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11/11/2023, 15:13 Os erros da Filosofia Perene - MONTFORT

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Polêmicas
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Os erros da Filosofia Perene

PERGUNTA

Nome: Heloísa Gusmão


Enviada em: 01/03/2018
Local: São Paulo-SP, Brasil
Religião: Católica

Recebemos de Heloisa Gusmão, nossa amiga e leitora, uma carta contendo um estudo aprofundado sobre as doutrinas relacionadas à “Filosofia Perene” defendida por Olavo de Carvalho e pelo
professor Antônio Donato Paulo Rosa, com repercussões nos ensinamentos do Padre Paulo Ricardo.

Apesar de extenso e com longos pedidos recomendamos a sua leitura atenta para que se possa avaliar de forma adequada o pensamento desses autores cujas ideias, muitas vezes, são
erroneamente relacionadas aos ensinamentos tradicionais da Igreja Católica.

De nossa parte, ao terminar a leitura deste trabalho nos veio a mente parte da transmissão feita por telex por um jovem “repórter” húngaro em 4 de novembro de 1956 do prédio de um jornal em
Budapeste enquanto lutava contra as tropas da antiga União Soviética. A transmissão teve início às seis e meia da manhã:

“...Há aviões sobrevoando, mas são tantos que não dá para contar. Estão chegando longas fileiras de tanques. Já atiramos em nosso prédio, mas ainda não houve nenhuma baixa. O estrondo
dos tanques é tão alto que aqui ninguém consegue ouvir o que os outros estão falando.
Agora eu tenho que ir de novo para a sala ao lado de alguns tiros da janela. Mas vou tentar voltar se houver alguma novidade”.

“Acabaram de disparar um tiro perto daqui. Agora há uma luta pesada na direção do Teatro Nacional, perto de nós, no centro da cidade. Em nosso prédio temos jovens de 15 anos de idade e
homens de 40 anos. Não se preocupem conosco. Somos uma nação pequena, mas somos fortes...” (Doze dias: a revolução de 1956. Victor Sebestyen p. 31).

Pouco antes das onze da manhã, a linha caiu, e o repórter não voltou mais.

Que Nossa Senhora não permita que nossa linha caia e que estejamos sempre na janela...

O CLUBE SECRETO DA FILOSOFIA PERENE

(Calvin: Novidades, Haroldo! Estou criando um clube secreto e você pode participar dele!
Haroldo: Ah, garoto!
Calvin: Vai ser demais! Nós vamos inventar nomes secretos pra gente, códigos secretos para as nossas correspondências secretas, um cumprimento secreto,
Calvn: Teremos uma sede secreta com um toque secreto para entrar e vamos fazer coisas bem secretas mesmo!
Haroldo: Mas por que todo esse segredo?
Calvin: As pessoas te dão mais atenção quando pensam que você está tramando alguma coisa.)

Prezado professor Alberto,


salve Maria!

Li, na página do Facebook da Montfort (https://www.facebook.com/Associacao.Cultural.Montfort/) , sua breve resposta a um consulente que perguntava sobre as aulas do Donato. Muito me
impressionou a ocorrência de alguns defensores do “são Moita” que se recusaram a apresentar argumentos às suas considerações, mas se reduziram a atacar a Montfort
(http://www.montfort.org.br/) e o senhor. Mesmo sem conhecer o Donato, o senhor foi justo em relatar o que se ouve em todas as partes acerca do ilustre desconhecido: modernismo ao defensor
das reformas litúrgicas do Concílio Vaticano II, envolvimento com movimentos direitistas e “neoconservadores” da Igreja, a amizade com o Olavo de Carvalho, o uso do termo “filosofia perene”...
Além disso, o senhor fez bem em mostrar que é péssimo sinal o ensinamento oculto de doutrinas. Um dos ataques mais “curtidos” afirmava que o senhor não tinha o que fazer da vida, por vir a
público responder uma pergunta sobre o Donato desconhecendo “a obra GIGANTE” dele, que só sobre a Santíssima Trindade teria 151 aulas (o que demonstra desconhecimento da parte do
defensor, pois eu tenho e ouvi 199 aulas só deste curso e tenho uma centena de outras aulas dele que, desde 2013, vinha ouvindo diariamente, junto à leitura do “site do Cristianismo” e demais
obras indicadas por ele no site do MicroBook Studio). Creio que é justamente por ter mais o que fazer - e já ter perdido tempo o bastante na TFP - que o senhor não se dedica a ouvir todas as
doutrinas de todas as pessoas que se apresentam como mestres de santidade ou gurus de sabedoria e alta cultura Brasil fora (e convenhamos que está para nascer quem nos faz o favor de
escrever a “História dos Gurus Tupiniquins”). Mas é intrigante como um argumento tão nominalista pode ter vindo de um defensor do Donato, que prega que a sabedoria é aquele que julga os
princípios, que sabe dizer a verdade de todas as coisas e estabelecer a relação causal entre todas elas. O próprio Donato, no curso de Filosofia moderna que veio recentemente ao público na
internet e se interessou por toda esta discussão, não julga página por página das obras de Newton, Kant, Schelling, Hegel, Marx etc, pois ensina que os erros destes autores “estão na primeiratopo
página”, ou seja, nos princípios. Ensina também os primeiros princípios da filosofia aristotélico-tomista e instrui os alunos a julgarem todo o resto à luz destes princípios. Por que então, quando se

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trata do próprio Donato, teríamos de estudá-lo exaustivamente antes de emitir uma opinião sobre de um ensino local, ou de uma heresia que ele defende e ensina, ou da forma secreta como
ensina, ou de suas suspeitas companhias , se é possível que haja um princípio (como, por exemplo, um ensinamento da Igreja ou a experiência com gurus de seitas etc) que nos permita julgar
que algo nele é contrário aos princípios que devemos seguir ou muito alheio ao que a Igreja recomenda como ensino seguro?!

Este é o mesmo argumento usado por Olavo de Carvalho: seus críticos nunca o leram o bastante ou, quando o leram, nunca o entenderam e fatalmente nunca o entenderão na totalidade de sua
obra a fim de criticá-lo com propriedade, a menos que se tornem seus alunos e, para isto, fazer cinco anos de voto de silêncio e ter a docilidade de aprender dele não somente o conteúdo, mas
também a forma de seu pensamento, use o método de suspensão da descrença (“suspensão da descrença”) e tenha fé de que um dia o compreenderão o suficiente para só aí criticá-lo em algum
ponto em particular. Deveríamos esperar, então, a publicação da grande obra metafísica que há anos Olavo promete, para somente então alertar as pessoas de que ele está no erro quando ele
ensina alguma proposição filosófica com consequências teológicas modernistas, ou quando ele diz que o Papa Francisco não é papa ou que Dom Odilo “não é bispo, nem padre nem nada,
apenas um excomungado”? Quer dizer que se alguém, ensinando filosofia, nega o princípio de não-contradição, devemos primeiro nos tornar discípulos do sujeito, esperar a publicação de toda
sua obra para poder afirmar que ele está errado em negar um princípio sem o qual todo o resto de sua obra, por extensa que seja, cairá num completo absurdo? Se alguém, ensinando a Doutrina
católica, nega ou distorce uma verdade de Fé ou faz uma afirmação histórica estapafúrdia como o faz o Donato, precisamos de analisar todo o pensamento dele para enfim dizer que aquela
afirmação é errada? Esta foi a acusação que padres modernistas, de inúmeras vertentes, fizeram a São Pio X quando a redação da Pascendi. Segundo estes, o Papa não poderia colocar num
mesmo grupo todos os hereges de então, dadas as discordâncias internacionais entre eles e a ignorância do sumo pontífice de todas as sutilezas e particularidades doutrinárias dos hereges. Mas
São Pio X, com sabedoria exemplar, julgou os princípios em comum que os uniam, encontrando um gênero próximo e uma diferença específica, categorizando-os então em modernistas filósofos,
modernistas crentes, modernistas historiadores, modernistas críticos e modernistas apologistas. E assim respondeu aos seus críticos:

“Talvez que na exposição da doutrina dos modernistas tenhamos parecido a alguém, Veneráveis ​Irmãos, demasiadamente prolixos. Isso, porém, foi de tudo necessário, tanto para que não
continuem a acusar-nos, como costuma, de ignorar as suas teorias, como também para que se veja que quando se fala de modernismo não se trata de doutrinas vagas e desconexas, mas de um
corpo uno e compacto de doutrinas em que, admitida uma, todas as demais também o devem ser (…). Se, pois, de uma só vista de olhos atentarmos para todo o sistema, a ninguém causará
pasmo ouvir-Nos defini-lo, afirmando ser ele a síntese de todas as heresias” . ( Encíclia Pascendi Dominici Gregis (http://www.montfort.org.br/bra/documentos/enciclicas/pascendi/) )

Assim age um santo pontífice quando segue par e passo os ensinamentos de Santo Tomás, que, no início da Suma Contra os Gentios, ressalta a dificuldade de lidar com cada um dos erros:

“ Primeiro, porque não nos são bastante conhecidos as palavras sagradas de cada um dos que erram, para que elas possam tirar os argumentos e destruir-lhes os erros. Foi deste processo que
obtiveram os antigos doutores para destruir os erros dos gentios, cujas posições puderam conhecer por terem sido eles mesmos gentios, ou, pelo menos, com eles tiveram convívio e assim
conhecerem-lhes as doutrinas. Segundo, porque entre os que erram, alguns, como os maometanos e os pagos, não aceitam, como nós, a autoridade de algum texto das Escrituras, pelo que
possam ser explicitados. Por meio deles, no entanto, podemos disputar contra os judeus, usando o Velho Testamento, e contra os heréticos, usando o Novo. Mas não o podemos contra quem
não aceita nenhum dos dois. Por esses motivos, deve-se recorrer à razão natural, com a qual todos são obrigados a concordar. Além disso, ao investigarmos uma verdade, adicionalmente
mostraremos os erros por ela excluídos e como a verdade racional concorda com a fé da religião cristã. " (Contra Gentios, I, 2).

Apesar da presença sapiencial de educadores educados por Donato, a discussão na postagem do Facebook se tornou indignada não somente de homens saudáveis, mas também de pessoas
o mais minimamente educadas, donde a Montfort transferiu a discussão para o site. Foi quando o senhor pegou algum material do Donato e publicou o artigo, pelo que lhe sou grata, pois é
vergonhoso ver como aceitamos ou obnubilamos nossa consciência diante de mentiras em meio a verdades, convencendo-nos de que aquelas são meras imprecisões ou erros inofensivos ; que
as verdades apresentadas suprem os erros e que “o inimigo do meu inimigo é meu amigo”. Isto nunca trabalhou com os católicos, que sempre foram alvo tanto da esquerda, quanto da direita. No
seu artigo é mais que provado que a noção de sabedoria do Donato, centro e auge dos ensinamentos dele, é uma noção paga e iniciática, mas ainda poderia parecer temerário, ao leitor
desavisado, o nexo que o senhor encontrou entre os elogios ao Donato que faz Olavo ao longo do Curso Online de Filosofia (COF) e o uso, por parte do Donato, do termo “filosofia perene”, dado
que no livro “A Educação Segundo a Filosofia Perene” o Donato mostra sentido por esta expressão algum núcleo filosófico comum entre o pensamento de Platão, Aristóteles, Santo Agostinho e
São Tomás, o que parece algo bem distinto do pensamento de Guénon, Schuon, Coomaraswamy e demais autores da escola “tradicionalista”:

“ Nossa intenção neste trabalho será examinar os princípios básicos da educação segundo a filosofia perene. Por filosofia perene entendemos aquela filosofia que, embora transcenda as
estatísticas históricas em que se desenvolveu, tem como seus representantes mais conhecidos Platão, Aristóteles, Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino, embora a ela pertençam, de fato, a
maioria dos filósofos gregos, patrísticos e medievais, além de uma multidão de outros pensadores posteriores e mesmo contemporâneos ”. (São Moita, A Educação Segundo a Filosofia Perene.
p. 7)

Pois bem, como pode se dizer tomista um professor que, nas primeiras linhas de um livro que pretende ensinar como educar pessoas para a mais excelsa sabedoria, não consegue oferecer
sequer uma definição clara e precisa daquilo em que ele próprio se baseia para fazer a tese ? O conjunto da “maioria dos filósofos gregos, patrísticos e medievais, além de uma multidão de
outros pensadores posteriores e mesmo contemporâneos” consegue a proeza de ser maior que a da torcida do Flamengo. Na verdade, o erro está na primeira página. A vagaza do que se
apresenta por filosofia perene é tão latente que qualquer autor poderia ser encaixado ou tirado dela segundo o que fosse mais conveniente ao autor, uma vez que este não determina um sorteio
pelo qual os leitores poderão, com ele, julgar racionalmente quem são os filósofos que fazem parte do que ele entende por filosofia perene. Ao contrário, exige-se uma confiança cega de que o
Donato é quem sabe quem são os filósofos que tomam café com Platão, Aristóteles, Santo Agostinho e São Tomás. Façamos o esforço de descobrir, então.

I – ASPECTO PRÁTICO: A ANISTIA PELA VIDA, A “OPERAÇÃO JUDITH” E A RCC.

Como completaram 5 anos que eu tinha contato com o material do Donato, sem nunca o ter visto, resolvi ir pessoalmente a uma aula e falar eu mesma com o professor. Em primeiro lugar,
impressionei-me com o local: Comunidade de Vida Aliança de Misericórdia, uma dessas comunidades novas da renovação carismática católica: disseram-me que é famosa. Havia em torno de
150 pessoas, de diversas partes do Brasil, destacando-se alguns padres, uma freira, alguns membros do Centro de Estudos Dom Bosco, professores de Teologia, um protestante que há anos
frequenta as aulas do Donato e não se converte ( apesar da fama de santidade dele...), pessoas de Cuiabá muito próximas do Padre Paulo Ricardo, e representantes de vários núcleos criados
desde os anos 90 por Donato, chamados de Anistia Pela Vida, principais ativistas da causa pró-vida no Brasil. A aula seria dividida em duas partes, uma pela manhã e outra à tarde. Achei que
tudo o que o Donato ensinasse fosse gravado e passado entre os alunos, mas qual foi minha surpresa ao descobrir que toda a primeira parte era apenas ad intra e ele pediu repetidas vezes que
não se falasse para ninguém de fora o que fosse “só para nós” (e veja só... descobertas por que Pitágoras não admitia mulheres em suas reuniões secretas!).

Donato passou a palavra a um militante pró-vida e este começou a exortar que todas as pessoas envolvidas com a Anistia não deveriam criticar nenhum político que se apresentasse pró-vida,
por omisso que parecesse, pois só os militantes ali presentes é que sabem, nos bastidores, se os políticos estão fazendo algo, mesmo que por baixo dos panos, para ajudar as pautas deles (da
nova direita). Donato até compartilhou, acrescentando que não se trata de não denunciar um político pró-vida que esteve envolvido em corrupção, roubo, tráfico de drogas, etc, mas sim de se
calar caso ele se mostre inativo em relação às reivindicações da causa pró- vida: independente de ser petista, independente de ser liberal, independente de ser tudo o que a Igreja Católica
condena num político. No entanto, não foram citados os nomes dos políticos que negociam com a Anistia (ou melhor, que compram o silêncio dos católicos apenas por se dizerem pró-vida), mas
desconfiamos que as críticas ao Bolsonaro, depois deste conselho, diminuímos bastante.

