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pau, corda, cores e

[re]invenções
instrumentos e artesanatos do carimbó
pau, corda, cores e
[re]invenções
instrumentos e artesanatos do carimbó

198

2 019
sala do artista popular
S A P museu de folclore edison carneiro

Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular


IPHAN/ Ministério da Cidadania
Realização Associação Cultural de Amigos do Museu de Folclore
Edison Carneiro
Ministério da Cidadania
Presidente: Maria Laura Viveiros de Castro Cavalcanti
Ministro Osmar Gasparini Terra
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional Produção Local
Presidente: Kátia Bogéa Vitor Gonçalves; Paula Pflüger Zanardi; Lucas Bragança;
Amélia Barbosa; Walter Silva; Esmael Da Costa; Zuleide
Departamento de Patrimônio Imaterial
Alves; Adan Max; Claudio Ferreira de Souza
Diretor: Hermano Fabrício Oliveira Guanais e Queiroz
Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular
Diretora: Claudia Marcia Ferreira

apoio
Superintendência Iphan Pará
Secult - Secretaria de Cultura do Estado do Pará
Prefeitura de Marapanim
Prefeitura do Soure
parceria
Comitê Gestor da Salvaguarda do Carimbó
Associação do Carimbó do Estado do Pará

realização
Programa Sala do Artista Popular Projeto de montagem e produção da mostra
Coordenadora: Elisabeth Costa Luiz Carlos Ferreira
Texto Programação visual
Daniel Reis I Graficci Programação Visual - Victória Sacagami
Pesquisa Edição e revisão de textos
Paula Pflüger Zanardi e Daniel Reis Lucila Silva Telles
I Graficci Programação Visual - Natália Natalino
Filmagens
Paula Pflüger Zanardi Sonorização e produção videográfica
Pierre Azevedo Alexandre Coelho
Vitor Gonçalves
Daniel Reis
P323 Pau, corda, cores e (re)invenções: instrumentos e artesanatos
Fotografias do Carimbó / pesquisa e texto de Daniel Reis. – Rio de Janeiro:
Francisco Moreira da Costa - p. 6, 7, 9, 10, 12, 13, 14, 15, 16, IPHAN, CNFCP, 2019.
17, 18 (alto esquerda), 23, 24, 25 (alto e baixo direita), 26, 27, 36 p. : il. – (Sala do Artista Popular, n. 198).
29 (inclinado e esquerda), 30, 31 (esquerda), 32, 33, 34, 35
ISSN 1414-3755
Cris Salgado - p. 3, 8, 18 (baixo esquerda), 21, 28, 29 (ao
meio), 31 (direita) Catálogo etnográfico lançado durante a exposição realizada
Pierre Azevedo - p.18 (baixo direita), 20, 24 (baixo direita), no período de 25 de julho a 08 de setembro de 2019.
25 (alto e esquerda), 29 (direita), 33 (direita no alto) 1. Carimbó 2. Instrumento Musical 3. Pará I. Reis, Daniel, org.
II. Série.
CDU 394.321+681.8(811.5)
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sala do artista popular
S A P museu de folclore edison carneiro

A Sala do Artista Popular, do Centro Nacional de Folclore e O CNFCP, além da realização da pesquisa etnográfica
Cultura Popular/CNFCP, criada em maio de 1983, tem por obje- e de documentação fotográfica, coloca à disposição dos
tivo constituir-se como espaço para a difusão da arte popular, interessados o espaço da exposição e produz convites e
trazendo ao público objetos que, por seu significado simbó- catálogos, providenciando, ainda, divulgação na imprensa e
lico, tecnologia de confecção ou matéria-prima empregada, pró-labore aos artistas, no caso de demonstração de técni-
são testemunho do viver e fazer das camadas populares. Nela, cas e atendimento ao público.
os artistas expõem seus trabalhos, estipulando livremente o São realizadas entre oito e dez exposições por ano, caben-
preço e explicando as técnicas envolvidas na confecção. Toda do a cada mostra um período de cerca de um mês de duração.
exposição é precedida de pesquisa que situa o artesão em seu A SAP procura também alcançar abrangência nacional,
meio sociocultural, mostrando as relações de sua produção recebendo artistas das várias unidades da Federação. Nes-
com o grupo no qual se insere. se sentido, ciente do importante papel das entidades cul-
Os artistas apresentam temáticas diversas, trabalhando turais estaduais, municipais e particulares, o CNFCP busca
matérias-primas e técnicas distintas. A exposição propicia ao com elas maior integração, partilhando, em cada mostra, as
público não apenas a oportunidade de adquirir objetos, mas, tarefas necessárias a sua realização.
principalmente, a de entrar em contato com realidades muitas Uma comissão de técnicos, responsável pelo projeto,
vezes pouco familiares ou desconhecidas. recebe e seleciona as solicitações encaminhadas à Sala do
Em decorrência dessa divulgação e do contato direto com o Artista Popular, por parte dos artesãos ou instituições inte-
público, criam-se oportunidades de expansão de mercado para ressadas em participar das mostras.
os artistas, com estes participando mais efetivamente do pro-
cesso de valorização e comercialização de sua produção.
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pau, corda, cores e [re]invenções das festas, seja no cotidiano, bem como formas particulares
de lidar com ambiente ao redor adaptando e reaproveitan-
instrumentos e artesanatos do carimbó do materiais. Está presente em diversas regiões do estado
Daniel Reis do Pará, como já havia identificado Vicente e Marena Sal-
les (1969), dividindo-o entre o carimbó praieiro, no Salgado;
Dançarina de carimbó do grupo O Cruzeirinho | Soure, Marajó

“Naquele tempo era no pau e corda; na viola e na lamparina. pastoril, no Soure; e rural, no Baixo Amazonas. Sua vitalida-
Não tinha microfone, não tinha nada.” Esta frase, e variações de atual foi identificada na pesquisa realizada para o inven-
dela, foram ouvidas repetidas vezes ao longo do percurso tário do carimbó como patrimônio cultural, que visitou mais
em busca dos mestres que fazem instrumentos e artesana- de 150 localidades e revela o quanto ele se espalhou pelo es-
tos associados ao carimbó, entre abril e maio de 2019, no tado, das fronteiras com o Amapá até próximo ao Maranhão.
Pará. Referiam-se, num misto de nostalgia e entusiasmo, a
um período considerado “passado”, “de outros tempos”, em
que o carimbó adentrava noite afora ao som de instrumen-
tos acústicos feitos, em grande parte, pelos próprios músi-
cos. Ao mesmo tempo, atualizavam memórias, saberes, ter-
ritorialidades e experiências; falavam de si, dos grupos dos
quais fazem parte e das mediações sensíveis provocadas
entre a dita tradição e a reinvenção permanente.

Manifestação secular, o carimbó pode ser descrito como


uma forma de expressão que envolve múltiplas linguagens
como a dança, o canto, o ritmo, a culinária, a produção ar-
tesanal. Promove redes de sociabilidades seja na produção
Roda de carimbó | Tijupá, Marapanim

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É tradicionalmente associado ao calendário festivo de san- carimbó estilizado, foram incorporados instrumentos elétri-
tos padroeiros, sobretudo aqueles ligados às irmandades ne- cos como a guitarra, o baixo e mesmo elementos eletrônicos.
gras, com destaque para São Benedito. O carimbó também é
realizado na celebração dos mutirões na época do plantio e As letras das músicas são descrições do cotidiano, das vi-
colheita, algo cada vez menos visto. Por outro lado, desde a vências de mestres e compositores que dividem seu tempo
década de 70 conquistou as rádios, clubes e festivais com a entre diversas atividades como a pesca, a agricultura e ou-
difusão do carimbó na indústria cultural. Em seguida, surgi- tros. Referem-se ao mundo do trabalho, memórias do lugar
ram os festivais: inicialmente, com grupos se apresentando e do próprio carimbó, para além de questões sociais e am-
no formato de concurso; depois, transformou-se numa rede bientais. São cronistas poéticos de seu tempo.
de trocas e reciprocidades baseado na ideia das visitas entre
os grupos, visando dissipar as disputas que o modelo de con-
corrência gerava (Pantoja, 2015; Costa, 2015; Salles, 1969).

