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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO PUC MINAS

Belo Horizonte
2020
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341.118 Anais do Congresso Internacional: preservar e fortalecer a democracia


A532 em tempos de pandemia / [organizado por] Marciano Seabra de Godoi
2020 [et al...]. - Belo Horizonte: Conhecimento Editora, 2020.
726p. ; 24cm (Programa de Pós-graduação em Direito da PUC Minas-
PPGD PUC Minas)

Vários autores.
ISBN: 978-65-86529-96-8

1. Direito- Anais de congresso. 2. Direito internacional. 3. Democracia.


4. Pandemia da Covid-19. 5. Saúde na pandemia. 6. Direito do trabalho-
Pandemia. I. Godoi, Marciano Seabra de (Org.). II. Teodoro, Maria Cecília
Máximo (Org.). III. Magalhães, José Luiz Quadros de (Org.). IV. Souza,
Dimas Antônio de (Org.). V. Título.

CDDir – 341.118
CDD(23.ed.)–342

Elaborada por Fátima Falci – CRB/6-700


APRESENTAÇÃO .................................................................................... 9

E ISONOMIA, EPIDEMIA E DEMOCRACIA


.......................................................................... 14

THE PANDEMIC AND THE MINORITIES


................................................................................. 25

(DES)GLOBALIZACIONES, PODER CONSTITUYENTE POPULAR Y ALTERIDAD


RADICAL. ENTRE RECONOCIMIENTO Y DESPRECIO
................................................................................. 33

A SAÚDE DA PESSOA IDOSA NO CONTEXTO DE PANDEMIA


........... 90

O PANÓPTICO PÓS MODERNO NO TRABALHO


....................... 102

PERSPECTIVAS PARA CONJUNTURA DE CRISE ORGÂNICA DO CAPITAL


NACIONAL E INTERNACIONAL: O QUE FAZER?
....................................................... 120

O NOVO FUNDEB E A EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 108/2020

................................................................ 134

A CONSTITUIÇÃO DE 1946 A PARTIR DO GOLPE CIVIL-MILITAR E DO AI-1:


entre Normalidade e Anormalidade Legal
................................................................................ 154
A COOPERAÇÃO INTERNACIONAL COMO INSTRUMENTO NECESSÁRIO
PARA O MEIO AMBIENTE SUSTENTÁVEL
.................... 172

A GARANTIA FUNDAMENTAL DE APRESENTAÇÃO DO PRESO AO JUIZ


COMPETENTE E A IMPOSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO DAS AUDIÊNCIAS DE
CUSTÓDIA EM TEMPOS DE PANDEMIA
...................... 188

A INFLUÊNCIA DO DIREITO PENAL DO INIMIGO NO SISTEMA PENAL


NACIONAL
.................................................................... 207

A PARTICIPAÇÃO DE ATORES NÃO ESTATAIS NO MECANISMO DA REVISÃO


PERIÓDICA UNIVERSAL: uma Análise das Revisões sobre o Brasil
................................................... 225

A REDUÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO DURANTE A PANDEMIA COMO


ATAQUE A DEMOCRACIA
.............................. 247

AGEÍSMO E SELEÇÃO DE PACIENTES DURANTE A PANDEMIA


.......................................................... 265

AS ELEIÇÕES COMO INSTRUMENTO DA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA EM


TEMPOS DE CRISE
... 282

AUDIÊNCIAS PÚBLICAS COMO INSTRUMENTO DE DEBATE DEMOCRÁTICO


NAS DEMANDAS ENVOLVENDO POLÍTICAS PÚBLICAS
... 304

AUTONOMIA PRIVADA NA VELHICE E A INFANTILIZAÇÃO DO IDOSO NO


CONTEXTO DO NOVO CORONAVÍRUS (COVID-19)
.................................. 325

CIDADES VAZIAS E AS LIMITAÇÕES DA CIDADANIA NA PANDEMIA: uma


Perspectiva Aristotélica
................ 343
COMINAÇÃO ELÁSTICA DAS PENAS: Violações Constitucionais, Direito Penal
do Autor e Parâmetros
..................................................................... 357

COMO AS DEMOCRACIAS MORREM: uma Análise do Atual Contexto


Brasileiro
.............................. 379

DA INCONSTITUCIONALIDADE DA REDUÇÃO DE SALÁRIOS POR ACORDO


INDIVIDUAL DURANTE A PANDEMIA E O PROTAGONISMO DO PRECARIADO
NA LUTA CONTRA O DESMANTELAMENTO DO DIREITO DO TRABALHO

........................................................................................... 394

DEMOCRACIA E LEGALIDADE: Criminalização da Homotransfobia à luz do


Garantismo Penal de Ferrajoli
............................................. 417

DISTANCIAMENTO ENTRE ESCOLHER, PRIORIZAR E IMPOR: os Custos dos


Direitos na Perspectiva das Despesas Públicas
............................. 433

ESCOLHAS NO FIM DA VIDA: uma Reflexão sobre o Direito de Morrer na


Velhice e o Contexto Pandêmico
................................ 455

INDÍGENAS E QUILOMBOLAS: a Luta pela Garantia de Direitos durante


a Pandemia da Covid-19, as Omissões do Governo Brasileiro e as
Consequências Internacionais
........................ 472

E DIREITO DO TRABALHO
..................... 497
MÍNIMO EXISTENCIAL, MÍNIMO ISENTO E COMPARAÇÃO BRASIL-ESTADOS
UNIDOS QUANTO ÀS DEDUÇÕES PESSOAIS NA LEGISLAÇÃO DO IMPOSTO
SOBRE A RENDA DA PESSOA FÍSICA
................................. 516

NECROPOLÍTICA E A (RE)LEITURA DA CRÔNICA , DE CLARICE


LISPECTOR
......................... 538

O COMÉRCIO INTERNACIONAL COMO PROMOTOR DA PAZ: as Restrições às


Exportações e o Risco à Estabilidade Democrática
......... 560

O IDEÁRIO DE DEMOCRACIA PELO DIREITO PENAL


.............................................................. 580

O IMPASSE NEOLIBERAL NA CONSOLIDAÇÃO DAS DIRETIVAS


CONSTITUCIONAIS
....................................................... 590

O MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E A AÇÃO SIGILOSA “ANTI-ANTIFASCISTAS”:


Notas sobre a Decisão da Medida Cautelar Proferida na Arguição
de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 722 do Supremo
Tribunal Federal
.............................................................. 611

O COMO INSTRUMENTO DE MITIGAÇÃO À CORRUPÇÃO


ENDÊMICA
......................................................................... 637

PANDEMIA DA COVID-19 E DIREITO FUNDAMENTAL À PRIVACIDADE NO


ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO: (In)constitucionalidade das Mitigações
ao Direito à Privacidade em Tempos de Crise Sanitária à luz da Medida
Provisória n.º 954/20 e ADI n.º 6.387/DF
......................................... 652
REFLEXÕES SOBRE O CONTRATO SOCIAL, DEMOCRACIA E CIDADANIA
FISCAL NO SÉCULO XXI
.................................... 675

