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MODOS DO DOCUMENTÁRIO:
POÉTICO, EXPOSITIVO E OBSERVATIVO
Curso Online de Cinema - AULA 184

INTRODUÇÃO

O autor Bill Nichols, em seu livro Introdução ao Documentário, descreve 6 modos do


documentário. Essa é a primeira de uma série de duas aulas em que iremos comentar
sobre estes modos.

O QUE SÃO OS MODOS DO DOCUMENTÁRIO?

Segundo Nichols, os modos identificam as diferentes maneiras da voz do documentário se


manifestar cinematograficamente. Os modos servem como um esqueleto ao qual cada
cineasta dá corpo de acordo com sua própria disposição criativa.

Em uma definição mais simplista, o modo é o “estilo” do documentário.

Se um filme segue o modo expositivo, ele seguirá um estilo mais didático, irá usar
entrevistas e narração em off, apresentará o seu tema de modo mais ilustrativo.

Se um filme segue o modo poético, ele seguirá um estilo mais livre. Neste caso, a obra
pode não usar entrevistas. Ela pode mostrar apenas imagens e construir um impacto
sensorial para tratar sobre o seu tema.

Esses modos irão ajudar, também, a moldar os documentos e materiais que um


documentário utiliza. Péter Forgács se utiliza de imagens de arquivo e filmagens familiares
de modo mais lírico, já Ken Burns se utiliza de imagens históricas de modo expositivo.

MODO POÉTICO

Nichols afirma que o modo poético explora associações e padrões que envolvem ritmos
temporais e justaposições espaciais. Ele diz que esse modo sacrifica as convenções da
montagem em continuidade e que existe um interesse mais específico pela forma.

É um modo mais livre que busca estabelecer uma relação poética com o seu tema e pode
não dar tanta atenção aos atores sociais.

Um filme como Chuva (1929) não enfatiza nenhum participante. É uma obra mais
interessada na relação com a forma do cinema ao mostrar um dia de chuva.

Koyaanisqatsi (1982) mostra regiões e paisagens dos EUA para propor uma reflexão livre e
poética sobre a relação do homem com o meio ambiente. É um filme sem narração e sem
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entrevistas. Ele apenas mostra imagens impactantes com uma trilha sonora minimalista que
ajuda a pontuar várias sensações.

Um curta como N.Y., N.Y. (1957) é uma sinfonia urbana sobre Nova Iorque. O filme mostra
imagens da cidade através de uma lente modificada que aborda tudo como se fosse um
caleidoscópio. O cineasta trata a cidade como uma massa com volume, cor e movimento.

MODO EXPOSITIVO

O modo expositivo é o modo mais comum. Uma parte bastante considerável dos
documentários produzidos se adequa a este modo.

Nesse modo, o filme expõe o seu tema a partir das convenções mais clássicas do
documentário: uso de entrevistas, narração ao estilo “voz de Deus”, retórica argumentativa
sobre o seu tema.

Bill Nichols diz que esse modo agrupa fragmentos do mundo histórico numa estrutura mais
retórica do que estética ou poética. É um modo que se dirige ao espectador propondo uma
perspectiva mais direta sobre um tema.

Os filmes de Michael Moore são um bom exemplo desse modo. O cineasta define um tema
e explora esse tema através destas convenções. Moore investe em uma retórica
argumentativa para expor o seu tema de modo direto e defender um ponto de vista.

Várias das convenções do modo expositivo foram estabelecidas por alguns filmes da Escola
Britânica de Documentários (temos duas aulas sobre esse tema).

O curta Night Mail (1936) é um bom exemplo. É um filme sobre a eficiência do serviço dos
correios inglês que usa uma voz off bem didática e mostra seus atores sociais reencenando
seus papéis para a câmera.

O modo expositivo pode soar um pouco genérico, já que ele busca essa eficiência acima de
tudo. O próprio Nichols diz que, nesse modo, os filmes são muito dependentes de uma
lógica informativa transmitida verbalmente. Ele também diz que existe uma inversão da
ênfase habitual do cinema, já que as imagens desempenhariam um papel secundário.

Entretanto, cineastas como Werner Herzog e Eduardo Coutinho se utilizam dessas


convenções de modo bastante autoral.

MODO OBSERVATIVO

Nesse modo, a câmera do diretor irá testemunhar um acontecimento sem interferir naquilo
diretamente. Além de vários filmes desse modo não terem narração e nem entrevistas, não
existe uma abordagem poética impondo uma visão.
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São filmes que observam seus acontecimentos como se a câmera não estivesse lá. O que,
por si só, já é algo um pouco utópico e talvez ingênuo, mas que atinge efeitos muito
expressivos.