Seus elementos orquestrais englobam percussão, cordas


e sopros. Caracterizam-se pelo ritmo sincopado, com forte
presença dos graves percussivos, elementos harmônicos
diatônicos e o fraseado arpejado dos sopros. A formação
mais recorrente dos grupos hoje envolve tambor, maraca,
milheiro, banjo e sopro – as flautas, consideradas tradicio-
nais, sendo ainda cada vez mais comum a presença de clari-
nete, saxofone e trompete. Podem ser encontrados também
variações com a inclusão de pandeiros, triângulo, reco-reco,
onça (espécie de cuíca) e o rufo. Com advento do chamado
Instrumentos no Espaço Kuatá de Carimbó | Alter do Chão

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A dança é marcada pelo colorido da indumentária e o uso do Olhares sobre o carimbó
corpo para desenhar movimentos característicos. É realiza-
da tanto em passos miúdos entre giros como numa dança A literatura sobre o carimbó foi escrita por pensadores
de roda, ou, ainda, em coreografias específicas em referên- de áreas distintas – como folcloristas, historiadores,
cia ao ambiente e à fauna. Em Belém e contextos mais turís- cientistas sociais, poetas, jornalistas, entre outros –,
ticos, ganhou contornos mais rápidos, passos mais largos, abordando-o sob diferentes aspectos, mas, sobretudo, a
adaptando-se também para o palco. partir de quatro elementos: 1) sua matriz formadora (ne-
gra, índia e branca – mito das três raças); 2) seu instru-
mental percussivo, muitas vezes tratado como sinônimo
da própria manifestação; 3) a dança; e 4) o diálogo entre
o homem e a natureza (Pantoja, 2015).

Do ponto de vista historiográfico, quatro momentos podem


ser sublinhados: 1) o olhar exotizante e criminalista que
atravessou o século 19 e chegou até a década de 1910;
2) a perspectiva das vanguardas literárias dos anos 20-
30, buscando uma nova percepção de identidade nacional
com viés regional a partir do norte em que o caboclo e suas
manifestações culturais são tomados como ícones deste
projeto; 3) o olhar dos folcloristas nos anos 50-60, que con-
tribuiu para “invenção” do carimbó como expressão musi-
cal folclórica típica amazônica, bem como o discurso sobre
autenticidade e distinção do genuíno carimbó em relação
Carimbó no O Cruzeirinho Carimbó na sede do O Popular
Soure, Marajó Salinas
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No âmbito das políticas públicas de cultura, um novo momen-
to pode ser indicado a partir dos anos 2000. Neste contexto,
é significativo o processo de patrimonialização cuja mobiliza-
ção teve início em 2005, durante a programação do IV Festival
de Carimbó, do município de Santarém Novo, transformada
no ano seguinte na Campanha Carimbó Patrimônio Cultural
Brasileiro Nós Queremos! (Pantoja, 2015; Bogéa, 2014).

O registro como bem imaterial no Livro das Formas de Ex-


pressão ocorreu em 2014. Para os detentores, a sua im-
Ferramentas de Mestre Nelson para fabricação de banjo
portância se deu, sobretudo, pela mobilização que desen-
àquele considerado projeção folclórica voltado ao turismo, cadeou em busca de reconhecimento e cidadania pela via
o risco de desaparecimento em função da urbanização, e do patrimônio. Atualizou, também, os diálogos e tensões
novos meios de comunicação; e, por fim, 4) a repercussão entre o dito carimbó “pau e corda” e suas versões “moder-
midiática dos anos 70, com o ingresso no mercado fono- nas/estilizadas”, apontando que, mais que disputas sobre
gráfico e consequente absorção pelas camadas médias ur- versões autênticas e inautênticas se referem a busca por
banas difundindo o carimbó para outras partes do país. É visibilidade, valorização, e maneiras distintas, porém não
também considerado período em que se acentuam mudan- excludentes, de narrar e fazer carimbó (Pantoja, 2015).
ças estéticas, o que igualmente desencadeou dissonâncias
entre os grupos defensores do “autêntico” carimbó e aque- Sobre o olhar de alguns mestres…
las que buscavam caminhos “modernos” ou “estilizados”;
entre forma de expressão de múltiplas linguagens e o seu Ao longo das conversas realizadas com os mestres que
recorte como música regional (Costa, 2015). produzem instrumentos e artesanatos ligados ao carimbó,

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identificou-se distintos olhares acerca dele, mas, em co- que dê continuidade ao trabalho que desenvolvem. Ato de
mum, o dado de que o percebem como experiência sensível salvaguarda, mas também de reinvindicação por reconhe-
de narrar e vivenciar o mundo. Foi possível conhecer um cimento e cidadania em áreas, não raro, de vulnerabilidade
universo de artesãos que, com recorrência, dominam mui- social entre os jovens.
tas técnicas e linguagens sendo comum encontrar aque-
les que produzem todos os instrumentos percussivos; ou Salinas
percussão e cordas – ou, ainda, especialistas em um único O percurso realizado nesta pesquisa teve início na região
instrumento, buscando sempre aperfeiçoar técnicas e ma- do Salgado. Em Salinas, Mestre Nelson é conhecido por seu
teriais para obter a melhor sonoridade. trabalho ligado à diversas manifestações populares como a
folia de São Benedito, mas principalmente no carimbó à fren-
É comum, neste universo, a menção da habilidade artesanal te do grupo O Popular, que completa 60 anos. Hábil artesão,
como um dom, algo herdado e desenvolvido. Em geral, con- constrói banjo e instrumentos percussivos. Ao narrar sua
tam ter aprendido apenas observando, vendo os pais, tios, história traz à tona a memória de seus mestres, como Pali-
avôs e as rodas que aconteciam em sua localidade. Por vezes, nha e Calixto, e afirma: “O carimbó foi o meu mestre. Quem
eram percebidos por algum mestre que os tomavam como me ensinou tudo foi o carimbó”.
alunos; outras vezes, seguiam movidos pela curiosidade. Al-
guns buscaram também se aperfeiçoar em cursos e oficinas. Mestre Lourival, por sua vez, começou a se interessar pela
Produzem em pequena escala, normalmente sob encomenda, música aos 12 anos de idade, observando os tios que toca-
com preços que variam de acordo com qualidade da matéria- vam flauta em serenatas. Certo dia, perguntou a um deles
prima desejada e detalhes de acabamento, por exemplo. se era difícil aprender e teve como resposta que bastava
dedicação. Aos 17 anos já fazia shows nas imediações que
Em comum, guardam também a preocupação com a trans- morava. Hoje toca saxofone, clarinete e flauta de chave.
missão de seus saberes e a formação de uma nova geração

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Santarém Novo
Santarém Novo é terra do grupo Irmandade do Carimbó de São
Benedito, cuja festa local ocorre de 21 a 31 de dezembro. Sua ca-
racterística é a manutenção de instrumentos feitos “no pau e cor-
da” e a presença de um orquestral composto por curimbó, reco,
maraca, triângulo, rufo e afoxé, em uma festa que os homens só
entram de terno e as mulheres com blusa de manga comprida.

