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Dedicatória
Epígrafe
Aviso — bwc
Um
Dois
Três
Quatro
Cinco
Seis
Sete
Oito
Nove
Dez
Onze
Doze
Treze
Quatorze
Quinze
Dezesseis
Dezessete
Dezoito
Dezenove
Vinte
Vinte e um
Vinte e dois
Epílogo
Obrigada
Dedicatória
Essa presente tradução é de autoria pelo grupo Bookworm’s Cafe. Nosso grupo
não possui fins lucrativos, sendo este um trabalho voluntário e não remunerado.
Traduzimos livros com o objetivo de acessibilizar a leitura para aqueles que não
sabem ler em inglês.
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construtiva e sem desrespeitar o trabalho da nossa equipe.
Um
Mesmo que minha casa fique a uma curta distância do meu escritório, ainda
assim levo 45 minutos para me livrar dos e-mails, pegar minhas coisas e começar
minha caminhada para casa. Eu deixo uma nota para lembrar de falar com Hank
e ver se ele notou algum problema com as árvores no pasto sul. Ou se ele notou a
família de guaxinins destruindo o celeiro. Ou se teve problemas com o
distribuidor de fertilizantes.
E se sim, por que ele não me disse nada?
Porque ele sabia que este lugar era um poço de dinheiro e ele queria se mudar
para a Costa Rica com sua esposa. Minha mente relembra os pôsteres que tive
que retirar das paredes do escritório. Selvas verdes brilhantes e cachoeiras
exuberantes, praticamente desbotadas de branco pelo tempo em que ficaram
penduradas.
Eu não estava sendo exatamente sensata quando comprei este lugar. Cega
pela positividade, provavelmente. Focada demais na cabana bonitinha que fica
no canto da propriedade, visões de me aconchegar em frente à lareira de pedra
com uma caneca de chá dançando na minha cabeça. Imaginando a primeira neve
do ano, caminhando por fileiras e mais fileiras de árvores. Um lugar só meu. Um
lugar ao qual pertencer, finalmente.
Enquanto crescia, minha mãe e eu estávamos sempre em movimento,
perseguindo a próxima oportunidade. Eu tive dificuldades para encontrar
estabilidade quando aparecemos em uma nova cidade para um emprego de
garçonete ou para um emprego temporário durante a temporada. Não foi por
falta de tentativa da parte da minha mãe. Ela sempre fez o seu melhor para tornar
as coisas especiais e conectadas. Ela nos manteve em um lugar pelo tempo que
conseguiu, meticulosamente empacotando nossa pequena quantidade de coisas
enquanto nos arrastamos de um lugar para outro. Ela pendurou a plaquinha de
boas-vindas em ponto cruz no mesmo lugar todas as vezes, usou os mesmos
panos de prato pontilhados com limões e limas bordados. Mas sempre tive medo
de me enraizar, imaginando se seria à toa. Se no mês seguinte teria que
desenraizar e começar tudo do zero.
Uma rajada de vento sussurra através das árvores e levanta meu cabelo,
roçando minhas bochechas enquanto minhas botas esmagam as folhas dos
grandes Bordos que beiram a propriedade. Há uma trilha que serpenteia por um
pequeno campo e a borda externa do canteiro de abóboras que liga a casa ao
escritório. É uma caminhada de cinco minutos quando o tempo está bom, mas
me vejo andando mais devagar essa noite, observando a forma como o sol dança
mais baixo no céu, a luz refletindo nas folhas. Vermelhos, laranjas e amarelos
dançam em um caleidoscópio de cores ao meu redor.
Provavelmente não é coincidência eu ter comprado o lugar em Outubro. Há
um tipo especial de magia em noites como essa, um certo tipo de nostalgia
quando o passado se mistura com o presente e flerta com o futuro. Eu posso
sentir o cheiro da fumaça vinda da madeira usada na lareira que Beckett tem em
sua casa, situada na base das colinas, e ver a nuvem de fumaça que se ergue de sua
chaminé. Os galhos farfalham acima de mim e algumas corujas chirriam, um som
solene quando o sol se põe mais baixo. Por um único momento perfeito, sinto
que estou naquela foto que minha mãe costumava colar na parede de qualquer
apartamento que chamávamos de lar.
Uma fazenda. Um único trator vermelho. Uma garotinha com sujeira nos
joelhos e uma coleção perfeita de árvores de Natal atrás dela.
Tem sido um sonho antes mesmo de eu ter coragem de realizar sonhos.
Uma luz ao longe chama minha atenção, um brilho quente se projetando sob
a pedra na minha calçada. Enquanto dou a volta na última árvore que delimita a
borda da minha propriedade pessoal, minha porta da frente se abre e Luka sai,
descansando o ombro contra o corrimão. Ele parece quase comicamente grande
na pequena varanda na frente da minha pequena casa com minha pequena
toalha de cozinha entre as mãos. Ele a joga sob o ombro e cruza os pés nos
tornozelos, usando apenas meias. Sorrio quando percebo que ele está usando as
meias que comprei para ele no último Natal, aquelas com as garrafinhas de
sriracha3. Sua boca se ergue em um pequeno sorriso, aquele que puxa seu lábio
inferior um pouco mais para baixo e para a esquerda, o vento de outubro
despenteando seu cabelo infinitamente bagunçado. Seus calorosos olhos
castanhos refletem o sol se pondo, fazendo-os parecer quase âmbar na luz fraca.
— Agora estamos arrombando e entrando? — Acelero o passo, sentindo um
cheiro de tomate e manjericão. Se ele fez as almôndegas de sua avó, talvez eu
nunca o deixe ir embora.
— Não é arrombamento se você tiver uma chave — ele diz de volta. Eu rio e
seu sorriso se transforma em algo bonito. É um momento que quero gravar em
minha alma para as noites em que me sinto um pouco solitária e muito triste.
Respiro fundo e me agarro ao momento. Os rosas e roxos que sombreiam o seu
rosto, o esticamento de seu moletom no seu peito, seus pés com meias fazendo a
madeira envelhecida da minha varanda ranger. A magia está nos detalhes, minha
mãe sempre dizia. E esses detalhes são perfeitos.
Meus pés encontram o último degrau, e ele me encontra no meio do
caminho, dois braços fortes envolvendo meus ombros em um abraço de urso. Ele
cheira a marinara e ao sabonete de baunilha que mantenho ao lado da pia da
cozinha, e de repente, sem explicação, quero chorar.
— E aí, La La — ele descansa o queixo em cima da minha cabeça, os braços
apertando com força. — Muito tempo sem te ver.
Enrolo meus braços em suas costas e pressiono minhas mãos em suas
omoplatas. Eu expiro lentamente pelo nariz e nos balanço para frente e para trás.
— Você me viu duas semanas atrás — murmuro em algum lugar em seu
peito. — Nós sentamos no sofá e assistimos a Independence Day duas vezes
seguidas porque você tem uma obsessão por Jeff Goldblum.
— Algo sobre aquele traje de voo, não estou certo? — Ele se afasta, mas
mantém as mãos no topo dos meus ombros. Seus olhos castanhos vagueiam pelo
meu rosto. Tão perto assim, consigo ver as sardas que cobrem o seu nariz e se
espalham como constelações sob seus olhos. Eu reprimo um suspiro, e ele franze
a testa. — O que está acontecendo, Stella?
O pânico ainda está lá. E aí eu adio. Dou um tapinha em seus lados e fico na
ponta dos pés, tentando ver por cima do ombro.
— Alimente-me primeiro?
Ele franze a testa, mas concorda com a cabeça, deslizando as mãos pelos meus
braços em uma série de apertos. Ele tem feito isso desde o primeiro dia, quando
eu tropecei direto para ele, um um-dois-três de suas mãos movendo-se pelos
meus bíceps, cotovelos, mãos. Assim que entramos, ele retorna para a cozinha e
eu tiro meus sapatos perto da porta, notando suas botas já cuidadosamente
enfiadas abaixo da mesinha de entrada. Jogo minhas chaves em cima das dele no
prato azul de cerâmica que fiz como um projeto da aula de arte no ensino médio
e prendo meu cachecol no gancho ao lado de sua jaqueta jeans preta.
E não é bobagem amar como as coisas de alguém se parecem do lado das
suas? Pequenos pedaços de uma vida vivida em paralelo.
Encaro sua jaqueta por um minuto muito longo antes que ele grite da
cozinha, pedindo uma garrafa de tinto que guardo no armário do corredor. Eu
ficaria impressionada com sua memória se ele não fosse o único a trazer este
vermelho e escondê-lo sob meus suéteres alguns meses atrás.
Entro na cozinha com a garrafa de vinho na mão, outra debaixo do braço.
Essa conversa provavelmente tomará um rumo melhor se eu tiver um pouco de
coragem líquida. Ele olha por cima do ombro quando eu coloco as duas para
baixo, uma mecha de seu cabelo caindo na frente de seu olho, aquele maldito
pano de prato com os gnomos de jardim enfiados no bolso de trás. Ele parece
absolutamente ridículo e deliciosamente perfeito, jeans desgastados e moletom
desbotado, mangas arregaçadas até os cotovelos.
— É uma noite daquelas?
— Um ano daqueles — murmuro em resposta, vasculhando minha gaveta
atrás do abridor de garrafas. Luka observa meu esforço por aproximadamente 26
segundos antes de abandonar o que quer que esteja mexendo no fogão e ocupar
o meu espaço pessoal, seu peito pressionando meu lado enquanto ele estende a
mão por cima das nossas cabeças. É repentino, seu corpo contra o meu, e eu
inclino minha cabeça para trás para observar seu rosto. Desse jeito eu poderia
morder seu bíceps se quisesse, a curvatura dele a apenas dois centímetros do meu
nariz.
Seus olhos vasculham meu rosto, um sorriso curvando seus lábios para cima.
— Em que diabos você está pensando?
— Coisas diabólicas. — Um rubor sobe pelas minhas bochechas e eu belisco
seu lado. Ele estremece, mas continua batendo em cima dos armários. — O que
você está fazendo aí em cima?
Ele ergue um abridor de vinho em resposta, e eu estico meu pescoço para
olhar acima dos meus armários com uma carranca.
— O que mais você está escondendo lá em cima?
— O que quer que eu não queira em suas mãozinhas.
Faço uma nota mental para pegar o banquinho mais tarde e investigar. Ele
pega a garrafa de vinho da minha mão e, com uma série de movimentos suaves
que sinceramente não deveriam parecer tão atraentes, ele a abre. Ele estende a
q p
mão por cima do meu ombro e nos serve uma taça para cada, comigo ainda
colada em sua frente. O topo da minha cabeça mal alcança seus ombros e eu
posso ver a saliência de suas clavículas saindo de seu moletom. Eu as encaro com
foco a laser.
— O jantar estará pronto em alguns minutos — ele murmura, suas palavras
um sopro quente contra a minha pele.
Eu pisco e alcanço meu vinho, agarrando-me a ele como uma tábua de
salvação. Eu notei essas coisas antes, claro, mas agora parece que tudo sobre Luka
está sob uma lupa. Enxergando novas cores, eu acho.
— Obrigada — eu olho ao redor da minha cozinha como se eu nunca tivesse
a visto antes, atordoada e confusa. — Você precisa de ajuda com alguma coisa?
Minha voz soa estranhamente formal, como se eu devesse adicionar um
“bem, senhor” ao final da frase. Luka estreita os olhos para mim mais uma vez e só
aponta para a mesa em resposta. Sigo a direção em que ele aponta sem comentar
e me acomodo na trêmula cadeira de jantar de meados do século passado, que
absolutamente não combina com a mesa da minha casa de fazenda. Eu encaro e
encaro o tampo da mesa e faço o meu melhor para não surtar, mas é difícil
manter a calma quando o que estou prestes a pedir para o meu melhor amigo
pode fazê-lo rir na minha cara, sair correndo pela porta, ou ambos.
No momento em que Luka desliza um prato cheio de espaguete e
almôndegas na minha frente, eu esvaziei minha taça de vinho e me transformei
em um foguete emocional, pronto para explodir.
— Beck disse que as árvores estão bonitas — Luka desliza na minha frente,
aconchegando-se na cadeira. — Bom, além daquelas do pasto no portão sul.
Não preciso do lembrete. Meus olhos vagam do meu prato cheio de
espaguete para o punho de seu moletom esticado ao redor de seu antebraço. Eu
rapidamente redireciono meu olhar para a garrafa de vinho no balcão da cozinha
e o queijo parmesão ao lado dela. Espero que não tenha vindo da minha
geladeira.
Eu aponto para ele com meu garfo, a minha perna dançando debaixo da
mesa.
— De onde veio isso?
Luka me encara como se eu fosse louca.
— Da mercearia.
— Legal. Bacana, maneiro.
— Stella — Luka coloca o garfo na borda do prato e se inclina para frente,
me alcançando como se quisesse pegar minhas mãos nas dele. Não tenho certeza
se isso ajudaria, sendo bem sincera. Ele se afasta, suspira e esfrega os nós dos
dedos contra a mandíbula. Ele pega o garfo. — O que está acontecendo com
você?
— Por que a pergunta?
Ele arqueia uma sobrancelha.
— Acho que você moveu esta mesa para o outro lado da cozinha, por
exemplo.
— Eu só… eu preciso te pedir uma coisa.
— Você precisa de um rim?
— O quê? Não. — Embora um transplante de órgão pareça preferível agora.
— Você está agindo como se precisasse de um rim.
— Eu preciso que você namore comigo — eu deixo escapar. Minhas palmas
estão suando, meu coração está em algum lugar na minha garganta e meu
estômago se afastou completamente da conversa. Luka, ao contrário de mim,
nem se mexe. Ele apenas gira calmamente o garfo ao redor e ao redor, pegando o
fio de espaguete mais longo do mundo.
— Ok. — Ele enfia o garfo na boca.
— É de mentirinha — eu praticamente grito para ele. Não sei por que estou
falando tão alto. Faço um esforço consciente para diminuir o volume. — Eu não
iria… eu queria perguntar se você fingiria namorar comigo. A parte de “fingir” é
importante.
Ele dá de ombros.
— Claro.
Claro. Claro. Estou à beira de um completo colapso mental, mas Luka diz
claro. Eu vejo outra almôndega elegantemente cortada desaparecer por trás de
seus lábios. Eu apunhalo agressivamente uma das minhas e ela voa até a metade
da mesa. Eu a ignoro, espeto outra e a enfio inteira na minha boca.
— Fé fá fefeifa fa fua fó?
Luka calmamente toma um gole de seu vinho, ignorando o agravamento da
minha loucura.
— Perdão?
Eu engulo e gentilmente acaricio os cantos da minha boca com o guardanapo
que repousa no meu colo. Sou uma dama.
— É a receita da sua vó?
— É sim
— Você acha que ela me adotaria?
— Ela me jogaria na rua e adotaria você em um segundo. — Luka bufa uma
risada. — Nós dois sabemos disso. Aliás, obrigado por trazer o jantar para ela na
semana passada. Ela me ligou setenta e cinco vezes para se gabar disso e perguntar
o que você usa em seus Snickerdoodles.
Eu não assei aqueles Snickerdoodles. Mas nem morta que eu vou contar isso
para a avó de Luka, que faz sua massa do zero. Uma vez ela veio até minha casa,
viu um pote meio usado de marinara industrializada na minha geladeira e olhou
no fundo dos meus olhos enquanto o jogava no lixo.
Eu gostaria que ele não me agradecesse por passar tempo com sua família.
Não é um sofrimento. Ir visitar a sua avó e a sua mãe e, às vezes, a sua tia Gianna,
que mora a duas cidades, é uma boa distração do fato de que minha única família
decide comemorar o Dia de Ação de Graças três semanas antes do normal, só
para não ter que explicar minha existência.
Além disso, a avó dele é fodona.
— Eles eram os Snickerdoodles de Layla, então você teria que perguntar a
ela.
— Estou mais interessado em saber por que você precisa fingir um namoro
comigo, na verdade — ele faz uma pausa com outro gole dramático de vinho.
Olho tristemente para o meu copo vazio. — Você não está namorando Wyatt?
Eu o encaro. Encaro e encaro e encaro. Como é possível alguém estar tão
complexamente entrelaçado em minha vida e ainda não perceber que não falei
sobre Wyatt em uma curta eternidade?
— Luka — eu pisco para ele. — Nós terminamos há mais de um ano.
Luka é uma paródia do comicamente chocado. Sobrancelhas franzidas, garfo
congelado a meio caminho de sua boca. Seria engraçado se não fosse tão
chocante.
— O quê?
— Sim, depois do festival da colheita do ano passado. Ele me mandou uma
mensagem.
— Ele… espera aí, ele terminou com você por mensagem?
Wyatt tinha sido gentil e doce, se não um pouco imaturo. De muitas
maneiras, foi como voltar ao meu eu adolescente e namorar o capitão bonitinho
do time de futebol. Muitas preliminares pesadas, um rótulo inútil e zero apego
emocional. Ele me mandou uma mensagem depois do festival do ano passado
g p p
com um simples: Você é super legal, mas acho que queremos coisas diferentes.
Amigos? :)
Super legal.
O emoji sorridente fechou o acordo para mim. Qualquer um que continue a
usar emoticons para transmitir emoções provavelmente está em algum lugar no
espectro do assassino em série. Eu tinha concordado e isso era… bem, era isso.
— Eu te contei isso.
Ele me encara.
— Você não me contou isso.
Eu abaixo meu garfo e me inclino para a esquerda, pegando a garrafa de
vinho.
— Luka, como diabos eu teria todo esse tempo para gastar com você se eu
estivesse namorando alguém?
Ele pisca, seu olhar distante como se estivesse revivendo mentalmente o
último ano de sua vida. Sua boca se move silenciosamente, e então ele pega sua
taça de vinho, esvaziando-a de uma vez.
— Ok, então sem Wyatt.
— Sem Wyatt. Sem.
— Então eu sou sua única opção?
Eu não sei por que ele parece tão chateado com isso.
— Se isso faz você se sentir melhor, eu pedi para o Beckett primeiro. Ele disse
não. — Sua carranca se aprofunda, aquele pequeno buraco entre as sobrancelhas
aparecendo. — Eu ia pedir para o Jesse, mas…
— Você ia pedir para o Jesse antes de pedir para mim? Cristo, Stella. —
Agora é a vez dele esfaquear uma almôndega como se ela tivesse o ofendido
pessoalmente. — Você deveria ter me pedido primeiro. Agora sinto que sou sua
última opção.
Não digo a ele que ele é, de fato, minha última opção. Bem, tirando o serviço
de acompanhantes.
— Desculpe, Luka. — Eu aperto minhas mãos na minha frente em cima da
mesa, satisfeita quando soo apenas um pouco sarcástica. — Você queria que eu
me esforçasse mais para te pedir para ser meu namorado falso?
— Não teria te matado — ele murmura. Ele passa as duas mãos pelo cabelo,
para frente e para trás e para trás novamente, um tufo do lado esquerdo se
destacando. É um gesto tão familiar que envia uma pontada de melancolia direto
no meu peito.
p
— Luka, me escuta — eu engulo duas vezes, hesitante. Isso parece
importante, a reação dele. Se ele já está agonizando, eu não quero...
Não quero estragar o que Luka e eu temos.
Eu enrolo minhas mãos em volta dos meus talheres.
— Essa foi uma ideia idiota. Se você não quer fazer isso...
— Não, não é isso. Desculpa, eu só... — Ele se interrompe ao engolir de volta
as palavras, os olhos castanhos fixos no prato. Ele pega o garfo de volta, enrola,
enrola, enrola um pouco de macarrão. — Continuo mudando o assunto. Por
que você precisa de um namorado falso?
É um redirecionamento, mas eu permito da mesma forma que ele permitiu
minha procrastinação mais cedo. Eu explico o sorteio das redes sociais para ele,
tomando cuidado para deixar de fora as partes sobre o quanto nossa fazenda
precisa desesperadamente do prêmio em dinheiro. Ao invés disso, concentro-me
na exposição nacional, na aquisição de novos clientes e, esperançosamente, em
uma presença online que possamos canalizar. No final, parece que estou fazendo
uma apresentação para um conselho, e considerando o olhar vidrado de Luka,
ele provavelmente concorda.
Ele é um cara de dados. Eu provavelmente deveria ter mostrado a ele um
monte de números.
Ele balança a cabeça ligeiramente quando eu termino.
— Acho que é a primeira vez que ouço as palavras ingresso e egresso saindo
da sua boca.
— Sim, provavelmente. — Eu penso por um segundo. — Embora eu sinta
que provavelmente falei isso quando estava reclamando da feira estadual.
Ele ri disso. Ele está muito familiarizado com minhas opiniões sobre a feira
estadual.
Ficamos em silêncio por um momento, com apenas o som de galhos das
árvores arranhando as minhas janelas preenchendo o espaço entre nós. O vento
assobia pelas frestas ao redor da porta, e penso em acender a lareira. Vinho em
frente a lareira soa excelente.
Luka se recosta em sua cadeira e pondera. Estou contente em deixá-lo com
seus pensamentos enquanto trabalho para desembaraçar os meus.
— Você acha que isso vai ajudar? O fingimento?
— Sim — eu respondo sem hesitação, a resposta surgindo de dentro de mim.
Não sei como sei que Luka é a chave para tudo isso, mas eu sei. Esse
relacionamento falso idiota e bobo e clichê seja como for, é a faísca que
j q
precisamos. É a faísca que eu preciso. Eu limpo minha garganta. — Eu realmente
acho.
Ele me conhece bem o suficiente para entender que há algo que eu não estou
contando a ele, mas ele também me conhece bem o suficiente para não me
pressionar. Parece que corremos maratonas verbais consecutivas desde que entrei
pela porta, e acho que estamos bem em deixar a conversa onde está durante a
noite.
Luka acena com a cabeça, uma decisão tomada.
— Então é isso que faremos.
Eu imito a sua posição e descanso no encosto da minha cadeira, agarrando-
me a algo que me deixará com os pés no chão. Algo que fará eu me sentir como
se não estivesse cometendo um erro gigante.
Exceto que nada vem à mente.
Quatro
Eu acordo na manhã seguinte com uma dor de cabeça no fundo dos olhos e um
aperto no estômago que é o resultado de muitas balinhas Fini, e provavelmente
uma decisão precipitada de forçar meu melhor amigo em um relacionamento de
mentira. Você pode ter uma ressaca de más decisões?
Parece ser possível.
À luz do dia, a decisão parece um erro evitável. Um namorado não vai
aumentar ou diminuir as minhas chances de ganhar esse prêmio em dinheiro. Eu
nem sei se Evelyn St. James leu a minha inscrição toda, muito menos o único
trecho na minha parte pessoal em que eu disse que era dona e administrava a
fazenda com o meu namorado.
A menos que ela tenha lido, e você esteja automaticamente eliminada por
mentir.
Eu pesquisei. Assim que soube sobre o concurso, vasculhei o feed de Evelyn.
Procurei por trends em seu conteúdo, o tipo de negócios que ela gostava de
divulgar. Ela sempre tem uma história para contar e ela ama romance. Suas
últimas três publis foram todas histórias de amor. O casal no Maine com sua
cama e café da manhã. Os melhores amigos durante a vida inteira que
administram cruzeiros históricos de seu pequeno cais na Carolina do Sul. Os
noivos que se conheceram em um encontro às cegas e decidiram fundar sua
própria vinícola. Talvez desta vez, pela primeira vez, eu queira que minha história
seja algo a mais do que uma história triste. Eu enfio as minhas palmas em meus
olhos e chuto as minhas pernas para fora dos meus cobertores bagunçados. Estou
cansada de ser a triste.
Eu penso em Beckett e Layla. A pilha de contas que estão ficando cada vez
mais difíceis de pagar. Penso no portão de ferro forjado que dá as boas-vindas à
fazenda, nos dois laços vermelhos gigantes que coloquei nele no ano passado.
Lembro-me do dia que recebi as chaves, como o som das correntes enferrujadas
caindo da grade quase me fez chorar. Penso em fechar aquele portão e colocar as
correntes de volta nas grades e quase tenho vontade de chorar por um motivo
totalmente diferente.
Eu tenho que tentar. Essa é a minha melhor chance. Mesmo que… mesmo
que pareça bobo, é a história que quero contar para esse lugar.
Quero que Evelyn St. James veja todas as coisas que fizeram eu me apaixonar
por esta fazenda no primeiro inverno que a visitei com minha mãe. Quando eu
tinha dezesseis anos e estava programada para odiar a maioria das coisas, mas me
apaixonei pelo espaço aberto que cheirava a bálsamo e fatias de laranja e apenas
uma pitada de canela. Eu quero que ela caminhe pelas fileiras e mais fileiras de
árvores, assim que o sol começa a se pôr, onde tudo está quieto o suficiente para
ouvir a forma que as suas botas rangem no chão congelado. Onde agulhas de
pinheiro se enredam no seu cabelo e você sente como se fosse a única pessoa no
mundo. Eu quero que ela pegue um chocolate quente da padaria de Layla, vá
patinar no gelo no ringue que Beckett montou no inverno passado, e veja as
crianças se perseguirem no celeiro.
Eu quero que ela veja a magia.
— Eu meio que esperava que você não estivesse sozinha.
É uma prova de quão imersa estou em meus pensamentos o fato de que eu
nem sequer recuo quando Layla aparece na porta do meu quarto, um gorro azul
marinho puxado para baixo em sua cabeça. Além disso, um sinal de que devo
repensar quem tem a chave da minha casa.
Eu franzo a testa para ela, minha cabeça meio debaixo do meu travesseiro,
minhas pernas perdidas entre os lençóis. Parece que lutei dez rounds nessa cama.
— Quem que estaria aqui comigo?
Ela revira os olhos e tira os seus sapatos, subindo na cama sem hesitar. Há um
rearranjo de membros, uma cotovelada no meu plexo solar, e então Layla está
enrolada ao meu lado, seus joelhos pressionados contra meu quadril. Eu amo
que ela exija toque para a maioria das conversas, que ela nunca hesite em
reafirmar com um abraço rápido. Ela puxa meu edredom fofo bem abaixo do
queixo e me dá uma olhada.
— Você sabe quem.