Outra exortação, feita por Donato, é que cada pessoa presente e os membros de seus núcleos espalhados pelo país comprassem uma edição da Teologia Moral de Santo Afonso Maria de
Ligório e dessem de presente para um padre ou seminarista. Sabemos que uma situação moral vai de mal a pior, mas é típico do conservadorismo acreditar piamente que vai resolver a crise da
Igreja por vias da moral, como se a doutrina e a liturgia discutir em seu estado mais salutar e como se a moral não fosse apenas uma consequência lógica da doutrina. Uma terceira exortação foi
de que 200 pessoas ali envolvidas disusessem uns 10 anos de suas vidas para, orientadas pelo Donato, seguirem a vocação acadêmica, curso de mestrado e doutorado em Filosofia da
Educação para que, no futuro, tendo espaço nas Universidades, possam formar e suporte a professores dos numerosos colégios católicos que estão surgindo sob oferta do guia do Donato e seu
eminente aluno, o professor Felipe Nery. Na TFP este tipo de infiltração em ambientes da esquerda se chamava “operação Judith” e terminou não somente com a capitulação dos membros dos
Arautos do Evangelho às doutrinas liberais, mas também à plena liberdade da reforma litúrgica, ao silêncio diante dos erros progressistas ao ao vício de se criar ambientes cada vez mais
secretos, linguagem secreta, meios de ação secretos, sede secreta e tudo isto para idolatrar delirantemente a pessoa de Dr. Plínio na seita Sempre Viva. Donato repetiu algumas vezes que todo
o seu não se trata de segredo de uma sociedade secreta, mas de uma ação política, cuja discrição é essencial para que os esquerdistas não se alertem para a entrega que ele faz. O problema é
o seguinte: ele não apenas traça plano de ações políticas reacionárias, o que bem justificaria o segredo, mas também, e talvez principalmente, ensina doutrinas filosóficas, teológicas e de “vida
mística”, e por isso foi muito acertada sua resposta ao consulente: “é prudente se ausentar de associações ou grupos que tenham “reuniões mais ocultas e interiores””.

Um dos motivos me deixou impressionado estranhamento quanto ao local ser da RCC é que o Donato falava mais aos frequentadores do Opus Dei, muito zelosos em ter missa nova em latim
para minar qualquer crítica de abuso litúrgico (como se a própria missa nova não fosse um abuso), muito disciplinados na pregação de virtudes morais por meio da vida profissional, e sempre
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mais intelectualistas que sentimentais, o que permite ensinar Filosofia e cobrar tamanha dedicação à vida de estudos como faz o Donato. Porém reparamos uma mudança e constatamos que
também o Donato se tornou profeta, por duas estórias que ele narrava com uma retórica para atrair carismáticos.

A primeira trata do livro dele, “A Educação Segundo a Filosofia Perene”, cuja primeira edição foi vendida, ao contrário das atuais que são distribuídas gratuitamente sob a condição de que o
livro seja lido (coisas que acontecem no Brasil!). Donato conta, então, que uma de suas alunas foi vender a primeira edição do livro numa faculdade de teologia para uma moça muito piedosa,
com fama de santidade (não tanto como a do próprio Donato, é claro!). A beata hesitou em comprar o livro, por ter pouco dinheiro, então disse que iria à Capela da faculdade perguntar a Jesus o
que Ele descobriu da ideia. Não deram 15 minutos, a beatinha saiu correndo atrás da aluna do Donato, pedindo com muita entusiasmo: “Me vende o livro, me vende o livro! Jesus disse que tem
pressa!”.
A segunda estória, trata-se na verdade de uma profecia de Dom Bosco, adaptada aos gostos do freguês. Transcrevo aqui como foi contado a história:

Donato - Dom Bosco fez uma profecia de que haveria um ressurgimento espiritual fora do comum aqui no Brasil, inconcebível.
Moça de Cuiabá, da equipe do Pe. Paulo Ricardo - Em Cuiabá!
Eu: Onde está esta profecia?
Donato: nos escritos de Dom Bosco. Ele não disse a data, mas disse a data antes da qual não aconteceria. Disse que a primeira seria fundada na cidade de Brasília, e surgiria um lago e depois
disso seria encontrada uma grande quantidade de minério e depois disso, não se sabe quando, surgiria uma renovação espiritual fora do comum naquela terra, que a gente não sabe se é
Brasília, se é o Brasil, se é a América Latina.
Moça de Cuiabá, da equipe do Pe. Paulo Ricardo - se é Cuiabá!
Donato – Agora, isto não é de Fé. Uma das coisas que parece que está relacionada em parte com isso, parece que foi o surgimento da Renovação Carismática, não diretamente. A RCC surgiu no
início do século. XX por causa de alguns católicos que leram o livro do pastor David Wilkerson e resolveram fazer um encontro onde aconteceram alguns milagres ali dentro, mas a RCC floresceu
no Brasil. A gente não entende ainda muito bem como, mas esta RCC floresceu e chegou a alcançar 5% dos brasileiros, chegou a 10 milhões de pessoas. Mas a RCC não conseguiu desenvolver
isto de forma completa, então surgiram algumas características muito curiosas dentro da RCC: pessoas que tinham sido desestimuladas a procurar a Deus pela RCC, vendo que faltava algo,
surgiram a criar comunidades novas. Eles surgiram sem pertencer à RCC, mas descendente dela e de uma quantidade imensa de comunidades, milhares de vidas consagradas. Temos aqui
pessoas que participam dessas comunidades. E elas continuam a aumentar, quer dizer, provocaram uma sede de algo que as pessoas estão começando a procurar. A quantidade de
comunidades que existem de consagração no Brasil, não existem em nenhum outro lugar do mundo, nem na Itália. É um fenômeno inédito. São descendentes da RCC que não sabem o boato
que vão tomar. É uma coisa que a própria RCC não esperava, são filhos da RCC e cada um deles é diferente, cada um deles segue uma espiritualidade diferente, busca coisas diferentes,
estudam coisas diferentes... alguns abrem canais de televisão, como a Canção Nova, outros trabalham com drogados... e continuam surgindo. Mas não é só isso: a gente está vendo agora nos
últimos dez anos, entre os padres jovens, uma busca por espiritualidade que a gente não via antes. Não dá para saber, mas parece que o embrião daquilo que Dom Bosco profetizou parece que
está acontecendo. E acho que a gente também faz parte desse negócio, porque eu fico assombrado que as pessoas vêm aqui participar da Anistia, pois quando o Felipe Nery fez o congresso das
escolas católicas no Rio de Janeiro, ele chamou seis argentinos e eles comentaram: “como é que vocês conseguiram juntar 600 pessoas?”, e o Felipe Nery falou: “é porque não cabia mais gente,
houve 2 mil inscritos”. E responderam: “Na Argentina nós tentamos fazer isto e juntamos 90. Na hora que abriu o congresso e cantamos o hino nacional, todo começou a brigar e aí teve que
parar.
Eu – o senhor foi profetizado por Dom Bosco??!!
Donato – Não. Dom Bosco profetizou uma renovação espiritual inconcebível no Brasil e não disse a data, disse que é depois da fundação de Brasília, e ela já aconteceu. E não sou eu, (risos)
porque toda esta renovação que a gente está vendo no Brasil não é a gente. O site do Padre Paulo, por exemplo, um negócio que nem o site do Pe. Paulo não existe no mundo.
Eu – Então o padre Paulo foi profetizado por Dom Bosco??!!
Donato – eu diria que o Espírito Santo está fazendo Seu papel e cada uma dessas peças faz parte de uma quebra cabeças que não é a gente que está fazendo. E isto é motivo de esperança.

Sobre a profecia de Dom Bosco, encontramos no site (http://www.ucb.br/Noticias/2/5102/UmSonhoProfeticoDeDomBosco/) da Universidade Católica de Brasília um folheto distribuído na data da
Reunião de Brasília com o relato do sonho que teve o santo. Para nossa surpresa, ali não cita o Donato, nem a RCC, nem o Pe. Paulo, mas, após narrar toda a profecia, conclui-se acerca dos
padres salesianos:

“Ademais que Dom Bosco teve associado ao Brasil o presente sonho, está fora de dúvida. Compreendemo-lo melhor, se recordarmos que, em 14 de julho de 1883, alguns dias antes do sonho
profético, desembarcavam no Brasil os primeiros Salesianos, para dar início à primeira fundação neste país. Toda a preocupação de Dom Bosco estava, naqueles dias, voltada para o Brasil.
Testemunha o Pe. Filipe Rinaldi, terceiro sucessor do Santo, que o surpreendeu em seu quarto, contemplando enterrado um atlas que focalizou exatamente o Brasil. Suas palavras então
revelaram sua esperança no futuro do Brasil Salesiano, chegando a prever para sua obra, em nossa terra, duzentas casas! Era humanamente ridículo pensar em um florescimento tão prodigioso,
quando aqui se implantara apenas uma casa, que lutava de todo gênero ” ( www.ucb.br/Noticias/2/5102/UmSonhoProfeticoDeDomBosco/).

