamentos sejam democráticos, uniformes e justos. A
Emenda Constitucional n° 45, de 30 de dezembro de 2004,

36
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

conferiu efeito vinculante apenas ao Supremo Tribunal Fede-


ral, cujo posicionamento adotado acerca da matéria constitu-
cional vinculará os órgãos do Poder judiciário e da Adminis-
tração Pública de todas as esferas (BRASIL, 2004), desde que
aprovado nos termos do art. 103-A da Carta Constitucional
(BRASIL, 1988).
Nos moldes do art. 927, II e IV, do NCPC, os juízes e tri-
bunais, além de observarem as súmulas vinculantes, devem
também seguir os enunciados sumulares do Supremo Tribu-
nal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribu-
nal de Justiça em matéria infraconstitucional (BRASIL, 2015).
Conforme entende a doutrina amplamente majoritária (THE-
ODORO JR.; NUNES; BAHIA; PEDRON, 2015, p. 348), o refe-
rido dispositivo consagrou efeito obrigatório aos precedentes
e enunciados sumulares previstos em seus incisos. Tal nor-
ma, em prol da uniformidade, deve ser tomada no sentido de
todas as súmulas dos Tribunais Superiores serem dotadas de
eficácia imperativa, sejam elas súmulas vinculantes ou não.
Além de súmulas, o NCPC menciona a jurisprudência e o
precedente (BRASIL, 2015). Jurisprudência é um conjunto de
decisões judiciais, proferidas pelos Tribunais, sobre uma deter-
minada matéria, em um mesmo sentido. Precedente, por sua
vez, é um pronunciamento judicial, proferido em um processo
anterior, que é empregado como base da formação de outra
decisão judicial, prolatada em processo posterior (CÂMARA,
2018, p. 419-420). Apesar de haver uma diferença quantitati-
va fundamental entre ambos, pois apenas um precedente já é
o suficiente para fundamentar a decisão do processo julgado
posteriormente, enquanto a utilização de jurisprudência como
razão de decidir exige do julgador a indicação de vários julga-
dos no mesmo sentido, ambos são vistos como instrumentos
de uniformização (CIMARDI, 2015, p. 90-91).

37
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Há, ainda, dois mecanismos voltados a evitar a disper-


são jurisprudencial, são os denominados incidente de as-
sunção de competência (IAC) e incidente de resolução de
demandadas repetitivas (IRDR).
O IAC não é um instituto inédito criado pelo Proces-
so Civil brasileiro, sendo apenas tratado com maior es-
pecificidade no Código vigente. Tal método processual,
já conhecido nos procedimentos dos Tribunais Superiores
(Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça),
agora se estendeu para todos os Tribunais.
O incidente previsto no art. 947 do NCPC tem como
objetivo fazer com que o colegiado do Tribunal assuma
o julgamento, quando há riscos de divergência entre os
órgãos internos da mesma corte em torno de questões de
direito com repercussão social que ultrapassa o interesse
individual das partes, de causa que normalmente seria de
competência de órgão fracionário menor do tribunal, des-
de que não haja múltiplos processos a respeito (BRASIL,
2015). Luiz Fernando Valladão Nogueira (2017, p. 171) sin-
tetiza a intenção do criador da norma:
A ideia do legislador foi a de, diante do surgimento de
relevante questão de direito com intenso alcance social,
permitir que o Judiciário já se previna e profira decisão mais
amadurecida. Isso porque, (...) a deliberação por colegiado
mais amplo, trata mais credibilidade ao que restar decidido.
Já o incidente de resolução de demandadas repetitivas
(IRDR), autorizado pelo art. 976 do NCPC, é um instru-
mento processual destinado a produzir eficácia pacifica-
dora de múltiplos litígios, mediante estabelecimento de
tese aplicável a todas as causas que versem sobre a mesma
questão de direito (BRASIL, 2015).
O IRDR pretende evitar o desencontro de decisões no

38
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

julgamento de causas repetidas, unificando o entendimen-


to jurisprudencial entre os pretórios nacionais (Tribunais
Nacionais, Tribunais de Justiça, Tribunais Regionais) para
que o direito seja interpretado de uma só forma em todo o
território nacional, além de implantar uniformidade de tra-
tamento judicial a todos os possíveis litigantes colocados
em situação igual àquela disputada no caso padrão.
Por fim, magistrados e tribunais também devem con-
siderar os acórdãos em julgamentos de recursos espe-
ciais e extraordinários repetitivos (art. 927, inciso III, do
CPC/2015). Lembrando que tais recursos (especial e ex-
traordinário) são técnicas de uniformização, sendo que o
especial trata da interpretação de textos legais federais e
o extraordinário, de questões constitucionais (art. 1.029 e
seguintes do NCPC) (BRASIL, 2015).
Os mecanismos de uniformização são necessários e
ditos essenciais ao se examinar o índice sentenças e/ou
acórdãos reformados pela respectiva hierarquia superior.

ÍNDICE DE DECISÕES REFORMADAS PELO TRIBUNAL DE


JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ E DE ACÓRDÃO
PROFERIDOS POR ESTA CORTE MODIFICADOS NOS
TRIBUNAIS SUPERIORES (STF OU STJ) NO ANO DE 2011
Os julgadores, ao proferirem suas sentenças, devem fa-
zê-lo observando o ordenamento jurídico pátrio, garan-
tindo, assim, coerência, uniformidade e previsibilidade ao
jurisdicionado. Contudo, o índice de modificações de de-
cisões na segunda instância e pelos Tribunais superiores
é alarmante.
Ao analisar os dados divulgados pelo Conselho Nacio-
nal de Justiça (CNJ, 2011) no ano de 2012, referente ao pe-
ríodo de 2011, é possível verificar o grau de recorribilida-

39
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

de externa de 1º e 2º graus, bem como o índice de reforma


de tais decisões pelos respectivos níveis. Ressalta-se que,
apesar de existirem relatórios mais recentes, o de 2012 foi
o último a abranger tais aspectos.
Em relação à Justiça Estadual, especificamente quanto
ao Estado do Paraná, é possível aferir que de mais de
1.000.000 (um milhão) de decisões proferidas pelos magis-
trados estaduais passíveis de recurso externo, 65.329 (ses-
senta e cinco mil, trezentos e vinte e nove) foram objeto
de recurso, ou seja, mais de 6% (seis por cento).
No ano de 2011, dos 39.426 (trinta e nova mil quatrocen-
tos e vinte e seis) recursos de apelação recebidos pelo TJPR,
14.939 (quatorze mil novecentos e trinta e nove) foram pro-
vidos, ainda que parcialmente. No tocante aos agravos de
instrumento, dos 41.232 (quarenta e um mil duzentos e trin-
ta e dois), cerca de 15.000 (quinze mil) foram aceitos. Por-
tanto, 36,6% (mais de trinta e seis por cento) das decisões
proferidas pelo juiz singular foram reformadas pela referida
Corte de Justiça, seja total ou parcialmente.
Adiante, 81.614 (oitenta e um mil seiscentos e quatorze)
acórdãos foram publicados no 2º grau pelo TJPR nesse
período-base, sendo que quase 25.000 (vinte e cinco mil)
pleitos, após irresignação, foram remetidos aos Tribunais
Superiores, ou seja, mais de 30% (trinta por cento) foram
objeto de recurso.
Dos aproximados 10.000 (dez mil) recursos julgados
pelo STF ou STJ em 2011 tendo como juízo a quo o TJPR,
1.642 (mil seiscentos e quarenta e dois) foram providos
pelo STF ou STJ, ainda que parcialmente, isto é, em torno
de 17% (dezessete por cento).
Acredita-se que as decisões devem ser precisas e coe-
rentes, de forma a que seja prestigiada a previsibilidade,

40
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

o que pressupõe a observância ao ordenamento jurídico


pátrio e aos entendimentos dos Tribunais, sejam eles de
segunda instância ou superiores.
Contudo, como será visto, a racionalidade do julgador
é sujeita a limitações, da mesma forma como ocorre com
outros agentes em suas tomadas de decisão. A limitação
da racionalidade decorre, dentre outros elementos da in-
capacidade de processamento de toda a informação dis-
ponível, assim como das influências por fatores externos e
manifestações neurocognitivas.
Assim, considerando tais premissas e visando a minimi-
zar o número de reformas das decisões do juiz ou tribunal
pela instância subsequente, os métodos de uniformização
são a melhor alternativa para o incremento de um judici-
ário uníssono.

O COMPORTAMENTO E A RACIONALIDADE (LIMITADA)


DO JULGADOR: UM OLHAR SOB A ÓTICA DA ANÁLISE
ECONÔMICA DO DIREITO
Apesar de o Direito e a Economia terem objetivos di-
ferentes, podem ser vistos como um todo indiviso, como
propõe a Análise Econômica do Direito (AED). O primei-
ro, com foco na justiça, procura regular as ações huma-
nas. A Economia, por sua vez, enfatiza a racionalidade
dos agentes, estuda como o homem se comporta e toma
decisões (GICO JR., 2011, p. 17).
O pressuposto principal da teoria econômica em rela-
ção à lei é a racionalidade. “Quais leis serão aprovadas,
como elas serão interpretadas e postas em prática, no fim
das contas, depende de qual comportamento será do inte-
resse racional dos formuladores e aplicadores do direito”
(BITTENCOURT, 2011, p. 28).

41
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Sabe-se, contudo, que em uma sociedade nem todos os


indivíduos agem no exercício de suas racionalidades. Mes-
mo assim, tais sujeitos procuram escolher, embora de ma-
neira imperfeita, a melhor forma de atingir determinado
objetivo. Assim, “a racionalidade pode ser um pressuposto
tido como pessimista quando aplicada às pessoas que su-
postamente agem segundo o interesse de terceiros, como
juízes ou legisladores.” Isso porque estes podem, como
também ocorre com outros agentes, “sacrificar racional-
mente os interesses que supostamente servem, como a
justiça e bem público, em favor de seus próprios interes-
ses privados”, o que, por óbvio, é o oposto da eficiência,
do senso de justiça e da própria segurança jurídica (BIT-
TENCOURT, 2011, p. 29).
O agente pode sofrer a interferência de vários fatores
que prejudicam a sua racionalidade, a exemplo de prazeres,
ideias, objetivos indiretos, ou seja, fazendo surgir as “falhas
de racionalidade.” A racionalidade humana é limitada.
A análise original com ênfase na limitação da racionali-
dade é atribuída ao economista estadunidense Herbert A.
Simon, na 2ª edição de sua obra “Administrative Behavior”,
no ano de 1957. Isso porque, como comentado, o ser hu-
mano é incapaz de processar toda a informação disponível
sobre determinado assunto, pois “a mente humana é vista
como um recurso escasso, já que o indivíduo não tem
condições de buscar todas as informações possíveis sobre
as decisões tomadas em seu dia a dia” (RIBEIRO, 2011,
p. 67). Ademais, tais falhas podem ser provocadas pelas
características inerentes ao próprio humano, a exemplo de
sentimentos, os quais podem afetar o pensamento racio-
nal e influenciar nas escolhas. Para Oliver E. Williamson
(1973, p. 317), “bounded rationality refers to rate and sto-

42
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

rage limits on the capacities of individuals to receive, store,


retrieve, and process information without error.”
A Economia Comportamental, também conhecida como
Behaviorismo, é um seguimento da Análise Econômica do
Direito. Surgiu em meados de 1970, após aprofundadas
pesquisas feitas por Amos Tversky e Daniel Kahneman
– ganhadores do Nobel da Economia no ano de 2002 –,
os quais criaram a chamada Teoria da Prospecção, fun-
dando a “Behavioral Economics.” Segundo os comporta-
mentalistas, as pessoas nem sempre escolhem o que é
melhor para si, pois podem falhar durante o processo de-
cisional, influenciados por razões externas ou de natureza
psicológica. Refuta, portanto, vários pressupostos acerca
da racionalidade considerados pela teoria neoclássica, es-
pecificamente pela Teoria da Racionalidade Econômica, a
qual entendia que, no momento da escolha, os agentes re-
velavam suas preferências e, de forma simplificada, “pre-
ferem o que escolhem”, sem ser necessário considerar as
motivações humanas subjacentes às escolhas, afastando-se
da Psicologia e, por consequência, impulsionando a mate-
matização da Economia (MURAMATSU, 2009, p. 70). Para
os Neoclássicos, essa preferência revelada no momento da
escolha se assenta em bases consistentes e estáveis, mes-
mo ao longo do tempo.
Segundo o pensamento econômico ortodoxo, confor-
me explica Cássio Cavalli (2013, p. 153) “todos os indiví-
duos atuam com base em uma hierperracionalidade, que
lhes outorga o nível máximo de informação (...) e realizam
escolhas racionalmente com o objetivo de maximizar o
seu bem-estar.” Em termos práticos, aplicando-se ao juiz,
este teria as perfeitas condições para decidir e escolher,
proferindo sempre a melhor sentença.

43
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Também Douglass North, embora inicialmente ligado


ao pensamento liberal neoclássico, rejeitou um dos seus
principais postulados – a racionalidade plena dos agentes
econômicos –, podendo ser considerado um dos funda-
dores da Nova Economia Institucional (NEI). O econo-
mista procurou criar um quadro analítico para entender
a mudança econômica, a partir da remodelação da teoria
neoclássica, modificando o pressuposto da racionalidade
e acrescentando a dimensão do tempo:
É necessário desfazer o pressuposto de racionalidade
subjacente à teoria econômica para podermos abordar de
forma construtiva a natureza da aprendizagem humana. A
história demonstra que as ideias, as ideologias, os mitos,
os dogmas e os preconceitos são pontos importantes, e
uma compreensão da forma como evoluem é necessária
para avançar no desenvolvimento de uma estrutura para
compreender as mudanças sociais. A estrutura da escolha
racional assume que os indivíduos sabem o que lhes be-
neficia e agem em conformidade com esse conhecimento.
Isso (...) é patentemente falso quando (os indivíduos) fa-
zem escolhas em condições de incerteza. (NORTH, 2010,
p. 19 e 20).
De forma semelhante, a Economia Comportamental su-
perou pensamentos estáticos. Toma as pessoas como li-
mitadamente racionais, ou seja, diante de um quadro de
incertezas ou de informações incompletas, os seres huma-
nos apresentam uma série de reações que não podem ser
consideradas plenamente racionais. As escolhas, portanto,
estão limitadas a fatores que bloqueiam a opção ótima. As-
sim, decisões nem sempre são ótimas, pois estão sujeitas a
distorções do julgamento (vieses) e atalhos mentais simpló-
rios que apresentam respostas, mesmo diante de problemas

44
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

complexos, “singelas e automatizadas”, nem sempre corre-


tas (heurísticas) (RIBEIRO; DOMINGUES, 2018, p. 462).
Desta forma, as manifestações neurocognitivas - como
heurísticas e vieses - podem alterar comportamentos deci-
sórios, podendo também atingir o magistrado, conduzin-
do-o a erros sistemáticos.
Um dos maiores riscos está na adoção dos atalhos men-
tais. Nas palavras do precursor da Economia Comportamen-
tal, Daniel Kahneman (2012, p. 127), “heurística é um proce-
dimento simples que ajuda a encontrar respostas adequadas,
ainda que geralmente imperfeitas, para perguntas difíceis.”
Tversky e Kahneman (1974) destacam a heurística da
representatividade, da disponibilidade e da ancoragem.
Enquanto na primeira o agente toma suas decisões com
base na semelhança com que as informações vêm à men-
te, na segunda considera a facilidade com fundamento na
frequência dos dados. Quanto à última, diz respeito à ten-
dência de modificar o julgamento inicial de forma que este
se ajuste às novas informações.
Como a racionalidade do homem é limitada, a utilização
de tais atalhos mentais pode ocasionar vieses, ou seja, dis-
torções no raciocínio, a exemplo da autoconfiança excessiva,
do otimismo exagerado, da insistência em manter o status
quo, o que impede uma tomada de decisão ótima. Como
explica Victor Hugo Domingues (2016, p. 50), “nossa disposi-
ção de manter o status quo (inertia), o sentimento de apego
e posse (endowment effect), o equívoco no julgamento sobre
os efeitos ao longo do tempo (hyperbolic discount), nossa
insistência em escolhas ruins (sunk cost) etc., são manifesta-
ções neurocognitivas que podem ser estimuladas ou evitadas
de acordo com os incentivos aos quais somos expostos.”
Sabendo que as escolhas nem sempre são sensatas e

45
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

­ odem ser, inclusive, desastrosas, os legisladores, a exem-


p
plo da Lei nº 13.105/2015 (NCPC), incentivam a criação de
mecanismos de uniformização da jurisprudência, a exemplo
das súmulas, dos incidentes, precedentes e de decisões vin-
culativas como forma de evitar, informar e corrigir compor-
tamentos indesejados por parte dos julgadores. Desta forma,
o juiz tende a decidir de forma mais eficiente, com maior
disponibilidade de informações, estando menos suscetíveis
às armadilhas mentais influenciadas por vieses e heurísticas.
A somar, a unificação interpretativa confere homogenei-
dade e previsibilidade ao sistema, garantindo segurança
jurídica. Escolhas menos eivadas de vícios farão com que
deixem de existir decisões conflitantes sobre um mesmo
tema, garantindo, além disso, maior previsibilidade sobre
os entendimentos proferidos pelos membros do Poder Ju-
diciário. Para Lucas Buril de Macêdo (2015, p. 88), defende
a utilização de precedentes. Para ele, “a argumentação por
precedentes está presente não só no direito, mas também
em qualquer parcela da vida em que seja necessária a jus-
tificação de decisões de uma forma racional”.
Logo, a análise econômica comportamental unida ao Di-
reito “visa diminuir a assimetria de informação para que o
indivíduo tome a decisão de forma menos enviesada” (RI-
BEIRO; DOMINGUES, 2018, p. 465). Assim sendo, quando
o magistrado proferir a sua sentença, desde que bem infor-
mado e amparado pelas técnicas de uniformização, estará
prezando e garantindo a segurança jurídica e isonomia.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Economia Comportamental, também conhecida como
Behaviorismo, é um ramo da Análise Econômica do Di-
reito e teve como precursores Amos Tversky e Daniel

46
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Kahneman. Tais comportamentalistas aperfeiçoaram e re-


formularam alguns pressupostos acerca da racionalidade
considerados escorreitos pela teoria neoclássica. Para o
pensamento econômico ortodoxo não era necessário con-
siderar as motivações humanas subjacentes às escolhas,
pois as pessoas são racionais e sempre optam pela melhor
alternativa. Já para a “Behavioral Economics” os sujeitos
nem sempre preferem o que é melhor para si, pois são li-
mitadamente racionais e podem falhar durante o processo
decisional, influenciados por razões externas ou de natu-
reza psicológica, como vieses (distorções do julgamento)
e heurísiticas (atalhos mentais simplórios).
Portanto, inúmeros fatores podem alterar comporta-
mentos dos agentes, inclusive do magistrado, estimulando
-o a proferir decisões contraditórias e instáveis.
Os mecanismos de uniformização de jurisprudência,
como súmulas, precedentes, incidentes e outras estraté-
gias que vinculem o juiz a decidir de maneira predisposta
podem atenuar os efeitos das distorções.
Assim, as técnicas de estabilização jurisprudencial reco-
nhecem os limites da racionalidade dos julgadores e podem
conduzi-los à tomada de decisões mais estáveis e coerentes,
contribuindo para o estabelecimento de um ambiente de
segurança jurídica e isonomia aos jurisdicionados.

REFERÊNCIAS
BITTENCOURT, Maurício Vaz Lobo. Princípio da Eficiência. In: RIBEIRO,
Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é Análise Eco-
nômica do Direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de
outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em:
06 ago. 2019.

47
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

______. Emenda Constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004. Di-


ário Oficial, Brasília, 2004. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc45.htm>. Acesso
em: 06 ago. 2019.
______. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Diário Oficial, Brasí-
lia, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 06 ago. 2019.
CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. 4.
ed. São Paulo: Atlas, 2018.
CAMBI, Eduardo; FOGAÇA, Mateus Vargas. Sistema dos precedentes
obrigatórios no novo Código de processo civil. In: DIDIER JÚ-
NIOR, Fredie; et al. (Coord.). Precedentes. Salvador: Juspodium,
2015.
CAVALLI, Cássio. Estruturas e Funções Econômicas da Empresa. In:
______. Empresa, Direito e Economia. Rio de Janeiro: Forense,
2013.
CIMARDI, Claudia Aparecida. A Jurisprudência uniforme e os pre-
cedentes no novo Código de Processo Civil brasileiro. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Justiça em Números
2011 – Justiça Estadual. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/
wp-content/uploads/2011/02/rel_completo_estadual.pdf> Acesso
em: 06 ago. 2019.
DOMINGUES, Victor Hugo. Vieses e Heurísticas. In: RIBEIRO, Marcia
Carla Pereira; ______; KLEIN, Vinicius (Coords.). Análise Econô-
mica do Direito: Justiça e Desenvolvimento. Curitiba: CRV, 2016.
GICO JR., Ivo T.. Introdução à Análise Econômica do Direito. In: RI-
BEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é
Análise Econômica do Direito: uma introdução. Belo Horizonte:
Fórum, 2011.
KAHNEMAN, Daniel. Rápido e Devagar: duas formas de pensar. Rio
de Janeiro: Objetiva, 2012.
MACÊDO, Lucas Buril de. Precedentes Judiciais e o Direito Proces-
sual Civil. Salvador: Editora Juspodivm, 2015.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO,
Daniel. Novo Curso de Processo Civil: teoria do processo civil.
Vol. 1. São Paulo: RT, 2015.

48
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

MONTENEGRO FILHO, Misael. Novo Código de Processo Civil Co-


mentado. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2018.
MURAMATSU, Roberta. The death and resurrection of ‘economics with
psychology’: remarks from a methodological standpoint. Revista
de Economia Política, São Paulo, v. 29, n. 1, p. 62-81, jan./mar.
2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rep/v29n1/04.
pdf>. Acesso em: 06 ago. 2019.
NOGUEIRA, Luiz Fernando Valladão. Recursos e Procedimentos
nos Tribunais: no Novo Código de Processo Civil. 3 ed. Belo
Horizonte: D’Palácio, 2017.
NORTH, Douglass C. Desempenho econômico através do tempo.
Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 255, p.
13-30, set. 2010. Disponível em: <https://pdfs.semanticscholar.or-
g/2cbb/69e9650f888a491d2a4e8231928a375b70ae.pdf>. Aceso em:
02 ago. 2019.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; DOMINGUES, Victor Hugo. Economia
Comportamental e Direito: a racionalidade em mudança. Revista
Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 8, n. 2, p. 457-472,
ago. 2018. Disponível em: <https://www.publicacoesacademicas.
uniceub.br/RBPP/article/view/5218/3760>. Acesso em 02 ago. 2019.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Racionalidade Limitada. In: ______;
KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é Análise Econômica do Direi-
to: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
THEODORO JR., Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre Melo
Franco; PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC: fundamentos e sis-
tematização. Rio de Janeiro: Forense, 2015.
TVERSKY, Amos; KAHNEMAN, Daniel. Judgment under Uncertain-
ty: Heuristics and Biases. Science, v. 185, n. 4157, p. 1124–1131,
set. 1974. Disponível em: <http://www.its.caltech.edu/~camerer/
Ec101/JudgementUncertainty.pdf>. Acesso em: 03 ago. 2019.
WILLIAMSON, Oliver E. Markets and Hierarchies: Some Elementary
Considerations. American Economic Association, v. 63, n. 2,
p. 316-325, 1973. Disponível em: <https://pdfs.semanticscholar.or-
g/51e0/624399096cb1bbf76f358f1fc790b274d4cd.pdf>. Acesso em:
01 ago. 2019.

49
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

A RECUPERAÇÃO DE EMPRESA:
RACIONALIDADE ECONÔMICA DOS AGENTES
OU BENESSE DO ESTADO?

Felipe de Poli de Siqueira6 e Francieli Micheletto7

Resumo: A recuperação de empresas, oportunizada pela


Lei n. 11.101/2005, está à disposição dos agentes econô-
micos, credores e devedor, como implementação dos inte-
resses coletivos da sociedade. O Estado, como interventor
e dinamizador da economia, criou com a lei de recupera-
ção de empresas uma racionalidade econômica, propondo
um conjunto de regras que estimulam a preservação das
empresas economicamente viáveis, bem como a maximi-
zação e a eficiência do processo recuperatório. E, apesar
dos incentivos legais, os agentes econômicos tendem a agir
em causa própria e prejudicar os anseios da coletividade.
Neste aspecto, acaba-se por entrar em choque a racionali-
dade dos agentes econômicos e os benefícios trazidos pelo
Estado para oportunizar o desenvolvimento econômico e
sustentável. Portanto, este artigo é uma tentativa de trazer
aos leitores quais são as principais aspirações do Estado
quanto à recuperação do empresário em dificuldade e tratar
da racionalidade dos agentes no ambiente de insolvência,
expondo, ao final, quais seriam as principais formas de di-
minuir este choque de interesses, a fim de evitar prejuízos e
custos transacionais maiores dos que os já evidentes.
Palavras-chave: Recuperação de Empresas; Racionalida-
de Econômica; Política Econômica; Intervenção do Estado.
6 Doutorando e Mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento (linha de pesquisa: Estado, Eco-
nomia e Desenvolvimento) pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUC/PR. Especialista
em Direito Civil e Empresarial e em Direito e Processo Tributário Empresarial pela PUC/PR
7 Especialista em Direito Civil e Processo Civil pelo Centro Universitário Curitiba/PR (UNICURITI-
BA). Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Curitiba/PR (UNICURITIBA).

50
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

INTRODUÇÃO
O individualismo e a procura pela maximização do au-
to-interesse são manifestações triviais dos agentes econômi-
cos8, ainda mais quando expostos ao ambiente de crise fi-
nanceira da atividade empresarial em que estão vinculados.
Para a desenvoltura da recuperação de empresas, es-
tabelecida pela Lei n. 11.101/2005, o legislador se propôs
a criar uma racionalidade econômica aos procedimentos
recuperatórios, propósito, inclusive de política econômica
do Estado.
A lei de recuperação dá aos agentes a capacidade de
realizar acordos e manter a continuação da atividade do
empresário em crise temporária. E, ainda, diante de um
quadro duvidoso e de assimetria de informações, princi-
palmente pela aprovação ou não do plano de recuperação
oferecido pelo devedor, as incertezas dos agentes são mi-
nimizadas pela lei, eis que é motivada a possibilidade de
barganha e negociação entre as partes.
Todavia, apesar da racionalidade da lei, conjugando
elementos de valor, utilidade e eficiência no direto em-
presarial9, os agentes econômicos envolvidos (credores
e devedores) também são dotados de racionalidade, cuja
manifestação limitada pelo meio, tende a ser maliciosa,
oportunista e, em certa medida, até gananciosa. Os indiví-
duos são determinados pelo interesse próprio, colimando
contra a coletividade e o bem-estar social de todos.
Ainda que superável o quadro financeiro da empresa
no ambiente de aprovação do plano de recuperação, a
pressão de alguns credores, economicamente mais forte
8 Sobre os métodos de como o comportamento racional é caracterizado na teoria econômica tradi-
cional ver SEN (1999. p.26-44).
9 A respeito da aplicação da ciência econômica ao direito empresarial e da Análise Econômica do
Direito, um movimento interdisciplinar e dinâmico que traz para o sistema jurídico as influências
da ciência econômica ver RIBEIRO e GALESKI JUNIOR (2009).

51
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

que outros, traduz as estratégias e escolhas falimentares


por eles traçadas, o que em grande parte atira a empresa
economicamente viável para a medida mais drástica que é
falência do empresário.
Não obstante isso, a legislação, ainda que racional,
criou critérios de aprovação para o plano de recuperação
em que os credores, colocados em classe, podem divergir
seus interesses, incrementado a rejeição do processo de
recuperação tendo em vista a heterogeneidade do grupo
de credores.
Assim sendo, o trabalho está divido da seguinte forma:
o segundo capítulo traça alguns pontos relevantes da recu-
peração de empresa na Lei n. 11.101/2005. Os benefícios
do Estado e sua política econômica de proteção e manu-
tenção da atividade econômica viável são apresentados
no capítulo terceiro. No quarto capítulo são apresentados
os agentes econômicos como indivíduos racionais e limi-
tados pelo ambiente da recuperação de empresa, assim
como suas atitudes oportunistas. Em seguida, no capítulo
cinco, é apresentada a deficiência da lei de recuperação
no que se refere aos critérios adotados de classificação
dos credores e seu direito de voto na aprovação do plano
de recuperação. Enfim, no sexto e último capítulo, são
apresentadas as considerações finais sobre o conflito exis-
tente entre os benefícios do Estado e da Lei n. 11.101/2005
trazidos à recuperação de empresas e à racionalidade dos
agentes econômicos.

A recuperação de empresa segundo a ordem


jurídica brasileira
A Lei n. 11.101/2005 possibilita a recuperação do em-
presário e da sociedade empresária através da via extraju-

52
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

dicial e judicial10, na qual se viabiliza a superação da crise


econômico-financeira do devedor, permitindo a manuten-
ção da fonte produtora, a circulação de bens e serviços,
do emprego dos trabalhadores, das receitas fiscais e dos
interesses dos credores, promovendo, assim, a preserva-
ção da empresa, sua função social e o estímulo à atividade
econômica (Lei n. 11.101/2005, art. 47).
Nas palavras de LisboA (2005, p. 43) “O instituto da re-
cuperação está baseado na constatação de que a reorgani-
zação eficaz dos negócios de uma empresa em dificuldade
representa uma das principais formas de maximização do
valor dos ativos e de proteção aos credores”.
O objetivo da lei é dar às empresas uma nova chance
de continuar suas atividades no mercado, mas desde que
sua manutenção seja economicamente viável (PINHEIRO;
SADDI, 2005, p. 207). Portanto, propiciam-se com a recu-
peração menores perdas de bem-estar social.
A forma extrajudicial de recuperação é um acordo ho-
mologado judicialmente e celebrado entre o devedor e os
seus credores sujeitos ao plano. Note-se que são preser-
vados da recuperação extrajudicial os titulares de créditos
de natureza tributária, derivados da legislação do trabalho
ou decorrentes de acidente do trabalho, de alienação fidu-
ciária, de arrendamento mercantil, de contratos de com-
pra e venda de imóvel com cláusula de irrevogabilidade
ou irretratabilidade e com reserva de domínio e de con-
tratos de câmbio de adiantamento ao exportador (Lei n.
11.101/2005, art. 161, § 1º).11
10 Sobre o procedimento da recuperação ver COELHO (2013) e BEZERRA FILHO (2008).
11 Sobre a exclusão de alguns crédito na recuperação extrajudicial, PINHEIRO e SADDI (2005, p.
210) expõe que a questão é “[...] polêmica e de muitas críticas. De um lado, alguns argumentam
que houve a descaracterização do instituto, cujo objetivo seria reunir todos os credores. De outro,
há os que defendem a necessidade de certeza na recuperação de crédito. De toda a sorte, o fato é
que os créditos com garantias reais terão prioridade sobre os tributários na falência, poderão não
se submeter à recuperação judicial e estão excluídos da recuperação extrajudicial.”.

53
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Para os casos mais complexos e abrangentes, em que


seja necessário o envolvimento de todos os credores, a
forma judicial da recuperação pode ser utilizada para a su-
peração da crise do empresário. O desígnio da recupera-
ção judicial é permitir a reestruturação por meios dos me-
canismos exemplificados no art. 51 da Lei n. 11.101/2005,
como a prorrogação de prazos e novas condições de pa-
gamento dos credores.
A recuperação judicial consiste na apresentação do pla-
no de reestruturação da empresa pelo devedor, no qual
será demonstrada a viabilidade econômica da empresa,
pelos documentos contábeis, e serão estabelecidos os
meios utilizados para o pagamento dos credores. Cumpri-
das as formalidades legais, o juiz suspenderá as ações e
execuções12 pelo prazo de 180 dias (também denominado
de stay period), o que dará tempo para a organização e
negociação do plano de recuperação com os credores.
Havendo ou não objeção de algum credor ao plano apre-
sentado, o juiz convocará a assembléia geral de credores,
cuja responsabilidade será de deliberar e aprovar o plano
de recuperação (PINHEIRO; SADDI, 2005, p. 210-211).
Assim sendo, a lei de recuperação de empresas visa es-
tabelecer um aparato normativo para a economia de mer-
cado, principalmente criando um equilíbrio entre credores
e devedores. Pretende-se, com isso, retirar do mercado as
empresas ineficientes, realocar os ativos dos menos para
os mais competentes empresários e criar um sistema de
incentivos para as partes envolvidas na crise empresarial
(PINHEIRO; SADDI, 2005, p. 221).
A partir de um sistema que aumenta a eficiência das re-
12 As execuções de natureza fiscal não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial,
ressalvada a concessão de parcelamento nos termos do Código Tributário Nacional e da legislação
ordinária específica (Lei n. 11.101/2005, art. 6º, § 7º).

54
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

lações comerciais e de trocas, estimula-se o investimento,


o crédito e o emprego. Porquanto, os dispositivos legais
possibilitam a negociação entre credores e devedores, via-
bilizando a continuidade do negócio da empresa enquan-
to unidade produtiva.

Os benefícios do Estado para a recuperação


de empresas
A forma como o Estado intervém na economia é deter-
minante para a atividade empresarial, tanto é que a produ-
ção legislativa pelo Congresso Nacional, pode em certos
momentos aumentar e em outros diminuir o mercado de
crédito e o mercado de juros.
Assim sendo, dependendo da natureza da legislação fa-
limentar, as estratégias serão diferentes entre os agentes.
Quando a lei privilegia o devedor, isto pode resultar em ine-
ficiência econômica, implicando na perda de valor e bem
-estar, além de piorar a situação de crédito na economia, na
medida em que aumenta o risco dos negócios e diminui a
perspectiva de recuperação dos empréstimos. Em contrapar-
tida, se a lei tender em demasia aos credores, o afastamento
dos empresários a tomar medidas de risco e, por isso, inves-
timentos altos será latente (LISBOA, 2005, p. 32).
Note-se que a lei pró-devedor pode fazer com que se
mantenham em funcionamento empresas inviáveis ou en-
tão legitimando a quebra de contratos, o rompimento do
direito de propriedade, gerando impactos negativos so-
bre o desenvolvimento econômico e social.13 Ao contrário,
em caso de amparo excessivo ao credor sobre o devedor,
mormente o insolvente temporariamente, este pode ser
aniquilado, sem qualquer previsibilidade de reorganização
13 Sobre o assunto ver BECK e LEVINE (2004).

55
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

e retomada dos lucros. Ora, evidencia-se o ganho pessoal


e individual dos agentes em detrimento da coletividade
em termos de renda e emprego.
Fundamentalmente, é necessário que haja um equilí-
brio entre incentivar o devedor a buscar recursos e tomar
riscos e estimular o credor a emprestar nas quantidades e
condições próprias de um mercado.14 É preciso a criação
de um ambiente formal de negociação e de cooperação,
impulsionando os credores e o devedor para uma solução
eficiente, principalmente quanto vivedoura a possibilidade
de recuperar a empresa em crise.
A figura estatal, neste aspecto, é evidenciada quando
invocada a função social e econômica da atividade em-
presarial15, eis que sob seu argumento pode proteger a
superação da crise do empresário. FrontinI (1974. p. 250),
quando trata da preservação da empresa16 que exerce ati-
vidade de destaque na sociedade, relata:
Ora, é justamente a expressão sócio-econômica de certas
empresas que imprimindo-lhes verdadeiro caráter público ou
de interesse público, justifica a continuação de suas ativida-

14 “A evidência empírica indica que a boa proteção legal aos credores leva a juros mais baixos e a
um mercado de crédito mais ativo. Há estudos que mostram, por exemplo, que a taxa de juros é
mais alta nos estados norte-americanos cuja legislação oferece mais proteção aos devedores e que,
nos estados brasileiros em que o Judiciário funciona melhor, a razão entre crédito e PIB é maior, o
que se observa igualmente na comparação entre países. Também há indicações de que o fato da
Lei de Falência norte-americana favorecer os acionistas em relação aos credores, comparado com
o que se observa na Europa, ajuda a explicar porque nos Estados Unidos os spreads de risco são
mais altos que na Europa.” (PINHEIRO; SADDI, 2005, p. 201).
15 “[...] a função social da empresa encontra-se indissociável de sua função econômica, i.e., de seu
papel como agente central do desenvolvimento econômico de uma nação que tenha adotado
o regime capitalista, pautado na livre iniciativa e na propriedade privada. Por conseguinte, por
função sócio-econômica pode-se entender como a adequação do exercício da empresa ao valor
social da livre iniciativa (art. 1°, IV, C.F.), sem que disso resulte qualquer prejuízo à eficiência
econômica, pressuposto para sua continuidade no âmbito das relações patrimoniais privadas. Em
suma, consiste na busca ética do lucro, à vista de princípios constitucionais (art. 1°, IV, c/c art. 170,
C.F.) e deveres de conduta que se projetam na comunhão de stakeholders [interessados diretos e
indiretos na atividade empresarial].” (MENEZES, 2013, n. p).
16 Em suma, o artigo enaltece a medida de desapropriação dos bens da Massa Falida da Sanderson
do Brasil S/A pelo Estado de São Paulo, declarando-os de interesse social, preservando, então, a
continuação das atividades de produtos cítricos na região do interior de São Paulo.

56
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

des. Chega-se, por via deste raciocínio, ao cerne da moderna


teoria da empresa, que reconhece suas responsabilidades e
deveres perante a coletividade e como que a emancipa de
seus proprietários, dissociando a empresa do empresário.
Continua Frontini (1974. p. 249), tratando da interven-
ção econômica do estado, expondo:
[...] que a intervenção estatal se faz para recompor o
complexo industrial - ou seja, para reativar o estabeleci-
mento - e não para elidir ou cessar a falência, resta disto
deduzir que o desejo governamental voltou-se, nuclear-
mente, para o interesse social econômico da coletividade,
e não para atender as reclames de credores, pois continu-
arão praticamente com a mesma garantia anterior.
O objetivo econômico do Estado é justamente garantir
o cumprimento das obrigações e o recebimento de suas
receitas. Por sua vez, a política econômica17 de preserva-
ção da empresa, diante do quadro de dificuldade econô-
mico-financeira, prescinde de uma ordem legal que crie
interesse aos agentes econômicos envolvidos.18

A racionalidade econômica dos agentes19


No que se refere à recuperação de empresas, outrora a
legislação era mais propícia ao devedor, como ocorria na
concordata20, contudo, hodiernamente, pode-se dizer que é

17 Dentre as espécies fundamentais de atuação do Estado na esfera econômica do Brasil, encontra-se a Política
econômica que como expõe Emerson Gabardo: “A política econômica equivale ao planejamento (artigo
174 da CF/88) e pode ser realizada mediante normas configuradoras de instrumentos diretos de controle
(fixação de salários, racionamento, tabelamento de preços) e diretos de adaptação institucional (legislação
de efeitos concretos, criação de órgãos), além dos indiretos (de finanças, monetários, creditícios, cambiais).”
(GABARDO, 2009. p. 130). Ainda, sobre política econômica vide NUSDEO (2010, p. 171-186).
18 Para que o mercado de crédito funcione com eficiência é necessário que as leis e o Poder Judiciário,
através de seus tribunais, possibilitem a rápida e segura execução de garantias. Notadamente, a moro-
sidade da justiça tem sido um vilão nas execuções de créditos no Brasil. Sobre o assunto ver PINHEIRO
e SADDI (2005, p. 205).
19 Para o presente trabalho, o agente econômico é aquela pessoa que toma decisões econômicas.
20 Segundo LISBOA (2005, p. 46) “Um dos principais problemas da concordata era o fato de ela ser
solicitada pelo devedor e deferida pelo Juiz, sem qualquer consulta aos credores. A ausência de

57
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

mais favorável aos credores, porque teoricamente abre maio-


res possibilidades de diálogo entre as partes envolvidas.
Neste sentido, a Lei n. 11.101/2005 se propôs a trazer
mecanismos de eficiência, limitando os prejuízos gerais
e particulares através da aproximação dos credores com
o devedor, desenvolvendo condições que permitam uma
recuperação efetiva da empresa viável.
A conduta e a expectativa dos agentes, em especial dos
credores, são fatores fundamentais para que o processo de
recuperação seja eficiente. Mas isso nem sempre é possí-
vel. Na recuperação de empresa o principal incentivo aos
agentes é o valor total obtido ou perdido com a negociação
dos créditos com o devedor. Porém, a Lei n. 11.101/2005
não possibilita a distribuição igualitária dos riscos entre os
credores, e também não consegue compatibilizar os inte-
resses em conflito, uma vez que estes são condicionados
pelos direitos de propriedade, informações privadas deti-
das pelas partes, poder de negociação, proibições legais e
limitações cognitivas dos agentes (SILVA, 2009, p. 35).
Assim sendo, parte-se da idéia de que os agentes são
racionais e oportunistas, em geral individualistas e moti-
vados pelo auto-interesse, em detrimento da coletividade.
Note-se que se no processo de recuperação cada um dos
agentes lutar individualmente para reduzir suas perdas,
vão acabar prejudicando o interesse coletivo.
A racionalidade é, pois, a faculdade de raciocinar, é a
razão coerente entre o fim desejado e a forma de alcan-
çá-lo. Dentre as formas de racionalidade21, para a ciência
meios de participação dos credores no processo impedida a criação de um ambiente de coopera-
ção entre as partes. Sem qualquer mecanismo de coordenação formal, com regras claras e previa-
mente definidas, estimulava-se cada credor a agir isoladamente para maximizar seus interesses, o
que acabava abortando quaisquer perspectiva de soerguimento da empresa.”.
21 De acordo com PINHEIRO e SADDI (2005, p. 168), “Na filosofia, existem três formas de racionali-
dade, segundo Max Weber e Habermas: racionalidade cognitiva (ciência), a racionalidade estética
(arte) e a racionalidade moral (moral e direito).”.

58
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

econômica a Racionalidade Cognitiva traz que o agente


decide de acordo com suas preferências. Então, parte-se
do pressuposto de que o agente tem total consciência das
alternativas disponíveis e expectativa sobre o incerto.
Não obstante, a racionalidade dos agentes é limitada22,
sobretudo no ambiente de insolvência do devedor, onde
suas escolhas, adotadas a partir de suas preferências, são
restritas quanto à possibilidade de avaliar com precisão a
crise da empresa e sua superação.
A racionalidade limitada diminui o conhecimento do
agente nas interações com os demais, sendo que corres-
ponde ao que é pretendido pelo agente, mas está limitada
por diversos fatores.23
Igualmente, há que considerar o oportunismo dos credo-
res, no qual os agentes agem em busca do interesse próprio,
com o uso de meios ardilosos, enganando, dissimulando ou
confundindo outra pessoa, como é o caso da “chantagem”
de alguns credores para aprovação do plano de recupera-
ção24 (PINHEIRO; SADDI, 2005, p. 218) ou realização do
ativo do devedor, como explica Sztajn (2005. p. 65-66):
Se compete aos credores analisar, aprovar ou rejeitar o
plano de recuperação apresentado pelo devedor, se de-
vem manifestar-se sobre formas de realização do ativo,
se qualquer mudança ou fato que incida sobre seus in-
teresses depende de aprovação, não estranha supor que
aqueles credores melhor informados sobre os efeitos de
cada uma das matérias tenderão a apresentar argumentos
favoráveis às suas posições – o que levará à sua dominân-
22 Em sentido contrário, tem-se como racionalidade plena aquela dotada de informações completas,
onde os agentes tomam escolhas por si mesmos, de forma eficiente, esgotando todos os fluxos de
incerteza e agindo com extrema consciência. Ainda, esclarece SILVA (2009, p. 35) que a “Raciona-
lidade plena decorre da noção de utilidade: o nível de satisfação que a pessoa tem ao consumir
determinado bem ou exercer certa atividade.”.
23 Quanto a racionalidade limitada e a abordagem do processo de decisão ver SIMON (1982).
24 Sobre a aprovação do plano de recuperação em assembleia ver COELHO (2009) e MACHADO (2007).

59
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

cia sobre os demais, suas estratégias serão mais eficazes.


E, exatamente porque têm informações de melhor quali-
dade, ou são mais hábeis no seu manejo, podem se apro-
veitar disso para agir de forma oportunista; seu domínio
sobre a atividade, operações econômicas, administração
de negócios, por exemplo, lhes permite extrair ganhos ou
vantagens; outros credores os obterão mediante ameaças,
provavelmente críveis, de recusar a aprovação do plano,
do que resultaria a decretação da falência.
Portanto, como os agentes econômicos, credor e deve-
dor, orientam suas ações com parâmetros de racionalidade
limitada e oportunismo, eles agem em um ambiente de
incerteza e buscam maximizar resultados usando os meios
que dispõem, que são claramente limitados pelas infor-
mações e dependentes das decisões dos demais agentes.
Note-se que no cenário da recuperação de empresas, de
modo inclusivo na sua aprovação, os agentes econômicos
não conhecem os riscos das decisões que tomam.
Desse modo, segundo SilvA (2009, p. 37), “Os agentes
comportam-se de acordo com a ‘motivação’ e a ‘habilida-
de em decifrar o ambiente’”. E, utilizando-se da teoria das
instituições25, a qual se preocupa com as regras do jogo,
explica o autor (SILVA, 2009, p. 37):
A “motivação” indica o conjunto de condições que
compele o indivíduo a agir, influenciado por fatores eco-
nômicos e altruísticos que podem ser inconsistentes com
premissas racionais de maximização de bem-estar. A “ha-
bilidade em decifrar o ambiente” é a capacidade do in-
divíduo em entender o contexto situacional em que se
encontra, dadas as informações disponíveis.
A “motivação” do agente é influenciada pela reputação,
25 Sobre o tema ver NORTH (2002).

60
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

confiança e aspectos altruísticos que podem ser decisivos


em certas situações. A “habilidade em decifrar o ambiente”
justifica a existência de instituições que estruturam as tro-
cas econômicas e reduzem incertezas. O processamento
incompleto e subjetivo da informação desempenha papel
relevante no processo decisório, pois há lacunas entre a
capacidade do agente para decifrar problemas e a dificul-
dade em determinar preferências. Quanto maior a lacuna,
maior a necessidade de padronização de respostas para
lidar com as incertezas que se originam da informação
incompleta, da complexidade dos problemas e da capaci-
dade limitada dos indivíduos em resolvê-los. Regras e pro-
cedimentos existem para simplificar o processo, limitando
o conjunto de escolhas possíveis. Estas podem, ou não,
coincidir com a maximização do bem-estar geral.
No processo de recuperação de empresas, a “motivação
dos agentes” depende da reputação das partes, do valor
da empresa, da duração do processo recuperatório e das
condições dos mercados. Ao passo que a “habilidade em
decifrar o ambiente” alude na capacidade de revelar ou
omitir informações, monitorar e controlar o andamento do
processo, influenciar outros agentes e obter garantias para
os créditos (SILVA, 2009, p. 37-38).
O procedimento de insolvência do devedor é carac-
terizado por informações assimétricas, imperfeitas e in-
completas e poder de negociação diferenciado entre os
credores, custos positivos e negativos de transação e pro-
babilidade de atitudes oportunistas dos agentes na defe-
sa de seus próprios interesses. Ressalte-se, ao mais, que
algumas classes de credores detêm maior capacidade de
obtenção de informações e proteção contra riscos, como
é o caso dos credores com garantia real, o que acarreta

61
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

comportamentos distintos daqueles com menor capacida-


de de defender seus próprios interesses, na hipótese dos
credores trabalhistas.
Por fim, na existência de informações assimétricas, há
possibilidades de que empresas eficientes e viáveis eco-
nomicamente, mas em momentos de crise, sejam levadas
à falência, e por este erro resultarem em externalidades
negativas, motivando ineficiências de mercado e custos
àqueles que não tiveram participação nas decisões.26

Homogeneidade e heterogeneidade de interesses


Estabelecidos em classes pela Lei n. 11.101/200527, os
credores quase sempre são grupos heterogêneos, nos
quais os interesses divergem e, por isso, não tomam deci-
sões que maximizam os ganhos da coletividade. Há que
se frisar, ainda, que os próprios critérios estabelecidos em
lei para a constituição das assembléias de credores podem
levar à formação de grupos com preferências antagônicas.
A lei distribuiu na mesma classe credora indivíduos com
interesses diversos, como é o caso dos credores quirografá-
rios e dos titulares de privilégio, que deveriam ser separados
ou agrupados com aqueles cujas intenções são convergentes.
Note-se que o objetivo da divisão destes credores é im-
pedir distorções na formação da vontade da comunhão,
mas a reunião numa mesma classe de credores com inte-
resses divergentes representa a negatividade desse objetivo.
Os credores quirografários têm interesses contrários

26 Sobre as falhas de mercado ver NUSDEO (2010, p. 138-170).


27 De acordo com o artigo 41 da Lei n. 11.101/2005, a assembléia-geral será composta pelas seguin-
tes classes de credores: i. titulares de créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes
de acidentes de trabalho; ii. titulares de créditos com garantia real; iii. titulares de créditos quiro-
grafários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados; e iv. titulares de créditos
enquadrados como microempresa ou empresa de pequeno porte (esta última incluída pela Lei
Complementar n. 147/ 2014).

62
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

aos dos titulares de privilégio, especial ou geral. Estes


últimos tendem a ser menos receptivos às propostas de
alteração, novação ou renegociação de seus créditos no
âmbito da recuperação judicial, pois gozam de prefe-
rência na falência, já os quirografários são mais male-
áveis com as propostas, uma vez que em situação de
falência dificilmente receberão seus créditos (COELHO,
2009, p. 150-151).
Por conseguinte, se viabilizada a união de preferências
numa mesma classe creditícia, cada agente, agindo de for-
ma particular e maximizadora, estará agindo também em
benefício alheio. Caso contrário, a maximização coletiva
pode ser negada parcialmente ou totalmente (BARROSSI
FILHO, 2005, p. 234).
Certamente, caso não haja consenso algum entre credo-
res da mesma classe, ou seja, heterogeneidade absoluta,
em que os agentes econômicos possuem estratégias pura-
mente individuais, não haverá possibilidade de aprovação
do plano de recuperação e, consequentemente, a recupe-
ração do empresário. Este fato, como dito anteriormente,
poderá trazer prejuízos aos demais envolvidos, especial-
mente no caso de uma crise temporária do empresário,
que pode se reestruturar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Estado brasileiro colocou à disposição dos empre-
sários em dificuldade econômico-financeira uma possi-
bilidade de se reerguerem no mercado, ampliou o diá-
logo entre os devedores e os credores, e alavancou um
ambiente econômico, com maior segurança jurídica e
destinado à preservação da produção, do emprego e
do crédito.

63
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

São notórios os avanços trazidos pela Lei n. 11.101/2005,


impactando o funcionamento da economia e a dando âni-
mos aos processos falimentares, exprimidos em processos
mais eficazes e úteis, o que tem o condão de fomentar o
mercado de crédito em particular. Trata-se da busca pelo
desenvolvimento sustentável28.
Adotando os critérios de racionalidade econômica, as
normas da lei de recuperação trouxeram o estímulo para a
preservação das empresas economicamente viáveis, impli-
cando em ganhos para o bem-estar da sociedade.
Ainda assim, há que se observar a forma de organiza-
ção dos agentes econômicos. Os credores economicamen-
te mais fortes são intangíveis e despreocupados com os
credores menores, geralmente em maior número. É nesse
ponto e em inúmeros outros que a lei falha, pois deixa
nas mãos de alguns poucos credores a “oportunidade” de
aceitar ou rejeitar o plano de recuperação de empresa.
Como visto anteriormente, os credores são propen-
sos a pensar somente no seu direito de crédito, assim
como o valor e a forma de seu pagamento. E quanto
a este aspecto, a lei não se manifesta em favor do in-
teresse coletivo, pelo contrário estabelece ainda uma
forma de votação quase unânime e de difícil verifica-
ção, mediante critérios de maioria absoluta quantitativa
e qualitativa.
Outro aspecto de relevância é a falta de informações
28 “Do ponto de vista econômico, desenvolvimento é, basicamente, aumento do fluxo real, isto é,
incremento da quantidade de bens e serviços, por unidade de tempo, à disposição de determinada
coletividade.” (FURTADO, 2009, p. 105). Segundo DERANI (2008, p. 155) “[...], o desenvolvimento
é sustentável quando satisfaz as necessidades presentes sem comprometer a habilidade das futuras
gerações em satisfazer suas próprias necessidades”. Sintetiza assim a autora (DERANI, 2008, p.
155), sobre a ótica do direito do desenvolvimento sustentável, que “[...] este direito pode ser com-
preendido como um conjunto de instrumentos ‘preventivos’, ferramentas de que se deve lançar
mão para conformar, constituir, estruturar políticas, que teriam como cerne práticas econômicas,
científicas, educacionais, conservacionistas, voltadas à realização do bem-estar generalizado de
toda uma sociedade.”.

64
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

e o desconhecimento dos riscos das decisões a serem to-


madas pelos agentes. Ora, estabelecem-se critérios de efi-
ciência na lei com o propósito coletivo, mas os credores
participam de classes com interesses divergentes, ou seja,
criam-se grupos heterogêneos.
Os credores e devedores têm interesses contrários e no
ambiente de insolvência do devedor as informações são
ocultadas, isso em certa medida pode até aumentar o po-
der de negociação, ampliando os ganhos. Contudo, a lei
deveria incentivar aquele agente econômico que detém a
informação privada a revelá-la, o que não ocorre nas nor-
mas estabelecidas atualmente.
Além disso, há que considerar que poucos agentes têm
a visão racional de considerar o negócio como um todo
em prol de terceiros, gerando, assim, a dificuldade entre
consenso e sacrifícios.
Neste contexto, a intervenção do Estado na economia,
criando mecanismos legislativos, agindo pró-credor ou
pró-devedor e criando “interesses” e “desinteresses” pela
recuperação de empresas, é de importância relevante. No-
te-se que a legislação processual civil vigente caracteri-
za-se pela grande dificuldade do credor em cobrar seus
créditos, assim como a grande vantagem que o devedor
detém para prolongamento de dívidas.
Notadamente, o Estado precisa se preocupar em criar
formas de motivação, buscando pelo aprimoramento dos
juízes falimentares, desenvolvendo mecanismo de celeri-
dade e capacitação no Poder Judiciário, em especial quan-
to tratar da recuperação do empresário. Levando-se em
consideração a morosidade, o devedor não pode ficar a
mercê dos despachos e das decisões longínquas. Em tem-
pos de evolução tecnológica e cotidiano conturbado, as

65
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

soluções precisam ser rápidas, sob pena de prejudicar os


interesses do devedor e, sobretudo, da maioria.29
Por outro lado, embora dinamizada a solução da in-
solvência entre as parte, o Estado-Juiz prescinde de uma
maior maleabilidade, podendo arbitrar as disputas, dimi-
nuindo os engessamentos ainda existentes na lei30, e até
mesmo aprovar o plano de recuperação manifestamente
rejeitado pelos credores oportunistas, sem a necessidade
de critérios tumultuosos e de impossível configuração,
desde que economicamente viável a recuperação31.
Enfim, na medida em que não se pode questionar a ra-
cionalidade dos agentes econômicos, pelos argumentos já
exposto, cabe ao Estado intermediar a solução dos confli-
tos empresariais, seja pela ordem pretoriana ou pelo poder

29 No procedimento recuperatório, o devedor precisa ter agilidade e respostas rápida do juízo


falimentar. Ele não pode ficar aguardando por muito tempo a liberação judicial de constrição de
um bem ou a retirada de seu nome nos cadastros de proteção ao crédito, sob pena de inviabilizar
a recuperação e até descumprir o plano de recuperação, tendo em vista a inatividade de algum
item do plano.
30 Em julgado do STJ, foi entendido que a interpretação literal da Lei de Falências e do CTN invia-
biliza toda e qualquer recuperação judicial. “As empresas em crise financeira não precisam estar
em dia com o Fisco para ter seus planos de recuperação judicial aprovados. A decisão unânime
foi proferida ontem pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, que reúne os 15 ministros
mais antigos” (POMBO, 2013).
31 A lei se propôs a trazer no bojo do procedimento de recuperação de empresas a escolha judicial
pela aprovação do plano de recuperação, no qual o juiz concederá a recuperação judicial do deve-
dor cujo o plano de recuperação tenha quase atendido ao quórum qualificado, nos termos do art.
58 da Lei n. 11.101/2005. Contudo, esta opção do legislador é merecedora de críticas, conforme
expõe TOKARS (2013), “Muito se elogiou o espírito do legislador, que teria atentado mais uma
vez para a preponderância do interesse social. Mas a louvação dos textos teóricos não encontra
qualquer reflexo na prática. E não é por acaso. A idéia deveria ser simples: quando não se obtém
a aprovação, o juiz deveria poder forçar a aplicação do plano, desde que estivesse clara a neces-
sidade de tutelar o interesse social, de alguma forma prejudicado pela vontade de um ou alguns
dos credores. Contudo, as limitações impostas pela lei, além de nos forçar a rememorar as lições
de matemática, praticamente inviabilizam a aplicação do instituto. A decisão que se sobrepõe à
reprovação do plano não se funda no interesse social, mas sim na verificação de uma espécie de
quorum alternativo de deliberação. E um quorum alternativo que está muito próximo ao neces-
sário para a aprovação. Afinal, é necessário que, cumulativamente: a) tenha ocorrido a aprovação
geral (não mais por classes) da maioria dos credores (maioria calculada agora pelo valor dos
créditos); b) a rejeição tenha ocorrido apenas em uma das classes; c) na classe em que houve a
rejeição, deve ter ocorrido a aprovação de mais de um terço dos credores; e d) não haja tratamento
diferenciado entre a classe dos credores que rejeitaram o plano e a dos demais credores. Quando
se consegue verificar esta conjugação de fatores? Quase nunca. Tudo somado, subtraído, multi-
plicado e dividido, cria-se um belo problema de matemática para a quinta série. Mas, no plano
jurídico, a proteção do interesse social por meio do cram down não passa de retórica legislativa.”.

66
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

legislativo, trazendo benefícios à sociedade, com fulcro em


induzir as condutas dos agentes econômicos no ambiente
de incertezas e riscos e aprimorar a possibilidade de inter-
venção quando constatada a viabilidade econômica.

REFERÊNCIAS
BAROSSI FILHO, Milton. As assembléias de credores e plano de
recuperação de empresas: uma visão pela teoria dos jogos.
Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro,
Ano XLIV, nº 137, jan./mar. 2005. p. 234.
BECK, Thorsten; LEVINE, Ross. Legal institutions and financial deve-
lopmente. NBER. Working Paper Series 10417. Cambrige, April 2004.
BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de recuperação de empresas
e falência: comentada: Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005:
comentário artigo por artigo. 5. ed. rev., atual. e ampl. São Pau-
lo: Editora Revista do Tribunal, 2008.
COELHO Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de recu-
peração de empresas. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
__________. Curso de direito comercial, volume 3 : direito de
empresa. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
DERANI, Cristiane. Direito Ambiental Econômico. 3. ed. São Paulo:
Saraiva, 2008.
FRONTINI, Paulo Salvador. O caso da falência da Sanderson e as
tendências atuais do Direito Falimentar. Revista de Direito
Mercantil - Industrial, Econômico e Financeiro n.º 15/16, Ano XIII.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1974.
FURTADO, Celso. Desenvolvimento e subdesenvolvimento. 5. ed.
Rio de Janeiro: Contraponto, 2009.
GABARDO, Emerson. Intere público e subsidiariedade: o Estado e
a sociedade civil para além do bem e do mal. Belo Horizonte:
Fórum, 2009.
HORST, Juliana Brandão de Melo. Poder de deliberação dos cre-
dores na assembléia de recuperação judicial. Dissertação de
Mestrado. Nova Lima: Faculdade de Direito Milton Campos, 2011.
LISBOA, Marcos de Barros. A Racionalidade Econômica da Nova Lei de
Falências e de Recuperação de Empresas. In: PAIVA, Luiz Fernando

67
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Valente de (coord.). Direito Falimentar e a nova Lei de Falências


e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
MACHADO, Rubens Approbato (coord.). Comentários à Nova Lei
de Falências e Recuperação de Empresas. 2. ed. São Paulo:
Quartier Latin, 2007.
MENEZES, Mauricio Moreira Mendonça de. Função Sócio-Econô-
mica da Empresa em Recuperação Judicial. Disponível em:
<http://www.bocater.com.br/artigos/mmm_funcao_soc_econ.
pdf‎>. Acesso em: 23 de Jul. 2013.
NORTH, Douglass Cecil. Institutions, institutional change and eco-
nomic performance. Nem York: Cambridge University Press, 2002.
NUSDEO, Fábio. Curso de Economia: introdução ao direito eco-
nômico. 6. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribu-
nais, 2010.
PINHEIRO, Armando Castelar; SADDI, Jairo. Direito, economia e
mercados. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
POMBO, Bárbara. STJ favorece empresa em recuperação. Disponível
em: <http://www.valor.com.br/legislacao/3167788/stj-favorece-em-
presa-em-recuperacao#ixzz2WnqUxvPL>. Acesso em 01 de ago. 2013.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; GALESKI JUNIOR, Irineu. Teoria geral
dos contratos: contratos empresariais e análise econômica.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
SEN, Amartya. Sobre Ética e Economia. São Paulo: Companhia das
Letras, 1999.
SILVA, Fernando César Nimer Moreira da. Incentivos à decisão de
recuperação de empresa em crise: análise à luz da teoria dos
jogos. Dissertação de Mestrado. São Paulo: Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo, 2009.
SIMON, Herbert Alexander. Models of Bounded Rationality. MIT
Press, Cambridge, Mass. 1982
SZTAJN, Rachel. Notas sobre as assembléias de credores na lei de recu-
peração de empresas. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econô-
mico e Financeiro, São Paulo, ano XLIV, n.138, p. 53-70, abr./jun. 2005.
TOKARS, Fábio. As limitações do “cram down” nas recuperações
judiciais brasileiras. Disponível em: http://por-leitores.jusbrasil.
com.br/noticias/2508142/as-limitacoes-de-aplicacao-do-cram-down-
nas-recuperacoes-judiciais-brasileiras. Acesso em: 23 de jun. 2013.

68
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ANÁLISE ECONÔMICA DA ATUAÇÃO


PREVENTIVA DO CADE DIANTE DAS
JOINT VENTURES CONTRATUAIS

Kharen Kelm Herbst32 e Ana Luisa Lopes Gomes33

Resumo: A evolução das relações negociais e o aumento da


complexidade no desenvolvimento de produtos e serviços
fez com que a dicotomia entre soluções de mercado e solu-
ções da firma fosse flexibilizada com a criação de contratos
híbridos, como as joint ventures contratuais. O presente artigo
tem por objetivo examinar, aplicando o instrumental teórico
da Análise Econômica do Direito, a atuação do Conselho Ad-
ministrativo de Defesa Econômica (CADE) como meio para
preservar a concorrência sem, entretanto, coibir a livre inicia-
tiva na utilização de joint ventures pelos agentes do mercado.
A partir da abordagem dos custos de transação e teoria da
firma, analisa-se a opção dos agentes econômicos pela joint
venture contratual para reduzir custos de transação, e a atu-
ação preventiva do CADE diante de externalidades causadas
por uma joint venture. Por meio dessa pesquisa, concluiu-se
que o controle do CADE busca maximização de bem-estar,
conciliando interesses privados das partes contratantes e o
interesse público de eficiência, sopesando danos e benefícios
em relação às empresas, ao mercado e aos consumidores.
Neste sentido, o exercício da atividade preventiva do CADE,
cumprindo os requisitos previstos na Lei nº 12.529/2011, é
um meio eficiente para atenuar falhas de mercado, favore-
cendo o desenvolvimento econômico.
32 Mestranda em Direito Econômico e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica do
Paraná - PUCPR. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR.
Pesquisadora integrante do Grupo de Estudos de Análise Econômica do Direito - GRAED/PUCPR
33 Graduanda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR. Pesquisadora
integrante do Grupo de Estudos de Análise Econômica do Direito - GRAED/PUCPR

69
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Palavras-chave: Análise Econômica do Direito; Joint Ven-


ture; Contratos empresariais; Concorrência; Conselho Ad-
ministrativo de Defesa Econômica.

INTRODUÇÃO
Na busca por diferenciais competitivos, as empresas
buscam novas formas de inovar e de gerir negócios e pro-
jetos. A joint venture contratual é um meio, criado pelos
agentes econômicos, para realizar empreendimentos com-
binando flexibilidade e segurança, sem recorrer aos extre-
mos do mercado ou da firma.
Com isso, a joint venture contratual é um instrumento
do desenvolvimento econômico, pois, ao privilegiar a co-
operação, possibilita o intercâmbio de know-how e o com-
partilhamento de investimentos e riscos, tornando viáveis
projetos que poderiam ser inviáveis se a empresa estivesse
condicionada a atuar sempre de forma isolada.
O funcionamento saudável da economia, entretanto,
requer concorrência. Se as joint ventures contratuais são
uma forma de cooperação entre empresas, qual é o limite
em que esta cooperação é contraposta à concorrência ao
ponto em que se torna prejudicial para a economia?
A Constituição Federal, em seu artigo 170, concilia os
princípios da livre iniciativa e livre concorrência com a
redução das desigualdades e justiça social. Por isso, ao
estruturar o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência,
a Lei nº 12.529/2011, estabelece o objetivo de repressão
ao abuso de poder econômico, sendo este um objetivo
de interesse público, tutelado por uma autarquia federal,
o Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE.
Balizado por requisitos e critérios definidos nos artigos
36, 88 e 90 da Lei nº 12.529/2011, o CADE tem competên-

70
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

cia para analisar casos concretos de joint ventures, exer-


cendo controle preventivo e repressivo sobre os atos que
ensejem ineficiência para o mercado.
O presente artigo tem por objetivo examinar, aplicando
o instrumental teórico da Análise Econômica do Direito, a
atuação do CADE como meio para preservar a concorrên-
cia sem, entretanto, coibir a livre iniciativa na utilização de
joint ventures contratuais pelos agentes do mercado.
A partir da abordagem dos custos de transação e teoria
da firma, cujos marcos teóricos iniciam-se com os estudos
de Ronald Coase e Oliver Williamson, adota-se o método
hipotético-dedutivo, com procedimento de pesquisa mo-
nográfico, técnica bibliográfica e documental, pesquisan-
do dados e informações relacionadas à atuação preventiva
do CADE, incluindo análise e interpretação das leis perti-
nentes ao tema, verificando a lógica por trás das delibera-
ções do CADE no momento de decidir pela possibilidade,
ou não, da criação de uma joint venture.
Assim, no primeiro item, será abordada a dicotomia
existente entre as soluções de mercado, com foco nos
contratos de intercâmbio; e as soluções da firma, com
foco nos contratos de sociedade; demonstrando os pontos
positivos e negativos de ambas as soluções, bem como
os custos de transação a serem considerados pelos agen-
tes no momento da escolha de uma delas. No segundo
item, será apresentado o contrato de joint venture, as suas
características e externalidades, e as razões pelas quais
os agentes de mercado optam por utilizá-lo. Por fim, no
terceiro e último tópico, será analisado, utilizando uma
abordagem de Análise Econômica do Direito, o controle
preventivo do CADE, identificando os critérios do controle
preventivo, bem como as consequências desse controle.

71
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

CUSTOS DE TRANSAÇÃO DAS SOLUÇÕES DE


MERCADO ÀS SOLUÇÕES DA FIRMA
Todas as decisões empresariais envolvem os critérios de
custos ou lucro para a empresa. São diversas as funções e
etapas que uma empresa precisa realizar para que possa
comercializar e lucrar com determinado bem ou serviço.
O desenvolvimento dessas etapas pode se dar através de
soluções de mercado, onde há a contratação de terceiros,
utilizando como instrumento os contratos de intercâmbio;
através de soluções da firma, onde são internalizadas as
etapas produtivas necessárias para as atividades da em-
presa de modo que não haja a necessidade de contratação
com agentes do mercado; ou em soluções intermediárias,
entre os extremos da firma e do mercado. A decisão por
um ou outro caminho se dá a partir de uma análise dos
custos e benefícios envolvidos (WILLIAMSON, 1989, p.20).
Os custos de transação são os custos em que incorrem
os agentes para o intercâmbio de recursos (COOTER e
ULEN, 2010, p. 105). Estes se dividem em (i) custos ex
ante, que são custos de busca, para encontrar interessados
em realizar determinada transação econômica; custos de
negociação, oriundos da negociação, redação e formali-
zação de instrumentos contratuais, como a contratação de
advogados, ou a obtenção de informações sobre o poten-
cial contratante; e (ii) custos ex post, referentes aos custos
de execução, para monitorar o cumprimento do contrato e
estabelecer sanções caso haja descumprimento (RIBEIRO;
GALESKI JUNIOR, 2009, p. 106).
Para Coase (1937, p.388), firma e mercado são formas
distintas de organização de atividades, de alocação de re-
cursos e que implicam em distintos custos de transação. A
firma, por se submeter a um sistema de hierarquia, incorre

72
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

principalmente nos custos de monitoramento e coorde-


nação das atividades para que seja atingido o resultado
esperado; enquanto o mercado segue o sistema de pre-
ços, organizando as atividades econômicas pelos sinais de
escassez e incentivo que este fornece, e incorre principal-
mente nos custos de busca e informação sobre fornecedo-
res, custos da barganha e decisão pela contratação.
O agente econômico analisa se o custo adicional de
organizar uma transação dentro da firma, internalizando a
atividade, excede ou não o custo de organizar a transação
por meio do mercado. Levando em conta os custos das
transações realizadas no mercado, a alocação de recursos
somente ocorrerá quando o aumento no valor da produ-
ção por ela gerado for maior do que os custos incorridos
para implementá-la (COASE, 1960, p.15). A firma é uma
forma alternativa à organização da produção, onde as bar-
ganhas entre os vários fatores de produção são eliminadas
e substitui-se uma transação no mercado por uma decisão
administrativa (COASE, 1960, p.16).
Os custos variam também de acordo com as característi-
cas de uma transação, quais sejam: (i) a especificidade ou
substitutibilidade dos ativos envolvidos; (ii) a frequência
com que a transação se repetirá – segundo Mackaay e
Rousseau (2015, p.521) o mercado é a solução mais eficaz
quando os ativos em causa são menos específicos, mas se
a especificidade dos ativos aumenta e as transações são
frequentes, a opção pela firma é mais eficaz; (iii) a com-
plexidade, riscos ou incertezas quanto aos resultados; (iv)
a mensuração do desempenho e remuneração; (v) e a co-
nexão com outras transações, que se relacionam entre si.
Portanto, todas essas características devem ser analisadas
na tomada de decisão empresarial.

73
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Quando se está diante de contratos de curta duração


e os ativos possuem certo grau de substitutibilidade, a
grande quantidade de agentes no mercado possibilita a
escolha, dentre inúmeras opções, daquela que melhor se
adequa às necessidades, levando em consideração a qua-
lidade, preço, prazos, entre outros fatores – o que significa
que esta tomada de decisão terá elevados custos de busca
e de informação.
Para os contratos de média e longa duração, há maiores
custos de monitoramento e execução que decorrem da
(des)confiança entre as partes, o que leva à estipulação
de mecanismos contratuais que sejam aptos a garantir o
cumprimento da avença.
Segundo Coase (1937, p.44), há redução dos custos de
transação – e consequente aumento dos lucros – quando
é possível reduzir o número de contratos firmados por
um determinado agente. Isso ocorre na medida em que
este deixa de firmar contratos de intercâmbio no mercado
toda vez que se depara com alguma necessidade, e passa
a firmar contratos de sociedade com os agentes que po-
dem contribuir para a realização de sua atividade, o que
faz com que todos estes agentes sejam reunidos em torno
de um único centro decisório denominado organização
empresarial; ou quando determinada atividade é internali-
zada por uma empresa já existente.
Entretanto, se a opção for pelos contratos de sociedade
ou internalização, além dos custos de transação de moni-
toramento e execução já mencionados, precisam ser leva-
dos em conta os pressupostos de formalização, hierarquia
e rigidez da sua constituição e atuação. Isso porque, uma
vez que se estabelece o objeto da sociedade, ou seja, o
seu campo de atuação no mercado, a sua alteração ou

74
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

expansão é difícil e custosa. Primeiramente, para internali-


zar outras atividades uma empresa precisará adaptar a sua
planta produtiva, ou realizar operações de fusão ou aqui-
sições (CAIXETA, 2015, p. 28). Ainda, precisará adquirir
ativos fixos como novo maquinário, contratar mais funcio-
nários, e se necessário, buscar capital externo, o que pode
tornar esta opção desvantajosa frente aos custos gerados.
Com o passar do tempo e desenvolvimento das relações
negociais, bem como com o advento de novas tecnologias
que possibilitaram incrementar a qualidade dos produtos e
serviços e tornar o processo de produção mais especializa-
do e complexo, observou-se que nem as soluções de mer-
cado e nem as soluções da firma fornecem respostas plena-
mente capazes de satisfazer as necessidades dos agentes de
mercado. Os contratos de sociedade são demasiadamente
rígidos, em dissonância com a dinamicidade do mercado
atual. Por outro lado, o desenvolvimento de certos projetos,
por exemplo, de criação de novas tecnologias, pode ser
muito arriscado ou custoso para se assentar somente em
soluções de mercado e contratos de intercâmbio.
Nesse contexto, passou-se a utilizar, como instrumentos
de organização das relações negociais, em busca de maior
eficiência para o mercado competitivo, modalidades situ-
adas na zona intermediária entre as soluções de organi-
zação da atividade empresarial, quais sejam, a firma ou o
mercado. Entre elas, as joint ventures contratuais.
Para Shapiro e Willig (1990, p. 114), o compartilhamen-
to dos riscos associados a investimentos que envolvem
incertezas de demanda ou tecnológicas, as sinergias rela-
cionadas às habilidades ou bens complementares de cada
parte, e a obtenção de economias de escala e de escopo
na produção são benefícios da cooperação no meio em-

75
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

presarial. Joint venture contratual é uma dessas formas al-


ternativas: um contrato híbrido que, conforme conceitua
Frazão (2015, p.189), soma a flexibilidade e autonomia das
relações de mercado à conjugação de esforços e a estabi-
lidade próprias das firmas.

ANÁLISE ECONÔMICA DA DECISÃO EMPRESARIAL PELA


JOINT VENTURE CONTRATUAL
“Firmas, mercados e contratos relacionais são impor-
tantes instituições econômicas. São também o produto da
evolução de uma fascinante série de inovações organiza-
cionais” (WILIAMSON, 1985, p.15). Rompendo com a di-
cotomia existente entre a firma e o mercado proposta por
Ronald Coase (1937), a inovação das joint ventures con-
tratuais situa-se na zona intermediária entre as soluções
de mercado e as soluções da firma (WILLIAMSON, 1985,
p.16), e consiste em permitir que as partes, apesar de man-
terem sua autonomia jurídica e patrimonial, exerçam de-
terminada atividade empresarial de forma compartilhada
e com o estabelecimento de uma estrutura organizacional
entre os contratantes, de modo que estes cooperem entre
si para a execução de um fim comum (FRAZÃO, 2015, p.
195). Trata-se, também, de uma forma de mitigar compor-
tamentos oportunistas, pois ambas as partes têm interesse
de que o negócio dê certo e seja duradouro, havendo uma
interdependência simbiótica entre eles.
A característica própria da joint venture contratual é que
ela não enseja criação de uma pessoa jurídica, como ocorre
nas joint ventures corporativas. Ou seja, a associação não
enseja vínculos societários, apenas vínculos contratuais.
As joint ventures contratuais são, assim, uma forma asso-
ciativa sui generis, que decorre da insuficiência dos sistemas

76
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

anteriormente existentes, criando um sistema de produção


interempresarial. Consistem na associação de duas ou mais
empresas, independentes econômica e juridicamente, para
o exercício de um empreendimento comum, sob risco co-
mum das contratantes. Geralmente caracterizadas por se-
rem contratos de longa duração, além do estabelecimento
de obrigações recíprocas, implicam no estabelecimento de
um sistema de governança entre as partes, com o objetivo
de possibilitar a continuidade e adaptabilidade da relação
entre as partes. (FRAZÃO, 2015, p.193)
As contribuições das empresas contratantes para a con-
secução da atividade comum podem consistir em inves-
timentos, transferência de tecnologia para o desenvolvi-
mento de um novo produto ou serviço, novos processos
produtivos, ou até mesmo o compartilhamento de recur-
sos humanos e know-how.
O que distingue essa modalidade contratual de todas as
outras modalidades é a extensão da cooperação entre os
contratantes. Nos contratos de intercâmbio, por exemplo, a
cooperação é um dever lateral decorrente da boa-fé objeti-
va, enquanto que nas joint ventures contratuais, a coopera-
ção é à própria prestação principal assumida pelas partes.
Para Williamson (1985; 1999), a racionalidade limitada
dos agentes torna impossível o conhecimento ex ante de
todos os desdobramentos de uma relação contratual. Nes-
ta modalidade contratual, há justamente a necessidade de
garantir certa flexibilidade para a relação, de modo que os
termos contratuais permitam eventuais adaptações, mas,
idealmente, sem que isso enseje efeitos prejudiciais para
qualquer das partes.
Isso é possível porque as joint ventures contratuais ini-
bem o oportunismo e incentivam a cooperação pela in-

77
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

teração continuada entre os co-venturers, aumentando a


importância do futuro ao invés do imediatismo, e promo-
vendo a expectativa de grandes recompensas – além da
consecução do objetivo para o qual foi criada –, como o
aumento dos lucros e da visibilidade no mercado. É apro-
fundada também a noção de reciprocidade, pois o suces-
so de um depende do sucesso do outro, ou seja, há uma
evolução estável de cooperação para o desenvolvimento
da atividade (AXELROD, 1984, p.117).
A utilização destes contratos como instrumento relacio-
nal envolve elevados custos de transação ex ante, refe-
rentes a uma criteriosa due dilligence para a obtenção de
todas as informações possíveis sobre o potencial contra-
tante; mas estes custos são assumidos em razão de sua ex-
pressiva redução quando se considera o longo prazo - isso
porque os benefícios e custos de transação ex ante e ex
post são analisados e as opções são comparadas pelas par-
tes contratantes simultaneamente, e não sequencialmente,
para a tomada de decisão (WILLIAMSON, 1985, p.21).
Há de se salientar que, em regra, o objeto da joint ven-
ture consiste em algo diferente do realizado por cada em-
presa contratante, de modo que algo novo é acrescentado
ao mercado. Não necessariamente um novo produto ou
serviço, mas talvez uma nova forma de produzir ou lidar
com os custos de produção e distribuição dos produtos
produzidos pelas contratantes, onde a joint venture repre-
senta atividade complementar àquela desenvolvida pelas
contratantes (MARTINS, 2017, p. 52).
Um centro de organização comum entre as co-ventu-
rers é criado, mas mantendo a independência organizativa
de cada parte (PIMENTA, 2006, p. 83). Cria-se uma nova
potencialidade empresarial, seja em capacidade produti-

78
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

va, nova tecnologia, novo produto, ou entrada em novo


mercado, possibilitada por meio da conjugação de esfor-
ços, recursos e do compartilhamento de riscos, onde os
contratantes não precisam se submeter aos altos riscos
ou despender a elevada quantidade de recursos que seria
necessário se o agente investisse na empreitada sozinho
(MARTINS, 2017, p. 51). Quando é atingido o objetivo
para o qual a joint venture foi criada, ela pode ser dissol-
vida sem maiores entraves.
Devido a este caráter de agregação de poder empresa-
rial e mercadológico, as joint ventures – sejam elas corpo-
rativas ou contratuais – podem ser enquadradas como atos
de concentração empresarial, uma vez que têm potencial
para prejudicar ou anular relações de concorrência (FRA-
ZÃO, 2015, p. 202).
Por esse motivo, o estabelecimento de uma joint ventu-
re pode ter que passar pelo crivo da atuação preventiva do
CADE, a fim de evitar que conjugação de poderes possa
resultar em eventual abuso de poder econômico de modo
a gerar externalidades negativas para todo o mercado.
Em todo arranjo jurídico há também custos envolvidos
para a sua criação, implementação, monitoramento do
cumprimento das leis e análise dos impactos que essa re-
gulação causa para o setor. Segundo Coase (1960), ao for-
mular determinado arranjo, devemos atentar para o efeito
total. É preciso analisar, então, os efeitos totais e sociais da
atuação preventiva do CADE em relação às joint ventures.

ANÁLISE ECONÔMICA DA ATUAÇÃO PREVENTIVA DO


CADE DIANTE DAS JOINT VENTURES CONTRATUAIS
As instituições econômicas do capitalismo - firma, mer-
cado e contratos relacionais – têm como principal objetivo

79
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

a redução dos custos de transação entre as partes interes-


sadas (WILLIAMSON, 1989, p.17). A tomada de decisão
empresarial para estabelecer uma joint venture leva em
conta os fatores que são determinantes para a consecução
de interesses privados das partes contratantes. Entretanto,
atividades econômicas eventualmente geram efeitos preju-
diciais para terceiros, afetando o interesse público.
Segundo Coase (1960), a análise econômica de uma si-
tuação como essa é desenvolvida com base na divergência
entre o produto privado e o social das atividades de uma
empresa. Quando há efeitos prejudiciais, cabe ao Estado,
na função reguladora, amenizar ou impedir a ocorrência
desses efeitos. Dessa forma, o Estado interfere no uso dos
fatores de produção por meio de decisões administrativas.
A busca pela redução dos custos de transação inter partes,
portanto, não pode se dar em prejuízo da eficiência con-
correncial (WILLIAMSON, 1989, p.17).
As joint ventures podem criar inovações, gerar ganhos de
qualidade, reduções nos custos, e, consequentemente, nos
preços. Mas, dependendo da amplitude desses efeitos, po-
dem ser causa de distorções no funcionamento do mercado
relevante em que participam, onde a cooperação passa a
ser uma concentração com externalidades negativas.
Para Paula Forgioni (2019, p.38) os objetivos conferidos
ao Direito Concorrencial incluem a prevenção ao contro-
le regional dos negócios, eficiência econômica, bem-estar
do consumidor, obtenção de resultados econômicos de-
sejáveis, promoção da concorrência e de condutas leais,
limitação da atuação e da expansão das grandes empresas,
controle do poder político dos grandes conglomerados,
entre outros.
Neste sentido, a Lei 12.529/2011 positivou, em seu ar-

80
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

tigo 36, que constituem infração à ordem econômica os


atos que possam produzir efeitos - ou seja, concretos ou
potenciais - de limitar ou prejudicar a livre concorrência,
dominar mercado relevante, aumentar arbitrariamente os
lucros, ou exercer de forma abusiva posição dominante. O
artigo 31 da mesma lei, prevê que ela se aplica para “quais-
quer associações de entidades ou pessoas, constituídas de
fato ou de direito, ainda que temporariamente, com ou
sem personalidade jurídica”, ou seja, aplica-se para joint
ventures contratuais, onde não há constituição de pessoa
jurídica. Forgioni (2019, p.189) esclarece que simples tro-
cas de informações, cartas de intenção ou acordos podem
caracterizar-se como atentatórios à ordem econômica se
incidirem nos efeitos prejudiciais à concorrência.
O inciso IV do artigo 90 da Lei 12.529/2011, por sua
vez, dispõe que pode ser considerado ato de concentração
a “celebração de contrato associativo, consórcio ou joint
venture” entre duas ou mais empresas. Ao deixar de espe-
cificar uma modalidade (contratual ou corporativa), enten-
de-se que ambas as modalidades de joint venture devem se
submeter ao controle preventivo do CADE quando preen-
cher os critérios objetivos do artigo 88 da mesma lei, onde
constam valores mínimos de faturamento bruto anual de
cada empresa contratante ou volume de negócios no país.
Esses dispositivos legais estão em consonância com os
ensinamentos de Williamson (1989, p.23) que elucida que
“sempre que custos e benefícios sociais e privados diferem
entre si, é o cálculo do custo social que deve determinar se
algum tratamento é indicado”. Ou seja, pelo instrumental
da análise econômica do direito, na busca pela eficiência,
pode-se dizer que o controle do CADE diante das joint ven-
tures contratuais é balizado pelo critério de Kaldor-Hicks,

81
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

que parte da premissa de que “as normas devem ser plane-


jadas com objetivo de causar o máximo de bem-estar para
o maior número de pessoas, de modo que os ganhos totais
compensem, de forma teórica, as eventuais perdas sofridas
por alguns” (RIBEIRO e GALESKI JUNIOR, 2009, p.86).
Todos os atos de concentração - fusões, aquisições e
joint ventures - são analisados pelo CADE com base no
exposto no “Guia para Análise Econômica de Atos de
Concentração Horizontal” (CADE, 2016), publicado pelo
própria autarquia. De acordo com este guia, o ato de con-
centração é analisado conforme os quesitos: (i) natureza
da operação; (ii) definição do mercado relevante; (iii) par-
cela de mercado e parcela de concentração sob controle
das empresas requerentes; (iv) probabilidade do exercício
do poder de mercado; (v) eficiências econômicas geradas
pelo ato; (vi) avaliação da relação entre custos e benefí-
cios gerados pelo ato de concentração.
Trata-se, então, de uma análise e controle ex ante pre-
sumindo que a cooperação entre duas ou mais empresas
que isoladamente já detêm grande poder econômico, gera
efeitos negativos para o mercado. O que não impede a aná-
lise e controle ex post, ou seja, repressivo, para os casos em
que as empresas, embora não preencham os critérios do
artigo 88 da Lei 12.529/2011, tenham a capacidade de gerar
os efeitos previstos no artigo 36 do mesmo diploma legal,
instaurando-se procedimento investigatório de natureza in-
quisitorial para apuração de infrações à ordem econômica.
Não se trata de análise meramente especulativa, seja ex
ante ou ex post, das (in)eficiências geradas para o mercado,
tendo em vista que há elaboração de parecer técnico de
uma autarquia que é especializada. Por outro lado, o prazo
legal para a decisão final do CADE é de 240 dias, prorrogá-

82
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

veis por mais 90 dias, o que pode ser um embaraço diante


da agilidade e ritmo acelerado das relações negociais e mer-
cadológicas, especialmente para joint ventures que visam
inovações tecnológicas, que evoluem muito rapidamente.
Outra dificuldade que poderia ser verificada no plano
fático é que contratos entre particulares, como regra, não
são submetidos a uma análise ex ante pelo Estado. Por
isso, embora a joint venture corporativa, por depender de
formalização societária, possa ser facilmente verificada pe-
los órgãos reguladores, a celebração de uma joint venture
contratual poderia passar despercebida pelo CADE, não
incidindo, portanto, o controle preventivo. Neste caso,
apenas eventuais efeitos prejudiciais à concorrência, já
materializados ou denunciados, é que seriam investigados
e punidos, incidindo somente o controle repressivo.
Entretanto, levando-se em consideração que a atua-
ção preventiva ocorre quando a joint venture é forma-
da por empresas de grande impacto econômico - onde
pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha
registrado, no último balanço valores mínimos de fatura-
mento bruto anual ou volume de negócios no país de R$
750.000.000,00 (setecentos e cinqüenta milhões de reais); e
pelo menos um outro grupo envolvido na operação tenha
registrado, no último balanço R$ 75.000.000,00 (setenta e
cinco milhões de reais), conforme Portaria Interministerial
nº 994/2012 -, comumente se configura, por informações
que transitam no próprio mercado, como fato público e
notório, garantindo o controle preventivo do CADE.
Diante disso, verifica-se que a Lei 12.529/2011 está de
acordo com o princípio de tratamento favorecido para as
empresas de pequeno porte, previsto no inciso IX do arti-
go 170 da Constituição Federal, pois estas não precisam se

83
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

submeter ao controle preventivo do CADE para celebração


de joint venture contratual, e estão protegidas dos efeitos
prejudiciais e anticoncorrenciais que poderiam ser causados
por joint ventures de grande impacto e poder econômico.
Assim, segundo Zingales (2015, p. 99), a concorrência
maximiza o bem-estar ao restringir o aumento da desigual-
dade, criar incentivos à meritocracia e dar aos consumido-
res a possibilidade de escolhas e de aproveitar benefícios
das inovações.
Como exemplo, no AC 08700.002792/2016-47, o CADE
aprovou com restrições a formação de uma joint venture
entre grandes bancos para criar um novo bureau de cré-
dito para fornecimento de informações sobre adimplência
e inadimplência, para fins de cadastro negativo e também
cadastro positivo. O CADE entendeu que essa integração
poderia propiciar condutas anticompetitivas, como a dis-
criminação no acesso às informações por outros bureaux
de crédito já existentes no mercado; mas verificou que a
operação possui potencial para alavancar o Cadastro Po-
sitivo, gerando impactos positivos que vão além do mer-
cado de serviços de informações de crédito. Para afastar
as preocupações concorrenciais, os bancos concordaram
em celebrar um Acordo em Controle de Concentrações
que prevê metas para o crescimento do cadastro positivo,
garantias de não discriminação para bureaux de crédito
concorrentes no acesso a informações de crédito, e meca-
nismos de governança corporativa.
No AC 08012.004387/2009-92, aprovado pelo CADE
sem restrições, companhias aéreas celebraram contrato
de joint venture para operar em conjunto nas atividades
transatlânticas, coordenando operações, dividindo recei-
tas e custos e reunindo suas malhas aéreas transatlânticas,

84
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

permitindo-lhes a comercialização de serviços aéreos glo-


balmente integrados. O CADE concluiu que a operação
não afeta o padrão da concorrência e ainda pode ser con-
siderada benéfica para o consumidor, que tem mais uma
opção de serviço.
No AC 08700.006723/2015-21, o CADE aprovou a for-
mação de uma joint venture entre três canais de televisão
para atuar na criação de conteúdos, programas e canais
destinados à tv fechada, bem como no licenciamento do si-
nal digital destas emissoras. Sua aprovação foi condicionada
à assinatura de um acordo para sanar eventuais problemas
anticoncorrenciais, contemplando medidas de subsídios a
pequenos e médios operadores de tv por assinatura e esta-
belecimento de um prazo para a duração da joint venture,
onde o CADE analisa a evolução de mercado esperando
por efeitos positivos para os consumidores, que se não fo-
rem observados, novos remédios são apresentados.
Portanto, seja pautada pelos interesses privados das
partes contratantes, ou pautada pelo interesse público tu-
telado pelo Estado, a formação de joint ventures passa
por uma análise criteriosa sopesando danos e benefícios
em relação às empresas, ao mercado e aos consumidores,
fazendo com que sejam instrumentos para a inovação e
desenvolvimento, oportunizando, inclusive, investimentos
estrangeiros no país e acompanhando mudanças econô-
micas de forma mais ágil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o desenvolvimento da indústria e da tecnologia,
desenvolveram-se também as relações negociais, de modo
que a dicotomia entre as soluções de mercado e as so-
luções da firma vem sendo flexibilizada. Surgem novas

85
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

modalidades contratuais para atender as demandas dos


agentes econômicos, entre elas, a joint venture contratual.
Ao tratar da importância, das principais características e
do ambiente negocial que propicia a tomada de decisão
empresarial pela criação de uma joint venture, verificou-
se que essa modalidade contratual vem acompanhada de
potenciais externalidades positivas e negativas. Entre elas,
o potencial de causar prejuízos à concorrência, na medi-
da em que aumenta o poder econômico dos contratan-
tes como resultado da cooperação, para a consecução de
um objetivo comum, entre agentes de mercado que antes
eram concorrentes.
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica tem
competência para evitar as referidas externalidades negati-
vas, preservando a concorrência e a eficiência no mercado
relevante. Para isso, exerce o controle preventivo dos atos
de concentração entre os agentes econômicos.
Considerando os efeitos sociais e totais que resultam
da conduta dos particulares – sejam empresas públicas ou
privadas – nos moldes da teoria do custo social de Ronald
Coase; possibilitando a redução de custos de transação
e desenvolvimento das instituições econômicas, conforme
esinamentos de Oliver Williamson; o CADE segue critérios
estabelecidos em lei para autorizar, autorizar com restri-
ções ou reprovar o contrato de joint venture entre agentes
econômicos que individualmente já detêm grande poder
econômico ou participação no mercado.
Nesse sentido, foi possível constatar que as normas de
direito concorrencial são aplicadas em consonância com
o critério de Kaldor-Hicks, ou seja, determinados atos dos
agentes de mercado somente se maximizam o bem-estar
geral e a eficiência econômica. Caso contrário, a livre ini-

86
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ciativa poderá ser restringida para preservar a dinâmica


concorrencial, que é de interesse público. Isso porque, em
um contexto em que há concorrência, há maior liberdade
de escolha, há incentivos para a constante melhoria de
produtos e serviços, para a inovação e estímulos para a
economia como um todo.
Assim, é possível concluir que o exercício da ativida-
de preventiva do CADE, cumprindo os requisitos deter-
minados por lei, é um meio eficiente para atenuar falhas
de mercado, na busca pelo equilíbrio entre cooperação e
concorrência, favorecendo o desenvolvimento econômico.

REFERÊNCIAS
AXELROD, Robert. A evolução da cooperação. São Paulo: Hemus, 1984.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/
constituicao.htm Acesso em: 28 de novembro de 2019.
BRASIL. Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011. Estrutura o Sis-
tema Brasileiro de Defesa da Concorrência. Disponível em: http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12529.htm
Acesso em: 12 de novembro de 2019.
BRASIL. Portaria Interministerial nº 994, de 30 de maio de 2012.
Indicação do Plenário do Conselho Administrativo de Defesa Eco-
nômica – CADE. Adequa os valores constantes no art. 88, I e II, da
Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011.
CADE - Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Guia para
Análise de Concentrações Horizontais. Jul. 2016. Disponível
em: http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes
-institucionais/guias_do_Cade/guia-para-analise-de-atos-de-con-
centracao-horizontal.pdf . Acesso em 16 de nov. de 2019.
CAIXETA, Deborah. Contratos Associativos: características e rele-
vância para o direito concorrencial das estruturas. Disserta-
ção (Mestrado), Universidade de Brasília, 2015.
COASE, Ronald. The nature of the firm. Economica, v. 4, n. 16, p.
386-405, 1937.

87
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

COASE, Ronald. The problem of social cost. Journal of Law and


Economics, Vol. 3 (Oct., 1960), pp. 1-44. University of Chicago
Press. October, 1960.
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Direito e Economia. Tradução de
Luis Marcos Sander e Francisco Araújo da Costa. 5ª edição. Porto
Alegre: Bookman, 2010.
FORGIONI, Paula A. Contratos Empresariais: Teoria geral e apli-
cação. 4. Ed., Rev., Atual., e Ampl., São Paulo: Thomson Reuters
Brasil, 2019.
FRAZÃO, Ana. Joint Ventures contratuais. In: Revista de informação
legislativa, a. 52, n. 207, jul-set, 2015, p. 187-211.
MACKAAY, Ejan; ROUSSEAU, Stephane. Análise Econômica do Di-
reito. 2ª Ed. Tradução de Rachel Sztajn. São Paulo: Atlas, 2015.
MARTINS, João Victor Ruiz. Controle concorrencial das joint ventures.
Dissertação (Mestrado). 123f. Universidade Federal do Paraná. Fa-
culdade de Direito. 2017.
PIMENTA, Eduardo Goulart. As modalidades de Joint Ventures ou
parcerias empresariais no direito brasileiro. In: Direito Públi-
co: Revista Jurídica da Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais,
n.1/2, Jan./Dez., 2006.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; GALESKI JUNIOR, Irineu. Teoria Ge-
ral dos contratos: contratos empresariais e análise econômica.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
SHAPIRO, Carl; WILLIG, Robert D. On the antitrust treatment of
production joint ventures. Journal of Economic Perspective, v.
4, n. 3, pp. 113-130, 1990.
WILLIAMSON, Oliver E. The Economic Institutions of Capitalism:
Firms, Markets, Relational Contracting. New York: Free Press, 1985.
WILLIAMSON, Oliver E. Transaction-cost economics: the governan-
ce of contractual relations. In: BUCKLEY, Peter; MICHIE, Jonathan.
Firms, organizations and contracts. New York: Oxford University
Press, 1999.
ZINGALES, Luigi. Um capitalismo para o povo: Reencontrando a
chave da prosperidade americana. São Paulo: Bei, 2015.

88
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO DA JOINT


VENTURE COMO INSTRUMENTO DE EFICIÊNCIA:
ESTUDO DE CASO DA HYUNDAI E APTIV

Aron Vitor Fraiz Costa34 e Ricardo Bazzaneze35

Resumo: A cooperação empresarial assumiu importância


crescente com o aumento exponencial do comércio interna-
cional e o avanço da tecnologia. O setor automotivo merece
destaque no cenário mundial atual, devido à busca de desen-
volvimento de veículos que possuam sistema de condução
autônoma. As empresas multinacionais buscam novos mer-
cados e parcerias empresariais para suprir as novas necessi-
dades que o mercado tecnológico exige. Este processo de
ampliação de negócios, ligados com a necessidade de maior
sofisticação e facilidade de uso, faz com que se busque por
instrumentos econômicos e jurídicos para corresponder às
exigências do cenário atual. Um desses instrumentos, que
mostrou ser extremamente efetivo é o de Joint Ventures, cuja
exponencial utilização no âmbito de relações jurídico-eco-
nómicas demonstra a sua relevância aos dias atuais. Assim,
entende-se como contrato de joint venture como um con-
junto de acordos contratuais que, celebrados entre pessoas
jurídicas, economicamente independentes entre si, visam a
realização de um determinado empreendimento comum. Por
meio do fundamento epistêmico do racionalismo, construído
através do método dedutivo de análise, alcançado preponde-
rantemente por meio de revisão bibliográfica, documental e
ao estudo de caso proposto. Dessa forma, um dos exemplos

34 Graduando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Membro do Grupo de


Estudos de Análise Econômica do Direito. Pesquisador da Iniciação Cientifica 2019-2020
35 Advogado. Doutorando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Membro do
Grupo de Estudos de Análise Econômica do Direito. Co-orientador da Iniciação Cientifica 2019-2020

89
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

de Joint Venture que merece destaque é realizada entre a


empresa de automóveis, Hyundai, com Aptiv, empresa de
soluções tecnológicas de mobilidade. O resumo revela o ins-
tituto de joint venture utilizando-se uma visão interdisciplinar
com o instrumento da Análise Econômica do Direito (AED),
identificando a Teoria dos Custos de Transação e a Teoria da
Firma de Oliver E. Williamson, sobretudo pela ponderação
entre eficiência e custos de transação à luz dos contratos in-
completos. Em função dos relacionamentos que deve manter
com os demais integrantes do sistema produtivo, que com-
preendem todos os custos associados a procura, negociação
e monitoramento do intercâmbio econômico, observando as
falhas de mercado, capazes de justificar a ocorrência e apli-
cação da joint venture entre as duas empresas, objeto estudo
deste estudo.
Palavras-chave: Joint Venture; Análise Econômica do Di-
reito; Mobilidade Autônoma; Teoria dos Custos de Transa-
ção; Teoria da Firma

INTRODUÇÃO
Com o advento do capitalismo moderno, a evolução das
relações jurídico-econômicas tem ganho crescente relevân-
cia, demonstrando-se mais intensas quando se vislumbra
sobre a ótica de cooperação e relação entre as empresas.
A acentuada globalização da atividade econômicas fez
com que as relações empresárias se tornassem mais com-
plexas e, somadas à abertura de portas promovida pelo
desenvolvimento do comércio internacional, se percebe
a constante demanda pela criação de novos instrumentos
para potencializar a eficiência das atividades empresariais
e maximização no aferimento de lucro, sem deixar de lado
a segurança que compromete os negócios empresariais.

90
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

O acirramento do processo concorrencial exige das em-


presas um posicionamento cada vez mais ativo no mer-
cado, buscando um meio de desenvolver a eficácia das
atividades econômicas, conjugando elementos como risco
e o lucro das suas atividades. Neste cenário que se destaca
o instituto da Joint Venture, que decorre da associação de
duas ou mais empresas através da criação de uma nova
entidade empresarial, cuja finalidade está no alcance de
um objetivo comum, prestando entre si suportes legais,
econômicos e técnicos.
Em sentido análogo, merece destaque ao setor auto-
motivo, cuja importância para o desenvolvimento da eco-
nomia está em nível mundial. As montadoras estão cada
vez mais integradas, apostando em novas tecnologias para
obter destaque nesse competitivo mercado.
Tanto que, nos últimos anos as principais montadoras
multinacionais intensificaram o investimento pela busca
da produção de carros autônomos, ou seja, que depen-
dendo de seu grau de autonomia, não requerem a condu-
ção humana.
Exemplo recente está no case envolvendo a Hyundai
Motors e a Aptiv, que anunciaram a parceria utilizando-se
do contrato de Joint Venture, em que o principal objetivo
está no desenvolvimento e comercialização de carros au-
tônomos nível 4 e 5 até o ano de 2022.
Assim, pelo método dedutivo, estuda-se principalmente
ela doutrina e a legislação para detectar o conceito das
Joint Ventures e como este modelo negocial/contratual
pode alavancar o desenvolvimento econômico e social.
Para tanto utiliza-se como referência a parceria entre a
Hyundai e a Aptiv para a criação de carros autônomos.
Ao final, pelo instrumental da Análise Econômica do

91
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Direito (AED), revela-se que a natureza incompleta dos


contratos, que está sujeito às limitações inerentes a qual-
quer processo decisório. Aliado a isto, a presença e influ-
ência dos custos de transações, que estão sempre presen-
tes nos contratos, afetam diretamente na viabilidade e a
própria eficiência da Joint Venture. Por isto, socorre-se a
Teoria de Custos de Transação e a Teoria da Firma, ambas
do economista Oliver Williamson, as quais revelam que o
uso do instrumento de Joint Venture entre duas empresas
se justifica, ante sua possibilidade de diminuição de riscos,
dos custos de transação, eficiência e maximização das ati-
vidades econômicas das empresas.

A MOBILIDADE DO FUTURO: A DIREÇÃO AUTONOMA


A indústria automobilística, sob diversos aspectos, pos-
sui extrema relevância para o crescimento econômico de
qualquer nação. Seja por ser grande geradora de empre-
gos, por apresentar importantes encadeamentos produti-
vos e por seus investimentos em inovação (DAUDT; WILL-
COX, 2015, p. 30).
Apenas alguns anos atrás, os elementos determinantes
da competitividade eram o preço e a qualidade dos veícu-
los (CLARK; FUJIMOTO, 1991, p. 25), porém, na medida
em que as relações de consumo foram naturalmente sen-
do alteradas, o setor automobilístico se moldou, reagindo
de forma mais rápida e eficiente.
Atualmente, este setor é acompanhado por constantes
processos de desenvolvimento, diante das mudanças e
exigências do mercado que é cada vez mais competitivo.
Conforme Clark e Fujimoto (1991, p. 20) essa mudança
pode ser explicada parcialmente por três motivos: cres-
cente competição internacional entre as empresas, o que

92
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

tem contribuído para globalização da escala dos produtos;


crescente fragmentação do mercado e, consequentemen-
te, maior intensidade no lançamento de novos produtos e
redução das vendas por volume de modelo; diversidade,
maior complexidade e ampliação da tecnologia incorpora-
da nos veículos; além da redução do ciclo de vida dos pro-
dutos, a qual possibilita maior vantagem para as empresas,
a substituição rápida de modelos e, consequentemente,
novos lançamentos (CONSONI; CARVALHO, 2002, p. 5).
Neste cenário, a tecnologia dos veículos autônomos
vem realizando importantes evoluções para a sociedade
na forma de sistemas automatizados, seja para fins de pes-
quisa ou comerciais (BRUMELEN et al, 2018, p. 44). Assim,
o veículo autônomo é aquele que consegue locomover-se,
dependendo de seu grau de autonomia, sem a intervenção
humana, lendo e interpretando o cenário ao seu redor,
interagindo com os elementos à sua volta.
A Society of Automative Engineers (SAE), organização
responsável pelos estudos em engenharia automobilísti-
ca, e indústrias montadoras de automóveis, elaborou uma
classificação que mostra o nível de automação no qual o
veículo pode atingir, como mostrado na Tabela 1 (SAE,
2018, s.p).

93
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Ainda, a NHTS, agencia do governo americano respon-


sável pela administração nacional de segurança nacional,
em outubro de 2016, também atualizou oficialmente sua
política de acordo com os níveis de autonomia delineados
pela SAE International. A maioria dos benefícios dos veícu-
los autônomos demonstrados requerem um nível de auto-
mação 4 ou 5, ou seja, em que o veículo é capaz de dirigir
completamente sem a necessidade da intervenção humana.
Embora algumas formas de automação de veículos já
estejam disponíveis há anos no mercado – como é o caso
do assistente de estacionamento, do controle de velocida-
de e do auxílio para manutenção na faixa –, por enquanto,
a automação em nível comercial ainda é escassa.
Para o Brasil, as perspectivas ainda são básicas. Primei-
ramente, vale atentar para a possibilidade de os principais
players de desenvolvimento automobilístico não estarem

94
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

presentes no Brasil na mesma intensidade em que estão


presentes em outros países, como EUA, Alemanha e China
(DAUDT; WILLCOX, 2015, p. 32).
Neste sentido, ao tratarmos dos reflexos que os car-
ros autônomos abarcam, se faz necessário tecer um breve
comentário da legislação brasileira, em que se vislumbra
uma superficialidade normativa.
Os veículos de automação de nível 4 e 5 não requerem
qualquer ação humana. Assim sendo, o debate abrange nos
casos de acidentes ocorridos em função da condução au-
tônoma, questionando qual será a proteção legal que o ci-
dadão obterá, seja na esfera civil, penal ou administrativa.
No âmbito civil, está expressamente disposto que aquele
que violar direito e causar dano a outrem, comete ato ilíci-
to36 e, de forma progressiva, aquele que causa este dano,
fica obrigado a repará-lo37. Em caso de acidentes de veícu-
los, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já firmou, com base
na teoria da guarda da coisa, em que o proprietário do veí-
culo, responde pelos danos causados a terceiros, ainda que
não tenha efetivamente conduzido o automóvel38.
Com efeito, no âmbito penal, a responsabilização do
proprietário somente ocorreria em casos pontuais, se da
análise fática, constar o dolo ou a culpa da ação ou omis-
são do condutor.
Por outro lado, em âmbito administrativo, percebe-se
que é onde se requer a maior evolução legislativa, haja
vista a sua completa incompatibilidade com os carros au-
tônomos, vez que o Código de Trânsito Brasileiro dispõe

36 Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito
e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
37 Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a
repará-lo.
38 A exemplo, olhar: AgRg no AREsp 752.321/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TER-
CEIRA TURMA, julgado em 15/12/2015, DJe 02/02/2016.

95
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

em seu art. 28 que cabe ao condutor ‘’a todo momento, ter


domínio de seu veículo, dirigindo-o com atenção e cuida-
dos indispensáveis à segurança do trânsito’’.
Nessas hipóteses, vislumbra que as ferramentas jurídi-
cas atuais estão apenas parcialmente preparadas para en-
frentar essas situações (OLIVEIRA, C. E. E; LEAL, T. A. C.
B, 2016, p. 9), de modo que exigirá do legislador uma
minuciosa evolução normativa para adequar-se à nova re-
alidade dos carros autônomos.
Considerando que o mundo vem se tornando cada vez
mais interconectado, em que o tempo se tornou o bem de
maior valor (e também o mais escasso), a eficiência é cada
vez mais exigida, o veículo autônomo é visto como uma
oportunidade para que o motorista utilize o tempo durante
o trânsito para realizar outras tarefas. Como projeção, o foco
por parte dos consumidores mudará ao adquirir um veículo,
já que 60% dos consumidores ao comprarem um veículo au-
tônomo se interessarão apenas em o que eles poderão fazer
com o tempo livre durante o trânsito, não mais apenas com
as características do veículo (KPMG Internacional, 2017, s.p).

