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MASSAUD MOISÉS

TEXTO 1 1
BARROSO
AR CAD I
A LITERATURA PORTUGUESA SM0

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃ O DA PUBLICAÇÀ O


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

M724L
37. ed.
Moisés, Massaud,
A literatura portuguesa / Massaud Moisés. - 37. ed., rev. e atual. -
l‘ reimpr. São Paulo :Cultrix, 2013.
576 p. ; 23 cm
Inclui bibliografia e índice
ISBN 978-85-316-0231-3
Edição Revista e Atualizada l . Literatura portuguesa - História e crítica. I. Título.

13-02688 CDD: 869.09


CDU:
821.134.3.09

Edltora
íultrix
UA IJROCO
(I .580-1756)

PRELIMINARES

i )i ianclo, em 1578, D. Sebastiã o desaparece em Alcú cer-Quibir, era chegado


o li ri i rnclancó lico das grandezas arduamente conquistadas a partir da tomada
de ( ‹ iria (1415), graças à abertura do caminho marítimo para as Índias
(1498), à
‹ 1‹ scoluerta do Brasil (l 500), e a outros cometimentos semelhantes. Indo para a
i tência o Cardeal D. Henrique, tio do malogrado rei, durante dois anos se de
1›,ii c si a magna quesiao sucessÓ ria, ate que, em 1550, Filipe 11 da Espanha, her-
r lciro mais pró ximo da Coroa, anexa Portugal a seus domínios. E ao longo de 60
.mos, até 1640, dominou o Espanhol. No mesmo ano de 1580, falece na miséria
‹› visioná rio caritor das gló rias perdidas e o intuitivo que pressentira a
desastrosa situaçã o de inconsciência coletiva — Luís Vaz de Camõ es: dois
acontecimentos 1 ragicamente simultâ neos, a marcar o crepú sculo de um
mundo e a aurora de outro. Termina a Renascença em Portugal e principia a
exlensa época do Barro- so, que se espraiará pelo secu1o CVII, atingindo os
meados do seculo VIII.
Extenso mas nã o intenso lapso de tempo: na fileira de uma turbulência
ge- ral, provocacla pelo senhorio castelhano e pelo movimento europeu das
ideias em torno da Reforma e da Contrarreforma, a cultura portuguesa baixa
de tom, vela-se, hiberna, envergonhada ou ensimesmada, a remoer pensamentos
de re- volta ou de misticismo, algumas vezes traduzidos em açã o, coerente ou
nã o.
109
gAgROCO ^ 111
Ii 0 • A LITERATURA PORTUGUESA

e do
divulgaçã o da estetica barroca com ãS suas ideias acerca da dote literária
De duvidosa etimologia, o vocá bulo “barroco” designava originalmente que se
tlifilogo, estampadas em Corte nd Aldeifi tl6l9), a exemplO do passo em
um tipo de pérola de forma irregular, ou, de acordo com a filosofia Portugal, o conceito de ngudez°, I1*-
porventura pela primeira vez em
escolástica,
um esquema mnemonico que servia para facilitar a memorizaçã o de um dos (tirmula,
para a compreensã o da literatura ao lotlgo dos
a
séculos CVII e XVllll
uma palavra para dizer
chamados silogismos da segunda figura.’ Com o tempo, passou a significar ico muó ai o sentido
todo sinal de mau gosto, e, por fim, a cultura pró pria do seculo XVII e princí- Os ditos agudos consistem em
em mudar alguma ou acento à p alavra para lhe dar outro
pios do século XVIII. oui ta coisa, ou mesmas coisas muda a tençã o dO
letra
O movimento barroco, iniciado na Espanha e introduzido em Portugal que nas
#tntido, ou em um som e graça com
durante o reinado filipino, é de instá vel contorno, por corresponder a uma que as diz”. deixar de set', O BarroCO sofreu mudanças em solO 0£-
profunda transformaçã o cultural, cujas raízes constituem ainda objeto de po- E, como nã o podia
antecedentes, ja porquea novidade espanhola CO¥-
tuguts, jã pOr causa de só Om
lêmica. Quem nele procure apenas o aspecto literá rio, faCilmente encontTãTá erturbaçã o da serenidade clá ssica, que
tais
no Renascimento algumas de suas formas embrionã rias, destacadamente no tcspondia a uma forma de p
os menos talentosos. A linha tra-
e foram
final do século XVI, quando já se percebem as palpitaçÔ es da discordia interna poucos letrados aCeitaram em bloco, de Camões, íunC1OHãV@COTflO
que iria transformar-se em Barroco, enfeixada no chamado Maneirismo, que tj|t}o}1al, engrossada g}O lTlã ÍStÔF Q ético