Eu pisco para ela. Eu não faço ideia.
— Quem?
— Acho que é óbvio que estou falando do Luka — ela passa a ponta dos
dedos pelo meu braço e desce novamente. — Passei pela casa da mãe dele no
p ç p
caminho para cá e vi o carro dele na garagem.
— Você viu o carro dele na casa da mãe dele, mas presumiu que ele estava
aqui comigo?
— Eu pensei que ele tivesse ido e dado meia volta — ela encolhe os ombros,
se afundando ainda mais nas cobertas, até que eu possa ver apenas os seus olhos.
Eles estão verdes hoje, refletindo a cor das árvores do lado de fora da janela do
meu quarto. Sua voz surge abafada debaixo dos meus cobertores. — Eu não sei,
ele poderia ter saído às escondidas.
— Ele é um homem adulto. Por que ele teria que sair escondido?
Ela suspira.
— Eu não sei, Stella, deixe eu mergulhar nessa fantasia. Estou torcendo por
vocês dois desde que os conheci.
Isso certamente explica todos os gestos ligeiramente vulgares que ela faz pelas
costas de Luka toda vez que ele nos visita na fazenda.
Eu franzo a testa. Layla percebe e pressiona o dedo indicador diretamente na
covinha no canto da minha boca. Ela puxa, tentando forçar um sorriso por conta
própria, e bufa quando eu faço uma cara grotesca. Sua frustração persistente
derrete, e uma suavidade em seu olhar surge no lugar.
— Você pediu para ele?
Concordo com a cabeça e pego um fio solto no meu edredom.
— E?
— Ele disse que faria isso — murmuro dentre o algodão, tendo lentamente
puxado o travesseiro sob todo o meu rosto. Ontem à noite, quando pedi a Luka,
eu estava tão obcecada com a ideia de ele dizer “não” que nem considerei as
implicações de ele dizer sim. Fingir um namoro. Teremos que fingir outras coisas
também. Fingir romance. Fingir carinho.
Será que Luka entende? Nós realmente não conversamos muito ontem à
noite depois da nossa conversa no jantar. Eu fui bastante agressiva com não
discutir qualquer detalhe, mortificada comigo mesma por pedir. Eu estava com
muito medo de falar mais sobre isso. Fazer com que ele mudasse de ideia. Ou
pior, ter que explicar a situação em detalhes.
Colocamos Sintonia de Amor e nos emaranhamos no sofá. Eu dormi com
meus pés enfiados embaixo da sua coxa e a minha cabeça no apoio de braço.
Layla puxa uma mecha do meu cabelo.
— Então por que você está tão triste, querida?
Vergonha, provavelmente. Um pouco de solidão. Medo da mudança, terror
absoluto com a ideia de estragar tudo. Luka descobrir a verdade sobre meus
sentimentos por ele.
Escolha uma opção, Layla. Pode ser qualquer uma.
Em vez disso, expiro longa e lentamente no travesseiro e deixo esse gesto
responder por mim. Layla gentilmente ergue o travesseiro do meu rosto e o
coloca sob sua bochecha.
— Acho que é hora de conversarmos sobre isso.
— Não, obrigada.
— Stella.
Eu nego com a cabeça.
— Eu não quero. Que tal falarmos sobre você e Jacob ao invés disso?
Seus olhos se estreitam em fendas. O histórico de Layla com romance é
interessante, para dizer o mínimo. Ela tem uma tendência a escolher o pior tipo
de cara.
— Nós não estamos falando sobre mim agora. Estamos falando sobre você.
— Poderíamos estar falando sobre você.
— Você tem sentimentos por ele, Stella.
Eu sei. Claro que eu sei disso. Só não estou disposta a fazer algo com esses
sentimentos.
— Eu estou…
— Você tem grandes sentimentos por Luka, e ele tem grandes sentimentos
por você, e eu não entendo por que nenhum de vocês nunca fez nada com isso.
É fácil para Layla. Ela sempre foi extremamente confiante sobre quem ela é e
o que ela sente. Apesar de tudo que ela passou, ela sempre conseguiu sacudir a
poeira e seguir em frente com um otimismo ensolarado. Ela é graciosa até em
suas decepções. Eu não sou.
E as coisas com Luka são ótimas, até mesmo incríveis, do jeito que são.
— Querida — seus olhos vão e voltam entre os meus, um sorriso triste
puxando o canto de seus lábios. — Só porque você se permite amar alguém, não
significa que eles irão embora.
Mas com certeza não significa que eles vão ficar.
— Eu acho… — Eu engulo em torno do aperto na minha garganta e tento
canalizar um pouco da confiança de Layla. Eu me enrolo de lado e imito a sua
posição, as mãos cruzadas embaixo do meu queixo. Parece que estamos em uma
nuvem, debaixo do meu edredom do jeito que estamos. Sem peso. Aqui, desse
j q p q
jeito, confesso meus maiores segredos. — Acho que se fosse para algo acontecer
entre Luka e eu, já teria acontecido.
Layla não gosta dessa resposta. Eu posso ver isso no jeito que seus lábios se
torcem.
— Talvez ele esteja esperando você dizer alguma coisa.
Eu nego com a cabeça tristemente. Uma vez, vi Luka caminhar até uma
garota em um bar, apoiar a mão no encosto da cadeira e dizer algo a ela que fez
seu queixo cair para trás com uma risada. Ele estava confiante, charmoso. Eles
saíram juntos nem meia hora depois. Luka nunca hesitou em verbalizar o que ele
quer. Se eu fosse o que ele queria, acho que eu já saberia.
— Eu acho que é isso o que devemos ser — eu me aninho ainda mais em
meus cobertores, piscando contra a sensação de formigamento nos cantos dos
meus olhos. — Nós devemos ser amigos. Apenas amigos.
— Então por que você mentiu em sua inscrição? — É uma acusação gentil,
mas eu sinto a dor disso, entretanto. — Beckett estava certo. Você não precisava
fazer isso.
— Eu não planejei tudo isso, se é isso que você quer dizer. Eu não o
enganaria para fingir ser meu namorado. Eu não... — Eu esfrego as duas mãos
pelo meu rosto. — Não estou tão desesperada.
Eu não estou. A mentira na inscrição… eu só queria que esse lugar parecesse
romântico. Caseiro. Quando entreguei a parte da descrição pessoal, nem pensei
que teríamos uma chance. Parecia um detalhe tão pequeno e inofensivo. Eu só
queria… eu queria que tivéssemos a melhor chance possível.
Dedos frios se entrelaçam nos meus, a pressão de seus anéis contra a minha
pele deixando pequenas marcas.
— Querida, não. Não foi isso que eu quis dizer.
— Então o que você quis dizer?
Seus olhos são gentis enquanto ela coloca meu cabelo atrás da minha orelha.
— Só estou dizendo que acho que isso pode ser algo que vocês dois estavam
esperando.
Uma hora depois, estou de pé na fonte de pedra que marca a entrada do nosso
centro da cidade. Não tenho certeza se você pode levar em consideração como
centro da cidade um pequeno conjunto de prédios consistindo em uma padaria,
uma pizzaria e uma livraria, mas é assim que se chama desde que moro aqui.
Luka gosta de rir disso quando estamos juntos em Nova York e falar sobre como
ele sente saudade das luzes brilhantes do centro de Inglewild, enquanto
caminhamos pelas ruas movimentadas cheias de homens e suas pastas, carros
ambulantes de comida e casais rindo saindo de bares.
Vale a pena lembrar que a última vez que Luka Peters me disse que ele tinha
um plano, acabei bêbada de tequila, vestindo uma saia hula e cantando karaokê
pop dos anos 90 em um restaurante 24 horas. Luka sorri com a memória quando
eu o lembro disso, sua mão encontrando a minha e entrelaçando os nossos
dedos.
— Mas você se divertiu, né?
Claro. Eu também tive uma ressaca por quase cinco dias depois disso. Eu tive
que me deitar em um milharal no dia seguinte, apenas para evitar que o
horizonte rodasse.
— Pense nisso como um teste — ele balança nossas mãos para frente e para
trás, nossos passos em sincronia enquanto caminhamos para a Main Street. —
Vamos aparecer em algumas lojas. Dizer oi e começar a partir daí.
Eu luto contra a vontade de tirar minha mão de seu aperto e voltar correndo
para a fazenda. Isso parece repentino. E idiota.
— Não deveríamos ter nos preparado para isso ou algo assim?
Ele murmura algo baixinho que não consigo entender e solta minha mão
para jogar seu braço sobre meu ombro ao invés disso. Eu resmungo, mas me
aninho facilmente ao seu lado. Sempre fomos carinhosos um com o outro. Essa
intimidade física entre nós não é novidade. O resultado, eu acho, de duas pessoas
que confiam fortemente no toque físico como método de conforto e
comunicação.
Mas com a história que estamos tentando vender, parece diferente. Um zíper
de consciência ilumina a minha espinha e se instala onde seu braço repousa
pesadamente nas minhas costas. Formiga onde seus dedos brincam
preguiçosamente com o cabelo espreitando para fora do meu chapéu.
— O que você teria feito?
Eu balbucio, distraída. Estou ocupada devolvendo a encarada do Sr. Hewett,
o bibliotecário da cidade. Ele parou na metade dos degraus da biblioteca,
vassoura na mão enquanto limpa as folhas que se amontoam na passagem de
pedra. Mas ele está nos encarando como se estivéssemos fazendo algo indecente.
Eu aceno e continuamos andando.
— Para se preparar — Luka continua, sem perceber a estranha interação. —
Como você teria se preparado para isso?
— Não sei. Provavelmente entender a nossa história, por exemplo. — Olho
por cima do ombro, meu nariz pressionando o braço de Luka. O Sr. Hewett
ainda está nos assistindo andar pela rua, seus óculos de tartaruga praticamente
embaçando.
— Já temos uma história.
— Ah, é? — Paro de me preocupar com os olhos arregalados do bibliotecário
velho e olho para Luka. Sua mandíbula está cerrada. Ah, cara, eu já vi esse nível
de determinação antes.
2009. A feira de verão. Mais de 75 dólares em ingressos de joguinhos para
liberar o maior número possível de peixinhos dourados.
2016. Jogos Olímpicos do Rio. Quando ele se convenceu de que poderia
correr um quilômetro e meio em quatro minutos.
2018. O pequeno apartamento-estudio que eu tinha, em cima da garagem de
troca de óleo. Sua súbita necessidade de colocar fechaduras em todas as janelas e
duas na porta.
— Sim — diz ele. Viramos à esquerda na rua principal. — Menino conhece
menina. É uma história bem simples.
Eu estou desconfiada.
— Tudo bem.
— Veja, a mãe do menino decide que quer se mudar para uma cidade
pequena na costa leste. Ela quer alguma coisa diferente, alguma coisa nova, e
continua falando sobre Pequena Florença. O menino realmente não entende,
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mas ele vai com ela. Ajuda-a a se estabelecer. Quando eles estão fazendo sua
mudança, menino conhece uma menina. Esbarra direto nela. E ela é... — ele
tosse, seu braço apertando meu ombro. — Ela é incrível. Inteligente, engraçada,
bonita para cacete. Mas ela também está triste. Então ele compra uma cerveja e
um queijo grelhado para ela e depois disso… bem, depois disso ele continua
esbarrando nela. Compra-lhe mais queijo grelhado. E é isso.
É isso. Eu engulo em seco. É a nossa história, mas... diferente. Ele me
comprou um queijo grelhado e uma cerveja. Ele me disse que era um pedido de
desculpas por praticamente me derrubar. Todos aqueles meses, tudo parecia
como nadar debaixo d'água, e então Luka estava lá e minha cabeça subiu na
superfície.
Eu olho para ele, presa em uma parte específica dessa história.
— Você me acha bonita?
Ele franze a testa para mim enquanto continuamos andando.
— Claro que eu acho. Eu já te disse isso antes.
Eu balanço minha cabeça, um pouco atordoada. Olho para o passado e tento
me lembrar daquele dia e do que aconteceu depois. Criar uma amizade com
Luka foi fácil. Na metade do tempo não me lembro como era antes dele. Parece
que ele sempre fez parte da minha vida. E não é à toa, depois de quase uma
década.
E embora estejamos confortáveis um com o outro como todos os melhores
amigos estão, eu não acho que ele já me chamou de bonita. Luka sempre
pareceu… alheio não é a palavra certa. Acho que só pensei que ele não pensava
em mim dessa maneira. Amigos não pensam em amigos desse jeito.
Mas você com certeza nota as clavículas dele, meu cérebro fornece, útil. Nunca
perde uma olhadinha para esses bíceps.
— Você não disse.
— Ah. — Sua carranca se aprofunda. — Você é bonita, La La.
Ele diz isso quase como se estivesse bravo por causa disso. E acrescentado
àquela carranca, bem... É provavelmente o elogio mais estranho que já recebi.
No entanto, uma vez um homem me disse que eu tenho dentes bonitos. E a
senhora do supermercado duas cidades acima que me disse que tenho
panturrilhas fortes.
— Mas se você quer uma história angustiante sobre como eu salvei você de
uma lata de lixo barulhenta rolando em sua direção no meio da rua enquanto sua
bota estava presa em um bueiro… à vontade.
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— Isso me parece familiar — murmuro.
Ele sorri, mas eu mal percebo. Meu cérebro ainda está preso no “bonita”.
Bonita, bonita, bonita. Estou me remoendo enquanto continuamos
andando, então não percebo quando ele nos conduz para a estufa que fica
lindamente na esquina da rua. É enorme, as paredes curvas cobertas de vidro,
uma cúpula ornamentada pintada de cores no topo. As silhuetas de vasos
pendurados e folhas largas roçam as janelas, a névoa dos aquecedores
obscurecendo os detalhes de qualquer coisa específica. Quando eu era criança, os
garotos do ensino médio costumavam entrar aqui e desenhar paus nas janelas.
Acompanho Luka cegamente, entrando em uma das grossas portas de vidro.
Duas coisas acontecem imediatamente. A umidade espessa da estufa me dá as
boas-vindas ao armar o meu cabelo instantaneamente, e Mabel Brewster grita a
plenos pulmões.
Luka e eu nos sacudimos.
— Ai, meu Deus — eu gemo. — Você achou que começar por aqui era uma
boa ideia?
Mabel está acenando pelas prateleiras de suculentas na parte de trás com um
olhar quase maníaco em seus olhos. Seu longo cabelo preto está em tranças,
amarrado cuidadosamente para trás com um lenço no alto da cabeça, o laranja e
o vermelho um contraste marcante com sua pele negra. Enquanto eu consigo
sentir o suor começando a se acumular na base das minhas costas e na cavidade
da minha garganta, sua pele está injustamente brilhando na umidade da estufa,
um brilho leve em suas maçãs do rosto salientes. Ela parece uma Barbie de estufa,
e eu digo isso à ela toda vez que ela visita a fazenda com ervas frescas.
Mas nesse momento, ela parece uma pequena barra de dinamite
determinada.
Eu gemo de novo, só para garantir. Luka troca de pé, aparentemente
começando a se arrepender de sua decisão quando ela esbarra em duas palmeiras
dentro de vasos e não diminui a velocidade.
— Por que ela está assim?
Eu sei exatamente o que ele quer dizer, eu só quero ouvi-lo dizer isso.
— Assim como?
Ele me enrola mais perto de seu corpo como se pudesse me proteger dela,
verdadeiramente aterrorizado, um único pensamento em sua cabeça. Conheço
Mabel desde o ensino médio. A última vez que a vi desse jeito foi quando ela
pegou Billy Walters desenhando os pênis nas janelas da estufa de seu pai.
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— Como se ela quisesse esquartejar nossos corpos em pedacinhos, mas
também dar uns amassos com nossos rostos.
Eu bufo uma risada. Mabel tem um metro e meio de altura, provavelmente
pesando 56 quilos quando está encharcada. Mas o que lhe falta em estatura, ela
mais do que compensa em energia. Ela marcha até nós, olhando
penetrantemente para onde a mão de Luka está enrolada ao redor do meu braço.
Ele me puxa um pouco mais perto e exala uma respiração trêmula contra a parte
de trás da minha cabeça. Quero gargalhar de prazer, mas tenho um pouco de
medo do que Mabel possa fazer.
— Vocês dois parecem confortáveis.
Nós continuamos em silêncio. Ela estreita os olhos.
— Não vejo você por aí há um tempo, Luka.
— Você me viu há duas semanas, Mabel. No supermercado.
Ela cantarola, mas não reconhece sua declaração.
— E você. Sra. Fazendeira Chique. Tem algo que você queira compartilhar
com a classe? — Ela praticamente queima um buraco no lugar onde a minha
mão está agarrando a jaqueta de Luka.
— Não muito — eu me faço de boba. — Ah, na verdade — eu digo e ela se
anima. — Eu terei algumas aparas fresquinhas para você a partir da terceira
semana de novembro. Para confeccionar guirlandas, se quiser.
Ela parece que ela gostaria de torcer meu pescoço.
— Confeccionar guirlandas.
— Sim.
— Tudo bem.
Há uma batida de silêncio enquanto todos nós nos consideramos. Estou
lutando contra um sorriso, e posso sentir o estrondo de uma risada presa no
peito de Luka. Ele me puxa para que eu fique totalmente na frente dele e cruza
os dois braços sobre meus ombros, me puxando contra ele. É um ajuste perfeito,
o arranhão de sua barba por fazer pegando na bagunça caótica que é meu cabelo
nesse calor. Os olhos de Mabel se iluminam e um sorriso começa a se formar em
seus lábios.
— Estávamos torcendo que você fizesse uma guirlanda para a nossa porta da
frente — Luka oferece, seu queixo descansando no topo da minha cabeça.
Homem esperto. Ele poderia ter contado direto para ela. Ao invés disso, ele
fez parecer que é algo que ela já deveria saber. Uma conclusão inevitável. Ele
alcançou direto o coração da fábrica de fofocas desta cidade.
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Mabel entrelaça os dedos, apertando as mãos sobre o coração. Ela sorri
enquanto ela balança para trás em seus calcanhares.
— Está acontecendo — ela canta.
E assim, nosso plano começa.
Luka usa a mão no meu pescoço para me puxar para trás, posicionando metade
do seu corpo na minha frente. Espio por cima do ombro para ver o xerife Jones
sentado na varanda da frente da antiga delegacia de polícia, uma espingarda
descansando casualmente em cima dos seus joelhos.
— Esses são bons instintos, filho — ele aponta o chapéu para Luka, mas
mantém uma mão firme ao redor de sua arma. — Isso será um ponto ao seu
favor.
Luka ri, seus ombros relaxando com uma expiração pesada. Sua mão desliza
do meu pescoço, aliviada.
— Ah, isso é um teste?
O xerife Jones não ri.
— Com certeza é.
Dane Jones, xerife da cidade, foi a primeira pessoa que minha mãe e eu
conhecemos quando nos mudamos para Inglewild. Ele nos viu desembalando
nosso hatchback4 superlotado e se ofereceu para nos ajudar, colocando uma das
malas de mão que não combinava com nada da minha mãe no ombro largo e
equilibrando uma caixa com os meus livros em seu outro braço. Ele pediu duas
pizzas para a gente, deu seu cartão de contato para minha mãe e disse para ela
ligar se precisasse de alguma coisa.
Eu pressiono um sorriso na lã do casaco de Luka e depois fico na ponta dos
pés, acenando para o bom xerife.
— O que está acontecendo, Dane?
Dane desvia seu olhar de Luka para sorrir para mim. Está longe de ser um
sorriso de acordo com os padrões, mas depois de quase vinte anos, eu sei o que
significa aquela inclinação dos lábios.
— Ouvi dizer que vocês dois estavam namorando.
— Oh?
— Pensei em parabenizar vocês dois. — Luka faz um som abafado de
protesto, sem dúvidas curioso para saber como a espingarda se traduz em
“felicidades”. Os olhos de Dane deslizam de volta para ele e seguram. — E dar
um aviso ao garotão aqui.
Ah, ok.
Meu sorriso se alarga, um calor se instalando em meu peito. Estranhamente,
sinto Luka relaxar na minha frente.
— Isso é tudo que você tem? — Ele acena para a arma. — Uma arma
descarregada e um aviso vago?
— Não há nada de vago em eu dizer a você que vou quebrar todos os ossos
do seu corpo bem construído se eu ver até mesmo a sugestão de uma lágrima no
rosto daquela garota. E terei um grande prazer em esmagá-lo fisicamente,
mentalmente e emocionalmente. — Ele balança para trás em sua cadeira e chuta
os pés no corrimão. Ele dá um tapinha na arma. — E quem disse que essa arma
não está carregada?
— Ah — Luka engole. — Anotado.
Há um silêncio enquanto nós três nos consideramos. Eu olho para Dane.
Dane olha para Luka. Luka, para seu crédito, não desvia seu olhar de Dane.
— Sabe — eu ofereço, a voz cuidadosamente uniforme. — Eu namorei com
Wyatt e você nunca apareceu com uma espingarda.
Os olhos de Dane voltam preguiçosamente para mim e ele me dá um olhar.
— Acho que nós dois sabíamos que aquilo não ia dar em nada, Canela.
Reviro os olhos para o apelido que ele me deu quando eu tinha treze anos, e
confessei em lágrimas o meu grande crime de esquecer de pagar por um pirulito
de canela no Pare e Guarde na esquina da Terceira com a Monroe. Sentei-me na
frente de sua mesa e chorei estupidamente, mostrando os meus pulsos no ar para
as algemas que eu tinha tanta certeza que ele seria forçado a usar.
Surpreendentemente, ele não sentiu a necessidade de me colocar sob
custódia.
— Você vai para a casa do seu pai no próximo fim de semana?
Eu faço uma careta. Eu quase tinha esquecido.
— Sim, o de sempre.
Luka se vira e franze a testa para mim.
— Ele ainda está fazendo isso? A coisa do Dia de Ação de Graças antecipado?
Sim, meu pai ainda me faz ir em um Dia de Ação de Graças antecipado em
sua casa para evitar o horror de ter que entreter sua filha bastarda no feriado de
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verdade. E sim, meu pai ainda é a pior combinação de egocêntrico e egoísta, sua
falsa humildade como uma cereja azeda no topo.
Mas ele é a única família que me resta. E isso deve contar para alguma coisa.
Mesmo que ele não queira que conte.
— Sim — eu digo simplesmente. — Vou levar a torta.
Eu posso sentir os olhares fixos de ambos os homens em mim. Luka parece
ter alguns pensamentos sobre o assunto. Acho que o vi franzir mais a testa nos
últimos dois dias do que em todo o nosso relacionamento. Dane voltou a correr
os dedos em sua espingarda, parecendo pensativo.
— Deixe-o saber que eu disse oi — ele oferece. — E que eu ainda acho que
ele não está apto para lamber o piche da bunda de Satanás.
Eu estouro de rir. Eu adoraria ver o olhar no rosto de Brian Milford se eu
entregasse essa mensagem. Vou ter que mandar uma mensagem para Charlie
mais tarde.
— Tudo bem — engancho meu braço no de Luka e começo a nos arrastar de
volta para a cidade. Se tivermos sorte, Matty ainda pode ter um pouco de
calabresa e podemos pegar uma torta para viagem. — Sempre um prazer, xerife.
— Igualmente, Canela. Estou de olho em você, Peters.
Eu meio que espero que ele aponte para os olhos e depois aponte para Luka
antes de arrastar o dedo pela garganta. Mas, aparentemente, isso é demais para o
homem sentado em frente à delegacia com uma arma no colo.
Luka fica quieto enquanto andamos de volta. Eu olho para ele, reparando
que sua carranca não se desfez nem um centímetro. Limpo minha garganta. O
que eu não daria para voltar à leveza de seus dedos torcendo meu cinto.
— Isso te incomodou?
— Hm?
— O xerife? Acho que ele estava basicamente brincando. Você sabe que ele é
protetor.
Luka levanta a mão para passar os dedos pelo cabelo, mas lembra no último
segundo que ainda está usando a touca com a bolinha. Ao invés disso, ele passa a
mão sobre ela, empurrando a touca para cima até que um tufo de cabelo espesso
se solte na frente. Com suas bochechas rosadas e cabelos escuros e bagunçados,
ele parece algo que deveria estar em um globo de neve. Eu suspiro.
— Não, isso foi tranquilo — diz ele. Um sorriso se abre, um pouco de sua
melancolia desaparecendo. — Na verdade, isso foi fantástico. Eu gosto que você
tenha pessoas cuidando de você.
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— Ele verifica a fazenda a cada duas semanas. Acho que ele até mandou
alguns dos deputados limparem a rua no trecho da estrada que leva até nós.
E ele sempre compra três árvores. Todo ano. Ele pega abóboras o suficiente
para colocar em cada corrimão de sua varanda. Ele faz questão de pegar um
chocolate quente de Layla e produtos frescos de Beckett. Ele é um bom homem.
— Por que você ainda está indo para a casa do seu pai, La La? Você fica
sempre tão... — Ele considera suas palavras cuidadosamente, me avaliando pelo
canto do olho. — Você fica retraída depois. Isso te deixa triste.
Eu dou de ombros e me concentro no jeito como nossos pés marcham na
mesma batida pela calçada. As pernas de Luka são muito mais longas, mas ele
desacelera para acompanhar o meu passo, dois pares de botas em perfeita
harmonia.
— Eu não fico triste, fico só… cansada, eu acho. É sempre exaustivo.
— Então por que você ainda vai?
— Eu gosto de ver o Charlie. E a Elle é legal.
— E? Você pode ver qualquer um deles sempre que quiser. Você não precisa
alimentar esse não-feriado estranho que seu pai insiste em fazer todos os anos.
Eu não tenho certeza se foi ideia do meu pai. Eu acho que ele vai na onda,
claro. E com certeza é mais conveniente para ele se eu comparecer a essa versão do
Dia de Ação de Graças e não à grande festa que ele dá no verdadeiro feriado para
o Conselho de Administração que supervisiona a sua empresa de cobertura de
gestão de fundos. Mas inicialmente o convite veio diretamente de Elle.
Suspiro e decido optar pela honestidade.
— É bom ter um lugar para estar — eu digo baixinho. — É bom ter uma
família para visitar.