Sobre a RCC e o imenso otimismo do Donato com os nossos tempos, o site (http://www.montfort.org.br/bra/veritas/religiao/professor_donato/) da Montfort já falou o bastante nas últimas
semanas, mas o senhor acha, professor Alberto, que cabe a nós interpretar profecias numa época em que até os documentos oficiais da Igreja são difícil de interpretar? E quanto à retórica do
Donato de esperar a si e à sua profecia sobre um grande florescimento católico em meio à época mais lamentável da Igreja? Já quanto ao site do Pe. Paulo, não é difícil acreditar que não é obra
do próprio Donato, já que o sacerdote testemunhou que teve vontade de jogar fora todas as aulas anteriores a seu encontro com o Donato? Se há algum renascimento claro e patente, é o
renascimento da velha “nova direita”, do conservadorismo morno, que acha que vai encontrar na moral e na política a solução para os problemas da sociedade, sendo que o que mais se precisa
é de sacerdotes que voltem a oferecer um sacrifício pacífico a Deus e de famílias que vivam e transmitam a fé católica, intacta, a seus filhos. Se Olavo de Carvalho e cia. Achamos que os
conservadores precisam se unir aos inimigos da Igreja para melhorar o quadro social, lamentamos e rezamos por sua conversão, mas que não se afirmam católicos, para não enganar os
desavisados.

II – ASPECTO TEÓRICO: UMA FILOSOFIA PERENE

Para o leitor que caiu na desgraça do contato com a obra de René Guénon, Frithjof Schuon, Ananda Coomaraswamy, Julius Evola, Henry Corbin, Harry Oldmeadow, Wolfgang Smith, Titus
Buckhardt, Patrick Laude, Martin Lings, Joseph Campbell, Seyyed Hossein Nasr, Rama Coomaraswamy, Jean Borella entre outros que, mesmo a contragosto, fazem parte do balaio de gato que o
Schuon resolveu chamar de “perenialismo”, pode parecer que não é da mesma filosofia perene que o Donato e outros autores católicos estão tratando, dado que esta segunda parece um esforço
apologético de comprovar uma continuidade entre a filosofia grega e o pensamento cristão, enquanto a primeira, grosso modo, apresenta-se-nos como um esforço muito moderno de, diante do
que Guénon chama de crise do mundo moderno, expressando uma revolta à modernidade e superar a crise moderna por meio da tentativa de transcender as particularidades de todos os
sistemas de pensamento e religiões a fim de encontrar o que de comum e mais elevado teria em todos, caindo, ironicamente, ou num simbolismo fantasioso completamente desprezado da
realidade ou numa imoralidade e irracionalidade tão lastimáveis ​quanto a própria crise do mundo moderno. Sem dúvidas, este esforço é um caminho que, para o católico que com ele se envolve,
leva do liberalismo à apostasia (não esqueçamos que no filme O Jardim das Aflições, o aflito Olavo confessa: “eu já nem sei se tenho religião!” ), dado negar a verdade da Revelação tal como
ensinada pelo Magistério da Igreja e, ao contrário, rebaixá-la a um estado de mera expressão exotérica de uma pretensa revelação esotérica superior e independente das manifestações de cada
religião e sistemas filosóficos particulares. Vejamos como esta ideia de blasfema é explicada por Coomaraswamy:

“(...) as religiões religiosas, na mesma medida em que uniram os homens, também dividiram os homens uns contra os outros, como cristãos e pagos, ortodoxos e hereges, de modo que se
quisermos saber qual pode ser o problema prático mais Urgentemente a ser resolvido pelos filósofos , só podemos responder: é ser reconhecido num controle e numa revisão dos princípios
de religião comparativa, cujo objetivo verdadeiro da ciência, julgado pela melhor sabedoria (e julgar é a função própria da sabedoria aplicada), deveria ser demonstrado a base metafísica
comum a todas as religiões e mostrar que as diversas sociedades estão basicamente relacionadas entre si como se fossem dialetos de um idioma espiritual e intelectual comum; pois quem
reconhecer isto não terá mais vontade de afirmar "a minha religião é a melhor", e em vez disso dirá: a minha religião é a melhor para mim ". ( A. Coomaraswamy, O Que é Civilização, p.
35. Editora Siciliano, 1992, o negro é nosso)

É de se questionar como estes perenialistas se consideram superiores aos católicos progressistas, aos globalistas e a tantos outros inimigos da Igreja que se unem para destruir-La e criar,
pelas vias do ecumenismo, uma grande religião única. É certo que Guénon opôs a “unidade transcendental das religiões” com o sincretismo religioso que fazia, por exemplo, madre Teresa de
Calcutá ao deixar que suas filhas meditassem diante do Santíssimo com escritos hindus, mas a conclusão relativista “a minha religião é a melhor para mim” é a mesma, independente se
alcançada por altas sutilezas e invenções metafísicas ou simplesmente por meio de um evento com todos os líderes de seitas como o ocorrido em Assis no dia Mundial de Oração pela Paz.
Segundo o Pe. Marcelo Tenório, “a questão é que o Encontro de Assis pôs a Religião Verdadeira em pé de igualdade com as falsas religiões, o erro ao lado da Verdade; Pedro ao lado de Lutero;
Deus ao lado do demônio. E isso, sem dúvida alguma, constituiu um “ Escândalo sem precedência (http://www.montfort.org.br:84/pedro-tu-me-amas-sobre-o-encontro-de-assis/) ””. Também a
falsa divisão entre esoterismo e exoterismo, que faz os perenialistas transitarem de religião em religião sem aderir a nenhuma, permite pôr em pé de igualdade a Igreja Católica e as seitas, Nosso
Senhor Jesus Cristo e o inimigo mortal do gênero humano, Nossa Senhora de Fátima e o “eterno feminino”, escândalo este teorizado pelos escritos perenialistas e muito praticado em tariqas
esotéricas (sejam elas islâmicas ou “ecumenicamente islâmicas”) mundo a fora.
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No livro “ Philosophia Perennis - Historical Outlines of Western Spirituality in Ancient, Medieval and Early Modern Thought ”, de Wilhelm Schmidt-Biggemann, encontramos, ao contrário do livro
do Donato, alguns classificações para se considerar quando um autor pertence ou não à filosofia perene :

“ Uma filosofia perene sustenta uma visão benevolente da criação como um mundo de signos divinos. Esta visão inclui uma abordagem devocional ou fantástica à criação, e é esta abordagem
que define o processo particular de aquisição de conhecimento, caracterizando uma filosofia perene. Esta perspectiva deriva do monoteísmo das religiões reveladas e é fundada sobre a teologia
judaico-cristã e muçulmana. Esta pia e edificante teoria aceita como condição sua a interpretação teológica do mundo criado como um sistema de signos. Uma vez que a criação supõe um
criador, a teoria indica um certo conhecimento (1) do criador, (2) do plano para o mundo e (3) do ato da criação, seu objetivo e seu fim” . (Wilhelm Schmidt-Biggemann, “Philosophia Perennis -
Esboços históricos da espiritualidade ocidental no pensamento antigo, medieval e moderno”, p. 27)

Com este estratagema, é possível superar a fronteira entre autores cristãos e não cristãos e apresentar o pensamento católico como se fosse um subconjunto de algo superior a ele, um
subconjunto que participa, como outros, de um núcleo filosófico e teológico comum entre o cristianismo, o judaísmo e o islamismo, mas nunca como o auge e ápice da filosofia, como nós
convidamos a estar concluídos de que é o pensamento católico. Aceitando esta suposição, toda a obra gnóstica e fantasiosa de um autor como Tolkien, por exemplo, poderia ser equiparada aos
ensinamentos da Igreja, e assim tem sido feita por um dos discípulos mais eminentes do Donato e do Olavo, o Pe. Paulo Ricardo, que recentemente disse que quem não se converte lendo O
Senhor dos Anéis não é gente (sic!). Biggemann, no entanto, faz uma distinção que nos é importante marcar:

A " philosophia perennis" enfatiza o aspecto de continuidade e tradição, que corresponde precisamente ao conceito de "teofilosofia" na Antiguidade cristã e nos períodos medievais e
renascentistas. Uma vez que o foco deste livro é a filosofia renascentista, ele não se dirige nem à neoescolástica nem à filosofia neotomista. Com o conceito neoescolástico de "filosofia perene",
o movimento neotomista dos séculos XIX e XX estabeleceu uma ligação precisa entre o aristotelismo e o escolasticismo no sentido de Santo Tomás de Aquino. Este movimento filosófico, no
entanto, não se interessa pelo sentido patrístico e renascentista do termo ”. (Wilhelm Schmidt-Biggemann, “Philosophia Perennis - Esboços Históricos da Espiritualidade Ocidental no Pensamento
Antigo, Medieval e Moderno”, Prefácio, p. XIV).

O autor faz questão de ressaltar que o uso do termo “filosofia perene”, quando adequado pelo movimento neotomista dos dois últimos séculos, torna-se distinto do uso do termo pelos demais
autores. A filosofia neotomista perene, que segundo Biggemann tenta estabelecer uma ligação precisa entre o aristotelismo e o escolasticismo no mesmo modo que fez São Tomás, é distinta da
que o autor julga ser no uso patrístico e renascentista da expressão. Há de se lembrar que, sessenta anos após o Concílio Vaticano II, estamos todos mui bem vacinados contra esta história de
buscar justificativas nos Padres da Igreja para todas as heresias possíveis: o sentido de “filosofia perene” do renascimento não é, de modo algum , respaldado pelo pensamento dos Padres da
Igreja. Mas, pensando, se a filosofia perene dos neotomistas se resume em fazer o que fez São Tomás e o uso do termo é distinto do uso feito na renascença (que deu origem ao uso por parte da
escola perenialista contemporânea), talvez tudo não passe de um nome equívoco e, assim, Donato se refira não à filosofia perene de Olavo de Carvalho e dos demais perenialistas, mas sim à
filosofia perene dos neoescolásticos de algumas décadas passadas, já que o livro dele é uma tese sobre a educação para a contemplação segundo São Tomás. Porém, este esforço de
interpretar bem o Donato é desestimulado não somente pelo artigo do site da Montfort, que analisa sua ideia de sabedoria como advinda dos Grandes Mistérios do Egito, como também pelo
próprio Olavo de Carvalho, que, numa aula do COF quando trata de simbolismo segundo o esoterismo de Suhrawardi afirma:

“Quando ele [Suhrawardi] diz que os escritos dos antigos são simbólicos e, portanto, não estão sujeitos a refutação, isso não quer dizer que esses escritos não têm um aspecto discursivo
também, o que é sujeito à discussão e refutação. Porém, é sujeito à discussão e refutação só depois de você perceber o sentido simbólico. Uma vez, por exemplo, eu estava conversando com o
meu amigo Antônio Donato e ele disse o seguinte: "olha, ninguém entende Santo Tomás de Aquino", porque as pessoas só vêem teses individuais e discutem essas teses. Mas se você ler e reler
o pensamento de Santo Tomás de Aquino, ler a Suma Teológica, a Suma Contra os Gentios etc., acaba percebendo que aquilo tem uma estrutura igual a de uma catedral, e que, portanto, é uma
obra de arte , um objeto de contemplação. Não foi escrito só para você concordar ou discordar com esta ou aquela tese, mas para você, olhando a estrutura do conjunto, ter a abertura para o
mundo divino que aquela estrutura simboliza, exatamente como uma catedral. E vejam que a minha formação é completamente diferente da de Antônio Donato, pois nossas vidas e vocações são
completamente diferentes, mas naquele momento concordamos, falamos "é esse mesmo o problema". Ninguém entende [Santo Tomás de Aquino] porque quer ter um entendimento discursivo
direto, o que não é possível se não se captar a forma do conjunto e a sua força simbólica” ( Olavo de Carvalho, COF, Aula 37, 19 de dezembro de 2009, 00:25:00).

Esta comparação das sumas medievais a catedrais é amplamente estudada por Erwin Panofsky, sobretudo em seu livro “Arquitetura Gótica e Escolástica: sobre a analogia entre arte, filosofia
e teologia na Idade Média”. Panofsky defende um paralelo entre a arquitetura gótica e o pensamento medieval: as reformas na Abadia de Sr-Denis (séc. XII) corresponderam ao começo da
escolástica, já o auge e esplendor do gótico (séc. XIII) correspondenteria à obra de São Tomás, enquanto o gótico decadente tardio (séc. XIV), corresponderia ao nascimento do nominalismo.
Também cada obra em particular, como as sumas, seria estruturada de modo a manifestar uma “lógica visual” da obra, seguindo o princípio de manifestação (clarificação) da ordem de cada parte
em relação ao todo, ou seja, a própria estrutura formal do o texto manifestava-se arquitetonicamente uma posição do pensamento e da argumentação, tal como uma catedral é edificada
respeitando rígidos princípios de proporcionalidade e harmonia:

Através de seu programa imagético, a catedral do apogeu gótico tentou representar todo o conjunto do conhecimento cristão da teologia, da moral, das ciências naturais e da história, no qual
tudo tinha o seu lugar certo, e sendo suprimido o que não teve. De modo semelhante, buscou-se na estrutura arquitetônica uma síntese de todos os motivos centrais, transmitida por vários
caminhos, para finalmente se chegar a um equilíbrio único entre basílica e edificação central, através da eliminação de todos os elementos que perturbaram o equilíbrio, como a cripta, a galeria e
as torres, excetuadas as duas situadas no lado frontal (Panofsky, “Arquitetura Gótica e Escolástica: sobre a analogia entre arte, filosofia e teologia na Idade Média” pp. 2-32).

O que Panofsky não faz, no entanto, é tirar as consequências esotéricas que, com base na doutrina da iluminação de Suhrawardi, tira Olavo de Carvalho, aliás, esta doutrina é basicamente a
mesma que Olavo atribuiu a Aristóteles em sua teoria dos quatro discursos. Não é mero acaso que numa aula sobre a escola perenialista, Olavo de Carvalho repete esta mesma teoria do
conteúdo inefável da forma, cita Panofsky, cita o seu Aristóteles pessoal e novamente elogia o Donato por ter feito o mesmo vislumbre de simbologia que ele. A citação é longa, mas não nos deixa
ser acusados ​de conspirar ou inventar conexões onde não há:

“As sumas são um grande, enorme gênero literário, que vale não somente pelo conteúdo explícito da doutrina, mas pela sua estrutura, que é obra de arte. E, como tal, ela veicula,
simbolicamente, aquelas realidades que a própria doutrina não pode explicitar em palavras. [1:30:00] Isso quer dizer que uma coisa é ler sobre o que Sto. Tomás de Aquino disse sobre isso ou
aquilo. Você acompanha o raciocínio, diz: “o homem tem razão”. Ele costuma ter razão. Pode falhar num ponto ou outro que dependa de conhecimentos factuais, que, evidentemente, ele não
tinha. Para além disso, você tema forma da suma. Contemplá-la é o mesmo que contempla uma catedral da Idade Média. Os princípios estruturantes são exatamente os mesmos. Quando Sto.
Tomás de Aquino vai ramificando a questão, ele coloca uma pergunta; uns dizem que sim, outros dizem que não; coloca os argumentos, vai montando tudo aquilo, bonitinho. Vejam a estrutura
das colunas em uma igreja medieval, uma catedral gótica; o princípio de ramificação é o mesmo. Há colunas que se ramificam em outras cada vez menores, até fechar lá em cima onde encontra
outra coluna. O que São Tomás faz, em palavras, é exatamente isto. Quando você está lendo um romance, por exemplo, em cada página que lê, você está interessado nos fatos que são
contados ali, mas, à medida em que vai avançando na leitura, aparece, por trás deles, uma ordem. Essa ordem não está descrita nos fatos, mas é uma estrutura interna por trás dos fatos, que os
ordena. Já se começa, então, a ter um objeto de contemplação estética propriamente dito. Uma coisa mesmíssima acontece ao se ler Sto. Tomás de Aquino, mas só acontece se alguém deu
essa dica, ou se você for um gênio para perceber. Obtive essa dica de um livro de Erwin Panofsky, que é um estudioso de história da arte. Ele não tem nada de cristão, é um judeu, mas me deu
essa dica. Ele mesmo não viu a imensidão do que estava abrindo. Eu estava pensando justamente nisso e estava ali, observando e lendo de novo e falando: "mas é isso mesmo, meu Deus do
céu! Esta Suma diz muito mais do que está dizendo!" De certo modo, ela ilustra sua estrutura a ordem do mundo que ela está explicitando em palavras. Daí eu comecei a relacionar isso com a
estrutura de A Divina Comédia, de Dante, que se compõe de tercetos: estrofes de três versos, onde o verso do meio rima com o primeiro verso da segunda estrofe; e daí tem um outro no meio
que vai... e você vai ver o negócio está assim até o fim. Mais ainda, a versificação está em versos de dez sílabas, cujo acento cai sempre na sílaba do meio, na sexta sílaba; na passagem da
quinta para a sexta. Isso continua até o fim. Essa estrutura ternária é a mesma estrutura do silogismo, meu Deus do céu! Você começa a ver que Sto. Tomás de Aquino, Dante e os construtores
das catedrais estão todos fazendo a mesma coisa; para eles, isso era translúcido. Era o óbvio dos óbvios. Não preciso sequer ser aqui. Como a questão de Aristóteles e dos quatro discursos. Ele
não precisa dizer: "olha, existem quatro discursos e existe uma série de princípios comuns". Não. Ele simplesmente escreveu um sobre cada um, só para que você possa escrever isso. Eles
nunca pretenderam explicitar os princípios dessa arte sacra porque os princípios eram tão óbvios... eles estavam praticando aquilo no dia a dia. Era que nem o português: "ó, raios, quem é que
não sabe?". Hoje em dia ninguém sabe, você tem de dizer. Estava eu ​fazendo essas observações quando chega o meu vizinho, Antônio Donato, que é o homem mais santo que eu conheci no
Brasil, e disse: "você já reparou que na Suma Teológica (ele era um tradutor de Sto. Tomás de Aquino, ele estava traduzindo todos os comentários dele e Aristóteles) tem isso?" Eu falei: "Ó raios,
eu estava vendo isso agora mesmo". E ele, por sua vez, percebeu isso através de outro autor escolástico que é o Hugo de São Vítor. Ele explica a diferença entre pensar, meditar e contemplar.
Ele diz que pensar é transitar de uma ideia para outra. Meditar é recuar, na ordem das idéias, até o seu fundamento. Meditar, então, já não é simplesmente pensar para agora, mas pensar para
trás: "de onde eu tirei isso? de onde veio isso?". E você vai descobrir, assim, a experiência real, o dado intuitivo profundo do que emerge seu pensamento. E ele diz que contemplar é quando
você fez várias meditações e elas começam a articular-se entre si e você contempla o conjunto. Note bem que expor um pensamento é algo relativamente fácil. Reproduzir uma meditação é
muito difícil. Somente grandes artistas da palavra ou disponíveis. Eric Voegelin é um. Muitos livros dele não são uma exposição lógica, mas uma meditação, um aprofundamento na experiência
que está por baixo do pensamento. Já é difícil de você exportar. Quando se chega na contemplação, porém, é uma coisa que, ao mesmo tempo, é óbvio, porque você está vendo aquilo, mas é
indizível. E quando se vê que Sto. Tomás, no final da vida, disse: “olha, o que eu percebi agora é tão, tão, tão gigantesco que, tudo o que eu escrevi, perto disso, é nada.” Note bem: estou falando
topo

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11/11/2023, 15:13 Os erros da Filosofia Perene - MONTFORT
do que eu e o Antônio Donato percebemos por trás do que São Tomás de Aquino escreveu. Mas ele não estava falando disso, mas sim, do que está por trás da própria ordem aparente do mundo.
Eu, então, falei: “não dá para explicar mais, dá para ver”. Nós não olhamos para isso aí, evidentemente, nós enxergamos, contemplamos, o edifício de Sto. Tomás de Aquino, e entendemos que
esse edifício é moldado num outro edifício, invisível, que ele viu. Não chegamos lá, mas, se Sto. Tomás de Aquino diz que viu, é porque viu. Se ele foi capaz de fazer isso, é porque em algo ele
se baseou”. (Olavo de Carvalho, COF, Aula 41, Sobre Perenialismo, 16 de janeiro de 2010).

Suhrawardi, cujas ideias se baseiam em Platão e em Zaratustra, foi um filósofo influente sufi e famoso por sua teoria da “iluminação”, que dividia a Filosofia entre filosofia intuitiva e filosofia
discursiva. A filosofia discursiva residiria no conteúdo doutrinário expresso, no texto, nos argumentos, enquanto que a filosofia intuitiva estaria para além da razão e seria uma doutrina inefável,
passível de ser transmitida apenas por vias simbólicas, mas as duas filosofias permeariam uma a outra, sendo possível “ler” um conteúdo intuitivo na forma de um texto discursivo. O que os
diálogos entre Olavo e Donato nos revelam é que, para Olavo e Donato, assim como para o esoterismo em geral, há um modo material e um modo formal de ler textos tradicionais, como os de
Santo Tomás de Aquino. No plano material, do puro discurso, a doutrina é passível de discussão e eventuais refutações. Haveria um plano superior, porém, o da forma, e nesse sentido é que o
sufismo afirma que os escritos “dos antigos” (ou seja, os escritos tradicionais) são simbólicos e, por isso, irrefutáveis. Tolkien seria perfeitamente irrefutável por ser simbólico tanto no plano
discursivo quanto no plano formal. O Jardim das Aflições de Olavo de Carvalho seria irrefutável porque, segundo o poeta Bruno Tolentino, para além do conteúdo discursivo, o livro está
estruturado simbolicamente numa espiral, como se fosse uma sinfonia de Jean Sibelius. Nós, pobres católicos, que fiamos à razão iluminada pela Fé, é que não temos o alcance suprarracional
de entender que só depois de apreendermos o sentido simbólico é que o texto está sujeito a discussão e refutação. Pobre de São Tomás, então, que, ao refutar a doutrina da unidade do intelecto
de Avicena, não teve a capacidade de apreender o sentido simbólico do discurso da metafísica maometana! Por que São Tomás não contemplou as formas geométricas dos escritos dos pagãos
em vez de impugnar os erros deles? Será que ele faltou “abertura para o mundo divino”? E o que dizer de todas as proposições condenadas pela Igreja? Todo o Denzinger não passaria de uma
coletânea de teses individuais que não considera o “todo” simbólico do pensamento dos hereges? A teoria da iluminação de Suhrawardi é, simplesmente, outro modo de se dividir doutrinas em
exotéricas e esotéricas. É bem aceita a teoria de Panofsky sobre o paralelismo entre uma catedral gótica e uma suma, mas aqui é flagrantemente usado para equiparar os escritos católicos aos
escritos esotéricos. Olavo até se envergonha de supor que faz a leitura da obra de São Tomás como faz da obra de Dante, cujas mensagens ocultistas são várias vezes indicadas ao longo do
corpo do poema. Recomendamos o estudo que o professor Orlando fez sobre Dante, aqui: http://www.montfort.org.br/bra/cadernos/arte/dante0/ , mas o próprio Guénon tem um estudo em que
trata da dita forma da Divina Comédia chamado “O esoterismo de Dante”.

Um ponto a se notar é que esta irrefutabilidade de um pretenso conteúdo místico escondido na forma é uma excelente chave de leitura para entender por que os perenialistas não se permitem
aceitar refutações quando algum católico (como muito bem se fez aqui ) mostra com argumentos claros (http://www.montfort.org.br/bra/veritas/religiao/modernismo_olavoc) e textuais que seus
ensinamentos são errôneos, afinal “são simbólicos e, portanto, não estão sujeitos a refutação”. Mas, é verdade que também o Donato pensa assim, está explicado por que tanto insiste em citar os
monges da escola vitoriana. O modo predominantemente simbólico do discurso de Ricardo e Hugo de São Vitor permite tantas interpretações católicas (como várias vezes como fez o Professor
Orlando, sempre referindo os símbolos à Doutrina da Igreja: http://www.montfort.org.br/bra/ veritas/religiao/bom_samaritano /), quanto a interpretações esotéricas inventadas pelos amantes do
erro. Hugo de São Vitor, por belos que sejam seus escritos, não pode contribuir com quem foi previamente “formatado” (e, passar às claras: esotericamente iniciado) para buscar sentidos ocultos
pseudo-místicos por trás de textos tradicionais.

Impressionante é como este tipo de erro não nos é alheio, pois Bergson, grande influência filosófica do Concílio Vaticano II, também usava da discursividade contra a própria razão para
alcançar um estado inefável de pura experiência irracional (como explica o professor Orlando aqui ) e (http://www.montfort.org.br/bra/cadernos/religiao/religiao_vaticano_ii_parte_2/#cap4) , como
explica São Pio X, também este é o comportamento geral do modernista, ao expressar o “sentimento religioso” numa fórmula discursiva que ele considera ser um dogma, cristalizado e passível
de ser superado (heresia da evolução do dogma) devido às limitações discursivas de expressar uma experiência religiosa. No fim das contas, os erros do perenialismo e do modernismo são
muito parecidos, mas não se trata de coincidências: Olavo de Carvalho foi apenas um divulgador muito pequeno, local e tardio do esoterismo islâmico em meios católicos. Há de se lembrar da
nefasta influência que teve o especialista em sufismo e padre melquita Louis Massignon. Massignon foi o professor que levou Henry Corbin, tradutor francês de Heidegger e um dos principais
nomes da escola perenialista, para o ismaelismo (cfr. O estudo “Elementos messiânicos na seita ismaelita de Alamut (http://www.montfort.org.br/bra/cadernos/apologetica/alamut1) ”) e sua
influência nos estudos de “mística comparada” , mesmo entre os que se diziam neotomistas, preparou todo o terreno para a acessível da ideia de que os muçulmanos exercitavam o mesmo Deus
que nós, ideia que culminou no documento do Concílio Vaticano II, Nostra Aetate, com este parágrafo mentiroso:

“A Igreja olha também com estimativa para os muçulmanos. Adoram eles o Deus Único, vivo e subsistente, misericordioso e onipotente, criador do céu e da terra (5), que falou aos homens e a
seus decretos, mesmos ocultos, procure submetê-lo de todo o coração, como a Deus se submeteu Abraão , que evoca a fé islâmica de bom grado. Embora sem o considerarem como Deus,
veneram Jesus como profeta, e honram Maria, sua mãe virginal, à qual por vezes invocam devotamente. Esperam pelo dia do juízo, no qual Deus remunerará todos os homens, uma vez
ressuscitados. Tem, por isso, em apreço a vida moral e prestam culto a Deus, sobretudo com a oração, a esmola e o jejum.
E é verdade que, no decurso dos séculos, surgiram entre cristãos e muçulmanos não poucas discórdias e ódios, este sagrado Concílio exorta todos a que, esquecendo o passado, sinceramente
se exercitem na compreensão mútua e juntos defendem e promovem a justiça social, os bens morais e a paz e liberdade para todos os homens ”. (Nostra aetate, §3)

Os estudos de mística comparados nos centros de teologia no começo do sec. XX teve enorme influência. Publicado em 1931 numa revista de estudos carmelitanos que circulou na França, o
estudo “L"experience mystique d"Ibn Arabî est-elle surnaturelle?” do carmelita Elisée de La Nativité procura provar a sobrenaturalidade das experiências religiosas de esotéricos islâmicos. Não
por coincidência, o Padre Paulo Ricardo indica em seu site a obra de uma carmelita contemporânea, o beato Maria-Eugênio do Menino Jesus. Esta carmelita fundou o Instituto Notre Dame de
Via, que reúne leigos e leigas consagrados, sacerdotes diocesanos e casais, tal como as novas comunidades nas quais o Donato ensina. Frei Maria-Eugênio passou boa parte da vida fazendo
exatamente o que o Donato faz: ensinando os altos graus da vida mística ao mais comum dos leigos. Seu livro “Quero ver a Deus”, uma tentativa de explicitação teológica da espiritualidade das
Sete Moradas de Santa Teresa (muito parecido com o que faz Donato nas aulas da Santíssima Trindade) é publicado pela Editora Vozes em mais de 1500 páginas de papel-bíblia. Logo nas
primeiras páginas, ao tratar da habitação divina no homem, há sabor de heresia, mas na página 576, citando o frei Elisée de La Nativité, o beato Ma.-Eugênio afirma categoricamente:

“No caso de alguns fiéis, de muçulmanos e, sobretudo, de cristãos não católicos, podemos admitir que existe uma verdadeira vida mística com os seus efeitos santificantes. Estas almas seriam
infiéis apenas aparentemente [exotericamente?], mas pertenceriam à alma da Igreja pela fé na Trindade e num Mediador, pela prática da virtude, e estariam verdadeiramente em estado de graça.
Estes casos possíveis só podem ser selecionados ” (Frei Maria-Eugênio do Menino Jesus, Quero Ver a Deus, p. 576)

Uma outra carmelita, neotomista ávida pela verdade e, como boa alemã, leitora voraz, parece-nos fiel testemunha do quadro histórico-filosófico do auge do neotomismo. Trata-se de Edith
Stein, ou Santa Teresa Benedita da Cruz (canonizada por seu martírio em Auschwitz e, portanto, a análise da ortodoxia ou heresia de seus escritos não fez parte de seu processo de
beatificação). Após se converter à Igreja Católica por meio da leitura do livro da Vida de Santa Teresa D'Ávila e do Catecismo, Edith Stein se dedica à tradução alemã de São Tomás e à leitura de
muitos autores neotomistas, vendo-se na necessidade de escrever a obra “Ser Finito e Ser Eterno", em que trava um debate entre o pensamento tomista e o fenomenológico em torno da questão
do ser. Para explicar o surgimento da fenomenologia, Edith Stein constata que a filosofia da idade moderna se divide em dois campos: o campo da filosofia católica, que é a continuadora das
grandes tradições escolásticas, e a filosofia que enfaticamente se denominava a si mesma como filosofia moderna, que começa com o Renascimento e culmina em Kant, com a característica
principal de buscar sistematicamente o rompimento com as grandes tradições e, a partir de então, desenvolve-se todo em torno de uma série de interpretações sobre a doutrina kantiana. Até a
transição do século XIX para o XX, estas duas áreas eram praticamente independentes uma da outra e quem não era católico não se atrevia a estudar São Tomás, bem como quem era católico
não se preocupava minimamente com Kant. A partir de Bretano e Husserl, com a fenomenologia, portanto, é que os dois campos se misturaram. O que nos interessa aqui é esta noção de filosofia
católica como continuadora das grandes tradições. Assim explica Edith Stein:

“A filosofia moderna já não via na verdade revelada uma norma para verificar resultados. Tampouco aceitava as tarefas que ele fixava a teologia, mas queria resolver as dificuldades por seus
próprios meios. Considere seu dever limitar-se à luz natural da razão, e não interferir no mundo da experiência natural. Queria ser uma ciência independente em toda a recepção do termo. Esta
tendência a levou em grande parte a se tornar uma ciência ateia. Por isso a filosofia se dividiu em dois grupos que caminhavam separadamente, falavam línguas diferentes e não se preocupavam
de se compreender mutuamente: a saber, a filosofia moderna e a filosofia escolástica católica, que se considerava a si mesma como a philosophia perennis, mas aos olhos das pessoas que eram
estranhas não assistindo à doutrina privada das faculdades católicas, dos seminários e dos colégios religiosos. A filosofia perene tornou-se um sistema rígido de noções que se transmite de uma
geração a outra, como propriedade inanimada. Sem dúvidas, a correnteza de vida secou em outro leito. As últimas décadas levaram a uma mudança de situação que surgiu em várias partes.
Consideramos em primeiro lugar a parte católica. Para compreender o que aconteceu, é importante registrar que a filosofia católica (e a ciência católica em geral) não são sinônimos da filosofia
dos católicos. A vida intelectual católica foi feita dependente de grande parte da vida intelectual moderna e havia perdido o laço com seu grande passado. A segunda metade do século XIX
produziu um verdadeiro renascimento, um novo nascimento ao retornar às fontes melhores (não é impressionante que foram necessários decretos de Leão XIII e de Pio XI para reavivar os
estudos tomistas?” (Edith Stein, "Ser Finito e Ser Eterno")

A tese aqui defendida por Edith Stein é que a filosofia católica, considerada como philosophia perennis, havia “secada” ou cristalizada por se tornar um sistema rígido e um conjunto de
ensinamentos internos do clero e alheio ao ambiente acadêmico geral. Pode ser que falte, realmente, um esforço de compreensão das fórmulas de fé e da filosofia tomista, onde os decretos topo