ROMPIMENTO DO PACTO CONSTITUCIONAL: de Adversários a Inimigos


............. 694

COMISSÃO AVALIADORA DOS ARTIGOS SUBMETIDOS........................... 720

PROGRAMAÇÃO E PALESTRANTES DO CONGRESSO ............................. 722


O Congresso Internacional “Preservar e Fortalecer a Democracia em
Tempos de Pandemia” surgiu da iniciativa das mestrandas Gabriella Véo
Lopes da Silva e Bárbara dos Santos Choucair por ocasião das aulas da disci-
plina “Democracia, Liberdade e Cidadania”, ministrada pelo Prof. Dr. Marciano
Seabra de Godoi no primeiro semestre de 2020, em que se abordou o fenô-
meno do crescente autoritarismo no mundo e a necessidade de reafirmar a
democracia como espaço de convivência e diálogo.
A temática despertou em todos o desejo de expandir esses debates
para além da sala de aula, estreitando os laços entre discentes e docentes
do Programa de Pós-Graduação em Direito da PUC Minas (PPGD PUC Minas) e
de outras instituições de ensino. É que a democracia não é cara somente ao
Programa (em que todas as Áreas de Concentração trazem a “Democracia”
no nome), mas sim a toda a comunidade acadêmica, espaço de pluralidade
de ideias, de questionamentos, de vozes; nossa intenção era, ainda que vir-
tualmente, “aglomerar” – palavra de sentido renovado em tempos de distan-
ciamento social –, reunir as pessoas em torno de discussões relevantes e
capazes de mobilizar estudantes, pesquisadores e defensores do respeito à
diversidade e ao diálogo social.
Com realização do Congresso “Preservar e Fortalecer a Democracia em
Tempos de Pandemia”, enriqueceu-se o intercâmbio do PPGD PUC Minas com
outras instituições de ensino superior e programas de pós-graduação em
Direito do Brasil, bem como fortaleceram-se as iniciativas de internacionaliza-
ção do Programa.
Como palestrantes no evento, para além dos professores da casa e da
presença do Magnífico Reitor da Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais, Dom Joaquim Giovani Mol Guimarães, contamos com a participação
de palestrantes de (UFAL), (UFMA), (UFMG),
(Centro Universitário Curitiba; Universidade Tecnológica Federal do
Paraná), (UFPE), (UERJ; UFRJ), (FGV-
SP) e (Universidade Federal de Santa Catarina).
No âmbito internacional, contamos com palestrantes da
(Universidad Nacional de La Pampa, Universidad Nacional de La Plata y
Universidad Nacional del Noroeste de la Provincia de Buenos Aires),
(Universidad Andina Simón Bolívar), da (Shangai Lixin University of
Accounting and Finance), da (Universidad del País Vasco; Universidad
Autónoma de Madrid), dos (Agnes Scott College),

9
APRESENTAÇÃO

da (Université de Nantes), da (Università degli Studi di Roma


1 “La Sapienza”; Università degli Studi di Torino), do (Universidad
Autónoma Metropolitana del Mexico) e de (Universidade de Lisboa;
Universidade de Coimbra).
Para conglobar os debates que tinham temas correlatos, os ciclos de
palestras ocorreram em quatro oportunidades, sendo as três primeiras re-
lacionadas às Áreas de Concentração do Programa e a última voltada para
discussão do papel da democracia no campo da saúde e da educação, com
a apresentação de trabalhos de pesquisa enviados conforme instruções de
um Edital publicado em julho de 2020. Todas as edições do Congresso foram
transmitidas ao vivo, , e se encontram registradas no canal do PPGD
PUC Minas no YouTube.
A primeira edição do Congresso Internacional se deu nos dias 15 e 16
de setembro de 2020 e teve como tema central “Democracia, Autonomia
Privada e Regulação”, nome da primeira Área de Concentração do PPGD PUC
Minas, com as mesas “Liberdade e Vulnerabilidade”, “Dano Existencial e
Responsabilidade Civil” e “O Trabalho em um Mundo Pandêmico”.
A edição seguinte ocorreu nos dias 20 e 21 de outubro de 2020 e
tratou do tema “Democracia, Constituição e Internacionalização”, voltada
para o Direito Constitucional, o Direito Internacional, os Direitos Humanos
e o Direito Processual, ramos do Direito que integram a segunda Área de
Concentração do PPGD PUC Minas. Para tanto, foram realizadas as mesas
“Processo, Constitucionalização e Democracia Forte”, “Democracia e Estado
Plurinacional” e “Estado, Democracia e Diversidade”.
Nos dias 17 e 18 de novembro de 2020 tivemos a terceira edição do
Congresso, “Democracia, Liberdade e Cidadania”, cuja temática se relacio-
nou com o Direito Penal, o Direito Tributário, as Finanças Públicas e a Teoria
do Direito, matérias afetas à terceira Área de Concentração do Programa.
As mesas receberam como título “Democracia e Sistema Penal”, “Covid-19,
Finanças Públicas e Política Tributária” e “Fragilidade da Soberania Popular e
Imunização do Futuro”.
A quarta e última edição do Congresso Internacional ocorreu nos dias 1º
e 02 de dezembro de 2020 e, como conclusão dos trabalhos, abordou-se o
tema “Democracia, Saúde e Educação: Novos caminhos para o futuro”, com
as mesas “Pandemia, Sustentabilidade Fiscal e Financiamento da Saúde”,
“A Educação e seus Desafios” e a palestra de encerramento, proferida pelo
Professor italiano Michelangelo Bovero, cuja conferência compõe o presente
volume.
Neste que foi o maior Congresso já organizado pelo PPGD PUC Minas
desde o ano de sua inauguração, em 1997, professores, pesquisadores e
acadêmicos do Brasil e de várias partes do mundo debateram e celebraram,

