Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
INTRODUÇÃO.
A pesquisa bibliográfica foi desenvolvida a partir da aglutinação e
sistematização das referências disponíveis sobre o tema. Já o trabalho de campo
vem se desenvolvendo desde 2009, com visitas intermitentes na comunidade
indígena Raposa, localizada na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, através do
acompanhamento dos eventos e feiras culturais e rituais ocorridos nessa
comunidade e concomitante na cidade de Boa Vista onde foi identificado o trabalho
de uma mestra paneleira, oriunda dessa mesma comunidade indígena, que obteve
notoriedade através da inserção de suas panelas em vários circuitos, tais como
feiras e exposições, em Roraima quanto no restante do Brasil. A panela de barro
possui um status social e político poderoso como um produto cultural indígena
dentro das comunidades e nas cidades. Ao mesmo tempo, diversos dispositivos
jurídicos asseguram e protegem as mestras paneleiras como detentoras dos
saberes, tecnologias e conhecimentos milenares do modo de fazer a Panela de
¹ Mestre em Antropologia Social, Universidade Federal de Pernambuco UFPE.
² Doutoranda em Direito Público pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC). É Professora Assistente do
Instituto de Ciências Jurídicas e Professora Colaboradora do Instituto Insikiran de Formação Superior Indígena da Universidade
Federal de Roraima (UFRR).
Barro, possibilitando com que esse importante instrumento politico, cultural e social
passe também a ser reconhecido como uma espécie de “grife étnica”, os dispositivos
jurídicos vêm para reforçar e assegurar a proteção das detentoras sobre o domínio
da técnica e da cultura por parte das mestras paneleiras desse símbolo politico
cultural e social, senão uma grife étnica.
Además, Lathrap stablece, por primera vez, uma relación entre la tradición
arqueológica de cerámica com incisión fina aplicada y la expansión de las
lenguas Caribe, la cual constituye uma de las ultimas oleadas (a partir de los
500 D.C) que llegaron a la cuenca amazónica...Este tipo de alianza
matrimonial, además de hacer surgir variaciones linguísticas, trajo como
consequência la aparición de estilos cerâmicos regionales bien diferenciados.
(TARBLE, p, 45. 1985).
Various degress of skill are show by the women of the different tribes in
making pottery. As has been said, the True Caribs are the most skilful.
Maroaver , the success of the potter seems also in part due to the place from
whence the clay from certain places on the Cuyuni river is said by the Indians
to be the best in the colony; and more goods are always asked in exchance
for a vessel made of this clay. (THURN, 1883, p.275).
As panelas de barro são manifestações artísticas com alto valor cultural, pois
refletem a percepção estética e de valores de seu povo, além de expressar a força
social e a visão de mundo de quem as produz. Mas, ao se inserirem no contexto da
sociedade envolvente, adquirem uma nova dinâmica e relevância, que agrega
¹ Mestre em Antropologia Social, Universidade Federal de Pernambuco UFPE.
² Doutoranda em Direito Público pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC). É Professora Assistente do
Instituto de Ciências Jurídicas e Professora Colaboradora do Instituto Insikiran de Formação Superior Indígena da Universidade
Federal de Roraima (UFRR).
também valor comercial ao seu valor cultural, exigindo, assim, proteção jurídica
específica por parte de distintos regimes jurídicos, em especial: o regime de
salvaguardas do patrimônio cultural imaterial, que permite a proteção dos
conhecimentos tradicionais e das expressões culturais indígenas por meio da sua
identificação, documentação, investigação, preservação, proteção, valorização,
transmissão e revitalização, em seus diversos aspectos (UNESCO, 2003), com a
finalidade de assegurar que esse patrimônio não seja perdido ou degradado; e o
regime de propriedade intelectual, que, através dos direitos autorais e de imagem,
protege os bens e expressões culturais e artísticos indígenas contra a sua
apropriação e uso indevidos por terceiros, através do reconhecimento jurídico da
titularidade desses bens às respectivas comunidades e povos indígenas e
permitindo, dessa maneira, que tenham o controle sobre sua exploração comercial,
decidindo se desejam ou não que a sociedade envolvente tenha acesso a tais bens
e de que maneira (WIPO, 2015).
Há quase cinquenta anos, o regime de salvaguarda do patrimônio cultural
imaterial vem se desenvolvendo e se consolidando no âmbito da UNESCO através
da definição de instrumentos jurídicos – tais como a Convenção para a Proteção do
Patrimônio Mundial, Cultural e Natural (1972), a Convenção para a Salvaguarda do
Patrimônio Cultural Imaterial (2003) e a Convenção sobre a Proteção e a Promoção
da Diversidade das Expressões Culturais (2005) – com vistas à promoção do
reconhecimento, valorização e proteção de expressões culturais como as panelas de
barro que, apesar de se apresentarem como um bem material tangível, passível de
apropriação e de comercialização, incorporam também conhecimentos, saberes e
técnicas cosmológicos intangíveis, de valor inestimável para toda a Humanidade,
que necessitam ser reconhecidos, valorizados e protegidos como patrimônio cultural
de seus povos.
Essa perspectiva foi também incorporada pelo ordenamento jurídico brasileiro
que, através dos artigos 215 e 216 da Constituição Federal, passa a reconhecer a
importância das expressões culturais indígenas, tais como as panelas de barro, para
a formação do patrimônio cultural brasileiro, devendo ser protegidas e promovidas
através de um sistema de “inventários, registros, vigilância, tombamento e
desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação” (art. 216, §1 o),
implementado por meio da instituição do “Registro de Bens Culturais de Natureza
Imaterial”, criado pelo Decreto 3.551/2000 e do Programa Nacional do Patrimônio
Imaterial, que viabiliza projetos de identificação, reconhecimento, proteção e
promoção do patrimônio cultural imaterial brasileiro do qual as expressões indígenas
fazem parte.
Mas quando essas expressões culturais se inserem no contexto capitalista e
passa a ser apropriada como mercadoria pela sociedade envolvente, não-indígena,
como acontece atualmente com as panelas de barro Makuxi, esse patrimônio
material e imaterial indígena precisa ser duplamente protegido, como explica
Villares: