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de Haximu
órtäos Ines Daflon
Seon
Maria Lúcia,paflon
TO
z
D
Introdução 9
Eu, indio 14
fo Um Yanom 30
De volta ao shabono 46
Visão de dentro 64
Visão profunda 76
União e forga 88
Epilogo? 102
INTRODuÇÃO
o seu
Ouando Daniel me pediu que escrevesse uma introdução para
garimpeiros.
As vezes recebiamos a visita de missionários, que traziam
medicamentos eacompanhavam
o
tratamento das doengas "trazidas pela
fu-
contra as quais noss0sshabori nada podiam fazer
maça do homem branco',
Se podia
estar
Ainda moro nareserva indígena,em Mucajat.
quisesse,
as Er.
rios eabismosque impedem a1nda rondam aldeias, Eles
dos montes,
Mas garimpeiros clandestinas no meio da sel
os
selva.
em plantar ecriargado. ae pouso
pistas
avioes econstroem esólapude ver como madeireir
têm barcas e
iros
adolescente,
Osmadeireis
Fui para Mucajat ainda iros
uma ameaça àforesta.
grande
também eram a
e boa e 1am embora, adeixando
fazendeiros
Tiravam a madeira
e o aua
chegavam primeiro. vinbam depois, queimarvam que
de
destruição. Osfazendeiros O ciclo repetia-se em
n
imagem tudo em pastagem.
havia sobrado para transformar
da Amaznia brasileira.
todos os outros estados na escola de Mucajaf. Fiz
Dedico minba vida à educação indigena
e
e participe da revisao atuali-
especialização
cursos etreinamentos para
da aldeia. Vi quando nossas crianças ejovens
das escolas
zação do currículo ao sistema nacional de ensino.
uma escola integrada
passaram afrequentar na bistória do meu povo.
A foi a melhor coisa que aconteceu
educação mais chamar
conhecemos bema lingua portuguesa e não queremos
Hoje
ainda dão motivo para isso, mas
a lei do Brasil
os brancos de napëpë. Muitos
temos nossa terra e nossa escola. Muitos
é boa para nás.Temos nossos direitos,
cá estudar nossa
a escola, outros vém para
brancos trabalham com gente na
ambiente.
10
Apesar de tantas conquistas, os problemas dos indios amazônicos não
deixaram de existir. Ainda tem invasão, grilagem e uso indevido das ri-
Nape Spenser
EU, INDIO
e Doris Woolc
por meu pai olf
a preparada
recepção
Foi simpática e parentes compareceram em
21 anos. Amigos
na ocasião dos meus Spenser, havia
Via
muito. Meu pai, Philip
nos divertimos
de decorar a casaa
no Brasil e tez questao
peso e, juntos,
uma temporada CDs de samba, bossa-novOva
passado
Tocamos nossos
com motivos brasileiros. A mesa
ainda não seidiferenciar... esa,
que para
mim sempre fora velado:
Vocé sabe.
-Pai, estou pensando naquela viagem.
sabendo que precisava
Eledemonstroucerto nervosismo, mas,
um sorriso meio sem graça:
-
conformar-se, respondeu com
E, eu sabia que esse dia iria
chegar.
de tudo, Pas
-Preciso conhecerolugar onde nasci, e, acima
minha
preciso saber mais sobre mãe.
teria
de contar tudo. Até aquela noite, eu sabia apenas que minha
ou manipular
-
tentar esconder esses fatos da minha
Ainda não acabei, pai. Escuta, por favor! Andei juntando di-
nheiro. Já tenho o suficiente para passar um tempo no Brasil, estudar,
15
fundo, e comegou
rundo, começou a falar,
um instante, respirou
Olhou-me por
sem os rodeios de sempre: urado d
nos anos 1980. Fui capturado durante
Vivi com os
Yanomami
como médico da missão.
uma de minhas viagens Mas nao o interromn:
eu a me surpreender.
