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Instituto Federal de Educação, Ciência e

Tecnologia do Ceará (IFCE)

Diretrizes para Solução dos


Problemas Relacionados aos Prédios
Construídos em Alvenaria Resistente
na Região
Metropolitana do Recife
Fevereiro de 2009

Equipe Responsável:

Max Giuliano Raulino Chagas


Raimundo Renato Sobrinho
Eduardo Wolnigler
Gustavo Bezerra
Resumo

Proposta da Comissão de Qualidade e Segurança do


Ambiente Construído do CREA/PE, com objetivo de
estabelecer Diretrizes para Solução dos Problemas
Relacionados aos Prédios Construídos em Alvenaria
Resistente na Região Metropolitana do Recife.
INTRODUÇÃO
A ocorrência de diversos acidentes com edifícios construídos em alvenaria
resistente, caracterizada como edificações em alvenaria que utilizam blocos
(tijolos vazados) de vedação com finalidade estrutural, chamou a
atenção da comunidade técnica local para a necessidade de se estabelecer
critérios de investigação, estudo e reabilitação deste tipo de edificação, dentro
de níveis de confiabilidade aceitáveis.

Diversas manifestações patológicas têm sido observadas nos prédios da Região


Metropolitana do Recife (RMR), já tendo ocorrido, em alguns casos,
desabamentos com vítimas fatais.
SISTEMA CONSTRUTIVO EM ALVENARIA ESTRUTURAL

O sistema construtivo Alvenaria Estrutural é um sistema racionalizado, que


utiliza blocos modulares, com vazados verticais (por onde passam algumas
tubulações), de resistência à compressão variando de 4,5 a cerca de 30MPa, na
área bruta.

Todo um conjunto de procedimentos é utilizado na alvenaria estrutural,


respeitando-se normas brasileiras (ou estrangeiras) de cálculo, execução e
controle de qualidade.
Tipos de blocos cerâmicos
A NBR 7171 diferencia claramente os blocos cerâmicos a serem empregados
em paredes de vedação daqueles recomendados para paredes estruturais.

Blocos de vedação são blocos que não têm a função de suportar cargas
verticais além das provenientes do próprio peso e pequenas cargas de
ocupação e são assentados com furos na direção horizontal.

Blocos estruturais são projetados para suportar outras cargas verticais além da
do peso próprio, compondo o arcabouço estrutural da edificação. São
projetados para serem assentados com os furos na vertical e podem ter
diferentes resistências à compressão. O assentamento de blocos com furos na
horizontal agindo como blocos estruturais provoca a redistribuição das forças
atuantes internamente. Esforços de tração passam a atuar sobre os blocos, que
podem seccionar, visto que são construídos de materiais pouco resistentes à
tração (concreto ou argila).
SISTEMA CONSTRUTIVO UTILIZADO nos prédios da
Região Metropolitana do Recife (RMR)

Segundo estimativas, que estão sendo confirmadas pelos levantamentos


cadastrais da época, a RMR contava com aproximadamente 6.000 (seis mil)
edifícios construídos em alvenaria resistente, regionalmente referidos como
prédios tipo caixão, numa alusão natural à forma da construção que se
assemelha a uma grande caixa. Neste tipo de edificação, geralmente se
utilizam blocos cerâmicos vazados assentados com furos na horizontal ou
blocos de concreto, ambos de pequena espessura, com baixa resistência à
compressão, da ordem de 3,0 MPa, como valor máximo
Estas edificações, conhecidas como “prédios-caixões”, geralmente, são
constituídas de quatro pavimentos sem elevador e utilizam alvenaria
portante, construída com tijolos cerâmicos sem qualquer função estrutural.
Esta modalidade de construção, no entanto, não pode ser definida como
alvenaria estrutural. Alguns autores a denominam “Alvenaria Resistente”.

O que se observa, nos edifícios de Recife, é a construção empírica, na qual são


empregados blocos de pouca precisão dimensional e baixa resistência,
caracterizados pela existência de furos horizontais. A tabela a seguir mostra
que a resistência dos blocos cerâmicos de vedação industrializados gira em
torno de 2MPa.
CARACTERÍSTICAS TÍPICAS DA ALVENARIA RESISTENTE

Técnica construtiva que se caracteriza pela utilização de unidades de vedação


(cerâmicas ou de concreto) com finalidade estrutural, ou seja, com o objetivo
de suportar cargas além do seu próprio peso.

