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INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DO CINEMA

AULA 04 - O Cinema Contemporâneo

O CONTEXTO PÓS-MODERNO

O cinema contemporâneo inicia-se no contexto do término do modernismo. A partir dessa


ideia, podemos falar sobre o pós-modernismo.

Jean-François Lyotard classifica a condição pós-moderna como uma descrença em


explicações totalizadoras para o processo histórico. Segundo ele, o pós-modernismo supera
ideologias e narrativas relacionadas ao modernismo. A partir de uma crise de ideologias, o
mundo passa por uma fase mais cética. Há uma relativização de várias definições e
referenciais, como por exemplo da razão, da beleza e da moral.

No artigo de Renato Luiz Pucci Jr, que integra o livro História do Cinema Mundial, a
expressão “jogos de linguagem” se refere ao uso de ironia, paródia ou elementos opostos
em uma obra.

Fredric Jameson observa que, desde os anos 70, os filmes já mostram uma nostalgia,
simulando o passado devido a essa falta de referencial.

A atmosfera peculiar dos Estados Unidos dos anos 50 é mostrada em Loucuras de Verão
(1973). Chinatown (1974) brinca com as tradições do noir. Guerra nas Estrelas (1977)
repensa as matinês dos anos 30 aos 50.

Chinatown (1974) - Roman Polanski

A teórica Linda Hutcheon atribui ao pós-modernismo um caráter híbrido, o qual mantém o


ilusionismo do classicismo somado ao distanciamento do moderno. Ela usa O Fundo do
Coração (1981) como exemplo. O filme é um musical/comédia romântica, gêneros
tradicionais do cinema. Por outro lado, os cenários e efeitos de montagem e de
pós-produção trazem ares modernos e artificiais.
A NOSTALGIA E A PARÓDIA

No pós-modernismo, a paródia é um elemento comum. Wes Craven foi um mestre em criar


slashers autoconscientes que propunham uma transgressão na medida que brincavam com
as tradições do subgênero. A paródia pós-moderna propõe um jogo com o objeto parodiado,
mas não necessariamente caçoa dele.

Pânico 4 (2011) - Wes Craven

Brian de Palma faz uma paródia lúdica de Hitchcock que funciona por si. Ele hiper estiliza
algumas formas e convenções que Hitchcock utilizou.

O MANEIRISMO

Uma tendência maneirista pode ser percebida em várias obras do contexto contemporâneo.
O maneirismo tem a ver com escolhas estéticas exageradas, mas também com um período
histórico específico nos anos 80.

Alain Bergala fala que, nessa época, alguns cineastas entram em uma espécie de crise por
não se encaixarem nem nas definições de clássico nem de moderno. Como até os anos 80
a forma do cinema foi explorada à exaustão, esses cineastas buscam novas formas de
representação, as quais poderiam se mostrar exageradas.
Elemento de Um Crime (1984) - Lars von Trier

Lars von Trier emula o noir barroco de Orson Welles. Leos Carax joga com os filmes
românticos clássicos.

O cinema moderno tinha uma unidade a partir do contexto do pós-guerra, bem como da
vontade de quebrar com as tradições. No contemporâneo, a perda de referência demanda
um olhar para o passado.

A ABORDAGEM SENSORIAL

Outra vertente do cinema contemporâneo apresenta uma abordagem mais sensorial com a
linguagem. Cineastas como David Lynch, David Cronenberg e Abel Ferrara trabalham com
signos enigmáticos, o que acaba virando uma tendência nos anos 90.
Crash - Estranhos Prazeres (1996) - David Cronenberg

Apesar dos filmes desses cineastas apresentarem uma história, existe um elemento
estilístico rítmico e climático que se mostra como o verdadeiro apelo.

CINEMA DE FLUXO

Stéphane Bouquet coloca o termo “cinema de fluxo” para diferenciá-lo de um cinema de


plano. O cinema de plano é algo mais tradicional, com uma decupagem que organiza os
planos a partir de uma convenção. Já o cinema de fluxo está interessado em fazer circular
as imagens de forma não convencional.

