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ISBN 978-989-8872-96-8
Apêndice I
História de Cámar-Azzamane
e dos seus filhos Amjad e Açaad (conclusão)
O manuscrito mais antigo d’As Mil e Uma Noites acaba a meio da 281.ª Noite, não se havendo
encontrado até aos dias de hoje nenhum manuscrito antigo completo contendo 1001 noites. Foi
possível concluir a segunda metade dessa noite e a 282.ª Noite com recurso a outros manuscritos
semelhantes ao manuscrito mais antigo, nos moldes descritos na nota de rodapé 134 do segundo
volume. Mas a partir desse ponto, a única forma de concluir a História de Cámar-Azzamane foi
recorrer a outro manuscrito, com uma numeração de noites não coincidente com o manuscrito
utilizado nesta tradução. Para o efeito escolheu-se o manuscrito do ramo egípcio com a cota Ms.
Bodl. Or. 550-551 da Bodleian Library (Oxford), datado de 1764, e manteve-se a divisão em
noites tal como neste consta, mas separou-se esta parte do resto da tradução, incluindo-a em
apêndice. Apesar de este não ser o manuscrito mais antigo com esta história, afigura-se ser
aquele que provavelmente contém uma versão mais antiga da mesma.
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
96.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
97.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite.»
E em sendo a próxima noite, que era a
98.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
99.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
100.ª Noite
Então, o vizir disse: «Ó rei dos tempos, até quando ficará ausente do
exército? O seu apartamento para estar junto do seu filho poderá provocar
desacatos no exército, receando eu que o rei fique ainda com mais
problemas. O sábio instruído, ao ser afectado por várias doenças no corpo,
começa por curar aquela que é a mais perigosa. O meu conselho é que se
mude com o seu filho para o palácio interior3 que dá para o mar, onde ficará
isolado com o seu filho, e às quintas-feiras e à segundas-feiras virão os
emires para lhe prestar serviço, e assim o rei tratará dos seus assuntos e
arbitrará entre eles, tratando dos negócios de Estado e dando ordens, sempre
à quinta-feira e à segunda-feira. Quanto aos restantes dias, fica com o seu
filho até que Deus traga alívio, pois não se julgue livre das adversidades da
vida e dos acidentes da sina. Tão bem falou o poeta quando disse estes
versos:
Enquanto durava, a tua vida parecia bela e clara,
E não temeste o que o destino te reservara.
Mas agora as tuas noites calmas ruíram,
E da límpida noite turvas mágoas emergiram.»
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, se o rei me poupar e eu viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
101.ª Noite
Após haver chorado, disse-lhe: «Ó rei, levanta-te e vai ver a tua filha, ela
está louca e bateu-me!» Ora, o rei ergueu-se e, perplexo, não parava de
dizer: «Ó minha filhinha!» Em seguida, foi ter com ela, cumprimentou-a e
ela levantou-se para o receber, cobriu a cabeça e retribuiu-lhe o
cumprimento. Ele disse-lhe: «Minha filha Budur, que Deus te preserve, mas
que conversa é esta sobre ti que me chegou aos ouvidos?» Ela disse:
«Paizinho, deixe-se dessas conversas e case-me com aquele que o pai e a
corte puseram a dormir junto de mim, aquele jovem formoso, de corpo
atraente, pálpebras lânguidas e belas, e com quem passei a noite abraçada
até de manhã.» Em o pai ouvindo as suas palavras, percebeu que ela havia
enlouquecido, e agachou-se em cima dela, atou-lhe as mãos atrás das costas
com um lenço, e ordenou que trouxessem uma gargalheira com uma
corrente fina de ferro que se prendeu a uma argola que havia no meio do
quarto. Pô-la em clausura sem criadas, anciãs ou a mãe, e disse: «Juro por
tudo em que acredito que se ouvir alguém mencioná-la ou falar sobre ela,
será decapitado.» Em seguida, incumbiu a tarefa de vigiar a porta a eunucos
da sua confiança, e abalou apreensivo, inquieto e preocupado, com o
espírito totalmente absorto na sua filha, dona Budur.
O rei sentou-se no trono e convocou os vizires e dignitários de Estado, e
então vieram os vizires, os emires, os camaristas, os delegados, beijaram o
chão ante o rei Ghaiur, soberano das ilhas, dos mares e dos sete palácios, e
trouxe-lhes ao conhecimento o caso da sua filha e do que lhe havia sucedido
durante a noite: «Sem sombra de dúvida que foi possuída por génios, e sem
sombra de dúvida que um génio lhe apareceu na forma de um jovem
formoso, dormiu junto dela esta noite e ficou-lhe na cabeça, e houve uma
coisa que me incomodou, pois vi no seu dedo um anel de homem cujo valor
era grande. Juro-vos, pois, ó emires, que aquele que a curar do que ela
padece, caso-o com ela e divido o meu reino com ele, mas a quem apareça e
a não cure, corto-lhe a cabeça.» Em os presentes ouvindo as palavras do rei,
perceberam a situação e pediram a Deus que trouxesse alívio para o rei e
sua filha.
Ora, um dos presentes disse: «Ó rei, eu ofereço-me para ir aos aposentos
de dona Budur para a exorcizar.»
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
103.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
104.ª Noite
Mal Marzawane ouviu estas palavras, soube que ela estava enamorada, e
disse: «Que choradeira é essa, minha senhora? Conta-me a tua história e o
que te aconteceu, talvez Deus traga alívio através das minhas mãos.» E
dona Budur disse a Marzawane: «Escuta, mano, a minha história…»
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
105.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
106.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
107.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
108.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite.»
E em sendo a próxima noite, que era a
109.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
110.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
111.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana», disse-lhe a sua irmã Dinarzade. E Xerazade
respondeu: «Isto nada é comparado com o que contarei, a ti e ao nosso rei,
na próxima noite.»
E em sendo a próxima noite, que era a
112.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana», disse-lhe a sua irmã Dinarzade. E Xerazade
respondeu: «Isto nada é comparado com o que contarei, a ti e ao nosso rei,
na próxima noite, se o rei me poupar e eu viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
114.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
115.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
116.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
118.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
119.ª Noite
Então, contou as talhas, e eram vinte talhas de cobre cheias de oiro puro.
Saiu do subterrâneo para a superfície, deixou o tampo como estava dantes, e
foi para o pomar, entretendo-se a trabalhar nele até que o caseiro veio,
cumprimentou-o e lhe disse: «Filho, alegra-te que vais regressar à tua terra!
Os mercadores já estão prontos para a viagem e o barco já está carregado.
Daqui a três dias parte para as Ilhas dos Ébanos, que é uma das cidades dos
muçulmanos e seu rei é Armanus. Em lá chegando, viajas seis meses por
terra para chegares ao país das Ilhas Khalidane e do rei Xaramane.» Cámar-
Azzamane, ao ouvir o seu pai Xaramane ser mencionado, ficou radiante e
declamou estes versos:
Não abandones quem nunca teu abandono apreciou.
Não tortures com aversão quem nunca prevaricou.
Só eu, mesmo se tua distância é do repúdio fruto,
A tua vida consigo mudar com meu contributo!
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
120.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
121.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
122.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
123.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
124.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
125.ª Noite
Tem misericórdia de quem te obedece, dum espírito sempre disponível para ti, de quem te
deseja e de ti depende. O que escrevo, ó rei Amjad, [O Mais Glorioso,] soberano do astro
mais fortunoso30, é um escrito de quem de noite não dorme, de dia pela inquietação se
absorve, cujas entranhas um fogo a consome e em cujo rosto a lágrima escorre, ardendo de
saudade e paixão por te ver, cuja imaginação a tua imagem dominou e a tua pessoa
açambarcou. Por isso, o sono as suas pálpebras não visita nem o sossego a habita. Por ti ela se
lamenta, tu és o seu único desejo e ela não se aguenta.
Em seguida, escreveu estes versos:
Até quando este repúdio e aversão tão fria?
Não bastou tanta lágrima por mim vertida?
Porque prolongas tanto a tua dura ausência?
Se foi vingança o teu intento, conseguiste-a.
Sê gentil, que eu já sofri demasiada paixão;
Ó Amjad, porque não mostras compaixão?
Fosse o destino justo com o amante punindo o traidor,
Não procuraria eu quem fizesse justiça à minha dor.
Por quem sofro eu? Quem sabe do meu degredo?
Que escândalo! Já todos sabem do meu segredo!
Que Deus a vida te prolongue, a emaciação do meu corpo te perdoe e afaste quem contra o
nosso encontro obste. Ó herdeiro da minha vida e soberano da minha morte, a minha alma
está aflita, meus olhos não dormem e as lágrimas escorrem.Tu és a causa do meu marasmo,
do meu desassossego, inquietação e preocupação. Compreende o que escreve minha alma
exposta e não te demores a dar resposta, pois de tanto me incendiar e suspirar já estou prestes
a me finar.
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
126.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
127.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
128.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
129.ª Noite
Ouvi dizer, ó rei bem-aventurado e bem guiado, que Amjad disse ao seu
irmão Açaad: «Serei eu a morrer antes de ti!» Então, Amjad disse: «Se
assim tem mesmo de ser, então abraça-me e eu abraço-te para que ele nos
mate ao mesmo tempo.» Então, abraçaram-se face a face, ficando colados
um ao outro, e disseram ao camarista-mor: «Ata-nos com uma corda bem
apertada dês dos pés aos ombros, desembainha a tua lâmina, agarra no seu
punho com ambas as mãos e desfere uma espadeirada nas nossas gargantas
ou barrigas, como queiras, e assim morremos ambos sem que um tenha de
ver o outro morrer. Quanto a ti, estás revestido de legitimidade para
derramar o nosso sangue.» Em seguida, choraram ambos, assim como o
camarista-mor, que exclamava: «A Deus pertencemos e a Deus
regressaremos!»
Ao depois, o camarista-mor sacou de uma cinta em coiro comprida que
media seis braças e atou-a à roda de ambos, enquanto chorava, tal como
Açaad e Amjad, cujas lágrimas corriam. Então, desembainhou a espada e
disse-lhes: «Valha-me Deus, meus senhores, custa-me fazer isto.» Então,
acercou-se deles, encostou-lhes a ponta da espada e disse: «Tendes algum
desejo final antes de morrerdes ou algum pedido para eu cumprir após a
vossa morte?» Disse Amjad: «Quanto ao que dizes sobre algum desejo, não
temos nenhum, mas peço-te que me mates comigo por cima do meu irmão,
isto é, que ponhas Açaad no chão por baixo de mim, ficando eu em cima,
assim a espada irá atravessar-me primeiro, antes de atingir o meu irmão. E
incumbo-te de uma missão, quando chegares junto de nosso pai e ele te
perguntar:“Que te disseram eles?”, vais-lhe dizer:“Os seus filhos saúdam-
no e consideram-no revestido de legitimidade para derramar o seu sangue,
porque não conhece o âmago deste caso, nem se eles são inocentes ou
culpados.” E declamas esta poesia:
“Ei-las:
Unhas envernizando,
Tranças pintando,
Homens rebaixando,
Agonias causando.”
