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Biomimicry as Metodological Tool for Technical Emancipation of Peripheral


Countries

Conference Paper in Advances in Intelligent Systems and Computing · July 2018


DOI: 10.1007/978-3-319-60582-1_35

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4 authors, including:

Justino Neto Amilton Arruda


Federal University of Pernambuco PPGD/UFPE
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Theska Laila de Freitas Soares


Federal University of Pernambuco
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Belo Horizonte – MG

04 a 07 de outubro de 2016

BIOMIMÉTICA COMO FERRAMENTA METODOLÓGICA PARA


EMANCIPAÇÃO TECNOLÓGICA DE PAÍSES PERIFÉRICOS

Resumo: As metodologias clássicas de Design, baseadas em sequências


lineares, lógicas, rígidas e verticais, análogas às das ciências exatas, que
justificam e fundamentam os modelos tradicionais de produção industrial
disseminados através da hegemonia tecnológica dos países de centro,
conduziram a um tipo de desenvolvimento que tem se mostrado
insustentável, pois impõe a lógica do mercado de produção e o consumo
de seus bens. Embora tal experiência tenha proporcionado uma tecnologia
que corresponde aos objetivos para os quais é aplicada, não atende aos
requisitos essenciais previstos nas metodologias atuais, orientadas pela
abordagem sistêmica e interdisciplinar. Diante dos riscos, das
consequências sociais e dos impactos ambientais desse modo de produção
hegemônico, repressor das iniciativas políticas de desenvolvimento dos
países periféricos, se faz urgente a revisão de todo o sistema e a
elaboração de novas formas de produzir, capazes de proporcionar o avanço
tecnológico desejado, que atenda aos novos requisitos metodológicos para
conter ou mitigar os efeitos prejudiciais desse modelo e conduzir à
emancipação dos países dependentes (Bonsiepe, 2012). Para isso, é
necessária a implantação de uma nova maneira não apenas de produzir
bens, mas de pensar todos os processos e modos de vida, de forma mais
coerente com as atuais necessidades, voltadas para uma visão holística,
sustentável e interdependente dos sistemas, sejam artificiais ou naturais
(Capra, 1982; 1996). Nesse contexto de emergência, o Design assume um
papel estratégico capaz de conduzir e coordenar tais processos, como
ferramenta e instrumento pedagógico e tecnológico que agrega o
conhecimento às aplicações das soluções para os grupos sociais.
Considerando que maior parte dos países periféricos ainda não tem
infraestrutura industrial sedimentada e universalizada devido a séculos de
exploração, industrialização tardia (ou precária) que geram assimetria e
mais dependência tecnológica, a implantação de um modelo sustentável e
portanto de vanguarda, se configura numa oportunidade racional, lógica,
ética e sustentável, de acordo com o atual paradigma científico baseado na
análise sistêmica, contextualizado numa realidade dinâmica (Molina,
2004). Para atender à exigência de metodologias que contemplem a essa
realidade e aos requisitos de interdisciplinaridade, interdependência e
inter-relações inerentes aos fatores que influenciam os processos, além do
compromisso com a responsabilidade social e ambiental, a disciplina
2

Biomimética se mostra uma alternativa inovadora, capaz de satisfazer


àqueles pressupostos técnicos, sociais, ambientais e éticos, relegados nas
metodologias tradicionais: seus princípios se articulam ao modo de
resolução dos problemas da natureza, que atuam há 3,8 bilhões de anos e
encontram soluções elegantes, duradouras e de baixo impacto (Benyus,
1997). Essa nova ciência corresponde aos requisitos das metodologias
alternativas que visam conter ou solucionar as necessidades e problemas
emergentes da cultura de consumo e desperdício, além de garantir, através
da prevenção, eventuais dificuldades decorrentes da nova cultura de
produção através da interdisciplinaridade, sustentabilidade, compromisso
socioambiental e ética.

Palavras-Chave: Design, Metodologia, Biomimética.