10
APRESENTAÇÃO

no contexto aflitivo da pandemia da COVID-19, a importância inegociável da


democracia.
O presente livro é a materialização desses debates profícuos e renovado-
res. Mais do que isso, é o registro de que, em 2020, em plena pandemia do
coronavírus e em meio ao aparente “crepúsculo da democracia”, a academia
manteve-se alerta e desperta.
Os Anais são compostos de duas partes. Na primeira, publicam-se tex-
tos de autoria de alguns dos professores palestrantes no evento. O primeiro
texto – “ e isonomia, epidemia e democracia” - corresponde à confe-
rência de encerramento do Congresso, proferida pelo Prof. Dr. Michelangelo
Bovero (Università degli Studi di Torino, Itália). Em seguida vêm o artigo “The
Pandemic and the Minorities” da Prof.ª Dra. Roberta Bortone (Università degli
Studi de Roma 1 “La Sapienza”) e o trabalho “(Des) Globalizaciones, Poder
Constituyente Popular y Alteridad Radical. Entre Reconocimiento y Desprecio”
do Prof. Dr. Alejandro Medici (Universidad Nacional de La Pampa, Universidad
Nacional de La Plata e Universidad Nacional del Noroeste de la Provincia de
Buenos Aires, todas na Argentina).
Professores do PPGD também contribuíram com estudos científicos para
os presentes Anais. A Prof.ª Dra. Maria de Fátima Freire de Sá e o Prof. Dr.
Bruno Torquato de Oliveira Neves, ambos professores da PUC Minas, elabo-
raram artigo intitulado “A Saúde da Pessoa Idosa no Contexto da Pandemia”.
Uma das organizadoras deste Congresso, a Prof.ª Dra. Maria Cecília Máximo
Teodoro (PUC Minas) escreveu ao lado da mestranda Karin Bhering Andrade o
trabalho “O Panóptico Pós-Moderno no Trabalho”. O Prof. Dr. José Luiz Quadros
de Magalhães (PUC Minas e UFMG), também organizador do Congresso, contri-
buiu com o artigo “Perspectivas para Conjuntura de Crise Orgânica do Capital
Nacional e Internacional: O Que Fazer?”. Finalmente, o Professor Marciano
Seabra de Godoi e a Mestra pelo PPGD PUC Minas Elisângela Inês Oliveira
Silva de Rezende contribuíram com o artigo “O novo Fundeb e a Emenda Cons-
titucional n.º 108/2020”.
Na segunda parte dos Anais, publicam-se os trabalhos científicos se-
lecionados pela Comissão Avaliadora do Congresso conforme regras e exi-
gências contidas em edital para submissão de artigos científicos, publicado
em julho de 2020. A chamada foi amplamente divulgada no sítio eletrônico
e nas redes sociais do PPGD PUC Minas e os artigos passaram pela ava-
liação sob o método por 16 professores doutores que
lecionam em diversas instituições de ensino do Brasil (Centro Universitário
Christus – Ceará, Centro Universitário Luterano de Palmas, Faculdade Damas
da Instrução Cristã – Pernambuco, FGV-SP, Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais, Unipar, Universidade Estadual do Tocantins, Universidade
Federal do Espírito Santo, Universidade Federal de Pernambuco, Universidade

11
Gabriela Cabral Pires1
Flávio Couto Bernardes2

No presente trabalho, os conceitos do contrato social e da demo-


cracia são contrapostos aos dados de pesquisas empíricas, em especial no
âmbito da América Latina, desde o início do século XXI. Objetiva-se identificar
não só uma relação lógica entre os conceitos de pacto social, democracia e
cidadania fiscal, mas também encontrar possíveis formas de fortalecer as re-
lações entre contribuintes e o Estado. A existência de um contrato social for-
talecido pressupõe a concordância da maioria da população com a eficácia do
acordo e, assim, a fragilidade da democracia (como consequência da ineficá-
cia do contrato) resulta no decréscimo da disponibilidade da população em
pagar tributos ao Estado, o qual não retribui as suas expectativas. Conclui-
se que o contrato social no Brasil e em outros países latino-americanos

1
Mestranda em Desenvolvimento e Políticas Públicas pela Faculdade de Direito da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais. Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Federal
de Minas Gerais (2009). Pós-Graduada em Direito Tributário pelo CEAJUFE (2010). Pós-Graduada
em Gestão Empresarial com ênfase em Finanças pela Fundação Dom Cabral (2014). Especialista
em Direito Tributário Internacional pela – Leiden, na Holanda, (2011).
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior - Brasil (CAPES). E-mail da autora: gabrielacpires0@gmail.com .
2
Doutor, Mestre, Especialista e Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal
de Minas Gerais. Professor do Programa de Pós Graduação da Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais – PUC Minas e da UFMG. Procurador do Município de Belo Horizonte. Advogado.
Secretário Geral da Associação Brasileira de Direito Tributário – ABRADT. E-mail do autor: flavio.
bernardes@bernardesadvogados.adv.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8180-0218.

675
GABRIELA CABRAL PIRES, FLÁVIO COUTO BERNARDES

está fragilizado, mas pode e deve ser reforçado, principalmente por meio do
aumento da cidadania fiscal e da confiança do povo no Estado.
Democracia. Direito Tributário. Cidadania Fiscal.
In the present work, the concepts of the social pact and democracy
are opposed to data from empirical research, especially in Latin America,
since the beginning of the 21st century. The objective is to identify a logical
relationship between the concepts of social pact, democracy and tax morale,
and also to find possible ways to strengthen relations between taxpayers and
the State. The existence of a strengthened social contract presupposes the
agreement of the majority of the population with the effectiveness of the pact
and, thus, the fragility of democracy results in a decrease in the willingness
of the population to pay taxes to the State, which does not reciprocate its
expectations. It is concluded that the social contract in Brazil and other Latin
American countries is weakened, but can and should be strengthened, mainly
through the increase of fiscal citizenship and trust of the people in the State.
: Democracy. Tax Law. Fiscal Citizenship.

Quebra do contrato social, crise democrática ou estado de exceção, são


expressões utilizadas pela doutrina e por diversas instituições para se refe-
rirem à ausência de confiança e compromisso do Estado com os cidadãos e
vice-versa. Em meio a um cenário político, social e econômico turbulento por
que passam alguns países do mundo e, em especial, da América Latina, o
debate acerca do fortalecimento das instituições democráticas torna-se ainda
mais relevante.
No presente trabalho, os conceitos doutrinários acerca do contrato social
e da democracia são contrapostos aos dados de pesquisas empíricas reali-
zadas por renomadas instituições como a Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico - OCDE, em especial no âmbito da América
Latina, desde o início do século XXI.
O regime democrático é essencial para a consolidação do Estado
Democrático e Social de Direito, sendo necessário examinar como um dos
elos de sua sustentabilidade a adequação das políticas públicas tributárias,
aqui se adotando como recorte metodológico o impacto da cidadania fiscal
como mecanismo de aprimorar o denominado contrato social fiscal.
Objetiva-se, por meio desse estudo em que se adota o referencial teórico
de Norberto Bobbio, identificar não só a relação lógica entre os conceitos de

676
REFLEXÕES SOBRE O CONTRATO SOCIAL, DEMOCRACIA E CIDADANIA FISCAL NO SÉCULO XXI

pacto social, democracia e cidadania fiscal, mas também analisar possíveis


formas de fortalecer as relações entre contribuintes e o Estado. Para tanto, a
metodologia adotada foi a pesquisa qualitativa, com o estudo de pesquisas
empíricas e doutrinas pertinentes ao tema em análise.

Na Inglaterra do Século XVII, o absolutismo da dinastia Stuart e o as-


cendente liberalismo da burguesia se conflitavam e criavam solo fértil para o
desenvolvimento de teorias políticas. John Locke, opositor dos Stuart e que
se encontrava refugiado na Holanda, retorna à Inglaterra após a Revolução
Gloriosa, em que se consuma a aprovação do em 1689 e o fim
do absolutismo.
O Segundo Tratado de Locke consiste em um ensaio sobre a origem, a
extensão e o objetivo do governo civil (WEFFORT, 2004), segundo o qual a
legitimidade do poder somente é alcançada por meio do consentimento, não
pela força ou pela tradição. Contrapondo a doutrina aristotélica, segundo a
qual o Estado existiria por natureza e seria anterior a cada um dos indivíduos,
Locke defende que o indivíduo é anterior à sociedade e ao Estado, assim
como o é a propriedade.
O pressuposto filosófico do Estado Liberal baseia-se no entendimento de
que todos os homens têm por natureza direitos fundamentais, como a vida,
a liberdade, a segurança e a felicidade. O Estado tem o dever de respeitar
esses direitos, não os invadindo e os protegendo contra qualquer possível
invasão por parte dos outros sujeitos. Assim, o jusnaturalismo serve de fun-
damento para os limites do poder do Estado, assim como defende Locke,
tendo sido reafirmado na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão
dos EUA e da França (BOBBIO, 1995).
A proteção da propriedade foi justamente o fundamento para o que Locke
chama de “contrato social”, gerado por meio do consentimento dos homens e
da concordância com a necessidade de encerrar o estado de natureza e criar
a sociedade política ou civil. Os objetivos dessa sociedade seriam a proteção
da propriedade individual e da própria comunidade em relação aos perigos
internos e estrangeiros.