OS INSTRUMENTOS DE APLICAÇÃO DA AED:


A MAXIMIZAÇÃO E A EFICIÊNCIA
A partir da AED, devem ser ponderados os custos dos
instrumentos jurídicos na persecução de seus fins e as con-
sequências econômicas das intervenções jurídicas baseadas
nas ideias de valor, utilidade e eficiência (FORGIONI, 2016,
p. 23), ou seja, uma perspectiva funcional dos fatos jurídicos:
A análise econômica do contrato pretende ser comple-
mentar da análise jurídica, fazendo ressaltar o escopo
utilitário que preside, quase invariavelmente, à delibera-
ção de contratar, e fazendo recair uma especial atenção

96
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

nos efeitos geradores de riqueza que podem associar-se


àquele acordo de coordenação de condutas, efeitos que
o transformam em veículo de consumação e permuta de
utilidades (ARAÚJO, 2007, p. 17).
Algumas teorias econômicas justificam as Joint Ventu-
res, como é o caso de Coase (1960) e Williamson (1979),
que ilustram através da Teoria de Custos de Transação
que os custos que advém de tempo e despesa de negocia-
ção de contratos e o risco dos contratos imperfeitos que
podem ser aproveitados para comportamentos oportunís-
ticos. Ainda, o economista diz que as formas contratuais
híbridas oferecem maior possibilidade de organização en-
tre as empresas. Contudo, são mais flexíveis do que os
contratos societários, baseados na hierarquia (firm), cuja
escolha dos signatários a respeito de três elementos es-
senciais: incentivos, adaptabilidade e custos burocráticos
(WILLIAMSON, 1996, p. 43).
Os custos de transação para Ronald Coase, representam
desincentivos à negociação, na medida que a negociação
bem-sucedida seria consequência direta do uso eficiente
de recursos (COASE, 1960, p.15).
As empresas conseguem exercer os seus direitos atra-
vés da administração e como tal reduzem posteriores ma-
lefícios como a apropriação errada de conhecimento e que
as Joint Ventures conseguem incorrer em menos custos do
que se tratasse de uma aquisição de empresas.
Destarte, o direito contratual serve para incentivar condu-
tas eficientes das partes, o que reduz a complexidade e os
custos de transação (POSNER, 1972, p.54), permitindo pelo
desenvolvimento comercial, no fornecimento de informações
que atingem a relação e auxilia no planejamento das partes.
É certo de que a lei dos contratos surgiu na tentativa de

97
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

reduzir este custo, mas não o eliminou, vez que estes sem-
pre serão incompletos. De modo inverso, o contrato só
se mostra completo ou fully specified quando o conteúdo
especifica todas as possíveis circunstâncias, presentes ou
futuras, que possam vir a ter reflexos na relação contratu-
al’’ (COSTA, 2017, p. 59).
Portanto, a função dos contratos consiste na redução
destes custos de transação, possibilitando que as transa-
ções econômicas busquem no maior grau de eficiência
possível, seja pela alocação dos riscos ou em sua redução
de oportunismo:
Explicitly specifying terms furnishes a clear framework
that defines each party’s rights, duties, and the principles
and procedures of cooperation. Wellspecified contracts
narrow the domain and severity of risk to which an ex-
change is exposed and thereby encourage subsequent
cooperation39 (POPPO; ZENGER, 2002, p. 710)
O contrato é, assim, um instituto extremamente efi-
ciente para que haja a transformação do mundo real con-
forme o interesse dos seus contratantes, pois cria deve-
res e limita as possibilidades de ação dos sujeitos. Além
disso, mais do que uma restrição ao comportamento, um
contrato sugere comportamentos desejáveis (STAJN; ZYL-
BERSTAJN, 2005, p 234).
A escolha entre o mecanismo de mercado ou o sistema
internalizado depende da compreensão de que as transa-
ções são realizadas por meio de contratos (WILLIAMSON,
2012, p. 32) bem como que custos deste serão parte dos
custos da estrutura de governança.

39 Em livre tradução: ‘’A especificação explícita de termos fornece uma estrutura clara que define
os direitos, deveres e direitos de cada parte princípios e procedimentos de cooperação. Contratos
bem especificados restringem o domínio e a gravidade do risco ao qual uma troca está exposta e,
assim, incentivar a cooperação subsequente’’

98
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Nem todas as Joint Ventures se refletem em sucesso,


justamente pelo seu caráter contratual incompleto. Assim,
tendo em conta que as empresas envolvidas ao longo do
tempo vão adquirindo know-How umas das outras, quan-
do chegam a um ponto em que os benefícios se aproxi-
mam dos custos, maior é o incentivo para a terminação da
Joint Venture. O inacabamento contratual se encara como
uma deliberação de que talvez não se vale a pena prolon-
gar as negociações quando o resultado não cobre o seu
custo (ARAÚJO, 2007, p. 151).
Neste sentido a teoria dos custos de transação propõe
que esses custos oriundos do mercado podem ser evitados
por meio da internalização, isto é, por meio da própria
organização de uma empresa (GONÇALVES, 2010).
Os custos de transação podem ser minimizados a
partir do aumento da relação de confiança, conheci-
mento dos recursos utilizados e know-kow (GULATI,
NOHRIAN & ZAHEER, 2000). Caso contrário, se o custo
de transação for elevado, este pode ocasionar compor-
tamento oportunista entre as partes envolvidas (CHEN,
PENG & SAPARITO, 2002). Tsang (2000) afirma que há
relação entre os custos de transação, falhas de merca-
dos, insumos intermediários e especificação dos ativos,
proporcionando elevada incerteza quanto ao desempe-
nho da aliança.
Assim, com a Joint Venture realizada entre a Hyundai
e Aptiv, é possível perceber que as intenções estratégicas
englobam pela oportunidade de trazer ao mercado inova-
ções tecnológicas, fundindo o know-how de cada uma,
facilitando a sua permanência como player no mercado e,
principalmente, na maximização do grau de eficiência e
redução dos custos de transações.

99
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

AS JOINT VENTURES – UMA RESPOSTA AOS CUSTOS


DE TRANSAÇÃO?
O instituto da joint venture possui sua origem nas práti-
cas empresariais norte-americanas, onde os tribunais, atra-
vés de sucessivas decisões jurisprudenciais, procuraram
identificar os elementos ditos caracterizadores das joint
ventures (ASTOLFI, 1981, p. 96).
Embora no ordenamento jurídico americano não pos-
sua uma definição específica de joint venture, os elemen-
tos essenciais deste instrumento tangem como”the coming
together of two (or more) independent business for the
sole purpose of achiving a specific outcome that would no
have been achievable by any one of the firms40” (WALLA-
CE, 2004, 95).
Assim, mesmo diante da impossibilidade de concei-
tuar-se de forma concreta o instituto, diversos autores
buscam em uma definição ideal. Dentre os estudiosos
brasileiros, as joint ventures são definidas como mecanis-
mos de cooperação entre empresas, que não têm forma
específica, tendo em vista sua origem e seu caráter con-
tratual: possuem natureza associativa (partilha de meios
e riscos), podendo apresentar objetivos e duração limi-
tados ou ilimitados (BASSO, 2002, p. 67). Já para Irineu
Strenger, a definição é relativa e de difícil enquadramen-
to diante de suas enormes variantes.
A terminologia relativa às Joint Ventures é aluvionária,
pois se pode falar de co-adventure, sindicate group,
pool, joint enterprise, joint undertaking, joint specula-
tion, partnership for a single transaction. […] Pode-se,
pois, dizer que o conceito de joint venture constitui um

40 Em tradução livre: a reunião de dois (ou mais) negócios independentes com o único objetivo de
obter um resultado específico que não seria possível por nenhuma das empresas.

100
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

genus cuja natureza jurídica exata é individual caso a


caso, tendo em conta as relações particulares que a ela
se refere. Daí a dificuldade de enquadrar as suas enor-
mes variantes (STRENGER, 2007, p. 429).
De qualquer forma, percebe-se que a essência deste
contrato é o objetivo comum, em que se cria uma entidade
distinta de seus membros na finalidade pela busca de um
fim acordado previamente.
Neste cenário, a Hyundai Motors, multinacional sul-co-
reana de automóveis, juntamente com a empresa Aptiv,
empresa de soluções tecnológicas de mobilidade, que in-
clui sistemas de percepção, programas de algoritmos, pla-
taformas computacionais e distribuição de ”datas”, anun-
ciaram a formação de uma joint venture, com participação
50/50, focada no desenvolvimento de automóveis com
sistemas autônomos de nível 4 e 5 a partir de 2020 para
comercialização em 2022.
Não obstante, inerente à produção dos automóveis, as
empresas buscam com essa parceria características-bases
das joint-ventures, qual seja o acesso das mesmas a novos
mercados consumidores, canais de distribuição diferencia-
dos, inovação tecnológica, acesso a patentes e licenças, com
o intuito de conquistarem vantagem competitiva em relação
às empresas concorrentes (RODRIGUES, 1999, p. 186).
O investimento inicial para a empreitada, constitui em
quantia em dinheiro e o valor agregado de serviços e pes-
quisa e desenvolvimento de produtos. A Aptiv contribuirá
com sua tecnologia de direção autônoma e, com aproxi-
madamente 700 funcionários. Já a Hyundai Motor Group
fornecerá US$ 1,6 bilhão em capital e US $ 400 milhões em
serviços de engenharia, recursos de P&D e acesso à pro-
priedade intelectual, abrangendo um total de U$ 4 bilhões.

101
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

As empresas optam por estabelecer joint-ventures ao


invés de outros tipos de contratos de cooperação quando
os riscos envolvidos são altos, pois com o compartilha-
mento de capital ou ações previstos neste tipo de aliança
estratégica, a dissolução da parceria é difícil.
A grande reflexão subjacente a este tipo de estratégia é
o aumento de bem-estar social e como tal refletir-se nos
consumidores sem que para tal seja necessário uma fusão
entre as partes (PINHO, 2013, p. 124).
Desta forma, devemos observar que a cooperação en-
globa a figura de um acordo contratual, pela qual as par-
tes decidem, de livre e espontânea vontade, e de acordo
com o princípio bona fides, exercerem uma determina-
da atividade ou prosseguirem um mesmo fim em mútua
comparticipação, distribuindo, assim, os lucros e repar-
tindo os prejuízos.
Ainda, sob a perspectiva da Teoria da Firma, conceito
criado por Coase, as ‘’firmas’’ são organizadas para atu-
arem nos mercados com o objetivo de diminuir os cus-
tos de transação, que são incorporados por terceiros em
negociações econômicas, ou seja, os agentes econômicos
não atuam de forma direta no mercado, as empresas são
estruturadas para tanto (COASE, 1937, p. 43). A firma, per-
mite centralizar, organizar a produção, e com isso se reduz
os custos de ir a mercados (SZTAJN, 2004, p. 187).
Inobstante, Williansom (2002, p. 602) demonstra a
necessidade de considerar a empresa não apenas como
função de produção e sim, como uma estrutura de go-
vernança, cuja estrutura interna tem finalidade e efeito
econômico, a exemplo dos contratos incompletos, em
que ao seu grau de incompletude, induz ao individua-
lismo das partes:

102
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

If the contract is seriously incomplete in these respects


but, once the original negotiations are settled, the con-
tracting parties are locked into a bilateral Exchange, the
divergente interests between the parties will predictably
lead to individually oportunistic behavior and joint losses
(WILLIANSOM, 1971, p.117)41.
Inerente à relação entre os agentes econômicos, estão
os custos de transação, que ‘’influem diretamente na inte-
ração entre os agentes, alternando as condições de nego-
ciação e, por conseguinte, de preço (RIBEIRO; JÚNIOR,
2015, p. 123).
Em uma economia capitalista de mercado, a empresa se
apresenta como principal mecanismo de desenvolvimento
da economia ao criar e fazer circularem as riquezas em
maior proporção (DOURADO, 2018, p. 348). O crescimen-
to da empresa deve ser proporcional às suas atividades,
de modo a atender a maior demanda do mercado, porém,
nem sempre este crescimento acarretará melhores resulta-
dos econômicos.
Ronald Coase (1937, p. 394-395) propõe três justi-
ficativas para esse fenômeno: i) quanto maior a em-
presa, maiores serão os custos de organizar uma nova
transação dentro de sua estrutura; ii) maiores serão
as dificuldades na alocação eficiente dos fatores de
produção em uma empresa grande e; iii) as empresas
pequenas costumam receber mais vantagens do Estado
do que as grandes.

41 Em livre tradução: ‘’Se o contrato estiver seriamente incompleto nesses aspectos, mas, uma
vez estabelecidas as negociações originais, as partes contratantes serão trancadas em uma bolsa
bilateral, os interesses divergentes entre as partes levarão, previsivelmente, a comportamentos
oportunistas e perdas conjuntas’’

103
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

A ESTRATÉGIA DA FORMAÇÃO DE JOINT VENTURE


DA HYUNDAI E APTIV
Uma empresa que busca integração vertical, geralmente
é motivada a fortalecer sua posição em seu negócio cen-
tral, através da eliminação de custos de mercado, melhor
controle para estabelecer qualidade e proteção de tecno-
logia (HITT; IRELAND, 2003, p. 246).
Em um mercado de concorrência acirrada, a assimetria
de informações pode representar um fator positivo para a
competição, pois reflete a estratégia adotada pelo agente
econômico em busca da maior eficiência.
Nas relações empresárias, a assimetria de informações
representa um problema e dificulta a tomada de decisões
eficientes em processos de transferência que envolvem,
por exemplo, a tecnologia (ARAÚJO, 2007. P. 282-283), e
elevam os custos de transações com atitudes preventivas.
De outro lado, aponta-se como vantagens obtidas atra-
vés de joint-ventures, podem ser destacados: compartilha-
mento de habilidade, recursos, capital e risco; maior poder
de penetração em novos mercados, economia de escala;
redução de custos, transferência tecnologia entre firmas,
competitividade, inserção de produtos em novos merca-
dos, maior participação de mercado (market share) entre
as organizações, P&D, produção conjunta, acordos bila-
terais, acesso a novos canais de distribuição, aumento do
nível de cooperação e desempenho entre as empresas en-
volvidas, entre outros (KOTLER, 2000, p. 33); (LOU, 2002,
p. 910); (INPKEN, 2006, p. 420).
As principais dificuldades encontradas na formação de
joint-ventures podem ser: alto nível de confiança entre
as empresas participantes; definição dos critérios de re-
partição de direitos e obrigações; resolução de confli-

104
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

tos; critérios para transferência de tecnologia; diferenças


culturais para formação; expansão da aliança; comporta-
mento oportunista pelo parceiro local; percepção de ris-
co do parceiro local; governança pós-formação; vida útil
limitada; e estrutura de governança estática e relacional
(BAKER;, GIBBONS, 2002, p. 99); (HSIEH; RODRIGUES,
2010, p. 264).
A noção de racionalidade limitada assume ponto focal
ao tratarmos da Joint Venture entre as duas empresas, sa-
bendo que estas são incapazes de conhecer todas as pos-
sibilidades ou precaver as consequências de suas ações.
De modo a reduzir esses riscos, como uma tentativa racio-
nal de incremento de seu desempenho, que se justifica a
cooperação entre as empresas.
Destas ações que se vislumbra a construção das institui-
ções que buscam padrões de condutas preventivos frente
às incertezas das relações, definindo salvaguardas contra o
risco (WILLIAMSON, 1985, p. 46).
Por fim, a estrutura da Joint Venture se verifica da inter-
nalização na firma de estágios da cadeia produtiva, elimi-
nando custos de transação, como os de negociações con-
tratuais entre entidades distintas, por exemplo a negociação
entre a tecnologia de condução autônoma, da Aptiv, para a
aplicação dos automóveis produzidos pela Hyundai.

CONCLUSÕES
Os contratos Joint Venture mostram-se como uma alter-
nativa eficaz na estratégia empresarial, sobretudo no que
respeita ao contexto internacional, dado que decorrem da
associação de empresas para alcance de um objetivo de
interesse comum, promovendo a expansão e permanência
como player na competitividade.

105
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Por isto, o contrato de joint venture é um instrumento


de cooperação no qual, em efeitos prendem-se a sua pre-
ferência face às fusões e aquisições, ao elevado custo de
obtenção, ou, até mesmo, quando o ambiente concorren-
cial é incerto e pouco claro, onde se afiguram possíveis
obstáculos de difícil ultrapassagem.
As partes, ao decidirem contratar por meio desse ins-
trumento, não buscam necessariamente às estraves da le-
gislação, mas sim, estabelecer e consolidar seus interesses
empresariais, deixando especificado suas ambições, finali-
dades e objetivos que impulsionam da união.
Para possibilitar a resposta à pergunta norteadora da
investigação, elegeu-se a Análise Econômica do Direito
como marco teórico para o desenvolvimento do trabalho,
justamente pela análise fática que corresponde aos anseios
do mercado.
Ato contínuo, explicou-se a teoria dos custos de transa-
ção de Williamson, por se identificar aos custos à celebra-
ção, execução e manutenção de contratos, que impedem
que relações jurídicas tenham máxima eficiência tão so-
mente pela barganha.
Assim, diante da análise, observa-se que a Joint Ventu-
re é um instrumento eficaz para a maximização dos inte-
resses das empresas (segurança x lucros), de modo que
diminuem os custos de transação e, com isto, alavancam
o desenvolvimento econômico e social. E, ainda, que as
Joint Ventures podem representar um meio eficiente para
o investimento e cooperação entre empresas, sabendo que
ambas maximizam seus esforços permitindo concretização
de seus interesses negociais.

106
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

REFERÊNCIAS
Aptiv and Hyundai Motor Group to Form Autonomous Driving
Joint Venture. 23 de set. 2019. Disponível em: https://www.aptiv.
com/media/article/aptiv-and-hyundai-motor-group-to-form-auto-
nomous-driving-joint-venture. Acesso em: 03 de nov. 2019.
ARAÚJO, Fernando. Teoria Econômica do Contrato. Coimbra: Al-
medina, 2007.
ASTOLFI, Andrea. El contrato international de joint venture. [ed.]
Depalma. Buenos Aires: s.n., 1981.
BAKER, G., GIBBONS, R,. Relational contracts in strategic allian-
ces. Cambridge: MIT, Sloan School of Management, 2003. Dispo-
nível em http://www.nber.org/books_in_progress/stragalli/baker.
pdf. Acessado em 18 de dez. 2019.
BAPTISTA, Luiz Olavo. A Joint venture: uma perspectiva comparatista.
Revista de Direito Mercantil. São Paulo: [s.n.], n. 42, abril/junho 1981.
BASSO, Maristela. Joint ventures: manual prático das associações
empresariais. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.
CARVALHO, Patrícia. Joint venture: uma visão econômico-jurídica
para o desenvolvimento empresarial. Curitiba: Juruá, 2003.
CHEN, C. C., Peng, M. W. & SAPARITO, P. A. Individualism, collec-
tivism, and opportunism: a cultural perspective on transac-
tion cost economics. Journal of Management., 2002.
CLARK, K. B.; FUJIMOTO, T. Product development performance:
strategy, organization and management in the world auto in-
dustry. 1. ed. Boston: Harvard Business School Press, 1991.
COASE, Ronald. The problem of social cost. Journal of Law and
Economics, Vol. 3 (Oct., 1960), pp. 1-44. University of Chicago
Press. October, 1960.
COSTA, Mariana Fontes da. Da alteração superveniente das cir-
cuntancias: em especial à luz dos contratos bilateralmente
comerciais. Almedina, Coimbra, 2017.
FERRAZ, Daniel Amin. Joint venture e contratos internacio-
nais. Belo Horizonte: Mandamentos, 2001.

107
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

FORGIONI, Paula A. Teoria Geral dos Contratos Empresariais.


São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. FREIRE, Maria Paula dos
Reis Vaz. Eficiência econômica e restrições verticais – os argu-
mentos de eficiência e as normas de defesa da concorrência.
Alameda da Universidade: Lisboa, 2008.
GONÇALVES, Oksandro. O princípio da eticidade no direito contra-
tual. in Nalin, Paulo (Org). Princípios de Direito Contratual -
Contratos & Sociedade. vol. 1, 1. ed. (2003), 3a reimpressão (ano
2010). Juruá Editora: Curitiba.
GRAU. Eros Roberto. Joint ventures e transferência de tecnologia:
lei de informática. Revista de Direito Mercantil. [s.l. : s.n.], n. 79, s.d.
GULATI, R., Nohrian, N, & Zaheer. A. Strategic netwoks.Strategic
Management Journal. 2000.
HSIEH, L. H. Y., RODRIGUES, S. B., & Child, J. (2010). Risk percep-
tion and post-formation governance in international joint
venture in Taiwan: the perspective of the foreign partner.
Journal of International Management, 2010.
INPKEN, A. Strategic alliances. In: Hitt, M., Freeman, R. E., & Harrisson,
J. S.. The blackwell handbook of strategic management, 2a.ed, 2006.
KOTLER, P. Administração de Marketing: a edição do novo milê-
nio. (10ª ed.). São Paulo: Prentice Hall. 2000.
KPMG’s Global Automotive Executive Survey 2017. KPMG INTER-
NACIONAL, jan. 2017. Disponível em: <https://assets.kpmg.com/
content/dam/kpmg/xx/pdf/ 2017/01/global-automotive-executive-
survey-2017.pdf> Acesso em: 9 dez. 2019.
LOU, Y. Contract, cooperation, and performance in internatio-
nal joint ventures. Strategic Management Journal, 2002.
MACKAY, Ejan; ROUSSEAU, Stéphane. Análise Econômica do Direi-
to. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2015.
OLIVEIRA, C. E. E. & LEAL, T. A. C. B. Considerações sobre os Veícu-
los Autônomos – possíveis impactos econômicos, urbanos e das
relações jurídicas. Brasília: Núcleo de Estudos e Pesquisas/CON-
LEG/Senado, outubro/2016 (Texto para Discussão nº 214). Disponível
em: www.senado.leg.br/estudos. Acesso em 17 de dez. de 2019.

108
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

PINHEIRO, Armando Castelar; SADDI, Jairo. Direito, economia e


mercados. 4. Reimpressão. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
POPPO L; ZENGER T. Do formal contracts and relational gover-
nance function as substitutes or complements? Strategic Ma-
nagement Journal. 2002.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; GALESKI JÚNIOR, Irineu. Contratos
empresariais e análise econômica. 2. ed. rev., atual. e ampl. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.
RODRIGUES, S. B. Formação de alianças estratégicas em países
emergentes: o caso Brasil-China. In: Rodrigues, S. B. (org.).
Competitividade,alianças estratégicas e gerências internacional.
São Paulo: Atlas, 1999.
STRENGER, Irineu. Contratos internacionais de comércio. 4. ed.
São Paulo: LTr, 2003.
_______, Irineu. Contratos Internacionais do Comércio. 7a edição.
LTR, 2007.
SZTAJN, Rachel. Teoria jurídica da empresa: atividade empresária
e mercados. São Paulo: Atlas, 2004.
TSANG, E. W. K. Transaction Cost and Resource-Based Explana-
tions of Joint Ventures: A Comparison and Synthesis. Organi-
zation Studies, 2000.
VILLELA, Ana Lucia Bonini A formação de joint ventures como
alternativa para investimentos no setor sucroalcooleiro bra-
sileiro. Franca: UNESP, 2008.
WALLACE, Robert L. 2004. Strategic Partnerships, An Entrepre-
neur’s Guide to Joint Ventures and Alliances. Chicago: Dear-
born Trade Publishing, 2004.
WILLIAMSON, Oliver. The economic institutions of capitalism.
New York, NY, USA: The Free Press, 1985.
_________. The theory of the firm as governance structure: from
choice to contract. 2002.
ZYLBERSZTAJN, Decio; SZTAJN, Rachel. Direito & economia: aná-
lise econômica do direito e das organizações. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2005.

109
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

BRAZIL IS HEADING NORTH

Andrei Lemisz Silverio dos Santos42 e


Eduardo Oliveira Agustinho43

Resumo: Devido ao acesso e melhorias das tecnologias


contemporâneas, um novo formato de empreendimento
surgiu: as denominadas startups. Essas empresas começam
pequenas e com poucos recursos, mas são capazes de al-
cançar ganhos financeiros altos devido à escalabilidade das
inovações que produzem. Mas, para que esse empreendi-
mento tenha sucesso, os empreendedores precisam vencer
diversos obstáculos, tanto de mercado quanto burocrático.
Nesse contexto, o Brasil editou a Lei Complementar 167
em 24 de abril de 2019, criando uma forma facilitada para
a formalização de novas startups. O objetivo do presente
estudo é de verificar se essa alteração contribui para que
essas empresas superem seus desafios iniciais. Para isso,
buscou-se como metodologia a busca por bibliografia no
tema de startups, Direito das startups e análise econômica
do Direito, além de estudos realizados por organizações a
respeito do tema. A partir dessas informações, foi possível
analisar os problemas mercadológicos enfrentados pelas
startups modernas e as novidades trazidas pela lei, uti-
lizar o ferramental da Análise Econômica do Direito, em
especial a teoria de Douglass North, de forma a concluir
pela eficiência, ou não, da alteração legislativa. O resul-
tado dessa análise foi a de que a Lei Complementar con-
tribui para que as startups vençam duas barreiras iniciais
para sua criação: a burocracia na formalização do empre-

42 Graduando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná.


43 Doutor em Direito Econômico e Socioambiental pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

110
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

endimento e a proteção da propriedade intelectual. Este


resultado contribui para o Estado brasileiro, uma vez que
o incentivo à inovação trazido pela lei tem a capacidade
de incentivar o desenvolvimento econômico do país, além
de permitir o acesso de novos agentes às oportunidades
econômicas. Espera-se que o Brasil continue seguindo o
rumo adotado pela Lei Complementar 167 de 2019, crian-
do novas leis de incentivo a inovação e melhorando o
ambiente das startups no país.
Palavras-chave: análise econômica do direito, startup,
inovação, desenvolvimento, Douglass North.

INTRODUÇÃO
O título deste artigo advém da expressão norte-americana
heading south, que significa seguir em direção à um caminho
ruim. O contrário da expressão, heading north, significa alte-
rar a situação para um bom caminho, além de que North é o
sobrenome do economista Douglass North, que serve como
referencial teórico para o presente trabalho. Assim, surgiu o
título Brazil is Heading North, com sentido duplo, para indi-
car que a conclusão do presente trabalho aponta para uma
mudança positiva no país, além de informar qual a teoria
econômica que será aplicada na análise.
O presente estudo tem como objeto o ambiente insti-
tucional das startups no Brasil e os efeitos da Lei Comple-
mentar 167 de 2019, que trouxe essas organizações para o
ordenamento jurídico brasileiro. Como objetivo, busca-se
verificar se essa lei trouxe um ambiente mais favorável
para o surgimento e desenvolvimento dessas empresas.
Para alcançar o objetivo proposto, o presente trabalho
utiliza como ferramenta de análise a teoria econômica
institucional. Dentre os defensores dessa corrente, desta-

111
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

cam-se Douglass C. North, Daron Acemoglu, James A. Ro-


binson, Robert D. Cooter e Hans-Bernd Schäfer, que são
utilizados para embasar a importância do Direito para o
desenvolvimento econômico dos países.
O trabalho se inicia com a exposição das teorias eco-
nômicas e os conceitos essenciais que serão utilizados na
presente análise. Em seguida, o trabalho passa a apresentar
o ambiente das startups durante o seu ciclo de existência.
Por fim, o trabalho passa a empregar os conceitos econô-
micos para analisar os impactos da Lei Complementar 167
de 2019 no ambiente institucional dessas organizações.
Com isso, busca-se avaliar se a lei incentiva a criação
e desenvolvimento das startups. Com base nesta conclu-
são, será possível contribuir para o debate do crescimento
econômico nacional, haja vista a importância da inovação
para a criação e acúmulo de riquezas no contexto da eco-
nomia globalizada.

DESENVOLVIMENTO
DA TEORIA ECONÔMICA INSTITUCIONAL
DE DOUGLASS NORTH
A economia é a ciência das escolhas dos indivíduos
(GICO JR, 2011, p. 17). Durante anos os economistas bus-
caram sistematizar as variáveis que influenciam na tomada
de decisões, de forma a prever o comportamento espera-
do dos sujeitos.
Neste âmbito, diversas teorias surgiram com novas ideias
e com focos diferenciados para atacar o problema da es-
colha humana. Em uma visão dicotômica e simplificada,
pode-se entender que parte dos economistas defende que
o ser humano é um animal racional, que escolhe a alter-
nativa que maximiza sua riqueza, e que esse pressuposto

112
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

é útil para a compreensão do comportamento humano,


enquanto outra parte acredita que essa amostra de com-
portamentos do ser humano influenciadas pelas limitações
no exercício dessa pretensa racionalidade é relevante, e,
portanto, deve ser considerada e estudada pela economia
na interpretação do comportamento do ser humano em
um ambiente de escolha pautada pela escassez.44
Inserido neste contexto e alterando o objeto foco da
análise econômica surge Douglass C. North e sua teoria
das instituições e organizações, para contribuir na explica-
ção dos comportamentos humanos.
De acordo com North (2018, p. 13-14), existem duas
forças que agem sobre a tomada de decisão dos sujeitos:
as instituições formais e as informais. Por instituições for-
mais, ele entende as regras escritas, que podem se ma-
terializar em constituições, leis, decretos, regulamentos
ou contratos. Por outro lado, as instituições informais são
aquelas compostas por códigos de conduta e costumes,
sem serem formalmente escritas, mas que são seguidas
pelos indivíduos.
As instituições influenciam nos custos de transação que
são avaliados pelos sujeitos no momento de realizarem
trocas voluntárias entre si. O papel destas, sejam formais
ou informais, é contribuir para reduzir os custos neces-
sários para que as trocas ocorram, através da criação de
estruturas de fiscalização e outras que garantam a executi-
vidade dos acordos.
Segundo North (2018, p. 37-38), o motivo que funda-
menta a existência das instituições e a sua capacidade de
influenciar os custos de transação é a incerteza que os
44 Fazemos referência as teorias clássicas da economia e a nova teoria institucional. Não se pretende
aprofundar na diferença entre a teorias, por não ser objeto do presente estudo. Para mais informa-
ções, ver RIBEIRO;AGUSTINHO, 2011, p. 121-122.

113
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

indivíduos possuem no momento de contratar uns com os


outros. De acordo com o autor, em uma contratação ordi-
nária as partes possuem dois vícios que impactam na sua
escolha: a sua própria percepção subjetiva da realidade e
a limitação informacional.
Todo sujeito possui uma visão particular de como o
mundo funciona, ou de como ele deveria funcionar. Alia-
do a isso, os valores pessoais levam as pessoas a avaliar
de forma diferente as mesmas situações. Além disso, nor-
malmente o ser humano não toma conhecimento de todas
as variáveis que são capazes de impactar em sua escolha,
bem como não tem a capacidade de processar todas essas
informações, mesmo se elas fossem alcançáveis.
Como resultado desses dois elementos, no momento da
troca não é possível ter certeza sobre o resultado daquela
interação. Ambas as partes apenas têm a confiança uma
na outra e nas instituições aplicáveis àquela interação para
determinar os custos de transação incidentes.
Esse mesmo problema é abordado pelos economistas
Robert D. Cooter e Hans-Bernd Schäfer (2017, p. 17-18),
sob a denominação de “dilema da confiança mútua”. Os
autores, em obra intitulada O Nó de Salomão, afirmam que
a incerteza gerada no momento de transacionar é causada
pela assimetria informacional entre os sujeitos, em outras
palavras, pela incapacidade de ambas as partes terem os
mesmos conhecimentos no mesmo momento. Com o ob-
jetivo de combater esse desequilíbrio, os autores defen-
dem que o Direito é o instrumento capaz de minimizar os
custos de transação, através do estabelecimento de regras
claras e executáveis.
Não apenas isto, os autores também defendem que o
motivo pelo qual determinados países alcançam níveis de

114
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

desenvolvimento econômico mais elevado é diretamente


relacionado com a solidez das regras jurídicas economica-
mente eficientes. Em um país com claros direitos de pro-
priedade, com segurança jurídica e eficiência na execução
de contratos, os custos de transação são reduzidos, o que
incentiva a inovação e que, por consequência, aumenta a
riqueza das nações (COOTER; SCHÄFER, 2017, p. 22-26).
Ao traçar um paralelo entre a teoria de North e o tra-
balho de Cooter e Schäfer, é possível identificar que as
instituições são responsáveis pela redução nos custos de
transação e no incentivo a inovação. O que diferencia
a abordagem de Cooter e Schäfer, todavia, é que estes
focam sua análise nas instituições formais, aquelas re-
guladas pelo Direito, mais especificamente os direitos
de propriedade, contratuais e comerciais, enquanto que
North busca criar uma base teórica que desse conta de
explicar a influência das regras formais e informais nas
decisões dos agentes.
Para ampliar a análise do tema, a obra Why Nations
Fail, de Daron Acemoglu e James A. Robinson (2012, p.
42), utiliza como fundamento para a prosperidade e a po-
breza as instituições prevalecentes em uma determinada
sociedade. Os autores afirmam que as instituições econô-
micas são responsáveis pelo sucesso ou fracasso de um
país, uma vez que essas regulam a estrutura de incentivos
para as ações dos indivíduos.
Em uma sociedade extrativista e não democrática, a es-
trutura de incentivos tende a desvalorizar a iniciativa pri-
vada e a busca por riquezas individuais. Por outro lado,
em uma sociedade democrática as regras tendem a permi-
tir que o indivíduo seja proprietário daquilo que produz
com esforço próprio, o que gera como consequência o

115
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

incentivo a inovação e o crescimento econômico do país.


Com base nesses modelos, Acemoglu e Robinson se
aproximam da teoria de Cooter e Schäfer, pois ambos de-
fendem que instituições sólidas e direitos de propriedade
bem definidos são essenciais para o desenvolvimento eco-
nômico. Sem esses direitos, o início da atividade econô-
mica não ocorre, a inovação não é incentivada e o país se
mantêm em uma situação de estagnação.
Ao considerar as contribuições dos mencionados auto-
res, utilizando os conceitos e a estrutura desenvolvida por
Douglass North, é possível conceber um instrumental eco-
nômico que visa analisar o sistema de regras, formais e in-
formais, incidentes sobre uma nação, averiguar a estrutura
de incentivos resultante dessas regras para avaliar se esse
sistema contribui para a inovação e para a riqueza do país.
Utilizar essa ferramenta em um ambiente específico das
startups é relevante, uma vez que essas organizações con-
centram o foco em inovação e os problemas de incerteza
e confiança abordado pelos autores estudados acima. Com
essa finalidade, o próximo tópico abordará o ambiente
mercadológico e jurídico das startups no Brasil, para, en-
tão, aplicar a teoria institucional e concluir pela eficácia
ou não do modelo atual, considerando-se como eficácia,
nesse caso sob investigação, a possibilidade de se deduzir
que o regime jurídico proposto como instituição formal
induz a uma facilitação ao surgimento de startups no mer-
cado nacional.

DO AMBIENTE MERCADOLÓGICO DAS STARTUPS


Ao identificar e conceituar o termo instituição para sua te-
oria econômica, North (2018, p. 16-18) as distingue das cha-
madas organizações. Essas últimas se referem ao agregado

116
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

de pessoas que se unem para alcançar uma finalidade em


comum, normalmente organizados em uma cadeia hierárqui-
ca e com estruturas próprias de gestão e divisão do trabalho.
Ao utilizar o conceito proposto por North, pode-se che-
gar ao entendimento de que as startups são organizações
dentro de um cenário institucional específico. Porém, esse
conceito não compreende os elementos que tornam essas
empreitadas diferentes das empresas tradicionais.
Para Eric Ries (2012, p. 24), o elemento que diferencia
as startups das demais organizações econômicas é o uso da
tecnologia e o ambiente de extrema incerteza na qual essas
empresas estão inseridas. Por outro lado, Steven Blank e
Bob Dorf (2014, p. 503) conceituam o termo startup como
um momento temporário de uma organização, onde há
busca pelo desenvolvimento de um produto inovador.
Independente do conceito específico adotado, o contex-
to mercadológico que se impõe para startups é similar para
esse tipo de organização, tendo riscos e incertezas como
pontos centrais. A literatura apresenta alguns desses riscos:
a empresa não conseguir desenvolver o produto; o produto
não ser adotado pelo mercado; a forma de entrega do pro-
duto não cumpre com as expectativas dos consumidores; a
dificuldade de regularizar a atividade diante das formalida-
des impostas pela legislação (SPINA, 2015, p. 42-45).
Todavia, não somente esses riscos são aplicáveis as
startups. A literatura mostra que essas empresas possuem
acesso escasso à capital no início do seu desenvolvimento,
momento no qual é preciso atravessar diversas barreiras
para alcançar um desenvolvimento autossustentado. A im-
possibilidade de conseguir acesso a recursos no início da
sua atividade também se revela como risco, que pode ser
elevando dependendo do país.

117
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Com base nesse cenário, as startups normalmente bus-


cam investimento externo para conseguir vencer as eta-
pas iniciais de desenvolvimento. Esse investimento nor-
malmente advém de três fontes: pessoas com relações
familiares ou de amizade com os fundadores da empresa;
empréstimo privado com investidores ou bancos; emprés-
timos públicos em bolsa de valores ou crowdfunding (SPI-
NA, 2015, p. 33-36).
Para cada forma de investimento externo a empresa
enfrenta situações diferentes. O investimento por pessoas
com laços pessoais com os fundadores tende a ter a me-
nor taxa de juros, porém com o menor valor agregado.
Isso aliado ao fato de que essa forma de investimento ten-
de a ser limitada, o que muitas vezes não é suficiente para
que a organização vença os obstáculos iniciais.
O empréstimo privado, segunda forma de aquisição de
recursos, depende da estrutura de bancos e investidores
para ocorrer. Bancos normalmente oferecem recursos com
altas taxas de juros, o que pode significar em uma barreira
intransponível no futuro. Os investidores, mais especifi-
camente os denominados investidores-anjos, geralmente
são a solução adotada por diversas startups, uma vez que
aliam recursos com expertise e rede de contatos que auxi-
liam no desenvolvimento da empresa (COELHO; GARRI-
DO, 2016, p. 116).
Porém, nesse momento as startups encontram de forma
mais intensa o problema da confiança mútua, exposta por
Cooter e Schäfer. Para conseguir o investimento necessário
advindo dessa modalidade, as startups precisam revelar os
segredos e técnicas utilizadas na empresa para o investi-
dor, com a finalidade de validar a organização nos olhos
deste. Ao fazer isso, os fundadores correm o risco de te-

118
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

rem sua inovação roubada pelo investidor e vendida para


outro competidor no mercado (COOTER; SCHÄFER, 2017,
p. 45). Não tomar esse risco, todavia, pode inviabilizar o
negócio por falta de recursos.
A terceira modalidade, investimento público, só ocorre
em sociedades onde existam estruturas que permitam a
ocorrência desse investimento. Trata-se da obtenção de
recursos por terceiros alheios ao negócio, sem que seja
firmado um contrato individual de investimento com cada
um deles, através de uma oferta pública de alguma re-
compensa para aqueles que aportarem recursos. Essa mo-
dalidade pode ser exemplificada na compra de ações em
bolsa de valores ou em investimentos de crowdfunding
possibilitados pela internet.
Em resumo, as startups são organizações sujeitas a di-
versos riscos e incertezas em grau mais acentuado que
organizações econômicas tradicionais. Com a finalidade
de vencer os riscos iniciais, essas empresas precisam de
investimento externo, sejam aqueles derivados de fami-
liares ou amigos, até aqueles advindos de investidores
ou do público. Também é preciso enfatizar que a prote-
ção da ideia que está sendo desenvolvida pela empresa
representa preocupação constante dos empreendedores.

DO AMBIENTE INSTITUCIONAL DAS STARTUPS –


ANÁLISE DA LEI COMPLEMENTAR 167 DE 2019
Até abril de 2019, o ordenamento jurídico brasileiro
não reconhecia as startups como organizações diferen-
ciadas. A lei submetia essas empresas ao regime geral das
sociedades empresariais tradicionais e ignorava grande
parte das necessidades específicas que as empresas de
inovação possuem.

119
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

No ordenamento brasileiro até então só era possível en-


contrar menção implícita as startups na Lei Complementar 155
de 2016. Essa lei trouxe para o ordenamento jurídico a figura
do investidor-anjo e regulou uma forma de aporte de capital
possível entre este e empresas de inovação. Embora a lei não
tenha trazido o termo startup, entende-se que o objetivo foi
atingir esse tipo de organização, vez que o instituto do investi-
dor-anjo é conhecido dentro desse mercado específico.
Porém, essa situação se alterou com a publicação da
Lei Complementar 167 em 24 de abril de 2019. O artigo 13
desta lei incluiu na Lei do Simples Nacional o artigo 65-A,
que traz e conceitua o termo startups além de regulamen-
tar normas específicas para elas.
Como primeira novidade desta Lei Complementar é
possível elencar que, pela primeira vez no ordenamento
brasileiro, o termo startup foi conceituado. Assim dispõem
os parágrafos 1º e 2º do novo artigo 65-A:
§ 1º Para os fins desta Lei Complementar, considera-se
startup a empresa de caráter inovador que visa a aperfei-
çoar sistemas, métodos ou modelos de negócio, de pro-
dução, de serviços ou de produtos, os quais, quando já
existentes, caracterizam startups de natureza incremen-
tal, ou, quando relacionados à criação de algo totalmente
novo, caracterizam startups de natureza disruptiva.
§ 2º As startups caracterizam-se por desenvolver suas
inovações em condições de incerteza que requerem ex-
perimentos e validações constantes, inclusive mediante
comercialização experimental provisória, antes de proce-
derem à comercialização plena e à obtenção de receita.
É possível encontrar dois conceitos de startup nesse
dispositivo: startups incrementais e disruptivas. As pri-
meiras são aquelas que buscam melhorar algo existente,

120
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

enquanto a segunda se busca a criar algo inexistente no


mercado até o momento. Ainda, o parágrafo 2º reforça a
característica central a qual essas organizações estão sujei-
tas, o alto grau de incerteza.
O conceito trazido pela Lei Complementar não limita o
tipo de startup que poderá se beneficiar dessa lei. Ao per-
mitir tanto as startups incrementais como as disruptivas, a
lei abrange todo tipo de empreendimento em inovação,
limitado apenas pelo requisito de incerteza previsto no
parágrafo 2º. Essas disposições, portanto, não represen-
tam problema para o ambiente de inovação (FERREIRA;
CAMARA; GHERINI; VALENTIM, 2019).
As empresas que se enquadram no conceito legal de
startup e que se autodeclaram como tal podem se beneficiar
do sistema Inova Simples, criado pela lei. Esse sistema traz
duas modificações estruturais para a formalização dessas
organizações e para a proteção da propriedade intelectual.
A primeira modificação está na forma de registrar a startup e
obter o número do Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ):
§ 3º O tratamento diferenciado a que se refere o caput deste
artigo consiste na fixação de rito sumário para abertura e
fechamento de empresas sob o regime do Inova Simples,
que se dará de forma simplificada e automática, no mesmo
ambiente digital do portal da Rede Nacional para a Simplifi-
cação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios
(Redesim), em sítio eletrônico oficial do governo federal,
por meio da utilização de formulário digital próprio, dispo-
nível em janela ou ícone intitulado Inova Simples.
§ 5º Realizado o correto preenchimento das informações,
será gerado automaticamente número de CNPJ específi-
co, em nome da denominação da empresa Inova Sim-
ples, em código próprio Inova Simples.

121
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Essa alteração, que pode parecer pequena, surge


para resolver um problema grave no ambiente empre-
sarial brasileiro: a burocracia necessária para abrir um
novo empreendimento e para encerrá-lo na hipótese
de insucesso.
A formalização da empresa apenas traz benefícios aos
empreendedores. Em primeiro lugar, a constituição de
uma pessoa jurídica, valendo-se do tipo societário so-
ciedade limitada, ou mesmo outro tipo societário de res-
ponsabilidade limitada, pode limitar a responsabilidade
patrimonial dos seus sócios, que só responderão pes-
soalmente pelas obrigações da sociedade em caso de
desconsideração da personalidade jurídica (RAMALHE-
TE, p. 835-844). Além disso, dentro do sistema tributário
brasileiro vigente, tem-se que os custos fiscais tendem a
ser menos impactantes para o negócio desenvolvido por
pessoa jurídica do que para a pessoa natural, quando o
empresário opta por exercer a atividade econômica pro-
fissional em seu próprio nome.45
Todavia, mesmo com a existência destes benefícios, a
formalização das empresas não ocorre para a maioria dos
empreendimentos no Brasil. Segundo pesquisa realizada
pelo SEBRAE (2019), 71% dos donos de negócios no Brasil
não se valem de pessoa jurídica constituída, ou mesmo do
registro para o exercício regular da atividade econômi-
ca. Especificamente nos setores de serviços e comércio, a
porcentagem de não formalizados chega em 65% e 57%,
respectivamente.

45 O cálculo do imposto de renda leva em conta diversos fatores, como a origem da renda e de-
duções previstas pela lei. Via de regra, a alíquota incidente desse imposto para pessoa física é
de 25%, segundo a Lei 8.134 de 1990. Para pessoa jurídica, o imposto pode ser calculado de três
formas: lucro real, lucro presumido e simples nacional. A alíquota das duas primeiras modalidades
é de 15%, de acordo com a Lei 9.249 de 1995, enquanto que a alíquota do simples nacional vai de
4% até 19% de acordo com a receita bruta.

122
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Entende-se que um dos motivos que levam a esses nú-


meros exorbitantes de informalidade é a dificuldade buro-
crática para a formalização da empresa. Segundo o índice
Doing Business (2018), a média de tempo necessária para
abertura de uma empresa no Brasil é de 79,5 dias, após a
realização de uma média de 11 procedimentos. Em com-
paração, nos Estados Unidos o tempo médio é de 4 a 8
dias, após 6 procedimentos.
Cumpre ressaltar que, até recentemente, uma ativida-
de empresarial só estaria formalizada, e com permissão
para iniciar suas atividades, após a realização de todos os
procedimentos que envolvem a obtenção de licenças de
funcionamento, regularidade perante a Junta Comercial,
Receita Federal e Previdência Social.
Agora, com a edição da Lei Complementar 167 de 2019,
a formalização ocorrerá de forma simplificada. Para for-
malizar uma startup basta o seu registro perante o sistema
digital da Redesim46, em regime mais célere denominado
InovaSimples. Dessa forma, evitam-se os procedimentos
burocráticos que criam barreiras desnecessárias para o es-
tabelecimento de empresas de inovação.
Essa alteração legislativa fortalece um dos pilares para o
incentivo à inovação e desenvolvimento econômico trazi-
do por Cooter e Schäfer (2017, p. 85): o direito de proprie-
dade bem definido. Os autores afirmam que o empresário,
por ter um grau maior de conhecimento dos riscos a qual
sua atividade econômica está sujeita, terá custos de transa-
ção reduzidos, uma vez que não precisará proteger o seu
patrimônio pessoal em caso de insucesso da empreitada.
Ainda, traçando-se um paralelo entre a mudança trazida
46 Sistema que integra as Juntas Comerciais e outros órgãos necessários para a formalização de em-
presas. Tem como objetivo reduzir o tempo gasto com a burocracia para formalização de novos
empreendimentos. Foi instituído pela Lei 11.598 de 3 de dezembro de 2007.

123
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

pela lei e a visão de Acemoglu e Robinson (2012, 217-221),


o Brasil parece tender para o desenvolvimento econômico.
A existência de barreiras para a entrada de novos sujeitos
no comércio é um dos fatores que levou diversas civiliza-
ções à estagnação econômica, enquanto que a facilitação
dessa entrada tende a incentivar a perseguição individual
de riquezas que acarretam no desenvolvimento das nações.
Dessa forma, é possível concluir que a simplificação
na formalização das startups é uma medida de incentivo
à inovação ao criar um ambiente institucional formal mais
favorável aos interesses dessas organizações.
Mas não foi apenas nesse ponto que a Lei Complementar
167 melhorou o ambiente das startups no Brasil. A lei tam-
bém cria um canal diferenciado para que a solicitação de
patentes por partes dessas empresas seja mais célere dentro
do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI):
§ 8º O INPI deverá criar mecanismo que concatene desde
a recepção dos dados ao processamento sumário das soli-
citações de marcas e patentes de empresas Inova Simples.
O instituto da propriedade intelectual no Brasil, necessá-
rio para a proteção da ideia que será desenvolvida dentro
do ambiente da startup, é deficitário. De acordo com dados
de 2018, a Organização Mundial da Propriedade Intelectual
(2018, p. 66) avaliou o tempo média de espera para que
um pedido de patente seja deferido pelo INPI e aproximou
que esse valor seria de 95,1 meses. Outros países que são
referência em inovação, como China e Coréia do Sul, foram
avaliados em 22 e 15,9 meses, respectivamente.
O alto tempo de espera por uma decisão definitiva atua
de maneira contrária à inovação, pois incide sobre o em-
preendedor um grau de incerteza até a emissão de uma
decisão final, o que aumenta os custos de transação na

124
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

tomada das decisões da startup. Em alguns casos, o mero


pedido de registro não confere a proteção adequada ao
empreendedor, sendo considerado apenas a constituição
de uma expectativa futura de direitos (RAMUNNO, 2015,
p. 245-272). Nesses casos, o empreendedor se vê sem pro-
teção até que seu pedido seja deferido pelo INPI.
Além disso, o tempo necessário para o processamento
da patente pode perpassar a vida útil da própria startup.
Em uma pesquisa empírica realizada pela Fundação Dom
Cabral (2012), constatou-se que 25% das startups não so-
brevivem ao seu 1º ano; 50% não sobrevivem ao período
inicial de 4 anos e 75% fecham em até 13 anos de sua cons-
tituição. De acordo com o tempo médio encontrado pela
Organização Mundial da Propriedade Intelectual, a decisão
pela patente demora em torno de 7 anos, momento no qual
a chance de a startup ainda estar ativa é inferior a 50%.
Dentro desse cenário, a Lei Complementar 167 buscou
melhorar a situação das startups ao determinar a integra-
ção entre o portal do InovaSimples com o INPI, com a
finalidade de dar maior celeridade a proteção da proprie-
dade privada dessas organizações.
Cumpre mencionar que tanto os trabalhos de Cooter
e Schäfer quanto de Acemoglu e Robinson enfatizam a
importância da proteção da propriedade intelectual no de-
senvolvimento econômico das nações. Para esses autores,
a ausência de proteção gera a necessidade dos indivíduos
de dispender recursos para defenderem sua propriedade
contra invasões e, nesse caso específicos, roubos. Esses
recursos dispendidos com proteção são incorporados nos
custos de transação, o que aumenta o seu valor e leva a
alocação menos eficiente dos recursos.
Nesse sentido, medidas que facilitem os meios de pro-

125
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

teção da propriedade intelectual reduzem os custos de


transação das startups, o que tende a incentivar o seu de-
senvolvimento. Portanto, é possível reconhecer novamen-
te que a Lei Complementar 167 de 2019 tem o potencial
de melhorar o ambiente institucional dessas organizações.
De forma geral, é possível concluir que a Lei Comple-
mentar 167 de 2019 trouxe inovações relevantes para o
ambiente das startups no Brasil, ao facilitar a formalização
destes empreendimentos e a proteção de sua propriedade
intelectual. Embora as alterações da lei em questão sejam
pequenas, certamente possuem potencial de melhorar o
ambiente empreendedor no Brasil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Douglass North explica que dentro de um modelo de
sociedade baseado em instituições e organizações, as mu-
danças políticas nem sempre seguem para um modelo mais
eficiente. Ao considerar que as organizações têm influência
nas mudanças das instituições formais, e que mesmo elas
possuem vícios ideológicos e de informação, não é incomum
encontrar regras alteradas para modelos menos eficientes.
Com relação a essa possibilidade, diante do exposto
neste artigo, é possível notar que esse não foi o rumo
adotado pelo Brasil. A alteração legislativa analisada torna
as instituições mais eficientes do que o modelo anterior.
As dificuldades enfrentadas pelas startups foram conside-
radas no momento da criação da Lei Complementar 167
de 2019, para o estabelecimento de um ambiente mais
favorável ao seu surgimento.
Ao facilitar a criação de empresas de base tecnológica,
reduzindo custos e burocracia, o Estado também facilita
o acesso das classes baixas e médias às oportunidades

126
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

econômicas que podem promover o crescimento de suas


riquezas e inseri-las na economia capitalista com melhores
condições de vida. Essa finalidade beneficia o Estado, pois
a circulação de riquezas entre os cidadãos gera incidência
de tributos, além do desenvolvimento econômico.
Nesse sentido, espera-se que o Brasil continue alterando
suas instituições formais no mesmo sentido adotado pela Lei
Complementar 167 de 2019, para incentivar novas emprei-
tadas e o avanço da economia do país, rumo ao desenvol-
vimento e a melhoria das condições de vida da população.

REFERENCIAS
ACEMOGLU, Daron; ROBINSON, James A. Why Nations Fail: the ori-
gins of power, prosperity, and poverty. New York: Currency, 2012.
ARRUDA, Carlos; NOGUEIRA, Vanessa; COZZI, Afonso; COSTA, Vini-
cius. Causa da Mortalidade de Startups Brasileiras: O que fazer
para aumentar as chances de sobrevivência no mercado? Fundação
Dom Cabral. Rio de Janeiro, 2012.
BLANK, Steve; DORF, Bob. Startup: Manual do Empreendedor: o
guia passo a passo para construir uma grande companhia. Rio de
Janeiro: Alta Books, 2014.
BRASIL, Lei Complementar nº 155, de 27 de outubro de 2016.
Altera a Lei Complementar no. 123, de 14 de dezembro de 2006 e
outras providências. Brasília, DF: Congresso Nacional, [2016]. Dis-
ponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp155.
htm. Acesso em: 16 de outubro de 2019.
BRASIL, Lei Complementar nº 167 de 24 de abril de 2019. Dispõe
sobre a Empresa Simples de Crédito e institui o Inova Simples.
Brasília, DF: Congresso Nacional, [2019]. Disponível em: http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp167.htm. Acesso em: 16
de outubro de 2019.
COELHO, Giulliano Tozzi; GARRIDO, Luiz Gustavo. Dissecando o

127
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

contrato entre startups e investidores anjo. In: JÚDICE, Lucas


Pimenta (Coord.); NYBO, Erik Fontenele (Coord.). Direito das star-
tups. Curitiba: Juruá, 2016. P. 115-130.
COOTER, Robert Dandridge; SCHÄFER, Hans-Bernd; ELTZ, Magnum
Koury de Figueiredo (Org. e trad.); VERA, Flávia Santinioni (Col.).
O Nó de Salomão: como o Direito pode erradicar a pobreza das
nações. 1 Ed. Curitiba: CRV, 2017.
FERREIRA, Fabiano M.; CAMARA, Dannys E. G.; GHERINI, Pamela
M. M.; VALENTIM, G. Lei Complementar 167/2019: conhecen-
do seus efeitos para o empreendedorismo no Brasil. 2019.
Disponível em: https://baptistaluz.com.br/institucional/lei-comple-
mentar-167-2019-conhecendo-seus-efeitos-para-o-empreendedo-
rismo-no-brasil/. Acesso em: 16 de outubro de 2019.
GICO JR., Ivo T. Introdução à análise econômica do direito. In:
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que
é análise econômica do direito: uma introdução. Belo Horizonte:
Fórum, 2011. P. 17-26.
NORTH, Douglass C. Instituições, mudança institucional e desem-
penho econômico. Tradução Alexandre Morales. São Paulo: Três
Estrelas, 2018.
RAMALHETE, Clóvis. Sistema de Legalidade na desconsideração
da personalidade jurídica. In: Doutrinas Essenciais de Direito
Civil. Vol. 3. P. 835-844.
RAMUNNO, Pedro Alves Lavacchini. Os prazos de proteção da pro-
priedade industrial: origens e críticas ao tempo de exclusi-
vidade do sistema patentário brasileiro. In: Revista de Direito
Empresarial. Vol. 10/2015. P. 245-272.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; AGUSTINHO, Eduardo Oliveira. Eco-
nomia institucional e nova economia institucional. In: RIBEI-
RO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é análise
econômica do direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum,
2011. P. 121-128.

128
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

RIES, Eric. A startup enxuta: como os empreendedores atuais utili-


zam a inovação contínua para criar empresas extremamente bem-
sucedidas. São Paulo: Lua de Papel, 2012.
SEBRAE. Relatório Especial: estudo sobre o empreendedorismo in-
formal no Brasil. Maio 2019. Disponível em: https://datasebrae.
com.br/wp-content/uploads/2019/06/Empreendedorismo-Formal
-x-Informal-2018-v7.pdf. Acesso em: 16 de outubro de 2019.
SPINA, Cassio A. Investidor anjo: como conseguir investidores para
seu negócio. 2 Ed. São Paulo: nVersos, 2015.
WORLD BANK GROUP. Doing Business: Reforming to Create Jobs,
2018. Disponível em: https://portugues.doingbusiness.org/pt/re-
ports/global-reports/doing-business-2018. Acesso em 20 de julho
de 2019.
WORLD BANK GROUP. GDP growth (annual %). Disponível em:
https://data.worldbank.org/indicator/NY.GDP.MKTP.KD.ZG?en-
d=2018&locations=US-CN-GB-IN-IL&start=2010. Acesso em: 16 de
outubro de 2019.
WORLD INTELLECTUAL PROPORTY ORGANIZATION. World Intel-
lectual Property Indicators 2018. Switzerland.

129
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

FACTORING E EMPRESA SIMPLES DE CRÉDITO:


ANÁLISE ECONÔMICA DOS INCENTIVOS
DESTAS FIGURAS JURÍDICAS.

Guilherme Helfenberger Galino Cassi47 e


Rafael Henrique Reske48

Resumo: O crédito é uma necessidade entre os peque-


nos empresários brasileiros para que possam desenvolver
e expandir suas atividades. No Brasil, a oferta dele é muito
concentrado e acaba gerando uma baixa oferta e altos cus-
tos, sendo os bancos os principais fornecedores de recursos
para estes empresários. Uma alternativa a isso, mais antiga,
foi a Factoring, um empresário que busca realizar o descon-
to de títulos de crédito mediante a cobrança de uma taxa.
Outra alternativa, mais recente, por meio da Lei Comple-
mentar 167/19, foi a Empresa Simples de Crédito (ESC), a
qual busca realizar empréstimos, financiamentos e desconto
de títulos de crédito para MEI, ME e EPP. Contudo, a ESC
foi inserida ao ordenamento jurídico com diversas restrições
feitas pelo legislador e este artigo busca, por meio da Aná-
lise Econômica do Direito, analisar se os incentivos trazidos
pela lei foram positivos para a ESC perante a Factoring. Ao
final, percebeu-se que os incentivos foram positivos, visto
que os custos de transação da ESC são mais baixos do que
os da Factoring e corrobora à cobrança de juros mais bai-
xos pela Empresa Simples de Crédito.
Palavras Chave: Empresa Simples de Crédito, Factoring,
Análise Econômica do Direito, Crédito
47 Doutorando em Direito na Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Mestre em Direito Econô-
mico e Socioambiental e Especialista em Direito Civil e Empresarial pela Pontifícia Universidade
Católica do Paraná. Advogado e professor universitário.
48 Graduando do 7º período do Curso Law Experience/Direito Integral - FAE Centro Universitário.
Bolsista do Programa de Iniciação Científica PAIC/FAE 2019-2020. Contato: rafael.reske@mail.fae.edu

130
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

INTRODUÇÃO
Recentemente, diante da necessidade do crescimento
da economia e do fomento de atividades que impulsio-
nam o mercado, retomou-se o debate sobre as condições
que o Brasil fornece ao empreendedor para o desenvol-
vimento das suas atividades. Segundo o relatório Doing
Business: treinar para implementar reformas, estudo do
Banco Mundial que avalia os países em relação às facili-
dades ou dificuldades impostas aos cidadãos no momento
da abertura de seu negócio, o Brasil ocupa a posição 109ª
em universo de 190 países.
Essa análise demonstra que os incentivos trazidos pelos
legisladores e governantes são baixos para a abertura de
novos empreendimentos no país, visto que a conduta esta-
tal, em grande parte, mais acarreta empecilhos e altos custos
de transação para os cidadãos do que lhes auxilia. Um dos
obstáculos mais contundentes é no acesso ao crédito, pois,
embora se trate de um dos fatores mais essenciais às ativi-
dades econômicas (COSTA; MANOLESCU, 2004, p. 612), é
de difícil acesso aos empreendedores, sobretudo quando
verificadas as altas taxas de juros praticadas no país.
As altas taxas de juros no país decorrem da concentra-
ção do crédito nas grandes instituições bancárias, o que
afasta a concorrência e a diminuição do preço. Segun-
do o Relatório de Economia Bancária do Banco Central
(2018), a razão de concentração dos cinco maiores bancos
do Brasil nas operações de crédito estava em 84,2%, o que
significa que estes cinco maiores bancos são responsáveis
por 84,2% de todo o crédito disponibilizado naquele ano.
Ademais, o próprio Estado exerce influência nesse seg-
mento porque, segundo a literatura, os juros bancários não
são mensurados exclusivamente em face da concorrência

131
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

do setor financeiro, e sim a partir de fatores mistos, em


grande parte ligadas à política econômica dos governos
(CASTRO; SANTOS, 2010, pp.70 – 72). Desse modo, a au-
sência de um quadro normativo e administrativo adequa-
do, acarreta altas taxas de juros ao setor produtivo.
O crédito a custo alto e a baixa tradição da poupança
popular fazem com que os empreendedores necessitem
recorrer a outras formas de financiamento para o início ou
continuidade de sua empresa
Como este contexto não é uma novidade no mercado
financeiro nacional o aparecimento de algumas alternati-
vas foram surgindo a partir da necessidade do mercado de
obter taxas mais baixas. Uma delas foi a Factoring, tam-
bém conhecida como atividade de Fomento Mercantil, a
qual busca realizar o pagamento antecipado de um título
de crédito ou de um crédito civil, mediante uma taxa. Ela
teve seu início no Brasil em 1968 e contou com uma gran-
de insegurança jurídica, tendo em vista que, até hoje, não
contém uma legislação específica que a regule.
Contudo, embora se tenha a Factoring como uma al-
ternativa à oferta de recursos ao mercado, ainda se tem
um cenário de concentração do crédito no Brasil. Dessa
forma, o legislador começou a se debruçar sobre o tema,
buscando alternativas para contornar este problema e con-
tribuir para o desenvolvimento financeiro nacional.
Diante disso, surgiu a Empresa Simples de Crédito. Ela
é uma figura jurídica, criada em 2019 pela Lei Complemen-
tar 167, que tem por sua atividade principal realizar em-
préstimos, financiamentos e descontos de títulos de cré-
ditos exclusivamente para Microempreendedor Individual
(MEI), Microempresa (ME) e Empresa de Pequeno Porte
(EPP). Levando em consideração que, segundo o levanta-

132
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

mento do SEBRAE acerca dos pequenos negócios, as ME


e as EPP correspondem a 98,5% do total dos empresários
brasileiros, a decisão tomada pelo Congresso se mostra,
em um primeiro momento, como uma medida que pode
alcançar o objetivo de facilitar o crédito.
Contudo, a lei que instituiu a ESC acabou trazendo diver-
sas restrições ao exercício de sua atividade, tais como o limite
de faturamento de uma EPP, a impossibilidade de se utilizar
de capital de terceiros para financiar o negócio, a vedação ao
enquadramento no Simples Nacional, dentre outros.
Com isso, assumindo que as disposições da nova Lei po-
dem trazer uma aversão aos indivíduos de optarem por esta
forma de atividade, este artigo tem por objetivo averiguar,
por meio das ferramentas da Análise Econômica do Direi-
to, se os incentivos, trazidos pelo legislador na criação da
Empresa Simples de Crédito, são positivos para promover
a criação e utilização dela por empresários para buscar seu
crédito em detrimento da já consolidada Factoring.

FACTORING
Definição e Histórico
A Factoring, ou Empresa de Fomento Mercantil, con-
siste em uma atividade comercial com fulcro na aquisição
de títulos de crédito ou direitos creditícios de empresários,
buscando a cobrança posterior do devedor da relação ori-
ginária. Não obstante, a Factoring, além de transacionar
em relação ao crédito, comumente oferece serviços como
assessoramento creditício, gestão de riscos, estratégias de
mercado, dentre outras que as partes podem convencio-
nar (SOARES, 2010, p.32).
O início dessa atividade remonta à Idade Antiga na região
do Mar Mediterrâneo. Segundo LEITE (2004, p.33), a Facto-

133
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ring começou diante da grande instabilidade do comércio


daquela época, proveniente das guerras e do movimento
expansionista. Assim, agentes comerciários fenícios criaram
factorias - centros comerciais - para que resguardassem e
vendessem a sua mercadoria com segurança.
Por outro lado, BULGARELLI (1998, p.535) compreen-
de de maneira diversa o início das Empresas de Fomento
Mercantil. Segundo o autor, “não obstante haja quem te-
nha visto a origem do Factoring nas épocas mais remotas
da humanidade, na verdade, ele surgiu na Inglaterra, no
século XVII, e, na Europa, somente em 1960”. No território
brasileiro, por sua vez, a atividade tem como marco inicial
o ano de 1968 (LEITE, 2004, p.43). Contudo, as Factorings
ganharam maior expressividade a partir de sua institucio-
nalização com a criação da Associação Nacional das So-
ciedades de Fomento Comercial (ANFAC) no ano de 1982.
No país, as dificuldades foram grandes para os empre-
endedores que iniciaram seu negócio nessa área. Ainda
em 1982, o Banco Central (BACEN) expediu a circular nº
703 que, a partir de uma má interpretação da atividade
realizada por essas sociedades, trouxe atraso para o de-
senvolvimento da Factoring no Brasil. Segundo FALCÃO
(2001), a circular “foi um documento confuso, ambíguo e
injurídico, que não definiu nem proibiu a Factoring, mas
atrasou e distorceu sua prática no Brasil.”
Posteriormente, a Circular 1.359 de 1988 do BACEN re-
vogou a antiga que dispunha sobre o tema e a Resolução
2.144 de 1995 do BACEN regularizou a atuação das Em-
presas de Fomento Mercantil, condicionando que elas não
exercessem atividades financeiras que eram reguladas pelo
Banco Central. Embora a Factoring não tenha legislação
própria no país, ela ganhou maior estabilidade com o ad-

134
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

vento do Código Civil de 2002 e suas disposições em rela-


ção à empresa.
Atualmente, a Factoring é muito importante para o país
e para o mercado empresarial. Segundo a ANFAC, no le-
vantamento estatístico realizado entre 2016/2017, houve
a movimentação de aproximadamente R$ 300 bilhões de
reais nas operações de seus associados, além de propor-
cionar a manutenção de 2.550.000 empregos diretos e in-
diretos. Ou seja, ela é uma importante alternativa para que
os empreendedores de pequeno e médio porte possam
buscar menores taxas de juros e serviços completos que
resultem no crescimento de seu negócio.

Insegurança Jurídica
A Factoring, como pode-se inferir, é uma figura impor-
tante no desenvolvimento econômico de qualquer país,
vez que possibilita o acesso de empresários ao crédito
mais rapidamente. Tudo isso é possível por conta da ces-
são de crédito civil e pela circulação dos títulos de crédito.
Os títulos de crédito são definidos pelo artigo 887 do
Código Civil, com base na concepção de Cesare Vivante
(BERTOLDI; RIBEIRO, 2008, p. 266), como “o documento
necessário para o exercício do direito, literal e autônomo,
nele mencionado”. Diante disso, percebe-se que uma das
características centrais que define esse instituto é a sua au-
tonomia entre as relações de circulação do crédito.
A circulação, nos títulos de crédito, cria a abstração e
garante a autonomia da relações (MARTINS, 2016, p.11),
bem como traz a obrigação dos codevedores das relações
pretéritas responderem pela totalidade do título, desde
que ocorra o protesto prévio (MAMEDE, 2018 ,p. 107).
Além disso, o artigo 784, I do Código de Processo Civil

135
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

demonstra que os títulos de crédito mais usuais têm força


de títulos executivos extrajudiciais, promovendo a maior
rapidez na busca do crédito.
Assim, eles trazem a segurança jurídica necessária para
os facturistas desenvolverem sua atividade. Contudo,
quando se trata de cessão de crédito, a Factoring não con-
ta com esse mesmo cenário.
Segundo o artigo 29649 do Código Civil Brasileiro, o
cedente do crédito não responderá pela solvência do de-
vedor, salvo disposição em contrário. Ou seja, em regra, a
cessão de crédito entre o cedente e a Factoring será regido
por uma cláusula pro soluto.
Muito embora a própria norma legal daquele diploma
demonstre a possibilidade de existirem cláusulas com dis-
posições diversas, os tribunais brasileiros afastam a livre
disposição do facturista quando ele for o cessionário. A
não responsabilidade do cedente pelo cumprimento da
obrigação transferida à empresa de fomento mercantil é,
em regra, uma das características dessa espécie de negócio
(SCHETTINI, 2015, p. 51).
A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de
Justiça justifica a partir da concepção de que “a natureza
do contrato de factoring imputa ao faturizador a assun-
ção dos riscos de inadimplemento dos títulos negociados,
não se admitindo a pactuação de garantias pro solvendo
ou de cláusulas que garantam ação de ‘regresso’ contra
o faturizado”50. Inclusive, conforme análises, grande parte
dos processos com participação de empresas de fomen-
to mercantil que tramitam nos tribunais brasileiros dizem
49 Artigo 296. Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do devedor.
50 STJ. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL: AResp 1.534.554-PR, Relatora: Ministra Nancy Andrighi.
DJ: 02/10/2019. Disponível em < https://ww2.stj.jus.br/processo/dj/documento/mediado/?sequen-
cial=101513868&tipo_documento=documento&num_registro=201901896159&data=20191002&for-
mato=PDF> Acesso em: 03 dez. 2019

136
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

respeito a indenização por danos morais (em face de pro-


testo indevido) e discussões acerca do direito de regresso
(SOUZA; TOLEDO FILHO; WIENHAGE, 2010, p.43).
Dessa forma, tem-se um cenário de alta insegurança,
uma vez que os facturistas estão atuando em um ambiente
em que se tem uma divergência nítida entre a Lei e o en-
tendimento consolidado dos tribunais.
Pode-se compreender que esta conjuntura está disposta
desta forma por conta da falta de regulamentação específi-
ca para a atividade de fomento mercantil, pois, caso hou-
vesse a disciplina pelo legislador sobre essa questão, se-
ria possível sanar a disparidade existente e promover um
ambiente favorável para o desenvolvimento da Factoring.

EMPRESA SIMPLES DE CRÉDITO


Definição e Histórico
A Empresa Simples de Crédito (ESC) pode ser definida
como um empresário que realiza operações que envolvam
empréstimo, financiamento ou desconto de títulos de cré-
dito exclusivamente à microempreendedores individuais,
microempresas e empresas de pequeno porte, sem uma
submissão direta daquela ao Banco Central.
Os debates sobre a ESC começaram com o PLP 420/2014,
de proposição do deputado Pedro Eugênio (PT-PE), com
fulcro na modificação da Lei Complementar 123 de 2006
para que fossem incluídos os parágrafos 9º e 10º ao artigo
13 que traziam a possibilidade da substituição tributária
para os microempreendedores individuais (MEI).
Após a tramitação pela Comissão de Desenvolvimento
Econômico, Indústria e Comércio (CDEIC), pela Comissão
de Finanças e Tributação (CFT) e pela mesa da Câmara
dos Deputados, fora criada uma Comissão especial para

137
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

proferir parecer sobre a proposição. Neste momento, no


dia 16 de maio de 2018, foi apensado, dentre outros, o PLP
341/2017, que propunha a criação da Empresa Simples de
Crédito (ESC) dentre outras disposições.
Segundo um de seus proponentes, Jorginho Mello (PL -
SC), a justificativa para a criação da ESC estaria relacionada
com o fato de que elas “afiguram-se importantes para au-
mentar o volume de crédito disponível às pequenas empre-
sas”. Posteriormente, o Projeto de Lei foi votado em plená-
rio e, no dia 25 de abril de 2019, o Presidente, Jair Messias
Bolsonaro, promulgou a Lei Complementar nº 167/2019 e
garantiu sua vigência em todo território brasileiro.
A introdução desta previsão legislativa é muito impor-
tante para o Brasil, pois aumenta a oferta de crédito em
um mercado que o possui concentrado em poucas fontes,
haja vista o Relatório de Estabilidade Financeira do Banco
Central (2017) que demonstrou que o índice de concen-
tração de crédito estava considerado em 1741 pontos, em
uma avaliação que considera como alta a concentração a
partir de 1800 pontos.
Ademais, a quebra do paradigma do ordenamento jurí-
dico foi tão expressiva que muitas máximas do direito cre-
ditício tiveram que ser modificadas. Até então, com base
no artigo 591 do Código Civil51 e o artigo 1º do decreto
22.626 de 193352 (Lei da Usura), era previsto que não po-
deriam ser cobrados, com exceção dos bancos, juros com-
pensatórios maiores do que doze por cento ao ano.
Com o advento da Empresa Simples de Crédito, este
status quo que perdurou por longos anos no país foi mo-
51 Art. 591. Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob
pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406 , permitida a capitalização
anual.
52 Art. 1º. É vedado, e será punido nos termos desta lei, estipular em quaisquer contratos taxas de
juros superiores ao dobro da taxa legal

138
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

dificado - expressamente disposto no artigo 5º, § 4º da LC


167/2019 -, trazendo grandes oportunidades para a pou-
pança popular e para os empresários desenvolverem rela-
ções com maior eficiência e menores custos.
Por fim, é necessário, contudo, o esclarecimento de que
a ESC é distinta da Sociedade de Crédito Direto (SCD) e
da Sociedade de Empréstimo entre Pessoas (SEP), trazidas
na resolução 4.656 de 2018 do Banco Central. A primei-
ra é uma fintech de crédito que busca a realização de
empréstimo, financiamento e aquisição de créditos, com
recursos próprios, por meio de uma plataforma eletrônica.
Já a segunda, também concebida como uma fintech de
crédito, compreende a uma intermediadora, de atuação
exclusivamente online, para operações de empréstimo e
financiamento entre pessoas.

Especificidades legais
A Lei Complementar 167 de 2019 trouxe algumas especi-
ficidades em relação ao funcionamento e desenvolvimento
da Empresa Simples de Crédito. Para a compreensão global
dos impactos desta norma, se faz necessária a análise de
determinados dispositivos que trazem a diretriz dela.
Primeiramente, verifica-se a região que a ESC poderá
atuar. Segundo o artigo 1º, ela poderá, exclusivamente,
atuar no município da sua sede ou em municípios limí-
trofes, ou sejam sem a possibilidade forma em que a ESC
poderá ser constituída. Já o artigo 2º da lei, disciplina
que ela poderá adotar a Empresa Individual de Respon-
sabilidade Limitada (EIRELI), Empresário Individual (EI)
e Sociedade Limitada (LTDA) como forma do empresário.
Esta previsão traz a limitação ao indivíduo de estabelecer
a ESC como uma Sociedade Anônima, tendo em vista que

139
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

esta forma carece de maior regulação estatal e menor au-


tonomia, o que poderia ser um empecilho para o intuito
deste novo segmento.
O Art. 2º, § 2º traz a incumbência de os fundadores da
ESC integralizarem o capital social em sua totalidade em
moeda corrente, bem como, segundo o § 3º, não se po-
der realizar operações de empréstimo, financiamento e de
desconto de títulos de crédito superiores ao capital que foi
integralizado pela Empresa. Estas exigências demonstram
a preocupação do legislador com a solvência da ESC dian-
te da falta de fiscalização assídua que os entes financeiros,
normalmente, detêm no país.
No § 4º do mesmo artigo, disciplinou-se que a pessoa
natural poderá ser integrante de apenas uma Empresa Sim-
ples de Crédito, independentemente se as Empresas sejam
localizadas em municípios diferentes ou se sejam conce-
bidas como filiais. Esta determinação trouxe a intenção de
vedar a possibilidade de uma ESC se tornar uma institui-
ção com porte bancário, visto que deturparia do intuito
desta figura jurídica.
Em relação aos seus recursos, a lei trouxe a vedação de
que a atividade seja financiada por captação de recursos,
seja ela feita em nome próprio ou de terceiros. Caso essa
prática seja realizada, o indivíduo que a praticou pode ser
enquadrado no artigo 16 da Lei de Crimes Contra o Siste-
ma Financeiro Nacional.
O artigo 4º regulou que a renda bruta de uma ESC não
poderá ser superior à renda estabelecida a uma Empresa
de Pequeno Porte (EPP). No mesmo sentido, foi modifica-
da a Lei Complementar nº 123 de 2006, em seu artigo 17º,
I, para impedir que a ESC possa adotar o sistema SIMPLES
Nacional para a tributação de sua atividade.

140
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

No artigo 5º, § 1º, o legislador autorizou a ESC a se valer


do instituto da alienação fiduciária na sua atividade, como
garantia dos empréstimos, financiamentos ou descontos
de títulos de crédito. Essa autorização proporcionou à Em-
presa uma maior garantia aos negócios realizados, vez que
uma garantia ao crédito é um dos requisitos fundamentais
em um capitalismo que se desenvolve em cima dele.
Por fim, incluiu-se o inciso IV ao artigo 15 da Lei nº
9.249 de 1995, a qual trata sobre imposto de renda de pes-
soas jurídicas, para dispor que a alíquota do tributo será
de 38,4% para esta atividade.
Dessa forma, percebe-se que o legislador esteve mui-
to preocupado com a regulação da Empresa Simples de
Crédito diante da menor fiscalização estatal nas transações
creditícias, e, com isso, preferiu limitar a ESC de várias
características regulares de um empresário. Posteriormen-
te, serão objeto de análise deste artigo os incentivos que
essas disposições expostas trazem aos indivíduos que pre-
tendem iniciar a atividade de uma ESC.

Comparativo com a Factoring


Como pode-se verificar diante da qualificação da Empre-
sa Simples de Crédito e da Factoring, elas têm uma grande
característica que as une: a busca da facilitação da circula-
ção do crédito. Em uma fase em que o capitalismo é regido
pelo crédito, essas duas figuras jurídicas conseguem trazer
opções aos empresários frente à grande centralização credi-
tícia promovida pela hegemonia dos bancos no país.
Por outro lado, elas detêm diferenças que as colocam
em diferentes posições no momento dos indivíduos rea-
lizarem sua escolha para iniciar sua atividade mercantil.
Diante disso, como o objetivo principal deste trabalho é

141
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

realizar a comparação entre elas, se faz necessário analisar


os principais pontos que as diferenciam.
Primeiramente, percebe-se a forma de disciplina legal
como um aspecto de disparidade entre as duas figuras ju-
rídicas. A ESC surgiu a partir de uma criação do legislador,
passando por comissões e sendo idealizada a partir do fim
específico de fomento dos pequenos e médios empresários.
Por sua vez, a Factoring, embora tenha uma disparidade
doutrinária em relação à sua origem, iniciou suas atividades
a partir da oportunidade e requisição do mercado como um
todo, ou seja, ela surgiu diante de uma demanda, e não de
uma criação legislativa propriamente dita.
Essa situação é evidente diante da forma com que a
Factoring foi tratada pelos órgãos reguladores no Brasil no
começo de sua atuação no país - vide circulares do Banco
Central -, bem como, da insegurança jurídica proveniente
do entendimento dos tribunais e da redação trazida na
norma por falta de disciplina legal.
Decorrente dessa mesma situação, tem-se outra dife-
rença entre as duas figuras jurídicas. O Fomento mercantil,
por não conter uma regulação legislativa, pode atuar de
acordo com as regras gerais da atividade empresária, uma
vez que tudo aquilo que o Estado não regulamenta poderá
ser exercido pelo particular. Assim, a Factoring tem a pos-
sibilidade de se revestir de qualquer forma de empresário,
sem restrição de faturamento ou de espaço de atuação.
Por outro lado, a Empresa Simples de Crédito, frente a
sua forma de nascimento, recebe diversas restrições para
desenvolver seu objeto comercial. São limitações em rela-
ção ao faturamento, ao público direcionado, ao espaço de
atuação, dentre outras. Com isso, essas disposições aca-
bam por trazer um grande contraste à Factoring.

142
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Outra diferença entre as duas relaciona-se ao público


alvo que cada uma se volta. A ESC somente poderá reali-
zar suas operações financeiras para Microempreendedores
Individuais, Microempresas e Empresas de Pequeno Porte,
visto a opção legislativa de facilitação do crédito a es-
ses empresários. A Factoring, por sua vez, não tem o seu
público voltado a qualquer empresário, independente de
qualquer forma que a empresa se revista.

ANÁLISE ECONÔMICA DAS FIGURAS JURÍDICAS


Breve comentário sobre a Análise Econômica do Direito
A menção à economia geralmente acaba influenciando
o pensamento para números, cálculos e fórmulas, as quais
dificilmente poderiam estar relacionadas com o direito.
Contudo, a Análise Econômica do Direito, também conhe-
cida como Direito e Economia, trouxe ao ramo jurídico
a possibilidade de se utilizar os preceitos e fundamentos
econômicos aos problemas jurídicos. O argumento central
da vertente é o de que os conceitos econômicos (p. ex.
escassez de recursos e reação de incentivos) são úteis para
a análise de institutos próprios do direito, como leis e de-
cisões judiciais (ALVAREZ, 2006, p. 53).
Diferentemente do Direito Econômico, o qual trata-se
de um ramo do direito que analisa e disciplina atividades
relacionadas ao mercado, tais como operações bancárias
e concorrência, o Direito e Economia pode ser compre-
endido como a corrente jurídica que busca averiguar as
decisões dos indivíduos com reflexos jurídicos a partir de
máximas econômicas, buscando, com elas, aumentar a efi-
ciência das decisões tomadas.
A relação entre estas áreas do saber é antiga. Segundo
Mackaay e Rousseau (2015, p.8), já era presente esta as-

143
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

sociação a partir de Maquiavel, Hobbes, Locke e alguns


filósofos escoceses durante o Iluminismo. No século XIX,
na Europa, continua o autor, já havia a busca de recursos
da economia para poder embasar uma análise do Direito.
Contudo, da forma que está posta atualmente, foi a partir
do movimento estadunidense que essa corrente começa a
ganhar forças e atingir outras proporções.
Rousseau e Mackaay (2015, p.9) dividem a evolução
desse movimento em quatro momentos: Lançamento,
Aceitação do Paradigma, Debate Sobre os Fundamentos e
o Movimento Ampliado.
O Lançamento pode ser compreendido como o início
do movimento, o qual ocorreu entre os anos de 1957 a
1972. Durante esse período, os economistas estavam bus-
cando expandir seus estudos e chegar a áreas que comu-
mente não se tinha a aplicação da economia, tais como
política e sociologia. O Direito teve seu marco de inserção
nos estudos econômicos a partir da publicação do Journal
of Law and Economics da Universidade de Chicago e por
meio do artigo “O Custo Social” de Ronald Coase.
Já a Aceitação do Paradigma, a qual perdurou entre
1972 a 1980, foi marcada pelo crescimento do debate so-
bre o tema e pela adaptação das universidades para re-
ceber essa nova corrente. Foi nesta fase que foi criado o
Journal of Legal Studies, o qual contou com Richard Pos-
ner como seu primeiro editor.
No debate Sobre os Fundamentos, ocorrido entre 1980
a 1982, verificou-se uma grande reflexão sobre as bases da
Análise Econômica do Direito. Neste momento, foram apre-
sentadas diversas críticas das mais variadas correntes, o que
proporcionou um considerável crescimento da teoria.
Por fim, tem-se o Movimento Ampliado. A partir do

144
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

desenvolvimento diante das críticas recebidas, o Direito


e Economia se expandiu e deteve diversas visões dentro
da corrente. Pode-se citar o Direito e Economia Compor-
tamental, os Institucionalistas e Neoinstitucionalistas, a Es-
cola Austríaca, dentre outros.
Neste artigo, busca-se o apoio da Análise Econômica do
Direito para a comparação entre a Factoring e a Empresa
Simples de Crédito, por conta da necessidade de averiguar
se os incentivos que a Nova Lei traz realmente são mais
vantajosos para facilitar o acesso ao crédito.

Análise Econômica dos institutos


Para iniciar a análise destas duas figuras jurídicas, deve-
se definir qual será o parâmetro no qual ela será norteada.
Levando em consideração que o Deputado Jorginho Mello
(PL-SC), idealizador do projeto de lei, evidenciou que sua
intenção seria facilitar o acesso ao crédito aos empresários
brasileiros, este artigo terá como premissa de sua análise a
intenção do legislador com a criação da Empresa Simples
de Crédito, buscando verificar se os incentivos trazidos
por ele foram suficientes para facilitar o acesso aos recur-
sos diante da já consolidada oferta da Factoring.
Primeiramente, é necessário analisar os custos de tran-
sação que estas duas figuras jurídicas possuem, tendo em
vista que isto será um fator preponderante para indivíduos
começarem a desenvolver suas atividades nesta área, bem
como é relevante para o valor final do crédito ofertado. En-
tretanto, é primordial a compreensão do que são os custos
de transação e como eles podem afetar os empresários.
Este termo foi trazido, primeiramente, por Ronald Coase
(1960), no conhecido “Coase Theorem”. Ele pode ser enten-
dido como os custos que um empresário detém para nego-

145
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ciar contratos, para concorrer com outros players de merca-


do, para enfrentar risco do inadimplemento, dentre outros.
A professora da Universidade de São Paulo, Rachel Sztajn
(2004), neste sentido, os conceituou da seguinte forma:
Consideram-se custos de transação aqueles incorridos
nas transações ainda quando não representados por dispên-
dios financeiros (isto é, movimentação de caixa), derivados
ou impostos pelo conjunto de medidas tomadas para reali-
zar uma determinada operação ou transação. Incluem-se no
conceito de custo de transação o esforço com a procura de
bens ou serviços em mercados; (...) compreende, portan-
to, todos os esforços, cuidados e o tempo gasto entre o
início da busca pelo bem, a decisão de efetuar a operação
e o cumprimento satisfatório de todas as obrigações assumi-
das pelos contratantes. Também devem ser incluídos mo-
vimentos que se sigam à operação que uma das partes
deva fazer para a completa satisfação de seu crédito.
Superada a conceituação, verificam-se os custos impli-
cados pelos meios utilizados pelos empresários para con-
solidar sua negociação, bem como sua força executiva nos
casos de falta de pagamento pelo crédito recebido. A Em-
presa Simples de Crédito, responsável por realizar emprés-
timos, financiamentos e descontos de títulos de crédito, irá
se valer de contratos entre ela e o MEI; e as ME; e EPP, que
materializarão o acordo realizado ou de títulos de crédito
que forem negociados entre as partes. Em relação à sua
força executiva, disciplina o Código de Processo Civil, em
seu artigo 784, que o contrato particular assinado por duas
testemunhas ou os títulos de crédito mais corriqueiros são
considerados como títulos executivos extrajudiciais, fato
que possibilita a busca pela satisfação do crédito vencido
mais rapidamente.

146
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

A Factoring tem por sua atividade principal a transação


em relação a títulos de crédito ou direitos creditícios, o
que a coloca na mesma posição da ESC no que tange aos
meios utilizados para formalização da negociação e à força
executiva dos instrumentos utilizados. Vale ressaltar que
os riscos de uma execução infrutífera, ou do oportunismo
gerado pela assimetria de informação na negociação ou
nos cumprimentos dos requisitos legais para tornar o ins-
trumento, são compartilhados por ambos os empresários.
Em relação à garantia, a Empresa Simples de Crédito
contou com autorização expressa, no artigo 5º, § 1º da Lei
Complementar 167 de 2019, de poder utilizar o instituto da
Alienação Fiduciária como forma de garantia de suas nego-
ciações. Da mesma forma, a ESC terá como garantia, se con-
tar com um contrato com a assinatura de duas testemunhas
ou quando transacionar por meio de um título de crédito, o
patrimônio do empresário que ela tiver negociado.
Por sua vez, a Factoring, que carece de uma regulação
legal, conta com uma interpretação extensiva da Lei nº
9.514 de 1997 para a instituição de uma garantia por meio
da alienação fiduciária nos casos de uma cessão civil de
crédito. Por outro lado, a Empresa de Fomento Mercantil
conta com a mesma garantia da ESC quanto ao patrimônio
daquele indivíduo que transacionou com ela, no caso de
inadimplemento. Dessa forma, percebe-se que os custos
de transação para as duas são semelhantes, ficando, a Fac-
toring, com um custo mais alto por conta da insegurança
jurídica diante da falta de regulamentação na utilização
da alienação fiduciária para seus contratos - o que não é
muito relevante, tendo em vista que a maior parte de suas
operações envolvem títulos de crédito.
No tocante ao dever de informação aos órgãos regula-

147
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

dores, muito embora ambos empresários não necessitem


de uma autorização do Banco Central, a Factoring e a
ESC precisam comunicar às entidades responsáveis pelas
transações financeiras, decorrente da obrigação trazida,
expressamente, pelo Artigo 9º, IV da Lei de Lavagem de
Dinheiro (9.613 de 1988). Neste ponto, o custo de opera-
ção desses sujeitos jurídicos é alto, tendo em vista que será
necessária a implementação de programas de compliance
para que os empresários possam cumprir com seus deve-
res legais e não serem responsabilizados civil, administra-
tiva e penalmente.
Outro fator que influencia fortemente nos custos de
transação destes empresários, é a tributação que incide
em sua atividade. A Empresa Simples de Crédito tem a
vedação à adoção ao SIMPLES nacional, mas tem a fa-
culdade de decidir entre o regime de lucro presumido e
o de lucro real. No caso do lucro presumido, a base de
cálculo do Imposto de Renda de Pessoas Jurídicas (IRPJ)
e da Contribuição Social Sobre Lucro Líquido (CSLL) será
de 38,4%, sendo que a alíquota básica para um mensal de
até vinte mil reais é de 15% para o IRPJ e 9% para o CSLL.
Além disso, ela é responsável pelo pagamento de PIS/
COFINS, com base no seu lucro bruto anual; do Imposto
Sobre Operações Financeiras (IOF) em suas operações; e
está isenta do Imposto Sobre Serviços (ISS).
A Factoring conta com um cenário totalmente diferen-
te em relação à tributação. O artigo 14, VI da Lei nº 9718
de 1998 traz a obrigatoriedade do empresário de optar
pelo regime tributário do Lucro Real para a sua base de
tributação. A alíquota do IRPJ será de 15%, para um lucro
mensal de até vinte mil reais, e de 25%, caso o lucro seja
maior do que o valor mencionado. O CSLL será de 9%,

148
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

independentemente do lucro auferido. Além disso, ela tem


a obrigação de adimplir com o pagamento do PIS/COFINS
sobre seu faturamento e do IOF diante de suas operações
financeiras; a incidência do ISS irá depender se houver
prestação, pela Factoring, de algum serviço juntamente
com a transação creditícia.
Neste ponto, percebe-se que o custo de transação da
Empresa Simples de Crédito é consideravelmente mais
baixo do que da Factoring, por conta da permissão dada
pelo legislador dela escolher entre os regimes de lucro
real ou presumido. Este fato acaba por baratear as des-
pesas e ajuda a diminuir o preço cobrado pelo crédito
ofertado, além de trazer incentivos positivos para que mais
indivíduos busquem realizar a atividade da ESC.
Atualmente, a média da taxa de juros cobrada pelos
bancos às Microempresa e Empresa de Pequeno Porte
(MPEs), segundo o Banco Central no levantamento Série
Economia Financeira (2017), gira em torno de 44,8% ao
ano. A Factoring tem como base a taxa conhecida como
“Fator Factoring”, a qual é disponibilizada diariamente
pela Associação Nacional de Fomento Comercial (ANFAC)
e ficou em torno de 48% ao ano em 2019. A ESC, por sua
vez, embora não conte com estatísticas oficiais por con-
ta de sua recente introdução ao mercado, tem taxas que
variam entre 36 a 60% ao ano segundo Renato Coelho,
ex-bancário e sócio de uma ESC, quando entrevistado pela
Agência Sebrae de Notícias- órgão responsável pela asses-
soria às ESC. Ou seja, em menos de um ano de sua imple-
mentação e com poucos empresários atuando no setor, a
ESC já é capaz de ofertar o crédito de forma mais barata
do que a Factoring e as instituições bancárias.
Dessa forma, percebe-se que os custos de transação

149
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

que a Empresa Simples de Crédito possui são menores


do que os custos da Factoring, principalmente por conta
da diferença de tributação, o que corrobora para que a
ESC possa ofertar um crédito mais barato para as MPEs e,
assim, alcançar o objetivo que o legislador tinha quando
idealizou e introduziu ao ordenamento esta figura jurídica.

CONCLUSÃO
A Empresa Simples de Crédito e a Factoring são impor-
tantes agentes no cenário econômico para a facilitação do
acesso ao crédito, sendo a Empresa de Fomento Mercantil
proveniente de uma necessidade e adequação do mercado
e a ESC fruto de uma opção legislativa frente a uma dor
dos empresários brasileiros. Muito embora o Brasil seja co-
nhecido pelos casos de leis ineficientes que foram elabo-
radas por seu Congresso, a LC 167 de 2019 foi positiva em
seus incentivos trazidos, principalmente no que tange à
concorrência com a Factoring, e, dessa forma, contribuiu
para que os empresários possam desenvolver sua ativida-
de e corroborar com o objetivo do legislador de aumentar
a oferta de crédito.
Pode-se perceber que os custos de transação foram mais
baixos para a ESC, visto que a faculdade de escolha dela
pelo regime de tributação pode influenciar diretamente na
sua despesa, bem como no valor final do crédito ofertado
para terceiros. Este fato pode ser verificado pela taxa de ju-
ros preliminar que a ESC oferece com pouco tempo de atu-
ação e baixo número de empresários, podendo ela chegar
a somente 36% ao ano, em um universo em que os bancos
o oferecem por 44,8% ao ano e as Factorings a 48%.
Com este cenário, a expectativa é de que o crédito ofere-
cido pela ESC continue a baixar diante da maior concorrên-

150
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

cia proveniente da maior prática da atividade no mercado.


Além disso, vale a reflexão de que a Empresa Simples de
Crédito pode ser mais um fator de mudança da cultura da
poupança popular em relação ao local de seu investimento,
vez que a rentabilidade das operações é alta, comparado
às taxas oferecidas no mercado, e o risco é diminuído por
conta da possibilidade da utilização da alienação fiduciária.
Contudo, para que isso possa acontecer e a “lei da oferta e
da procura” possa realmente produzir efeitos, culminando na
diminuição do valor do crédito ao empresário, é necessário
que a ESC seja amplamente divulgada. Além disso, com sua
limitação geográfica de atuação à somente uma cidade e sua
região metropolitana e sua limitação de expansão, já que a
pessoa natural não poderá participar de mais de uma ESC, se
faz necessário que pessoas que usualmente não participem
desta espécie de atividade iniciem a sua atuação na área.
Com isso, o SEBRAE, sendo órgão responsável pelo au-
xílio ao desenvolvimento - de acordo com o artigo 10º da
Lei Complementar 167/19 - deverá realizar um acompa-
nhamento eficiente e próximo dos empresários para au-
xiliar em seu desenvolvimento, além de divulgar a ESC e
seus benefícios, para que, dessa forma, o objetivo de sua
criação possa continuar sendo cumprido.
Por fim, vale a menção à concorrência que a ESC terá
com a Sociedade de Crédito Direto (SCD). As fintechs de
crédito, por mais que não tenham exclusivamente o pú-
blico das pessoas jurídicas como objeto de sua atividade,
possuem uma maior amplitude de atuação e facilidade de
buscar capital para iniciar sua atividade, uma vez que elas
utilizam, impreterivelmente, o meio eletrônico para realizar
suas transações, bem como podem buscar recursos abrindo
o capital da sociedade para investimentos de terceiros.

151
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

REFERÊNCIAS
AGÊNCIA SEBRAE DE NOTÍCIAS. Empresa Simples de Crédito Fa-
cilita a Concessão de Empréstimos e Reduz Custos para MPEs.
31 jul. 2019. Disponível em <http://www.sp.agenciasebrae.com.
br/sites/asn/uf/SP/dinheiromaisacessivel,41020baa1e74c610VgnV-
CM1000004c00210aRCRD > Acesso em: 6 dez. 2019.
ALVAREZ, Alejandro Bugallo. Análise econômica do direito: contribui-
ções e desmistificações. Revista Direito, Estado e Sociedade, v.9,
n.29, jul/dez 2006.
ANFAC. Fator ANFAC. Disponível em < http://www.anfac.com.br/v3/
anfac-fator.jsp > Acesso em 6 dez. 2019.
ANFAC. Levantamento Estatístico ANFAC 2016/2017. Disponível
em <http://www.anfac.com.br/v3/factoring-estatistica.jsp> Acesso
em: 3 dez. 2019.
BANCO CENTRAL. Relatório de Economia Bancária. Disponível em
< https://www.bcb.gov.br/publicacoes/relatorioeconomiabancaria
> Acesso em: 6 dez. 2019.
BANCO CENTRAL. Relatório de Estabilidade Financeira. Dispo-
nível em < https://www.bcb.gov.br/htms/estabilidade/2017_04/
refPub.pdf > Acesso em 11 set. 2019.
BANCO CENTRAL. Série Cidadania Financeira. Disponível em <
https://www.bcb.gov.br/content/cidadaniafinanceira/Documents/
publicacoes/serie_cidadania/serie_cidadania_financeira_4_credi-
to_concedido_mei.pdf > Acesso em 6 dez. 2019.
BERTOLDI, Marcelo M.; RIBEIRO, Marcia C.P. Curso Avançado de
Direito Comercial. 4ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei Complementar PLP
341/2017. Modifica a Lei Complementar 123 e institui a Empre-
sa Simples de Crédito. Disponível em <https://www.camara.leg.
br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1527051&filena-
me=PLP+341/2017> Acesso em 11 set. 2019.
BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de lei Complementar

152
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

PLP 420/2014. Modifica a Lei Complementar nº 123/2006 que


regulamenta os microempreendedores individuais e empresas
de pequeno porte. Disponível em< https://www.camara.leg.br/
proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1276663&filena-
me=PLP+420/2014 > Acesso em 12 set. 2019.
BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406 de 2002. Lei que institui o Có-
digo Civil. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
leis/2002/l10406.htm > Acesso em 6 dez. 2019.
BRASIL. Decreto nº 22.626 de 1933. Dispõe sobre juros nos contra-
tos e dá outras providências. Disponível em < http://www.planal-
to.gov.br/ccivil_03/decreto/D22626.htm > Acesso em: 6 dez. 2019.
BULGARELLI, Waldirio. Contratos Mercantis. 10ª Ed. São Paulo:
Atlas, 1998.
CASTRO, Gabriela; SANTOS, Carlos. Determinantes das taxas de
juro e do crédito bancário. Boletim Económico, Banco de Portu-
gal, 2010. Disponível em < https://www.bportugal.pt/sites/default/
files/anexos/papers/ab201002_p.pdf > Acesso em: 12 dez. 2019.
COASE, Ronald H. The problem of social cost. The Journal of Law
and Economics. v. III, oct. 1960. Disponível em: < http://www2.
econ.iastate.edu/classes/tsc220/hallam/Coase.pdf> Acesso em: 6
dez. 2019.
COSTA, Erika Alcino; MANOLESCU, Friedhilde Maria Kustner. A im-
portância do crédito na economia. Anais do Encontro Latino
Americano de Pós-Graduação, 2004.
FALCÃO, Guilherme J. Legislação que Regula as Empresas de
Fomento Mercantil (“Factoring”) no Brasil. Consultoria Le-
gislativa. Disponível em < https://www2.camara.leg.br/atividade
-legislativa/estudos-e-notas-tecnicas/publicacoes-da-consultoria-le-
gislativa/arquivos-pdf/pdf/111802.pdf > Acesso em: 3 dez. 2019.
LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 9ª Ed. São Paulo: Atlas, 2004.
MACKAAY, Ejan; ROUSSEAU, Stéphane. Análise Econômica do Di-
reito. 2ª Ed. São Paulo: Atlas, 2015.

153
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

MAMEDE, Gladston. Direito Empresarial: Títulos de Crédito. 10ª Ed.


São Paulo: Atlas, 2018.
MARTINS, Fran. Títulos de Crédito. 17ª Ed. Rio de Janeiro: Forense,
2016
SCHETTINI, Fernando Gomes. Fomento mercantil (factoring) e dupli-
cata no Direito Brasileiro. Revista Jurídica da Faminas, v. 2., n
1., 2015.
SEBRAE. Perfil das Microempresas e Empresas de Pequeno Por-
te. Disponível em < https://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20
Sebrae/UFs/RO/Anexos/Perfil%20das%20ME%20e%20EPP%20
-%2004%202018.pdf > Acesso em 6 dez. 2019.
SOARES, Marcelo Negri. Contrato de Factoring. São Paulo: Saraiva,
2010.
SOUZA, Roni Petson Santana de; TOLEDO FILHO, Jorge Ribeiro de;
WIENHAGE, Paulo. As empresas de Fomento Mercantil e o Ris-
co Jurídico: Um estudo sobre as principais causas e prevenções
de litígios judiciais. Revista Sociais e Humanas, 2010.
SZTAJN, Rachel. A Incompletude do Contrato de Sociedade.
(2004) Disponível em < http://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/
view/67626/70236 > Acesso em: 6 dez. 2019.
THE WORLD BANK. Doing Business 2019: Training for Reform. Dis-
ponível em < https://portugues.doingbusiness.org/pt/reports/glo-
bal-reports/doing-business-2019 > Acesso em: 6 dez. 2019.

154
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

OS DESAFIOS DAS INSURTECHS NO BRASIL À


LUZ DA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO

Bruna Antunes Ziliotto53 e


Luis Guilherme Badotti Linhares54

Resumo: O termo Insurtech designa toda e qualquer for-


ma de empresa, startup ou serviço que faz uso das tec-
nologias de informação e comunicação (TIC) dentro do
mercado de seguros, objetivando diminuir burocracias in-
ternas, bem como garantir maior eficiência na precificação
de seus seguros. Assim, esse novo modelo conquistou seu
espaço dentro do mercado internacional, tendo-se em vista
que, de acordo com o banco de dados da empresa Norte
-Americana de Consultoria Empresarial, McKinsey, somen-
te em 2015 os investimentos em Insurtechs atingiram a
margem de $2.7 bilhões de dólares. A partir desse dado, é
certo que, em curto prazo, essas tecnologias também irão
permear o mercado nacional, uma vez que o maior evento
de Insurtech da América Latina, Insur-tech Brasil, se enca-
minha a sua terceira edição que ocorrerá em 2020 em São
Paulo. Portanto, o objetivo do presente trabalho é o de ex-
plorar os desafios que as Insurtechs possivelmente enfren-
tarão em sua adaptação ao mercado brasileiro, uma vez
que a sua lógica de precificação colide diretamente com o
atual posicionamento do judiciário brasileiro a respeito de
cláusulas contratuais abusivas. Isto é, este trabalho aborda
a dicotomia existente entre a área do pricing (precifica-
ção), setor responsável pela análise de dados e integração
53 Mestranda em Direito Econômico e Desenvolvimento. Pós-graduada em Direito das Famílias
e Sucessões (ABDCONST). Membra do Grupo de Estudos em Análise Econômica do Direito da
PUCPR (GRAED).
54 Graduando em Direito (PUCPR). Membro do Grupo de Estudos em Análise Econômica do Direito
da PUCPR (GRAED).

155
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

informacional na definição dos prêmios das Insurtechs,


com a tendência pró-consumidor do judiciário brasileiro
no que tange a responsabilização das seguradoras face
à incidentes não previstos contratualmente. Para atingir
esse fim, doutrinas nacionais e estrangeiras que dissertam
sobre a existência e os efeitos de tal tendência foram ana-
lisadas; ressaltando-se que não foi realizado levantamento
jurisprudencial na presente pesquisa haja vista o enorme
arcabouço de jurisprudências sobre contratos de seguro
e suas diversas modalidades. Deste modo, a metodologia
empregada foi a hipotético-dedutiva, uma vez que a con-
clusão foi auferida a partir das hipóteses suscitadas e de
seus respectivos desenrolares sob à perspectiva da Análise
Econômica do Direito (AED). Com efeito, o critério de
eficiência de Kaldor-Hicks é utilizado como parâmetro de
análise sobre o possível choque entre os dois polos acima
citados. A conclusão auferida é a de que, para que as In-
surtechs vinguem no mercado nacional como seguradoras
eficientes, o entendimento dos magistrados deverá ser la-
pidado a fim de que esteja em consonância com o modus
operandi da nova tecnologia.
Palavras-chave: Insurtechs; Mercado de seguros; Precifi-
cação; Tendência pró-consumidor; Eficiência.

INTRODUÇÃO
De acordo com o alemão Klaus Schwab (2016, p. 11-
12), diretor e fundador do Fórum Econômico Mundial,
nos encontramos na “Quarta Revolução Industrial” que,
diferentemente das pretéritas, vem com a promessa da al-
teração genética, cruzamento de dados, nanotecnologia,
internet das coisas e revolução digital.
No âmbito dos seguros, as influências dessa nova revo-

156
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

lução se materializaram nas denominadas Insurtechs, defi-


nidas como empresas, startups ou serviços que se utilizam
das tecnologias da informação e comunicação (TIC) apli-
cadas ao mercado de seguros para atingir maior conecti-
vidade, automação e uma revolucionária análise de dados
(MCKINSEY, 2019, p. 2).
Assim, o processo de evolução dessas tecnologias se
estende por diversas áreas dentro do mercado de seguros,
sendo elas: distribution, setor que trata das possíveis vias
de distribuição do produto ou serviço, cyber security, que
garante a proteção e confidencialidade dos dados em po-
derio da seguradora e pricing, responsável pela precifica-
ção do risco e, portanto, dos prêmios, com destaque para
o big data, machine learning e data processing em função
de sua relevância e características ímpares para previsão
do risco e de seus respectivos prêmios.
Neste cenário altamente tecnológico, o problema en-
frentado no presente estudo gravita em torno dos desa-
fios inerentes a recepção e acomodação das Insurtechs no
mercado de seguros brasileiro à luz dos entendimentos
jurisprudenciais a respeito do tema.
Foi identificado que existe uma forte tendência de res-
ponsabilização solidária e pró-consumidor quando se trata
de litígios judiciais envolvendo companhias de seguro. Há
em muitos casos um sacrifício por parte dos magistrados à
segurança jurídica e respeito aos preceitos contratualmente
acordados em prol do alcance de uma suposta justiça social.
Portanto, o atual trabalho objetiva examinar a dicoto-
mia existente entre a lógica do pricing com a tendência
solidária e pró-consumidor do judiciário brasileiro, expon-
do, deste modo, a inconsistência e ineficiência dessa re-
lação aos olhos da Análise Econômica do Direito (AED).

157
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Ressalta-se desde logo que o presente artigo em nada va-


lora tal tendência nacional, mas somente a aponta como
um obstáculo para a adaptação do modelo do pricing nas
Insurtechs.
A metodologia escolhida foi a hipotético-dedutiva, uma
vez que a conclusão será auferida a partir das hipóteses
suscitadas, através da análise bibliográfica de artigos em
doutrina nacional e estrangeira.