Mesmo que todo o jantar seja uns desajeitados noventa minutos de conversa
fiada, é uma tradição por si só.
— O que isso quer dizer? Você está me dizendo… — Estou surpresa ao ouvir
que Luka parece zangado. Furioso, até. — Stella. Eu te convidei para todos os
Dias de Ação de Graças.
Eu sei disso. E eu recusei todas as vezes. Ao invés disso, passo meu dia em um
abrigo nos arredores de Baltimore, servindo purê de batatas e sanduíches de peru
até parecer que meus braços vão cair. E no caminho para casa, paro no Sheetz e
como o equivalente ao meu peso em tater tots e mac and cheese frito.
E tá tudo bem. Perfeito, até. É exatamente como eu quero passar meu
feriado. Minha mãe costumava montar um banquete parecido para nós todo Dia
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de Ação de Graças. Nunca podíamos comprar peru e batata-doce e caçarolas de
feijão verde, então ela improvisava. Fizemos jantares na frente da TV e
arrumamos a mesa com nossos utensílios de plástico mais extravagantes e rimos
alegremente brindando uma com a outra com Dr. Pepper.
É a minha própria tradiçãozinha.
— Eu te vejo no dia seguinte — eu me defendo. — Você sabe que eu não
gosto de perder a oferta de Black Friday na livraria.
Ele para de andar e envolve as duas mãos nos meus ombros. Eu olho para ele
e vejo aquela bolinha novamente. É realmente irritante. Eu franzo a testa para
ele.
— Por que você não tem passado o Dia de Ação de Graças comigo e com a
minha mãe?
Porque a mãe de Luka ainda belisca suas bochechas quando ele entra pela
porta. Porque sua avó e todas as suas tias fazem o jantar enquanto gritam umas
com as outras em italiano, batendo em seus pulsos com colheres de pau quando
você chega muito perto da panela. Porque é acolhedor, e barulhento, e caótico, e
perfeito. Porque se parece muito com todas as coisas que estou perdendo.
Eu dou de ombros. Ele murmura baixinho.
— Bem, se eu não posso impedi-la de passar voluntariamente o seu dia com
aquele idiota, eu não vou deixar você fazer isso sozinha. — Ele olha para mim, e
eu posso ver que ele está falando sério. Ele parece como se devesse estar me dando
essa proclamação do topo de uma montanha, diante de um campo amplo e
verde. Uma espada ou algo na mão. Talvez um kilt. — Eu vou com você.
Eu me esforço para tirar da minha mente a imagem mental de Luka em um
kilt.
— O quê?
— Vou com você para o Dia de Ação de Graças forçado e falso.
— Uh, não, você não vai.
— Por quê?
— Bom, em primeiro lugar: porque você não está convidado.
— Tudo bem, ok. Charlie me ama. Vou mandar uma mensagem para o
Charlie.
É verdade. Charlie o ama. Charlie o convidaria em um milissegundo.
— O que é o “em segundo lugar”?
— O quê? — Eu me assusto e olho ansiosamente para a placa néon da
pizzaria a dois quarteirões de distância. Se eles ficarem sem pizza de massa grossa
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enquanto estamos tendo essa discussão, talvez eu nunca perdoe Luka.
— Você disse “em primeiro lugar”. O que é o “em segundo lugar”?
— Em segundo lugar — eu procuro uma resposta apropriada. — Em
segundo lugar…
— Viu — ele está presunçoso. Reviro os olhos e começo a andar rapidamente
até a pizzaria. Vou pegar uma pizza de massa grossa para mim, e Luka ficará
apenas com a especial de vegetais sem glúten e de massa fina. — Não tem
segundo lugar.
— Há um “em segundo lugar” — eu estalo. Não quero que ele ouça a
maneira como meu pai fala comigo. Como às vezes ele nem sequer reconhece a
minha existência. Como se eu fosse uma sombra inconveniente na mesa. Não
quero que Luka veja como o meu Dia de Ação de Graças é quando o dele é tão
maravilhoso. — Eu não quero que você vá.
Isso faz Luka parar, e sinto que os seus passos vacilam ao lado dos meus. Eu
luto contra o instinto imediato de retirar o que disse.
— Isso não é verdade — ele diz baixinho, e meu peito aperta quando ouço a
dor em sua voz. — Você não quer dizer isso, Stella.
Merda. Eu paro na calçada com um último olhar ansioso para o Pizza do
Matty e então me viro para Luka, agarrando logo acima de seus cotovelos como
ele costuma fazer comigo. Eu o sacudo uma vez.
— Luka — Seu rosto está quase comicamente triste. Não faço ideia de como
sua mãe conseguiu educá-lo na infância. — Luka, você já está fazendo muito por
mim. Não quero que você venha para… — Tento lembrar de como ele se referiu.
— Eu não quero que você vá para o Dia de Ação de Graças forçado e falso.
Ele se anima um pouco.
— É por isso? Porque você acha que eu já estou fazendo muito?
Eu concordo, hesitante. Ele sopra uma lufada de ar e balança para trás em
seus calcanhares.
— Ok, bem, isso é fácil.
— Isso é fácil?
— Sim, eu vou com você. Somos amigos há quase dez anos, La La. Pare de
anotar o placar.
A semana anterior à versão do Dia de Ação de Graças do meu pai passa voando.
Luka passa esse tempo em Nova York, cuidando de algum projeto misterioso no
trabalho, que ele explica usando apenas adjetivos vagos, e eu passo o meu tempo
organizando as coisas para a mudança de feriados na fazenda.
Eu encontro um purificador de ar de pinheiro no vão da porta da minha casa
depois que ele volta para a cidade, suspenso ordenadamente no meio como um
raminho de visco. Eu o puxo para baixo com um sorriso e coloco com os outros,
me perguntando se ele sempre para no pequeno posto de gasolina nos limites da
cidade.
Limpamos o canteiro de abóboras danificado e instalo algumas câmeras ao
redor da propriedade. Eu tive que dirigir por quase 20 minutos para encontrar
uma loja de eletrônicos com qualquer tipo de estoque. Barry, da Eletrônicos do
Barry, me informou que, embora as câmeras não sejam tão de ponta quanto
algumas das outras coisas do mercado, elas me avisarão se alguém estiver
entrando na fazenda sem meu conhecimento.
Ou se os guaxinins desenvolveram uma sede por destruição de abóboras.
Em um golpe de mestre, Beckett transforma as árvores retorcidas no pasto
sul em uma floresta mal-assombrada na noite de Halloween. A melhor parte é
que ele não precisa fazer absolutamente nada para a floresta parecer algo do
Labirinto do Fauno. Susie Brighthouse dá uma olhada na floresta enquanto ela e
sua mãe pegam o bufê de Layla, declara que é totalmente distorcido e a próxima
coisa que eu sei, toda a turma do segundo ano está correndo pelo terreno como
uma horda de zumbis bêbados.
É o maior número de convidados que tivemos desde a última temporada, e
apesar de ser um grupo de pré-adolescentes empolgados, é o suficiente para me
dar uma bóia de esperança. Beckett, Layla e eu comemoramos de acordo e
sentamos na beira dos pastos com uma garrafa térmica de cidra com cravo,
ouvindo enquanto eles gritavam um para o outro.
— O que você colocou lá para assustá-los?
— Nada.
— Nada?
— Talvez eles tenham medo da sua própria idiotice.
Enfim, é uma boa semana. Acordo na manhã do Dia de Ação de Graças
forçado e falso e espero pelo pior, mas estou agradavelmente surpresa. Nada na
fazenda é destruído, todas as remessas chegam a tempo e ninguém aparece no
meu escritório para me dizer que algo está pegando fogo. Metade de mim espera
que uma cratera se abra e me engula nas profundezas do inferno enquanto
caminho pelos pastos até o grande celeiro vermelho. Mas não vejo nada além de
caixas de jardim bem cuidadas à beira da estrada e árvores ao longe, alguns cestos
vazios na trilha que alguns colecionadores de produtos devem ter esquecido.
Pego as cestas vazias e as coloco no meu braço, empilhando-as perto da porta
enquanto entro no celeiro e começo a puxar as caixas com enfeites de Natal. É a
minha parte favorita do ano, a transição entre o outono e o inverno. Quando eu
desempacoto todas as coisas que tornam esse lugar mágico.
Hank fez o seu melhor para tornar este lugar festivo, mas ele estava mais
focado nas árvores do que na experiência. Ele havia deixado para trás algumas
renas de madeira de aparência triste, um trenó feito de velhas caixas de transporte
e uma fantasia de Papai Noel comida por traças. Todos os pisca-pisca
pendurados nos prédios haviam queimado há anos atrás, e o letreiro do pólo
norte estava desbotado e desgastado. Layla apelidou de Natal do deserto nuclear
na nossa primeira semana na fazenda.
A maior parte do meu orçamento no ano passado foi para a reforma. Eu
queria que as pessoas dirigissem pela estrada de terra estreita e fossem recebidas
com um túnel de grandes lâmpadas bulbo, exatamente como as que seus avós
tinham. Eu queria que elas passassem pelos portões da frente enfeitados com
dois grandes laços vermelho-cereja, placas de sinalização pintadas com espirais de
vermelho e branco. Eu queria que as famílias saíssem de seus carros e olhassem
para fileiras e mais fileiras de árvores no sopé das colinas, crianças correndo na
frente para conseguir um lugar na fila para a pista de patinação no gelo.
Eu queria que parecesse entrar em um especial de Natal de Dolly Parton.
Eu agarro a escada e começo a puxar as caixas para baixo, puxando as tampas
e cutucando o papel de embalagem cuidadosamente embrulhado. Corro minhas
mãos sobre a placa do Pólo Norte que passei horas estampando, com tinta
vermelha nas pontas dos dedos por semanas. Uma parte da tensão em meus
ombros é liberada na quinta caixa. Parece que tudo está aqui e contabilizado. Até
a pequena rena de lata feita com latas de cerveja por Beckett, seu presente de
elefante branco6 para mim no ano passado.
Eu seguro um dos laços vermelhos gigantes e corro meu dedo ao longo da
borda inferior. É tolice se emocionar com uma fita, entre todas as coisas, mas
aqui estou eu. Eu tinha imaginado… com tudo, eu tinha imaginado que os laços
estariam em frangalhos ou roubados ou manchados ou qualquer outra coisa
ridícula. Mas eles estão aqui, perfeitos e imaculados e prontos para ficarem
perfeitos em nossos portões de ferro forjado. Estou grata. Envio um desejo aos
fantasmas dos feriados passados, presentes e futuros. Eu só preciso que esse
pouco de mágica continue até o final do mês.
— Por favor — eu sussurro, desejando ter um ramo de visco para agitar por
aí. Talvez algum incenso de hortelã.
— É isso que você está vestindo essa noite? — Quando me viro, Luka está
recostado na porta aberta do celeiro, com um donut na mão. Ele está com os
membros soltos e os ombros relaxados, seus olhos viajando no mesmo padrão
um-dois-três que suas mãos sempre pressionam na minha pele. Tenho uma
desculpa pronta na ponta da língua, ansiosa para dar para trás, para explicar, mas
ele não dá nenhum sinal de que ouviu o meu pedido nas vigas do celeiro. Ele dá
uma mordida e acena para o laço muito grande em minhas mãos, obscurecendo
metade do meu corpo de vista. — Ousado, mas festivo. Deve causar uma
impressão.
Sentindo-me boba, eu o seguro perto do meu peito e o coloco sobre mim,
esticando minha perna por baixo e arqueando meu pescoço para trás. Eu sou
Jessica Rabbit em um lindo laço vermelho. Há um som de asfixia e eu me
endireito para encontrar Luka dobrado ao meio, lutando para engolir sua
rosquinha.
Preocupada, eu jogo o laço em cima das caixas de enfeites e corro, batendo a
palma da minha mão entre suas omoplatas várias vezes. Tento me lembrar do
que eles nos ensinaram em nossa aula de Reanimação Cardiorrespiratória no
ensino médio. Bater no ritmo de uma música? Eu murmuro baixinho antes que
Luka me afaste, sua risada um pouco rouca.
— Por que você está cantarolando Earth, Wind, & Fire enquanto eu quase
engasgo até a morte?
Ah, essa... não era a música correta.
Luka tosse mais uma vez e se endireita, um sorriso devastador puxando sua
boca. É fácil assim pensar nele como sendo meu. Esse Luka, com esse sorriso,
nesse lugar. Botas marrons com cadarços e um suéter sob sua roupa. A onda de
possessividade é tão feroz que me tira o fôlego, e esfrego meu peito em um
esforço para me livrar do sentimento. Sinto que nosso showzinho de ontem na
cidade abriu a pequena caixa de aço em que guardo enterrados todos os meus
sentimentos por Luka.
Eu preciso lembrar que Luka não é meu. Nem mesmo quando estamos
fingindo.
Ele inclina a cabeça para mim e pondera, algo apertando as linhas de seus
olhos. O que eu não daria para saber o que está passando pela cabeça dele. O
momento passa, e eu luto para encontrar meu equilíbrio.
— Você está pronta para ir?
Não, eu não estou. Eu quero ficar aqui neste celeiro com ele e meus lindos
laços vermelhos para sempre. Eu quero esquecer que todo o resto existe. Quero
que Layla deixe rosquinhas de cidra de maçã na porta para nos sustentar. Talvez
uma pizza ou duas.
Em vez disso, eu suspiro e olho para onde seu carro está estacionado no
cascalho do lado de fora do celeiro. Eu me entrego à uma fantasia passageira de
cortar todos os pneus, então teremos que ficar aqui.
— Acho que tenho que estar.
Estar nessa casa é sempre uma experiência estranha. Uma tradição de seu
próprio jeito, eu imagino. Elle nos recebe em sua casa, calorosa e amigável como
sempre, nem um único fio de cabelo loiro fora do lugar. Sua blusa branca está
cuidadosamente enfiada em uma linda saia azul royal, reta e sem amassados. Eu
me pergunto como ela consegue se sentar nela e continuar assim. Eu a imagino
encostada na parede. Deitada no sofá.
Entramos no hall de entrada, o sol refletindo desde o chão de mármore até o
lustre ornamentado que fica no meio da sala de recepção, como Elle a chama. É
impossível não eternamente comparar a vida aqui com a que minha mãe e eu
tínhamos. O tipo de mulher que minha mãe era e o tipo de mulher que Elle é.
Minha mãe teria atendido a porta com geléia no rosto e uma caneta enfiada no
cabelo, pés descalços e esmalte descascado. Sem sala de recepção para nós.
— Você chegou bem? Sem trânsito, tomara?
Abençoada seja ela por agir como se realmente fosse Dia de Ação de Graças, e
não um sábado aleatório em novembro. Eu a sigo até a cozinha e obedientemente
coloco as tortas na bancada.
— Foi tudo tranquilo.
— Fico feliz em ouvir isso — diz ela. Ela olha para Luka e junta as suas mãos
embaixo do queixo. Parece que ela deveria estar posando em um catálogo da J.
Crew, a edição de férias. — E eu estou tão feliz que você trouxe um amigo.
— Estou feliz por estar aqui. Obrigado por me receber tão em cima da hora
— Luka lhe entrega um buquê de flores, colhidas a dedo da fazenda. Ela enterra
o nariz nas flores, bochechas corando. Eu sorrio contra a minha mão. É bom
saber que não sou a única afetada por Luka.
— Eu ouvi tanto sobre você através de Charlie e Stella. É bom finalmente
conhecê-lo pessoalmente.
Seus olhos dançam para frente e para trás entre nós com o que eu suponho
ser um pesado significado. Às vezes eu esqueço que, apesar de todas as formas em
que eu Charlie nos aceitamos em nossas vidas, minhas interações com Elle ainda
são muito restritas.
— Eu posso apenas imaginar as histórias de horror que você ouviu, então.
— Bobagem — Elle coloca as flores em um vaso que ela tira de cima da
geladeira e, em seguida, click-clack até o forno e verifica o interior. Acho que
nunca andei pela minha casa de salto alto. Acho que meus sapatos nunca
passaram pela soleira da minha porta. — Meus filhos não têm nada além de
coisas boas a dizer sobre você.
É um rápido deslize da língua. Duas palavras na verdade, um pronome
possessivo. Parece que a cozinha inteira teve todo o ar sugado para fora dela
instantaneamente. Talvez eu faça um som, ou talvez o meu corpo esteja falando
alto o suficiente para que isso não seja necessário, mas me sinto eletrocutada com
isso. Rígida e rangente, como um dos espantalhos que ficam nos campos de
milho.
Elle se levanta rapidamente, o rosto contraído. Pela primeira vez desde que a
conheci, ela parece nervosa.
— Eu só quis dizer… — ela enfia o cabelo compulsivamente atrás das orelhas.
— Eu só quis dizer…
— Está tudo bem — dou a ela um pequeno sorriso e limpo minha garganta.
— Eu sei que eu não sou… eu sei o que você quis dizer.
— Stella. — Ela parece abatida. — Eu…
O que quer que ela iria dizer é felizmente perdido em uma comoção na porta
da frente. Este jantar já é o suficiente sem o lembrete adicional de que sou a filha
que seu marido teve com outra mulher. Eu ouço vários sacos caindo no chão,
um xingamento abafado, e então o som muito claro de vidro se quebrando
contra mármore. Elle deixa cair a cabeça para trás e olha para o teto com um
sorrisinho pesaroso.
— Isso seria Charlie.
Eu dou uma risada e a tensão desaparece da sala junto com Elle, que sai para
buscar Charlie no hall de entrada. Suspiro e me livro da estranheza da conversa,
da confusa mistura de surpresa e arrependimento. Surpresa faz sentido. Não sei o
que fazer com o arrependimento. Luka se aproxima, aqueles olhos castanhos dele
são calorosos enquanto ele suavemente aperta o meu braço. Seus dedos roçam
gentilmente sob meu queixo.
g q
— Tudo bem? — ele pergunta baixinho.
— Estou bem — eu digo, e estou surpresa ao descobrir que estou. Ou, pelo
menos, bem o suficiente para não querer pegar uma garrafa de vinho e começar a
beber. Essa é uma mudança positiva de como eu normalmente me sinto nesse
momento da noite. Dou-lhe um sorriso e inclino a cabeça em direção às
elegantes taças de vinho de cristal colocadas no balcão. Estamos debatendo qual
garrafa extremamente cara abrir primeiro quando a porta da cozinha se abre,
com força suficiente para bater direto na parede e voltar novamente.
— Você trouxe um parceiro? — Charlie grita no lugar de uma saudação, os
braços cheios dos restos estilhaçados do que ele trouxe para o jantar. Grandes
pedaços rasgados de um saco de papel, o barbante que eu suponho que já foi
uma alça. A crosta de uma torta de nozes e o que parece ser a borda do vaso de
cerâmica ornamentado que estava na entrada. Os olhos de Charlie viajam dos
ombros de Luka até mim e voltam novamente, se apertando em confusão. Eu
não sei o que é mais divertido: que Charlie não reconheça Luka imediatamente,
ou que ele consiga incorporar a agressividade de irmão protetor equivalente à
uma vida inteira em uma única pergunta.
Luka olha para Charlie por cima de seu ombro, longe de onde ele não parou
de abrir um cabernet sauvignon. Seus antebraços flexionam e soltam, flexionam e
soltam enquanto ele gira o saca-rolhas. Estou hipnotizada.
— E aí, cara. Quanto tempo.
Charlie quase derruba a coleção de itens em suas mãos novamente, uma
grande parte deles voltando ao chão.
— Ai, meu Deus, está acontecendo.
Eu coro em um tom escarlate. Charlie deveria estar no telefone sem fio de
Inglewild. Pego a garrafa de vinho de Luka e me sirvo de uma taça generosa. E lá
se vai não querer beber para apagar o desconforto.
— Nada está acontecendo, Charlie. Luka só veio jantar.
— Com você — Luka acrescenta com um sorriso malicioso e uma piscadela.
Eu bufo. — Juntos.
Há uma troca silenciosa entre Luka e Charlie, uma sobrancelha erguida, duas
em troca, que faz Charlie praticamente balançar de prazer. Honestamente. Luka
pega a taça de vinho da minha mão e toma um gole, um ponto de exclamação
pontiagudo e silencioso sobre o que quer que aquela conversa tenha sido.
— Quer dizer, claro, tecnicamente chegamos no mesmo carro — balbucio.
Eu não dou um tapa nele, mas é uma coisa próxima. Eu o deixo pegar meu copo
p p pg p
e busco um novo. — Então, sim, estamos aqui juntos. Juntos, como amigos, em
harmonia.
— Certeza que parece harmonioso — Charlie brinca, revirando os lábios
entre os dentes. Reviro os olhos para ele e ele retribui o gesto. É estranho ver as
minhas expressões espelhadas em seu rosto. Os mesmos grandes olhos azuis,
cobalto escuro quando a luz os atinge bem. Nós poderíamos ser gêmeos se não
fosse pela enorme largura e extensão de seus ombros. Ele se eleva sobre minha
pequena forma, e eu sinto cada centímetro da nossa diferença de altura quando
ele dá três passos pela cozinha e me pega em seus braços. Meus pés balançam
inutilmente enquanto eu enrolo meus braços ao redor de seus ombros, os dedos
dos meus sapatos batendo contra suas canelas.
— Bom te ver, tampinha.
Eu belisco entre suas omoplatas, e ele ri calorosamente em algum lugar acima
da minha cabeça.
— Bom te ver também.
Ele me solta e vai até Luka, dando-lhe o mesmo tratamento, tirando-o do
chão. Sorrio na minha taça de vinho enquanto os vejo se abraçando, um pedaço
de massa de torta ainda grudado no braço de Charlie. Luka murmura algo em
voz baixa e Charlie solta uma risada, seus olhos brilhando quando encontram os
meus novamente.
— Vamos comer ou o quê?
No momento em que todos os pratos do jantar estão postos na mesa, meu
pai ainda não chegou, sua ausência pairando ameaçadoramente sobre todas as
nossas cabeças. É como as espessas nuvens escuras que surgem antes de uma
tempestade, relâmpagos piscando à distância. Você sabe que algo ruim está
vindo, mas não pode fugir da natureza. Elle nos leva à sala de jantar formal, que
não deve ser confundida com a aconchegante sala de jantar da família ou a copa
ao lado da cozinha.
A mesa parece uma pintura de Norman Rockwell. Uma impecável toalha de
mesa branca e pratos prateados brilhantes. Está muito distante dos copos
descartáveis e pratos de papel com os quais cresci. O único detalhe que sugere
que humanos reais pretendem comer essa refeição são os cartões minúsculos em
forma de perus marcando os lugares onde as pessoas devem se sentar. Eles são
famosos e desbotados, os nomes escritos com uma mão inexperiente. Me faz
sorrir imaginar um Charlie muito menor colocando meticulosamente pompons
em rolos de papel higiênico para deixá-los parecidos com pequenos perus. Eu
pp g p p pq p
posso imaginá-lo colocando-os juntos quando criança, os mesmos cachos
selvagens que eu tenho caoticamente no topo de sua cabeça, a língua para fora
em estado de concentração.
Meu nome está marcado com um cartão de identificação muito mais recente
e muito mais profissional. Um simples Stella impresso em um pedacinho de
cartolina, mantido por um maciço peso de papel que parece uma folha. As
bordas apenas roçam a curva inferior do a. Esse não é um que é guardado de ano
para ano. Provavelmente foi impresso essa manhã. Encomendado de um
fornecedor chique, estampado em cartolina pesada com bordas entalhadas.
Encontro meu assento e vejo um novo cartão fazendo companhia ao meu.
Luka com uma folha de laranja queimada. Eu o encaro por um longo tempo, até
que todos os outros estejam acomodados e sentados.
— O papai vai se juntar a nós? — Charlie olha fixamente para a cadeira vazia
na cabeceira da mesa. Eu sei que eles têm suas brigas, meu pai e Charlie. Charlie
muitas vezes carrega o peso de expectativas injustas. Ele trabalha na mesma
empresa que o meu pai, preparado para um dia ocupar seu lugar. Isso é um peso
em seus ombros, uma submissão maçante se instalando sobre ele toda vez que
eles estão no mesmo cômodo. Eu odeio isso. Eu odeio vê-lo desabar
internamente, escondendo todas as partes de si mesmo que o tornam tão
maravilhoso.
— Se tivermos sorte, não. — Elle calmamente enche sua taça de vinho até a
borda. Um despeje pesado, se eu já vi um. Charlie e eu a encaramos. Luka faz um
som como se estivesse tentando não rir. Eu nunca ouvi Elle dizer nada negativo
sobre ninguém, muito menos Brian. Nem mesmo quando apareci na porta da
frente dela, o pior tipo de surpresa, tenho certeza. Ela deu uma olhada em mim,
emitiu um zumbido baixinho, e me ofereceu uma limonada.
Charlie se recupera primeiro.
— Está se sentindo bem, mãe?
— Maravilhosa, docinho. Você quer um pouco de vinho?
— Sobrou algum?
Ela inclina a garrafa para frente e para trás.
— Apenas um pouco.
Charlie estende a mão e bebe diretamente da garrafa. Sentado ao lado de Elle,
vejo as semelhanças sutis entre eles. A mesma curva em seus lábios. Uma covinha
que pestaneja na luz bruxuleante das velas. Travessura que se esconde no canto
dos olhos de Elle, mas domina corajosamente os olhos de Charlie. O tipo que
aumenta agora quando ele termina a garrafa.
— Este pode ser o meu Dia de Ação de Graças favorito até agora.
Estou prestes a concordar quando ouço a porta da frente se abrir, passos
desajeitados e pesados se movendo na direção da sala de jantar. Charlie xinga
baixinho.
— Falei cedo demais.
Todos nós ouvimos em silêncio enquanto meu pai serpenteava pelo primeiro
andar da casa, sem sentido em sua direção. Ele dá dois passos para frente, e então
volta. Esbarra, tropeça e depois se apressa até a cozinha. Parece que ele escorrega
em um ponto e se segura com o ombro contra a parede.
Luka se aproxima de mim.
— Ele está…?
— Bêbado? — Elle toma um longo gole de sua taça de vinho muito cheia. —
Provavelmente.