Abstract: The classical metodology of design, based on linear sequences,


logics, rigids and verticals, similar to the exact sciences, to justify and
establish the traditional models of disseminated industrial production
through technological hegemony of the central countries, conduced to a
kind of development it has proven unsustainable, because it imposes the
logic of the market of production and consumption of their goods. Although
this experience has provided a technology that meets the objectives for
which it is applied, it does not meet the previous essential requirements in
current methodologies, guided by the systematic and interdisciplinary
approach. Given the risks, social consequences and environmental impacts
of this hegemonic mode of production, repressor of policy development
initiatives in peripheral countries, it is urgent to review the entire system
and the development of new ways of producing, capable of providing
advance desired technology that meets the new methodological
requirements to contain or mitigate the harmful effects of this model and
lead to the emancipation of dependent countries (Bonsiepe, 2012).
Therefore, it is necessary to introduce a new way not only to produce
goods, but to think of all the processes and ways of life, more consistent
with the current needs, aimed at a holistic, sustainable and interdependent
systems, are artificial or natural (Capra, 1982; 1996). In this the emergency
context, the design takes on a strategic role able to lead and coordinate
those processes as a pedagogical and technological tool that adds
knowledge to the solutions applications for social groups. Considering that
the most of the peripheral countries has not settled industrial infrastructure
and universalized due to centuries of exploitation, late industrialization (or
poor) that generate asymmetry and more technological dependence, the
implementation of a sustainable model and so cutting edge, is configured
into an opportunity rational, logical, ethical and sustainable, according to
the current scientific paradigm based on systemic analysis, contextualized
in a dynamic reality (Molina, 2004). To meet the requirement of
methodologies that address this reality and interdisciplinary requirements,
3

interdependence and interrelationships inherent factors influencing the


processes, and the commitment to social and environmental responsibility,
Biomimetics discipline shown an innovative alternative, capable to meet
those technical, social, environmental and ethical assumptions, relegated
the traditional methods: its principles are linked to the resolution mode of
the nature of the problems, which have been working for 3.8 billion years
and find elegant solutions, lasting and low impact ( Benyus, 1997). This new
science meets the requirements of alternative methodologies that aim to
contain or address the emerging needs and problems of the culture of
consumption and waste, and ensure, through prevention, any difficulties
arising from the new crop production through interdisciplinary,
sustainability, social and environmental commitment and ethics.

Keywords: Design, Methodology, Biomimicry

1. INTRODUÇÃO
O modelo comum de desenvolvimento industrial, que se baseia na produção e
consumo de bens, segue metodologias tradicionais lineares e centralizadoras,
semelhantes às das ciências exatas. No entanto, a nova realidade planetária e as
emergências das sociedades contemporâneas, cada vez mais complexas, exigem uma
abordagem de projeto abrangente e sistêmica, que contemple diversos fatores na
criação de artefatos (Bonsiepe, 2012).
Para substituir esse modelo que é mantido por países desenvolvidos e
poderosos economicamente sobre seus dependentes, se fazem necessárias uma
revisão e reformulação do sistema: os países periféricos devem desenvolver suas
próprias tecnologias se pretendem alcançar a emancipação e a autonomia, sua
‘segunda independência’ (Bonsiepe, 2012).
O instrumento que permite operacionalizar essa proposta passa pelo projeto
segundo Papanek (1984, 2006). A atividade do Design não é isolada e tem
consequências sociais e éticas, portanto pode e deve contribuir nessa tarefa, através
de metodologias orientadas para a realidade dos grupos, das sociedades e o respeito
ao meio natural.
Os países periféricos copiam ou ‘mimetizam’ um modelo de desenvolvimento
que, além de insustentável, mantém a sua dependência tecnológica em relação aos de
centro. Esse modelo é fundamentado na produção/consumo de bens e numa
assimetria tecnológica na qual os países desenvolvidos e mais poderosos
economicamente produzem e exportam tecnologias sobre a matéria importada dos
seus dependentes (Bonsiepe, 2012)
Essa assimetria é mantida pela proteção dos mercados e a ingerência que
restringe as iniciativas emancipatórias dos países periféricos. A solução seria revisar
esse sistema modificando suas metodologias, orientadas para manter esse modelo
centralizador, linear, fragmentado e desarticulado. A partir dessas observações, propor
novos modos de produzir, criar tecnologias próprias, próximas à realidade e
especificidades de cada sociedade (Bonsiepe, 2012).
4