O MERCADO DE SEGUROS E AS INSURTECHS


A atividade securitária é voltada essencialmente a ame-
nização de riscos sociais decorrentes de determinada re-
lação contratual ou da própria vida humana, objetivando
que possíveis infortúnios não venham a se transformar em
prejuízos irreparáveis.
No Brasil, teve seu início formalmente marcado com a
abertura dos portos locais ao comércio exterior no ano de
1808, sendo que naquele momento a atividade voltava-se
principalmente para seguros marítimos (SUSEP, 2019).
A primeira legislação regulamentadora da atividade foi
o Código Comercial Brasileiro de 1850, momento no qual
começaram a surgir companhias de seguros nacionais vol-
tadas a uma gama um pouco mais ampla a anterior, abar-
cando além de seguros marítimos, seguros contra incên-
dio, vida e acidentes de trabalho (LEÓN, 2019, p. 14).
Nos tempos modernos, o contrato de seguro passou
por considerável desenvolvimento, alcançando enorme
relevo que levou a disciplina atual, sendo tratado em nu-
merosas leis avulsas e objeto de regulamentação estatal
(GONÇALVES, 2018, p. 505).
Isso decorre daa necessidade de o ser humano se pro-
teger contra certos riscos, cabendo às seguradoras o com-

158
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

promisso de indenizar os danos causados por eventual


sinistro de modo a reduzir o grau de incerteza da socie-
dade, tornando-se, além de empresas altamente rentáveis,
responsáveis pela promoção de bem-estar social.
A definição clássica feita pela doutrina parte do seguin-
te pressuposto (GONÇALVES, 2018, p. 504):
Considera-se contrato de seguro aquele pelo qual uma
das partes, denominada segurador, se obriga, mediante
o recebimento de um “prêmio”, a “garantir interesse legí-
timo” da outra, intitulada segurado, “relativo a pessoa ou
a coisa, contra riscos predeterminados”.
Em consequência dessa definição, um contrato de segu-
ros pode ser compreendido dentro dos seguintes elemen-
tos: partes, objeto e remuneração. Numa relação de segu-
ros, as partes se dividem entre o segurado, aquele que paga
o prêmio em troca de uma possível indenização, e a segura-
dora, aquela que assume o dever de indenizá-lo face a um
possível sinistro em troca de seu respectivo prêmio.
Com efeito, o objeto do seguro consiste no próprio ris-
co segurado, ou seja, qualquer matéria, existente ou es-
perada, que seja passível de risco ou variação econômica
negativa. Por fim, a remuneração diz respeito ao prêmio,
o qual preenche o fundo congregado de recursos, ou seja,
o valor necessário para que a seguradora arque com suas
incertas indenizações (KRIGER FILHO, 2000, p. 258).
Não obstante, tais elementos dos contratos de seguros são
organizados e estruturados dentro de uma lógica de controle
estatal. No Brasil, essa regulamentação é realizada pela Supe-
rintendência de Seguros Privados (SUSEP), autarquia vincula-
da ao Ministério da Economia, criada pelo Decreto-lei nº 73,
de 21 de novembro de 1966, o qual ainda rege, com algumas
alterações, o mercado de seguros brasileiro.

159
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Estabelecidos os conceitos e a regulamentação dos se-


guros, concerne ao presente artigo definir também a fun-
cionalidade deste mercado, isto é, de que maneira as se-
guradoras operam de fato. Para tanto, o entendimento da
maneira pela qual: um risco é calculado, seu respectivo
prêmio fixado e seu conteúdo transcrito em uma apólice.
O risco designa todo e qualquer evento incerto que im-
plique em alguma circunstância negativa. Essa existência é
intrínseca a realidade, não havendo como anulá-la ou ex-
tingui-la. Por conta disso, numa perspectiva individual, o
risco é tido como um elemento irresistível e imprevisível,
somente podendo ser minimamente reduzido através de
medidas cautelares. (RODRIGUES, 2008, p. 78).
Em contraponto, no âmbito macroeconômico, o risco
representa meramente uma variável que pode ser prevista
e numericamente calculada. Isto é, por meio da Lei dos
Grandes Números, segundo a qual a frequência de even-
tos independentes e análogos se aproxima cada vez mais
do valor previsto pela teoria das probabilidades na medida
em que a amostra é ampliada, as seguradoras se tornam
capazes de identificar com qual valor das indenizações
terão que arcar (SAMPAIO, 2007, p. 1).
Tendo esse valor, as empresas partem para a fixação
de seus respectivos prêmios. Tal processo, se concentra
principalmente no risco médio da ocorrência do sinistro
segurado, visto que é com base nele que a seguradora irá
determinar qual é a estimativa de reserva para se quitar as
eventuais indenizações futuras. Assim, se estabelece um
prêmio de valor médio, sendo equivalente ao valor do
risco médio do sinistro ocorrer.
Por fim, o contrato entre o segurado e a seguradora se
firma através de uma apólice de seguro, na qual os direitos

160
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

e obrigações, as garantias contratadas, as excludentes de in-


denização, o prazo contratual e todos os outros elementos
do serviço estão dispostos (GONÇALVES, 2018, p. 507).
Assim, a apólice constitui, em regra, o instrumento con-
tratual entabulado entre a seguradora e o segurado, po-
dendo ser nominativa, à ordem e ao portador, nos termos
do art. 760 do Código Civil.
Feitas estas considerações iniciais, passa-se a explorar o
mercado de seguros frente a nova realidade das Insurtechs.
Tal realidade, projetada pela “Quarta Revolução Indus-
trial”, alterou substancialmente os meios tecnológicos den-
tro do mercado de seguros, se beneficiando por conta de
novos algoritmos e tecnologias que auxiliam/facilitam o
trabalho de seus atuários (profissionais que calculam o
impacto financeiro do risco e da incerteza, definindo os
prêmios e as reservas para seguros) e também dos pró-
prios segurados, que possuem acesso facilitado as ofertas
e termos da apólice a ser adquirida.
Assim, o termo Insurtech (fruto da junção dos termos
insurance e technologie) designa toda e qualquer empre-
sa, serviço ou startup que faça uso da TIC (Tecnologia
da Informação e Comunicação) dentro do mercado de
seguros; aumentando, portanto, sua dispersão, segurança
e eficiência.
Neste cenário, as Insurtechs surgiram para revolucionar
os métodos tradicionais de auferir risco, prêmio e a própria
apólice, utilizando-se de técnicas avançadas de captação
e processamento de dados, mitigação de risco, personali-
zação do perfil do segurado e detecção de fraude, dando
maior previsibilidade e transparência ao procedimento se-
curitário (LEWIS, 2017, p. 493).
Esse sistema vem se desenvolvendo em ritmo crescente

161
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

e acelerado, já tendo, inclusive, conquistado seu espaço


no mercado internacional.
De acordo com o banco de dados da empresa Norte-A-
mericana de Consultoria Empresarial McKinsey, enquanto
em 2011, 140 mil dólares foram investidos em Insurtechs,
em 2013 esse valor subiu para $270 milhões de dólares.
Já em 2015, tal valor atingiu a incrível margem de $2.7
bilhões de dólares investidos (MCKINSEY & COMPANY,
2019, p. 3).55
Logo, comprovado que as Insurtechs não são uma mera
tendência, mas sim uma realidade que já se firmou no
mercado internacional; por certo que muito em breve irá
permear o mercado nacional. Tal afirmativa mantém sua
procedência ao considerar que o principal evento de In-
surtech da América Latina (Insur-tech Brasil) terá sua ter-
ceira edição em São Paulo no ano de 2020. Valendo desta-
car que, da primeira edição para a segunda, foi registrado
um crescimento participativo de 110% no evento.56
Tendo esse crescimento em mente, faz-se relevan-
te para o presente trabalho uma breve apresentação das
principais áreas de desenvolvimento tecnológico explora-
das pelas Insurtechs, quais sejam, distribution, cybersecu-
rity e pricing.
A área da distribution (distribuição) é responsável pela
dispersão dos produtos ou serviços de uma empresa, ou
seja, ela busca métodos de marketing e venda mais efi-
cientes entre a seguradora e o cliente.
No caso da Insurtech, essa área muito tem dependido
do uso de novos canais de comunicação, tais como aplica-

55 O panorama informacional apresentado acima é oriundo do “CB insights”, um provedor de infor-


mação da “VC deals”, e proprietário do panorama informacional da McKinsey.
56 INSUR-TECH BRASIL. O principal evento de insurtech da américa latina está confirmado em 2020.
[s.d]. Disponível em: <https://insurtechbrasil.com/>. Acesso em: 03 dez. de 2019.

162
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

tivos, agentes e websites para ampliar e facilitar o acesso


de seus clientes a seus seguros, já contratados ou não (LE-
ONARD, 2019).
Por outro ângulo, a área da cybersecurity (segurança
digital) dispõem sobre a segurança de dados e proteção
contra crimes cibernéticos. Tema esse, que tem sido ca-
lorosamente recebido pelo mercado em decorrência da
urgência por parte das empresas em protegerem suas in-
formações e dados de alto valor agregado (HAM, 2019).
Por fim, a área do pricing (precificação) designa “a ci-
ência de encontrar um preço justo ao risco, mas que caiba
no bolso do segurado, através da análise de sua função de
utilidade” (CHAVES, 2017, p. 21).
No modelo tradicional, conforme discorrido anterior-
mente, a precificação levava em conta quantos elementos
e características fossem plausíveis para que se atingisse a
maior exatidão possível em suas previsões de risco. Toda-
via, a capacidade de absorção e cruzamento de informa-
ções desse modelo é limitada.
Em função de uma melhor compreensão desses limi-
tes, tomemos como exemplo os seguros automotivos. Se
tratando de automóveis, e perante o modelo tradicional de
precificação, a análise do atuário estaria restringida aos se-
guintes elementos: características do condutor, tais como
idade, experiência de direção, condição médica, etc; ca-
racterísticas do veículo, tais como marca, tamanho, quilo-
metragem, preço, etc; características da apólice de seguro,
tais como duração do contrato, coberturas, excludentes,
etc, e características geográficas, tais como clima, distância
de deslocamento, segurança da região, etc.
Isto é, nenhuma forma de análise sobre o perfil, capa-
cidade e hábitos particulares do sujeito contratante existe

163
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

dentro da ótica tradicional. Entretanto, com o advento das


mais requintadas tecnologias de informação e comunica-
ção que as Insurtechs dispõem, essas restrições são facil-
mente transpostas.
Isso ocorre principalmente pelo uso do big data, ma-
chine learning e data processing, todos sendo elementos
fundamentais para a nova lógica do pricing (MCKINSEY &
COMPANY, 2019, p. 8).
O termo big data designa os novos sistemas digitais ca-
pazes de extrair, armazenar e realocar imensas quantidades
de informação, disponibilizando para as Insurtechs uma sé-
rie de dados oriundos de redes sociais, históricos de pesqui-
sa em provedores de busca, aplicativos, localizadores, entre
outros; permitindo à empresa ampliar seu conhecimento
sobre o perfil do segurado (MAGRO, 2017, p. 39).
Já o machine learning trata da capacidade das máqui-
nas e sistemas em se adaptarem ao cenário proposto, ou
seja, conforme as Insurtechs são diluídas em grandes mon-
tes de informação fornecidos pelo big data, seu sistema se
torna cada vez mais inteligente e capacitado.
Por fim, o data processing cruza e analisa toda essa
informação, interligando uma série de dados para atingir
uma previsão de risco muito mais precisa.
Retornando ao exemplo dos seguros automotivos, po-
rém agora com o auxílio dessas novas tecnologias, a se-
guradora terá acesso a dados como: localização GPS cons-
tante, velocidade, aceleração e desaceleração do veículo,
perfil de consumo do segurado, locais que frequenta, ho-
rários que utiliza o automóvel etc., permitindo as Insur-
techs que definam um perfil de risco com muita maior
exatidão para cada um de seus segurados (WUTHRICH,
BUSER, 2019, p. 203).

164
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Portanto, conclui-se que as Insurtechs trarão inúmeras


vantagens ao atual mercado de seguros a fim de fornecer
uma cobertura mais fidedigna ao perfil do cliente e aos
riscos que está exposto. Seja, facilitando o processo de
aquisição da apólice pelo cliente, ampliando a segurança
dos sistemas digitais ou otimizando o processo de capta-
ção e gestão de dados (MCKINSEY, 2017, p. 2).

O COMPROMETIMENTO DA EFICIÊNCIA
DAS INSURTECHS SOB A ÓTICA DA ANÁLISE ECONÔMICA
DO DIREITO
Conforme discorrido no tópico antecedente, as relações
entre seguradora e segurado se dão através de um contra-
to, denominado de apólice, que vincula ambas as partes
com obrigações recíprocas.
O inadimplemento por um dos contratantes é o maior
fator responsável por eventuais desequilíbrios contratuais,
haja vista que o valor do prêmio e a probabilidade do
risco foram previamente calculados por cálculos atuariais.
Ou seja, se alguma das partes descumpre com o estipula-
do, os valores arbitrados se alteram, acabando por onerar
excessivamente a parte prejudicada.
Ainda, os contratos de seguro possuem outra caracte-
rística importante no direito brasileiro: são contratos de
adesão. Isto, pois se aperfeiçoam mediante a aceitação
pelo segurado das cláusulas previamente elaboradas pelo
segurador e impressas na apólice, sem que tenha havido
ampla e prévia discussão entre as partes (GONÇALVES,
2018, p. 506).
E por assim ser, os contratos de adesão estão submeti-
dos ao regramento do Código de Defesa do Consumidor,
o qual prevê, em seu artigo 47, que as cláusulas contra-

165
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

tuais deverão ser sempre interpretadas de maneira mais


favorável ao consumidor, ora segurado.57
Neste viés, há muitos anos a jurisprudência pátria tem
decidido que, nos contratos de adesão em geral, na dúvi-
da, a interpretação conferida a determinada cláusula de-
verá favorecer o aderente, ora consumidor (GONÇALVES,
2018, p. 506).
Esta tendência pró-consumidor manifesta-se das mais
diversas formas em lides judiciais que envolvem contratos
de seguro.
Ocorre que, conforme narrado no tópico anterior, o
seguro é baseado na estatística, em cálculos complexos
capazes de unificar a probabilidade, o risco e o sinistro,
característica da ciência atuária. Referida ciência busca
atingir um equilíbrio do ponto de vista da operação glo-
bal do contrato de seguro, a fim de garantir com precisão
as consequências e os comprometimentos assumidos pe-
los contratantes – comutação entre o prêmio e a garantia
(TIMM; BENETTI, 2008, p. 2717).
Na comutatividade sempre se encontrou inserta uma
louvável preocupação com o equilíbrio das prestações
– mesmo no plano subjetivo – de forma que os contra-
tantes pudessem, tanto quanto possível, se sentir segu-
ros quanto ao fato de que a prestação de um deveria
encontrar correspondência na contraprestação do outro
(BORGES, 2010, p. 11).
Assim, colide com a lógica atuarial do seguro a ten-
dência de justiça social distributiva, na qual as segurado-
ras são condenadas a se responsabilizarem por sinistros

57 Os contratos de seguro são contratos de consumo por excelência não só por serem de adesão,
mas porque a própria lei consumerista assim os definiu em seu artigo terceiro, parágrafo segundo,
com a seguinte redação: Serviço é qualquer atividade fornecida ao mercado de consumo, median-
te remuneração, inclusive as de natureza (…) securitária.

166
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

não originalmente previstos nas apólices. Isto se apresenta


como verdadeiro obstáculo não somente aos contratos tra-
dicionais, mas também a toda a lógica desenvolvida pelas
Insurtechs, especialmente no que tange ao setor do pri-
cing, que utiliza-se de toda a tecnologia desenvolvida para
apurar da forma mais personalizada possível os preços
inerentes ao contrato de seguro.
Assim, o desequilíbrio contratual ocorre não somente
pelo inadimplemento de uma das partes, mas também
pela imposição judicial de custo não previsto estatistica-
mente (TIMM; BENETTI, 2008, p. 2710).
Frise-se que não se está a negar a importância da legis-
lação consumerista, a qual inclusive positivou o princípio
do “in dubio pro segurado”. Porém, o que se questiona
são quais os limites de atuação do poder judiciário sobre
os contratos de seguro e sua articulação com a modalida-
de obrigacional examinada, sob pena de “sucumbimento
dos fundamentos técnicos do seguro e a sotoposição dos
interesses transindividuais a mero proselitismo consume-
rista.” (DRUCK, 2003, p. 64).
Ademais, é cediço que os contratos de seguro não pos-
suem livre conteúdo e forma, porquanto devem obedecer
obrigatoriamente às normatizações da SUSEP, sendo obje-
to de prévia estipulação suas condições gerais, prêmios e
tarifas das apólices.
Neste sentido, para alguns autores como Orlando Go-
mes, os contratos de seguro seriam melhores classifica-
dos como “contratos de adesão bilateral”, tendo em vista
que as partes pactuam dentro do dirigismo estatal imposto
pelo órgão regulamentador, quem condiciona a vontade
negocial e impede que abusos sejam cometidos (OCTA-
VIANI, 2004, p. 13-14).

167
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Ou seja, o fato de os contratos de seguro serem, na


maioria dos casos, por adesão, não implica automatica-
mente em uma vulnerabilidade aos segurados. Existem
normas à que estão sujeitos e cálculos a serem seguidos
em função do mutualismo existente entre os segurados,
os quais suportam solidariamente os prejuízos decorrentes
dos riscos heterogêneos decorrentes do grupo que com-
põe (TIMM; BENETTI, 2008, p. 2719).
Quando o Poder Judiciário condena as seguradoras a
ampliar a cobertura securitária em decorrência de deter-
minado sinistro, está-se, em muitas vezes, sendo feita uma
análise à luz da justiça social, mas não à luz do impacto
econômico que a decisão trará.
Até porque, não se pode pensar que a exclusão de co-
bertura de determinadas ocorrências nos contratos são
imotivadas; muito antes pelo contrário, são fundadas na
técnica probabilística atuarial, visando à manutenção e,
principalmente, estabilidade do negócio. É a chamada
dispersão dos riscos e a alta sinistralidade de determina-
do evento que, basicamente, restringem sua cobertura
(TIMM; BENETTI, 2008, p. 2721).
Ou seja, por se tratar de uma operação mutualista, é
que os magistrados devem atentar-se não somente as con-
sequências inter partes no caso concreto, mas a toda a
coletividade afetada. Ao contrário da corrente jurispruden-
cial, a busca da justiça social, muitas vezes embasada no
princípio da função social do contrato ou da hipossufici-
ência do consumidor, não justifica o sacrifício da segu-
rança jurídica e a criação de danos econômicos de larga
escala (PINHEIRO, 2005, p. 79).
Diz-se de larga escala pois um caso de repercussão ge-
ral, julgado sob o manto dos Tribunais Superiores (Supe-

168
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

rior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal) atinge


a todas as companhias de seguro e a todos os segurados
que estejam vinculados a determinado tipo de apólice e
cobertura de danos.
Ademais, o subjetivismo do magistrado é empregado
no proferimento da decisão, a qual vincula-se a suas con-
vicções íntimas e bom senso, o que pode, eventualmente,
vir a prejudicar uma análise de cunho econômico e ati-
nente as peculiaridades das operações securitárias (TIMM;
BENETTI, 2008, p. 2723).
Por certo, quando a seguradora é condenada a arcar
com indenização não prevista no contrato, cria-se um de-
siquilíbrio contratual que rompe com o provisionamento
financeiro minunciosamente calculado.
Assim, os efeitos básicos deste desiquilíbrio consubs-
tanciam-se: no aumento de preço do serviço prestado, au-
mento dos prêmios pagos e na realocação dos recursos no
plano interno da firma. Ou seja, a seguradora dificilmente
assumirá com os prejuízos oriundos da condenação judi-
cial, pois repassará os custos “extras” e não previstos con-
tratualmente aos segurados (SZTAJN, 2005, p. 322).
Significa dizer que a repercussão econômica das decisões
judiciais precisa ser analisada pelos magistrados com maior
atenção, visto que, ao buscar a justiça social em decisões
pró-consumidor, acabam por emitir sinais e afetar expecta-
tivas e comportamentos dos agentes econômicos, como no
caso, das seguradoras (PINHEIRO; SADDI, 2005, p. 76).
Esta ideia de consequencialismo das decisões encontra
azo na disciplina da Análise Econômica do Direito (AED),
a qual configura-se como um riquíssimo método de abor-
dagem que se utiliza de premissas e teorias econômicas
para o exame de situações jurídicas.

169
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Na concepção de Thomas Ulen e Robert Cooter (2016,


p. 3), a AED consiste, sobretudo, em um método investiga-
tivo utilizado para prever o comportamento dos indivíduos
perante as leis, sendo que a análise deste comportamento
permite o estabelecimento de parâmetros para a criação,
revisão e interpretação das normas.
Logo, conclui-se que a Economia se mescla com o Direi-
to ao tentar modelar o comportamento humano de modo
que seja possível ao operador do Direito compreender os
impactos que determinada lei ou decisão jurídica surtirá
na sociedade (SALAMA, 2013, p. 5).
Dentre os mecanismos de averiguação legal da AED,
o parâmetro da Eficiência se sobressai quando se trata da
efetividade de algum dispositivo ou sistema.
O critério Kaldor-Hicks de eficiência delimita que uma
medida somente será considerada eficiente se elevar o
bem-estar do maior número de pessoas de respectiva co-
munidade, desde que haja a possibilidade de o ganho to-
tal compensar os prejudicados do sistema (GONÇALVES;
RIBEIRO, 2013, p. 83).
Assim, ao se analisar o posicionamento referenciado
perante o critério Kaldor-Hicks, se constata a grande ine-
ficiência da tendência jurisprudencial mencionada, visto
que, por mais que nos casos individuais o protecionismo
estatal aparente ser razoável e, até mesmo louvável, no
âmbito macroeconômico ele gera grande insegurança ju-
rídica às seguradoras, o que, por sua vez, também é inefi-
ciente aos segurados, na medida que o risco de toda essa
insegurança é repassado aos seus clientes por meio do
aumento de seus prêmios.
Do mesmo modo que, a possibilidade de compensação
também é minada, pois, se por meio das Insurtechs os prê-

170
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

mios são os mais adequados o possível ao risco individual


de cada cliente, agora esses prêmios sofrerão um incre-
mento geral em razão do reconhecimento da insegurança
jurídica como um risco concreto de todos os contrato.
Portanto, quando diante de uma lide envolvendo se-
guradoras, se faz imperioso que o magistrado tenha em
mente os elementos que envolvem o contrato de seguro
como o mutualismo, os cálculos estatísticos e o desiquilí-
brio contratual que poderá ser gerado. Somente sob esta
análise, é que a decisão será economicamente eficiente do
ponto de vista da AED.
As Insurtechs apresentam-se como empresas revolu-
cionárias no mercado de seguros, capazes de moderni-
zar todo o processo de aferição do prêmio, da apólice
e riscos inerentes ao sinistro. Logo, para que possam
surgir ou adentrar o mercado brasileiro securitário, pre-
cisam estar cientes dos desafios que enfrentaram em
matéria judicial.
Com efeito, embora decorram de uma iminente revo-
lução tecnológica mundial, adentrarão em um mercado
secular, que há muito encontra-se sedimentando no Bra-
sil em matéria jurisprudencial. Portanto, resta-se evidente
a urgente necessidade de os julgadores se atualizarem
a respeito do tema e entenderem todo o processo por
detrás das Insurtechs, sob pena de continuarem a priori-
zar fatores de justiça social sob econômicos, tornando a
operação ineficiente.
A elevação dos custos de transação e conseqüente ine-
ficiência operacional do mercado securitário levarão, no
fim, à inviabilidade do negócio. Operando muitas vezes
no prejuízo e diante da possibilidade de colapso do sis-
tema, com a perspectiva de quebra das seguradoras, será

171
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

mais vantajoso para os detentores de capital que inves-


tem nas Companhias Seguradoras alocar seus recursos
onde eles irão produzir maiores ganhos. Os agentes se
sentirão desestimulados para que operem nesse nicho
do mercado (TIMM; BERNETTI, 2008, p. 2725).
Destarte, os magistrados, a fim de proferirem uma de-
cisão eficiente diante do critério de Kaldor-Hicks, deverão
analisar à luz do caso concreto, se o ganho obtido ao se
indenizar um sinistro não previsto no contrato, ou ao am-
pliar a cobertura securitária previamente estipulada, trará
maiores ganhos do que perdas a coletividade de segura-
dos atingidos pela decisão e seus impactos sob o mercado
de seguros nacional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho debruçou-se sobre os desafios jurí-
dicos que as Insurtechs encontrarão no Brasil em matéria
jurisprudencial.
Foi constatado que o país segue uma tendência pró-
consumerista que atribui previamente ao consumidor o
caráter de parte hipossuficiente, mesmo que em verdade
não o seja. Neste sentido, são inúmeros os casos nos quais
o magistrado condenou a seguradora a efetuar pagamento
além das cláusulas estipuladas na apólice, o que causa
desiquilíbrio contratual especialmente no que concerne ao
cálculo do prêmio.
As Insurtechs representam o futuro das seguradoras
por apresentarem métodos altamente desenvolvidos ine-
rentes a captação e leitura de dados, otimizando todo o
processo desde a contratação do seguro até o cálculo do
risco e do prêmio.
Sendo assim, a insegurança jurídica causada pela pen-

172
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

dular tendência jurisprudencial atual mostra-se não ser o


meio mais eficiente de lidar com futuras lides envolvendo
as Insurtechs e até mesmo as seguradoras que operam no
modelo tradicional. Isto, pois a seguradora passa a aumen-
tar a incerteza e custos com a operação que foram previa
e minunciosamente calculados, o que acaba sendo trans-
ferido, no final das contas, ao consumidor.
Portanto, a conclusão auferida é a de que os magistrados e
operadores do direito devem atualizar-se a respeito da nova
tecnologia e toda a complexidade por de trás dela, sob pena
de, ao invés de facilitar e personalizar o processo de seguro,
cair na “mesmice” das seguradoras antigas, e não concretizar
a tão esperada “revolução” no mercado de seguros.

REFERÊNCIAS
BORGES, Nelson. Os contratos de seguro e sua função social: Re-
visão Securitária no Novo Código Civil. Disponível em: <www.
ibds.com.br> Acesso em: 08.12.19.
CATLIN, T.; LORENZ, J. T.; MUNSTERMANN, B.; OLESEN, B.; RIC-
CIARDI, V.. Insurtech the threat that inspires. 2018. Disponí-
vel em: https://www.mckinsey.com/~/media/McKinsey/Indus-
tries/Financial%20Services/Our%20Insights/Insurtech%20the%20
threat%20that%20inspires/Insurtech-the-threat-that-inspires.ashx>.
Acesso em: 21 out. 2019.
CHAVES, Fernanda. A revolução do big data: Os Desafios do Atuário
do Setor de Seguros. Revista brasileira de atuária, número 1,
2017, p. 18-22.
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Law and Economics. 6ª ed. Cali-
fornia: Berkeley Law Books, 2016.
DRUCK, Tatiana Oliveira. O contrato de seguro e a fraude do segu-
rado. Dissertação de Mestrado. Porto Alegre: Faculdade de Direito
da UFRGS, 2003.

173
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: contratos e atos uni-


laterais. 15ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018, p. 504 e 505 e 507.
GONÇALVES, Oksandro Osdival; RIBEIRO, Marcelo Miranda. Incen-
tivos Fiscais: uma perspectiva da Análise Econômica do Di-
reito. In: Economic Analysis of Law Review, v. 4, nº 1, p. 79-102,
Jan-Jun, 2013. Disponível em: <https://bdtd.ucb.br/index.php/
EALR/article/viewFile/4%20EALR%2079/4%20EALR%2021%20-%20
p>. Acesso: 17 dez. 2019.
HAM, Scott. Insuretech connect 2019 overview: Today’s pivotal in-
surance topics. Mckinsey e Company, 2019. Disponível em:
<https://www.mckinsey.com/industries/financial-services/our-in-
sights/insurance-blog/insuretech-connect-2019-overview>. Acesso
em: 07 nov. 2019.
INSUR-TECH BRASIL. O principal evento de insurtech da américa lati-
na está confirmado em 2020. [s.d]. Disponível em: <https://insur-
techbrasil.com/>. Acesso em: 03 dez. de 2019.
KRIGER FILHO, Domingos Afonso. O contrato de seguro. In: KRI-
GER FILHO, Domingos Afonso. O Contrato de Seguro no Direi-
to brasileiro. 1. ed. São Paulo: Frater et Labor Edições Ltda - Labor
juris, 2000.
LEÓN, Gustavo Amado. A atividade seguradora no Brasil e sua re-
lação comercial com os resseguradores dcionais. Orientador:
Prof. Dr. Antônio Márcio da Cunha Guimarães. 2018. Dissertação
(Mestrado em Direito) - Mestrado, São Paulo, 2019. Disponível em:
https://sapientia.pucsp.br/bitstream/handle/21982/2/Gustavo%20
Amado%20Le%c3%b3n.pdf. Acesso em: 7 dez. 2019.
LEONARD, Hannah. What is the future of insurance distribution?
Insurtech Gateway, 23 mai. 2019. Disponível em: <https://insur-
techgateway.com/2019/05/23/future-of-insurance-distribution/>.
Acesso em: 10 nov. 2019.
LEWIS, Sam. Insurtech: an industry ripe for disruption. Georgetown
Law Technology Review, vol. 1, 2, p. 491-502, 2017, p. 493.

174
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

MCKINSEY & COMPANY (Estados Unidos da América). Insurtech:


the threat that inspires. Nova York, março 2017. Disponível em:
https://www.mckinsey.com/industries/financial-services/our-insi-
ghts/insurtech-the-threat-that-inspires. Acesso em: 8 dez. 2019.
OCTAVIANI, Alessandro. Estado moderno, sistema econômico e
seguro: Aproximação da regulação pública sobre os seguros pri-
vados. Disponível em: www.ibds.com.br.
PINHEIRO, Armando Castelar; SADDI, Jairo. Direito, economia e
mercados. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
RODRIGUES, Adriano. Gerenciamento da informação contábil e
regulação: evidências no mercado brasileiro de seguros. 2008.
Tese (Doutorado em Controladoria e Contabilidade: Contabilida-
de) - Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Uni-
versidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
SALAMA, Bruno Meyerhof. O que é direito e economia? Direito UNI-
FACS – Debate Virtual, Salvador, n. 130, p. 1-17, 2013.
SAMPAIO, Murilo de Medeiros. Lei dos grandes números na per-
colação multi-dimensional: apresentação. 2007. 42. Dissertação
submetida para obtenção do grau de Mestre em estatística- Univer-
sidade Federal de Pernambuco, Recife, 2007.
SCHWAB, Klauss. A quarta revolução industrial. 1ª ed. São Paulo:
Edipro, 2016, p. 11-12
SIMÕES MAGRO, Francisco Humberto. A revolução do big data: A
nova revolução com o big data. Revista brasileira de atuária,
número 1, 2017.
SUSEP - Superintendência de Seguros Privados. In: História do Segu-
ro. [S. l.], 2019. Disponível em: http://www.susep.gov.br/menu/a-
susep/historia-do-seguro. Acesso em: 7 dez. 2019.
SZTAJN, Rachel. Externalidades e custos de transação: A redistribui-
ção de direitos no Covo Código Civil. In: ÁVILA, Humberto (Org).
Fundamentos do estado de direito. São Paulo: Malheiros, 2005.
TIMM, Luciano Benetti; ALVES, Francisco Kummel Ferreira, In: TIMM,

175
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Luciano Benetti (Org.) O novo direito civil: ensaios sobre o mer-


cado, a reprivatização do direito civil e a privatização do direito
público. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.
WUTHRICH, Mario V.; BUSER, Christoph. Data analytics for non-li-
fe insurance pricing. Swiss Finance Institute Research Paper, No.
16-68, 2019. Disponível em: <https://ssrn.com/abstract=2870308>.
Acesso em: 29 nov. 2019, p. 203.

176
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

A PREVISÃO CONTRATUAL DA INTEGRIDADE E


DE CUMPRIMENTO COMO DIFERENCIAL COM-
PETITIVO E ATIVO EMPRESARIAL

Bruno Fediuk de Castro58 e Lucas Hinckel Teider59

Resumo: No ambiente empresarial, além da possibilidade de


o Compliance ser compreendido como naturalidade ética e
moral inerente e indispensável, é crescente o entendimento,
tanto no campo teórico quanto no prático, de que a adoção
de um padrão de integridade e de cumprimento das normas
são elementos economicamente benéficos para os agentes
econômicos. Isso considerado, assumiu-se como problema
de pesquisa a indagação se, de fato, a previsão contratual (na
medida em que os contratos são a base da rotina empresarial)
de integridade e de cumprimento nos instrumentos de pacto
da corporação com seus clientes, parceiros, fornecedores e
demais terceiros possui o condão de trazer maiores ganhos
econômicos para a instituição. A problemática compreende
também contemplar a visão dos agentes econômicos com
relação ao Compliance, afastando a ideia de que Compliance
seria apenas um custo para as instituições. Em termos me-
todológicos, a partir de referenciais práticos e teórico-me-
todológicos (instrumentos lógico-categoriais), foi utilizado o
método hipotético-dedutivo, assim como o procedimento de
pesquisa monográfico e técnica de bibliografia em livros e ar-
tigos científicos. Ao final, comprovou-se que o cumprimento
das normas de integridade estabelecidas nos contratos em-

58 Mestrando em Direito Econômico e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná


(Curitiba - PR, Brasil). Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Curitiba - UniCuritiba (Curitiba –
PR, Brasil). Advogado. https://orcid.org/0000-0003-0947-8142. E-mail: bfc.adv@gmail.com.
59 Mestrando em Direito Econômico e Desenvolvimento pelo Programa de Pós-Graduação em
Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Bolsista da PUCPR (Bolsa de Fo-
mento ao Aprimoramento Pessoal).

177
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

presariais são economicamente importantes para as empre-


sas, considerado o beneficiamento econômico decorrente da
consideração de reputação corporativa como um importante
ativo empresarial.
Palavras-chave: Integridade; Contratos Empresariais;
Cumprimento; Compliance Empresarial; Ativo empresarial.

INTRODUÇÃO
As temáticas relativas às questões de integridade e de
cumprimento apresentam-se como um assunto de alta rele-
vância e incidência no cenário corporativo. Nesse sentido
não se contesta a contribuição do Compliance Empresarial
para o ideário de elevação do patamar ético das relações
negociais e a expectativa fundamental de adimplemento
às obrigações impostas e assumidas.
Não obstante a possibilidade de o Compliance Empre-
sarial ser entendido como naturalidade inerente e indis-
pensável da instituição sob o entendimento da prioridade
e primazia da integridade, questão que surge é a de se a
integridade e o cumprimento (especificamente materiali-
zados por meio da previsão contratual nos instrumentos
de pacto da corporação com seus clientes, parceiros, for-
necedores e demais terceiros) são elementos e circunstân-
cias corporativas capazes de proporcionarem resultados
econômicos benéficos para a empresa.
A partir desse problema de pesquisa e a fim de buscar
comprovar a hipótese positiva (de que a integridade e o
cumprimento, além de se demonstrarem como uma das prin-
cipais preocupações e contemplações corporativas, oportu-
nizam melhor saúde institucional), denotou-se como neces-
sária incursão nos fundamentos, aplicabilidades e benefícios
do compliance Empresarial, conceituando e contextualizan-

178
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

do a integridade e o cumprimento no ambiente corporativo;


a evidenciação e dissecação jurídico-normativa da previsão
contratual anteriormente abordada e seus efeitos; e a análise
e a conclusão das maneiras e formas pelas quais pode advir
beneficiamento econômico da instituição ou prevenção, mi-
tigação ou resposta adequada à perdas empresariais.
O presente artigo científico justifica-se nos três pilares da
adequação, atualidade e relevância. A adequação ao campo
de estudo da Análise Econômica do Direito se ampara no
questionamento e na conclusão dos efeitos do Compliance
Empresarial nos resultados econômicos da corporação. A
atualidade do tema é evidenciada pelo protagonismo das
pautas relativas à integridade e ao cumprimento no cená-
rio nacional e internacional, assim como a constatação da
necessidade de maior desenvolvimento científico do Com-
pliance aplicado às relações negociais. A relevância da pes-
quisa se apoia na sua contribuição de integração entre o
ideário teórico de integridade e de cumprimento e a entrega
de potencialidade de resultados às instituições a partir de
um instrumento de Compliance Empresarial.
Observada a amplitude da temática e dos problemas de
Compliance, impôs-se um recorte metodológico com o in-
tuito de verticalizar a pesquisa proposta para o artigo cien-
tífico e contribuir para a prática corporativa com questiona-
mento, análise e conclusão acerca de importante destaque
no cenário empresarial: a previsão contratual da integridade
e do cumprimento e o possível beneficiamento econômico,
direto ou indireto, da instituição a partir desse dispositivo.

COMPLIANCE EMPRESARIAL
Em termos teóricos (acadêmico-científicos) e práticos
(sobretudo no ambiente corporativo) muito se discute

179
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

acerca do tema de Compliance. Inobstante esse fato, ca-


racteriza-se como necessária a adequada conceituação do
instituto a fim de correta compreensão de seus pressupos-
tos e fundamentos, objetivos e potencialidades.
Para a sua completude e eficácia, em primeiro lugar e
necessariamente, o Compliance deve contemplar funda-
mentalmente a ética, a moral e a integridade (corporativa).
A partir de uma compreensão kantiana, o (verdadeiro)
Compliance não deve ser resumido à um imperativo hi-
potético (simples meio condicional ou instrumento), mas
deve ser contemplado, executado e rotineiramente prati-
cado como um imperativo categórico cujo intento essen-
cial seja o da integridade, onde a ação exemplar poderia
se apresentar como um princípio universal e parâmetro
(máxima replicável) para toda a instituição ou sociedade
(KANT, 2007, p. 50 e 59). Isso significa que o certo deve
ser feito fundamentalmente por ser o certo (e não exclu-
sivamente ou meramente em razão de uma obrigação [im-
posta ou assumida]). Em termos práticos, o Compliance
deve estar presente “em todas as atitudes das pessoas” e
“mover uma organização inteira, no sentido de adotar, de
fato, uma postura cada vez mais transparente, lícita, ética
e íntegra (GIOVANINI, 2014, p. 20 e 47).
Inobstante uma necessária dimensão axiológica do Com-
pliance, junto ao ambiente empresarial ganha tônus a com-
preensão do instituto e da metodologia como sinônimo de
cumprimento, notadamente em virtude de o termo da lín-
gua inglesa derivar da expressão “to comply”, que na língua
portuguesa significa estar em cumprimento (BLOCK, 2017,
p. 15). É inafastável a assimilação (ao menos literal e prima
facie) de Compliance como “concordância” e “obediência
ao que foi imposto pela norma” (CARDOSO, 2015, p. 35)

180
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ou “conformidade com as leis e regulamentos internos ou


externos à organização” (GIOVANINI, 2014, p. 20) cujo pro-
pósito seja o de “mitigar o risco atrelado à reputação e o
risco legal ou regulatório” (COIMBRA; MANZI, 2010, p. 2).
Em conexão com o tema, o problema e a hipótese
abordados, evidencia-se que os pilares de prevenção, de-
tecção (ou constante monitoramento) e resposta (GIOVA-
NINI, 2014, p. 51), manifestados por meio dos diversos
instrumentos de Compliance, tais como o mapeamento
de riscos, “fundamental para o sucesso da organização”
(GIOVANINI, 2014, p. 61), onde deverá ser antecipado “o
maior número de eventos incertos, no sentido de estabe-
lecer uma dinâmica, após identificado, para a sua priori-
zação, tratamento e controle” (CASTRO; ZILIOTTO, 2019,
p. 143); a elaboração de Matriz de Riscos e Controles que
também proporciona o aprimoramento contínuo (GIOVA-
NINI, 2014, p. 214 e 52); a elaboração de documentos
específicos; implementação de controles, “colocando em
prática os procedimentos criados (GIOVANINI, 2014, p.
90); e treinamentos, podem beneficiar a empresa com re-
sultados positivos, inclusive em aspecto econômico.
Como resultados da incorporação axiológica e imple-
mentação do Compliance na corporação, além de fatores de
prevenção institucional como o conhecimento dos riscos e
a classificação de seus potenciais danos e o beneficiamento
com redução de multas e atenuantes normativas nos casos
de eventual responsabilização; igualmente se vislumbram
melhorias operacionais como a redução do custo opera-
cional e o aumento da competitividade da instituição; bem
como melhora na imagem da corporação (fator reputacio-
nal) (ROCHA JUNIOR, GIZZI, 2018, p. 135-136).
Abordando-se o Compliance estritamente como me-

181
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

todologia de cumprimento (inclusive interno), é possí-


vel exemplificar com o correto seguimento de normas e
procedimentos de produção que, além de maior produ-
tividade e nível de acerto, geram menor índice de erro e
desperdício de insumos (humanos, tecnológicos ou mate-
riais). No sentido de prevenção institucional, COIMBRA e
MANZI, citando um estudo de Arnold Shilder, reiteraram
que o investimento de US$ 1 (um dólar) em Compliance é
equivalente à uma economia de US$ 5 (cinco dólares) em
relação à “custo com processos legais, danos de reputação
e perda de produtividade” (COIMBRA; MANZI, 2010, p. 5),
denotando-se, assim, o “valor comercial” do Compliance
(RIBEIRO; DINIZ, 2015, p. 94).
Uma pesquisa global em gerenciamento de riscos rea-
lizada pela AON apontou “danos à reputação e à marca”
como uma das principais preocupações dos agentes eco-
nômicos entrevistados (2019)60. Segundo o relatório ela-
borado pela AON, ao longo dos últimos anos, ao mesmo
tempo em que defeitos de produtos, fraudes ou corrupção
ainda são altos riscos de dano à reputação, a crescente uti-
lização de novas tecnologias midiáticas possuem potencial
de aumentar de forma significativa um impacto negativo,
tornando as empresas mais vulneráveis (AON, 2017, p. 4).
Cabe destacar que, ainda que o relatório de 2019 in-
dique que para os próximos anos outras preocupações
deverão ganhar papel de maior destaque, como, por
exemplo, a escassez de produtos e questões envolvendo
a proteção de dados, o dano à reputação/marca permane-
cerá como uma das principais preocupações diretas das
empresas, observando-se, também, que eventuais proble-
60 O dano à reputação/marca havia sido considerado como a principal preocupação nas entrevistas
de 2015 e 2017. Já no relatório de 2019, a “Desaceleração econômica/recuperação lenta” do mer-
cado passou a ocupar a primeira posição.

182
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

mas enfrentados podem acarretar indiretamente danos à


imagem (AON, 2019, p. 13).
Os últimos dois relatórios apresentados pela AON (2017
e 2019) evidenciam a magnitude do fator reputacional,
destacando de forma (in)direta a importância Compliance
Empresarial no sentido de cumprir as normas e os termos
pactuados com os clientes, fornecedores e demais agentes
econômicos visando, não apenas, mas inclusive, preservar
a imagem e a reputação da companhia perante o mercado
e suas partes integrantes.

A PREVISÃO CONTRATUAL DA INTEGRIDADE


E DO CUMPRIMENTO
A rotina das empresas e dos empresários está baseada
em contratos, sejam escritos ou não, de longa ou curta du-
ração. O enfoque do presente artigo são aqueles que pode-
mos denominar “contratos empresariais”, adotando-se aqui
o conceito utilizado por Paula Forgioni (2009, p. 29), para
quem os contratos empresariais são aqueles praticados pe-
los comerciantes no exercício de sua profissão com outros
empresários, movidos pela busca do lucro. É justamente
neste cenário que os contratos ganham sentido e força.
Ao contratar, os agentes manifestam seu interesse indi-
vidual, e, se forem deixados livres, no exercício de suas ra-
cionalidades, realizarão o melhor negócio possível. Dentro
deste cenário, a positividade do resultado da negociação
contribuirá para o nível de estabilidade social e para o de-
senvolvimento econômico (RIBEIRO, 2011, p. 63).
A autonomia da vontade e o respeito aos contratos pos-
sibilita a existência do mercado, garantindo a sua manu-
tenção. É preciso ter consciência de que ninguém contrata
pelo simples prazer de contratar: há motivos e interesses

183
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

relacionados. As cláusulas de um contrato empresarial são


pensadas e analisadas pelas partes envolvidas previamente
a assinatura do contrato. Paula Forgioni (2019, p. 117) des-
taca que, ao se vincular, as empresas têm em vista determi-
nado objetivo, o qual, por sua vez, mescla-se com a função
que esperam que o negócio desempenhe, pois, segundo a
autora, todo negócio possui uma função econômica.
Irineu Galeski Júnior (2011, p. 132) aponta que para se
negociar uma relação econômica, concretizá-la ou forçar o
seu cumprimento, as partes gastam muito, o que poderia
ser reduzido com a existência de algumas normas claras
que garantissem mais efetividade ao negócio. O que está
sendo tratado aqui é justamente com relação aos custos
de transação.
Os custos de transação podem ser conceituados como
os custos das trocas ou comércio, sendo divididos em (a)
custos incorridos previamente para a realização do negó-
cio; (b) custos de negociação; e (c) custos para cumpri-
mento daquilo que foi pactuado entre as partes (COOTER
e ULEN; 2010, p. 105).
Williamson (1996), por sua vez, identifica nos custos
de transação três atributos essenciais: (a) a frequência, (b)
a incerteza e (c) a especificidade dos ativos. Destaca-se
que, com relação ao primeiro atributo, quanto maior for a
frequência, menores serão os custos relativos à coleta de
informações e à celebração dos contratos, haja vista que o
agente econômico estará melhor e mais preparado dado o
seu histórico e pesquisas anteriores. Ademais, a frequência
de transações entre os mesmos agentes econômicos tende
a propiciar maior confiança mútua, diminuindo-se assim
os custos de transação nas relações que sucederem.
Nesse sentido, tem-se que o agente, em cada transação

184
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

realizada, buscará adimplir as suas obrigações a fim de


encorajar as futuras contrapartes a nele confiar ou, em ou-
tras palavras, manter a própria reputação de honestidade.
Independentemente do contrato a ser firmado, a confiança
entre as partes envolvidas na operação é fator a ser con-
siderado, justamente por este motivo, a confiabilidade de
uma parte se apresenta como importante característica no
mundo corporativo.
Sztjan (2010, p. 14) exemplifica que, no comércio inter-
nacional, a confiança serve de fundamento para que muitos
empresários aceitem a estranha prática para empregar ter-
mos genéricos. Para a autora, a maximização da eficiência
permite que os agentes econômicos, agindo racionalmente,
celebrem contratos incompletos desde que conheçam as
políticas econômico-sociais que poderão ser invocadas em
face de uma dada operação internacional. A incompletude
dos contratos poderia constituir-se na estratégia preferidas
dos contratantes que pretendem basear primordialmente na
confiança mútua a função de assegurar o respeito às obriga-
ções assumidas entre as partes (FICI, 2005, p. 101), afastan-
do-se, assim, a presença de condutas oportunistas.

OS BENEFÍCIOS ECONÔMICOS PARA A EMPRESA


Em termos práticos de Direito Empresarial, é possível
concluir que a integridade e o cumprimento representam
um importante ativo comercial da empresa na medida em
que a doutrina contempla os chamados bens incorpóre-
os existentes “na consciência coletiva” (REQUIÃO, 2010,
p. 334-339) e que parte integrante dos ativos intangíveis
constitui-se como o capital intelectual da corporação (ca-
paz de gerar vantagem competitiva) (VARGAS; ORTIZ,
2014, p. 19-20).

185
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Insere-se, nessa realidade, a reputação corporativa, por


exemplo, como a concepção do prestígio da instituição, a
sua imagem e as opiniões (positivas ou negativas) exter-
nadas acerca da empresa (VARGAS; ORTIZ, 2014, p. 21).
Em uma relação negocial, quando uma corporação exige
à outra a contemplação (notadamente contratual) da inte-
gridade e do cumprimento, está se buscando a preserva-
ção estratégica de seus ativos, entre eles aquele intangível
da reputação (ante aspectos regulatórios e potencialmen-
te sancionatórios). Isso considerado, possuir efetivamente
Compliance pode representar, além de uma imprescindi-
bilidade ética, uma necessidade competitiva e de lugar co-
mum de mercado.
Tão importante quanto a ideia (ou mais) é a sua ope-
racionalização. No ambiente empresarial, considerada a
natureza das relações e visando a segurança do adimple-
mento das ideias e intenções acordadas, uma maneira na-
tural de contemplação da integridade e do cumprimento
ocorre por meio do instrumento do contrato. Deste modo,
o não cumprimento das normas contratualmente previstas
podem ocasionar não apenas a aplicação de penalidades
que foram pactuadas no contrato, mas também efeitos co-
laterais em razão da perda da confiança para com aquele
que deixou de honrar o contrato.
Estudos jurídico-econômicos demonstram que as con-
venções sociais influenciam o comportamento humano,
possibilitando uma postura que não leva em consideração
apenas o interesse particular, mas passe a adotar outras
motivações, tais como: o altruísmo, a preocupação pelo
interesse geral ou o bem comum, o sentimento de justiça,
a solidariedade e a equidade. Acrescenta-se, ainda, que
a vontade de salvaguardar a própria reputação constitui

186
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

– observadas determinadas condições, um desincentivo a


adotar comportamentos oportunistas e um fator de adim-
plemento espontâneo dos contratos (FICI, 2005, p. 99).
Tratando do comportamento dos agentes e do fator re-
putacional, interligado com o tema de Compliance Empre-
sarial está a corrupção, que cada vez mais se apresenta na
sociedade contemporânea como um fenômeno transna-
cional, afetando de forma negativa diversos sistemas po-
líticos e econômicos. Para combater este cenário, muitos
países adotaram políticas no sentido de prevenir e comba-
ter a corrupção.
O Brasil seguiu este mesmo caminho, além de ratifi-
car alguns tratados neste sentido, como, por exemplo, a
Convenção Interamericana contra a Corrupção (“OEA”), a
Convenção da Organização para a Cooperação e Desen-
volvimento Econômico (“OCDE”) e a Convenção das Na-
ções Unidas contra a Corrupção (“UNCAC”). Promulgou,
dentre outras, a Lei nº 8.429, de 2 de Junho de 1992 (“Lei
de Improbidade Administrativa”) e a Lei nº 12.846, de 1º
de agosto de 2013 (“Lei Anticorrupção”).
Não obstante a Lei Anticorrupção ter estabelecido be-
nefícios econômicos para empresas que, caso autuadas,
possuíssem um programa de integridade ativo, a ima-
gem, a reputação da empresa e do empresário passaram
a ser bastante considerados pelos agentes econômicos, de
modo que alguns optaram em não ter a sua imagem vin-
culada com pessoas físicas e/ou jurídicas que estivessem
envolvidas em atos de corrupção.
A má reputação, considerada como um custo à parte
que deve ser levado em conta quando estiver perseguin-
do o próprio interesse, acaba por reduzir as perspectivas
de futuras transações. Desta forma, tem-se que o agente

187
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

econômico racional deve observar os custos existentes ao


agir de forma cativa, optando, se desfruta ou não, de uma
posição de vantagem, eventualmente produto da modi-
ficação de circunstâncias. (FICI, 2005, p. 99). Por certo,
aproveitar-se de uma situação de vantagem pode trazer
benefícios imediatos, mas, considerando o risco reputacio-
nal, pode acarretar prejuízos em operações futuras. Sob o
prisma da Análise Econômica do Direito, deve o agente se
sentir desincentivado à descumprir o contrato, eis que não
lhe será mais benéfico.
Considerando a preocupação com a legalidade das
operações, por motivos de moralidade ou de interesse
econômico, os empresários e as empresas passaram a dar
mais importância aos mecanismos de Compliance em seus
compromissos, inclusive quando da contratação de tercei-
ros. Afora o aspecto da moralidade, vislumbrou-se que o
caráter reputacional passou a ser bastante considerado nas
contratações no mercado, tornando-se fator de escolha e
até mesmo de exclusão de determinados agentes.
Neste cenário, o receio da parte em perder a reputação
pode ser caracterizado como um impedimento à realiza-
ção de uma conduta oportunista pelo agente, inclusive
nas relações de longa duração, afinal, ao contrário do que
pode ocorrer em acordos isolados, exigem que as partes
atuem com cooperação, caso contrário perder-se-ia a pos-
sibilidade de efetuar outros negócios posteriores com o
agente enganado, ou até mesmo com outros agentes, afi-
nal, poderia ocorrer a disseminação da informação de sua
inconfiabilidade. Assim, a melhor estratégia para o agente
econômico é convencer o outro agente de sua própria
honestidade e respeitar, a cada negócio, a confiança em si
depositada. (FICI, 2005, p. 100).

188
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dentro da problemática desse artigo, verificou-se que
uma dificuldade para a implementação, adesão e enfor-
cement do Compliance nas empresas pode se constituir
como o argumento de que as corporações não poderiam
apenas se guiar pela vontade de elevação do patamar ético
de suas negociações, eis que, observando a racionalidade
limitada dos agentes, o Compliance poderia ser visto tão
somente como um custo. Desta forma, os agentes econô-
micos enfrentam o dilema entre cumprir ou não a norma e
conhecer as possíveis consequências de suas ações. Com-
preendeu-se que o Compliance, além de não se apresentar
como um mero ou exclusivo custo às instituições, pode
se configurar como um investimento, podendo direta ou
indiretamente originar benefícios econômicos aos agentes
que optem pelo cumprimento das normas.
Além de uma dimensão ética e moral do Compliance
(que deve ser entendido como um imperativo categórico
no ambiente corporativo), necessariamente coexiste uma
perspectiva de literal e operacional cumprimento empre-
sarial, considerando-se a preocupação com o fator repu-
tacional, bem como os benefícios do Compliance Empre-
sarial (à exemplo da prevenção institucional; a redução
de custo operacional; o aumento da produtividade, apro-
veitamento e competitividade; e decorrente melhoria de
imagem), o fato de a reputação corporativa constituir-se
como um ativo da empresa e o diferencial competitivo
experimentado.
Na medida em que a rotina empresarial é baseada fun-
damentalmente em contratos (empresariais, ou seja, movi-
dos pela busca do lucro), os quais podem contribuir para
a estabilidade social e o desenvolvimento econômico, o

189
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

adimplemento contratual representa a manutenção da


confiança corporativa e da reputação de honestidade.
Nesse cenário, a integridade e o cumprimento se apresen-
tam como importante ativo empresarial (intangível), especifi-
camente alocado no capital intelectual da instituição e, mais
verticalmente, em sua reputação corporativa. Não obstante, a
maneira (ou o instrumento) pelo qual se consolida a previsão
de integridade e de cumprimento são os contratos.
Estabelecido o fato de que a má-reputação pode se cons-
tituir ou implicar em custos para a empresa, o caráter repu-
tacional é necessariamente considerado nas relações de mer-
cado. O receio de perdas reputacionais funda-se como um
incentivo ao adimplemento (seja ele ético, em termos axio-
lógicos, ou contratual, em sua vertente prático-corporativa).
Junto ao cenário de que o beneficiamento econômico
das empresas decorrente do Compliance se justifica pela
consideração da reputação como (importante) ativo empre-
sarial, a conclusão (que até mesmo vai além do escopo do
presente artigo para aproveitar às empresas e à sociedade)
é a de que a melhor estratégia corporativa é a honestidade.

REFERÊNCIAS
AGUSTINHO, Eduardo Oliveira; RIBEIRO, Márcia Carla. Economia
Institucional e Nova Economia Institucional. In: RIBEIRO,
Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é análise
Econômica do Direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum,
2011.
AON. Pesquisa global de gerenciamento de riscos. 2017, dispo-
nível em http://aonbrasil.com/pesquisa-global-riscos-2017. Acesso
em 09 dez. 2019.
AON. Pesquisa global de gerenciamento de riscos. 2019, disponí-
vel em https://aonconteudo.com.br/pesquisa-global-de-gerencia-

190
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

mento-de-risco-sumario-executivo-2019/. Acesso em 09 dez. 2019.


BLOCK, Marcella. Compliance e governança corporativa: atualiza-
do de acordo com a Lei Anti-corrupção Brasileira (Lei 12.846) e o
Decreto-Lei 8.421/2015). Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2017.
CARDOSO, Débora Motta. Criminal compliance na perspectiva da
lei de lavagem de dinheiro. São Paulo: LiberArs, 2015.
CASCIONE, Fábio de Souza Aranha (org.). Lei anticorrupção: uma
análise interdisciplinar. São Paulo: LiberArs, 2015.
CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de; ZILIOTO, Mirela Miró. Com-
pliance nas contratações públicas: exigências e critérios norma-
tivos. Belo Horizonte: Fórum, 2019.
COASE, Ronald. The Nature of the Firm. In: Economica, New Series,
vol. 04, n° 16, 1937.
COIMBRA, Marcelo Aguiar; MANZI, Vanessa Alessi (orgs.). Manual de
Compliance: preservando a boa governança e a integridade das
organizações. São Paulo: Atlas, 2010.
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Direito e Economia. Tradução de
Luis Marcos Sander e Francisco Araújo da Costa. 5ª edição. Porto
Alegre: Bookman, 2010.
DE GASPERÍN, Miguel Ángel Vichique. Riesgo Reputacional y Ges-
tión Institucional de Crisis. Barcelona (Espanha), 2013. 795 f.
Tese (Doutorado) – Departamento de Comunicação, Universidad
Pompeu Fabra.
DEMATTÉ, Flávio Rezende. Responsabilização de pessoas jurídi-
cas por corrupção: A Lei nº. 12.846/2013 segundo o direito de
intervenção. Belo Horizonte: Fórum, 2015.
FICI, Antônio. Il contrato incompleto. Torino: G. Giappichelli, 2005.
FORGIONI, Paula Andrea. Teoria Geral dos Contratos Empresa-
riais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
FORGIONI, Paula A. A evolução do direito comercial brasileiro. 3
edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016
FORGIONI, Paula A. Contratos Empresariais. Teoria Geral e Apli-

191
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

cação. 4ª edição. São Paulo. Thomson Reuters Brasil, 2019


GALESKI Junior, Irineu. Economia dos Contratos. In: RIBEIRO, Mar-
cia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é análise Eco-
nômica do Direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum, 2011,
p. 129-139.
GALESKI Junior, Irineu; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Teoria geral
dos contratos: contratos empresariais e análise econômica.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
GIOVANINI, Wagner. Compliance: a excelência na prática. São Pau-
lo: s.n., 2014.
KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes.
Lisboa (Portugal): Edições 70, 2007.
KELLY, Kevin. New rules for the new economy: 10 radical strategies
for a connected world. Harmondsworth (England): Viking, 1998.
LAMBOY, Christian Karl de (org.). Manual de compliance. São Paulo
(SP): Instituto ARC, 2017.
NUCCI, Guilherme de Souza. Corrupção e anticorrupção. Rio de
Janeiro: Forense, 2015.
REPUTATION DIVIDEND; MZ GROUP. The twenty most potent
corporate reputations in Brazil contributing US$89bn of sha-
reholder value, 2016. São Paulo.
REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. Volume 1. 34 edi-
ção. São Paulo: Saraiva, 2015.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; DINIZ, Patrícia Dittrich Ferreira. Com-
pliance e Lei Anticorrupção nas Empresas. Revista de informa-
ção legislativa, v. 52, n. 205, p. 87-105, jan./mar. 2015.
RIBEIRO, Márcia Carla. Racionalidade Limitada. In: RIBEIRO, Marcia
Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é análise Econômica
do Direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p. 63-71.
ROCHA JUNIOR, Francisco de Assis do Rego Monteiro; GIZZI, Gui-
lherme Frederico Tobias de Bueno. Fraudes corporativas e pro-
gramas de compliance. Curitiba: InterSaberes, 2018.

192
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

SILVEIRA, Renato de Mello Jorge; SAAD-DINIZ, Eduardo. Complian-


ce, direito penal e lei anticorrupção. São Paulo: Saraiva, 2015.
SZTJAN, Rachel. Função social do contrato e direito de empresa. Re-
vista de direito mercantil: industrial, econômico e financeiro, v.
44, p. 29-49, São Paulo, jul. 2005.
SZTAJN, Rachel; ZYLBERSZTAJN, Decio. Direito e economia: aná-
lise econômica do direito e das organizações. Rio de Janeiro:
Campus, 2005.
SZTAJN, Rachel. Supply chain e incompletude contratual. Systemas:
Revista de Ciências Jurídicas e Econômicas, Campo Grande (Bra-
sil). 2010.
VARGAS, J. G.; ORTIZ, S. El capital reputacional como cuestionamien-
to ético de la innovación tecnológica en Monsanto. Revista Di-
mensión Empresarial, Barranquilla (Colômbia), vol. 12, n. 1, p.
15-25, jan./jun. 2014.
WILLIAMSON, Oliver E. The Mechanisms of Governance. New
York/Oxford: Oxford University Press, 1996.
ZYLBERSZTAJN, Decio. A organização ética: um ensaio sobre as rela-
ções entre ambiente econômico e o comportamento das organiza-
ções. RAC, v. 6, n. 2, p. 123-143, mai./ago. 2002.

193
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE COMO UM


VALOR DE CONCRETIZAÇÃO À TRÍADE DA
REVOLUÇÃO FRANCESA

Laís Chuffi Rizardi61

Resumo: Os Direitos Humanos e Fundamentais, base do


Constitucionalismo Moderno, decorrem de uma perspecti-
va histórica de uma intensa luta em prol da superação da
opressão e construção de uma sociedade mais justa e iguali-
tária, constituindo a categoria fraternidade como uma influ-
ência de ideias que passa a refletir nas concepções que re-
gem as ações e relações estabelecidas em meio a sociedade.
Os ideais propagados pela Revolução Francesa impulsiona-
ram a construção dos ordenamentos jurídicos que grada-
tivamente passam a contemplar valores tidos como invio-
láveis e necessários a manutenção da ordem e pacificação
social. O presente trabalho tem por objetivo situar a Função
Social da Propriedade como um valor de concretização à
tríade da Revolução Francesa, discorrendo sobre a influên-
cia da categoria fraternidade na construção do Constitucio-
nalismo Moderno. Adota-se o método dedutivo e a técnica
de pesquisa bibliográfica. A Revolução Francesa desponta,
ao longo da história da humanidade, como um movimento
marcado pela superação das contradições produzidas pelo
capitalismo, cuja tríade liberdade, igualdade e fraternidade
passa a nortear as codificações que se seguiram, a ponto de
refletirem na conotação atribuída aos direitos fundamentais,
no que tange ao direito à propriedade.
Palavras-chave: Função social da propriedade; Revolu-
ção francesa; AED.
61 Mestra em Direito pelo Centro Universitário Eurípides de Marília (UNIVEM) – Marília/SP.

194
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

INTRODUÇÃO
Um elemento comum a todos os tipos de revoluções
consiste na resistência popular contra mecanismos de
opressão perpetrados pelo próprio Estado, ao mesmo
tempo tais “movimentos” trazem mudanças profundas e
certamente não teriam acontecido caso a população não
tivesse se mobilizado para a transformação da realidade
que a afetava.
Dentro desse contexto, a Revolução Francesa se trans-
formou muito mais que no símbolo da resistência contra
os arbítrios e desmandos praticados pelo poder estatal ab-
soluto reinante na França no final do século XVIII, tornan-
do-se um acontecimento que contribuiu para a modifica-
ção da história de toda a humanidade.
Ancorando-se nos ideais de liberdade, igualdade e fra-
ternidade, a partir da Revolução Francesa, a influência
destes na construção de diferentes ordenamentos jurídicos
ao redor do mundo, fomentando-se o cenário ideal para o
surgimento do Constitucionalismo, cujas bases contempo-
râneas encontram-se assentadas na valorização e respeito
aos direitos e garantias fundamentais.
A exemplo do que se vislumbra em relação ao orde-
namento jurídico brasileiro e especificamente no tocante
ao direito de propriedade, cuja evolução normativa resul-
tou na refutação ao caráter absoluto de tal direito, objeti-
vando-se a consolidação de uma sociedade democrática e
igualitária, está o seu exercício vinculado ao atendimento
de sua função social.
A função social da propriedade apresenta-se como um
valor que concorre para a contribuição à tríade da Revo-
lução Francesa.
Partindo desse pressuposto, o presente trabalho tem

195
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

por objetivo geral situar a Função Social da Propriedade


como um valor de concretização à tríade da Revolução
Francesa, discorrendo sobre a influência da categoria fra-
ternidade na construção do Constitucionalismo Moderno.
Enquanto problema encontrado, verifica-se o exercício do
direito de propriedade condicionado a uma função social.
Justifica-se que com a ordem jurídica constitucional, nin-
guém poderá ser privado dos seus bens, a não ser nas hipó-
teses legalmente previstas. A função social da propriedade
é vista como a valoração de uma sociedade que reconhece
o papel de cada um dos seus membros, no que diz respei-
to ao exercício do direito de propriedade, concorre para a
manutenção dos interesses de toda a sociedade.
Adota-se o método dedutivo, visto que os argumentos
dedutivos apresentados sustentam a conclusão e a técnica
de pesquisa bibliográfica que é realizada a partir da con-
sulta a referencial teórico que discute a temática proposta,
constituído de livros e artigos científicos.

A FRATERNIDADE E O CONSTITUCIONALISMO
MODERNO
É importante compreender que, a base para o nasci-
mento do Constitucionalismo Moderno fundado no reco-
nhecimento dos direitos e garantias fundamentais, bem
como a limitação do poder político por parte do Estado,
estão asseguradas em grande parte nas ideias propagadas
na Europa, de forma especial na França, cuja mobilização
social resultou na afirmação da fraternidade como catego-
ria política a refletir na construção das relações entre os
seres humanos.
Baseando-se no referencial teórico de Barroso (2015),
para além de um acontecimento histórico com seu próprio

196
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

enredo, a Revolução Francesa desempenhou um papel sim-


bólico arrebatador no imaginário dos povos da Europa e do
mundo que vivia sob sua influência no final do século XVIII,
incumbindo a ela e não à Revolução Inglesa ou à Americana,
conferir o sentido moderno ao que se entendia por revo-
lução, implicando em um divisor de “águas” em termos do
antes e do que se passou a suceder em nível mundial.
Do ponto de vista deste autor, a Revolução Francesa
face às suas peculiaridades contribui de forma decisiva
para o redimensionamento das relações entre o homem
e o Estado, e como tal, embora de forma tardia, agente
construtor de sua própria história.
Em atenção a tais aspectos:
A Revolução não foi contra a monarquia, que, de início,
manteve-se inquestionada, mas contra o absolutismo, os
privilégios da nobreza, do clero e as relações feudais no
campo. Sob o lema liberdade, igualdade e fraternidade,
promoveu-se um conjunto amplo de reformas antiaristo-
cráticas, que incluíram: a) a abolição do sistema feudal;
b) a promulgação da Declaração dos Direitos do Homem
e do Cidadão; c) a elaboração de uma nova Constituição,
concluída em 1791; d) a denominada constituição civil do
clero. Essa primeira fase da revolução, que foi de 1789 a
1792, consumou o fim do Antigo Regime e pretendeu criar
uma monarquia constitucional e parlamentar, em que o
rei deixava de ser soberano por direito próprio e passava
a ser delegado da nação (BARROSO, 2015, p. 51).
Destaca-se que a partir da Revolução Francesa um in-
tenso aparato de cunho ideológico passa a refletir de for-
ma substancial no papel do Estado frente a sociedade,
reconhecendo-se a partir desse redimensionamento uma
série de direitos e garantias.

197
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Neste contexto:
Não faz dúvida, entretanto, que o principal documento
da evolução dos direitos fundamentais para a consagra-
ção dos direitos econômicos e sociais foi a Constituição
francesa de 1848. Esse 1848 foi na Europa um ano de
graves conflitos, de “revoluções”, uma das quais foi a
que derrubou na França a monarquia orleanista. Ora,
um elemento importante nesses movimentos, e particu-
larmente no que ocorreu em Paris, foi a atuação dos
trabalhadores e dos desempregados. A conotação social
da revolução que levou à segunda república é nítida.
A Constituição então elaborada, promulgada em 4 de
novembro, é precedida de um preâmbulo e contém um
capítulo no qual se enunciam os direitos por ela garanti-
dos. No primeiro, que expressamente “reconhece os di-
reitos e deveres anteriores e superiores às leis positivas”
(III), é dada por tarefa à República “proteger o cidadão
na sua pessoa, sua família, sua propriedade, seu traba-
lho, e pôr ao alcance de cada um a instrução indispen-
sável a todos os homens”. Deve ela, ademais, “por uma
assistência fraternal, assegurar a existência dos cidadãos
necessitados, seja procurando-lhes trabalho nos limites
de seus recursos, seja dando-lhes, à falta de trabalho,
socorros àqueles que estão sem condições de trabalhar”
(VIII). Está aí explícito o direito ao trabalho, assim como,
embora a ênfase seja menor, o direito à educação (FER-
REIRA FILHO, 2016, p. 61-62).
As noções básicas de que a fraternidade deve concorrer
para a promoção de uma vida digna por parte de toda a
sociedade, desfrutando todos os seres humanos de um
mínimo existencial, sem o qual não se pode falar em uma
sociedade que se intitule fraternal.

198
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

De tal modo, a fraternidade como um valor maior a


ser concretizado por todas as nações que passam a reco-
nhecer expressamente a coexistência de direitos e deveres
intrínsecos ao ser humano, a exemplo se sucedeu com a
promulgação da Constituição Brasileira de 1988.
Conforme o entendimento de Silva e Brandão (2015,
p. 124) a fraternidade como “fundamento para entender
a Constituição Brasileira como projeto cultural e, como
categoria política”.
Como projeto cultural, evidencia-se a construção de
uma nova mentalidade passando a refletir na cultura e
consequentemente no pensamento de cada cidadão, ten-
de a reconhecer o seu papel individual na construção de
uma sociedade.
Já a fraternidade como categoria política impele a va-
lorização na construção do ordenamento jurídico vigente
dos valores que venham a colaborar para uma sociedade,
cuja liberdade seja exercida de forma a promover a igual-
dade na fruição de direitos e deveres, com base em con-
cepções que valorizem o ideal de uma sociedade a serviço
do ser humano.
Deste modo:
(...) é o compasso teórico que irá restituir à Política o
sentido da existência humano (existência do humano),
implementando, assim, um ritmo bem brasileiro na mar-
cha constitucional, embalando o desenvolvimento em
evoluções coreografadas, de forma a não retroceder
nunca ao nível cultural adquirido pelo Estado Constitu-
cional Brasileiro, colocado à serviço da sociedade brasi-
leira, criando, assim, condição para tornar a Sociedade
critério de decisão adequada a sociedade brasileira (SIL-
VA; BRANDÃO, 2015, p. 124).

199
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Qualquer valorização que venha se dar em nível “polí-


tico” e refletir na tomada de decisões, inclusive quanto ao
âmbito legislativo, não pode implicar na repulsa à catego-
ria fraternidade, pois esta impulsiona a própria essência
do Estado Democrático de Direito.
O Estado Constitucional Brasileiro deve ser entendido
como um Estado cuja razão de ser o coloca em direção
ao atendimento inadiável das necessidades da sociedade,
alicerçado em um referencial teórico cujo legado histórico
não pode ser ignorado, sob pena de retrocesso.
Para a compreensão, o sentido presente no vocábu-
lo fraternidade está vinculado diretamente ao conjunto
de valores que regem as sociedades contemporâneas de
cunho essencialmente democrático.
Assim:
Encontra-se na fraternidade um referencial teórico e prático
capaz de recuperar a ideia-força contida na tríade francesa
revelada como uma das mais fortes fórmulas de ideais pro-
gramáticos, inclusive entre aqueles apresentados nas culturas
políticas contemporâneas (SILVA; BRANDÃO, 2015, p.125).
É essencial compreender a fraternidade do ponto de
vista político, na medida que encerra a consecução de ins-
trumentos, além do ideal de solidariedade entre as pessoas
que compartilham de um mesmo espaço.
Nessa perspectiva, (re)propor a Fraternidade como prin-
cípio do universalismo político e, consequentemente,
como categoria política, requer que ela seja entendida
como uma ideia muito mais ampla que a solidariedade,
mesmo quando possa ser considerada princípio, e não
remédio (SILVA; BRANDÃO, 2015, p. 125).
Embora a solidariedade esteja inserida dentre os valores
essenciais para a convivência harmônica e auxílio mútuo en-

200
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

tre os membros de uma determinada sociedade, a fraternida-


de vai ao encontro da construção de uma sociedade capaz
de gerar a fruição de todos os direitos sociais indispensáveis
para todos os indivíduos desfrutarem uma vida digna.
A partir dos valores ofertados por Silva e Brandão
(2015), reconhecer a configuração da fraternidade como
princípio político na atualidade demanda a superação das
fronteiras dos Estados assistencialistas e nitidamente pro-
tetores, inaugurando em seu âmbito sociedades democrá-
ticas cuja prática é capaz de gerar a concretização dos
direitos sociais, sem os quais, não se pode intitular uma
sociedade como democrática.
Como argumentado por tais autores, uma atuação polí-
tica direcionada à redistribuição e reconfiguração das lógi-
cas proprietárias e de interpretação nacional-nacionalista
em termos de distribuição econômica e material dos bens
materiais existentes.
A respeito do nosso Estado Democrático de Direito,
evidencia-se que o preâmbulo traz em seu âmbito o ideá-
rio expresso ao qual ele se destina.
De tal modo:
O preâmbulo da Constituição Brasileira, de forma pre-
cisa e convencionada, é a expressão da ideia para a
qual o Estado Constitucional é instituído e, logicamen-
te, os termos dessa ideia devem ser conhecidos e co-
municados àqueles a quem ele é destinado a servir, ou
seja, à Sociedade brasileira. A fórmula prescrita no texto
do preâmbulo da Constituição Brasileira comunica ao
povo brasileiro a destinação do Estado Constitucional
instituído, que é, e deve ser assegurada uma Sociedade
fraterna, pluralista e sem preconceitos (SILVA; BRAN-
DÃO, 2015, p. 126).

201
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Trata-se o preâmbulo da Constituição brasileira da ex-


pressão e exteriorização da finalidade que encarta a razão
de ser do nosso Estado Democrático de Direito, trazendo
os ideais em torno dos quais circundam as disposições
presentes ao longo do seu texto.
Vejamos:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em
Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Es-
tado Democrático, destinado a assegurar o exercício
dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segu-
rança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade
e a justiça como valores supremos de uma socieda-
de fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na
harmonia social e comprometida, na ordem interna e
internacional, com a solução pacífica das controvér-
sias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguin-
te CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO
BRASIL (BRASIL, 1988, p. 1).
A missão maior de nosso Estado Democrático consiste
em assegurar, ou seja, concretizar e viabilizar o exercício
de todos os direitos, garantias e pressupostos que corres-
pondam aos valores maiores de uma sociedade fraterna,
pautada no apreço ao coletivo, a diversidade, harmonia e
solução pacífica dos conflitos.
Na abordagem de Bonavides; Miranda e Agra (2009),
percebe-se os valores que norteiam a construção de uma
“sociedade fraterna” contemplados no preâmbulo da
Constituição Brasileira vinculados à tríade, que marca o
pensamento constitucional após 1945, acrescentando-se
através da expressão “pluralista” a orientação de um Es-
tado Democrático cuja atuação política deve fomentar o
atendimento ao bem comum.

202
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Razão pela qual:


Além de garantir o exercício dos direitos sociais e direitos
individuais, o texto do preâmbulo expressa reconhecer,
também, que esses direitos não são apenas direitos, mas
“valores supremos de uma Sociedade fraterna, pluralista
e sem preconceitos” (SILVA; BRANDÃO, 2015, p. 127).
Fala-se em valores supremos na medida que correspon-
dam ao sentido de cunho ideológico que deve orientar as
ações e práticas sociais estabelecidas.
E como tal, “os valores enumerados no preâmbulo são
considerados supremos, ou seja, acima de qualquer outro”
(SILVA; BRANDÃO, 2015, p. 127).
Dessa maneira, estando acima de qualquer pretensão e
valoração de cunho individual, buscando-se a consolidação
do ideal de uma sociedade cuja identidade e relações con-
correm para o alcance da fraternidade em sua totalidade.
Neste sentido:
A adjetivação fraterna dada à Sociedade contêm duas
ideias: primeiro manifesta o anúncio de uma sociedade
que é e, ao mesmo tempo, anuncia a Sociedade preten-
dida, criando, assim, uma qualificação e uma identifi-
cação social como condição para as nações e relações
na organização da ordem social e convivência política
(SILVA; BRANDÃO, 2015, p. 128).
Por sociedade fraterna, compreende-se a noção de uma
sociedade que se reconhece como fraternal e ao mesmo
tempo concorre para a concretização de um ideal de manu-
tenção de uma ordem e convivência fundada na preserva-
ção de interesses maiores que se tornam indispensável para
o atendimento das necessidades de toda a coletividade.
Em termos práticos, com base em Lazzarin (2015), a
manutenção de uma ordem social pautada na promoção

203
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

da dignidade da pessoa humana somente se perfaz quan-


do cada sujeito puder experimentar na prática os direi-
tos sociais assegurados pelo ordenamento constitucional
pátrio, não podendo em nome do ideal de fraternidade,
aceitar-se qualquer ideia de retrocesso, que concorra para
a precarização.
Assim, para frear a crescente precarização dos direitos
na complexa sociedade contemporânea, a dignidade
humana tem que figurar em primeiro plano, o que de-
penderá de uma transformação da sociedade, implican-
do em uma alteração simultânea de todos os códigos
pelos quais a sociedade é guiada, enfim, uma revolu-
ção mental, configurando um verdadeiro desafio ético
(LAZZARIN, 2015, p. 92).
É possível compreender que a concretude de uma so-
ciedade fraterna depende substancialmente da capacidade
desta em promover a dignidade da pessoa humana, cená-
rio no qual há de se extirpar qualquer forma de precari-
zação, demandando a transformação da sociedade politi-
camente organizada, assim como o papel a ser cumprido
pelo Estado.
Para colocar o Estado a serviço de uma Sociedade qua-
lificada como fraterna é preciso ir mais além dos limites
das ações políticas, reflexões culturais e cumprimento da
função social fundamentadas na solidariedade. Colocar
o Estado a serviço de uma Sociedade qualificada como
fraterna é conferir maior validade e capacidade vincula-
tiva à interpretação constitucional, inclusive, através de
valores de orientação e objetivos educativos programá-
ticos-constitucionais nas ações e relações qualquer que
sejam seus tipos –existentes, potenciais ou virtuais -, com
reflexões culturais (SILVA; BRANDÃO, 2015, p. 134).

204
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

O ideal de uma sociedade fraterna não se resume a


um mero conjunto de intenções e sim, deve se traduzir
de forma prática na construção de ações e relações, com
reflexões culturais que induzam à uma nova realidade em
meio a sociedade orientada para o futuro.
Complementando tais aspectos:
A sociedade do humano é a perspectiva de Sociedade
do futuro: o horizonte que se abre para compor a ideia
de uma Sociedade fraterna, que é e deve ser a Socie-
dade brasileira, conforme compromisso firmado pela
determinação que se faz no Preâmbulo da Constitui-
ção Brasileira. Sociedade fraterna é, então a Sociedade
que tem como bem social o sentido da existência do
humano. É o tipo de Sociedade construída por pessoas
humanas estimuladas a perceber o sentido da própria
existência e, porque percebem o sentido da própria
existência, adotam modos de vida que dão sentido a
existência do humano e sua continuidade no tempo
e espaço da biosfera. Logo, a Sociedade fraterna é
uma Sociedade com vistas para o futuro, uma expres-
são equivalente a Sociedade do humano, na qual o
humano é o sentido relacional do pensar e agir da
pessoa humana. Esta é a Sociedade a ser considera-
da pelo constitucionalismo brasileiro para atender o
mandamento constitucional (SILVA; BRANDÃO, 2015,
p. 151).
O ideal de uma sociedade fraterna deve inspirar a pri-
mazia do humano sobre qualquer aspecto, inspirando tan-
to o agir, como o pensar do ser humano nas relações tra-
vadas com o outro.

205
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE E A TRÍADE


À REVOLUÇÃO FRANCESA
A partir da análise da influência de ideias em torno da
categoria fraternidade e sua influência na construção do
Constitucionalismo Moderno, a dinâmica social passou a
exigir novas concepções, constituindo-se a função social
da propriedade e as transformações suscitadas no exer-
cício do direito à propriedade parte indissociável de um
contexto que remete a construção de uma sociedade plu-
ralista e igualitária.
O direito fundamental à propriedade em razão de sua
extrema relevância sob o ponto de vista econômico e so-
cial, como base, por exemplo, para a fruição do direito à
moradia, conta com proteção constitucional ao longo de
todas as Cartas Constitucionais brasileiras, a exterioriza-
ção deste direito foi se moldando aos imperativos de uma
nova ordem social pautada na necessidade de assegurar a
utilização racional da propriedade, conciliando a liberda-
de individualmente considerada com os valores supremos
indispensáveis ao atendimento das necessidades coletivas.
Partindo desse ponto:
Outro direito fundamental de grande relevo, possivel-
mente aquele considerado de maior relevo na esfera cí-
vel, ao menos sob o aspecto econômico, é o direito de
propriedade, objeto de proteção desde a primeira Car-
ta Constitucional brasileira, de 1824, mas cujos contor-
nos que foram evoluindo, tornando-se mais complexos,
amoldando-se às novas ideologias como a social-demo-
cracia e amoldando-se e compatibilizando-se com novos
direitos outros surgidos posteriormente, como, dentre
eles, o direito a um meio ambiente saudável, o direito de
moradia (BRANDÃO, 2014, p. 240-241).

206
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

A liberdade referente ao direito de propriedade não


pode ser exercida de forma desmedida a ponto de ferir a
liberdade do outro, requer a incorporação de uma consci-
ência com base na visão da sociedade em sua totalidade.
Para Grau (2018, p. 243): “(...) o princípio da função
social da propriedade impõe ao proprietário – ou a quem
detém o poder de controle – o dever de exercê-lo em
benefício de outrem e não, apenas, de não o exercer em
prejuízo de outrem.”
A função social justifica e legitima a propriedade. O
princípio da função social da propriedade inscrito no arti-
go 170, III da Constituição Federal de 1988, importa dire-
tamente a ordem econômica.
Brandão (2014) ressalta que o direito de propriedade
inserido como um direito típico de primeira dimensão/
geração, cujo exercício inicialmente era inspirado em um
modelo liberal, passa com o influxo de novas ideias gera-
das pela expansão do Estado Social a ser vinculado a uma
gama de direitos e princípios que preservam o interesse
público como valor preponderante em relação às preten-
sões individuais.
Isso não significa afastar o direito constitucionalmente
assegurado à propriedade, mas sim o adequa a uma nova
perspectiva sem a qual não se atinge o ideal de uma socie-
dade pluralista, não há como falar em fraternidade sem a
compreensão de que acima das prerrogativas asseguradas
a cada indivíduo, coexiste uma gama de direitos que con-
correm para a preservação da sociedade como um todo.
Desta forma, baseando-se em Siqueira Júnior e Oliveira
(2016), mesmo que a propriedade privada tenha figurado
na Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de
1789 como um direito sagrado, tal configuração não se

207
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

amolda com o ideal fraterno que inspira a existência de


um Estado em favor do ser humano.
Um Estado em favor do ser humano, em sua máxima
expressão, consiste na manutenção de uma ordem social
e econômica que assegure a manutenção do equilíbrio e
harmonia nas relações estabelecidas entre os seres huma-
nos que compõem uma determinada sociedade.
O exercício absoluto da propriedade resultante do seu
“caráter” sagrado tende a gerar um desequilíbrio social,
quebrando o ideal de igualdade que garante às futuras
gerações desfrutar dos bens indispensáveis para o atendi-
mento de suas necessidades.
A partir das proposições de Siqueira Júnior e Oliveira
(2016), embora o direito à propriedade esteja inserido no
elenco dos direitos fundamentais, a fruição deste não pode
se dar em excesso, devendo o seu exercício concorrer para
a concretização da liberdade e preservação da segurança,
resguardando-o de quaisquer intromissões vedadas pela lei.
O direito fundamental à propriedade conserva, em seu
âmbito, mesmo sendo condicionado ao exercício da função
social, um núcleo intangível que permite ao seu proprietário
dispor dos seus bens de forma livre, desde que esta liberdade
não ofenda a liberdade do outro, oponível até mesmo contra
atos de intromissão arbitrária por parte do Estado.
De igual modo, sob a nova ordem jurídica constitucio-
nal, pela segurança jurídica, ninguém poderá ser privado
dos seus bens, senão nas hipóteses legalmente previstas.
Diante do exposto, é preciso reconhecer a função so-
cial da propriedade como a valoração máxima de uma so-
ciedade que passa a reconhecer o papel que cabe a cada
um dos seus membros, inclusive a respeito do exercício
do direito de propriedade.

208
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

O direito de propriedade é uma das maiores expressões


do Estado Democrático de Direito. Apesar de muito valo-
rizado em nossa cultura, o direito à propriedade está dire-
tamente ligado ao contexto social em determinado tempo
e espaço. Nossa Constituição traz expressa a garantia ao
direito de propriedade (art. 5º, XXII). Como cada socie-
dade aborda o direito à propriedade à sua maneira, e o
atual ordenamento jurídico incorporou parcela dos ensi-
namentos do Estado Social de Direito ao seu arcabouço,
o constituinte assegura que a função social da proprieda-
de deve prevalecer sobre o interesse individual (art. 5º,
XXIII). Nesse caso, apesar de uma conjuntura capitalista,
as mais variadas formas de expressão da propriedade de-
vem pautar-se pela vontade do todo em face da pretensão
econômica do particular (TRINDADE, 2015, p. 103).
Tomando-se por base as noções de tempo e espaço, o
exercício ilimitado do direito à propriedade perdurou por
longa data, os resultados por ele produzidos passaram a se
tornar insustentáveis, a ponto de exigir uma nova ordem
comprometida com o bem comum.
A função social da propriedade remete de tal modo à
concretização da categoria fraternidade ao passo em que
prevalece sobre o interesse individual, fomentando uma
visão de que há limites a serem atendidos, sob pena de
retrocesso social.
Para Siqueira Júnior e Oliveira (2016), é importante com-
preender a função social da propriedade como mecanismo
que demonstra a transformação radical do direito à pro-
priedade, deixando de ser entendida como algo ilimitado e
consequentemente, a partir do momento em que a Cons-
tituição brasileira passa expressamente a reconhecer que
o exercício do direito à propriedade não pode se dar de

209
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

forma absoluta, há limites que precisam ser obedecidos,


assegurando-se em contrapartida, a preservação do direito
à propriedade contra qualquer forma de arbitrariedade.
Neste sentido, a adjetivação conferida ao termo fraterni-
dade presente na Constituição Federal de 1988, anuncia o
despontar de uma nova consciência social, assentada em
bases teóricas que concorrem para a corresponsabilidade
e respeito mútuo.
O próprio ordenamento jurídico constitucional pátrio
passa a delimitar expressamente os valores que norteiam a
proteção ao direito de propriedade, bem como os requisitos
que fornecem tal proteção, que assegura a sua preservação,
no tocante à intromissão que possa ser praticada pelo pró-
prio Estado.
A função social estabelece condicionantes para a liberdade
no exercício ao direito de propriedade, busca assegurar que
seu exercício se dê em condições de igualdade, passando o
direito de propriedade a ser revestido de um caráter utilitarista.
Novelino (2014), enfatiza em relação ao ordenamento jurí-
dico constitucional pátrio a existência de restrições interven-
tivas segundo as quais o direito de propriedade vincula-se a
diferentes restrições constitucionais diretas e indiretas, em um
contexto no qual o caráter absoluto passa a estar condicionado
ao cumprimento do princípio da função social da propriedade
(artigo 5º, XXIII da Constituição Federal de 1988).
Além disso:
A propriedade, nem que seja pelo seu uso, deve servir
ao bem da comunidade. A vinculação social da proprie-
dade, através do princípio jurídico, implica a negativa de
que o interesse individual do proprietário sobreponha-se
incondicionalmente aos interesses de uma coletividade
(ARONNE, 2014, p. 130).

210
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Sendo assim, segundo Slaibi Filho (2009), o ordena-


mento jurídico constitucional pátrio protege o direito de
propriedade, estando tal proteção vinculada ao cumpri-
mento da função social, que por sua vez implica na ob-
servância de determinados requisitos, dentre os quais, o
aproveitamento racional e adequado, explorando-a em
compatibilidade com o meio em que encontre, bem como
estabelecendo uma exploração que concorre para o bem
-estar de toda a coletividade.
Reconhece que a liberdade conferida ao direito de pro-
priedade ao estar vinculado ao cumprimento da função
social está intrinsicamente relacionada aos aspectos que
regem a categoria fraternidade.
A fraternidade pressupõe que a minha liberdade não se
possa realizar sem a liberdade do outro, é considerada
um princípio que está na origem de um comportamento
relacional e, exatamente por isso, além de ser um princí-
pio ao lado da liberdade e da igualdade, aparece como
aquele que é capaz de tornar esses princípios efetivos
(LAZZARIN, 2015, p. 93).
Observa-se que os vocábulos fraternidade, liberdade e
igualdade mantêm uma correlação entre si, determinado
quanto ao exercício do direito à propriedade que a sua
fruição se dê de forma a viabilizar a concretização da li-
berdade e da igualdade resultante de uma utilização cons-
ciente e responsável.
Ampliando-se tal abordagem:
Através do princípio da solidariedade expresso na Carta
Constitucional, é possível identificar a ideia de fraternida-
de. A solidariedade não é atributo específico ou restrito
à ação do Estado. Trata-se aqui também da solidarieda-
de, não pode ser reduzida ao preceito do não prejudi-

211
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

car os outros, mais do que isso, orienta a liberdade de


modo mais vinculativo, no sentido de que o indivíduo
deve fazer o bem ao outro, porque é também o seu bem
(LAZZARIN, 2015, p. 93).
A função social da propriedade encarta em seu interior
a orientação para o exercício do direito à propriedade a
partir da consciência de que cada membro da sociedade
deve fazer a sua parte para o bem do todo, tendo ciência
de que está sendo direta ou indiretamente afetado.
Ramos (2017), entende que o direito de propriedade
deve ser compreendido a partir da base sobre os quais
estão assegurados todos os direitos sociais previstos no or-
denamento jurídico constitucional pátrio, assim como ser
interpretado a partir dos demais valores que a Constitui-
ção Federal estabelece como o direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado e que o exercício das prer-
rogativas inerentes à propriedade deve se dar a partir da
observância das exigências ambientais estabelecidas.
Reconhece-se:
O Direito de propriedade apresenta-se como um direito
renovado, que passa por um processo de publicização a
fim de adequar-se às demandas sociais da coletividade;
essa propriedade renovada é agora vinculada ao cum-
primento de uma função social, tornando-se instituto ju-
rídico híbrido, que contempla proteção dos interesses
públicos e privados a ela inerentes. No que se refere à
caracterização e abrangência da função social da pro-
priedade prevista no texto constitucional, é entendida
como um dever para a satisfação dos interesses e neces-
sidades de uma sociedade, vinculado a um poder cujo
exercício está condicionado ao cumprimento de tal de-
ver. Passa-se a entender o direito de propriedade como o

212
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

poder do titular do domínio sobre um bem de fazer uso


do mesmo dentro dos limites impostos pelo seu dever
de atender uma função social, correspondendo ao uso
de acordo com os interesses da coletividade (SOARES,
2008, p. 693).
Um direito renovado passa a se alinhar às novas dinâ-
micas que regem a sociedade contemporânea, diante das
quais se torna essencial reconhecer que acima do direito
individualmente consagrado ao indivíduo, inclusive com
respeito ao exercício do direito à propriedade, há interes-
ses maiores para a preservação de toda a coletividade.
O cumprimento da função social da propriedade com-
preende a proteção de interesses públicos e privados, que
devam se harmonizar em função do todo, quer seja, o bem
comum, reconhecendo ao proprietário a possibilidade de
utilizar todas as prerrogativas que lhes são asseguradas
pelo ordenamento jurídico deste tal uso se dê de forma
racional e adequado, comportando em si a manutenção
dos interesses de toda a sociedade.
No entendimento de Franzoni (2014), a ordem econô-
mica constitucional enquadra adequadamente a proprie-
dade e a sua função social ao princípio da igualdade e aos
limites da redistribuição de direitos e deveres de valores
econômicos para combater as desigualdades. Tema central
da teoria política e econômica no Brasil, a redistribuição
da propriedade privada, requer um olhar para as causas
e soluções do problema relativo à desigualdade que res-
tringe o acesso pleno à cidadania e às condições jurídicas
capazes de mediá-lo. O sistema jurídico é a coluna que
mantém o status quo e rege os instrumentos capazes de
provocar as mudanças essenciais.
A partir das descrições de Soares (2008), o Direito em

213
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

sua máxima extensão deve se colocar à serviço da con-


cretização de uma sociedade mais justa, digna e huma-
na, embasado na preponderância da solidariedade sobre
o individualismo, alinhando-se aos preceitos vigentes que
orientam a construção de todo o sistema jurídico.
A vinculação do direito de propriedade, a exemplo dos
valores que devem nortear o conteúdo e abrangência dos
demais direitos fundamentais, aos objetivos encartados no
preâmbulo da Constituição Federal de 1988, reiterando-se
conforme fora visto, que estes encartam em seu âmbito
a razão maior e consequentemente, os objetivos a serem
alcançados pelo nosso Estado Democrático de Direito.
A função social da propriedade se traduz inegavelmen-
te na predominância e até mesmo a opção do legislador
constituinte pátrio pela solidariedade em detrimento de
um individualismo que contrasta com a promoção do bem
-estar, desenvolvimento, igualdade e justiça e justiça social
como valores maiores de uma sociedade que realmente
possa se intitular como fraterna.
A função social com base em Soares (2008), em ter-
mos de interpretação do seu significado do ponto de vista
constitucional, como orientação para o exercício do di-
reito à propriedade em um contexto onde cada indivíduo
conserva o direito e o dever de contribuir para o bem do
próximo, evidenciando uma função fraternal, cujas bases
históricas remontam à tríade da Revolução Francesa.
Trata-se de uma orientação voltada à conscientização
de não se poder construir uma sociedade mais justa, igua-
litária e fraterna sem a consciência de que o respeito à
pessoa do outro representa a condição essencial para o
exercício de qualquer direito, inclusive no que se refere
ao direito de propriedade, cuja função social incita-nos à

214
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

conciliação de uma prática assentada na vinculação entre


a liberdade, igualdade e fraternidade por parte de todos
os concidadãos e na concepção de um Estado voltada à
promoção da dignidade do ser humano.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dentre as revoluções que já ocorreram ao longo da his-
tória, a Revolução Francesa se revela como um aconteci-
mento ímpar, cujas lições e ideais de uma sociedade mais
justa, fraterna e democrática nortearam a construção do
Constitucionalismo em todo o mundo.
A categoria fraternidade passa de tal modo a inspirar
a construção do Constitucionalismo Moderno, implicando
em concepções teóricas e práticas que venham convergir
para ações pautadas no respeito e valorização da pessoa
do outro, refletindo na configuração de um Estado a ser-
viço do ser humano.
Reconhece na tríade liberdade, igualdade e fraternidade as
bases para a construção de novas relações entre o indivíduo
e a sociedade, assegurando o exercício do direito individual
à propriedade, este passa a ser tutelado contra arbitrarieda-
des praticadas pelo próprio Estado, desde que sua fruição
venha se dar em observância a determinados limites e aten-
didos determinados pressupostos para o bem-estar comum.
Influência que se faz presente na configuração do di-
reito à propriedade enquanto direito fundamental previsto
no ordenamento jurídico constitucional pátrio, cujo exer-
cício anteriormente tido como absoluto, passa a ser con-
dicionado em face dos pressupostos que regem a função
social da propriedade.
A função social da propriedade desponta como valor
que converge em prol da construção de uma nova socie-

215
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

dade, pautada no respeito e reconhecimento do exercício


do direito à propriedade cuja liberdade de fruição não
pode ser exteriorizada de forma desmedida, a tal ponto de
contrariar os valores supremos que regem o atendimento
das necessidades coletivas.
No tocante a consagração da igualdade, a função social da
propriedade visa assegurar ao exercício da propriedade que
toda a coletividade venha ser beneficiada pela observância
de limitações que congregam em seu âmbito a preponderân-
cia do interesse coletivo sobre o interesse particular.
Portanto, a função social da propriedade concorre para a
fraternidade, induz ao reconhecimento e consequentemente,
ao exercício consciente e responsável do direito de proprie-
dade que somente se torna legítimo quando revestido de
uma perspectiva utilitarista, que individualmente ou coleti-
vamente se firma, orientado para a concretização de uma
sociedade mais justa e fraterna, fomentando a solidariedade
entre indivíduos que compartilham do mesmo espaço.

REFERÊNCIAS
ARONNE, Ricardo. Propriedade e domínio: a teoria da autono-
mia: titularidades e direitos reais nos fractais do direito ci-
vil-constitucional. 2.ed., rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2014.
BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contem-
porâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo
modelo. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
BONAVIDES, Paulo; MIRANDA, Jorge; AGRA, Walber de Moura. Co-
mentários à Constituição Federal de 1988. Rio de Janeiro: Fo-
rense, 2009.
BRANDÃO, Cláudio. Direitos humanos e fundamentais em pers-
pectiva. São Paulo: Atlas, 2014.

216
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos humanos funda-


mentais. 15.ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
FRANZONI, Júlia ÁVILA. Política urbana na ordem econômica.
Belo Horizonte: Arraes Editores, 2014.
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de
1988. 19.ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2018
LAZZARIN, Sonilde Kugel. O princípio da fraternidade na Constituição
Federal Brasileira de 1988. Direito & Justiça, v. 41, n. 1, p. 92-99, jan.-
jun. 2015. Disponível em: <http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.
php/fadir/article/view/19975/12670>. Acesso em: 14 ago. 2019.
NOVELINO, Marcelo. Curso de Direito Constitucional. 9.ed. revista
e atualizada. São Paulo: Método, 2014.
RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. 4.ed. São
Paulo: Saraiva, 2017.
SILVA, Ildete Regina Vale da; BRANDÃO, Paulo de Tarso. Constitui-
ção e fraternidade: o valor normativo do preâmbulo da Cons-
tituição. Curitiva-PR: Juruá, 2015.
SIQUEIRA JÚNIOR, Paulo Hamilton; OLIVEIRA, Michel Augusto Ma-
chado de. Direitos humanos: liberdades públicas e cidadania.
4.ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
SLAIBI FILHO, Nagib. Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Fo-
rense, 2009.
SOARES, Vivian Bacaro Nunes. Interpretação da função social da pro-
priedade na Constituição Federal de 1988, à luz dos fundamentos
da socialidade, fraternidade e dignidade da pessoa humana. Tra-
balho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI,
realizado em Brasília – DFnos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.
Disponível em: <http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/
arquivos/anais/brasilia/20_548.pdf>. Acesso em: 11 ago. 2019.
TRINDADE, André Fernando dos Reis. Curso de Direito Constitu-
cional. 2.ed. atualizada até a Emenda Constitucional nº 83, de 05
de junho de 2014. São Paulo: Saraiva, 2015.

217
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ANÁLISE ECONÔMICA DA EXCLUSÃO


DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E
DA COFINS: UMA INTERPRETAÇÃO À LUZ
DA TEORIA DOS JOGOS

Gustavo Carvalho Kichileski62 e Fernanda Huss Erzinger63

Resumo: O presente artigo tem por objetivo apresentar


uma intepretação da recente decisão do Supremo Tribunal
Federal (STF) sobre a exclusão do Imposto sobre Circula-
ção de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo
do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição
para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), a
partir da Análise Econômica e da Teoria dos Jogos. Reali-
za-se uma revisão bibliográfica sobre o tema, com enfo-
que na legislação, doutrina e jurisprudência brasileira e,
valendo-se de uma abordagem qualitativa e do método
indutivo, o artigo analisa como as decisões do STF sobre
Direito Tributário podem surtir efeitos na economia, prin-
cipalmente na atividade privada. Com a teoria dos jogos,
busca-se demonstrar um raciocínio estratégico para os
contribuintes de forma semelhante à elisão fiscal, utilizan-
do a possibilidade de recuperação de crédito como forma
de investimento para os contribuintes que foram lesados
perante o fisco Federal durante décadas.
Palavras-chave: Análise Econômica; Teoria dos Jogos; Di-
reito Tributário; Supremo Tribunal Federal; Elisão Fiscal.

62 Mestrando pela Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP). Graduado em Direito pelo
UNICURITIBA. Integrante do NEC-UFPR e IEE da UENP. Advogado. Professor de Direito Econômico.
63 Mestranda em Direito no Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Direito da Pontifícia Uni-
versidade Católica do Paraná (PUC/PR). Especialista em Direito Contemporâneo com ênfase no
Novo Código de Processo Civil pela Universidade Cândido Mendes. Servidora pública no Tribunal
de Justiça do Estado do Paraná (TJ/PR).

218
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

INTRODUÇÃO
O presente artigo tem por objetivo apresentar uma inte-
pretação da recente decisão do Supremo Tribunal Federal
(STF) sobre a exclusão do Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo do Pro-
grama de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social (COFINS), a partir da
Análise Econômica e da Teoria dos Jogos.
Realiza-se uma revisão bibliográfica sobre o tema, com
enfoque na legislação, doutrina e jurisprudência brasileira
e, valendo-se de uma abordagem qualitativa e do método
indutivo, o artigo analisa como as decisões do STF sobre
Direito Tributário podem surtir efeitos na economia, prin-
cipalmente na atividade privada.
Além disso, apresentamos a perspectiva da recuperação
de créditos tributários, em que os contribuintes que pa-
garam por anos, indevidamente, as contribuições sociais
com a base de cálculo englobada no ICMS no recolhimen-
to do PIS e da COFINS, terão direito de usufruir do levan-
tamento dos créditos tributários.
Com a teoria dos jogos, busca-se demonstrar um ra-
ciocínio estratégico para os contribuintes de forma seme-
lhante à elisão fiscal, utilizando a possibilidade de recu-
peração de crédito como forma de investimento para os
contribuintes que foram lesados perante o fisco Federal
durante décadas.

DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS


DE ACORDO COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
A tributação sempre esteve ligada à figura do Estado, haja
vista que é principal meio de sustentar todo aparato estatal.
Nesse aspecto, uma parcela da doutrina destaca a

219
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ideia de “um dever fundamental de pagar impostos”


como meio de todos financiarem coletivamente a figura
do Estado na sociedade:
[…] depois torna-se cada vez mais claro que o pro-
blema da atual dimensão do estado, mera decorrência
do crescimento de sua atuação econômico-social, ape-
nas pode solucionar-se (rectius, atenuar-se) através da
moderação desse intervencionismo, moderação que
implicará, quer o recuou na assunção das modernas
tarefas sociais (realização dos direitos econômicos, so-
ciais e culturais), quer mesmo o abandono de algumas
tarefas tradicionais. Com efeito a crise do atual estado,
diagnosticada e explicada sob as mais diversas teo-
rias, passa sobretudo pela redefinição do papel das
funções do estado, não com a pretensão de o fazer
regredir ao estado mínimo do liberalismo oitocentista,
atualmente de todo inviável, mas para compatibilizar
com os princípios da liberdade dos indivíduos e da
operacionalidade do sistema econômico, procurando
evitar que o estado fiscal se agigante a ponto de não
ser senão um invólucro de um estado dono (absoluto)
da economia e da sociedade pela via (pretensamente)
fiscal”. (NABAIS, 1998, p. 186-187).
Tendo em vista a importância dos impostos para o Esta-
do, e sua complexidade no atual sistema, não é surpreen-
dente que o fisco adote condutas abusivas na arrecadação
destes tributos.
A Constituição Federal em seu art. 195, inciso I, ante-
riormente à alteração levada a efeito pela Emenda Cons-
titucional (EC) nº 20, de 15 de dezembro de 1998, a qual
modificou o sistema de previdência social, dispunha que
as contribuições ao PIS e à COFINS seriam financiadas

220
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

por toda a sociedade, de forma direta ou indireta, e con-


tribuições sociais: dos empregadores, incidente sobre a
folha de salários, o faturamento e o lucro, dos trabalha-
dores e, por fim, sobre a receita de concursos de prog-
nósticos (BRASIL, 1998a).
Contudo, a referida Emenda (EC 20/1998) alterou a
redação do dispositivo e estabeleceu que as contribui-
ções passariam a ser exigidas tanto do empregador, da
empresa e da entidade a ela equiparada na forma da
lei, incidentes sobre a folha de salários e demais ren-
dimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer
título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo
sem vínculo empregatício, a receita ou o faturamento e
o lucro, quanto do trabalhador e dos demais segurados
da previdência social, não incidindo contribuição sobre
aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral
de previdência (BRASIL, 1998a).
As Leis nº 10.637, de 2002 (PIS) (BRASIL, 2002), e nº
10.833, de 2003 (COFINS) (BRASIL, 2003), ampliaram a
base de cálculo das contribuições sociais, incluindo tribu-
tação (artigo 195, inciso I, alínea “b”) sobre a “receita” ou
o “faturamento”. Insta salientar, contudo, que os termos
“receita” e “faturamento” não são definidos pela normativa
tributária, pelo contrário, são conceitos de origem da ativi-
dade mercantil privada.
Destaca-se que a recente Emenda Constitucional nº
103, de 2019, modificou, novamente, o art. 195, inciso
II, da Carta Magna, permitindo, no tocante à contribui-
ção social do trabalhador e dos demais segurados da
previdência social, a adoção de alíquotas progressivas
de acordo com o valor do salário de contribuição (BRA-
SIL, 2019).