se caracteriza pela tensã o entre as correntes está ticas e ideolÓ gicas que cruzam contra a invasã o das á guas vizinhas, e acabou dando um toque de
5grreira
aquele século, expressa pelo acú mulo de metáforas, antíteses, trocadilhos, a lflentidade especial aO Barroco portugues. BãrrOCO tornou-se a arte da Con-
mescla do real e do irreal. Lembre-se, apenas como exemplo, o soneto camo- No entender de alguns estudioSOS, está tico servirem
niano iniciado pelo verso “Amor é fogo que arde sem se ver”, em que jã se ob- j3qovimento
trzrrefonna, este as característicã s bá sicas do fsta.
e pedagó giCos da lgrejã na luta antirreform A
zoe designios d outriná rios
servam antecedentes barrocos no jogo hos paradoxos que levam aos conceitos, a estética barroca, fazendo dela uma espécie
t,t›ntrarreformateria absorvido
uma das bases daquela tendencia estética. de onde o cará ter
de telratégia dã SUL ã ÇÃ O catequizadora;
Ainda no tocante ã s suas origens em Portugal, é preciso levar em conta o pragmá tÍCO assumi-
@ }ce1as expressõ es da arte literária bã TTOCã ,
papel representado por Francisco Rodrigues Lobo (Leiria, 1573?-rio Tejo, 24 ãTticularmente as em prosa. 8Of dõ ncias
pqtt'o lado, a fusá o de propó sitos e ten
de novembro de 1621): nã o só serviu de nexo entre o magistério camoniano nem sempre coerentes expltci
e o Barroco, tendo de permeio o Maneirismo, como também colaborou para BarrOCO.
ii mú ltiplas facetas apresentadas pelo aracterísticasfu
a Posto isso, pergunta-se: quais aS c ndamentaisda t8tt1!
l›irroca7Primeiro que tudo, corresponde ã tentativa de fundir, numa unldfdt
peiíeiçáo, as duas linhas de força que condu•
smblciosa de simbolú gTã suma
' Os silogismos da 2• figura consistem em silogismos hiporéticos, em que a premissa menor é #tt#m o pensamento europeu ao longo do século XVI: o Bartoco procurou
sempre particular e negativa, e a conclusão sempre negativa. No pensamento escolãstico, o A designava
b A Todos os alunos do 2º ano fizeram exame. (premissa
t3nctltar numa síntese utó pica a
maior) r O Aquele aluno ulgamentos universais afirmativos, e o O, parti• visão do
nã o fez exame. (premissa menor) culares negativos. O caráter hipotético desse tipo
c O Logo, aquele aluno nao é do 2º ano. (conclusã o) de silogismo reside no seguinte: a conclusão
de postsbes. mundo medieval, de base ttoctntrt- de forma que se opcrarla a 6â !flt<*•

nega que o aluno pertença ao 2º ano apenas na hipó tese de niio ter telto exame, quando por
outras circunstâncias era fácil chegar à mesma conclusao. Com isso, descreve-se um clrfutto
desnecessário e complicado, Por dar margem a uma série de formoso combfn»çties, esie gine• 1
ro de toclocfnto nao raro mi em sllogtime ímpar topygJ4bg.
PARRO**
A LITERATU RA PORTUG UESA