Em Locke, o contrato social é um pacto de consentimento em que


os homens concordam livremente em formar a sociedade civil para
preservar e consolidar ainda mais os direitos que possuíam original-
mente no estado de natureza. No estado civil os direitos naturais ina-
lienáveis do ser humano à vida, à liberdade e aos bens estão melhor

677
GABRIELA CABRAL PIRES, FLÁVIO COUTO BERNARDES

protegidos sob o amparo da lei, do arbítrio e da força comum de um


corpo unitário. (WEFFORT, 2004).

Ao tratar do contratualismo, Bobbio (2018) destaca que a teoria de Locke,


assim como as de Hobbes, Rousseau e Kant, possuía o objetivo de encontrar
um fundamento racional para o poder do Estado, mas não se preocupava
com a justiça. Ainda segundo Bobbio, o interesse renovado pelas doutrinas
contratualistas advém do resgate dessas ideias por Rawls em seu livro sobre
a teoria da justiça, muito embora essa sua teoria não tivesse a mesma inten-
ção das anteriores, que buscavam apenas justificar o poder político.
A teoria do contrato social se baseia em fundamentos racionais e está
diretamente relacionada à origem da democracia, ainda que nem todas essas
teorias contratualistas fossem democráticas. A democracia pode ser concei-
tuada como uma das formas de governo, em que o poder está nas mãos da
maior parte das pessoas, ao contrário do que ocorre nas formas autocráticas.
José Adércio Sampaio (2013) faz importante observação na evolução do
poder fazendo a ligação entre a antiguidade e os contratualistas ao afirmar
que: embora a teoria do contrato social se tenha elaborado com maior nitidez
na modernidade, sobretudo nos trabalhos de Hobbes, Locke e Rousseau,
seus elementos conceituais já se faziam presentes na antiguidade . E prosse-
gue citando como exemplos a sociedade de Esparta e Argos. Barroso (2009)
faz caminho inverso, apontando essa ligação com o futuro da democracia,
afirmando que:

Soberania é o conceito da hora, concebida como absoluta e indivisí-


vel, atributo essencial do poder político estatal. [...] Com Rousseau e
as Revoluções Francesas e Americana, o poder soberano passa no-
minalmente para o povo, uma abstração aristocrático-burguesa que,
com o tempo, iria democratizar-se.

O conceito da liberal-democracia, por sua vez, encontra fundamento na


concepção de que a democracia é natural ao desenvolvimento do Estado
liberal, quando tomado por sua fórmula política de soberania popular, con-
templando a extensão dos direitos políticos até o sufrágio universal. Bobbio
(1995) destaca que o método democrático é necessário para a salvaguarda
dos direitos fundamentais da pessoa (base do Estado liberal) e que a garantia
desses direitos é essencial para a concretização da democracia.
Ao tratar do que chama de “a crise do Estado”, Norberto Bobbio (1987)
fez menção ao “fim do Estado”, lembrando que Engels considerava que, as-
sim como o Estado teve um início, terá seu fim quando as causas que o

678
REFLEXÕES SOBRE O CONTRATO SOCIAL, DEMOCRACIA E CIDADANIA FISCAL NO SÉCULO XXI

produziram cessarem. Antes do possível fim, contudo, merece atenção a “cri-


se do Estado”, decorrente da sua crescente complexidade, que resulta na
instabilidade até a extrema consequência da ingovernabilidade. O doutrinador
destaca que para os escritores conservadores, o que estaria em crise seria
a democracia, que não conseguiria mais fazer frente às demandas por ela
mesma provocadas. Já os autores marxistas, segundo Bobbio, defendem que
quem estaria em crise seria o capitalismo, por não conseguir mais dominar
o poder dos grupos que possuem interesses divergentes entre si. Em conclu-
são, Bobbio afirma que a crise em questão significa, de fato, a crise de um ou
outro tipo de Estado, não dele em si.
Apesar de o contexto em que foi escrita a obra em comento (final dos
anos 80) ser diverso do atual, continuam sendo frequentes os estudos acerca
da possível ingovernabilidade como motivo da crise democrática, consideran-
do que a constatação então formulado pelo referencial teórico mencionado
tem se tornado empiricamente mais presente, com desdobramentos anuncia-
dos na mídia em diferentes países.
Michelangelo Bovero (2015) questiona se, diante da gravidade das pato-
logias atuais, seria o caso de uma crise na democracia (destinada a remode-
lar a forma política), ou uma crise mais complexa, da democracia. O autor faz
interessante comparação entre a democracia antiga e a moderna, no sentido
de que aquela seria a democracia do povo, em contrapartida à moderna, que
se denota como uma democracia do indivíduo. A modernidade, então, seria
um projeto de construção de uma sociedade dos indivíduos, especialmente
no que tange às dimensões econômica e política.
Essa constatação pode ser ilustrada por meio do resultado de pesquisa
divulgada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
– OCDE (2017), em que se buscou identificar como a análise do comporta-
mento social poderia ser útil para a concretização das políticas públicas, es-
pecificamente aquelas relacionadas ao aumento da arrecadação de tributos.
No caso específico do Reino Unido, apresentado no trabalho, cinco diferentes
formas de abordagem foram utilizadas nas cartas enviadas aos contribuintes
que estavam em atraso com o pagamento de determinado tributo.
Após o envio das cartas, constatou-se que aquelas que alcançaram maior
efeito em termos de arrecadação (5,1% de aumento) continham o seguinte
texto: “nove em dez pessoas no Reino Unido pagam seus tributos em dia.
Você está atualmente entre a pequena minoria das pessoas que não nos
pagaram ainda”3. Noutra mão, as cartas cujos textos mencionavam o quanto