221
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO


DO PIS E DA COFINS
O PIS atualmente é regulado pela Lei Complementar
nº 7, de 1970 (BRASIL, 1970), em que incide sobre “receita
bruta, como definida pela legislação do Imposto de renda,
proveniente da venda de bens nas operações nas operações
de conta própria, do preço dos serviços prestados e do re-
sultado auferido nas operações de conta alheia” (art. 3º da
Lei nº 9.715, de 25 de novembro de 1998) (BRASIL, 1998b).
Por outro lado, a COFINS, regida pela Lei Complemen-
tar nº 70, de 1991, tem como base de cálculo (art. 2º)
o “faturamento mensal, assim considerado a receita bruta
das vendas de mercadorias, de mercadoria e serviços e
serviços de qualquer natureza” (BRASIL, 1991).
Como se pode perceber, ambas bases de cálculos pos-
suem receita bruta, no entanto, em nenhumas delas pode
ser considerado os valores gastos pela empresa com o reco-
lhimento do ICMS como parte integrante da receita bruta, e,
por consequência, sua integração a base de cálculo do PIS
e da COFINS. De acordo com Geraldo Ataliba (1978, p. 88):
[...] O conceito de receita refere-se a uma espécie de en-
trada. Entrada é todo o dinheiro que ingressa nos cofres
de determinada entidade. Nem toda entrada é receita.
Receita é a entrada que passa a pertencer à entidade.
Assim, só se considera receita o ingresso de dinheiro que
venha a integrar o patrimônio da entidade que a recebe.
A lição de doutrina nos mostra que o recolhimento do
ICMS não pode integrar a base de cálculo das contribui-
ções sociais, sob pena de caracterização de bitributação.
Na Apelação Cível nº 33025, Registro nº 90.03.311650-3,
julgada pela 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª
Região, no voto do Relator, ficou clara referida exclusão

222
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

dos custos das empresas com o ICMS da base de cálculo


das contribuições sociais, in verbis:
[...] Assim sendo, o Imposto sobre Circulação de merca-
dorias, tributo não-cumulativo, incide sobre o faturamen-
to mas não o integra, constituindo tal imposto receita do
Estado-membro, recebido pela empresa que é obrigada a
recolher o respectivo ao Tesouro estadual. Não constitui
o ICMS receita da empresa nem se inclui no faturamento
desta e, portanto, excluído está da base de cálculo da
contribuição para o PIS. [...] Assim, na receita da empre-
sa, não há como fazer integrar importância que apenas
transitam por ela e que, quando do seu ingresso, já tem
sua destinação definida (receita tributária da União ou
do Estado-membro), sem qualquer acréscimo patrimo-
nial para a empresa contribuinte [...]. (BRASIL, 1991).
Assim, os valores recolhidos por tais contribuintes
ao fisco Estadual a título de ICMS não podem compor
a base de cálculo das contribuições sociais como PIS
e COFINS.
Na data de 15 de março de 2017, em Plenário, o E. Su-
premo Tribunal Federal, por maioria e nos termos do voto
da Relatora, Ministra Cármen Lúcia (Presidente), julgando
o Tema 69 com Repercussão Geral, deu provimento ao
Recurso Extraordinário (RE) e, por maioria de votos, fixou
a tese de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para
a incidência do PIS e da COFINS” (BRASIL, 2017).
Foram mais de duas décadas de discussões a respeito
da integração ou não do ICMS no conceito de fatura-
mento e receita bruta das empresas, que, foi superado
pelo STF no RE nº 574.706, dotado de repercussão geral,
instituto jurídico que visa atribuir efeito multiplicador aos
casos análogos:

223
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GE-


RAL. EXCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO
PIS E COFINS. DEFINIÇÃO DE FATURAMENTO. APURA-
ÇÃO ESCRITURAL DO ICMS E REGIME DE NÃO CUMU-
LATIVIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Inviável a apura-
ção do ICMS tomando-se cada mercadoria ou serviço e a
correspondente cadeia, adota-se o sistema de apuração
contábil. O montante de ICMS a recolher é apurado mês
a mês, considerando-se o total de créditos decorrentes
de aquisições e o total de débitos gerados nas saídas de
mercadorias ou serviços: análise contábil ou escritural
do ICMS. 2. A análise jurídica do princípio da não cumu-
latividade aplicado ao ICMS há de atentar ao disposto
no art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República,
cumprindo-se o princípio da não cumulatividade a cada
operação. 3. O regime da não cumulatividade impõe
concluir, conquanto se tenha a escrituração da parcela
ainda a se compensar do ICMS, não se incluir todo ele na
definição de faturamento aproveitado por este Supremo
Tribunal Federal. O ICMS não compõe a base de cálculo
para incidência do PIS e da COFINS. 3. Se o art. 3º, § 2º,
inc. I, in fine, da Lei n. 9.718/1998 excluiu da base de
cálculo daquelas contribuições sociais o ICMS transferido
integralmente para os Estados, deve ser enfatizado que
não há como se excluir a transferência parcial decorrente
do regime de não cumulatividade em determinado mo-
mento da dinâmica das operações. 4. Recurso provido
para excluir o ICMS da base de cálculo da contribuição
ao PIS e da COFINS. (BRASIL, 2017).
A tese firmada pelo STF, além de favorável aos contri-
buintes, representou um avanço na área tributária e con-
tábil, facilitando o reconhecimento dos créditos tributários

224
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

recolhidos indevidamente pelos contribuintes, referente


aos últimos cinco anos.
Em que pese a decisão da Corte Suprema, o Conse-
lho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), de forma
surpreendente, durante o ano de 2019, rejeitou a tese do
Tribunal Máximo e manteve os valores recolhidos como
ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, confor-
me fundamentação exposta no Processo Administrativo nº
10980.940183/201126, Acórdão nº 3402006.283, da 4ª Câ-
mara/2ª Turma Ordinária, assim ementada:
REPERCUSSÃO GERAL. ART. 15 DO CPC/2015. PROCES-
SO ADMINISTRATIVO. SOBRESTAMENTO. NÃO CABI-
MENTO. Só há uma lacuna de ordem processual a ser
colmatada pelo julgador no subsistema especial do pro-
cesso administrativo fiscal com a aplicação por analogia
de instituto do CPC, nos termos do seu art. 15, quando
houver uma incompletude indesejável ou insatisfatória
no referido subsistema. Não é porque inexiste disposi-
ção normativa que determine o sobrestamento no âmbito
do processo administrativo fiscal que se pode dizer que
há uma lacuna a ser preenchida com o traslado de tal
instituto do CPC para o processo administrativo fiscal. A
vinculação dos julgadores do CARF é unicamente às de-
cisões definitivas de mérito referidas no art. 62, §2º do
Anexo II do Regimento Interno do CARF, de forma que,
enquanto ela não sobrevenha, o processo administrativo
deve ser julgado normalmente em conformidade com a
livre convicção do julgador e com os princípios da ofi-
cialidade e da presunção de constitucionalidade das leis.
PIS/COFINS. BASE DE CÁLCULO. INCLUSÃO DO ICMS.
RECURSO REPETITIVO. STJ. TRÂNSITO EM JULGADO.
CARF. REGIMENTO INTERNO. Em 13.03.2017 transitou

225
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

em julgado o Recurso Especial nº 1144469/PR, proferido


pelo STJ sob a sistemática do art. 543-C do CPC/73, que
firmou a seguinte tese: “O valor do ICMS, destacado na
nota, devido e recolhido pela empresa compõe seu fatura-
mento, submetendo-se à tributação pelas contribuições ao
PIS/PASEP e COFINS, sendo integrante também do con-
ceito maior de receita bruta, base de cálculo das referidas
exações”, a qual deve ser reproduzida nos julgamentos do
CARF a teor do seu Regimento Interno. Em que pese o Su-
premo Tribunal Federal ter decidido em sentido contrário
no Recurso Extraordinário nº 574.706 com repercussão ge-
ral, publicado no DJE em 02.10.2017, como ainda não se
trata da decisão definitiva a que se refere o art. 62, §2º do
Anexo II do Regimento Interno do CARF, não é o caso de
aplicação obrigatória desse precedente ao caso concreto.
Recurso Voluntário negado. (BRASIL, 2019).
Não obstante a decisão do STF tenha efeitos vinculan-
tes, consoante dispõe o art. 1.030 c/c art. 1.042, ambos do
Novo Código de Processo Civil (BRASIL, 2015), devendo
ser os precedentes seguidos quando criados a partir de
julgamentos de Recursos Extraordinários dotados de Re-
percussão Geral, como no caso, o CARF, mesmo sendo
um órgão administrativo, também deveria acatar o referido
entendimento, mas pareceu ignorá-lo.
A recente conduta do CARF tende a estar sujeita à alte-
rações, haja vista sua afronta à Corte Constitucional. Ade-
mais, o RE nº 574.706 findou a controvérsia ao fixar a
tese que os valores recolhidos ao fisco Estadual a título
de ICMS não podem integrar a base de cálculo que pos-
teriormente é utilizada para recolher contribuições sociais
perante o fisco Federal, já que um tributo não pode ser
tributado sobre outro.

226
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ANÁLISE ECONÔMICA DA DECISÃO DO STF


SOBRE A EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO
DO PIS E DA COFINS
Via de regra, toda ação tende a gerar uma reação, sen-
do tal afirmativa também aplicável ao universo do Direito.
A própria decisão judicial gera consequências no mundo
dos fatos, as quais, até então, não existiam.
As implicações das decisões judiciais podem ocasionar
impactos diversos no mundo real, desde o cerceamento de
liberdade com uma sentença penal condenatória até a reti-
rada da guarda de uma criança dos familiares, dentre outros.
Assim sendo, pode haver também consequências eco-
nômicas, a exemplo da Repercussão Geral nº 69, aqui já
salientada, sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo do
PIS e da COFINS, oportunidade na qual a Corte Suprema
reconheceu determinadas inconstitucionalidades tributárias.
A atividade econômica, tendo como pilar sua liberdade
no art. 170 da Constituição Federal, é afetada diretamente
pelas decisões do Supremo sobre grandes teses tributárias
(BRASIL, 1988).
O sistema tributário nacional interfere direta e indireta-
mente nos custos da atividade econômica empresarial, fa-
zendo parte, inclusive, da responsabilidade por aumento e
diminuição de custos de produtos para os consumidores.
Desta forma, é notória a conexão entre o sistema tributário
e atividade econômica, sendo possível realizar uma breve
análise econômica de uma decisão do STF na área tributária.
Luís Eduardo Schoueri (1987, p. 41-43), por exemplo,
discorre sobre o impacto que o setor tributário possui na
formação dos preços no setor econômico empresarial.
Além do tempo (longo, curto ou curtíssimo), os mais va-
riados fatores de influxo manipulam os preços: em rela-

227
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ção ao tributo, o montante (grande ou pequeno), o tipo


(geral ou especial), a forma de cálculo (fixo, segundo a
quantidade produzida, sobre o valor das vendas, sobre
a renda marginal, sobre o capital investido) e o sistema
geral de arrecadação e lançamento (embutido ou não no
preço); quanto ao bem onerado, a curva de custos (custo
fixo ou variável), a elasticidade da demanda (alta, média,
baixa ou nula), a elasticidade da oferta (alta, média, baixa
ou nula), a durabilidade (conservação ou deterioração) e
a existência de bens complementares, substitutivos ou de
oferta rival; a respeito do regime econômico, a existência
de concorrência perfeita, de monopólio (de oferta ou de
demanda), e monopólio bilateral, de duopólio (de ofer-
ta ou de demanda), de oligopólio perfeito (de oferta ou
de demanda) ou de concorrência monopolista; no tocante
ao sujeito passivo, a possibilidade de estoques (grande,
média, pequena ou nula), a necessidade de manutenção
de níveis mínimos de trocas, possibilidade de uso de li-
nhas de crédito, possibilidade de abandonar a produção
do bem onerado pela de outro, motivação do pagamento
indevido do imposto; em relação à conjuntura econômica,
a taxa de juros (alta ou baixa), a taxa de remuneração do
capital (alta ou baixa) e a conjuntura (prosperidade, crise
ou estagnação, inflação acentuada ou não).
A análise econômica tem por escopo, principalmen-
te, realizar uma compreensão de determinado fato e, se
possível, diagnosticar seus principais reflexos na ordem
econômica. Segundo Ivo T. Gico Jr. (2011, p. 19-20), a
análise econômica do direito é um método, denomina-
do de método econômico, o qual pode ter como objeto
qualquer questão que envolva escolhas humanas, seja ela
tomada no âmbito do mercado ou não. Assim, toda ativi-

228
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

dade humana é passível de análise econômica. “A Análise


Econômica do Direito, portanto, nada mais é que a apli-
cação desse método para se tentar compreender, explicar
e prever as implicações fáticas do ordenamento jurídico,
bem como da lógica (racionalidade) do próprio ordena-
mento jurídico.”
Deste modo, ao analisar o RE nº 574.706, quando o Su-
premo Tribunal Federal decidiu que o ICMS não integra a
base de cálculo do PIS e da COFINS, com uma perspectiva
econômica, de pronto, é notório ter o mencionado prece-
dente significativo impacto econômico financeiro.
Todavia, o referido julgado trouxe aos contribuintes o
direito de reaver (repetição de indébito, consoante o art.
168 do Código Tributário Nacional) o valor pago indevida-
mente ao fisco Federal, durante os últimos cinco anos, em
função da prescrição quinquenal (BRASIL, 1966).
De início, o impacto econômico, principalmente no
setor empresarial, é significativo, surgindo a oportunida-
de de os contribuintes poderem reaver financeiramente
os créditos tributários recolhidos indevidamente ao fisco,
bem como compensá-los com dívidas fiscais ou créditos
tributários vincendos (PIMENTA; LANA, 2010).
Nesse sentido, é imperioso destacar a reflexão de Erik
Navarro Wolkart (2019, p. 30) sobre o termo “tragédia da
justiça”. O autor propõe a necessidade de um raciocínio
econômico que busque ter um sistema sofisticado e mais
complexo para análise de grandes casos, com significativo
impacto econômico, bem como a solidificação de um sis-
tema de justiça mais simplificado e eficaz para causas de
grande reincidência, buscando beneficiar o bem comum,
que, infelizmente, ainda não é a realidade nacional.
Ademais, o fisco Federal, após o posicionamento do

229
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

STF no RE nº 574.706, perdeu por um lado, tendo que re-


embolsar o dinheiro dos contribuintes. Porém, ganhou no
aspecto prescricional (prescrição quinquenal), nos termos
do art. 168 do CTN (BRASIL, 1966), considerando que a
demanda foi protocolada em 13.12.2007, minimizando os
efeitos (BRASIL, 2017).
Destarte, por meio de uma análise econômica é possí-
vel pontuar que a decisão do STF trouxe reflexos bilioná-
rios ao fisco Federal, pois inúmeros contribuintes poderão
reaver valor significativo, seja na forma de levantamento
de crédito tributário para receber via Precatório ou sistema
de Requisição de Pequeno Valor (RPV) ou, ainda, com-
pensação tributária, sendo notório o significativo impacto
na esfera econômica.
É perceptível, portanto, que a decisão do Supremo trou-
xe significativo impacto na esfera econômica nos últimos
2 anos.

UMA INTEPRETAÇÃO A PARTIR DA TEORIA DOS JOGOS


PARA OS CONTRIBUINTES SOBRE A RECUPERAÇÃO DOS
CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS
À medida que se adotam determinados comportamen-
tos, na maioria das vezes, as atitudes são pautadas em uma
explicação racional. Para exemplificar esta afirmativa é im-
portante pontuar o aspecto finalístico da conduta, como
a atividade empresarial, que busca auferir lucro e renda,
priorizando, para tanto, condutas que ensejem tal objetivo.
A Teoria dos Jogos, criada pelo matemático John Von
Neumann no início do século XX, analisa a forma como
agentes econômicos ou sociais definem sua atuação no
mercado, considerando as possíveis ações e estratégias dos
demais agentes econômicos (BAIRD, GERTNER; PICKER,

230
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

1998). Contudo, foi difundida e aperfeiçoada por John F.


Nash Jr., o qual aprofundou os estudos de equilíbrio en-
tre os agentes econômicos em ambientes não cooperati-
vos, recebendo, em 1994, o Prêmio Nobel da Economia
pelo desenvolvimento de tal trabalho. A Teoria de Nash Jr.
(1950) é vista como uma solução para determinado mer-
cado competitivo, onde nenhum agente pode maximizar
seus resultados, diante da estratégia dos outros agentes.
De acordo com Herbert Gintis (2009, p. 45), a teoria
dos jogos é uma teoria da decisão de múltiplos jogadores,
em que as escolhas de cada jogador afetam as recompen-
sas de outro, e os jogadores consideram isso ao escolhe-
rem. Duilio de Avila Bêrni e Brena Paula Magno Fernan-
dez (2014, p. 16) explicam a referida teoria:
[...] o jogo expresso na forma normal tem três ingre-
dientes: agentes (jogadores), ações (estratégias de cada
jogador) e recompensas (benefício atribuível a cada
jogador por adotar determinado curso de ação com-
binado com a ação do outro jogador ou dos demais
jogadores). A solução de um jogo do qual participam
agentes racionais é indicada pela seleção das estratégias
que estes devem adotar em resposta às recompensas
que podem auferir, usando-as quando os demais joga-
dores adotam estratégias que também lhes conferem as
recompensas desejadas.
Para cristalizar, os preços que determinadas indústrias
repassam aos seus consumidores estão ligados aos preços
incidentes pela produção, dentre eles, os impostos (CAR-
VALHO, 2018, p. 109).
No quadro a seguir é possível compreender como o va-
lor dos impostos estão integrados na variável de formação
de preços do mercado:

231
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Fonte: (CARVALHO, 2018, p. 161).

A teoria dos jogos “é mais uma teoria de interações


entre seres humanos e deveria ser denominada – me-
nos elegantemente – de teoria das interações estratégi-
cas” (MACKAAY; ROUSSEAU, 2015, p. 43). A teoria dos
jogos está inserida de forma direta e indireta no coti-
diano das pessoas, quando tomam decisões racionais,
as quais geram consequências, a exemplo da compra
de um carro, casa (imóveis), negócios em geral (RÍOS,
2018, p. 26), contratos particulares, em que o objetivo
é o lucro em si, como a realidade dos empresários, no
momento de fixar o preço do produto por eles fabrica-
dos, que leva em consideração os preços incidentes na
cadeia de produção, dentre eles, os impostos (FIANI,
2014, p. 33).
A Teoria dos Jogos pode ser aplicada ao Direito Tribu-
tário, principalmente no que diz a respeito a recuperação

232
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

de créditos tributários, tendo em vista o reaver dos valo-


res que os contribuintes pagaram indevidamente durante
anos, tornando, assim, um campo de investimento para
atividade econômica:
[...] Como se isso aplica ao direito tributário? As apli-
cações são mais diversas, desde elisão e evasão fis-
cais, à guerra fiscal entre os entes federativos e à
reforma tributária. No caso da elisão e evasão fiscal,
o contribuinte espera usufruir de bens públicos e de
bens privados. Os bens públicos serão supridos pelo
Estado, em troca do pagamento de tributos. Os bens
privados serão usufruídos por meio dos rendimen-
tos líquidos do contribuinte, i.e., após a tributação.
Na lógica do dilema do prisioneiro, o auto interesse
racional incentiva o contribuinte a buscar, de forma
lícita (elisão) ou ilícita (evasão), evitar o máximo que
puder a incidência fiscal sobre sua riqueza (CARVA-
LHO, 2019, p.118).
O raciocínio aplicável da Teoria dos Jogos para os con-
tribuintes é semelhante ao procedimento da elisão fiscal,
ou melhor, ao planejamento tributário lícito, em que os
contribuintes adotam estratégias legais para economizar
porcentagens de tributos, que, em significativa escala, ge-
ram notável reflexo econômico.

(Im)possível modulação dos efeitos no RE


nº 574.706: pendente de julgamento no STF
Via de regra a decisão do STF não precisa transitar em
julgado para ter efeito vinculante perante o poder judiciá-
rio, podendo ser aplicada de forma imediata, sem ter mo-
dulação de efeitos, conforme art. 927 e art. 1.040, inciso I,
do Novo Código de Processo Civil:

233
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:


[...]
III - os acórdãos em incidente de assunção de competên-
cia ou de resolução de demandas repetitivas e em julga-
mento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
§ 1° Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art.
10 e no art. 489, § 1°, quando decidirem com fundamen-
to neste artigo.
Art. 1.040. Publicado o acórdão paradigma:
I - o presidente ou o vice-presidente do tribunal de ori-
gem negará seguimento aos recursos especiais ou extra-
ordinários sobrestados na origem, se o acórdão recorri-
do coincidir com a orientação do tribunal superior [...].
(BRASIL, 2015).
No entanto, com o Neoprocessualismo, seguindo a
constitucionalização do processo civil, instaurou-se a cul-
tura dos precedentes judiciais. Então, a partir do ano 2015,
as decisões judiciais que não observarem os precedentes
judiciais, principalmente dos Tribunais Superiores, estarão
sujeitas a anulação (MARINONI, 2019).
No RE nº 574.706 não é diferente. Possui efeito vin-
culante como precedente judicial firmado pelo STF em
tema de Repercussão Geral. Assim, o RE nº 574.706, em
seu mérito, não é mais passível de discussão, ou seja, foi
encerrado, sendo inviável alteração quanto ao conteúdo.
Contudo, eventual decisão sobre a modulação dos efeitos
pode restringir um lapso temporal para sua aplicação.
É importante lembrar que a modulação dos efeitos, pre-
vista no art. 927, § 3º, do Código de Processo Civil (BRA-
SIL, 2015), é um instrumento processual pautado no inte-
resse social e na segurança jurídica, especialmente quando
ocorre mudança de entendimento jurisprudencial.

234
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

O RE nº 574.706 ainda está pendente de julgamento


dos Embargos de Declaração apresentados pela Fazenda
Nacional, a qual solicitou a modulação dos efeitos. Aguar-
da-se, assim, uma decisão do STF sobre a aplicação da
tese restrita a um determinado lapso temporal, o que é
perfeitamente possível. O fundamento da modulação dos
efeitos está na própria análise econômica das consequên-
cias daquela decisão.
A Procuradoria Geral da República manifestou-se favo-
rável à modulação dos efeitos para o futuro (pro futuro).
Contudo, até que seja julgado os referidos Embargos de
Declaração, o RE nº 574.706 tem efeito cogente.
A possibilidade ou não da aplicação da modulação
dos efeitos no RE nº 574.706 pelo STF será pautada em
uma análise das consequências que uma possível restri-
ção temporal do julgado acarretará na prática, podendo
o resultado ser a favor do fisco, restringindo os direitos
dos contribuintes.
A futura decisão do STF sobre a aplicação da modula-
ção dos efeitos, neste caso, pode gerar um impacto eco-
nômico em face do fisco Federal bilionário, além de afetar
milhares de contribuintes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo teve por objetivo apresentar uma tese
contemporânea do Direito Tributário decidida pelo STF,
bem como os principais efeitos que a decisão pode trazer
perante a atividade econômica e para os principais interes-
sados, os contribuintes.
Nesse contexto, assinala-se que uma decisão do STF
pode ter efeitos erga omnes na área econômica, como o
caso do RE nº 574.706, oportunidade na qual a Corte Su-

235
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

prema decidiu que o ICMS não deve integrar o conceito


de Receita ou Faturamento, para servir de base de cálculo
do PIS e da COFINS perante o fisco Federal, o que na
verdade, representa tributação sobre tributo, ligado ao fe-
nômeno da bitributação.
Tendo em vista o destaque sobre a exclusão do ICMS da
base de cálculo do PIS e da COFINS, pontua-se o reflexo
financeiro (de milhões de reais) que a referida decisão do
Tribunal Constitucional gerou aos cofres públicos, prin-
cipalmente a oportunidade da recuperação dos créditos
tributários aos contribuintes, que pagaram, durante anos,
tributos indevidos.
Sob o viés da Teoria dos Jogos é possível refletir que,
em um cenário de dificuldade econômica no país, para
os contribuintes que recolheram indevidamente anos de
PIS e COFINS calculados com ICMS no faturamento e na
receita de forma errônea, a decisão pode propiciar um
campo de investimento estratégico. Aos contribuintes será
permitido reaver os valores, conseguir a compensação tri-
butária de tais créditos perante o fisco Federal e abater
em dívidas e tributos pro futuro, prática esta que encaixa
perfeitamente na elisão fiscal, ou melhor, no planejamento
tributário estratégico lícito.
A relação entre a Teoria dos Jogos, Direito Tributário
e a decisão do STF no RE nº 574.706 corresponde a uma
perspectiva estratégica do ponto de vista da elisão fiscal,
em que os contribuintes podem se utilizar da recuperação
destes créditos tributários pagos (indevidamente) aos Fis-
co Federal durante anos (mais precisamente nos últimos
cinco) para adotar decisões – das mais variadas – sobre
seus investimentos. Dentre elas, após o levantamento dos
créditos, o contribuinte pode conseguir a compensação

236
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

tributária com as dívidas anteriores ou as vincendas em


face do fisco Federal, o que abre uma janela de investi-
mento, resultando em ampliação de empregos, aumento
do capital de investimento, expansão do fluxo econômico,
na ótica dos contribuintes empresários.
Com a adoção destas atitudes pelos contribuintes afeta-
dos, é possível notar um reflexo econômico no seu sentido
macro. Com isso, os contribuintes que se valerem desta es-
tratégia racional (explicada pela teoria dos jogos) poderão
ampliar suas oportunidades de crescimento no mercado,
haja vista, como já acentuado, a influência dos impostos
na formação de preços no mercado.

REFERÊNCIAS
ATALIBA, Geraldo. Estudos e Pareceres de Direito Tributário. v. 1.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978.
BAIRD, Douglas G.; GERTNER, Robert H.; PICKER, Randal C.. Game
Theory and the Law. Cambridge: Harvard University Press, 1998.
BÊRNI, Duilio de Avila; FERNANDEZ, Brena Paula Magno. Teoria dos
Jogos: crenças, desejos e escolhas. São Paulo: Saraiva, 2014.
BRASIL. Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Recurso Voluntá-
rio. Acórdão nº 3402-006.283 – 4ª Câmara / 2ª Turma Ordiná-
ria, proferido no Processo nº 10980.940183/2011-26. Relator: Conse-
lheiro Waldir Navarro Bezerra, 26 de fevereiro de 2019. Disponível
em <https://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJu-
risprudencia/listaJurisprudencia.jsf>. Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de
outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em:
04 dez. 2019.
______. Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998.
Diário Oficial, Brasília, 1998a. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc20.htm>.
Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Emenda Constitucional nº 103, de 12 de novembro de 2019.

237
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Diário Oficial, Brasília, 2019. Disponível em: <http://www.pla-


nalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc103.htm>.
Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Lei Complementar nº 7, de 7 de setembro de 1970. Diário
Oficial, Brasília, 1970. Disponível em: <http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/LEIS/LCP/Lcp07.htm>. Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Lei Complementar nº 70, de 30 de dezembro de 1991. Diário
Oficial, Brasília, 1991. Disponível em: <http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/LEIS/LCP/Lcp70.htm>. Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Diário Oficial, Bra-
sília, 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
leis/l5172.htm>. Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Lei nº 9.715, de 25 de novembro de 1998. Diário Oficial,
Brasília, 1998b. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/LEIS/L9715.htm>. Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002. Diário Oficial,
Brasília, 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/LEIS/2002/L10637.htm>. Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003. Diário Oficial,
Brasília, 2003. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/leis/2003/L10.833.htm>. Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Diário Oficial, Brasí-
lia, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário com
Repercussão Geral nº 574.706 – Paraná, Tema 69, Tribunal Ple-
no. Relatora: Min. Cármen Lúcia, 15 de março de 2017. Disponí-
vel em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/
verAndamentoProcesso.asp?incidente=2585258&numeroProces-
so=574706&classeProcesso=RE&numeroTema=69>. Acesso em: 04
dez. 2019.
______. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Apelação Cível nº
33025, da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
Relator: Juiz Fleury Pires, 22 de maio de 1991. Disponível em: <ht-
tps://www.trf3.jus.br/lpbin22/lpext.dll/FolRevistas/Revista/revs.
nfo.3260.0.0.0/revs.nfo.32ce.0.0.0/revs.nfo.32ea.0.0.0?fn=document-
frame-nosync.htm&f=templates&2.0>. Acesso em: 04 dez. 2019.

238
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

CARVALHO, Cristiano. Teoria da Decisão Tributária. São Paulo: Al-


medina, 2018.
FIANI, Ronaldo. Teoria dos Jogos. 3. ed. São Paulo: Editora Campos, 2014.
GICO JR., Ivo T.. Introdução à Análise Econômica do Direito. In: RI-
BEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é
Análise Econômica do Direito: uma introdução. Belo Horizonte:
Fórum, 2011.
GINTIS, Hebert. The Bound of Reason: Game Theory and the Unifi-
cation of the Behavioral Sciences. Princeton: Princeton University
Press, 2009.
MACKAAY, Ejan; ROUSSEAU, Stéphane. Tradução Rachel Sztajn. Aná-
lise Econômica do Direito. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2015.
MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil. v. 2. São Pau-
lo: Revista dos Tribunais, 2019.
NABAIS, José Casalta. O Dever Fundamental de Pagar Impostos.
Coimbra: Almedina, 1998.
NASH JR., J. F.. Equilibrium Points in n-person Games. Proceedings
of the National Academy of Sciences of the United States of
America, v. 36, n. 1, p. 48-49., jan. 1950. Disponível em: <https://
pdfs.semanticscholar.org/ffd7/c0ad6edb6ca69a43786c39cd01569e-
35b8a2.pdf>. Acesso em: 04 dez. 2019.
PIMENTA, Eduardo Goulart. LANA, Henrique Avelino. Análise Econô-
mica do Direito e sua Relação com o Direito Civil Brasileiro. Revis-
ta da Faculdade de Direito da UFMG, Belo Horizonte, n. 57, p.
85-138, jul./dez. 2010. Disponível em: <https://www.direito.ufmg.
br/revista/index.php/revista/article/download/126/118>. Acesso
em: 04 dez. 2019.
RÍOS, Aníbal Sierralta. Negociação e Teoria dos Jogos. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2018.
SCHOUERI, Luís Eduardo. A restituição de impostos indiretos no sis-
tema jurídico-tributário brasileiro. Revista de Administração de
Empresas, São Paulo, v. 27, n. 1, p. 39-48, jan./mar. 1987. Dispo-
nível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rae/article/
view/38958/37700>. Acesso em: 04 dez. 2019.
WOLKART, Erik Navarro. Análise Econômica do Processo Civil:
como a Economia, o Direito e a Psicologia podem vencer a Tragé-
dia da Justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.

239
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

A IMPLEMENTAÇÃO DE INOVAÇÃO
ABERTA NO SETOR DE ENERGIA:
UM ESTUDO DE CASO SOB A ÓTICA DA
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO

Maria Eduarda Ferreira Piccoli64 e


Lara Bonemer Rocha Floriani65

Resumo: O desenvolvimento de novas tecnologias no mun-


do globalizado tem fomentado a criação de modelos recen-
tes de inovação, como o modelo de Inovação Aberta, que
estão se tornando cada vez mais presentes – especialmente
no âmbito das universidades. Esta pesquisa tem como ob-
jetivo o estudo da implementação da Inovação Aberta pela
Companhia Paranaense de Energia – COPEL (Copel+), inter-
mediada pelo Ecossistema de Inovação da Pontifícia Univer-
sidade Católica do Paraná (HotMilk). Partindo da premissa de
que a pesquisa básica se desenvolve na universidade, com
o objetivo de que seja aplicada diretamente no mercado, o
presente estudo é voltado aos principais fatores que motiva-
ram a adoção do modelo de Inovação Aberta pela Compa-
nhia Paranaense de Energia - COPEL e quais as principais
vantagens da intermediação da universidade nesse processo,
de modo que todos os atores participantes possam ser bene-
ficiados. Para o desenvolvimento da pesquisa, foi utilizado o
método científico dedutivo-descritivo, a técnica de pesquisa
bibliográfica, e o caso selecionado para estudo foi o Progra-
ma Copel+. Dentre os fatores que motivaram a adoção da
Inovação Aberta no caso analisado, foram identificados: I)
64 Graduanda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Membro do Grupo de
Estudos de Análise Econômica do Direito.
65 Doutoranda (Bolsista CAPES/FA) e Mestre (Bolsista CNPQ) em Direito pela Pontifícia Universida-
de Católica do Paraná. Professora nos cursos de Graduação em Direito da Unibrasil e da Faculdade
Estácio de Sá. Membro do Grupo de Estudos de Análise Econômica do Direito. Advogada

240
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

o compromisso internacional firmado no Acordo de Paris,


capaz de proporcionar mudanças tecnológicas no setor de
energia, com forte redução no consumo direto dos sistemas
tradicionais e aumento da Geração Distribuída; II) prazos e
custos envolvidos nos processos de compras e contratações;
III) custos elevados com processos manuais; IV) infraestru-
tura de linhas e redes susceptíveis à intemperes climáticos;
V) grande quantidade de informações existentes com poten-
cial de exploração. Fazer com que a pesquisa desenvolvida
na universidade alcance o setor energético é um importante
passo para que as contribuições científicas promovam um
impacto direto na sociedade. Para atingir os objetivos desta
pesquisa, foi utilizada a Análise Econômica do Direito, em
especial, as premissas da Nova Economia Institucional – NEI,
em razão de sua pertinência em estudos de modalidades
negociais que se realizam entre a universidade e empresa,
na qual a confiança e a cooperação entre as partes torna-se
fundamental para a manutenção das relações entre os agen-
tes. Não obstante, a relevância da cooperação, embasada nas
premissas de Robert Axelrod, justifica-se na medida em que
pode contribuir para suprimir a assimetria informacional e
reduzir os custos de transação incidentes sobre a relação de
troca. Em complemento à Teoria dos Custos de Transação
de Oliver E. Williamson, verificou-se que a Inovação Aberta
também está atrelada à maximização do valor transacional,
conforme defende Jeffrey Dyer. Por fim, pode-se verificar
que tal processo induz o aprendizado entre seus participan-
tes, o que contribui para potencializar a inovação e o desen-
volvimento econômico e social da sociedade.
Palavras-Chave: Inovação Aberta. Programa Copel+.
Acordo de Paris. Inovação Tecnológica. Análise Econômi-
ca do Direito.

241
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

INTRODUÇÃO
Os agentes econômicos, especialmente no âmbito do
mercado, tomam suas decisões motivados pela busca do lu-
cro. No âmbito empresarial, para obtê-lo, é imprescindível
que os custos decorrentes da produção e do exercício da
atividade empresarial, sejam menores do que o ganho final
obtido. Para atingir este resultado, as empresas estão em
contínuo processo de busca de mecanismos para a redução
dos custos da atividade em todos os níveis de produção.
Neste cenário, verifica-se o poder da inovação para o
desenvolvimento e crescimento da atividade empresarial,
eis que repercute diretamente no aumento da produtivida-
de e nos ganhos marginais.
Tradicionalmente, a indústria e as organizações traba-
lhavam com o modelo de inovação fechada, em que as
pessoas responsáveis pela criação, desenvolvimento e co-
mercialização de novas ideias e modelos de negócios e
produção trabalhavam para elas. Cabia às empresas, des-
cobrir o modelo inovador, para somente então, auferir os
lucros resultantes da inovação ao colocá-la no mercado.
Contudo, este cenário foi gradativamente transformado,
na medida em que se constatou a possibilidade e as efeti-
vas vantagens de se produzir inovação fora dos limites da
empresa, por meio de uma combinação de ideias internas
e externas e efetiva cooperação entre os agentes envol-
vidos no processo de inovação, o que se dá pela via do
modelo de inovação aberta.
Na inovação aberta, a ideia de que a própria empresa
é que deve ser responsável pela descoberta para que pos-
sa auferir as vantagens dela resultantes foi superada pelo
princípio de que a inovação não precisa necessariamente
ter sido desenvolvida no departamento interno de pesqui-

242
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

sa da empresa para que possa ser utilizada e aumentar a


eficiência e os ganhos de produção.
Neste cenário, as universidades e laboratórios de pesquisa
ganharam um papel relevante, na medida em que são res-
ponsáveis, em grande parte, pelo desenvolvimento do co-
nhecimento e pela produção de pesquisa, eis que dotadas
de potencial para originar novas técnicas de produção, bem
como novos produtos a serem colocados no mercado.66
A inovação aberta pressupõe a interação entre as univer-
sidades e centros de pesquisa com potencial de produzir
conhecimento, e as empresas, que já estão inseridas em
mercados, possuem expertise para produzir em larga escala,
manufaturar e, portanto, funcionar como auxiliar da univer-
sidade, na aplicação do resultado da pesquisa produzida.
Para o desenvolvimento da pesquisa, foi utilizado o mé-
todo científico dedutivo-descritivo, a técnica de pesquisa
bibliográfica, e o caso selecionado para estudo foi o Pro-
grama Copel+. Para atingir os objetivos desta pesquisa, foi
utilizada a Análise Econômica do Direito, em especial, as
premissas da Nova Economia Institucional – NEI, em razão
de sua pertinência em estudos de modalidades negociais
que se realizam entre a universidade e empresa, na qual a
confiança e a cooperação entre as partes torna-se funda-
mental para a manutenção das relações entre os agentes.
Não obstante, a relevância da cooperação, embasada
nas premissas de Robert Axelrod, justifica-se na medida
em que pode contribuir para suprimir a assimetria infor-
macional e reduzir os custos de transação incidentes sobre
a relação de troca. Em complemento à Teoria dos Custos

66 Segundo Brito Cruz e Pacheco (2008, p. 20), a maior parte da pesquisa brasileira está concen-
trada nas universidades e centros de pesquisa - mais especificadamente, 77% dos cientistas estão
alocados em universidades e centros de pesquisa e 23% restante nas áreas de Pesquisa e Desen-
volvimento das empresas.

243
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

de Transação de Oliver E. Williamson, verificou-se que a


Inovação Aberta também está atrelada à maximização do
valor transacional, conforme defende Jeffrey Dyer.
O estudo foi segmentado em cinco partes, cuja introdu-
ção apresenta a visão panorâmica, o problema, o objetivo
e alguns aspectos da metodologia utilizada. Na segunda
parte foi desenvolvida a revisão de literatura, focada no
conceito de inovação aberta e seus benefícios para o pro-
blema apresentado. A seguir, é incorporada a metodologia
adotada para o estudo de caso sobre os fatores de erosão
que motivaram a adoção de Inovação Aberta pela Copel
- mediante o Programa Copel+, para, na quarta parte, apli-
car as premissas da Nova Economia Institucional (NEI). Ao
final, foram apresentadas as conclusões deste estudo, em
que se indicou os benefícios decorrentes da adoção do
modelo de inovação aberta no caso concreto do programa
Programa Copel+.

INOVAÇÃO ABERTA
A inovação é um aspecto fundamental ao desenvolvi-
mento da atividade da indústria e das organizações. De
acordo com COOTER e SCHÄFER, a produtividade au-
menta especialmente através das inovações feitas pelos
empreendedores (2016, p. 69-84).
Considerada a vasta complexidade e obsolescência das
novas tecnologias, as organizações empresariais deman-
dam modelos de gestão de inovação cada vez mais céle-
res. Neste contexto, o modelo de inovação aberta tem ga-
nhado cada vez mais espaço, como forma de potencializar
a inovação dentro de organizações.
Os modelos de inovação podem ser classificados em
dois grandes grupos: inovação fechada e inovação aber-

244
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ta. O primeiro modelo de inovação, para CHESBROUG


(2003), é aquele que se desenvolve dentro dos limites da
empresa. Uma empresa que opta por manter seus esfor-
ços de inovação internamente, desenvolve seus projetos
apenas dentro de limites claramente definidos. Know-how,
tecnologia, processos e propriedade intelectual permane-
cem sob seu próprio controle, sem colaboração de outros
agentes do mercado ou universidades.
Por sua vez, a inovação aberta pode ser conceituada
como um processo de inovação distribuída que envolve
propositalmente os fluxos da gestão de conhecimento por
meio das fronteiras organizacionais (CHESBROUG; VA-
NHAVERBEKE; WEST, 2018, p. 29).
A difusão tecnológica é a forma como as inovações se
espalham e chegam ao mercado. Sem a difusão tecnológi-
ca a inovação não teria impacto no sistema econômico. A
inovação tecnológica que não é difundida não consegue
propiciar mudanças radicais no sistema econômico vigente,
deste modo é necessária a interação das organizações, do
governo e das universidades (compreendendo também os
centros de pesquisa) de maneira aberta por meio da forma-
ção de redes de informação (AGUSTINHO, GARCIA, 2018).
Segundo levantamento realizado por CHESBROUGH e
BOGERS (2018, p. 28), o desenvolvimento de pesquisas em
inovação aberta foi potencializado rapidamente desde que
o termo foi cunhado por CHESBROUg, em 2003. As citações
a “inovação aberta” no Google Acadêmico demonstram que
o número de livros sobre a temática está crescendo ano
após ano. Tal fato sugere que a inovação aberta está sendo
traduzida para além da pesquisa acadêmica à prática nas
organizações empresariais, a uma taxa crescente.
Todavia, cumpre esclarecer que não é apenas o modelo

245
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

de inovação aberta que menciona a necessidade de uma


maior conexão entre atores econômicos para o sucesso
na produção de novos produtos e processos tecnológicos.
Estas ideias decorrem de outros modelos de inovação, que
foram sendo cunhados desde a década de 50, como os
modelos: Elo da Cadeia, Sistêmico, entre outros (CZELUS-
NIAK, RIBEIRO, DERGIN, 2018, p. 632).
No entanto, a opção pelo modelo de inovação aber-
ta é realizada por produzir os melhores resultados, por
pressuporem o compartilhamento de tecnologia entre as
organizações, para diminuir custos e riscos (CZELUSNIAK,
RIBEIRO, DERGIN, 2018, p. 632).
Nesse sentido, cumpre pontuar uma definição de inova-
ção aberta relacionada a outros conceitos, tendo em vista
suas diferenças e complementaridades.
Quando CHESBROUGH (2003) começou a utilizar o
termo inovação aberta, descreveu um fenômeno em que
as empresas faziam maior uso das ideias e tecnologias ex-
ternas em seu próprio negócio e deixavam as ideias e
tecnologias internas não utilizadas irem para o mercado
para outros usarem em seus negócios. Sua obra propu-
nha os “fatores de erosão”, que minavam a lógica anterior
do modelo de pesquisa e desenvolvimento (P&D) tratado
como “inovação fechada”, e desenvolvia a lógica de um
modelo de inovação aberta (CHESBROUG; VANHAVER-
BEKE; WEST, 2018, p. 41).
Dentre os “fatores de erosão” responsáveis por mudar
as condições em que as empresas inovavam, foram iden-
tificados por CHESBROUGH (2003): o aumento da mo-
bilidade dos trabalhadores, universidades mais capazes,
declínio da hegemonia dos Estados Unidos e o crescente
acesso das startups ao capital de risco. Mais recentemente,

246
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

pode ser acrescentada a ascensão da internet (e das mídias


sociais) que trouxe o acesso ao conhecimento e o com-
partilhamento de capacidades das redes internas de TIC
(Tecnologias de Informação e Comunicação) de empresas
específicas para a rede mundial de computadores (CHES-
BROUG; VANHAVERBEKE; WEST, 2018, p. 42).
Os “fatores de erosão mencionados” permitem identifi-
car, conforme KUHN (2009, p. 176) o porquê da inovação
aberta refletir uma mudança de paradigma: desafia pres-
supostos básicos e problemas, propondo novas soluções e
métodos para a pesquisa e a prática da inovação industrial
do século XXI.
Portanto, a inovação aberta refere-se a um modelo de
inovação que enfatiza os fluxos intencionais de entrada
e saída de conhecimento pelas fronteiras de uma empre-
sa, para alavancar fontes externas de conhecimento e ca-
minhos para a comercialização, respectivamente (CHES-
BROUG; VANHAVERBEKE; WEST, 2018, p. 42).
Estes fluxos de conhecimento podem envolver o flu-
xo de entrada de conhecimento na organização em foco
(aproveitando fontes externas de conhecimento por meio
de processos internos), a saída de conhecimento da orga-
nização em foco (aproveitando o conhecimento interno
a partir de processos de comercialização externa) ou am-
bos. (CHESBROUG; VANHAVERBEKE; WEST, 2018, p. 43).
Também vinculamos essa definição aos principais tipos de
inovação aberta, denominadas de fora para dentro (out-
side-in ou inbound), de dentro para fora (inside-out ou
outbound) e do tipo acoplado combinado, bem como os
mecanismos associados, incluindo os fluxos pecuniários e
não pecuniários (CHESBROUG; VANHAVERBEKE; WEST,
2018, p. 29).

247
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Como resultado, tem-se que o modelo de inovação


aberta, ainda que recente, resulta de um aprimoramento
do modelo tradicional que aplica ideias de outros mo-
delos de inovação cunhados na década de 50, eis tem
apresentado resultados mais vantajosos em relação aos an-
tecessores, justificando o estudo da forma como tem sido
desenvolvido para fins de difusão do conhecimento, bem
como sua utilização pelas indústrias e organizações em
um processo de interação e cooperação com os centros de
pesquisa e universidades.

ESTUDO DE CASO: A COPEL E O PROGRAMA COPEL+


Conforme indicado no edital divulgado pela COPEL -
Chamada Pública para Seleção de Startups - a Companhia
Paranaense de Energia (COPEL) foi criada em outubro de
1954. Trata-se de empresa de capital aberto, constituída sob
a forma de sociedade de economia mista e controlada pelo
Governo do Estado do Paraná́. Possui ações negociadas na
BM&FBovespa e nas Bolsas de Nova Iorque e Madri.
É a maior empresa do Paraná́, tem sua sede em Curi-
tiba (PR) e está presente em dez estados brasileiros. Atua
nas áreas de geração, transmissão, distribuição e comer-
cialização de energia, além de telecomunicações e gás na-
tural. Opera um abrangente e eficaz sistema elétrico com
parque gerador próprio de usinas, linhas de transmissão,
subestações, linhas e redes elétricas do sistema de distri-
buição e um moderno sistema ótico de telecomunicações
que integra todas as cidades do estado, segundo dados da
Chamada Pública para Seleção de Startups.
No entanto, após o surgimento de uma série de fatores,
tais como: o compromisso firmado no Acordo de Paris,
prazos e custos envolvidos nos processos de compras e

248
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

contratações, infraestrutura de linhas e redes susceptíveis


à intemperes climáticos e a grande quantidade de infor-
mações existentes com potencial de exploração, a Com-
panhia se viu diante da necessidade de buscar novas solu-
ções e métodos para inovar no setor de energia.
Para tanto, foi lançado o Programa de Inovação Aberta
da Companhia Paranaense de Energia - o Copel+. Confor-
me divulgado pela Agência de Notícias do Paraná - AEN
PR (2019), o objetivo da iniciativa consiste na seleção de
startups para serem aceleradas pelo programa. Entre os
benefícios, segundo a Agência de Notícias do Paraná, a
empresa oferece possibilidade de acesso a um fundo de
pesquisa e desenvolvimento no valor de R$ 10 milhões.
O programa Copel+, consoante a AEN PR (2019), tem
duas frentes: uma direcionada à formação de startups a par-
tir de ideias de estudantes universitários, por meio da qual
foram selecionados projetos para serem desenvolvidos até
a validação de um modelo de negócios; e outra voltada a
empresas que já venham do mercado, que contempla um
plano de aceleração. Para tanto, a Copel possui como par-
ceiros no programa a Pontifícia Universidade Católica do
Paraná (PUCPR) - pelo Ecossistema de Inovação Hotmilk - e
o Sistema FIEP - pelo Instituto Euvaldo Lodi (IEL).

Fatores de Erosão que impulsionaram


o Programa Copel+
O compromisso internacional firmado no Acordo de Paris,
capaz de proporcionar mudanças tecnológicas no setor de
energia, com forte redução no consumo direto dos sistemas
tradicionais e aumento da Geração Distribuída, representa
um dos principais desafios gerais que influenciaou na mu-
dança de paradigma da Companhia Paranaense de Energia.

249
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Isto porque, dentre as fontes de geração de energia elé-


trica no Brasil, há preponderância das hidrelétricas. Em
seguida, há a geração termelétrica, a qual pode ser promo-
vida por meio de diferentes combustíveis, tais como: gás
natural, biomassa, carvão mineral, nuclear, óleo combustí-
vel entre outros.
As fontes mais poluentes - tais como carvão, gás natural
e petróleo, representam um percentual reduzido da ener-
gia produzida no Brasil. Por esse motivo, é possível afir-
mar que a matriz energética brasileira, quando comparada
a de outros países, é pouco poluente (BARROS, BORELLI,
GEDRA, 2014, p. 18).
Mesmo diante desse cenário, como subscritor do Acor-
do de Paris, o Brasil precisa definir uma estratégia de tran-
sição energética para uma economia de baixo carbono.
Não há que se falar em um setor já ser suficientemente
sustentável sob o ponto de vista ambiental, vez que tal
acordo impõe metas aos países subscritores, independen-
temente de seus pontos de partida.
Tendo isso em vista, o elevado nível de perdas na dis-
tribuição de eletricidade representa um desperdício de re-
cursos que ​precisa ser combatido. Adicionalmente, a es-
cassez hídrica que há décadas atinge a região Nordeste e
que no período 2014-2015 teve consequências perversas
na região Sudeste, evidencia a necessidade de que a in-
terdependência do setor de eletricidade com o setor de
recursos hídricos seja tratada de outra forma.
Não obstante, a regulação já tem incentivado a expan-
são da geração distribuída, por meio de resoluções nor-
mativas, como a REN 482/2012 e REN 687/2015​​, emitidas​​
pela​​ ANEEL.
Para a pesquisadora da FGV Energia, Tatiana Bruce da

250
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Silva (2017), uma maneira de continuar a investir em ener-


gias renováveis e no combate ao desmatamento, mesmo
com a crise econômica e política que assola o país é, além
de recorrer a fontes de bancos multilaterais, como o Banco
Mundial e o BID, incentivar investimentos do setor priva-
do e empresas.
Para desenvolver o setor de energia, são necessárias
interações com outros setores. Não cabe agora recorrer à
abordagem tradicional de regular as infraestruturas elétri-
cas à medida das conveniências do setor elétrico e da sua
lógica interna, com o objetivo de reestruturar os mercados.
Como resultado, emergem novos modelos de negócios,
capazes de gerar valor para investidores, agentes e usuá-
rios de eletricidade.
Por sua vez, no que concerne aos desafios específicos
enfrentados pela Companhia Paranaense de Energia foi
possível constatar: elevados custos com processos manu-
ais, tais como a leitura de unidades consumidoras - o que
exige a presença da Copel no local do consumo para veri-
ficar os medidores, inspeção de linhas e redes e recepção
de materiais em almoxarifados. Outros custos identifica-
dos estão nos processos de contratação, além de acidentes
de trabalho - com ou sem contato com a energia (COPEL,
2017, p. 1).
Outro fator igualmente relevante é a Infraestrutura de
linhas e redes suscetíveis à intemperes climáticos, o que
é uma das causas dos desligamentos não programados.
Este, por sua vez, é um dos fatores que mais contribui
para a interrupção do fornecimento de energia e, portanto,
impacta na qualidade do serviço prestado (TRONCHONI,
2018, p. 5).
Necessário mencionar a melhoria do desempenho nos

251
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

indicadores de qualidade do fornecimento. Automação,


virtualização e interação inteligente com o consumidor,
por meio da adoção de tecnologias multiplataformas. A
companhia entende que estes temas podem gerar opor-
tunidades em aplicações de Inteligência Artificial e cog-
nitiva, Blockchain, Drones, Realidade Virtual e Realidade
Aumentada, Internet das Coisas, “Gamification” de proces-
sos, Virtualização de Atendimentos e Processos, Big Data,
Analytics, entre outras. Existe, portanto, grande quantida-
de de informações com potencial de exploração.
A definição de “fluxos de entrada e saída intencionais
de conhecimento” remonta a uma literatura econômica vi-
brante em transbordamentos, que surgem a partir do in-
vestimento das empresas em pesquisa e desenvolvimento.
Já que as empresas não podem especificar totalmente os
resultados desse investimento com antecedência, o P&D,
inevitavelmente, produz resultados não esperados ex ante
(CHESBROUG; VANHAVERBEKE; WEST, 2018, p. 42).
Uma transição energética motivada pelos fatores de ero-
são acima mencionados exige um diálogo técnico e uma
estratégia institucional muito ampla. A salvaguarda do in-
teresse público requer o respeito da legítima diversidade
de cada setor envolvido nesse processo, num espírito de
cooperação que garanta a consistência das várias opções
através dos setores e através do tempo, conforme delimita-
do pelas políticas públicas e​​ pelos acordos
​​ internacionais​
​​
democraticamente ​​aprovados.

ANÁLISE ECONÔMICA
A transferência de tecnologia, para TERRA (2001, p. 22),
não possui por objeto apenas a produção industrial ime-
diata de um novo produto ou uma nova maneira de fazer

252
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

determinadas atividades, mas a aquisição de um conjunto


de conhecimento que só se concretiza através da realiza-
ção conjunta de atividades de pesquisa.
O processo de transferência de tecnologia não é um
processo simples, tendo em vista que envolve a troca re-
cíproca de informações entre os parceiros envolvidos. Tal
complexidade se verifica devido à diferença dos propósi-
tos e resultados dados pelas universidades e o setor pro-
dutivo para o desenvolvimento das pesquisas dentro de
seus ambientes (AGUSTINHO, GARCIA, 2018).
Os obstáculos não dizem respeito apenas à diferença de
propósitos entre as instituições, mas também estão relacio-
nados às dificuldades de comunicação, burocracia na for-
malização contratual, prazos, aversão a riscos e barreiras
técnicas. A esse respeito, dispõe Agustinho e Garcia (2018),
que a criação de Escritórios de Transferência de Tecnologia
nas Instituições Científicas - como o Ecossistema de Inova-
ção HotMilk da Pontíficia Universidade Católica do Paraná -
têm contribuído para uma melhor interação entre os atores.
Isso porque os escritórios adotaram uma visão estraté-
gica no sentido de proteger a academia e ao mesmo tem-
po não perder oportunidades, direcionando-se também ao
atendimento das necessidades das empresas.
Nesses termos, para que seja estabelecida uma relação
de confiança entre as partes, necessário estimular a coo-
peração - objetivando a continuidade das relações e, con-
sequentemente, a preservação futura da relação negocial.
A solução mais eficiente sob a perspectiva econômica,
advogada por COASE (1960), trata da colaboração mútua
das partes, por possibilitar uma redução significativa dos
custos de transação. Para tanto, seria necessário que os
direitos de propriedade estivessem bem definidos.

253
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Todavia, ainda que as partes estejam dispostas a cola-


borar, externalidades atingem a negociação - tais como a
impossibilidade de redigir contratos que disciplinem de
forma ótima todas as condições contratuais, sem que res-
tem lacunas para quaisquer das partes.
Levando isso em conta, deve-se apontar que o cumpri-
mento contratual igualmente pressupõe a colaboração das
partes, tanto no momento em que acordam por firmar o
contrato, tanto quando agem em conformidade com o que
fora acordado. Segundo Robert Axelrod (2010), a coope-
ração procede ainda que os indivíduos objetivem apenas
satisfazer seus próprios interesses, sem levar em conside-
ração interesses alheios.
Nesse sentido, AXELROD (2010, p. 118) postulou como
premissa de qualquer cooperação uma memória de intera-
ções, ou seja, que a cooperação entre partes só ocorre se
elas são capazes de memorizar interações prévias.
Outro modo de incentivar a relação de cooperação con-
siste em partir os problemas em partes menores, com o
objetivo de promover uma estabilidade no contrato. Isso
porque, os ganhos com uma possível traição seriam me-
nos importantes em relação aos potenciais ganhos advin-
dos de uma cooperação mútua em movimentos futuros.
Igualmente, destaca-se a importância da reciprocidade.
Portanto, para o autor, é necessária a capacidade de reco-
nhecer um parceiro de interações passadas e lembrar-se
de características relevantes dessas interações. Sem ha-
ver o reconhecimento não há como existir reciprocidade
(AXELROD, 2010, p. 132)
Relativamente aos Contratos de Transferência de Tecno-
logia e suas incertezas e delimitações, será importante que
contenham cláusulas que favoreçam futuras renegociações.

254
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Em casos inesperados, que produzam alterações no anda-


mento ordinário do contrato, uma boa relação de coopera-
ção entre as partes pode levar a uma fácil resolução priva-
da, sem a necessidade de intervenção do Poder Judiciário,
por exemplo (CZELUSNIAK, RIBEIRO, 2013, p. 5).
Perante a Nova Economia Institucional (NEI), o con-
trato de inovação aberta também possui um papel impor-
tante. Isso porque, conforme exposto no presente artigo,
a inovação aberta está relacionada com o estabelecimen-
to de relações entre a empresa e parceiros externos de
inovação.
As empresas que buscam a inovação podem interagir
de diferentes maneiras com seus parceiros e a esco-
lha entre esses diferentes tipos de colaboração encon-
tra-se no cerne da Teoria dos Custos de Transação de
WILLIAMSON (2002). Para o autor, quando os parceiros
de inovação fazem investimentos em transações especí-
ficas, os custos de transação surgem por causa do medo
do oportunismo.
Segundo a Teoria dos Custos de Transação, as empresas
irão optar por um modo específico de governança para que
os custos de transação sejam minimizados, considerada a
ameaça do oportunismo em um ambiente competitivo.
Em complemento à essa visão, DYER (1997, p. 539)
demonstra que as transações entre as organizações não
devem ser estruturadas apenas para que se minimizem os
custos de transação, mas também, para que se maximize
o valor desta.
Como tal, a otimização do valor da transação ofere-
ce um quadro teórico mais interessante para as ofertas
de inovação aberta. Em primeiro lugar, a inovação aberta
toma forma por meio de diferentes tipos de relações a

255
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

longo prazo entre um conjunto de parceiros para executar


tarefas complexas relacionadas com o desenvolvimento
e a comercialização de inovações. Isso requer um eleva-
do nível de compreensão e confiança entre os parceiros
para aprender uns com os outros e perceber o potencial
completo da estratégia de cooperação. Nesse contexto, o
valor da cooperação entre empresas não se baseia apenas
nos objetivos dos custos de transação, como também no
valor estratégico e nas oportunidades de aprendizagem
(BOGERS; CHESBROUGH, 2018, p. 298)
Portanto, com a prevalência da cooperação, há uma ten-
dência ao aumento da produtividade e à diminuição do
inadimplemento para ambas as partes, o que, consequente-
mente, implica a redução da litigiosidade (CASSI, GONÇAL-
VES, 2014, p. 264). Oportuniza-se aos agentes que sejam
estabelecidos relacionamentos mais duradouros, mediante
partilha de resultados, assunção conjunta de riscos e prévia
definição de funções e resultados no contrato - como um
meio de atenuar a incompletude ocasionada pela incerteza
e maximizar o valor da transação realizada.
Tendo em vista a complexidade do processo de transfe-
rência de tecnologia - resultante da diferença dos propó-
sitos, dos resultados dados pelas universidades e o setor
produtivo, bem como pelas barreiras técnicas existentes
- necessário o estímulo à cooperação, visando estabelecer
uma relação de confiança entre as partes. As empresas
que buscam a inovação podem interagir de diferentes ma-
neiras com seus parceiros, visando não apenas minimizar
os custos de transação, mas também, maximizar o valor
da transação realizada, com o intuito de não beneficiar
somente a própria empresa, mas todos aqueles que fazem
uso dos serviços e produtos por ela ofertados.

256
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando que o setor energético está em desen-
volvimento e passando por mudanças, crucial o incentivo
no âmbito da inovação. Tal incentivo é possível por meio
da interação entre a universidade, o setor produtivo e a
sociedade - premissa que foi verificada mediante o estudo
de caso do Programa Copel+.
Enquanto a universidade precisa ser empreendedora
para que o conhecimento possa ultrapassar suas frontei-
ras, a indústria precisa inovar para sobreviver à concor-
rência esmagadora e atender aos anseios da sociedade por
fontes energéticas cada vez mais limpas e eficientes.
Utilizando das premissas da Análise Econômica do Di-
reito e da Nova Economia Institucional (NEI) o presente
artigo se propôs a contribuir com uma solução que otimi-
zasse a interação supracitada, apresentando a cooperação
como meio de tornar tal relação mais eficiente e dura-
doura. Igualmente, foi possível concluir que a Inovação
Aberta está atrelada não apenas à Teoria dos Custos de
Transação, mas também ao valor da transação - visto que
as interações entre parceiros em um contexto de inovação
aberta podem ser consideradas em termos de maximiza-
ção dos valores envolvidos.
Uma transição energética pautada pela racionalidade
econômica, ambiental e política exige um diálogo técnico,
institucional e político muito amplo. A salvaguarda do in-
teresse público requer o respeito da legítima diversidade
de cada setor envolvido nesse processo, num espírito de
cooperação que garanta a consistência das várias opções
através dos setores e através do tempo, em coerência com
as políticas públicas ​​e ​​com ​​os ​​acordos ​​internacionais​de-
mocraticamente ​​aprovados.

257
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

REFERÊNCIAS
AEN PR, Agência de Notícias do Paraná. Programa de inovação
da Copel abre inscrições para startups. 2019. Disponível em:
http://www.aen.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyi-
d=103586&tit=Programa-de-inovacao-da-Copel-abre-inscricoes-pa-
ra-staAgrtups Acesso em: 10 de nov. de 2019.
AGUSTINHO, Eduardo Oliveira; GARCIA, Evelin Naiara. Inovação,
Transferência de Tecnologia e Cooperação. João Pessoa: Revis-
ta Direito e Desenvolvimento. Unipê, v. 9 n. 1. 2018 pág. 223-239
AXELROD, Robert. A evolução da cooperação. Tradução de Jusella
Santos. São Paulo: Leopardo Editora, 2010.
BARROS, Benjamin Ferreira de; BORELLI, Reinaldo; GEDRA, Ricardo
Luis. Geração, transmissão, distribuição e consumo de ener-
gia elétrica. 1. ed.; São Paulo: Érica, 2014.
BRITO CRUZ, C. H.; PACHECO, C. A. Conhecimento e inovação:
desafios do Brasil do século XXI. 2008. São Paulo: São Paulo
em Perspectiva, v.19, nº.1. jan./mar: 2005. Disponível em: https://
www.ifi.unicamp.br/~brito/artigos/inte-pacheco-brito.pdf Acesso
em: 23 de nov. de 2019.
CASSI, Guilherme Helfenberger Galino. GONÇALVES, Oksandro Osdi-
val. Os Custos de Transação no Contrato de Integração. Porto
Alegre: Revista da AJURIS, v. 41, n. 136, 2014.
COOTER, Robert D.; SCHAFER, Hans-Bernd. O Nó de Salomão:
Como o Direito pode erradicar a pobreza das Nações. Trad. Mag-
num Eltz. Curitiba: CRV, 2016.
CHESBROUG. Henry; BOGERS. Marcel. Explicando a inovação
aberta. Esclarecendo esse paradigma emergente para o en-
tendimento da inovação. São Paulo: Editora Edgard Blücher
Ltda, 2018.
CHESBROUG. Henry. Open innovation: the new imperative for
creating and profiting from technology. Boston: Harvard Busi-
ness School Press, 2003.

258
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

CHESBROUG. Henry; VANHAVERBEKE. Wim; WEST. Joel. Novas


fronteiras em inovação aberta. São Paulo: Editora Edgard Blü-
cher Ltda, 2018.
COASE, Ronald. O problema do custo social. (Tradução de Francis-
co Kümmel F. Alves e Renato Vieira Caovilla). Universidade da Vir-
gínia, Journal of Law and Economics, 1960. Disponível em: https://
periodicos.unipe.br/index.php/direitoedesenvolvimento/article/
view/525/547 Acesso em: 27 de nov. de 2019.
COPEL, Companhia Paranaense de Energia. Chamada Pública para
Seleção de Startups. 2017. Disponível em: https://www.copel.
com/hpcopel/root/sitearquivos2.nsf/arquivos/cp_052017_startu-
p/$FILE/CP%200052017.pdf . Acesso em: 03 de nov. de 2019.
CZELUSNIAK, Vivian Amaro; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; e DERGIN,
Dario Eduardo Amaral. Contratos de Transferência De Tecnolo-
gia e a Teoria da Nova Economia Institucional. Belo Horizonte:
Revista da Faculdade de Direito UFMG, jan./jun. 2018 pág. 629-661
CZELUSNIAK, Vivian Amaro; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Coope-
ração para a efetividade dos contratos de transferência de
tecnologia: uma análise jus econômica. Economic Analysis of
Law Review, v. 4, n. 1, p. 21-34, jan.-jun. de 2013.
DYER, Jeffrey. Effective Interim Collaboration: How Firms Mi-
nimize Transaction Costs and Maximise Transaction Value.
Philadelphia: Strategic Management Journal, Vol. 18/7, p. 535 -
556, 1997. Disponível em: https://dspace.mit.edu/bitstream/han-
dle/1721.1/1442/148a.pdf Acesso em: 27 de nov. de 2019
FGV CERI – Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura da Fun-
dação Getúlio Vargas. Contribuições à Consulta Pública Acer-
ca Da Proposta De Aprimoramento Do Marco Legal Do Setor
Elétrico Brasileiro. 2017. Disponível em: <https://bibliotecadi-
gital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/19063/aprimoramen-
to-do-marco-legal-do-setor-eletrico-brasileiro-cp-mme-n-033-2017.
pdf?sequence=1&isAllowed=y> Acesso em: 10 de nov. de 2019.

259
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

SILVA, Tatiana Bruce da. Pesquisadora da FGV analisa o Brasil no


Acordo de Paris. 2017. Disponível em: http://rmai.com.br/pes-
quisadora-da-fgv-analisa-o-brasil-no-acordo-de-paris/ Acesso em:
11 de nov. de 2019.
TERRA, B. A Transferência de Tecnologia em Universidades Em-
preendedoras: um caminho para a inovação tecnológica. Rio
de Janeiro: Qualitymark, 2001.
TRONCHONI, Alex Bernsts. Identificação das causas de des-
ligamentos não programados em redes de Distribuição.
2008. Disponível em: http://repositorio.pucrs.br/dspace/bitstre-
am/10923/3225/1/000403015-Texto%2BCompleto-0.pdf Acesso
em: 15 de nov. de 2019.
KUHN. Thomas Samuel. The Structure of Scientific Revolutions.
New Jersey: Princeton University Press, 2009. p. 176.
WILLIAMSON, Oliver E. The lens of contract: private ordering. Nash-
ville: American Economic Review, v. 92, n. 2, p. 438-433, mai. 2002.

260
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

LEI Nº 12.846/2013 - LEI ANTICORRUPÇÃO:


O ACORDO DE LENIÊNCIA SOB UM ENFOQUE
DA ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO

Bruno Fediuk de Castro67 e


Gilberto Bomfim68

Resumo: A corrupção é um fenômeno que pode ser obser-


vado em escala mundial, diferindo em seu grau de difusão
entre diversos países. A sua prevenção e o combate foram
incorporados ao plano global sendo que, o que muda, em
cada país, são as regras formais e informais e suas respec-
tivas características. No Brasil, a Lei nº 12.846/2013 – Lei
Anticorrupção buscou incorporar ao ordenamento jurídi-
co os institutos do Compliance e do acordo de leniência
como medidas de prevenção e combate a corrupção. Uma
análise da eficiência da lei pode ser realizada por meio
da avaliação da racionalidade do processo de decisão
dos agentes que cometem atos de corrupção, do ambien-
te institucional de interação da corrupção e da eficiência
de alocação de recursos na prevenção e repressão dessa
prática ilícita, sob um enfoque da Análise Econômica do
Direito. O objetivo deste artigo é fazer uma análise da
Lei nº 12.846/2019, destacando os seus principais aspectos
normativos e investigar seus êxitos relativamente a reali-
zação dos acordos de leniência à luz do instrumental me-
todológico da Análise Econômica do Direito. No tocante a
metodologia, será utilizado o método hipotético-dedutivo,

67 Mestrando em Direito Econômico e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica do Para-


ná (Curitiba - PR, Brasil). Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Curitiba - UniCuritiba (Curiti-
ba – PR, Brasil). Advogado. https://orcid.org/0000-0003-0947-8142. E-mail: bfc.adv@gmail.com.
68 Mestrando em Direito Econômico e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica do
Paraná (Curitiba - PR, Brasil). Procurador federal, membro da AGU. https://orcid.org/0000-0002-
0141-7620. E-mail: g_bomfim@hotmail.com.

261
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

por meio de uma abordagem qualitativa, buscando-se fo-


mentar o debate sobre os métodos econômicos aplicáveis
à ciência jurídica. Ao final, pretende-se demonstrar como
a lei afetou a racionalidade dos agentes econômicos e das
empresas privadas na adoção de acordos de leniência.
Palavras-chave: Corrupção. Lei Anticorrupção. Análise
Econômica do Direito. Teoria da Agência. Incentivos.

INTRODUÇÃO
A corrupção é um fenômeno que pode ser observado
em escala mundial e que afeta o desenvolvimento econô-
mico e social de todos os países do mundo, diferindo em
seu grau de difusão entre diversos países. Em alguns os
casos são práticas esporádicas, em outros, a corrupção é
sistêmica. O que muda, em cada caso, são as regras for-
mais e informais e suas respectivas características, em cada
país, para a execução e supervisão das políticas públicas
de prevenção e de combate à corrupção, bem como a efi-
ciência do quadro de incentivos.
Na medida em que a corrupção se converteu em um fe-
nômeno transnacional com potencial para afetar todas as
sociedades e economias, exigiu-se dos países a necessária
cooperação internacional para a criação de tratados dire-
cionados à busca de melhorias institucionais na prevenção
ao combate à corrupção. Destacam-se os três tratados ra-
tificados pelo Brasil: (i) Convenção Interamericana contra
a Corrupção (“OEA”), em 1996; (ii) Convenção da Organi-
zação para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(“OCDE”), em 2000; e (iii) Convenção das Nações Unidas
contra a Corrupção (“UNCAC”), em 2003.
Além de ratificar esses tratados, as instituições brasileiras
têm trabalhado intensamente para o combate à corrupção.

262
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

A Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade) dispõe sobre as


sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enri-
quecimento ilícito. A Lei nº 12.529/2011 (CADE) estrutura
o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e dispõe
sobre a prevenção e repressão às infrações contra a or-
dem econômica. A Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção),
dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de
pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administra-
ção pública e a Lei nº 12.850/2013 (Lei das Organizações
Criminosas), dispõe sobre as organizações criminosas e
prevê os acordos de delações premiadas.
Nesse contexto de interdependência entre os países no
atual mundo globalizado, a corrupção não pode ser es-
tudada apenas sob a ótica jurídica, desconsiderando as
vertentes econômica e institucional, pois ao analisar a cor-
rupção como entrave ao desenvolvimento, é necessário
considerar que o Estado e as instituições são os principais
responsáveis pelas causas e pela prevenção da corrupção.
A racionalidade do comportamento humano e suas es-
colhas são influenciadas pelas instituições de cada país,
as quais têm papel relevante nos níveis de corrupção e
refletem a maturidade com que cada povo lida com o pro-
blema. O papel principal das instituições é o de reduzir as
incertezas ao criar estruturas estáveis que regulem a intera-
ção entre os indivíduos, definindo e limitando o conjunto
de escolhas. A matriz institucional dita aquilo que os indi-
víduos são proibidos de fazer e, por vezes, as condições
sob as quais se permite que alguns indivíduos exerçam
determinadas atividades.
E a criação e modificação da matriz institucional anticor-
rupção pode (deve) se basear nos métodos da Análise Eco-
nômica do Direito (“AED”), buscando verificar os arranjos

263
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

institucionais e incentivos do sistema para a implementação


de medidas de prevenção e combate à corrupção pelas em-
presas privadas, utilizando dos conceitos da economia.
O problema que o artigo pretende responder é como
a Lei nº 12.846/2013 – Lei Anticorrupção afetou os arran-
jos institucionais e incentivos do sistema normativo para
a implementação de medidas de prevenção e combate à
corrupção e, especialmente, como alterou o aspecto com-
portamental empresarial relativamente aos acordos de le-
niência. O objetivo deste artigo é fazer uma análise da
Lei Anticorrupção, mostrando os seus principais aspectos
normativos e investigar os êxitos e falhas da formulação
normativa dos acordos de leniência à luz do instrumental
metodológico da AED e da economia comportamental.
No tocante a metodologia, será utilizado o método hi-
potético-dedutivo, por meio de uma abordagem qualitati-
va, buscando-se fomentar o debate sobre os métodos eco-
nômicos aplicáveis à ciência jurídica.
Este trabalho encontra-se estruturado da forma a seguir
apresentada. No capítulo 1, mediante o exame de modelos
econômicos teóricos sobre corrupção o artigo busca fazer
uma análise da racionalidade do processo de decisão dos
agentes que cometem atos de corrupção, do ambiente ins-
titucional de interação da corrupção e da eficiência de alo-
cação de recursos na prevenção e repressão dessa prática
ilícita. No capítulo 2, o artigo pretende fazer uma análise
normativa da Lei Anticorrupção, com foco no acordo de
leniência previsto na referida norma legal e uma correla-
ção com a teoria dos jogos. No capítulo 3, o artigo preten-
de refletir sobre as melhorias institucionais e os incentivos
criados pelo diploma legal e, mediante uma análise crítica
sobre a racionalidade da intervenção estatal em comento.

264
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

CAPÍTULO 1. MODELOS ECONÔMICOS TEÓRICOS


DE RACIONALIDADE APLICÁVEIS A CORRUPÇÃO
A Análise Econômica do Direito não trata de um objeto
de estudo específico, mas de um método de investigação
aplicado ao problema, qual seja, o método econômico, cujo
objeto pode ser qualquer questão que envolva escolhas. A
análise econômica serve para compreender toda decisão
que verse sobre recursos escassos, baseando-se em duas
perguntas básicas: (i) quais as consequências de uma deter-
minada regra jurídica; e (ii) qual a regra jurídica que deveria
ser adotada para o caso (RIBEIRO, 2016, p.19-20).
A AED, portanto, pretende entender como se comporta
o agente e prever suas reações a mudanças na estrutura de
incentivos, baseada nas teorias econômicas a respeito do
comportamento humano (RIBEIRO, 2016, p. 21).
A investigação da AED se divide em duas frentes. Para
Gico Júnior (2016, p. 20-21) a AED positiva auxiliará a
compreensão do que é a norma jurídica, qual a sua racio-
nalidade e as diferentes consequências prováveis decor-
rentes da adoção dessa ou daquela regra, enquanto a AED
normativa auxiliará a escolher entre as alternativas possí-
veis a mais eficiente, isto é, o melhor arranjo institucional
dado um valor (vetor normativo) previamente definido.
O paradigma predominante na teoria econômica que
trata da ciência das escolhas advém das teorias econômi-
cas clássicas, que pressupõem a racionalidade ilimitada do
comportamento das pessoas e a busca pela maximização
da utilidade. O sujeito racional busca sempre a melhor
alternativa dentre as opções a ele apresentadas. Toma de-
cisões com base nas informações disponíveis e escolhe a
opção que vai melhor servi-lo. Para a economia clássica,
as atividades de corrupção – trocas de favores, extorsão,

265
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

lavagem de dinheiro, evasão fiscal, fraude eleitoral, ne-


potismo, subornos – são consideradas manifestações de
comportamentos de indivíduos racionais, maximizadores
de seus próprios interesses, que respondem aos incentivos
oferecidos pela matriz de instituições políticas e econômi-
cas. Sendo assim, o sucesso dos programas anticorrupção
dependeria apenas da mudança nos benefícios e custos da
conduta corrupta.
O indivíduo racional, ao se deparar com mais de uma
conduta possível, leva em consideração a relação custo
-benefício entre as escolhas possíveis, de modo a optar
pela que possui maiores incentivos, atendendo, conse-
quentemente, melhor aos seus interesses. Jeremy Bentham
entende que o indivíduo atingiria a felicidade ao obter o
que lhe seria útil, afastando-se da dor e o aproximando o
mais possível do prazer (FARACO; SANTOS, 2003, p. 32).
Cabe ressaltar que o pressuposto econômico da racio-
nalidade se refere ao agir de maneira racional, de acordo
com as conclusões pessoais que proporcionem maior uti-
lidade (utilitarismo), não que os agentes sejam “racionais”,
mas simplesmente que estes escolhem o que seria mais
lógico e aparentemente mais vantajoso de acordo com
suas percepções. Ainda, a escolha racional depende das
informações que o agente possui de cada alternativa e a
valoração que é atribuída a cada uma de suas utilidades.
Tem-se que as escolhas humanas são dependentes das
preferências individuais e das características de motivação
humana de cada alternativa (SEN, 1995, s.p).
Já para a Economia Institucional, a racionalidade do
comportamento humano e suas escolhas são influenciadas
pelas instituições. Em linhas gerais, as instituições repre-
sentam as “regras do jogo em uma sociedade” e estabe-

266
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

lecem um complexo de ações possíveis, que devem ser


consideradas como parte de um sistema. Douglass North
(2018, p. 13) classifica as instituições em formais e infor-
mais, sendo que ambas restringem a atuação dos indi-
víduos e entes sociais. Os seres humanos desenvolvem
instituições, compostas de restrições informais, em grande
parte determinadas pela cultura da sociedade, e normas
formais, que dizem respeito, entre outras, à definição dos
direitos de propriedade que amenizam a incerteza dos in-
vestimentos produtivos.
A partir delas, os agentes econômicos enxergam o am-
biente no qual suas ações serão realizadas, podendo an-
tever, em maior ou menor medida, os resultados e as res-
pectivas consequências. Para o autor, o principal papel
das instituições em uma sociedade é reduzir a incerteza,
ao estabelecer uma estrutura estável para interação huma-
na, no entanto, North destaca que não necessariamente a
instituição será eficiente (NORTH, 2018, p. 50).
De acordo com o pressuposto comportamental baseado
estritamente pela maximização da riqueza, uma parte da
troca irá trapacear, roubar ou mentir quando a recompen-
sa a tais procedimentos exceder o valor das oportunidades
alternativas de que dispõe.
Para a teoria institucionalista, as atividades de corrup-
ção são consideradas manifestações de comportamen-
tos de indivíduos limitadamente racionais, em busca da
maximização da riqueza, em grande parte determinadas
pela cultura da sociedade (restrições informais) e em res-
posta aos incentivos oferecidos pela matriz institucional
(restrições formais). Sendo assim, o sucesso dos progra-
mas anticorrupção dependeria da mudança da cultura de
aprendizagem da sociedade e do quadro institucional que

267
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

deveria desestimular a corrupção e aumentar os custos e


consequên­cias da conduta corrupta.
Nesse contexto, a perfeição do sistema teórico, no en-
tanto, pode ser rompida por uma série de fatores, ten-
do em vista que a racionalidade ilimitada e a maximiza-
ção das escolhas, muitas vezes, não são verificadas nas
decisões que tomamos no mundo real (RIBEIRO, 2016,
p.78-79). Os indivíduos possuem racionalidade limitada e
comportamento oportunista, acarretando o surgimento de
custos de transação, que poderiam ser minimizados pela
cooperação das partes contratantes no momento da exe-
cução do objeto contratual. Também a assimetria informa-
cional se junta ao oportunismo dos agentes para restringir
a elaboração de contratos completos, causando custos de
transação. Tais custos associam-se a coletas de informa-
ções, à elaboração e negociação dos contratos, além dos
custos pós-contratuais, decorrentes da inexecução das
obrigações. (CATEB; GALLO, 2010, p.3)
No caso da corrupção, a preocupação gira torno do fato
de que a sociabilidade humana pode acompanhar padrões
de cooperação perversa, tais como privilégios financeiros
dirigidos a grupos de interesse em detrimento de toda a
população. Em alguns casos, a corrupção parece ser uma
crença compartilhada de que usar o serviço público para
beneficiar-se ou ajudar a família e amigos é tolerável, dese-
jável e previsível. Para complicar, algumas sociedades pre-
miam mapas mentais capazes de justificar privilégios exclu-
sivos a amigos e familiares (BANCO MUNDIAL, 2015, s.p).
Para Pinheiro (2010, p. 9), o oportunismo “deve ser
definido como uma forma forte de busca do interesse pró-
prio, que pode passar por práticas desonestas, incluindo
mentir, trapacear e roubar”.

268
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Para fins do presente artigo, utiliza-se o conceito de que


o agente oportunista é aquele que orienta a sua conduta
principalmente com objetivo de maximizar seus interesses,
ignorando, por vezes, questões sociais, contratuais e até
mesmo a moral e a ética. Dentro do contexto institucional
de Douglass North, tem-se que o indivíduo econômico
não se sente tolhido por nenhuma norma – seja ela formal
ou informal.

CAPÍTULO 2. A LEI Nº 12.846/2013 E O


ACORDO DE LENIÊNCIA
O Brasil, atendendo a compromissos internacionais
anteriormente assumidos, aprovou a Lei nº 12.846/2013,
denominada Lei Anticorrupção, que passou a integrar as
instituições anticorrupção brasileiras. Ela foi inspirada em
outras normas internacionais bastante rígidas, como o Fo-
reign Corrupt Practices Act (“FCPA”) dos Estados Unidos, e
o UK Bribery Act, do Reino Unido. Essas referências foram
utilizadas considerando a necessidade de se obter meios
fiscalizadores que mantivesse a conformidade com os pa-
drões estrangeiros.
A grande inovação da Lei Anticorrupção foi a possibili-
dade de sancionar, administrativa e civilmente, as pessoas
jurídicas por atos lesivos à administração pública. Até en-
tão, os atos de corrupção e fraude à licitação acarretavam
punição apenas às pessoas físicas envolvidas (administra-
dores, empregados, agentes públicos e outros).
Já em seu artigo 1º, a norma legal assinala explicitamen-
te o propósito de atribuir à pessoa jurídica a responsabili-
zação objetiva pelos atos lesivos nela previstos (artigo 2º).
Constatado o dano à administração pública e a vinculação
deste dano a uma ação (ou omissão) de qualquer pessoa

269
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

que tenha se revertido em interesse ou benefício da pes-


soa jurídica, a empresa poderá ser responsabilizada ad-
ministrativa ou civilmente, sem que isso exclua a respon-
sabilidade individual de seus dirigentes, administradores
e empregados, que poderão ser responsabilizados pelos
atos ilícitos na medida da sua culpabilidade.
Os atos lesivos passíveis de responsabilização estão
previstos em rol taxativo no artigo 5º da referida norma
legal. Nesse rol, a lei deu especial destaque aos atos rela-
cionados a licitações e contratos administrativos.
No tocante a responsabilidade administrativa, as multas
previstas na lei vão de 0,1% (um décimo por cento) até
20% (vinte por cento) do faturamento bruto da empresa,
havendo a possibilidade da aplicação, isolada ou cumula-
tiva, da publicação extraordinária da decisão condenatória
(artigo 6º, inciso II). A instauração e julgamento do proces-
so administrativo para a apuração da responsabilidade da
pessoa jurídica cabem à autoridade máxima de cada órgão
ou entidade dos Poderes Executivo, Legislativo e Judici-
ário e será conduzido por uma comissão do ente públi-
co lesado que encaminhará o relatório final à autoridade
competente para o julgamento (artigo 8º). A Controladoria
Geral da União - CGU pode agir de forma a complemen-
tar a atuação ou mesmo suprir a ausência de atuação dos
órgãos do Poder Executivo Federal. A comissão deverá
dar conhecimento ao Ministério Público acerca da existên-
cia do processo administrativo para apuração de eventuais
delitos (artigo15).
Quanto a responsabilização civil, a lei prevê uma série
de medidas punitivas, cuja aplicação depende da condu-
ção de processo judicial e de prolação de sentença conde-
natória civil. As sanções abrangem: a reparação do dano;

270
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

o perdimento de bens e valores; a suspensão de atividades


econômicas; a dissolução da pessoa jurídica; a proibição
de incentivos, doações, empréstimos públicos, etc. (artigo
19). Nesse caso, o ajuizamento da ação judicial para apli-
cação das referidas penas cabe às Advocacias Públicas ou
órgãos de representação judicial da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios e ao Ministério Público.
Os programas de integridade também são novidade
para a execução e supervisão das políticas públicas de
combate a corrupção trazidos pela Lei nº 12.846/2013, de
forma que a “implantação de uma política de Compliance
é essencial para empresas que prezam pela eficiência e
buscam perenizar e aumentar os seus lucros, pois a trans-
parência, a ética e a confiança são condições legais, e não
apenas itens de ostentação” (RIBEIRO; DINIZ, 2015, p.102)
A Lei nº 12.846/13 trouxe, por fim, duas modalidades
de acordo de leniência como estímulo às empresas in-
fratoras a abandonar a conduta ilícita e colaborar com as
autoridades, de modo que possam obter os benefícios e
mitigar a incidência das sanções previstas na lei. São elas:
a leniência para atos de corrupção (artigo 16) e a leniência
para infrações licitatórias (artigo 17), ambas direcionadas
às pessoas jurídicas.
Especificamente em relação aos acordos de leniência,
tema do estudo, a lei colocou à disposição da pessoa jurí-
dica, que confesse um ato de corrupção punível pelo Esta-
do com base na Lei Anticorrupção e cesse completamente
seu envolvimento com a prática investigada, a adoção do
acordo ao prever benefícios caso ela decida colaborar com
as investigações.
Assim, a celebração da leniência exige que a pessoa
jurídica seja a primeira a manifestar interesse em coo-

271
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

perar para a apuração do ato ilícito e efetivamente reú-


na informações que possibilitem o célere esclarecimento
dos fatos e a identificação dos envolvidos. Para Di Pietro
(2018, p. 217) o acordo precisa ser proposto num mo-
mento em que a cooperação do infrator se comprove útil
à execução das tarefas investigatórias e probatórias do
Estado - requisito que não consta do artigo16, §1º, mas
sim da lógica do acordo.
Cumpridos os requisitos legais e regulamentares e cele-
brado o acordo de leniência, suas consequências serão a
divulgação do acordo ao público, salvo nas situações em
que a publicidade possa prejudicar as investigações ou
a condução do processo sancionador e a interrupção do
prazo prescricional para punição dos atos ilícitos tratados
na Lei Anticorrupção.
O cumprimento do acordo por parte do infrator co-
laborador lhe trará dois benefícios administrativos e um
civil: (i) a imunidade à publicação extraordinária da de-
cisão condenatória (artigo 6º, II); (ii) a redução em até ⅔
(dois terços) da multa administrativa; e (iii) em relação às
possíveis punições civis, a dispensa à sanção de proibição
de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou
empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de ins-
tituições financeiras públicas ou controladas pelo poder
público (artigo 19, IV).
Em caso de descumprimento do acordo, este deve-
rá ser anotado no Cadastro Nacional de Empresas Puni-
das (“CNEP”) e impedirá a pessoa jurídica que celebrou
o acordo, mas o descumpriu, de celebrar nova leniência
pelo prazo de 3 (três) anos contados do conhecimento,
pela Administração Pública, do descumprimento (artigo 22
e §§ 4º e 8º).

272
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

A previsão legal dos acordos de leniência revela um


aspecto do Direito Administrativo Consensual, onde os
investigados reconhecem os ilícitos praticados, auxilian-
do na apuração dos fatos, obtendo, por outro lado, penas
atenuadas. O Estado, por sua vez, além de comprovação
dos ilícitos, alcança a cessação das práticas ilegais e a
reparação dos danos, evitando, assim, longas e custo-
sas discussões administrativas e/ou judiciais (BLANCHET,
2018, p. 283).
O que se verifica aqui é semelhante ao dilema dos pri-
sioneiros na teoria dos jogos69, pois é oferecido um bene-
fício a um dos agentes para que ele colabore com a in-
vestigação, no intuito de forçá-lo a maximizar seu próprio
interesse, notadamente uma redução de punição ou, ao
menos, o cumprimento da pena em liberdade, a depender
do caso e das circunstâncias presentes.
Essa solução consensual prevista na lei estimula os
agentes das empresas envolvidas em atos de corrupção a
entregarem as demais empresas e o modo como operam,
contribuindo para a investigação a partir de informações
de quem, de fato, conhecia o esquema internamente. Nes-
se dilema do acordo de leniência a opção com menor
risco de punição, ou seja, o melhor payoff, é colaborar,
mesmo que os outros agentes não o façam. Será, portanto,
sempre a opção de menor risco, a estratégia dominante
em outras palavras.

69 O Dilema dos Prisioneiros consiste em um jogo não cooperativo no qual os players não possuem
informações completas sobre o comportamento do outro agente (GALESKI JUNIOR; RIBEIRO,
2009, p. 111). Por sua vez, a Teoria dos Jogos tem por objetivo estudar os conflitos e as coopera-
ções entre os jogadores, analisando as tomadas de decisões em que um ou vários agentes fazem
escolhas que afetam, potencial ou efetivamente, a conduta de outros agentes. A utilização deste
método para compreensão da tomada de decisão possui como objetivos principais auxiliar no
entendimento teórico no processo de decisão dos agentes que interagem, a partir de abstrações e
pressupondo a racionalidade dos jogadores, e desenvolver a capacidade de racionalizar estrategi-
camente nos agentes (BECUE, 2011, p. 112).

273
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

A leniência corre por conta e risco do colaborador, que


assume os custos da cooperação e os riscos de outras puni-
ções derivadas da confissão e da cooperação probatória em
busca dos benefícios oferecidos advindos da cooperação. A
lei se apresenta, nesse ponto, como um instrumento de po-
lítica pública que estabelece punições e recompensas para
os agentes, mediante a construção de uma cultura utilitarista
de cooperação, diálogo ou consensualismo no âmbito de
poder sancionador estatal (DI PIETRO, 2018, p. 188).
O fundamento racional dessa tática de prevenção e com-
bate à corrupção é tornar mais atraente para os agentes o
fato de serem produtivos – e combaterem a corrupção – e
menos atraente engajarem-se em comportamento ilícito.
Assim, a racionalidade do acordo de leniência está rela-
cionada à compreensão de que todos os agentes são racio-
nais e agem movidos a maximizar seu interesse individu-
al, definido em termos de cálculo de custos e benefícios,
de forma que “a leniência funciona como um estímulo à
empresa infratora para abandonar a conduta ilícita e co-
laborar com as autoridades, de modo que possa obter os
benefícios e mitigar a incidência das sanções previstas em
lei” (TOJAL, 2019, s.p).

CAPÍTULO 3. ANÁLISE CRÍTICA DA EFETIVIDADE DO


ACORDO DE LENIÊNCIA DA LEI ANTICORRUPÇÃO
O acordo de leniência surgiu no Brasil na Lei nº
10.149/2000, com o objetivo de fortalecer a atividade de
repressão de infrações à ordem econômica no âmbito do
CADE, assumindo uma feição híbrida, destinada ao afas-
tamento de sanções penais e administrativas àqueles que
colaborarem com o Conselho. Com a entrada em vigor da
nova Lei nº 12.529/2011 foi instituído o atual Programa de

274
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Leniência do CADE, com um capítulo exclusivo na lei, cujos


direitos e garantias estão previstos em seus artigos 86 e 87.
Devido ao ambiente concorrencial ser controlado, con-
duzido por uma instituição que detém a especialidade de
atuação em relação ao tema, segundo Tojal (2019, s.p) “o
instituto da leniência antitruste desenvolveu-se rapidamen-
te e logo se tornou o pilar da Política Nacional de Proteção
da Ordem Econômica no Brasil ante a sua capacidade de
atuar de forma preventiva e reativa às práticas de cartel”.
Conforme dados do CADE, o primeiro Acordo de Leni-
ência do país foi assinado em 2003, e, desde então, mais
de 50 Acordos de Leniência já foram assinados pela auto-
ridade antitruste brasileira70.
Posteriormente, os institutos de resolução consensu-
al de conflito passaram a ter maior destaque nas novas
propostas de tutela dos ilícitos cometidos contra a Ad-
ministração Pública, surgindo os acordos de colaboração
premiada destinados às pessoas físicas (no âmbito penal),
disciplinados pela Lei nº 12.850/2013 (Lei das Organiza-
ções Criminosas), e os acordos de leniência às pessoas
jurídicas (no âmbito administrativo e civil), estabelecidos
pela Lei nº 12.846/2013.
Após 6 anos de vigência da Lei Anticorrupção, o balan-
ço da aplicação do instituto da leniência da Lei Anticorrup-
ção até novembro de 2019, é de que a Controladoria-Geral
da União - CGU, em conjunto com a Advocacia-Geral da
União (AGU), assinaram apenas 11 (onze) acordos de le-
niência com empresas investigadas pela prática dos atos
lesivos previstos na Lei Anticorrupção e dos ilícitos admi-
nistrativos previstos na Lei de Licitações. Os valores a se-
rem ressarcidos envolvem os pagamentos de multa, dano
70 Informações extraídas do site oficial do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE.

275
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

e enriquecimento ilícito. O retorno de recursos aos cofres


públicos atingiu a marca de R$ 13,58 bilhões. Além dos 11
acordos já assinados, outros 22 acordos de leniência estão
em andamento na CGU e AGU71.
O Ministério Público Federal, por sua vez, indica que
até dezembro de 2017 havia firmado 18 acordos de leni-
ência com empresas investigadas em casos de corrupção,
envolvendo valores que chegam a R$ 24 bilhões. Ainda
que somados os acordos firmados pela AGU, CGU e MPF,
o número ainda é pequeno em comparação com os acor-
dos realizados no âmbito do CADE72.
O mérito da Lei Anticorrupção foi exigir que as pessoas
jurídicas se relacionem com o Poder Público de modo reto
e ético, na amplitude e limitações por ela fixadas, o que
foi realizado por meio de uma estrutura de incentivos que
acabou por estimular, inegavelmente, a adoção de políti-
cas de integridade nas pessoas jurídicas.
No entanto, alguns de seus dispositivos apresentam fa-
lhas que acabam por prejudicar a sua eficiência, especial-
mente quando se fala dos acordos de leniência.
Uma das críticas é com relação ao caso do artigo 16, que
preconiza que: “a autoridade máxima de cada órgão ou
entidade pública poderá celebrar acordo de leniência com
as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos pre-
vistos nesta Lei que colaborem efetivamente com as inves-
tigações e o processo administrativo” (BRASIL, 2013). Nesse
ponto, há ausência de extensão do acordo de leniên­cia às
pessoas físicas, uma vez que o artigo 16 restringe o acor-
do às pessoas jurídicas. Sem a possibilidade de obterem os
benefícios de uma leniência, os administradores ou pro-

71 Informações extraídas do site oficial da Controladoria-Geral da União - CGU.


72 Informações extraídas do site oficial do Ministério Público Federal.

276
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

prietários dificilmente irão impulsionar a pessoa jurídica a


colaborar com o Estado (DI PIETRO, 2018, p. 191).
Ainda no artigo 16, a lei estabelece que a competência
para celebração do acordo com as pessoas jurídicas res-
ponsáveis pela prática dos atos lesivos é da “autoridade
máxima de cada órgão ou entidade pública”. Diante da
multiplicidade de órgãos ou entidades dos Poderes Exe-
cutivo, Legislativo e Judiciário, CGU e Ministério Público,
pode-se dizer que o dispositivo não proporciona seguran-
ça jurídica em relação a competência para a celebração
do acordo. Não esclarece a competência, nem define com
clareza a quais órgão se refere.
Outra falha que vem sendo apontada está relacionada
a amplitude do acordo de leniência. A incidência das san-
ções civis elencadas no artigo 19 da lei pressupõe processo
judicial o que, segundo Di Pietro (2018, p. 194), mitiga os
poderes punitivos da Administração e explica os tímidos
benefícios derivados do acordo de leniência celebrado no
âmbito do processo administrativo punitivo. Além disso, “a
ausência do processo administrativo não impede a conde-
nação judicial, nem que para superar a omissão da Adminis-
tração, o juiz imponha às pessoas jurídicas condenadas as
sanções administrativas” (DI PIETRO, 2018, p. 194).
Além disso, o texto da Lei Anticorrupção é lacunoso em
relação aos efeitos do descumprimento do acordo de leni-
ência. Nem a lei, tampouco a Portaria CGU nº 2.278 definem
o que se entende por inadimplemento, não diferenciam o
descumprimento de obrigações principais de acessórias,
nem tratam de sanções contratuais e da possibilidade de
extinção do acordo antes da finalização do processo.
Por fim, existe a falta de normas de cooperação insti-
tucional que garantam maior previsibilidade em relação

277
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

aos efeitos do acordo e reduzam a insegurança jurídica do


colaborador, sobretudo diante de eventuais investidas do
Ministério Público em outras esferas, especialmente penal.
Essas falhas demonstram a necessidade de maior previ-
sibilidade dos programas de leniência para que eles criem
os incentivos desejados, pois os agentes devem ser ca-
pazes de avaliar quão interessante é para uma empresa
participante em um ato ilícito trair seus cúmplices, cau-
sando-os prejuízo com as pesadas multas que decorrerão
da delação e, assim, eliminando de pronto a confiança de
que o grupo criminoso pode permanecer estável e obter
lucros elevados (SPAGNOLO, 2008, p. 294).
Muitas vezes, a insegurança gerada pela Lei Anticorrup-
ção leva o colaborador a formalizar delação premiada com
o Ministério Público, regida pela Lei n 12.850/2013, com o
intuito de garantir-lhe benefícios na esfera penal, deixan-
do de realizar o acordo de leniência.
Como se percebe, a evolução das práticas do acordo de
leniência aplicáveis às pessoas jurídicas desde sua implan-
tação pela Lei Anticorrupção passou por avanços. Segundo
Tojal (2019, s.p) não foram pequenas as dificuldades en-
frentadas decorrentes, principalmente, da disputa entre os
vários órgãos estatais competentes para celebrá-lo. Tam-
bém concorreu para muitas das dificuldades incor­ridas a
diversidade de pretensão que cada órgão público buscava
retirar do acordo, além da própria dificuldade de compre-
ensão pelo Poder Judiciário.
Após a edição do Decreto nº 8.420/2015, que regu-
lamentou a Lei Anticorrupção, e das Portarias CGU nº
901/2015 e 2.278/2016, bem como do amadurecimento
das instituições anticorrupção brasileiras, o acordo de le-
niência vem buscando evolução, na medida em que uma

278
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

maior atuação das instituições legitimadas a celebrá-lo tem


se verificado, fato este, por outro lado, acompanhado de
uma solidificação de uma jurisprudência que tende a ga-
rantir os efeitos jurídicos do pactuado entre o Estado e a
empresa (TOJAL, 2019, s.p).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise ora realizada das regras da Lei Anticorrupção
utilizou da racionalidade no processo de tomada de deci-
são dos agentes, sob uma perspectiva da análise econô-
mica do direito positiva, buscando auxiliar a compreensão
do que trata a norma jurídica, qual a sua racionalidade e as
diferentes consequências prováveis decorrentes da adoção
ou não daquela regra.
É notável que as formulações econômicas desempe-
nham e ainda podem desempenhar papel importantíssimo
quando associadas ao Direito, no sentido de garantir efi-
cácia de punições decorrentes dos ilícitos cometidos por
pessoas jurídicas contra a Administração Pública, por meio
de um método analítico e demonstrando quais os meca-
nismos eficientes para eliminar esse tipo de comportamen-
to pelos agentes dessas empresas. A teoria dos jogos, em
especial, é fundamental na dissuasão da corrupção, princi-
palmente no âmbito das grandes empresas que atuam com
o Poder Público.
Ao estabelecer a atenuação na aplicação das sanções
para a empresa que, além de cooperar com a administra-
ção pública na apuração das infrações (acordo de leniên-
cia), demonstrar que adota práticas de prevenção aos atos
de corrupção, como a existência de mecanismos e proce-
dimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à
denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códi-

279
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

gos de ética e de conduta (artigo 7º), a Lei Anticorrupção


estabelece uma nova racionalidade a pessoa jurídica.
Nesse tópico, merece destaque a diretriz da Lei Anti-
corrupção que pretende fazer das empresas verdadeiras
parceiras da administração pública na prevenção e no
combate à corrupção. O mérito da Lei Anticorrupção foi
exigir que as pessoas jurídicas se relacionem com o Poder
Público de modo reto e ético, na amplitude e limitações
por ela fixadas, pois são condições de mercado e não ape-
nas exigências formais.
Tal exigência se encontra estabelecida pelo mercado.
Hoje, é inimaginável que uma empresa de grande porte
atue sem a adoção dos princípios de governança e de uma
política de Compliance. Nesse ponto, a lei foi muito bem,
ampliando consideravelmente a adoção de programas de
integridade pelas pessoas jurídicas.
Contudo, existem falhas na lei que impedem o alcance
almejado, o que é demonstrado pelo número ainda peque-
no de acordos de leniência em comparação com os acordos
realizados no âmbito do CADE. Essa ineficiência do quadro
institucional pode desestimular as empresas a adotar medi-
das que levem a realização dos acordos de leniência, em
razão do aumento demasiado dos custos de transação.
O que se verifica aqui, com base no dilema dos prisionei-
ros na teoria dos jogos, é que o benefício oferecido a um dos
agentes para que ele colabore com a investigação, no intuito
de forçá-lo a maximizar seu próprio interesse, notadamente
uma redução de punição, é muito pequeno e incerto. Daí o
pequeno número de acordos efetivamente celebrados.
Em que pese a existência da Lei Anticorrupção tenha
estimulado mudanças institucionais, faz-se necessário o
amadurecimento do ambiente institucional brasileiro. A re-

280
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

dução da corrupção necessariamente passa pela evolução


das instituições formais, mas também pela alteração das
instituições informais, com a implementação de políticas
que estimulem a mudança dos costumes e da cultura e
filosofia negocial brasileira.

REFERÊNCIAS
AGUSTINHO, Eduardo Oliveira; RIBEIRO, Márcia Carla. Economia
Institucional e Nova Economia Institucional. In: RIBEIRO, Mar-
cia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é análise Econô-
mica do Direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
ARAÚJO, Marcelo; SANCHEZ, Oscar Adolfo. A corrupção e os
controles internos do estado. Lua Nova [online]. 2005, n.65,
pp.137-173. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?pi-
d=S010264452005000200006&script=sci_abstract&tlng=pt. > Acesso
em 05 de novembro de 2019.
BANCO MUNDIAL. 2015. Relatório sobre o Desenvolvimento
Mundial 2015: “Mente, Sociedade e Comportamento”. Overview
booklet. Banco Mundial, Washington, D.C.
BECUE, Sabrina Maria Fadel. Teoria dos Jogos. In: KLEIN, Vinicius;
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira (Coord.). O que é análise econômica
do direito: uma introdução. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2011.
BLANCHET, Luiz Alberto. MARIN, Tâmera Padoin Marques. A corrup-
ção como violação de direitos humanos e a necessária efetividade
da Lei nº 12.846/13. A&C – Revista de Direito Administrativo &
Constitucional, Belo Horizonte, ano 18, n. 71.
BRASIL. Lei ordinária nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. Dispõe sobre
a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela
prática de atos contra a administração pública, nacional ou estran-
geira, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília,
2 de ago. 2013. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm. Acesso em 14 dez 2019.

281
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

CAIRES, Fernanda Oliveira; CHAVES, Carlos Moisés O. Economia do


crime: uma análise econômica das variáveis que levam um
indivíduo a optar pelo crime. XII Edição da Semana de Econo-
mia da Uesb, p. 1-20, 2013.
CASCIONE, Fábio de Souza Aranha (org.). Lei anticorrupção: uma
análise interdisciplinar. São Paulo: LiberArs, 2015.
CATEB, Alexandre Bueno; GALLO, José Alberto Albeny. Breves consi-
derações sobre a teoria dos contratos incompletos. Latin American
and Caribbean Law and Economics Association (ALACDE) An-
nual Papers, UC Berkeley, 2007. Disponível em: <http://escholar-
ship.org/uc/item/1bw6c8s9>. Acesso em: 09 de dezembro de 2019.
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Direito & Economia. Trad. Luis
Marcos Sander e Francisco Araújo da Costa. 5. ed. Porto Alegre:
Bookman. 2010.
DEMATTÉ, Flávio Rezende. Responsabilização de pessoas jurídi-
cas por corrupção: A Lei nº. 12.846/2013 segundo o direito de
intervenção. Belo Horizonte: Fórum, 2015.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. MARRARA, Thiago (Coord.). Lei An-
ticorrupção comentada. 2. Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2018.
FARACO, Alexandre Diztel; SANTOS, Fernando Muniz. Análise Eco-
nômica do Direito e possibilidades aplicativas no Brasil. Revista
de Direito Público da Economia – RDPE, nº 1, jan. a mar., 2003.
GICO JR. Ivo T. Introdução à análise econômica do direito. In:
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord). O que é
análise econômica do direito: uma introdução. 2ª ed. Belo Hori-
zonte: Fórum, 2016, p.17-26.
HAYASHI, Felipe Eduardo Hideo. Corrupção: combate transnacio-
nal, compliance e investigação criminal. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2015.
HILBRECHT, Ronald O. Uma introdução à teoria dos jogos. In:
TIMM, Luciano Benetti (Org.). Direito e Economia no Brasil. São
Paulo: Atlas, 2011. p. 115-138.

282
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

NORTH, Douglass C. Instituições, mudança institucional e desem-


penho econômico. Tradução Alexandre Morales. São Paulo: Três
Estrelas, 2018.
PINHEIRO FILHO, Francisco Renato Codevilla. Teoria da agência:
problema agente-principal. In: RIBEIRO, Marcia Carla Pereira;
KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é análise econômica do direito:
uma introdução. 2.ed. Belo Horizonte: Fórum, 2016.p.109.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. DINIZ, Patrícia Dittrich Ferreira. Com-
pliance e Lei Anticorrupção nas Empresas. Revista de Informa-
ção Legislativa. Número 205 jan./mar., 2015. p. 87-105.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é aná-
lise econômica do direito: uma introdução. 2ª ed. Belo Hori-
zonte: Fórum, 2016.
SEN, Amartya. Rationality and Social Choice, American Economic
Review, American Economic Association. 1995. vol. 85(1), p. 1-24,
March.
SIMON, Herbert A. Models of man: Social and Rational. Nova Ior-
que: John Wiley & Sons, Inc., 1956, p.197 In: RIBEIRO, Marcia
Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord). O que é análise econômica
do direito: uma introdução. 2ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2016.
SPAGNOLO, Giancarlo. Optimal Leniency Programs. F.E.E.M. Nota
di Lavoro, No. 42.00. Fondazione ENI Enrico Mattei, Milano, 2000.
Disponível em: <http://ssrn.com/abstract=235092>. Acesso em: 14
dez 2019.
TOJAL, Sebastião Botto de Barros. Perspectivas para a segurança ju-
rídica dos acordos de leniência. Revista Consultor Jurídico, 5
de setembro de 2019. Disponível em: <https://www.conjur.com.
br/2019-set-05/leniencias-questao-perspectivas-seguranca-juridica
-acordos-leniencia?imprimir=1>. Acesso em: 14 dez 2019.

283
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ANÁLISE ECONÔMICA DA PENA DE MULTA


EM SEDE DE RESPONSABILIDADE PENAL
DA PESSOA JURÍDICA

Antônio Osmar Krelling Neto73 e


Paulo Henrique Costa de Abreu Coelho74

Resumo: A responsabilidade penal da pessoa jurídica é


uma realidade no ordenamento jurídico brasileiro e em di-
versos outros. Esta modalidade de tutela penal justifica-se
em razão das evidentes ofensas graves à bens jurídicos es-
senciais perpetradas por empresas hodiernamente. Sendo
o aparato penal o instrumento de controle destas condu-
tas intoleráveis justifica-se sua incidência para a proteção
de bens importantes como o meio ambiente e a ordem
econômica. Contudo as sanções penais precisam ser pen-
sadas de modo que respeitem garantias e cumpram suas
funções, sob pena de excessos ou mero simbolismo. O
presente trabalho pretende, tomando como referência o
famoso caso de punição do Banco HSBC no ano de 2012,
oferecer uma crítica a respeito da pena de multa, demons-
trando sua pouco eficiência em dissuadir e reprimir a cri-
minalidade corporativa.
Palavras-chave: Análise econômica do direito; Eficiência;
Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica; Pena de Multa.

INTRODUÇÃO
Partindo da concepção de Direito Penal e de sua missão
como a realização do controle social do intolerável, identi-
ficando-se como este intolerável o ataque grave a um bem

73 Mestrando em Direito pela PUC-PR.


74 Bacharel em Direito pela UFPR.

284
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

jurídico essencial ao desenvolvimento do indivíduo na so-


ciedade (BUSATO, 2013, p. 17), o presente artigo possui o
objetivo de, adotando posicionamento concordante com a
concepção de Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica
(RPPJ), demonstrar através da Análise Econômica do Direi-
to a ineficiência da aplicação de penas pecuniárias como
sanção criminal a entes morais a fim de fomentar o debate
em busca de opções adequadas.
Tendo em vista a RPPJ como uma necessidade para a
realização da proteção de bens jurídicos através do Direito
Penal e sua existência em diversos ordenamentos jurídi-
cos, bem como no ordenamento brasileiro (Lei de crimes
ambientais e assinatura de diplomas internacionais que
recomendam o instituto) faz-se relevante o estudo sobre
sua eficiência. É neste ponto que a Análise Econômica
do Direito se faz método adequado para análise da RPPJ
em razão principalmente do caráter financeiro do Direito
Penal em geral na figura da Política Criminal, este que tor-
na inafastável seu viés econômico e obrigatório o esforço
pela eficiência. Ademais, a natureza econômica dos agen-
tes e motivações criminosas no cenário aqui discutido faz
da AED meio de reflexão ainda mais adequado.

