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REVISTA DE FFLCH-USP

HISTÓRIA 1998

DEL PRIORE, Mary (org.). História das Mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto/Unesp,
1997, 678 páginas.

Organizado pela Professora Doutora Mary Lucy importância e referência obrigatória, à medida que
Murray Del Priore, do Departamento de História da pioneiros.
Universidade de São Paulo, fartamente ilustrado, A Professora Mary abre a obra com uma breve
História das Mulheres no Brasil, pretende ser uma apresentação, que é seguida pelo texto de Ronald
obra destinada a especialistas, não especialistas, e Raminelli, professor adjunto do Departamento de His-
curiosos, tarefa que cumpre com maestria. Na verda- tória da Universidade Federal do Paraná, “Eva Tupi-
de a obra reúne os escritos de 19 historiadores, em nambá”, no qual através de uma visão histórico-antro-
sua quase totalidade professores universitários, e de pológica, o autor levanta questões relacionadas com
uma escritora, Lygia Fagundes Telles. Todos eles o cotidiano das indígenas brasileiras do início da colo-
contribuem com temas que refletem o estágio atual nização portuguesa, destacando sobretudo a tribo
das pesquisas relacionadas à feminilidade no Brasil, Tupinambá, sem deixar de mencionar algumas práti-
mostrando o papel desempenhado pelas mulheres ao cas observadas entre os Caetés e Caraíbas. Lembran-
longo de nossa história, abarcando desde o cotidiano do que a documentação, dos séculos XVI e XVII,
das indígenas do início da colonização até os movi- referente ao tema é pouco precisa e muito contradi-
mentos de trabalhadoras desenvolvidos ao longo do tória, uma vez que os relatos dos viajantes europeus,
século XX. principal fonte na reconstituição do cotidiano indíge-
O fato da organizadora ser uma das maiores, e tal- na, viam com estranheza e julgavam pela ótica de seus
vez mesmo a maior, especialista no assunto no Bra- próprios valores os costumes silvícola, o historiador
sil, garantiu que a obra tomasse um corpo unívoco, descreve o cotidiano feminino indígena desde o nas-
não obstante ter sido construída a partir do conheci- cimento até a idade dos “seios caídos”, passando pela
mento de diversos autores das mais variadas especiali- análise da sexualidade, pelo papel desempenhado
dades. Cabe aqui lembrar que a tese de doutorado da pelas mulheres nas cerimônias canibalescas, pelas
Professora Mary, Ao Sul do Corpo: condição femini- relações observadas entre mães e filhos, os ritos de
na, maternidade e mentalidades no Brasil Colônia, passagem de menina à mulher, e a inserção e o papel
defendida sob a orientação da Professora Doutora desempenhado pelas indígenas dentro do contexto
Maria Luiza Marcílio em 1990, bem como os diver- familiar silvícola. Curiosamente o autor consegue tra-
sos artigos publicados ao longo de sua carreira como çar o vínculo temático implicado entre o sexo femini-
docente, abordando questões ligadas à sexualidade e no, a sedução, o canibalismo, a vida e a morte; mos-
sociabilidade feminina, constituem trabalhos de suma trando que no imaginário Europeu, as mulheres, ín-
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dias ou européias, eram vistas como filhas de Eva, nhada pelas danças e costumes africanos, concluin-
reunindo sob este desígnio os piores predicados. do que, no Brasil colonial, das mais variadas formas
O segundo texto da obra, “A arte da sedução: se- as mulheres contornavam a repressão deixando aflorar
xualidade feminina na Colônia”, de autoria de Emanuel a arte da sedução.