Considerando que os países desenvolvidos também devem revisar seu próprio


modelo - de acordo com as exigências internacionais baseadas em dados científicos
que fundamentam as preocupações ecológicas - os países em desenvolvimento têm a
vantagem de se anteciparem ao adotarem tecnologias mais coerentes com a nova
realidade planetária e as suas próprias necessidades.
Nesse contexto, a Biomimética se insere como alternativa estratégica, pois se
baseia em princípios naturais de maneira integrativa, sofisticada, contemplando, além
dos requisitos da sustentabilidade, soluções elegantes e econômicas a partir da
mimese natural.
Entre as ferramentas metodológicas atuais, a Biomimetica se apresenta como
aquela capaz de integrar os requisitos da sustentabilidade, a complexidade dos
sistemas, as estratégias naturais à lógica tradicional de projetos, através da aplicação
dos princípios da natureza em vários níveis, desde os estético-formais aos ecológico-
pedagógicos (Benyus, 2012).
Desta forma, o objetivo principal deste artigo é o de apresentar a Biomimética
como ferramenta inovadora e estratégica na condução de Metodologias de
Projeto/Design e na criação de tecnologias próprias, específicas para a realidade e a
emancipação tecnológica dos países emergentes. Portanto, será necessário propor um
instrumento de reflexão e revisão dos conceitos da cultura de projeto decorrentes do
modelo de desenvolvimento predominante e justificar a inovação e a sustentabilidade
como tendências na aplicação de tecnologias.

2. BIOMIMÉTICA: INOVAÇÃO E EMANCIPAÇÃO TECNOLÓGICA


As emergências sociais e planetárias levaram a questionamentos e críticas ao
modelo de desenvolvimento comum, baseado na lógica da extração de recursos,
produção/transformação, utilização dos artefatos e seu descarte. Embora questionado
desde sua origem, através de movimentos contestatórios como o ‘Arts and Crafts’, ‘Art
Nouveau’ e ‘Werkbund’, o modelo industrial prosperou e difundiu uma mentalidade
que se justificava pelas conquistas tecnológicas, fundamentando a ideologia do
progresso e da modernidade (Moraes, 1999).
A mesma evolução técnico-científica que promoveu sua hegemonia e
disseminação global também permitiu fundamentar novas críticas a partir de estudos
como os do ‘Clube de Roma’ e encontros científicos internacionais subsequentes. Além
disso, eventos como as crises político-econômicas que culminaram em guerras, crises
ambientais, acidentes e desastres em empresas ao redor do mundo, num contexto de
Guerra Fria e ameaça nuclear, trouxeram questionamentos à própria maneira de
produzir e usar o conhecimento científico (Kazazian, 2005)
Por outro lado, pensadores ao redor do mundo, influenciados por essas
emergências, crises e limites, refletiram sobre o artificial, as ciências e nosso impacto
sobre o planeta, questionando nossas ideologias e suas concepções de mundo. A visão
holística, ecológica e interdisciplinar precisava ser integrada ao conhecimento e aos
meios produtivos (Capra, 1997,2001). No campo do design, Victor Papanek propõe
uma abordagem mais realista do modo de projetar, engajada politicamente e atenta as
especificidades sociais e à ética.
Nesse contexto de complexidade sistêmica e interdependência, a Biomimética
se configura como um instrumento condutor dos requisitos contemporâneos em
5