»Portanto, o pedido que te fazemos é que lhe faças chegar isto fielmente
e que nos deixes morrer com o nosso segredo, que nós não revelamos para
não expor o nosso pai ao escândalo, mas faz-lhe chegar estes versos, saúda-
o da nossa parte e nada mais digas sobre nós. Peço-te ainda, tio, que esperes
um pouco para eu declamar uma poesia ao meu irmão, poesia essa que é a
minha despedida, e quando eu terminar de a declamar, desfere uma
espadeirada em nós e mata-nos.» Ao depois, olhou para a direita e para a
esquerda, chorou desalmadamente e declamou ao seu irmão uma poesia:
Vede os antepassados:
Tantos reis idos
Nos rios da morte
Sem jusante ou norte.
Vi, indo para lá,
Pequeno e grande, velho e novo.
E certeza tive que fuga não há
Senão ir aonde vai indo o povo.
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
130.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
132.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
133.ª Noite
Ao depois, sentiu com a mão um naco de pão à sua banda. Comeu tão
pouco, só o quanto bastava para se aguentar vivo, e bebeu um pouco de
água, ficando acordado até de manhã, pois não conseguia dormir devido à
aflição que lhe causavam os percevejos, as baratas e outros insectos. Em
sendo de manhã, mal ele deu por ela, já lá estava a serva Qawame. Ela
despiu-lhe as roupas, que se haviam empapado em sangue e colado ao
corpo, havendo a camisa ficado como uma crosta mole, e quando ela a
puxou, a pele veio colada à camisa e ele gritou: «Ai! Ai! Ó Senhor se este é
o Teu desejo, aumenta a severidade do teu decreto! Talvez assim não
ignores quem me oprime e me lançou nesta tormenta!» Ora, a serva pregou-
lhe uma tareia e não parou senão quando ele perdeu os sentidos. Então,
deixou-lhe um naco de pão e um jarro de água salobra, e abalou, deixando
Açaad com os flancos a esvaírem-se em sangue.
Quando acordou e viu o estado em que se encontrava, com sangue a
escorrer dos flancos, nu, o corpo dilacerado e preso a uma corrente de ferro,
longe dos seus entes queridos, prometido para ser abatido e morto, chorou
desalmadamente, pensando no seu irmão e em como era boa, feliz e
confortável a sua vida anteriormente, quando estavam todos juntos, e vendo
o que lhe havia acontecido, o seu encarceramento, a tortura, as tareias, as
correntes, a nudez e a fome, declamou estes versos:
Calma, ó fado! Quanto abusas e quão brutal!
E quantos dos meus entes queridos abalaram!
Não é já tempo de teres pena da minha tormenta
E compaixão, ó coração duro que nem pedra?
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
134.ª Noite
Em ela ouvindo as suas palavras, ficou toda perdida por ele, nutrindo
sentimentos por ele, mostrando-lhe o seu sorriso e falando com palavras
doces. Então, Amjad disse: «Minha senhora, em tua casa ou na minha?» Ela
disse: «Deus fez as mulheres miseráveis no que possuem, ter casa é coisa de
homens, não de mulheres.» Amjad baixou a cabeça, pois estava
comprometido com a moça mas tinha vergonha de ir para casa do alfaiate.
Então, caminhou à frente da moça que o seguiu, levando-a de ruela em
ruela, de lugar em lugar. A moça dizia-lhe: «Amor, onde fica o teu lar?» E
ele dizia-lhe: «Estamos perto, minha senhora.» Caminhou com ela até
ambos já estarem cansados, e ela disse: «Mas onde fica a tua casa?» E ele
disse: «Minha senhora, já chegámos.» Estando ele desnorteado, caminhou
com ela seguindo-lhe o passo, e levou-a por uma das várias ruelas,
acabando por perceber que era um beco sem saída, mas tinha de ficar à
altura da coisa. «Não há força nem poder senão em Deus Altíssimo e
Grandioso», disse ele de si para si, e quando olhou para o fim da ruela, viu
uma bela casa com uma grande porta ladeada por dois bancos de pedra
cobertos com mantas de feltro, sendo que a porta esta fechada. Vai Amjad e
senta-se num deles, enquanto a moça se senta no outro e lhe diz: «Senhor
meu, de que estás à espera?» E ele disse, baixando a cabeça: «Espero o meu
mameluco, pois a chave ficou com ele. Eu disse-lhe para trazer comida,
bebida e fruta enquanto ia aos banhos. Ora, aqui estou eu a chegar e não o
vejo!» E disse para consigo: «Talvez ela se canse de esperar e se vá
embora.»
Mas a moça, ao ouvir as palavras dele, disse: «Ó senhor, não me digas
que o teu rapaz nos deixou assim à espera dele! Isto de ficarmos aqui
sentados na rua ainda vai dar escândalo!» Ora, a moça levantou-se e pegou
numa pedra para arrombar a fechadura, e com isto Amjad disse-lhe: «Não!
Não! Isso não é boa ideia. Espera um pouco.» Mas ela deu duas pancadas
com a pedra e partiu a fechadura. Amjad, já a perder as estribeiras, disse:
«O que te deu na cabeça para fazeres isto?» E ela disse: «Francamente,
senhor, o que se passa contigo? Não é esta casa tua e tu o seu dono?» Ele
disse: «Sim, claro, mas assim a fechadura ficou estragada.» E suspirou
ofegantemente.