em sentido horário: Waldery Araújo de Souza, Mestre Waldery; Norberto Lá, Mestra Tina é a responsável pelo colorido de boa parte
Teixeira Costa, Mestre Norberto; Lourival Monteiro, Mestre Lourival; Nelson das saias rodadas. “Eu aprendi na marra”, conta ela, sobre
Freitas dos Santos, Mestre Nelson seu início na costura. A avó a matriculou aos 12 anos num
Desde a pré-adolescência Mestre Norberto diz que sempre ateliê para aprender acabamento. Aos 14, começou a fazer
gostou de estar no carimbó, conhecido por meio do pai, um roupa de boneca e, no ano seguinte, seu próprio vestido de
festeiro que tocava viola e adorava dançar. Nesse ambiente debutante. Daí em diante, nunca mais parou. Hoje é a mais
foi crescendo e logo se interessou também por fazer os instru- requisitada costureira de sua localidade.
mentos percussivos, descobrindo, mais tarde, seus próprios
caminhos. Como diz: “você sabe, tudo tem começo, né? ”. Mestre Sabá, por sua vez, percebeu o dom através de so-
nhos. Costumava dormir em sua oficina após o almoço e
Já mestre Waldery se aproximou do carimbó em função de sua foi assim que começou a sonhar com tudo o que devia fa-
esposa, dançarina do grupo O Popular, e logo seguiu seus passos. zer. No início foi o artesanato em madeira sobre o que via
Como artesão, trabalha com conchas e buriti. No seu repertório e buscava no mangue: o caranguejo, o siri. Até que um dia
estão as miniaturas das personagens que compõe a roda do ca- sonhou fazer um tambor. E foi assim que deu início em sua
rimbó – muitas delas, miniaturas dos próprios colegas de grupo. trajetória na confecção de todos os instrumentos percussi-

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vos do carimbó. Como diz: “A realidade é esta: você perce- fundadores do grupo Brasileirinho. Na altura estava sem ban-
ber que tem um dom e partir para cima!”. jo e conseguiu um que precisava ser reformado. Logo perce-
beu o tino para fabricar seus próprios instrumentos. Além do
banjo, viola e cavaquinho, confecciona todos os outros ins-
trumentos percussivos do carimbó. Sobre o fazer artesanal,
diz: “O espinho quando nasce já traz a ponta”. E acrescenta:
“Tem gente que precisa de professor. Mas tem gente que já
vem com muita ideia na cabeça”.

Por outro lado, para Mestre Manoel “o músico vive de


aventura”, referindo-se às experiências desencadeadas
pelo carimbó enquanto produzia um tambor. Não basta to-
car. Há que viver o carimbó e, com ele, ver e viver o mundo
Maria Cristina Oliveira dos Santos, Sebastião Almeida da Silva, como também registrou em uma de suas composições:
Mestra Tina Mestre Sabá

Marapanim
Seguindo para Marapanim logo se vê na entrada da cidade a
estátua de Mestre Lucindo, reverenciado por sua contribui-
ção ao carimbó. Lá, o trajeto começou numa conversa com
Mestre Caranguejo. Hoje com 82 anos de idade, dedicou 69
deles ao carimbó, como registrou em uma de suas composi-
ções: “Quando eu tinha 12 anos, já tocava por aí. Agora, tô
com 80 e ainda não me arrependi”. Em 1960, ele foi um dos

Juracy Gonçalves Freire, Mestre Caranguejo


e Manoel Agnaldo Farias Pinto, Mestre Manoel
que conheceu “Pula-Pula”, flautista que, percebendo o seu
interesse, decidiu ensiná-lo a tocar. No início, inspirava-se
em Mestre Geraldinho, do grupo Os Canarinhos, chegando a
ser confundido com ele algumas vezes. Aos poucos, foi de-
senvolvendo seu próprio estilo de tocar e fazer suas flautas.

“A música não é nada mais que a sensibilidade da alma”,


conta Reginaldo, o Mestre Neves do Banjo, como é conhe-
cido, sobre o amor pela música que vem desde berço. No
Marinho Ferreira das Neves, Reginaldo Neves Vieira, carimbó começou como maraqueiro no grupo Uirapuru,
Mestre Marinho Mestre Neves do Banjo
ocupando o posto de banjista de vários grupos na região.
“Eu fui de Marapanim para o Rio de Janeiro/ Eu fui fazer Começou a construir instrumentos quando aconteceu uma
maraca e também o meu milheiro/ Fui fazer milheiro fui oficina em Marapanim promovida pelo Instituto de Artes do
fazer milheiro/ Tão dizendo pra mim que com meu milhei- Pará, em 2010. Para ele: “Confeccionar um instrumento é
ro não ganho dinheiro/ Não quero dinheiro, não quero di- dedicação, atenção e vocação”.
nheiro/ Só quero meu carimbó tocado no mundo inteiro”.
Esta dedicação e vocação Emelentino Ferreira da Silva, conhe-
Essa percepção é partilhada também por Mestre Marinho. cido como Mestre Meleco, descobriu aos 25 anos de idade, já
Como afirma, foi por meio da flauta e do carimbó que co- pai de família, quando começou a fazer e tocar flauta enquan-
nheceu o mundo e foi a lugares que jamais imaginaria es- to descansava no roçado. Tímido, diz que tocava escondido.
tar. Sua participação no carimbó também começou cedo, aos Um dia ouviram e lhe convidaram para um grupo de carimbó.
12 anos de idade acompanhando os tios. Sempre que tinha Inicialmente relutante, decidiu aceitar o convite e nunca mais
oportunidade ficava mexendo nos instrumentos e foi assim parou. Desde então, já gravou CDs e fez shows por toda parte.

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Mestre Sandoval toca e confecciona de tudo no carimbó.
Sandico, como é conhecido, começou no carimbó aos dez
anos ajudando o avô a trocar as cordas da viola. Hoje é um
dos poucos que confecciona a onça, espécie de cuíca, cada
vez mais rara de se ver nos grupos de carimbó - mas que,
para ele, tem uma presença sonora fundamental.

A última conversa em Marapanim foi com Mestre Kaito.


Pintor profissional de formação, começou a fazer artesana-
to aos 32 anos como forma de obter uma renda extra e foi
se envolvendo cada vez mais com a cena cultural local. Foi
assim que acabou por se interessar pelo banjo e aprender a
Emelentino Ferreira da Silva, Elias Barata Modesto,
Mestre Meleco Mestre Elias confeccioná-lo de forma cada vez mais refinada.
Sandoval Soares,
Mestre Elias, por sua vez, acompanha o carimbó e outras Mestre Sandoval
festas populares desde adolescência com o avô. Quando se
instalou em Itajubá, no entanto, um evento lhe despertou a
atenção: uma homenagem a Seu Digóia, mestre do xeque-
xeque. A importância dada a valorização daquela memória
lhe motivou a criar um grupo de carimbó e um projeto voltado
para as crianças que, desde 2009, vem difundindo o carimbó.
Além disso, se dedica ao estudo do banjo, à fabricação de
instrumentos percussivos e ao fazer de suas composições.
Oscarino de Carvalho
Lima Neto,
Mestre Kaito
Marajó No Soure, Mestra Adriana confecciona arranjos de cabeça.
Ao chegar no Marajó foi possível acompanhar Mestres Envolvida com a dança e o carimbó desde a infância, desen-
Mico, Elieser e Neno, que integram o grupo O Cruzeirinho, volveu também o gosto pelo artesanato a partir do trabalho
encourando um carimbó com um couro de cobra, peça hoje feito pela mãe, somado ao encanto pelas cores do carimbó.
rara, e que estava há muito tempo guardada. Narraram, ao
longo do processo, a especificidade do uso deste material Já no quintal de Mestre Diquinho, ele lembrou um carimbó e
com seu timbre mais agudo e que não desafinava ao longo outras festas populares vividas desde a infância. Mais rústi-
do tempo, atualizando memórias sobre o carimbó do Mara- cas e, em sua opinião, mais bonitas. Ao longo da conversa re-
jó, suas mudanças e o cenário atual. memorou o dia em que viu uma pessoa fazendo um boi para
o bumbá e pensou: “Vou fazer um!”. Considera este evento o
despertar de um dom desenvolvido na produção dos instru-
mentos percussivos do carimbó e suas composições.