Araújo, professor do Departamento de História da O terceiro texto, “Magia e medicina na Colônia:
Universidade de Brasília, aborda questões ligadas a re- o corpo feminino”, de autoria da Professora Mary Del
pressão da sexualidade feminina por parte da socie- Priore, aborda a ciência médica entre os séculos XVI
dade colonial, que distinguia o papel da mulher mãe e XVII, quando se acreditava que as doenças eram
e esposa do papel desempenhado pela amante. À boa derivadas dos pecados cometidos, os cirurgiões eram
esposa cabiam os atos contidos e a auto repressão se- poucos e mal instruídos e o atraso da medicina era
xual, ao passo que o bom marido deveria respeitar sua grande. Em uma época em que muitas mulheres que
esposa, tendo sexo com ela apenas com fins a procria- tinham algum conhecimento de como curar enfermi-
ção, o prazer só podia ser vivido ao lado da amante e dades desempenhavam o papel que caberia a um mé-
nunca da esposa. Não obstante esta repressão, no dico, tendo sido por este motivo perseguidas, mas nem
Brasil colonial imperava a sensualidade feminina, exi- por isso deixando de curar, o conhecimento médico
bida através dos trajes provocantes, leves e típicos de sobre o corpo feminino era extremamente reduzido e
um país quente. Reprimidas pela sociedade, as mu- relegado a segundo plano. A historiadora mostra que
lheres encontravam nas festas religiosas a oportuni- enquanto o conhecimento médico acerca do corpo da
dade ideal para deixarem-se seduzir, e embora o ris- mulher estava reduzido aos órgãos ligados a reprodu-
co fosse grande, pois caso fossem pegas podiam de ção, a prática de curandeirismo era extremamente co-
acordo com a justiça ter a pena capital aplicada pelo mum no Brasil colonial, suprindo a lacuna deixada
próprio cônjuge, trair ao marido. Dentro deste contex- pela medicina oficial, como resposta ao desconhe-
to, o autor coloca a idéia de que a tentativa de controle cimento médico do corpo feminino as mulheres termi-
da sexualidade feminina, tinha como resposta ou a navam tratando a si mesmas.
submissão aos padrões impostos, ou, ao contrário, o O quarto texto, “Homoerotismo feminino e o San-
exercício da sedução e da transgressão, descrevendo to Ofício”, de autoria de Ronaldo Vainfas, professor
como forma de não aceitação ao domínio masculino titular do Departamento de História da Universidade
o homossexualismo feminino. Lembrando por vezes Federal Fluminense, aborda os chamados casos de so-
as interpretações de “uma historiadora”, a saber Mary domia entre mulheres no Brasil colonial, depois de
Del Priore, o texto mostra com clareza que a mulher discutir a concepção de sodomia, o historiador mos-
era vista como um animal a ser domado, e que exata- tra que a prática do homossexualismo feminino era
mente por isso deveria ter sua sexualidade reprimi- muito mais comum do que se poderia imaginar. Não
da. A expressão máxima da repressão da sexualidade obstante a inquisição ter perseguido os praticantes do
feminina e também da transgressão às normas de con- ato de sodomia, fossem homens ou mulheres, poucos
duta ditadas pela sociedade era representada pelo foram os condenados, pois somente em caso de con-
convento, onde filhas e esposas repudiadas eram con- duta escandalosa e reincidência o réu terminava na
finadas e mantinham seus amantes, fato notoriamen- fogueira. Além disto a inquisição enfrentava um gran-
te conhecido que todos fingiam não saber. De certa de problema no que diz respeito a considerar possí-
forma o autor termina também por tocar na questão vel ou não a uma mulher cometer sodomia, na Euro-
da sensualidade das escravas, e na sedução desempe- pa Moderna foi bastante comum o lesbianismo, sen-
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do este tipo de relação passado desapercebido ou to- Campus de Araraquara, “Mulher e Família Burgue-
lerado, o autor mostra que no Brasil Colônia esta es- sa”, sétimo texto da obra, saímos da esfera do Brasil
trutura tendeu a se reproduzir. colonial para passearmos pelo universo do século
O texto de Vainfas é seguido pelo texto de seu XIX. Autora de Amor e família no Brasil, D’Incao
colega Luciano Figueiredo, professor assistente do narra as transformações arquitetônicas realizadas ao
Departamento de História da Universidade Federal longo do século XVIII e XIX que possibilitaram a for-
Fluminense, “Mulheres nas Minas Gerais”, onde o mação dos espaços privados, e que por conseqüência
autor reconstitui o cotidiano feminino Mineiro do trariam também significativas mudanças na esfera dos
século XVIII, quando as mulheres apesar de serem sentimentos. Através de sua visão sociológica ela
minoria, representadas por negras forras e escravas, mostra a formação da sensibilidade romântica no in-
exerciam funções secundárias ligadas ao abasteci- terior das famílias burguesas, enfatizando o enraiza-
mento e prostituição. O historiador mostra como algu- mento de novos valores neste meio social.