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO


A colaboração das ciências econômicas com conceitos de
eficiência a fim de aprofundar o estudo sobre responsabiliza-
ção penal da pessoa jurídica é o cerne do presente trabalho.
Algumas abstrações técnicas e objetivas podem apre-
sentar resultados mais claros para se averiguar os efeitos
pretendidos pelo ordenamento jurídico e oferecem, assim,
uma metodologia com categorias referenciais, trazendo
esclarecimentos e/ou informações que elucidem melhor

285
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

o contexto fático e as consequências dos efeitos jurídicos


na prática. Com efeito, os principais elementos resgatados
nesse campo interdisciplinar são valor utilidade e eficiên-
cia; utilizados de maneira dinâmica e, arrisca-se, pouco
ortodoxa dentro de conceitos clássicos de economia (RI-
BEIRO, 2009, p. 68).
Nessa linha de raciocínio, enquanto instrumento meto-
dológico, a ciência econômica pode auxiliar a equilibrar
justo privado e custo social. A questão fulcral é atribuir
aspectos avaliativos de justiça com clareza e objetividade,
sem critérios aleatórios, para, então, afastar-se de conjec-
turas motivadas por questões políticas ou filosóficas. Al-
meja-se, assim determinar o comportamento social com
base em custos ou obstáculos, e benefícios e incentivos
(GONÇALVES; STELZER, 2014, p. 264).
O custo de oportunidade irá influenciar a escolha do
agente econômico, de sorte que, sob uma perspectiva ra-
cional, ele adotará condutas que irão maximizar seus po-
tenciais ganhos, seja de bem-estar, renda ou outro critério
a ser preestabelecido para fins de metodologia. Aqui resi-
de um fator de relevância para a presente pesquisa, pois o
direito também se constrói sobre a premissa que os indi-
víduos agirão de acordo com os incentivos ou obstáculos
que a norma jurídica lhe fornecer (GICO JUNIOR, 2011
p. 22). Efetivamente, caso a hipótese de que as penas pe-
cuniárias não estão correspondendo aos seus efeitos pre-
tendidos, estamos diante de uma situação que a norma
jurídica não tem seus efeitos eficazes ou, ao menos, de
eficiência quase nula.
Assim, busca-se na análise econômica do direito a ado-
ção de critérios e ferramentas para avaliar interdisciplinar-
mente se mormente as penas pecuniárias estão não só for-

286
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

malmente balizadas pelas regras processuais e dogmáticas,


mas também pelos objetivos propostos pela sanção penal,
qual sejam, prioritariamente, a sanção efetiva que coíba e
desestimule a transgressão da norma jurídica de proteção
a bens jurídicos caros à coletividade.
Gary BECKER, considerando que os economistas ne-
gligenciavam suas atenções ao crime, olvidando que sua
atividade tem relevância econômica, buscou analisar os
custos gerados pelos delitos. Apontou-se, nesse estudo,
ainda, que o crescimento dos crimes de “colarinho bran-
co” cresceriam exponencialmente frente aos delitos tidos
por “comuns”, pois havia vantagens financeiras claras nas
transações ilegais (BECKER, 1974, p. 3).
Então, pautando-se nas ideias de BECKER, o indivíduo
realizaria a tomada de decisão no sentido de um crime
econômico de maneira racional, sem muitas distinções
de outras decisões de sua rotina, porquanto está a avaliar
custos de transação e possíveis benefícios na empreitada
delitiva. Com efeito, Pery SHIKIDA resolveu utilizar dessa
metodologia e levou à ilação conclusiva que os principais
motivos da prática do crime estão ligados a critérios indi-
viduais, visando maximizar interesses pessoais, mormente
de natureza socioeconômica e psíquica como cobiça, difi-
culdades financeiras, indução de amigos e falta de estrutu-
ra familiar (SHIKIDA, p. 2012, p. 99).
Nessa linha de ideias, ainda que com a possibilidade
de se quedar uma afirmação demasiadamente superficial,
as empresas multinacionais têm por escopo o lucro e, nos
casos das empresas com capital aberto, propiciar retor-
no aos seus investidores e acionistas. Com efeito, deve-se
compreender que a empresa, ainda que em um conceito
abstrato, em matéria proposta pela microeconomia, bus-

287
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

cará maximizar seus lucros, sem necessariamente equacio-


nar respeito aos bens jurídicos supraindividuais (CAMPOS;
ARDISSON, 2012, p. 99), como por exemplo, no caso es-
pecífico desse trabalho, a ordem econômica.
Para fins embrionários de pesquisa, optou-se por tra-
tar apenas da multa pecuniária aplicada ao Banco HSBC
no ano de 2012. Na oportunidade, a empresa concor-
dou que havia responsabilidade pelas falhas de controle
sobre os erros que permitiam a lavagem de dinheiro e
violação de sanções econômicas, pagando US$ 1,92 bi-
lhão para por termo às investigações criminais no Esta-
dos Unidos (assinatura de acordo denominado Deferred
Prosecution Agreement).
Apesar da multa, o lucro da multinacional foi de US$13.5
bilhões. Em uma conta demasiadamente simples, a multa
pecuniária representa 10% daquele valor. Ainda, dado os
impactos reputacionais negativos, estimou-se um decrés-
cimo de 17% no lucro líquido em razão dos eventos, em
comparação com o ano anterior.
Antes de aprofundar questões normativas, destaca-se
os apontamentos feitos pelos professores Daniel KAHNE-
MAN e Amos TVERSKY, quando questionam a fé exage-
rada em pequenas amostragens estatísticas, de modo que
os números, muitas vezes, apresentam apenas explicações
causais que podem enviesar os pesquisadores a certas ila-
ções e buscarem tão somente a comprovação do que ini-
cialmente encontraram (KAHNEMAN; TVERSKY, 1971, p.
105). Dentro dessa perspectiva, sem presunção de exaurir
o tema dada sua profundidade teórica e prática, o presen-
te artigo propõe-se a debater sobre a eficiência deste tipo
de medida a partir deste caso concreto com referência
dogmática sobre a norma penal.

288
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA


A RPPJ é tema controverso, sendo ponto de intenso
desacordo a própria compatibilidade da concepção com
elementos fundamentais da teoria do delito, dentre os
quais se encontram no centro das discussões a capacidade
de ação e culpabilidade. Dentre renomados doutrinadores
com posição contrária à responsabilidade penal da pessoa
jurídica, em geral movidos por uma concepção antropo-
cêntrica e finalista do Direito Penal, pode-se citar René
Ariel DOTTI (1995, p. 184) e Juarez CIRINO DOS SANTOS
(2007, p. 433).
Contudo, existem propostas de inovação da doutrina
penal que apresentam soluções para os problemas apon-
tados pela crítica. A problemática da capacidade de ação
resolve-se através da superação da sobrevalorização dada
ao conceito bem como de sua equivocada visão de viés
ontológico, logo, a partir de visões como a funcionalista
de Klaus ROXIN (1986, p. 105) ou a significativa defendida
por Paulo BUSATO (2018, p. 41), torna-se possível falar
sobre conduta penal da pessoa jurídica. Com relação à
questão da culpabilidade o modelo construtivista apresen-
ta uma boa solução na qual se concebe uma culpabilida-
de funcionalmente correspondente com a pensada para a
teoria do delito das pessoas físicas. Carlos GÓMEZ-JARA
DÍEZ (2015, p. 38), apresenta como sendo os três equiva-
lentes funcionais deste modelo de culpabilidade empresa-
rial a) a não institucionalização de uma cultura de fidelida-
de ao direito, o qual caracteriza o descumprimento do pa-
pel de cidadão corporativo fiel ao Direito; b) a liberdade
de organização, a qual constituí a responsabilidade pelos
resultados negativos desta liberdade e c) reforçando-se o
status de cidadania da empresa, a capacidade de interven-

289
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ção em assuntos públicos exercido através do direito de


liberdade de expressão.
Para além de ser possível adequação dogmática à RPPJ,
a concepção se mostra verdadeiramente necessária no pa-
norama hodierno de criminalidade para a proteção dos
bens jurídicos essenciais contra os ataques mais graves.
A doutrina criminológica reconhece que as lesões a bens
jurídicos transindividuais, tais como o sistema financeiro e
o ambiente são perpetradas principalmente por empresas
(BUSATO; GUARAGNI, 2012, p. 21). Outrossim, a com-
plexidade das estruturas empresariais dificulta em muito
a tutela penal pautada somente na imputação de pessoas
físicas. Bernd SCHÜNEMANN (1988, p. 530) indica duas
principais razões neste viés para justificar a criminalização
de pessoas jurídicas: a) a dificuldade de demonstração pro-
batória da responsabilidade individual e da culpabilidade;
e b) a possibilidade de adoção de uma autoindulgência
a respeito da culpabilidade, permitida pela característica
hierárquica e fragmentada das atividades empresariais.
BUSATO, por sua vez, aponta a irrazoabilidade da não
responsabilização criminal da pessoa jurídica, isto caracte-
rizando situação de um sujeito de plenos direitos e isento
de deveres com relação a condutas de agressão intolerável
a bens jurídicos essenciais (BUSATO; GUARAGNI, 2012, p.
22). Finalmente, a RPPJ é realidade fática no ordenamento
jurídico brasileiro dada a própria Lei de Crimes Ambientais
e a adesão de diversos diplomas internacionais que suge-
rem a responsabilidade penal da pessoa jurídica.

FINALIDADES DA PENA
A discussão a respeito da responsabilidade penal da
pessoa jurídica encontra-se intimamente ligada com o

290
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

tema das finalidades da pena, vez que a aplicação de san-


ção criminal é a principal consequência da adjudicação de
responsabilidade. Por esta razão, neste trabalho utiliza-se
a noção de finalidade da pena como critério para a expo-
sição da baixa eficiência da sanção pecuniária.
Assim como os demais elementos das ciências criminais
supracitados, a questão da finalidade da pena necessita
de sua devida tradução para a responsabilidade penal das
pessoas jurídicas, diante disto, cuida-se de primeiramente
de sintetizar tal concepção.
A princípio firmou-se um conceito unitário da função
da pena como prevenção identificado pela noção de dis-
suasão, tendo este entendimento sido influenciado inclusi-
ve pela própria Análise Econômica do Direito, a qual inter-
preta a pena como um ônus a ser calculado pelo potencial
infrator de modo que eleva o custo do crime diminuindo
sua ocorrência (SALVADOR NETTO, 2018, p. 231). Nos
dizeres de Richard POSNER (2007, p. 219), “uma pessoa
comete um delito porque os benefícios esperados supe-
ram os custos esperados”. Ocorre que esta concepção
isoladamente tende a gerar excessos na incidência do ius
puniendi tendo em vista que despreza a consideração de
um grau de proporcionalidade entre a infração concreta
e a potência da sanção. Por este motivo resgatou-se fun-
damentos das concepções retributivas em busca da ade-
quação com o paradigma do castigo justo, raciocínio que
também contribuiu para o debate acerca da configuração
de uma adequada culpabilidade empresarial.
Por fim, tem-se como definição das finalidades da pena
para a pessoa jurídica que, visando prevenção e a retri-
buição, puna-se nos limites de sua desconformidade com
o Direito, bem como pelo grau de agressividade ao bem

291
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

jurídico lesado. Ao mesmo tempo serve a punição como


desmotivação à prática da conduta e reafirmação dos limi-
tes de risco aceito (SALVADOR NETTO, 2018, p. 239).

ANÁLISE ECONÔMICA DAS PENAS PECUNIÁRIAS


Certamente a multa figura como a pena das pessoas
jurídicas por excelência, podendo-se afirmar sem muita
dúvida que esta se equipara à pena de privação de li-
berdade, base da punição das pessoas naturais. Contudo,
assim como a pena de prisão apresentou suas controvér-
sias ao longo do tempo e atualmente tem sua eficiência
questionada (BITENCOURT, 2004, p. 155), igual crítica é
adequada à pena de multa no âmbito dos entes morais.
A literatura acadêmica norte-americana, já a bom tem-
po, bem como em trabalhos mais recentes acusa a não
eficiência das penas de multa para a dissuasão dos crimes
empresariais, seja por modelos mal planejados de dosi-
metria (BRYAN, 1982, p. 582) ou pela evidência empírica
do aumento desta criminalidade (DISKANT, 2008, p. 128).
A título de exemplo, nos últimos 20 meses do governo
Obama, entre 2015 e 2017, aplicou-se $14.15 bilhões em
sanções criminais a 105 empresas (GARRET, 2019).
Conforme supracitado, na década atual as multas tam-
bém atingiram vultuosos recordes, destacando-se o caso,
referência para este trabalho, de lavagem de dinheiro e
violação de sanções econômicas do Banco HSBC, no qual
se aplicou multa de $1.9 bilhões. Contudo, o impacto re-
tributivo representa apenas uma desaceleração na corrida
por performance disputada entre as grandes corporações,
tendo em vista o lucro do Banco HSBC no ano de 2012
somar o montante de $ 13.5 bilhões. Individualmente o
efeito retributivo dos valores pagos é exíguo.

292
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

O Banco HSBC ainda reiterou no ano de 2013 em vio-


lação de sanções econômicas após a aplicação da multa
recorde supracitada, além da ocorrência de caso de fraude
no ano de 2018. Portanto, o efeito de dissuasão igualmen-
te mostra-se ameno.
A sanção em tela contribuí também, por um outro lado,
para a inadequação da pena ao princípio da proporciona-
lidade, anteriormente citada, vez que sua liquidez pode vir
a ser influenciador de práticas excessivas e desarmoniosas
com a gravidade do fato. Destaca-se, portanto, que a crí-
tica aqui feita sobre a baixa eficiência das multas não diz
respeito simplesmente ao seu impacto no agente crimino-
so e seus montantes, mas sim ao seu papel como sanção
adequada em todos os aspectos necessários para tal. É de
todo modo importante que a multa não atinja um patamar
extremamente oneroso que venha a impossibilitar a ativi-
dade econômica, a depender do caso concreto.
Ocorre ainda que tais penalidades financeiras, via de re-
gra, ou ocorrem nas searas cível e administrativa, ou quan-
do são levados à justiça criminal resolvem-se em acordos
de não persecução, logo o poder investigativo e punitivo
do estado – sua mais potente ferramenta de controle das
ofensas mais graves aos bens jurídicos mais importantes
– sequer chega a incidir completamente (HANLON; JACK-
SON; LEWIS; O’REILLY, 2009).
Conclui-se, através da análise do presente caso, que a
pena de multa se mostra pouco eficiente em cumprir com as
finalidades pretendidas ao aplicá-la. A reiteração criminosa
específica, além do histórico de violações da instituição fi-
nanceira, demonstra a falha em dissuadir o cometimento de
delitos. Por sua vez, o valor sancionatório se mostra brando
quando comparado com o lucro obtido pelo Banco HSBC

293
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

no ano de 2012, não constituindo repressão suficientemen-


te grave. Finalmente, é possível concluir pela ineficiência
da pena de multa por meio das ideias de BECKER (1968):
In casu o risco materializado da sansão pecuniária não su-
peram os ganhos da atividade criminosa, logo a escolha ra-
cional por esta ocorre pois ela é benéfica economicamente.

CONCLUSÃO
O presente trabalho teve por objetivo, com o auxílio da
metodologia propiciada pela Análise Econômica do Direi-
to, verificar a eficiência das penas pecuniárias em sede de
responsabilidade penal da pessoa jurídica.
Com base no exemplo apresentado, conclui-se, portan-
to que, a pena pecuniária se mostrou pouco eficiente para
realizar os fins da pena no cenário da responsabilidade pe-
nal da pessoa jurídica. O histórico de violações do Banco
HSBC, bem como sua reiteração após aplicação de multa
recorde demonstram a falha na finalidade de dissuadir; do
mesmo modo que a exiguidade do impacto nos negócios
os quais ainda se mantiveram extremamente lucrativos,
demonstra falha na finalidade de repressão.
Dentro de uma perspectiva técnica, deve-se aprofun-
dar os estudos para que seja possível eventualmente uma
sugestão de quais os parâmetros têm de serem seguidos
a fim de culminar em uma pena eficiente. Com efeito, a
finalidade do artigo é provocar a reflexão para consolidar
a necessidade de aprimorar e consolidar a dogmática no
sentido da responsabilização penal da pessoa jurídica, ex-
pondo a pouca eficiência das penas pecuniárias e, deste
modo abrir espaço para discussões a respeito de penas
alternativas, como restrição dos negócios ou obrigação de
implementação de programas de compliance.

294
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

REFERÊNCIAS
BECKER, Gary S. Crime and Punishment: An Economic Approach.
Essays in the Economics of Crime and Punishment. NBER,
1974, Disponível em: < https://www.nber.org/chapters/c3625.pdf
>. Acesso em 09 dez de 2019.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Falência da Pena de Prisão: causas e
alternativas. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
BRASIL. Decreto nº 5.105 de 12 de março de 2004. Promulga a
Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Trans-
nacional Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2004-2006/2004/decreto/d5015.htm >. Acesso em 10 dez 2018.
BRASIL. Decreto nº 5.687 de 31 de janeiro de 2004. Promulga a
Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, adotada pela
Assembléia-Geral das Nações Unidas em 31 de outubro de 2003
e assinada pelo Brasil em 9 de dezembro de 2003. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/
Decreto/D5687.htm>. Acesso em 10 dez 2018.
BRYAN. John T. The Economic Inefficiency of Corporate Criminal Liabi-
lity. Journal of Criminal Law and Criminology. Vol 73. 1982. Dis-
ponível em:< https://scholarlycommons.law.northwestern.edu/cgi/
viewcontent.cgi?article=6306&context=jclc>. Acesso em 10 dez 2019.
BUSATO, Paulo César. Direito Penal: parte geral. São Paulo: Atlas, 2013.
BUSATO, Paulo César. Direito penal e ação significativa: uma análise
da função negativa do conceito de ação em direito penal a partir
da filosofia da linguagem. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
BUSATO, Paulo César, GUARAGNI, Fábio André. Responsabilidade
penal da pessoa jurídica: fundamentos criminológicos, supera-
ção de obstáculos dogmáticos e requisitos legais do interesse e
benefício do ente coletivo para a responsabilização criminal. Curi-
tiba: Juruá, 2012.
CAMPOS, Adriana; ARDISSON, Daniel Piovanelli. Por uma Nova Con-
cepção de Empresa no Marco da Sociedade do Risco: do lucro
inconsequente à responsabilidade socioambiental. Seqüência: Es-
tudos Jurídicos e Políticos, Florianópolis, p. 85-104, jul. 2012.

295
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/sequencia/


article/view/23412>. Acesso em: 06 dez 2019.
DISKANT. Edward B. Comparative Corporate Criminal Liability: Explo-
ring the Uniquely American Doctrine Through Comparative Crimi-
nal Procedure. Yale Law Journal. Vol 118. 2008.
GARRET, Brandon L. Declinig Corporate Prosecutions. American Cri-
minal Law Review, Forthcoming; Duke Law School Public Law &
Legal Theory Series no. 2019-25.
GONÇALVES, Everton das Neves; STELZER, Joana. Princípio da Efi-
ciência Econômico-Social no Direito Brasileiro: a tomada de de-
cisão normativo-judicial. Seqüência: Estudos Jurídicos e Políti-
cos, Florianópolis, v. 35, n. 68, p. 261-290, jun. 2014. Disponível
em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/sequencia/article/view/
2177-7055.2013v35n68p261>. Acesso em: 06 dez 2019.
GÓMEZ-JARA DÍEZ, Carlos. A responsabilidade penal da pessoa
jurídica: teoria do crime para pessoas jurídicas. São Paulo
Atlas, 2015.
HANLON, James Patrick. JACKSON, Steven L. LEWIS Erin, O’REILLY
James T. Punishing Corporate Crime: Legal penalties for Criminal
and Regulatory Violations – Oxford: Oxford University Press, 2009.
POSNER, Richard A. Economic analysis of law. 7. ed. New York:
Aspen Publishers, 2007.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. KLEIN, Vinicius (Coord.) O que é análise
econômica do direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. Teoria geral dos contratos: contratos
empresariais e análise econômica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
SCHÜNEMANN, Bernd. Cuestiones básicas de dogmática jurídico-pe-
nal y de política criminal acerca de la criminalidad de la empresa.
In: Anuário de Direito penal y Ciências penales. Madrid: Insti-
tuto Nacional de Estudos Jurídicos, n. 38, 1988.
TVERSKY, A.; Kahneman, Daniel. Belief in the law of small numbers.
Psychological Bulletin. 1971. vol. 76, n. 2, p. 105–110. Dispo-
nível em: <http://stats.org.uk/statistical-inference/TverskyKahne-
man1971.pdf > Acesso em: 09 dez 2019.

296
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ANÁLISE ECONÔMICA DA TEORIA DOS


JOGOS NO QUE CONCERNE A
COLABORAÇÃO PREMIADA DE “LÉO
PINHEIRO” NA OPERAÇÃO LAVA JATO.

Isabela Carolina Machado de Lima75 e


Lorena Pinto Gonçalves76

Resumo: O objetivo do estudo aqui exposto é realizar


uma análise econômica da aplicação da Teoria dos Jogos,
referente à colaboração premiada de “Léo Pinheiro” nos
autos nº 5046512-94.2016.4.04.7000/PR, de origem da 13ª
Vara Federal de Curitiba, no Estado do Paraná, que tratam
do apartamento triplex, no Edifício Salina, no Condomínio
Solaris, na cidade do Guarujá no estado de São Paulo, de
suposta propriedade do ex-Presidente da República Luiz
Inácio Lula da Silva, na investigação da Sétima fase da
Operação Lava Jato. O problema de pesquisa se dá pela
forma como a Teoria dos Jogos se relaciona com a ação
em questão, acerca da Economia e do Direito. Para tanto,
utilizou-se da metodologia jurídico-normativa para com-
preender: I. Perspectivas acerca da Teoria dos Jogos; II.
Síntese da ação do triplex de “Luiz Inácio Lula da Silva”; e
III. Análise da tomada de decisão e eficácia da aplicabili-
dade da colaboração premiada frente a decisão ora estuda.
Sendo assim, quanto a Teoria dos Jogos, esta possibili-
ta que, a partir da colaboração premiada, utilizada como
75Isabela Carolina Machado de Lima – UNIFACEAR – Centro Universitário; Graduanda em Direito.
Já estagiou no Departamento Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor do Paraná na cidade
de Curitiba e atualmente é Assistente Jurídico na Astecman Assistência Técnica e Manutenção de
Máquinas Ltda. isabelamdelima@outlook.com.
76 Lorena Pinto Gonçalves – UNIFACEAR – Centro Universitário; Graduanda em Direito. Já estagiou
nos Juizados Especiais no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná; no Ministério Público e atual-
mente está estagiando no Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. É Mediadora do CEJUSC no
Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. lorenap.gons@gmail.com.

297
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ferramenta para a prestação de informações relevantes à


Justiça, sobre um determinado crime e/ ou agente, desde
que úteis aos interesses político-criminais do Estado, au-
mentando a possibilidade de satisfação e resultados das
decisões proferidas pela mesma e de benefícios para o co-
laborador, funcione como auxílio estratégico, matemático
e essencialmente econômico para análise da equivalência
da decisão. Desta forma, a Teoria do Jogo foi aplicada na
decisão dos autos supracitados de modo que a colabora-
ção de “Léo Pinheiro” foi acolhida pela Justiça e o possi-
bilitou de ter sua pena de reclusão reduzida, bem como
regime, se tornando semiaberto e afiançável. O impacto
da prestação das informações se deu devido à possibili-
dade da obtenção de materialidade e autoria essenciais
à Justiça para a investigação quanto à aquisição e oculta-
ção do apartamento tríplex do ex-Presidente da República
Luiz Inácio Lula da Silva no Guarujá em São Paulo. Assim,
compreendendo-se a importância da colaboração pre-
miada e da Teoria dos Jogos na Operação Lava Jato,
substancialmente acerca da ação do apartamento tri-
plex, nesta ocasião estudada, visto a necessidade de
fornecer meios de incentivos para que haja a confissão
de uma determinada ação, por se tratarem de crimes con-
tra a economia pública.
Palavras-chave: Teoria dos Jogos; Colaboração Premiada;
Lava Jato; Léo Pinheiro; Luiz Inácio Lula da Silva.

INTRODUÇÃO
Na esfera penal, entende-se que, no momento em que
duas ou mais pessoas estão concorrendo sobre um ato
ilícito, cujo o qual, não se encontram informações neces-
sárias para a construção da justa causa, se torna necessário

298
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

recorrer a estratégias que objetivam a investigação e que


podem até mesmo, trazer a concretude exata dos fatos.
Para que isso ocorra se torna considerável, desde que do
entendimento da Justiça, o oferecimento da colaboração
premiada, a qual gira entorno da Teoria dos Jogos, que,
por sua vez, possibilita, através de sua resolução de con-
flitos, benefícios a economia processual e pessoal aos su-
jeitos que colaborarem com o processo e construção de
materialidade e autoria do crime.
Sucintamente, a Teoria dos Jogos compreende o auxí-
lio para os participes de um mesmo crime de compreen-
der a opção mais vantajosa para ambos frente a possibi-
lidade da colaboração premiada, bem como da Justiça,
para que se possa determinar uma sentença adequada.
Porém, em se tratando dos indivíduos, quando se visu-
aliza um determinado caso em que houve a cooperação
premiada, onde, verifica-se a utilização unilateral, ocorre
o desiquilíbrio de penas.
Sendo assim, o presente artigo possui como intuito a
análise do panorama jurídico acerca da investigação da
Lava Jato frente à ação da aquisição e ocultação do apar-
tamento triplex, no Edifício Salina, no Condomínio Solaris,
na cidade de Guarujá no estado de São Paulo, de matrí-
cula 104.801 do Registro de Imóveis. Sendo que, sobre o
imóvel se discute a suposta propriedade do ex-Presidente
da República Luiz Inácio Lula da Silva, conforme indica a
colaboração premiada de José Aldemário Pinheiro Filho,
ex-Presidente do Grupo OAS, ademais, analisar-se-á onde
será analisada como foi o comportamento da Justiça com
a prestação das informações fornecidas por “Léo Pinheiro”
e a aplicação da Teoria dos Jogos embasada na economia.
Para alcançar os objetivos, utilizou-se a metodologia ju-

299
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

rídico-normativa a partir de decisões acerca do caso da


Justiça Federal, de doutrinas que se baseiam sobre a Teo-
ria dos Jogos, artigos publicados em revistas, monografias
e trabalhos de conclusão de curso, documentos disponi-
bilizados em sites do Poder Executivo e matéria de jornal.
Para tanto, a pesquisa se dividiu em três partes. Antes
de tudo, buscou-se entender a esfera estratégica existente
na matemática, bem como, a forma como as variáveis em
jogos de mesa ou azar trazem possibilidades, chegando,
portanto, a Teoria dos Jogos sobre os fatos de direito e a
forma como os indivíduos podem se beneficiar ou sofrer
penas mais severas diante das possibilidades trazidas pela
Teoria dos Jogos. Logo após o objetivo foi compreender
como a investigação em que o ex-Presidente da República
Luiz Inácio Lula da Silva se portou diante a colaboração
premiada de “Léo Pinheiro” ao processo.
Onde, através da leitura do presente artigo o interlocu-
tor será capaz de visualizar que o problema de pesquisa
girará em torno da relação da Teoria dos Jogos com a
análise econômica do direito, sendo que, irá compreen-
der a importância da Teoria dos Jogos no ordenamento
jurídico, bem como, se a colaboração premiada, junta-
mente a Teoria dos Jogos é plenamente eficaz ou falho,
quando sua aplicabilidade no caso prático da ação do
apartamento triplex.

PERSPECTIVAS ACERCA DA TEORIA DOS JOGOS


O princípio da teoria dos jogos surgiu através de Blaise
Pascal e Pierre de Fermat, no século XVII, com a teoria
da probabilidade, capaz de definir a quantidade de chan-
ces que podem ocorrer determinados resultados. A qual
foi base para o desenvolvimento da estatística, através da

300
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

criação de um jogo de azar chamado “Pontos” de Antonie


Goumbaud, em que Pascal encontrou uma solução ade-
quada para a repartição do dinheiro apostado entre os
jogadores, fundando-se na análise de dados e estratégias
apropriadas para a obtenção de interpretações, resultados
e conclusões (ALMEIDA, 2002, p. 2).
Com isso, os chamados “jogos de mesa” e a perspectiva
acerca da estatística, passaram a ser objeto de estudo da
matemática. Ganhando força com Émile Borel, o qual ana-
lisou o poker e sua relação com o blefe e a interferência
com as possibilidades de jogadas e resultados, conforme
as possibilidades de cartas na mão e na mesa (FERGU-
SON, 2003, p. 6).
No entanto, foi diante do levantamento de informações
de Émile Borel e posteriormente de John Von Neumann,
através da extensão dos estudos apresentados por Borel,
que defendia o princípio da competição entre indivíduos,
marcando a criação da “Teoria dos Jogos” (FERGUSON,
2003, p. 1), que John Forbes Nash então trouxe o conceito
de equilíbrio, sendo seu estudo conhecido como “Equi-
líbrio de Nash”, o qual conquistou o Prêmio Nobel de
Economia no ano de 1994, adaptando o entendimento da
Teoria dos Jogos (ALMEIDA; KAJIN; VIEIRA, 2012, p. 130).
Nash através do seu conceito de equilíbrio determinou
um sistema estável perante a competição, visando às pos-
sibilidades de jogadas do oponente, para estabelecer uma
estratégia e movimentações, em regra, mais adequadas para
ambos os lados, partindo de a premissa da necessidade dos
indivíduos agirem em concordância. Se tornando assim um
fator essencial para a economia (MONSALVE, 2003, p. 6).
Com o conceito surgiu o “Dilema do Prisioneiro” de
Albert Tucker, o qual traz a reflexão figurada no sentido

301
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

jurídico para melhor entendimento da aplicação da Teoria


dos Jogos (FIDELIS; FALEIROS, 2017, p. 43).
O dilema esquematiza uma situação em que dois indi-
víduos supostamente cometeram um mesmo crime, mas a
Justiça possui apenas parte das informações, o que pos-
sibilitaria que o indivíduo A e B cumprissem apenas uma
pena mínima. Desta forma, para a Justiça obter maior en-
tendimento do crime e material mais conclusivo para pro-
ferir a sentença, esta, oferece a possibilidade da colabo-
ração premiada, onde se A se mantiver calado e B prestar
informações, ou vice-versa, aquele que colaborou seria
liberado de sua pena, enquanto a pena do que foi dela-
tado teria sua pena acrescida ao máximo, já, se ambos se
colaborassem cada um cumpriria pena intermediária e, se
mantivessem calados cumpririam a pena inicial (FIDELIS;
FALEIROS, 2017, p. 43).
Percebe-se, portanto, que a Teoria dos Jogos oferece
auxílio a colaboração premiada, vez que a cooperação
consiste, em suma, como ferramenta de investigação, atra-
vés do oferecimento de benefícios aos indivíduos partici-
pantes de um mesmo crime, a fim de obter a confissão de
suas ações e dos demais integrantes diante ao ato ilícito.
Estas informações, por sua vez, são fornecidas para o ór-
gão que está realizando a investigação, sendo que, con-
siderando a procedência dos fatos trazidos ao processo e
forma como se atingiu a sua elucidação, aquele que coo-
perou, em troca, se beneficia a partir de um prêmio, qual
seja o disponibilizado (VIEIRA, 2017, p. 19).
Diante dos fatos narrados, a teoria dos jogos é uma aná-
lise matemática sendo aplicada quando houver conflito de
interesses, a fim de verificar a melhor opção e ação a ser
tomada perante as condições e pressupostos fornecidos,

302
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

visando à satisfação dos indivíduos em relação aos resul-


tados prováveis.
Portanto, compreende-se que a Teoria dos Jogos, utili-
zando-se da exemplificação trazida entre os indivíduos A e
B no “Dilema do Prisioneiro”, acerca das possibilidades de
ações e da visualização de benefícios que podem ser obti-
dos entre uma relação conflitante, fazem com que, quando
aplicada na esfera penal, consiga atingir uma decisão judi-
cial com maior eficácia, possibilitando ainda às partes do
ato ilícito o alcance de vantagens individuais ou conjuntas,
quando houver cooperação mútua.

SÍNTESE DA AÇÃO DO TRIPLEX DE


“LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA”
José Aldemário Pinheiro Filho, popularmente conheci-
do pelo nome de “Léo Pinheiro”, ex-Presidente do Grupo
OAS, foi preso durante a Sétima fase da Operação Lava
Jato, em 14 novembro de 2014. Onde foi mantido preso
durante cinco meses e teve sua pena convertida para a
prisão em regime domiciliar. Retornando ao regime fecha-
do em 5 de setembro de 2016 por supostamente ter pago
propina a Petrobrás (CARVALHO, 2017, s.p).
Ocorre que desde o ano de 2015, se estendendo por
mais de dois anos de negociações, “Léo Pinheiro” bus-
cou acordo visando sua redução de pena em troca de sua
colaboração premiada. Até que em abril de 2017 decidiu
prestar as informações mesmo sem acordo firmado (BRA-
SIL, 2017, p. 108-118).
As informações prestadas se tornaram fundamentais
para o entendimento e posterior condenação do ex-Presi-
dente da República Luiz Inácio Lula da Silva relativamente
a aquisição e ocultamento do apartamento triplex no Gua-

303
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

rujá em São Paulo, se tornando o principal delator contra


Luiz Inácio (BRASIL, 2017, p. 108-118).
Vez que era do conhecimento da Justiça quando no
início da investigação, que no ano de 2006, para poder
se reeleger a Presidente da República, Luiz Inácio Lula da
Silva declarou ao Tribunal Superior Eleitoral, através do
nome de sua esposa, Marisa Letícia Lula da Silva, o paga-
mento de um valor de R$ 47.695,38 (quarenta e sete mil,
seiscentos e noventa e cinco reais e trinta e oito centavos)
já pagos, referente à aquisição de um apartamento triplex
no Guarujá em São Paulo de valor total do bem de R$
192.533,20 (cento e noventa mil, quinhentos e trinta e três
reais e vinte centavos). (BRASIL, 2017, p. 60).
A empreiteira responsável pela construção do aparta-
mento na época era a Bancoop, a qual passou por di-
ficuldades financeiras e transferiu através de Registro de
Imóvel firmado em cartório, no dia 08 de outubro de 2009,
a transferência da propriedade e obra para a OAS Empre-
endimentos (BRASIL, 2017, p. 52).
A construção do apartamento ficou pronta no ano de
2013 e no decorrer deste ano “Léo Pinheiro” teria realizado
diversas reformas no apartamento 164-A, as quais teriam
atingido o valor de R$ 1.104.702,00 (um milhão, cento e
quatro mil e setecentos e dois reais). “Léo Pinheiro” ainda,
em novembro de 2013, teria sido preso pela primeira vez
como medida cautelar (BRASIL, 2017, p. 61).
Não somente, em 2015, Marisa, através de seus defen-
sores ajuizou ação contra a Bancoop em solidariedade a
OAS Empreendimentos solicitando a restituição dos valo-
res pagos pelo apartamento triplex no Guarujá (BRASIL,
2019, p. 1)
Até que em 4 de março de 2016 o juiz Dr. Sérgio Moro

304
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

expediu um mandado para que o ex-Presidente da repú-


blica Luiz Inácio Lula da Silva prestasse seu depoimento
no aeroporto de Congonhas/SP na presença dos agentes
da Polícia Federal sobre sua suposta aquisição do apar-
tamento 164-A. E em agosto de 2016, Lula foi indiciado
frente suspeita de corrupção passiva, falsidade ideológica
e lavagem de dinheiro, bem como Marisa pelos crimes de
corrupção passiva e lavagem de dinheiro público, através
da denúncia do Ministério Público Federal (GRANATO;
BRETAS, 2018, s.p).
Ocorre que em abril de 2017 “Léo Pinheiro” então pres-
tou sua colaboração premiada mais importante a Justiça,
contendo informações que foram essenciais para compre-
ender a materialidade e autoria da aquisição e ocultamen-
to do apartamento triplex no Guarujá/SP (BRASIL, 2017,
p. 108-119).
Passando a ser das informações, devido “Léo Pinheiro”,
que o apartamento triplex, número 164-A, de matrícula
104.801 do Registro de Imóveis do Guarujá em São Paulo,
pertencia de fato ao ex-Presidente da República Luiz Iná-
cio Lula da Silva. E que as reformas no apartamento 164-A
foram feitas de acordo com as orientações dos reais pro-
prietários do imóvel, Lula e sua esposa. Tendo a reforma,
inclusive, sido aprovada na casa de Lula em São Bernardo
do Campo (BRASIL, 2017, p. 113-116).
Assim, sendo do conhecimento que Lula teria adquiri-
do um apartamento de valor inferior, conforme declara-
do ao Tribunal Superior Eleitoral, sendo de R$ 209.119,73
(duzentos e nove mil, cento e dezenove reais e setenta
e três centavos), referente sua aquisição do apartamento
141-A no mesmo condomínio, contrapartida tendo rece-
bido um apartamento no valor de R$ 1.147.770,00 (um

305
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

milhão, centos e quarenta e sete mil e setecentos e setenta


reais), somado ainda as reformas realizadas no valor de R$
1.277.221,00 (um milhão, duzentos e setenta e sete mil e
duzentos e vinte e um reais), fruto de corrupção e lavagem
de dinheiro (BRASIL, 2017, p 3; 50; 116-118).
Ainda, que os gastos que o Grupo OAS teria tido com
as reformas no apartamento triplex eram abatidas da pro-
pina devida pela empresa para o Partido dos Trabalhado-
res em obras da Petrobrás, conforme determinações de
Lula, devido o ex-Presidente da República ter intermedia-
do empreitadas para a OAS, especificamente no Consórcio
CONEST/RNEST em obras na Refinaria do Nordeste Abreu
e Lima - RNEST e no Consórcio CONPAR em obras na Re-
finaria Presidente Getúlio Vargas – REPAR (BRASIL, 2017,
p. 3-4; 109-110).
Sendo assim, com base na colaboração de “Léo Pinhei-
ro” quanto ao caso triplex, em 10 de maio de 2017 ocorreu
o primeiro depoimento de Lula diretamente ao juiz Dr.
Sérgio Moro (EXAME, 2017, 4h28min).
Na fase das alegações finais, a defesa de Lula negou ser
o proprietário ou possuidor do imóvel, afirmando que o
apartamento pertenceria ao Grupo OAS. Negando também
qualquer conhecimento de informações ou envolvimento
com corrupção no que concerne a Petrobrás ou o Grupo
OAS, bem como alegou se tratar de perseguição política e
afirmou que faltam provas para atestarem a veracidade da
autoria e materialidade da propriedade ou posse de Lula
do imóvel no Guarujá em São Paulo (BRASIL, 2017, p. 7-8).
Já, a defesa de “Léo Pinheiro” solicitou que o empresário
recebesse os mesmos benefícios da colaboração premiada
mesmo sem acordo assinado com o Ministério Público,
perante a importância das informações prestadas para o

306
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

entendimento da receptação e aquisição do apartamento


triplex e do sítio de Atibaia, bem como demais propinas
entre partidos. Bem como tendo alegado ter provado que
o apartamento triplex sempre pertenceu ao ex-Presidente
da República e por razão de ser fruto de crime o aparta-
mento manteve seu registro nome do Grupo OAS (BRA-
SIL, 2017, p. 6).
E em 12 de julho de 2017, com base no levantamento de
informações realizadas acerca dos autos supracitados, Lula
foi condenado por corrupção ativa e lavagem de dinheiro
com pena totalizada em nove anos e seis meses de reclusão
em regime fechado, além de multa convertida em valores
somados, pelo entendimento da receptação de vantagem in-
devida no valor de R$3.7 milhões (BRASIL, 2017, p. 214-216).
Tendo em janeiro de 2018 a 8ª Turma do Tribunal Re-
gional Federal da 4ª Região confirmado a sentença de
Moro e aumentado a pena para doze anos e um mês de
reclusão no mesmo regime (BRASIL, 2019, s.p).
Com isso, a defesa de Lula solicitou habeas corpus nº
152752, tendo este sido negado por unanimidade de votos
pelo Superior Tribunal de Justiça e chegado ao Supremo
Tribunal Federal que, em 5 de abril de 2018, negou no-
vamente o habeas corpus por seis votos a cinco (BRASIL,
2018, s.p).
“Léo Pinheiro” assinou acordo com a Procuradoria-Ge-
ral da República firmando a colaboração premiado em ja-
neiro de 2019, a qual somente foi homologada em 13 de
setembro de 2019, pelo Ministro Edson Fachin, do Supre-
mo Tribunal Federal. Tendo assim, Léo Pinheiro deixado
a Supremacia da Polícia Federal em Curitiba, no estado do
Paraná para cumprir sua pena em prisão em regime domi-
ciliar, em São Paulo (RICHTER, 2019, s.p).

307
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Entretanto, em 7 de novembro de 2019, o Supremo Tri-


bunal Regional alterou o entendimento da prisão em se-
gunda instância e no dia posterior Luiz Inácio foi liberado
da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba/PR e
passou a responder pela acusação em liberdade até o jul-
gamento da instância final (BRASIL, 2019, p. 1-2).
Vale ressaltar que Lula ainda responde por outros pro-
cessos. No dia 27 de novembro de 2019, o TRF-4 decidiu
por unanimidade manter a acusação de Luiz Inácio e au-
mentar a pena para dezessete anos, um mês e dez dias
de reclusão em regime fechado perante a lavagem de di-
nheiro em relação ao sítio de Atibaia do ex-presidente da
república, correspondendo como uma nova condenação
em segunda instância. Ação, inclusive, que “Léo Pinheiro”
teve sua pena, devido as atenuantes e colaboração pre-
miada, fixada em um ano, sete meses e quinze dia, em
regime inicial semiaberto (BRASIL, 2019, p. 337-344).

ANÁLISE DA TOMADA DE DECISÃO E EFICÁCIA DA


APLICABILIDADE DA COLABORAÇÃO PREMIADA FRENTE
A DECISÃO ORA ESTUDA
Ao analisar o entendimento da Justiça acerca da cola-
boração premiada de “Léo Pinheiro”, prestada nos autos
nº 5046512-94.2016.4.04.7000/PR, de origem da 13ª Vara
Federal de Curitiba, no Estado do Paraná, quanto o apar-
tamento triplex no Guarujá em São Paulo e sua origem
criminosa, matéria de ação na Operação Lava Jato, é pos-
sível verificar que quando homologada pelo Ministro Luiz
Edson Fachin pôde ser equiparada ao “Dilema do Prisio-
neiro” de Albert Tucker (RICHTER, 2019, s.p).
Visto que, é possível verificar nos autos supracitados, a
não existência de colaboração mútua entre os participes,

308
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

vez que, “Léo Pinheiro” prestou informações que coopera-


ram e esclareceram com o entendimento da Justiça acerca
do imóvel discutido em questão, bem como tornou do en-
tendimento que houve de fato a aquisição do ex-Presiden-
te da República Luiz Inácio Lula da Silva ao apartamento
triplex 164-A no Edifício Solaris, através de corrupção e
lavagem de dinheiro que, contrapartida nega o envolvi-
mento com o bem (BRASIL, 2017, 108-119).
Sendo assim, o ex-Presidente da República foi condena-
do por corrupção ativa e lavagem de dinheiro com pena
inicial de nove anos e seis meses de reclusão em regime
fechado e aumentada pela 8ª Turma do Tribunal Regional
Federal da 4ª Região para doze anos e um mês de reclusão
no mesmo regime (BRASIL, 2019, s.p).
Enquanto, Léo Pinheiro passou a cumprir pena em pri-
são em regime domiciliar em São Paulo, deixando assim a
Superintendência da Polícia Federal de Curitiba, no estado
do Paraná (RICHTER, 2019, s.p).
Nestes termos, ao analisar a esquematização do “Dilema
do Prisioneiro”, bem como a Teoria dos Jogos aplicada no
que concerne a colaboração premiada de “Léo Pinheiro”, é
possível verificar que aquele que colaborou teve redução e
progressão de pena como benefício, enquanto aquele que
foi delatado teve sua pena aumentada a partir do horizonte
de novas informações que a Justiça pode adquirir.
Nestes termos, o Dilema do Prisioneiro, estrategicamente
e economicamente, possui como opção mais favorável para
os indivíduos a colaboração mútua, vez que os criminosos
ao serem colocados frente à possibilidade da colaboração
premiada não podem determinar com clareza qual será o
movimento um do outro, sendo assim, ao analisarem as
possibilidades das ações possíveis dos participes e das pe-

309
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

nas, se tornaria menos arriscado possuírem como parâme-


tro uma pena entre nula e intermediária, do que uma pena
entre mínima e máxima (MONSALVE, 2003, p. 6).
Por conseguinte, os envolvidos devem tomar suas de-
cisões em prol do grupo e não de seu interesse particular,
para que as ações de um membro não se coloquem em
desconformidade com os demais causando desequilíbrio
de penas. Ou seja, de modo cooperativo um com os ou-
tros, para maximizar ganhos individuais e produzir coleti-
vos (MONSALVE, 2003, p. 6).
Visando pelo lado da Justiça a colaboração premiada se
faz um importante instituto de contribuição para elucida-
ção de casos criminais e controle da economia do Estado.
Em compensação, quando há conflito de decisões e ações
entre os participes ocorre desiquilíbrio de penas, vez que
estes não agem conforme os interesses coletivos para ob-
tenção de satisfação equiparada.
Neste liame, o ideal seria que os partícipes quando ins-
tigados a trazer novos fatos para a elucidação do caso
investigado, colaborassem mutuamente, eis que, sob tal
égide a balança do direito ficaria equilibrada, havendo o
aumento mútuo das penas, mas também, a redução pro-
porcional de ambas de forma compensatória.
Isto porque, quando apenas um delata o outro, a ba-
lança fica desiquilibrada, pois apenas um acaba sendo
agraciado pelos benefícios que tal instituto confere, cau-
sando com que, pessoas que respondam por um mesmo
crime tenham condenações bastante dispares uma da ou-
tra, quando que o ideal, para fins de sentimento de cum-
primento da justiça, seria o de que ambos os partícipes
tivessem penas assemelhadas dentro da ação criminal (FI-
DELIS; FALEIROS, 2017, p. 43).

310
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

CONCLUSÃO
É do entendimento que a Teoria dos Jogos se trata da
análise matemática que busca realizar o levantamento de
dados conforme uma determinada situação em que há
conflito de interesses para traçar a movimentação mais
adequada para que haja o melhor resultado coletivo, con-
forme estudos de John F. Nash.
Nestes termos, a colaboração premiada se trata de um
benefício em que um ou alguns dos envolvidos em um
crime concordam em prestar informações úteis e necessá-
rias para que a Justiça possa adquirir maior compreensão
e propriedade da ação para proferir decisão. Com isso,
o estudo de Nash e seu conceito sobre equilíbrio seriam
aplicados para auxiliar na dosimetria da pena dos agentes
envolvidos no crime.
Deste modo, a Ação Penal de nº 5046512-94.2016.4.04.7000/
PR, de origem da 13ª Vara Federal de Curitiba, no Estado do
Paraná, que se refere ao apartamento triplex no Guarujá/SP,
mostrou preencher de forma econômica o “Dilema do Prisio-
neiro” de Albert Tucker no que favorece um os participes en-
volvidos e a Justiça, a partir da aplicação da Teoria dos Jogos.
Compreendendo-se assim que para que a Teoria dos
Jogos se torne satisfatória para os envolvidos é necessário
que quando colocados frente a possibilidade do forne-
cimento de informações para a Justiça estes colaborem
mutuamente para que não haja eventual desiquilíbrio de
condenações.

REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Fábio Portela Lopes de. A teoria dos jogos: uma fundamenta-
ção teórica dos métodos de resolução de disputa, 2002, 15 f. p. 2.
ALMEIDA, P.; KAJIN, M.; VIEIRA, M. Equilíbrio de Nash e Estraté-

311
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

gias evolutivamente estáveis: A Teoria dos jogos na ecologia de


populações, 2012. Vol 16, nº 127-140. Disponível em: <https://
revistas.ufrj.br/index.php/oa/article/view/8199/6649>. Acesso em:
17 dez. 2019. p. 130.
BRASIL. Justiça Federal, Seção Judiciária do Paraná, 12ª Vara
Federal de Curitiba. Execução Penal Provisória nº 5014411-
33.2018.4.04.7000/PR. Juiz Federal: Danilo Pereira Júnior. Dispo-
nível em: <https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/
wp-content/uploads/sites/41/2019/11/LULA-SOLTO.pdf> Acesso
em: 17 dez. 2019. p. 1-2.
BRASIL. Poder Judiciário, Justiça Federal, Seção Judiciária do
Paraná 13ª Vara Federal de Curitiba. Ação Penal nº 5021365-
32.2017.4.04.7000/PR. Juíza Federal: Gabriela Hardt. Disponível
em: <https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/wp-
content/uploads/sites/41/2019/02/Evento-1369-SENT1.pdf>. Aces-
so em: 15 dez. 2019. p. 337-344.
BRASIL. Poder Judiciário, Justiça Federal, Seção Judiciária do
Paraná, 13ª Vara Federal de Curitiba. Ação Penal nº 5046512-
94.2016.4.04.7000/PR. Juiz Federal: Sérgio Fernando Moro. Julgado
em: 12 de julho de 2017. Disponível em: <https://www.conjur.com.
br/dl/sentenca-condena-lula-triplex.pdf>. Acesso em: 05 dez. 2019.
BRASIL. STF nega habeas corpus preventivo ao ex-presidente
Lula, 2018. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/ver-
NoticiaDetalhe.asp?idConteudo=374437>. Acesso em: 04 dez. 2019.
Acesso em: 17 dez. 2019.
BRASIL. TRF4 confirma condenação do ex-presidente Lula, 2019.
Disponível em: <https://www.trf4.jus.br/trf4/controlador.php?a-
cao=noticia_visualizar&id_noticia=14914>. Acesso em: 05 dez. 2019.
BRASIL. Tribunal De Justiça Do Estado De São Paulo da Comarca
de São Paulo Foro Central Cível. 34ª Vara Cível. Processo nº:
1076258-69.2016.8.26.0100. Juiz de Direito: Dr. Adilson Aparecido
Rodrigues Cruz. Julgado em: 25 de abril de 2019. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/dl/juiz-espolio-marisa-leticia-triplex.
pdf>. Acesso em: 16 dez. 2019. p. 1

312
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

CARVALHO, Cleide. Moro determina prisão de Léo Pinheiro após


confirmação da sentença pelo TRF4, 2017. Disponível em: <ht-
tps://oglobo.globo.com/brasil/moro-determina-prisao-de-leo-pi-
nheiro-apos-confirmacao-da-sentenca-pelo-trf4-21848249>. Acesso
em: 05 dez. 2019.
EXAME. Depoimento de Lula a Sergio Moro – Completo, 2017.
(4h28m). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Pc-
Qo35lle0Y>. Acesso em: 04 dez. 2019.
FERGUSON, C.; FERGUSON, T. On the Borel and von Neumann
Poker Models, 2003. Disponível em: <https://www.math.ucla.
edu/~tom/papers/poker1.pdf>. Acesso em: 16 dez. 2019. p. 1; 6.
EXAME. Depoimento de Lula a Sergio Moro – Completo, 2017.
(4h28m). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Pc-
Qo35lle0Y>. Acesso em: 04 dez. 2019.
FIDELIS, D. P.; FALEIROS, P. B. Dilema Do Prisioneiro na Análise
Experimental do Comportamento: Uma Revisão Sistemática
da Literatura, 2017, Vol 13, nº 1, 42-52. Disponível em: <https://
periodicos.ufpa.br/index.php/rebac/article/view/5262/4441>.
Acesso em: 17 dez. 2019. p. 43.
GRANATO, Luísa; BRETAS, Valéria. A linha do tempo do caso triplex que
levou Lula à prisão, 2018. Disponível em: <https://exame.abril.com.
br/brasil/a-linha-do-tempo-do-caso-triplex-que-levou-lula-a-prisao/>.
Acesso em: 09 dez. 2019.
MONSALVE, Sergio. John Nash y la teoria de juegos, 2003. Vol 23,
nº 137-149. Disponível em: <https://www.casanchi.com/mat/john-
nashjuegos.pdf>. Acesso em: 17 dez. 2019. p. 6.
RICHTER, André. Fachin homologa acordo de delação de Léo Pi-
nheiro, 2019. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/
justica/noticia/2019-09/fachin-homologa-acordo-de-delacao-de-leo
-pinheiro>. Acesso em: 05 de dez. 2019.
VIEIRA, Yan Renatho Silva. Colaboração premiada e Teoria dos Jo-
gos. 2017. 53 f. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em
Direito) - Universidade de Brasília, Brasília, 2017. Disponível em: <
http://bdm.unb.br/handle/10483/17917>. Acesso em: 05 nov. 2019.

313
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

O PAPEL DA ANÁLISE ECONÔMICA DO


DIREITO E DA TEORIA DOS JOGOS NO COMBATE
AOS CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO
NACIONAL E DE LAVAGEM DE DINHEIRO

Daiana Caye Reizes77 e Tiago Neu Jardim78

Resumo: No campo do Direito Penal Econômico, a apli-


cação da Análise Econômica do Direito e da Teoria dos Jo-
gos se revela em um dos mais relevantes temas em discus-
são atual, visto que os custos para o Estado combater os
crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e de Lavagem
de Dinheiro, objetos desse estudo, são extremamente ele-
vados. Frente a isso, esse artigo propõe-se a analisar esses
crimes sob a ótica dos custos pelo viés utilitarista, a partir
de uma crítica à Política Criminal brasileira, procurando
responder à seguinte questão: a aplicação da Análise Eco-
nômica do Direito e da Teoria dos Jogos são instrumentos
adequados para otimizar o combate aos crimes contra o
Sistema Financeiro e de Lavagem de Dinheiro a um custo
mais reduzido? O objetivo dessa investigação, portanto,
é o de tentar aferir o papel da Análise Econômica do Di-
reito e da Teoria dos Jogos para o combate à criminali-
dade a partir dos custos da obtenção das provas, dadas
as particularidades desses crimes e a sua relevância para
o sistema econômico-financeiro do país. A metodologia

77 Acadêmica do Curso de Direito – 10º Semestre. Faculdades Integradas Machado de Assis – FEMA/
Santa Rosa. daiana.bvb@hotmail.com
78 Mestre em Direito, com distinção, pela Universidade de Passo Fundo - UPF (2016). Especialista
em Finanças pelo Centro Universitário Franciscano - UNIFRA (2009). Possui graduação em Ciên-
cias Econômicas (2007) e em Direito (2009) pela Universidade Federal de Santa Maria - UFSM.
É Procurador do Município de Horizontina/RS. Professor dos cursos de Ciências Econômicas da
Faculdade Horizontina - FAHOR e de Direito das Faculdades Integradas Machado de Assis - FEMA/
Santa Rosa. Membro do Colégio de Professores da Academia Brasileira de Direito Constitucional
- ABDConst.

314
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

compreende-se como teórica, com tratamento qualitativo


dos dados e fins explicativos. A geração de dados deu-se
por documentação indireta, com produção bibliográfica
de informações; já, a análise e a interpretação do estudo
decorrem do método hipotético-dedutivo, com procedi-
mentos técnicos, históricos e comparativos. As conside-
rações alcançadas caracterizam a aplicabilidade da Aná-
lise Econômica do Direito e da Teoria dos Jogos como
eficazes, pois transferem o ônus do Estado para o agente
criminoso, ao aumentar a sua probabilidade de fracasso.
Por outro lado, reduz os custos com a repreensão de cri-
mes dessa natureza por tornarem mais célere e eficiente a
produção da prova que, de outro modo, poderia tornar-se
economicamente inviável.
Palavras-chave: Análise Econômica; Teoria dos Jogos; Crimes
contra o sistema financeiro nacional; Lavagem de dinheiro.

INTRODUÇÃO
Os crimes de Lavagem de Dinheiro e àqueles pratica-
dos contra o Sistema Financeiro Nacional possuem carac-
terísticas em comum, chamando a atenção pela difícil ras-
treabilidade do dinheiro e pela dificuldade da produção
da prova necessária para eventual condenação, o que se
torna extremamente dispendioso para o Estado. A Análise
Econômica do Direito e a Teoria dos Jogos utilizam-se de
estratégias para atingir os melhores resultados da forma
menos onerosa possível, sem colocar em risco os direitos
e garantias fundamentais do investigado. Trata-se, pois, de
uma estratégia, através da qual o autointeresse do agente
é utilizado como forma de romper a cooperação estabele-
cida entre os membros da organização criminosa. Ou seja,
os indivíduos deixam de ter incentivo para cooperarem

315
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

entre si e passam a ser estimulados a colaborem com o


Estado na obtenção da prova.
O propósito desse artigo é, justamente, abordar o papel
da Análise Econômica do Direito e da Teoria dos Jogos
como instrumentos eficientes para a utilidade do procedi-
mento investigativo. Por conseguinte, é fundamental en-
tender o combate aos crimes dessa natureza sob a ótica
dos custos do processo e do aparelhamento necessário
para a obtenção das provas.
Nesse sentido, o presente artigo foi dividido em três se-
ções: a primeira trará um enfoque geral da Análise Econômica
do Direito e da Teoria dos Jogos, procurando contextualizar
e introduzir o leitor, sobretudo aquele ainda pouco familiari-
zado com esse estudo, à temática discutida; a segunda, abor-
dará o combate à criminalidade sob a ótica dos custos, a
partir de uma perspectiva utilitarista; a terceira e última seção,
trará algumas contribuições para a eficácia do combate aos
crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e a Lavagem de
Dinheiro, tecendo uma crítica à Política Criminal brasileira.

A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO E A TEORIA


DOS JOGOS COMO INSTRUMENTOS DE OBTENÇÃO
DE PROVAS
Inicialmente, a Análise Econômica do Direito desenvol-
veu-se na segunda metade do século XX, nos Estados Unidos
da América (EUA), publicado por Richard Posner no clássico
Economic Analysis of Law em 1960, a fim de obter maior
eficiência nas relações econômicas e sociais. Logo, outros
autores fizeram contribuições da mesma relevância, como
Gary Becker na obra Crime and Punishiment: An economic
approach no ano de 1968, “[...] ao afirmar que existe uma
razão para o cometimento de crimes lucrativos, o crime neste

316
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

meio é tido como uma escolha racional de migrar para ativi-


dades ilícitas com o intuito de obter um máximo ganho com
o mínimo de esforço.” (MONTEIRO, 2009, p. 1089).
A Análise Econômica do Direito conceitua-se como a
aplicação do instrumental analítico e empírico da econo-
mia, para se tentar compreender, explicar e prever as im-
plicações fáticas do ordenamento jurídico, bem como a ló-
gica do próprio ordenamento jurídico. Em outras palavras,
a Análise Econômica do Direito pode ser definida como
uma forma de “[...] compreender o pensamento jurídico
por meio da aplicação da teoria econômica para o exame
da formação, estrutura e impacto econômico causado pelo
Direito, aplicado sob o enfoque da ciência econômica.”
(PARREIRA; BENACCHIO, 2012, p. 184).
Assim, nos principais parâmetros utilizados na metodo-
logia da disciplina, se encontram os chamados “critérios
de eficiência”, tidos como aptos para avaliar o atingimento
dos melhores resultados com o mínimo de desperdício.
Por isso, verifica-se a finalidade de “[...] expandir a com-
preensão e o alcance do direito e aperfeiçoar o desenvol-
vimento, a aplicação e avaliação de normas jurídicas, prin-
cipalmente com relação às suas consequências.” (GICO
JÚNIOR, 2014, p. 01). A fim de formular uma proposta de
análise conjunta entre economia e direito, de maneira a
observar a justiça com os olhos da eficiência econômica, o
autor Sérgio Mourão Corrêa Lima afirma:
A análise econômica do Direito, já conhecida e muito
válida, cuida de enxergar a Justiça com os olhos da efici-
ência e da conveniência econômica. A análise jurídica da
economia, inédita e igualmente necessária, consiste em
observar a economia na busca do que é admissível, jus-
to, correto e equilibrado. (CÔRREA LIMA, 2012, p. 54).

317
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Em contrapartida, a Teoria dos Jogos foi sistematizada


pelo matemático John Von Neumann e pelo economista
Oskar Morgenstern em 1944, para entender e explicar os
mecanismos utilizados pelas pessoas na tomada de deci-
sões. Em outros termos, a Teoria dos Jogos diz respeito à
análise de comportamento estratégico em que os tomado-
res de decisão interagem, sendo que o resultado de suas
ações depende também das ações dos outros. Assim, as-
sume que os tomadores de decisão (também chamados de
jogadores ou agentes) são racionais, o que significa que:
i) eles sabem quais são seus objetivos e preferências; ii)
eles sabem quais são as limitações e restrições relevan-
tes às suas ações; e iii) eles conseguem escolher a me-
lhor ação possível dados seus objetivos e preferências e
respeitadas as limitações e restrições relevantes. (TIMM,
2014, p. 115).
Dessa maneira, a Teoria dos Jogos ajuda a entender teo-
ricamente o processo de decisão de agentes que interagem
entre si, a partir da compreensão da lógica da situação em
que estão envolvidos. Também ajuda a desenvolver a capa-
cidade de raciocinar estrategicamente, diante da exploração
das possibilidades resultantes da interação estratégica entre
agentes, conforme o autor Ronaldo Fiani expressa:
[...] em particular aquelas que vão de encontro à intui-
ção, é uma excelente forma de desenvolver o raciocínio
estratégico. Isso porque, quando os indivíduos ou or-
ganizações estão envolvidos em processos de interação
estratégica, algumas vezes existem possibilidades que
dificilmente seriam percebidas sem o treinamento pro-
porcionado pela teoria dos jogos. (FIANI, 2009, p. 10).
Nesta perspectiva, a Teoria procura entender como os
jogadores tomam suas decisões em situações de interação

318
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

estratégica, quer dizer, visa explicar como esses jogadores


fazem as suas escolhas. À vista disso, propicia a leitura for-
mal dos jogadores a partir das recompensas e do custo-be-
nefício de cada estratégia, autorizando a estabelecer ex-
pectativas de comportamento em face do custo-benefício
(COUTINHO; LOPES JÚNIOR; MORAIS DA ROSA, 2018,
p. 150). Logo, uma recompensa é aquilo que todo joga-
dor obtém depois de encerrado o jogo, de acordo com
suas próprias escolhas e as dos demais jogadores. Essa é a
lógica que precisa ser incorporada pelo ordenamento ju-
rídico, alterando a concepção de incentivos estabelecidos
pela Política Criminal de modo a aumentar a eficiência no
combate aos crimes de Lavagem de Dinheiro e contra o
Sistema Financeiro Nacional.
Os meios de obtenção da prova são atividades extra-
processuais, as quais referem-se a certos procedimentos
regulados por lei, com o objetivo de conseguir provas
materiais, e que podem ser realizadas por outros funcio-
nários, como pelo Ministério Público ou pela Polícia. No
Código de Processo Penal, apesar de inserida entres os
meios de prova, a busca pessoal ou domiciliar deve ser
compreendida como meio de investigação, visto que seu
objetivo não é a obtenção de elementos de prova, mas
sim de fontes materiais de prova. Deste modo, “[...] os
meios extraordinários de obtenção de provas (ou técnicas
especiais de investigação) são ferramentas sigilosas postas
à disposição da Polícia, dos órgãos de inteligência e do
Ministério Público para a apuração de crimes graves, que
exijam o emprego de estratégias investigativas [...]” (LIMA,
2016, p. 801). Essas técnicas, foram utilizadas inicialmen-
te para a persecução penal do tráfico de drogas, sendo
que, atualmente, também são usadas para a investigação

319
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

de crimes praticados por organizações criminosas, como


no caso dos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e
a Lavagem de Dinheiro.
Em regra, são identificados pela presença de dois ele-
mentos: o sigilo e a dissimulação. No grupo de técnicas
sigilosas estão incluídas a interceptação das comunicações
telefônicas, a ação controlada, etc. Entretanto, dentre as
técnicas de dissimulação, a infiltração policial costuma ser
utilizada com o objetivo de induzir a erro o investigado
(LIMA, 2016, p. 801). Nessa acepção, o Código de Proces-
so Penal elenca os demais meios de obtenção de provas,
como exemplo, cita-se o exame de corpo de delito e outras
perícias, o interrogatório judicial, a confissão, entre outros.
Observa-se que, tais meios de obtenção de provas utili-
zados demandam elevados custos para o Estado. Em razão
disso, “[...] o sistema brasileiro acaba admitindo algumas
práticas probatórias absolutamente incompatíveis com um
processo penal constitucional, como os exames crimino-
lógicos, os diagnósticos sobre a interioridade do agente
e outras provas deste estilo.” (LOPES JÚNIOR, 2015, p.
357). A concepção que precisa ser incorporada e assimila-
da pela Política Criminal é que, as pessoas, em regra, não
cometem crimes porque são desonestas, mas sim, pela
percepção de uma estrutura de incentivos adequada, ou
seja, o custo para o agente praticar o delito é baixo e a
probabilidade do crime ser descoberto é reduzida, dada a
complexidade dos crimes de Lavagem de Dinheiro e con-
tra o Sistema Financeiro Nacional que torna extremamente
difícil a rastreabilidade do dinheiro e a descoberta da au-
toria pelos métodos tradicionais de investigação.
Nesse caso, passa-se a utilizar a Análise Econômica do
Direito e a Teoria dos Jogos, os quais, são instrumentos lí-

320
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

citos e adequados para otimizar o combate à criminalidade


a um custo mais reduzido, mediante a obtenção de pro-
vas, em razão de reforçar o benefício positivo através da
redução de pena ou multa para o delator. Consequente-
mente, os próprios agentes passarão a contribuir volunta-
riamente com as investigações, contribuindo com o Estado
na obtenção da prova. Inclusive, as Teorias não compro-
metem os direitos e garantias fundamentais do investigado
ou do réu, cujo propósito é precisamente introduzir uma
metodologia que contribua significativamente para a com-
preensão de fenômenos sociais e que auxilie na tomada
racional de decisões jurídicas.
Com o acolhimento da justiça negocial por meio de
acordos de colaboração e de leniência, especialmente
diante da delação premiada, os custos da descoberta pro-
batória em favor do Estado são trocados por reduções de
pena e de regimes prisionais. Contudo, pode-se verificar
que não há formas de flexibilizar a lei para aumentar as
chances de punição e, assim, reprimir a criminalidade. En-
tão, acolhe-se a utilização da Análise Econômica do Direito
e a Teoria dos Jogos como alternativa sem violar nenhuma
garantia, e ainda, a um custo reduzido, visto que os agen-
tes criminosos passarão a contribuir voluntariamente com
as investigações, pois os indivíduos são criaturas que se
comportam tentando maximizar seus interesses. Por isso,
propicia o que desenvolver-se-á no próximo tópico.

O COMBATE À CRIMINALIDADE SOB A ÓTICA


DOS CUSTOS E O VIÉS UTILITARISTA
Como visto, os crimes contra o Sistema Financeiro Na-
cional e a Lavagem de Dinheiro demandam uma inves-
tigação mais custosa ao Estado, em razão de uma pecu-

321
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

liaridade: a difícil rastreabilidade; e o alto custo para a


obtenção da prova. Dessa maneira, a população é obriga-
da a suportar um duplo ônus: o dos recursos que foram
desviados e o da política pública que não é realizada ou
é mal executada.
Nesta linha, a proposta de Hardin em The tragedy of
the commons publicado em 1968, indaga que o aumento
populacional desmedido combinado à propriedade comu-
nal de bens degenera em problemas de natureza social.
Diante disso, o conflito de interesses individuais e o bem
comum no uso de recursos finitos, determina que o pro-
blema apenas pode ser superado com a redução de liber-
dades individuais e através da coerção, adotando-se o ar-
ranjo de propriedade privada ou pública, mas esta última
com restrições. Não obstante, o autor aceita a suposição
resultante de que um mundo com recursos finitos somen-
te pode suportar uma quantidade populacional limitada
(VARGAS; HERSCOVICI, 2017, p. 107).
Neste mesmo ponto de vista, trazendo como partida o
pensamento de Pigou em sua obra The Economics of wel-
fare em 1920, são analisadas as influências das externali-
dades negativas na relação econômica, na qual, as ações
de um indivíduo afetam a felicidade e o bem-estar dos
outros. Assim, pode-se falar em custo social, que deve
ser atribuído a uma determinada atividade econômica de
forma a equilibrar os prejuízos advindos para a sociedade
(LAMEU SILVA, 2017, p. 99). Dessa forma, é possível retra-
tar os efeitos colaterais negativos na sociedade que podem
emanar da corrupção e da malversação dos recursos. Em
função disso, investir mais dinheiro público em aparato
de segurança, exigiria ainda mais desperdício de recursos.
Desse modo, propõe-se um método de combate à crimi-

322
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

nalidade que, além de ser compatível com a Lei e a Consti-


tuição Federal, como a Análise Econômica do Direito e da
Teoria dos Jogos, já tratados no tópico anterior, possibilite
obter provas à um custo mais reduzido para o Estado.
Nesse sentido, destaca-se a Teoria Utilitarista desenvol-
vida principalmente por Jeremy Bentham e John Stuart
Mill, princípio segundo o qual os indivíduos tendem, intui-
tivamente, a maximizar a sua felicidade e promover o seu
bem-estar, valendo-se sempre da eficiência como guia de
ação. Em outras palavras, busca-se sempre tomar decisões
racionais do ponto de vista do custo benefício, sem avaliar
se elas são justas ou morais. O filósofo Jeremy Bentham
define tal princípio como sendo:
Por princípio de utilidade entende-se aquele princípio
que aprova ou desaprova qualquer ação, segundo a ten-
dência que tem a aumentar ou a diminuir a felicidade da
pessoa cujo interesse está em jogo, ou, o que é a mesma
coisa em outros termos, segundo a tendência a promo-
ver ou a comprometer a referida felicidade. Digo qual-
quer ação, com o que tenciono dizer que isto vale não
somente para qualquer ação de um indivíduo particular,
mas também de qualquer ato ou medida de governo.
(BENTHAM, 1974, p. 10).
Ainda, Bentham adverte que esse princípio está funda-
mentado na relação de domínio do prazer e da dor pre-
sente na natureza humana, e são eles que determinam o
que se deve ou não fazer, apontando o que é certo e erra-
do e delimitando a cadeia de causas e efeitos. Demonstra-
se abaixo o que o filósofo afirma:
O princípio da utilidade reconhece esta sujeição e a
coloca como fundamento desse sistema, cujo objetivo
consiste em construir o edifício da felicidade através da

323
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

razão e da lei. Os sistemas que tentam questionar este


princípio são meras palavras e não uma atitude razoá-
vel, capricho e não razão, obscuridade e não luz. (BEN-
THAM, 1974, p. 09).
O interesse ou objetivo da comunidade consiste em al-
cançar o máximo na soma da felicidade de cada um dos
indivíduos, sendo que, tal princípio, não resguarda a exis-
tência de um estilo de vida que corresponda à perfeição:
O princípio que estabelece a maior felicidade de todos
aqueles cujo interesse está em jogo, como sendo a justa
e adequada finalidade da ação humana, e até a única fi-
nalidade justa, adequada e universalmente desejável; da
ação humana, digo, em qualquer situação ou estado de
vida, sobretudo na condição de um funcionário ou gru-
po de funcionários que exercem os poderes de governo
(BENTHAM, 1974, p. 09).
Dessa maneira, será importante medir a quantidade de
prazer e dor da forma mais objetiva possível para que o
legislador considere sua decisão. Segundo o autor Sérgio
Trindade, a felicidade não é só a quantidade de prazer
produzido, mas também a qualidade do prazer conquista-
do, sendo necessário diferenciar o trabalho de Stuart Mill
entre utilitarismo de ato e utilitarismo de regra ou de nor-
ma, expressa: “No utilitarismo de ato, o cálculo sobre o
maior saldo de felicidade sobre a infelicidade é feito na
base do que resultará da realização de um ato dado. No
utilitarismo de regra, o cálculo é feito na base do que ad-
virá da observância ou não de uma regra.” (TRINDADE,
2004, p. 95).
No entanto, em ambos os casos se faz necessário le-
var em consideração as consequências, sejam das normas
ou dos atos praticados, para o maior número possível de

324
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

pessoas. O princípio se preserva no que tange à sua fun-


damentação e à relação entre indivíduo e sociedade. Não
há a possibilidade de um afastamento entre a sociedade e
o indivíduo, já que existe um vínculo de interdependência
(GODOI, 2017, p. 18). O filósofo e economista Stuart Mill
conceitua a felicidade e introduz o prazer como o único
fim desejável, como pode ser observado:
A utilidade ou o princípio da maior felicidade como a
fundação da moral sustenta que as ações são corretas
na medida em que tendem a promover a felicidade e
erradas conforme tendam a produzir o contrário da fe-
licidade. Por felicidade se entende prazer e ausência de
dor; por infelicidade, dor e privação de prazer [...] o pra-
zer e a imunidade à dor são as únicas coisas desejáveis
como fins, e que todas as coisas desejáveis [...] são de-
sejáveis quer pelo prazer inerente a elas mesmas, quer
como meios para alcançar o prazer e evitar a dor. (MILL,
2000, p. 187).
Nesse sentido, a questão que exsurge é a seguinte: have-
ria uma forma de combater a criminalidade com custo míni-
mo sem comprometer os direitos e garantias fundamentais
do investigado ou do réu? À vista disso, de acordo com o
professor Tiago Neu Jardim, pode-se utilizar a Equação da
Utilidade: Ut= Ue*.ps - C.pf, demonstrada a seguir:
Ut: Utilidade total (o ganho do criminoso com a conduta
delituosa);
Ue*: Utilidade esperada (o que o criminoso espera con-
seguir);
ps: Probabilidade de sucesso;
C: Custos que a organização criminosa terá de suportar;
pf: Probabilidade de fracasso. (adaptada de JARDIM,
2017, p. 165).

325
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Logo, o que reduz a utilidade total do agente está ilus-


trado depois do sinal negativo, designado pelas variáveis
“Custos” e a “Probabilidade de fracasso”. Os custos repre-
sentam a pena que o criminoso terá que cumprir, caso seja
preso. Já a probabilidade de fracasso são as chances que
existem da conduta delituosa ser descoberta pelo Estado.
Levando em consideração que os custos da investigação
para o Estado são muito elevados, essa probabilidade para
o criminoso acaba sendo diminuída. Por isso, certifica-se
que o agente criminoso possui incentivos para se corrom-
per. Além disso, seria possível aumentar a pena para esse
tipo de crime, porém, irrelevante se o crime continuasse
sem ser descoberto.
Consequentemente, a Análise Econômica do Direito e a
Teoria dos Jogos, oportunizam uma “troca” de proporções
entre os custos e a probabilidade de fracasso baseadas na
Equação da Utilidade. Nessa situação, o Estado propõe a
redução da pena ou multa, concedendo um benefício po-
sitivo no cumprimento da pena do delator, reduzindo, as-
sim, os seus custos para a obtenção da prova, e, ao mesmo
tempo aumenta a probabilidade de a organização criminosa
fracassar, reduzindo os incentivos para a prática delituosa.
A possibilidade de utilização a chamada “prova empres-
tada” é uma dessas técnicas processuais, a qual, consis-
te no transporte de produção probatória de um processo
para outro pela forma documentada. É o aproveitamento
de atividade probatória anteriormente desenvolvida, ob-
servando-se os princípios do contraditório e da ampla de-
fesa. Inclusive, o autor Eduardo Talamini destaca que:
A função primeira e imediata do empréstimo da prova é
a economia processual. Busca evitar a repetição desne-
cessária de atos a fim de que, com menor dispêndio de

326
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

tempo e recursos materiais, o processo seja mais acessí-


vel a todos (é aplicação do célebre “princípio econômi-
co”, formativo do processo). Sendo essa a função normal
da prova emprestada, impõem-se, com rigor, a observân-
cia dos requisitos [...] é a economia processual, somada
à circunstância de que nenhuma garantia constitucional
está sendo violada, que autoriza o empréstimo da prova
a despeito de inexistir sua previsão genérica no ordena-
mento. (TALAMINI, 1998, p. 159).
Evidentemente que já se discute os custos do processo
há muito e uma delação premiada, por exemplo, com a
aplicação da pena, é menos custosa do que um Processo
Penal, daí que ambas as partes podem obter vantagens.
O Estado reduz a pena ou o regime prisional, enquanto
o acusado/delator fornece provas contra si e/ou terceiros,
apurando os custos benefícios das recompensas. A tomada
de decisão de cooperação:
[...] com os demais investigadores/acusados, ou com o
Estado (polícia e/ ou Ministério Público), se observada
do ponto de vista da maximização de ganhos, ainda que
se levando em conta aspectos morais, econômicos, fami-
liares, religiosos, e de reputação, aproxima-se da noção
de preço. Embora, exista uma bilateralidade nesse racio-
cínio, pois o acusador e acusado entram numa relação
de ônus/bônus, de ponderação na lógica custo benefí-
cio. (COUTINHO; LOPES JÚNIOR; MORAIS DA ROSA,
2018, p. 50).
A cooperação entre os investigados/acusados torna-se
tensa e suscetível a traições inspiradas na maximização dos
ganhos, haja vista que a alteração na estrutura de incentivos,
cuja racionalidade deriva da Análise Econômica do Direito,
suprime as vantagens que os agentes possuem para continu-

327
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ar cooperando. Assim, quando o primeiro agente começa a


delatar, surge uma “corrida” pela colaboração premiada, com
ofertas crescentes de informações capazes de se comprar e
vender no mercado da informação/prova penal. O valor de
face das informações varia conforme o interesse do compra-
dor em apurar uma investigação específica.
A partir dessa noção é que se pode compreender as re-
compensas de participar ou não do “jogo” da delação pre-
miada. Para esse modelo não há julgamentos a priori do
conteúdo da otimização, mas somente do reconhecimento
do movimento otimizador. Logo, “[...] o acolhimento da
negociação implica na renúncia do direito ao processo,
mediante o acolhimento antecipado e informado, sobre os
limites e modos da sanção futura. A troca, por sua vez, ho-
mologada pelo Estado-Juiz converte-se no novo modelo
de adjudicação de culpa.” (COUTINHO; LOPES JÚNIOR;
MORAIS DA ROSA, 2018, p. 33).
Em desfecho, considera-se que há uma forma de com-
bater a criminalidade a um custo mais reduzido, sem com-
prometer os direitos e garantias fundamentais do investi-
gado, através da aplicabilidade de instrumentos como os
aqui apresentados, capazes de obter provas de forma me-
nos onerosa para o Estado, pois encontram-se centrados
na eficiência e na cadeia de incentivos, assim, associados
à noção de inclinação da escolha para a melhor chance
de maximização. Ao final, a transação se dá a partir da li-
berdade do agente criminoso e do interesse do Estado em
obter informações que seriam custosas e difíceis.
No próximo tópico, ver-se-á mais de perto como a Aná-
lise Econômica do Direito e a Teoria dos Jogos podem
contribuir para combater os crimes de Lavagem de Dinhei-
ro e contra o Sistema Financeiro Nacional.

328
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

CONTRIBUIÇÕES PARA A EFICÁCIA DO COMBATE AOS


CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO
NACIONAL E A LAVAGEM DE DINHEIRO À PARTIR DE
UMA CRÍTICA À POLÍTICA CRIMINAL BRASILEIRA
“Política Criminal” é a expressão de origem italiana que
“[...] surgiu com o objetivo de crítica ao sistema punitivo,
remontando aos escritos de Cesare Beccaria (1974). Na épo-
ca, foi uma ousadia escrever “Dos delitos e das penas”, que
retratava a necessidade de uma reforma no sistema criminal
vigente naquele período histórico.” (CIT, 2010, p. 233).
Contudo, é por meio dela que se traça a finalidade do
direito penal e deve estar atrelada a este e a criminologia.
Assim, Beccaria critica o exercício do poder punitivo e
ressalta que o método de punição a ser escolhido deve ser
aquele que melhor sirva ao interesse público maior, o bem
estar social, visto que para ele o propósito de punição é
a criação de uma sociedade cada vez melhor e não, tão
somente, a vingança. Além disso, a punição deve ter dois
objetivos: impedir que os indivíduos cometam crimes e
impedir a reincidência criminal (CIT, 2010, p. 233).
Segundo Heleno Cláudio Fragoso, conceitua-se a Polí-
tica Criminal como o conjunto de princípios que orientam
as ações da justiça criminal, no momento da elaboração e
da aplicação das leis e apresenta como finalidade a investi-
gação dos elementos “[...] mais adequados para o controle
da criminalidade, valendo-se dos resultados que propor-
ciona a criminologia, inclusive através da análise e crítica
do sistema punitivo vigente.” (FRAGOSO, 2004, p. 23).
Dessa feita, o objetivo da Política Criminal é dar res-
posta para os problemas criminais, logicamente, inserida
no contexto social. É a ciência do ser que percorre criar
estratégias para a diminuição da violência. De acordo com

329
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

a Política Criminal brasileira, “[...] as penas privativas de


liberdade constituem o centro da política penal e a forma
principal de punição, as penas restritivas de direitos fun-
cionam como substitutivas da privação de liberdade, as
penas de multa são, em regra, cominadas em forma cumu-
lativa ou alternativa à privação de liberdade.” (SANTOS,
2014, p. 482).
Os regimes de execução das penas privativas de liber-
dade, sob forma de reclusão ou detenção, nos regimes
fechado, semiaberto ou aberto, podem ser definidos pelo
artigo 33, §1º do Código Penal. No entanto, a progressão
de regime estabelecida pelo artigo 112 da Lei de Execução
Penal (LEP), “[...] representa a passagem do preso de re-
gime de maior rigor para regime de menor rigor punitivo,
após o cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena
do regime anterior e o bom comportamento carcerário
comprovado pelo Diretor do estabelecimento, mediante
decisão judicial motivada precedida de manifestação do
Ministério Público e a Defesa.” (SANTOS, 2014, p. 485).
A Lei 10.792/2003 trouxe alterações substancias à reda-
ção do artigo 112 da LEP. Buscou-se, diminuir a esfera de
atuação da Comissão Técnica de Classificação no cenário
da progressão de regime. Inclusive, pertencia a ela pro-
por as progressões e regressões de regime, bem como as
conversões. Embora, o Código Penal não foi modificado,
e continua a mencionar a necessidade de se avaliar o mé-
rito do condenado para a progressão, bem como o exame
classificatório continuará a ser feito no início da execução,
assim como o exame criminológico, submetido à Comis-
são Técnica de Classificação.
Outrossim, o livramento condicional também necessita
da avaliação do merecimento, através de atestado de boa

330
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

conduta carcerária, como, se necessário a formação do


convencimento do magistrado, pelo exame criminológico,
privilegiando-se o princípio constitucional de individuali-
zação executória da pena. Ademais, outra medida é a de-
tração que consiste na contagem no tempo da pena pri-
vativa de liberdade e da medida de segurança do período
em que o condenado, ficou detido em prisão provisória,
no Brasil ou no exterior, bem como do tempo de prisão
bem como no tempo de prisão administrativa e o de inter-
nação em hospital de custódia e tratamento, previsto no
Código Penal.
Com efeito, pode-se verificar que a progressão de regi-
me, o livramento condicional e a detração, utilizadas pela
Política Criminal brasileira como incentivo para a ressocia-
lização, acarretam em desvantagens para o Estado, pois
reduzem os custos do agente criminoso, fazendo com que
ele disponha de incentivos para cometer crimes. Em ou-
tras palavras, os benefícios carcerários concedidos pela
Política Criminal durante a execução da pena, como um
suposto benefício para o bom comportamento carcerário,
reduz a eficiência do Estado justamente na prevenção da
criminalidade. Logo, a Política Criminal brasileira não se
constitui como um programa de controle da criminalidade,
mas como um incentivo para a sua prática.
O combate eficiente dos crimes contra o Sistema Fi-
nanceiro Nacional e de Lavagem de Dinheiro aumenta a
credibilidade nas instituições, amplia a confiança no direi-
to e nas Leis, além de contribuir para o fortalecimento do
Estado Democrático de Direito através do combate mais
efetivo dos crimes de Lavagem de Dinheiro e contra o
Sistema Financeiro Nacional. Nessa situação, para comba-
ter tais crimes no Brasil, demanda uma reformulação da

331
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Política Criminal brasileira, sem necessariamente modificar


os direitos e garantias fundamentais do investigado ou do
réu, expressos pela Constituição Federal de 1988.
Diante disso, para combater de forma eficiente os cri-
mes contra o Sistema Financeiro Nacional e de Lavagem
de Dinheiro, pode ser efetuada por meio do aumento dos
custos do agente criminoso, através da elevação da pena
e da redução dos benefícios no cumprimento da pena.
Ainda, a aplicação da Análise Econômica do Direito e da
Teoria dos Jogos, contribuem para o aumento da proba-
bilidade de fracasso das ações criminosas, pois viabilizam
uma “troca” de proporções entre os custos e a probabili-
dade de fracasso, como já foi explícito no tópico anterior,
pela Equação da Utilidade.
Sendo assim, a Análise Econômica do Direito e a Teo-
ria dos Jogos, revelam-se instrumentos adequados e lícitos
que possibilitam a capacidade de raciocinar estrategica-
mente, podendo ser utilizados como meios menos onero-
sos de obtenção de provas, sem comprometer os direitos
e garantias fundamentais do investigado ou do réu. Isso é
possível porque esses instrumentos não apenas reduzem
os incentivos que o agente criminoso detêm para delin-
quir, como também reduz os custos do Estado com a re-
preensão de crimes dessa natureza, uma vez que reforçam
o benefício positivo, através da redução de pena ou multa,
fazendo com que os próprios agentes tenham incentivos
para contribuir voluntariamente com as investigações.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do presente artigo, pode-se constatar as falhas,
equívocos e inconsistências da Lei 7.492/1986, que define
os crimes contra o Sistema Financeiro Nacional. Portanto, o

332
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Brasil encontra-se mal dotado de instrumentos legais com


efetividade e rigor para fiscalizar o sistema financeiro brasi-
leiro e inibir as práticas irregulares, com poder de coibir e
punir. Os “crimes de colarinho branco” afrontam a ordem
econômica, isto é, um bem jurídico tutelado pelo Estado. A
proteção da ordem econômica é necessária, pois refere-se
ao interesse de toda coletividade, de tal forma que a socie-
dade desenvolve-se a partir de uma economia devidamente
estruturada. Desse modo, não há um país desenvolvido sem
um bom sistema financeiro, o que implica também que não
há país nessa situação sem um bom sistema legal e judicial.
Além disso, a internacionalização do setor financeiro
favoreceu o desenvolvimento de um mercado global do
crime. A estrutura deste setor é um complexo formado
por diversas instituições financeiras. Logo, as instituições
financeiras no Brasil, compõem um dos setores mais vi-
sados pelas organizações criminosas para realização de
operações de lavagem de capitais. Acerca disso, os crimes
contra o Sistema Financeiro Nacional e de Lavagem de
Dinheiro afetam significativamente a credibilidade do país,
a confiança no mercado e a capacidade do Estado imple-
mentar políticas públicas.
No Brasil, o montante advindo da Lavagem de Dinheiro
possibilita a corrupção de diversos profissionais e servi-
dores, não sendo incomum que os lavadores sejam pro-
prietários de banco, utilizando-se da propriedade para fins
criminosos. Desse modo, provocam um abalo as estruturas
econômicas e sociais, além da segurança e a soberania do
Estado. Por esse motivo, torna-se necessário combater tal
criminalidade, porém, não se pode fazê-la sem observar
os valores financeiros envolvidos. Daí que exsurge a Aná-
lise Econômica do Direito e a Teoria dos Jogos.

333
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Foi possível evidenciar que os meios de obtenção de pro-


vas utilizados no Brasil para combater os crimes contra o
Sistema Financeiro Nacional e de Lavagem de Dinheiro, de-
mandam elevados custos para o Estado. Não obstante, os
métodos utilizados pela Política Criminal brasileira acarretam
em desvantagens para o Estado, visto que o custo para o
agente praticar o delito é baixo e a probabilidade do crime
ser descoberto é reduzida, dada a complexidade de crimes
dessa natureza, que torna extremamente difícil a rastreabili-
dade do dinheiro e a descoberta da autoria pelos métodos
tradicionais de investigação. Contudo, a Política Criminal bra-
sileira não se constitui como um programa de controle da cri-
minalidade, mas como um verdadeiro incentivo a sua prática.
Comprovou-se que a aplicação da Análise Econômica
do Direito e a Teoria dos Jogos, podem ser utilizados como
meios menos onerosos de obtenção de provas, a partir da
compreensão da lógica da situação em que os agentes
criminosos estão envolvidos, o que auxilia a aprimorar a
capacidade de raciocinar estrategicamente, além de que,
não comprometem os direitos e garantias fundamentais do
investigado ou do réu.
A partir do exposto, chega-se a uma resposta afirmativa
para o problema de pesquisa do artigo, a Análise Econô-
mica do Direito e da Teoria dos Jogos são instrumentos
menos onerosos de obtenção de prova, isso é possível
porque não apenas reduzem os incentivos que o agente
criminoso detêm para delinquir, como também reduz os
custos do Estado com a repreensão de crimes dessa natu-
reza, uma vez que reforçam o benefício positivo, através
da redução de pena ou multa, fazendo com que os pró-
prios agentes tenham incentivos para contribuir volunta-
riamente com as investigações.

334
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

REFERÊNCIAS
BENTHAM, Jeremy. Uma introdução aos princípios da moral e
da legislação. Tradução de Luiz João Baraúna. São Paulo: Editora
Abril, 1974.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.
htm>. Acesso em: 01 nov. 2019.
______. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Có-
digo Penal. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 31 dez. 1940.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/
del2848compilado.htm>. Acesso em: 08 nov. 2019.
______. Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986. Define os crimes con-
tra o sistema financeiro nacional, e dá outras providências. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 18 jun. 1986. Disponível em: <http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7492.htm>. Acesso em: 10
nov. 2019.
______. Lei nº 9.613, de 03 de março de 1998. Dispõe sobre os cri-
mes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; a pre-
venção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos
nesta Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras
– COAF, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília,
DF, 04 mar. 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/LEIS/L9613.htm>. Acesso em: 14 nov. 2019.
______. Lei nº 10.792, de 1º de dezembro de 2003. Altera a Lei no
7.210, de 11 de junho de 1984 - Lei de Execução Penal e o Decreto
-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal
e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 02
dez. 2003. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
leis/2003/l10.792.htm>. Acesso em: 14 nov. 2019.
______. Lei nº 12.683, de 9 de julho de 2012. Altera a Lei nº 9.613/1998,
para tornar mais eficiente a persecução penal dos crimes de lava-

335
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

gem de dinheiro. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 jul. 2012a.


Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-
2014/2012/Lei/L12683.htm>. Acesso em: 14 nov. 2019.
CIT, Franciele. Tendências da Política Criminal no Estado Democrá-
tico de Direito Brasileiro: enfoque minimalista consubstanciado
na Constituição de 1988. Revista da Esmesc, [S. l.], v. 17, n. 23,
p. 231-258, 2010. Disponível em: <https://bit.ly/2NzBjun>. Acesso
em: 15 nov. 2019.
CÔRREA LIMA, Sérgio Mourão. Análise jurídica da economia. Re-
vista de Direito Mercantil Econômico e Financeiro, [S. l.], v.
159/160, p. 53-86, 2012.
COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda; LOPES JÚNIOR; MORAIS DA
ROSA, Alexandre. Delação premiada no limite: a controvertida
justiça negocial made in Brazil. Florianópolis: EMais, 2018.
FIANI, Ronaldo. Teoria dos Jogos: com aplicações em economia, ad-
ministração e ciências sociais. 3. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: parte geral. Atu-
alizador: Fernando Fragoso. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
GICO JÚNIOR, Ivo. Introdução ao Direito e Economia. Análise Eco-
nômica e Direito Comparado. In: TIMM, Luciano Benetti (Org.).
Direito e Economia no Brasil. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
GODOI, Jivago Silva Calado de. O utilitarismo de Jeremy Bentham
e Stuart Mill: articulações, problemas e desdobramentos. 2017.
37f. Monografia (Graduação em Filosofia) – Universidade Federal
da Paraíba, João Pessoa, 2017. Disponível em: <https://reposito-
rio.ufpb.br/jspui/bitstream/123456789/4038/1/JSCG31102017.pdf>.
Acesso em: 18 nov. 2019.
JARDIM, Tiago Neu. A Dimensão Normativa da Argumentação:
contribuições da Análise Econômica do Direito e elementos para
uma teoria da decisão. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017.
LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 4. ed. Salva-
dor: JusPodivm, 2016.

336
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal. 12. ed. São Paulo:
Saraiva, 2015.
MILL, John Stuart. A Liberdade/Utilitarismo. São Paulo: Martins Fon-
tes, 2000.
MONTEIRO, Renato Leite. Análise Econômica do Direito: uma visão
didática. São Paulo, 2009. Disponível em: <http://www.publica-
direito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/sao_paulo/2425.
pdf>. Acesso em: 20 nov. 2019.
PARREIRA, Liziane; BENACCHIO, Marcelo. Da análise econômica do
Direito para a análise jurídica da Economia: a concretização da
sustentabilidade. Prisma Jurídico, São Paulo, v. 11, n. 1, p. 179-
206, jan./jun. 2012. Disponível em: <https://periodicos.uninove.
br/index.php?journal=prisma&page=article&op=view&path%5B%-
5D=4031&path%5B%5D=2459>. Acesso em: 16 nov. 2019.
SANTOS, Juarez Cirino dos. Direito Penal: parte geral. 6. ed. Curitiba:
ICPC Cursos e Edições, 2014.
TALAMINI, Eduardo. Prova emprestada no processo civil e penal. Re-
vista de informação legislativa, Brasília, v. 35, n. 140, p. 145-
162, out./dez. 1998.
TIMM, Luciano Benetti. Direito e economia do Brasil. 2. ed. São
Paulo: Atlas, 2014.
VARGAS, Juliano; HERSCOVICI, Alain. A tragédia dos Commons Revi-
sitada: uma análise crítica. Análise Econômica, Porto Alegre, ano
35, n. 67, p. 105-128, mar. 2017. Disponível em: <https://seer.ufrgs.
br/AnaliseEconomica/article/view/54987>. Acesso em: 15 nov. 2019.

337
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO E SISTEMA


DE PREVIDÊNCIA

Ariê Scherreier Ferneda79,


Danna Catharina Mascarello Luciani80 e
Miriam Olivia Knopik Ferraz81

Resumo: O presente artigo tem como objetivo avaliar a ne-


cessidade de aplicação prévia dos conceitos da Análise Eco-
nômica do Direito para garantia da eficiência na proteção
dos indivíduos que dependem da Previdência para supera-
ção dos riscos sociais a que estão sujeitos. Para isso, parte-
se do pressuposto que a eficiência é alcançada quando não
for possível alcançar o mesmo resultado empregando menos
recursos e quando não for possível alcançar melhores resul-
tados com a mesma quantidade de recursos empregados.
Dessa forma, a Análise Econômica do Direito será pautada
na compreensão das consequências das legislações correla-
tas com a Previdência Social, na eficiência da norma e os
impactos econômicos para o INSS, para o Poder Judiciário
e para os beneficiários. A partir do método lógico-dedutivo,
obteve-se a conclusão de que os pressupostos da Análise
Econômica do Direito podem contribuir para a formação de
um Sistema de Previdência que observe a realidade de escas-
sez e necessária materialização de direitos.
79 Graduanda na Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Membro do Grupo de Estudos de
Análise Econômica do Direito. Pesquisadora de Iniciação Científica 2019-2020. ariefernedaxx@
gmail.com
80 Graduanda na Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Membro do Grupo de Estudos de
Análise Econômica do Direito. dannacml@hotmail.com
81 Doutoranda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná- Brasil (bolsista PROSUP),
Mestre e Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná- Brasil. Especialista
em Direito Constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional. Editora Adjunta da
Constituição, Economia e Desenvolvimento: Revista da Academia Brasileira de Direito Constitucio-
nal. Coordenadora Adjunta do Grupo de Estudos em Análise Econômica do Direito da Pontifícia
Universidade Católica do Paraná- Brasil. Professora da Universidade Positivo e da UNIFACEAR.
Advogada. m.okf@hotmail.com.

338
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Palavras-chave: INSS; Benefícios; Escassez; Recursos;


Análise Econômica.

INTRODUÇÃO
As alterações realizadas periodicamente no sistema ju-
rídico-previdenciário buscam a maximização dos recursos
investidos na Seguridade Social, que são provenientes da
contribuição direta (por meio da contribuição social) ou in-
direta (por meio de tributos) e que devem ser aplicados sob
a ótica dos princípios da Universalidade e da Solidarieda-
de. Essas alterações, entretanto, preferenciam a análise dos
efeitos a curto prazo, pautando-se na escassez dos recursos
para justificar alterações que ferem direitos expectados.
Propõe-se, a partir disso, a aplicação – anterior às al-
terações legislativas – da Análise Econômica do Direito
(AED) para garantia da eficiência do sistema. Para isso,
descreve-se o sistema da seguridade, com foco na Previ-
dência Social, e, após análise das reformas constitucionais
promovidas, pretende-se demonstrar a aplicação dos con-
ceitos da AED no direito previdenciário.

SEGURIDADE: PANORAMA GERAL DA


PREVIDÊNCIA SOCIAL
A implementação de políticas públicas de segurança social
deriva da necessidade de o Estado proteger o cidadão dos
riscos sociais (doença, acidente, desemprego, idade, etc.) –
ou, pelo menos, de reduzir os efeitos destes na vida do in-
divíduo, preservando condições dignas de subsistência em
meio a tais adversidades e garantindo segurança econômi-
ca (SAVARIS, GONÇALVES, 2018, p. 27). Essa implementa-
ção depende do investimento de recursos públicos (em sua
maioria provenientes de tributos) em setores específicos.

339
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Uma das políticas públicas previstas no Estado Brasileiro


é a Seguridade Social – prevista no artigo 194 da Constitui-
ção da República – que pode ser definida como um siste-
ma complexo pelo qual a Administração Pública exercita
o princípio da solidariedade com a distribuição de bens e
serviços àqueles que necessitam (PERSIANI, 2008, p. 48).
A Seguridade se expressa pela Assistência, Saúde e
Previdência, em um sistema de conexões pelo qual esses
direitos se complementam em prol do fortalecimento da
“rede solidária de proteção aos riscos sociais, organizada
pelo Estado e patrocinada por toda a sociedade” (ROCHA,
SAVARIS, 2019, p. 24).
A Previdência Social atua em favor dos segurados que
se encontram em situações impeditivas ao trabalho, seja
temporária seja definitivamente, e à percepção de rendi-
mentos (VIANNA, 2014, p. 65), em caso de prisão, por
exemplo. Ou seja, os benefícios previdenciários têm a fi-
nalidade de garantir a subsistência do segurado quando
não lhe é possível fazê-lo por conta própria.
Ainda, constitui-se em um seguro social compulsório
e contributivo (KERTZMAN, 2014, p. 10). É compulsório
pois independe da vontade do particular de integrá-lo,
contando com a força estatal para sua cobrança em caso
de descumprimento da obrigação (decorrente da caracte-
rização da contribuição social como tributo, cuja destina-
ção é prevista constitucionalmente), isto é, sua finalidade
é determinada constitucionalmente, integrando, assim, a
definição constitucional do tributo (VIANNA, 2010, p. 90).
Assim, denota-se que os recursos oriundos das contribui-
ções previdenciárias devem ser destinados exclusivamente
à manutenção das prestações do seguro social (TAVARES,
2012, p. 245).

340
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Além disso, é contributivo em decorrência da necessi-


dade (derivada da ideia de que todos os direitos implicam
em deveres correlatos) de toda a sociedade, direta ou indi-
retamente, financiar esse sistema, nos termos do artigo 195
da Constituição da República. Ou seja, as fontes do custeio
da previdência são oriundas das contribuições sociais e
das receitas do Poder Público (IBRAHIM, 2008, p. 199).
O financiamento direto é realizado pela própria socie-
dade, por meio das contribuições sociais, constitucional-
mente previstas. Em contrapartida, o financiamento indire-
to ocorre por intermédio dos orçamentos fiscais da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (TSU-
TIYA, 2008, p. 60). Em caso de déficit na receita obtida
pelas fontes de contribuições sociais, entre outras medidas
cabíveis, a Lei nº 8212 de 1991 dispõe sobre a instituição
do Plano de Custeio e prevê, em seu art. 16, que a União
será responsável pela cobertura de “eventuais insuficiên-
cias financeiras da Seguridade Social”. (BRASIL, 1991, s.p.)
Esse seguro é regido, entre outros, pelo princípio da
solidariedade social, pela qual o indivíduo, reconhecendo-
se como pertencente a uma coletividade, pondera sobre
os reflexos sociais de suas escolhas, de modo a otimizar a
maximização dos interesses coletivos, priorizando a assis-
tência recíproca (DURKHEIM, 1999). Quando essa postura
não é adotada voluntariamente pelo indivíduo, pode ser
construída e estimulada por meio da força normativa, a fim
de promover a comunhão das atitudes estatais e privadas
no sentido do bem comum (KERTZMAN, 2014, p. 12-13).
Percebe-se, assim, que o custeio da previdência social
decorre da cooperação entre a sociedade e o Estado, que
se solidarizam em favor daqueles que estão impossibilita-
dos, temporária ou definitivamente, de prover o seu sus-

341
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

tento próprio, os quais são denominados de beneficiários,


os quais figuram como sujeitos ativos da relação jurídico
-previdenciária. (VIANNA, 2010, p. 414)
Ademais, apenas a União detém a competência para
legislar sobre a seguridade social, de acordo com o art. 22,
inciso XXIII, da CRFB, bem como de instituir contribuição
social, com base no art. 149 da CRFB. Os demais entes fe-
derativos legislam de maneira cumulativa com a União, de
modo a instituir contribuição de previdência e assistência
social apenas em relação aos seus servidores. (TAVARES,
2012, p. 246)
Não obstante, cumpre ressaltar que o direito à seguran-
ça social é um direito humano, previsto junto art. 22 da
Declaração Universal dos Direitos do Homem82. Sendo um
direito fundamental, percebe-se, portanto, que os particu-
lares (obrigatoriamente) financiam a atuação do Estado,
de quem exigem uma postura positiva – que decorre de
direitos fundamentais de segunda geração –, no sentido de
intervenção para garantir ao cidadão que dele precisar as
condições mínimas para continuidade da vida em socieda-
de, observando os limites decorrentes da disponibilidade
de recursos econômicos (DIAS, MACÊDO, 2012, p. 71).
Considerando esses limites, Gilmar Mendes e Gustavo
Branco (2013, p. 608) pontuam que “gastar mais recursos
com uns do que com os outros envolve, portanto, a adoção
de critérios distributivos para esses recursos”. Desse modo,
deve-se levar em conta a reserva do possível e a escassez
de recursos, bem como a necessidade de se fazerem esco-
lhas alocativas. Assim, para garantir a efetivação dos direitos

82 Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente
exigir a satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço
nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os recursos de cada país
(DUDH, 1948).

342
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

sociais, é necessária a atuação positiva do Estado na medida


em que demanda o dispêndio de recursos públicos.
Cumpre ressaltar também que eventuais alterações le-
gislativas no que tange à previdência devem, necessaria-
mente, observar os limites impostos a alteração de direitos
fundamentais – uma ver que o direito à seguridade social
é um direito fundamental social tutelado pelos princípios
constitucionais. Assim, quando certo grau de realização ou
estabilização é alcançado, esse direito passa a ser considera-
do uma garantia institucional e um direito subjetivo (DIAS,
MACÊDO, 2012, p. 123). A não observância dessa limitação
pode acarretar em violação do princípio do não retrocesso.
Desse modo, observa-se a existência de um pacto de
confiança entre o Poder Público e a sociedade que, se
“quebrado por contingências meramente circunstanciais
[...] pode gerar verdadeira ruptura na sustentação de um
sistema público de previdência”. (CORREIA, CORREIA,
2010, p. 103). Portanto, caso o Estado não ofereça meios
capazes de efetivar os direitos que por ele são garantidos,
não há como sustentar uma sociedade desacreditada em
relação ao sistema público previdenciário.
Além disso, o alto volume de reformas (realizadas sem
a correta observância dos limites formais, materiais e mo-
rais), além da quebra de confiança, pode levar ao descré-
dito no sistema previdenciário (IBRAHIM, 2008, p. 2000),
mesmo que objetive a correção de problemas. Desse
modo, considerando que a previdência social diz respeito
à proteção social, não há como excluir o destinatário da
norma de sua formação, sob o risco de descrédito do sis-
tema previdenciário.
Cumpre ressaltar, ainda, que eventuais alterações le-
gislativas no que tange à previdência devem, necessaria-

343
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

mente, observar os limites impostos a alteração de direitos


fundamentais. Desse modo, passa-se à análise das refor-
mas constitucionais83 promovidas desde a promulgação da
Constituição da República e instituídas por meio de Emen-
das Constitucionais.
A Emenda Constitucional nº 3, de 1993, alterou os arts.
40, 42, 102, 103, 155, 156, 160, 167 da Constituição da
República, voltando-se aos trabalhadores do setor público
ao dispor que “as aposentadorias e pensões dos servidores
públicos federais serão custeadas com recursos provenien-
tes da União e das contribuições dos servidores”. (BRASIL,
1993, s.p.)
Por sua vez, a EC nº 20, de 1998, modificou o sistema
de previdência social, de modo que estabeleceu normas
de transição fixando idade e período de contribuição mí-
nima para aposentadoria, sendo sessenta anos de idade e
trinta e cinco de contribuição, se homem, e cinquenta e
cinco anos de idade e trinta de contribuição, se mulher;
bem como sessenta e cinco anos de idade, se homem, e
sessenta anos de idade, se mulher, com proventos propor-
cionais ao tempo de contribuição. (BRASIL, 1998, s.p.)
A EC nº 41, de 2003, estabeleceu que para o cálculo dos
proventos de aposentadoria, por ocasião da sua conces-
são, serão consideradas as remunerações utilizadas como
base para as contribuições do servidor aos regimes de pre-
vidência. (BRASIL, 2003, s.p.)
Ainda, dois anos após, a EC nº 47, de 2005, beneficiou
trabalhadores de baixa renda e aqueles sem renda própria
que se dediquem exclusivamente ao trabalho doméstico
no âmbito de sua residência, desde que pertencentes a fa-

83 Destaca-se, no entanto, que as alterações promovidas por meio de legislação infraconstitucionais


não foram analisadas.

344
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

mílias de baixa renda, garantindo-lhes acesso a benefícios


de valor igual a um salário-mínimo. (BRASIL, 2005, s.p.)
A EC nº 70, de 2012, por outro lado, estabeleceu crité-
rios para o cálculo e a correção dos proventos da aposen-
tadoria por invalidez dos servidores públicos que ingres-
saram no serviço público até a data da publicação da EC
nº 41 de 2003. (BRASIL, 2012, s.p.)
Em 2015, a EC nº 88 ampliou de 70 para 75 anos a ida-
de estabelecida para aposentadoria compulsória. (BRA-
SIL, 2015, s.p.) Por fim, em 2019, a EC nº 103 (BRASIL,
2019, s.p.) introduziu diversas mudanças, dentre as quais
podem-se citar: idade mínima para se aposentar de 65
anos e 35 anos de contribuição, se homem; 62 anos de
idade e 30 de contribuição, se mulher; estabelecendo re-
gras de transição.
Assim, conforme demonstrado, sazonalmente a previ-
dência social sofre alterações substanciais, que objetivam
melhorar as expectativas a longo prazo, maximizando a
utilização dos recursos disponíveis, mas acabam por mini-
mizar os direitos expectados e colocar em risco a seguran-
ça jurídica de todo o sistema, o que acarreta no aumento
dos custos de oportunidade.
Ainda, partindo-se da premissa de que “a Previdência
também é movida por sua racionalidade e visa maximizar
o seu interesse pessoal” (FLORIANI NETO; GONÇALVES,
2014, p. 586), é essencial a análise das consequências (so-
ciais e financeiras) decorrentes das posturas adotadas pelo
Poder Público, por meio de uma análise econômica posi-
tiva, explicitando os excessos e acertos deste para maxi-
mização dos recursos financeiros aplicados e dos efeitos
sociais almejados.
Sendo assim, as alterações legislativas e jurisprudenciais

345
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

acerca da Previdência Social pressupõem a aplicação pré-


via dos conceitos da Análise Econômica do Direito como
será demonstrado a seguir.

ANÁLISE ECONÔMICA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL:


A GARANTIA DE EFICIÊNCIA DA PROTEÇÃO SOCIAL
A Análise Econômica do Direito (AED), cuja origem re-
monta à década de 1960, busca o instrumentalismo ju-
rídico e consiste em um “método consequencialista de
compreensão das normas jurídicas a partir dos efeitos que
elas geram na sociedade” (GONÇALVES; BONAT, 2018, p.
388). Da mesma forma, filiando-se ao aludido método, a
AED busca explicar o direito com base na teoria econômi-
ca, dispondo de instrumentais teóricos presentes na micro-
economia. (ANDRIGHETTO, 2013, p. 78-79)
Nada obstante, a partir da Análise Econômica entende-se
que as regras que regem a sociedade devem ser desenvolvi-
das, aplicadas e alteradas com base em suas consequências
no mundo real. (GICO JR. 2011, p. 18) Assim, surge a neces-
sidade de uma análise pautada em ideais econômicos para
garantia do cumprimento eficiente das obrigações estatais
assumidas no que tange a Previdência Social.
Assim, cabe, inicialmente, abordar alguns postulados da
AED, quais sejam: a escassez de recursos; os custos de
oportunidade; a conduta dos agentes como racional maxi-
mizadora; o fato de que pessoas respondem a incentivos
(GICO JR., 2010, p. 20-21). Da escassez de recursos decor-
re a necessidade da promoção de escolhas, que devem ser
realizadas com parcimônia, em especial ao serem conside-
rados os custos de oportunidade. Ou seja, o fato de que a
escolha por uma alternativa trará necessariamente o custo
da abdicação de outra. Além disso, deve-se partir da pre-

346
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

missa de que a conduta dos agentes é racional maximiza-


dora dos interesses, e que esses respondem a incentivos.
Por sua vez, as fontes de custeio da Previdência So-
cial, conforme citado anteriormente, são repartidas entre
o Poder Público e os particulares, logo, “há claramente
uma repartição de responsabilidades constitucionalmen-
te estipuladas, de forma que sociedade e Estado devem
contribuir para a existência e a manutenção da seguridade
social”. (FLORIANI NETO; GONÇALVES, 2014, p. 570-571)
Com isso, os cidadãos acabam por centralizar na figura
estatal a competência de realizar escolhas de modo a ma-
ximizar interesses. Quando o Estado é o agente que pro-
move as escolhas, esse deve ponderar (além dos aspec-
tos intrínsecos à AED) os princípios constitucionais que
restringem a atuação estatal em prol da maximização dos
interesses dos cidadãos.
Dentre esses princípios está o da eficiência, previsto no
caput do art. 37 da Constituição da República, e que pode en-
contrar sua definição no conceito utilizado por Cooter e Urlen
(2010, p. 14), para quem a eficiência é alcançada quando não
for possível atingir o mesmo resultado empregando menos re-
cursos e quando não for possível alcançar melhores resultados
com a mesma quantidade de recursos empregados.
Esse conceito deve ser utilizado em alinhamento com o
proposto por Galdino (2005, p. 241), para quem a eficiência
ocorre com a máxima efetivação dos direitos fundamentais,
com a aplicação mais adequada dos recursos disponíveis,
respeitados os limites éticos e morais da sociedade. Com
isso, a economia deixa de ser argumento apenas para a
negativa da concretização dos direitos, e passa a alcançar
o posicionamento mais abrangente, para maximização dos
efeitos destes (RIBEIRO, CAMPOS, 2012, p. 325)

347
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Desse modo, a eficiência é alcançada quando o resul-


tado (no caso da previdência, predominantemente social)
é elevado ao seu máximo, ampliando os efeitos positivos
dos investimentos realizados.
Ademais, ressalta-se que o § 4º do art. 195 estipulou
a possibilidade de outras fontes de custeio direcionadas
à manutenção e expansão da seguridade social, por lei.
Isto é, a partir do momento em que a alteração legislativa
definir atuações que dependem de recursos, esta deve-
rá, considerando o contexto de escassez, prever fontes de
custeio84, mesmo que alternativas, para suprir esses acrés-
cimos e garantir o cumprimento do previsto na legislação,
respeitando a segurança jurídica.
Desse modo, faz-se necessária a análise dos custos dos
direitos, considerando que garantir direitos é distribuir
recursos, entretanto, esses são escassos. Nesse sentido, a
título de exemplo, em dezembro de 2017, a Previdência
Social mantinha pouco mais de 34,3 milhões de benefícios
ativos, sendo que 85% eram previdenciários (aproximada-
mente 29 milhões), 13,6% assistenciais e 2,3% acidentários.
(BRASIL, 2017, p. 275) No mesmo período, o valor dos
benefícios alcançou os R$ 45,5 bilhões, o que representou
um aumento de 9,5% em relação a dezembro do ano an-
terior (2016). (BRASIL, 2017, p. 275)
Não obstante, de acordo com a Projeção de População
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
em 2060 o volume da população brasileira começará a
diminuir gradualmente, até atingir os 228,3 milhões (em
dezembro de 2019 a população brasileira atinge a marca
de 210.837.614). (BRASIL, 2018, s.p.)
Ademais, no ano de 2060, o IBGE prevê que “um quarto
84 Sobre a natureza tributária das contribuições sociais, consulte: (FLORIANI NETO; GONÇALVES, 2014)

348
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

da população (25,5%) deverá ter mais de 65 anos”. Nesse


mesmo período, “o país teria 67,2 indivíduos com menos
de 15 e acima dos 65 anos para cada grupo de 100 pessoas
em idade de trabalhar (15 a 64 anos)”. (BRASIL, 2018, s.p.)
Sendo assim, a evolução demográfica aponta para uma
maior quantidade de beneficiários do sistema, recebendo
benefícios por maior período de tempo, em contraposi-
ção a menor quantidade de pessoas em idade contributi-
va. Percebe-se, assim, a necessidade de readequação, de
modo periódico, do sistema de Previdência Social para
garantir seu equilíbrio e a sua sustentabilidade no médio e
longo prazo. (BRASIL, 2016, s.p.)
Nada obstante a necessidade de readequação ou reformu-
lação do sistema previdenciário, há de se levar em conta os
custos dos direitos, em especial os sociais, no que tange aos
benefícios previdenciários, os quais representam o maior vo-
lume de “gastos”. Nesse sentido, não basta que o Estado pro-
clame meramente o reconhecimento formal de um direito.
Torna-se essencial, portanto, que, para além do simples
reconhecimento constitucional, o direito seja integralmen-
te respeitado e plenamente garantido. Isso deve ocorrer
especialmente nos casos em que o direito se qualifica
como “prerrogativa jurídica de que decorre o poder do
cidadão de exigir, do Estado, a implementação de presta-
ções positivas impostas pelo próprio ordenamento consti-
tucional”. (STF, 2000, s.p.).
Considerando que a limitação de recursos pressupõe a
realização de escolhas, surge, a partir dessas, a figura das
preferências e dos preteridos (WANG, 2008, p. 540). Com
base no princípio da inafastabilidade da jurisdição, pode
o preterido buscar na justiça a garantia de seu direito não
tutelado pelo Poder Executivo.

349
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Entretanto, com base no sistema de tripartição dos po-


deres, o Poder Judiciário não pode sobrepor suas decisões
às escolhas promovidas pelo Executivo, que pode valer-se
do argumento da reserva do possível para justificar suas
opções, pautando-se em critérios objetivos de diferencia-
ção entre indivíduos para demonstrar que a melhor esco-
lha foi realizada.
A reserva do possível, entretanto, não pode ser utiliza-
da de maneira indiscriminada, sem a ocorrência de justo
motivo objetivamente aferível, apenas com a finalidade de
evitar o cumprimento das obrigações constitucionais, prin-
cipalmente quando disso decorrer a anulação de direitos
fundamentais (BRASIL, STF, 2016, p. 11). Além disso, as
decisões jurídicas devem ponderar a possibilidade, inclusi-
ve financeira, de realização do direito, uma vez que “se os
recursos são escassos, nada que custe dinheiro pode ser
absoluto” (WANG, 2008, p. 563).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo demonstrou a necessária aplicação
da Análise Econômica do Direito para a compreensão do
sistema de previdência no Brasil. Para tanto verticalizou-se
a pesquisa no enfoque da eficiência para a proteção dos
indivíduos, sendo esta alcançada quando não for possível
alcançar o mesmo resultado empregando menos recursos
e quando não for possível alcançar melhores resultados
com a mesma quantidade de recursos empregados. De
forma conjunta analisa-se a compreensão das consequên-
cias das legislações e o impacto ao INSS, poder judiciário
e beneficiário.
A metodologia utilizada foi a lógico-dedutiva, por meio da
aproximação dos conceitos e premissas da seguridade social

350
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

com a Análise Econômica do Direito, e assim, subdividiu-


se o trabalho em dois tópicos: primeiramente abordou-se a
seguridade: panorama geral da previdência social, demons-
trando-se as premissas e estruturação do sistema, inclusive
as Emendas Constitucionais sobre o tema; e em um segun-
do momento abordou-se análise econômica da previdência
social como um mecanismo para a garantia de eficiência da
proteção social. Ademais, concluiu-se que os pressupostos
da Análise Econômica do Direito podem contribuir para a
formação de um Sistema de Previdência que observe a reali-
dade de escassez e necessária materialização de direitos.

REFERÊNCIAS
ANDRIGHETTO, Aline. Análise econômica do direito e algumas con-
tribuições. Revista de Direito Econômico e Socioambiental.
Curitiba, v. 4, n. 1, p. 76-91, jan./jun. 2013.
ARAÚJO, Israel Lacerda de. A tarifa social de energia elétrica: aper-
feiçoamentos, impactos e consideraçoes sobre técnica legislativa e
análise econômica do direito. Instituto Legislativo Brasileiro – ILB.
Conclusão de Curso de Pós Graduação Lato Sensu em Direito Le-
gislativo. Orientador: Dr. Rafael Silveira e Silva, 2016.
BIGOLIN, Giovani. O requerimento administrativo e o controle judi-
cial dos benefícios previdenciários. In: ROCHA, Daniel Machado
da. (Coord.). Temas Atuais de Direito Previdenciário e Assis-
tência Social. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 03 de 1993. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/
Emc/emc03.htm>. Acesso em: 10 dez. 2019.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 20 de 1998. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/
Emc/emc20.htm>. Acesso em: 10 dez. 2019.

351
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

BRASIL. Emenda Constitucional nº 41 de 2003. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/
Emc/emc41.htm>. Acesso em: 10 dez. 2019.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 47 de 2005. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/
Emc/emc47.htm>. Acesso em: 10 dez. 2019.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 70 de 2012. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/
Emc/emc70.htm>. Acesso em 10 dez. 2019.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 88 de 2015. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/
Emc/emc88.htm>. Acesso em: 10 dez. 2019.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 103 de 2019. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/
Emc/emc103.htm>. Acesso em: 10 dez. 2019.
BRASIL. Lei nº 8.212/1991. Disponível em <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/leis/l8212cons.htm> Acesso em: 10 dez. 2019.
BRASIL. Ministério da Fazenda. Instituto Nacional do Seguro Social.
Anuário Estatístico da Previdência Social. AEPS. Brasília, v. 24,
2017. Disponível em: <http://sa.previdencia.gov.br/site/2019/04/
AEPS-2017-abril.pdf>. Acesso em: 09 dez. 2019.
BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Projeção da
população do Brasil e das Unidades da Federação. Disponí-
vel em: <https://www.ibge.gov.br/apps//populacao/projecao/>.
Acesso em: 09 dez. 2019.
BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Projeção da
População 2018: número de habitantes do país deve parar de
crescer em 2047. 25/07/2018. Disponível em: <https://agenciade-
noticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-
noticias/releases/21837-projecao-da-populacao-2018-numero-de
-habitantes-do-pais-deve-parar-de-crescer-em-2047>. Acesso em:
09 dez. 2019.

352
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

BRASIL. Proposta de Emenda à Constituição nº 287/2016. Dispo-


nível em <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetra-
mitacao?idProposicao=2119881> Acesso em: 09 dez. 2019.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº
232335/RS. Relator: Ministro Celso de Mello; Decisão Monocrática;
j. em 01/08/2000.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº
956475/RJ. Relator: Ministro Celso de Mello; j. em 12/06/2016.
COOTER, Robert D.; ULEN, Thomas. Direito e Economia. Tradução:
Luís Marcos Sander, Francisco Araújo da Costa. 5 ed. Porto Alegre,
Bookman, 2010.
CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; CORREIA; Érica Paula Barcha. Cur-
so de Direito da Seguridade Social. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
DIAS, Eduardo Rocha; MACÊDO, José Leandro Monteiro de. Curso de
Direito Previdenciário. 3. ed. São Paulo: Método, 2012.
DURKHEIM, Émile. Da Divisão do Trabalho Social: Tradução de Edu-
ardo Brandão. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
FLORIANI NETO, Antonio Bazilio; GONÇALVES, Oksandro Osdival.
Leading case ARE no 664335 à luz da Análise Econômica do Direi-
to: aposentadoria especial versus precedência da fonte de custeio.
Pensar, Fortaleza, v. 19, n. 3, p. 559-593, set./dez. 2014.
GALDINO, Flávio. Introdução à Teoria dos Custos dos Direitos:
Direitos não nascem em árvores. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
GICO JR., Ivo T. Metodologia e Epistemologia da Análise Econômica
do Direito. Economic Analysis of Law Review, v. 1, n. 1, p. 7-32,
Jan-Jun, 2010.
GONÇALVES, Oksandro Osdival; BONAT, Alan. Análise Econômica do
Direito, incentivos fiscais e a redução das desigualdades regionais.
Revista Jurídica da Presidência. Brasília, v. 20 n. 121, p. 381-407,
jun./set. 2018.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 13. Ed.
Rio de Janeiro: Impetus, 2008.

353
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

KERTZMAN, Ivan. Guia Prático de Direito Previdenciário. 5. ed.,


São Paulo: Saraiva, 2014.
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de
Direito Constitucional. 9. Ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva,
2014.
MORENO FILHO, Ivo da Silva. Perícia Médica Jucial Previdenciária:
contexto crítico. In: BERWANGER, Jane Lucia Wilhelm. FOLMANN,
Melissa. Previdência Social nos 90 anos da Lei Eloy Chaves.
Curitiba, Juruá Editora: 2013. Pg.422.
O’SULLIVAN, Arthur; SHEFFRIN, Steven; NISHIJIMA, Marislei (revisora
e co-autora); tradutora Maria Lúcia G. L. Rosa. Introdução à eco-
nomia: princípios e ferramentas. São Paulo, Prentice Hall, 2004.
PERSIANI, Mattia. Direito da Previdência Social. Coordenação da
Tradução no Brasil: Wagner Balera. 14. ed. São Paulo: Editora
Quartier Latin do Brasil, 2008.
ROCHA, Daniel Machado da. SAVARIS, José Antonio. Direito Pre-
videnciário: Fundamentos de Interpretação e Aplicação. 2ª
Edição. Curitiba: Alteridade Editora, 2019.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. CAMPOS, Diego Caetano. Análise Eco-
nômica Do Direito E A Concretização Dos Direitos Fundamentais.
Revista de Direitos Fundamentais e Democracia. Curitiba, v.
11, n. 11, p. 304-329, jan./jun. 2012.
SAVARIS, José Antonio. GONÇALVES, Mariana Amelia Flauzino. Com-
pêndio de Direito Previdenciário. Curitiba: Alteridade Editora,
2018.
TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário: regime geral
de previdência social e regras constitucionais dos regimes próprios
de previdência social. 14. ed. rev. e atual. Niterói/RJ: Impetus, 2012.
VIANNA, Cláudia Salles Vilela. Previdência Social – Custeio e Bene-
fícios. 3. Ed. São Paulo: LTr, 2014.
VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de Direito Previdenciário.
3. Ed. São Paulo: Atlas, 2010.

354
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

DEPRESSÃO E ANSIEDADE: POLÍTICAS PÚBLICAS


PARA TRATAMENTO, EFEITO NUDGE
E APLICAÇÃO DA AED

Vagner França Florentino Junior85

Resumo: O presente artigo tem como objetivo analisar


os percentuais de pessoas com depressão e transtornos
de ansiedade de todo o Brasil, prezando pela análise dos
dados. Há alguns fatores que podem levar ao desenvolvi-
mento dessas condições como desemprego e políticas pú-
blicas mal direcionadas. Os fatores psicológicos também
são levados em consideração pois, os mesmos são os mais
agravantes nessas situações. Depressão e ansiedade são
conhecidas como uma das doenças mentais mais proemi-
nentes. Atualmente a depressão atinge 3,4% da população
mundial, o que totaliza 264 milhões de pessoas. Distúrbios
de ansiedade atingem 3,8% da população, o que totaliza,
então, 284 milhões de pessoas. Em ambas as situações, as
mulheres são mais afetadas. O Brasil possui 3,30% de sua
população com depressão e 6,73% com transtornos de an-
siedade, segundo dados da Our World in Data. Após essa
análise de dados, foi traçado uma correlação entre a aná-
lise econômica do direito (AED) e políticas públicas para
obter um enfoque maior sobre as pessoas que sofrem
de depressão e transtornos de ansiedade, abordando tam-
bém aspectos da economia social como o investimento de
instituições privadas para tratar de depressão e ansiedade
assim como melhoras na qualidade do ambiente de traba-
lho. Após analisados os gráficos e percentuais adquiridos,
foi feito um contraste sobres quais políticas públicas tem
85 Graduando em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC, Paraná

355
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

se destinado à saúde mental e a eficiência da mesma no


Brasil. Foi utilizada a interpretação e análise de Leonardo
Secchi sobre políticas públicas, como se deve diagnosticar
um problema e achar métodos para a solução, sejam elas
racionalistas ou argumentativas. O livro Nudge de Richard
Thaler também fornece luz para uma melhor interpretação
e um método de aplicação as políticas públicas. Também
foi observado se o dinheiro destinado a essas políticas é
suficiente e se abrangem todas as áreas possíveis de nossa
nação. A depressão e ansiedade também afetam o desem-
penho de diversos profissionais de diversas áreas. Foca-
mos em uma política pública na área educacional para a
redução dos índices apresentados. Utilizamos o feito Nud-
ge para modular uma escolha em um grupo de indivíduos
moldando sua ação para uma melhor tomada de decisão
que irá impactar efeitos a longo prazo. Fica a cargo então
das esferas jurídicas e dos direitos humanos e políticas
públicas de aplicar este modelo apresentado que se torna
mais eficientes para que se reduza significativamente o
índice de depressão e ansiedade no Brasil, trazendo assim
uma maior eficiência nas áreas prejudicadas por essas do-
enças. Deste modo foi possível analisar que, a depressão e
ansiedade comprometem drasticamente o desempenho e
eficiências de pessoas que atuam no mercado de trabalho,
isso afeta setores microeconômicos e macroeconômicos
sendo prejudiciais para empresas e para o país como um
todo. Por fim, concluiu-se que o efeito Nudge juntamente
com políticas públicas bem estruturadas e estratégicas po-
dem ajudar a diminuir os índices de depressão e ansieda-
de que se alastram por todo o país.
Palavras-chaves: análise econômica do direto; depres-
são; ansiedade; políticas públicas.

356
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

INTRODUÇÃO
Depressão e distúrbios de ansiedade podem ser con-
siderados, hoje em dia, uma das doenças mais comuns
em quase todas as faixas etárias. Depressão é caracteri-
zado por uma “perda de interesse e prazer nas atividades
habituais, pela diminuição da energia, com sensação de
cansaço, que leva a uma diminuição das atividades.”86 Ou-
tros sintomas podem ocorrer como “falta de concentração
e atenção; a baixa autoestima, sentimento de culpa ou
inutilidade, pessimismo, alterações de apetite e do peso
corporal, alterações no padrão do sono. As ideias e os
atos suicidas não são raros.”. Já o transtorno de ansiedade
e caracterizado como “preocupações, tensões ou medos
exagerados; sensação continua de que um desastre ou
algo ruim vai acontecer; preocupações exageradas com
saúde, dinheiro, família ou trabalho; medo extremo de al-
gum objeto ou situação em particular; medo exagerado
de ser humilhado publicamente; falta de controle sobre os
pensamentos, imagens ou atitudes, que se repetem inde-
pendentemente da vontade; pavor depois de uma situação
muito difícil.”87
Tanto depressão quanto transtornos de ansiedade são
doenças que podem vir a se tornar patológicas, isto é,
prejudicial ao nosso funcionamento psíquico (mental) e
somático (corporal). Isso impede milhares de pessoas de
construírem relações sociais88, isso é extremamente preju-
dicial aos mesmos.
Ambas as doenças afetam diversas áreas do indivíduo
86 MELLO, Marília de Souza. Glossário do ministério da saúde: Projeto de terminologia em saúde.
[S. l.]: Editora MS, 2004. Página 40.
87 Secretaria da saúde de Curitiba. Ansiedade (folder impresso)
88 Segundo Max Weber, a definição de relações sociais seria “o comportamento reciprocamente
referido quanto a seus conteúdos de sentido por uma pluralidade de agentes e que se orienta por
essa referência”

357
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

como por exemplo: relações sociais, saúde física, comuni-


cação, saúde mental, trabalho, autodesenvolvimento, efici-
ência em vários âmbitos de relações e eficiência no traba-
lho. A causa desses tipos de doenças são diversos, desde
fatores biológicos e psicológicos até sociais. Traumas na
infância podem levar a desencadear essas doenças, assim
como ambientes onde os horários e cobranças são abusi-
vos levam o indivíduo ao mesmo caminho.
Isso gera no final prejuízos para o indivíduo. Porem
olhando de uma visão econômica, isso traz prejuízos em
escala. O presente artigo tem como objetivo mostrar os
impactos de ambas doenças em quesitos econômicos, psi-
cológicos e no quesito de eficiência pensando a longo
prazo, e como as áreas dos direitos humanos e políticas
públicas poderia auxiliar em uma expressiva redução de
casos de depressão e ansiedade através das mesmas.
O presente artigo ficou subdividido em 4 pontos: I. Os
dados da depressão e do transtorno de ansiedade pelo
mundo. II. O Brasil, seus dados e uma breve análise sobre
políticas públicas. III. Abordagem no sistema educacional
juntamente ao efeito Nudge. IV. Considerações finais.

OS DADOS DA DEPRESSÃO E DO TRANSTORNO DE


ANSIEDADE NO MUNDO
Segundo a fundação Our World in Data89, a depressão
assola 3,4% da população de todo mundo. Isso totaliza em
torno de 264 milhões de pessoas que tem a convivência
da depressão ao seu lado. Os países têm uma ponderação
de 2% até 6% de sua população total com depressão. Esses
dados coletados são todos os que se tem conhecimento,
os que são diagnosticados.
89 <https://ourworldindata.org/>

358
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Analisando o infográfico acima90 podemos observar que


a média de percentual de pessoas com depressão, nos pa-
íses, é de 3% a 4,5%. Esses dados são de 2017, os dados
mais antigos disponíveis são de 1990 e não são muito dife-
rentes do presente gráfico. O país com maior índice de de-
pressão nesse gráfico é a Groelândia com 6,23%, porém,
a mesma possui uma população de 56.171 pessoas, esse
percentual representa 3.449 pessoas de sua população. Pa-
íses como Peru, Colômbia, Polônia, Romênia, Macedônia
dentre outros possuem os menores percentuais.
Não obstante a isso, o transtorno de ansiedade afeta
3,8% da população mundial. Isso equivale em 284 milhões
de pessoas. Porém o transtorno de ansiedade e bem mais
presente do que depressão em grandes partes do mundo,
tendo uma ponderação entre 2,5% até 7% da população
dos países computados.
90 <https://ourworldindata.org/mental-health#prevalence-of-depressive-disorders>

359
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

É perceptível, atraves do gráfico acima91, que o trastor-


no de ansiedade é bem mais presente do que depressão
em muitos países. Estado unidos, Brasil, Argentina, França
são só alguns dos países que possuem mais de 6% de sua
população com transtornos de ansiedade.
Para ambos os casos as mulheres acabam por sofrer
mais do que os homens. A depressão afeta 4,1% das mu-
lheres, já a ansiedade afeta 4,7%. Rotinas apuradas, dupla
jornada de trabalho, pressão social, influência de mídias
socias, educação, economia, renda percapta, segurança,
políticas públicas, isso tudo influencia nesses percentuais.

O BRASIL, SEUS DADOS E AS POLÍTICAS PÚBLICAS


Partimos então para os dados do Brasil. Nosso país pos-
sui o terceiro maior índice da América latina tanto em

91<https://ourworldindata.org/mental-health#prevalence-of-anxiety-disorders>

360
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

depressão quanto ansiedade. Perdemos apenas para a Ar-


gentina e Chile porém vale lembrar que ambos os países
são menores que o Brasil. Começamos então analisando a
tabela disposta abaixo.

Tabela 1: Percentual da população total com depressão e


distúrbios de ansiedade, 2017, América latina1
Transtornos de
Depressão ansiedade
Argentina 3,67% 6,97%
Bolívia 3,09% 5,42%
Brasil 3,30% 6,73%
Colômbia 2,20% 5,87%
Chile 4,06% 8,11%
Equador 2,98% 6,59%
Guayana Francesa 2
** **
Guayana 4,14% 5,26%
Paraguai 2,96% 7,39%
Peru 2,28% 6,81%
Suriname 3,97% 5,67%
Uruguai 3,62% 6,31%
Venezuela 2,81% 5,39%
Fonte: Our World in Data. Elaboração própia

Brasil possui 3,30% da população com depressão e 6,73%


com trastorno de ansiedade. Acaba por não ser o maior da
América Latina, porém, como o Brasil possui a maior po-
pulação os dados brutos acabam sendo mais significantes.
O Brasil possui 6.930.000 milhões de pessoas com de-
pressão e 14.133.000 milhões de pessoas com ansiedade92.

92 Esses números foram extraídos de cálculos matemáticos do valor de 210 milhões de brasileiro

361
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Muitas dessas pessoas podem possuir ambas as doenças


pois geralmente uma pode vir a desencadear outra. Esses
dados são de 2017, dados mais recentes ainda não foram
obtidos.
Infelizmente não há acesso a aonde essas pessoas
estão localizadas, quais são seus diagnósticos, faixa de
renda ou emprego, muitos desses dados são sigilosos
ou até mesmo o indivíduo não se sente confortável em
compartilhar. Não podemos definir exatamente as cau-
sas da depressão e da ansiedade no nosso país então,
até porque cada pessoas tem seus diferentes motivos
para cada uma dessas doenças. Porem podemos gene-
ralizar93 os efeitos causadores para efeitos macroeco-
nômicos e microeconômicos que acabam por atingir as
pessoas direta e indiretamente.
Fatores macroeconômicos podem influenciar em
diversos aspectos, saúde mental é um deles. Nosso
país passou por diversos tumultos econômicos ao lon-
go dos últimos anos. Ouve uma massiva demissão de
funcionários de pequeno e grandes porte, muitas em-
presas tiveram que reduzir sua cota, tanto de salários
quanto de funcionários. Aqueles que migravam para
um sistema empreendedor acabaram por ser atingindo
de uma maneira mais abrupta tendo que, muitas vezes,
fechar o próprio negócio. Isso se pode observar pela
oscilação do PIB através do tempo. Vale lembrar que,
ao tratamos desse assunto entramos no mérito de Cau-
salidade de Granger94

93 Generalização de dados é algo muito presente na microeconomia. Não é viável analisar cada
variável individualmente, logo, se generaliza para poder obter um resultado, ou solução, mais
abrangente.
94 Causalidade de Granger nos diz que correlação não implica em causalidade, ou seja, não é por-
que dois eventos ocorreram simultaneamente que um originou outro ou que foi a causa do outro.

362
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

As pessoas reagem de diferentes maneiras a situações


como essas. Porém, em um país como o Brasil, uma situ-
ação de desemprego, uma economia instável e problemas
políticos, que acarretaram boa parte desse prejuízo, aca-
bam impactando negativamente a saúde mental das pes-
soas. O nosso sistema público de saúde não possuiu um
foco adequado em saúde mental. O Sistema Único de Saú-
de (SUS) tem foco em atendimento físico e não psicológi-
co, embora tenham psicólogos somente em alguns postos
de saúde pelo Brasil.
No capítulo 1 de Políticas de saúde mental (MATEUS,
Mário Dinis, 2013) o autor começa com a seguinte frase “O
Brasil tem um sistema de saúde mental inovador, centra-
do nos cuidados na comunidade, mas ainda enfrentando
grandes desafios em sua implementação.” Isso é fato, em-
bora o SUS faça o papel de atender a população de uma
maneira menos custosa de uma forma direta, o mesmo,
ainda tem dificuldades de realizar o atendimento de pes-
soas no quesito de saúde mental.
Levamos em conta que poucas pessoas buscam um
atendimento em uma unidade de saúde quando se tem
problemas de depressão e ansiedade. Muitas vezes as pes-

363
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

soas portadoras reprimem ambas e optam por não falar.


Isso pode ser por fatores como medo, angústia, pânico ou
até mesmo a falta de incentivo.
Logo então vemos que não existe uma política públi-
ca especifica para abordar esse problema, muitas vezes
que passa despercebido através de pautas no congresso.
Segundo Leonardo Secchi a política pública se divide em
duas partes: problema público e política pública. Um tra-
ta da resolução e o outro trata do mecanismo. Podemos
então, com os dados obtidos e a interpretação e análise
de Leonardo Secchi95, buscar um método para a solução
desse problema encontrado.
Abordar todas as instâncias possíveis em que se poderia
desenvolver depressão e ansiedade seria quase impossí-
vel, abordar um método de intervenção em cada uma seria
ainda mais complexo, um conteúdo apenas para um livro.
Buscarei a partir de agora abordar o respectivo problema
na área educacional, mostrando um método de interven-
ção através de políticas públicas.

ABORDAGEM NO SISTEMA EDUCACIONAL


E O EFEITO NUDGE
Segundo o Art. 208 da constituição federal, parágrafo
primeiro “O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é di-
reito público subjetivo.” Logo, todos aqueles nas instâncias
do Brasil acabam por ir para escolas públicas de educação
básica, colegial e universidades federais pois, os mesmos
têm esse direito garantido. Isso faz com que o sistema
educacional brasileiro seja uma peça chave para a imple-
mentação dessas políticas públicas. Porem simplesmente

95 SECCHI, Leonardo. Análise de políticas públicas: diagnóstico de problemas, recomendação de


soluções. São Paulo Cengage Learning 2016

364
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

mudar algo na regra do ensino educacional não seria o


suficiente ou até mesmo bem aceito.
Entendemos então que todos passaram pelo o proces-
so de ensino básico. A faixa etária estudantil geralmente
fica mais suscetível a essas doenças devido ao ambiente
inserido. Um ambiente com pressão, cobranças e estresse,
acabam por fazer com que os jovens sejam mais suscetí-
veis a esses fatores negativos, família e problemas psico-
lógicos também já são agravantes. Mesmo alguns não sen-
do portadores dessas doenças, uma política pública nessa
área acaba sendo uma maneira de educar e conscientizar,
tanto aqueles que são portadores dessas doenças quanto
aqueles que convivem com pessoas que são portadoras,
também serve como um método de prevenção.
A intervenção ocorrerá em duas partes, daremos mais
enfoque na segunda já que é objetivo do presente arti-
go. A primeira irá consistir na educação sobre o cuidado
da saúde mental. Embora o sistema de ensino brasileiro
tenha suas forças em certas áreas, em outra ele acaba
pecando. Não temos nenhuma base de ensino sobre os
cuidados da saudade mental. Depressão e ansiedade po-
dem assolar mais pessoas do que doenças como o cân-
cer, e podem se tornar difíceis de se tratar tal. A segunda
parte seria a aplicação do efeito Nudge para um método
de solução.
Porém, antes temos que frisar que quando entramos no
âmbito das políticas públicas também entramos no âmbi-
to das preferências. A presente solução trará um método,
porém, nem todos terão essa preferência. Juntamente com
conceitos econômicos e análise econômica do direito, ve-
mos o conceito de economia de bem-estar. Citando Cooter
e Ulen (2013, P. 37)

365
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

“A parte da teoria microeconômica chamada economia


de bem-estar explora como as decisões de muitos indiví-
duos e empresas interagem para afetar o bem-estar dos
indivíduos como um grupo. A economia do bem-estar
é muito mais filosófica do que outros tópicos da teoria
microeconômica.”96
Ao tratamos desse conceito vemos que a ação de um
coletivo afeta cada um dos indivíduos presentes. Para essa
política pública poder ser mais eficiente, deverá ser apre-
sentado a todos os envolvidos quais serão as reações, caso
todos colaborem, mostrando o custo benefício97 e o custo
de oportunidade98 dessa política pública.
Umas das etapas iniciais seria introduzir nas instituições
educacionais, de como tratar uma depressão e ansiedade
no ensino básico. O que são essas doenças? Aonde pro-
curar ajuda? Com quem falar? Como se expressar? Com
ajudar alguém portador dessas doenças? Essas informa-
ções muitas vezes faltam e acabam prejudicando ambas
as partes. Muitas pessoas, principalmente a comunidade
masculina, sente dificuldade em se abrir sentimentalmente
para outros, tanto para profissionais da área da psicologia,
quanto pessoas próximas como família e amigos. Uma das
etapas consiste em quebrar esse tabu99, que as pessoas
veem de se abrir para outros e de se expor sentimental-
mente para terceiros, muitas vezes o simples ato de falar
já resolve muitos problemas.
A etapa principal seria a aplicação do efeito Nudge,

96 “The part of microeconomic theory called welfare economics explores how the decisions of many
individuals and firms interact to affect the well-being of individuals as a group. Welfare economics
is much more philosophical than other topics in microeconomic theory.”
97 Comparar os custos e os benefícios de um bem público para a sociedade.
98 Aquilo do qual você abre mão por fazer algo. Se faço uma política pública para saúde, deixo de
fazer uma para incentivar o empreendedorismo.
99 Proibição religiosa ou controle social que restringe o uso de uma linguagem, de um gesto ou
comportamento.

366
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

através de políticas públicas educacionais, as mesmas, ser-


viriam para o ensino básico e superior. A ação que será
apresentada a seguir irá auferir gastos, principalmente pú-
blicos, porém, com certos incentivos, o âmbito privado
também pode intervir reduzindo custos. Leva-se em conta
também que essa é uma suposição não testada, porém
que poderá ser colocada em prática no futuro para resul-
tados mais assertivos.
O efeito Nudge (THALER, SUNSTEIN, 2018), também
conhecido como arquitetura da escolha, se caracteriza
como “um pequeno empurrão”, uma ajuda na hora de
uma tomada de decisão. Temos ciência de que o indiví-
duo tem racionalidade limitada100 então acabará por nem
sempre tomar as melhores decisões. Entramos então com
o efeito Nudge para arquitetar uma escolha para uma sé-
rie de indivíduos prezando pela sua saúde mental. Viria a
funcionar da seguinte maneira:
Durante o ano letivo, serão preparadas aulas, palestras
e eventos sobre depressão e ansiedade. Provas visuais e
áudio visuais seriam implementadas na instituição para
agir de uma maneira mais sutil, apelando simplesmente
para o subconsciente do indivíduo. Ao fim do ano letivo,
a escola ou faculdade iria agendar automaticamente cada
um de seus alunos para uma consulta com um psicólogo
que teria um vínculo com essa unidade de ensino101. A
consulta já seria agenda sem mesmo o aluno precisar fa-
zer algo ou concordar com a marcação da mesma. Caso
o indivíduo, não quisesse fazer essa consulta, ele deveria
ligar para o consultório e ele mesmo desmarcar, não se-

100 Segundo Hebert Simon, laureado Nobel da economia em 1978, a racionalidade limitada é com-
posta por três dimensões: A informação disponível, limitação cognitiva da mente individual e o
tempo disponível para tomada de decisão
101 Como a instituição seria publica, fica a cargo do SUS contratar psicólogos para atuar nessa área.

367
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ria perguntado motivos, simplesmente seria desmarcada.


Segundo o efeito Nudge as pessoas ficam mais propensas
a aceitarem algo que já está pronto, dificilmente optando
por recusá-la. A probabilidade de uma grande parte recu-
sar é muito pequena, utilizo então o exemplo da doação
de órgãos na Espanha. A Espanha é o país com maior
índice de doações de órgãos da Europa (EXAME ABRIL,
2017) simplesmente pela utilização do efeito Nudge. To-
dos os cidadãos espanhóis já são cadastrados no programa
de doação de órgãos, através do sistema opt-out102, a partir
do momento que criam seu documento de identificação.
Casos o mesmo, não queira ser doador, basta ligar para
um órgão específico de saúde e retirar essa opção. Como
isso já é dado aos cidadãos, o incômodo de ligar para se
desfazer disso é tamanho que a maioria não o faz, logo a
Espanha acaba por concentrar esse elevado índice de do-
ação de órgãos. O mesmo, se aplicaria ao quesito do psi-
cólogo. Como já está marcado e não haverá custo direto,
a opção de desmarcar se torna um certo incômodo, logo
uma grande parte irá a consulta.
Os resultados que iremos obter através disso não serão
instantâneos. Como se trata de uma política de longo pra-
zo, quando nos atentamos no ensino básico público, o re-
sultado levaria em torno de 12 (doze) anos para se mostrar
efetivo ou não103, seguindo o modelo antes citado. Porém,
podemos apelar para um método onde os resultados irão
demorar muito menos.
Levamos então esse modelo paras as universidades. O
modelo de aplicação seria o mesmo, seguindo quase os

102 O cidadão é automaticamente registrado como doador de órgãos, não requisitando seu con-
sentimento
103 Para a coleta desses dados e resultados deveria ser feita uma pesquisa ex-post-fact, porem a
mesma iria demorar muito tempo para ser feita.

368
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

mesmos passos, com apenas algumas modificações. Po-


rém, devido ao ambiente universitário concentrar pessoas
maiores de 18 (dezoito) anos de idade, poderíamos ob-
servar uma segunda variável que é muito importante para
esse trabalho. A eficiência no ambiente de trabalho.
No ambiente universitário nos deparamos com muitos
alunos que fazem estágio ou trabalho de maneira efeti-
vada. Devido a problemas como depressão e ansiedade
a eficiência no ambiente de trabalho acaba caindo, ren-
dimento acadêmico também. Caso o mesmo modelo seja
aplicado a uma universidade, podemos analisar os impac-
tos de uma consulta com um psicólogo a cada término
de período, ou seja, duas vezes ao ano. Seria incentivado
da mesma maneira o aluno a ter um maior contato com
um psicólogo fazendo consultas frequente. De qualquer
maneira ao fim de um período a própria universidade já
teria marcado uma consulta para seus alunos, caso ele
não queira, ele mesmo teria que desmarcar, entramos
novamente no caso do efeito Nudge da doação de órgãos
na Espanha.
Podemos também levar em conta que uma parcela de
alunos gostaria de fazer consultas, porém não tem tempo
para marcar ou dinheiro para pagar. Como praticamen-
te todas a universidades possuem o curso de psicologia,
poderia de certa forma acabar por baratear o custo de
consulta a um psicólogo. Seria viável pois a consulta seria
realizada na própria faculdade e acabaria por indiretamen-
te treinar o futuro profissional de psicologia.
Para termos um maior entendimento da eficiência da
política pública dentro da universidade, pode-se então
aplicar um questionário no início do ano aos alunos com
perguntas sobre a vida acadêmica, problemas de depres-

369
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

são e ansiedade104 e vida profissional. Durante o ano séria


analisado o desempenho profissional, acadêmico e pes-
soal de uma turma de alunos e comparado com uma que
não recebeu os determinados incentivos. Poderia ser fei-
to então uma estatística comparativa, até mesmo com as
notas, para analisar se aplicação da política pública foi
efetiva ou não.
O período para a aplicação em uma universidade séria
de 14 (quatorze) meses para realizar uma coleta de dados
precisos. Essa coleta serviria para compilar dados que po-
deriam ser generalizados para expandir essa política públi-
ca caso obtivermos resultados positivos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A depressão e ansiedade são um dos males modernos
mais agravantes. Seus motivos são diversos e seus impac-
tos mais ainda. A eficiência no mercado do trabalho tende
a cair muito pois o trabalhador não se sente motivado para
executar suas funções, isso prejudica tanto ele quanto as
empresa como um todo.
Há diversas maneiras de abordar esses problemas. Polí-
ticas públicas se mostram as mais eficientes pois, a mesma
pode abordar em larga escala, tanto em quantidade quan-
to em território.
A utilização do efeito Nudge em combinação com as
políticas públicas acaba dando margem para maiores ca-
minhos a serem seguidos. O modelo apresentado, com
base em um estudo de caso da doação de órgão na Espa-
nha através do sistema opt-out, nos dá ideia de que ma-
neira prosseguir.
O modelo criado, pode ser aplicado sem muitos pro-
104 Não precisaria ser necessariamente sobre o indivíduo, pode ser sobre algum colega de sala por exemplo

370
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

blemas. Como já dito irá envolver custos, porém, no longo


prazo esses custos serão compensados através da eficiência
no mercado de trabalho. Também devemos levar em conta
o custo benefício nessa análise, pois, o mesmo irá impactar
em uma escala macroeconômica e microeconômica.
O presente trabalho prezou abordar a área educacional,
pois, a mesma se mostra uma peça chave e fundamental
para uma implementação de política pública. Porém po-
demos aplicar em outros âmbitos. O mesmo modelo pode
ser adotado dentro de uma empresa fazendo apenas pe-
quenas alterações em seu modelo de abordagem.
Os impactos dessa ação são refletidos em setores macro-
econômicos, microeconômicos, impactos sociais e culturais
e principalmente na área da saúde. Com o passar do tempo
os índices analisados irão se reduzir significativamente.

REFERÊNCIAS
MELLO, Marília de Souza. Glossário do ministério da saúde: Projeto
de terminologia em saúde. [S. l.]: Editora MS, 2004.
Secretaria da saúde de Curitiba. Ansiedade (folder impresso)
Mental Health. [S. l.], 2 abr. 2018. Disponível em: https://ourworldin-
data.org/mental-health#depression. Acesso em: 3 nov. 2019.
ANAMT (Brasil) (org.). As 10 carreiras que mais causam depres-
são. [S. l.], 18 nov. 2015. Disponível em: https://www.anamt.org.
br/portal/2015/11/18/as-10-carreiras-que-mais-causam-depressao/.
Acesso em: 3 nov. 2019.
MATEUS, Mário Dinis. Políticas de saúde mental: Baseado no cur-
so Políticas públicas de saúde mental, do CAPS Professor Luiz da
Rocha Cerqueira. São Paulo: SPDM – Associação Paulista para o
Desenvolvimento da Medicina, 2013. 402 p.
MANKIW, N. Gregory. Introdução à economia. 6. ed. [S. l.]: Cengage
Learning, 2014. 824 p.

371
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

WORLD HEALTH ORGANIZATION. The ICD-10 Classification of Men-


tal and Behavioural Disorders: Clinical descriptions and diagnostic
guidelines. [S. l.]: World Health Organization, [1987?]. 267 p.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Glossário do ministério da saúde: Projeto
de Terminologia em Saúde. Brasília: Editora MS, 2004. 144 p.
ASSIS, Pablo de. Um breve manual de transtornos mentais: Um
guia introdutório à psicopatologia e os sistemas diagnósticos de
classificação, Paraná, [entre 2000 e 2010].
SECCHI, Leonardo. Análise de políticas públicas: diagnóstico de
problemas, recomendação de soluções. São Paulo Cengage Lear-
ning 2016
MARQUES, Ariane Belcavelo Silveira; EMMENDOERFER, Magnus Luiz.
Análise de Políticas Públicas: Diagnóstico de Problemas, Reco-
mendação de Soluções, [s. l.], 28 jul. 2018.
FERNEDA, Ariê Scherreier. Fronteiras & Horizontes do Direito do
Trabalho: Trabalho decente e o meio ambiente do trabalho como
forma de proteção da saúde mental do trabalhador, [s. l.], 2018.
VARIAN, Hal R. Microeconomia: uma abordagem moderna. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2016. xxvii, 806 p.
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Law & Economics. 6. ed. [S. l.]:
Pearson, 2013. 570 p.
THALER, Richard H.; SUNSTEIN, Cass R. Nudge: Como tomar melho-
res decisões sobre saúde, dinheiro e felicidade. [S. l.: s. n.], 2018.
HAN, Byung-chul. Sociedade Do Cansaço. 2. ed. [S. l.]: Vozes, 2014. 136 p
Granger, C. W. J. (1969). «Investigating Causal Relations by Econo-
metric Models and Cross-spectral Methods». Econometrica. 37
(3): 424–438
CIOATTO, Roberta Marina; PINHEIRO , Adriana de Alencar Gomes.
Nudges como política pública para aumentar o escasso número de
doadores de órgãos para transplante. Revista Brasileira De Polí-
ticas Públicas , [s. l.], v. 8, ed. 2, p. 369-387, 2018.
ESPANHA é campeã do mundo em doações de órgãos. Exame, 17
abr. 2017. Disponível em: <https:// exame.abril.com.br/ciencia/es-
panha-e-campea-do-mundo-em-doacoes-de-orgaos/>. Acesso em:
30 de novembro de 2019

372
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

TRATAMENTO HOME CARE E ANÁLISE


ECONÔMICA DO DIREITO: A CIÊNCIA A SERVIÇO
DA EFETIVAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Cristiane Luiza Riffel105 e Lairton Ribeiro de Oliveira 106

Resumo: O tema a que esta abordagem se propõe trata


das Políticas Públicas para a Saúde, tendo como delimita-
ção temática o atendimento denominado Home Care. O
enfoque utilizado na investigação é administrativo e cons-
titucional aliado à interdisciplinaridade das ciências, espe-
cialmente no que tange à análise econômica do Direito.
Busca-se explorar a política pública do Home Care, ten-
do-se como problematização o questionamento acerca da
sua viabilidade financeira no Brasil, levando-se em consi-
deração o cenário econômico brasileiro, sopesando-se a
humanização que essa forma de tratamento proporciona,
em consonância com o postulado da dignidade da pessoa
humana, fundamento republicano do Estado Democrático
de Direito, aqui vigente. Para tanto, na tentativa de atribuir
maior significado ao debate, investiga-se os fundamentos
jurídicos de interesse da abordagem. Entende-se que é ne-
cessário enfrentar a discussão dessa temática sob a óptica
da viabilidade econômica, tendo-se em vista que o benefí-
cio proporcionado por tal modalidade de atendimento ao
paciente é incontroverso. Trata-se de um tema relevante e
de interesse da sociedade, notadamente se considerando
o crescente aumento da expectativa de vida da população
brasileira e a atual realidade de carência de recursos pú-
105 Bacharela em Direito, servidora pública da Procuradoria Municipal de Santo Cristo, Brasil.
cristianeluizariffel@gmail.com
106 Mestre em Integração Latino-Americana, pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
Professor do Curso de Direito das Faculdades Integradas Machado de Assis (FEMA). lairtonsma@
gmail.com

373
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

blicos para as políticas públicas de saúde. Assim, avulta-se


a necessidade do debate no meio acadêmico, ambiente
propício para inquietações acerca das situações postas ou
mesmo impostas pelo Estado.
Palavras-chave: políticas públicas – home care- análise
econômica do direito.

INTRODUÇÃO
A presente análise abordará o tratamento de saúde
prestado na forma de atendimento domiciliar, conhecido
como Home Care, que é basicamente oferecido no Brasil
por empresas privadas especializadas, circunstância que
o torna de difícil acesso, sobretudo em razão do elevado
custo de contratação. Destaca-se, de pronto, que em al-
guns países ele é fornecido por operadoras de planos de
saúde, e tem se mostrado, em determinados casos, mais
econômico do que semelhantes tratamentos disponibiliza-
do em ambiente hospitalar.
Busca-se, com essa análise, perscrutar o porquê des-
sa forma humanizada de atendimento não ser oferecida
no Brasil, voluntariamente, tanto pelo Estado como por
operadoras de planos de saúde, visto que, na maioria dos
casos, ela somente acaba sendo disponibilizada compulso-
riamente, mediante provimento jurisdicional. Para tanto, o
estudo referencia-se na legislação pertinente e em autores
de Direito Administrativo, Civil e Constitucional, baseado
na temática específica do atendimento Home Care na esfe-
ra da saúde, visando uma análise quanto à sua aplicabili-
dade ou inaplicabilidade na realidade brasileira, tendo por
elemento norteador a análise econômica do Direito.
Pretende-se desenvolver uma abordagem de caráter re-
flexiva e com fundamentação histórica, analisando-se o

374
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

contexto das políticas públicas107 e o serviço privado de


atendimento na seara da saúde. A proposta norteia-se na
busca de possíveis respostas à seguinte indagação: é viá-
vel a prestação dos serviços de saúde sob a modalidade
Home Care no sistema brasileiro de saúde pública?
Tem-se por objetivo instigar o leitor a uma reflexão crí-
tica e construtiva acerca da temática relativa à saúde, com
enfoque na efetivação de direitos que concretizam o con-
teúdo jurídico do princípio da dignidade da pessoa hu-
mana e que possam resultar em diminuição dos custos no
tratamento médico, aliados a um atendimento humaniza-
do, realizado no ambiente familiar. Para tanto, os aspectos
metodológicos seguidos caracterizam a pesquisa pela sua
natureza teórica, de cunho qualitativo, bibliográfico, de
fins explicativo, que se respalda nos métodos hipotético-
dedutivo e histórico.
A pesquisa, que trata qualitativamente os dados, de for-
ma sistemática e por meio de documentação indireta, jus-
tifica-se por se tratar de tema que abarca a coletividade e
refere-se a um bem fundamental da maior grandeza, qual
seja a saúde, elementar para uma vida digna. Nesse con-
texto busca-se analisar especificamente o atendimento a
domicílio pelo método Home Care, fazendo-se um cotejo
com a análise econômica do direito.
A abordagem estrutura-se em duas seções, sendo a pri-
meira destinada a explorar a origem histórica do trata-
mento denominado Home Care, consubstanciado numa
modalidade de atendimento aos pacientes em seus

107 Para Bucci, as políticas públicas se desenvolvem em três estágios, quais sejam, o primeiro
momento que é o da formação, no qual se refere a apresentação dos pressupostos técnicos e
materiais. O segundo momento que é o da execução, que consiste nas medidas administrativas,
financeiras e legais utilizadas para sua implementação, e o terceiro e último momento que é o
da avaliação, no qual analisa-se os efeitos sociais e jurídicos no processo de atuação da política
pública (BUCCI, 2006).

375
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

domicílios, também conhecido como desospitalização,


bem como apresentar as normativas basilares acerca
desse serviço. Busca-se, nesta oportunidade, situar o
leitor quanto ao tema, que é pouco conhecido no meio
acadêmico e instigar esses leitores a questionarem-se
acerca das razões pelas quais esse modelo de tratamen-
to humanizado, que traz melhor qualidade de vida e
preserva o doente no seio familiar, ainda é pouco di-
fundido no Brasil.
Na segunda seção, destina-se a investigar acerca da
viabilidade ou inviabilidade do fornecimento desse trata-
mento por operadores de planos de saúde e pelo Estado,
fazendo-se um cotejo com a análise econômica do direito
que se acredita ser a ciência apta a franquear, de forma
interdisciplinar, o conhecimento necessário na avaliação
quanto à viabilidade financeira de implementação dessa
modalidade de tratamento.

CONTEXTO HISTÓRICO E LEGISLATIVO DO


ATENDIMENTO HOME CARE
Sabe-se que o ambiente hospitalar, via de regra, é uti-
lizado pelos indivíduos de forma transitória quando, por
algum problema de saúde, recebem uma assistência pro-
fissional especializada. Todavia, há casos em que a inter-
nação faz-se necessária por períodos prolongados, o que
sabidamente pode se tornar extremamente penoso, tanto
para o paciente quanto para os seus familiares, situações
em que o tratamento domiciliar mostrar-se-ia alentador
para todos os envolvidos nesse processo.
Os Estados Unidos foram pioneiros nesse tipo de trata-
mento quando, no ano de 1947, no pós-guerra, um grupo de
enfermeiras reuniu-se para desenvolver a atividade de cuidar

376
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

de pacientes em seus lares. Contudo, foi em 1960 que esse


modelo fortaleceu-se, no intuito de afastar a hospitalização e
amenizar a superlotação dos hospitais, diante da insuficiência
de vagas, potencializado pela existência de muitos enfermos
com sequelas da guerra, tudo isso aliado ao fator do aumen-
to da longevidade e da falta de recursos para construção de
novos hospitais (SAMPAIO; IMAI, 2012, p. 5).
No mesmo período surgiram as “Nursing Home”, até
hoje existentes, que proporcionam um atendimento rea-
lizado especialmente por equipes de enfermagem a pa-
cientes idosos, com algum tipo de patologia crônica, em
estágio terminal. Devido ao grande sucesso desse modelo
de tratamento, que resultou numa redução de custos da
ordem de até 50%, se comparado ao modelo tradicional de
internação hospitalar, pensou-se em ampliar esta experi-
ência para outras patologias (SAMPAIO; IMAI, 2012, p. 6).
Não obstante, poucos indivíduos detinham condições
financeiras para suportar as despesas do tratamento do-
miciliar, circunstância que acabou por torná-lo um serviço
elitizado. Dessa forma, as operadoras de planos de saúde
dos Estados Unidos, com um olhar econômico prospecti-
vo, passaram a oferecer tal serviço a seus conveniados, em
razão da redução significativa das despesas, comparativa-
mente com à forma usual de contratação de vagas em leitos
hospitalares para internação de seus segurados, ou mesmo
a manutenção de hospitais próprios (FALCÃO, 1999, s.p.).
No Brasil, o tratamento domiciliar está regulamentado
por meio de leis, resoluções e portarias, destacando-se a
Lei 10.424/2002, que acrescentou o capítulo VI, sobre o
atendimento e internação domiciliar, na Lei 8.080, de 1990,
que trata do Sistema Único de Saúde (SUS); a Portaria nº
825, de 2016, que redefiniu a Atenção Domiciliar no âmbi-

377
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

to do SUS; a Resolução do Conselho Federal de Enferma-


gem (COFEN), nº 270, de 2002 e a Portaria nº 629, de 2013
(SAMPAIO; IMAI, 2012. p. 2).
Assim, no ordenamento jurídico pátrio, é a Lei 8.080/90,
que criou o Sistema Único de Saúde, o pilar central no qual
todas as demais normativas buscam seu fundamento, sem
olvidar, evidentemente, dos preceitos constitucionais corre-
latos. O aludido diploma legal constitui-se no marco tem-
poral a partir do qual criou-se um sistema de atendimen-
to custeado pelo Estado, na área da saúde, conquista que,
normativamente, beneficiou a coletividade (BRASIL, 1990).
A mencionada alteração normativa, produzida pela Lei
10.424/02, disciplinou o subsistema de atendimento e in-
ternação domiciliar, pelo qual, em seu artigo 19-I, estabe-
leceu-se a possibilidade de realização de procedimentos
médicos, de enfermagem, fisioterapêuticos, psicológicos e
de assistência social, entre outros necessários ao cuidado
integral em domicílio, a serem realizados por equipes mul-
tidisciplinares, que atuam nos níveis da medicina preven-
tiva, terapêutica e reabilitadora, diretamente na residência
do paciente, uma verdadeira inovação ao tradicional aten-
dimento hospitalar. (BRASIL, 2002).
Nesse ensejo, os atos normativos infralegais correspon-
dentes, as Resoluções COFEN, nº 267/01 e 270/02, res-
pectivamente, aprovaram as atividades de Enfermagem
Home Care e regulamentaram a atuação das empresas que
prestam Serviços de Enfermagem Domiciliar - Home Care,
visto haver empresas que prestavam tal serviço sem regu-
lamentação específica, estabelecendo-se o quadro de pro-
fissionais e especialidades necessárias para sua prestação.
(CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM, 2001), (CON-
SELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM, 2002).

378
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Não se pode olvidar, ainda, da Portaria nº 825, de 2016, do


Ministério da Saúde, que redefiniu a atenção domiciliar no
âmbito do SUS, considerando a internação domiciliar, aquela
que possa ser prestada no domicílio do indivíduo acometido
de situação clínica estável, cujo quadro necessite intensida-
de de cuidados além das modalidades ambulatoriais e que,
todavia, possibilite o tratamento em casa por profissionais
capacitados para esse fim. A referida norma disciplina, tam-
bém, os parâmetros de inserção e exclusão de pacientes nes-
sa modalidade de tratamento. (BRASIL, 2016)
A despeito do conteúdo jurídico das aludidas normas,
é o anexo da Resolução COFEN, nº 267/01, que define o
atendimento de enfermagem em Home Care como sendo a
prestação de serviços de saúde ao cliente, família e grupos
sociais em domicílio, na modalidade assistencial, conser-
vando a autonomia e o caráter liberal do profissional En-
fermeiro. (CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM, 2001).
O mencionado ato normativo subdivide o atendimen-
to em três níveis de complexidade, a saber: o de menor
complexidade, baseado no atendimento domiciliar carac-
terizado pela investigação do processo saúde/doença, no
qual o cliente necessita de procedimentos técnicos-cientí-
ficos de Enfermagem, relacionados às prevenções, promo-
ções e manutenção do estilo de vida saudável; o de média
complexidade, no qual não se dá a caracterização de uma
doença em curso, quando o enfermo necessita de procedi-
mentos técnicos-científicos de Enfermagem que definirão o
modelo assistencial aplicado à pessoa, visando a resolução
do dano, invalidez e a reabilitação da patologia com retorno
ao seu estado sanitário anterior; e o de alta complexidade,
empregado quando o paciente apresenta uma doença em
curso, cujo atendimento em domicílio deverá ser multipro-

379
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

fissional, assegurando-se a complexidade do especialista de


Enfermagem em Domicílio - Home Care. (CONSELHO FE-
DERAL DE ENFERMAGEM, 2001).
Nessa via, como exemplo prático da adoção dessa polí-
tica, pode-se citar um modelo de atendimento Home Care
que é prestado na cidade de Pelotas, primeira cidade do
Rio Grande do Sul a disponibilizar esse tratamento por
meio de convênio com o Ministério da Saúde, totalmen-
te custeado com recursos públicos federais, denominado
“Melhor em Casa” (JÚNIOR, 2012, s.p.).
Para ter acesso ao tratamento, o paciente deve ser usu-
ário do Sistema Único de Saúde (SUS), submeter-se a uma
avaliação médica para analisar a viabilidade desse trata-
mento e, se indicado, deve aceitar a modalidade de atendi-
mento. Além disso, também faz-se necessário que a família
tenha um cuidador, o qual pode ser um familiar, em turno
intensivo, acompanhando o paciente (JUNIOR, 2012, s.p.).
Em cumprindo-se tais requisitos, o paciente recebe o
tratamento domiciliar na modalidade Home Care ou, caso
não haja vagas de imediato, aguarda em uma lista de es-
pera, visto que as equipes são limitadas e o Ministério da
Saúde exige que, pelo menos, uma visita semanal seja re-
alizada pela equipe multidisciplinar do programa “Melhor
em Casa” (JÚNIOR, 2012, s.p.).
A partir dos resultados do aludido programa, vislum-
bra-se uma potencial viabilidade de implantação do home
care, utilizando-se, para tanto as estruturas existentes nos
municípios e adequando-as às exigências do Ministério da
Saúde, agregando-se maior possibilidade de qualidade de
vida aos enfermos, além de liberar vagas em hospitais e,
sobretudo, promover a dignidade da pessoa humana.
Contudo, embora o tratamento esteja disciplinado e regu-

380
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

lamentado no Brasil, no âmbito da normativa corresponden-


te ao sistema público de saúde, verifica-se que, em grande
medida, ele está acessível somente aos indivíduos que dete-
nham condições financeiras de arcar com tal custo, diante de
um quadro de flagrante desinteresse dos dirigentes estatais
em disponibilizá-lo à população, restando, nesse caso, a con-
tratação de empresas privadas que atuam na área, circuns-
tância que motiva a análise da viabilidade financeira de sua
prestação pelo Estado e empresas de planos de saúde.

(IN)VIABILIDADE DE IMPLEMENTAÇÃO DO
ATENDIMENTO HOME CARE A PARTIR DE UM COTEJO
COM A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO (AED)
Um aspecto relevante, no que tange à definição, exe-
cução e eficácia das políticas públicas, e que tem tomado
corpo na conjuntura atual é a necessidade de se ter em
conta, em todas as fases daquelas, a Análise Econômica
do Direito (AED). Esta teoria, segundo Coura, busca na
economia subsídios para otimizar ações, podendo resultar
em ganhos financeiros. Seus postulados foram utilizados,
por exemplo, pelo Ministro Luis Felipe Salomão, do Supe-
rior Tribunal de Justiça (STJ), para fundamentar seu voto
na decisão do Recurso Especial o nº 1.162.283, no ano de
2015, em julgamento relativo ao reequilíbrio contratual de
financiamento habitacional, quando defendeu a conexão
das ciências jurídicas e econômicas (COURA, 2017, s.p.).
Nesse julgado, o aludido Ministro argumentou que a
AED permite maior previsibilidade, que se transforma em
segurança nas operações econômicas e sociais, tornando
os setores públicos e privados mais sustentáveis, com ins-
tituições mais sólidas aptas a reforçar tanto a economia,
como a própria sociedade (COURA, 2017, s.p.).

381
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Acrescentou o Ministro que deverá haver um intercâm-


bio entre as ciências jurídicas e econômicas e não a exclu-
são de uma pela outra. Portanto, infere-se que a ciência
jurídica deve complementar-se pela econômica, no ponto
em que poderá haver mútua contribuição. Para o enfo-
que dessa abordagem, tais aspectos permitiriam a racio-
nalização da análise quando confrontada a necessidade
de satisfação dos interesses individuais com a finitude dos
recursos públicos.
Notadamente, o Brasil, por sua ampla extensão territo-
rial e geografia heterogênea, constitui-se em um desafiador
projeto governamental. Por mais abrangente que sejam as
normas jurídicas e as políticas públicas, há a necessidade
de adequação, dentro do contexto social no qual ela será
inserida, que impacta na eficiência do agente político. É
nesse aspecto que a AED, poderia contribuir a partir de
estudo técnico sobre a realidade local e/ou regional, para
definição da melhor estratégia de enfrentamento das de-
mandas, tal como na área da saúde, justamente por ser
aspecto essencial à dignidade humana, fundamento cons-
titucional republicano pátrio.
Acerca da AED, importa esboçar a conceituação elabo-
rada por Gico Jr., proposta nos seguintes termos:
[...] é o campo do conhecimento humano que tem por
objetivo empregar os variados ferramentais teóricos e
empíricos econômicos e das ciências afins para expandir
a compreensão e o alcance do direito e aperfeiçoar o
desenvolvimento, a aplicação e a avaliação de normas
jurídicas, principalmente com relação às suas consequ-
ências. (GICO JUNIOR, 2014, p. 1).
Notadamente, a interconexão dessas ciências demanda
esforço múltiplo, por meio de uma conjunção de iniciati-

382
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

vas e diálogos entre os atores correspondentes envolvidos,


algo complexo diante da sistemática atual, em que a inter-
disciplinaridade ainda é incipiente na solução das deman-
das públicas, permanecendo tanto o legislador quanto o
julgador, soberanos em suas decisões, por vezes apartados
da realidade econômica tanto da Administração Pública,
quanto da expressiva maioria da população.
A AED é a ciência que pesquisa como o agente reage
em um espaço limitado de recursos, quais decisões toma
e os seus consequentes efeitos. Assim o é porque consti-
tui-se em uma ferramenta que segue um método no qual
despreza-se o senso comum e a intuição, pois se serve de
dados com os quais analisa-se a causa e o efeito, levan-
tando-se proposições sobre o impacto das leis na conduta
humana, o que torna-o empírico, tendo-se em conta que
“[...] a escassez dos bens impõe à sociedade que esco-
lha entre alternativas possíveis e excludentes.” (GICO JU-
NIOR., 2014, p. 19).
Essa lógica interpretativa e decisória foi recentemen-
te positivada, no ordenamento jurídico, por meio da Lei
13.655/18, que incluiu disposições na Lei de Introdução
às Normas do Direito Brasileiro, sobre segurança jurídica
e eficiência na criação e na aplicação do direito público,
dentre os quais, destacam-se:
Art. 20 . Nas esferas administrativa, controladora e judi-
cial, não se decidirá com base em valores jurídicos abs-
tratos sem que sejam consideradas as consequências
práticas da decisão.
[...].
Art. 21. A decisão que, nas esferas administrativa, con-
troladora ou judicial, decretar a invalidação de ato, con-
trato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá

383
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

indicar de modo expresso suas consequências jurí-


dicas e administrativas.
Parágrafo único. A decisão a que se refere o caput deste
artigo deverá, quando for o caso, indicar as condições
para que a regularização ocorra de modo proporcional
e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais, não se
podendo impor aos sujeitos atingidos ônus ou perdas
que, em função das peculiaridades do caso, sejam anor-
mais ou excessivos.
Art. 22. Na interpretação de normas sobre gestão públi-
ca, serão considerados os obstáculos e as dificuldades
reais do gestor e as exigências das políticas públicas a
seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.
(BRASIL, 2018) (Grifou-se).
Além disso, os princípios da AED tornam-na maleável,
para amoldar-se em realidades diversas, congregando-se a
inter e transdisciplinaridade. Nesse sentido:
[...] a AED pode contribuir para (a) a identificação do que
é injusto – toda regra que gera desperdício (é ineficiente)
é injusta – e (b) é impossível qualquer exercício de pon-
deração se quem o estiver realizando não souber o que
está efetivamente em cada lado da balança, isto é, sem a
compreensão das consequências reais dessa ou daque-
la regra. A juseconomia nos auxilia a descobrir o que
realmente obteremos em determinada política pública
(prognose) e o que estamos abrindo mão para alcançar
aquele resultado (custo de oportunidade). Apenas deten-
tores desse conhecimento seremos capazes de realizar
uma análise de custo-benefício e tomarmos a decisão
socialmente desejável. (GICO JUNIOR, 2014, p. 28).
Assim, quando a decisão envolve o direito à vida, nas
palavras do conselheiro do Conselho Administrativo de

384
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Defesa Econômica-CADE, Alexandre Cordeiro, as escolhas


são trágicas, contudo “[...] a vantagem da análise econômi-
ca do Direito é conseguir medir o impacto das decisões e
das normas [...].” (COURA, 2017, s. p.).
A Análise Econômica do Direito, portanto, tem sido
apontada como fundamento de decisões, como esposa-
da no trecho de Acórdão em Apelação, inscrito sob o nº
70077089860, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul, que trata da teoria do risco concorrente:
[...] Caso se examine a questão sob a óptica da análise
econômica do direito, pode-se invocar a doutrina do
cheapest cost avoider. Esta doutrina defende a ideia
de que um critério objetivo para minimizar perdas e
evitar custos consiste em tentar identificar quem pode
evitar o dano a um menor custo [...] (RIO GRANDE DO
SUL, 2018).
Com efeito, o que deve prevalecer é a eficácia das
ações administrativas, que não deverão ser executadas
quando se mostrarem ineficientes e/ou excessivamente
onerosas e, nesse caso, pode ser afastada, fundada na lei
e em consonância com os princípios gerais do direito,
o que possibilita uma ponderação fundamentada e sus-
tentada no interesse da coletividade, o que redunda na
juridicidade qualificada.
Nessa perspectiva, Freitas leciona que o Direito Admi-
nistrativo é composto de Direito Formal e Material, teoria
e prática, de forma que lançando-se mão tão somente das
regras não se é possível encontrar respostas para toda a
complexa atividade estatal. Assim:
O sistema administrativo não se constrói dotado de es-
treitos e definitivos contornos, sobretudo porque o dog-
ma da completude não resiste à constatação de que as

385
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

contradições e as lacunas acompanham as normas, à


feição de sombras. Dado que a decisão administrativa
transcende a esfera do discurso descritivo e da lógica
formal em termos dedutivos, verifica-se que o formalis-
mo não abarca o todo do fenômeno administrativo, em
profundidade e extensão. (FREITAS, 2014, p. 76).
Nesse viés, faz-se necessária uma análise detida so-
bre as políticas públicas que serão implementadas, não
se concebendo programas sem um prévio estudo de sua
viabilidade econômica e financeira, evitando-se que se
instituam programas de atendimento a pacientes, como o
Home Care, caso a dificuldade e o custo e implementação
não resultem em efetivos benefícios humanos e sociais.
Não obstante, percebe-se flagrante resistência por parte
das operadoras de planos de saúde em oferecer o trata-
mento na forma de Home Care. Contudo, o STJ tem se
posicionado no sentido de determinar a concessão, desde
que o custo do atendimento domiciliar, por dia, não su-
pere o custo diário em hospital, conforme se vislumbra
na decisão Agravo em Recurso Especial nº 1.016.162 – SP,
julgado em maio de 2017:
Ademais, acerca da controvérsia em torno da recusa da
recorrente à cobertura do tratamento domiciliar pelo sis-
tema home care, o acórdão reclamado deu solução à
lide sob o seguinte enfoque: É importante ressaltar que
não há controvérsia acerca da necessidade da prestação
de tais serviços.[...] diante da gravidade do estágio atual
da parte recorrida, há urgência/emergência para o trata-
mento, restando inequívoco que este deve ser na forma
domiciliar (home care), tratando-se, a recusa do plano
de saúde, de ato ilegal e abusivo.[...]. Mesmo nos casos
de expressa exclusão da cobertura mediante o serviço

386
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

de home care, tem sido reconhecida a abusividade dessa


cláusula contratual. A propósito: [...] 1 - Polêmica em tor-
na da cobertura por plano de saúde do serviço de “home
care” para paciente portador de doença pulmonar obs-
trutiva crônica. 2 - O serviço de “home care” (tratamento
domiciliar) constitui desdobramento do tratamento hos-
pitalar contratualmente previsto que não pode ser limi-
tado pela operadora do plano de saúde. [...]. 4- Ressalva
no sentido de que, nos contratos de plano de saúde sem
contratação específica, o serviço de internação domi-
ciliar (home care) pode ser utilizado em substitui-
ção à internação hospitalar, desde que observados
certos requisitos como a indicação do médico assis-
tente, a concordância do paciente e a não afetação
do equilíbrio contratual nas hipóteses em que o cus-
to do atendimento domiciliar por dia supera o custo
diário em hospital. [...] (BRASIL, 2017) (grifou-se).
Hodiernamente, no Brasil, podem ser citados dois exem-
plos de empresas privadas que tiveram relativo sucesso na
disponibilização do atendimento Home Care, quais sejam
a ADS e a Home Doctor, ambas sediadas em São Paulo e
que são modelos lucrativos e em franca expansão desse
tipo de serviço (GODINHO, 2016, s.p.).
Segundo Luiz Claudio Rodrigues Marrochi, à época pre-
sidente do Núcleo Nacional das Empresas de Serviços de
Atenção Domiciliar (NEAD), o ponto nevrálgico para imple-
mentação desse tipo de serviço reside no fato da escassez
de recursos humanos qualificados para prestar tal forma de
atendimento (GODINHO, 2016, s.p.).
Marrochi sustenta que se trata de um setor jovem e que
exige mão de obra qualificada, o que não se vislumbra no
mercado de trabalho, tampouco no meio acadêmico, que

387
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

é carente de pesquisas e cursos de especialização na área,


situação que dificulta a implementação do serviço, visto que
são poucos os profissionais com formação apropriada, con-
dição que acaba elevando os custos operacionais (GODI-
NHO, 2016, s.p.).
Afirma ainda o autor que a dificuldade reside no fato de
equilibrar a delicadeza desse tipo de serviço com a com-
plexidade das exigências técnicas que o serviço demanda,
e que seguem o modelo formal de condutas e praxes de
atendimento hospitalar tradicional.
Segundo relato do Diretor e Pesquisador do NEAD, no
ano de 2018, Ari Bolonhezi, as empresas prestadoras do
Home Care têm notado um significativo aumento na sua
procura, tendo em vista o envelhecimento da população,
decorrente da acrescente expectativa de vida, aliada à ca-
rência de vagas em hospitais, ao aumento de patologias
crônicas e incapacidades funcionais, que podem ser tratadas
em ambiente domiciliar, desde que o paciente seja assistido
por uma equipe multidisciplinar (REZENDE, 2018, s.p.).
Outro aspecto que merece relevo é o fato de que,
para a prestação desse serviço faz-se necessária “[...] uma
estrutura sofisticada de logística, com locais de depósito
de equipamentos e medicamentos e frota de transporte
para as equipes e materiais[...]”. (GODINHO, 2016, s.p.).
Assim, infere-se o grau de complexidade e planejamento
que a disponibilização desse serviço demanda, aspecto
que, contudo, não pode ser considerado obstáculo in-
transponível para sua implementação.
Nas pesquisas da autora, de acordo com os especialistas da
área, a chamada desospitalização, que é a transferência dos
cuidados efetuados em um hospital para a residência do pa-
ciente, reduzem em até 80% os gastos para o sistema de saúde

388
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

(GODINHO, 2016, s.p.). Esta estimativa mostra-se plausível,


sobretudo se considerada a supressão do custo referente à
diária hospitalar, reconhecidamente de valor elevado.
Pelo exposto, infere-se que se trata de um ramo no qual
a gestão é o ponto crucial para a implementação desse em-
preendimento no tocante ao levantamento e controle de
custos, tanto na esfera privada quanto na pública, sendo
esse o ponto no qual acredita-se que a análise econômica
do direito se amoldaria perfeitamente com a interdisciplina-
ridade das ciências, a fim de que se possa encontrar solu-
ções adequadas, proporcionais e razoáveis, humanizando-
se os tratamentos de saúde, par e passo com a redução dos
custos do seu fornecimento.
Não se pode olvidar, contudo, que ao lado dessa dis-
cussão existem demandas judiciais nas quais o tratamento
tem sido deferido por meio de medidas liminares, quan-
do o Poder Judiciário determina que o Estado custeie o
tratamento de forma compulsória, por meio de bloqueios
de valores nas contas bancárias dos entes estatais, para
pacientes usuários do SUS.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A atuação do Estado, representado pelos poderes Exe-
cutivo, Legislativo e Judiciário, materializa-se, principalmen-
te, por meio de ações positivas que buscam garantir aos
indivíduos o alcance a uma vida digna. Este é o seu papel
fundamental como Estado Social Democrático de Direito,
qual seja buscar sempre o atingimento do interesse público
primário. Todavia, existem mazelas nas quais, embora haja
um esforço conjunto de seus órgãos, seus objetivos não se
concretizam adequadamente, o que acaba por gerar defici-
ências que impactam diretamente na vida das pessoas.

389
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Assim, uma forma de materialização de ações em prol


da sociedade são as políticas públicas, que buscam asse-
gurar a consecução dos direitos sociais, tendo como enfo-
que, nesta pesquisa, a seara da saúde, bem maior do ser
humano e essencial para que se tenha uma vida digna.
Neste intento, debruçou-se sobre a análise das ferramen-
tas adotadas pelo Estado na tentativa de disponibilizar aos
seus cidadãos políticas capazes de efetivar os direitos ex-
pressos no texto legal.
Nesse ponto, analisou-se o atendimento domiciliar do
Home Care, que também é denominado de desospitaliza-
ção, no qual o paciente recebe os cuidados em sua resi-
dência, junto de seus familiares, circunstância que propor-
ciona um atendimento humanizado e melhor qualidade de
vida a todos os envolvidos no processo. Contudo, sabe-se
que existem condicionantes que acabam por impactar di-
retamente na eficácia das políticas públicas prestacionais
do Estado, especialmente ligados a gestão e contingencia-
mento orçamentário.
Dessa forma, depreende-se que o norteador das ações
estatais deve ser a busca do interesse público, tendo como
escopo o bem da coletividade, aliando-se as diversas ci-
ências com seu aparato de cognição interdisciplinar, em
especial no que concerne a aplicação da teoria da Análise
Econômica do Direito, como forma de estabelecer a via-
bilidade ou não da política pública do Home Care, casuis-
ticamente, tanto por meio das empresas operadoras de
planos de saúde quanto pelo próprio Estado.
Esse é um trabalho que para se perfectibilizar deverá
contar com uma conjunção de esforços, com frentes de
trabalho em equipe, pautados no altruísmo institucional e
espírito de cooperação, que deverão ser a tônica para que

390
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

a AED encontre um terreno fértil para fomentar ideias nas


quais o debate e embate serão inevitáveis. Nessa perspec-
tiva, não há espaço para protagonismos personalistas, tam-
pouco para viéses autoritários, ou mesmo “jogo” de trans-
ferências de responsabilidades, pois o foco deverá ser a
busca da soma de esforços entre os atores envolvidos, para
o alcance da decisão/solução mais acertada, pois o direi-
to, interconectado com as demais ciências, especialmente a
econômica pode produzir resultados mais eficazes.
Reconhece-se que se está diante de um desafio traba-
lhoso, árduo e desgastante, visto que pressupõe uma mu-
dança de paradigmas e o estabelecimento de uma nova
perspectiva de solução de problemas complexos, nas
quais a colegialidade, a participação da cooperação de-
vem substituir o solipsismo, e o protagonismo típico de
exercício arbitrário de poderes e competências públicas.
Diante desse cenário, em especial à temática da política
do Home Care, conclui-se que a pesquisa, a experiência,
a ponderação e o debate inter ou transdisciplinar, além da
análise sistêmica de todos os fatores, podem redundar no
alcance das melhores estratégias e condutas para o alcan-
ce dos fins almejados pelo Estado, em especial àqueles
que podem dar concretude à prevalência da dignidade
humana, em compasso com as possibilidades econômico-
financeiras dos atores estatais.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as con-
dições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organiza-
ção e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras pro-
vidências. Brasília: Senado Federal, 1990. Disponível em: http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm. Acesso em: 23 maio 2019.

391
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

_______. Lei nº 10.424, de 15 de abril de 2002. Dispõe sobre as


condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a
organização e o funcionamento de serviços correspondentes e dá
outras providências, regulamentando a assistência domiciliar no
Sistema Único de Saúde. Brasília: Senado Federal, 2002. Dispo-
nível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10424.
htm. Acesso em: 02 abr. 2019.
_______. Ministério da Saúde. Portaria Nº 825, de 25 de abril
de 2016. Redefine a Atenção Domiciliar no âmbito do Sistema
Único de Saúde (SUS) e atualiza as equipes habilitadas. Dispo-
nível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2016/
prt0825_25_04_2016.html. Acesso em: 22 de mai. 2019.
_______. Superior Tribunal de Justiça (Decisão Monocrática). Agra-
vo em Recurso Especial Nº 1016162. Relator: Ministro Paulo
de Tarso Sanseverino, Julgado em 19 de maio de 2017. Dispo-
nível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/
mediado/?componente=MON&sequencial=72737574&num_regis-
tro=201602992182&data=20170524. Acesso em 15 maio 2019.
_______. Lei nº 13.655, de 25 de abril de 2018. Inclui no Decre-
to-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro), disposições sobre segurança jurídica
e eficiência na criação e na aplicação do direito público. Brasília:
Senado Federal, 2018. Disponível em: https://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2018/Lei/L13655.htm. Acesso em: 03
nov. 2019.
BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito Administrativo e Políticas Pú-
blicas. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM (COFEN). Resolução 267,
de 05 de outubro de 2001. Rio de Janeiro: COFEN, 2001. Disponí-
vel em: http://www.coren-ro.org.br/wp-content/uploads/2014/06/
Anexo-Resolucao-267.pdf. Acesso em: 17 abr. 2019.
_______. Resolução 270, de 18 de abril de 2002. Foz de Iguaçu:

392
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

COFEN, 2002. Disponível em: http://www.cofen.gov.br/resoluo-


cofen-2702002_4307.html. Acesso em: 22 maio 2019.
COURA, Kalleo. Análise Econômica do Direito. In: JOTA, publi-
cado em 01 de julho de 2017. Disponível em: https://jota.info/
especiais/analise-economica-do-direito-chega-aos-tribunais-do
-pais-01072017. Acesso em 21 maio 2019.
FALCÃO, Horácio Arruda. Home Care – uma alternativa ao aten-
dimento da Saúde. In: Revista Virtual de Medicina, 1999. Dis-
ponível em: http://www.geocities.ws/mcdobies/enf_domiliciar/
home_care.doc. Acesso em 30 maio 2019.
FREITAS, Juarez. Direito Fundamental à Boa Administração Públi-
ca. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2014.
GICO JÚNIOR, Ivo. Introdução ao Direito e Economia. In: TIM,
Luciano Benetti (Org.). Direito e Economia no Brasil. 2. ed. São
Paulo: Atlas S.A., 2014, p. 1-33.
GODINHO, Inês. Atendimento em casa: o serviço que pode resolver o
nó da saúde. In: Jornal das Associações Comerciais do Estado de São
Paulo. Publicado em: 16 de junho de 2015. Disponível em: https://
dcomercio.com.br/categoria/sustentabilidade/atendimento-em-casa-o-
servico-que-pode-resolver-o-no-da-saude. Acesso em: 01 maio 2019.
JÚNIOR, Nauro. Pelotas é a primeira cidade gaúcha a receber progra-
ma de saúde domiciliar do governo federal. Gaúcha ZH. Publi-
cada em 16 de março de 2012. Disponível em: https://gauchazh.
clicrbs.com.br/saude/vida/noticia/2012/03/pelotas-e-a-primeira-
cidade-gaucha-a-receber-programa-de-saude-domiciliar-do-gover-
no-federal-3696731.html. Acesso em: 01 mai. 2019.
REZENDE, Ana Paula. O crescimento do atendimento home care.
In: SEBRAE. Publicado em: 13 de dezembro de 2018. Disponível
em: https://sebraers.com.br/saude/o-crescimento-do-atendimento
-home-care/. Acesso em: 01 mai. 2019.
RIO GRANDE DO SUL. Apelação Cível Nº 70077089860. Relator
Desembargador Eugênio Facchini Neto, Nona Câmara Civel. Jul-

393
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

gado em 25 de abril de 2018. Disponível em: http://www.tjrs.jus.


br/busca/search?q=aplica%C3%A7%C3%A3o+da+an%C3%A1li-
se+econ%C3%B4mica+do+direito&proxystylesheet=tjrs_index&-
client=tjrs_index&filter=0&getfields=*&aba=juris&entsp=a__politi-
ca-site&wc=200&wc_mc=1&oe=UTF-8&ie=UTF-8&ud=1&sort=da-
te%3AD%3AS%3Ad1&as_qj=tratamento+home+care+custeado+pe-
lo+sus&site=ementario&as_epq=&as_oq=&as_eq=&as_q=+#main_
res_juris. Acesso em: 27 maio 2019.
SAMPAIO, Ana Virgínia C. de Faria Sampaio; IMAI, Cesar. A atenção
domiciliar à saúde (home health care), a arquitetura acessí-
vel e o desenho universal. Publicado em: 2012 Disponível em:
https://www.usp.br/nutau/nutau_2012/2dia/20120628170403_arti-
go%20NUTAU%202012%20final%20com%20pag.pdf. Acesso em 30
maio 2019.

394
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ANÁLISE ECONÔMICA DA TEORIA DA PERDA DE


UMA CHANCE PELA NÃO SUBMISSÃO À PROCE-
DIMENTO DE COLETA DE CÉLULAS-TRONCO.

Lorena Pinto Gonçalves108 e Miriam Olivia Knopik Ferraz109

Resumo: Apesar da existência de indenização a danos


tradicionais, como o patrimonial e moral, pressupõe-
se ainda uma modalidade bastante peculiar conhecida
como o dano recorrente da Teoria da Perda de uma
Chance. O objetivo do estudo é analisar em especí-
fico o Recurso Especial nº 1.291.247 julgado em 2014
e o dano econômico à vida sofrido por parte de um
recém-nascido ao não ser submetido ao procedimen-
to de coleta de células-tronco, bem como, a relação
deste fato com a Teoria mencionada. Sendo delineada
na responsabilidade civil, esta se origina da extinção
de uma oportunidade de um sujeito, esta na qualida-
de de patrimônio jurídico, ao ser lesada pela conduta
ilícita o prejuízo vai além de uma hipótese. O prejuízo
é certo e não necessita de prova sobre, mas sim, de
prova sobre sua perda. Questiona-se no problema de
pesquisa a forma como esse dano atingiu dois vieses: a
economia e o direito. A metodologia utilizada é lógico-
dedutiva, por meio da análise sobre as células tronco,
108 Lorena Pinto Gonçalves – UNIFACEAR – Centro Universitário; Graduanda em Direito. Faz parte
do Grupo de Pesquisa Gênero e Violência e é Pesquisadora de Iniciação Científica na UNIFACEAR –
Centro Universitário. Já estagiou nos Juizados Especiais no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná;
no Ministério Público e atualmente está estagiando no Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região.
É Mediadora do CEJUSC no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. lorenap.gons@gmail.com.
109 Doutoranda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná- Brasil (bolsista PRO-
SUP), Mestre e Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná- Brasil. Es-
pecialista em Direito Constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional. Editora
Adjunta da Constituição, Economia e Desenvolvimento: Revista da Academia Brasileira de Direito
Constitucional. Coordenadora Adjunta do Grupo de Estudos em Análise Econômica do Direito
da Pontifícia Universidade Católica do Paraná- Brasil. Professora da Universidade Positivo e da
UNIFACEAR Advogada. m.okf@hotmail.com.

395
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

diferenciação entre algumas modalidades de dano e as


consequências jurídicas e econômicas sobre o julgado.
Assim sendo, em suma, tentou-se demonstrar que com
a adesão dessa Teoria estudada, houve influência na
vida privada e econômica dos indivíduos envolvidos
na relação jurídica, além de existir impacto no biodi-
reito e na bioética.
Palavras-chave: Células-tronco, Responsabilidade Civil,
Indenização, Teoria da Perda de uma Chance.

INTRODUÇÃO
No contexto da análise econômica do direito, escolheu-
se uma decisão paradigmática que integrasse uma área di-
versa do direito, assim, a coleta de células-tronco, conside-
rada como uma biotecnologia que traz aos seres humanos
a viabilidade de prevenção e tratamento patógenos graves
como a leucemia foi a temática escolhida e presente no
Recurso Especial nº 1.291.247 julgado em 2014. Nesta de-
cisão, os fatos giram em torno da modalidade de dano
referente a perda de uma chance, que a cada espaço de
tempo é mais aceita nos tribunais brasileiros.
Desta feita, o objetivo da pesquisa, foi buscar a partir
de uma análise a Teoria da Perda de uma chance a forma
como esta é construída em um fato concreto e entender
de que forma ocorre sua classificação e valoração sob a
luz na análise econômica do direito. Para tanto, questiona-
se sua peculiaridade referente a certeza do dano sobre o
patrimônio jurídico e a forma como é realizado o arbitra-
mento da indenização.
Para construção dos objetivos, utilizou-se a metodolo-
gia lógico-dedutiva através da própria decisão e doutrinas
específicas sobre a Teoria da Perda de uma Chance, Aná-

396
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

lise Econômica do Direito e sobre a Teria dos Custos de


Oportunidade. Realizou-se ainda uma comparação entre
essas figuras com base nos fundamentos contidos na deci-
são do Tribunal para verificar as suas aproximações e tirar
a conclusão sobre a aplicação da Teoria de modo geral,
bem como, na decisão.
Assim, o estudo se dividiu em duas partes, primeiro
destrinchou-se os fatos e como o processo ocorreu para
que se analisasse de fato a Teoria da Perda de uma
Chance. Assim, a partir do momento que é analisada
sua integração sobre a responsabilidade civil, estudou-
se os requisitos para sua configuração, principalmente
sobre o dano, visto que, a partir de uma extensão de
entendimentos sobre esse pressuposto, percebe-se que
o dano se molda encima da perda da chance e não em
um dano concreto de fato.
Na aproximação do caso e da Teoria na Análise Eco-
nômica do Direito, utilizou-se a Teoria dos custos de
oportunidade, assim, antes de tudo, pela tentativa de
definição e finalidade desta, o questionamento e sua
compatibilidade com a perda de uma chance podem ser
traçados ao momento que os custos de oportunidade
foram baseados em escolhas e a forma como esta esco-
lha interferiu no fato de direito e gerou custos. Portanto,
a partir disso, a tentativa de trazer maior segurança na
aplicação da Teoria da Perda de uma Chance no caso
estudado, existe ainda fundamentação sobre os custos
que a escolha incorreta gerou a empresa e ao recém-
nascido, ponto este é que trouxe a perda da oportuni-
dade deste se utilizar eventualmente de seu material
genético no caso de desenvolver algum patógeno grave
em seu corpo.

397
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE PELA NÃO


SUBMISSÃO À PROCEDIMENTO DE COLETA DE
CÉLULAS-TRONCO: ANÁLISE DO CASO - RECURSO
ESPECIAL Nº 1.291.247 JULGADO EM 2014.
A perda da chance da cura de uma possível doença que
um filho poderia ter. Como valorar uma situação dessas?
Este é o caso que o presente trabalho busca analisar,
que a princípio pode parecer hipotético, mas é exatamente
o que se passou em uma lide entre Carlos Mario da Costa
Cortazio Correa, Francis Longo Cortazio Correa e seu filho
recém-nascido, em face da empresa Cryopraxis Criobiolo-
gia LTDA (BRASIL, 2014, p. 1). No presente tópico utiliza-
se da metodologia lógico-indutiva, e assim, subdividiu-se
a análise em: 1. Compreensão do caso; 2. Compreensão da
Teoria da Perda de uma chance.
Para a compreensão do caso (1.) adentra-se nas suas
particularidades. Primeiramente os recorrentes exprimem
em sua petição inicial que na data do dia 26 de novembro
de 2008, ratificaram um contrato de prestação de serviços
com a empresa Cryopraxis Criobiologia LTDA com o ob-
jetivo de esta realizar a coleta e a criopreservação110 das
células-tronco de classificação embrionária do seu filho re-
cém-nascido na data dos fatos. Logo, no dia 31 de novem-
bro de 2008, o Sr. Carlos informou devidamente a empresa
sobre a data da cesariana que se realizaria no dia 06 de
janeiro de 2009, no entanto, ocorre que, ao momento de
ser realizado o procedimento, a empresa responsável não
110 Procedimento que visa a preservação de embriões advindos de gametas femininos e masculinos,
assim sendo, o procedimento realizado através dos gametas femininos, geralmente são utilizados
com o intuito de realizar uma reprodução assistida em um momento oportuno e servem para
trazer maior sucesso na reprodução no que tange a mulheres com problemas de fertilização.
Quanto aos gametas masculinos, geralmente, são colhidos com o intuito de proteger o material
genético quando o homem está sendo submetido a tratamentos médicos como a quimioterapia
ou radioterapia, desse modo, poderá eventualmente utilizar seus gametas para uma inseminação.
(SCHMITT, 2019, p. 14-15)

398
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

se encontrava no local, apesar de ter sido fornecido todas


as informações necessárias gerando a família extrema pre-
ocupação e diversos transtornos (BRASIL, 2014, p. 4). Ou
seja, o momento para a realização da coleta das células-
tronco era no nascimento, e a empresa não realizou.
Devido a essa quebra de contrato por parte da empresa
frente aos interesses e direitos dos autores, requereu-se
desta maneira uma indenização referente a danos extra-
patrimoniais. Diante a este pedido, a parte ré esclareceu
que houve um imprevisto, qual seja, que sua preposta não
logrou êxito em chegar no local no horário definido entre
as partes, motivo este, acarretou na não coleta do mate-
rial, restituindo as partes os valores que teriam adiantado
para tanto. Achando apropriado o ato da devolução do
dinheiro por não ter prestado o serviço, expressou sua
inconformidade com a indenização em sua contestação
(BRASIL, 2014, p. 4).
A seguir, proferida a sentença, a magistrada julgou pro-
cedente a ação para os requerentes, com o fundamento
de que não fora somente uma quebra contratual e que
os danos extrapatrimoniais subsistiram nos fatos, os quais
ficaram fixados em R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Contu-
do, julgou improcedente o segundo pedido indenizatório
relacionado a um suposto dano hipotético que o menor
teria sofrido, cujo qual, não poderia ser cobrado haja vista
a ausência de concretude do dano nesta modalidade de
lesão ao patrimônio jurídico, pois este se basearia encima
de uma simples expectativa e necessitaria do dano certo
para que houvesse caracterização da responsabilidade ci-
vil (BRASIL, 2014, p. 4-29).
Durante o prazo recursal, ambas as partes recorreram,
porém, o Tribunal de origem, do Estado do Rio de Janeiro,

399
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

durante o seu juízo de admissibilidade deu seguimento


apenas para o recurso peticionado pelas partes autoras.
Ademais, o mesmo tribunal durante sua análise de ad-
missão, modificou o valor indenizatório de encargo da
ré para que o valor indenizatório correspondesse a R$
15.000,00 (quinze mil reais) para cada um dos pais, ou
seja: a indenização passou a ser o dobro do valor inicial.
Por outro lado, manteve-se o pedido de indenização ao
menor improcedente.
No mesmo sentido do entendimento da magistrada, a
decisão presente no acórdão ora recorrido, pregou pelo
parecer de que a indenização extrapatrimonial em favor
da criança era indevida pelo motivo de que não contém
a consciência sobre os fatos, bem como, que não existe
a devida probabilidade de que o dano realmente ocor-
ra, sendo excluída a classificação dos fatos com relação
a teoria da perda de uma chance, visto que, durante o
nascimento verificou-se que a criança continha uma saúde
comparativamente normal com as das outras crianças de
sua idade (BRASIL, 2014, p. 5).
Contrários a estes fundamentos, os autores recorreram
ao Superior Tribunal de Justiça com os fundamentos de
que a decisão do acordão além de ter ferido o Estatuto da
Criança e do Adolescente em seus artigos 2.º, 3.º, 4.º, 5.º,
15 e 70, houve lesão ao Código de Defesa do Consumidor
em seu art. 14. Além do mais, respaldaram sobre a caracte-
rização da teoria da perda de uma chance, como também,
pela fixação de indenização em favor do menor (BRASIL,
2014, p. 5).
Com as devidas manifestações e remetido o processo
para julgamento, o Recurso Especial foi julgado pela Ter-
ceira Turma, sendo dado provimento de acordo com a

400
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

manifestação da maioria e reconhecimento a existência


e a aplicação da teoria da perda de uma chance na
temática trazida pelos recorrentes, além de fixação de in-
denização em favor do menor. Os fundamentos utilizados
basicamente quanto a teoria ora estudada se baseia em
suma: i. A criança foi a principal atingida; ii. A criança con-
tém direito a indenização visto que se exauriu a chance
desta de se utilizar de algo que realmente existiu, ou seja,
não será possível se utilizar das células embrionárias em
um eventual tratamento de saúde (BRASIL, 2014, p. 5-6).
Sendo reconhecida a aplicação da teoria da perda de
uma chance, com relação ao que condiz a indenização ex-
trapatrimonial em favor da criança, a Corte Superior fixou
o valor R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), já que a infante
foi o maior prejudicado devido a não realização do proce-
dimento (BRASIL, 2014, p. 23).
Por fim, insta salientar que houve provimento pela
maioria, no entanto, à vista da não uniformidade dos en-
tendimentos ministrais, há demonstração da tamanha com-
plexidade da teoria, pois, ao mesmo tempo que existem
estudiosos que entendem pela sua aplicação, existem ou-
tros que pregam o contrário se baseando em resumo que
deveria existir uma chance de perda séria, além daquele
que foi o suposto prejudicado estar relacionado de fato
devido as suas condições e a situação futura, que neste
caso, seria uma doença que necessitaria do material, como
também, uma proximidade entre a perda e o fato saúde
(BRASIL, 2014, p. 23-27).
Após a compreensão do caso, adentra-se na Teoria da
Perda de uma Chance (2.). A referida teoria pode ser de-
finida como a possibilidade de um sujeito de direito ser
responsabilizado civilmente a partir do momento que uma

401
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

oportunidade ou chance considerada como patrimônio


jurídico de outro sujeito é tirada de seu poder, visto a
conduta ilícita praticada pelo primeiro indivíduo, ou seja,
a responsabilidade da perda de uma chance não existirá
se o dano for causado pela própria vítima. Além do mais,
cabe dizer que a teoria compreenderá na perda da pos-
sibilidade de almejar um resultado já aguardado ou um
dano com probabilidade de existir no mundo fático, de-
vendo para tanto, realizar uma devida valoração quanto a
conquista desse resultado no caso dessa oportunidade não
ter sido lesionada (FRANCO; PORTO, 2018, p. 205).
A referida teoria encontra-se dentro da perspectiva da
responsabilidade civil que se materializa quando um agen-
te através de sua ação ou omissão lesiva ou culposa, acaba
por cometer um dano patrimonial ou moral, em que existe
um nexo de causalidade entre a conduta praticada e o
dano ao ofendido (PEREIRA, 2013, p.237).
A Teoria da Perda de uma chance, diferente dos danos
tradicionais, ou seja, o dano patrimonial e moral, conterá
algumas peculiaridades, porém, antes de tudo, diz-se que
os seus requisitos para a classificação em uma situação
de fato são os mesmos citadas acerca da responsabilidade
civil, porém, com algumas adequações que merecem ser
destacadas (SANTOS, 2014).
Para melhor compreensão, cabe realizar um aprofun-
damento sobre o dano, este por sua vez, reputa-se como
pressuposto da aplicação da responsabilidade civil, seja
de forma contratual ou extracontratual, deverá existir pa-
ralelamente na situação fática para que consequentemente
exista a responsabilidade e o dever de indenizar (SILVA,
2013, p.12).
Ademais disso, o dano pode ser conceituado como uma

402
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

lesão, seja de maneira a diminuir ou destruir o patrimônio


jurídico de um indivíduo, uma vez que, quando a lesão
ocorre existirá um evento, um sujeito que estará sendo o
lesado sem livre vontade frente ao ato danoso, bem como,
um bem ou interesse jurídico que pode ser patrimonial ou
moral. À vista disso, cabe ainda dizer, que a lesão apenas
irá se originar se houver prova real e uma lesão de fato
ao bem jurídico. Sendo assim, como mencionado, pode
ser tanto moral quanto patrimonial e fará referência e ao
interesse jurídico tutelado, como também, a ação realizada
pelo sujeito autor do ilícito, que poderá ser através de uma
ação ou omissão (SILVA, 2013, p.12).
Insta dizer que, existem determinados requisitos a se-
rem observados para a caracterização do dano, quais se-
jam: i. A injustiça do dano através da ação ou omissão
sobre um patrimônio jurídico a um sujeito de direito; ii. A
certeza, referente a existência do dano, ou seja, ele é cer-
to, efetivo e indenizável; e ii. Imediatidade ou subsistência
do dano, visto que, não se indeniza algo que já teve repa-
ração (SILVA, 2013, p.12).
A consequência da existência do dano em uma situação
fática quando um indivíduo se utiliza da sua pretensão,
em síntese, é a indenização. Sua finalidade é basicamente
promover uma compensação simbólica, ou seja, exteriori-
zará que o sujeito atingido conterá uma relação entre o ato
ilícito realizado por outro sujeito, sendo que, ao analisar
detidamente os pontos existentes no fato danoso, como a
gravidade e a natureza por exemplo, será arbitrado valor
em dinheiro de acordo com o caso em questão (KERN,
1999, p.26).
No entanto, conforme supramencionado anteriormente,
para que o dano seja constituído, a certeza sobre ele é

403
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

fundamental, sendo assim, é excluída a possibilidade de


indenização em casos referentes a um dano hipotético. A
referência sobre esse requisito é a do sujeito atingido pelo
ato ilícito ter suportado um prejuízo ou eventualmente o
suportará em um momento recente, prestes a acontecer.
Na Teoria ora estudada, se discute a dificuldade de iden-
tificar esta certeza, pois, o sujeito perdeu uma chance ou
vantagem que pretendia conquistar, porém, como ocorreu
o ilícito acabou não ocorrendo (GONDIM, 2010, p.62).
Dessa forma, para realizar essa apreciação, para que
um dano seja encarado como um dano decorrente da
perda de uma chance, entende-se em resumo que deverá
ser explorada a possibilidade de concretização da chance
que foi perdida, já que, o fundamento da Teoria é a pró-
pria chance ou oportunidade perdida. Assim, para chegar
ao ponto de existir uma indenização, os requisitos que o
constituem o dano normal não devem ser excluídos, de-
vendo, portanto, observar os requisitos da responsabilida-
de civil em conjunto. Ocorre que, quando nos referimos
a essa modalidade diferenciada de lesão a um patrimônio
jurídico, a base não será construída pelo resultado final,
pois, não chegou a acontecer, ao contrário da oportunida-
de de se obter algo, que de fato existiu definitivamente, ou
seja, a chance perdida é algo concreto e existe fundamen-
to para que a reparação aconteça devido a possibilidade
do resultado final vir a existir (GONDIM, 2010, p.63).
Assim sendo, diz-se de fato que existe uma certa ale-
atoriedade sobre este resultado, porém, ao que concerne
a certeza de se perder uma chance, a sua existência é
inegável e apenas desencadeou um rumo diverso do que
certamente já aconteceria. Desta feita, a incerteza da ocor-
rência da chance estaria no sentido de trazer o benefício

404
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

esperado, porém, ela era concreta e é de forma básica um


dano em si mesma (GONDIM, 2010, p.63-64).
Portanto, os requisitos que caracterizam a responsabi-
lidade civil serão vislumbrados da forma a reclassificar o
dano normal sob a oportunidade perdida, enquanto os
demais pressupostos, deverá ainda conter a conduta ilíci-
ta, bem como, nexo causalidade sobre a perda da chance,
situação esta, que será o objeto a ser reparado em uma
lide, sendo algo autônomo do que eventualmente pode
acontecer (GONDIM, 2010, p.64).
Com base nas considerações acima, verifica-se que para
a haja a caracterização da Teoria da Perda de uma chan-
ce, é necessário antes de tudo haver o preenchimento de
algumas características que constituem a responsabilidade
civil, quais seja, o nexo causal entre a conduta e o dano,
o dano propriamente dito e o ato ilícito daquele que o re-
produziu no mundo dos fatos. Ocorre que, no que consis-
te ao dano, percebeu-se que, para que exista nesse mundo
paralelo de danos, é necessário conter uma visão menos
sistemática e se utilizar da analogia sobre os fatos que a
Teoria traz, pois, de fato o dano no presente existe, mas
qual é a proporção da sua certeza e o que gira em torno
desta para que eventualmente seja indenizada?
De acordo com isso, cabe explorar ainda alguns requi-
sitos e realizar um comparativo com os fatos presentes
na decisão. Em primeiro lugar, na decisão ora estudada
deverá abranger uma chance séria e real para que se pu-
desse discutir a indenização, a qual, antes de tudo deverá
ser possível e se fundar em quesitos objetivos quanto a
possibilidade da oportunidade perdida. Se fundamentan-
do sobre o princípio da razoabilidade, o ofendido deve
demonstrar em juízo de que de fato a possibilidade de

405
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

concorrer a chance perdida existiria, não bastando a mera


fundamentação de uma simples esperança relacionada a
um dano hipotético (SILVA; DIAS, 2016, p.89).
A fundamentação do Recurso Especial expressou que
tais requisitos foram evidenciados, pois, a indenização te-
ria como base o dano ser decorrente chance perdida ser
séria e real. Não se baseando no dano final, analisou-se a
existência de um contrato de prestação de serviços, a qual,
concretizou a certeza quando se observa que a oportuni-
dade existiu e foi tirada do poder do menor ao momento
que a preposta da empresa não compareceu para realizar
o procedimento. Em resumo, a base da perda da oportu-
nidade ocorreu quando a coleta do material era certa para
ocorrer no mundo dos fatos, devido a existência de um
contrato pactuado entre as partes. Cabe dizer ainda que
a possibilidade de indenizar se fundamenta na medicina
conseguir através de outros meios de colher o mesmo ma-
terial genético no caso da criança vir a desenvolver pro-
blemas de saúde, situação em que se utilizaria o material
que não foi recolhido na data acordada em contrato (BRA-
SIL, 2014, p.9-20).
No âmbito médico a perda da oportunidade pode ainda
ser justificada através de porcentagem, com base no sis-
tema norte-americano a teoria não é aplicada quando um
paciente determinado apresenta mais de 51% (cinquenta e
um por cento) de sobrevivência a algum problema de saú-
de, ou seja, para que esta modalidade de dano existisse,
o ofendido deveria abranger uma porcentagem de risco
menor do que 50% (cinquenta por cento) de alcançar a
chance que estava disputando. Na justiça italiana, existe
contradição a este percentual, dizendo que no mínimo a
perda para ser caracterizada, deverá abranger 50% (cin-

406
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

quenta por cento) e devido a essa incongruência de enten-


dimentos é que de a teoria se baseia de maneira genérica
sobre fatos perdidos, sérios e reais, os quais, bastam haver
comprovação, quesito que é verificado no caso em ques-
tão (SILVA; DIAS, 2016, p.92-93).
Como citado anteriormente, a indenização fundada na
chance perdida não poderá integrar a totalidade da indeni-
zação no caso de haver eventualmente prejuízo, o valor a
ser fixado deverá sempre ser inferior, ou seja, a reparação
não será integral, porém, sua reparação será total no que
se refere as chances perdidas, devido a sua especificidade
e autonomia diante ao dano final que foi frustrado. Des-
se modo, o cálculo se baseará nos seguintes questiona-
mentos: Quais são as chances de o indivíduo alcançar a
oportunidade que estava esperando? Quais são as chances
de o prejuízo ser evitado? Tais perguntas são respondidas
da seguinte forma, a indenização será valorada de acordo
com a probabilidade de lucro no caso de a chance não ter
sido perdida (SILVA; DIAS, 2016, p.93-98).
Como expresso anteriormente, a chance de se realizar
o procedimento de coleta de células-tronco havia extrema
certeza quando analisada a existência de contrato, sendo
que, a chance de eventual prejuízo, se fundamentou nos
avanços médicos e nas demais possibilidades de se atingir
a mesma finalidade no caso do recém-nascido vier a pre-
cisar de células tronco para um tratamento futuro. Cabe
dizer ainda, que os meios disponíveis hoje para conseguir
o mesmo material objeto da indenização, cujo qual é a
possiblidade de prevenir com o tratamento em se utilizaria
as células, é através da coleta da medula-óssea e dentes de
leite, por exemplo (BRASIL, 2014, p.6-23).
Portanto, de acordo com tais esclarecimentos, não há

407
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

dúvidas sobre a perda de uma chance no caso estuda-


do, sem dizer que, é de grande importância reforçar de
que o objeto do processo se refere a perda definitiva de
realizar a prevenção através de tratamento de patologias
com o uso do material genético que iria ser colhido do
recém-nascido. Comparavelmente, a criança foi conside-
rada normal para sua idade diante a outras crianças, não
havendo ainda qualquer doença ou histórico de doenças
hereditárias, porém, tais fatores não são requisitos fun-
damentais para classificação da Teoria, bastando apenas,
a caracterização da certeza devido a expetativa dos pais
em realizar o procedimento para prevenção de patologia
grave, prejuízo futuro este, que poderá ser evitado por
outros meios que a medicina disponibiliza.