Raimundo Francisco Barroso Ribeiro (Neno), Elieser Carlos Serafim Nonato Adraiana Barbosa Costa, Raimundo Miranda Amaral,
Brandão e Sr. Jamie, Mestre Mico, encourando tambor com couro de cobra Mestra Adriana Mestre Diquinho
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mina a gente”. Professora por mais de 40 anos, formada em
pedagogia, sempre incluiu o carimbó nas escolas em que
trabalhou como parte das atividades da educação infantil.
Mestra Edicinamar de Nazará
da Rocha e Silva e sua mãe
Nilma da Rocha e Silva A transmissão de mãe para filha também é parte da história
Antônia
de Mestra Edicinamar, conhecida como a “Baixinha das va-
Cantuario retas”, que aprendeu o bordado marajoara aos 7 anos com
Souza, a mãe, Nilma. Trata-se de um artesanato que hoje envolve
Mestra Santa
toda a família, sendo fonte de seu sustento. É feito com faca,
gilete e estilete, desenhando os grafismos marajoaras nas
varas de taquari, que, segundo a tradição local, afastam más
Maria Miriam
Faria Lobato, energias e trazem bons fluidos. Estes padrões são aplicados
Mestra Meire também nas maracas produzidas por elas em coco e cuia.
As duas principais costureiras do carimbó no Marajó guar-
dam em comum nunca terem dançado em nenhum grupo. Partindo para Salvaterra, Mestre Agnaldo, desde a adolescên-
Apenas o acompanham pelos bastidores fazendo a sua in- cia envolvido com a percussão do carimbó, decidiu se aventu-
dumentária. Mestra Santa, nascida numa família de costu- rar na lutheria há cinco anos. O que lhe motivou foi ter visto
reiras, começou aos 15 anos e hoje conta 61 costurando, Mestre Moacir, único de sua cidade que naquele momento
sendo 32 deles, roupas de carimbó. Já Mestra Meire tam- construía os instrumentos, ficar impossibilitado de continuar
bém tinha a mãe costureira e sempre que ela saía de casa sua jornada após um problema de saúde. Decidiu então dar
ia “brincar” com seu material, até o dia em que ela resolveu continuidade àquele trabalho. Agnaldo é um entusiasta na
lhe ensinar. Hoje, diz, já fez de tudo, de roupa de boneca a busca por novas técnicas e descobertas para fazer instrumen-
vestido de noiva. Para ela: “Carimbó é uma coisa que conta- tos melhores e mais acessíveis, produzindo percussão e banjo.

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José Ronaldo Gudes Santos,
Mestre Ronaldo
Belém e Região metropolina
Ao começar a pesquisa em Belém e região metropolitana
descortinam-se outros cenários e narrativas. Mestre Lucas
de Bragança, um dos fundadores do grupo Sancari, por exem-
plo, é categórico ao afirmar: “A minha paixão é tocar maraca.
Parece que invade a minha alma”. Embora saiba fazer e tocar
os demais instrumentos do carimbó, seu amor pela maraca
é tal que plantou sua própria cuieira no quintal de casa para
selecionar as melhores cuias para fazer o instrumento.

Em Icoaraci, Mestre Ray já tocava barrica nas brincadeiras


Agnaldo Vasconcelos
Magalhães, de boi desde os 12 anos de idade. Em 2000, criou o espaço
Mestre Agnaldo Coisas de Negro, onde organiza as rodas semanais de ca-
rimbó, com intuito de criar um circuito de trocas entre gru-
De volta ao Soure, o percurso no Marajó se encerrou numa con- pos. Foi nesta altura que se interessou pela lutheria. Sem-
versa com Mestre Ronaldo, para quem o carimbó e a herança pre observador e curioso, tentou aplicar aquilo que ficou em
cultural do marajó são ferramentas de ação política e cidadã. sua memória, herdado das vivências com outros mestres.
Percebendo que cada mestre que partia levava consigo um
mundo de saberes, associado a um contexto de vulnerabilida-
de social entre jovens, constatou a importância de fazer algo.
Foi assim que criou um ateliê colaborativo e uma associação
cultural para desenvolver ações na área na região do Pacoval,
como oficinas de dança e produção de instrumentos.

Lucas Pacheco Bragança, Mestre Lucas


e Raimundo Piedade da Silva, Mestre Ray 19
Em 2010 participou de uma oficina de lutheria no Corro Ve- sabe fazer instrumento, que toque; se não toca, que dance; se
lho, onde teve oportunidade de aperfeiçoar suas técnicas e não dança, que escreva, pense ou simplesmente aplauda.
refinar seus banjos, violões e outros instrumentos de corda.
Mestre Tomas Cruz é um narrador nato. Recorda com deta-
Já Mestre Lourival Igarapé é músico e fabrica instrumentos lhes a história do carimbó em Icoaraci desde os anos 50, dan-
percussivos do carimbó há trinta anos. Revela, ao longo de do continuidade ao trabalho do pai, Zito Nunes, precursor na
todo esse tempo, seu desejo pelo reconhecimento e valori- região. Como diz: “Eu entrei no carimbó, ele entrou em mim,
zação do carimbó, como declama em uma de suas composi- e eu tenho um amor pelo carimbó que só vai acabar quando
ções: “Eu vim no som do tambor no primeiro vento que pas- eu morrer”. Esse amor é transmitido nas rodas que realiza e
sou/quero chegar de madrugada, na alvorada e te dar bom na fabricação de seus instrumentos de percussão e cordas.
dia/ eu já sabia que ela ia aparecer antes do sol nascer e a lua
se esconder/ os caranguejos fazem a festa no mangal/ e a Mestre Alexandre também começou ainda criança nas brincadei-
cultura de um povo se transforma em festival/ mas uma dose ras de boi, cordões de pássaro e o carimbó, acompanhando o pai
moderada não faz mal/ o carimbó é patrimônio cultural”. e o avô. De suas memórias, recorda um carimbó de curimbó, pan-
deiro e violão. Não havia banjo e nem flauta. No tempo do avô, ele
“Não sei se eu comecei na percussão ou se a percussão co- pegava uma lata grande, cortava o fundo e colocava couro de ca-
meçou em mim”, brinca Mestre Ney Lima. Envolvido com a maleão ou iguana para bater. Hoje, experimenta soluções alterna-
percussão desde a infância no terreiro frequentado pela mãe, tivas aos seus curimbós como o uso de náilon e peles sintéticas.
o interesse em produzir os instrumentos veio ao perceber a ne-
cessidade de atender os grupos e também aprender a ensinar. Já Mestre Cazuza começou a participar do carimbó, de fato,
Daí começou a fazer “da sua própria cabeça” carimbó, banjo, aos 50 anos de idade. Mas afirma que nesse momento trouxe
maraca. Para ele, qualquer pessoa pode e deve potencializar o consigo a bagagem da vida. Com a mãe, aprendeu a manipu-
mundo contribuindo de alguma forma. No carimbó, diz, se não lar o barro e a fazer a louça; com o pai, o roçado e a pesca.