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11/11/2023, 15:13 Os erros da Filosofia Perene - MONTFORT
papais para se retornarem a São Tomás de Aquino. Porém, foi com esta mesma crítica que se abriu espaço para que teólogos modernistas substituíssem o que julgassem ser o pensamento de
São Tomás por um pensamento filosófico tão móvel a ponto de se defender a evolução do Dogma e demais heresias condenadas pelo Decreto Lamentabili. Sabe-se que o próprio Husserl,
fundador da fenomenologia, não teve contato com a obra de São Tomás, mas o professor que despertou a ideia da fenomenologia, o padre Franz Bretano (que largou a batina por defensor de
heresias), foi o primeiro uma tentativa de sintetizar o neokantismo com a neoescolástica. Edith Stein, por sua vez, faz parte do grupo de autores que buscavam sintetizar a fenomenologia com o
pensamento cristão, tornando-a apenas um método de pensamento sem incompatibilidade com o realismo tomista ou mitigando os erros da fenomenologia e tornando-os mais diluídos e
palatáveis, a ponto dela se tornar o grande método adotado pelos teólogos do Concílio Vaticano II, entre eles, principalmente, Karol Woitja. As sínteses e debates que surgiram com a intersecção
do pensamento neokantiano com o pensamento neoescolástico Edith Stein chama de reflorescimento. O relato de que ela faz do tomismo de sua época pode nos dar uma ideia de como há um
envio modernizante mesmo nos neotomistas que, conforme afirma Biggemann, se apropriaram do título de “filosofia perene”:

“Hoje sabemos que o tomismo não nasceu do pensamento de seu mestre como um sistema já concluído. Nós consideramos como uma elaboração viva do espírito cuja gênese e crescimento
podemos seguir de perto. Ele se nos apresenta para que o assimilemos e nos engendre uma nova vida. Sabemos que os grandes pensadores da Idade Média se fizeram as mesmas perguntas
que também nos interessam e que tudo o que nos têm a dizer pode ser muito útil. Porém aqui há outro aspecto do problema: quase ao mesmo tempo em que se despertou a filosofia cristã de seu
sonho lendário, a filosofia moderna descobriu que era impossível continuar pelo caminho seguido já há quase três séculos. Para evitar naufragar no materialismo, tratou primeiro de buscar sua
salvação voltando a Kant, mas este retorno não bastava. O kantismo, de tendência diferente, foi substituído por correntes de pensamento orientadas de novo ao ente, que devolveram a honra ao
antigo nome da ontologia (doutrina do ser). Primeiro apareceu a filosofia do ser (a fenomenologia de Husserl e Scheler), depois, como seus antípodas, formaram-se a filosofia da existência de
Heidegger e a doutrina do ser de Hedwig Conrad-Martius. A filosofia que teve grande auge na Idade Média e a nova filosofia do século XX podem se unir em uma mesma corrente, a da
philosophia perennis?” (Wilhelm Schmidt-Biggemann)

Esta se tornou a principal questão da escola neotomista. Se se dizem abertamente filósofos católicos, filósofos tomistas, quais são as possibilidades de participarem do “grande debate” do
mundo contemporâneo? Se usarem um termo mais neutro e amplo, como filosofia perene, conseguirão “infiltrar” o pensamento católico em ambiente acatólico ou, antes, abrirão brechas para que
pensamentos heterodoxos se misturem às verdades defendidas pelo pensamento católico? Sigamos a famosa resposta dada por Santo Agostinho, nos primórdios do debate sobre o que fazer
com as verdades que os filósofos pagos encontraram:

“(...) que reivindiquemos essas verdades para nosso uso, como alguém que retoma seus bens a possuidores injustos. De facto, verificamos que os egípcios não possuíam apenas ídolos e
impunham cargas pesadas a que o povo hebreu desviava abominar e fugir, mas também tinham vasos e ornamentos de ouro e prata, assim como quantidade de vestes. Agora, o povo hebreu, ao
deixar o Egito, apropriou-se, sem alarde, dessas riquezas (Ex 3.22), na intenção de dar a elas o melhor emprego. E não tratou de fazê-lo por própria autoridade, mas sob a ordem de Deus (Ex
12.35-36). E os egípcios passaram sem contestação desses bens, dos quais fizeram mau uso. Ora, dá-se o mesmo em relação a todas as doutrinas católicas. Elas possuem, por certo, ficções
mentirosas e supersticiosas, pesada carga de trabalhos supérfluos, que cada um de nós, sob a conduta de Cristo, ao deixar a sociedade dos pacíficos, dever rejeitar e evitar com horror. Mas eles
possuem, igualmente, artes liberais, bastante comentários ao uso da verdade e ainda alguns preceitos morais muito úteis. E quanto ao culto do único Deus, encontramos nos pagos algumas
coisas verdadeiras, que são como o ouro e a prata deles. Não foram os pagos que os fabricaram, mas os extraíram, por assim dizer, de certas minas fornecidas pela Providência divina, as quais
se espalharam por toda parte e das quais receberam, por vezes, o serviço do demônio. Quando, porém, alguém se separa, pela inteligência, dessa miserável sociedade paga, tendo-se tornado
cristão, deve aproveitar-se dessas verdades, em justo uso, para a pregação do evangelho. Quanto às vestes dos egípcios, isto é, às formas tradicionais condicionais pelos homens, mas
adaptadas às necessidades de uma sociedade humana, da qual não podemos ser privados nesta vida, serão permitidas ao cristão tomá-las e guardá-las a fim de convertê- las em uso comum."
(Santo Agostinho. A Doutrina Cristã; Manual de Exegese e Formação Cristã. II, 41.60. São Paulo: Edições Paulinas, 1991, pp. 149-150)

CONCLUSÃO

A Igreja Católica, como fiel esposa, segue em tudo os passos do esposo, que disse: "falei publicamente ao mundo. Ensinei na sinagoga e no templo, onde se reúnem os judeus, e nada falou
às ocultas" (Jo 18, 20) . Mas a partir do momento que o respeito humano toma conta, deixa-se de professar publicamente a Fé em nome de diplomacias políticas, depois passa-se a organizar
grupos secretos para ações políticas planejadas, depois, acrescenta-se o estudo de doutrinas e práticas espiritual e, por fim, adere-se a todo tipo de heresias, fantasias e ilusões, levando a
pensar como esta:

"O meu amigo Antônio Donato, por exemplo, que é o melhor instrutor religioso que eu já vi na minha vida, um santo homem. O Donato é santo mesmo, não tenho a menor dúvida. Mas o Donato
não é ordenado padre. Ele é santo o melhor padre que tem no Brasil, e diz que não está preparado para ser ordenado padre. Quer dizer que Deus no céu já o tentou mil vezes; dá ordenação
sacerdotal para ele todo dia. Porém, o Donato não liderou um movimento, ele não é um chefe de seita. Ele é um professor de religião, e o melhor que eu já vi. Então, quer estudar? Estude com o
Donato. Mas vai dar um trabalho triste. E olha que eu sou amigo do Donato faz 30 anos, e entre nós nunca houve a mínima divergência sobre nada. Eu estou fazendo aqui o meu serviço, ele está
fazendo o dele lá, e nós estamos indo para o mesmo lugar. Agora, se você entrar em qualquer movimento, você vai criar problema. Se você Se quiser mesmo o negócio da teologia, procure
Antônio Donato Paulo Rosa. É o melhor do Brasil, se não o melhor do mundo. É o mais honesto, o mais bondoso, mas ele é durão, vai lhe dar muito trabalho para fazer." (Olavo de Carvalho,
COF, Aula 37, 19 de dezembro de 2009, 02:20:00).

Para que isso aconteça, resta uma dúvida, Olavo e Donato poderiam ir juntos, se Olavo, com tão bom amigo e professor de religião, atualmente já nem sabe mais se tem religião? Fico com o
ensinamento do Pe. Daniel Pinheiro, que não é o ensinamento de nenhum guru, mas simplesmente o ensinamento de sempre da Igreja: “nem direita, nem esquerda, nem de centro... sejamos
católicos!”.

Em Corde Iesu,
Heloísa Gusmão

RESPOSTA

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