Esse é um novo desenrolar. Acho que nunca vi o meu pai bêbado. Ele
geralmente chega atrasado, soltando uma desculpa sobre o escritório, um cliente,
um novo negócio, algo sobre quão importante e necessário ele é na empresa. Mas
acho que nunca o vi com um fio de cabelo fora do lugar. Ele está sempre
abotoado, impecável. Frio e intocável.
Ele finalmente abre caminho para a sala de jantar, seus movimentos
descoordenados e confusos. Seu braço pega um dos castiçais de prata enquanto
ele caminha lentamente ao redor da mesa, derrubando-o e quase incendiando a
toalha. Charlie o pega antes que qualquer coisa possa pegar fogo, a manteigueira
se moveu ordenadamente em cima do pequeno anel preto de queimadura. Sua
série de movimentos é fácil, antecipatória. Como se ele tivesse prática em limpar
bagunça exatamente assim.
Sempre pensei que era eu quem tinha tirado o menor palito. Brian Milford
abandonou minha mãe assim que o teste de gravidez deu positivo. Mas aqui,
observando isso, assistindo a Charlie cautelosamente observar seu pai enquanto
ele afunda em seu assento na cabeceira da mesa, não posso deixar de sentir que
tive sorte.
— Feliz Dia de Ação de Graças — ele murmura, olhando diretamente para
seu prato, sem se preocupar em olhar nos olhos de ninguém. Ele estende a mão e
pega purê de batatas direto da tigela de servir... com a mão.
E não posso evitar. Não sei se é a tensão de vir aqui, a contínua decepção de
meu pai e todas as suas falhas, ou o estresse da iminente visita de Evelyn, mas
enquanto observo o autodeclarado deus corporativo beliscando purê de batatas
na palma de sua mão como uma criança, eu… eu me descontrolo. Meus ombros
tremem enquanto tento manter a histeria sob controle. Eu engulo
compulsivamente, mais e mais. Mas é uma batalha perdida e assim que a mão de
Luka encontra a minha coxa por baixo da mesa, verificando meu estado mental,
tenho certeza, uma risada alta sai da minha boca.
Ah, como eu gostaria que uma pintura de Norman Rockwell fosse assim. Eu
poderia encomendar algo.
Meu pai franze a testa para mim. É a primeira vez que ele olha diretamente
para mim em quase um ano, eu acho, e ele tem um pouco de molho grudado no
canto da boca.
— Estelle — meu nome está arrastado no final. — Controle-se.
Minhas risadas continuam, embora mais moderadas.
— Tudo bem — eu concordo com um pequeno aceno de cabeça, disposta
como sempre, mas com uma dose saudável de sarcasmo que eu nunca tive
coragem de usar com meu pai. Eu não consigo evitar. Não quando ele está me
repreendendo com uma mão cheia de batatas. — Claro, farei o meu melhor.
A risada de Charlie escapa com isso, um estrondo de uma risada que faz meu
pai sacudir em sua cadeira. Olho para Luka e o vejo sorrindo para um pedaço de
caçarola de feijão verde. Com a mão dele ainda na minha coxa, os dedos mal
roçando a parte interna do meu joelho, estou de repente, absurdamente feliz por
ele estar aqui comigo. Que eu não vou ter que contar a ele sobre isso mais tarde
por FaceTime, enrolada sozinha no sofá. Tê-lo aqui é uma dose de conforto e
confiança. Eu encontro sua mão debaixo da mesa e aperto, seus olhos quentes
disparando de sua comida para mim e segurando meu olhar.
Charlie estava certo.
Melhor Dia de Ação de Graças de todos os tempos.
Elle não concorda com esse sentimento geral. Isso fica claro assim que meu
pai desmaia de cara com a testa quase encostando o molho de cranberry. É o
material de primeira também. Nenhuma massa trêmula de cranberry que ainda
se parece com a lata aqui. Há frutas e fatias de laranja de verdade, e estou
estranhamente decepcionada por não ter a visão do rosto do meu pai manchado
de rosa para mencionar na próxima vez que ele for um idiota.
Embora eu ache que a coisa do purê de batata vá funcionar tão bem quanto.
Decidimos tratá-lo como um acessório na mesa, tão inanimado quanto os
perus de papelão. Eu me pergunto se Elle vai gentilmente convencê-lo a ir para a
cama, mas ela se levanta e desaparece na cozinha, voltando com minhas duas
tortas e uma nova garrafa de vinho. Charlie tira várias fotos em seu telefone com
um suspiro melancólico.
— Eu sei que estávamos todos preocupados com o tipo de merda que esse
cara faria hoje à noite — diz ele. Elle faz uma careta para a sequência de palavrões
de Charlie. Ela tem uma regra sobre maneiras à mesa de jantar. — Desculpe,
mãe. Mas, no geral, acho que tudo acabou bem.
Meu pai bufa, seu corpo inteiro se empurrando uma vez. Ele se firma, e uma
de suas mãos pousa na tigela de molho.
— Quero dizer, olhe para essa decoração de mesa. — Charlie tira outra foto.
— Perfeição.
A mão de Luka ainda está na minha coxa por baixo da mesa, sua palma
levemente curvada, dedos quase dobrados no vinco entre o meu joelho e a minha
perna. Essa mão parece pesar cinco mil quilos, cada ponto de contato da sua pele
na minha se ilumina como uma placa de circuito. Ele aperta de vez em quando, e
quando seu dedo mindinho acaricia levemente a parte interna da minha perna,
eu pulo com tanta força que derrubo uma cesta de pãezinhos. Ele esconde o
sorriso no guardanapo e deixa a mão onde está.
— Essas são as tortas da Layla? — As mãos de Charlie já estão alcançando a
torta de abóbora mais próxima a ele, garfo preso entre os dentes. Eu balanço
minha cabeça.
— Não, são uma receita sem açúcar que fiz em casa. — Com o olhar
horrorizado de Charlie, eu arrisco um olhar para Elle. Embora essa noite tenha
sido diferente de todas as outras com a sua óbvia dispensa ao meu pai, eu ainda
não tenho certeza do que posso dizer na frente dela. Não quero que ela pense
que sou ingrata. Eu não quero que ela suspenda um convite no futuro. Estou
faminta por família, por conexão e raízes, não importa como elas venham.
Mas quando deslizo meu olhar para ela, ela está sorrindo serenamente em sua
taça de vinho, um olhar secreto em seus olhos que me diz que ela já sabe o que
vou dizer. Eu dou de ombros, envergonhada.
— Eu queria que a torta tivesse um gosto ruim.
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Charlie cai de volta em sua cadeira.
— Deus, Stel. Você poderia ter comprado nozes-pecã como eu disse! Isso já
seria bastante do contra.
Eu poderia.
— Apenas guarde esta torta para Brian pela manhã.
Elle levanta o copo com um soluço.
— Um brinde a isso.
Eu luto para não soar sem fôlego quando faço a pergunta, embora eu me sinta
um pouco como se tivesse levado um soco. Claro. Claro, foi isso. Os toques, os
olhares, os sorrisos fáceis. Foi tudo uma oportunidade de praticar na frente de
um público desconhecido. Assim como o nosso passeio pela cidade. Eu balanço
minha cabeça. Eu preciso me lembrar. Não posso continuar me confundindo
com Luka.
A vergonha se instala no meu estômago como uma pedra de chumbo quanto
mais tempo o silêncio permanece entre nós. É por isso que eu deveria ter
escolhido o serviço de acompanhantes. Aposto que não ficaria tão perturbada
assim com um encontro alugado.
Eu tento mudar de assunto.
— Acho que amanhã vou começar a arrumação para o feriado — murmuro,
agachando-me no meu assento. Eu trago meus joelhos para o meu peito,
consciente da forma como minha saia se abre em torno das minhas coxas. Os
laços. Vou colocar os laços amanhã e fingir que essa conversa nunca aconteceu.
Foi uma coisa idiota de se sugerir, de qualquer maneira. O que vamos fazer:
praticar o beijo? Não estamos no ensino médio. Somos capazes de nos beijar sem
praticar. — Eu gostaria de resolver tudo antes que Evelyn chegue.
Como minha sanidade.
— Ok — Luka diz a palavra, o carro começa a roncar abaixo de nós enquanto
a sujeira se transforma em cascalho. — Mas vamos rebobinar. Você acha que eu
vim com você hoje à noite para, o que, adquirir um pouco mais de prática?
Descobrir como segurar sua mão? — Eu observo enquanto ele se mexe em seu
assento, o cotovelo pousando no parapeito de sua janela. Ele esfrega acima de sua
sobrancelha, frustrado. — Eu não preciso praticar como segurar a sua mão — ele
murmura.
Eu me afundo ainda mais, meus joelhos batendo no painel, e envolvo meus
braços em volta de mim.
— Foi só um pensamento.
— Bem, foi um idiota.
Uma risada sai de mim.
— Obrigada.
Minha risada deve acalmar o que quer que o agite porque seus ombros se
desencostam de suas orelhas. Ele olha para mim uma vez do lado do motorista, a
luz das estrelas em torno de sua cabeça.
— Mas acho que você tem razão quanto ao resto.
— Que resto?
— A coisa da prática.
Eu pisco para ele.
— Você acabou de me dizer que não precisa praticar.
— Eu disse que não vim hoje à noite para praticar. Há uma diferença. — Seu
polegar traça a curva inferior do volante. — Acho que seria bom.
Isso me surpreende.
— Você acha?
— Sim, eu acho… — É a vez dele se revirar em seu assento. — Bem, com nós
dois sendo um casal. Addison…
— Evelyn — eu corrijo. Não entendo por que ele não consegue se lembrar o
nome dela.
— Ela provavelmente ficará confusa se formos um casal que não se toca.
Eu sei que foi minha sugestão, mas minha mente vai instantaneamente para a
sarjeta. Penso na mão dele na parte interna do meu joelho. Como estava quente,
quanto espaço ele cobria com a palma da mão, seus dedos levemente enrolados
ao longo da parte de dentro da minha coxa. Penso nele deslizando a mão mais
para cima, sob a saia do meu vestido. Mais alto ainda, seu nariz contra minha
garganta, minhas pernas bem abertas sob seus quadris.
Ele ainda está falando do seu lado do carro, explicando sobre uma coisa ou
outra, mas eu não ouvi nada disso. Eu limpo minha garganta.
— O que é que foi isso?
Ele engole em seco, um mergulho forte na estrada fazendo o carro balançar
abaixo de nós.
— Estou apenas dizendo. Não seria estranho se não nos beijássemos?
— Seria estranho se não nos beijássemos — eu concordo. Eu pareço sem
fôlego, como se tivesse levado um tiro no pé.
— Não há necessidade de soar tão empolgada com isso, La La.
Quando eu não digo nada em resposta, ainda presa pensando em suas mãos
nas minhas pernas, ele suspira, os nós dos dedos esticando o volante com a flexão
de suas mãos.
— Tenho certeza de que podemos evitar isso.
— Espera — eu me viro no meu assento, o cinto ficando preso no meu
ombro. — Por que você está chateado agora?
— Porque você está agindo como se eu tivesse lhe dado uma sentença de
morte — ele resmunga.
— O que você está falando?
Eu só consigo ver o canto de sua mandíbula na luz fraca do console, a ponte
de seu nariz. Mas é o suficiente para ver que ele está deliberadamente se
mantendo sob controle. Há uma rigidez em seu corpo que significa que ele está
chateado. Eu alcanço seu antebraço e aperto. Estamos quase chegando ao chalé
agora, a escuridão se enrolando em nós como um cobertor. As estrelas estão
escondidas por uma espessa camada de nuvens e tudo parece mais próximo,
silencioso e parado. Ele nos puxa para uma vaga na minha garagem, mas deixa o
carro ligado, um suspiro pesado saindo de algum lugar profundo em seu peito.
— Não sei. Essa conversa saiu do controle. — Ele passa a mão pelo rosto. —
Acho que você tem razão nisso de praticar — diz ele, numa tentativa de
recomeçar. A tensão que o esmagava começa a deixar seu corpo. — Aí, na
primeira vez que tentarmos na frente de uma platéia, você não será uma droga
nisso.
— Uma droga nisso? — Estou ofendida. — Eu não sou uma droga nisso.
Você provavelmente é uma droga nisso.
— Posso garantir que não sou uma droga nisso.
— O que, você tem uma pesquisa para enviar? Avalie o seu nível de satisfação
de 1 a 10?
Ele dá uma risada.
— Isso não é uma má ideia, na verdade. Vou adicioná-lo à minha cesta de
presentes pós-coito. Um pequeno código QR que elas podem digitalizar.
Reviro os olhos e saio do carro. É bom saber que podemos rapidamente
voltar ao nosso normal.
— Eu nunca mais quero ouvir a expressão pós-coito sair da sua boca.
q p p
Duas portas batem, botas ecoando pela passarela de pedra.
— Por quê? — Luka está me seguindo, caminhando devagar, com as mãos
nos bolsos.
Porque não quero pensar em Luka com ninguém. Porque sua mão na minha
coxa no jantar irá me assombrar por décadas. Eu limpo minha garganta
enquanto tento achar as minhas chaves na minha bolsa, Luka invadindo meu
espaço.
— Acho que coito é uma palavra estranha — digo para o interior da minha
bolsa. Um dia, talvez eu seja uma pessoa mais organizada e não precise caçar as
chaves da minha casa toda vez que precisar entrar. Mas não será no dia de hoje.
Sua risada sussurra na minha nuca. Eu tremo e espero que ele não perceba.
— Qual palavra você prefere então?
— Hm? — Eu finalmente consigo colocar minha chave na fechadura e
praticamente caio pela porta. Minhas bochechas estão quentes apesar do frio no
ar, minha respiração muito rápida. Eu desenrolo meu cachecol e o deixo cair
sobre a mesa.
— Se você não gosta de coito — Luka faz o seu melhor para conter seu
sorriso, mas ele luta para aparecer. — O que você prefere?
Prefiro não ter essa conversa.
— Eu não sei se eu já pensei sobre isso — eu consigo dizer. Eu tiro meus
sapatos e vou até a cozinha, Luka seguindo depois da sua necessária
reorganização do meu espaço. Estou feliz por ter tido a premeditação de preparar
o bom uísque essa manhã, sabendo que ia querer um hot toddy imediatamente
após a minha chegada. Está tudo bem organizado na bancada: uísque, limão,
chá, mel. E também restos de um pão de abóbora, cortesia de Layla.
Eu seguro a garrafa de uísque em uma pergunta silenciosa e Luka acena com
a cabeça. Ele encontra um assento na velha cadeira de balanço que fica na
cabeceira da mesa, incombinável e horrível, mas surpreendentemente
confortável. Eu pego o limão e a tábua de cortar.
— Cidade da sacanagem? Meter fofo? — Eu por pouco não corto o meu
dedo enquanto Luka lista as opções. — A dança sem calças?
— Eu não posso dizer que alguém já me pediu para ir à cidade da sacanagem.
— Algo mais direto, então — ele descansa o queixo na mão e me encara com
um olhar que sinto na barriga, na parte de trás dos joelhos. — Foder, né?
Eu engulo em seco com isso, uma enorme quantidade de fantasias atingindo
a minha mente como dominós sujos. Eu posso honestamente dizer que não
j p q
tenho mais ideia do que estamos discutindo. Ouço essa palavra, saindo de sua
boca, e perco o fio da conversa. Tudo que eu sei é o pulso de calor que está afiado
entre nós, seus olhos castanhos escuros na quietude da minha cozinha. Esse é um
território novo e... não é indesejável. Com a boca seca de repente, umedeço o
lábio inferior com a língua.
— Eu, hm… — Eu balanço minha cabeça e pego o uísque. — O quê?
— Foder.
Luka e eu discutimos sexo exatamente duas vezes, e apenas em termos vagos e
gestos sugestivos com a mão. Uma vez, quando mencionei a completa falta de
compromisso de toda a população masculina com as preliminares, e outra vez,
depois de assistir à uma peça de época com uma cena de amor muito confusa,
onde discutimos sobre boquetes por sete minutos.
Então eu estou... confusa. Confusa e corada da cabeça aos pés.
— Eu não… — balanço minha cabeça e corto os limões, ligo a boca do fogão
para o chá. O fato de eu conseguir até mesmo realizar essas tarefas básicas
quando parece que estou tendo uma experiência extracorpórea é surpreendente
para mim. Vou ouvir Luka falando foder pelo resto da eternidade. — O que está
acontecendo aqui?
Luka equilibra o tornozelo no joelho e balança para trás uma vez.
— Não sei. Eu me empolguei, eu acho. — Um leve rubor pincela as suas
bochechas, seu olhar permanece em meus ombros, deslizando pela curva das
minhas costas. Eu nunca o vi olhar para mim assim antes. Eu o sinto como uma
carícia. — É fácil se perder no momento — ele acrescenta como uma reflexão
tardia, a voz um sussurro na quietude da cozinha.
Eu o estudo, sem saber se ele está brincando comigo ou falando sério. Eu não
consigo dizer. Quase parece que ele está… meio que flertando comigo. Não sei o
que fazer com isso. Balanço minha cabeça levemente e luto para colocar essa
conversa de volta nos trilhos.
— Não era isso que eu tinha em mente.
— Não?
— Acho que ninguém vai perguntar como me refiro ao sexo.
— Esse é um ponto válido.
— Obrigada.
Nós nos encaramos em silêncio, o ar carregado. Meus olhos não sabem onde
pousar. As pontas de seus dedos, traçando para frente e para trás ao longo do
braço da cadeira. Suas longas pernas se abriram só um pouco. O rubor rosado
ç g p p
nas pontas de suas orelhas. Minha leitura corporal é interrompida quando a
chaleira começa a assobiar no fogão. Viro as costas para ele e pesco duas canecas
no armário superior, pressionando os dedos dos pés.
Normalmente, tenho canecas espalhadas pela cozinha. Não que eu seja
bagunceira, apenas prefiro a conveniência. Eu bebo muito café. E chá. E uísque.
E chá com uísque. Às vezes, vinho quente. E ocasionalmente, bolo de tigela. As
canecas são a minha escolha e, como tal, normalmente são deixadas em vários
lugares pela minha casa.
Mas tenho tentado ser mais arrumada, mais organizada, e a chegada de Luka
marcou a sua habitual mania quinzenal de limpeza. O que infelizmente significa
que estou colocando minhas canecas de volta no lugar mais inacessível da
cozinha. Ouço o ranger da cadeira de balanço, passos fáceis na madeira, e então
sinto Luka atrás de mim, perto o suficiente para que seus joelhos rocem a parte
de trás das minhas coxas. Minha respiração sai apressada quando uma de suas
mãos encontra o meu quadril, a outra indo para cima de nossas cabeças em
direção às canecas.
— Aqui estamos de novo — murmuro. Eu nunca peguei o banquinho para
olhar o que ele tem escondido lá em cima. Sentindo-me um pouco permissiva, eu
pressiono minha cabeça ligeiramente para trás para que eu possa sentir a pegada
de sua barba no meu cabelo. Sua risada ressoa nas minhas costas, uma caneca e
depois duas sendo colocadas ordenadamente na minha frente.
— Como Charlie te chama? Tampinha? — Luka não recua enquanto eu
pego a chaleira e sirvo, me passando o uísque por cima do ombro com uma mão,
a outra ainda no meu quadril. Ele aperta uma vez.
— Sim, ele está testando apelidos. Tentando encontrar um que role.
— Talvez ele devesse experimentar Canela. Não é assim que o xerife Jones te
chama?
Eu cantarolo, toda a minha existência focada em onde o polegar dele se
arrasta contra o osso do meu quadril. Ele me pressiona ainda mais, apenas por
um segundo, seu peso corporal uma pressão deliciosa e intensa contra mim. Seu
nariz se arrasta pelo meu cabelo, e se aninha uma vez abaixo da minha orelha.
— Você cheira a canela — diz ele, a voz calma, séria, insuportavelmente doce.
Viro a cabeça ligeiramente, minha têmpora contra sua mandíbula.
— Ossos do ofício.
— Todos os donos de fazendas de árvores cheiram à canela então?
— E às Fadas dos Doces.
Luka ri disso, a estranha tensão entre nós se estilhaçando. Ele dá um passo
para trás, mas sua mão continua contra meu quadril, dedos escorregando com
relutância. Olho para ele na luz fraca da minha cozinha e, por um único fôlego,
vejo uma fome selvagem, feroz. Mas ele pisca e se foi. Ele é meu Luka novamente,
a mudança tão rápida que acho que imaginei. Olhos castanhos suaves, sorriso
torto, cabelo uma bagunça selvagem.
Ele deixa cair uma fatia de limão na minha bebida.
— Tintim.
— Obrigada — eu entrego a ele a sua caneca, uma coisa velha e lascada que
tem uma raposa e diz oh, pelo amor da raposa7. Ele toma um gole e eu inclino
minha cabeça para ele. — E obrigada por ir comigo mais cedo. Significa muito.
— Você não tem que ficar me agradecendo — ele murmura, uma ponta
afiada de frustração em sua voz. Ele parece querer dizer mais, mas engole em seco,
os olhos vasculhando o meu rosto. Eu o sinto como a ponta de um dedo no meu
maxilar, na cavidade da minha garganta, no canto dos meus lábios. — Eu não
estou fazendo isso pela sua gratidão, ok?
Ele estende a mão por cima do meu ombro e pega um pedaço de pão de
abóbora do balcão, segurando-o entre os dentes enquanto me puxa uma vez em
direção ao sofá.
— Nós vamos assistir a Duro de Matar e você vai fazer sua imitação de Hans
Grueber.
Enquanto nos acomodamos no sofá, um cobertor de flanela jogado sobre
nossos colos, nem penso em questionar. Se ele não está fazendo isso pela minha
gratidão, então por que ele está fazendo isso?
— Vocês se beijaram?
Eu cuidadosamente mantenho a minha atenção na bandeja de chocolate com
hortelã e não em Layla. Eu não tinha a intenção de começar nossa conversa com
aquela bomba, mas eu estava guardando isso há dias e eu precisava contar para
alguém. E lá se vai não ficar obcecada.
Luka me mandou várias mensagens desde que saiu. Uma selfie dele com um
cannoli de abóbora da delicatessen italiana em sua rua, um olhar de horror
puxando os cantos daqueles olhos dourados, o corte reto e afiado de sua
mandíbula. Uma afronta sobre como nada é sagrado e os cannolis merecem ser
consumidos como Deus pretendia que fossem, com massa frita, ricota e lascas de
chocolate.
Vinte minutos depois, outra selfie depois de seus olhos fechados em absoluta
felicidade, a embalagem de cannoli vazia, um toque de abóbora grudado no
canto da boca. Mudei sua foto de contato imediatamente.
Uma mensagem perguntando se alterei a senha da HBO Max, e opa, não, ele
só usou a quantidade incorreta de pontos de exclamação. Eu vi que eles
acabaram de adicionar a coleção completa de filmes de Harry Potter? Uma nota
rápida de que ele deixou pipoca enfiada no armário perto do fogão quando
trouxe o jantar na outra noite. Manteiga de cinema, nada dessa porcaria de
pipoca doce.
Uma foto dele e Charlie saindo para almoçar, os dois rostos retorcidos em
carrancas exageradas e cômicas. Queria que você estivesse conosco, dizia.
E uma mensagem de voz lembrando a ele mesmo de pegar tomates frescos e
caldo de galinha, a voz sem fôlego, o som intenso de pesos ao fundo. Essa me fez
imaginar Luka suado e ruborizado, o cabelo úmido logo atrás das orelhas. Braços
flexionando e soltando. Ouvi aquela mensagem de voz duas vezes antes de excluí-
la completamente do meu celular, preocupada comigo mesma.
Uma mensagem de texto dezessete minutos depois com um pedido de
desculpas, ele pretendia enviar para si mesmo e eu estava no topo de suas
mensagens. Mas enquanto ele está pensando nisso… eu preciso que ele pegue
alguma coisa na mercearia no caminho de volta para a cidade?
Todas as mensagens completamente normais. Nem um único sinal de que ele
estava pensando no nosso beijo.
— Sim — eu pego um martelo e bato no chocolate de hortelã uma vez no
meio. Ele racha e eu bato nele mais duas vezes. Agora eu sei por que Layla está
sempre fazendo chocolates de hortelã sazonais. É muito catártico. — Mas foi um
beijo de mentira.
— Ah, ok. Um beijo de mentira. — Layla se arrasta pela cozinha enquanto
continuo batendo no chocolate.
Convertemos um antigo galpão para tratores em um espaço de cozinha e
padaria para Layla, os tetos baixos na parte de trás sendo onde ela cozinha tudo, a
frente substituída quase inteiramente por vidro. Árvores perenes e bálsamos se
pressionam por todos os lados, roçando contra as janelas. Quando está frio
especialmente, as janelas congelam na parte inferior e você mal consegue ver
Layla se movimentando atrás do balcão, bandejas de biscoitos e brownies e tortas
em pequenas fileiras em cada vitrine. Canecas recheadas com bengalas doces e
uma lousa com o especial do dia. O espaço de jantar está cheio de pequenas
mesas vermelhas com cadeiras de nogueira, aconchegantes cabines verdes ao
longo das paredes. Há mesas de piquenique com aquecedores bem na frente e
elas se espalham pelos pastos. Eu amo que esse lugar esteja escondido como uma
casinha de gengibre para os nossos visitantes descobrirem.
Eu vim aqui esta manhã com uma caixa de reposição de lâmpadas para os
cordões de luz que Beckett pendurou no final de semana e rapidamente fui pega
no trabalho do chocolate de hortelã.
Ela enrola os dedos em volta da minha mão que segura o martelo.
— Precisamos que isso seja chocolate de hortelã, querida. Não pó de hortelã.
Eu solto o martelo e franzo a testa para a bancada, pegando uma pequena
pilha de hortelã e chocolate com meus dedos. Layla pega uma das peças maiores
que deixei para trás e me oferece.
— Me explica o que envolve um beijo de mentira.
— Não sei. Exatamente o que parece ser, eu acho. — Eu dou de ombros e
penso no som que ele fez quando coloquei minhas mãos em seu cabelo. Aquele
zumbido baixo. Eu mordisco meu chocolate de hortelã. — Pensamos que seria
uma boa ideia treinar o beijo antes que tivéssemos uma audiência.