As lajes são na sua maioria nervuradas, pré-moldadas tipo volterrana, com


blocos cerâmicos ou de concreto e com capeamento de concreto. São
assentadas diretamente sobre as paredes ou sobre cintas de concreto
executadas no coroamento das paredes.

As fundações são geralmente construídas em alvenaria simples ou dobrada,


em continuidade às paredes da edificação, geralmente assentadas sobre
sapatas corridas na forma de T invertido de concreto armado ou sobre
componentes de fundação pré-moldados assentados sobre camada de concreto
magro.
CARACTERÍSTICAS TÍPICAS DA ALVENARIA RESISTENTE

Tem sido constatada a execução do piso do pavimento térreo em laje pré-


moldada, semelhante às empregadas nos demais pisos da edificação, em
substituição ao preenchimento do caixão da obra com aterro compactado. O
porão assim formado cria um ambiente potencialmente agressivo aos
elementos do embasamento e à própria laje. É agravado pela inexistência de
saneamento, em muitos casos.

Neste tipo de edificação é freqüente não se dispor cintas de concreto armado


na interface fundação-parede de elevação ou mesmo nas interfaces parede-laje
em cada pavimento. É comum também a ausência de vergas e contravergas
nos vãos de aberturas de portas e janelas.
CARACTERÍSTICAS TÍPICAS DA ALVENARIA RESISTENTE

As paredes de elevação são construídas em alvenaria singela de blocos


cerâmicos ou de concreto, com espessura média de 9 cm, com juntas verticais
descontínuas, assentadas com argamassa mista de cimento, cal e areia, de
cimento saibro e areia ou simplesmente cimento e areia. Esta espessura das
paredes é responsável, em grande parte, pela redução da já pequena
capacidade de carga destes elementos resistentes devido à sua elevada
esbeltez.
CARACTERÍSTICAS TÍPICAS DA ALVENARIA RESISTENTE

Geralmente os revestimentos externos e internos são constituídos de


argamassas mistas de cimento.

A caixa de escada, muitas vezes posicionada na parte central do bloco, é


geralmente estruturada em pórtico de concreto armado e serve de sustentação
do reservatório superior. Em alguns casos são observadas escadas apoiadas
diretamente sobre as paredes da edificação.

A estrutura de telhado, geralmente em madeira, assenta-se sobre as paredes


através de pilaretes ou barrotes de madeira, sendo a coberta em telhas de
fibrocimento ou telhas cerâmicas.
Tabela: Resistência Média dos Materiais e
Componentes da Alvenaria Resistente
Material/Componente Traço (em Características do Resistência média à
volume) cimento : corpo-de-prova compressão(1)
cal : areia

Bloco cerâmico - Furos na horizontal 2,0 MPa

Prisma de 2 blocos - Furos na horizontal 2,2 MPa

Prisma de 3 blocos - Furos na horizontal 1,9 MPa

Argamassa de 1 : 0,5 : 6 5 x 10cm 7,0 MPa


assentamento

Argamassa de 1 : 0,5 : 6 ; 5 x 10cm 8,0 MPa


revestimento a/c=0,45

(1)
Resistência dos blocos e prismas expressa em relação à área bruta.Fonte:
HANAI e OLIVEIRA, 2002.
Os Desabamentos mais Significativos de Edificações em Alvenaria Resistente

Em março de 1994, um dos blocos do Conjunto Residencial Bosque das


Madeiras, localizado no bairro de Engenho do Meio ruiu ainda na fase de
construção. A alvenaria da edificação era singela em blocos cerâmicos de oito
furos e a fundação em caixão vazio. Não houve vítimas. O laudo de avaliação do
acidente foi conduzido pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura de
Pernambuco (CREA-PE) e apontou como

causa principal do colapso a execução de

rasgos horizontais para instalação de

eletrodutos ao longo de toda extensão de

uma parede divisória central.


Fig. 1 – Conjunto Residencial Bosque das Madeiras
Fig. 1 – Conjunto Residencial Bosque das
Madeiras
Três anos mais tarde, em 1997, ocorreu o desabamento do Edifício
Aquarela, localizado no bairro de Piedade, no município de Jaboatão dos
Guararapes. O colapso ocorreu onze anos após sua construção. A estrutura da
edificação era em alvenaria singela de blocos cerâmicos vazados, assentados à
galga na superestrutura com os furos na horizontal. As lajes eram pré-
moldadas do tipo volterrana apoiadas sobre cintas de concreto armado,
corridas ao logo de todas as paredes.