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: APROXIMAÇÃO DA


TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE A TEORIA DOS
CUSTOS DE OPORTUNIDADE E O CONSEQUENCIALISMO.
Como metodologia de estudo do presente trabalho será
utilizada a Análise Econômica do Direito (AED). Cabe
pontuar que enquanto o Direito é definido como a “arte
de regular o comportamento humano” (GICO JR., 2014, p.
1), a Economia aborda a tomada de decisões humana e o
seu comportamento em um mundo de recursos escassos,
e quais as consequências. (GICO JR., 2014, p. 1) Nesse
sentido a AED dialoga entre os dois campos do conheci-
mento, utilizando de várias ferramentas teóricas e empíri-
cas para “expandir a compreensão e o alcance do direito e
aperfeiçoar o desenvolvimento, a aplicação e a avaliação
de normas jurídicas, principalmente com relação às suas
consequências” (GICO JR., 2014, p. 1).
Assim, a AED é o instrumento adequado para compre-

408
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ender o fenômeno da Teoria da Perda de uma chance


no caso aplicado, primeiramente traçando em que me-
dida há uma aproximação e um afastamento da referida
teoria com a teoria dos custos de oportunidade, e em um
segundo momento, responder uma das perguntas básicas
dos juseconomistas: quais as consequências do arcabouço
jurídico existente sobre a matéria (GICO JR., 2011, p. 20),
contribuindo nesse sentido para traçar limites.
Adentra-se então na Teoria dos Custos de oportunida-
de. Primeiramente, ressalta-se que por vezes alguns auto-
res utilizam a expressão “custos alternativos” (PEREIRA,
1990, p. 2). Essencialmente voltado à aplicação empresa-
rial, a referida teoria vem a ser aplicada em um cenário de
recursos limitados (escassos) em que os sujeitos elegem
suas prioridades, e assim, os custos de oportunidade se-
riam a “medida daquilo que precisa ser sacrificado para
sua obtenção” (O’SULLIVAN; SHEFFRIN; NISHIJIMA, 2004,
p. 9 a 22), aqui no caso, a escolha.
Em outros termos, Cooter e Ulen afirmam que os custos
de oportunidade se referem ao custo econômico de uma
alternativa, uma escolha, que foi deixada de lado (COO-
TER; ULEN, 2010, p. 53).
Ademais, é possível demonstrar o desenvolvimento da
Teoria dos Custos de Oportunidade na economia:

409
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Tabela 1 - Conceitos de Custo de Oportunidade sob o Enfoque


Econômico
Renda líquida gerada pelo uso de um
WIESER (1860) bem ou serviço no seu melhor uso
alternativo.
Custo de produção de qualquer unida-
de de mercadoria é o valor dos fatores
de produção empregados na obtenção
MEYERS (1942, p.194) desta unidade - o qual se mede pelo
melhor uso alternativo que se poderia
dar aos fatores se aquela unidade não
tivesse sido produzida
Os custos dos fatores para uma em-
presa são iguais aos valores destes
BILAS (1967, p.168)
mesmos fatores em seus melhores usos
alternativos.
O custo de se utilizar alguma coisa
num empreendimento específico é
LIPSEY & STEINER
o benefício sacrificado (ou custo de
(1969,p.215)
oportunidade) por não o utilizar no
seu melhor uso alternativo.
O custo de uma unidade de qualquer
LEFTWICH (1970,p.123) recurso usado por uma firma é o seu
valor em seu melhor uso alternativo
Fonte: SANTOS, 2019, s.p. com base em (BURCH; HENRY, 1974) adap-
tado pelas autoras.

Assim, essencialmente, a escolha entre uma alternativa,


corresponde a abrir mão de outra, e nesse sentido, o valor
do bem/serviço perdido é o custo de oportunidade (SA-
MUELSON; NORDHAUS, 2012, p. 13).
Veja-se que com relação às empresas, é a eficiência que
representa um ponto de maior importância, considerada
como maximização dos resultados ao menor custo, e as-
sim, uma renúncia a uma escolha denomina-se trade-off
(CARVALHO, 2013, p. 64) , ou seja “toda escolha pressu-

410
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

põe um custo, um trade off, que é exatamente a segun-


da alocação factível mais interessante para o recurso, mas
que foi preterida” (GICO JR., 2014, p. 19).
Como demonstrado anteriormente os requisitos para a
materialização da Teoria da perda de uma chance são: i.
Conduta humana; ii. Dano; iii. Nexo de responsabilidade;
iv. Chances sérias e reais.
Por outro lado, a Teoria dos custos de oportunidade vai
considerar: i. Escolha de uma alternativa, ensejará na abs-
tenção à outra; ii. O custo do valor perdido, pela escolha,
é o custo de oportunidade.
No caso demonstrado os pais contrataram um serviço
de coleta de células tronco, com o objetivo de, no fu-
turo, se necessário, utilizar o material para potencializar
tratamentos médicos. Ou seja, em uma situação hipotética
no futuro, o filho deles poderia ter alguma doença, e os
pais acrescentaram uma opção de tratamento. Assim,
quando ocorresse a situação da enfermidade eles teriam
duas escolhas: tratamento tradicional, ou tratamento com
células tronco.
Entretanto, como demonstrado a escolha por um tra-
tamento mais benefício no futuro, foi retirada por ato da
Empresa Cryopraxis Criobiologia LTDA em quebra contra-
tual. Nesse sentido, é possível observar que a empresa foi
a responsável pelo trade off, ou seja, é a responsável pela
renúncia imposta aos pais.
Assim, as duas teorias se encontram, quando se limitou
as escolhas dos pais, gerou-se um custo, uma vez que ao
invés de terem duas alternativas de tratamento agora terão
uma só, um grupo de tratamentos que não incluirá a uti-
lização de células tronco. Assim como em uma empresa
deve ser somado os custos de oportunidade, das escolhas

411
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

não feitas, no caso prático deve ser somado o custo de


uma escolha retirada.
Caso no futuro o filho do casal tivesse uma referida
doença, os pais teriam duas opções de grupos de trata-
mento, com ou sem células tronco. Nesse ponto, uma es-
colha ocasionará a recusa da outra opção, assim, se eles
optassem pelo tratamento tradicional, em um primeiro
momento, estariam abdicando do tratamento com células
tronco, e deveriam arcar com esses custos: sejam financei-
ros, como de tentar novamente o tratamento; em tempo
gasto; e emocional. Eles deveriam arcar de alguma forma
com o custo da escolha, como se vê na teoria dos custos
de oportunidade.
Por outro lado, como se estabeleceu a impossibilidade
da segunda opção de tratamento, por células tronco, esse
custo da escolha deve ser arcado por quem suprimiu a
possibilidade, ou seja, a Empresa Cryopraxis Criobiologia
LTDA. Assim, acrescenta-se mais um subsídio ao integrar
a teoria dos custos de oportunidade à teoria da perda de
uma chance.
Por fim, é importante ressaltar a análise das consequ-
ências das decisões como um dos pilares da Análise Eco-
nômica do Direito, e que há muito é negligenciado pelos
juristas tracionais: “Não que ignorem a realidade social em
suas considerações, tão-somente digo que seu foco tem
sido elaborar justificativas teóricas e abstratas para a flexi-
bilização da lei e sua compatibilização com princípios de
conteúdo indeterminado, segundo algum critério de justi-
ça, que se esforçam para criar e legitimar como racionais
e não voluntaristas” (GICO JR. 2010, p. 14).
Nesse sentido caminha a AED com o propósito de ofe-
recer uma metodologia que analise os fenômenos sociais

412
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

e que auxilie na tomada de decisões, e assim, “a avaliação


da adequação de determinada norma está intimamente li-
gada às suas reais consequências sobre a sociedade (con-
sequencialismo)” (GICO JR. 2010, p. 15).
Partindo-se dessa compreensão é possível observar que
a Teoria da perda de uma chance aplicada ao caso de não
coleta de células tronco deve ser cautelosamente aplicada,
pois a sua generalidade poderá ensejar em consequências
como grandes valores indenizatórios. Assim, o próprio cri-
tério da certeza do dano e os tetos indenizatórios devem
ser vistos como limitações para o deferimento de indeni-
zações respaldadas na referida teoria.

CONCLUSÃO
A partir do estudo de caso realizado acerca da Teoria
da Perda de uma Chance buscou-se aprofundar a temática
da referida teoria em contraponto a uma realidade com
sujeitos e problemáticas humanas e latentes.
Destaca-se que além de existir divergência entre os entendi-
mentos de doutrinadores e até mesmo nos tribunais, percebe-
se que a importância de se trazer maiores fundamentos para
agregar sua concretude é essencial, além da necessária pre-
caução durante a sua classificação para que não se torne um
recurso inefetivo tão cedo para o mundo jurídico brasileiro.
Desse modo, primeiramente demonstrou-se que o
dano originado da perda de uma chance no processo
em questão não seria aplicável, pois, devido à falta de
certeza sobre a chance da criança ter ou não uma do-
ença futuramente era improvável, visto que não possuía
doença prévia. No entanto, esse ponto, foi esclarecido ao
momento que se verificou que o ‘pode ser indenizável’,
ou seja, o objeto da ação, é a chance perdida de um pos-

413
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

sível tratamento que dependia da coleta de células-tron-


co. Nesse sentido a atitude da empresa em não realizar o
procedimento pactuado entre as partes por um contrato,
prejudicou essa coleta e consequentemente a possível
utilização do material genético.
O dano hipotético estaria relacionado ao dano final, o
qual na realidade, seria uma simples expectativa, este de
fato, não pode ser indenizável, porém, o dano sobre o
procedimento não realizado existiu, e cumpriu os requisi-
tos específicos da Teoria, quais sejam: a conduta humana,
o dano, o nexo de causalidade e chances sérias e reais.
Para maior segurança desta aplicação realizada pelo
tribunal e para melhor entender sua valoração, o estu-
do sobre a Teoria dos Custos de oportunidade foi essen-
cial para esclarecer uma questão simples: Ao contratar os
serviços da empresa alterou-se o número de possibilida-
des que a criança teria de tratamento, trazendo uma nova
opção. Entretanto, no momento em que a empresa, por
quebra contratual, não realizou o procedimento de coleta,
ela ocasionou a perda dessa possibilidade, gerando como
consequência um custo dessa oportunidade perdida.
Essa oportunidade que os pais e a criança perderam
exauriu a possibilidade e a facilidade de tratamento sem
ter que recorrer a coleta do material através de uma me-
dula óssea por exemplo.
Nesse sentido, por meio da abordagem da Teoria dos
custos de oportunidade tem-se que ao realizar-se uma es-
colha, o custo da não escolha também deve ser conside-
rado. Assim, no momento em que não foram os pais que
fizeram a escolha e sim, a empresa os impediu desta liber-
dade construída por meio de contrato, o custo de oportu-
nidade é passível de ser acostado à empresa.

414
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Portanto, a valoração da indenização além de se basear na


Teoria da Perda de uma Chance poderá ter subsídios também
na Teoria dos Custos de oportunidade. Ademais, em prosse-
guimento a Análise Econômica do Direito aplicada ao caso
deve-se apontar a necessária visualização das consequências
das decisões. O intuito dessa pesquisa não é oferecer subsí-
dios para novas possibilidades ilimitadas de indenização, e
sim, aproximar teorias e construir limites, observando princi-
palmente um dos pilares da AED: o consequencialismo.
Tais limitações, como apontado, podem ser observadas
no próprio critério da certeza do dano e os tetos indeni-
zatórios, estes últimos pautados nas situações práticas e
contratos realizados.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.291.247.
Carlos Márcio da Costa Cortázio Corrêa e outros. Cryopraxis Crio-
biologia LTDA. Relator: Paulo de Tarso Sanseverino. Consulta
Processual. Brasília, 01 out. 2014. Disponível em: <https://ww2.
stj.jus.br/processo/pesquisa/?src=1.1.2&aplicacao=processos.ea&ti-
poPesquisa=tipoPesquisaGenerica&num_registro=201102672798>.
Acesso em: 03 nov. 2019.
BURCH, E.E. & HENRY, William R. Opportunity and incrementall cost:
attempt do define in systems terms: a comment. The Accounting
Review. 248-251, jan.1974.
CARVALHO, Cristiano. Teoria da Decisão Tributária. São Paulo, Sa-
raiva, 2013.
COOTER, Robert D.; ULEN, Thomas. Direito e Economia. Tradução:
Luís Marcos Sander, Francisco Araújo da Costa. 5 ed. Porto Alegre,
Bookman, 2010.
FRANCO, Paulo; PORTO, Antonio Maristrello. A Teoria da Perda de
uma Chance e a Microeconomia. Economic Analysis Of Law

415
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Review, Brasília, v. 9, n. 1, p.202-225, abr. 2018. Disponível em:


<https://portalrevistas.ucb.br/index.php/EALR/article/view/8447>.
Acesso em: 03 dez. 2019.
GICO JR. Ivo. Introdução ao Direito e Economia. In: TIMM, Luciano
Benetti. (org.) Direito e economia no Brasil. 2.ed. São Paulo:
Atlas, 2014.
GICO JR. Ivo. Metodologia e Epistemologia da Análise Econômica do
Direito. Economic Analysis of Law Review, V. 1, nº 1, p. 7-32,
Jan-Jun, 2010.
GONDIM, Glenda Gonçalves. A reparação civil na teoria da per-
da de uma chance. 2010. 187 f. Dissertação (Mestrado) - Curso
de Direito, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2010. Dis-
ponível em: <https://www.acervodigital.ufpr.br/bitstream/hand-
le/1884/23451/dissertacao%20perda%20chance.pdf?sequence=1>.
Acesso em: 04 dez. 2019.
KERN, Bernd-rüdiger. A Função de Satisfação na Indenização do Dano
Pessoal: um elemento penal na satisfação do dano?. Revista da
Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, [s.l.], v. 11, n. 17, p.25-46, 1999. Continuação de: Revis-
ta da Faculdade de Porto Alegre.http://dx.doi.org/10.22456/0104-
6594.70933. Disponível em: <https://seer.ufrgs.br/revfacdir/article/
view/70933>. Acesso em: 04 dez. 2019.
O’SULLIVAN, Arthur; SHEFFRIN, Steven; NISHIJIMA, Marislei (revisora
e co-autora); tradutora Maria Lúcia G. L. Rosa. Introdução à eco-
nomia: princípios e ferramentas. São Paulo, Prentice Hall, 2004.
PEREIRA, Anísio Cândido et al . Custo de oportunidade: conceitos e
contabilização. Cad. estud., São Paulo , n. 2, p. 01-24, Apr. 1990
SAMUELSON, Paul A; NORDHAUS, William D. Economia. Tradução:
Elsa Fontainha, Jorge Pires Gomes; Revisão técnica: Emílio Hiroshi
Matsumura. 19 ed. Porto Alegre: AMGH, 2012.
SANTOS, Marina Czarneski FelÍcio dos. Responsabilidade ci-
vil pela perda de uma chance. 2014. 66 f. Monografia (Espe-

416
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

cialização) - Curso de Direito, Faculdade de Ciências Jurídicas e


Sociais do Centro Universitário de Brasília – Uniceub, Brasília,
2014. Disponível em: <https://repositorio.uniceub.br/jspui/bitstre-
am/235/6016/1/21008093.pdf>. Acesso em: 04 dez. 2019.
SILVA, Mariana Pinheiro Sanches da. Responsabilidade civil do esta-
do por atos jurisdicionais. 2013. 50 f. Monografia (Especialização)
- Curso de Direito, Centro Universitário Toledo, Araçatuba, 2013.
Disponível em: <http://bit.ly/2DFR5Ox>. Acesso em: 03 dez. 2019.
SILVA, Taynara Larissa da; DIAS, Feliciano Alcides. A teoria da perda
de uma chance: critérios de aplicação e breve análise acerca da
recente admissão doutrinária e jurisprudencial no ordenamento ju-
rídico brasileiro. Revista da Esmesc, [s.l.], v. 23, n. 29, p.63-82, 1
dez. 2016. Lepidus Tecnologia. http://dx.doi.org/10.14295/revista-
daesmesc.v23i29.p63. Disponível em: <https://revista.esmesc.org.
br/re/article/view/140>. Acesso em: 09 dez. 2019.

417
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ANÁLISE ECONÔMICA DA PROIBIÇÃO


DO ABORTO NO BRASIL

Ariane Fonseca Dalazuana111, Jéssica Fernanda Maciel


da Silva112 e Fernanda Huss Erzinger113

Resumo: Partindo do viés da Análise Econômica do Di-


reito (AED), que é utilizado para a investigação de um
problema que envolva escolhas humanas e as consequên-
cias de um dado dispositivo jurídico, o presente estudo,
por meio do método dedutivo e técnica bibliográfica, tem
como objeto a tipificação de crime de aborto comparado
com os atuais índices de práticas desta conduta pelas mu-
lheres no Brasil. As estatísticas demonstram que, mesmo
sendo proibida, a conduta de aborto é recorrente, tendo
como consequências custos com o Sistema Único de Saúde
em decorrência de complicações na saúde das gestantes,
bem como altos índices de mortalidade materna devido
aos abortos voluntários realizados clandestinamente. Des-
ta forma, se verifica a ineficácia da norma que criminaliza
o aborto voluntário, que não é suficiente para sanar este
problema de saúde pública. Para que haja eficiência (bem
-estar social) tanto à mulher que se sujeita a tal procedi-
mento quanto ao Estado, a AED demonstra ser necessário
optar pela legalização do aborto, de forma responsável.
Palavras-chave: Análise Econômica do Direito; Direito
Penal; Criminalização do Aborto; Sistema Único de Saúde.

111 Acadêmica em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Contato: arianedalaz@
gmail.com
112 Mestranda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Especialista em Direito
Ambiental e Bacharel em Direito pela mesma instituição. Contato: jessihfer@gmail.com
113 Mestranda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná e Bacharel em Direito
pela mesma instituição. Especialista em Direito Contemporâneo com ênfase no Novo Código de
Processo Civil pela Universidade Cândido Mendes. Contato: fernandahuss@hotmail.com

418
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo realizar uma Aná-
lise Econômica do Direito (AED) com relação à criminali-
zação do aborto no Brasil, com base em pesquisas que de-
monstram que demonstram os autos índices de prática de
aborto e a decorrente mortalidade materna, sendo que
a descriminalização do aborto no país poderia melhorar a
saúde pública e, ainda, ser menos custoso para Sistema
Único de Saúde (SUS).
Sendo assim, com base em dados da Organização
Mundial de Saúde, além do auxílio dos ensinamentos
da doutrina, este estudo conceitua o que é o aborto e
quais suas consequências quando realizado clandesti-
namente, além de conectá-lo à Análise Econômica do
Direito.
Ainda, elenca o fundamento da criminalização desta
conduta perante o Código Penal Brasileiro, bem como
enumera os casos em que é permitido o aborto.
Por fim, questiona-se se a criminalização é o caminho
mais eficaz, a partir do conceito de eficiência trazido pela
AED, para a problemática apontada, tanto para que ocor-
ra não somente um menor gasto do Estado com a saúde
materna, mas também para que o número de mortes cau-
sadas pelo abortamento seja reduzido.

A ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO


A Análise Econômica do Direito (AED) consiste na in-
terdisciplinaridade entre as ciências econômica e jurídica,
de forma que a economia é utilizada como ferramenta
para interpretar o direito, que regulamenta a sociedade e,
portanto, o comportamento humano. Para GICO JR. (2016,
p. 17), a AED pode ser descrita como:

419
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

(...) o campo do conhecimento humano que tem por ob-


jetivo empregar os variados ferramentais teóricos e em-
píricos econômicos e das ciências afins para expandir a
compreensão e o alcance do direito e aperfeiçoar o de-
senvolvimento, a aplicação e a avaliação de normas jurí-
dicas, principalmente com relação às suas consequências.
Assim, a AED se refere ao método econômico que é
utilizado para a investigação do problema, sendo que o ob-
jeto a ser estudado pode ser qualquer questão que envolva
escolhas humanas. Ao utilizar este método, tenta-se com-
preender, explicar e prever o ordenamento jurídico, tanto
sobre as implicações fáticas quanto em relação à sua lógi-
ca (racionalidade). Com isso, procura-se entender quais as
consequências de um certo dispositivo jurídico e também
que regra jurídica deveria ser adotada, sendo a AED subdi-
vidida em positiva e normativa (GICO JR., 2016).
A ação do Estado possui uma relação direta com o com-
portamento dos agentes econômicos no ambiente social e
certos ajustes de no ordenamento jurídico podem trans-
formar a forma com que as pessoas reagem a incentivos.
Para explicar tal premissa, pode-se aplicar a Economia
Comportamental, também denominada como Behavioris-
mo, que busca analisar a racionalidade econômica. Com
ela, pode-se entender que os indivíduos (que por sua vez
constituem as organizações e instituições) possuem limita-
ções racionais e abam por ter bloqueios para optarem por
opções ótimas, especialmente em ambientes de incertezas.
Tais escolhas podem ser estimuladas ou evitadas de acor-
do com incentivos aos quais são expostos. Nesse senti-
do, a Economia Comportamental pode ser um elemento
importante para se aplicar na elaboração de políticas pú-
blicas, pois cabe ao Estado buscar melhores incentivos

420
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

comportamentais “para evitar que os agentes econômicos


sejam vítimas de suas próprias escolhas”, ou seja, influen-
ciar o agente econômico a tomar decisões mais eficientes
(RIBEIRO; DOMINGUES, 2018, p. 464).
Deste modo, levando em consideração políticas públi-
cas que consideram importante considerar o comporta-
mento psicológico em sua construção, aplica-se o termo
“nudge”, o qual pode ser entendido como um “empurrão”
que são ações do agente governamental. Ou seja, um esti-
mula, algo que é sugerido e incentivado, mas não obriga-
tório, não se aplicando a norma coercitiva pura, mas dei-
xando o indivíduo no campo de sua liberdade de escolha
(RIBEIRO; DOMINGUES, 2018, p. 466).
A Nova Economia Institucional, a qual podemos en-
contrar nas elucidações de Douglass North (2010), busca
entender a mudança econômica através do tempo e como
as organizações conseguem se adaptar. Para ele, é a inte-
ração entre instituições e organizações que molda a evo-
lução institucional de uma economia e, desta forma, se as
instituições são as regras do jogo, as organizações e seus
empresários são os jogadores. Os incentivos para adquirir
conhecimento puro, base essencial do crescimento econô-
mico moderno, são afetados por recompensas e punições
monetárias. As instituições e a tecnologia empregada de-
terminam os custos de transação e transformação que se
somam aos custos de produção. No mercado competitivo,
quando houver custos de transação significativos, as insti-
tuições buscarão corrigir seus modelos, de forma a buscar
se adaptar, mas sempre em busca de resultados eficientes.
Para entender os problemas contemporâneos do de-
senvolvimento, North (2010) traz uma abordagem institu-
cional/cognitiva a partir de uma estrutura analítica, a qual

421
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

considera algumas implicações, dentre elas o fato de que


as normas é que fornecem “legitimidade” a um conjunto
de regras e, deste modo, a mudança revolucionária nun-
ca é tão revolucionária quanto seus defensores desejam
e o desempenho será diferente do que o previsto. Ain-
da, as políticas moldam significativamente o desempenho
econômico porque definem e aplicam as regras econô-
micas. Para ele, o desenvolvimento de normas de com-
portamento que apoiem e legitimam novas regras acaba
sendo um processo demorado e, na falta destes mecanis-
mos, as políticas tenderão a ser instáveis, sendo que não
sabemos como criar eficiência adaptativa a curto prazo. O
crescimento econômico pode advir de restrições informais
(como normas e códigos de conduta), mas isto depende
do grau em que tais regras são aplicadas.
Assim, a Análise Econômica do Direito, “consiste na
aplicação dos instrumentos econômicos aos fenômenos
jurídicos, para examinar sua formação, sua estrutura, seus
processos e os impactos do Direito e de suas instituições
sobre o comportamento dos agentes econômicos e sobre
as relações sociais, bem como a qualidade e eficiência dos
instrumentos legais” (JAKOBI; RIBEIRO, p. 30).
Por fim, Richard Posner (2004, p. 36-37) esclarece que
a AED oferece vantagens aos observadores da realidade
social, pois abordagem neutra em assuntos controversos,
ainda que do ponto de vista jurídico.

A CRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO
Dentre as condutas regulamentadas pelo Direito está a
prática do aborto, ou seja, a interrupção da gravidez, sen-
do tipificado como crime nos artigos 124 a 127 do Código
Penal, que assim dispõe:

422
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir que


outrem lhe provoque:
Pena - detenção, de um a três anos.
Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento da gestante:
Pena - reclusão, de três a dez anos.
Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante:
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se
a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada
ou debil mental, ou se o consentimento é obtido mediante
fraude, grave ameaça ou violência.
Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores
são aumentadas de um terço, se, em conseqüência do abor-
to ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante
sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se,
por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.
Para que seja caracterizado como crime de aborto é ne-
cessário que a gravidez esteja em curso e que o feto esteja
vivo, ocorrendo a morte do feto por manobras abortivas
de forma voluntária (BITENCOURT, 2019, 234). Esta regra
jurídica se fundamenta pela tutela do direito à vida, no
caso daquela em formação embrionária, conforme explica
Cezar Roberto Bitencourt (2019, p. 234):
O Direito Penal protege a vida humana desde o mo-
mento em que o novo ser é gerado. Formado o ovo, evo-
lui para o embrião e este para o feto, constituindo a pri-
meira fase da formação da vida. A destruição dessa vida
até o início do parto configura o aborto, que pode ou não
ser criminoso.
Para o Direito Penal, o aborto voluntário pode ocor-
rer como auto aborto ou aborto consentido, sendo que a
própria mulher gestante é considerada como sujeito ativo

423
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

e o feto ou embrião é tido como sujeito passivo. Ainda,


é possível a ocorrência de aborto provocado por terceiro,
com ou sem consentimento da gestante, em que o sujeito
ativo pode ser qualquer pessoa, independentemente de
qualidade ou condição especial e os sujeitos passivos são
tanto a gestante quanto o feto ou embrião. Ressalta-se
que quando o aborto é provocado por terceiro, a tipifi-
cação penal também protege a incolumidade da gestante
(BITENCOURT, 2019, p. 233-234).
Nota-se que há apenas duas hipóteses em que a condu-
ta de aborto não é considerada como crime, assim descri-
tas no artigo 128 do Código Penal:
Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:  
I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é prece-
dido de consentimento da gestante ou, quando incapaz,
de seu representante legal.
Nestes casos o aborto foi descriminalizado, sendo que o
primeiro decorre do estado de necessidade por não haver
outro meio de salvar a vida da gestante, sendo necessário
que haja o perigo de vida da gestante e a inexistência de
outro meio para salvá-la. Ainda, no segundo caso, deve ha-
ver prova cabal tanto da ocorrência do estupro quanto do
consentimento da gestante (BITENCOURT, 2019, p. 242-243).
Ainda, através da Arguição de Descumprimento de Pre-
ceito Fundamental – ADPF 54, julgada procedente em 12
de abril de 2012, o Supremo Tribunal Federal considerou a
interrupção da gravidez de feto anencefálo como hipótese
de aborto, contudo entendeu que essa hipótese deve ser
interpretada como causa de excludente de ilicitude, já pre-
vista no Código Penal, por ser comprovado que a gestação
de feto anencefálo é perigosa à saúde da gestante.

424
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

No entanto, nota-se que o aborto voluntário se tornou


uma questão de saúde pública, tendo em vista a quantida-
de de pessoas que o realizam clandestinamente e acabam
até mesmo morrendo durante o procedimento ou com as
consequências deste, gerando altos custos ao Poder Pú-
blico. Segundo DINIZ (2010), “em 2010, no Brasil urba-
no, 15% das mulheres entrevistadas relataram ter realizado
aborto alguma vez na vida” e “A PNA indica que o aborto
é tão comum no Brasil que, ao completar quarenta anos,
mais de uma em cada cinco mulheres já fez aborto”. De
acordo com o Conselho Federal de Enfermagem, chega a
um milhão o número de abortos realizados todos os anos
no Brasil e a criminalização não é suficiente para fazer
cessar esta prática (COFEN, 2018).
Sobre a subnotificação dos abortamentos, CECATTI, J.
G. et al. (apud LAUREANTI, M. et al., 2010, p.106) dis-
corre: Apesar da subnotificação dos abortamentos nas
declarações de óbitos, em 2002, um estudo nas capitais
brasileiras, com utilização de um fator de correção, permi-
tiu identificar que o abortamento correspondia à terceira
causa de morte materna (11,4%).
Ainda sobre o tema, CRUZ et. al. (2013, p. 495 e 498)
explica:
Se, por um lado, o cerne da argumentação gira em tor-
no do fato do aborto clandestino e/ou inseguro, realiza-
do em condições precárias, ser uma das maiores causas
de morbimortalidade materna, relacionando-se, assim, à
defesa dos direitos humanos, por outro, a moralidade
que advoga a manutenção de sua proibição justifica-se
pelo princípio da sacralidade da vida, segundo a qual o
início da existência ocorreria a partir da concepção e,
portanto, quem aborta estaria tirando uma vida. Reflexo

425
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

da moralidade religiosa ainda vigente, esta perspectiva é


imposta à sociedade por intermédio de uma legislação
que criminaliza o aborto, impedindo sua realização com
segurança. (...)
Várias mulheres, independentemente de sua classe so-
cial, credo e idade realizam o aborto. As que têm boas
condições financeiras utilizam clínicas, com mais higiene
e cuidado. As mais carentes, que compõem a maior par-
cela da população brasileira, são impelidas a buscar mé-
todos mais perigosos, o que resulta no elevado índice de
agravo à saúde e alta mortalidade. As medidas para evitar
uma gravidez indesejada no Brasil são insuficientes. Como
resultado, várias mulheres se envolvem em situações de
abortos inseguros, os quais, inúmeras vezes, resultam em
complicações graves como hemorragias, infecções, perfu-
ração do útero, esterilidade – muitas vezes levando-as à
morte em consequência dessas práticas.
Segundo dados da OMS – Organização Mundial de Saú-
de (2013), uma a cada cinco mulheres até os quarenta
anos já fizeram aborto e a proibição não faz com que esse
número diminua, mesmo com os graves riscos à saúde de
um abortamento inseguro, pelo qual cerca de 250 mil mu-
lheres ocupam os leitos do SUS a cada ano. Ainda, cerca
de cinco milhões de mulheres sofrem no mundo todo, a
cada ano, com disfunções físicas e psicológicas decorren-
tes de um aborto clandestino. Além dos casos de near
miss, ou seja, quase morte, que chegam a 2,5% das hospi-
talizações por aborto no Brasil entre 2008 e 2017, sendo
que em 2016 o SUS teria registrado uma morte a cada dois
dias pelo mesmo motivo.
Em contrapartida, a Lei de Biossegurança (Lei Federal
nº 11.105/2005) regulamentou a pesquisa em células-tron-

426
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

co embrionárias (BRASIL, 2005), que para SOUZA, V. et al.


(2003), se trata de:
(...) células indiferenciadas ou com baixo grau de dife-
renciação, encontradas em tecidos embrionário e extra
-embrionário. Podem permanecer em estado quiescente
até a fase adulta, através da auto-replicação, ou diferen-
ciar-se em diversos tecidos, a partir da expressão de de-
terminados genes, e exercer funções específicas.
Portanto, nota-se uma contradição quanto a não liberação
da prática do aborto voluntário, posto que, tanto a pesquisa
com células-tronco embrionárias, quanto o aborto, tratam de
intervenção em embriões que nunca se tornarão vida. Ao
menos não a vida a qual a ciência determina, ou seja, seria
a partir do momento em se forma o sistema nervoso, isto é,
ao terceiro mês da gestação. Tendo em vista, que a morte
cerebral significa o fim da vida, seria plausível que o início da
vida se desse com o início da atividade cerebral.
E, mesmo que se defenda que o aborto fere o direito à
vida, instituído no artigo 5º, caput, da Constituição Federal
(BRASIL, 1988), percebe-se que há aqui um sopesamento a
ser feito entre o direito à vida da mulher e o suposto direi-
to à vida do embrião. Levando em conta, que não há um
consenso jurídico acerca do que se considera como o início
da vida, apenas do início da personalidade jurídica, que,
segundo o Código Civil em seu artigo 2º, se dá com o nas-
cimento com vida. No entanto, o mesmo código resguarda
os direitos do nascituro desde a concepção (BRASIL, 2002).
Ainda, os custos do aborto clandestino para o sistema
de saúde são, segundo dados da OMS (2013), exorbitan-
tes, pois apenas no SUS, cerca de R$ 486 milhões (quatro-
centos e oitenta e seis milhões de reais) foram gastos entre
os anos de 2008 e 2017 com internações decorrentes de

427
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

complicações de abortos inseguros. E, o órgão ainda infor-


ma que quando os procedimentos são realizados correta-
mente e com medicamentos seguros, apenas dois a cinco
por cento das mulheres necessitam de intervenção médica
posterior. A OMS (2013, p. 26) afirma que:
Calculou-se que o abortamento inseguro custou ao sis-
tema sanitário da Cidade do México USD 2,6 milhões em
2005, antes da legalização do aborto (53). Se existisse livre
acesso a um abortamento sem riscos, o sistema poderia
poupar potencialmente USD 1,7 milhões a cada ano.
Feitas tais considerações, passa-se a tratar do abordo a
partir do método econômico.

ANÁLISE ECONÔMICA E A INTERRUPÇÃO


VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ
Percebe-se que, do ponto de vista de uma Análise Eco-
nômica do Direito, sob o viés positivo, a criminalização do
aborto não é a forma mais adequada de se tratar a questão
da interrupção voluntária da gravidez.
A ideia aqui é que há uma diferença entre o mundo dos
fatos que pode ser investigada e averiguada por métodos
científicos, cujos resultados são passíveis de falsificação – o
que chamamos de análise positiva – (...). Em resumo, a AED
positiva nos auxiliará a compreender o que é a norma jurí-
dica, qual a sua racionalidade e as diferentes consequências
prováveis decorrentes da adoção dessa ou daquela regra, ou
seja, a abordagem é eminentemente descritiva/explicativa
com resultados preditivos. (GICO JR., 2011, p. 20-21).
Isso porque, mesmo sendo tal conduta crime, os núme-
ros demonstram, consoante exposto, serem as práticas de
aborto recorrentes, enquanto o grau de reprovabilidade
mostra-se baixo e ineficaz.

428
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

A somar, é preciso considerar que a maior parte dos


abortos são feitos na ilegalidade, já que não se encaixam
nas hipóteses descritas no art. 128 do Código Penal ou,
ainda, na ADPF nº 54 (feto anencéfalo). Portanto, as mulhe-
res recorrem a locais clandestinos, onde não há condições
plenas de saúde e sequer profissionais capacitados. Mesmo
sabendo dessas circunstâncias e do risco de vida durante e
após a execução do procedimento, as gestantes submetem-
se a tais clínicas, as quais estão disponíveis a apenas uma
parcela da população, pois cobram valores altos.
Já as grávidas que não possuem condições de arcar
com os custos da intervenção ilícita, valem-se de outros
métodos, como a utilização de medicamentos que indu-
zem o parto e até mesmo introduzindo objetos visando
perfurar o útero.
Insta salientar que os dados, aqui já elencados, de-
monstram ser a interrupção da gravidez é responsável
pela manutenção de altas taxas de mortalidade materna,
principalmente nos países em desenvolvimento como o
Brasil. Nesta toada, a criminalização do aborto se mostra
ineficaz, pois mesmo sendo a interrupção da gravidez um
ato delituoso, as mães insistem em fazê-la, colocando suas
próprias vidas em risco de morte.
O Estado mostra-se negligente e omisso, porquanto a
questão sequer aparece nas pautas de políticas públicas
e evita enfrentar o problema na atual conjuntura. A esse
respeito menciona:
Considerando que grande parte dos abortos é ilegal e,
portanto, feito fora das condições plenas de atenção à
saúde, essas magnitudes colocam, indiscutivelmente, o
aborto como um dos maiores problemas de saúde públi-
ca do Brasil. O Estado, porém, é negligente a respeito,

429
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

sequer enuncia a questão em seus desenhos de política


e não toma medidas claras para o enfrentamento do pro-
blema. (DINIZ; MEDEIROS; MADEIRO, 2017, p. 659).
Portanto, preferível, tanto para o Estado quanto para
a maior parte das grávidas que recorrem ao aborto, tratar
o tema como um problema de saúde pública, as quais
devem receber apoio, tratamento adequado e um sistema
de saúde público apropriado, resguardando o direito à
saúde da mulher e sua dignidade enquanto pessoa, o que
é dever do próprio poder público, nos termos da própria
Constituição Federal.
A AED, neste caso, demonstra ser necessário optar
pela legalização do aborto, de forma responsável. Isso
porque a AED, sob a ótica da eficiência, almeja a ob-
tenção da maximização do bem-estar social, o que seria
condizente, na hipótese, com a descriminalização da in-
terrupção voluntária da gravidez, acompanhada de uma
política multidisciplinar.
Para Richard A. Posner (2007, p. 11), no âmbito da Te-
oria Econômica, o termo eficiência se relaciona com uma
regra de maximização da utilização de riquezas e do bem
-estar social. Assim, a noção de eficiência, deve ser com-
preendida pelo entendimento do Ótimo de Pareto.
Na visão de eficiência paretiana, parte-se do pressu-
posto da realização da melhoria de situação para todas
as partes envolvidas em relações socioeconômicas. Em
uma situação na qual os agentes ganhem sem signifi-
car a perda para qualquer outro, haveria o Ótimo de
Pareto, sendo possível aumentar o bem-estar de um
indivíduo sem prejudicar o outro indivíduo, chegando-
se em um equilíbrio. Victor Hugo Domingues (2011, p.
40-41) explica:

430
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

(...) quando chegamos a um ponto “Ótimo de Pareto”,


também chamado de “Pareto Eficiente”, pode-se dizer
que não existe mais a possibilidade de alterar qualquer
situação entre as partes sem que algumas delas sejam
prejudicadas, impedindo o aumento do benefício de in-
finitamente aos custos alheios. O “Ótimo de Pareto” é o
exato momento de equilíbrio em que todas as ações a
serem tomadas não incrementam a condição dos agentes
sem prejudicar outros. Nesse exato momento está carac-
terizado o critério de eficiência de Pareto.
Desta forma, segundo a AED, haverá eficiência com
a descriminalização do aborto, pois, além de a norma
jurídica existente atualmente não ser suficiente para re-
primir tal prática, o número de mortes de mulheres e
complicações na saúde das gestantes em razão de opta-
rem por métodos irregulares e clandestinos para inter-
romper a gravidez é bastante alto, além de custoso ao
sistema de saúde.
Ressalta-se que a legalização, neste caso, deve ser
acompanhada de uma política multidisciplinar engloban-
do planejamento familiar, orientação sobre métodos con-
traceptivos, auxílio de médicos, psicólogos e assistência
social às gestantes, especialmente aquelas que desejam
interromper a gestação.
De qualquer forma, considerando a conjuntura atual, a
descriminalização do aborto acarretaria maior bem-estar so-
cial tanto às gestantes adeptas a tal método quanto ao Estado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Código Penal dispõem ser o aborto crime no Brasil,
com exceção de hipóteses taxativas previstas no art. 128
da Norma Punitiva e ADPF 54. Contudo, mesmo sendo

431
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

uma conduta proibida, a interrupção voluntária da gravi-


dez é recorrente no Brasil.
As mulheres submetem-se a procedimentos realizados
na clandestinidade, sem condições plenas de saúde e pro-
fissionais aptos para o ato, correndo risco de morte ou,
ainda, utilizam-se de medicamentos e objetos perfurantes,
visando abortar.
Sob o viés da Análise Econômica do Direito, os dados
demonstram a ineficácia deste dispositivo penal, conside-
rando o alto índice de gestantes que interrompem volun-
tariamente a gestação.
A criminalização, então, não é a forma mais adequada
de se tratar a questão, pois, atualmente, inexiste eficiência
(bem-estar social). Isso porque, além de o aborto quando
feito na clandestinidade causar riscos à vida da mãe, onera
o Estado. Assim, para ambas as partes (mulher e Estado), a
melhor maneira seria de cuidar do tema como um proble-
ma de saúde pública, chegando-se ao “Ótimo de Pareto”.

REFERÊNCIAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Espe-
cial 2 – crimes contra a pessoa. 19. Ed. São Paulo, 2019.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de
outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em:
04 dez. 2019.
______. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Diário Ofi-
cial, Rio de Janeiro, 1940. Disponível em: <http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em:
04 dez. 2019.
______. Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005. Diário Oficial, Brasí-
lia, 2005. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_

432
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Ato2004-2006/2005/Lei/L11105.htm#:~:targetText=1%C2%BA%20
Esta%20Lei%20estabelece%20normas,a%20prote%C3%A7%-
C3%A3o%20do%20meio%20ambiente>. Acesso em: 04 dez. 2019.
______. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Diário Oficial, Brasí-
lia, 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso em: 04 dez. 2019.
CECATTI, José Guilherme; GUERRA, Gláucia Virgínia de Queiroz Lins;
SOUSA, Maria Helena de; MENEZES, Greice Maria de Souza. Abor-
to no Brasil: Um enfoque demográfico. Revista Brasileira de Gi-
necologia e Obstetrícia, Rio de Janeiro, v. 32, n. 3, p. 105-111,
mar. 2010.
CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM (COFEN). Uma mulher morre
a cada 2 dias por aborto inseguro, diz Ministério da Saúde, COFEN,
03 de agosto de 2018. Disponível em: <http://www.cofen.gov.br/
uma-mulher-morre-a-cada-2-dias-por-causa-do-aborto-inseguro-diz-
ministerio-da-saude_64714.html>. Acesso em: 04 dez. 2019.
SANTOS, Vanessa Cruz; ANJOS, Karla Ferraz dos; Souzas, Raquel.;
Eugênio, Benedito Gonçalves. Criminalização do aborto no Brasil
e implicações à saúde pública. Revista Bioética, Brasília, v. 21, n.
3, p. 494-508, 2013.
DINIZ, Debora; MEDEIROS, Marcelo. Aborto no Brasil: uma pesquisa
domiciliar com técnica de urna. Ciência & Saúde Coletiva, Rio de
Janeiro, v. 15, p. 959-966, 2010.
DINIZ, Debora; MEDEIROS, Marcelo; MADEIRO, Alberto. Pesquisa Na-
cional de Aborto 2016. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro,
v. 22, n. 2, p. 653-660, fev. 2017. Disponível em: <https://www.scie-
losp.org/article/csc/2017.v22n2/653-660/>. Acesso em: 04 dez. 2019.
DOMINGUES, Victor Hugo. Ótimo de Pareto. In: RIBEIRO, Marcia
Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é Análise Econô-
mica do Direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
GICO JR., Ivo Teixeira. Introdução à Análise Econômica do Direito. In:
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é

433
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Análise Econômica do Direito: uma introdução. Belo Horizonte:


Fórum, 2011.
JAKOBI, Karin Bergit; RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. A Análise Eco-
nômica do Direito e a Regulação do Mercado de Capitais. São
Paulo: Atlas, 2014.
NORTH, Douglass C.. Desempenho econômico através do tempo.
Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 255, p.
13-30, set. 2010. Disponível em: <https://pdfs.semanticscholar.or-
g/2cbb/69e9650f888a491d2a4e8231928a375b70ae.pdf>. Aceso em:
04 dez. 2019.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Abortamento se-
guro: orientação técnica e de políticas para o sistema de
saúde. 2. ed., 2013. Disponível em: <https://apps.who.int/iris/
bitstream/handle/10665/70914/9789248548437_por.pdf;jsessioni-
d=A5D74D8308ABBF8B4A3D1B9DE004B7CD?sequence=7>. Aces-
so em: 04 dez. 2019.
POSNER, Richard A. Economic analysis of law. 7. ed. Austin: Wol-
ters Kluwer, 2007.
POSNER, Richard A. Frontiers of Legal Theory. Cambridge: Harvard
University Press, 2004.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; DOMINGUES, Victor Hugo. Economia
Comportamental e Direito: a racionalidade em mudança. Revista
Brasileira de Políticas Públicas, v.8, n. 2, p. 457-472, 2018.
TEIXEIRA, Carmen; SILVEIRA, Paloma (Orgs.). Glossário de análi-
se política em saúde. Salvador: EDUFBA, 2017. Disponível em:
<https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/22110/4/glossario%20
em%20saude.pdf>. Acesso em: 04 dez. 2019.
SOUZA, Verônica Ferreira de. et al. Células-tronco: uma breve revisão.
Ciências Médicas e Biológicas, Salvador, v. 2, n.2, jul./dez. 2003.

434
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

CONSEQUÊNCIAS DAS POLÍTICAS LGBTQI+


NAS EMPRESAS PELO VIÈS DA ANÁLISE
ECONÔMICA DO DIREITO

Marcos Guilherme Rodrigues Mafra114 e


Vinicius Ernesto dos Santos115

Resumo: O que se busca analisar no presente trabalho


são as consequências de atitudes empresárias relaciona-
das às políticas internas e externas que atinjam direitos da
comunidade LGBTQi+, através de um aspecto de Análise
Econômica do Direito (AED), buscando entende-las por
meio de fundamentos econômicos. Pretende-se, assim, de-
monstrar que apesar de algumas atitudes comerciais serem
consideradas predatórias, a aderência pelo público criam
tendências entre as concorrentes, situação que decorre das
características inerentes ao sistema capitalista. Trazendo
aos estudos a razão para a tomada dessas atitudes voltadas
à inclusão da comunidade LGBTQi+: o poder econômi-
co dessa comunidade, conhecido como Pink Money, que
soma-se à aproximadamente 10% do PIB nacional, além
de que as políticas internas de inclusão social criam visi-
bilidade internacional para as empresas como defensoras
dos Direitos Humanos. É através da AED que se preten-
de analisar o problema central do trabalho: de que forma
poderá ocorrer o equilíbrio entre a principal finalidade da
empresa – o lucro – com os ideais sociais da comunidade
LGBTQi+, e de que forma um afeta o outro. Para chegar
a uma conclusão objetiva, o presente trabalho utilizará de

114 Graduando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR. E-mail: mar-
cos,guilherme96@gmail.com
115 Graduando em Direito pelo Centro Universitário Curitiba – UNICURITIBA. E-mail: v.ernesto@
hotmail.com

435
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

pesquisas bibliográficas em livros e artigos especializados.


Por fim, concluindo-se que apesar de muito se debater
sobre os abusos acometidos ao Pink Money, sua lucrati-
vidade para as empresas LGBTQi+ friendly é expressiva,
tendo consequências indiretas positivas à própria comuni-
dade LGBTQi+.
Palavras-Chave: Atitudes empresárias. LGBTQi+. Lucro.
Representatividade. Análise Econômica de Direito.

INTRODUÇÃO
É pela Análise Econômica do Direito, devido sua inter-
disciplinaridade entre Economia e Direito, que se pode
verificar um resultado positivo no desenvolvimento do
país através do crescimento econômico influenciado pelo
Direito e vice e versa.
Em um cenário global, já se percebe a capacidade eco-
nômica que a comunidade LGBTI+ possui, especialmente
quando se trata em lazer, consumo, cultura e turismo.
Devida a evolução da sociedade e da universalização
trazida pelo advento de facilidades tecnológicas, as bar-
reiras entre sociedades foram levantadas, e aqueles que
antes não possuíam voz para declarar sua existência e im-
portância no meio em que viviam começaram a ter uma
mudança em seu comportamento.
Somando a isso, a internet trouxe novas formas das
empresas buscarem sua solidificação e expansão, possibi-
litando atingirem novos mercados que não tinham a pos-
sibilidade anteriormente. Com isso vem a necessidade de
se adequar a aqueles mercados diferentes e suas culturas,
levando-as a utilização novas formas de atrair o público.
A tecnologia é um fato de transformação, visto que di-
funde a informação, sendo fato gerador de educação para

436
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

as massas, permitindo que estas participem do debate de-


mocrático116.
Assim foi com a comunidade LGBTI+, similar a outras
minorias sociais, como as mulheres e os afrodescendentes
por exemplo. As pessoas que se identificavam com esses
grupos perceberam que, apesar de terem pouca represen-
tação pública, em um contexto mundo, sua voz soma-se
com de milhões outras. Esta mudança de perspectiva so-
bre a posição que essas comunidades ocupam dentro da
sociedade em geral trouxe um fortalecimento a elas, o que
consequentemente consegue atrair a atenção também da-
queles que não se incluem nesses grupos.
Advindo desse reconhecimento que em 1983 criou-se
a IGLTA, uma associação voltada especificamente ao tu-
rismo LGBTI+117. Bem como, no mundo jurídico, em um
contexto internacional, de proteção aos direitos humanos,
a Organização das Nações Unidas (ONU), busca efetivar a
igualdade de gêneros, mais especificamente na proteção
dos direitos ligados a situação da mulher, por meio de
programas como a UNWOMAN, criada em julho de 2010118.
116 Nesse sentindo: atualmente, quando a tecnologia disponível já permite operar educação em
massa e a difusão da informação ocorre por inúmeros instrumentos diferentes, o debate sobre a
participação social volta à tona com enorme intensidade. Temas como violência, habitação, saúde,
educação e outros direitos fundamentais estão constantemente na mídia. Será que, finalmente, na
era da informação, teremos a classe historicamente dominada se envolvendo ativamente nas deci-
sões políticas? Será que existe a possibilidade de que eventos recentes como os acontecidos nos
países árabes se espalhem pelo mundo e tornem-se uma constante? (QUEIROZ, 2011)
117 IGLTA, the International LGBTQ+ Travel Association was founded in 1983 and is the world’s
leading network of LGBTQ+-welcoming tourism businesses. We provide free travel resources and
information while continuously working to promote equality and safety within LGBTQ+ tourism
worldwide. IGLTA’s members include LGBTQ+-friendly accommodations, transport, destinations,
service providers, Travel Advisors, tour operators, events and travel media located in over 75
countries. IGLTA, s.d.
118 UN Women is the United Nations entity dedicated to gender equality and the empowerment
of women. A global champion for women and girls, UN Women was established to accelerate
progress on meeting their needs worldwide. UN Women supports UN Member States as they set
global standards for achieving gender equality, and works with governments and civil society to
design laws, policies, programmes and services needed to ensure that the standards are effectively
implemented and truly benefit women and girls worldwide. It works globally to make the vision
of the Sustainable Development Goals a reality for women and girls and stands behind women’s
equal participation in all aspects of life [...] (UNWOMEN, s.d)

437
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

César Roberto da Silva já dizia que o sistema econômi-


co é para satisfação das necessidades das pessoas e “esse
sistema econômico não permanece estável no decorrer
do tempo. Ele se modifica, cresce e atravessa crises, tudo
isso com consequências sobre as pessoas que o integram”
(2018. p.49). Assim, além de ser influenciada por seus usu-
ários, a economia também influência quem nela se integra.
Nesse intuito, em que aqueles que estão à frente das
grandes empresas conseguem verificar um novo nicho
de mercado a ser aproveitado, é que hoje, a comunidade
LGBTi+ encontra-se em destaque. A partir desse vislumbre
sobre o alto poderio econômico desse grupo, e de suas
atitudes voltadas ao consumismo: o Pink Money119.
Além do fato de que, corroborando com a principal fi-
nalidade da empresa, sendo está a de gerar lucro, verifica
que a utilização de campanhas e políticas LGBTQi+ frien-
dly trazem consequências bastantes positivas à empresa.

COMUNIDADE LGBTI+ E O PINK MONEY


Advindo do crescimento da representatividade da co-
munidade LGBTI+ dentro das várias camadas sociais da
sociedade, verificou-se a capacidade de movimento de ri-
quezas do Pink Money, esse sendo o poder de compra
que os membros da comunidade LGBTQi+ possuem.
Nesse sentindo, Peñaloza (1996, p. 9-41), cita o conhe-
cido Pink Money como The Dream Market, cujo processo
de liberdade e aquisição de direitos LGBTI+ é responsável
pela urbanização da comunidade, obrigando-as a se reti-
rarem de locais conservadores e buscando ambientes ur-

119 Pink Money, ou dinheiro rosa, é uma expressão que descreve o poder de compra dos membros
da comunidade LGBT. O pink money é quase um segmento de mercado, com a ascensão da luta
pelos direitos LGBT, o público gay passou a ser um consumidor em potencial e com isso diversas
empresas voltaram suas atenções para as demandas do grupo. (QUEVEDO, 2018)

438
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

banos. A urbanidade, muito ligada com o pensamento de


desenvolvimento, conforme complementa Aldrich (2004,
p. 1719-1737), torna-se a razão de LGBTI+ obterem acesso
a oportunidades de melhorar sua vida economicamente.
A maioria das empresas que atuam em um contexto
global percebem que a exclusão de uma parcela tão signi-
ficativa da sociedade de suas campanhas não é mais uma
possibilidade.
Empresas como Burguer King, Doritos, Ben n’ Jerry’s,
Netflix, Boticário entre outras estão sempre lançando cam-
panhas de conscientização e inclusão. Essas atitudes tra-
zem uma visibilidade para a comunidade, que se identifi-
cam com as campanhas, e consequentemente utilizam dos
produtos ofertados por essas empresas.
Uma das campanhas da Doritos foi lançar as famosas
Tortillas chip coloridas na época em que ocorre a Parada
do Orgulho LGBTI+ em São Paulo. Isso porque a Parada
em 2019 teve a presença de 3 milhões de pessoas na ave-
nida paulista, e a prefeitura de São Paulo informou que a
época movimentou R$ 403 milhões na economia da cida-
de. (G1, 2019)
O inegável o poder de consumo desse grupo chamou
a atenção do inglês Paul Thompson, fundador da LGBTI+
Capital120. Com sedes em Londres e Hong Kong, a empre-
sa é especializada em administração de ativos e consultoria
financeira especialmente dirigida à comunidade LGBTI+.
120 Fundada em 2010, e atualmente com US$ 350 milhões em ativos sob gestão, a gestora viu uma
grande oportunidade nesse público, que reúne 400 milhões de pessoas e tem poder aquisitivo de
US$ 750 bilhões somente nos EUA (leia quadro). “Mesmo com rendimentos acima da média, a
comunidade LGBT ainda não planeja o futuro corretamente, embora já tenha começado a sentir
essa necessidade, principalmente no que diz respeito à aposentadoria e à proteção ao parceiro”,
afirma Thompson. “Além disso, muitos desses consumidores estão de olho em investimentos, prin-
cipalmente no mercado imobiliário, em busca da segunda residência ou da casa dos sonhos para
a aposentadoria”. Segundo Thompson, apesar de os direitos de casais do mesmo sexo serem um
assunto desassombrado em boa parte do mundo, a chamada filosofia “gay friendly” não chegou
às finanças. (ISTOÉDINHEIRO, 2016)

439
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Thompson compreende o real significado de quando


o capitalismo utiliza de minorias para sua propagação e
crescimento. Sendo agora uma real potência de consumo,
o mercado percebeu que a comunidade LGBTI+ se en-
contra defasado em alguns aspectos quanto sua proteção
econômica e de direitos.
Verificando a inércia das grandes empresas financeiras
em prestar um serviço especializado para esta comuni-
dade, Thompson aproveitou de uma lacuna protetiva e
ofereceu um serviço customizado para um público que
particularmente é atraído para serviços que realizam uma
proteção a esta minoria que se identificam, além de ser um
público com um alto poder econômico.

COMPREENSÃO BÁSICA DA ANÁLISE


ECONÔMICA DO DIREITO
A Análise Econômica do Direito (AED) se baseia em
uma premissa de interdisciplinaridade entre o Direito e a
Economia. Verificando que em decorrência desta análise,
o meio jurídico é necessário para regulamentar os meios
econômicos, e também, que a realidade econômica afeta
diretamente o rumo das decisões jurídicas.
É pela AED que utilizando da aplicação de conceitos
econômicos que se busca melhor compreender a realida-
de jurídica. Essa metodologia não é algo novo, foi primei-
ramente pensada por Adam Smith, mas ganhou verdadeira
força na década de 1930, na Universidade de Chicago121.
O importante de se compreender, é que a partir de tal

121 Todos esses fatores colaboraram para que a universidade absorvesse e utilizasse os impulsos
provenientes da área econômica, e fizeram com que a Escola de Chicago se tornasse conhecida
pelas seguintes características, em termos de Análise Econômica do Direito: confiança básica nas
instituições jurídicas do capitalismo, forte carga de estudos empíricos e ceticismo a respeito da in-
tervenção estatal no funcionamento dos mecanismos de mercado. (JAKOBI; RIBEIRO, 2014. p. 09)

440
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

metodologia que se verificou que o sistema capitalista é o


cerne para compreensão de muitos aspectos jurídicos. E
partir de então compreender que atual sociedade coexiste
de uma forma simbiôntica com o capitalismo, influencian-
do-o e por ele sendo influenciada.
É por esta utilização dos métodos econômicos para
compreensão dos fenômenos jurídicos que se busca tra-
zer algumas finalidades inerentes ao sistema capitalista ao
Direito, como por exemplo, o da eficiência. E ainda em
como as leis podem influenciar no comportamento dos
agentes econômicos, que no caso, seriam as empresas e
suas atitudes comerciais.
Assim que o busca evidenciar, é que algumas leis, ou até
mesmo o que a elas se identificam, ainda mais no sistema
internacional de comércio, como por exemplo, os princípios
de direito internacional e Jus Cogens, influenciam que as em-
presas tomem atitudes mais ativas de inclusão de minorias, e
como geralmente o mundo empresarial evolui de uma forma
mais rápida e busca sempre englobar o máximo de público
possível, acaba por atingir um grupo não antes evidenciado.
Consequente eficácia de atitudes comerciais inclusivas
pode obter uma explicação pela natureza do mercado,
que pode partir de duas precisas: o público interessado
em um produto irá buscar esse produto, ou, um fornece-
dor do produto irá buscar um público que possa ser inte-
ressado em seu produto122.

122 “Mercado” é qualquer situação em que pessoas que têm bens ou serviços para oferecer pro-
curam apresentar-se frente a pessoas interessadas em obtê-los, ou, ainda, aquela em que muitos
compradores potenciais buscam se apresentar frente à pessoa ou às pessoas que tenham bens ou
serviços a oferecer, podendo, portanto, os dois fenômenos ocorrer simultaneamente. (MACKAAY;
ROUSSEAU, 2020. p. 91).

441
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

CONSEQUÊNCIAS DAS CAMPANHAS DE


INCLUSÃO SOCIAL
Muito antes das campanhas publicitárias abarcarem a
temática sobre a diversidade, as grandes empresas já com-
preendiam que as pessoas gastam com base naquilo que
se identificam, assim lançavam publicidades voltadas a
atrair um público específico, utilizando de meios que esse
público se identificasse.
O Pink Money não é a primeira forma de utilizar de mi-
norias sociais para um impulso na comercialização de pro-
dutos. Antes já se falava em Green Money e Black Money.
O primeiro refere-se a empresas que utilizam de campa-
nhas e atitudes eco-friendly para a promoção publicitária,
e o segundo é utilizado para incentivo de negócios criados
ou geridos por pessoas negras, campanhas essas que ge-
ram o consumo ideológico. (GALVÃO, 2019)
Portanto, há um impulso não apenas no comércio que
utilizou da campanha inclusiva, mas todas as áreas da so-
ciedade que trazem o assunto para o debate.
É a forma como a mídia social hoje pode controlar em
quais os tópicos que estarão em destaque para debates. A
facilidade de transportar notícias pelo mundo todo trazida
pelas tecnologias de hoje mostra-se eficiente em propagar
ideologias e opiniões.
Fica claro quando visualizamos a campanha inicia-
da pela professora Patrícia Braille123, com a utilização da
#PraCegoVer. Muitas empesas aderiram a campanha e seus

123 A professora baiana Patrícia Braille, que trabalha com educação especial e tem muitos amigos
cegos¹, sempre sentiu a necessidade de incluir legenda de descrição nas fotos que compartilhava
em seu blog e Redes Sociais. [...] E foi pensando nisso e para melhorar o entendimento desta
audiência especial, que a hashtag #PraCegoVer foi incorporada antes da descrição como forma de
deixar claro o motivo do texto, separando melhor a legenda da foto da descrição da imagem. Al-
gumas marcas, empresas em geral e instituições já aderiram ao movimento e criaram suas próprias
Tags de acessibilidade. (CARACHO, 2019).

442
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

comerciais nas redes sociais que são em vídeos e ima-


gem são expostos em textos, facilitando a acessibilidade
de quem tem cegueira e/ou surdez.
O que iniciou apenas como uma simples campanha
publicitária de uma rede de fast food levantou assunto
que não era discutido entre os usuários dessas redes so-
ciais: qual a acessibilidade que elas possuem a aqueles
com certos tipos de dificuldades?
A partir de então, verificou-se a limitação que esses
indivíduos detinham ao tentar utilizar da tecnologia. As-
sim, evidencia-se que uma campanha publicitária pode
levantar um assunto sobre uma minoria social que antes
não se discutia.
Tamanha foi a importância do tópico, que hoje, muitas
das empresas que utilizam desses sistemas de comunica-
ção em massa se aderiram a forma de publicidade “A tec-
nologia, juntamente com as mídias sociais mudaram não
somente a forma de nos comunicarmos, mas também a
forma com que as empresas divulgam seus produtos e
fazem publicidade”. (MUCKE, 2017)
As consequências indiretas que essas campanhas
publicitárias conseguem gerar são de suma importân-
cia, ao atingirem um público maior que aquele espe-
cífico da campanha. Por vezes, quem simpatiza com
a causa apresentada, também começa a enxergar com
outros olhos a empresa que emprega esforços para
praticar a inclusão.
Muito mais além de abranger uma minoria utilizando
campanhas, é a possibilidade de remodelar um pensamen-
to enraizado de uma sociedade.
Já se tem conhecimento que as formas de comunicação
e propaganda influenciam altamente no comportamento

443
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

das pessoas. Aquilo que se mostra nas redes televisivas,


na internet e no cinema criam padrões a serem seguidos
pelos espectadores124.
Verifica-se que pela natureza humana, quando um ma-
terial é lançado especificamente para tratar sobre assuntos
de inclusão social, acaba-se por atingir apenas o público
que está interessado sobre aquele assunto em específico.
Porém, quando minorias são tratadas por empresas que
procuram atender toda forma de público, sua gama de
eficácia ganha outras proporções.
Reforçando esse pensamento, no Brasil, conforme o site
Out Leadership125, responsável por apurar dados quanto a
qualidade de trabalho, vida, entre outros temas atrelados
à comunidade LGBTI+, em 2015, definiu que no Brasil, o
potencial financeiro do segmento LGBTI+ é estimado em
US$ 133 bilhões, que equivale à aproximadamente 10% do
PIB nacional da época.

AS POLÍTICAS INTERNAS NAS EMPRESAS


A ideia de inclusão de pessoas LGBTI+ iniciou-se na
década de 1960 nos Estados Unidos, a nível de complian-
ce, a fim de evitar riscos judiciais, visto as práticas discrimi-
natórias na época. (DONAVON; KAPLAN, 2013, p. 127) O
que não ocorria na mesma época no Brasil, marcada pela
ditadura militar e a intervenção estatal conservadora.
Para TEIXERA (2011, p. 81), as organizações começa-

124 Nesse sentindo: “O entendimento de que a publicidade e a vigilância estão profundamente


associados na sociedade de controle, através da Publicidade de Controle, é por si só instigante e
desafiador. Se você perguntar a um estudante de publicidade qual a função dela, possivelmente
dirá que é “anunciar”, “persuadir” e “vender”. Com a pesquisa que resultou no livro, podemos ob-
servar que uma das funções ontológicas da publicidade talvez seja controlar os sujeitos e seus pro-
cessos de subjetivação. Na sociedade de controle, este controle se dará a céu aberto, através dos
dispositivos infocomunicacionais conectados em rede que capturam, sistematizam, categorizam e
cruzam dados a favor de diversos atores sociais, como empresas e governos.” (DOMINGUE, 2016).
125 Para maiores informações acessar: OUTLEADERSHIP, S.d/

444
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ram a se importar diretamente com temas de diversidade


em razão do movimento neoliberal, cujo Estado procurou
iniciativas privadas a fim de fortalecer o discurso de res-
ponsabilidade social, o qual está diretamente ligado com
políticas de inclusão nas organizações.
Esse processo se fortaleceu no Brasil com a promul-
gação da Constituição Federal de 88, dando força para
movimentos sociais de minorias pressionassem os repre-
sentantes, bem como o fortalecimento dos sindicatos, que
questionavam o descumprimento da Convenção nº 111 da
Organização Internacional do Trabalho, cujo tema é discri-
minação nas relações de emprego.
Cox (1994, p. 267), em 1994, já defendia que a prática
de gestão de pessoas aberta à diversidade está ligada a
diversos benefícios: econômicos, éticos e legais. O econô-
mico traduz-se em razão da produtividade/desempenho,
pois um ambiente diverso é favorável para práticas cria-
tivas e inovadores, melhorando a comunicação de áreas
da empresa126. Os benefícios legais estariam ligados à re-
dução de processos judiciais motivados por discriminação
dentro do âmbito empresarial. A ética está ligada com os
valores que a empresa gostaria de transmitir.
Percebe-se que, apesar de Cox não comentar em sua
obra, Política de Inclusão traz em si o maior benefício para
área de compliance: mitigação de riscos (reputacionais, de
imagem, financeiros e jurídicos).
No sentindo do desempenho/produtividade, em re-
cente pesquisa desenvolvida pela Management Science,
“Employment Nondiscrimination Acts and Corporate In-
novation”, conclui-se que empresas que possuem políti-
126 Complementa Dozier: “quando os valores organizacionais proporcionam apoio às mulheres e
àqueles de origens diferentes, existe maior possibilidade de que a comunicação seja excelente”
(DOZIER, 1995, p.149, traduzido).

445
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

cas efetivas de inclusão de pessoas LGBTI+ demonstra-


ram um aumento de 8% no registro de novas patentes.
(GAO; WEI, 2016)
A pesquisa ligou esse fato diretamente com o fato de
a empresa estar situada em um Estado com uma gran-
de quantidade de LGBTI+ assumidos, e que estes Estados
também possuam políticas antidiscriminação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: BALANÇEAMENTO ENTRE


LUCRO E A EFETIVA REPRESENTATIVIDADE
Hoje não se pode mais negar que a pauta LGBTQi+ é
uma grande demanda no mercado, muito decorrente do
poder de consumo que esse grupo em específico possuí,
ainda pela grande procura por produtos customizados que
a comunidade requer.
E como verificado pela Análise Econômica do Direito,
que o funcionamento mercado demanda que os fornece-
dores se adequem a demanda. E por consequência, ocorra
o aumento de publicidade e políticas de inclusão da co-
munidade LGBTQi+ nas empresas. E como decorrente da
AED, com a aplicação de tais políticas, se faz necessário
que haja uma regulamentação pela administração pública,
pode evitar que ocorram abusos ou desinformação.
Importante é o exemplo trazido por Machaay e Rou-
sseau127, que evidência que a moralidade que é guia de
algumas escolhas políticas não necessariamente atingem o
127 Durante muito tempo o aborto era proibido. Quais os efeitos dessa proibição? Como o pertur-
bador filme Vera Drake tentou, recentemente, demonstrar, para as pessoas mais abonadas o abor-
tamento sempre foi acessível e realizado em condições médicas seguras mediante correspondente
pagamento e um discurso hipócrita escondendo a verdadeira questão, ao inserir a intervenção
entre as exceções admitidas por conta da saúde. Para os pobres, ao revés, a única opção era re-
correr aos fazedores de anjos. A operação deveria ser realizada em condições arriscadas do ponto
de vista médico, com falhas frequentes e, demais disso, sujeita aos procedimentos penais. O efeito
da proibição era, pois, não a inexistência de abortamentos mas, ao contrário, acesso limitado e
custoso no plano humano, com efeito discriminatório líquido dos menos afortunados. (MACKAAY;
ROUSSEAU, 2002, p. 667).

446
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

mercado, pois a demanda sempre existirá independente-


mente dos controles legais.
Portanto quando o mercado demanda produtos e po-
líticas voltados para a comunidade LGBTQi+, os fornece-
dores irão aproveitar da oportunidade para crescimento
econômico pessoal, independentemente de normatização.
Fazendo por necessário ocorrer uma regulamentação pos-
terior por parte do poder público.
E é pela New Economics and Law que se percebe a
aplicação da economia às normas reguladoras fora do viés
econômico, atingindo outros ramos do Direito, como o
direito de família, penal, entre outros.
Por fim, conclui-se que as atitudes empresariais visan-
do o lucro sobre a comunidade LGBTQi+, apesar de su-
perficialmente predatórias, é decorrência de um sistema
capitalista comum, sendo de suma importância tanto para
o grupo em questão quanto para os agentes econômicos,
sendo papel do Direito a regulamentação posterior.

REFERÊNCIAS
About IGLTA. Disponível em: http://www.iglta.org/About-IGLTA.
Acessado em: 16 de setembro de 2019.
About UN Women: Work and priorities. Disponível em: https://
www.unwomen.org/en/about-us/about-un-women. Acessado em:
16 de setembro de 2019.
ALDRICH, Robert. Homosexuality and the city: an historical over-
view. Urban Studies, v.41, n.9. 2004.
CARACHO, Natália. #PraCegoVer – O que você precisa SABER so-
bre este movimento! 2019. Disponível em: http://fourmi.com.br/
blog/pracegover-pratodosverem-o-que-voce-precisa-saber-sobre
-este-movimento/. Acessado em: 16 de setembro de 2019
CAZASSUS Dall’Agnol, Talita A. Publicidade Inclusiva: As Pesso-

447
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

as Com Deficiência Como Consumidores Em Potencial. 2017.


Disponível em: https://diariodainclusaosocial.com/2017/12/02/pu-
blicidade-inclusiva-vendo-as-pessoas-com-deficiencia-como-con-
sumidores-em-potencial/. Acessado em 12 de setembro de 2019.
COX, Taylor. Cultural diversity in organizations: theory, resera-
ch and practice. São Francisco: Berrett-Koehler Publishers. 1994.
Da publicidade disciplinar à de controle: livro mostra trajetória
para propaganda 24/7. 2016. Disponível em: http://lavits.org/
da-publicidade-disciplinar-para-a-de-controle-conversa-com-izabe-
la-domingues/?lang=pt. Acessado em 12 de setembro de 2019.
DONOVAN, Mason; KAPLAN, Mark. The inclusion dividend. Massa-
chussets: Bibliomotion. 2013.
DOZIER. traduzido. 1995.
GALVÃO, Pedro. Pink Money: como sua marca deve se relacionar
com o público LGBTI+. 2019. Disponível em: https://rockcontent.
com/blog/pink-money/. Acessado em: 16 de setembro de 2019.
GAO, Huasheng. WEI, Zhang. Employment Nondiscrimination
Acts and Corporate Innovation. Published Online:15 Jun 2016.
Disponível em: https://doi.org/10.1287/mnsc.2016.2457
JAKOBI, Karin Bergit. RIBEIRO, Marcia Carla Pereira. A análise eco-
nômica do direito e a regulação do mercado de capitais. São
Paulo. Atlas. 2014.
MACKAAY, Ejan. ROUSSEAU, Stéphane. Análise Econômica do Di-
reito. Atlas. 2ª ed. São Paulo. 2020.
MUCKE, Isabela. A Influência das Redes Sociais na Atualidade.
2017. Disponível em: https://komeia.com/blog/influencia-das-re-
des-sociais-na-atualidade/. Acessado em: 16 de setembro de 2019
O poder do pink money. 2016. Disponível em: https://www.isto-
edinheiro.com.br/noticias/investidores/20130531/poder-pink-mo-
ney/3262. Acessado em: 22 de agosto de2019.
PEÑALOZA, Lisa. We’re here, we’re queer, and we’re going sho-
pping! A critical perspective on the accommodation of gays

448
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

and lesbians in the U.S. marketplace. Journal of Homosexuality,


v.31, n.1/2. 1996.
PINHONI, Mariana. Parada LGBT de 2019 movimentou R$ 403
milhões em SP, diz prefeitura. 2019. Disponível em: https://g1.
globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2019/06/29/23a-parada-lgbt-mo-
vimentou-r-403-milhoes-em-sao-paulo-diz-prefeitura.ghtml. Aces-
sado em 16 de setembro de 2019.
QUEIROZ Soares, Danielle de. Gurge, Wildoberto Batista. Ideologias
e Consciência Possível na Era da Informação: reflexões sobre
a possibilidade de emancipação na contemporaneidade. 2011.
Disponível em: http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinpp2011/
CdVjornada/JORNADA_EIXO_2011/MUNDIALIZACAO_BLOCOS_
ECONOMICOS_ESTADO_NACIONAIS_E_POLITICAS_PUBLICAS/
IDEOLOGIAS_E_CONSCIENCIA_POSSIVEL_NA_ERA_DA_INFOR-
MACAO.pdf. Acessado em: 16 de setembro de 2019
QUEVEDO, Cecília. Afinal o que é o Pink Money? 2018. Disponí-
vel em: https://woomagazine.com.br/afinal-o-que-e-pink-money/.
Acessado em: 16 de setembro de 2019
SILVA, César Roberto Leite da. Economia e Mercados: Intro-
dução à Economia. pag. 49. Saraiva. Ed. 20. 2018. São Pau-
lo. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/
books/9788547227739/cfi/4!/4/4@0.00:0.00. Acessado em: 16 de
setembro de 2019
SILVA, Maria Aparecida da Costa. Consumo e Beleza Feminina a
Partir das Propagandas da Revista “O Cruzeiro”. p.107. 2016.
Disponível em: file:///C:/Users/131142034/Downloads/30220-
66862-1-PB.pdf. Acessado em: 16 de setembro de 2019
TEIXEIRA, Kamila Cristina da Silva. Discursos e Práticas sobre a va-
lorização da diversidade no âmbito empresarial: um estudo
de caso. Gênero. Niterói, v. 12, n.1. 2011.

449
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO E ECONOMIA


COMPORTAMENTAL: A RACIONALIDADE
LIMITADA NO PROCESSO DE DECISÃO

Ariê Scherreier Ferneda128 e


Pedro Andrade Guimarães Filho129

Resumo: O presente artigo tem como objetivo realizar


um estudo teórico a respeito da Análise Econômica do
Direito, bem como da Economia Comportamental, com
o intuito de compreender quais os fatores que influen-
ciam o processo de tomada de decisões dos agentes.
Para isso, realizou-se um estudo pautado em revisão
bibliográfica com o fim de identificar e avaliar as heurís-
ticas e os vieses de decisão, os quais geram a denomi-
nada racionalidade limitada. Os referenciais utilizados
para o desenvolvimento deste estudo foi Herbert Simon,
Daniel Kahneman e Amos Tverski. Constatou-se, ainda
que de modo não exauriente, que a tomada de decisão
está repleta de imperfeições e, por vezes, de julgamen-
tos desviantes da racionalidade. Assim, há necessidade
de reconhecer como ocorrem as influências cognitivas e
intuitivas no momento da tomada de uma decisão, para
que seja possível a busca por maior eficiência alocativa
de recursos em todos os seus aspectos.
Palavras-chave: Análise Econômica do Direito; Racionali-
dade Limitada; Heurísticas; Vieses.

128 Graduanda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Membro do Grupo de
Estudos de Análise Econômica do Direito. Pesquisadora de Iniciação Científica 2019-2020. ariefer-
nedaxx@gmail.com.
129 Mestrando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Graduado em Direito
pela FAE. Membro do Grupo de Estudos de Direitos Humanos e Empresas. Professor Convidado.
Advogado. E-mail: pedro@martinelliguimaraes.com.br.

450
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

INTRODUÇÃO
Para além do prisma do Direito Positivo que permeou a
ciência jurídica ao longo do Século XX, de modo gradiente
a multidisciplinaridade e o debate direto com outras áreas
do conhecimento, como a psicologia e a economia, urgem
como uma nova tônica da pesquisa jurídica.
Tal postura empreende um sem número de janelas am-
pliativas para a compreensão doo Direito contemporâneo,
das suas bases principiológicas, passando pelo processo
legiferante até o efetivo exercício jurisdicional; lembre-
mos, pois, que o âmbito jurídico não constitui um espaço
em alijado da realidade, pelo contrário. É um elemento da
zeitgeist, um fruto do seu tempo, o influenciando e por ele
sendo influenciado.
Trata-se de uma atividade imperativa ao regular exercí-
cio do Direito na atualidade, sobretudo quando a socieda-
de busca nas fileiras jurídicas respostas às mazelas contra
ela impingidas. Embora não caiba ao Direito a dura tarefa
de ser a panaceia para todas as agruras do mundo, justo
afirmar, noutra mão, que seu exercício deve se reportar
aos fins que o concebem.
Neste passo, economia e psicologia, exemplos supra-
citados, são constitutivos ao Direito no eixo central dos
estudos acerca de quais vetores compõe o processo de
decisão; não exaurindo a questão, mas é notável a pre-
sença da intersecção entre a Análise Econômica do Direito
e a Economia Comportamental dentro do tópico. Trata-se
precisamente do objeto deste estudo.
Tendo como ponto focal uma análise teórica objetivada
ao fomento de estudos futuros sobre a temática, inicial-
mente serão abordados elementos gerais e introdutórios
da análise econômica do direito, para, num segundo mo-

451
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

mento, adentrar a seara do processo de tomada de de-


cisão, momento em que a questão será abordada sob a
lente de três autores: Herbert Simon, Daniel Kahnemann e
Amos Tversky, para, enfim, traçar um espaço dialógico e
intercomunicacional entre os dois temas.

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: A BUSCA


POR EFICIÊNCIA ALOCATIVA
O Direito, enquanto ciência social aplicada, busca re-
gular o comportamento humano por meio de regras. Em
contrapartida, a Economia estuda o processo de tomada
de decisões e como o ser humano se comporta diante
da escassez de recursos e de suas consequências. Tendo
isso em vista, compreende-se que a Análise Econômica do
Direito (AED) se utiliza de fundamentos teóricos e empíri-
cos da economia para expandir a compreensão do direito,
bem como aperfeiçoar o desenvolvimento, a aplicação e a
avaliação das normas jurídicas. (GICO JR., 2012, p. 1)
A AED surge a partir da necessidade de aproximação
entre o direito e a realidade social, de modo a abandonar
o ideal juspositivista, em que o direito não dialoga com as
demais ciências sociais. Nesse sentido, busca-se o instru-
mentalismo jurídico, uma vez que o operador do direito
deve empregar abordagens mais pragmáticas perante o
direito com o intuito de “promover de forma balanceada
os interesses sociais”, considerando que o direito não é ca-
paz de sustentar apenas única resposta diante de um caso
concreto e sua utilização não se resume à mera aplicação
mecânica da lei. (GICO JR., 2012, p. 7)
Por sua vez, no Brasil, essa corrente contrária ao forma-
lismo jurídico pode ser exemplificada pelo neoconstitucio-
nalismo (ou pós-positivismo) (GICO JR., 2012, p. 7-8) que,

452
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

no entanto, não se preocupa de maneira efetiva com as


consequências oriundas da aplicação de determinada lei
ou com os efeitos de uma decisão judicial, por exemplo.
Assim, percebe-se que, a partir da corrente neoconsti-
tucionalista, os instrumentos postos à disposição do intér-
prete do direito com o fim de identificar, prever e mensu-
rar as consequências da adoção de determinada lei foram
deixados de lado, uma vez que referida corrente possui
como foco a elaboração de “justificativas teóricas e abstra-
tas para a flexibilização da lei e sua compatibilização com
princípios de conteúdo interminado, segundo algum crité-
rio de justiça, pretensamente racional e não voluntarista”.
(GICO JR., 2012, p. 7)
Diante dessa insuficiente preocupação com as conse-
quências, a Análise Econômica do Direito passa a ser dis-
cutida no Brasil como uma metodologia (interdisciplinar)
que contribui para compreensão do processo de tomada
de decisões e do comportamento humano em face de uma
norma, trazendo ao sistema jurídico elementos como valor,
utilidade e eficiência. (RIBEIRO; GALESKI JR., 2009, p. 69)
Além disso, serve de auxílio para avaliação de prováveis
consequências de uma decisão ou da adoção de políticas
públicas, levando em conta o contexto social, econômico,
político e institucional em que a lei ou decisão será imple-
mentada (diagnóstico e prognose). (GICO JR., 2012, p. 11)
Em suma, a AED filia-se ao consequencialismo, de acor-
do com o qual as regras que regem a sociedade devem
ser desenvolvidas, aplicadas e alteradas com base em suas
consequências no mundo real. (GICO JR., 2011, p. 18) Para
isso, há necessidade de valer-se de instrumentos teóricos
e empíricos que permitam a identificação de problemas
sociais, bem como as prováveis reações dos indivíduos

453
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

diante de uma determinada regra. (GICO JR., 2011, p. 18)


Assim, diante do conhecimento das consequências prová-
veis, torna-se possível optar pela adoção da melhor regra.
Não obstante, a AED não se restringe aos aspectos
“econômicos”, isto é, não se limita ao direito econômico,
referente à regulamentação das atividades “econômicas”.
Ao contrário, busca “explicitar a lógica, nem sempre cons-
ciente de quem decide, e que não se traduz, expressamen-
te, nos motivos das decisões”. (MACKAAY; ROUSSEAU,
2015, p. 8) Inobstante, salienta-se que a teoria econômica
é um método de análise, um aparato da mente, e não uma
doutrina. Trata-se de uma técnica de raciocínio que auxilia
o ser possuidor a alcançar conclusões acertadas (KAYNES,
1992, s.p.), de modo a adotar critérios (normativos) que
“induzam as pessoas a buscar eficiências alocativas”. (ZYL-
BERSZTAJN; SZTAJN, 2005, p. 2)
Tendo isso em vista, é possível constatar que a análise
econômica não se refere a um objeto de estudo específico,
como o comércio, concorrência, moeda etc., mas a um
método de investigação, cuja análise se volta a qualquer
questão que envolva escolhas humanas, feitas de modo in-
dividual ou coletivo, no âmbito do mercado ou fora dele,
diante de recursos escassos. (GICO JR., 2011, p. 19-20)
Trata-se, portanto, de uma análise de fenômenos jurí-
dicos sob uma perspectiva econômica que permite a atri-
buição de função clara ao direito e, como consequência,
torna eficientes as relações sociais, contribuindo, assim,
para uma maior interação entre o direito e as demais ciên-
cias sociais. (BITTERNCOURT, 2011, p. 27)
Não obstante, o movimento da AED (como conhecida
hoje) pode ser dividido em cinco momentos: a proposi-
ção do paradigma (1958-1973); sua aceitação (1973-1980);

454
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

questionamento (1976-1983); reformulação do movimento


(1983-até hoje). (MACKAAY, 2000, p. 71-80)
Entretanto, as bases para o desenvolvimento da AED en-
contram-se em “A Riqueza das Nações”, de Adam Smith
(Economia Clássica), o qual crê que a liberdade de con-
corrência é capaz de promover a melhoria na alocação de
recursos, uma vez que os preços seriam livremente fixados
pelo mercado, de modo a se alcançar o equilíbrio por meio
da “mão invisível”. (RIBEIRO; GALESKI, 2009, p. 54) Assim,
com base nas ideias de Smith, foi criada uma doutrina de
não intervenção estatal, salvo em casos de falha de merca-
do (fato que não era estudado na época de Smith). A partir
disso, iniciam-se os estudos sobre Direito e Economia.
Outros precursores foram: Beccaria, Bellamy e Ben-
tham. De acordo com a visão utilitarista de Bentham, o
homem deve maximizar a sua felicidade e dar utilidade
às coisas, por isso, o único princípio que fundamentaria
essa corrente seria o da utilidade, o qual se torna possível
por meio da propriedade de um bem, através do qual o
proprietário pode produzir um benefício ou vantagem ou
simplesmente evitar o dano ou a dor, por exemplo. (BEN-
THAM, 2002, p. 262)
Ocorre que é a partir da década de 1930, com Ronald
Coase na Universidade de Chicago (a partir da “A Nature-
za da Firma”), que a Análise Econômica do Direito ganha
suas primeiras linhas (autônomas em relação à análise do
Direito e Economia). Entretanto, somente na década de
1960 que o movimento pode ser considerado fundado,
tendo como marco o artigo “O problema do custo social”,
de Ronald Coase (considerado também como precursor
da Nova Economia Institucional). Outro trabalho que re-
forçou as bases do movimento foi “Alguns pensamentos

455
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

sobre distribuições de risco e a lei de agressão”, de Guido


Calabresi, oportunidade em que demonstra a importân-
cia da análise de impactos econômicos da alocação de
recursos para a regulação da responsabilidade civil, tanto
na seara legislativa quanto na judicial. (ZYLBERSZTAJN;
SZTAJN, 2005, p. 2)
Posteriormente, Richardo Posner, considerado como ver-
dadeiro precursor da AED, contribuiu para o fortalecimento
do movimento ao afirmar que é a sua aplicação jurisdicio-
nal é plenamente possível. (RIBEIRO; GALESKI, 2009, p.
60) Por sua vez, a AED como concebida hoje se utiliza de
alguns conceitos como o de eficiência, de custos de transa-
ção, bem como o da consideração das externalidades e dos
bens públicos. (RIBEIRO; GALESKI, 2009, p. 78)

ECONOMIA COMPORTAMENTAL: A RACIONALIDADE


LIMITADA NO PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO
Os estudos sobre o comportamento humano e o pro-
cesso de tomada de decisões geraram embates entre pro-
fissionais da economia e da psicologia/sociologia, a partir
dos quais foi proposta a ideia de que os agentes econô-
micos valorizam de modo diferente ganhos e perdas da
mesma magnitude, tendo a perda maior valor subjetivo
que o ganho. (PAIVA, 2013, p. 1) Nesse sentido, desenvol-
veu-se a Economia Comportamental (EC), que consiste no
“estudo das influências cognitivas, sociais e emocionais
observadas sobre o comportamento econômico das pes-
soas”. (SAMSON, 2015, s.p.)
Para melhor compreensão da EC, destacam-se as prin-
cipais premissas para a aplicação da AED: 1) reconheci-
mento de que o homem está disposto a aplicar todos os
esforços para obter o melhor para si mesmo, agindo de

456
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

forma racional com o fim de maximizar os benefícios; 2)


o agente se utiliza de cálculos racionais a respeito de qual
conduta lhe trará mais benefícios, ou seja, se há ou não
incentivos e se a sanção compensará o resultado; 3) as re-
gras legais atuam como incentivos ou como meio de coibir
condutas, de modo a influenciar no processo de tomada
de decisão das pessoas. (RIBEIRO; GALESKI, 2009, p. 77)
Cabe ainda esclarecer que o “atuar de forma racional”
possui três concepções distintas: 1) agir racionalmente
pressupõe saber comparar e decidir entre duas ofertas
concomitantes; 2) o agente, conhecedor da utilidade de
cada objeto posto, escolhe com base na maior utilidade
que o bem pode lhe ofertar; 3) levar em conta os custos
de oportunidade, considerando o fato de o agente poder
optar pela alternativa que trás mais benefícios do que cus-
tos. (RODRIGUES, 2007, p. 13) Nesse sentido, tem-se que
o “escolher de forma racional” está associado ao padrão
de racionalidade (em relação às informações e/ou a forma
como as analisa) que o agente possui.130
Desse modo, “escolher de forma racional é saber ana-
lisar a utilidade marginal do bem” (RIBEIRO; GALESKI,
2009, p. 82) (Revolução Marginalista e Escola Austríaca),
considerando os efeitos de pequenas variações entre o
custo marginal e o benefício marginal.
Tendo em vista as breves considerações sobre a “esco-
lha racional”, parte-se à análise inicial da EC, cujos princi-
pais autores abordados neste artigo são Herbert Simon (i),
Daniel Kahnemann e Amos Tversky (ii).
A primeira análise sobre o processo de tomada de deci-
são é realizada por meio do ponto de vista da racionalida-
130 O assunto também foi discutido em: FERNEDA, Ariê Scherreier. Economia Comportamental e
os Truques para Escolher Melhor. Disponível em: <https://martinelliguimaraes.com.br/econo-
mia-comportamental-e-os-truques-para-escolher-melhor/>. Acesso em 07 dez. 2019.

457
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

de limitada. A segunda, por sua vez, é realizada com base


na teoria da perspectiva, a qual questiona a racionalidade
do agente econômico para tomada de decisões.
De acordo com as ideias de Simon, “a racionalidade
de uma decisão depende de estruturas encontradas no
ambiente”. (SAMSON, 2015, s.p.) Herbert Simon foi quem
propôs a noção de racionalidade limitada considerando
“os limites humanos no tratamento da informação disponí-
vel para tomar decisões” (GARCÍA-MARQUES; FERREIRA,
2003, p. 476), com o objetivo de propor um modelo alter-
nativo àquele utilizado na economia a fim de demonstrar
que “as decisões são tomadas de maneira diversa da tra-
dicional maximização de utilidade e de lucros”. (SBICCA,
2014, p. 581)
Nesse sentido, para que seja possível entender o com-
portamento de um organismo é preciso conhecer sua es-
trutura interna, bem como seu mecanismo de adaptação.
(SBICCA, 2014, p. 582) De modo sucinto, Adriana Sbicca
explica que Simon entende que as pessoas não compreen-
dem o mundo em sua integralidade e não levam em con-
sideração, necessariamente, as informações disponíveis.
As pessoas tendem, na verdade, a focar naquilo que as
preocupam e não enfrentam informações que podem ser
potencialmente contraditórias, selecionando apenas o que
é importante, reduzindo, assim, a sobrecarga de informa-
ções. (SBICCA, 2014, p. 582)
Ao abordar a racionalidade limitada, Simon leva em
consideração três fatores: 1) complexidade do ambiente
de escolha; 2) acesso às informações; 3) limites psicoló-
gicos do decisor. (SBICCA, 2014, p. 584) Em suas análises
sobre o tema, Simon ainda utiliza o exemplo do jogo de
xadrez, a partir do qual enfatiza a impossibilidade de os

458
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

jogadores pesquisarem todas as possibilidades de jogadas,


bem como ressalta diversas estratégias que diminuem essa
necessidade de análise (SBICCA, 2014, p. 585), confirman-
do o afirmado acima.
Sendo assim, chegou-se a conclusão de que o homem
utiliza atalhos, chamados de heurísticas, para tomada de
suas decisões (julgamentos de probabilidades). Nesse sen-
tido, o autor aponta que “a memória humana é organiza-
da como uma enciclopédia muito bem indexada”, sendo
que as dicas de percepção são os itens indexados, “os
quais dão acesso à informação armazenada a respeito da
cena percebida e das ações relevantes”. (SIMON, 1993, p.
642-643) Assim, para a busca de satisfação (e não apenas
otimização/maximização) faz-se necessária análise do am-
biente em que se toma a decisão e a estrutura interna do
organismo, uma vez que estes fatores podem influenciar
os mecanismos de adaptação e a própria decisão.
Em contrapartida, a teoria da perspectiva, ou dos pros-
pectos, criada por Daniel Kahnemann e Amos Tversky,
evidencia que nem sempre as decisões são ótimas, sen-
do que a tendência do ser humano a correr riscos é in-
fluenciada pelo modo como as escolhas são apresentadas,
dependendo, portanto, do contexto. Em outras palavras,
as heurísticas, por vezes, podem levar a erros graves e
sistemáticos. (TVERSKI; KAHNEMAN, 1974, p. 1124) Os
autores classificam as heurísticas em (PAIVA, 2013, p. 22):
• Disponibilidade - maior influência de eventos que são
mais fáceis de lembrar ou imaginar. Por exemplo, João
vai viajar de avião na próxima semana e ainda irá com-
prar suas passagens. Mas hoje acontece o maior aci-
dente da história da aviação. Embora uma viagem de
avião seja segura (em comparação com outros meios de

459
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

transporte), o acidente ocorrido terá um peso maior do


que merece no processo de tomada de decisão de João
no momento da compra da passagem.
• Representatividade – comparação da probabilidade de
um acontecimento com categorias semelhantes pree-
xistentes, baseadas em estereótipos. Por exemplo, Ma-
ria tem uma BMW, assim, pressupõe-se que ela é rica.
Ocorre que, mesmo tendo uma BMW, Maria não possui
uma vida estável, sequer é rica. Nota-se, assim, um erro
de julgamento.
• Ancoragem – realização de ajustes num valor inicial,
que é determinado arbitrariamente com fundamentos
em antecedentes históricos.
Ademais, é a partir da identificação de desvios cogni-
tivos e de equívocos decorrentes de processos mentais
obscuros que se pode explicar as razões pelas quais os
agentes econômicos não agem de acordo com o modo
previsto pelos modelos economáticos. (RIBEIRO; DOMIN-
GUES, 2018, p. 462) Nesse sentido, a partir das heurísticas,
os decisores podem se utilizar de regras simples que “não
analisam os eventos em listas exaustivas para agregá-los, e
nem mesmo avaliam suas probabilidades de ocorrência”.
(SBICCA, 2014, p. 589)
Por outro lado, de acordo com a teoria da perspectiva, as
pessoas possuem maior aversão à perda do que apreço por
um ganho equivalente. Esta constatação resta comprovada
a partir da seguinte hipótese, confirmada por Daniel Kahne-
mann e Amos Tversky: O que você prefere? 1) Um ganho
certo de $250, ou 2) Uma chance de 25% de ganhar $1000 e
uma chance de 75% de não ganhar nada? E que tal: 3) Uma
perda certa de $750, ou 4) Uma chance de 75% de perder
$1000 e uma chance de 25% de não perder nada?

460
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Conforme o trabalho realizado pelos autores, diante do


primeiro tipo de decisão, grande parte das pessoas opta
pela alternativa sem risco (1); já diante do segundo proble-
ma, as pessoas mostram maior probabilidade de escolher
(4), a mais arriscada (SAMSON, 2015, s.p.), comprovando
a opção pela alternativa mais próxima do certo (efeito cer-
teza), considerando, inclusive, que “abrir mão de alguma
coisa é mais doloroso do que o prazer que sentimos por
recebê-la”. (SAMSON, 2015, s.p.)
A partir da referida pesquisa, os autores afirmam que o
efeito certeza “contribui para aversão ao risco em escolhas
que envolvem ganhos e para uma propensão ao risco em
decisões que envolvem perdas”. (SBICCA, 2014, p. 592)
Isto ocorre porque, muitas vezes, o agente decide de for-
ma instintiva. Por isso, deve-se levar em consideração o
contexto no momento da tomada de decisão.
Por fim, a compreensão da decisão não envolve ape-
nas o seu resultado, mas a análise do processo decisório.
Assim, “o bom resultado deve levar em consideração o
ambiente da escolha, restrições de tempo e esforço, os ob-
jetivos e o nível de aspiração do decisor”. (SBICCA, 2014,
p. 596) Constata-se, desse modo, que os agentes econômi-
cos nem sempre são racionais e, portanto, as consequên-
cias de suas decisões podem ser nocivas a toda a socieda-
de. Assim, vislumbra-se a real necessidade do estudo do
comportamento dos agentes com o intuito de se tomarem
decisões, sejam elas econômicas ou políticas, cujas conse-
quências busquem maior eficiência alocativa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo buscou analisar teoricamente os fun-
damentos e os objetivos da Análise Econômica do Direito,

461
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

a qual filia-se ao consequencialismo, a partir do qual as


regras que regem a sociedade devem ser desenvolvidas,
aplicadas e alteradas com atenção as suas consequências.
Para tanto, há necessidade de valer-se de instrumentos
teóricos e empíricos que permitam a identificação de pro-
blemas sociais, partindo-se de uma visão mais pragmática
do direito. Ainda, com o intuito de garantir a eficiência das
normas jurídicas, a AED busca avaliar as prováveis reações
dos indivíduos diante de uma determinada regra.
Nesse sentido, insere-se o estudo sobre o comporta-
mento humano e o processo de tomada de decisões, a
partir do qual foi proposta a ideia de que os agentes eco-
nômicos valorizam de modo diferente ganhos e perdas da
mesma magnitude, tendo a perda maior valor subjetivo
que o ganho.
Com base nisso, desenvolveu-se a Economia Comporta-
mental (EC), que consiste no estudo das influências cogniti-
vas, sociais e emocionais observadas sobre o comportamen-
to econômico das pessoas. Os principais autores utilizados
para o desenvolvimento do presente artigo foram Herbert
Simon, com o ideal da racionalidade limitada, Daniel Kah-
neman e Amos Tverski, com a teoria das heurísticas e vie-
ses. Com isso, pretendeu-se analisar o fato de os agentes
possuírem uma racionalidade limitada e que o processo de
tomada de decisão está envolto de fatores externos capazes
de influenciar de modo considerável a escolha dos indiví-
duos em todos os aspectos, seja econômico seja pessoal.

REFERÊNCIAS
ÁVILA, Róber Iturriet. Construção do homo economicus e a sua neces-
sária desconstrução. Ensaios FEE, Porto Alegre/RS, v. 35, n. 2, pp.
309-336, dez. 2014.

462
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

BENTHAM, Jeremy. Uma introdução aos princípios da moral e da le-


gislação. In: MORRIS, C. (Org.). Os grandes filósofos do Direito.
São Paulo: Martins Fontes, 2002.
BITTERNCOURT, Mauricio Vaz Lobo. Princípio da Eficiência. In: RI-
BEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinícius (Coord.). O que é
análise econômica do direito: uma introdução. Belo Horizonte:
Fórum, 2011.
COASE, Ronald. O problema do Custo Social. The Journal of Law &
Economics. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.
php/2123990/mod_resource/content/1/custosocial.pdf.
FERNEDA, Ariê Scherreier. Economia Comportamental e os Tru-
ques para Escolher Melhor. Disponível em: <https://martinelli-
guimaraes.com.br/economia-comportamental-e-os-truques-para
-escolher-melhor/>. Acesso em 07 dez. 2019.
GICO JR. Ivo T. Introdução à Análise Econômica do Direito. In: RI-
BEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinícius (Coord.). O que é
análise econômica do direito: uma introdução. Belo Horizonte:
Fórum, 2011.
GICO JR. Ivo. Introdução ao Direito e Economia. In: TIMM, Luciano Be-
netti (Org.). Direito e Economia no Brasil. São Paulo: Atlas, 2012.
MACKAAY, Ejan. History of Law and Economics. In: BOUCKAERT,
Boudewijn; DE GEEST, Gerrit. Encyclopedia of Law and Econo-
mics. The history and metodology of Law and economics. Massa-
chusetts: Edward Elgar Publishing Inc., 2000.
PAIVA, Fabiana Silva. O processo de decisão sob a perspectiva da
economia comportamental e da neurociência. 104f. 2013. Dis-
sertação (Mestrado). Instituto Superior de Contabilidade e Admi-
nistração de Lisboa. Lisboa, 2013.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; DOMINGUES, Victor Hugo. Economia
comportamental e direito: a racionalidade em mudança. Revista Bra-
sileira de Políticas Públicas. Brasília, v. 8, n. 2, p. 456-471, 2018.
RIBEIRO; Marcia Carla Pereira; GALESKI JR., Irineu. Teoria Geral dos

463
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Contratos: contratos empresariais e análise econômica. Rio de Ja-


neiro: Elsevier, 2009.
RODRIGUES, Vasco. Análise Económica do Direito. Coimbra: Al-
medina, 2007.
SAMSON, Alain. Introdução à Economia Comportamental. In: ÁVILA,
Flávia; BIANCHI, Ana Maria (Org.). Guia de Economia Compor-
tamental e Experimental. Trad. Laura Teixeira Motta. 1. ed. São
Paulo: EconomiaComportamental.org, pp. 26-60, 2015.
SBICCA, Adriana. Heurísticas no Estudo das Decisões Econômicas:
Contribuições de Herbert Simon, Daniel Kahneman e Amos Tver-
sky. Estudos Econômicos. São Paulo, v. 44, n. 3, pp. 579-603,
jul./set. 2014.
SIMON, H. A. The Human Mind: The Symbolic Level. The American
Philosophical Society, v. 137, n. 4, pp. 638-647, 1993.
TVERSKY, A; KAHNEMAN, D. Judgment under uncertainty: heuristics
and biases. Science, New Series, v. 185, n. 4157, pp. 1124-1131,
1974, p. 1974.
ZYLBERSZTAJN, Decio; SZTAJN, Raquel. Análise Econômica do Direi-
to e das Organizações. In: ZYLBERSZTAJN, Decio; SZTAJN, Raquel
(Org.). Direito e Economia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

464
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

PRISÃO ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO


DA SENTENÇA CONDENATÓRIA: UMA ANÁLISE
ECONÔMICA DOS GASTOS DO ERÁRIO PÚBLICO
COM PRESOS PROVISÓRIOS POSTERIORMENTE
ABSOLVIDOS PELOS TRIBUNAIS SUPERIORES

Lincoln Machado Domingues131


Roberta Martinic Cauduro132

Resumo: O presente artigo visa analisar a viabilidade eco-


nômica do condicionamento - seja por via legislativa, por
emenda constitucional ou por entendimento judicial - do
cumprimento da sentença condenatória de pena privativa de
liberdade em caráter antecipado, tendo em vista as recentes
mudanças de entendimento acerca do conceito de culpabi-
lidade na legislação e pelos tribunais. Não se pretende, por-
tanto, estudar os fundamentos jurídicos favoráveis ou contrá-
rios a esta modalidade de prisão, mas tão somente observar
e elencar os reflexos do custo de prender os réus quando
a prisão se torna posteriormente indevida. Para tanto, serão
exploradas pesquisas estatísticas providas por órgãos oficiais
acerca dos gastos com a carceragem para verificar se a deci-
são de prender ou não anteriormente ao trânsito em julgado
da ação penal é economicamente eficiente para o erário pú-
blico, resultando em uma análise crítica do encarceramento
em caráter precoce sob uma perspectiva econômica.
Palavras chave: Análise econômica do Direito; cumpri-
mento antecipado da pena privativa de liberdade; admi-
nistração penitenciária.

131 Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, especialista em Direito e
Criminologia pela PUC-RS e professor da FAE.
132 Acadêmica de Direito na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, bolsista no PIBIC pela
PUC-PR e pesquisa nas áreas de direito penal e questões de gênero.

465
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

1. INTRODUÇÃO
A Constituição da República promulgada em 1988 foi,
em tese, inequívoca ao dispor que ninguém será conside-
rado culpado - e, consequentemente, cumprir pena como
se o fosse - até o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória (Artigo 5º, inciso LVII da CR/88), em espe-
cial atenção ao princípio da presunção de inocência já
previsto pela Declaração Universal de Direitos Humanos,
em 1948133.
Ainda assim, tal entendimento não é unânime entre os
juristas brasileiros, de modo que desde a promulgação do
Código de Processo Penal, em 1941, há controvérsias so-
bre a possibilidade da execução provisória da pena priva-
tiva de liberdade.
Recentemente, foram julgadas as Ações Declaratórias
de Constitucionalidade n. 43, 44 e 54, quando o Supremo
Tribunal Federal voltou atrás acerca do entendimento pro-
ferido no HC 126.292, retornando ao paradigma de que
a prisão só pode ocorrer após esgotados todas as possi-
bilidades de interposição de recursos – ou seja, após o
trânsito em julgado.
Causando desagrado a uma quantidade significativa de
advogados, juízes, membros do Ministério Público e de-
putados, além de repercutir pressão social por uma par-
cela da sociedade civil, novos esforços estão sendo em-
pregados para alterar a legislação vigente - seja através
de Emenda à Constituição ou por alteração no Código de
Processo Penal para reafirmar o posicionamento adotado
pelo Supremo Tribunal Federal em 2016.
Nesse contexto, percebe-se que a discussão acerca da
133 Artigo 11. § 1. Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente
até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no
qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.

466
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

legalidade e legitimidade da execução provisória da pena


antes do trânsito em julgado da sentença penal condena-
tória está longe de acabar, de modo que a instabilidade e
insegurança jurídica da decisão recém-proferida são moti-
vos para continuar pautando o tema.
Não são poucos os casos de réus de ações penais que,
tendo cumprindo a execução provisória da pena após a
confirmação da condenação por Tribunal de Justiça ou por
Tribunal Regional Federal, são absolvidos, têm suas ações
penais arquivadas - ou por vezes, reiniciadas - pelos tribu-
nais superiores em razão de alguma nulidade processual
ou investigatória, o que enseja-lhes uma indenização, por
parte do Estado, por tê-lo submetido às condições - nada
agradáveis - de uma prisão para só depois ter reconhecida
sua inocência ou sua submissão a uma ilegalidade.
Em que pese a análise constitucional e penal aprofun-
dada da matéria sejam indispensáveis para a tomada de
uma decisão, entende-se que a análise econômica da via-
bilidade da prisão provisória é de suma importância para
ampliar os horizontes da discussão, visto que a eficiência
econômica das decisões atualmente é tida como um im-
portante método de abordagem do Direito contemporâ-
neo (ZANATTA, 2012).
Portanto, não se pretende por meio da presente pesqui-
sa estudar a validade dos argumentos jurídicos emprega-
dos no debate, qualquer que seja a posição adotada, mas
tão somente avaliar quais são os aspectos econômicos ao
erário com o decreto de prisão antes do trânsito em julga-
do, nos casos em que os acusados são posteriormente ab-
solvidos ou têm suas ações penais arquivadas ou extintas
pelos Tribunais Superiores.
Diante dessa situação, se pretende estimar os custos

467
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

que geram a execução antecipada da pena quando o acu-


sado vem a ser absolvido, tem sua ação penal anulada
– no todo ou em parte -, sua pena privativa de liberdade
convertida em restritiva de direitos ou tem a dosimetria
reformada colocando-o em regime mais benéfico, bem
como qual a frequência com que isso acontece, para então
avaliar se há um prejuízo significativo ao Estado a ponto
de merecer ser revista a questão a partir dessa abordagem
econômica.