3
Tradução livre, realizada pela autora, do trecho: “

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GABRIELA CABRAL PIRES, FLÁVIO COUTO BERNARDES

o pagamento do tributo é importante para a melhoria e manutenção dos ser-


viços públicos de saúde, educação e de manutenção das estradas, causaram
efeito muito tímido (1,6% de aumento na arrecadação). A conclusão a que se
chegou com esse estudo foi de que as normas sociais podem ser uma forma
eficaz de incentivar o tributário.
O comportamento apresentado pelos contribuintes britânicos é forte in-
dício de que atualmente os cidadãos pensam de forma individualista e foram
motivados a recolher o tributo pela intenção de se sentirem integrados ao
grupo, à sociedade, mas não por se solidarizarem com o coletivo ou prezarem
pela qualidade dos serviços públicos de que necessitam os menos favoreci-
dos. Essa constatação reflete a afirmação de Bovero, segundo a qual a mo-
dernidade seria um projeto de construção de uma sociedade dos indivíduos,
não do povo4.
Bovero ainda alerta para o fato de que o mundo passa por uma crise
dos princípios éticos sobre os quais a democracia deveria se fundar, princi-
palmente no que tange à cultura anti-igualitária, à força do poder das oligar-
quias globais e à restrição das liberdades pela “colonização midiática das
consciências”.
Vale mencionar, nesse contexto, outra pesquisa realizada pela OCDE
(2010), em que os cidadãos de países da América Latina foram questionados
sobre (i) o apoio à democracia como o melhor sistema de organização da
sociedade e (ii) o grau de satisfação com a forma com que a democracia fun-
ciona em cada país. A maioria dos países apresentou índices de insatisfação
com a forma como a democracia funciona, embora os cidadãos continuem a
apoiar esse regime como o melhor.
No Brasil, menos de 40% da população entrevistada demonstrou satisfa-
ção com a forma democrática no ano de 2008, enquanto menos de 50% da
população demonstrou apoio à democracia como o melhor sistema político.
Esse dado merece ser avaliado à luz da atualidade.
Pesquisa divulgada pela Datafolha (2020), realizada por meio da coleta
de dados que aconteceu nos dias 23 e 24 de junho de 2020, mostrou que
75% dos brasileiros concordam que a democracia é sempre a melhor forma
de governo, taxa essa que é recorde e superou o índice observado em outubro
de 2018, no mês da eleição presidencial, quando era 69%. Em análise das
variáveis sociodemográficas, conclui-se que a preferência pela democracia é
majoritária em todos os segmentos sociais e cresce na proporção do aumen-
to do grau de instrução e da renda familiar mensal do entrevistado.

4
Sobre o tema, indica-se o documentário “The century of the self”, produzido e dirigido por Adam
Curtis, 2005.

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REFLEXÕES SOBRE O CONTRATO SOCIAL, DEMOCRACIA E CIDADANIA FISCAL NO SÉCULO XXI

Apesar do inegável apoio ao regime democrático, significativamente ma-


jorado nos últimos 12 anos, merece alerta a constatação da pesquisa de que
para 46% dos brasileiros há alguma chance do Brasil se tornar uma ditadura,
dando fim ao período democrático que fora consolidado pela Constituição de
1988.
Estudo realizado pela Universidade de Cambridge (2020), baseado em
pesquisas efetuadas até o ano de 2020, demonstra que muitas das demo-
cracias mais populosas do mundo, onde se incluem os Estados Unidos e o
Brasil, lideraram a tendência de alta nos níveis de insatisfação com o referido
regime. O índice de insatisfação da população brasileira com o atual regime
democrático bateu recorde histórico (considerando o início das pesquisas,
em 1995), chegando ao patamar de aproximadamente 80% em 2020, muito
superior àquele índice encontrado na pesquisa de 2008 (quando cerca de
60% estavam insatisfeitos).
O mesmo relatório observa que os níveis de insatisfação dos cidadãos
com a democracia são normalmente respostas a circunstâncias e eventos
objetivos, como choques econômicos, escândalos de corrupção e crises políti-
cas, o que gera efeito imediato sobre os níveis médios de insatisfação cívica.
As evidências indicam que nos países em que as instituições políticas são
transparentes, atuam de forma responsável em relação às finanças públicas
e sem corrupção, é maior a satisfação cívica.
Na obra “Sobre o autoritarismo brasileiro”, Lília Schwarcz (2019) afirma
que “se o patrimonialismo é o primeiro inimigo da República, o segundo prin-
cipal adversário atende pelo nome de corrupção”. A historiadora e antropóloga
ensina que, independentemente da forma que assumir, a corrupção desvirtua
costumes e os torna antiéticos e imorais, sendo que suas consequências ul-
trapassam o âmbito privado dos envolvidos e afetam diretamente a sociedade,
que perde recursos estatais que deveriam ser destinados aos investimentos
públicos. Sobre o tema, Flávio Bernardes e Milton Mattedi (2016) pontuam:

É latente que hoje há grande desconfiança na democracia representa-


tiva. Este fato decorre de múltiplos fatores dentre os quais podemos
citar o alto índice de corrupção dos agentes públicos, a ineficácia dos
instrumentos de coibição e punição desses indivíduos, a desconexão
entre a vontade popular e a atuação dos poderes públicos, dentre ou-
tros. Tal fato fica evidenciado pelo volume de protestos populares em
diversos Estados democráticos e, especialmente no caso brasileiro,
através da onda de protestos ocorridos em todo o país em meados
de 2013 e 2014.

Note-se que embora a maioria dos brasileiros defenda a democracia


como o melhor regime político, também a maioria está insatisfeita com a

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GABRIELA CABRAL PIRES, FLÁVIO COUTO BERNARDES

forma como o sistema está atualmente sendo gerido, principalmente em face


dos diversos escândalos envolvendo corrupção e que vêm sendo expostos
ao público nos últimos tempos. Ou seja, não é possível se afirmar que a de-
mocracia esteja em crise no Brasil, mas sim que a qualidade do regime não
é satisfatória, ou, em outras palavras, que a sua legitimidade está em crise.
O próprio relatório da Universidade de Cambridge chega à conclusão de
que a insatisfação com o regime político na maioria dos países cuja democra-
cia está madura ou é emergente não significa que os cidadãos possuem ex-
pectativas excessivas ou utópicas, mas sim que as instituições democráticas
estão falhando em alcançar os resultados que mais importam.

Levando-se em conta a teoria jusnaturalista de que o contrato social


consistiria em ferramenta hábil a assegurar os direitos naturais inalienáveis
do ser humano à vida, à liberdade e à propriedade, associada à noção de jus-
tiça dos neocontratualistas, chega-se à constatação de que a arrecadação de
receitas por meio de tributos, com vistas a suportar as despesas do Estado
Fiscal, somente se justifica mediante a vigência do contrato social.
O tributo, assim, caracteriza-se como o meio de fomento do Estado que
tem por fim garantir a cada cidadão a observância de seus direitos fundamen-
tais. Nesse sentido, leciona Casalta Nabais (2012):

Os impostos são um preço: o preço que todos, enquanto integrantes


de uma dada comunidade organizada, em estado (moderno), paga-
mos por termos a sociedade que temos. Ou seja, por dispormos de
uma sociedade assente na liberdade, de um lado, e num mínimo de
solidariedade, de outro.