Esse embate entre os dois pote s, de resultado sempre negativo, pois a anti- coisas. Trata—se,
nomía persiste ao fim e ao cabo, radica no problema do conhecimento da
rea- lidade. Entendendo se que conhecer e idcnti/car-se com, assimilar o poesia. Recebeu a
i i;1o co llstitui atributo inerente
e típiCo
objeto ao
sujeito, parece evidente que a dicotomia barroca (corpo e alma, luz e „ ti o seu representant
sombra, etc.) corresponde a dois modos de conhecimento. Primeiro,
consistiria na des- criçã o dos objetos, num estado de espírito que induziria a três COiSas: olhos, eSQelho e
SÃO necessarias
pensar-se num defi- Para ujTt hO1T1 sc ver a si mesm
rio cromá tico, em que se procurava saber o como das coisas. Conhecer seria
descrever, como se observa nestes poucos versos extraídos do Lampadá rio lx seem 9**°"“*""°””””"“
de Cristal”, de Jeró nimo Baia:
/¢jj, e há mister olhos”

“Lãinpadn soberana,
( pypy que se entenda,
inclusive num JQÇJO CS-
Digníssirna do templo da Diana.
tltempor á nea s,
Mas se nele tivera t tt,m tendencias interinfluentes e p processo
Vossa luz sua esfera, ‹ütoT: aO " P ” r cursos f4gbf3 OS XC linguagem
e
Com tal excesso brilha, ‹ opceptual, ConceptlSlTtO lâFtÇa máO DOS pp mtlitos casos, torna-se mesmo
Brilha tao sem exemplo, O n;gio da poesia
{$ pt2Cedimentos.
gongÓ riCa.
Que fora mais estranha maravillaa ,t¡l icil estabelCCRT
em a uma concepy8O
A lâmpada que o templo; Ambos os ‘islTlOS’ obedec procura criar um c!! ã
* ludismo VCtbã l
Que fota o templo emulaçúo do polo i noi ro Cnã ltecendo aS sillestesias,
De Diana por si, por vós de Apolo" (numa inferior, diScutíVed OU requintada, Õ R
està lo}qge da “torre de mó *8
’ simbolista.
Visto o processo descritivo implicar a utilizaçã o de metá foras e imagens 52ypre a eXíSte cia dum auditÓ tto
— forma-
para todos os sentidos (a chamada sincstesiu), e a poesó se exprimir sobretudo „gongóhcospa ece*P'ess’9o'
aO qual jjeces sariamente suas ObTdS deveriam
por meio de metá foras e imagens, resulta que essa tendência se manifesta no pares
,|,i ato menos de seus
tadainente em poesia. E recebe o nome de longoúsmo, por ser o poeta espa- econWnd"*«° ”8”' asno que O COlt—
ra hot Gongora o seu principal representante. Os seus adeptos procuram cultivar oS ‘”’
corvo dialetica, uma vii que organiza
e Serve
i mr:i linguagem rebuscada, preciosa, orçamental. E, para alcançá -la, conside- t¢ende-se a
‹’‹›iihcccr a essencia, ou melhor, saber o que sõ o, chegar aos conceitos que os t
i .tiii ele bom tom o emprego de neologismos, hiperbatos, trocadilhos, dubie-
li'li ncra. Pera tanto, utilizam-se da inteligência e da Razã o, sem pre ju íz‹a elos
t l,«lcs c todas as demais figuras de sintaxe que tornam o estilo pesado, tortuoso
s‹'nt tolos, /\o cat›s l/astico que resulta da dest'i iç)o pong‹irica, ti|iFic-st ii ‹irtlti
‹‘ .il;i rn l icado.
ii L:«'i‹i i mil tel, i, li1lii ,i, tf isc'ti rsiv.i, |ir‹i|a ri.i cl t' i i it' i i i {ii ‹i‹ lii a ‹'si:il ii‘ lr'i’‹'i
t l segundo modo pressupunha a aná lise dos objetos no cncalço dc lhes
sim›;iih
5t de coTlvencei e ensinar. COmQ

objetivos ecumê^1°OS,
ê para menos
3qmpanhia de
uma
A LITERATU RA PORTUG U ESA

Por outro lado, cumpre atentar para o fato de o Barroco teT começado
nas artes plá sticas. A pintura, a escultura e a arquitetura traduzem, mais a
primeira que as outras, a busca de conciliaçã o que vai no interior do Barroso.
O belo- feio, a linha torta, o excesso de pormenor, o desenho que foge do
ponderado, do “razoá vel”, ojogo do claro-escuro em que a sombra ocupa
lugar preponde- rante, sã o, a par de outras novidades formais, meios de
exprimir a procura da síntese das tendencias opostas no homem e na cultura.
Dessc ã ngulo, é das épocas mais vibrantes no terreno das artes plá sticas,
embora nã o o seja para Portugal, onde poucas vezes alcançaram maior nivel,
relativamente aos demais países europeus, incluindo a Espanha, onde a arte
barroca atingiu graus de primeira grandeza.
Enquanto literatura, o Barroco europeu implica um complexo problema,
que extravasa dos limites deste livro. Atenhamo-nos ao caso português. Do
â ngulo literá rio, o Barroco em Portugal nã o apresenta o brilho do século
ante- rior: será preciso aguardar o advento do Romantismo para a Literatura
Portu guesa sair da depressã o. Na quadra
seiscentista, encontramos figuras de
relevante porte, mas o todo, ou está impregnado de preocupaçõ es limitada-
mente literá rias, isto é, doutriná rias, filosó ficas ou de feiçã o mística, ou com-
posto de escritores isolados.
Falta à época uma “atmosfera” comum, tã o dispersos estã o os
intelectuais, guiados por cliches, ou padroes estéticos de alambicamento e de
forçado sen- tido literá rio. Falta à época a conexã o entre os homens de letras,
guiados por clichês ou padrÔ es estéticos de alambicaniento, de forçado
sentido literá rio, e apenas aproximados por coincidência, as mais das vezes
de precá rio poder aglutinador, embora as academias literá rias, historicas e
científicas, das quais a primeira foi a Acndemin dos SingtiIó tPCS (fundada em
Lisboa, em 1628), e uma das mais importantes, a Acndcmin dos Genc rosos
(fundada em 1647 por D. An- tÔ nio Á lvares da Cunha), procurassem sanar
essa falta. Somente ultrapassa o ramerrã o uma que outra figura, e, ainda
assim, nã o raro presa a compromissos políticos ou religiosos, a significar a
existencia de liga5õ es pouco literá rias.
Nã o obstante, a doutrina do Barroco suscitou, em Portugal, um amplo
tra- tado, escrito por Francisco Leitã o Ferreira (1667-1735), sob o titulo de
Nova
. Arte de Conceitos (2 vols., l718, 1721), num total de 934 pá ginas, fruto rlc 3tl
preleçõ es feitas ao longo de seis anos, na Acodcmin dos A nü nimris J‹'
Li.s1›o‹i, fundada em 1714, e ainda em atividade de pois ele 1720.
ARCADISMO
(1756-1825)