Esse modo se tornou mais popular a partir dos anos 50 e 60 quando surgem câmeras
16mm mais compactas e gravadores de som mais práticos.

Filmes como Primárias (1960) e Caixeiro-Viajante (1969), grandes exemplos do Cinema


Direto, se utilizam do modo observativo.

Frederick Wiseman, um cineasta que produz desde os anos 60, é o principal nome dessa
categoria. Wiseman faz filmes sobre instituições, ambientes ou locais específicos em que
“habita” tal local e registra imagens muito naturais e espontâneas.

Em High School (1968), ele registra o dia a dia de um colégio norte-americano. Apesar da
presença da câmera, vemos discussões e conversas muito legítimas entre as pessoas em
cena.

O modo observativo pode parecer passivo ou pouco autoral, porém existem várias sutilezas
nesses registros. Wiseman, em High School (1968), faz closes muito interessantes quando
capta os jovens. E mesmo a maneira que ele decide alongar um diálogo já é uma escolha
autoral muito particular de montagem.

A mesma coisa acontece em Primárias (1960). A câmera mais livre do filme capta pequenos
detalhes específicos, sejam de algumas ações dos candidatos ou expressões de pessoas.
Essa atenção da câmera a detalhes é um elemento autoral.

Em relação ao cinema contemporâneo, o chinês Wang Bing é um dos casos mais


emblemáticos desse modo. Ele permanece em certos ambientes com uma câmera digital
pequena e registra aspectos espontâneos desses locais. Ou, ainda, segue personagens
que vivem isolados e registra o cotidiano dessas pessoas de modo bem minucioso.

CONCLUSÃO

Apesar de cada um desses modos possuir convenções e formas específicas, vários


documentários irão misturar essas características. Mesmo que os modos tenham elementos
próprios, não podemos pensar nisso como “regras”.

Os modos, na verdade, demonstram toda a riqueza de possibilidades do documentário.

LIVRO CITADO

Introdução ao Documentário - Bill Nichols


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FILMES CITADOS

In the Land of the Head Hunters (1914) - Edward S. Curtis


Night Mail (1936) - Harry Watt, Basil Wright
Shoah (1985) - Claude Lanzmann
Nanook, o Esquimó (1922) - Robert J. Flaherty
A Guerra do Vietnã (2017) - Ken Burns, Lynn Novick
Koyaanisqatsi (1982) - Godfrey Reggio
Sem Sol (1983) - Chris Marker
The Maelstrom: A Family Chronicle (1997) - Péter Forgács
Chuva (1929) - Mannus Franken, Joris Ivens
Baraka - Um Mundo Além das Palavras (1992) - Ron Fricke
N.Y., N.Y. (1957) - Francis Thompson
Lost, Lost, Lost (1976) - Jonas Mekas
Sicko: $O$ Saúde (2007) - Michael Moore
Tiros em Columbine (2002) - Michael Moore
Roger e Eu (1989) - Michael Moore
O Homem Urso (2005) - Werner Herzog
The Fire Within: A Requiem for Katia and Maurice Krafft (2022) - Werner Herzog
Cabra Marcado Para Morrer (1984) - Eduardo Coutinho
Edifício Master (2002) - Eduardo Coutinho
Peões (2004) - Eduardo Coutinho
It Felt Like a Kiss (2009) - Adam Curtis
HyperNormalisation (2016) - Adam Curtis
Noite e Neblina (1956) - Alain Resnais
Why We Fight: The Nazis Strike (1943) - Frank Capra, Anatole Litvak
Why We Fight: War Comes to America (1945) - Frank Capra, Anatole Litvak
The Spanish Earth (1937) - Joris Ivens
Triunfo da Vontade (1935) - Leni Riefenstahl
Into Great Silence (2005) - Philip Gröning
Caixeiro-Viajante (1969) - Albert Maysles,David Maysles, Charlotte Zwerin
Primárias (1960) - Robert Drew
Ex Libris: The New York Public Library (2017) - Frederick Wiseman
National Gallery (2014) - Frederick Wiseman
High School (1968) - Frederick Wiseman
Grey Gardens (1975) - Albert Maysles, David Maysles, Muffie Meyer, Ellen Hovde
A Oeste dos Trilhos (2003) - Wang Bing
Man With No Name (2010) - Wang Bing
Crônica de um Verão (1961) - Edgar Morin, Jean Rouch

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