Ora, a moça entrou à frente dele, ficando Amjad com uma perna dentro e
outra na rua, desnorteado com o que se passava. Então, a moça virou-se
para ele e disse: «Senhor meu, entra em tua casa!» Amjad baixou a cabeça e
disse: «Sim, claro, mas o meu mameluco atrasou-se e acontece que eu lhe
disse para cozinhar, preparar as refeições, limpar os mármores e arrumar a
casa, e não sei se ele já fez alguma coisa ou não.» Ao entrarem ambos,
deram com um amplo, espaçoso e elegante salão, com quatro salas
anichadas e elevadas, dispostas face a face, com armários, mezaninos, e
sofás forrados a seda e brocado. No meio, havia uma preciosa fonte, sobre a
qual havia uma bandeja coberta por uma toalha de seda, à banda da qual
havia uma travessa grande de cobre cheia de fruta e flores aromáticas, à
banda da qual havia um candelabro com uma vela requintada e uma
travessa com canecas cheias de vinho refrescante. O sítio estava
devidamente arrumado, cheio de tecidos, tapetes e almofadas de seda, e
baús fechados. Havia uma fila de cadeiras, e em cima de cada uma havia
uma pilha de tecidos, por cima do qual havia uma bolsa cheia de dirâmes.
Era uma casa espaçosa e rica com o chão forrado em mármore colorido.
Em tal vendo, Amjad, atónito, pôs o dedo na boca e disse para consigo:
«Ainda vou perder a vida. A Deus pertencemos e a Deus regressaremos.»
No que toca à moça, ao ver aquele sítio ficou doida e voou de alegria, e
disse: «Meu Deus! o teu mameluco não se poupou em nada; limpou os
mármores, preparou a carne, e pôs a fruta e um banquete. E fui eu a
escolhida para vir! Ena, meu senhor, que tens para estar aí especado e
atónito? Se tinhas um encontro com outra que não eu, não faz mal, eu
aguento-me e sirvo a outra.» Amjad riu-se de ira e foi-se sentar preocupado,
dizendo para consigo: «Que morte tão infortunada me espera!» Ora, a moça
sentou-se à sua banda e pôs-se a rir e a brincar, enquanto Amjad estava
carrancudo e angustiado, com mil preocupações na cabeça, dizendo de si
para si: «Que vou eu dizer ao dono da casa? Não há dúvida, vou mesmo
perder a vida.» Então, a moça levantou-se, arregaçou as mangas…
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
135.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
136.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
137.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
138.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
139.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
140.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
141.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
142.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
143.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
144.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
145.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
146.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
147.ª Noite
Ouvi dizer, mas só Deus conhece toda a verdade, que havia um homem
entre os habitantes da cidade de Cufa que dava pelo nome de Rabie ibn
Hâtime, que tinha grande fortuna e a quem não faltava coisa alguma. Foi
abençoado com um filho macho e chamou-lhe Felisbelo.
Um dia, enquanto estava no mercado dos maganos, viu uma rapariga que
estava exposta para venda, de mão dada a uma menina ainda pequena de
ímpar formosura, irradiante beleza e perfeita lindeza. Então, Rabie gritou ao
magano: «A quanto está esta escrava mais a filha?» E este disse:
«Cinquenta dinares.» E Rabie disse: «Redige o contrato, toma o dinheiro e
dá-o ao seu dono.» Pagou ao magano o preço da rapariga, deu-lhe a sua
comissão no valor de cinco dinares, recebeu a rapariga e a filha, e foi para
casa.
Quando a sua mulher, que era filha do seu tio paterno, viu a rapariga,
disse-lhe: «Ó primo, que rapariga é esta?» Ele disse: «Comprei-a agora
mesmo, mas só pela filha que está de mão dada com ela. Fica sabendo que
em ela crescendo não vai haver entre as filhas dos árabes, nem dos persas
ou dos turcos, alguém que rivalize com ela em beleza, perfeição ou
formosura.» Ela perguntou à escrava: «Como se chama a tua filha?» A
escrava respondeu: «Fortuna.» Então, a patroa perguntou: «E tu, como te
chamas?» Ela disse: «Prosperidade.» E a patroa disse: «Falaste verdade:
foste afortunada com ela.» E disse ao marido: «Ó primo, como lhe vais
chamar?» Ele disse: «Escolhe tu o nome.» E ela disse: «Chamemos-lhe
Felisbela.» Ao que Rabie disse: «Que ideia tão feliz a tua.»
Ao depois, ambos criaram aquela pequenita, a Felisbela, juntamente com
Felisbelo, filho de Rabie. Cresceram no mesmo berço, por assim dizer, até
atingirem os dez anos, e cada um era mais belo do que o outro. O rapaz
tratava-a como irmã e chamava-lhe «mana», e ela tratava-o como irmão e
chamava-lhe «mano». Então, Rabie foi ter com o seu filho Felisbelo e
disse-lhe: «Filho, ela não é tua irmã mas tua escrava, e eu comprei-a em teu
nome estavas tu ainda no berço. De hoje em diante, não lhe chames mana.»
E ele disse: «Se assim é, então vou-me casar com ela.» Dito isto, foi ter
com a sua mãe, deu-lhe a saber o que havia ouvido, e a mãe disse-lhe:
«Sim, filho, ela é tua escrava.» Então o rapaz tomou-a, entrou nela e a cada
dia que passava ele a amava mais.