Dessa vez fui
muito além do que podia imaginar. Meeu
ouvi um relato que foi
com o da história que eu ja conhecia. Contou.
nt bu
pai começou pedaço
realizar um sonho que sempre
que depois de se formar resolveu
tinha atração pela Amazônia. Na
acompanhara. Desde pequeno
e dedicou-se à pesquisa
faculdade, interessou-se por imunologia
sobre doenças tropicais endêmicas. Soube direcionar sua carreira
me-revelou com as
apenas adornos.
-Então vocêmentiu mãos um tanto ulas.
pra mim! Ela é tremu
uma índia e não uma
na cabocla!
cau
Sim, essa é Yarima, sua mãe. Uma Yanomami. Você nasceu
no entorno da Serra do Parima, na fronteira com a Venezuela. Foi
registrado
em São Gabriel da Cachoeira, mas nasceu numa aldeia
indígena, em
Koraima. Não contei porque meu envolvimento com
no passado, somos
e hoje estamosaqui
uma familia!
Os problemas ficaram felizes, somos
17
minha mãe
o romance com
Como você começou e eu:
tanto confusO, responder.
também um
Meu pai olhou-me, ela.
A vida levou-meaté eu preciso saber!
-Como assim, pai? Explica
direito,
pois cles haviam perdido a barcaça que os levaria do Rio Branco até
alta, calafrios
e forte dor de cabeça. O
quadro era típico de malária.
Uma chuva forte começou a cairea carga de medicamentos
que transportavam foi fundamental para o tratamento de Winston.
O mau tempo continuou por alguns dias e não havia nada que eles
tazer senão aguardar.
pudessem Winston, felizmente, começou a
dar sinais de melhora.
No dia do retorno a Boa Vista, meu pai já se sentia aliv1ado com
a melhora de seu velho amigo. Retornaria à base, onde o deixaria
a
riopara tratar malária falciforme, e
Uuwa sabia que substância a
estava presente na carga.
"Digaa eles que no próximo voo farei uma visita para tratar
Seu povo."
20
reira linguistica era enorme, mas meu pai finalmente entendeu que
não lhe fariam mal.
os indigenas achassem
Talvez que o tivessem atraido com suas
evocaçõespensou. Tlalvez cantassem para agradecer aos deuses por
tê-lo enviado.
ritmo.
acompanhar aquele
tarefas na comunidade. Seus
Yarima, minha mãc, tinha diversas
pais haviam morrido quando ela ainda era menina esua condição de
órfi a colocava em uma posição
social
inferior.Além depreparar ervas,
tinturas e indumentárias para osrituais, ela também ganhou tarefa
a
de ajudar meu pai com os doentes.
ter sido
Também em situação social inferior por capturado pelos
meu pai identificou-se com a bela jovem. Não sabia quando
índios,
adotar os há-
vida. Porém, mesmo privado de liberdade
e forçado a
bitose costumes daquele povo, sentia-se feliz por estar vivo. Tinha
sua vez, pareciam não se importar com a sua presença, desde que ele se
costume de
Mas averdade é
que alguns povos
indígenas tem
o
capturar pessoas de outras etnias e
sua comunidade. levá-las para viver em
Os
própriosYanomamitêm uma
Em 1932,eles história curo
11 anos de idade.capturaram a
menina Helena Valero, com
entao c
Contam que
um Helena fora ferida às de
igarapé, durante um margc
atentado contra seuspais. da pelos
Tratada
P
22
indios, cresceu entre eles, adaptou-se à vida no shabono, casou-se
duas vezes e teve filhos.
exploradores,
desmentindo o preconceito de que os Yanomami seriam
deitar com meu pai. Ele ainda resistiu por um minuto, mas logo cedeu
aos encantos da jovem.
os Yanomaminão há regras definidas de conduta social.
Entre O
bem da comunidade sempre fala mais alto e, se o problema de um é
problema de todos, a felicidade de um é a felicidade
de todos. Tam-
bém não há laços eternos de relacionamento ounada quesecompare
à instituição do casamento. Aquele romance, portanto, atormentou
vida. Pensando sobre essas coisas, meu pai afinal compreendeu que
deveria deixá-los em paz e voltar à base da missão.
