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Interpretar “As Mil e uma Noites”


José Manuel de Sousa-Rico * 2 anos ago

José Manuel Sousa-Rico - Membro associado do P.E.N. Clube Português (PEN International)

“As Mil e Uma Noites”, é uma colectânea de contos populares baseados na oralidade dos
grandes contadores de histórias árabes e asiáticos; mas mais especificamente da Pérsia, que
viajavam no imaginário popular, e que foram reunidas em livro entre os séculos xiii e xvi
(1200-1500). Hoje em dia, normalmente, uma edição de “As Mil e Uma Noites” podem ter
cerca de 20 tomos, que se espraiam no seu conteúdo em cerca de “mil e um livros” (ou talvez
não), e que contam belas histórias, dentre elas, as mais conhecidas, as que são contadas pela
princesa Sherazade e que ficaram famosas: as do salteador “Ali Babá e os Quarenta Ladrões”;
“As viagens de Sindbad, o Marinheiro; e as “Aventuras de Aladino e a Lâmpada Mágica”.
A obra “As Mil e Uma Noites” é um “jorrar incessante de narrativas nessa maravilhosa
máquina de contar”. A técnica de renovação da história suportava-se numa nova versão
sucessiva surgida por outro contista, e assim a história contante tornava-se sempre também
uma história contada, na qual a nova história se reflecte e encontra a sua própria imagem.
“Por outro lado, toda a narrativa deve criar outras; no interior dela mesma, para que seja
consumado o suplemento que ela comporta inevitavelmente. Inclusive, os múltiplos
tradutores de “As Mil e Uma Noites”, sofreram da influência da trama dessa máquina
narrativa: nenhum se contentou com uma tradução simples e directa, fiel ao original; “cada
tradutor acrescentou e suprimiu histórias (o que é também uma maneira de criar novas
narrativas, sendo a narrativa sempre uma selecção); o processo de enunciação reiterado, a
tradução representa ela mesma um novo conto que não espera mais pelo seu narrador
original.

Deste modo continuado, existem razões de sobra para compreendemos que as narrativas por
“processo de encaixe” ([encaixando-se] umas nas outras) jamais cessem de acontecer –
influenciando-se e reconstruindo-se. O que foi que aconteceu à primeira versão de “As Mil e
Uma Noites” neste processo metamorfoseado, em que, na sua primeira frase começa por:
“Conta-se…” Deste modo, com este “incipit”, torna-se desnecessário procurar a origem das
narrativas no tempo, é o tempo que suscita novas narrativas. “E se antes da primeira narrativa
há “contou-se”, depois da última haverá “contar-se-á”; para que a história pare”.
“As Mil e Uma Noites” revela a originalidade de naqueles tempos obscuros, existir uma mulher
plena de coragem e inteligente conseguindo pela perspicácia sublimar a ira e a raiva
plenipotenciária de um rei. Os cronos da história acontecem no espaço persa, ao tempo do rei
Schariar, dos Sassânidas, no seu esplendor, um dos mais evoluídos da humanidade de então.
Um dia Schariar, depois de regressar de uma caçada foi informado pelo seu irmão
Schahzaman, que encontrara sua mulher, e as suas escravas deitadas com os escravos. De
seguida, Schariar mandou o Vizir matar a sua esposa, as servas e os escravos. A partir desse
dia, o rei Schariar tomou a decisão de pedir ao Vizir o encargo de ele lhe arranjar todas as
noites uma nova noiva que invariavelmente, no dia seguinte seria assassinada. O reino seria
apoderado de um estado de terror, no dia que uma família fosse atingida por essa ignomínia
para com uma das suas filhas. Mas, um belo dia, Sherazade, filha do grande Vizir – bela, culta
e inteligente – decidiu urdir um plano para terminar com a loucura do rei. Embora sendo
levada a desistir dos seus intentos pelo seu pai, de tal não se demoveu a bela Sherazade, que
pediu a colaboração da sua irmã Duniazade.
Consumada a primeira noite de matrimónio entre o rei e Sherazade, esta pediu-lhe um último
desejo; que sua irmã Duniazade assisti-se ao conto que ela queria narrar, ao que o rei acedeu
prontamente e disposto a escutar em conjunto. Sherazade contou uma história tão bonita que
deixou o rei perplexo e agradado, ao que ela lhe disse que, o que havia contado não se equipara
para o que ela lhe contaria na noite seguinte. O rei anuíu, desejoso de saber o continuar da
história interrompida: e assim se passou mais uma noite, e mais um dia, e outro dia ainda, e
de forma continuada o rei se apaixonaria por Sherazade. Schariar decretou a realização de
grandes festas de casamento durante trinta dias, com a mulher da qual nunca mais se
separaria.

“Note-se que, nas colectâneas de “As Mil e Uma Noites”, só apareceram 291 histórias e não
1001. Há quem defenda que se trata de um número simbólico, ou de um exagero literário;
outros consideram que cada história se divide em vários capítulos, cada um equivalendo a
uma noite, o que perfaria no total, o número de 1001.”

Referências bibliográficas:

“As Mil e Uma Noites”. Disponível na Internet: https://www.infopedia.pt/apoio/artigos/pas-


mil-e-uma-noites

Todorov, Tzevetan, 1939, “As Estruturas Narrativas”, tradução de Leyla Perrone-Moisés, São
Paulo, ed. Perpectiva, S:A, 2006

www.editoraperspectiva.com.br, 2006

* Mestre em História, pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra


Categories: Opinião

Tags: Algarve, As Mil e uma Noites, cultura, História, Narrativa, Sherazade

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