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Exemplo 1
Elegia de verão
O sol é grande. Ó coisas
Todas vãs, todas mudaves!
(Como esse “mudaves”,
Que hoje é “mudáveis”,
E já não rima com “aves”.)
Ó verões de antigamente!
Quando o Largo do Boticário
Ainda poderia ser tombado.
Carambolas ácidas, quentes de mormaço;
Água morna das caixas-d’água vermelhas de ferrugem;
Saibro cintilante...
Exemplo 2
Operário no mar
Na rua passa um operário. Como vai firme! Não tem blusa. No
conto, no drama, no discurso político, a dor do operário está
na blusa azul, de pano grosso, nas mãos grossas, nos pés
enormes, nos desconfortos enormes. Esse é um homem
comum, apenas mais escuro que os outros, e com uma
significação estranha no corpo, que carrega desígnios e
segredos. [...]. Agora está caminhando no mar. Eu pensava que
isso fosse privilégio de alguns santos e de navios. Mas não há
nenhuma santidade no operário, e não vejo rodas nem hélices
no seu corpo, aparentemente banal. Sinto que o mar se
acovardou e deixou-o passar. Onde estão nossos exércitos que
não impediram o milagre? Mas agora vejo que o operário está
cansado e que se molhou, não muito, mas se molhou, e peixes
escorrem de suas mãos. Vejo-o que se volta e me dirige um
sorriso úmido. A palidez e confusão do seu rosto são a própria
tarde que se decompõe. Daqui a um minuto será noite e
estaremos irremediavelmente separados pelas circunstâncias
atmosféricas, eu em terra firme, ele no meio do mar. Único e
precário agente de ligação entre nós, seu sorriso cada vez mais
frio atravessa as grandes massas líquidas, choca-se contra as
formações salinas, as fortalezas da costa, as medusas,
atravessa tudo e vem beijar-me o rosto, trazer-me uma
esperança de compreensão. Sim, quem sabe se um dia o
compreenderei?
DRUMMOND DE ANDRADE, Carlos. Sentimento do mundo. 13. ed. Rio de Janeiro: Record,
2001.
Exemplo 3
No campo
Olhos chorosos sob as negras sobrancelhas,
Costas abaixo solta a negra trança basta,
A campônia via guiando, a picadinhas d’hasta,
Um rebanho gentil de cândidas ovelhas.
Uma junta de bois morosa, em meio à vasta
Nava, arrastando vai umas charruas velhas...
E escutando o raspar monótono das relhas,
Queda-se na planície um grande boi, que pasta...
E some-se o rebanho. Uma sombra flutuante
Paira sobre a extensão da planície, distante...
Na espessura a campônia esconde-se depois.
E, ao longe, sob o céu, como uma prece estranha
Que desperta a mudez do campo e da montanha,
Chora no ar o mugir dos fatigados bois.
JÚLIA, Francisca. Poesias. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 1961.
História da poesia
Na Antiguidade, além dos poemas épicos (narrativas
heroicas), também se produzia a poesia lírica. Desse modo,
está aí a origem mais remota de que temos notícia. Nesse
período, a poesia apresentava os mesmos elementos que
persistem na atualidade, isto é, a expressão subjetiva e
conotativa de emoções e pensamentos.
A poesia dessa época tinha forte ligação com a oralidade, já
que era feita para ser cantada ao som de uma lira (um
instrumento musical de cordas). Tal característica permaneceu
no período medieval, quando foram produzidas as cantigas
trovadorescas. Contudo, no final da Idade Média, a poesia
passou a ser declamada. E, a partir do renascimento, passou
a ser valorizada a leitura individual.