métodos e processos sustentáveis. Inicialmente concebida como biônica, essa


disciplina estava restrita a alguns aspectos formais, aplicáveis como matematicamente
ou geometricamente úteis na modelagem de artefatos. Contudo, a evolução científica
da Pós Segunda Grande Guerra promoveu o aprofundamento de suas atribuições e
alcance: a pesquisa de novos materiais e a observação microscópica de processos
permitem emulações em níveis moleculares.
O Biomimetismo é uma abordagem tecnologicamente orientada para aplicar as
lições de design da natureza buscando solucionar os problemas do homem. É possível
verificar, principalmente no método da analogia, relações frequentes com a natureza
para encontrar soluções projetuais. Os estudos da Biomimética são embasados nas
soluções naturais de projeto, decodificando geometrias e funcionamentos, na busca
do melhor aproveitamento e do menor gasto de energia.
Segundo Arruda (2002), o termo Biônica foi inventado, em 1958, pelo
Engenheiro da Força Aérea dos E.U.A Major Jack. E. Steele e foi definido como “a
análise das formas pelas quais os sistemas vivos atuam e têm descoberto os artifícios
da natureza”. O termo Biônica - do grego “elemento de vida”- foi oficialmente usado
como título de um simpósio em setembro de 1960. Ainda segundo Arruda (2002), a
Biônica é a ciência que estuda os princípios básicos da natureza (construtivos,
tecnológicos, de formas, etc.) e a aplicação destes princípios e processos na procura de
soluções para os problemas que a humanidade encontra. Uma vez que a Biônica lida
com a aplicação das estruturas, procedimentos e princípios de sistemas biológicos, foi
convertida em um campo interdisciplinar que combina a biologia com a engenharia, a
arquitetura, e a matemática.
Wahl (2006), sugere que a Biônica e o Biomimetismo representam duas
abordagens distintas ao “design e natureza”, baseadas em diferentes concepções da
relação entre a natureza e a cultura. Enquanto a Biônica trata da previsão,
manipulação e controle da natureza, o Biomimetismo aspira a participação na natureza
e, por isso, constitui uma maior contribuição para a sustentabilidade. Depois de
investigar um extenso número de pesquisas, Janine Benyus documentou e integrou
suas descobertas em Biomimicry - Innovation Inspired by nature. Este novo termo -
Biomimética - é caracterizado por ser mais amplo que o conceito de Biônica, conhecido
até então. Além de considerar a imitação da forma biológica, o Biomimetismo inclui
também o conceito de replicação do comportamento dos organismos biológicos.
Como diretrizes de abordagem, partimos dos seguintes princípios pelos quais
podemos imitar a natureza (Benyus, 2012):

A Natureza como modelo: Inspiração e mimese das soluções da natureza para


aplicações práticas;
A Natureza como medida: Utilização do padrão ecológico como parâmetro para as
inovações;
A Natureza como mentora: Visão que busca valorizar, respeitar principalmente
aprender com a natureza ao invés de apenas extrair dela.

3. PROCESSO DE DESIGN - METODOLOGIA EM BIOMIMÉTICA


Estas últimas abordagens da natureza como medida e mentora apresentam
novos valores, que incluem aspectos de sustentabilidade e de respeito à natureza, o
6