23
..
por mais alguns
meses.
a ficar ali
Mas o destino o obrigaria à vid.
totalmente integrado
com Yarima,
A essa altura
ele vivia
sua Acostumado a prese.sen-
a notar gravidez.
tardou
no shabono. Não indígenas,
resolveu permanec..r
em comunidades .
é secular entree os
ciar o infanticídio Esse costume
nascesse.
na aldeia até que
a criança devem viver ou morr rrer
se seus filhos
mulher decide
Yanomami. A
decisão.
As razões para o infanticidin
em sua
e ninguém interfere um pode morrer. Se uma
Se nascem gemeos,
são as mais diversas. ela também
ou se o sexo é indesejado,
nasce com deficiência
criança
sacrificada. mais tarde
pode ser ter uma filha para
dizer que queria
Yarima costumava o costume do seu povo.
conforme
casá-la com um primo
cruzado, meu pai
caso fosse um menin0,
da criança,
Temendo pelo destino e o nascimento do bebê. Assim,
toda a gestação
decidiu acompanhar a criar a criança.
de tentar convencê-la
teria uma chance
pelo menos em
a gravidez avançava, ele pensava
Em todo caso, enquanto
e de lá seguir para
a Inglaterra, dizendo
adeus
voltar para Manaus fosse o
o nascimento do bebê, iria embora,
à vida na floresta.Após sua
ele intervir por
ou fosse ou não necessário
bebê menina menino, e
a criança
ou não. Passou a sair sozinho
sobrevivesse
sobrevivência,
observar a reação dos índios.
aandarpelos arredoresdo shabono para
a ausência de regras explícitas
A indiferença mais uma vez comprovou a
Tudo era permitido, desde que paz
nas comunidadesYanomami.
fosse respeitada.
Tendo chegado a essa conclusão, meu pai começou
trocar
Uma das providências que tomou foi
a se preparar para partir.
uma canoa.
alguns objetos por aa
Com o passar dos meses, porém, ele começou a descontiar
de gêmeos. Após a ausculta, foi possível verificar a ocorren
gestação
cia de dois fetos. Decidiu contar a ela
o que haviapercebido e assim
os
era
tentar, pouco a pouco, convencer Yarima de que possível cra
e rem
dois, que era possível as duas crianças nascerem saudáveis crescc
Yarima se mostrou assustada e impressionada om o
normalmente.
24
de meu de 'saber o futuro" e não oassunto.
poder pai quis falar sobre
Meu pai, por sua vez, estava empenhado em garantir a sobrevivência
das crianças, nem que para isso tivesse de retardar seus planos de
retornar à Inglaterra.
Minha me toi assistida por outras mulheres na hora do parto.
25
seio materno. No meio dos do1s, que se olhavam fixamente, eu
eu
por
.
Suou
o bico do peito e, como minha irm, ei-o
fim consegui alcançar e F.
na minha direção sorriu, Era
avidamente. Yarima desviouo olhar
não sabia como a comunidade iria ree
receber
um sorriso nervoso, pois
bebé magricela. Ma, por fim, minha
a notícia da aceitação daquele
vida estava salva.
tachou meus pais de
A princípio, a comunidade do sbabono
aceita é responsabilidade
de todos e eu, nos
insensatos. A criança
de vida, já me mostrava frágil. Enquanto minha
primeiros meses
tinha restriados constantes e
irm se desenvolvia normalmente, eu
nariz entupido e tinha dificuldades para ma-
picos de febre. Vivia de
mar e dormir. Meus berros no meio da noite atormentavam a todos.
Era obrigação de meus pais notar que eu era fraquinho e evitar
Mas ofato éque eu estava ali, lutando para me manter vivo. Meu
pai temia por meu futuro e, segundo me contou, dormia sempre
movimento.
27
f
AALAAAL
EM LON
UM YANOMAMI NDRES
presença
maior floresta do planeta e, embora não tenha se afastado totalmente
versidade e
de Londres optoupela Antropologia ameríndia.
Além das escolhas profissionais, meu pai e
Winston tambéém
ainda eram
aprenderam a pilotar e,desde muito jovens, quando estu
o
de formados, os dois cumpriram quevinham afirmando e partiram
na frente, Winston chegou meses depois.
para o Brasil. Meu pai foi
De volta à pouco mais de um ano após sua ida para
Inglaterra,
Os sonhos de juventude
a Amazônia, Winston sentiu-se péssimo.
haviam terminado da pior maneira possível: ele, desiludido com a
temendo por seu futuro e pelo futuro dos povos
situação da floresta,
morto.
que ali habitavam, e meu pai, desaparecido, supostamente
deixou de
Winston tornou-se um empresário de sucesso. Jamais
ajudar instituiçõesdedicadas à
pesquisae
à defesa dos povos da flo-
31
meus avos nao mediram estorços
para
em que esteve desaparecido, na medida do possível i
informa
Winston ajudou dosindi4
tentar localizá-lo. tomadoea etnia
hav1a
a aeronave queo
do a direção que território Yanomamiiémaior
Contudo,opouco
acessível do
levaram. assim localizar um sbabon
meio
e não étão simples
que Portugal, ficaram telizes quando souberam que ele
quanto
dafloresta.Imagino à Inglaterra!
retornaria
estava vivoe que
a familia estava maior. Quando Winston
ston
Não sabiam, porém, que
e um bebe, meus avós mal
voltou trazendo o amigo
do aeroporto pu-
e Doris. A
Albert, tia Lisa e os amigos Edward, Claude surpresa foi
Tato de eu não tertido muito contato com minha mäe biológica, uma
cabocla lá da Amazônia, segundo a história que meu pai contava.
33
mei demã
a chamei mäe.
Doris, jamais Conhesi
Mesmotendo sido
criado por tão logo
ileira tão
brasileira logo m
me
a minha origem permiti
sobre
a meia verdade
a maturidade. do que era a minha cond:..
tinha consciência
Ainda garoto, outroporhsd
Não era comoqualquer de
en.
um nascido em plena Amazónia enquan-
cidadão anglo-brasileiro.
mas
dupla nacionalidade, assistência
aos povos da florea
para a Inglaterra.
momento desses, deitado
em meu quarto antes
Exatamente num
se eu estava com
de dormir, a porta se abriu e meu sono
pai perguntou
de culpa, tanto pelo destino de Nape eYarima como pelo fato de ter
escondido de mim a verdade sobre o meu nascimento na América
do Sul.
Eu e minha irm tínhamos10 anos quando o massacre ocorreu.
35
itam
eles acreditas
pois
são queimados,
Seus pertences
também
farturae nada do que
que prec:.
precisavam
um mundo de
mortos vão para
la.
serventia por meu aicon-
aqui tem dalingua Yanomami,
tinha conhecimentos
Como e contou a eles que idá tinha
seguiu
se aproximar
morado no shabono.
dossobreviventes
Os índios, ainda jovens, lembraram-se dele De .
de longe, mas os dias passaram e ela tamhz.
ém
Nape o olhava
início,
a conversar um pouco.
se mostrou mais disposta
e meu pai mostrou a ela ae
Finalmente os dois se
as
aproximaram
A pedido da menina, juntos fizeram am
fotos que tinha com Yarima.
a libertar o espirito
uma fogueira e as destruíram. Assim, ajudariam
de sua mäãe e a do mundo de fartura. A partir de então
aproximá-lo
ela se mostrou mais amigável.Mas a indiazinha ainda estava assus
tada e traumatizada. Naquela mesma semana, caiu doente.
que a assistiu.
que queria fazer o
Disse-lhe teste de
paternidade e
prostitui-
da
ção. No abrigo, Nape estaria protegida. Também seria bem mais fácil
para meu pai manter contato com a senhora Blasser e saber notícias
de minha irm. Pediu-lhe que começasse a dar a ela, na nmedida do
possível, noções de inglês. Ali, Nape também poderia a
frequentar
escola e aprender o portugués. A única desvantagem era afastá-la da
Sua cultura de origem. No abrigo, grande parte dos índios era de fa-
ou Aruak. Alguns haviam nascido na Guiana
milia linguística Karib
para o seu futuro. Nos anos que se seguiram, houve maior organização
37
entre
io entre os
osdi
dointercâmbio diversos sha-
com a expansão zônicas. M..s6a
Mais
amazônicas.
do nosso povo e outras culturas: nheceria as
Yanomami e conheceria as lid.de
bono eentre os
o contato
com suas origens
nomami. Ela se
lider
co
retomaria da cultura Yanomami. tornaria
Nape
manutenção
que lutavam pela
na comunidade. cheio emvida de
importante de Haximu atingiu
Certamente o
Massacre
de Yarima só aos poucos
foiora1
a morte
minha irm. Para mim, Ela erauma
não fez muita diterença.