Dessa forma, o pagamento de tributos pode ser visto como um dever fun-
damental, uma vez que tem por fim garantir direitos fundamentais. Nabais en-
sina que a concepção da existência dos deveres fundamentais, associada à
aceitação da existência do custo dos direitos, é essencial para a compreensão
de que a liberdade e a solidariedade não se excluem, mas se complementam.
Não à toa, o artigo 3º da Constituição de 1988 prevê que constituem
objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, dentre outros, a
construção de uma sociedade livre, justa e solidária. O texto constitucional
ainda busca garantir a observância dos direitos e garantias fundamentais,
como leciona Bernardes (2017):

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REFLEXÕES SOBRE O CONTRATO SOCIAL, DEMOCRACIA E CIDADANIA FISCAL NO SÉCULO XXI

Vários dispositivos do texto constitucional brasileiro, por exemplo,


demonstram a nítida preocupação em assegurar a aplicação dos re-
cursos disponíveis na ampliação e melhoria das políticas sociais. O
objetivo precípuo, ao constituir o marco da ruptura do Estado Autori-
tário, é colocar o cidadão como o centro do ordenamento e, portanto,
do Estado.
Garantir ao cidadão a efetividade de seus direitos sociais e estabe-
lecer limites claros na conduta do Estado e nas suas finalidades,
sobretudo através dos denominados “direitos e garantias fundamen-
tais”, foi tratado como um dos aspectos primordiais da Constituição
vigente.

Seguindo essa ordem de ideias, o fortalecimento do chamado contrato


social perpassa a concepção de que os direitos que se pretende ver assegu-
rados não se garantem por si mesmos e geram custos, os quais são financia-
dos por meio das receitas do Estado.
Como anteriormente mencionado, a proteção da propriedade foi o funda-
mento para o contrato social de Locke e, da mesma forma, Jeremy Bentham
afirma que “a propriedade e o direito nascem juntos e morrem juntos. Antes
de haver leis, não havia propriedade; tirando-se as leis, toda propriedade
deixa de existir” (BENTHAM, 1931 SUNSTEIN; HOLMES, 2019). As leis,
por sua vez, são criadas e têm sua aplicação garantida pelo Estado e, para
tanto, existem altos custos.
Holmes e Sunstein (2019) destacam, sobre o tema, que o governo libe-
ral ideal extrai recursos da sociedade por meio da tributação justa e os aplica
de forma responsável e hábil na produção de serviços e bens socialmente
úteis. Além disso, afirmam que “toda liberdade privada tem um custo público”
(SUNSTEIN; HOLMES, 2019). Isso significa que tanto os direitos relacionados
aos serviços públicos de saúde, educação e aposentadoria, quanto a garantia
ao livre exercício da religião, à liberdade contratual e à liberdade de expressão
demandam custos públicos.
Ainda nesse sentido, Casalta Nabais (2012) expõe seu pensamento de
maneira clara afirmando que todos os direitos, por não serem uma dádiva
divina, por não serem autorrealizáveis (dependem do Estado), por não con-
seguirem ser realmente protegidos num estado falido ou incapacitado, impli-
cam cooperação social e responsabilidade dos indivíduos da sociedade em
contribuir para garantia dos mesmos. Daí poderem ser considerados como
“liberdades privadas com custos públicos” (NABAIS, 2012).
Todavia, essa concepção não é difundida em todos os países. A OCDE
(2010) aponta que alguns autores sugerem que o contrato social estaria que-
brado na América Latina, tendo em vista os altos índices de desigualdade, os

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GABRIELA CABRAL PIRES, FLÁVIO COUTO BERNARDES

baixos níveis de tributação (o que não é o caso do Brasil) e a baixa qualidade


dos serviços públicos que prevalecem na região.
O trabalho da OCDE (2010) em questão analisou empiricamente a rela-
ção entre política fiscal, mobilidade social e a consolidação da democracia na
América Latina e Caribe, por meio de dados do de 2007 e
2008. Os resultados permitem concluir que a qualidade dos serviços públicos
interfere na disposição para pagar tributos, constatação que pode diferir do
que se viu na pesquisa realizada no Reino Unido, mencionada no início desse
trabalho.
A legitimidade tributária perante a sociedade normalmente é baixa na
América Latina porque os cidadãos dos países em desenvolvimento frequen-
temente não confiam que as receitas tributárias sejam bem gastas, o que
faz com que eles tenham menor disposição para recolher os tributos. Acerca
dessa matéria, Ives Gandra da Silva Martins (2018) justifica sua classificação
da norma tributária como sendo de “rejeição social” por entender que:

(...) em todos os espaços geográficos e períodos históricos, a carga


tributária foi mais elevada do que a necessária para que o Poder
Público pudesse prestar serviços públicos, servindo para garantir tam-
bém benesses, privilégios e corrupção, ingredientes indissociáveis de
qualquer governo.

Ainda que o posicionamento de Martins não seja acompanhado pela


maioria dos tributaristas brasileiros, a constatação acerca da baixa legitimi-
dade tributária representa a percepção de que, embora a população possa
reconhecer a existência do custo dos direitos, entende como ilegítimo um
sistema em que as receitas advindas da propriedade privada – que deveriam
ser destinadas à garantia dos direitos - sejam mal geridas.
Segundo a pesquisa (OCDE, 2010), os latino-americanos que se conside-
ram parte do contrato social e possuem maior escolaridade são mais propen-
sos a pagar tributos e a aceitar os altos índices de tributação. Aqueles que
pensam que já escalaram a pirâmide social e/ou esperam que seus filhos
caminhem mais adiante, concordam que os bons cidadãos devem recolher
os tributos e, em geral, rejeitam a ideia de que a carga tributária seja elevada
demais.
No entanto, destaca-se que qualquer reforma tributária planejada pelos
governos dos países em desenvolvimento deve ser precedida de um trabalho
de aumento da legitimidade fiscal, caso contrário os resultados não serão
alcançados. A melhor forma de cultivar a confiança nas reformas é o aumento
da eficiência e da transparência nas despesas públicas, acompanhada da

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REFLEXÕES SOBRE O CONTRATO SOCIAL, DEMOCRACIA E CIDADANIA FISCAL NO SÉCULO XXI

melhoria das condições de vida de importante parcela da sociedade que se


sente atualmente excluída do contrato social.
O estudo da OCDE (2010) ainda demonstra como o contrato social está
fragilizado nos países da América Latina ao apresentar os índices de cidada-
nia fiscal, comparados aos dos países integrantes deste renomado organis-
mo. Ao serem questionados sobre se a sonegação fiscal é justificável, mais
de 60% dos entrevistados em países integrantes da OCDE responderam nega-
tivamente, enquanto na América Latina essa porcentagem não alcançou 35%.
Os autores do trabalho em questão interpretam os resultados como uma
evidência de que, apesar de o contrato social nesses países estar fragilizado,
ele pode e deve ser reforçado, principalmente por meio do aumento da cida-
dania fiscal e da confiança do povo no Estado.