Passaram-se anos e dias e em Cufa não havia rapariga mais bela que ela,
nem mais formosa ou airosa. Aprendeu a ler e a escrever, a jogar xadrez, a
tocar alaúde, no qual era exímia, tal como o era no canto e a tocar pandeiro
e todos os instrumentos que havia. Ela superava qualquer um da sua época.
Um dia de entre dias, estando ela com o seu senhor, Felisbelo, filho de
Rabie, num dos seus convívios, ela pegou no alaúde enquanto bebiam...…
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
148.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
149.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
150.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
151.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
152.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
153.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
154.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
156.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
157.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
158.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
159.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
160.ª Noite
O miralmuminim ficou tocado até mais não com aquela canção e bebeu
mais, enchendo outro copo, e pondo-se a olhar para Felisbela, como quem
apreciava a sua beleza e perfeita lindeza, e o seu corpo gracioso e
harmonioso, enquanto Felisbela declamava:
Juntassem o orgulho de todos os reis,
Só tu terias motivo para te orgulhares.
Único és em distinção e generosidade.
Teu nome todos conhecem pela tua moral.
Só tu entre reis da Terra de qualquer idade
Provê sem olhar a meios, fiques bem ou mal.
Apesar dos tirânicos inimigos, é tua a vitória,
Porque só tu vives em prosperidade e glória.
O califa ficou mais uma vez tocado pela sua canção e disse: «Valha-me
Deus, que bela é a tua poesia, ó Felisbela.» E elogiou-a com bonitas
palavras. Ao depois, encheu outro copo e disse: «Pela minha vida, ó
Felisbela, tens de cantar em honra do meu copo.» E ela declamou um
poesia, depois de haver afinado as cordas do alaúde:
Meus olhos pingam e as nuvens sem pingo de chuva.
Ó secura do amor, onde está o ar que traz aguaceiro?
Eu e as nuvens parece o mesmo estado de agrura,
Como se nossos olhos fossem iguais, que desvairo!
Ó olhos das nuvens, tuas lágrimas sofrem de secura,
Enquanto meu lacrimejar sem parar dura e dura.
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
161.ª Noite
Com tais palavras, o califa ficou tocado até mais não, e a sua irmã disse:
«Mano, quem se julga a si mesmo tem de ser fiel à sua palavra, e tu
julgaste-te a ti mesmo, tu que és rei da Terra. Glória a Deus Todo-Poderoso,
Rei da Terra e do Céu!» E mais disse: «Ó Felisbelo, levanta-te, e tu
também, Felisbela.» Assim fizeram eles e ela disse: «Ó miralmuminim, este
aqui em pé é Felisbelo, filho de Rabie, de Cufa, e esta aqui é a sua rapariga,
que lhe foi roubada de casa por Al-Hajjaj ibn Yúçuf Attaqafi, que a enviou
para si, e que mentiu na sua carta sem se poupar nisso, mencionando que
havia comprado a rapariga por dez mil dinares a um proprietário local.
Peço-lhe por Hamza, por Aqil e por Abbas55, que os perdoe, os absolva de
qualquer delito e os ofereça como presente um ao outro. Eles bem
merecem, até porque estão no seu palácio protegidos pela sua hospitalidade,
pois comeram da sua comida e beberam da sua bebida, e eu intercedo por
eles e suplico-lhe que poupe as suas vidas.»
Logo, o califa disse: «Falas verdade, porque eu já julguei e proferi a
minha sentença sobre este caso, e eu, quando julgo, nunca volto atrás na
sentença.» Em seguida disse: «Ó Felisbela, este é o teu amo?» Ela disse:
«Sim, é, ó miralmuminim e califa ao serviço do Senhor dos mundos.» E ele
disse: «Não vos preocupeis, ofereço-vos como presente um ao outro.» E
mais disse: «Ó Felisbelo, como soubeste onde estava ela e quem te
introduziu aqui?» E Felisbelo disse: «Ó miralmuminim, escute o que me
aconteceu…»
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
162.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o rei me poupar e eu
viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
163.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa», disse-lhe a sua irmã Dinarzade. E Xerazade
respondeu: «Isto nada é comparado com o que contarei, a ti e ao nosso rei,
na próxima noite, se o rei me poupar e eu viver.»
E em sendo a próxima noite, que era a
164.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o prestigiado rei me
poupar e eu viver. Será ainda mais tocante, espantoso, maravilhoso e
prazeroso, com palavras mais belas e frases mais singelas.»
E em sendo a próxima noite, que era a
165.ª Noite
Mas Xerazade, sentindo a manhã chegar, calou-se e não mais falou. «Que
história tão deliciosa, ó mana, tão boa e tão prazerosa», disse-lhe a sua irmã
Dinarzade. E Xerazade respondeu: «Isto nada é comparado com o que
contarei, a ti e ao nosso rei, na próxima noite, se o prestigiado rei me
poupar e eu viver. Serão palavras mais tocantes, espantosas e
maravilhosas.»