Em um filme como Blackout (1997), de Abel Ferrara, os planos circulam com uma espécie
de fluxo; a decupagem não é tradicionalmente organizada. Bouquet afirma que o cineasta
Tsui Hark está interessado em “pôr em movimento, e não pôr em cena”.

Hou Hsiao-Hsien e Apichatpong Weerasethakul também são grandes exemplos dessa


tendência. Eles filmam planos longos em que situações cotidianas ganham ares
metafísicos.
Eternamente Sua (2002) - Apichatpong Weerasethakul

No início dos anos 2000 e na virada do milênio, essas obras propõem experimentações em
torno da duração e da definição dos planos, os quais se comportam de modo mais
autônomo, não submissos a outros elementos.

A tendência do cinema de fluxo é uma das mais icônicas do cinema contemporâneo, porque
se deu de forma espontânea e envolveu diversos lugares do mundo, não centrando-se em
um único país.

DOCUFICÇÃO

A docuficção, que pode estar ligada ou não ao cinema de fluxo, é outra grande tendência
contemporânea. Esse nome representa um híbrido entre documentário e ficção.

São filmes que repensam a realidade à sua volta, bem como aspectos históricos e de
representação. Essa é uma tendência que já existia antes, mas que ficou em voga nesse
período. Cineastas como Lisandro Alonso, Pedro Costa e Adirley Queirós são grandes
exemplos.

REVOLUÇÃO DIGITAL

A revolução digital foi algo crucial para o desenvolvimento do cinema contemporâneo. Até
certo momento, haviam filmes filmados em película e somente editados digitalmente. A
partir de 2010 a maioria dos filmes já eram gravados em digital.
Festa de Família (1998) - Thomas Vinterberg

Michael Mann foi um importante diretor ao explorar o início do digital. Ele aliava o realismo e
a estilização de seus filmes à estética ruidosa do vídeo.

O Dogma 95 foi um movimento criado por Lars von Trier e Thomas Vinterberg, no qual
vários filmes foram gravados digitalmente, alguns até mesmo com câmeras amadoras.
Diferente dos movimentos modernos, no Dogma 95 não havia uma urgência política; esse
foi um movimento forjado em ironia, que deu certo.

ANIMAGEM

Também devemos salientar as possibilidades que o cinema digital trouxe à pós-produção e


aos efeitos especiais, como efeitos de CGI e motion capture.

Nesse sentido, a animagem inaugurou um novo paradigma da imagem, que mistura CGI e
motion capture; são filmes não totalmente gravados e nem feitos totalmente em
computador. Eles existem entre regimes de imagens. Eles misturam a captura digital de
atores reais com o CGI.

CINEMA BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO

Em um contexto brasileiro, nos anos 90 são lançados filmes provenientes de uma nova lei
de incentivo que marca uma volta da produção mais regular depois de um período de
estagnação. Longas como Carlota Joaquina, Princesa do Brazil (1995) e Central do Brasil
(1998) foram marcantes nesse sentido.
Central do Brasil (1998) - Walter Salles

Cidade de Deus (2002) marca o ápice dessa nova fase. Esse cinema contemporâneo
brasileiro lida com vários temas que o cinema moderno brasileiro dos anos 60 lidava,
principalmente em relação a questões sociais, porém faz isso com uma abordagem mais
bem acabada.

São filmes mais “bonitos”, o que também é um pouco criticado. Uma autora como Ivana
Bentes fala sobre uma possível cosmética da fome dentro desse contexto.

De toda forma, mesmo isso vem sendo superado nos últimos anos. Vários cineastas
brasileiros como Adirley Queirós, Affonso Uchoa, Juliana Antunes, entre outros, fazem
filmes com temáticas sociais que não glamourizam seus temas, mas lidam com o
testemunho dos seus participantes de modo mais direto.

INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DO CINEMA


Minicurso ministrado por Arthur Tuoto
https://arthurtuoto.com/
https://www.youtube.com/arthurtuoto/

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