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da esquerda para direita: Lourival Monteiro Barros, Mestre Lourival Igarapé; Manoel Alexandre Costa da Silva,
Mestre Alexandre; Waldiney Lima da Silva, Mestre Ney Lima (alto); Thomaz Barbosa da Cruz, Mestre Thomaz
(baixo); José Maria de Freitas Cordeiro, Mestre Cazuza; Acidenor Garcia, Mestre Laranjeira

Depois aprendeu a marcenaria e outras habilidades que apro- Santarém


veitou mais tarde para fazer suas maracas e seus tambores. A jornada em Santarém teve início com uma longa conver-
sa com Mestre Leopardo. Capoeirista há mais de duas dé-
O trajeto na região metropolitana se encerrou ouvindo Mestre cadas e ogan, narra ter recebido o pedido de uma entidade
Laranjeira e seus banjos. Contou que tinha um amigo em Mara- para que fizesse tambores de curimbó. Foi para o mato,
panim que estava no auge da carreira com uma série de shows encontrou um camaruzeiro e dele fez sete tambores. Já
e gravando discos no final dos anos 90. Após a morte do ban- tinha expertise com os instrumentos da capoeira, mas
jista de seu grupo, procuraram-lhe convidando para fazer um nunca havia feito um curimbó. Desde então, já perdeu a
teste para assumir o posto. Aprovado, a parceria permaneceu conta de quantos produziu entre encomendas e o trabalho
por um bom tempo. Seu desejo, no entanto, era criar seu pró- desenvolvido em oficinas de difusão do carimbó com o
prio grupo reunindo seus filhos, algo que nunca se concretizou, grupo Banzeiro, do qual é fundador.
exceto nas rodas domésticas nos fins de semana.

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Nas trocas com Mestre Leopardo, Mestre Calango se deu
conta de que ninguém no grupo fazia o banjo, assumindo
então essa missão. Movido pela incessante curiosidade e
busca pela perfeição, deu início a uma longa pesquisa sobre
o instrumento na internet e com pessoas mais velhas que o
tocavam. Apesar de já contar com uma expertise na produ-
ção artesanal, dado sua profissão como escultor em madeira,
afirma: “O banjo tem pequenos detalhes que a gente tem que
ter sensibilidade”. Como no início não sabia tocar, mostrava em sentido horário: Cláudio Ferreira de Souza, Mestre Leopardo; Roberto
para as pessoas ansioso por ouvir as críticas e sugestões. Costa Oliveira, Mestre Calango; Adan Max Pereira Cardoso da Silva, Mestre
Curupira; Hermes Caldeira Rego, Mestre Hermes

Já Mestre Hermes é palhaço de formação. No circo sentia falta Os curimbós e maracas aprendeu a fazer por curiosidade e
de inserir temas da região e começou pelo próprio nome: Pa- também necessidade de manutenção de seus instrumentos.
lhaço Tucupi. A presença da música era constante com os en-
saios do grupo Espanta Cão na casa de sua avó. O avô lhe deu A pesquisa encerrou-se em Alter do Chão com Mestre Curupira,
as primeiras lições com o clarinete e depois o saxofone. Mais Adan Max, que começou a viajar o país fazendo artesanato em
tarde, frequentou oficinas de tambor. Quando a família decidiu 2006. Numa roda em São Luís, pediram para que tocasse algo
abrir um espaço cultural, o músico Chico Malta foi convida- de sua terra. Criado em São Paulo, percebeu que pouco sabia
do para o show inaugural e, na ocasião, convidou Hermes ao de suas raízes no Pará. Foi quando decidiu voltar e descobrir a
palco. Foi, formalmente, sua primeira apresentação pública. cultura paraense. Numa oficina de percussão no Pacoval, Ma-
Mais tarde estavam tocando na praça quando uma equipe de rajó, aprendeu ritmos e a fazer instrumentos; com um amigo
filmagem que produzia um filme na cidade os convidou para músico, a desvendar os caminhos do banjo. Hoje, desenvolve
gravar uma cena – acabaram, assim, formalizando um grupo. um projeto que busca fomentar o carimbó em Alter do Chão.

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Os instrumentos em toras, entre 1,00 e 1,20 m, em média, utilizam machado
ou uma motosserra. Siriúba, ipezeiro, corticeira, abacateiro e
Curimbó faveira são as madeiras mais utilizadas – considerando va-
Curimbó, corimbó, carimbó, atabaque, tambor, eis alguns dos riáveis geográficas e a disponibilidade de encontrá-las, bem
nomes atribuídos ao instrumento muitas vezes descrito como como o som, a durabilidade e o peso das mesmas.
sinônimo da manifestação cultural como um todo (Cascudo,
2002; Miranda, 1968). Será considerado aqui o primeiro, curim- O curimbó é escavado com uma coiva, ou ferro de ponta,
bó, por ter sido o mais escutado ao longo da pesquisa. Trata-se até se tornar um cilindro com aro de aproximadamente 2 a
de um tambor escavado em um tronco de tamanhos variáveis 3 cm de largura. A madeira também é tratada por fora lim-
e encourado em uma das aberturas. É tocado na horizontal, pando e acertando as suas irregularidades. Alguns mestres,
apoiado sobre um suporte, por vezes independente e por vezes como Agnaldo, no Marajó, vêm fazendo o carimbó também
já fixado ao próprio instrumento. Sobre ele, o tocador se senta em tubo de PVC. Este material oferece a praticidade de não
e bate com as mãos. Há também casos em que usam a baque- precisar escavar, ser relativamente fácil de conseguir e ser
ta nas laterais, como em Alter do Chão, com Mestre Leopar- resistente. Mestre Cazuza, por sua vez, vem testando um
do. O carimbó é afinado e tocado de diferentes formas pelos novo formato, que chama cachimbó, parecido com um ca-
grupos, cada qual buscando um acento ou timbre específico. chimbo em que a boca do tambor fica inclinada para cima.
É comum utilizarem dois ou três em que o mais grave marca Segundo ele, isso melhora a postura para tocar e é uma ho-
o ritmo e um ou dois são usados para “repicar” ou “repinicar”. menagem a sua mãe e a sua avó que firmavam o cachimbó.

A confecção do instrumento é um processo moroso e duro, No “tempo do pau e corda” ou no dito “tambor de antigamen-
relata Mestre Norberto. Nas palavras de Mestre Caranguejo: te”, havia o couro preso à madeira por meio de torniquetes
“Madeira pra carimbó é pau furado”. No mangal ou mata aden- amarrados em cordas, algo visto ainda em Santarém Novo.
tro, procuram sempre uma árvore já oca, “morta”. Para cortá-la Era comum ao longo da apresentação o instrumento desafinar

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e ter que ser aquecido no fogo. Hoje, usam tarraxas metálicas. O acabamento é feito de diferentes formas: alguns preferem dei-
Mestre Manoel destaca que esse processo trouxe praticidade, xar na própria madeira; outros, usam verniz. É comum uso da
possibilitando afiná-lo com a chave sem precisar parar a festa. pintura de acordo com as cores do grupo ou do santo de devo-
ção ou, ainda, o uso de adesivo, como Mestre Agnaldo, em Soure.
As ferragens do carimbó – que incluem os aros para prender o O carimbó também é usado como forma de identificar o grupo,
couro e as cantoneiras para fixar as tarraxas de afinação – cos- sendo muitas vezes pintado, no couro, o nome ou algum logo.
tumam ser encomendadas aos ferreiros. Os ganchos são feitos
de parafuso de cama com a ponta entortada. Há, no entanto, os
que fazem suas próprias ferragens, caso de Agnaldo, no Soure.