E em sendo a próxima noite, que era a
166.ª Noite
Quando o génio ouviu esta história, ficou espantado até mais não e disse
[ao segundo ancião]: «Sabes o nome dessa génia?» E ele disse: «Sim, sei,
ela disse-me que dava pelo nome de Carcaza, filha de Dahnaxe, [e disse-
me]:“Tenho um irmão que dá pelo nome de Caxecaxe, e nós habitamos em
altas montanhas negras, nas fontes, nas grutas e nas árvores.” E descreveu-
me o lugar como sendo tal e tal.» E após o génio ouvir tal descrição, disse:
«Ó ancião, foi com a minha filha que te casaste e ele contou-me a tua
história. Eu e o meu filho íamos hoje ter com ela, para ela desencantar os
teus irmãos, mas por causa deste mercador aconteceu-nos o que aconteceu,
e ele matou o meu filho, irmão da tua mulher, pior mal não podia ele ter
feito, mas eu concedo-te a vida do mercador, porque és meu genro, marido
da minha filha, mas antes quero ouvir a história do ancião que traz consigo
uma mula»59. Em o dono da mula ouvindo estas palavras do génio,
aproximou-se dele e disse:
Fica sabendo que eu tomei como mulheres quinze escravas, e que elas me
deram filhos e filhas. Mas ao depois morreram todos. Então, ouvi dizer que
em Baçorá havia um homem que fazia divinação com areia, e para lá
viajei.Ao chegar a Baçorá, perguntei por aquele homem e indicaram-me
onde o encontrar. Dei-lhe parte do meu caso, de que os meus filhos não
sobreviviam. Ele lançou areia na sua tábua, olhou para ela e chorou. Então,
disse-lhe: «Porque chora?» Ele disse: «Vejo que os filhos que tem com
escravas abissínias não sobrevivem, por isso tome como concubinas duas
escravas brancas.»
Então, fui ao país dos turcos e comprei duas raparigas. Casei-me com
elas, dei-lhes roupas e reparti entre elas de maneira igual os meus
proventos, as roupas e as dormidas comigo. Ao cabo de algum tempo, Deus
abençoou-me por meio delas com dois filhos machos de belo aspecto.
Cresceram até o mais velho fazer três anos e o mais novo dois, altura em
que o mais novo morreu, ficando-me só o mais velho. Então, o ciúme
perseguiu a mãe daquele que havia morrido, e tal era o seu ciúme e inveja
que quase se finou. Entretanto, a mãe do moço maior faleceu, e a outra
raptou o filho da que havia morrido, subiu com ele à açoteia da casa e disse-
me: «Ergue a tua cabeça e olha para o teu filho, porque vou atirá-lo daqui e
deixá-lo em pedaços.» Ergui a cabeça e o meu coração estremeceu ao ver o
miúdo nas suas mãos. Com receio pelo meu filho, submeti-me e rebaixei-
me a ela, prometendo-lhe o que quisesse, e ela disse-me:«Queres que o teu
filho fique são e salvo?» «Sim», disse-lhe eu. E disse ela: «Prometes-me
que não me culpas por ter poucos filhos, nem por este filho não ser meu,
nem te casas com uma segunda mulher?» Disse-lhe que sim a tudo e
prometi-lhe solene e firmemente que faria o que ela pedisse, e ela disse:
«Não quero isso de ti, nem as tuas promessas, porque tu és pouco devoto.
Se queres que o teu filho fique são e salvo, pega numa faca e corta o teu
membro de maneira que eu veja.» Rebaixei-me perante ela implorando-lhe
várias vezes, mas ela não quis saber. Então, com receio pelo meu filho,
peguei numa faca e fiquei atrapalhado. Não me era fácil decidir entre cortar
o meu membro e a morte do meu filho. E sempre que estava preste a cortá-
lo, o meu corpo tremia e não o conseguia fazer. Então, ela disse: «Parece
que preferes ficar com o teu membro, vais ver o teu filho em pedaços!» E
ergueu-o com os braços, olhou para ele e estava prestes a atirá-lo. Implorei-
lhe mas ela não quis saber, então peguei na faca para cortar o meu membro,
estando prestes a fazê-lo com a faca encostada nas minhas partes, até que
esta cortou o meu membro e eu perdi os sentidos, esvaindo-me em sangue.
Xerazade disse:
PARTE I
O que há de mais importante a dizer sobre o livro d’As Mil e Uma Noites
já foi dito no preâmbulo do primeiro volume. No entanto, não se
mencionaram alguns detalhes de alguma importância relativos a esta
tradução. Da mesma maneira, julgou-se necessário colmatar certas lacunas,
proceder a pequenas correcções relativas ao Preâmbulo, e ainda esclarecer
alguns factos.
Fórmulas
Origens
Referências religiosas
Outros manuscritos
Versão matriz
Localização de fontes
Se Ginés resume muito bem esta questão, urge no entanto fazer alguns
comentários críticos a esta passagem. No que diz respeito à ideia de que os
leitores d’As Noites morreriam no decurso da sua leitura, segundo a nota de
rodapé do texto original, esta provém de um comentário do orientalista
Victor Chauvin (1844-1913) na sua Bibliographie des ouvrages arabes ou
relatifs aux Arabes12 que, por sua vez, se baseia num comentário que
Yacoub Artin Pacha (1842-1919), historiador e ministro da Cultura do
Egipto, faz no prefácio aos seus Contes populaires inédits de la vallée du
Nil13. Não é de excluir que Yacoub Pacha, tendo em conta o público a quem
se destinava a sua obra, quisesse impressionar os leitores com tal
observação, a qual carece de fundamento, não se encontrando aliás em
outras referências bibliográficas pertinentes algo que corrobore a circulação
deste mito. No entanto, a ideia de um livro que mata o seu leitor está
presente na História do rei Yunane de Zumane e do sábio Dubane, e é
provavelmente nesta história e nesta ideia que Lovecraft se baseou para
conceber o seu famoso Necronomicon, que levaria quem o lesse à loucura, e
cujo nome original em árabe seria al-ʿazīf, palavra traduzível por «o sibilo
do vento», e que também designa certos sons e ruídos estranhos, como
aqueles que se ouvem no deserto produzidos pelas areias, cuja proveniência
alguns dicionaristas árabes dizem ser desconhecida, ou pelo vento varrendo
as areias. Em qualquer caso, são estes sons estranhos que por vezes se
associam aos produzidos por génios e ifrites durante a noite.