A
do importância. princípio e assim continuou. medida.ueA
da minha imaginação
personagem consciência da
minha condiço. eoessa
e ganhando
fui amadurecendo vinha a ausa
a me incomodar. Em
primeiro lugar ên-
história começou
sua origem, sabia o que
tinha acontecido. Era uma a
cia. Nape conhecia
era um meio inglës
com a outra metade
Yanomami por inteiro. Eu
amazonense,segundo meu pai. E daf?
obscura, filho de uma
cabocla
Novo. Assim que chegamos ao hotel, liguei para ela, que foi ao nosso
encontro e nos levou para uma volta pela cidade.
turistas no Rio de Ja-
Depois de alguns passeios obrigatórios aos
neiro, à noite fomos a um restaurante. Após ojantar, meu pai eDoris
tomaram um táxi e voltaram o hotel. Achei ótimo!
- Vamos falar
para
Quer treinar?
me mudar o Brasil em alguns
- Sim. Vou
Não desistiu?
para anos.
Não vai acontecer comigo, pensei. Mas o Brasil era mesmo muito dife-
rente. Se era assim no Rio de Janeiro, mal podia imaginar como seria
a vida dos caboclos e dos índios da Amazônia.
39
linda mesmo!
E como sabia
sabia sambar!
de ir à praia no
dia seguinte.
de Mariana. Lind, a
Luísa, irm mais nova
Na praia, conheci a partida de Ma.
a me
ciceronear após
também! Ela se prontificou o homem mais
noite. Eu era feliz
do mundo
Adorei a praia carioca. Um verdadeiro campo de observação para
receptivo.
De voltaà Inglaterra, apaixonado, não havia um dia em que eu
férias do meio
do ano. E foi.
A visita ao Kio de Janeiro me fez terainda mais vontade de mudar
à minha irm, tão logo se mostrou mais receptiva, que ela havia ganhado
outro pai" após morte deMarane. Falou de meu pai como o homem
a
branco quehavia morado na aldeia antes de
ela nascer, descreveu-o
e que
como alguém que nutria grande estima por Yarima iriaajudá-Ha
ele
dele a verdade sobre o meu nascimento na Amazônia.Dizia a c
eria
que certamente tinha parentes lá, podia ter irmãos, primos e qu
ito
conhece-los. Seus
problemas com minha mãe não me diziam Iesp
e ela já estava morta.
42
bém o sobrenome de meu pai. Todos sabiam que tinha vontade de
deixar a lnglaterra após a conclusão do mestrado para fazer o douto-
rado no Brasil.
final do
Ninguém esperava, no entanto, a reviravolta próximo ao
a conversa com meu pai na noite do meu vigésimo pri-
curso, após
Todo o direcionamento que dera aos meus estudos
meiro aniversário.
sobre
começou a mudar. Certamenteeu já havia escutado muita coisa
de antropó-
os Yanomami. Meu povo sempre despertou o interesse
43
m
oSHABON
AO SHABONO
DE VOLTA
de toda
toda a hhistória
já ciente
do,ja
demestrado, m. Fisi-
minha irm
Durante
minha pesquisa vez e conheci
as vezes,
Roraima pela
primeira nos falado algumas
estive em Jáhavíamos ais
éramosparecidos. conversas superficiais que
camente, dealgumas
mas nosso contato
não passara
nos. A princípio, tudo e era
o abismo entre
mesmo assim,
mostravam criar ma proximidade,
alguma proximidade
tempo para
estranho.