mas funções, tais como a ocupação exercida pelas Enquanto Miridan Knox Falci, professora do
“negras do tabuleiro” (vendedores ambulantes), eram Departamento de História da Universidade Federal do
encaradas como possível foco de revolta escrava, e Rio de Janeiro, em “Mulheres do Sertão Nordestino”,
por isso combatidas e vigiadas de perto pela Coroa aborda a situação vivida pelas mulheres nordestinas
Portuguesa. O artigo de Figueiredo é extremamente no século XIX, em meio a uma sociedade extrema-
rico em detalhes e informações, e como lembra o pró- mente hierarquizada e escravista; Joana Maria Pedro,
prio autor, condensa alguns temas desenvolvidos em professora titular do Departamento de História da
seu livro O avesso da memória: cotidiano e trabalho Universidade Federal de Santa Catarina, em “Mulhe-
da mulher em Minas Gerais no século XVIII, bem res do Sul”, relata uma realidade totalmente oposta,
como sua dissertação de mestrado, Barrocas famíli- não só no sentido geográfico como também social,
as: vida familiar em Minas Gerais no século XVIII, pois neste caso as mulheres na ausência dos homens,
defendida junto ao Departamento de História da Uni- geralmente envolvidos em guerras ou com a política,
versidade de São Paulo. possuíam uma relativa liberdade, e, ao contrário das
Em a “Maternidade Negada”, sexto texto da obra, mulheres nordestinas, estavam quase sempre a fren-
Renato Pinto Venâncio, professor do Departamento te dos negócios da família.
de História da Universidade Federal de Ouro Preto, Com o décimo texto da obra, “Psiquiatria e Fe-
discute a questão do abandono de crianças no Brasil minilidade”, de Magali Engel, professora do Depar-
colonial, prática comum entre as famílias pobres, tamento de História da Universidade Federal Flumi-
principalmente no meio urbano, e entre as mulheres nense, entramos na esfera do Brasil republicano,
que engravidavam em relações extraconjugais. Além quando os parâmetros burgueses se legitimam norma-
de abordar a prática do abandono de crianças, o au- tizando os comportamentos, e exigindo a “medicali-
tor toca também na questão do massacre dos “anji- zação da loucura”. A historiadora mostra a relação
nhos”, quando em uma sociedade em que a morte de implicada entre feminilidade e loucura, através de sua
bebês era um fato corriqueiro da ordem de 20% a 30% interpretação da instituição da psiquiatria como ciên-
dos recém-nascidos, muitas crianças eram deixadas cia, pelos primeiros republicanos, enquanto aparelho
expostas ao tempo por suas mães para que morressem. de controle político, social e sexual.
Com o texto de Maria Ângela D’Incao, professo- Colega de Engel na Universidade Fluminense,
ra do Departamento de Sociologia da UNESP do professora titular do Departamento de História,
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Rachel Soihet, autora de Condição feminina e formas ver, e não só romances e poemas como também jor-
de violência: mulheres pobres e a ordem urbana (1890- nais, uma forma de participar do cotidiano da socie-
1920), contribui para a formação de um panorama his- dade da época, escapando do jugo masculino.
tórico da condição feminina em nosso país, com seu Com um recorte extremamente especifico, Guacira
texto “Mulheres Pobres e Violência no Brasil Urba- Lopes Louro, professora titular do Departamento de
no”, onde a historiadora mostra como o processo de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do
aceleração da urbanização estimulou um progressi- Sul, autora de Educação e Gênero: a escola e a pro-
vo movimento das populações pobres em direção as dução do masculino e do feminino, em seu texto “Mu-
capitais, no fim do século XIX e já princípio do XX. lheres na sala de Aula”, reconstitui uma espécie de
Enfatizando que a pressão social exigia das mulhe- história das mulheres na educação brasileira, mostran-
res um recato restrito a esfera do privado, cabendo so- do que durante o século XIX, ao mesmo tempo em
mente aos homens o domínio do público, a autora que os homens estavam abandonando as salas de aula,
demostra que esta exigência não era acatada pelas o magistério se tornava cada vez mais uma profissão
mulheres das classes populares, que quase sempre feminina. De certa forma, a educadora termina tam-
movidas pela necessidade de prover o próprio susten- bém por tocar na questão do conteúdo destinado ao
to, além do sustento dos filhos, eram seres rudes e ensino dos meninos e das meninas, diferenciado prin-
resistentes como qualquer homem. Utilizando os pro- cipalmente no tocante a praticidade do que era ensi-
cessos criminais como principal fonte, ela mostra que, nado. As meninas, por exemplo, deviam ser ensina-
ao contrário do que se poderia imaginar, quando víti- das a serem futuras boas esposas e mães, enquanto
mas de violência nem sempre as mulheres pobres aos meninos cabia aprender a serem bons provedo-
agüentavam tudo caladas, figurando muitas delas res e chefes de família.