Layla me dá um olhar.
— Tudo bem. E então vocês o quê? Só se beijaram?
— Sim.
Layla suspira e se aproxima de mim. Ela dá outra pancada forte no chocolate
de hortelã.
— Você não está me dando nada para elaborar aqui.
— Não sei o que te dizer.
— Eu preciso de detalhes, obviamente.
— Como o quê?
Layla me encara como se quisesse usar o martelo em meus dedos.
— Como o quê — ela murmura. Ela abaixa o martelo e coloca a mão no
quadril, peneirando os cacos de hortelã até encontrar um que lhe agrade. —
Vocês conversaram sobre isso antes? Quanto tempo durou? Houve língua?
Vamos lá, agora. Não seja tímida.
Não é que eu seja tímida. Eu sou apenas um pouco... protetora, eu acho.
Agora parece meu… bem, meu e de Luka, e guardá-lo para mim parece ser o
certo.
— Foi... bom.
Com o olhar ligeiramente assassino de Layla, sinto um pouco da tensão ser
liberada dos meus ombros. Eu dou uma risada pelo nariz e alcanço os sacos em
que deveríamos estar colocando esse chocolate. Não nos esbaldando com.
— Foi um beijo gostoso — ofereço baixinho, pensando na forma como o
ouro dançou em sua pele, como sua palma pressionou a minha enquanto ele me
puxava para mais perto, na curva de seu corpo. Eu suspiro. — Foi um beijo
realmente muito gostoso.
— Um beijo gostoso.
— Sim.
Layla cantarola baixinho, seu interrogatório desaparecendo, um brilho
pensativo entrando em seu olhar enquanto ela inclina a cabeça para o lado. Ela
pega uma tesoura e arrasta a lâmina ao longo de um fio vermelho cereja, a fita
enrolada sob seus dedos.
— Sabe, você tem permissão para aproveitar o tempo com Luka.
— Eu sei. Eu sempre aproveito o tempo com Luka.
— Eu quis dizer — ela amarra a fita em um laço e repete a ação, as unhas
verde floresta se movendo perfeitamente durante a manobra. — Eu quis dizer
algo como você tem permissão para gostar de beijá-lo. Divertir-se fingindo.
E é só isso, né? Eu gosto do fingimento. Demais, provavelmente. É o fim do
fingimento que será o problema. O que vem depois. Não consigo parar de pensar
nisso, apesar do plano de Luka de continuar.
Caímos no silêncio, o som das sacolas e o enrolar da fita os únicos sons entre
nós. Estou mais uma vez grata pelo trabalho que mantém as minhas mãos e o
meu cérebro ocupados.
— Faz um tempo desde que eu tive um beijo gostoso — ela diz, um pouco
nostálgica. Penso nela e em Jacob, seu namorado atual. O jeito que os olhos dele
ficam colados no seu celular ao invés de em qualquer lugar ao redor dela quando
eles estão juntos. Eu franzo a testa e alcanço a sua mão, apertando-a uma vez. Ela
me dá um sorriso forçado e aperta de volta.
Um cronômetro emite um bipe ao fundo. Mais uma bandeja de guloseimas
prontas para sair do forno. Layla ainda está olhando para mim pensativa após a
interrupção, esfregando o polegar para frente e para trás sobre o lábio inferior.
— O quê?
Ela pisca, um sorriso malicioso curvando seus lábios.
— Eu teria pagado muito dinheiro para ver a cena.
Eu gaguejo uma risada, bochechas ficando vermelhas. Às vezes, a tímida e
doce Layla me surpreende. Eu belisco a pele logo acima de seu cotovelo.
— Não torne isso estranho.
— Tarde demais — ela canta, indo em direção aos fornos.
— Tudo bem, pessoal. Isso tem sido divertido e tudo mais — eu descanso as
minhas mãos em meus quadris, encarando o fundo do celeiro. Alguma coisa
conseguiu desenredar metade da guirlanda que eu enrolei nos postes de
sustentação e duas fitinhas estão faltando nas guirlandas da porta. — Mas é hora
de limpar.
Estou bem ciente de que os guaxinins são criaturas noturnas, mas minha
coragem está passando. Eu tentei vir aqui ontem à noite com uma lanterna e
uma raquete de tênis, mas isso pareceu uma má ideia assim que dei dois passos
para o pasto e ouvi um barulho inexplicável no escuro. A lanterna caiu e eu fui
correndo de volta para minha casa. O que planejei fazer com uma raquete de
tênis, nunca saberei. Agora, à luz do dia, com certeza é menos assustador. E eu
deveria ser capaz de pelo menos descobrir onde essas criaturas estão fazendo
ninho.
Novamente, não tenho ideia do que farei com essa informação. Mas
precisamos desse celeiro para o Papai Noel e, a menos que possamos convencer
esses guaxinins a colocar chifres de rena, eles precisam encontrar um novo lar.
Algo farfalha no canto mais distante e eu me preparo. Eu posso fazer isso. Já
fiz coisas mais assustadoras do que isso. Encontrei aquela pequena família de
baratas quando estávamos esvaziando o galpão do trator. Eu tive pesadelos com
perninhas minúsculas rastejando pelo meu cabelo por semanas. Isso não é nada
comparado a aquilo.
Eu dou um passo mais perto. Há outro movimento aleatório e então um...
miau? Um pouco mais corajosa, atravesso o celeiro e enfio a cabeça por cima da
nossa velha caixa de correio de metal. Aninhada logo atrás dela com algumas das
guirlandas que desapareceram e uma fita vermelha de veludo enrolada em um
pequeno ninho, está uma mamãe gata e seus três gatinhos. Todos brancos com
manchas pretas ao redor dos olhos.
— Bem — Mamãe Gata olha para mim com desconfiança, enrolando seu
corpo mais perto das três bolinhas de pelo enroladas ao redor dela. — Isso não é
o que eu esperava.
Meia hora e alguns telefonemas depois, Beckett, Layla e eu estamos olhando
para a pequena família em meu escritório, aninhada em um cesto de roupa suja
com o pedaço da guirlanda que a Mamãe se recusou a soltar. Ela não tinha saído
da sua casa sem reclamar, mas assim que me viu colocar seus bebês
delicadamente na cesta e convencê-la a se juntar, ela foi bastante agradável. Agora
todos os quatro estão cochilando, roncos doces de seus narizes rosados.
— Isso é adorável para caralho — Beckett murmura, quase com raiva. Ele
gira o seu boné de beisebol para trás e cruza os braços sobre o peito. — O que
devemos fazer com eles?
— Levá-los para o abrigo?
Beckett desdobra os braços e apoia as mãos nos quadris, me lançando um
olhar. Eu levanto as duas mãos.
— Ok, talvez não. Eu só… eu não sei o que fazer com quatro gatos.
— Acho que devemos levá-los ao Dr. Colson e começar daí. — Layla se
agacha, pressionando o rosto contra as barrinhas do cesto de roupa suja. Uma
pequena pata toca seu nariz, e ela praticamente se derrete no chão em uma poça.
Ela suspira sonhadora. — Eles realmente meio que se parecem com guaxinins.
Com sua coloração e as manchas ao redor de seus olhos, não é de admirar
que eu os tenha confundido com guaxinins durante todo esse tempo.
Francamente, eu tinha aberto a porta do celeiro uma vez, vi um flash de preto e
branco, e encerrei o dia. Eu sempre pensei que um guaxinim muito emotivo
estava deixando aquelas marcas de arranhões em todos os postes.
— Talvez devêssemos chamar a mamãe de Guaxinim — eu penso em voz
alta, e tanto Beckett quanto Layla me dão uma encarada. — O quê?
— Se estamos dando nomes aos gatos, é provável que estejamos ficando com
os gatos. — Layla se levanta, limpando as mãos na parte de trás de seu jeans.
Olho de volta para as pequenas bolas de pelo e sinto uma pontada aguda de
saudade. Eu sempre quis um animalzinho de estimação enquanto crescia, mas
nunca tivemos tempo ou espaço. E com nossa época movimentada chegando e
com Evelyn chegando em uma semana, com certeza não temos tempo agora.
Mas talvez, com nós três, pudéssemos...
— Nós não vamos chamá-la de Guaxinim — Beckett bufa. — É um insulto.
Acho que é óbvio como devemos nomeá-los.
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Layla e eu trocamos um olhar, seu sorriso escondido atrás das pontas dos
dedos. Beckett não desviou o olhar dos gatos nem uma vez.
— Ah, é?
Ele aponta para o menor pacote de pelo, bem apertado com o rosto dela
escondido no peito de sua mãe.
— Cometa. — Ele aponta para os outros dois, enrolados juntos. — Cúpido,
Vixen. — Ele aponta para a mãe, que virou o rosto para olhá-lo com o que eu
juro por Deus ser a versão felina de olhos apaixonados. Beckett segura seu rosto
minúsculo com a mão grande e ela ronrona, aninhando-se na palma da mão dele.
— Ela é Prancer.
— Bem — Layla suspira. — Acho que agora temos gatos.
Quatro brownies depois e Evelyn parece estar pronta para afundar na cabine
e dormir pelo resto dessa viagem. Nós estamos acomodadas no meu lugar
favorito da padaria, um cantinho aconchegante em uma esquina, ao lado da
lareira de pedra. É uma cabine de encosto elevado, com assentos de veludo verde
e uma montanha de almofadas xadrez, uma mesa de madeira escura no meio.
Evelyn pega uma almofada e se aconchega no cantinho, um som condescendente
enquanto ela olha pelas janelas para as árvores além.
Ela é fácil de gostar, fácil de conversar, e acho que é por isso que ela é uma
personalidade tão querida online. Eu estou muito chocada por ainda não tê-la
visto com seu celular em mãos, e eu menciono isso durante uma pausa na nossa
conversa.
Ela acena com a mão entre nós, fitando o prato de brownies ainda meio
cheio na beirada da mesa.
— Antes de tudo, gosto de conhecer os lugares que eu visito — diz ela,
esfregando o lábio inferior. — O que soa super pretensioso, eu sei, mas… eu
percebo que sou uma pessoa que ganha a vida nas redes sociais, mas eu odeio
como isso nos priva às vezes, sabe? As pessoas ficam muito focadas em como as
coisas se parecem ao invés de como as coisas são — ela encolhe os ombros. —
Vou começar a produzir conteúdo amanhã. Faremos a cobertura ao vivo, é claro,
e depois um destaque completo que será publicado em algumas semanas. Você
será mencionada no blog, todas as coisas que minha equipe acertou com você.
Uma menção no blog, uma lista oficial como participante do concurso em
seu site e um destaque em cada um de seus canais sociais. Mesmo sem o prêmio
em dinheiro que será anunciado ao final de suas viagem, é o suficiente para fazer
uma grande diferença no nosso futuro.
Ela arrasta o prato de brownie para mais perto e depois o empurra
novamente com um gemido.
— Embora eu possa entrar em um coma de chocolate até lá.
— Layla tem um dom.
Os olhos escuros de Evelyn se iluminam.
— Isso mesmo. Seus parceiros de negócios, Layla e Beckett.
Eu concordo.
— Layla faz toda a confeitaria aqui nas instalações com a sua equipe. Nós
atendemos durante o horário da fazenda, e ela também faz alguns serviços de
bufê para a cidade.
— Que é a mais fofa de todas, falando nisso.
Eu estou tão feliz que ela pense isso. Nossa pequena cidade não agrada todo
mundo. O serviço de correio tem dificuldade para entregar aqui, e não temos
grandes lojas de departamentos onde você pode comprar de tudo, desde
decoração a rímel e uma caixa de vinho em uma só compra. Você teria que fazer
pelo menos três paradas diferentes para comprar todas essas coisas em Inglewild.
Todo mundo cuida da vida de todo mundo e você não consegue sair de casa sem
encontrar pelo menos quatro conhecidos. Mas sempre tem alguém para me
perguntar como estou. E para dar uma ajudinha quando eu preciso.
Nós somos uma família. Uma estranha, da qual você quer férias prolongadas
às vezes, mas uma família mesmo assim. Eu olho para a mesa no canto onde Gus,
Clint e Monty estão detonando uma caixa de rosquinhas francesas.
Aparentemente, essa é a vez deles no cronograma de visitação à fazenda. Bailey e
Sandra estiveram aqui ontem, correndo pelo celeiro aberto como um casal de
adolescentes.
— Beckett lida com todas as nossas operações agrícolas e supervisiona a sua
própria equipe. Principalmente colheitas e manutenção, mas ele se interessa por
outras coisas também. — Tipo criar uma família de gatos, aparentemente.
Ela assente, seus olhos ainda viajando de mim para os brownies. Eu mudo o
prato para mais perto dela e ela pega outro com uma risadinha.
— Obrigada. E Luka, o seu namorado. — Meu estômago afunda e meu
sorriso vacila com a mentira dita em voz alta. Digo a mim mesma que é pela
fazenda, que é inofensivo no esquema das coisas, mas ainda sinto aquela agitação
de dúvida no fundo da minha mente. — Como é trabalhar com seu
companheiro? Não tenho certeza se muitas pessoas conseguiriam fazer isso.
Penso em Luka deitado de bruços no telhado do escritório, um parafuso
entre os dentes enquanto ele martelava alcaçuz falso nas telhas. Como mais tarde
naquela noite ele descansou o queixo no meu ombro enquanto eu lia os
relatórios de despesas, um litro de sorvete na mão enquanto ele consertava as
minhas fórmulas do Excel para facilitar a inserção de dados.
— É perfeito — eu digo, porque é. Perfeito demais. Eu quero isso para
sempre, não apenas por essa semana. A ressaca do relacionamento falso vai me
p p p
chutar bem nos dentes. Como você volta a traçar limites quando seu melhor
amigo já esteve com a mão dentro das suas calças? Eu não faço ideia. Limpo
minha garganta. — Somos uma boa equipe.
Olho para o relógio acima do balcão e expulso da minha mente todos os
pensamentos sobre Luka e aquele sofá.
— Eles devem estar aqui em breve, na verdade. Eu disse a eles para nos
encontrarem mais ou menos agora.
Empolgação ilumina seus olhos escuros.
— Ótimo. Eu quero beijar Layla no rosto por esses brownies.
— Quem estaremos beijando? — Beckett aparece na beirada da cabine com
uma caneca de Papai Noel, uma carranca no rosto e uma gatinha no ombro. Eu
reconheço Cupido, o pequeno ponto preto em forma de coração em sua pata
dianteira a denunciando. Eu estendo minhas mãos para ela e a abraço quando ela
pula alegremente em meus braços.
— Layla, por causa dos brownies — explico. Ele resmunga no que eu
suponho ser concordância. — Beckett, deixe eu apresentar a…
Eu me viro na cabine para olhar para Evelyn e fico surpresa ao ver o olhar de
choque em seu rosto, sua boca boquiaberta. Ela fecha a rapidamente quando eu
levanto as duas sobrancelhas e imediatamente olha para a mesa. Eu olho de volta
para Beckett em um questionamento e ele está congelado com a sua caneca a
meio caminho de sua boca, o olhar colado na linda mulher sentada à minha
frente.
— Errr — eu digo, eloquente como sempre. Sinto o meu rosto se contraindo
em confusão. Beckett não desviou o olhar de Evelyn e Evelyn não desviou o olhar
da mesa. Cupido mia do berço em meus braços. — Errr, Beckett, essa é Evelyn.
Evelyn, esse é Beckett.
Silêncio.
— Errr — eu começo novamente e tento desesperadamente chamar a
atenção de Beckett. Eu o chuto na canela uma vez e ele se encolhe. Eu levanto
ambas as sobrancelhas para ele significativamente.
— Prazer — ele limpa a garganta e coloca a caneca na mesa, esfregando a
mandíbula. — Prazer conhecê-la.
Evelyn assente rapidamente e ergue os olhos uma vez apenas para atirá-los de
volta para a mesa. Seus dedos estão brancos onde ela está segurando a borda dela.
Eu franzo a testa e aproximo o prato de brownie.
Beckett desliza para a cabine ao meu lado depois de outra longa hesitação e
nós três nos sentamos em silêncio. Eu olho para Cupido.
— Errr, nós resgatamos esses gatos — eu ofereço, esperando afastar a
estranha tensão que se estabeleceu entre nós. Eu não tenho ideia do que está
acontecendo, não tenho ideia do que aconteceu quando Beckett chegou. Será
que ela o acha bonito? Quer dizer, claro, Beckett é lindo de se olhar.
Objetivamente falando. Já o vi aturdir as mulheres que vêm à fazenda mais de
uma vez. Mas não consigo imaginar que ele deixaria alguém como Evelyn sem
palavras. Acaricio a cabecinha macia de Cupido. — Eles estavam morando no
celeiro do Papai Noel. Achei que fossem guaxinins.
— Ela é uma gracinha — murmura Evelyn, sem um único pingo de
entusiasmo. Eu franzo a testa. Ela olha para mim, uma pequena linha de
ansiedade no espaço entre as suas sobrancelhas perfeitas. — Escuta, Stella, eu
tenho que correr de volta para o hotel bem rapidinho, ok?
Eu franzo a testa.
— Eu ia…
Mas ela já está se movendo, saindo da cabine e jogando almofadas em todas as
direções.
— Eu vou voltar de manhã e podemos começar do zero.
Ela sai da padaria sem dizer mais nada. Olho para a porta, a guirlanda
pendurada na frente balançando para frente e para trás com a força de sua saída.
Beckett pega um brownie ao meu lado com um longo suspiro de sofrimento.
— Estelle.
Eu estreito os meus olhos. Beckett só me chama pelo meu nome completo
quando temos um problema. Cupido escorrega do meu aperto e se esfrega
contra o antebraço de Beckett. Vou ter que falar com ele sobre ter os gatos na
padaria. Ele olha para mim e dá uma mordida gigante no brownie.
— Por favor, me explique o que acabou de acontecer.
Ele engole e olha para o teto, em seguida, para as mãos.
— Bom — ele se remexe na cabine e coloca o cotovelo na mesa e depois o
levanta novamente. Acho que nunca vi Beckett tão sem palavras. — Ah, bom.
Eu dormi com aquela mulher.
— Beckett — eu faço as contas. — Ela está na cidade há seis horas.
Ele revira os olhos.
— Não foi hoje. — Ele mexe com o punho da manga. — Você se lembra de
quando eu fui àquela palestra no Maine? Aquela sobre agricultura orgânica?
q q p q g g
— Você não parou de falar sobre como os fertilizantes sintéticos são os piores
por quase um mês. Você está me dizendo que dormiu com Evelyn naquela
viagem, e que fertilizantes sintéticos foi tudo o que eu fiquei sabendo?
Ele coça grosseiramente a nuca e faz Cupido sair voando pela mesa. Ele a
pega de volta e a coloca em seu colo.
— Eu não… nós não falamos sobre coisas assim. E foi uma coisa de uma vez
só. — Seus olhos ficam nebulosos, um pequeno sorriso chutando no lado direito
de sua boca. Eu quero dar um soco na cara dele. — Mais como uma coisa de três
vezes, eu acho. Ela estava hospedada na mesma pousada que eu. Nos
conhecemos em um bar.
Eu me lembro de ver fotos dela em uma pequena pousada no Maine. Suas
fotos da colcha de flores silvestres e das ervas frescas no parapeito da janela. Para
mim, é alucinante que Beckett estivesse lá. Ele estava debaixo daquela colcha.
— Acabou mal? Por que ela teve essa reação?
Ele dá de ombros e dá outra mordida no brownie.
— Beckett. — Ele mastiga e mantém os olhos firmes no tampo da mesa. Essa
cabininha nunca foi inspecionada tão minuciosamente. — Explica isso para
mim.
Ele dá de ombros novamente.
— Eu não sei, Stella, não consigo nem explicar isso para mim mesmo. — Ele
termina seu brownie e se recosta na cabine. Não faço ideia do que isso significa
para o concurso, para a viagem dela aqui. Ela vai embora mais cedo? Estamos
desclassificados? — Ela provavelmente estava apenas surpresa. Nós não… nós
não conversamos muito, exatamente. — Um rubor furioso ilumina a sua nuca e,
apesar de tudo, sinto uma gargalhada borbulhando no meu peito. Toda essa
situação é surreal.
Eu inventei um namorado falso para que Evelyn achasse esse lugar
romântico. Beckett, sem saber, dormiu com ela em uma viagem de fim de
semana ao Maine. Temos um invasor misterioso determinado a prejudicar a
fazenda.
Seria engraçado se não fosse uma bagunça.
— Foi ela quem saiu primeiro. Nós estávamos, hm, nós passamos a noite
juntos e quando eu acordei de manhã, ela tinha ido embora. Todas as coisas dela
também se foram.
— Você nunca tentou encontrá-la? Nunca a viu nas redes sociais?
Ele faz uma careta para mim.
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— Você sabe que eu não faço nada nas redes sociais. Achei que ela tinha um
motivo para sair do jeito que saiu. Eu não corro atrás de pessoas que não querem
ser seguidas.
— Justo — eu digo. Caímos em silêncio. Eu examino Beckett e listo a tensão
em seus ombros, o jeito que ele não parou de se mover desde que Evelyn partiu.
Seus dedos contra o tampo da mesa. Seu joelho pulando embaixo dela. Um
movimento de seus quadris a cada poucos segundos no assento da cabine. Na
minha surpresa, esqueci o mais importante.
— Ei — eu enrolo a minha mão logo acima de seu cotovelo e puxo uma vez.
— Você está bem?
Ele assente, abaixando a cabeça um pouco.
— Estou bem. Com vergonha, em grande parte. Não quero estragar nada
para nós. Eu sei o quanto isso é importante.
Eu tremo. Ele não tem ideia de como isso é importante porque eu não fui
honesta com ele. Um flash de vermelho na janela chama a minha atenção, a
jaqueta brilhante de Layla enquanto ela e Luka se arrastam em direção à entrada
da padaria. Ela ri de algo que ele diz, ambas as bochechas coradas com o frio. Eu
tomo uma decisão.
— Sobre isso. Preciso falar com você e Layla. Luka também.
Espero até que todos estejam sentados na cabine, bebidas quentes para Layla
e Luka depois de sua manhã nos pastos. Layla tem falado sobre técnicas
apropriadas de serragem desde que eles chegaram, um Luka perplexo atrás dela
desde a porta para a cozinha nos fundos até a nossa cabine aconchegante no
canto. Mas ela para abruptamente quando percebe como Beckett está tenso na
beirada do banco de madeira, a carranca no meu rosto.
— Vibe estranha — ela diz e eu sinto a bota de Luka cutucando a minha por
baixo da mesa, um silencioso “você está bem?” no arco de sua sobrancelha. Ele
está usando suas botas de caça às árvores, aquelas com a flanela.
— Nós temos algumas… — Eu lanço um olhar para Beckett, que parece
querer derreter no chão. Eu acaricio suas costas uma vez em solidariedade. —
Temos algumas atualizações.
— Eu dormi com Evelyn — Beckett oferece, sem um pingo de preparação ou
contexto. Layla cospe o seu chocolate quente e derrama metade na mesa entre
nós. Luka apenas o encara, as sobrancelhas franzidas. Jogo uma pilha de
guardanapos para Layla.
— Estou confuso — Luka olha para mim, então para Beckett, então para
mim novamente. — Ela não acabou de chegar aqui?
Beckett divide com eles os mesmos detalhes vagos que dividiu comigo.
Pousada. Maine. Seis meses atrás. Conferência do Agricultor. Ele soa como se
estivesse contando uma ida ao dentista, não uma aventura selvagem e sexy de fim
de semana. Os olhos de Layla ficam maiores a cada staccato até que ela está
praticamente dobrada sobre a mesa, em êxtase. Beckett finaliza a sua história e cai
de volta em seu assento. Cupido cutuca seu queixo uma vez com sua patinha.
— Beckett — Layla respira. — Eu não sabia que você fazia sexo.
Ele se mexe e cruza os braços com uma carranca.
— Claro que eu faço sexo.
— Claramente.
— Eu só sou reservado com isso.
— Obviamente.
— Ok. — Eu esfrego minha testa. — Já chega de... disso. — Beckett parece
querer que o chão se abra embaixo dele. — Tem algo que eu preciso contar para
vocês. — Três pares de olhos concentram sua atenção em mim, os de Luka se
estreitando em preocupação. Eu reúno minha coragem e endireito a minha
coluna. Eu lhes devo uma explicação. Eu lhes devia uma explicação há muito
tempo. — Eu tenho sido bastante vaga sobre como a fazenda está se saindo
financeiramente. A verdade é que não está bem.
Beckett estreita os olhos.
— Essa é uma afirmação tão vaga quanto.
— Apesar de termos tido um ano incrível no ano passado, ainda não estamos
tendo um grande lucro. — Talvez se eu falar mais rápido, seja mais fácil. A bota
de Luka ainda está entre a minha e ele bate no meu pé uma vez. — O que eu
estava esperando, e contando com. O que eu não estava nos meus planos foram
todos os consertos extras que fizemos no ano passado, a perda do pasto do sul, as
remessas desaparecidas e as dívidas que devemos a alguns fornecedores
diferentes…
— Espera, o quê?
Eu ignoro Beckett e continuo.
— Resumindo, estamos meio que perdendo dinheiro agora. Espero que essa
temporada ajude com os nossos valores, especialmente com a atenção a mais de
ter Evelyn aqui. Mas estou realmente apostando nesse grande prêmio em
dinheiro.
— Eu não entendo — Layla começa lentamente. — Como assim estamos
tendo problemas com dinheiro? Eu ainda recebo meu salário quinzenalmente. A
minha equipe também. Os salários não atrasaram ou faltaram nenhuma vez.
Beckett exala bruscamente pelo nariz.
— Idem. — Pela expressão tempestuosa em seu rosto, ele sabe exatamente o
porquê isso acontece.
— Stella — a voz de Luka é calma, aflita. Acho que ele descobriu também.
Eu mantenho os meus olhos nos guardanapos molhados amontoados no centro
da mesa.