Demoramos algum a retornar à lnglaterra
Ta.
eu já estava prestes
e quando isso aconteceu o
e resto da família
conheceu Londres
e finalmente
Nape foi comigo a nos corresponder e falávamos
esse encontro,passamos
Após primeiro
47
na
onal na
vida protissional direço
de vez minha zes
às vezes me. sentia um me
de encaminhar outro lado,
Por vida de
o exemplo da vida
tunidade
indígena. aventuras
da Antropologia ter seguido de O.
por não garoto, por não
nos tempos
tanto covarde
o
com
sonhava
que doo
de meu pai, a minna irma,experimentand. dia
unir logo
de me
tercoragem
Yanomami. mais próximo
a dia nas aldeias em Brasilia estava
morando um futur
De toda maneira, a Vislumbrarde
começamos O
de Nape, e nesse período
luta pela preservação
da cultura
o
Yanomami. próprio desen1
a passar tempo
desenrolar
e
entre a capital federal e São
-
da pesquisa levou-me as escolas em obseruva-
de onde partia para
Gabriel da Cachoeira, vezes a Brasil:
também algumas
foi lia,
ção no meu estudo. Nape
Embora as distâncias aind
com lideranças indígenas.
em comitiva e foi nos
a nos ver com mais frequência
fossem grandes, passamos
sível estreitar nossa
amizade. Dizem que irmãos gëmeos têm uma
e eu, separados logo
muito forte, e devo admitir que Nape
ligação
ali uma amizade que nem sempre
após o
nascimento, começamos
se vê entre irmãos criados juntos.
la cada vezmenos ao Rio de Janeiro. Embora tenha mantido o
contato com Luísa eMariana por algum tempo, acabamos nosdistan
ciando. Não nos perdemos de todo, e ainda hoje trocamos e-mails e às
vezes nos visitamos, em datas como aniversários e festas de fim de ano.
Não tardeia encontrarum outro amor. Andrea caiu de
paraquedas
em São Gabriel. Paulistana, em
interessada do meio am
preservação
biente e em Medicinae
terapias alternativas, mudou-se para o Ama
zonas
depois de formada. Inquieta,
viajava pelo mundo à de
procura
lugares perdidos nas
regióes mais distantes do
de e planeta. Erapsicolo
formação ocupava-se deestudos sobre
Também xamãs,curandeiros e
gostava deartes marciais paj
e, acredite, era
se brincava.
Naverdade, era ela ninia! Com ela
na
quem
vezes por ano alugares inimagináveis brincavacomigo.V1ajava itas
de reencontrar
Comissão
com
gëmeo,
seu povo e
Pró-Yanomami.
toi
Em
ele pôde compreender
com
Boa
ele e
Vista,
otamanhodo
lon.
rsaram longamente
eles conversaram
ssado.R.
os fantasmas do passado,
ura
Laura .
Revelou
visitar
ceuDavi
conhece
as
trabalho
que
Kopenawae
nas mãos.
os protessores tinham não deixou de acompanha os
se Nape
Nos anos que seguiram, as feria
dos Yanomami. Sempre que vinham ias,
educacionais
projetos ão a
e a reserva. Começou naquela ocasião.
deixava a Guiana para
seguia
en.
indígena. Para en-
dar sinais de todo o seu potencial como educadora
19 anos, deixou a casa de Laura Blasser
curtar a história,ao completar
a seu povo, cumpriu a formação para
para o Brasil.
Reuniu-se
e voltou
da escola indígena e passou a atuar diretamente
tornar-se professora
na educação Yanomami.
de ensino indigena não tinha reconhe-
Naquele tempo,osistema
de Roraima. Isso só aconteceu
cimento da Secretaria de Educação
mesmo assim, as
11 anos após a fundação das primeiras escolas e,
um currículo mínimo não foram
mudanças necessárias para garantir
automáticas. Minha irm participou de tudo isso. Foi uma mulher
Brasília-completei.
coisa e, sem rodeios,
Ela me olhou como se estranhasse alguma
perguntou:
-De onde você tirou esse sotaque?
5
e ja começava a traçar plan.
tivas. Fez cursos em toda parte anos
parta
uma casa
tempo.
Não
e respondeu:
vou agora.
ecológica
Só daqui
em São Paulo
a alguns meses. Estou const
muito
Naquele momento,soube
que não conseguiria voltar a Brasilia
Liguei para meu oorientadore disse a ele
que precisava Tic
mai
is
com uma das regiões mais ricas do planeta. Mesmo com todo o
Mal o conheceu.
De todo modo, achei que, se queria resgatar minha história, era
sei se estava certo, não tinha
esse o caminho quedeveria tomar.Não
53
-Eu
sei, Nape.
Vou
me acompanhasse
fazer isso.
Mas antes quero encontra.
Di Atiba
até a aldeia Tukano Elee
Atilb
contrar
b
Gostaria que Bayá
dois mundos.
a entre os meus
são ligação
Daniel. O caminho daqui n
Você escolhe o caminho, igual
não tem universidade, não tem douto
ao caminho deLondres. Aqui
tem povo da floresta enfrentando fAZen
rado. Tem vida comunitária,
vem enfrentar fazend
deiro e garimpeiro. Se quer mesmo ajudar, ndeiro
na escola Yanomo
e garimpeiro com a gente. Vem educar criança omami.
olhos. Sabia que ela
Olhou-me bem no fundo dos estava ces
certa,
São Gabriel, fui falar com Bayá e no dia seguinte tomamos a barcaca
rumo à aldeia Tukano. Estava agitadíssimo, embora tentasse me con-
trolar. Pegava-me querendo ser apenas o antropólogo e usava aquele
Spenser, que ela havia registrado como filho cerca de 24 anos antes.
Eu disse a ela, logo emque apenas queria conhecê-la. Ao
seguida,
lado dela uma jovem nos olhava. Era sua filha, com quem eu havia
-
dividido o leite materno nos meus primeiros dias de vida.
Atiba fica feliz de ver você bonito e crescido ela disse.
-E eu só tenho a agradecer pelo que fez por mim-respondi.
- Atiba não fez muito.
acredite!
importante,
Daniel não volta mais para o estrangeiro?
Não, Atiba. Vou ficar aqui. E quero dizer a você que es-
tarei sempre por perto, pronto para ajudarvocê sua familia, se e
precisarem.
não
Spenser jáajudou bastante. Daniel precisa preocupar.
na pescaria. Tinham
me disse que ele estava trabalhando também,
em
grande e precisavam produzir
alimento quantidade
uma família
outros filhos e ainda alguns netos. Um
suficiente para todos. Havia
índios Maku também vivia em sua maloca.
Os
pequeno grupo de
com os Tukano e outros
Maku são uma etnia que vive em associação
nômades e se juntam a outros povos
índios ribeirinhos. São caçadores
e
em busca de maior diversidade na alimentação abrigo temporário.
os Tukano
São conhecidos "índios da floresta', ao passo que
como
são "índios do rio".
Cobé. Atiba disse
Pergunteia ela se podia ficar e encontrar
o A noite nos reunimos
que eu poderia ficar tempo que quisesse.
55
vos
Tive vontade
toda a familia.
com de
e conversar se não fosse
Sse i
na maloca pude
com eles e pedi
autorização, incomodo,
uns dias eu poderia ficaree decla.d
declarou sua
passar Cobé disse que com os sentes que
Assim como Atiba, presentes que re
que,
a meu pai. Contou-me uma grande a.
gratidão
do meu nascimento, pôde adquirir
e
o
canoa,
u
na ocasião de viagens mais longas boa
a possibilidade
que lhe garantiu
produção pesqueira. de passar um tempo no sha.
a minha ideia bono.
Contei a ele sobre os Yanomami. Contos.
a dia entre ntou-me
o dia
Cobé alertou-me sobre indios daquela região étots
e de outros otal-
como a vida dos Tukano
meus parentes. Eu
disse a ele que sak.
dos sabia
mente diferente da vida os povos
que estudava
falei
indigena.
bem onde estava me metendo,
havia inclusive estudado bastaante
da Amazónia há muitos anos, que de minha
sobreseu até os 21 anos tinha convicção
povo, pois
em
Tukano.
o interesse quando descobri
-OsYanomami só me despertaram
morta no Massacre de Haximu. Mas hoie
que minha mäe era Yarima,
sei muito sobre eles concluí.
sos. Saí diversas vezes para pescar e caçar com Cobé e aprendi com
embora ele e outros índios
ele as técnicas indigenas para essas práticas,
daregião muitas vezes preferissem o anzol ea arma de fogo. Cobé
também me ensinou um pouco sobre como me orientar na floresta,
a
embora faltadeprática
me impedisse de tentar incursões solitárias
o
Saíalgumasvezes com rapaz Maku, que vivia com eles na maloca.
Cauré-era esse oseu nome-conheciabem os igarapés da regia0
e,embora não falasseum bom português, podíamos nos comunica
por meio de sinais.
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grande festa, ou um caxiri, como eles costumam chamar. Indios de
outros povos foram convidados e
dançamos muito para celebrar nos-
sa amizade. Os convidados são os que mais dançam nessas ocasiões
e, em troca da alegria que trazem, os anfitriões oferecem o caxiri,
bebida fermentada à base de mandioca, preparada pelas mulheres,
e que dá nome à festa. Passada a ressaca, tomei a
barcaça para Sao
Gabriel.
a
Alguns índios também queriam revisão do processo. A maioria dos
indígenas da região, no entanto, era a favor da manutenção da área
contínua, decisão que ferira os interesses de plantadores de arroz,
milho esoja localizados no entorno de Uiramute Pacaraima, muni-
cípios criados na região da reserva, cuja população, em grande parte,
tem origem
indigena.
Os índios que se posicionaram a favor dos tazendeiros eram ho-
mens aculturados. Empregados nas lavouras, afirmavam que a h0-
mologação em terras contínuas trouxera grave problema social para a
57
inicial e defendiam.
diam quei
conforme
a demarcação
ndígenas da
da res
issO era Oe
do território das culturas indígenas
a
para preservação do Sol
Sol na
da Raposa Serra não
importante em torno chegou
Toda essa situação cujas
terras demarcada. são
os Yanomami, to
a afetar diretamente briga os povos Ma
do território que abriga
Makuxi,
talmente independentes
Taurepang e
Patamona. Nape, porém rém,sesen-
Ingarikó, Wapixana,
tia
bastante abalada.
Blasser fundara
anos após
acompanhou
ter
Uiramut,
sua instituição
perdido
afinal,
era a localidade ond
no Brasil e là ela passou os prim
mãe no Massacre de Haximu. Minha irm
todo o processo
a
de homologação e,junto com sua ma
:
Laura
da população indipena
a favor de parte
grande na
drinha, posicionou-se
e contra os fazendeiros e agricultores da região. Assim que tivemoe
me contou o que se passava.
-
oportunidade de conversar,
-Posso ficar com você até
ela
ajudar.
-Não, Daniel. A região de Uiramut sempre tem oonflito. Você
que somente
eles conhecem. Os
rapazes que me acompanharam
no caminho me ensinaram algumas palavras e regras sociais bási-
cas. Muito do que disseram eu já sabia, mas não me importei em
ouvi-los.
agrícolas
e à utilização de ferramentas de metal adquiridas em trocas
com vizinhos de família linguística Karib e Aruak, ou mesmo em
incursões guerreiras contra os domínios desses povos, já fragilizados
pelo contato
com a fronteira da colonização.
direto
59
ficaram era importante
pudesse
do então
so, e os
ser concluido.
Durante
território
Yanomami
recuperá-las
o regime militar,
a
de Roraima
viram surgir
política
forçou
de modo que o ritua
de controle e
um contato ainda
os projetos decolonizac
do potencial
minerador da
nização
Serra do D
1al
oagricol
Parim
.funerári
amentg
te
homologado.
Tudo isso passou por minha cabeça durante a viagem. Pela pr*
bebe. Eu, por outro lado, sabia que chegaria à aldeia na qualidade de
deveria
"agregado" e que, assim, não teria privilégios. Pelo contrário,
assumir tarefas e prestar serviçosde acordo com a designação dos
lideres. De todo modo, a comunidade me recebeu com festa. Afinal,
6
o
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33
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