Apesar de parecer uma descoberta demasiado boa para ser verdade, pois
teríamos um manuscrito com um parente relativamente próximo d’As Mil e
Uma Noites mas mais antigo que qualquer outro manuscrito desta obra, a
datação ainda continua questionável.
Mesmo Tarchouna30, na introdução à terceira edição (2013) d’As Cento e
Uma Noites, chamava a atenção de que ainda não haviam sido feitas análise
químicas com o intuito de datar o papel de ambos os manuscritos. Sabemos
também que em inícios de Novembro de 2017, a investigadora Renata
Fontanillas contactou responsáveis do Museu Aga Khan com o intuito de
obter várias informações relativas ao manuscrito, nomeadamente se já
haviam sido feitas análises químicas de datação, e que a resposta a esta
questão foi negativa31.
Ficamos por isso sem saber se este irmão ocidental ou magrebino –
conforme o adjectivo que se prefira – d’As Mil e Uma Noites lhe seria
anterior ou não na sucessão cronológica, mas talvez a intertextualidade das
várias obras da família alargada d’As Noites seja bem mais complexa para
que se possa estabelecer cronologias simples, continuando qualquer estudo
sobre esta questão à mercê da escassa quantidade de elementos factuais
conhecidos. Novamente, ficamos com mais questões do que certezas.
PARTE II
Na 117.ª Noite são referidos, entre outros, três pratos: «sicbaj, guisados,
tiras de massa frita embebidas em mel de abelha».
O sicbaj (sikbāj) é um guisado agridoce de carne com vinagre, xarope de
fruta, e especiarias. Este prato já foi referido no primeiro poema da 49.ª
Noite, onde se menciona um prato de grous cozinhado «em molho
agridoce»34, referido novamente no início da 167.ª Noite, em que o dono da
casa menciona um «sicbaj de ganso engordado». Apesar do vinagre ser
talvez o único elemento comum, alguns dicionários traçam, com
reticências, a etimologia de «escabeche» na palavra sikbāj (na sua variante
iskabāj).
O livro de culinária de Muḥammad ibn al-Ḥasan al-Baghdādī, escrito por
volta de 1226 AD, com o título Kitāb aṭ-Ṭabīkh, doravante referido como
«O Livro de Culinária de al-Baghdadi»35, fornece a seguinte receita:
Corta-se a carne gorda em pedaços de tamanho médio, põe-se numa panela e cobre-se com
água, juntamente com coentros frescos, um pau de canela e sal quanto baste. Quando ferver,
tira-se a espuma e a gordura com uma concha, e deita-se fora. Depois, retiram-se os coentros
frescos e põem-se coentros secos. Depois, pega-se em cebola branca, alho-porro e, se for a
época, cenoura, caso contrário beringela. Descasca-se tudo e corta-se a beringela em cruz, [ou
seja, cada rodela em quatro bocados,] e ferve-se ligeiramente noutra panela em água e sal.
Depois retira-se a água e deita-se na [primeira] panela sobre a carne, acrescenta-se especiarias
e apura-se o sal. Quando estiver quase cozido, pega-se em vinagre de vinho e xarope
concentrado de fruta [geralmente de uva, ou tâmaras, ou alfarroba, ou romã] – há quem
prefira antes mel, mas com xarope é mais apropriado – mistura-se de forma a que o conjunto
fique equilibrado e despeja-se na panela, deixando-se a ferver durante uma hora. Quando for
altura de deixar de alimentar o fogo, retira-se um pouco do molho, ao qual se junta açafrão36
quanto baste, e põe-se de novo na panela. Depois, adiciona-se amêndoas doces descascadas e
partidas ao meio por cima do guisado, juntamente com um pouco de uvas, passas, e figos
secos. Cobre-se a panela durante uma hora para repousar na quentura [remanescente] do fogo,
limpando-se os bordos com um trapo limpo e borrifando-se com água de rosas. Depois de
repousar, retira-se [e serve-se].
As histórias dos seis irmãos contadas pelo barbeiro que começam no final
da 152.ª Noite, assim como a História de Jullanar do Mar, são retiradas de
um livro anónimo com o título O Livro das Histórias Espantosas e das
Estranhas Novas (e tal como já mencionado, será referido abreviadamente
por Histórias Espantosas), que remonta pelo menos ao século xiv, datação
do único manuscrito integral conhecido, o qual que se encontra no Ayasofya
Müzesi em Istambul50. A história que consta nesse livro chama-se História
dos seis indivíduos: o corcunda, o zarolho, o cego, o paralítico, o homem
de lábios cortados, e o vendedor de vidro51.