O couro mais usado atualmente é o de boi ou baby búfalo


na região do Marajó. Recordam que antes era o de caça ou
o de cobra. Hoje o couro é comprado em açougues. Mestre
Leopardo prefere o de boi para os mais graves e o de no-
vilho nos mais agudos. O tratamento envolve deixá-lo de
molho de dois a três dias na água, por vezes adicionada
de cal, para retirada do pelo. Recomenda-se voltar com o
couro para o molho por mais algum tempo para amolecer.
Na encouragem é colocado um aro por dentro e um por fora,
encaixando-o na madeira. Alguns mestres costuram o cou-
ro no aro interno com náilon, utilizando uma agulha feita de
ferro de sombrinha. Em seguida, deixam secar na sombra.

em sentido horário: Victor limpando a madeira; Mestre Sabá escavando um


curimbó; curimbó com couro de cobra no Marajó; Mestre Manoel encourando
Maracas
As maracas, responsáveis pelos agudos, ajudam a conduzir o
dançarino. Segundo Mestre Lourival de Igarassu, uma mara-
ca fora do ritmo acaba com um carimbó. Elas são pensadas
sempre aos pares: uma grave – maior – e outra mais aguda –
menor. São comumente feitas de cuias ou coco. A diferença
entre uma e outra se deve à disponibilidade do material ou à
preferência pelo peso e timbre. As feitas com cuia são mais
leves e com som mais “brilhante”. As de coco, mais pesa-
das e com som mais “aveludado”. Alguns mestres plantam a
cuieira em sua própria casa para, assim, escolherem as que
podem oferecer melhor qualidade sonora.
em sentido horário: maracas de Mestre Norberto; de Mestra Edicinamar, feitas em
Para fazer a maraca abre-se um furo para limpar por dentro a cuia coco e cuia; de Mestre Lourival de Igarapé; Mestre Agnaldo fazendo acabamento
ou coco, normalmente com uma faca ou gancho metálico. Mestre
Elias diz que a deixa na água e ela já sai praticamente limpa. Dei- O cabo normalmente é feito de cupiúba, breu branco ou
xam, então, secar. Com as mãos ou auxílio de um funil, colocam madeira reutilizada, como cabos de vassouras. Seu acaba-
sementes, pregos ou esferas metálicas de bicicleta. Alguns prefe- mento é feito somente com o alisamento e verniz na ma-
rem as primeiras pela sonoridade mais rústica; outros, a segunda deira, ornamentações, como Mestre Agnaldo, ou colocando
por projetar mais som. A quantidade é definida pela sensibilidade, com punho de bicicleta, com Mestre Lucas para ficar mais
testando aos poucos; ou a partir de um número pré-estabelecido. confortável de segurar. Para vedar a maraca, alguns fazem
Mestre Elias, por exemplo, coloca 500 esferas; Mestre Lucas, 250, um furo em cima da cuia e fecham com um parafuso que
Mestre Lourival de Igarapé, três “mãos” de semente. se prende ao cabo. Outros, passam arame ou fio de náilon

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Milheiros
É recorrente a memória dos mestres dos “milheiros de an-
tigamente” feitos com latas de leite em pó e com caroço de
milho dentro. Hoje, são produzidos com placas de zinco en-
roladas. Há algumas variações, como a adotada por Mestre
Elias, que usa tubo cilíndrico de metal recolhido em obras e
mesmo frascos de aerossol depois de lixados e higienizados.
Dentro são colocadas sementes ou esferas de metal. Depois,
é vedado com uma tampa de madeira cortada na faca que,
além de encaixada, é pregada e vedada com resina epóxi.

Maracas de Mestre Cazuza e Mestre Sabá


colocando sementes em uma maraca

e finalizam com uma massa feita com serragem e cola de


madeira branca. Mestre Curupira usa um pino para que fa-
cilite desmontar a maraca caso se queira trocar o timbre
das esferas dentro dela. Para finalizar, pintam com tinta es-
malte ou spray, as mais usadas, ou, somente envernizam. É
comum encontrar cores e/ou desenhos que remetem a São
Benedito, à fauna local, à cultura marajoara e aos padrões
gráficos como os das cuias de Santarém.
Mestre Manoel fazendo milheiro

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Flauta
Uma das questões identificadas no processo de patrimoniali-
zação do carimbó foi a necessidade de valorização da lutheria
e de seus instrumentos. Mais urgente, nesse cenário, eram
as flautas. Cada vez mais substituídas pelas industrializadas
e outros instrumentos de sopro, são poucos os que ainda a Mestre Lourival
fazem. Soma-se, ainda, o baixo número de pessoas que se de- mostrando processo
de medição da flauta
dicam ao instrumento no carimbó, sendo recorrente entre os
grupos ter de lançar mão de músicos profissionais para tocar. construída por ele ou seus pais. A flauta do carimbó mais
comum é a de seis furos, mas há variações. Mestre Marinho,
O Iphan, em parceria com Instituto de Artes do Pará, desenvolveu por exemplo, tem feito algumas com sete, para ter mais re-
em 2010 uma ação de salvaguarda chamada “Sopro do Carimbó cursos, diz. As distâncias variam de acordo com as “fôrmas”
– a musicalidade da Flauta Artesanal”, na região do Salgado. En- de cada mestre. A furação é feita por meio de um metal aque-
volveu a pesquisa e registro dos mestres, o encontro entre eles e cido ou com furadeira. O arremate, por fim, com faca.
os aprendizes e laboratório para confecção da flauta.
O timbre varia também de acordo com o diâmetro da madei-
A considerada flauta tradicional do carimbó tem um timbre ra. Quanto mais largo, mais grave. Assim, a afinação é relati-
peculiar, “aveludado”, gerado pelas características da madei- va e não corresponde necessariamente à métrica formal dos
ra em que é feita, a embaúba. A fabricação de uma flauta co- instrumentos industrializados. O ponto, diz Mestre Lourival,
meça com a limpeza do galho: por dentro, com uma vara; por é “como, a partir de um pau oco, acertar a tonalidade que
fora, com uma faca. Mede-se, então, os pontos de furação. É dê certo com os outros instrumentos. (...) Porque nós faze-
muito comum os artesãos terem começado com uma medida mos instrumento artesanal e nós temos que dar conta dele,
a partir da flauta de seus mestres ou, aquela que lhe fora conferir no tom de voz de cada uma pessoa que vai cantar”.

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O bambu também pode ser usado como matéria-prima para O acabamento pode ser verniz ou pintura – neste caso, tin-
construção da flauta. O timbre produzido é parecido com ta spray. Buscando melhor portabilidade do instrumento,
o da madeira, porém ligeiramente mais “aveludado”. No alguns mestres como Marinho, Meleco e Sandoval come-
entanto, os mestres apontam a dificuldade em furá-lo em çaram a fazer as flautas em duas partes que se encaixam.
função dos “nós”. Mais recente é o uso do PVC – material Marinho opta por aquecer o PVC e alargá-lo para unir as
leve, acessível, resistente, de fácil manuseio e que produz partes. Já Meleco prefere o uso de emendas. No caso do
também boa sonoridade, com características mais suaves. alumínio, é usado uma emenda.
Demanda uma etapa a menos no tratamento da matéria-
prima e oferece uma unidade de espessura, visto que é pa-
dronizado de fábrica. Normalmente são utilizados os de 20”
e 25”. O alumínio também é bastante comum. Oferece um
timbre mais “brilhante” e, comparado ao PVC, é um pouco
mais difícil de ser encontrado em algumas localidades, com
custo um pouco mais alto e mais duro de furar.

A afinação do instrumento é feita por meio de uma ma- Flauta fechada com tampa
de garrafa pet de Mestre
deira encaixada na parte superior, a “tampa” da flauta. É Sandoval e Mestre Marinho
comum o uso do buriti ou cabo vassoura. Mestre Sandoval furando uma flauta
o faz com uma tampa de garrafa PET. Para achar a afina-
ção, enfia-se a madeira até encontrar o ponto considerado
adequado. Como diz Mestre Lourival, é um processo em
que “tem que pensar com a madeira”.

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Banjos de Mestre Calango

Os mestres hoje em dia tocam também a flauta de chave por


facilitar uma padronização na afinação dos instrumentos e
oferecer mais recursos de execução. No entanto, há uma re-
lação de afeto e confiança que perdura em relação ao instru-
mento artesanal. Foram unanimes ao relatar que a flauta de
chave pode falhar – soltar algum parafuso, por exemplo. Já
a artesanal, como dizem, “nunca dá problema”.