que para Janine significa a verdadeira revolução desse campo, transformando este
termo num conceito ainda mais amplo que o da biônica que na maioria das vezes
aborda a natureza apenas como modelo. Apesar do termo derivar da palavra grega
“Biomimesis”, onde “bios” siginifica vida e “mimesis”, imitação, a biomimética não se
restringe a considerar apenas a imitação da forma biológica, mas considera também o
conceito de replicação do comportamento dos organismos biológicos.
De acordo com Santos (2010), ela corrobora com a filosofia do design
ambiental, que também tem a visão multidisciplinar onde muitos setores industriais
podem substituir o método tradicional de projeto e produção dos bens de consumo
pelo “método” da natureza que é bem mais equilibrado e menos oneroso para o
ambiente.
Benyus documentou e integrou suas descobertas na obra Biomimética,
Inovação inspirada na Natureza e ainda criou o Biomimicry Institute 3.8, um instituto
cujo site disponibiliza conteúdo, reúne pessoas envolvidas com o tema e é um canal de
divulgação de diversos workshops, palestras e inclusive um curso de especialização
nessa área online. Dentre os conteúdos disponíveis, Janine elenca os três elementos
essenciais e interconectados para a prática desta ciência (Figura 1), são eles:
1. Ethos, que é uma representação do respeito, responsabilidade e gratidão da
espécie humana pelo planeta;
2. (Re) Conexão, que indica que nós somos parte da natureza, pessoas e
natureza estão na verdade profundamente entrelaçadas. Nesta perspectiva, existe
uma reconexão do humano com o meio natural;
3. Emulação, representando os princípios, padrões, estratégias e funções
encontradas na natureza que podem inspirar o design. A emulação representa um
sentimento que instiga a imitar ou a exceder outrem, de forma estimulante e
cooperativa (BIOMIMICRY INSTITUTE 3.8, 2015).

Figura 1 - Elementos Essenciais. (Fonte: BIOMIMICRY.NET, 2015)

Outro conteúdo disponível pelo Biomimicry Institute 3.8 é o Projeto Biomimicry


Thinking - Design Lens (Figura 2), que aborda um método específico para aplicação dos
conceitos inspirados nos princípios da vida com metodologias não lineares, mas
realizadas em ciclos contínuos e repetidos, que de maneira gradual aumentam em
7

complexidade conforme especificidades e avanço das etapas. A ideia é fornecer um


contexto nas tomadas de decisão, procurando identificar o como e o porquê a
Biomimética se encaixa no processo de qualquer disciplina ou em qualquer escala do
projeto de design.
Esta ferramenta possui um background de desenvolvimento e aperfeiçoamento
desde 1998 e está em constante evolução através de novas descobertas na ciência. Ela
foi criada com o intuito de ajudar a observar profundamente a forma como a vida
funciona, e estabelecer parâmetros para a utilização da genialidade da natureza,
orientando os projetos humanos. Contém um conjunto de diagramas que representam
visualmente os fundamentos da abordagem do design perante a natureza.

Figura 2 - Biomimicry Thinking (Fonte: BIOMIMICRY.NET, 2015)

Esta metodologia, que apesar do nome remeter ao design, pode ser aplicada
em diversas áreas, e inclui quatro fases que fornecem as etapas para o processo de
Aplicação da Biomimética, são elas: Escopo, Descoberta, Criação e Avaliação.
No Escopo se tem a definição do problema, a identificação das funções e a
integração com os princípios da vida. Na Descoberta, se faz a investigação de
elementos da natureza que atendam aos requisitos do Escopo. A seguir, se faz a
abstração através das estratégias biológicas. Na fase de Criação, é feito um Brainstorm
para gerar alternativas que correspondam e tenham similaridade com os elementos
escolhidos e por fim, na fase de Avaliação, se vai medir para escolher a solução que
melhor atender aos princípios propostos por esta ciência.
Ainda falando em método para a prática da Biomimética, a solução encontrada
através da natureza pode partir de uma investigação sem ter um problema específico
para resolver, ou por outro caminho, já tendo o problema específico a ser resolvido.
Este último, Benyus chama de “Desafio Biológico” e é útil para uma configuração
"controlada", ou para a criação de um processo interativo de design, (Figura 3).
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Figura 3 - “Desafio Biológico” (à esquerda) e “Biologia para Design” (à direita)


(Fonte: BIOMIMICRY.NET, 2015)