Parece indubitável que a fonte das histórias dos irmãos do barbeiro seja
este manuscrito, e se não este exactamente, pelo menos um outro contendo
o mesmo livro, não sendo de excluir que o redactor d’As Noites possa ter
ouvido essas histórias e tentado reproduzi-las de memória, em vez de copiar
o texto. A enorme semelhança, incluindo longos excertos que se
reproduzem ipsis verbis, corrobora a ideia de que é esta a fonte literária em
que esta história se baseou. No entanto, nem sempre as histórias foram
devidamente transpostas para o contexto d’As Mil e Uma Noites, deixando
elementos do conjunto original que não se encaixam n’As Noites. Por
exemplo, um erro recorrente, mas corrigido nesta tradução, é que as
histórias originais são narradas na primeira pessoa, enquanto aqui o são na
terceira e por vezes essa alteração não foi feita na transposição. São
inúmeros os casos em que tal acontece.
Convém mencionar que nas Histórias Espantosas não é um barbeiro que
conta as histórias dos seus irmãos, mas são os próprios protagonistas que as
contam na primeira pessoa a um rei que, certa noite, sofrendo de insónias,
pediu à governanta que fosse buscar quem lhe contasse histórias
extraordinárias. Esta trouxe de um beco onde havia pedintes e gente da mais
pobre condição social «seis indivíduos: o corcunda, o zarolho, o cego, o
paralítico, o homem de lábios cortados, e o vendedor de vidro», e cada um
deles contou a sua história ao rei. Note-se, ainda, que várias vezes onde
seria expectável encontrar a palavra «califa» ou título equivalente n’As
Noites, aparece antes «o rei», o que se depreende que haja sido transposto
das Histórias Espantosas por distração52. Para comodidade de leitura, esta
tradução corrigiu tais aparentes incoerências.
Nalguns casos em que não foram feitas correcções, optou-se pela menção
«sic» em nota de rodapé. Por exemplo, no início da 162.ª Noite, a expressão
dita pelo barbeiro, «o pai dele», em referência ao seu irmão, «o das orelhas
cortadas», soa pouco natural, visto que de seguida é referido que o pai do
irmão «deixou-nos setecentos dirames, que repartimos entre nós havendo
cada um ficado com cem dirames». A transposição terá sido feita de forma
pouco reflectida, alterando simplesmente – com algum desleixo, como já
mencionámos – a primeira pessoa para a terceira, pois nas Histórias
Espantosas, onde os seis indivíduos não são aparentados, quem narra esta
história diz antes «o meu pai». Uma transposição bem feita e atenta teria
com certeza optado por «o nosso pai». No entanto, o narrador d’As Noites
teve o cuidado, para efeitos de coerência, de alterar o valor e a repartição da
herança, pois nas Histórias Espantosas o pai da personagem desta história
não deixa no total setecentos dirames repartidos por sete irmãos, mas
apenas cem, dando a entender que o vendedor de vidro teria sido o único a
beneficiar da herança do pai.
Gralhas e lacunas
Moral da história
Geografia humana
No final da 209.ª Noite referem-se «todos os géneros de raparigas, tais
como núbias, senegalesas, francas, zagauas, gregas, turcas, tártaras, e
outras». O termo que figura no texto árabe para «senegalesas» é takrūrīyah
(ou tukrūrīyah, segundo alguns dicionários), que deriva do nome de um
antigo Estado, Takrur, que existiu entre os séculos ix e xiii na África
Ocidental, na parte baixa do rio Senegal, nos territórios hoje compreendidos
pelo Senegal e Mauritânia. No entanto, o termo é usado em árabe, pelo
menos na época, para designar genericamente todas as pessoas provenientes
da África Ocidental Subsariana. Resolveu-se nesta tradução usar também
uma sinédoque, recorrendo a um nome mais conhecido e relacionado com
aproximadamente a mesma região que o do antigo Estado de Takrur. A
tradução do termo zaghwīyah por zagauas (povo que habita uma região
compreendida entre o Leste do Chade e o Oeste do Sudão) não é tida por
certa, e não nos foi possível encontrar em nenhuma fonte documental
(incluindo dicionários, enciclopédias e tratados de geografia árabes, antigos
e modernos) qualquer referência a um povo referido por este nome. A
escolha de «zagauas» partiu da mera suposição que em vez de zaghwīyah
talvez o pretendido fosse zaghāwīyah. Não deixa de ser curioso que a lista
de povos enunciada, com excepção precisamente dos zagauas, começa na
África Oriental, passando pela África Ocidental, França, Anatólia e
Tartária, fazendo o que se assemelha vagamente a uma rotação no sentido
dos ponteiros do relógio à volta do mar Mediterrâneo. Assim, pareceria
lógico pensar que as zaghwīyah viessem de uma região da Europa, mas no
entanto nada assegura que o autor quisesse listar estas referências numa
determinada ordem espacial e geográfica (e aliás isso não acontece em
vários outros manuscritos). O termo zaghwīyah aparece também nos
manuscritos Codex Vaticanus Arabo 782 da Biblioteca Apostólica Vaticana,
Arabic 207 da Christ Church Library (Oxford), e Arabe 3612 da BnF. No
manuscrito Arabic MS 2699 do India Office Records aparece grafado
zaghzīyah, sendo possivelmente um erro em que o «z» foi trocado pelo «w»
(em árabe, estas letras são susceptíveis a erro de cópia). Outros manuscritos
fazem listagens mais ou menos semelhantes, com referência a povos da
Ásia, Europa e África. Dos termos de outros manuscritos que aqui não
constam pode-se mencionar: abissínias, berberes (nome pelo qual
antigamente eram conhecidos os amazighes), georgianas, circassianas, e
ainda outro etnónimo que também não foi possível identificar.
Fauna e flora
Incongruências e curiosidades
Posfácio
Parte I
Parte II
Este livro foi publicado com o apoio dos leitores
através de um mecanismo de financiamento colectivo.
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