— Eu nunca vou cortar os pagamentos de ninguém que trabalha aqui. Fiz
uma promessa a vocês dois quando decidiram se juntar à fazenda, e vou cumpri-
la.
Eu estava com medo, eu quero dizer. Eu não queria que vocês pensassem que eu
sou um fracasso. Eu não queria decepcionar vocês. Eu não queria que vocês fossem
embora.
— E quanto ao seu salário?
Minha despensa está cheia de lámen. Luka coloca barras de proteína no meu
porta-luvas toda vez que vem para casa. A casa veio com a fazenda e meu carro
está totalmente quitado há anos. Eu não preciso de um salário consistente, não
como Beckett e Layla.
Quando fico em silêncio, Beckett se levanta da mesa com um bufo.
— Estou saindo — ele anuncia, sucinto como sempre. Eu esperava por isso,
mas ainda estremeço com o baque pesado das suas botas contra os azulejos da
padaria. Ele caminha até a porta, muda de ideia no meio do caminho e volta. Os
bombeiros no canto fazem o possível para parecer que estão ocupados,
estudando a última rosquinha francesa no prato deles como se ela fosse
eletricidade inventada.
Beckett volta para a beira da cabine e me encara. Sua decepção é o pior de
tudo, a tristeza e a mágoa que permanecem na pressão firme de sua boca. Ele
engole uma vez.
— Isso não é o que parceiros fazem — diz ele calmamente. Eu assisti Beckett
discutindo com duas de suas irmãs uma vez. Ele ficou quieto enquanto elas
gritavam, os braços cruzados sobre o peito, deixando-as continuar enquanto ele
estava parado ali. Na época, achei divertido. Olhar para elas desperdiçando toda a
sua energia apenas para dar de cara com uma parede de tijolos. Agora, porém,
posso simpatizar. Calado e desapontado, Beckett é mil vezes pior do que
qualquer demonstração de raiva. Eu assinto uma vez.
Esse dia não saiu nada como o planejado.
Ele sai ao som alegre dos sinos de prata em cima da porta. Eu gostaria que ele
tivesse batido ao invés disso.
Layla estende a mão por cima da mesa e pega a minha mão.
— Ao mesmo tempo em que estou tão brava quanto Beckett por você
esconder isso de nós, eu quero acrescentar que eu te amo. — Ela se levanta da
mesa e veste a jaqueta de volta, virando o capuz para cima e sobre a cabeça. Ela
parece uma exploradora ártica mal-humorada. — Falaremos sobre isso mais
tarde. Tenho um pedido para entregar na cidade.
— Você vai voltar?
Ela me dá um sorriso triste.
— Sim, querida. Eu vou voltar.
Eu a vejo sair com mil desculpas na ponta da minha língua, mas eu as mordo
de volta. Gritar para ela não vai mudar nada. Eu caio na cabine e evito os olhos
de Luka, recolhendo a bagunça do chocolate quente derramado. Eu sei que há
uma moral aqui sobre dizer a verdade, mas não consigo aplicá-la à nossa situação.
Talvez quando eu ver Evelyn amanhã, se eu ver Evelyn amanhã, meu cérebro me
lembra de forma útil, eu possa ser honesta com ela. Que Luka não é meu
namorado, que tudo isso foi um mal-entendido.
— Quer ir para casa?
Eu assinto para a mesa e respiro fundo, trêmula. Luka ouve e suspira, sua
mão segurando o meu cotovelo e me puxando para ele assim que saio do banco.
Eu seguro um punhado de toalhas de papel molhadas por cima de seus ombros e
tento não molhar a sua jaqueta.
— Vai ficar tudo bem — diz ele em algum lugar acima da minha cabeça. Seus
braços apertam, mas ele não faz o seu um-dois-três. Digo a mim mesma para não
pensar demais nisso. — Nós vamos dar um jeito nisso.
Eu quase não consigo fazer uma limpa no meu e-mail antes de ter outro
grupo de visitantes.
Beckett entra no meu escritório com um olhar determinado em seu rosto,
uma pilha de papéis debaixo do braço. Ele bate o livreto na minha mesa e, em
seguida, cai na mesma cadeira em que Evelyn estava sentada há uma hora atrás,
os braços cruzados no peito. Layla se apressa atrás dele, ofegante, um pedaço
gigante de cartolina em suas mãos.
— Você não acreditaria como essa coisa pega o vento — diz ela, colocando a
enorme cartolina na cadeira desocupada, com o canto para baixo. Ela arranca a
jaqueta e aponta para a pilha na minha mesa. — Beckett te trouxe os anexos.
Bom.
— Não tive tempo para laminar — diz ele, ainda me encarando.
— Você não tem sua própria máquina?
— Quebrada — ele resmunga.
Tentei ligar para os dois ontem à noite depois que Luka e eu dançamos pela
cozinha o suficiente para o meu coração se acalmar. Todas as minhas ligações
foram direto para a caixa postal. Viro a pilha de papéis na minha mesa para ler a
primeira página: PLANO DE NEGÓCIOS DA FAZENDA LOVELIGHT em
negrito.
Agora eu entendo o porquê ninguém estava atendendo seus telefones.
— Devo me sentar?
Beckett e Layla assentem em uníssono e então me conduzem por uma
apresentação de quarenta e cinco minutos. Há seções separadas por cores no
livreto sobre novos fornecedores, referências a leis locais sobre isenções fiscais e
créditos, e até mesmo uma planilha de orçamento que se parece muito com a que
mostrei a Luka ontem à noite, uma coluna destacada em amarelo com os nossos
números iniciais se começarmos a cobrar taxas de entrada.
Viro a página e olho para as projeções salariais, minhas sobrancelhas se
unindo em confusão quando vejo os números.
— Isso está errado — eu digo, interrompendo Layla no meio da frase e
estremecendo em desculpas. — Desculpa. Eu estou olhando a seção de
pagamento e esses números estão errados.
Beckett esfrega o queixo com a palma da mão, as pernas para fora. Layla
liderou a maior parte desta apresentação, mas ele ficou bastante entusiasmado ao
falar sobre fertilizantes. Como sempre. Ele vira para a página correspondente em
seu livreto e arqueia uma sobrancelha.
— Eles não estão errados.
— Eles estão errados em cerca de trinta por cento — eu aperto os meus
olhos. — Mmm, na verdade. Em cerca de…
— É um corte salarial de quarenta por cento para Beckett e para mim —
Layla diz sem um pingo de hesitação. — Com o reembolso embutido do que
você cortou de si mesma.
— É um corte de cinquenta por cento para mim — Beckett resmunga. —
Não pago aluguel pela minha casa. Isso deve ser incluído no meu pacote de
benefícios.
Eu engulo e mantenho meus olhos nos números.
— E todos os outros? — Eu limpo a minha garganta até a minha voz não
vacilar. — A ajuda temporária e as equipes de vocês? Seus números não mudam?
— Todo mundo fica com o que já tem. O corte salarial apenas para nós três
deve ser capaz de nos carregar por mais alguns meses, mesmo sem o prêmio em
dinheiro.
Eu pressiono abaixo dos meus olhos e mantenho o meu olhar na planilha
firmemente. Tenho medo de que, se olhar para cima, eu possa explodir em
lágrimas.
— Eu não posso deixar vocês fazerem isso.
— Bem, estamos fazendo isso, então — Layla apoia as mãos nos quadris. Ela
gesticula para a cartolina, onde desenhou um gráfico com linhas listradas
vermelhas e brancas, contornadas em glitter. Projeções financeiras para os
próximos três anos. — E tem outra coisa. Beckett e eu discutimos sobre isso.
Queremos ser sócios igualmente. Gostaríamos de dividir a propriedade e todas as
obrigações financeiras em três.
Beckett intervém.
— Precisamos ver seus investimentos iniciais, uma lista completa de quanto
o terreno te custou e todos os reparos. Vamos avaliar e dividir. Há alguma
papelada legal a ser feita também. Por causa da propriedade. Mas se você estiver
disposta a nos deixar fazer parte disso, nós topamos.
Layla assente.
— Nós super topamos. Até o fim. Deveria ter sido assim desde o começo,
Stella. Isso parece ser certo.
Eu chupo uma lufada de ar e olho para Layla. Seu rosto está aberto, nenhum
sinal da resignação magoada de ontem. Agora ela só parece determinada. Ela me
dá um pequeno aceno de cabeça, apenas uma inclinação de seu queixo.
Beckett é diferente. Ele é todo linhas duras e sobrancelhas franzidas, braços
ainda cruzados na altura do peito, as mangas da sua flanela enroladas até os
cotovelos. A tinta colorida pintada na sua pele é uma boa distração do jeito que
meu coração está batendo no meu peito. Olho para a videira de hera que se
enrola em seu pulso. A lua crescente na parte interna de seu cotovelo.
— Beck? Você tem certeza? — Eu olho de volta para seu rosto e algo muda.
Uma declaração. Um comprometimento.
— Isso — diz ele baixinho. — Isso é o que os parceiros fazem.
Quando Dane diz “algumas notícias”, ele quis dizer que ele capturou a
pessoa que estava jogando pedras na minha câmera de segurança. Ele me diz isso
ao invés de uma conversa polida e eu voo para fora da cadeira em frente a sua
mesa, derrubando um copo cheio de canetas e um aeromodelo em miniatura.
— Você o quê? — Olho ao meu redor como se o suspeito estivesse prestes a
sair de trás das cortinas. — Quem foi? Por que ele fez isso? — Eu olho através da
parede de vidro de seu escritório para a pequena cozinha, a cela e a área de
recepção para entrantes. Aponto para uma porta no canto de trás. — Você está
interrogando ele?
Dane esfrega as pontas dos dedos entre as sobrancelhas e gesticula para a
cadeira, uma ordem silenciosa para eu me sentar.
— Isso é um armário de utilidades, Canela.
Sento-me de volta, equilibrada na borda.
— Ele confessou?
Ele concorda. Eu quero dar um soquinho no ar em vitória.
— Você precisa de um parceiro de interrogatório? — Toda a minha
maratona de Lei & Ordem está prestes a valer a pena. Eu sinto que preciso ir para
casa e vestir um terninho elegante, pegar uma pasta. — Quer ser o bom policial,
o mau policial?
— Isso não é algo que aconteça, Estelle.
— Segundo você.
— Segundo literalmente todos os profissionais que aplicam a lei no país.
Escuta — ele me nivela com um olhar, uma carranca puxando seus lábios. —
Não há necessidade de um interrogatório. Ele já nos contou tudo o que fez.
Estou tendo problemas com esse caso porque estou um pouco irritado por você
e não estou adotando a minha costumeira… — ele esfrega a mandíbula enquanto
procura a palavra — … imparcialidade, suponho que você poderia dizer.
— Você deu um soco na cara dele?
Dane balança a cabeça com um leve sorriso.
— Eu não dei um soco na cara dele — parecia que ele gostaria de dar um
soco na cara dele.
— Então eu não vejo problemas. Você não precisa ser imparcial se ele já
confessou. — Minha mente vaga através das possibilidades de quem poderia ser,
o seu motivo. Luka queria vir comigo, mas eu o obriguei a ficar na fazenda para
caso Evelyn precisasse de alguma coisa. Eu peguei um vislumbre dela um pouco
antes de sair, chocolate quente em mãos. Curiosamente, Beckett não estava
muito atrás.
— Ele está aqui agora… — Eu abro minha boca para perguntar — … não na
sala de interrogatório inexistente — Ele está exausto por minha causa. Ele pega
uma bola anti-estresse da gaveta de cima e começa a apertá-la. — Como você
gostaria de lidar com isso?
— Acho que quero saber minhas opções — Eu gostaria de jogar algumas
pedras nessa pessoa, para começo de conversa. Olho por olho e tudo mais. Mas
eu não acho que isso vai dar certo com Dane.
— Ele está enfrentando várias acusações de destruição maliciosa de
propriedade privada. Isso é um pequeno delito no estado de Maryland. Como
isso foi feito de propósito e resultou em milhares de dólares em danos, ele pode
enfrentar pena de prisão.
— Pena de prisão? — Eu estou chateada pela câmera e pelas remessas
desaparecidas e os postes quebrados da cerca, mas não tenho certeza se quero que
alguém vá para a cadeia por causa disso. Eu franzo a testa e me acomodo na
cadeira. — Essa é a única opção?
— Depende de se você quiser prestar queixa ou não — ele começa a apertar a
bola novamente, dessa vez com mais força. — Ele perguntou se poderia… ele
perguntou se poderia falar com você. Pedir desculpas.
Eu pisco.
— Acho que provavelmente é um bom começo, né? — Seria bom se
pudéssemos lidar com isso civilizadamente.
O bigode de Dane se contrai.
— Claro.
— Tudo bem, então me mostre o caminho até o interrogatório.
— Não é… — Dane suspira e desiste. — Por aqui.
Não sei quem eu esperava que fosse. Alguma gárgula suja em forma de um
humano, talvez. Eu acho que parte de mim esperava que fosse alguém fazendo
tudo isso como um pedido de ajuda. Talvez ele estivesse jogando pedras na
minha câmera porque precisava alimentar a sua família... ou algo assim. Talvez
ele só tenha corrido porque estava com medo, e tudo isso foi um grande mal-
entendido.
Eu certamente não esperava Will Hewett sentado à mesa de conferência com
seu casaco de lã e óculos de tartaruga, tomando uma xícara de chá em um copo
de isopor.
— Onde você conseguiu o chá? — Dane grunhe em saudação enquanto eu
fico imóvel e confusa na porta.
— Policial Alvarez — Sr. Hewett responde, olhando para mim brevemente e
depois de volta para sua xícara. Eu sinto que sou parte de uma pegadinha
planejada. Caleb desliza silenciosamente para a sala por trás de nós, com o
caderno preso debaixo do braço. Dane lhe dá uma encarada.
— Estamos oferecendo chá para criminosos agora?
Caleb pisca e olha para a pequena xícara de chá de isopor.
— Quer que eu tire isso dele?
— Obviamente.
Caleb pega a xícara e eu aceno para ele, me sentando na cadeira vazia em
frente ao Sr. Hewett. Ele não olha para mim novamente e eu luto contra a
vontade de sussurrar que porra é essa.
— Eu estou confusa — é o que eu consigo dizer. Eu olho para Dane, de pé
atrás de mim com uma expressão violenta, braços cruzados no peito. Eu me viro
e franzo a testa para Caleb, encostado contra a porta. Eu me acomodo e olho de
volta para o Sr. Hewett. Ninguém nessa sala está sendo particularmente
comunicativo. — Isso é uma pegadinha?
Todos os três homens balançam a cabeça com vários graus de entusiasmo.
— Ok, bem — eu gostaria de um pouco de chá também. Com uma dose
saudável de uísque. — Alguém pode me explicar o que está acontecendo? Eu
estou tendo problemas para entender. Sr. Hewett, você destruiu minha câmera?
— Por que você não começa do começo, William?
Tudo começa com a venda da fazenda, muito antes de eu passar e ver a placa
de VENDE-SE. O Sr. Hewett explica que tinha um acordo de cavalheiros com
Hank para comprar o terreno, mas precisava de mais tempo para juntar o
dinheiro. Enquanto ele tentava quitar alguns dos seus ativos e liberar o dinheiro,
eu entrei e comprei a fazenda debaixo de seu nariz.
Eu me lembro vagamente que Hank mencionou que havia outro comprador
interessado quando fiz a minha oferta, mas nada aconteceu. Eu estava guardando
dinheiro há anos na esperança de abrir o meu próprio negócio, o pagamento da
apólice de seguro da minha mãe permanecendo intocado na minha conta
bancária. Eu o estava juntando para algo especial, algo significativo. Eu vi a placa,
fiz a oferta, e na semana seguinte Hank estava na Costa Rica e eu tinha as chaves
do lugar.
— Você queria uma... o quê?
O Sr. Hewett pega um pedaço de isopor da borda de seu copo, com desdém
na curva de seu lábio. Qualquer que seja o altruísmo que o levou a confessar não
afetou sua percepção geral de mim.
— Uma fazenda de alpacas — ele murmura.
— Uma fazenda de alpacas.
— É o meu sonho — ele responde com impaciência ocultada. Dane bufa
atrás de mim. Claramente, houve alguns pensamentos compartilhados entre os
homens dessa sala sobre o conceito de uma fazenda de alpacas.
Eu levanto minhas mãos.
— E você estava chateado comigo porque você pensou que eu tirei o terreno
de você — eu raciocino. Eu abaixo a minha cabeça e tento encontrar seus olhos.
— Mas você precisa saber que eu não fazia ideia que você estava interessado.
Hank nunca me disse nada sobre o acordo de vocês.
Ele concorda.
— Eu percebo isso agora.
— Ok, bom — eu dou de ombros. — Ainda tenho algumas perguntas. —
Ele me dá um aceno de cabeça e se remexe na cadeira, claramente desconfortável.
Seus olhos olham por cima do meu ombro para a outra sala com um pequeno
suspiro melancólico. — Por que você contou a Dane a verdade sobre tudo?
— Naquela noite quando eu quebrei sua câmera e Beckett me perseguiu
pelos pastos, ele quase me pegou. Eu acabei deitado em uma vala por três horas,
coberto de agulhas de pinheiro na tentativa de me esconder. Então percebi que
era hora de dar uma reavaliada nas minhas escolhas.
Ok, justo. Eu imagino que alguém possa reconsiderar as suas escolhas depois
de deitar em uma vala de terra gelada na tentativa de fugir de um fazendeiro
irritado.
— E o que você estava fazendo?
Ele suspira.
— Comecei com coisas pequenas e inconvenientes. Eu só queria que você
sentisse que a fazenda era um fardo e talvez pensasse em vendê-la. Para mim. Mas
nada te deu uma pausa. Quebrei alguns postes da cerca, liguei para os seus
fornecedores e cancelei alguns pedidos. Peguei algumas das suas decorações do
ano passado… elas estão no porão da biblioteca, se você as quiser de volta.
Eu quase bufo.
— Eu quero, obrigada.
— E nada parecia te frustrar. Era enlouquecedor. Sua falta de frustração foi...
frustrante. Eu sabia que tinha que fazer algo maior, então eu… — ele engole em
seco e olha para Dane antes de olhar de volta para a mesa. — Eu consertei o
sistema de escoamento no pasto sul. Eu… bom… há muitas obras sobre os abetos
de Fraser na biblioteca, sabe.
Dane pigarreia, desinteressado em quaisquer recursos educacionais que a
biblioteca ofereça sobre abetos de Fraser. Até mesmo o doce Caleb parece
decepcionado. O pasto sul. As árvores retorcidas e de aparência morta. Meu
estômago afunda.
— O que você fez com minhas árvores?
— Se você saturar demais o solo, as raízes ficarão sobrecarregadas e não
conseguirão extrair oxigênio do solo. Desativei o seu sensor de umidade do solo e
apodreci as raízes das suas árvores.
O pobre Beckett passou horas de quatro naqueles pastos, verificando cada
árvore em busca de pistas. Ele mandou o equipamento para inúmeros testes e
fiscalizações, ficou praticamente louco tentando descobrir.
— Mas essas árvores não parecem ter apodrecido nas raízes, elas parecem...
— … como algo de um reino alternativo, sei. Eu não… eu não tenho certeza
de como isso aconteceu. Consertei seu sistema de drenagem depois de algumas
semanas, logo depois que a podridão tomou conta, então você não descobriria o
motivo. E as coisas meio que pioraram a partir daí. Aposto que o departamento
de horticultura da universidade local estaria interessado em dar uma olhada… —
Dane tosse de novo, parecendo mais um urso resmungando do que qualquer
outra coisa, e o Sr. Hewett se encolhe na cadeira. — Mas acho que isso depende
de você.
Eu desabo na minha cadeira, sem fôlego. O Sr. Hewett causou milhares de
dólares de danos à minha fazenda ao longo de um ano em um esforço para me
g ç p
convencer a vendê-la para que ele pudesse criar a sua própria fazenda de alpaca. A
verdade certamente pode ser selvagem.
Eu esfrego meus dedos sobre meus lábios.
— Eu não sei o que pensar — eu digo fracamente. É um alívio saber que
todos os nossos problemas podem ser explicados. Que os desafios que tivemos
provavelmente desaparecerão agora que ele confessou. Mas a coisa mais triste
para mim, o desgosto absoluto de tudo isso é...
— Sr. Hewett, eu teria ficado feliz em dar espaço para suas alpacas — digo a
ele. — Se você sequer tivesse me pedido.
Poderíamos ter colocado tiaras de rena nelas durante o inverno. Vendido
suéteres de Natal feitos de lã de alpaca na loja de presentes. Teria sido adorável.
Algo em seu rosto se expõe e se quebra com isso, suas sobrancelhas se
inclinam para baixo enquanto ele olha para a mesa à sua frente. Ele coloca o copo
destroçado de lado e tira os óculos, esfregando furiosamente os olhos com os nós
dos seus dedos.
— Eu vou fazer o que você quiser para compensar, Estelle — ele olha para
mim, encontrando meu olhar firmemente pela primeira vez desde que entrei
nessa apertada sala de não-interrogatório. — Eu cumpro a pena.
Eu ainda não sei o que quero fazer, mas sei que esse homem ir para a cadeia
por querer ter uma fazenda de alpacas parece ser um pouco ridículo. Eu me
afasto da mesa e me levanto.
— Eu poderia ter algum tempo para pensar sobre isso? — Eu olho para
Dane. — As acusações?
Ele concorda.
— Acho que sim, mas não muito, tá? — Ele desvia o olhar para o Sr. Hewett.
— E se você colocar um pé na estrada que leva para a Lovelight Farms, eu
pessoalmente vou mantê-lo trancado na nossa cela para bêbados o mais rápido o
possível. Você entendeu?
O Sr. Hewett acena freneticamente. Pelo menos eu posso ficar tranquila que
ninguém irá quebrar câmeras de segurança enquanto Evelyn estiver aqui.
Se ao menos eu estivesse tão confiante com o resto.
Nós não falamos sobre Beckett novamente. Mas andamos pelo que parece ser
cada centímetro quadrado da fazenda. Passeamos pelos pastos segurando
chocolates quentes da padaria, passamos pelo Trenó e pela escondida Floresta de
Jujubas. Evelyn ri quando vê o aglomerado de árvores decoradas com luzes
brilhantes e coloridas. É outra surpresa para as famílias encontrarem, com um
túnel no meio construído com barris velhos para as crianças escalarem. Layla o
chama de nosso mini Lincoln Tunnel. Evelyn rodopia ao redor das árvores, as
pontas dos dedos alcançando as luzes vermelhas, azuis e amarelas.
— Esse lugar faz eu me sentir uma criança mais uma vez — diz ela.
— Todo mundo deveria se sentir uma criança nessa época do ano.
É bom passar tanto tempo nos pastos. Quando o inverno chega, geralmente
estou presa à minha mesa, respondendo e-mails e lidando com a papelada. Gosto
do silêncio, da quietude, do roçar do ar frio de inverno nas minhas bochechas.
Prometo para mim mesma fazer isso com mais frequência. Me perder entre as
árvores.
Enquanto caminhamos, nós conversamos. Uma entrevista informal, eu acho.
Evelyn me pergunta sobre a fazenda, sobre por que a comprei. Todas as
mudanças que fiz no ano passado, e como recrutei Beckett e Layla. Luka é
mencionado com frequência, não de forma alguma para convencê-la de nossa
história romântica, mas porque ele esteve comigo durante tudo isso. Conto a ela
como ele me trouxe uma garrafa de champanhe na primeira noite em que fui
dona desse lugar e como fomos até os pastos mais distantes, nos deitamos de
costas sob as estrelas e bebemos como loucos. Ele me disse naquela noite que
estava orgulhoso de mim, que não conseguia imaginar nada melhor do que eu
aqui, fazendo isso.
— Ele estava certo — ela me diz. — Você pensou em tudo. Eu sei que já disse
isso, mas esse lugar é incrível. Eu não posso acreditar que está aberto há apenas
um ano.
O orgulho me aquece até o âmago. Tudo o que eu sempre quis fazer era criar
um pouco de magia.
Conversar com Evelyn é como conversar com uma velha amiga. É confortável
e fácil, rápido para se transformar em gargalhadas. Vagamos pelos pastos até os
nossos pés ficarem dormentes de frio, as barrigas resmungando com a promessa
de um jantar quente. Posso ver a fumaça subindo da chaminé enquanto Evelyn
passa o braço pelo meu e descemos a última colina antes do chalé.
— Eu nunca mais quero sair desse lugar — diz ela com um suspiro, enfiando
o rosto na gola da sua jaqueta.
— Você é bem-vinda para ficar o tempo que quiser — eu digo, queixo
inclinado para o céu. O sol já se pôs, dias mais curtos completamente sob nós. O
céu essa noite parece pesado com nuvens, um tipo diferente de quietude se
instalando acima das árvores. — Portas abertas.
— Acho que os finalistas que preciso visitar na semana que vem podem
achar ruim — ela ri.
— Você gosta do que faz? Todas essas viagens?
— Sabe, eu acho que você é a primeira pessoa há bastante tempo que me
pergunta isso. — Ela sorri para mim, seus olhos enrugando nos cantos onde eles
espreitam pelo seu cachecol. Pensar nisso me entristece, e me pergunto quantas
pessoas ao seu redor são próximas dela só pelo poder da sua influência. — Eu
gosto. Eu gosto de contar histórias. Foi por isso que comecei tudo isso.
Eu acompanho Evelyn há algum tempo. Ela começou no Instagram
postando fotos de pessoas comuns sem filtros, sem edição. Compartilhando suas
histórias, pensamentos e sonhos, mesmo quando era desconfortável. Isso
lentamente se transformou em destaque para pequenas empresas e depois passou
para o que ela tem hoje. Ela mostra a beleza escondida pela costa leste, revelando
lugares que as pessoas podem não saber que existem. Cafeterias de cidades
pequenas, livrarias independentes, ONGs sem fins lucrativos que ajudam
famílias a colocar comida na mesa. Essas são as histórias que eu mais amo,
aquelas em que uma comunidade se une para apoiar os seus.
— Mas ultimamente, eu não sei. Parece que algumas das minhas histórias são
escritas antes mesmo de eu dar uma olhada — eu sei o que ela quer dizer. A
maioria de suas coisas hoje em dia é patrocinada por empresas que tentam entrar
no mercado de influenciadores digitais. — Eu tento ser seletiva com quem eu
trabalho, mas a rede social é… ela me deixa louca na maior parte dos dias.
p
— Quer dizer que você não sonhava em ser uma influenciadora de redes
sociais?
Ela ri e balança a cabeça.
— Eu queria ser jornalista. Por um tempo, pensei que a rede social era o
melhor jeito de fazer isso. Mas agora, eu não sei. Sinto que não conto uma
história de verdade já faz um tempo. Eu só quero ajudar as pessoas — ela bate seu
ombro no meu. — Pessoas como você, que estão apenas tentando tirar o sonho
do papel.
— Você está me ajudando — digo. Nossos seguidores já triplicaram, mais
procuras por reservas de horários do que jamais vimos antes. E Evelyn não
postou nem grande parte do seu conteúdo. — Eu nem consigo te dizer o quão
agradecida eu estou.
— Todo mundo merece conhecer esse lugar — ela diz. Uma rajada de vento
levanta o seu cabelo e ela sorri, brilhante e incrédula. — Ah, você deve estar
brincando comigo.
Eu olho para onde ela está olhando, a cabeça inclinada para cima. Uma
nevasca leve começou a cair, flocos de neve gordos flutuando silenciosamente das
nuvens pesadas acima. A primeira neve do ano.
— Um Pólo Norte da vida real — ela murmura fracamente, uma pitada de
admiração em sua voz.
Sorrio e olho para o céu. Um momento perfeito da magia do Natal.
Entramos pela porta da casa de campo para uma explosão de jazz natalino da
cozinha, o cheiro de manteiga quente e alho e algo doce e pegajoso. Luka aparece
no corredor com um avental, uma colher de pau enfiada no bolso da frente. Não
faço ideia de onde ele tirou aquela coisa, uma tela azul meia-noite escura com
AJUDANTE DO PAPAI NOEL estampado no peito. Ele parece ridículo.
— Ei, bem na hora.
Ele não se move da entrada da cozinha enquanto eu ando até lá, esfregando
minhas mãos para afastar um pouco do frio. Quando eu arqueio uma
sobrancelha por causa de seu bloqueio, ele aponta silenciosamente acima de
nossas cabeças, um raminho de visco que definitivamente não estava lá hoje de
manhã. Eu dou uma risada e fico na ponta dos pés, dando um beijo em sua
bochecha.
— Trapaceira — ele ri e pega meus quadris com as mãos antes que eu consiga
escapar, abaixando e pressionando a sua boca na minha em um beijo curto, doce
e ardente. Ele suga brevemente o meu lábio inferior e, em seguida, me deposita
de volta aos meus pés, olhos castanhos divertidos quando eu cambaleio com as
pernas instáveis.
A linha que define mentira e realidade é obliterada. Não tenho ideia se foi
porque Evelyn está atrás de mim, ou porque é algo que ele queria fazer.
Ele me dá uma piscadela, e eu acho que realmente não me importo.
Aproveite, uma voz que se parece suspeitosamente como Layla sussurra no
fundo da minha mente. Não pense demais.
— Isso é abóbora? — Evelyn exclama de seu lugar, pairando sobre o fogão.
Ela tirou os sapatos e a jaqueta, um suéter enorme com uma gola larga
artisticamente drapeada sobre um ombro. — Ai, meu Deus, isso é torta de
abóbora?
Ela parece suspeitosamente perto de chorar.
— O pão de alho está no forno — acrescenta Luka. — Deve sair daqui a
pouco. Vai. Senta. Beba vinho. — Ele acena para a mesa onde duas garrafas de
vinho tinto estão esperando. Ele acendeu todas as decorações da casa, o espaço
pequeno e aconchegante transbordando com pinho fresco e luzes e uma
guirlanda artesanal feita a partir de um velho padrão escocês. Velas em todas as
janelas e um abeto de bálsamo cheio na sala de estar, repleto de piscas-piscas e
enfeites e ornamentos que pendem na medida certa. Eu assisto à Evelyn absorver
tudo, os olhos arregalados se demorando na fileira de casinhas em miniatura
acima dos armários, iluminadas em uma réplica quase perfeita de Inglewild.
Ela pega a garrafa de vinho e se serve de uma taça grande.
— Porra, este lugar é perfeito.
O jantar é um sonho, minha casinha cheia de risadas pela primeira vez em
muito tempo. Luka é charmoso e gentil, contando histórias bobas sobre as
crianças da turma da sua mãe, aquela vez em que ele e Beckett ficaram agachados
nos pastos por quase quatro horas quando estavam tentando pegar os
adolescentes tirando rachas ilegais. Como eu fiquei com tinta verde escura na
minha toalha de mão por meses.
Nada disso parece falso ou fingido. Eu não tenho que atuar quando Luka
pisca para mim por cima da sua taça de vinho, o pé cutucando o meu debaixo da
mesa. Não me sinto desonesta quando tiro os pratos da mesa e dou um beijo na
cabeça de Luka enquanto passo, seus dedos pegando os meus com um aperto
suave.
— Como vocês começaram a namorar?
É a primeira pergunta que ela faz sobre o nosso relacionamento e eu deixo
cair uma das travessas, a colher tintilando no chão. Luka assume a liderança
enquanto eu me recomponho.
— Minha mãe se mudou para cá há cerca de dez anos. Acho que Inglewild
teve uma campanha de turismo em um certo momento, alguma coisa tipo
Pequena Florença, não sei. Acho que ela viu um anúncio no jornal e decidiu se
mudar para cá. Ela sente saudade da Itália.
Eu ri da pia. Eu não tinha ideia de que fora por isso que sua mãe e todas as
irmãs dela se mudaram para cá. Deve ter sido um choque quando elas chegaram
e nada aqui se parecia com a pitoresca cidade italiana.
— Stella morava aqui há um tempo. Nós nos encontramos quando ela estava
saindo da loja de ferragens.
Conheço bem essa história. Mas Luka me surpreende com um desvio.
— Achei ela tão linda. Ela estava… ela estava usando um vestido amarelo
brilhante com pequenas margaridas na bainha. Eu não conseguia parar de olhar
para aquelas margaridas. Pensei naquele vestido amarelo por dias depois que
parti. Cada mulher que eu vi usando um vestido amarelo em Nova York… — Ele
para e limpa a garganta. — E quando voltei para visitar minha mãe novamente,
eu fui… — Seus olhos me encontram na pia, de costas para a torneira, os pratos
sujos esquecidos. — Eu dei tantas voltas pela cidade, apenas tentando encontrá-
la mais uma vez — ele ri. — Minha mãe pensou que eu estava louco. Mas eu
finalmente me encontrei com ela, saindo da livraria dessa vez. Não me lembro o
que ela estava vestindo, mas lembro que ela sorriu para mim. O sorriso grande e
cheio da Stella.
Esse era o meu sorriso, ele disse quando Caleb estava na minha cozinha.
Evelyn e Luka dão risada, mas estou ocupada tendo um evento médico na pia.
Eu desligo a água e seco as minhas mãos em uma toalha.
Evelyn se ajeita em sua cadeira, passando o braço em volta dela e me olhando
com um sorriso.
— E o que você achou do Luka? Quando vocês se conheceram?
Ainda me lembro do momento que bati no seu peito com uma clareza
surpreendente, embora estivesse enterrada em uma névoa de dor tão profunda
que eu mal conseguia colocar um pé na frente do outro.
q g p
— Luka não está apenas usando uma figura de linguagem quando diz que o
encontrei do lado de fora da loja de ferramentas. Eu praticamente derrubei ele no
chão. — Dobro a toalha de cozinha e olho para Luka, suas longas pernas
chutadas para debaixo da mesa, uma taça de vinho tinto na mão. — Minha mãe
tinha acabado de morrer e eu estava meio que flutuando. Eu tropecei naquele
degrau e ele me pegou, se certificou de que eu estava em pé. Ele meio que me
mantém em pé desde então.
Eu me pergunto se eles podem ouvir todas as coisas que eu não estou
dizendo. Que eu não lembro o que ele estava vestindo, mas lembro que ele
cheirava a fatias de laranja frescas e manjericão. Que eu mal conseguia recuperar
o fôlego o tempo todo em que estávamos sentados na pequena padaria, comendo
nosso queijo grelhado. Que eu sempre gostei dele, e que eu o amei por tanto
tempo.
— Eu nunca te disse isso — eu digo diretamente para Luka agora. — Mas eu
não tinha motivos para estar naquela loja de ferramentas. Eu estava só… eu estava
meio que vagando por aí. Tentando me convencer a ser produtiva. E quando eu
esbarrei em você… — Respiro fundo e pisco para o teto. Não é uma surpresa que
a dona de uma fazenda de árvores de Natal seja sentimental. Luka coloca sua taça
de vinho na mesa e se senta ereto, preocupado. — Eu não sei, eu sempre pensei
que a minha mãe havia enviado você para mim. Acho que nunca tinha entrado
em uma loja de ferramentas antes e... não sei. Acho que gosto de pensar assim —
eu dou de ombros. — É bobo.
Eu não acredito em destino, ou coisas fadadas, ou qualquer regra ou razão
para o universo e todos os seus acontecimentos aleatórios, maravilhosos e
terríveis. Mas eu acredito que encontrei Luka quando eu mais precisava dele, e
eu gosto de pensar que minha mãe teve um papel nisso. É um conforto. Como se
ela ainda estivesse cuidando de mim. Ainda segurando minha mão. Luka se
levanta da cadeira e dá três passos largos até a cozinha. Ele me envolve em seus
braços, minhas mãos agarrando firmemente os seus lados.
— La La — ele diz, me balançando para frente e para trás. Ele dá um beijo no
lado da minha cabeça e eu cerro os punhos na parte de trás de sua camisa. Isso
pode até não passar dessa semana e eu posso nunca dizer a ele como realmente
me sinto, mas ele merece saber disso.
Tudo o que ele me devolveu.
Há uma consciência pesada entre nós depois disso. Os olhos de Luka
permanecem em mim enquanto termino de lavar os pratos, seu olhar
descobrindo novos centímetros de mim. A pele logo acima do meu pulso, a
cavidade entre as minhas clavículas, a parte inferior das minhas costas quando eu
me estico para colocar um prato em uma das prateleiras de cima. Ele sorri
quando reviro os olhos para ele por cima do ombro, a língua espreitando entre os
dentes, as mãos se abrindo e fechando nos braços da cadeira.
Evelyn sai logo após outra rodada de vinho e torta de abóbora, ligando para o
único motorista Lyft da nossa cidade. Luka espia por cima do ombro dela em seu
telefone, rindo quando vê de onde Gus está vindo.
— Acho que ele e Mabel ainda estão rolando.
Eu me junto a ele e observamos o desenho do carrinho sair da estufa. Luka
coloca a palma da mão na parte inferior das minhas costas, seu polegar
deslizando para baixo para deslizar por baixo da bainha do meu suéter. Eu tremo.
— Então ele dirige a ambulância e faz Lyft? — Ela coloca o telefone no bolso
com um sorriso divertido. — As cidades pequenas são tão engraçadas — ela
inclina a cabeça para o lado e o sorriso desaparece de seu rosto. — Espera aí, ele
não vai me buscar na ambulância, certo?
Gus não a busca com a ambulância. Ele a busca com seu Toyota Camry
muito sensato, buzinando duas vezes para Luka e eu enquanto eles desaparecem
pela estrada. Ficamos juntos na varanda enquanto eles descem a calçada,
observando a neve continuar a cair em flocos grandes e gordos. Eles derretem
assim que tocam o chão, tudo muito quente para que grude corretamente. Mas
há uma fina camada nas árvores, uma pequena camada de branco. Como se
alguém tivesse sacudido um globo de neve e deixado tudo voltar ao normal.
Eu me viro para voltar para dentro, mas Luka me impede com a sua mão. Ele
dá um puxão até que eu me vire para encará-lo, e depois mais um para me colocar
no degrau mais alto da varanda. Eu rio e enrolo as minhas mãos nas dele, a
cabeça inclinada para o céu. Assim, com o brilho da luz de dentro queimando
quente através das janelas, a neve quase parece pedacinhos de glitter. Sorrio
quando um floco cai no meu nariz.
— O que você está fazendo? — Eu rio, outro floco de neve emaranhado em
meus cílios. Eu o afasto com as costas da minha mão e a risada fica presa na
minha garganta quando olho para Luka.
Seus olhos brilham em um tom âmbar na luz que sai de casa, um sorriso
inclinando seus lábios. Esse é um sorriso secreto. Um que eu nunca tinha visto
q
antes. Eu quero traçá-lo com os meus dedos e sentir o peso dele contra minha
pele. Eu quero me inclinar e pegá-lo com a minha língua como um floco de neve,
ver qual é o gosto. Seu sorriso cresce em algo maior, flocos de neve caindo em seu
cabelo. Ele parece divino desse jeito. Perfeitamente meu.
— Eu quero te beijar — diz ele, agradável e fácil, como se o olhar em seu
rosto não estivesse a um passo da fome absoluta. Ele abaixa a cabeça mais perto
até que seu nariz roça o meu. — Não é mágico beijar alguém na primeira neve do
ano?
Se não é, deveria ser. Porque parece mágica quando eu me inclino e pego o
lábio inferior de Luka entre os meus. Ele sussurra um suspiro, um fôlego, e
envolve seu braço em volta das minhas costas, me puxando para mais perto, me
arrastando para cima e para perto dele até que nossos quadris batem juntos. Seus
dedos roçam a minha clavícula enquanto ele me beija lentamente, sua mão
deslizando para cima, seu polegar pressionando um floco de neve derretido na
minha pele. Eu sinto cada pontinha de dedo enquanto ele arrasta o seu toque
pelo meu pescoço até a pele macia abaixo da minha orelha. Nunca pensei que
fosse uma parte particularmente sensível do meu corpo, mas Luka a transformou
em uma. Claro que ele transformou. Ele permanece lá com os seus círculos
suaves até que eu me engasgo em sua boca, sua língua emaranhada contra a
minha assim que os seus dedos se enrolam no meu cabelo, segurando a parte de
trás da minha cabeça e me inclinando para trás para que ele possa lamber mais
profundo, mais gostoso. Eu nunca fui beijada assim antes, com o céu noturno
pressionando sobre mim e Luka em todos os outros lugares. Flocos de neve
tocando minha pele como pequenas agulhadas de frio.
— Você estava falando sério com aquilo? — Ele sussurra no mesmo espaço
abaixo da minha orelha que ele estava explorando com o polegar, minha cabeça
caindo no meu ombro para lhe dar mais espaço. Sua palma mapeia a pele nua das
minhas costas por baixo do meu suéter, o material amontoado em seu pulso. —
Aquilo que você disse?
Eu nem sei o meu nome nesse momento. Luka tem gosto de vinho tinto e
canela e eu não quero que ele pare de me beijar.
— O que foi que eu disse?
Ele se afasta de mim e descansa a sua testa contra a minha com respirações
pesadas e ofegantes. Cada uma delas é uma pequena nuvem branca entre nós,
girando no céu noturno entre a neve e as estrelas.
— Que eu tenho te mantido em pé — diz ele. Ele abaixa a cabeça e morde o
meu lábio inferior uma vez como se não pudesse se conter.
— Claro que eu quis dizer aquilo — eu digo e enrolo meus dedos nas
presilhas do seu cinto. — Eu não consigo acreditar que você precisa perguntar
isso.
Ele exala, longa e lentamente, e puxa a mão da parte de trás da minha camisa.
Eu tremo com a perda da sua pele quente contra a minha e olho para ele, meu
queixo em seu peito. Quero me lembrar desse momento para sempre, meu
momento globo de neve. Luka com um desejo evidente em seu rosto, uma
mecha rebelde de cabelo começando a se enrolar atrás da orelha, bochechas
coradas de frio e desejo.
Magia.
— Vamos entrar.
Ele fala isso como uma promessa, as mãos dele me empurrando por cima do
parapeito da varanda, impaciente demais para que eu mesma a pule. Eu o deixo
me guiar de volta para o chalé, a porta se fechando firmemente atrás de nós, o
barulho da tranca travando no lugar. Metade de mim espera ser pressionada
contra ela, levantada até que nossos quadris possam combinar perfeitamente,
mas Luka apenas tira as botas que ele nunca se preocupou em amarrar, sorri e faz
um som doce quando eu chuto as minhas na mesma direção. Ele se abaixa e as
endireita em uma linha reta, as costas de sua mão roçando a minha panturrilha, o
meu joelho, a minha coxa, quando ele se endireita. Ainda há música natalina
tocando na cozinha, mais fraca agora, um cantarolar baixinho de Ella Fitzgerald
sobre um natal feliz. Eu observo a sua silhueta na penumbra do corredor, a linha
forte da sua mandíbula, a curva do seu ombro.
— Escuta, La La. Eu vou ser honesto aqui — ele arrasta os dedos pelo cabelo,
mechas castanho carameladas em uma bagunça caótica. — Estou tendo
dificuldade para me conter. — Eu engulo em seco e me aproximo, querendo ver
todo aquele jeito cuidadoso escapar dele. Eu quero o Luka desarrumado,
respirações ofegantes e palavrões meio falados.
— Você está sentindo o que eu estou sentindo? — Ele sussurra e eu assinto,
indo em direção a ele, minha mão ao redor do seu pescoço enquanto eu o puxo
para mim. Com toda a energia me iluminando como uma… ora, como uma
árvore de Natal; é um beijo delicado. Uma doce carícia dos seus lábios contra os
meus. Então eu envolvo a minha mão no seu cabelo e o puxo, e não é tão doce.
Luka solta um gemido áspero e dobra os joelhos, as palmas das suas mãos
alisando para baixo da minha cintura sob a minha bunda até a parte de trás das
minhas coxas. Ele agarra e me levanta, ganhando um guincho de mim que o faz
sorrir, a curva de seus lábios deliciosos nos meus.
— Esse é um som interessante — ele observa, perambulando pela minha sala
e esbarrando em cada móvel que tenho. Ele resmunga quando as suas canelas
batem na mesa de centro.
— Cala a boca — eu rio na pele do seu pescoço, salpicando pequenos beijos
na linha da sua garganta. Eu desfaço o primeiro botão da sua camisa de flanela
enquanto ele tenta se deslocar pelo meu chalé como se nunca tivesse estado aqui
antes na sua vida e eu pressiono um beijo profundo, chupando a borda da sua
clavícula, o oco de sua garganta. Ele faz seu próprio conjunto de sons
interessantes e me joga bruscamente no braço do sofá, as mãos por baixo do meu
suéter e no fecho do meu sutiã antes mesmo que eu perceba que paramos de nos
mover.
— Caralho, Stella — ele sussurra, enchendo as mãos com os meus seios. Os
seus polegares roçam os meus mamilos e eu oscilo na beirada do sofá, enrolando
as minhas pernas ao redor dos seus quadris para me manter firme. Se beijá-lo na
neve foi mágico, então isso é… isso é Fadas dos Doces e crocância de caramelo por
cima de cupcakes de chocolate amargo. Eu me atrapalho com os botões da sua
camisa, abandonando a parte de cima para começar pela parte de baixo quando
ele vira a minha cabeça para o lado e começa a chupar o meu pescoço. Seus
polegares acariciam, giram e puxam e eu estou fora de controle.
Perco toda a paciência e puxo a sua camisa, tentando rasgar a coisa em duas.
— Fora — eu digo, querendo a sua pele contra a minha mais do que
qualquer coisa.
— Mas estou ocupado — diz ele, tentando esticar a gola do meu suéter o
suficiente para ele colocar a boca onde as suas mãos estão. Ele morde o meu
ombro em frustração.
— Luka — eu rio e abro outro botãozinho em sua camisa. Quando flanelas
ficaram tão complicadas? — Vamos lá.
— Peça com jeitinho — ele retruca na minha pele com um sorriso e eu rio de
novo, contorcendo a minha bunda no braço do sofá e empurrando-o para trás
com as palmas das mãos em seu peito. Ele me faz um beicinho quando suas mãos
escorregam de baixo do meu suéter, seus dedos se demoram acima dos meus
joelhos, seus polegares deslizando para frente e para trás na linha da minha coxa
j p g p p
interna. Eu puxo o meu suéter pela cabeça e o beicinho desaparece, uma fome se
instalando em seu lugar, a língua no canto da boca.
Eu alcanço a alça do meu sutiã, pronta para soltá-lo e jogá-lo na direção do
meu quarto, mas ele nega com a cabeça, dá um passo à frente no vão entre as
minhas pernas e desliza o dedo indicador por baixo da alça delicada. É um
algodão liso e macio, o mesmo que eu estava usando naquela noite no sofá, mas
ele me olha como se eu estivesse em renda italiana. Ele arrasta o dedo para cima e
para baixo na alça, brincando com ela, os nós dos dedos deslizando pela minha
pele.
— Você lembra daquele festival de música que fomos na Filadélfia? Aquele
com The Roots?
— Hm, acho que sim — eu digo, distraída. É difícil pensar quando as suas
mãos estão em mim. Ele muda a sua atenção para a outra alça, puxando-a com os
dedos. Ele a puxa por cima do meu ombro e costas, meu peito subindo e
descendo com cada toque cuidadoso.
— Você estava usando um vestido rosa pálido com as alças mais finas que eu
já vi— ele me diz. Eu lembro desse vestido. Estava muito calor e eu gostei do jeito
que ele se espalhava ao redor das minhas pernas quando eu rodava.
Ele engole em seco, o pomo de Adão balançando na coluna de sua garganta.
Estou presa lá, observando como seu corpo se move quando ele está coberto de
desejo. Seu polegar desliza para o bojo do meu sutiã e ele traça a pele logo acima
dele, hipnotizado.
— Você estava dançando na minha frente e elas ficavam caindo — ele olha de
volta para mim e pressiona as palmas das mãos contra a minha clavícula, os dedos
abertos, os mindinhos enfiados sob cada alça. Ele empurra as mãos para baixo
lentamente, levando o material com ele até que as alças estão presas em meus
cotovelos, os bojos do meu sutiã mal me cobrindo. Ele exala uma respiração
trêmula, um meio sorriso curvando seus lábios. — Eu queria tanto te beijar.
Eu estremeço.
— Isso era tudo o que você queria fazer?
Seu sorriso se transforma em um riso, um brilho perverso naqueles olhos
castanhos.
— Não.
Ele mergulha dois dedos no centro do meu sutiã e puxa o tecido, deixando-
me sem a parte de cima no braço do sofá. Resisto a vontade de me cobrir, as luzes
da árvore pintando minha pele em pequenas meias-luas.
p p pq
— Queria fazer isso — diz ele, se aproximando, as mãos segurando os meus
seios nus. Sua boca encontra a minha clavícula e chupa, molhada e longamente
contra a minha pele. — Eu pensei em deslizar as minhas mãos na parte de cima
do seu vestido — sua boca roça o meu mamilo. — Eu pensei em colocar a minha
boca em você.
— Por favor — eu imploro. Eu queria que soasse como uma provocação
boba, mas eu ouço a necessidade na minha voz. Luka também, se a maneira
como ele começa a mexer em sua camisa é alguma pista. É tudo um pouco
apressado depois disso, nós dois tiramos freneticamente o restante das nossas
roupas, tentando chegar o mais perto o possível. Eu vejo como sua pele dourada
é revelada centímetro por centímetro, meus olhos ansiosamente seguindo o
punhado de cabelo escuro em seu peito enquanto se afunila em uma linha fina
que desaparece sob a fivela do cinto. Eu ocupo minhas mãos com o cinto
enquanto ele tenta tirar o meu jeans, praticamente me arrancando do sofá com a
força de seu aperto.
Eu rio e levanto com apenas um pé, segurando os seus ombros enquanto ele
os puxa para baixo com um resmungo, trazendo seu rosto de volta ao meu para
um beijo. Ele geme quando eu me enrolo ao redor dele, pele quente contra pele
quente. Finalmente.
Pequenos percalços de lembretes continuam me atingindo enquanto
cambaleamos pelo corredor em direção ao meu quarto, parando a cada poucos
passos para nos tocar e provocar. Eu deslizo minha mão em sua boxer,
acariciando com força e apertado, e tenho que me lembrar de que é Luka
ofegando em meu ombro, meu melhor amigo. É Luka enrolando as mãos em
punhos contra a parte inferior das minhas costas, seguindo o meu toque com o
movimento dos seus quadris, um grunhido baixo em sua garganta. Luka
agarrando o meu pulso e tirando a minha mão, nos levando para o quarto e me
jogando na cama.
Os travesseiros tombam e eu os golpeio para longe enquanto Luka rasteja por
cima de mim, suas mãos se apoiando em meus ombros. Eu estou faminta para
vê-lo assim, sua pele nua e seus braços flexionados, as sardas em sua pele
silenciadas ao luar.
— Espera — ele diz, e ele enfia o braço por baixo de mim, me guiando até
que a minha cabeça esteja nos travesseiros e os meus joelhos estejam abertos, meu
peito subindo e descendo com cada respiração trêmula. Eu não consigo esperar,
uma necessidade frenética queimando através de mim. Meus lábios estão
q
inchados dos seus beijos, minha pele formigando com o roçar áspero de sua
barba contra a minha pele. — Pronto — diz e então deixa seu corpo cair sob o
meu, a pele ardente, a sua espessura pesada pressionando contra a minha
suavidade molhada. Ele revira os seus quadris para baixo uma vez e tudo em mim
se aperta. Eu suspiro em um travesseiro rosa pálido em forma de lua crescente e
me pergunto como é possível que eu esteja tendo a experiência sexual mais
intensa da minha vida ainda vestindo a minha calça.
Luka desacelera o movimento dos seus quadris até que ele ainda esteja acima
de mim, seus dedos pegando o meu cabelo e peneirando os fios escuros. Ele o
arruma com cuidado para que não fique preso por baixo dos meus ombros, uma
auréola artística de cachos escuros emaranhados. Seu olhar viaja pelo meu rosto,
se demorando na curva dos meus lábios, eu acho. Ele suspira, um pouco
melancólico, e eu sorrio com a suavidade disso.