2. BREVE HISTÓRICO LEGISLATIVO E JURISPRUDENCIAL


ACERCA DA PRISÃO PROVISÓRIA
Promulgado na conjuntura do Estado Novo, o Código
de Processo Penal Brasileiro (Decreto-lei 3.689, de 3 de
outubro de 1941) é reflexo dos ideais da ditadura da Era
Vargas, e por isso, partia de um pressuposto de antecipa-
ção de culpabilidade ao invés de presunção de inocência.
Contudo, em 1973, com a prisão do Delegado Fleury
por conta de investigação de seu envolvimento com trá-
fico de drogas, foi editada a Lei 5.941, que facultava aos
réus primários, com residência fixa e bons antecedentes,
a espera do julgamento em liberdade. Conhecida mais tar-
de por “Lei Fleury”, dispunha que a prisão preventiva só
deveria ser determinada em caso de fundada necessidade,
sendo essa uma das bases do princípio da presunção de
inocência. Em 1977, porém, tal legislação foi revogada,
levando em conta o temor público da impunidade de pes-
soas mais influentes.
Foi somente em com a Constituição da República de
1988 que se legitimou o princípio da presunção de ino-
cência enquanto um dos pilares do Estado Democrático
de Direito, com previsão no artigo 5º, inciso LVII - nin-

468
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

guém será considerado culpado até o trânsito em julgado


de sentença penal condenatória -, que criou uma contra-
dição com o Código de Processo Penal, que antecipava a
culpabilidade da pessoa investigada ou acusada de crime.
Para solucionar o impasse, o Supremo Tribunal Federal
editou a Súmula 9134 em 1990, que determinou que a ne-
cessidade de estar cumprindo pena em caráter provisório
para apelar não ofende a presunção de inocência - como
era de praxe -, de modo que tal modalidade de prisão foi
assumida como legítima.
Dez anos depois, o julgamento do habeas corpus n.
84.078/2009 mudou novamente o entendimento da corte
constitucional, no sentido de ser inconstitucional a exe-
cução antecipada da pena frente aos princípios de pre-
sunção de inocência (art. 5º, LVII) e dignidade da pessoa
humana (art. 1º, III) da Constituição da República.
Contudo, por sete votos a quatro, em 2016, o julgamen-
to do habeas corpus n. 126.292 alterou o escólio judicial
do STF, afirmando ser possível a execução da pena depois
de sentença condenatória confirmada em segunda instân-
cia, por tribunal colegiado.
Em 07 de novembro de 2019, as Ações Declaratórias de
Constitucionalidade n. 43, 44 e 54, julgadas conjuntamente e
que discutiam a constitucionalidade do artigo 283 do Código
de Processo Penal, na redação dada pela Lei 12.403/2011135,
foram julgadas procedentes por maioria, pelo que foi assen-
tada a constitucionalidade do mencionado dispositivo.
Contudo, tal embate está longe de encontrar uma solu-

134 Súmula n. 9/STF – “A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia consti-
tucional da presunção de inocência”.
135 Art. 283, Código de Processo Penal – “Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou
por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sen-
tença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude
de prisão temporária ou prisão preventiva.”

469
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ção definitiva. Atualmente, tramitam ao menos 25 iniciativas


de 15 partidos que tentam três estratégias distintas para re-
tomar a possibilidade de prisão em segunda instância. Cita-
se, apenas a título exemplificativo, a Proposta de Emenda
à Constituição 410/18 da Câmara de Deputados, que visa
antecipar o próprio conceito de culpabilidade para a con-
denação em segunda instância. Há também projetos de lei
que visam alterar o artigo 283 do Código de Processo Penal,
prevendo a antecipação da pena nos termos dos recentes
julgamentos. Essas iniciativas legislativas atuais, a despeito
do entendimento do Supremo com efeitos erga omnes e
vinculantes, conferem ao tema especial relevância e justifi-
cam sua análise sob um aspecto econômico.

3. A IMPRESCINDIBILIDADE DA ANÁLISE ECONÔMICA DA


DECISÃO
Em que pese a ânsia punitivista do brasileiro médio
seja, por si só, uma explicação para os consecutivos tu-
multos - tanto na comunidade jurídica quanto na socie-
dade civil - requerendo a antecipação do cumprimento
da pena, como se trata de um assunto sensível aos cofres
públicos justamente em razão do Estado ser o responsá-
vel por custodiar integralmente a estadia dos aprisionados,
acredita-se que uma análise acerca da viabilidade econô-
mica de tal fenômeno se faz imprescindível para ampliar
os horizontes de posicionamento.
O movimento da Análise Econômica do Direito, a par-
tir do pensamento interdisciplinar das grandes áreas de
Direito e Economia, tem crescido exponencialmente nos
últimos anos, visto que considerada por alguns como o
“desenvolvimento mais importante na erudição jurídica do
século XX” (COOTER e ULEN, 2016. p.2,).

470
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Levando em consideração que tal escola de pensamen-


to tem como pretensão “explicar e prever o comportamen-
to dos grupos que participam do sistema jurídico, além de
explicar a estrutura doutrinária, procedimental e institucio-
nal do sistema” (POSNER, 2011, p. 8), e que, no presente
caso, a decisão tomada pela corte constitucional tem influ-
ência direta nas consequências para o erário público, seria
desejável que seus julgadores compreendessem as con-
sequências econômicas de suas decisões e, consequente-
mente, as levassem em conta ao exercerem sua competên-
cia decisória. (COASE, 1960. p.15).
Mackay e Roussau (2015) corroboram com esse ideal ao
relembrar que ao utilizar conceitos da ciência econômica, o
legislador faz uso de uma racionalidade das normas jurídi-
cas a partir de seus efeitos previsíveis trazidos com as mu-
danças da decisão, trazendo não só ao juiz mas à doutrina
os fundamentos do direito e seus caminhos para adaptação
de novas realidades, como é o caso da superlotação dos
cárceres e alto custo de manutenção dos presídios.
Inclusive, as ferramentas albergadas pela Law and Eco-
nomics no direito penal brasileiro já vêm sendo empregadas
por magistrados, como foi o caso do julgamento do Recurso
Especial 962.934/MS, de relatoria do ministro Herman Ben-
jamin, que negou indenização por responsabilidade civil
do Estado pelas más condições do presídio (superlotação e
falta de condições mínimas) a um presidiário.136
O custo do encarceramento, portanto, deve refletir não
somente a preocupação com administração penitenciária
eficiente levando à eficácia da execução da pena (FERREI-
136 Apesar de o REsp 962.934/MS ter sido julgado colocando-se em pauta os efeitos econômicos
da possível concessão de indenização a todos os presos colocados em situações degradantes no
Brasil pelo Estado, tal entendimento foi superado em fevereiro do ano de 2017, quando o Su-
premo Tribunal Federal aprovou a tese para fim de repercussão geral de ser cabível indenizar o
presidiário pelas más condições do sistema carcerário (RExt 580252).

471
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

RA e SANTIAGO, 2018, p. 2) enquanto um custo simbólico


e moral, mas também o custo econômico da política de
encarceramento no Brasil.
Assim como na economia, embora as demandas sejam
ilimitadas, os recursos para atendê-los são finitos - logo,
considerando a escassez dos bens, perseguir o uso efi-
ciente dos recursos interessa a todos, também ao Direito
(SZTAJN, 2005).
Nesses termos, é útil desvelar as vantagens ou desvanta-
gens econômicas aos cofres públicos que a declaração da
constitucionalidade ou inconstitucionalidade do artigo 283
do Código de Processo Penal, bem como de ações e proje-
tos de lei e de emenda constitucional que buscam rever o
posicionamento, para que se observe a viabilidade prática
do cumprimento antecipado de pena privativa de liberdade.

4. ANÁLISE DE DADOS ECONÔMICOS REFERENTES À PRI-


SÃO E À PRISÃO PROVISÓRIA
Conforme exposto na introdução e desenvolvimento
da presente pesquisa, a pretensão do trabalho é analisar
dados que se mostrem consideráveis no contexto da an-
tecipação do cumprimento de pena para, somente após,
verificar sua viabilidade econômica para o erário público.
Nesse contexto, o papel da Análise Econômica do Di-
reito enquanto método epistêmico para a avaliação da
questão se mostra não apenas viável, mas necessária, vis-
to que partindo do princípio da promoção de eficiência
para a maximização do bem-estar social (POSNER, 2007),
nos fornece alguns critérios de instrumentos não utilizados
pelo direito clássico.
Dentre eles, se destaca o critério do custo-benefício en-
quanto um artifício para definir prioridades e superar pos-

472
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

síveis obstáculos à regulação desejável (SUNSTEIN, 2013),


com o objetivo de atingir resultados mais eficientes.
Através do uso desses conceitos, tomando como base o
óptimo de Pareto137, a decisão de se aprisionar ou não an-
tes do trânsito em julgado da sentença condenatória pode
ser apreciada pela ótica da AED, contabilizando quais são
os custos desse fenômeno.
Para tal análise, consideraram-se convenientes para os
fins da pesquisa o número de pessoas com condenação
confirmada em 2ª instância aguardando julgamento pe-
los tribunais superiores, a porcentagem de recursos aos
tribunais superiores que resultam em absolvição, decla-
ração de nulidades, mudança do regime de cumprimento
para o regime semiaberto ou aberto ou mesmo a conver-
são da pena privativa de liberdade em pena restritiva de
direitos, bem como o gasto mensal médio com o preso
nas unidades penitenciárias, a média do tempo de trâmi-
te de recurso nos tribunais superiores e, por fim, o va-
lor médio de indenização concedida àqueles que tiveram
decretada prisão indevida, como é o caso dos réus que
podem ter sua prisão decretada após a confirmação da
condenação por tribunal colegiado, antes do trânsito em
julgado da sentença condenatória.
Deste modo, considerados tais fatores, seria possível cal-
cular a média de gastos anuais do erário público com presos
provisórios posteriormente absolvidos ou de outra forma
isentados do cárcere pelos tribunais superiores por meio
de apuração da quantidade nominal de presos que tem sua
pena reformada e, após, pela multiplicação desse número

137 Segundo BARR (2012), Eficiência ou óptimo de Pareto é um conceito desenvolvido pelo italiano
Vilfredo Pareto, que define um estado de alocação de recursos em que é impossível realocá-los
tal que a situação de qualquer participante seja melhorada sem piorar a situação individual de
outro participante

473
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

de indivíduos pelo produto do gasto médio do preso, que


deve levar em conta a multiplicação do gasto mensal deten-
to pelo prazo de julgamento dos recursos, que são somados
– para apuração total do custo individual – ao valor médio
de indenização por ter sido indevidamente preso.
A seguir, serão esmiuçados os dados oficiais e não ofi-
ciais de cada que revelam cada um desses dados.
Número de presos com condenação confirmada em se-
gunda instância aguardando julgamento de recurso pelos
tribunais superiores (STF e STJ)
O número de ações penais - e consequentes recursos -
ao contrário dos demais tipos de ação, vem crescendo nos
últimos anos, com alta de 0,7% entre os últimos anos138.
Em 2018, o número de casos novos criminais totalizou 2,7
milhões, sendo 103,9 mil deles (3,9%) distribuídos aos Tri-
bunais Superiores139.
Como resultado, portanto, o Brasil possui uma eleva-
díssima taxa de aprisionamento - constituindo a 4ª maior
população carcerária do mundo -, levando a um total de
726.354 pessoas encarceradas140, segundo os dados mais
recentes do Infopen.141
Em razão do apresentado histórico de antecipação do
cumprimento de pena privativa de liberdade no país, o
número de presos nessa situação era de 235.241 em 2016,
correspondendo a 32,39% presos sem condenação.142
A cultura da prisão provisória é tanta que, atualmente,

138 Dados extraídos do Justiça em Números 2019, publicado pelo Conselho Nacional de Justiça.
139 Ibidem.
140 Dado extraído do relatório do Levantamento Nacional de informações penitenciárias, atualiza-
ção junho de 2017, p. 11.
141 O número total de custodiados no Brasil é calculado pela soma das pessoas privadas de liber-
dade no sistema prisional estadual, nas carceragens das delegacias, além daquelas custodiadas no
Sistema Penitenciário Federal, conforme informa o INFOPEN.
142 Dado extraído do relatório do Levantamento Nacional de informações penitenciárias, atualiza-
ção junho de 2017, p. 25.

474
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

50,03% dos estabelecimentos prisionais é destinado so-


mente ao recolhimento de presos provisórios143.
Contudo, mesmo a partir da reunião de todos os dados
estatísticos referentes a réus aguardando julgamento de re-
cursos pelos tribunais superiores, não foi possível chegar
a um resultado médio de quantos deles tiveram suas sen-
tenças condenatórias ratificadas pelos tribunais de justiça
ou tribunais regionais federais.

Condenação anulada ou diminuída pelos tribunais


superiores
Em pesquisa realizada pela Coordenadoria de Gestão
da Informação do Superior Tribunal de Justiça, sugerida
pelo ministro do STF Luís Roberto Barroso - “Pedidos da
defesa concedidos em recursos criminais no STJ” -, em
que foram analisadas decisões julgadas pelos 10 ministros
que compõem a 5ª e a 6ª Turma do STJ no período de
1º/9/2015 a 31/8/2017, dentre recursos especiais e agravos
em recursos especiais, foram concedidos os pedidos da
defesa nas seguintes porcentagens: em 0,62%, absolvi-
ção; em 1,02%, substituição da pena privativa de liberda-
de por pena restritiva de direitos; em 0,76%, prescrição;
em 6,44%, diminuição da pena; em 2,32%, diminuição da
pena de multa; em 4,57%, alteração de regime prisional.
Deve-se levar em consideração que em todos os casos
de absolvição, substituição de pena privativa de liberdade
por restritiva de direitos, prescrição e alteração do regime
prisional, o réu da ação penal não deveria ou poderia es-
tar preso, resultando em 6,97% dos recursos julgados no
Superior Tribunal de Justiça.
Ademais, ampliado o recorte temporal (agora entre ja-
143 Ibidem, p. 18.

475
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

neiro de 2009 e agosto de 2016) e de recursos (além dos


considerados na pesquisa anterior, habeas corpus e recur-
so em habeas corpus) da análise do comportamento da
seção criminal do tribunal, o resultado é que as decisões
favoráveis aos réus em recursos penais foram 15,85% do
total: 5,31% em agravos em recurso especial, 32,13% nos
habeas corpus, 17,97% nos recursos especiais e 7,12% nos
recursos em habeas corpus.
Por sua vez, no Superior Tribunal de Justiça, com base
em dados oficiais da assessoria de gestão estratégica do STF,
o ministro Roberto Barroso apontou em seu voto no HC
126.292 que, nos últimos sete anos, as decisões absolutórias
representariam 0,035% do total das 25.707 decisões de méri-
to proferidas. Isso significaria, portanto, que dentre mais de
25 mil recursos, apenas 9 deles teriam resultado em absol-
vições. Já em estudo coordenado pelo Procurador-geral da
República “As estatísticas estão ao lado da prisão antes do
trânsito em julgado”, entre 2009 e 2016, o STF julgou 3.015
recursos extraordinários em matéria penal, dos quais ape-
nas 211 foram providos, dentre os quais apenas 41 tiveram
desenlace favorável aos réus, concluindo que somente 0,6%
dos recursos providos afetou a liberdade imediata dos réus.
Contudo, como bem apontado por Breda, Streck e
Trindade (2016), a enorme quantidade de habeas corpus
substitutivos de recursos extraordinários impetrados no
STF ao longo desse período, ainda que desconsiderada
da pesquisa, pode ter substancial impacto na estatística,
se considerados seus resultados. Além disso, outro ponto
que poderia dar feição radicalmente diferente à questão, é
a apuração da quantidade de processos nos quais ocorreu
anulação, total ou parcial, do feito, com a consequente
concessão de liberdade ao apenado.

476
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Nesse sentido, o estudo Relatório Final do Projeto de


Pesquisa Panaceia universal ou remédio constitucional?
Habeas Corpus nos Tribunais Superiores (BOTTINO, 2014)
demonstra que entre 2008 e 2012, analisando o julgamen-
to de 13.888 recursos (amostra de 5%, respeitada a propor-
ção de cada classe de ação em cada tribunal), a pesquisa
chegou em dois resultados: o primeiro é que a concessão,
total ou parcial, da ordem atinge o percentual de 8,27% no
STF e de 27,86% no STJ, e segundo, que esses percentuais
podem superar 50% quando a ilegalidade decorre de de-
terminados temas, tais como “erro da fixação de regime”
e “erro na dosimetria” —, cujo impacto incide diretamente
na execução da pena e seu regime inicial de cumprimento.
Portanto, ainda que sob uma perspectiva conservadora
em relação às reformas impostas a decisões judiciais pelas
cortes superiores em razão da limitação dos dados, que
não avaliam todas as variáveis em que é possível que o
preso provisório deixe o cárcere, ainda assim os núme-
ros são importantes. Porém, devem ser aperfeiçoados, na
medida em que – como salienta um dos principais argu-
mentos citados pelos defensores do modelo da execução
antecipada da pena – o STJ e o STF não apreciam ma-
téria fática, somente de Direito. Contudo, esquece-se de
mencionar que análise de matéria de Direito – seja esta
constitucional o infraconstitucional – em grande parte das
vezes tem condão de anular – total ou parcialmente – o
processo, o que pode implicar na restituição da liberdade
ao condenado, provando que este tem meios diferentes
de uma absolvição de se ver livre do cárcere antecipado.

Custos mensais do preso


O Fundo Penitenciario Nacional (Funpen), gerido pelo

477
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Departamento Penitenciário Nacional (Depen), foi criado


pela Lei Complementar nº 799 de 1994, com a finalidade
de proporcionar recursos e meios para financiar e apoiar as
atividades e programas de modernização e aprimoramento
do Sistema Penitenciário Brasileiro, constituído de recursos
provenientes de dotações orçamentárias, custas judiciais,
arrecadação de concursos, recursos confiscados ou prove-
nientes da alienação dos bens perdidos em favor da União,
multas de sentenças penais condenatórias, dentre outros.
Com um elevado número de apenados em regime fe-
chado em conjunto com a falta de políticas carcerárias
destinadas ao aprimoramento das unidades para redução
de custos, os estados não conseguem arcar com os ele-
vados custos de seus sistemas penitenciários sem a ajuda
do Governo Federal, que disponibiliza parte dos recursos
do Funpen aos Funpes (Fundos Penitenciários Estaduais)
para gestão do financiamento de gastos e assistências tan-
to para os presos quanto para os egressos. Além disso, os
estados contam com outras modalidades de arrecadação,
como doações, parcelas descontadas da remuneração do
trabalho dos detentos e da receita dos bens produzidos
nas unidades, fianças, entre outros.
Apesar de auditoria realizada pelo Tribunal de Contas
da União em 2017 ter constatado que 59% dos 17 estados
fiscalizados não haviam calculado o custo mensal do preso
nos últimos três anos conforme os parâmetros do Conse-
lho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP),
se estabeleceu que a média de gastos mensais com cada
preso é de R$2.400,00.144
De acordo com o 10º Anuário Brasileiro de Segurança
144 É o que apontou a Ministra Carmen Lúcia no 4º Encontro do Pacto Integrador de Segurança
Pública Interestadual e da 64ª Reunião do Colégio Nacional de Secretários de Segurança Pública
(Consesp), em Goiânia (GO).

478
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Pública (BRASIL, 2016), em 2013 foram gastos 4,9 bilhões


de reais com o sistema prisional, indicando que uma pes-
soa em privação de liberdade custa, em média, R$ 3.000,00.
Ainda que se tenha uma margem de diferença entre as apu-
rações, se pode constatar que os gastos do erário com a ma-
nutenção do preso na unidade carcerária são gritantes, ainda
mais se considerando a quantidade de pessoas privadas de
liberdade nas unidades penitenciárias estaduais e federais.

Tempo de trâmite do recurso nos tribunais superiores


Indica o relatório anual de 2019 CNJ em Números (BRA-
SIL, 2019, p. 162) que o trâmite de processo criminal dura,
em média, oito meses no Superior Tribunal de Justiça.
Em estudo realizado pela Secretaria de Gestão Estraté-
gica do STF, que avaliou os andamentos de recursos extra-
ordinários, recursos extraordinários com agravo e agravos
de instrumento, foi verificado que o tempo de tramitação é,
igualmente ao outro tribunal, de aproximadamente 8 meses.

Valor da indenização por prisão indevida


No memorável voto do relator Ministro Marco Aurélio
no julgamento das ADCs 43, 44, e 54, uma verdade foi dita:
“É impossível devolver a liberdade perdida ao cidadão”.
Nesse sentido, a tese definida no Recurso Extraordiná-
rio 580.252/MS: “Considerando que é dever do Estado, im-
posto pelo sistema normativo, manter em seus presídios
os padrões mínimos de humanidade previstos no orde-
namento jurídico, é de sua responsabilidade, nos termos
do artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição, a obrigação
de ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente
causados aos detentos em decorrência da falta ou insufici-
ência das condições legais de encarceramento”.

479
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Contudo, não existe uma pesquisa estatística do valor


médio de indenização por prisão indevida nesses casos pois
existem diversos critérios a serem observados: o tempo da
prisão, as condições do cárcere, as consequências físicas e
psicológicas que o indenizado sofreu, entre outros.
Dentre as possibilidades de indenização, há notícia de
já ter sido fixada no valor de dois mil reais145 até dois mi-
lhões de reais146
O Decreto Federal nº 9.191, de 1º de novembro de 2017
estabelece “normas e as diretrizes para elaboração, redação,
alteração, consolidação e encaminhamento de propostas de
atos normativos ao Presidente da República pelos Ministros
de Estado.” (BRASIL, 2012). O texto legislativo enfatiza du-
ramente a necessidade da análise dos custos e benefícios
envolvidos com a proposição do ato normativo, requeren-
do que os Ministros de Estado estimem as despesas media-
tas e imediatas que teria a União, os Estados, os Municípios
e o Distrito Federal com a medida.
Em que pese a lei se destine apenas às propostas de atos
ao Presidente da República, já se evidencia uma maior preo-
cupação do Governo Federal acerca dos efeitos das normas
no erário público, tendência que pode se repetir para as de-
mais maneiras de proposição de atos normativos e, inclusive,
para decisões judiciais de maior extensão econômica.
No presente caso, levando em consideração que os da-
dos são, em sua maioria, controversos ou incompletos, é
evidente que não será possível chegar a uma estimativa
exata dos gastos do erário público na ocasião discutida.
O cálculo proposto não pode ser estimado em razão de
o número de condenados em segunda instância aguardan-
145 Como foi o caso do acórdão do Recurso Extraordinário n. 580252/MT.
146 Como foi o caso da sentença da 7ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias da Comarca de Belo
Horizonte do Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais nos autos n. 0024.13.184.340-1.

480
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

do julgamento de recurso pelos tribunais superiores não ser


estimado por qualquer estatística de conhecimento dos au-
tores, bem como por causa da incerteza de qual a porcen-
tagem de recursos que mudam a situação de pena dos acu-
sados, visto que cada órgão possui um resultado diferente.
Portanto, se evidencia que o desapreço com apuração
de dados estatísticos contundentes para análises como essa
resultam em um descontrole da Administração Pública com
o custo dos regimes prisionais frente ao erário público.
Mesmo assim, - sem a pretensão de fazer uma estimativa
concreta do valor anual destes gastos através da fórmula
apresentada neste capítulo - é possível apurar que o gasto
do erário público com os presos que posteriormente tem
sua situação revertida pelo STF ou STJ causa grande impac-
to nas contas públicas federais e estatais, visto que apenas o
gasto mensal individual de um preso é impactante por si só,
e mais ainda se considerada a população carcerária do país.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A protelação do cumprimento da condenação por meio
de incansáveis recursos até o esgotamento da via recursal,
a aparente impunidade de criminosos e a adoção do mo-
delo de antecipação da culpabilidade por outros Estados
são alguns dos principais argumentos de quem se declara
favorável à prisão após a ratificação da condenação em
segunda instância.
Contudo, ainda que o dilema se valha de questões judi-
ciais, morais e até mesmo sociológicas – como o medo da
impunidade -, a inclusão da escola de pensamento da Aná-
lise Econômica do Direito se mostra necessária na reflexão
acerca da adoção – ou não – desse modelo no ordenamen-
to jurídico brasileiro, sob uma perspectiva econômica que

481
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

deve levar em consideração as consequências da adoção da


execução antecipada da pena aos cofres públicos.
Afinal de contas, a partir dos dados expostos, foi possí-
vel observar que, ao contrário do que pensa a opinião pú-
blica, não é somente o valor da indenização devida àque-
les que são presos indevidamente que é custoso ao Estado
– vez que a média de indenização é R$ 2.000,00 – mas sim
o alto custo de manutenção dos presos nas penitenciárias,
que muitas vezes ultrapassa os R$2.400,00 mensais.
Ainda, cabe destacar que embora grande parte das pes-
quisas revele uma aparente baixa incidência de absolvições
pelos tribunais superiores, deve-se levar em conta que não
só a decisão absolutória é capaz de reverter a condição de
pena do acusado, mas também as hipóteses de anulação
total ou parcial da ação penal, diminuição de pena capaz de
alterar o regime prisional do réu, dentre outros, que não são
albergados por essas pesquisas, o que leva a crer – conse-
quentemente – que o índice de reversão da situação prisio-
nal pelos tribunais superiores é maior do que apresentado
pelos órgãos judiciais, apontando para uma possível inten-
ção de manipular os dados para influir na opinião pública
e/ou atender a certos interesses que não se revelam atentos
às consequências econômicas de tal modelo.
Ademais, deve-se levar em consideração que grande
parte das penitenciárias são geridas por estados, que aca-
bam por aplicar significativa parte de seus recursos na
gestão do sistema prisional. Portanto, especialmente em
debates legislativos, não se pode deixar de trazer à tona a
questão econômica sob o ponto de vista dos estados, que
são os mais afetados – financeiramente – pelo aumento
da população carcerária, a ponto de terem que recorrer a
auxílios da União para arcar com tais custos. Nesse senti-

482
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

do, embora os estados sejam representados no Poder Le-


gislativo por meio de senadores, estes devem dar especial
atenção às consequências econômicas decorrentes da an-
tecipação da execução penal também num plano regional.
Deste modo, levando em consideração o elevado custo
que se tem com o aprisionamento e a estadia dos presos
nos cárceres, aponta-se para a necessidade de uma refle-
xão econômica não só da prisão de natureza punitiva em
caráter antecipado, mas do modelo de punição aplicado
pelo Estado sob uma perspectiva de eficácia econômica,
sendo este um dever da Administração Pública (MEIREL-
LES, 2003).

483
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

6. REFERÊNCIAS
BARR, M.S.; MULLAINATHAN, S.; SHAFIR, E. Behaviorally informed
regulation. In: Shafir. (Ed.) The Behavioral Foundations of Public
Policy. Estados Unidos: Princeton University Press, p. 440-461,
2013.
BOTTINO, Thiago (org). Panaceia universal ou remédio constitu-
cional? Habeas corpus nos Tribunais Superiores. Rio de Janei-
ro: FGV Direito Rio, 2014.
BRASIL. Justiça em Números 2019. Brasília: Conselho Nacional de
Justiça, 2019.
CASTRO, Bruno R (org.). Relatório de gestão: supervisão do departa-
mento de monitoramento e fiscalização do sistema carcerário e do
sistema de execução de medidas socioeducativas – DMF. Brasília:
Conselho Nacional de Justiça, 2017.
COASE, Ronald. O problema do custo social. Trad. Francisco Kum-
mel; Renato Caovilla. The Latin American and Caribbean Journal of
Legal Studies, v.3, n.1, art. 9, 2008.
LAURIA FERREIRA, C. L.; ARARUNA SANTIAGO, N. E. O custo do
encarceramento no brasil sob a ótica da análise econômica
do direito. Revista Digital Constituição e Garantia de Direitos, v.
11, n. 1, p. 201 - 216, 16 nov. 2018.
MACKAAY, Ejan; ROUSSEAU, Stéphane. Análise Econômica do Di-
reito. São Paulo: Atlas, 2015.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. São
Paulo: Malheiros, 2003.
MELO, Márcia. Cármen Lúcia diz que preso custa 13 vezes mais do
que um estudante no Brasil. CONJUR, 2016. Disponível em: http://
www.cnj.jus.br/noticias/cnj/83819-carmen-lucia-diz-que-preso-
custa-13-vezes-mais-do-que-um-estudante-no-brasil. Acesso em:
03 dez. 2019.
MOURA, Marcos Vinícius (org). Levantamento Nacional de infor-
mações penitenciárias, atualização junho de 2017. Brasília:

484
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Ministério da Justiça e Segurança Pública, Departamento Peniten-


ciário Nacional, 2019.
POSNER, R. A. Economic Analysis of Law. 7th ed. Nova Iorque:
Aspen Publishers, 2007.
POSNER, Richard. Fronteiras da Teoria do Direito. Trad. Evandro
Ferreira e Silva, Jefferson Luiz Camargo, Paulo Salles e Pedro Sette-
Câmara. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011.
SUNSTEIN, C.R. If Misfearing is the problem, Is Cost-Benefit
Analysis the solution? In: SHAFIR (Ed.) The Behavioral Founda-
tions of Public Policy. Estados Unidos: Princeton University Press,
2013. p. 231-242.
TRINDADE, STRECK e BREDA. O lado oculto dos números da pre-
sunção de inocência. CONJUR, 2016. Disponível em: https://
www.conjur.com.br/2016-jun-13/lado-oculto-numeros-presuncao
-inocencia. Acesso em 02 dez. de 2019.
ZANATTA, Rafael Augusto Ferreira. Desmistificando a Law & Eco-
nomics: a receptividade da disciplina Direito e Economia no
Brasil. Revista dos Estudantes de Direito da UnB, Brasília, n. 10,
2012.
ZYLBERSZTAJN, Décio e SZTAJN, Rachel (org.). Direito e Economia:
análise Econômica do direito e das Organizações. Ed. Campus,
São Paulo: 2005.

485
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

O PRINCÍPIO DA MELHORIA DO ARCABOUÇO


INSTITUCIONAL NOS PROJETOS DE
REFORMA DA LEI 11.101/2005: UMA LEITURA
A PARTIR DE DOUGLASS NORTH

Ademar Nitschke Júnior147 e João Paulo Atilio Godri148

Resumo: Desde a promulgação da Lei 11.101, em 09 de


fevereiro de 2005, até o final de outubro de 2019, vinte
e sete projetos de lei pretenderam estabelecer alterações
em um ou mais dispositivos da lei falimentar. Mais recen-
temente, as proposições legislativas foram concentradas
no Projeto de Lei 6.229/2005, pela apresentação de um
substitutivo, fruto dos esforços enveredados pelas mais
variadas entidades da sociedade civil. Neste contexto, o
legislador reformista elencou cinco princípios norteadores
das alterações do texto legal, dentre os quais se destaca
o princípio da melhoria do arcabouço institucional. Se-
gundo se depreende da relatoria do projeto, tal vetor se
destina a implementar regras que tornem o procedimento
recuperacional e falimentar mais adequado à realidade so-
cioeconômica brasileira, em clara derivação dos princípios
da celeridade, eficiência e segurança jurídica elencados
quando da apresentação da Lei 11.101/2005 no Congresso
Nacional pelo Senador Ramez Tebet. Em outras palavras,
parece clara a intenção do legislador em amoldar as regras
do jogo às melhores práticas e resultados experimentados
nos últimos quatorze anos de vigência da Lei 11.101/2005.
Neste sentido, inevitável se traçar um paralelo à Nova
Economia Institucional, sob a perspectiva de Douglass

147 Mestre em Direito Empresarial e Cidadania pela UNICURITIBA


148 Mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento pela PUCPR (Direito/PUCPR)

486
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

North. Como cediço, para o referido autor, o ambiente


institucional interfere não apenas na eficácia da norma,
mas no grau de desenvolvimento da economia. As intera-
ções entre as instituições formais e informais – leis, cons-
tituições, costumes, convenções etc.– e as organizações
– empresas, partidos políticos, universidades etc. – é que
permitem a evolução das instituições e a criação de um
ambiente institucional que conduza a resultados eficien-
tes e que proporcionem estabilidade e segurança jurídica.
Parece clara, portanto, a intenção do legislador reformista
em propor mudanças no ambiente institucional que, de
fato, permitam à consecução dos objetivos estabelecidos
para a recuperação judicial ou extrajudicial (preservação
da empresa e recuperação do empresário recuperável) ou
para a falência (otimização dos ativos do falido e retirada
do mercado do empresário não recuperável). Somente a
efetiva aplicação da norma demonstrará se as alterações
nas instituições formais propostas serão suficientes para
suplantar eventuais instituições informais já consolidadas
pelos agentes e operadores da lei falimentar. Como se ex-
trai das lições de Douglass North, o tempo é a dimensão
em que o processo de aprendizagem do ser humano mol-
da à forma como as instituições evoluem, uma alteração
gradual do complexo de restrições formais e informais de
determinada sociedade. No entanto, mostra-se louvável a
preocupação do legislador reformista em configurar o ar-
cabouço institucional visando a obtenção de resultados
eficientes e que impactam diretamente no desenvolvimen-
to econômico do país.
Palavras-Chave: Reforma Legislativa. Lei 11.101/2005.
Instituições. Desenvolvimento Econômico. Nova Econo-
mia Institucional.

487
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

REFERÊNCIAS
KLEIN, Vinicius; KRASINSKI, Rafaella. Instituições e Mudança Insti-
tucional. In: RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius; DO-
MINGUES, Victor Hugo. Análise Econômica do Direito: justiça e
desenvolvimento. Curitiba, CRV, 2016.
NORTH, Douglass C. Institutions, institutional, change and econo-
mic performance. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.
NORTH, Douglass. Economic Performance Throug Time. The
American Economic Review. Vol. 84, n. 3, 1994.
NORTH, Douglass. Desempeno economico en el transcurso de
los anos. Economia: Teoria y Pratica, n. 9, 1998.
REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Câmara dos Deputados. Pro-
jeto de Lei 6.229/2005. Altera a Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro
de 2005, e a Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002, para atualizar a
legislação referente à recuperação judicial, à recuperação extraju-
dicial e à falência do empresário e da sociedade empresária.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius; DOMINGUES, Victor
Hugo. Análise Econômica do Direito: justiça e desenvolvimento.
Curitiba, CRV, 2016.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é
Análise Econômica do Direito: Uma Introdução. 2. ed. Belo Ho-
rizonte: Fórum, 2016.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; GODRI, João Paulo Atilio. Recuperação
judicial, micro e empresas de pequeno porte e a Lei Complementar
147/2014: uma análise de eficiência a partir de Douglass North. In:
GARCIA, Ricardo Lupion (Org.). 10 anos da Lei de Falências e
Recuperação Judicial de Empresas: inovações, desafios e pers-
pectivas. Porto Alegre: Editora Fi, 2016.
SZTAJN, Rachel. Law and Economics. In: ZYLBERSZTAJN, Décio; SZ-
TAJN, Rachel (Org). Direito e Economia: Análise Econômica do
Direito e das Organizações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p. 74-83.
SZTAJN, Rachel; AGUIRRE, Basília. Mudanças Institucionais. In: ZYL-
BERSZTAJN, Décio; SZTAJN, Rachel (Org). Direito e Economia:
Análise Econômica do Direito e das Organizações. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2005, p. 228-243.
TIMM, Luciano Benetti (Org.). Direito e Economia no Brasil. 2. ed.
São Paulo: Atlas, 2014.

488
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ANÁLISE ECONÔMICA DA RECUPERAÇÃO


JUDICIAL DE EMPRESAS BASEADA NAS
PREFERÊNCIAS E ESTRATÉGIAS FALIMENTARES,
DIANTE DA ECONOMIA COMPORTAMENTAL

Felipe de Poli de Siqueira149 e


Gustavo de Oliveira Pedroso150

Resumo: A Lei n. 11.101/2005, que regula a Recuperação


Judicial de Empresas não considera o comportamento ina-
dequado de alguns credores na deliberação do plano de re-
cuperação da empresa, pois alguns credores, geralmente os
mais “fortes”, podem desaprovar o plano devido suas pai-
xões, vieses e, portanto, irracionalidade. Os credores com
maior poder decisório (isto é, os mais “fortes”) preferem re-
cusar o Plano de Recuperação e seguir com a falência, sem
levar em consideração os interesses de uma coletividade
maior interessada na reabilitação da atividade produtora da
empresa. Assim sendo, torna-se necessário uma alteração
legislativa no sentido de penalizar e coibir tais atos irra-
cionais e inadequados. Diante o exposto, e com base em
uma análise econômica do direito, assim sendo, empregan-
do ferramentais teóricos e empíricos econômicos, torna-se
necessário uma alteração da Lei 11.101/05, visando melhor
análise para com a aprovação do plano de recuperação ju-
dicial em consonância com a economia comportamental,
enfrentando e discutindo quais as penalidades necessárias
que deveriam ser trazidas pela legislação já citada, no sen-
tido de coibir tais práticas, para que as decisões irracionais
tomadas por credores “mais fortes” não se tornassem preju-
149 Doutorando em Direito (PUCPR). Membro do Grupo de Estudos em Análise Econômica do
Direito da PUCPR (GRAED). Advogado.
150 Graduando em Direito pela Faculdade Estácio de Curitiba.

489
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

diciais para os credores com menor poder decisório (mais


fracos) na hora da aprovação deste plano. A classificação
metodológica usada para a resolução do problema enfren-
tado, qual seja, a parcial ineficácia da Lei 11.101/05 para
com a efetiva recuperação judicial de empresas perante os
credores que agem de forma irracional, será: Seguindo a
Linha de Pesquisa de Ciências Sociais Aplicadas; Com Fi-
nalidade Aplicada Pura; Com objetivos Exploratórios; Pelo
método de pesquisa bibliográfica; Com análise de dados
pelo método hipotético-dedutivo. Nota-se, após análises
adequadas, que a Lei 11.101/05 não é eficiente para solu-
cionar o problema em questão, visto que não traz consigo
penalidades para aqueles que agirem com irracionalidade.
Tendo isto, fica explícito, de acordo com as pesquisas aqui
demonstradas, que para o problema ser resolvido, dever-
se-ia o juízo utilizar documentos trazidos com análises téc-
nicas econômicas, para que, após a apreciação dos docu-
mentos elaborados pelos credores, de forma negativa ao
Plano de Recuperação, possa somente ser deferido, caso
demonstrada a inviabilidade de recuperação, sendo assim,
chegando-se a conclusão de que a falência seria o melhor
caminho. Veja-se que o resultado da pesquisa demonstrou
macro envolvimento, entre Credor, Devedor, e Judiciário,
pois acredita-se que com esses três polos, e também com
a aplicação das teorias abordadas, chegar-se-ia a uma so-
lução satisfatória deste problema. Ainda, nota-se que, com
a adequada análise econômica, a aplicação da norma tor-
na-se mais efetiva em relação à forma atual. Como forma
de exemplificação, foi trazido à pesquisa, julgados já nes-
te sentido, os quais esclareceram a importância da efetiva
análise econômica diante da economia comportamental, no
procedimento de recuperação judicial.

490
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Palavras-chave: Análise Econômica; Economia Com-


portamental; Recuperação Judicial de Empresas; Eficiên-
cia; Lei 11.101/2005.

REFERÊNCIAS
BAROSSI FILHO, Milton. Lei de recuperação de empresas: uma
análise econômica baseada em eficiência econômica, prefe-
rências e estratégias falimentares. EARL, Brasília, v. 2, n. 1, jan./
jun. 2011, p. 33.
COASE, Ronald H. O Problema do Custo Social. Journal of Law and
Economics. 1960.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é aná-
lise econômica do direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fó-
rum 2011. 182 p. ISBN 978-85-7700-468-3
STJ. RESP 1337989-SP. Rel. Min. Luis Felipe Salomão Jul. 08/05/2018
Data pub: 04/06/2018; Parte da ementa. Data de acesso: 03/11/2019
Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?sr-
c=1.1.2&aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGene-
rica&n um_registro=201102695785.
THALER, Richard H. Comportamento Inadequado: a construção da
economia comportamental. Lisboa: Conjuntura Actual Editora, 2016.
THALER, Richard H. NUDGE: O empurrão para a escolha certa:
Aprimore suas decisões sobre saúde, riqueza e felicidade. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2009.

491
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

SOCIEDADE LIMITADA:
ANÁLISE DAS QUOTAS PREFERENCIAIS
NA PERSPECTIVA DO QUOTISTA MINORITÁRIO

Geovane Antunes Santos Oliveira151 e


Igor Murilo de Andrade Lindner152

Resumo: O presente trabalho objetiva, por meio da me-


todologia de pesquisa bibliográfica, avaliar o instituto das
quotas preferenciais e suas consequências na perspectiva
do quotista minoritário da sociedade limitada, se utilizan-
do da Análise Econômica do Direito (“AED”), para, ao fim,
determinar a forma mais eficiente para instrumentalização
do instituto em tela. Cabe ressaltar que as quotas preferen-
ciais, na sociedade limitada, é um instituto derivado da Lei
das Sociedades Anônimas (Lei n. 6.404/76, “LSA”), o qual
garante determinadas vantagens ao seu titular, em especial,
a majoração dos direitos econômicos, como, por exemplo,
adquirir prioridade na distribuição dos lucros. Contudo,
por mais que a sociedade limitada possa reger-se de forma
supletiva à LSA, consoante ao art. 1.053, parágrafo único,
do Código Civil Brasileiro, a criação de quotas preferen-
ciais, neste tipo societário, sempre foi um paradigma, oca-
sionando dúvidas na possibilidade de sua criação e, mui-
tas vezes, vedação pelas Juntas Comerciais. Não obstante,
o Departamento Nacional de Registro Empresarial e Inte-
gração (“DREI”), em 03 de março de 2017, publicou a Ins-
trução Normativa n. 38, que dispõe quais institutos da LSA
são aplicáveis às sociedades limitadas, onde inclui-se as
quotas preferenciais, reafirmando a viabilidade de sua uti-

151 Graduando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR.


152 Graduando em Direito pelo Centro Universitário Curitiba – Unicuritiba.

492
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

lização. A normativa infralegal solucionou o descompasso


com as Juntas Comerciais, estabelecendo um entendimen-
to fixo. Porém, ainda se discute a eficácia da manutenção
do instituto na sociedade limitada, haja vista a possibilida-
de de mitigação dos poderes do quotista minoritário e so-
breposição dos poderes do quotista majoritário. Ainda, ao
que se refere a posição de subordinação do quotista mino-
ritário ao quotista majoritário, busca-se formas de estabe-
lecer uma harmonia entre os sócios, estabelecendo meios
em que um não se veja prejudicado pela ação do outro.
A exemplo, evidencia-se uma situação em que a partici-
pação societária é distribuída em 90% (noventa porcento)
ao socio “A” 10% (dez porcento) ao sócio “B” de somente
10% (dez porcento), onde, em regra, prevalecerá a von-
tade do sócio “A” nas deliberações sociais. Assim sendo,
partimos de uma perspectiva da análise da racionalidade
limitada dos indivíduos, onde cada sócio irá realizar uma
interpretação baseada nas suas próprias convicções, para
a instituição das quotas preferenciais na sociedade, sendo
necessário a realização de uma barganha entre as partes,
para que, ao fim, atinjam a eficiência de Kaldor-Hicks, es-
tabelecida pela compensação dos prejuízos pela parte que
adquirir maior vantagem na relação, garantindo o pleno
desenvolvimento da sociedade e o bem estar social. Neste
sentido, conclui-se que o instituto das quotas preferencias
recai como um nivelador de direitos, podendo minorar os
direitos de voto do majoritário em prol de uma vantagem
ínfima de direitos econômicos, ou manter seus direito de
voto, sendo utilizado este instituto apenas para equalizar
os direitos econômicos na sociedade, agindo a incentivar
a colaboração entre os sócios. Trazendo maior discussão
à deliberação de matérias que podem ditar a continuidade

493
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

da sociedade, funcionando como uma forma de controlar


o poder inquisitório de uma das partes sobre a outra, sen-
do uma medida aplicável à governança corporativa, como
uma busca de melhor alocação dos recursos decisórios e
econômicos da sociedade.
Palavras-chave: Análise Econômica do Direito, Direito
Societário, Sociedade Empresária Limitada, Quotas Prefe-
renciais Eficiência.

REFERÊNCIAS
AGUSTINHO, Eduardo Oliveira; RIBEIRO, Márcia Carla. Economia
Institucional e Nova Economia Institucional. In: RIBEIRO, Marcia
Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é análise Econô-
mica do Direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Direito & Economia. Trad. Luis
Marcos Sander e Francisco Araújo da Costa. 5. ed. Porto Alegre:
Bookman. 2010.
CORRÊA LIMA, Osmar Brina. O acionista minoritário no direito
brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1994.
ULGARELLI, Waldírio. A proteção às minorias na sociedade limita-
da. São Paulo: Pioneira, 1977. v.40.
WALD, Arnoldo. O acordo de acionistas e o poder de controle
do acionista majoritário. Revista de Direito Mercantil, Industrial,
Econômico e Financeiro, v. 110, 1998.

494
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

O INSTITUTO DA GOLDEN SHARE NA FUSÃO EM-


BRAER-BOEING SOB A PERSPECTIVA DA ANÁLI-
SE ECONÔMICA DO DIREITO

Vitória Fornerolli Wisniewski153 e Ludmilla Batista Duarte154

Resumo: A Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A (Em-


braer) é uma holding produtora de aeronaves militares
e por sua grande importância desta empresa a economia
e ao governo brasileiro, foi emitida uma ação de classe
especial visando manter os privilégios do governo rela-
cionados aos direitos patrimoniais desta holding. No ano
de 2017, a BOEING realizou um negócio com a EMBRAER
prevendo em seu memorando de entendimentos a parce-
ria de uma joint-venture a qual previa uma incorporação
dos serviços e negócios relacionados à aviação comercial
de ambas as companhias. O processo de venda que até
então estava suspenso, o governo brasileiro de 2019 deci-
diu não utilizar o poder de veto, autorizando a operação.
De acordo com a análise econômica do direito (AED) o
Direito pode comunicar-se com ciências econômicas, apli-
cando-se conceitos microeconômicos para alcançar o en-
tendimento em relação ao comportamento dos indivíduos
em face das normas jurídicas e a sua eficácia. Ao analisar
o caso, conjuntamente com ideias da Escola de Chicago,
pode-se afirmar que a ação de classe especial é malvista
pelo mercado e causa um efeito negativo neste, visto que
o direito daquele que está comprando a empresa nego-
ciada acaba por ser limitado, reduzindo ainda o potencial
do valor de mercado da companhia a ser vendida. Anali-

153 Graduanda pela PUCPR.


154 Graduanda pela PUCPR.

495
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

sando ainda este efeito no mercado, no dia 11 de janeiro


de 2019, um dia após o anúncio de que o atual governo
não iria se opor à fusão da Embraer e Boeing, por volta
das 11h00 locais (13h00 GTM), as ações ordinárias dispa-
raram 7,43%, enquanto o índice Ibovespa dos principais
valores recuava 0,28%. Analisando o contexto e a opinião
do economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, a golden
share é uma ação de muito valor pois consegue impor
certas condições aos negócios pelo poder de veto, porém
pode ser prejudicial quando usada com finalidades nacio-
nalistas. No caso utilizado pode-se afirmar que os impac-
tos negativos deste instituto na fusão seria a utilização do
veto e a venda não se realizando, pois, a Boeing poderia
desenvolver sua própria linha de aviões de pequeno forte
e competir com a Airbus, o principal concorrente e o mo-
tivo da negociação. Já o aspecto positivo seria uma forma
de manter a produção em território brasileiro e absorver
ao máximo a sua produção, pois o que a Embraer tem é
a tecnologia de produzir aviões pequenos e que é com-
prado de terceiros, sendo fácil para a Boeing utilizar este
software e levar para os Estados Unidos. Pode-se concluir
que a utilização deste instituto deve ser ponderada em re-
lação a exageros no poder do veto e o custo-benefício de
ficar atado ao Estado, levando em conta a possibilidade do
efeito negativo sobre o valor dos ativos.
Palavras-chave: Golden share. Ação com poderes espe-
ciais. Controle societário. Privatização. Direito Societário.

REFERÊNCIAS
AÇÕES da Embraer sobem 7% após luz verde para fusão com Boeing.
Correio Braziliense. 11 jan. 2019. Disponível em: <https://www.
correiobraziliense.com.br/app/noticia/economia/2019/01/11/in-

496
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ternas_economia,730288/acoes-da-embraer-sobem-7-apos-luz-ver-
de-para-fusao-com-boeing.shtml>. Acesso em: 27 out. 2019.
CAMAROTTO, Murillo. Governo quer fim de ‘golden share’. Valor
Econômico. Brasília, 06 set. 2017. Disponível em: <https://valor.
globo.com/empresas/coluna/governo-quer-fim-de-golden-share.
ghtml>. Acesso em: 27 out. 2019.
CUNHA, Joana. ‘Ação mais valiosa da Embraer é a golden share’, diz
economista. Folha de S. Paulo. São Paulo, 22 dez. 2017.
JANKAVSKI, André. Governo poderá utilizar golden share para barrar
Boeing-Embraer. Exame. 19 mar. 2019. Disponível em: <https://exa-
me.abril.com.br/blog/primeiro-lugar/governo-podera-utilizar-gol-
den-share-para-barrar-boeing-embraer/>. Acesso em: 27 out. 2019.
PELA, Juliana Krueger. As golden shares no direito societário bra-
sileiro. São Paulo: Quartier Latin, 2012.
PINHEIRO, Armando Castelar; SADDI, Jairo. Direito, Economia e
Mercados. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p. 120/121
POSNER, Richard A. A economia da justiça. Tradução de Evandro
Ferreira e Silva. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
POSNER, Richard A. Direito, pragmatismo e democracia. Tradução
de Teresa Dias Carneiro. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
POSNER, Richard. El Análisis económico del derecho. México:
Fondo de Cultura Económica, 1998.
RODRIGUES, Vasco. Análise Económica do Direito: Uma Introdu-
ção. Coimbra: Almedina, 2007.
SALAMA, Bruno Meyerhof. Direito, justiça e eficiência: a perspec-
tiva de Richard Posner. São Paulo: Fundação Getúlio Vargas.
Disponível em: <http://works.bepress.com/bruno_meyerhof_sala-
ma/30>. Acesso em: 27 out. 2019. Direito FGV.

497
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

ANÁLISE ECONÔMICA DA SUCESSÃO


EMPRESARIAL DO INCAPAZ
INDEPENDENTEMENTE DA AUTORIZAÇÃO
JUDICIAL DO ARTIGO 974 DO CÓDIGO CIVIL

Luis Guilherme Badotti Linhares155 e


Felipe de Poli de Siqueira156

Resumo: De acordo com o artigo 974 do Código Civil,


caso um dos sócios de uma sociedade empresária fique im-
possibilitado de continuar na atividade empresarial, pode
seu sucessor incapaz dar continuidade a empresa, desde
que devidamente assistido ou representado. Também será
exigido, nesse tipo de situação, a devida autorização judi-
cial para que a execução da empresa pelo incapaz ocorra,
tendo em vista a necessidade de se examinar a viabilidade
das circunstâncias, estruturas, riscos e perspectivas futuras
do comércio (conforme artigo 974, §1º, do Código Civil).
Isto é, a autorização judicial tem como propósito essen-
cial verificar se a continuidade da empresa pelo incapaz
será exequível ou se ela apresenta qualquer tipo de risco
ao sucessor, a própria empresa, aos outros sócios ou aos
colaboradores em questão. Em que pese que, essa mesma
autorização, em primeira análise, apresente um importante
papel preventivo ao sucessor e a própria empresa; ela tam-
bém compreende uma série de custos de transação. Isso
porque, o aval judicial se institui de forma extremamente
burocrática e extensa, representando uma alternativa de,
por mais que benéfica no sentido de garantir maior segu-

155 Graduando em Direito (PUCPR). Membro do Grupo de Estudos em Análise Econômica do


Direito da PUCPR (GRAED)
156 Doutorando em Direito (PUCPR). Membro do Grupo de Estudos em Análise Econômica do
Direito da PUCPR (GRAED). Advogado

498
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

rança e proteção ao incapaz, grande ineficiência. Assim,


o presente resumo objetiva analisar, por uma perspectiva
da Análise Econômica do Direito, se as externalidades de-
correntes dessa autorização judicial não inviabilizam a su-
cessão empresarial em questão; além de propor uma nova
alternativa contratual prévia entre os sócios da empresa,
como uma possível solução mais eficiente que, ao mesmo
tempo, mantém a segurança do incapaz e elimina os cus-
tos de transação decorrentes do aval judiciário.
Palavras-chave: Sucessão empresarial; Incapaz; Autoriza-
ção Judicial; Eficiência e Custos de transação.

REFERÊNCIAS
BITTENCURT, Mauricio Vaz Lobo. Princípio da Eficiência. In: RIBEI-
RO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinícius (coord). O que é Análise
Econômica do Direito. Uma introdução. Belo Horizonte: Edito-
ra Forum, 2016. P.27-36.
FRANCA, Erasmo Valladao Azevedo e Novaes; ADAMEK, Marcelo
Vieira von. O sócio incapaz (CC, art. 974, § 3º). Revista de Direito
Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, São Paulo, v.
50, n. 159/160, p. 112-126, 2011.
LOURENÇO, Shandor Portella. Revista de Direito da ADVOCEF: O
empresário e a teoria subjetiva moderna. Revista de Direito da
ADVOCEF, ano VIII, nº 16, p. 44-58, mai/13
MATIAS, J. L. N.; MENDES, D. G. A EXCLUSÃO DE SÓCIO INCAPAZ
NA SOCIEDADE LIMITADA: ANÁLISE À LUZ DO PRINCÍPIO DA
FUNÇÃO SOCIAL DA EMPRESA. Revista Jurídica da UNI7, v. 13,
n. 2, 30 dez. 2016.
NETO, Alfredo de Assis Gonçalves. Direito de empresa. Revista dos
Tribunais: 9º edição, 2019.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; GALESKI JR, Irineu. Teoria geral dos
contratos. Contratos Empresariais e Análise Econômica. 2º
edição, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

499
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

A FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO ANTES E


DEPOIS DA LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA:
A NOVA PERSPECTIVA DA LIBERDADE
CONTRATUAL E DO PRINCÍPIO DO
PACTA SUNT SERVANDA

Renata Maria Amatuzzi Köche157

Resumo: O presente resumo tem como finalidade avaliar,


por meio da Análise Econômica do Direito (AED), os im-
pactos da mudança de paradigma da função social do con-
trato. Sabe-se que, antes da vigência da nova lei, o concei-
to de liberdade contratual pregava como elemento único
e essencial à vontade das partes, que regulavam seus inte-
resses por meio de negócios jurídicos, assumindo direitos
e obrigações. Com a crescente padronização destes instru-
mentos contratuais e a limitação da autonomia de escolha
dos contratantes, o princípio do pacta sunt servanda – que
consiste na ideia de preservar as negociações assumidas
em um contrato – aos poucos foi deixado de lado, em ra-
zão das diversas decisões jurisprudenciais que buscavam
diminuir a autossuficiência dos documentos e aumentar a
igualdade dos litigantes. A Lei da Liberdade Econômica,
por sua vez, surgiu com o intuito de limitar a intervenção
do Estado-Administração e do Estado-Juiz frente à livre
iniciativa econômica e à liberdade dos contratos, através
da inserção do parágrafo único ao artigo 421 e artigo 421-
A. Neste aspecto, cumpre esclarecer primeiramente que,
embora a redação do novo parágrafo único consagre o
princípio da intervenção mínima, este na realidade nun-
ca existiu no Direito Civil, porquanto o intermédio esta-
157 Graduanda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

500
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

tal sempre foi considerado imprescindível nas relações de


natureza privada, seja pela força vinculante dos contratos,
seja pela garantia da aplicação das normas jurídicas. Sendo
assim, percebe-se que, muito antes da elaboração da Me-
dida Provisória convertida em Lei, o ideal de revisão con-
tratual sempre foi tido como excepcional, ocorrendo so-
mente quando houvesse significativas alterações no pacto
celebrado, fazendo necessária a busca do Poder Judiciário
para estabelecer o reequilíbrio entre as partes. Para tanto,
com base nesta linha de raciocínio é que os Tribunais
Superiores por muitas vezes entenderam no passado que
o princípio do pacta sunt servanda estava mitigado e, em
contratos de adesão, não possuía mais razão de existência.
Todavia, com a inserção do artigo 421-A, esta perspectiva,
a tudo indica, será revista pelos magistrados de todo o
país no que tange às demais modalidades contratuais, na
medida em que discorre sobre a possibilidade das partes
contratantes estabelecerem parâmetros para interpretação
dos requisitos de revisão e resolução do contrato, assim
como a alocação dos riscos previamente entabulados.
Palavras-chave: Função social do contrato; liberdade
contratual; mudança de paradigma; princípio do pacta
sunt servanda; revisão contratual.

REFERÊNCIAS
RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski. O valor social da livre inicia-
tiva e a função social dos contratos na MP 881. Jota. Curitiba,
15 de maio de 2019. Disponível em: < https://www.jota.info/opi-
niao-e-analise/artigos/o-valor-social-da-livre-iniciativa-e-a funcao-
social-dos-contratos-na-mp-881-15052019>. Acesso em 05/11/2019
às 17:54.
SANTOS, Eduardo Sens dos. A função social do contrato: elementos

501
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

para uma conceituação. Revista de Direito Privado. Vol. 13/2003,


pág. 99/111. Jan-Mar/2003 DTR\2003\75.
TARTUCE, Flávio. A “lei de liberdade econômica” (lei 13.874/19)
e os principais impactos para o Direito Civil. Segunda parte:
Mudanças no âmbito do Direito Contratual. Migalhas. Curitiba, 15
de outubro de 2019. Disponível em: < https://tecnoblog.net/247956/
referencia-site-abnt-artigos/>. Acesso em 05/11/19 às 17:36.
TIMM, Luciano Benetti. Função social do direito contratual no có-
digo civil brasileiro: justiça distributiva vs. eficiência econômica.
RIDB, Ano 1 (2012), n. 6, pág. 3734-3789.

502
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ANÁLISE ECONÔMICA DO SISTEMA TRIBUTÁRIO


BRASILEIRO À LUZ DA CURVA DE LAFFER

Sabrina Barbosa Paiva158

Resumo: Este trabalho busca analisar economicamente o sis-


tema tributário brasileiro, a partir da verificação da relação de
proporcionalidade existente entre sua alta carga tributária e o
crescimento dos índices de evasão fiscal, através da perspec-
tiva da Curva de Laffer. Enquanto o direito trata de conceitos
de natureza prescritiva, comunicando as pessoas como estas
devem se comportar, a economia compõe-se de juízos descri-
tivos, expondo como as pessoas tendem a proceder. Assim,
analisar economicamente o direito é apropriar-se de lições da
economia para melhor aplicar as regras e princípios jurídicos.
É transformar a economia em uma “serva” do discurso jurídi-
co que lhe complementa o sentido e a aplicação através da
análise das consequências reais de um determinado ato nor-
mativo, uma vez que nem sempre o objetivo pretendido com
sua edição é alcançado, ocorrendo, por vezes, inclusive, de
tal ato surtir efeito contrário a sua finalidade inicial. É o que
ocorre, por exemplo, no sistema tributário brasileiro. Isso por-
que, quando os entes federativos instituem novos tributos ou
majoram alíquotas excessivamente, almejando maximizar suas
receitas, muitas vezes, incidentalmente, acabam fomentado o
desenvolvimento do mercado negro e a prática da sonegação
fiscal, isso porque, para o contribuinte, evadir-se, diante de tais
condições, torna-se economicamente racional. Tal fenômeno
pode ser previsto e explicado pela Curva de Laffer, concei-
to econômico que indica que a arrecadação fiscal não cresce
proporcionalmente à carga tributária de forma indefinida, mas
158 Graduanda em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB)

503
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

apenas até certo ponto, a partir do qual, com a nova elevação


de tributos, a receita auferida passa a decair, uma vez que não
haveria mais incentivo para o indivíduo trabalhar sem sonegar.
Conclui-se, portanto, que a elevada carga tributária brasileira
pode explicar parte dos seus altos índices de evasão fiscal e
que, portanto, uma redução em tal encargo, tenderia a ele-
var a arrecadação para os cofres públicos, pois desestimularia
práticas de evasões fiscais. Para a pesquisa, utilizou-se, além
das revisões bibliográficas, consulta documental à legislação
pertinente e dados estatísticos referentes a evolução e situação
atual do sistema tributário brasileiro.
Palavras-chave: Direito. Economia. Sistema Tributário.
Curva de Laffer.

REFERÊNCIAS
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 3ª Ed.
São Paulo, 2009.
LIMA, Emanuel Marcos; REZENDE, Amaury José. Um estudo sobre a
evolução da carga tributária no Brasil: uma análise a partir da
Curva de Laffer. INTERAÇÕES, v. 20, p. 239-255-255, 2019.
RIANI, Flávio. Economia do Setor Público: uma abordagem intro-
dutória. São Paulo: Atlas, 2002.
SIQUEIRA, Rosane Bezerra de; NOGUEIRA, José Ricardo; SOUZA,
Evaldo Santana de. A incidência final dos impostos indiretos
no Brasil: efeitos da tributação de insumos. Revista Brasileira
de Economia, Rio de Janeiro, v. 55, n. 4, p. 513-44, set./dez. 2001.
Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttex-
t&pid=S0034-71402001000400004
VARSANO, Ricardo; PESSOA, Elisa de Paula; SILVA, Napoleão Luiz Costa
da; AFONSO, José Roberto Rodrigues; ARAUJO, Erika Amorim; RA-
MUNDO, Julio Cesar Maciel. Uma análise da carga tributária do Bra-
sil. Rio de Janeiro: IPEA/BNDES, 1988. Texto para Discussão n. 583.

504
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

APLICAÇÃO DA FÓRMULA DE LEARNED HAND


NA VERIFICAÇÃO DE EFICIÊNCIA ECONÔMICA
DE PRECAUÇÃO NA ESFERA TRABALHISTA

Mariana Salles Andrade159

Resumo: Buscando verificar a aptidão como instrumento


analítico e empírico da Fórmula de Hand no impacto do
valor de indenizações no montante investido em precau-
ção de acidentes laborais, por meio de método deduti-
vo, emprega-se abordagem consequencialista da AED em
pesquisa qualitativa jurisprudencial e revisão bibliográfica.
Mencionada fórmula, resultado de construção judicial que
almejava estabelecer parâmetro de precaução esperada e
eficiente, é constituída por três variáveis: a probabilidade
de ocorrência (p); a magnitude do dano resultante (d) e o
custo das precauções que reduziriam o dano esperado (C).
Se o valor empregado em precaução se revelar superior
ao valor estimado do acidente multiplicado pela proba-
bilidade de ocorrência (ou seja, C>pd)160, verifica-se uma
situação eficientemente econômica, retirando, sob a ótica
da AED, possível juízo de negligência sobre a conduta do
ofensor. Tal inferência aponta para concepção utilitarista
de maior eficiência, em que a conduta é tida por eficiente
se maximizar a soma total dos benefícios esperados em-
pregando menores custos; não importando quem arca com
ônus e quem recebe os benefícios. Depreende-se, então,
que o padrão de eficiência alocativo empregado pela AED
não se preocupa em entender a responsabilidade civil sob
159 MINICURRÍCULO
160 C = custo marginal de precaução
DE = dano esperado marginal = pd
p = probabilidade marginal de ocorrência de dano
d = dano marginal

505
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

o modelo distributivo. Mencionado critério puramente ma-


temático, que despreza parâmetros axiológicos da conduta
tida por ofensiva, é contraposto à critica formulada por
Derrida no sentido de que é o direito elemento de cál-
culo, mas que a justiça é incalculável. Embora cunhada
para examinar a responsabilidade civil em relações civis
extracontratuais, sua aplicação na área justrabalhista con-
fere novos elementos à apreciação da conduta ofensiva do
empregador quando combinada a conceitos empregados
por autores da AED (nomeadamente Cooter e Ulen) tais
como a escolha racional, incentivos econômicos e danos
eficientes. Parte-se à definição de possível entremetimento
dos valores pagos a título de indenizações acidentárias no
juízo decisório de investimento pecuniário em precaução
de acidentes. Estabelecer, por meio da fórmula abordada,
que o dever de precaução de acidentes de trabalho (valor
investido) tido como economicamente eficiente deve ser
maior que a probabilidade de ocorrer o infortúnio laboral
multiplicada pelo valor da indenização a ser paga revela
que possível minoração de valores de indenizações extra-
patrimoniais pela Lei no 13.467/17 (demonstrada por aná-
lise qualitativa jurisprudencial) incorreria em uma altera-
ção negativa do parâmetro de precaução economicamente
eficiente. Admitindo-se, sucessivamente, que a aplicação
empírica da fórmula exigiria o acesso a dados precisos e
estatísticos de probabilidade e da aferição de custos de
prevenção (não divulgados ou, geralmente, nem mesmo
conhecidos pelas empresas), conclui-se que à fórmula
deve ser atribuído valor mais analítico que operacional,
o que não lhe retira sua aptidão como importante pro-
cedimento auxiliar no processo argumentativo de casos
concretos. Destarte, infere-se que magistrados trabalhistas

506
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

encontrarão na Fórmula de Hand, combinando seu juízo a


conceitos da AED (como escolhas racionais e incentivos),
relevante ferramenta de apreciação visando à precaução
de acidentes da mão obreira.
Palavras-chave: Fórmula de Learned Hand. Precaução.
Reforma Trabalhista. Indenizações extrapatrimoniais. Res-
ponsabilidade Civil Trabalhista.

REFERÊNCIAS
ARRUDA, Kátia Magalhães. Dano Moral no Direito do Trabalho.
Tarifação e Jurisprudência do STF. In: A Centralidade do traba-
lho e os rumos da legislação trabalhista: homenagem ao ministro
João Oreste Dalazen / Kátia Magalhães Arruda, Delaíde Alves Mi-
randa Arantes, organizadoras. – São Paulo: LTr, 191-201, 2018.
BRASIL. Código Civil Brasileiro. Lei no 10.406, de 10 de janeiro
de 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
leis/2002/L10406compilada.htm> Acesso em: 03 nov. 2019.
_________. Lei n° 13.467, de 13 de julho de 2017. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Lei/
L13467.htm> Acesso em: 03 nov. 2019.
CABRAL, Flávio Garcia; REICHEL, Dafne. Breves Considerações so-
bre a Fórmula de Hand e sua Aplicação à Responsabilidade
dos Agentes Públicos. Revista da PGBC, Brasília, v. 11, n. 1, p.
37-56, jun. 2017.
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Law & economics. 6a ed, 2011.
Disponível em: https://scholarship.law.berkeley.edu/cgi/viewcon-
tent.cgi?article=1001&context=book Acesso em: 28 out. 2019.
CORREIA, Henrique; MIESSA, Elisson. Manual da Reforma Traba-
lhista: O que mudou. Judpodivm. 2a ed, 2018, 1392 p.
DERRIDA, Jacques. Força de Lei: o fundamento místico da autori-
dade. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
ESTADOS UNIDOS. United States Court of Appeals. McCarty v. Phea-

507
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

sant Run, Inc., 826 F.2d 1554, 1557 (7th Cir. 1987). Disponível em:
<https://h2o.law.harvard.edu/cases/2478>. Acesso em: 29 out. 2019.
GONÇALVES, Everton das Neves; STELZER, Joana. Eficiência e Di-
reito: pecado ou virtude; Uma incursão pela Análise Econô-
mica do Direito. Revista Jurídica – UNICURITIBA. v. 1, n. 28, p
77-122, 2012.
MENEZES, Mauro de Azevedo. Danos Extrapatrimoniais na Refor-
ma Trabalhista Brasileira de 2017. In: A Centralidade do traba-
lho e os rumos da legislação trabalhista: homenagem ao ministro
João Oreste Dalazen / Kátia Magalhães Arruda, Delaíde Alves Mi-
randa Arantes, organizadoras. – São Paulo: LTr, 271-288, 2018.
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. O dano extrapatrimonial trabalhis-
ta após a Lei n. 13.467/2017, modificada pela MP n. 808 de 14
de novembro de 2017. In: Revista do Tribunal Regional do Trabalho
da 3a Região. Belo Horizonte, edição especial, p.333-368, nov. 2017.
PORTO, Antônio José Maristello. Análise Econômica do Direito
(AED) - Texto e casos geradores. FGV Direito Rio, Rio de Janei-
ro, 2013.
PUSCHEL, Flávia Portella (coord.). A quantificação do dano moral
no Brasil: justiça, segurança e eficiência: relatório de pes-
quisa apresentado ao Ministério da Justiça/PNUD, no proje-
to “Pensando o Direito”, referência PRODOC BRA 7/004. Série
Pensando o Direito, Brasília, n. 37, p 11-76, out. 2011.
TEIXEIRA, Pedro Freitas; SINAY, Rafael; BORBA, Rodrigo Rabelo Ta-
vares. A Análise EconôMica Do Direito Na Axiologia Constitu-
cional. Revista do BNDES, p. 181-222, dez. 2014.               
WRIGHT, Richard W. The standards of care in negligence law.
Philosophical Foundations of Tort Law. Oxford: Clarendon
Press, 1995, p. 249-275.
YEUNG, Luciana Luk-Tai. Análise Econômica do Direito do Tra-
balho e da Reforma Trabalhista (Lei No 13.467/2017). Revista
Estudos Institucionais, vol. 3, 2017, p. 891-921.

508
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ANÁLISE ECONÔMICA DAS POLÍTICAS


PÚBLICAS HABITACIONAIS

Artur Fleith Couto161

Resumo: A Constituição Federal de 1988 elenca, em seu


artigo 6º, o direito à moradia como um dos direitos so-
ciais tutelados, atribuindo a todos os entes federativos a
competência de promover programas de construção de
moradias e a melhoria das condições habitacionais. Após
a crise mundial de 2008, originária curiosamente de uma
bolha imobiliária nos Estados Unidos, o mercado imobili-
ário brasileiro vivenciou um período de intensa valoriza-
ção, sendo que logo em 2009 o Governo Federal lançou
o Programa Minha Casa Minha Vida, com o objetivo de
reduzir o déficit habitacional do país. Através da premissa
de que os Imóveis, por conta de seu alto custo, tem sua
precificação muito atrelada às taxas de crédito imobiliário
e de que a grande maioria das construções e aquisições de
imóveis se dá através da liberação de crédito, permite-se
fazer uma análise econômica tanto positiva quanto nor-
mativa do direcionamento das políticas públicas do Go-
verno Federal para a questão habitacional brasileira que,
até o momento, só viu como possível solução o incentivo
à produção e aquisição através da concessão de subsí-
dios utilizando-se de verbas públicas. Permite-se fazer o
estudo através da grande quantidade de dados e índices
disponíveis que analisam desde o custo médio da cons-
trução (como o IBGE e o CUB/SINDUSCON), passando
pela divulgação da Associação Brasileira das Entidades de

161 Graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná(2016) e curso-tecnico


-profissionalizante em Técnico em Contabilidade pelo Instituto Federal do Paraná(2011).

509
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) do volume de


financiamentos liberados até os índices inflacionários e de
valores imobiliários como o IGMI-R e o FIPEZAP. Através
dos dados obtidos é possível se examinar o êxito ou não
da política pública atual na redução do déficit habitacio-
nal, bem como buscar possíveis alternativas para a formu-
lação de um plano governamental embasado.
Palavras-chave: Análise Econômica; Políticas habitacio-
nais; Programa Minha casa Minha Vida.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa
do Brasil Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
DE SOTO, Jesús Huerta. Moeda, Crédito Bancário e Ciclos Econômi-
cos. 1ª edição. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises. Brasil, 2012.
CARDOSO Henrique Ribeiro; SANJUAN Pedro Ernesto Celestino Pas-
coal. O Déficit Habitacional no Brasil: a relevância dos instru-
mentos privados na implementação de políticas públicas de mo-
radia. Revista Eletrônica dos Tribunais da 9 Região: Vol. 8, n. 78.
Brasil, 2019.
DIAS, Daniella S. O Direito à Moradia Digna e a Eficácia Dos Di-
reitos Fundamentais Sociais. Revista Eletrônica do CEAF. Porto
Alegre, 2011.

510
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

INCENTIVOS FISCAIS À INOVAÇÃO


NANOTECNOLÓGICA COMO INSTRUMENTO AO
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO SUSTENTÁVEL

Rudinei Jose Ortigara162

Resumo: O processo de inovação tecnológica é tido como


fundamental para o desenvolvimento social e econômico.
Neste processo, os agentes privados exercem papel fun-
damental. No entanto, em vista da complexidade inerente
ao desenvolvimento de novas tecnologias, nem sempre os
agentes privados estão predispostos a desenvolvê-las, em
face de riscos, sobretudo, econômicos. É o que ocorre, por
exemplo, com as nanotecnologias, tidas atualmente como
fator fundamental ao processo de inovação. No campo das
inovações tecnológicas, o Estado brasileiro verificou como
essencial seu incentivo, entendendo-o como motor para o
desenvolvimento social e econômico, a exemplo do dis-
posto na Lei 10.973/2004, atualizada pela Lei 13.243/2016,
e no estabelecimento de Política Industrial voltada à inova-
ção, a partir dos anos 2000. A presente pesquisa não busca
esgotar a política, nem mesmo todas as possibilidades de
incentivos tracejadas nos citados instrumentos normativos,
mas somente os ligados ao incentivo fiscal voltados para
o desenvolvimento nanotecnológico, tido como altamen-
te inovador por vários pesquisadores e setores da indús-
tria. Para a análise, o desenvolvimento do trabalho será
pautado pelo método descritivo, com a exposição sobre a
previsão e fundamentos contextuais dos incentivos fiscais,
bem como pelo método dialético, para a investigação das

162 Mestre e doutorando em Direito no Programa de Pós-Graduação em Direito da Pontifícia Uni-


versidade Católica do Paraná. Professor no Curso de Direito da FAE Centro Universitário.

511
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

finalidades e resultados dos incentivos fiscais. Devido a


capacidade inovativa, o desenvolvimento nanotecnológico
pode posicionar setores empresariais ou mesmo países na
vanguarda desenvolvimentista. Assim, a problemática gira
em torno da análise de se as nanotecnologias são de fato
inovadoras e capazes de promover desenvolvimento sus-
tentável, bem como, e devido à necessidade de grandes
investimentos para seu desenvolvimento, se em havendo
possibilidade de o Estado conceder incentivos fiscais para
a promoção de processos inovativos, como e sob quais
parâmetros devem ser seguidos e analisados para a con-
cessão, delimitando-se, neste sentido, o objeto da presente
pesquisa. O Brasil já vem assumindo o papel de fomen-
tador de inovações tecnológicas junto aos agentes priva-
dos, especialmente a partir da década de 2000, com a for-
mulação de políticas industriais voltada à inovação, bem
como com a instituição de instrumentos de incentivos. No
presente estudo, o objetivo é o de analisar, a partir de ele-
mentos da análise econômica do direito, se o instrumento
da concessão de incentivos fiscais a atividades de inova-
ção tecnológica, especialmente na Lei 10.973/2004, atuali-
zada pela Lei 13.243/2016, pode ser motivador e promotor
de desenvolvimento econômico sustentável, e como se
aplicaria no campo das nanotecnologias. Para isso, busca-
se dados gerais, divulgados pelo Governo Federal, sobre
inovações nanotecnológicas, e, com base nestes, discute-
se, ao final, o impacto do incentivo fiscal na incremen-
tação de resultados produtivos e na efetividade para o
desenvolvimento econômico sustentável. Conclui-se que a
inovação nanotecnológica pode ser fator essencial ao de-
senvolvimento econômico sustentável, ainda mais dentro
de mercados altamente competitivos e globalizados, po-

512
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

dendo, portanto, ser incentivada. No entanto, e ao que se


verifica dos resultados apresentados em pesquisa governa-
mentais, os incentivos fiscais não são os únicos instrumen-
tos levados em consideração na equação custo-benefício
pelos agentes econômicos quando da decisão de investir
em inovação nanotecnológica, pois o desenvolvimento
destas tecnologias é ainda baixo nos processos produtivos
das empresas nacionais.
Palavras-chave: Incentivos fiscais; inovação nanotecnoló-
gica; análise econômica do direito; desenvolvimento sus-
tentável.

REFERÊNCIAS
AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL (ABDI).
Cartilha sobre nanotecnologia. Disponível em ˂http://www.
abdi.com.br/Estudo/Cartilha%20 nanotecnologia.pdf˃. Acesso em:
10. jun. 2019.
_____. Panorama Nanotecnologia. Disponível em ˂http://www.
abdi.com.br/Estudo/Panorama%20de%20Nanotecnologia.pdf˃,
Acesso em: 10. jun. 2019.
_____. Nano, um mercado de macrooportunidades. Disponível
em &lt; https://www.abdi.com.br/ postagem/nano-um-mercado-
de-macrooportunidades&gt;. Acesso em: 15. ago. 2019.
BATISTA, A. J. S.; PEPE, V. L. E. Os desafios da nanotecnologia para
a vigilância sanitária de medicamentos. Temas Livres. Ciência da
saúde coletiva, n.º 19 (7), Jul/2014. Disponível em: &lt; https://
www.scielosp.org/article/csc/2014.v19n7/2105-2114&gt;.Acesso
em 23. set. 2019.
BORGES, José souto Maior. Teoria geral da isenção tributária. São
Paulo: Malheiros, 2011.
BRAGANÇA, Claudia Campos. Meio Ambiente e Sistema Tributá-
rio: novas perspectivas. São Paulo: SENAC, 2005.

513
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

BRASIL. Constituição (1988), Constituição da República Federativa


do Brasil de 1988.
Disponível em: &lt; http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constitui-
cao/constitui%C3%A7ao. htm&gt;. Acesso em 15. ago. 2019.
______. Lei 10.973, de 02 de dezembro de 2004: Dispõe sobre in-
centivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no am-
biente produtivo e dá outras providências. Disponível em: &lt;
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/
l10.973.htm&gt;. Acesso em: 15. ago. 2019.
______. Lei n.º 13.243, de 11 de janeiro de 2016: Dispõe sobre
estímulos ao desenvolvimento científico, à pesquisa, à capaci-
tação científica e tecnológica e à inovação (...). Disponível em:
&lt; http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/
l13243. htm&gt;. Acesso em 15. ago. 2019.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 21. ed.,
São Paulo: Saraiva, 2009.
DREXLER, E. Os nanossistemas: possibilidades e limites para o planeta
e para a sociedade. In: NEUTZLING, I.; ANDRADE, P. F. C. (org).
Uma Sociedade pós-humana: possibilidades e limites das nano-
tecnologias. São Leopoldo: UNISINOS, 2009.
DURAN, N.; MATTOSO, L. H. C.; MORAIS, P. C. Nanotecnologia:
introdução, preparação e caracterização de nanomateriais e exem-
plos de aplicação. São Paulo: Artliber, 2006.
FALKNER, R., et al. Regulating Nanotechnologies: Risk, Uncertainty
and the Global Governance Gap. Global Environmental Politics 12
(1), 2012.
FERRAZ, J. C.; PAULA, G. M.; KUPFER, D. Política Industrial. In: HA-
SENCLEVER, l.; KUPFER, D. (Orgs.). Economia Industrial – fun-
damentos teóricos e práticas no Brasil. São Paulo: Campus,
2002.
FEU, Karla S. et al. O Prêmio Nobel de química em 2016: máquinas
moleculares. Revista Quimica Nova, Vol. 40, No. 1, 113-123, 2017.

514
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

FOLADORI, G., et al. Las nanotecnologias en la crisis mundial. Revis-


ta Polis, Volume 8, n. 23, ano 2009.
FOLLONI, André. Isonomia na tributação extrafiscal. Revista de Di-
reito GV, São Paulo, v. 10, p. 201-220, Jan-Jun 2014.
FOLLONI, A.; BONAT, A. L. Incentivos Fiscais e suas Condições de
Validade: Igualdade e Proporcionalidade. Revista Cadernos do
Programa de Pós-Graduação em Direito PPGDir./UFRGS. Porto
Alegre, v. 10, n. 2, 2015, p. 341-363. Disponível em: http://seer.ufrgs.
br/index.php/ppgdir/article/view/58617. Acesso em: 01. ago. 2019.
FOLLONI, A.; SIMM, C. B. Direito tributário, complexidade e análise
econômica do direito. Revista Eletrônica do Curso de Direito
da UFSM. v. 11, n. 1, 2016, p. 49-70. Disponível em: &lt; https://pe-
riodicos.ufsm.br/revistadireito/article/view/19726/pdf&gt;. Acesso
em 01. ago. 2019.
FONSECA, Renato. Inovação Tecnológica e o Papel do Governo.
Revista Parcerias estratégicas, n. 13, dez.2001. p. 64-79.
FORNASIER, Mateus de Oliveira. Diálogo ultracíclico transordinal:
possível metodologia para a regulação do risco nanotecnoló-
gico para o ser humano e o meio ambiente. Tese (Doutorado
em Direito). São Leopoldo: Universidade do Vale do Rio dos Sinos
(Programa de Pós-Graduação em Direito), 2013.
FREEMAN, C. The economics of industrial innovation. 2. ed. Lon-
don: Frances Pinter, 1982.
FOSS HANSEN, S., et al. Nanotechnology - early lessons from ear-
ly warnings. Late lessons from early warnings: science, pre-
caution, innovation. EEA Report No. 1/2013. European Protection
Agency, 2013.
GONÇALVES, O. S.; KALIL, G. A. A. Incentivos fiscais à inovação tec-
nológica como estímulo ao desenvolvimento econômico: o caso
das Start-ups. Revista Jurídica da Presidência. Brasília, v. 17, n.
113, Out. 2015/Jan. 2016, p. 497-520.
GONÇALVES, O.; RIBEIRO, M. Incentivos Fiscais: uma perspectiva da

515
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

Análise Econômica do Direito. Economic Analysis of Law Re-


view (Universidade Católica de Brasilia), V. 4, nº 1, Jan-Jun 2013,
p. 79-102.
GONÇALVES, O. S.; VOSGERAU, D. R. A extrafiscalidade como polí-
tica pública de intervenção do Estado na Economia e desenvolvi-
mento: o ICMS ecológico e o IPI de veículos automotores. Ciên-
cias Sociais Aplicadas em Revista, v.13, n. 24, p. 207-221, 2014.
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de
1988. São Paulo: Malheiros, 2008.
HITT, M.; IRELAND, D.; HOSKISSON, R. E. Administração estratégi-
ca. São Paulo: Thomson, 2008.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE.
Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica – PINTEC 2000.
Rio de Janeiro: 2002. Disponível em: http://www.pintec.ibge.gov.
br/downloads/PUBLICACAO/Publicacao%20PINTEC%202000.p df.
Acesso em: 15. jun. 2019.
_____. Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica – PINTEC
2008. Rio de Janeiro: 2002. Disponível em: http://www.pintec.
ibge.gov.br/downloads/PUBLICACAO/Publicacao%20PINTEC%20
2008.p df. Acesso em: 15. jun. 2019.
_____. Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica – PINTEC
2011. Rio de Janeiro: 2011. Disponível em: http://www.pintec.
ibge.gov.br/downloads/pintec2011%20publicacao%20completa.
pdf. Acesso em: 15. jun. 2019.
_____. Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica – PINTEC
2014. Rio de Janeiro: 2016. Disponível em: https://biblioteca.ibge.
gov.br/visualizacao/livros/liv99007.pdf. Acesso em: 15. jun. 2019.
_____. Pesquisa de inovação. Brasília: IBGE, 2013. Disponível em:
&lt; http://www.pintec.ibge.gov.br/downloads/pintec2011%20
publicacao%20completa.pdf.&gt;. Acesso em: 15. jun. 2019. MI-
NISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA, INOVAÇÕES E COMU-
NICAÇÕES. Estratégia nacional de ciência, tecnologia e inovação

516
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

2016-2022: Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimen-


to Econômico e Social. Brasília: 2016. Disponível em: &lt; http://
www.finep.gov.br/images/a-finep/Politica/16_03_2018_Estrategia_
Nacional_de_ Ciencia_Tecnologia_e_Inovacao_2016_2022.pdf&gt;.
Acesso em: 15. ago. 2019.
_____. Nanotecnologia Aplicada ao Agronegócio. Brasília: 2018. Dis-
ponível em: &lt;5 http://www.mctic.gov.br/mctic/export/sites/ins-
titucional/backend/galeria/arquivos/2018/04/16/ Nanotecnologia-
NoAgronegocio.PDF&gt; Acesso em: 15. ago. 2019.
OLIVEIRA, J. O.; ZARELLI, R. C. A competitividade internacional e a
desoneração tributária do trabalho formal no Brasil. Revista de
Direito Econômico e Socioambiental (PUCPR), Curitiba, v.3,
n.2, jul./dez.2012, p. 355-373.
ORTIGARA, Rudinei José. Nanotecnologias e Consumidor: a efeti-
vação da proteção ao consumidor ante o risco dos produtos na-
notecnológicos. Dissertação (Mestrado). Pontifícia Universidade
Católica do Paraná: Curitiba, 2017.
PEIXOTO, Flávio José Marques. Nanotecnologia e sistemas de ino-
vação: implicações para política de inovação no Brasil. Rio de Ja-
neiro: Universidade do Rio de Janeiro, 2013 (Tese de Doutorado).
PISCOPO, M. R.; KNIESS, C. T.; TEIXEIRA, C. E.; BIANCOLINO, C. A.
O setor brasileiro de nanotecnologia: Oportunidades e desafios.
Revista de Negócios, Blumenau, v. 19, n. 4, p. 43-63, Out./Dez.2014.
PLONSKI, Guilherme Ary. Bases para um movimento pela inova-
ção tecnológica no Brasil. São Paulo em Perspectiva. v. 19, n.º
1, p. 25 – 33, 2005.
POSNER, Richard A. El analisis económico del derecho. Ciudad del
México: FCE, 2007.
RAUEN, Cristiane Vianna. O novo Marco Legal da inovação no Brasil:
o que muda na relação ICT-Empresa? Radar (Repositório do Co-
nhecimento do IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada),
n. 43, fev.2016, p. 21-35.

517
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; GALESKI, Irineu. Teoria geral dos


contratos: contratos empresariais e análise econômica. Rio de Ja-
neiro: Elsevier, 2009.
SALERNO, M. S.; DAHER, T. Política industrial, tecnológica e de
comércio exterior do governo federal (PITCE): Balanço e Pers-
pectivas. Brasília: MDIC, 2006. Disponível em: &lt; https://old.abdi.
com.br/Estudo/Balanco%20PITCE%20nov2006.pdf&gt;. Acesso
em: 15. jun. 2019.
SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação da Atividade Econômica:
princípios e fundamentos jurídicos. São Paulo: Malheiros, 2001.
SANT’ANNA, L.; ALENCAR, M.; FERREIRA, A. Patenteamento em na-
notecnologia no Brasil: desenvolvimento, potencialidades e refle-
xões para o meio ambiente e a saúde humana. Revista Química
Nova, Vol. 36, Nº. 2, 2013, p. 348-353. Disponível em: http://www.
scielo.br/pdf/qn/v36n2/v36n2a24.pdf. Acesso em: 01. ago. 2019.
SCHUMPETER, Joseph Alois. Teoria do desenvolvimento econômi-
co: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo
econômico. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1997.
_____. Capitalism, Socialism and Democracy [ebook]. Oxford:
Taylor &amp; Francis e-Library, 1942.
SCHAPIRO, Mario Gomes. Amarrando as próprias botas do desenvol-
vimento: a nova economia global e a relevância de um desenho
jurídico institucional nacionalmente adequado. Revista de Direito
GV, São Paulo, v. 13, n. 7, jan-jun. 2011, p. 341-352.
ZUCOLOTO, Graziela Ferrero. Origem de capital e acesso aos in-
centivos fiscais e financeiros à inovação no Brasil. Texto para
Discussão. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada -
IPEA, 2012.

518
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

O ACESSO SUSTENTÁVEL A ÁGUA EM


PROL DA ECONOMIA

Christina Wosch Brochonski163

Resumo: A água é um bem jurídico de importância imen-


surável, visto ser fundamental para a existência de vida e
desenvolvimento, portanto é necessária a proteção desse
recurso natural. Embora seja renovável, é finita, conse-
quentemente, possui imenso valor econômico. Nesse sen-
tido, utilizando metodologia dedutiva, sobre um viés do
Direito Ambiental e Análise Econômica do Direito será fei-
ta uma apresentação de obras de recuperação dos recursos
hídricos em Nova York e na Coréia do Sul, que buscaram
garantir o acesso à água potável a diferentes populações.
Em NY, em decorrência do crescimento exacerbado, uma
crise de abastecimento hídrico assombrava a metrópole
na década de 90. A alternativa mais óbvia para solucionar
a escassez do recurso natural era investir na construção
de novos reservatórios e estações de tratamento da água,
uma vez que ela chegava poluída e afetada por químicos
oriundos dos produtores com terras ao redor das bacias
que abasteciam a cidade. Entretanto, a medida escolhida
foi investir no conserto de vazamentos, troca de sistemas
de abastecimento interno residenciais mais econômicos,
e aplicou políticas de sensibilização da população sobre
a importância de não desperdiçar, fazendo projetos nos
bairros e escolas locais. A fim de evitar a poluição e con-
taminação dos reservatórios por químicos, o governo no-
va-iorquino passou a financiar e investir em programas
de boas-práticas agrícolas nas zonas de influência dos
163 Acadêmica do curso de direito na Pontifícia Universidade Católica do Paraná

519
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

mananciais que abasteciam a metrópole. Estima-se que a


economia feita com o projeto, foi tão grande, tendo sido
gasto apenas um décimo do esperado em relação ao pre-
visto em obras para a construção de novos reservatórios e
unidades de tratamento de água – comparação de cerca de
U$ 500 milhões ao invés de U$ 5 bilhões, o que significa
muito em termos de eficiência econômica. Já a Coréia, a
fim de revitalizar o rio Arroio e o rio Han, seus principais
abastecedores de água potável, que no final do século XX
encontravam-se extremamente poluídos, em 2002, fez um
projeto que despoluiu, revitalizou, recuperou o Arroio em
um complexo de laser. Ao longo das margens foi projeta-
do um grande parque linear, entre 3 a 5 metros abaixo do
nível da rua, com espaços de lazer, rede de esgotamento
sanitário, sistema de drenagem de águas pluviais, constru-
ção de pontes de conexão, o plantio de espécies nativas e
outras estruturas visando a conexão dos cidadãos com o
rio, pensado também na solução das enchentes e projeção
de novas linhas de transporte público. A obra coreana,
não apenas amenizou o problema de escassez do recurso
natural, como também agiu em prol da eficiência econô-
mica do uso de seus principais rios. Nova York atualmen-
te, não precisa investir num complexo tratamento de água,
e a Coréia do Sul, solucionou diferentes problemas urba-
nos, e ainda conectou os cidadãos aos rios locais que os
abastecem. Verifica-se na prática, que obras que garantem
o acesso a todos de forma sustentável, tem consequências
significativas na economia, lidando diretamente com as
eventuais externalidades, e com a chamada “tragédia dos
comuns”, de forma que apresentaram de forma eficaz, so-
luções para o acesso aos recursos hídricos. Se as medidas
tomadas, forem pensadas a longo prazo, o acesso univer-

520
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

sal aos recursos fundamentais, terá consequên­cias bené-


ficas a economia, bem como garantirá a sustentabilidade,
em conformidade com ideais econômicos e a busca de um
meio ambiente ecologicamente equilibrado atualmente e
para as futuras gerações.
Palavras-chave: Recursos hídricos, sustentabilidade, eco-
nomia, alternativas eficientes, moderação.

REFERÊNCIAS
MIGUEL, Sylvia. Nova York, a metrópole com a água mais pura do
planeta. Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São
Paulo. 03. Nov. 2016. Disponível em: <http://www.iea.usp.br/noti-
cias/nova-york-a-metropole-com-a-agua-mais-pura-do-planeta-1>.
Acesso: 13. Mai. 2019.
Nova York venceu crise de água sem gastar muito dinheiro. G1. Jornal
Nacional. 12 de Fev. de 2015. Disponível em: <http://g1.globo.
com/jornal-nacional/noticia/2015/02/nova-york-venceu-crise-de
-agua-sem-gastar-muito-dinheiro.html>. Acesso em: 09 de out. de
2019.
NEW YORK CITY 2001 DRINKING WATER SUPPLY AND QUALITY
REPORT. New York City Department of Environmental Protection.
2001. Disponível em: <http://www.nyc.gov/html/dep/pdf/wssta-
t01a.pdf>. Acesso em: 09 de out. de 2019.
SOUZA, Mateus M. O sistema de abastecimento de água de NY -
a metrópole que não tem estação de abastecimento de água.
AquaFluxus - Consultoria Ambiental em Recursos Hídricos. 28.
Nov. 2016. Disponível em: <https://www.aquafluxus.com.br/o-
sistema-de-abastecimento-de-agua-de-ny-metropole-que-nao-
tem-estacao-de-tratamento-de-agua/?lang=en> Acesso: 06. Out.
2019.
CAVALCANTI, José Eduardo. O Plano B do exemplar sistema de abaste-
cimento de água da cidade de Nova York. Instituto de Engenharia.

521
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

04 de Ago. de 2014. Disponível em: <https://www.institutodeen-


genharia.org.br/site/2014/08/04/o-plano-b-do-exemplar-sistema-
de-abastecimento-de-agua-da-cidade-de-nova-york/>. Acesso em:
09 de out. De 2019.
Nova York venceu crise de água sem gastar muito dinheiro. G1. Jornal
Nacional. 12 de Fev. de 2015. Disponível em: <http://g1.globo.com/
jornal-nacional/noticia/2015/02/nova-york-venceu-crise-de-agua-
sem-gastar-muito-dinheiro.html>. Acesso em: 09 de out. de 2019.
Cheonggyecheon Museum (청계천박물관). Visit Korea. Korea Tou-
rism Organization. Disponível em: <http://english.visitkorea.or.kr/
enu/ATR/SI_EN_3_1_1_1.jsp?cid=268210>. Acesso em 06 out. 2019.
MAYER, Nathalie. THE CHEONGGYECHEON RIVER RESTORATION
PROJECT, SEOUL, SOUTH KOREA. The Susteinability Writer. 04.
Jul. 2012. Disponível em: <https://sustainabilitywriter.wordpress.
com/2012/07/04/the-cheonggyecheon-river-restoration-project-
seoul-south-korea/>. Acesso em: 11 out. 2019.
Seoul Metropolitan Government. CheongGyeCheon Restoration Pro-
ject. Seul: Governo da Cidade Especial de Seul, 2006. p. 24.

522
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ANÁLISE ECONÔMICA DA LEI DO AUDIOVISUAL


E DO FUNDO SETORIAL DO AUDIOVISUAL NO
ESTADO DA PARAÍBA

Pablo Ruan Siqueira Lopes164

Resumo: O acesso integral à cultura é um direito humano


disposto na Declaração dos Direitos Humanos da ONU
em 1948, bem como garantido pela Constituição Federal
da República Federativa do Brasil. Todavia, a democratiza-
ção do suporte necessário para o desenvolvimento desta
arte imprescindível à economia de uma região ainda en-
frenta dificuldades em ser efetivada em nosso país. Deste
modo, o presente trabalho possui como objetivo realizar
uma análise do impacto econômico da Lei do Audiovisual
e do Fundo Setorial do Audiovisual no estado da Paraíba,
através da Análise Econômica do Direito (AED). O presen-
te estudo possui um método quantitativo. Quanto aos pro-
cedimentos técnicos, classifica-se através do levantamento
bibliográfico, ancorado na interpretação hermenêutica da
norma, entendendo a intenção original do legislador; além
da análise dos editais do FSA no referido estado e do levan-
tamento de dados econômicos acerca de seu uso e do uso
da Lei do Audiovisual, de forma empírica e montando uma
base de dados, aliado a um modelo econométrico com
variável explicativa. A pesquisa é focada nas produções
audiovisuais independentes, isto é, aquelas que não são
produzidas pelos grandes estúdios. Analisa-se então quais
foram os principais impactos, nos últimos cinco anos, na
economia da Paraíba com a aplicação das referidas nor-
mas. Aliado a tais dispositivos, é realizada uma pesquisa
164 Acadêmico de Direito da Universidade Estadual da Paraíba.

523
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

com a percepção prévia de universitários do Centro de Ci-


ências Jurídicas da Universidade Estadual da Paraíba, loca-
lizado no Campus de Campina Grande, a respeito de seus
entendimentos sobre os dispositivos supracitados, com o
intuito de evidenciar se seus conceitos prévios acerca da
influência dos dispositivos legais na economia do esta-
do coincidem com a realidade. O que se percebe é uma
relativa correspondência entre os entendimentos prévios
dos estudantes e o que ocorre de fato, concluindo que há
um impacto positivo não apenas através do retorno dos
tributos arrecadados, mas através também do aumento no
número da geração de empregos.
Palavras-chave: Análise Econômica do Direito, cinema
independente, Fundo Setorial do Audiovisual, lei do au-
diovisual, Paraíba.

REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, Marcos Cintra Cavalcanti de. Microeconomia. São
Paulo: McGraw Hill, 1986.
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Considerações sobre as relações
do estado e do direito na economia. In: Revista Brasileira de
Direito Público (RBDP), 14, nº 55, out./dez. Belo Horizonte: Fó-
rum, 2016.
ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS EM PARIS. Declaração
universal dos Direitos Humanos. 10 de dezembro de 1948. Dis-
ponível em: <https://nacoesunidas.org/direitoshumanos/declara-
cao/>. Acesso em: 01 de novembro de 2019.
AVELLAR, A. P.; MICHEL, R. C. A indústria da sétima arte no Bra-
sil: uma análise da lei do audiovisual. Disponível em: <http://
www.ie.ufu.br/sites/ie.ufu.br/files/Anexos/Bookpage/Anexos_Ar-
tigos_2010_Michel1.pdf>. Acesso em: 01 de novembro de 2019.
BARBIERI, Fábio; OLIVEIRA, Roberto Guena de; VASCONCELLOS,

524
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

Marco Antonio s. de. Manual de microeconomia. 3 ed. São Paulo:


Gen Atlas, 2011.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em:
01 de novembro de 2019.
BRASIL. Lei nº 11.437, de 28 de dezembro de 2006. Altera a des-
tinação de receitas decorrentes da Contribuição para o Desen-
volvimento da Indústria Cinematográfica Nacional -CONDECINE,
criada pela Medida Provisória nº 2.228-1, de 6 de setembro de
2001, visando ao financiamento de programas e projetos voltados
para o desenvolvimento das atividades audiovisuais; altera a Me-
dida Provisória nº 2.228-1, de 6 de setembro de 2001, e a Lei nº
8.685, de 20 de julho de 1993, prorrogando e instituindo mecanis-
mos de fomento à atividade audiovisual; e dá outras providências.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-
2006/2006/Lei/L11437.htm>. Acesso em : 01 nov 2019.
BRASIL. Lei nº 8.685, de 20 de julho de 1993. Cria mecanismos de
fomento à atividade audiovisual e dá outras providências. Disponí-
vel em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8685compi-
lado.htm>. Acesso em: 01 nov 2019.
CARVALHO, Cristiano. Teoria do sistema jurídico - direito, econo-
mia, tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
CLASEN, Luisa. 1 vídeo (28 min). Tudo sobre leis de incentivo e
fundo setorial do audiovisual. Publicado pelo canal Lully de
Verdade, 2016. Disponível em: <https://www.youtube.com/wat-
ch?v=ynzxrYgwTC4>. Acesso em: 01 nov 2019.
DALENOGARE NETO, W. 1 vídeo (18 min). A importância da AN-
CINE para o cinema brasileiro (parte II): FSA, incentivos e o
exterior. Publicado pelo canal Dalenogare Críticas, 2019. Dispo-
nível em: <https://www.youtube.com/watch?v=0UHWsfaFuBw>.
Acesso em: 01 nov 2019.

525
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

GADELHA, Sérgio Ricardo de Brito; GÓES, Geraldo Sandoval. Macro-


economia. 2. ed. Salvador: JusPODIVM, 2019.
RIBEIRO, Marcia Carla Pereira; KLEIN, Vinicius (coords.). O que é
análise econômica do direito: uma introdução. 2 ed. Revista e
Ampliada. Belo Horizonte: Fórum, 2016. Volumes 1 e 2.
TAVARES, T. S. O Brasil de todas as telas e seu financiamento
pelo fundo setorial do audiovisual. Disponível em: <http://
www.periodicoseletronicos.ufma.br/index.php/cambiassu/article/
view/4180>. Acesso em: 01 de novembro de 2019.
TIMM, Luciano Benetti (org.). Direito e economia. 2. ed. Porto Ale-
gre: Livraria do Advogado, 2008.

526
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO PENAL


E AS SANÇÕES PENAIS: É POSSÍVEL UM PONTO
ÓTIMO NA REPRIMENDA PENAL?

Samuel Ebel Braga Ramos165 e


Thômas Henrique de Souza Carvalho166

Resumo: O presente resumo tem o objetivo apresentar


um contorno inicial sobre análise econômica do direito
penal, com a aproximação do direito e da economia. Des-
te modo, e através de um olhar a partir das teorias econô-
micas, propor uma abordagem sobre uma possível pena
ótima, minimizando o custo marginal da aplicação da pe-
nalidade e elevando a eficácia da pena, em combate a la-
tente criminalidade. Os juristas e economistas partilham de
um senso comum: a lei é um mecanismo para orientação
do comportamento social e os incentivos e recompensas
(pay-offs, em uma linguagem da teoria econômica) são
centro da análise primária em qualquer caso a ser analisa-
do. A abordagem econômica do crime baseia-se no pres-
suposto de que os criminosos, as vítimas e os responsáveis
pela lei são racionais e tomam decisões racionais. A deci-
são de se envolver na prática de um crime é vista como
não diferente em termos de escolha de um emprego lícito.
Um indivíduo participa de atividades criminosas porque
oferece um fluxo de benefícios maior que o uso legítimo
de seu tempo e esforço. Se pensarmos que criminosos po-
dem ser dissuadidos pelas penas e consequências jurídicas
previstas pela lei, a sociedade – através de seus legisla-
dores - deve decidir o tipo e o tamanho das penalidades

165 Professor de Direito Penal da FESP – Curitiba/PR.


166 Acadêmico do Curso de Direito da FESP – Curitiba/PR.

527
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

pelos crimes. Tais questões serão determinadas pela medi-


da em que diferentes tipos de consequência jurídica pela
prática de crime (multas, prisões, serviços comunitários,
medidas de segurança, etc.) dissuadir o crime, em compa-
ração com os respectivos custos de cada sanção. Partindo
desta premissa, os custos da aplicação de consequências
jurídicas pela prática de injustos penais (penas ou medi-
das de segurança), se mostram como o ponto central da
aproximação entre Direito Penal e Economia. Desta forma,
como pensar em uma resposta penal ótima, a qual se equi-
libram seus custos com a eficácia de sua aplicação? Para
a resposta do problema apresentado, o resumo utiliza do
método dedutivo e da pesquisa bibliográfica. O tema tem
seu recorte nos tópicos que apresentam um olhar inicial
sobre a Análise Econômica do Direito, da aproximação
entre o Direito Penal e a Economia para, ao final, pensar
na possibilidade de uma pena criminal ótima. O objeti-
vo aqui buscado é, portanto, apresentar fundamentos da
teoria econômica para se pensar em uma possível pena
ótima, constituindo bases para o equilíbrio dos custos da
aplicação da pena e a dissuasão do agente criminoso na
prática do ilícito penal. É fato que o Direito Penal possui
papel de destaque na sociedade moderna, a qual busca a
plena efetivação da justiça como forma de promoção da
segurança de seus cidadãos, em atenção à visibilidade que
as decisões emanadas da jurisdição criminal têm na atuali-
dade. Neste prisma, busca-se levantar a hipótese de como
maximizar a efetividade e eficácia da pena, em atenção
ao baixo orçamento disposto pelo Estado. Em resposta ao
problema apresentado, evidencia-se que uma pena ótima
se apresenta como possível, quando da redução dos cus-
tos para o Estado e no aumento da dissuasão do indivíduo

528
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: RESULTADO DE PESQUISA DO GRAED

na atividade criminosa, através da certeza da punição. A


Análise Econômica do Direito Penal é a ferramenta pro-
pulsora para o estudo, se demonstrando eficiente para a
presente investigação
Palavras-chave: Direito Penal. Análise Econômica do
Direito. Sanção Penal.

REFERÊNCIAS
BECKER, Gary S. Crime and punishment: an economic approach.
In: BECKER, Gary S.; LANDES, William M. Essays in the economic
of crime and punishment. 1974.
BOWLES, Roger A.; FAURE, Michael G.; GAROUPA, Nuno M. The
Scope of Criminal Law and Criminal Sanctions: An Economic
View and Policy Implications. Journal of Law and Society, Vol.
35, Issue 3, pp. 389-416, September 2008
BUSATO, Paulo César. Fundamentos para um direito penal demo-
crático. São Paulo: Atlas, 2013.
____________________. Direito penal: parte geral. São Paulo: Atlas,
2017.
BRASIL. Ministério da Justiça. Responsabilidade Penal da Pessoa
Jurídica. Série “Pensando o Direito. nº 18/2009. Disponível em:
http://www.justica.gov.br/seus-direitos/elaboracao-legislativa/
pensando-o-direito/publicacoes/anexos/18pensando_direito_rela-
torio.pdf, p. 13. Acesso em 16/12/2017.
CHIASSONI, Pierluigi. El análisis económico del derecho. Lima:
Palestra Editores, 2013.
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Direito & Economia. Porto Alegre:
Booksman, 2010.
DOMINGUES, Victor Hugo. Ótimo de Pareto. In RIBEIRO, Marcia Car-
la Pereira; KLEIN, Vinicius (Coord.). O que é análise econômica
do direito: uma introdução. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p. 39-47
FISCHER, Talia. Economic Analysis of Criminal Law. Oxford Uni-

529
PROF. DR. OKSANDRO GONÇALVES,
MIRIAM OLIVIA KNOPIK FERRAZ, BRUNA ZILLIOTTO, RICARDO BAZZANEZZE,
FELIPE DE POLI DE SIQUEIRA, LARISSA MILKIEWICZ. ARIÊ SCHERREIER FERNEDA

versity Handbook of Criminal Law. Oxford University Press, 2014.


GONÇALVES, Jéssica; CARDOSO, Luiz Eduardo Dias. Análise Econômica
do Crime: Abordagem acerca da aplicação do princípio da efici-
ência econômico social em matéria penal. Revista de Criminologias
e Políticas Criminais. Curitiba, Jul/Dez. 2016. v. 2, n. 2. p. 77 - 98.
HYLTON, Keith N., The Theory of Penalties and the Economics
of Criminal Law Boston Univ. School of Law. Working Paper nº.
02-17, January 2005.
JIMÉNEZ, Javier W. Ibañez. Análisis económico del Derecho: método,
investigación y prática jurídica. Barcelona: Editor Bosch, 2011
JUNIOR, Ivo Gico T. Metodologia e Epistemiologia da Análise Eco-
nômica do Direito. In: Economic Analysis of Law Review. V. 1, nº
1, p. 7-33, jan-jun, 2010
KLEVORICK, Alvin K., “Legal Theory and The Economic Analysis of
Torts and Crimes”. Faculty Scholarship Series. Paper 1462, 1985.
MACAAY, Ejan; ROUSSEAU, Stéphanie. Analise econômica do direi-
to. Tradução Raquel Sztajn. São Paulo: Atlas, 2015.
POSNER, Richard. An Economic Theory of Criminal Law. 85 Co-
lumbia Law Review, 1985. p. 1193-1231.
PYLE, David J. Cortando os custos do Crime: A Economia do Cri-
me e da Justiça Criminal. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 2000.
SALAMA, Bruno Meyerhof. Estudos em direito & economia: micro,
macro e desenvolvimento. 1. ed. – Curitiba: Editora Virtual Gra-
tuita - EVG, 2017.
SUNSTEIN, Cass R.; JOLLS, Christine; THALER, Richard H. A Behavio-
ral Approach to Law and Economics, 50 Stanford Law Review
1471,1998.
ULEN, Thomas S. The Economics of Corporate Criminal Liability.
In: Managerial and Decision Economics, Vol. 17, No. 4, Special
Issue: Corporate Crime, pp. 351-362, 1996.
VELJANOVSKI, Cento. The Economics of Law. The Institute of Eco-
nomic Affairs, London, 2006.

530

Você também pode gostar