como principais personagens dos crimes passionais, Doutora pela École des Hautes Études en Sciences
não obstante muitas vezes figurarem também como Sociales de Paris, com sua tese Les femmes dans le
vítimas, de um modo ou de outro elas eram sempre catholicisme au Brésil-Lecas des communautés
castigadas pela violência masculina. ecclésiales de base, defendida em 1991, Maria José
Através do décimo segundo texto da obra, “Escri- Rosado Nunes, professora da Faculdade de Teologia
toras, Escritas, Escrituras”, de autoria de Norma Nossa Senhora Assunção (de São Paulo), discorre no
Telles, professora do Programa de Estudos Pós-gra- décimo quarto texto da obra sobre o papel desempe-
duados em Ciências Sociais da Pontifícia Universi- nhado pelas “Freiras no Brasil”. Em seu artigo a auto-
dade Católica de São Paulo, entramos em uma subdi- ra defende a idéia de serem as freiras, com exceção das
visão da história social, intimamente ligada a ela, a mulheres pobres, as primeiras mulheres a de fato de-
história da cultura. Em seu texto a socióloga enxerga o sempenharem uma profissão em nosso país, enquanto
século XIX como o século do romance, e muito embora a maioria das mulheres era simplesmente do lar, rela-
tenha sido também uma época em que as mulheres fo- tando todos os conceitos implicados em ser freira no
ram inferiorizadas pelos homens, foi neste período que Brasil, e suas modificações ao longo dos séculos.
os primeiros textos escritos por mulheres começaram a Em “Ser Mulher, Mãe e Pobre”, décimo quinto
aparecer. Apesar do romance, por mais inocente que texto da obra, Cláudia Fonseca, professora do Depar-
fosse, ser considerado como uma leitura imprópria tamento de História da Universidade Federal do Rio
para moças, excluídas da participação política, mui- Grande do Sul, delimita o cotidiano da mulher pobre
tas mulheres acabaram encontrando no ato de escre- dos núcleos urbanos das primeiras décadas do sécu-
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lo XX. Levando o leitor a passear por temas como: o tir do cotidiano das fábricas, e da luta travada por
trabalho feminino nas indústrias enquanto necessida- anarquistas e socialistas, a mulher conquistou o espa-
de complementar ao salário do marido, ao mesmo tem- ço público, contando como ocorreu o início da vira-
po em que estas mulheres eram mal vistas pela socie- da da situação exposta nos textos precedentes da con-
dade; a dinâmica familiar dentro dos grupos populares; dição da mulher na esfera social, por meio de uma
a precariedade dos laços familiares e a questão do aban- batalha intensa das chamadas “indesejáveis”, ou seja
dono de mulheres; a moralidade oficial e as contradi- das feministas.
ções implicadas no cerne desta moral, que culminavam Carla Bassanezi, mestre em História Social pela
na oposição pureza ou prostituição; e a maternidade USP e doutoranda em Ciências Sociais da UNICAMP,
entre as famílias pobres, entre outras questões. responsável pela coordenação geral de textos da obra,
Com o texto de Maria Aparecida Silva, professo- em “Mulheres dos Anos Dourados”, colabora para a
ra livre docente do Departamento de Sociologia da formação de uma imagem mais contemporânea da
UNESP do Campus de Araraquara, “De Colona a condição feminina ao examinar a estrutura mental dos
Bóia-Fria”, entramos em um universo polêmico e anos 50. Utilizando como principal fonte, revistas
atual, a questão da terra e o envolvimento do traba- femininas da década de 1950, ela vislumbra a gama
lho feminino nesta questão. Com a substituição do tra- de imaginário envolvida na conceituação do “ser
balho escravo pela mão de obra livre, a mulher colona, mulher”, e as relações implicadas entre namoro, ca-
a imigrante, aparece nas áreas rurais paulistas enquan- samento, virgindade, honra, filhos, e aventuras extra-
to força de trabalho, esta situação prevalece como do- conjugais, entre outros assuntos. O texto de Bassanezi
minante até 1960, a partir desta data, o processo de é extremamente rico e parece estar em consonância
urbanização do país concentra as terras nas mãos de com sua dissertação de mestrado, Virando as pági-
poucos, e expulsa os trabalhadores residentes, os co- nas, revendo as mulheres; relações homem-mulher e
lonos, da terra, criando um empobrecimento genera- revistas femininas, 1945-1964, defendida junto ao
lizado. Na década de 1970, com a implementação do Departamento de História da Universidade de São
plano governamental Proálcool, cria-se a necessida- Paulo em 1992.