Banjo
A presença do banjo no carimbó é documentada desde, pelo
menos, o início do século 20. Na exposição de longa dura- pouco vista. A migração para o banjo, disseram, se deve à
ção do Museu de Folclore Edison Carneiro, do CNFCP, há, por maior amplitude sonora e à versatilidade que oferece em
exemplo, um instrumento oriundo de Marapanim que, segun- matéria de construção. De fato, na mão dos mestres, tudo
do informações de coleta, data da década de 1920. Feito com pode ser utilizado para se fazer um banjo. Panelas, tubos
tampo em couro e cordas de aço, pouco visto nos dias atu- de PVC, copos de alumínio, chapas de raio-x, madeiras de
ais, o instrumento passou por vários grupos, sendo o último móveis velhos, partes de instrumentos quebrados e capa-
o Paramaú, documentado pela pesquisadora Maria Brígido, cetes de moto são alguns dos itens encontrados.
membra da Comissão Paraense de Folclore nos anos 70.
No carimbó, o banjo atualmente cumpre função harmônica e
Os mestres contatados nesta pesquisa afirmam, contudo, percussiva. É tocado seja com um estilo de palheta parecido a
que o banjo se tornou o instrumento harmônico predomi- um rasqueado, seja marcando o tempo – neste caso, batendo a
nante no carimbó a partir dos anos 60-70. Antes, recordam palheta com mais força nas cordas. O instrumento, com quatro
que o instrumento dividia espaço com a viola, hoje em dia cordas, pode ter diversos tamanhos e número de casas no bra-

29
ço, variando de 10 a 19. A afinação mais frequente é em quin-
tas, mas há muitas variações1. A afinação do banjo varia so-
em sentido horário: Banjo com
bretudo quando vão acompanhar uma flauta artesanal. Nestes lateral feita em pvc e adesivado
casos, os banjistas “conferem” as notas pela altura das flautas. com motivos marajoaras de Mestre
Agnaldo; detalhe da lateral de um
banjo de mestre Ray; banjo feito com
As cordas utilizadas hoje são de náilon de pesca, recorren- panela de Mestre Calango; banjo em
temente com espessura única. As mais comuns 0.60 e 0.70 construção por Mestre Kaito
mm. Há também os que preferem usar mais grossas, como
Mestre Ray, 0.80; ou com espessuras distintas como Mes-
tre Agnaldo, no Soure. Há, ainda, os que usam cordas de
violão, como Mestre Ney Lima, por exemplo2.

A lateral do corpo do instrumento é recorrentemente feita


de materiais reutilizados. São comuns a panela de pressão; proveitar partes dele. O PVC, do mesmo modo, é resultado
o aro de pandeiro de 8” ou 10”, de tamborim, forma de pizza, de reutilização seguindo o mesmo processo das panelas de
capacete de moto, chapa de alumínio de assoalho de ôni- corte e acabamento. Mestre Ray também constrói a lateral
bus e o PVC. No caso das panelas, podem oferecer até três com madeira usando, geralmente, o mogno.
aros de banjos, a depender de sua altura. Marcam as medi-
das com a caneta e cortam com a serra ou maquita, fazen- O tampo do banjo atualmente é feito de material majoritaria-
do acabamento com uma lixa nas bordas. Formas e chapas mente sintético. Mestre Diquinho, no Soure, recorda, no entan-
metálicas são cortadas e adaptadas ao tamanho pretendido to, o banjo de Mestre Cariri, feito de couro de camaleão e cujo
do banjo. No caso dos aros de pandeiro, são instrumentos timbre era inigualável. Em geral, os mestres hoje utilizam a pele
já usados ou, às vezes, comprados para desmontá-lo e rea- porosa ou leitosa de pandeiro ou qualquer plástico rígido que

30
acabamento estético, opção de Mestre Marinho. É cortada res-
peitando as dimensões do aro com espaço para as presilhas.

Para fixar o tampo, o aro e o fundo, são utilizados diversos tipos de


tarraxas – ou garras de afinação. Podem ser feitas com parafusos,
Banjo com couro de camaleão de Mestre
Cariri. Atualmente ele é parte da decoração do
raios de bicicletas, motos ou podem ser reaproveitadas daquelas
restaurante Solar do Bola | Soure, Marajó que vem nos próprios pandeiros. São fixadas na madeira do fundo
do instrumento prendendo ao aro. O tampo é fixado por encaixe.
Banjo pertencente
ao acervo do
A construção do braço é o maior desafio para os artesãos.
MFEC/CNFCP
Às vezes, reaproveitam o de algum outro instrumento adap-
ofereça ressonância para o instrumento, como ensina Mestre tando-o ao banjo. Quando não, cada mestre tem seu próprio
Nelson. Mestre Kaito, por sua vez, vem se aperfeiçoando no método. Em geral, opta-se por madeiras leves e com alguma
uso das chapas de raio-x que consegue em clínicas, laborató- flexibilidade. É talhada no serrote, faca, formão e o acaba-
rios e hospitais. Após serem lavadas e retirada a imagem im- mento é feito com lixas. O diâmetro do braço varia bastan-
pressa, proporciona uma estética interessante ao instrumento te, sendo comum entre 30 e 40 cm. Pode ser feito com uma
e uma projeção sonora maior do que o náilon de pandeiro. única peça de madeira ou até três, como o fazem os Mestres
Ray, Kaito e Calango. Neste caso, a primeira régua serve de
O fundo do instrumento é de madeira. Mestre Nelson prefere o base; a segunda, mais extensa e mais rígida, para segurar a
marupá, cedro, louro e jaqueira. Na falta delas reutiliza-se uma tensão do braço; e a terceira, para escala de trastes.
tábua de cortar peixe, algum pedaço de móvel ou mala anti-
gos, ou alguma que esteja à disposição, como diz Mestre Ca- Sobre a escala e afinação do banjo, alguns trabalham a par-
ranguejo. A fórmica também é utilizada por oferecer um bom tir do ouvido, caso de Mestre Marinho e Neves. Marca-se

31
Banjo em construção por Mestre Nelson Assinatura de Mestre Calango no tampo de um de seus banjos

casa a casa sentindo as variações sonoras do instrumento. Além dessas partes, o cordal para prender as cordas pode ser
Outros, como Mestre Caranguejo, utilizam uma régua de feito com pedaço de um copo de alumínio, de uma panela ou
afinação com medidas prévias retiradas a partir de um ou- de outro artefato metálico. Ainda, pode ser feito em madeira,
tro instrumento. Mestres Ray, Kaito e Calango, por sua vez, sobra do corte da régua do braço do instrumento. Normal-
vem utilizando uma fórmula matemática. mente são furados com furadeira para fixação das cordas e
parafusados ou colados ao corpo do instrumento.
O traste pode ser reaproveitado de outro instrumento, fei-
to de fio de cobre, fio de alumínio ou PVC, por exemplo. O cavalete para as cordas também pode ser feito destes mes-
Depende da disponibilidade de recurso. A marcação das mos materiais. Mestre Ray e Ney Lima preferem osso de boi
casas no braço pode ser feita de parafuso aproveitando por considerarem que captam o som de forma mais fiel. Al-
para unir a régua na madeira de sustentação ou de cabeça guns colam no náilon do pandeiro; outros, o deixam solto pois
de raio de bicicleta achatado e, posteriormente, lixado. a afinação depende também da posição do cavalete no tampo.

32
tre Nelson que usa o “choro de boneca” – dispositivo que vem
acoplado nas costas das bonecas que “falam”. Mestre Calango
produz seus próprios captadores a partir de falantes de celular
ou qualquer eletrônico que encontre disponível para reutilizar.

Há ainda invenções como a banjola de Mestre Caranguejo,


um híbrido de banjo e viola. Redondo e com quatro cordas
como o banjo e todo em madeira, como a viola.