PRELIMINARES

Grandes transformaçõ es em toda a Europa, sobretudo na França,


agitaram a segunda metade do seculo XVIII. No campo das ideias, assinala
se como acontecimento de fundamental relevâ ncia a instalaçã o do pensamento
enciclo- pü dico de D'Alembert, Diderot e Voltaire, ocorrida em l75l , quando
o primei ro publicou o Discours Préliminaire de l’EncJclopédic, dando início a um
processo r ue culminou com a Revoluçã o Francesa (i 789). Esta, como é
sabido, veio a ser o símbolo acabado duma nova era na histÓ ria da
Humanidade. O lluminis- nao francês, baseado no culto das ciências, da
Razã o e do progresso, impreg- non larga audiência de intelectuais pelos
quatro cantos do mundo.
Portugal, malgrado o peso morto duma tradiçã o ideolÓ gica fundada em
rlogrnas e princípios imutá veis, nã o raro de estrutura medieval, conseguiu
.acompanhar o íluxo dessas mudarr;as. Primeiro que tudo, graças ao apoio
rl:ml o por D. Joã o V (que reinou entre 1707 e 1750) a Luís Antõ nio Verney
(1 .islaoa, 23 de julia o de 1.71.3 Roma, 20 de março de 1792): de ascendência
1\.inccsii, tlcpois c]i ii ;«lii.tolo em Teologia pela Universidade de Evora, vai ã
li .mia segui r ‹'ti i .ste st'i n‹'lli:ii i i ‹ s, lcvaclti por objetivos que logo se revelam
na
‹i l i i .i Jir i1.it*t“i;ii‹ i, t‘ i i i i li i'. v‹ili i ri it's, cJ tre Ja tiblic‹i anonirnarnc nte, cm 1.746:
ii ' i i li i i li l i ‹ i M ‹’f i ii li i i fi‘ l ' 11 i i f i i 1.1 i \' i ‹ l i t l . i t‘ i i i 1 (› ‹ ,i i i ;is , i i‹‘sl i i i i l i rii Vt’ i' i i t’y |i i ‹ i Ja‹ú t“
ARCADISMO ^ 145
144 • A LI'PERATURA PORTUGUESA

a reforma geral do ensino superior em Portugal com fundamento nas ideias C’.atarina; na tiaduçã o que D. F7ä nCisco Xaviei’ de Meneses (l6T5-l745),
iluministas. Ao programa ali expendido, seguir-se-ia a elaboração de manuaís
4* Conde da Ericeira, pub1İCOI1, Cm lö 97, da An PoétiqltE(l67d) de Boileau;
e compêndios redigidos segundo o novo credo, dos quais alguns chegam a
Jose xavier Valadares e Sousa, centrado no elogio
țiO mQme CritiCo (1739), de
sair, como De Re Logica (175 l), De Re MetnpltJsicn (1753), Crdmríiico Lntina Verney.
t|a Razão, da Verdade e da imitasao da Natureza; e nos escritos de
o a onta de n eoclassiClSlflO, 8.ÇáS ä ienascen-
(1758), De be Physica (l7ö 9). Com Verney, entra em crise o ensino ieligioso e Pouco a pOucO, ¥ã Í crescend
pelos antigOs, notadamente Aristó teles,
teorizante de
ça das doutrinas literárias ensinadas e
cOlabora eficazment O labor
medieval entã o predominante nas escolas portuguesas. Horácio e Quintiliano. Para tanto,
Em consequëncia, a Universidade transforma-se: a partir de 1759, com a
Francisco José Freire 1719-MaÍra, l T73), ou Cã ndido Lusitano
de
expulsão dos jesuítas, a escolaridade aos poucos laiciza-se e abre-se às ideias
(LiSboä,
novas que circulavam além-Pireneus, rompendo um cerco que durava quase pscudô nimo, autor de uma Arle pyznro (1748 , m Dicionö rio POéliCO 1765)
dois séculos, nos quais era marcante a influëncia espanhola. c Rene gS SOkTC a Linen Portuguese tl842), obras em que, a par das ideias da-
É o Marquis de Pombal (1699-1782) quem centraliza o empreendimento: queles escritores greco-latinos, diWlga doutrinas de pensadores mOdCínOS,
ministro de D. Josë 1 (que sucede a D. Joä o V e reina atë 1777), promove nu-
Escalígero, Addison e PCipe.
rlcntie os quais Boileau, Muratori, Castelvetro,
merosas medidas tendentes a colocar Portugal no nível da cultura europeia,
Atčque,em 17ã 6, se funda a Arcä dia Lusitana (StTllLÍar Û II cä dia Roma-
especialmente a francesa, e incrementa a instalaçäo do tõeailo iluminista, ain-
Antö nio Dints da Cruz
na, instaurada em Roma, em 1690), pOr inìciativa de
da que adaptado à s suas direrrizes individualistas e ditatoriais, na linha do
Esteves Negrã o e Teotò nio Gomes de Carvalho. A C-
c sity a, Manuel Nicolau
chamado “déspota esclarecido”. Para colaborar no movimento, em lugar de tgt de numerosos percalços, dissensö es internas, ataques, afastamento de
até l774. Além dos jä referidos,
sficios, etc. , a ArCä dia Lusitana vingou
Verney coloca o pedagogo Antô nio Nunes Ribeiro Sanches (1699-1783), mas per- Pedro Antö nio Correia
lenciam à agremiaçä o os seguintes letrados:
limitando-lhe a influência e a projeçä o. Com a importaçã o de professores es- GalÇä O, Freire e Manuel de
trangeiros, a Universidade conhece uma fase de agitaçä o e intensa atividade Domingos dOs Reis Quita, Francisco J osé
científica e filosofica. Por outro lado, o terremoto de Lisboa 1755), destruin- Figueiredo. Re-
oclässica, expressa em boa parte pelos
tiiam-se pela Õ oDtTina arcädica, ou ne
que Correia Garçã o proferiu em algu-
do parte considerävel da cidade, permite a Pombal demonstrar capacidade e cstatutos da academia e pelas oraçö es
tino administrativos, que doravante ficaräo associados ao seu nome: uma cida- mas de suas sessoes. o te Ú díO
i cdi truncat, desejam testemunhar
de nova, moderna, ampla, arrojada para os padrÕ es do tempo, a “Lisboa pom- Tendo por norte a divisa pesadamente a poesia bãHOCä. E julgando
balina”, surge dos escombros. ès coisas inuteis que adornä Vă m
Com a queda de Pombal, toma a dianteira dos acontecimentos um grupo OIlÕÙYã TO desequilíbrio e ä decadênciä
que esta te ndência eStétlCã COTT2S
dos upremacia da autëntica
poesia
de homens mais on menos emudecidos até ä data, dentre os quais o Duque de titres clä ssicos, propö em-se a restaurar a s
Lafõ es, que funda, em 1780, a Academia Real das Ciências, segunda academia consegui-lo, empreendem uma viagem no passado
rezando
mais remo-
0 BaHOCO,
classica. Para
oficial portuguesa (a primeira foi a Academia Real de Histć*ria, fundada em 1720), Centiada nO pTopó sito ò e equiparar-se, já em seus princípios,
já em fontes originá rias do ClaSSicism o. Desp
to, em busca das
XVI e dele aceitam 0 pastoralismo e a poesia camoniana,
detëm se no século
suas realizaçö es, às similares espalhadas pela Europa. visto coinctdirem com o ideal que eles, os ä iCades, pretender alcan5ar. Sãl-
Respira-se um clima de efervescência cultural, no dual imerge a estética medievai s, que a seu ver tinham lä rfÇßdO no es-
tando pot sobie os stculos
li- terã ria do Arcadismo. As primeiras manifestaçõ es antibarrocas vëm de clasdca, chegam à Antiguidade greco-latina, finn da
longe: jfi na -?ntx Rennscida começaram a aparecer notas satiricas contra
exageros benocos (ë o caso da poesia dum Tomfis de Noronha e ğoç Oiogo
Camacho?. ldłnt co Sentiments Serra no 5er4o Polïttco cas

Qucclmento B 1 '##"°
Arcãdta, região gregø de pasț0rese poetas viven-
øømptøtĆtlCa,ÌO00Ìl¥G* *#* *®"""
ARCADIS MO 147
J46 ' A LITERAT URA PORTUGUESA