O outro caminho é chamado de “Biologia para Design”, e é mais adequado


quando o processo inicia com uma visão biológica inspiradora (como por exemplo,
quando se visualiza em determinada situação algum dos princípios da vida) e que se
deseja manifestá-lo em um projeto.
Há aproximadamente sete anos, o Instituto também criou uma comunidade
online colaborativa conhecida como AskNature (Pergunte à Natureza), que reúne
pesquisadores interessados em trocar informações sobre o assunto, o que acumulou
uma incrível fonte de informação onde estão compartilhados os trabalhos de biólogos
de diferentes partes do mundo sobre as mais variadas espécies e que podem ser
acessados por qualquer pessoa, inspirando as criações inovadoras com referência na
natureza. Este serviço já está sendo utilizado por profissionais de diversas áreas.
Mas apesar dos avanços dessa ciência, ainda existem poucos estudos
formulados para o procedimento de interpretação ou tradução da biologia da fase de
Criação, sendo mais comumente utilizado o método já conhecido na Biônica, a
analogia.
Porém, é importante perceber que é necessário sistematizar esta criação
através de novos caminhos pois esta transferência de um conceito ou mecanismo vivo
para sistemas inanimados não é trivial. Uma réplica simples e direta do modelo
biológico raramente é bem-sucedida, mesmo com toda tecnologia disponível no
cenário atual, pois se trata de uma atividade com certo grau de complexidade. Gruber
(2011) afirma que para que ocorra o sucesso da solução Biomimética deve existir
interdisciplinaridade ou ainda deve-se aplicar os conceitos de forma estratégica

4. BIOMIMÉTICA: APLICAÇÃO PARA AUTONOMIA


A industrialização nos países periféricos é desarticulada ou inexistente: essa
precariedade se observa por conta de sua implantação tardia e da imposição de
políticas protecionistas dos países de centro, que restringem as iniciativas tecnológicas
dos periféricos (Bonsiepe, 2011)
9

No entanto, a falta desse modelo sedimentado pode se tornar uma


oportunidade de aprimorar um novo, mais inteligente e integrado, descentralizado e
interligado, semelhante à configuração rizomática: sustentável, autônoma, porém
interdependente. Um modelo que se articule através de componentes modulares,
intercambiáveis e auto reguladores.
Um exemplo prático deste modelo foi aplicado pela empresa americana PAX
WATER MIXER (Figura 4) que desenvolveu o seu misturador de água baseado na forma
em espiral tão recorrente na natureza através do formato de algumas plantas como o
“copo de leite” ou até mesmo de fenômenos naturais como o nascer das plantas, o
quebrar das ondas, o movimento dos ventos ao longo do equador, a formação dos
tornados, furacões, etc. Neste produto criado para misturar grandes volumes de água
à nível industrial, têm-se uma solução simples inspirada numa forma natural que
proporciona maior eficácia na mistura e uma redução de energia no processo, o que se
traduz num maior ganho em eficiência.

Figura 4 – PAX WATER MIXER (USA) Misturador de água inspirado na forma em espiral dos
jarros e de fenómenos naturais que proporciona maior eficácia.
Fonte: VERSOS, 2010.

Essa forma de configuração:


a. Permite multiplicação em Escalas e Ciclos;
b. Se organiza de acordo com a demanda ou economia;
c. É Co-produtiva: ‘todos são designers’ e contribuem na criação/integração;
d. Favorece o conhecimento, tecnologias, uso da matéria e mão de obra locais;
e. Promove a emancipação e a autonomia de grupos específicos e por fim, da
sociedade como um todo;
f. Mantém as comunidades unidas e o conhecimento tradicional preservado.

