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sem conhecê-la; e ii) a teoria gramatical que circula nas salas de aula
(notadamente oriunda da Gramática Tradicional) é incompleta e confusa.
Por sua vez, Antunes (2003), ao traçar um panorama da aula de
língua portuguesa e tratar especificamente do trabalho em torno da
gramática, constata que esse trabalho é comumente perpassado por
uma gramática descontextualizada, fragmentada, baseada em questões
irrelevantes e voltada para a classificação e a nomenclatura de unidades
linguísticas. A autora atribui esse tratamento da gramática a uma visão de
língua uniforme e inalterável, bem como a uma tendência essencialmente
prescritiva. Acrescentamos à composição desse cenário o isolamento da
gramática em relação a outras competências do ensino de língua portugue-
sa (leitura, escrita e oralidade); o privilégio de atividades mecanizadas,
com o objetivo de identificar, definir, classificar e substituir elementos
linguísticos, sem a devida reflexão sobre as motivações subjacentes; além
da ausência de uma fundamentação clara para o trabalho com gramática.
Essas considerações fazem-nos perceber que o ensino de gramática
ou o trabalho com tópicos gramaticais na sala de aula de língua portu-
guesa tem sido alvo de amplo debate. Há muito, advoga-se, no campo do
ensino de língua, que a atividade de produção e compreensão de textos
e o desenvolvimento da competência comunicativa sejam os elementos
centrais da aula de língua portuguesa.
A centralidade do texto no ensino de LP é uma premissa que foi
incorporada às orientações curriculares oficiais de nosso país há bastante
tempo, desde os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (BRASIL,
1998). Esse documento traz, de forma muito clara, a ideia de que “a
linguagem se realiza na interação” (BRASIL, 1998, p. 25) e que a uni-
dade básica de estudo da língua é o texto, e sua função comunicativa é
a razão do ato linguístico. Uma vez que o texto é compreendido como
lugar da interlocução entre sujeitos e produto da atividade discursiva,
a compreensão e a produção de textos constituem os reais objetos de
ensino de língua.
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2 Trata-se do modo de codificação, na BNCC, das habilidades a serem desenvolvidas pelos alu-
nos: as letras iniciais designam a etapa da Educação Básica, no caso, Ensino Fundamental; os
dois dígitos intermediários referem-se às séries/anos (6º ao 9º ano); LP codifica o componente
curricular Língua Portuguesa; já os dígitos finais dizem respeito à sequência do conjunto total
de habilidades (habilidade 20).
3 A escolha dessas obras deve-se às pesquisas referidas na nota 77.
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No município em que ele mora, diz Isaac, não há muitas coisas legais
para se fazer na rua. A casa onde ele vive com os pais fica em Francisco
Morato, a cerca de 30 quilômetros do centro de São Paulo.
“Aqui não tem muito lugar pra ir, não tem livraria, parque. Sou
filho único e nas casas do lado não tem crianças da minha idade, então
eu tenho que usar muito a imaginação aqui em casa pra brincar”, explica.
Ele diz que é “bem criativo” e até inventa seus próprios jogos, além
de gostar muito de ler. Mas, mesmo assim, a tentação do eletrônico tem
sido grande nas férias da escola. Isaac não tem um aparelho próprio, e
pega emprestado o da sua mãe, Luciana.
[…]
Recentemente, ele leu “Desligue e Abra” (editora Moderna), do
escritor Ilan Brenman. O autor conta que teve a ideia de fazer este livro
enquanto caminhava despretensiosamente, e imaginou como seria a vida
se ele fosse, em vez de humano, um livro.
Ilan foi ainda mais longe na viagem: se ele se transformasse nesse
tal livro, o que ele diria? “Eu ia querer dizer para as crianças que eu sou
melhor que o celular, e que eu posso provar isso”, fantasia ele.
[…]
“Desligue e Abra” segue a ideia original de Ilan, e “fala” com o
leitor como se o livro estivesse realmente ali trocando uma ideia. Nisso
surgem propostas de brincadeiras que vão desde cantar com voz fininha
e depois bem grave, até arremessar o exemplar para o alto, sem dó.
“Por mais que ele tenha ficado um pouquinho arrebentado depois
que eu li, eu amei esse livro. Ficou assim porque ele pedia pra jogar ele
pro alto e bater palma três vezes, e eu tentei umas 24 vezes e ele caiu no
chão. Coitado dele. Mas vou informar aqui rapidinho que o livro passa
bem, ele está na estante”, brinca Isaac.
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Sofia C. tem 13 anos e também acha que, nas férias, vem usando
mais o celular. “Tô usando bem mais do que quando estava indo pro
colégio. Uso Tik Tok, Instagram e eu também edito imagens”, conta.
[…]
“Minha família até pede pra eu ficar sem celular, mas, infelizmen-
te, às vezes eu não consigo sair dele, pois ou estou assistindo vídeos
engraçados no Tik Tok, tipo meme, ou estou entediado, ou ainda estou
jogando Fifa 23 mobile”, diz Théo C., de 13 anos.
“A criança não vai pôr limites, quem põe limite é a família. É ela
quem tem que saber que o celular está dando problemas na coluna das
crianças, nos olhos, problemas cognitivos e de ansiedade”, defende Ilan
Brenman.
Nas primeiras páginas de “Desligue e Abra”, o livro deixa claro
que “sabe” o quanto é difícil deixar o celular de lado, que é preciso se
esforçar para resistir à vontade de ficar com ele.