Mestre Marinho falando como constrói seus banjos Por fim, nota-se a preocupação crescente com a assinatura
As tarraxas podem ser feitas manualmente em madeira dos instrumentos como visto nos banjos dos Mestres Calan-
dura ou reaproveita-se a de outros instrumentos como ca- go, Ray e Kaito, por exemplo.
vaquinho, violão, etc.

Mestre Calango, em Alter do Chão, mostra preocupação ainda


na construção da palheta: as mais moles, para instrumentos
feitos em base de panela que tem as cordas mais altas; as mais
duras, para instrumentos menores para projetar mais som.

Atualmente é comum ser inserido também um sistema de


captação nos banjos. Eles variam desde os convencionais
captadores de rastilho e de ficha comprados em lojas de ins-
trumentos musicais, até soluções engenhosas como de Mes-

Banjo feito com panela por Mestre Neves do Banjo 33


Assinatura de Mestre Kaito
Mestre Ray na mão parafusando o
de um de seus banjos fundo de um banjo

Banjo feito por Banjola de


Mestre Kaito Mestre Caranguejo

34
Outros instrumentos Indumentária
Alguns grupos usam outros instrumentos, dos quais valem
mencionar: o reco-reco, feito de bambu e tocado com uma bar- A fabricação da indumentária compõe também o quadro dos
ra de metal; o rufo, parecido com uma caixa, porém um pouco artesanatos do carimbó, com as cores vibrantes da saias ro-
mais grave – o corpo é normalmente feito de aro de panela de dadas e adereços de cabeça. As costureiras relatam que a
pressão, sendo encourado dos dois lados e afinado por cordas produção de uma saia pode demandar de 3 a 7 m de pano.
entrelaçadas, tocado com baquetas e, em geral, preso no meio Podem ser feitas em godê ou sobreposição de camadas de
das pernas; e, por fim, a onça, instrumento parecido com a cuí- tecido, sendo a seda, o crepe e o musseline bastante co-
ca. Pode ser feita de madeira ou PVC com uma vara de fricção muns. Mestra Tina relata que costuma começar a procurar
de flecheira ou caranã amarrada com uma corda por dentro. pelos tecidos ao longo do ano e vai guardando. “Ninguém
Quanto maior o tambor, maior a ressonância do instrumento. quer ter uma saia igual”, afirma. Por isso é importante sem-
Mestre Sabá pre buscar uma diversidade de desenhos, cores e tipos de
demonstrando como tecido. No caso de Mestras Meire e Santa, elas costumam
se toca o rufo e onça receber a encomenda do grupo Cruzeirinho no Marajó já com
feita por Mestre
Sandoval (abaixo) material incluído. Também recebem em menor escala enco-
mendas para fazer as blusas para as mulheres, normalmente
branca e de manga, e a camisa para os homens.

Por fim, os adereços. Anéis e arcos de flores na cabeça são


recorrentes. Adriana, no Soure, mostrou como constrói es-
ses itens a partir de flores sintéticas e ramos de patchuli,
sempre procurando conferir mais colorido e inventividade.

35
“Inovar sem sair da tradição”...

... a frase, de Mestre Manoel de Marapanim, sintetiza bem


o quadro atual da construção de instrumentos artesanais
do carimbó no Pará. Uma busca constante por adaptações
e reinvenções, visando se adequar ao mundo contemporâ-
neo, sem deixar de lado as raízes e adquire cada vez mais
contornos de busca por reconhecimento, visibilidade e ci-
dadania. Como afirma Mestre Ronaldo: “os mestres antigos
faziam cultura, nós temos fazemos uma ação política e de
cidadania a partir da cultura”.

Notas
1
Do agudo ao grave, por exemplo: Mi-Sol-Ré-Dó | Mi-Si-Sol-Ré | Dó-Ré Mi-Fá.
2
Ainda sobre as cordas, muitos mestres relataram a preferência pelo nái-
lon por ser mais flexível e, desta forma, durar mais tempo. Mestre Nelson
lembra que antes usavam o arame, pois o carimbó era mais cadenciado
do que hoje, sobretudo no tempo da viola. Com a acelaração do ritmo e
mudança da forma de tocar as cordas se partiam muito facilmente.

em sentido horário: Adriana fazendo adereços de carimbó; filha da Mestra Tina


dançando carimbó; e indumentária feita por Mestra Santa

36
Bibliografia Contatos para comercialização
BOGÉA, Eliana. A Cultura no Brasil pós-2003, um Norte: Carimbó Pa- Mestra Adriana 91 996054874 | Mestra Nilma 91 996054874 |
trimônio Cultural Brasileiro.In: V Seminário Internacional de Políticas Mestra Santa 91 96054874 | Mestra Tina 91 999622937 | Mes-
Culturais. RJ, 2014. Disponível em: http://culturadigital.br/politicacul- tre Adam max 93 991668345 | Mestre Aguinaldo 91 996054874 |
turalcasaderuibarbosa/files/2014/06/Eliana-Bog%C3%A9a.pdf aces- Mestre Calango 93 988057298 | Mestre Caranguejo 91 984746840
so em 18/07/2019. | Mestre Cazuza 91 98501-9819 | Mestre Diquinho 91 996054874 |
CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do folclore brasileiro. São Paulo: Mestre Elias 91 9340-1361 | Mestre Hermes 93 999125005 | Mes-
Global, 2002. tre Kaíto 91 98208454 | Mestre Laranjeira 91 999064373 | Mes-
tre Leopardo 93 999751800 | Mestre Lourival 91 981056347; 91
CARNEIRO, Edison. A conquista da Amazônia. Rio de Janeiro: Min. da
980712302 | Mestre Lourival Igarapé 91 98192 8869 | Mestre Lucas
Viação e Obras Públicas, 1956.
Bragança 91 98410-3833 | Mestre Manoel 91 98208454 | Mestre
COSTA, Antônio Maurício. Produção da “Música Cabocla”: a polifonia Manoel Alexandre 91 98813-0732 | Mestre Marinho 91 98208454
formadora do Carimbó nas representações de literatos, jornalistas | Mestre Melé 91 98208454 | Mestre Nego Ray 91 98388-1177 |
e folcloristas no Pará (1900-1960). História (São Paulo) v.34, n.1, p. Mestre Nelson 91 980550139 | Mestre Neves 91 988785841 | Mes-
241-273, jan./jun. 2015. tre Ney Lima 91 98281-1742 | Mestre Norberto 91 985235757; 91
GIFFONI, Maria. Manifestações coreográficas na religiosidade brasilei- 985053575 | Mestre Ronaldo Guedes 91 996054874 | Mestre Sabá
ra. RBF Set/Dez 1971 - Nº31 (2). 91 988122972 | Mestre Sandoval 91 98208454 | Mestre Thomaz
MIRANDA, Vicente Chermont de. Glossário paraense ou coleção de vo- 91 98428-4853 | Mestre Waldery 91 98972-7740
cábulos peculiares à Amazônia e especialmente à Ilha do Marajó. Belém:
Ed. da UFPA, 1968. Sala do Artista Popular | CNFCP
PANTOJA, Lorena. “Nós Queremos”: O Carimbó e a sua Campanha pelo tí- Rua do Catete, 179 (metrô Catete)
tulo de patrimônio cultural brasileiro. RJ, 2015 (dissertação do Mestrado Rio de Janeiro – RJ cep 22220-000
defendida no Mestrado Profissional em Patrimônio Cultural PEP/IPHAN). (21) 3826-6460
SALLES, Vicente; ISADEBSKI, Marena. Carimbó: Trabalho e lazer do caboclo. mercado.folclore@iphan.gov.br
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Rio de Janeiro, 25 de julho de 2019 a 08 de setembro de 2019
Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular
IPHAN | Ministério da Cidadania

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