5. CONCLUSÃO
Ao longo de nossa evolução técnica-científica nos afastamos gradualmente da
dependência e do modo natural de atender às nossas necessidades. Esse afastamento
foi útil para nos tirar do nomadismo e da passividade que nos mantinha sujeitos às
dificuldades e vicissitudes da natureza e da existência. Essa evolução nos tornou
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capazes de prever estações, mudar cursos de rios, plantar e colher, domesticar outros
animais e plantas: uma transformação que nos potencializou e artificializou (Flusser,
2004)
À medida que nos apropriamos dos segredos da vida, também nos afastamos
das leis que a tornaram viável, pois imitamos o modelo artificial a ponto de não nos
reconhecermos como seres dependentes do suporte natural. O conhecimento que
desenvolvemos e suas tecnologias precisam de um senso ético criterioso que trace
prioridades para uma nova forma de criar, mais relacional, ecológica (Capra, 1997,
2001).
A sustentabilidade dos sistemas deve ser amparada pela ciência e nela se
embasar para se reformular e fundamentar teoricamente. Ao mudar a lógica da
imitação do modelo artificial linear insustentável para emular um outro, complexo,
limitado, sistêmico e interdependente que se autorregula, estaremos adotando a
maneira como a vida se sustenta, interagindo através de fatores que favorecem a vida
e suas transformações, permitindo o tipo de tecnologia mais viável e inteligente que já
tivemos acesso (Benyus, 2012).
É importante ressaltar e incentivar a implementação de tal metodologia
biomimética nos países subdesenvolvidos (periféricos) como forma de incentivar o
financiamento de mais pesquisas no país e nos demais países em desenvolvimento,
que se estiverem alinhados a essa nova abordagem, poderão suplantar não apenas as
dificuldades imediatas, presentes no cotidiano de suas economias que estão
envolvidas nas imposições do mercado globalizado, mas também gerar produtos mais
inovadores e patentes, o que acarretará ao longo desta prática num incremento da
qualidade, da viabilidade e de certa paridade tecnológica comum nos países
desenvolvidos.
Soluções biomiméticas simples como a do misturador de água PAX MIXER, com
referência em formas de espirais recorrentes na natureza podem trazer grandes
benefícios econômicos, sem o montante de investimento em pesquisa de ponta como
é feito em países desenvolvidos, o que já configura como uma maneira inteligente de
fazer e utilizar o Design em concordância com o cenário atual com foco em
sustentabilidade.

REFERÊNCIAS

ARRUDA, Amilton. Bionic Basic: Verso un nuovo modello di ricerca progettuale. 2002.
175 p. Tese (doutorado) – Univesidade Politécnico de Milão, Dottorato di Ricerca in
Disgno Industriale e Comunicazione Multimediale.
_______ Verso una didattica nel campo biônico: ipotesi per lo sviluppo di una
strategia progettuale. 1993. 185 p. Tese (mestrado) – Istituto Europeo di Design di
Milano, Centro Ricerche in Strutture Naturalli.
BENYUS, Janine M. Biomimética: Inovação inspirada pela natureza. 6ª ed. São Paulo:
Ed. Pensamento- Cultrix, 2012.
BONSIEPE, Gui. Design, Cultura e Sociedade. 1 Ed. São Paulo: Blucher, 2011
11

BONSIEPE, Gui: Design como Pratica Projetual. São Paulo: Blucher 2012
CAPRA, Fritjof. O Ponto de Mutação. 22 Ed. São Paulo, 2001
CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida. 1 Ed. São Paulo, 1997
DE MORAES, Dijon: Limites do Design, 2ª Ed. São Paulo: Studio Nobel, 1999;
FLUSSER, Vlém. O Mundo Codificado. São Paulo: Cosac Naify, 2004.
GRUBER, P. Biomimetic in Architecture [Architekturbionik]. In: Biomimetics Materials,
Structures and Processes - Examples, Ideas and Case Studies. Berlim: Springer-Verlag,
2011.
KAZAZIAN, Thierry (Org.). Haverá a Idade das Coisas Leves: Design e Desenvolvimento
Sustentável. 2ª Ed. Tradução: Eric Roland Rene Heneault. – São Paulo: Ed. SENAC São
Paulo, 2005.
PAPANEK, Victor. Design For The Real World: Human Ecology and Social Change. 2nd
Ed. London: Thames & Hudson, 2006
VERSOS, Carlos. A.M. Design biônico: a natureza como inspiração criativa. Dissertação
(Mestrado). 2010. 186p - Universidade da Beira Interior, Covilha, Departamento de
engenharia Eletromecânica.
WAHL, D. C. (2006). Bionics vs. biomimicry: from control of nature to sustainable
participation in nature. WIT Transactions on Ecology and the Environment, 87, 2006.

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