Desde o movimento da Revolução Gloriosa, antes mencionada, uma das


exigências daqueles que lutavam contra as arbitrariedades dos governantes
absolutistas centrava-se no impedimento da exigência de tributos de forma
exagerada e sem aprovação pelo Parlamento. Em diversos outros momentos
históricos, inclusive anteriores a esse, é possível encontrar a tributação como
o estopim de revoluções que geraram importantes reflexos nas sociedades.
No Brasil, um exemplo foi a Inconfidência Mineira, movimento ocorrido
no fim do século XVIII, que se voltava contra as medidas tirânicas da rainha
de Portugal, dentre elas as relacionadas à contenção do contrabando e a
cobrança de tributos em altos valores.
Com o advento do Estado Democrático de Direito e sua Constituição
Econômica, o Brasil passou a experimentar novo paradigma da função esta-
tal, em que próprio Estado e a iniciativa privada, em conjunto, buscam estabe-
lecer e garantir as liberdades e os direitos individuais (XAVIER, 2020).
No entanto, não se pode olvidar do fato de que os tributos são neces-
sários para a manutenção do Estado, representando custos dos contribuin-
tes intrínsecos à garantia dos direitos fundamentais. Ou seja, os cidadãos
podem – e devem – lutar por um sistema tributário justo, mas não há como
compreender a liberdade sem o pagamento dos tributos. Eis um dos mais
importantes aspectos do que se chama de cidadania fiscal: o sentimento de
solidariedade com relação à sociedade como um todo. Ensinam Bernardes e
Azevedo Branco (2009):

Logo, verifica-se o consentimento expresso do povo brasileiro quanto


à exigência dos tributos, em especial dos impostos, como forma de

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GABRIELA CABRAL PIRES, FLÁVIO COUTO BERNARDES

contraprestação para o Estado, ou seja, assegurando a receita tribu-


tária como a principal fonte de recursos para a administração pública.
Esta constatação caracteriza, indubitavelmente, a autorização expres-
sa do cidadão como um dever fundamental de contribuir mediante
sua subsunção às obrigações de natureza tributária.

Ao tratar da ideia de liberdade, Kelsen (1993) destaca que em sendo


a liberdade e a igualdade elementos essenciais do relativismo político, sua
analogia com a democracia política se torna óbvia, já que esses são ideais
fundamentais da democracia. A liberdade natural é substituída pela liberda-
de política ou social, segundo a qual o indivíduo sujeita-se a uma ordem
normativa, uma ordem social. Trata-se de submissão à própria vontade na
medida em que o sujeito participe do estabelecimento da lei. Essa transição
entre liberdade natural e liberdade social é imprescindível à democracia e, por
conseguinte, justifica a existência da cidadania fiscal como a concepção de
que todos devem compartilhar dos custos inerentes à garantia dos direitos
fundamentais, na medida da sua capacidade contributiva.
Torgler (2005) ressalta que na América Latina é significativo o baixo índi-
ce de cidadania fiscal, assim conceituada a intrínseca motivação para pagar
tributos, ou os valores e atitudes relacionadas ao pagamento de tributos. O
autor aponta o elevado encargo tributário, a falta de honestidade e a corrup-
ção como fatores determinantes nesse cenário. Na medida em que os contri-
buintes percebem seu relacionamento com o Estado não só como de coerção,
mas também como de troca, quando sentem que são tratados de forma justa,
estão mais dispostos a pagar os tributos.
Dados coletados por recente pesquisa publicada pela OCDE (2019) de-
monstram o que representa o ciclo virtuoso entre uma performance estatal
eficaz, altos níveis de cidadania fiscal e de voluntário por parte
dos contribuintes. A esse ciclo, os pesquisadores chamam de “contrato fis-
cal” celebrado entre Estado e contribuintes.
A relação entre cidadania fiscal e serviços públicos é menos clara na
América Latina, onde os resultados encontrados em estudos anteriores e
os dados atuais se contrastam. Embora na pesquisa realizada em 2008-
2009 tenha sido encontrada uma relação positiva entre a cidadania fiscal e
a satisfação com a educação e os serviços de saúde públicos, a análise de
2019 apresenta dados inconsistentes a esse respeito. Isto porque, a relação
entre serviços públicos e a cidadania fiscal não é clara na região, a confiança
na performance do governo e a percepção do nível de corrupção impactam,
ambos, na cidadania fiscal.
Além disso, foi identificada significativa diminuição na cidadania fiscal
na América Latina, a qual foi relacionada às mudanças econômicas e sociais

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REFLEXÕES SOBRE O CONTRATO SOCIAL, DEMOCRACIA E CIDADANIA FISCAL NO SÉCULO XXI

ocorridas desde 2011. A desaceleração econômica pôs fim a um período de


progresso econômico e social, em que a pobreza foi reduzida, criando uma
classe média cada vez mais exigente, que se deparou com uma série de es-
cândalos de corrupção. Como apontado no trabalho, essa gama de fatores foi
favorável à criação do clima de incerteza quanto à capacidade das instituições
públicas de responderem eficazmente às necessidades dos cidadãos, espe-
cialmente na eficiência da aplicação da arrecadação tributária.
Nesse cenário, merece ainda mais atenção a busca pelo Estado de me-
canismos que auxiliem na reconstrução das bases de confiança dos cidadãos
no contrato fiscal e na tributação. Dentre as diversas ferramentas que podem
auxiliar os governos, encontram-se a maior transparência e publicidade em
relação às despesas e receitas públicas e maior abertura para representantes
da sociedade participarem das decisões e fiscalizarem as contas públicas,
ambos instrumentos úteis no combate à corrupção e à gestão ineficaz do di-
nheiro público. Sobre a cidadania participativa, ensina Bernardes (2017) que:

A cidadania participativa, base para a democracia, tem como ins-


trumento de destaque os orçamentos participativos. A participação
popular é importante no processo político, porque torna possível a in-
fluência mais direta da população no processo normativo e executivo,
estruturando a cidadania ativa. A prática do orçamento participativo
vem se desenvolvendo extraordinariamente nos últimos anos, apenas
ganhando enfoques diferentes caso se trate do exercício da cidadania
ativa perante a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.

Essas ferramentas são bastante conhecidas e frequentemente integram


as agendas políticas, mesmo que sua implementação e seus resultados não
sejam acompanhados como deveriam ser. Ainda assim, é importante que os
governantes se atentem também para políticas mais específicas que podem
ser de grande valia.
O trabalho da OCDE (2019) cita, dentre essas ações, a criação de pro-
gramas de educação fiscal, incluindo a cidadania fiscal, bem como suas pes-
quisas e análises nos programas; o desenvolvimento da Administração Fiscal,
no sentido de simplificar a forma de apuração e pagamento dos tributos; e,
a longo prazo, o reforço da confiança na relação receita e despesas estatais,
de forma a construir um robusto contrato social.
Especificamente sobre o tema da educação tributária, ensinam Godoi e
Rezende (2019):

Em suma, o objetivo principal da educação tributária é formar contri-


buintes que são conscientes e se esforçam para cumprir com rigor

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GABRIELA CABRAL PIRES, FLÁVIO COUTO BERNARDES

seus deveres e obrigações fiscais, mas também exigem o mesmo


grau de comprometimento para com seus deveres em relação ao Es-
tado e à administração tributária, seja na fase legislativa, seja na fase
de fiscalização ou cobrança dos tributos, utilizando todos os remé-
dios e recursos previstos em lei para resistir a exigências ilegais. O
objetivo da educação tributária é fortalecer o sentido de responsabili-
dade social do contribuinte.