A fundação deste edifício, em caixão vazio, foi construída em alvenaria singela


de blocos cerâmicos de seis furos (19cm x 11cm x 9cm) assentados ao chato,
constituindo uma trama de paredes.

Os embasamentos então formados não foram aterrados em seu interior,


apresentando em alguns pontos vazios de até 1,40m do solo à laje de piso. A
laje de piso do pavimento térreo era também do tipo volterrana.
A existência de cintas de amarração evitou o desmoronamento da edificação,
mantendo os níveis dos pisos praticamente horizontais, na ocasião do colapso
da estrutura. Não houve vítimas.

O laudo de avaliação foi conduzido pelo CREA-PE e indicou como causa


principal da ruptura a perda de resistência dos blocos de fundação decorrente
da expansão por umidade. Também foram observadas na edificação reduções
das dimensões das alvenarias de embasamento projetadas.
Em novembro de 1999, ruiu em Jardim Fragoso, Olinda, o Edifício Éricka
causando a morte de cinco pessoas. O edifício era construído em alvenaria
singela mista, envolvendo blocos cerâmicos e blocos de vedação em concreto.

A fundação desta edificação foi executada em caixão vazio e as paredes em


alvenaria singela mista. Foram observados em alguns pontos vazios de até 1,70
m, entre o solo natural e a laje de piso do pavimento térreo.

O laudo de avaliação da Coordenação de Defesa Civil de Pernambuco


(CODECIPE) apontou como causa principal da ruína a perda de resistência
decorrente da degradação produzida pela ação continuada de íons de sulfatos
sobre os componentes do cimento.
Figuras: Edifício
Éricka
Em dezembro de 1999, colapsou também em Jardim Fragoso, o Bloco B do
Conjunto Enseada de Serrambi causando sete vítimas fatais. O edifício
era construído em alvenaria singela de blocos cerâmicos vazados assentados
com furos na horizontal.

A fundação deste prédio foi também executada em caixão vazio com paredes
em alvenaria singela e a laje de piso do pavimento térreo em laje do tipo
volterrana.

O laudo de avaliação apontou como causa principal da ruína a falha dos blocos
de fundação. A Figura a seguir mostra detalhes do colapso da edificação, onde
se pode observar a fragmentação generalizada da mesma, decorrente da
inexistência de cintas de concreto armado nos níveis dos pisos.
Figura: Bloco B do Conjunto Enseada de Serrambi
Em maio de 2001, o Edifício Ijuí, localizado em Candeias, Jaboatão dos
Guararapes, também construído em alvenaria resistente de blocos de concreto
e fundação em caixão vazio, ruiu sem deixar vítimas. O laudo de avaliação foi
conduzido pela Prefeitura Municipal de Jaboatão dos Guararapes contando
com a participação do ITEP, CREA e CODECIPE.

A Figura ilustra as condições do edifício após o colapso. A ruptura se deu a


partir dos embasamentos provocados pelo descalçamento das sapatas corridas
em decorrência da passagem das águas servidas e pluviais devido à inclinação
do terreno natural e pelo fato da fundação não ser aterrada.
Fig. 5 – Edifício Ijuí
Mais recentemente, em dezembro de 2007, a parte posterior do Bloco B do
Edifício Sevilha, situado em Jaboatão dos Guararapes colapsou no nível das
paredes que constituíam os embasamentos da edificação. A fundação era
também construída em caixão vazio em alvenaria singela formada por blocos
vazados de oito furos assentados ao chato. A Figura ilustra as condições do
edifício após o colapso.