de da utilização de uma mão de obra intinerante para Complementando e dando continuidade ao con-
cultivar e colher a cana de açúcar, surgem os bóia- teúdo abordado no texto de Margareth Rago, em “Os
frias. A socióloga aborda justamente em seu artigo a Movimentos de trabalhadoras e a sociedade Brasilei-
questão do trabalho feminino integrado ao sistema de ra”, Paola Cappellin Giulani, professora do Departa-
bóias-frias, discutindo as raízes de uma questão obser- mento de Sociologia da Universidade Federal do Rio
vada em nosso presente, tratando assim de um tema de Janeiro, aborda a questão da formação da cidada-
que interessa tanto a pesquisadores como a curiosos. nia ao longo do século XX, e a história da formação
Em “Trabalho Feminino e Sexualidade”, décimo dos movimentos sindicais no Brasil, destacando so-
sétimo texto da obra, Margareth Rago, professora do bretudo o período compreendido entre 1979 e 1985,
Departamento de História da UNICAMP, autora de que foi marcado pelas greves do ABC paulista e pela
Os prazeres da noite: prostituição e códigos de se- vitória de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. A
xualidade feminina em São Paulo e Do cabaré ao lar: historiadora toca não só na participação das mulhe-
a utopia da cidade disciplinar (1890-1930), traça um res nos movimentos sindicais, como também nos mo-
panorama acerca das trabalhadoras dos primórdios da vimentos femininos rurais, na crise da divisão sexual
industrialização brasileira, demostrando como a par- do trabalho e da representação sindical, nas reivindi-
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cações de igualdade sexual no trabalho, e na prática tema, à medida que, inserido na tendência de recons-
política das trabalhadoras; chegando a mencionar tituição da micro história, coloca o leitor em contato
fatos ocorridos em 1996, demostrando assim a atua- com autores que de algum modo trabalham ou já abor-
lidade de seu texto. daram questões relacionadas com a história das mu-
A escritora Lygia Fagundes Telles, representan- lheres no Brasil.
te da terceira fase do movimento modernista, autora Através da descrição do conteúdo de cada um dos
entre outros romances de As meninas, encerra a obra textos integrantes da obra, pudemos notar que eles
com um texto totalmente inédito e escrito especial- estão intimamente ligados entre si, encadeados de
mente para a ocasião, intitulado “Mulher, Mulheres”, maneira extremamente lógica e coerente, o que certa-
constituindo o vigésimo texto da obra. Apesar de seu mente foi garantido pela organização e experiência
texto não possuir um caráter propriamente histórico, da Professora Mary. Publicado com o apoio da
termina por deliciosamente fechar de forma coeren- FAPESP, Historia das Mulheres no Brasil é uma obra
te a obra enquanto corpo temático, e por ter sido es- de leitura obrigatória não só aos interessados no tema
crito por Lygia merece uma leitura atenta. propriamente dito, como também a todos os estudan-
A exemplo de algumas obras publicadas no exte- tes e pesquisadores interessados na história de nosso
rior, sobretudo na França, como por exemplo o livro país da colônia aos dias atuais, constituindo também
de Catherine Delamarre e Bertrand Sallard, La Femme fonte de referência para sociólogos, psicólogos, e
au Temps des Conquistadores, a obra organizada pela educadores. Com certeza esta obra deverá tornar-se
Professora Mary vem preencher uma brecha na em breve mais um clássico da historiografia brasilei-
historiografia brasileira, constituindo um importante ra, que não pode deixar de ser lido quer seja de for-
esforço no sentido de fazer conhecer este importante ma parcial ou em sua totalidade.

Fábio Pestana Ramos


Pós Graduando - Depto. de História-FFLCH/USP
Bolsista da FAPESP

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