É com base no mito da Arcá dia que erguem suas doutrinas: destruindo a Para bem mpreender esse quadro hiStÓ fiCO, convém que tenhamos em
“hidra ho mau gosto”, que se havia apoderado da poesia barroca, procuram
X VIII, ta1V« mais do que qualqller outro, e sVi geuens |9OC
‹ ‹enta que o século
realizar obra semelhante à dos clá ssicos antigos. Daí que a imitac0o dos mode-
cultural g CStêí\Ca, marcada con(1uencia de vertentes an-
,int
pelacomp!exi a e
los greco-latinos seja a primeira característica a considerar numa sinopse da p ermanecer agente até a metade
1,igíonicas: piimeiTO,d m raz ã o de o BaTTOco

estética arcá dica. O mais vem por desenvolvimento dessa ideia-matriz: elogio yden i fato óe q ue não so as suas coletá reas poétiCaS
‹ l ‹ ssa centú ria, e C á o
(oram publiCafi0S
CO1TIO
da vida simples, sobretudo em face da Natureza, no culto permanente das ni:iis representativas,
vir- 761—1762<, as tambêm a obra de autO£8S
tudes morais; fuga da cidade para o campo sugere urbem), pois a primeira é i ‹ sJaectivamente em i716—1728 e 1 SOrOí MEnA dO Céu, SÓrOi
l ›:u rocos, como mà s Pinto Brandão, ViOlan'’ dO
de Pina
considerada foco de mal-estar e corrupçã o; desprezo do luxo, das riquezas e
das ambiçõ es que enfraquecem o homem; elogio da vida serena, plá cida, pela t éu Frei Antô nio das Chagas, ou de um gotlgorizantecomo Francisco
quando a estétlCa bã tFoca parecia tombã ¥ FtO
superaçã o estoica dos apetites menores; elogio da velhice como exemplo desse ‹ Pelo (RtrflÕ S l 7i7J , veio à luz
dessa
ideal tranquilo da existencia, da aurea mcdiocritas; apologia da espontaneidade ‹ «gus ulO. Nã o menos expressiva
ilaçÕ es da d utú na barroCa, ü c Fran-
primitiva, pré-civilizada; por outro lado, o gozo pleno da vida, minuto a mi- p
l72l)c6eManud
nuto, na contemplaçã o da beleza e da Natureza, pressupõ e epicurismo, que i ‹, quartel Setecentista, Õ ãS CCO ã ÍS COTI1
equilibra as tendências estoicas do movimento; por fim, a incidental presença
Dã S ã cademias barrocas continu-
t i Fonseca BOrTalhO (L9ZCS dd
da Virgem Maria explica-se pelo fato de que os seguidores do Arcadismo
assu- ainda muito signihCativo que algumas dos Ocultos, de
miam a condiçã o de neoelú ssicos cató licos. ã Academ'‘
Quanto ã orientaçã o literá ria propriamente dita, ainda seguem os mode- ;issem atuantes Até o terremotO dC 1755, COlTiO
‹que RcataTÍ1 SCÍS codices com o registro das suas
sessõ es, um “fabuloso reposi-
¡ittygtiã do século XVIII portugues, porvel!ttt'ã uma dãs
los antigos (defendem a separaçã o dos gêneros, a aboliçã o da rima, o empre- torio da atifid8'd8
possuímos" (joã o Palma— Academia DOS
go de metros simples, o despojamento do poema, a importâ ncia da mais ricas coleçÕes que
Ferreira)a,
mitologia), ao mesmo tempo que procuram suporte nos teó ricos dO tempo, /\nõnimos, na qual dos
MDTã tOT1,
Luzá n entre outros, Boileau à frente. Adotam pseudõ nimos pastoris para tor- expressivã s, em
nar mais verossímil o “fingimento poêtico” e imaginam se vivendo num dos Escolhidos, alem de outras menos
mundo habitado por deuses e ninfas, em meio a uma Natureza e um tempo Guimarã es e Santarem. nessa
iluminlsta também exerceu influência
fictícios, utó picos. Acrescente-se que a estética
A ievalorizaçã o do estilo de vida preconizado pelos antigos vai dar azo, não raro em coexistên Clã COJTI â doutrina arcadica ou neocláSSiCã, O
}OO •, s
graças ao princípio reinante da imitoçõo, ao cultivo duma poesia de pose, arti- vinculada ao estilo RocOCÓ ,
ficial, demasiado literá ria, porque em flagrante contraste com o clima histó ri-
resultantes do Barto° m declínio. Ou fie outras
rom;iI1tlCã ,
co cultural duma epoca em que, ao desenvolvimento das ciencias, se adiciona que anunciavam o advento da revoluçã o
o franco progresso urbano por via da industrializaçã o, para apenas Teferir dois Pré-RomantiSmO
aspectos relevantes do século VIII europeu. Constitui uma forma de exílio
voluntá rio, uma vida em “torre-de-marfim”, ideologicamente regressiva,
opos- ta à ideia de pTOgresso que o lluminismo defendia, idêntica à de punha metacle do século
outros ho- reis de,1etras em condiçõ es semelhantes, no século XVI e na
Antiguidade, ao lugircm para as “vilas” nos arieóotes das grandes cidades,
por aborrecc-las e jiilpú -l.is imagem ela decadê ncia e devassiil3‹i,
148 A LITERAT URA PORTUG UESA