Figura – Edifício Sevilha


Considerações Críticas sobre a Pesquisa em Andamento e seus Resultados

Seguindo a metodologia utilizada no estudo de alvenaria estrutural e de


vedação, foram realizados ensaios de blocos, prismas e paredinhas em
diversas composições de argamassas de assentamento e de revestimento,
objetivando a determinação de suas propriedades e comportamentos
estruturais. Os resultados destes estudos permitiram determinar as razões
pelas quais, apesar dos cálculos indicarem que as paredes dos edifícios do tipo
caixão sejam instáveis, milhares deles se encontram em “aparente”
estabilidade. Alguns resultados obtidos são a seguir sumarizados:
• Os blocos cerâmicos e de concreto pesquisados apresentaram importante
variabilidade dimensional denunciando um precário controle de qualidade
no seu processo de fabricação;

• A resistência à compressão dos blocos ensaiados se mostrou


excessivamente baixas – da ordem de 2 MPa – aspecto que os caracteriza
como blocos que deveriam ter utilização restrita como elementos de
vedação. Nenhum dos blocos ensaiados apresentou resistência compatível
para suportar cargas além do próprio peso da parede;

• Os ensaios de compressão realizados em componentes, prismas e


paredinhas de blocos cerâmicos mostraram ruptura brusca;

• Os ensaios realizados em prismas e paredinhas indicaram que o chapisco e


o revestimento contribuem para o aumento da capacidade de carga destes
elementos e a sua existência pode ser um dos responsáveis pela
“estabilidade” aparente de grande parte das edificações .
• Apesar de ter sido constatada melhoria na capacidade de carga gerada pelos

• revestimentos, a natureza brusca da ruptura dos elementos ensaiados ainda


se constitui em um problema a ser superado;

• Os ensaios realizados em prismas e paredinhas indicaram que a colocação


de armaduras no interior da camada de revestimento, desde que adotados
critérios adequados de disposição e fixação, pode contribuir para o
incremento da capacidade de carga dos elementos ensaiados, bem como
promover ductilidade.
Construções de Edifícios em Alvenaria Resistente no
Estado de Pernambuco - Histórico
Com a criação do Banco Nacional de Habitação, a partir da década de 70, houve
um importante impulso na construção de habitações populares, em larga escala,
no Brasil. Naquela época, começaram a ser produzidos edifícios residenciais de
até quatro pavimentos empregando, com razoável freqüência, blocos
caracterizados como de vedação com finalidade estrutural. Trata-se de extensão
das construções que vinham sendo produzidas com menor número de
pavimentos.

A maior parte destas edificações foi executada de forma empírica, sem


atendimento aos requisitos de normas técnicas específicas que possibilitassem o
estabelecimento de padrões de confiabilidade estrutural aceitáveis, sendo este o
principal problema com este tipo de construção.
POSSÍVEIS AGRAVANTES
Diversos agravantes podem ser detectados em prédios de alvenaria resistente:

 Os blocos cerâmicos utilizados geralmente são produzidos por pequenos ou


médios fabricantes, resultando em materiais de baixo nível de qualidade;

 Os blocos de vedação empregados têm dimensões muito menores do que os


recomendados para alvenaria estrutural. Conseqüentemente, as paredes
(com espessura da ordem de 9 cm) tornam-se muito esbeltas em relação ao
pé-direito (cerca de 2,60 m), o que diminui sensivelmente a capacidade
resistente;

 É comum a ausência de vergas e contravergas nos vãos de aberturas de


portas e janelas, o que enfraquece o prisma de compressão formado pela
parede;
 Os blocos cerâmicos utilizados geralmente são produzidos por pequenos ou
médios fabricantes, resultando em materiais de baixo nível de qualidade;

 As lajes são, geralmente, pré-moldadas unidirecionais, que terminam por


sobrecarregar as paredes na direção perpendicular às vigotas;

 O piso do pavimento térreo, em muitos casos, é executado em laje pré-


moldada, semelhante às empregadas nos demais pisos da edificação, em
substituição ao preenchimento do caixão da obra com aterro compactado. O
porão assim formado cria um ambiente potencialmente agressivo aos
elementos do embasamento e à própria laje.

 Em alguns casos, são observadas escadas apoiadas diretamente sobre as


paredes da edificação, sobrecarregando, ainda mais, as paredes.
COMISSÃO DE SISTEMATIZAÇÃO

Eng. Alexandre Duarte Gusmão (Universidade de Pernambuco)

Eng. Carlos Fernando de Araújo Calado (Universidade de Pernambuco)

Eng. Carnot Leal Nogueira (Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco)

Eng. Fernando Artur Nogueira Silva (Universidade Católica de Pernambuco)

Eng. Romilde Almeida de Oliveira (CREA-PE)

Eng. Sérgio Osório Cerqueira (Assoc. Bras. de Engenharia e Consultoria


Estrutural)

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