Não basta, contudo, responsabilidade social em um cenário de inse-


gurança jurídica. Embora a ausência de segurança jurídica seja usualmente
apontada como um problema para as empresas, ela é outro aspecto que
merece atenção considerando os contribuintes de forma geral, pois é patente
a insegurança em relação ao tratamento da Administração Pública face aos
negócios jurídicos praticados pelos particulares.5
Em obra dedicada ao estudo da Segurança Jurídica no âmbito do Direito
Tributário, o professor o professor Heleno Taveira Torres (2019) destaca o
seguinte:

O exame da evolução do Estado é fundamental para compreender as


diversas razões das mudanças verificadas em matéria tributária ao
longo dos tempos. Basta pensar que o “poder de tributar”, no Estado
Democrático de Direito, efetiva-se nos limites da liberdade, da demo-
cracia e da dignidade da pessoa humana, motivo pelo qual a segu-
rança jurídica deixa de ser aquela exclusivamente formal de outrora,
pautada pela certeza e irretroatividade, para ser a previsibilidade da
concretização de direitos e liberdades fundamentais, ademais da pro-
teção da confiança legítima, em termos subjetivos.

Em face do atual cenário da jurisprudência administrativa – chamado por


Torres de “estado de exceção” – o contribuinte convive com contradições de
decisões de órgãos ou autoridades entre si, o que não se espera do Estado
de Direito orientado pela moralidade e impessoalidade isonômica na rela-
ção com os administrados. A consequência dessa constatação é a ausência
de “previsibilidade da concretização de direitos e liberdades fundamentais”
(TORRES, 2019), fato que, mais uma vez, resulta na indisposição do cidadão
em contribuir com o Estado.

5
Nesse sentido: BERNARDES, Flávio Couto; PIMENTA, Victor Pimenta de.
a. Revista da Faculdade Mineira de Direito, v. 21, n. 42, 2018.

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REFLEXÕES SOBRE O CONTRATO SOCIAL, DEMOCRACIA E CIDADANIA FISCAL NO SÉCULO XXI

Diante desses diversos apontamentos sobre os motivos para a reduzida


cidadania fiscal na América Latina, chamam atenção duas características pró-
prias dos cidadãos que possuem maior confiança no governo, identificadas
pela OCDE: as pessoas que confiam no seu governo possuem maior cidada-
nia fiscal e aquelas que entendem a democracia como o melhor sistema de
governo para seus países tendem a pensar que a sonegação é injustificável.
Inegável, portanto, a íntima relação entre a cidadania fiscal e o fortale-
cimento da democracia, já que a existência de um contrato social fortalecido
pressupõe a concordância da maioria da população com a eficácia do acordo.
A eficácia do contrato, em um regime democrático, significa, dentre outras
coisas, que os cidadãos estão dispostos a arcar com custos tributários em
troca da garantia dos seus direitos fundamentais.
Como bem lembrado por Levitsky (2018), a democracia brasileira, assim
como a norte americana, não está morta, mas há sinais de alerta que mere-
cem toda atenção da população e dos governantes interessados em manter
a forma de governo escolhida pela maioria.
Da mesma forma, o contrato social dos países da América Latina não
foi quebrado, não há que se falar em ausência de Estado ou anarquia, mas
esse contrato está fragilizado e a confiança no governo é essencial para o
fortalecimento do vínculo contratual, bem como para o aumento da concepção
de que os cidadãos devem contribuir por meio do pagamento de tributos com
a manutenção do Estado que irá garantir-lhes os direitos fundamentais.
Necessário, diante do cenário apresentado, concordar com Carvalho
(2005) quando afirma que ainda falta muito para completar a cidadania bra-
sileira. O historiador ensina que parte da dificuldade em solucionar proble-
mas como a desigualdade e o fortalecimento da democracia e da cidadania
pode ter a ver com a lógica invertida de conquista dos direitos observada no
Brasil (onde os direitos sociais foram garantidos antes dos políticos e civis)
se comparada aos demais países. Apesar de não ser correto afirmar que só
existe um caminho a ser percorrido para se alcançar a cidadania, é certo que
a cidadania e a democracia brasileiras foram afetados pelo caminho trilhado.

O percurso histórico brasileiro atravessa as heranças sociais decorrentes


do passado escravocrata, colonial, patriarcal, de corrupção, de discriminação
e intolerância (seja de raça, gênero, sexo ou religião) que tende a reaparecer
ao longo dos anos de forma mais ou menos incisiva, mas sempre reforçada
nos governos autoritários que ressurgem de tempos em tempos.

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GABRIELA CABRAL PIRES, FLÁVIO COUTO BERNARDES

Ser cidadão em um Estado autoritário, se não for tarefa impossível, é,


ao menos, bastante árdua e, talvez por isso, o desenvolvimento da cidadania
brasileira tenha que se reiniciar e refortalecer a cada início de ciclo democrá-
tico. Somente diante de uma sociedade democrática é que estão garantidos
os direitos fundamentais dos cidadãos.
Como apresentado anteriormente, embora a maioria dos brasileiros de-
fenda a democracia como o melhor regime político, também a maioria está
insatisfeita com a forma como o sistema está atualmente sendo gerido, prin-
cipalmente em face dos diversos escândalos envolvendo corrupção que vêm
sendo expostos ao público nos últimos tempos. Ou seja, provavelmente não
é a democracia que está em crise no Brasil, mas sim a qualidade do regime,
que não é satisfatória e resulta na crise de sua legitimidade.
Na medida em que a existência de um contrato social fortalecido pres-
supõe a concordância da maioria da população com a eficácia do acordo,
a fragilidade da democracia (como consequência da ineficácia do contrato)
resulta no decréscimo da disponibilidade da população em contribuir com a
manutenção do Estado, o qual não retribui as suas expectativas.
A eficácia do contrato, em um regime democrático, significa, dentre ou-
tras coisas, que os cidadãos estão dispostos a arcar com custos tributários
em troca da garantia dos seus direitos fundamentais. Caminhando adiante,
destaque-se a outra face do pagamento de tributos no Estado Democrático
de Direito, a qual representa a atuação do indivíduo em prol da igualdade e da
liberdade da parcela da população menos favorecida economicamente.
Percebe-se, pois, que o contrato social no Brasil e em outros países
latino-americanos está, de fato, fragilizado, mas pode e deve ser reforçado,
principalmente por meio do aumento da cidadania fiscal e da confiança do
povo no Estado. Por óbvio, não cabe apenas aos cidadãos fazerem sua parte,
sendo imprescindível que o Estado cumpra com seus compromissos e seja
transparente a esse respeito. Nunca é demais lembrar que a Constituição de
1988, além de Econômica, é Cidadã e mantém em seu artigo 5º a previsão
de garantia dos direitos dos cidadãos de uma República Democrática, que
merece ter seu contrato social reforçado.

BARROSO, Luís Roberto. os


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REFLEXÕES SOBRE O CONTRATO SOCIAL, DEMOCRACIA E CIDADANIA FISCAL NO SÉCULO XXI

TORGLER, Benno. . 122, 133–157


(2005). Disponível em:https://doi.org/10.1007/s11127-005-5790-4. Acesso
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