[…]
E, antes que alguém pense que Ilan estaria sugerindo que todo mundo
viva sem celular, ele explica que não é exatamente isso. “Eu também
uso o meu celular, óbvio, mas a questão é que temos que ter bom senso
e parcimônia”, fala.
[…]
Para Ilan, essa parte é realmente importante: ainda que o celular
ocupe uma parte do dia a dia das crianças, ninguém esqueça como é
que se brinca. “Na história do Peter Pan, ele esquece como era ser
criança. E é triste pensar que as crianças de hoje, quando crescerem,
podem não ter mais lembranças de que brincavam quando pequenas”,
imagina o escritor.
“Se você não fabricar lembranças, se ficar só nas telas, pode ter
consequências desastrosas. Eu acho que no futuro o celular vai vir com
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outros valores semânticos: modo (com voz fininha, sem dó, no 8º pará-
grafo), direção (para o alto, no 8º parágrafo), reforço/confirmação (re-
almente, no 8º e no penúltimo parágrafos) e avaliação (infelizmente, no
11º parágrafo). Destacamos que alguns desses valores merecem análise
específica, uma vez que, por exemplo, não são contemplados em livros
didáticos nem nos compêndios gramaticais mais tradicionais, além de
alguns elementos que os codificam não representarem necessariamente
adjuntos adverbiais. Mais adiante, faremos considerações a respeito.
Cabe lembrar que o encaminhamento aqui proposto é o de sempre
analisar com os alunos a funcionalidade dos fatos linguísticos estudados.
Assim, também vale para os elementos referidos no parágrafo anterior
discutir o papel que cumprem no texto: explicitar, por exemplo, que
com voz fininha, sem dó e para o alto estão relacionados às formas de
interação com a obra Desligue e Abra sugeridas ao leitor. Também é
oportuno dizer que a concepção desse livro tem relação direta com o
tema discutido na reportagem.
Ainda na esteira da diversidade de elementos adverbiais presentes no
texto e de circunstâncias a eles relacionadas, propomos que o professor
também discuta com a turma o emprego de um mesmo elemento com
valores semânticos distintos. Nesse sentido, sugerimos que os alunos
sejam instados a cotejar os usos de aqui no quarto parágrafo (Aqui não
tem muito lugar pra ir) e no primeiro (Um videozinho engraçado aqui).
De igual modo, é oportuno instigar a turma a confrontar a ocorrência
de bem no quinto parágrafo (bem criativo) e no nono parágrafo (o livro
passa bem). A ideia é que seja oportunizada uma discussão, em grupos,
de modo que os alunos consigam perceber que, no primeiro uso, aqui
remete a um lugar concreto (o município de Francisco Morato, em São
Paulo). Na outra situação, contudo, não há referência a um espaço físico.
Esse termo é empregado, em conjunto com o aqui, para a organização
sequencial (temporal) de atividades feitas ao celular, as quais tomam
muito tempo do usuário: assistir a um vídeo engraçado; depois, a “uma
thread polêmica”; em seguida, a “um post de terror” etc. No que diz
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cidade onde o garoto Isaac mora: no município em que ele mora (con-
junto de palavras, incluindo verbo), em Francisco Morato (mais de
uma palavra, mas sem verbo) e aqui (uma só palavra). Seguindo essa
identificação, o professor discute com os alunos a natureza categorial
das formas de representação dessas relações circunstanciais (advérbio,
locução adverbial e oração). Nesse momento, é oportuno ao professor
retomar, caso os alunos tenham estudado em séries anteriores, a cate-
goria do advérbio, seus valores semânticos e expressões formadas por
preposição + Sintagma Nominal com valor circunstancial (as chama-
das locuções adverbiais). Também sugerimos que seja solicitado aos
alunos identificar mais elementos circunstanciais presentes no texto,
observando o modo de codificação.
No que diz respeito ao segundo fator de ordem morfossintá-
tica que mencionamos, cabe ao professor analisar com os alunos
a que elementos do texto os termos de ordem circunstancial estão
vinculados/relacionados. A ideia é que o professor oriente a turma
a observar os usos desses termos e a perceber sobre que conteúdo
recai a circunstância/conteúdo expressa/o. Assim, por exemplo, no
caso de “eu tenho usado mais o celular” (2º parágrafo), o intensifi-
cador mais incide sobre o conteúdo do verbo usar; em “Ele diz que é
‘bem criativo’” (5º parágrafo), a intensificação de bem recai sobre a
semântica do adjetivo criativo; no trecho “Ilan foi ainda mais longe
na viagem” (7º parágrafo), o advérbio mais intensifica o conteúdo
do advérbio longe; já em “[…] mas, infelizmente, às vezes eu não
consigo sair dele […]” (11º parágrafo), o conteúdo de infelizmente
incide sobre a oração “às vezes eu não consigo sair dele”. Com esse
procedimento, o docente oportuniza aos alunos conhecer diferen-
tes possibilidades de escopo dos elementos de natureza adverbial,
expandindo a abordagem da perspectiva adotada por compêndios
gramaticais mais conservadores e por livros didáticos ao considerar
o adjunto de sentença (MARTELOTTA, 2012; CASTILHO, 2010)6.
6 Destacamos que alguns termos técnicos aqui mencionados, a exemplo de intensificador e
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evento, são dirigidos ao profissional docente, podendo ou não ser utilizados para os alunos,
conforme o nível de compreensão da turma. Sugerimos o uso da metalinguagem corriqueira
e conhecida dos alunos, como é o caso da categoria gramatical advérbio.
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Considerações finais
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