Em terreno mais prÓ ximo da estrita atividade literá ria, observa-se,


contu- do, a tentativa de construir uma ficçã o de estrutura novelesca,
segundo os moldes iluministas, como é o caso do Padre Teodoro de Almeida
(Lisluoa, 7 de janeiro de 1722- i8 de abril de 1804), autor do Feliz independente
do Mundo c du Fortuna (3 vols. , 1779), longa narrativa moralizante em torno
dum episó - dio da histó ria da Polô nia passado no secu1o XIII, e que seria
largamente lida e difundida ate meados do seculo XIX; e de Rrcrcnçó o
filosófica, ou Diá logo so-
6re a Filoso/a N iuraL . . ( 10 VOIS. , 175 1- 1799) , Sc rmÕ es (3 VOIS. , 1787), LisÕ O
Destruída, poema (1803).
Ou de Teresa Margarida da Silva e Orta, nascida em S. Paulo (1711) e
falecida em Portugal (1793), para onde se mudou em tenra idade. Irmã de
Matt as Aires, publicou em 1752 uma novela alegorizante, intitulada
MÕ ximns de Vi rtuúe e Formosu ra, com que Diô]anes, Climcneici e Hemirc nn,
Príncipes de Te- fins, vence ram os mais apertados lances da desgraça..., sob o
pseud0nimo de Do- tothea Engrassia Tavareda Dalmira. Com o título mudado
para Aventuras de Dió Janes, sai em 1777 a segunda ediçã o, ainda encoberta
pelo mesmo anagra- ma. Passados treze anos, republica-se pela terceira vez,
e agora se indicava, er- roneamente, o nome de Alexandre de Gusinao como o
seu autor. Dividida em seis livros, e mesclando valores cristã os à mitologia
greco-latina, a novela tem objetivos nitidainente pedagÓ gicos, doutrinais:
colaborar na formaçã o moral e Politica do herdeiro ao trono português.
lendo por modelo as AvcnttifcS de
Téltmaquc (i 699), de Fénelon, como aliá s declara o título da segunda ediçã o,
a narrativa oscila entre o lluminismo emergente e o Barroco agonizante.
Maior atençã o mcrece o teatro, seja pela traduçao e adaptaçã o de peças
francesas e clá ssicas, seja pela criaçã o de peças nacionais, mas sem lograr
êxi- to. Esforço digno de nota, embora infecundo, o realizado por Manuel de
Fi- gueiredo (1725 i 801) em primeiro plano (Teatro, 13 vols. , 1804-1815),
seguido por Correia Parçao e Domingos dos Reis Quita, visando a dotar o pal-
co português dum teatro à altura dos novos tempos.

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