— O quê? — Eu pergunto. Ele está olhando para mim com uma reflexão
cuidadosa que tem uma linda honestidade. Ele está dizendo um milhão de coisas
com aquele olhar, eu simplesmente não consigo ouvir o que é.
— Nada — diz ele, e seus olhos descem para o volume pesado dos meus seios,
a pele macia abaixo. O alargamento dos meus quadris e o mergulho do meu
umbigo. Eu sinto seu olhar como a ponta de um dedo no meu esterno. Ele se
ajoelha entre as minhas coxas abertas e enfia os polegares no material em meus
quadris, arrastando a minha calcinha para baixo um centímetro e depois o
restante do caminho quando movo as minhas pernas para ajudar. Ele solta uma
respiração profunda quando estou nua para ele, suas mãos roçando os meus
joelhos. — Também pensei sobre isso — diz. — Quando aquela linda saia rosa
roçou suas coxas.
Ele encontra o lugar onde estou quase embaraçosamente molhada e me
entrego ao prazer do seu toque, minha cabeça inclinada para trás nos travesseiros
enquanto tudo dentro de mim chacoalha e geme. Idem, quero dizer, um pouco
histérica. Eu pensei sobre isso de centenas de maneiras, um milhão de
possibilidades diferentes.
— Porra — diz ele, e eu abro os olhos para vê-lo me tocar, uma mão se
movendo entre as minhas pernas, a outra deslizando pelo meu estômago para
traçar a curva inferior do meu seio. Ele puxa meu mamilo e eu gemo, grosso e
gutural. Eu nunca fui tocada assim.
— Porra — ele repete, mais sombrio dessa vez. Seus olhos viajam de entre as
minhas pernas para o meu rosto. Ele muda o ângulo da sua mão entre minhas
p p g
pernas, a palma da mão moendo para baixo. Eu faço outro som choramingando.
— Eu poderia gozar assim, Stella. Apenas assistindo você. Ouvindo você.
Meu corpo inteiro aperta. Mas não é o que eu quero, gozar assim. Talvez
mais tarde possamos explorar essa ideia em específico, mas agora eu quero senti-
lo me prendendo ao colchão, meus braços ao redor do seu pescoço e a sua boca
na minha. Eu o quero desesperado e ofegando na minha pele, nós dois nos
movendo juntos.
Eu digo isso a ele em uma respiração ilegível, sua risada um pouco sem fôlego
quando ele se afasta de mim.
— Você não precisa se preocupar com isso — ele murmura, as mãos puxando
a cintura da sua boxer para baixo. — Tô muito desesperado.
Eu me estico em direção à gaveta da minha mesa de cabeceira onde joguei a
caixa de preservativos que Layla me entregou na semana passada. Ela os deixou
na minha porta com uma reverência desagradável e uma garrafa de vinho. Estou
grata por nenhum dos trabalhadores da fazenda ter passado pelo meu chalé e
visto a caixa de Trojan13 do tamanho Costco no meu tapete de entrada. Eu puxo
uma tira inteira e jogo em Luka, distraída pela visão dele no luar filtrado pela
minha janela.
Pernas longas, peito sólido, a inclinação e o corte de seu quadril afiados na luz
fraca. Seus bíceps flexionam enquanto ele arranca uma camisinha da tira e a
coloca, o resto deixado com segurança no baú estofado ao pé da minha cama.
— Para mais tarde — diz ele com uma piscadela e eu rio, puxando-o para
cima e sobre mim.
Eu passo os meus dedos pelo seu cabelo.
— Isso é presunçoso — eu provoco, como se o pensamento de mais não
enviasse uma emoção através de mim. Eu estou insaciável por ele e pelos seus
toques, seus suspiros sussurrados em minha pele.
Ele bufa uma risada e se acomoda em cima de mim, deixando um beijo entre
meus seios, sua boca distraída pela ondulação da pele macia. Ele trilha um
caminho sinuoso pelo meu peito até que estou ofegante e arqueando sob ele,
minhas mãos em seu cabelo guiando-o com mais força contra mim. Ele está se
arrastando bem entre as minhas pernas, pressionando em todos os lugares que eu
preciso. Eu poderia gozar assim e digo isso a ele, seu gemido de resposta áspero e
quebrado.
— Foram nove anos de preliminares, La La — Luka se levanta usando as suas
palmas acima de mim, flexionando os braços. — Eu não acho que uma vez só vai
resolver.
Sou eu quem está impaciente agora, meus quadris dançando sob os dele,
minha boca saboreando qualquer pele que eu possa alcançar. Eu mordo a sua
orelha, a curva da sua mandíbula. Beijo avidamente o seu lábio inferior e a ponta
do seu nariz. Minhas mãos agarram os seus ombros, seus antebraços. É como se
cada momento de desejo acumulado estivesse saindo de mim em uma enxurrada.
Eu não consigo ter o suficiente dele, não consigo me mover rápido o suficiente
para tudo o que eu quero. Cada pensamento reprimido, cada toque hesitante,
cada meia-verdade e devaneio zumbem sob minha pele, me deixando impaciente
e frenética.
— Está tudo bem — ele acalma e segura a parte de trás da minha cabeça com
a mão, inclinando o meu queixo para cima até que ele possa me beijar lento e
doce, aliviando o ritmo do meu coração com longos beijos lânguidos. —
Desacelere um segundo.
— Eu quero…
— Eu sei. Eu também quero.
Ele me acalma com mãos gentis, abrindo as minhas pernas largamente e
arrastando as palmas das mãos para cima e para baixo até que eu relaxe de volta
no colchão. Ele sorri para mim, os olhos enrugando nos cantos, e então rouba a
respiração do meu peito com uma pressão lenta de calor entre as minhas pernas.
Eu não sei se é porque já faz um tempo ou apenas porque esse é… esse é Luka,
mas o meu corpo inteiro ganha vida com a pressão, a deliciosa plenitude. Ele se
acomoda dentro de mim e eu soluço um gemido, alto e apertado na parte de trás
da minha garganta. Eu sinto que não consigo recuperar o fôlego, o ar roubado
dos meus pulmões por Luka. Meu sangue pulsa quente, um calafrio delicioso
indo do lugar onde Luka está agarrando as minhas coxas com os dedos
machucados até a inclinação das minhas omoplatas contra o colchão. Eu envolvo
as minhas mãos em torno dos seus bíceps e aperto, sussurro uma respiração
quando os seus quadris se movem contra os meus.
Ele deixa cair a testa na minha clavícula e balança a cabeça para frente e para
trás uma vez.
— La La — diz ele, sem começo ou fim para o pensamento, apenas o prazer
de dizer o meu nome na minha pele.
Eu aliso as minhas mãos em suas costas e levanto os meus quadris, um
movimento superficial que não faz nada além de me frustrar.
— Luka.
Ele escova um beijo casto na minha têmpora, murmura baixo em sua
garganta, e então ele começa a se mover.
Ele começa devagar, me despedaçando pedaço por pedaço. Ele está atento,
aprendendo, catalogando cada puxão na minha respiração, colocando em uso.
Ele aperta as minhas coxas e eu suspiro. Morde o meu pescoço e eu arqueio as
minhas costas. Ele muda o ângulo dos seus quadris até que a minha perna
esquerda se contorça em seu aperto, meu pé chutando contra sua canela. A
risada em seus olhos se torna uma pequena chama de determinação, as
sobrancelhas franzidas, a língua entre os dentes. Ele balança a cabeça uma vez e
repete o mesmo movimento, um arrastar lento e um círculo de seus quadris
contra os quais eu fecho os meus olhos.
— Não faz isso — ele diz, a mão segurando o meu pescoço suavemente, o
polegar acariciando uma vez a batida de beija-flor em meu pulso antes de se
estabelecer no oco da minha garganta. — Não se esconda de mim.
— É tão gostoso — eu murmuro, desejando poder ser mais eloquente.
Desejando ter as palavras para dizer a ele como parece que estou me desfazendo
em pedacinhos de poeira estelar. Eu me sinto incandescente, iridescente, todas as
luzes da árvore de Natal explodidas. Mas seus quadris estão se movendo mais
rápido agora e ele está ligeiramente inclinado sobre os joelhos, a mão que não
está no meu pescoço alcançando entre nós para tocar logo acima de onde
estamos unidos. Leva apenas alguns golpes ásperos de seu polegar, seus quadris
perdendo a sutileza em favor de um movimento desesperado que me faz escalar a
cama, minhas mãos apoiadas acima de mim na cabeceira enquanto mais
travesseiros caem ao nosso redor. — Luka — eu suspiro quando a frustração
aguda de não ser o suficiente se transforma em um puxão perfeito de exatamente
certo, um empurrão áspero do pico em minha liberação. Começa na parte de
baixo da minha barriga e se espalha pelas minhas coxas, se instala na parte de trás
dos meus joelhos e na pressão dos meus braços acima da minha cabeça. Ele rouba
a respiração dos meus pulmões enquanto eu o sigo balançando os quadris, me
esticando como caramelo. A mão de Luka no meu pescoço estremece e então
desliza por mim para se enredar com a minha, pressionando meus dois pulsos no
colchão. Eu consigo abrir meus olhos assim que ele se inclina sobre a borda
também, seus dentes mordendo todo o seu lábio inferior. Ele fica lindo desse
jeito. Mais um segredo revelado.
Luka cai em cima de mim, o cabelo úmido de suor, o nariz cutucando a
minha bochecha. Eu me regozijo com o seu peso e me enrolo ao seu redor,
g j p
tornozelos enganchados nos deles. Ele aperta as minhas mãos e suspira, contente.
Como um gato da selva. Ou um garoto sonolento e sexy.
— Nós deveríamos estar fazendo isso há anos — ele murmura, a voz
sonolenta. Ele ajeita a sua posição e geme. — Ou talvez não. Não tenho certeza se
teria sobrevivido. Acho que você me matou. Eu estou morto.
— Você será meu fantasma favorito de Natal, então.
Eu tento me esticar embaixo dele, um cobertor quente e pesado de Luka me
cobrindo da cabeça aos pés. Eu mexo os dedos dos pés e sinto um roçar de
algodão, um zumbido sonolento e divertido enfiado em sua clavícula.
— Você ainda está usando suas meias — eu aponto. Tudo o que recebo em
resposta é um ronco, Luka enroscado possessivamente ao meu redor. Eu me
entrego à leve atração do sono, segurando-o com a mesma força, e deixo os meus
sonhos me levarem.
Pela primeira vez, acho que a realidade pode ser melhor.
Vinte e um
Luka me ama.
Luka está apaixonado por mim.
Repito para mim mesma em loop e espero que faça sentido. Esse olhar em
seu rosto no vídeo, eu já vi isso antes. Eu já o peguei olhando para mim assim no
início da manhã quando estou na máquina de café, sussurrando olá e
implorando por cafeína. Quando saímos para a baía naqueles pequenos barcos a
remo em forma de dragões, um saco de migalhas no bolso para as gaivotas. Eu vi
isso praticamente todas as vezes que o vi. É difícil perceber que talvez Luka esteja
se apaixonando por mim esse tempo todo também. Eu estive muito envolvida
em esconder meus próprios sentimentos para notar os dele.
O sino acima da porta da padaria toca quando entro, as mesas vazias, as
cadeiras ainda empilhadas no canto. Layla só abrirá em uma hora, mas eu sei que
ela está aqui em algum lugar, provavelmente se preparando nos fundos. Vejo
Beckett sentado no balcão, um prato de donuts na frente dele e um saco de
confeiteiro na mão esquerda. Ele gosta de vir aqui quando está estressado, comer
seus sentimentos e fingir que está ajudando Layla enquanto faz isso. Layla sai do
armário de suprimentos, um avental na cintura e uma mecha de farinha no
cabelo.
Ela para de repente ao me ver, Beckett se virando com um olhar por cima do
ombro.
— Eu fodi tudo — digo a eles em voz baixa.
Nenhum deles diz nada, completamente congelados no balcão. Parecem uma
daquelas exposições de arte vivas.
— Por favor, diga que é sobre Luka — Layla respira.
Beckett revira os olhos e volta a encher seus donuts.
— Claro que é sobre Luka. Ela tem um chupão no pescoço e o chapéu está
virado para trás. — Ele coloca uma rosquinha perfeita no prato que Layla
preparou para ele e joga um pequeno visco em cima. — Além disso, Luka está se
escondendo na minha casa desde esta manhã.
Estou aliviada que Luka ainda esteja aqui na fazenda. Apesar de sua promessa
de que voltaria, uma grande parte de mim estava preocupada que ele
desaparecesse de volta em Nova Iorque. Recusasse o trabalho em Delaware e
nunca mais voltasse.
Layla acena para mim e abre espaço no balcão. Ela segura um donut na frente
do meu rosto.
— Coma isso e me diga o que aconteceu.
Beckett tenta pegar o donut da minha mão, mas eu me afasto dele. Eu
preciso disso mais do que ele.
— Você está uma bagunça. — Ele pega sua própria rosquinha, mordendo o
minúsculo fondant de visco de cima ao meio. Layla franze a testa para nós dois e
move o prato para a prateleira de trás, fora do nosso alcance ganancioso.
— Eu não vou ter mais comida nenhuma se vocês dois continuarem
tentando me ajudar.
Eu engulo massa folhada quente e recheio de creme de manteiga e reúno
minha coragem.
— Luka está apaixonado por mim.
Beckett e Layla olham para mim. Quando não digo nada, Layla levanta as
duas sobrancelhas.
— E?
Eu deixo cair minha testa no balcão com um gemido.
— Todo mundo sabia menos eu?
— Sim — Beckett responde. Eu ouço o estalo de uma mão contra a pele nua
e espreito assim que Beckett esfrega sua testa, um olhar voltado para Layla. — O
quê? Você sabe que é verdade. Havia um pool de apostas em toda a cidade sobre
isso.
Layla o ignora.
— Ele te contou?
Eu aceno e dou a eles a versão abreviada dos eventos. Que ele disse que me
amava, e eu disse que ele estava errado. Minha conversa com Evelyn no campo e
o vídeo que ela me mostrou.
— Não deveria ter levado um vídeo para você perceber — Beckett diz,
espremendo um pouco do recheio de donut em seu dedo. Layla arranca isso dele
também. — Ele está mostrando a você há anos.
Olho para a bancada.
— Eu não vi.
— Você viu — Layla discorda gentilmente e lança um olhar de advertência
para Beck quando ele abre a boca. — Você viu, querida. Você estava com muito
medo de fazer qualquer coisa sobre isso. Você está confortável na friendzone e
então decidiu se manter lá.
Eu dou de ombros, infeliz.
— Como faço para corrigir isso?
— Acho que depende — Layla se vira e pega uma rosquinha da bandeja,
divide ao meio e me oferece. Beckett faz um ruído de dor baixinho. — Você está
disposta a ser honesta?
Eu volto para minha casa depois de alfinetar Layla para me dar outro donut.
Dou a última volta ao redor do grande carvalho e tropeço quando vejo uma
figura nos degraus da frente. Luka está sentado na escada que leva à minha
varanda, as pernas afastadas, as mãos entrelaçadas frouxamente entre elas. Ele
está olhando para o chão, mas olha para cima quando minhas botas lançam uma
chuva de cascalho pelo meu jardim da frente, um donut ainda na minha mão.
— Oi.
Depois de assistir ao vídeo e examinar cada detalhe de cada interação que
tivemos no último mês e meio, é quase surpreendente vê-lo sentado na minha
frente. Eu não esperava vê-lo novamente hoje. Eu construí um esboço solto de
um plano na minha caminhada de volta para casa:
Encontrar uma garrafa de vinho
Continuar a pensar demais em Luka.
Consumir a referida garrafa de vinho e o resto da torta de abóbora.
Pedir desculpas a Luka.
Implorar por perdão.
Dizer a Luka que eu o amo.
Comer mais torta.
A coisa toda é um trabalho em andamento.
— Oi.
Meu coração se aloja na garganta e fica difícil para mim engolir. Nós nos
observamos, hesitantes, e então Luka se levanta, desdobrando seu corpo alto do
último degrau para encostar no corrimão. Procuro minhas chaves nos bolsos, um
dos pinheiros de Luka roçando meus dedos. Eu nunca tirei depois que ele me
beijou no celeiro. Isso parece séculos atrás agora.
As palavras de Layla soam na minha cabeça. Você está disposta a ser honesta?
Não tenho certeza se sou tão corajosa.
— Você tem uma chave — digo a ele, ignorando o pinheiro e empurrando
meus pés para frente. Está frio esta tarde, um estalo no ar que deixa meus dedos
dormentes nos dedos. Eu me pergunto quanto tempo estive nos campos, quanto
tempo Luka esteve na minha varanda da frente. Eu olho para a cor avermelhada
em suas bochechas, a forma como seus ombros encolhem em suas orelhas. Ele
nem está usando um lenço.
— Não parecia certo usá-la — diz ele, o olhar ainda preso em mim, apesar da
linha ansiosa de seu corpo. Ele está se segurando parado, apertado, longe de mim,
e isso mais do que tudo me deixa triste. Eu deslizo por ele subindo as escadas,
ciente do espaço entre nós. Eu quero jogar seu braço sobre meu ombro, enrolar-
me em seu lado e fazer com que ele me provoque por não ser capaz de encaixar a
chave na fechadura.
— Você sempre pode usá-la — murmuro, abrindo a porta para nós. Meu
olhar pega a árvore de Natal na janela enquanto estou tirando minhas botas,
meu sutiã pendurado em um dos galhos mais altos. Luka segue meus olhos e
bufa quando vê, uma mancha de cor na base de seu pescoço, onde ele ainda não
está pintado de rosa pelo frio.
— Ah — ele coça a parte de trás de sua cabeça e arruma minhas botas em
uma linha perfeita, quase como se não pudesse evitar. Esse pequeno gesto me dá
esperança de que as coisas não estão completamente arruinadas entre nós. Ele
balança a cabeça e desvia sua atenção do meu novo enfeite criativo. Eu deveria
anotar isso antes que Dane venha com a papelada para Hewett. Luka balança
para trás em seus calcanhares. — Estou aqui para o negócio com Evelyn.
— Ah — Minha pequena faísca de esperança se apaga. — Decidimos não
fazer isso esta tarde. — Não adianta, já que fomos desclassificados do concurso.
Acho que eu provavelmente deveria dizer a ele. — Não, eer, nós não temos que
fingir que estamos mais juntos. — Eu engulo e olho fugazmente para seu rosto
antes de perder a coragem e olhar para nossas meias em vez disso. — Eu disse a
verdade a Evelyn. Acontece que ela já sabia.
— Ela sabia que não estávamos juntos?
Eu concordo.
— Intrusos — eu digo. Isso é tudo o que posso oferecer como explicação
agora. Eu aceno com a cabeça em direção à máquina de café na cozinha. — Quer
ficar por aqui, ou…
Eu não quero que ele sinta que tem que ficar aqui comigo, especialmente
porque está claro que ele só veio aqui para cumprir qualquer responsabilidade
que ele sentiu que tinha. Ele está livre para ir agora, livre para ficar
completamente livre de mim se quiser. Isso provoca uma sensação azeda rolando
pelo meu estômago. Ele deve ver isso no meu rosto, porque ele estende a mão,
bate uma vez no meu cotovelo. É uma tentativa valente de nossa afeição física
anterior, e fico desejando que ele enrolasse os dedos em volta de mim, me puxasse
em seu peito e descansasse o queixo na minha cabeça.
— Vou ficar por aqui — diz ele, parecendo apenas levemente melancólico
com a ideia. Seus olhos saltam da janela, para a curva do meu queixo, para o meu
ombro e depois de volta. Eu odeio o quão estranho isso é. Mesmo na primeira
vez que almoçamos juntos, não nos faltou o que dizer. Eu estava triste, retraída,
um pouco perdida, mas Luka havia preenchido o espaço entre nós com
conversas fáceis com padrões de dados e a comida de sua mãe e a barraca de
pupusa na cidade que ele gostava de ir nas manhãs de sábado.
Eu ligo a cafeteira em silêncio, o gotejamento constante como um metrônomo
determinado a me deixar louco. Você está disposta a ser honesta? Luka se senta em
uma das cadeiras na cozinha, os olhos fixos na janela. Eu mantenho a
compostura através de duas séries de gotejamento antes que eu não aguente mais,
meu coração martelando no meu peito.
Estou indo fazer isso. Eu vou dizer a ele a verdade.
— Luka, eu...
— Eu quero…
Eu solto uma risada que é mais nervosa do que divertida e aceno para ele
continuar. Se alguém merece falar primeiro, é Luka. Eu seguirei sua liderança.
Farei o que ele quiser.
Ele descansa as mãos sobre a mesa.
— Quero me desculpar por esta manhã. — Meu estômago afunda até os
dedos dos pés e meu rosto deve mostrar isso porque ele corre para se corrigir. —
Não… não pelo que eu disse, mas pelo jeito como eu saí. Isso não estava certo.
— Eu te machuquei — eu ofereço e sirvo duas canecas fumegantes de café
com as mãos trêmulas. Se Luka tivesse reagido do jeito que eu reagi esta manhã,
eu estaria no primeiro trem saindo da cidade. Eu estaria nos campos, cavando
p p
um buraco para me enterrar. Não tenho certeza se voltaria a mostrar meu rosto
em Inglewild.
— Você me machucou — ele concorda, e esse sentimento azedo torce e
aperta, fazendo eu franzir a testa em minha caneca. Eu tomo o assento em frente
a ele e luto para manter meu olhar no dele. — Mas eu ainda não deveria ter saído
assim. Eu sei… eu sei que é muito importante para você, a ideia de pessoas indo
embora. Acho que é por isso que você manteve Beckett e Layla fora do circuito
dos negócios agrícolas. Porque você estava com medo de que eles fossem embora
se descobrissem que você estava tendo algum problema. — Sua voz é gentil, mas
suas palavras atingiram seu alvo, pousando como pequenas pedras de granizo
contra meu coração. Cada uma deixa um pequeno amassado. — E quando eu te
disse que eu… — ele limpa a garganta, evita dizer as palavras, e isso dói também.
Que eu dei um pedaço do meu medo para ele. — Quando eu disse o que disse, e
sua reação não foi o que eu queria, fiz exatamente o que você temia. Eu te deixei.
Peço desculpas por isso.
Não suporto ouvi-lo se desculpar. Não depois da maneira como agi esta
manhã. Não depois do jeito que tenho agido desde que começamos essa coisa
toda.
— Luka…
— Você sabe que eu compro esses pinheiros a granel? Aqueles de papelão —
ele explica como se eu não soubesse do que ele está falando. Como se eu não
tivesse todos os que ele me deu guardados na gaveta da minha mesa,
transbordando em uma caixa no meu armário. Ele cheira a pinho toda vez que
abro a porta para pegar um suéter, eles estão um pouco velhos agora, mas me
recuso a me livrar deles. — O primeiro eu peguei por capricho no posto de
gasolina da rua, mas seu rosto se iluminou quando eu o dei a você. Acho que foi
provavelmente então que percebi.
Prendo a respiração, cativada.
— Percebeu o quê?
Ele é tímido, reservado, olhando para suas mãos enroladas em sua caneca
antes de deslizar os olhos de volta para os meus. Sua boca se ergue no canto, mas
ele ignora minha pergunta.
— Fiquei ganancioso por esse olhar. Eu não queria que mais ninguém o
tivesse. Ainda não quero que mais ninguém o tenha.
Você pode tê-lo, eu quero dizer. Você pode ter todos os meus sorrisos e olhares e
abraços e toques. Meu coração também. Se você ainda quiser.
ç q ç q
— De qualquer forma, acho que o que estou tentando dizer é que ainda
tenho cerca de duzentos desses pinheiros de papelão. E eu tenho um pedido
recorrente. Eu não vou embora, La La. Ainda tenho muitas árvores para te dar.
Enquanto você me quiser por perto, estarei aqui.
Ele enfia a mão no bolso de trás, levantando os quadris para puxar algo. Ele
coloca um pequeno pinheiro de papelão na mesa e o desliza para mim com o
dedo.
Eu encaro aquela árvore por um longo tempo, olhos quentes, garganta
apertada.
É difícil amar alguém sem restrições. Se doar a isso por inteiro e colocar isso
acima de tudo sem medo do que possa acontecer. Eu acho que é natural se
segurar em parte e proteger o que você pode. Minha mãe me amava ferozmente,
mas ela também nunca abriu seu coração para mais ninguém. Não depois do que
meu pai fez. Então acho que... acho que foi assim que aprendi a não desejar
muito. Para jogar de modo seguro e fácil.
Mas é difícil impedir-se de ceder também. Layla está certa. Nos últimos nove
anos, enterrei cada vislumbre de sentimento forte com negação, anseio e uma
pitada de mal-entendido deliberado. Toda vez que eu olhava para Luka, eu sentia
isso. Um anel oco. Um puxão afiado. Uma dor persistente e desconfortável.
Eu me levanto da mesa abruptamente, minha cadeira saltando para trás pelo
chão de madeira com um guincho raivoso. Luka também se levanta, os olhos
levemente em pânico. Eu me viro e sigo pelo corredor, meu corpo inteiro
vibrando.
— La La? — Luka tropeça atrás de mim, batendo o joelho na borda de um
suporte de guarda-chuva vintage que eu uso para embrulhar tubos de papel. Ele
xinga baixinho e manca atrás de mim. — Stella, espere um segundo. Eu não…
Eu abro a porta do meu armário, uma cascata de suéteres e cachecóis e todas
as outras coisas aleatórias que eu enfiei aqui caindo pelos lados. Um gnomo de
jardim pousa no meu dedo do pé. Duas caixas de luzes de cordas extras dão um
salto para a liberdade. Jogo uma versão antiga de Candyland por cima do ombro.
Luka entra no meu quarto.
— O que você está… ai, meu Deus — ele corta abruptamente. Ele respira
afiadamente, provavelmente horrorizado com a minha bagunça desencadeada.
Talvez eu devesse ter mostrado isso a ele antes que ele confessasse seu amor. —
Isso é uma samambaia?
É um monstro falso que uma das irmãs de Beckett comprou para ele e ele
prontamente depositou na minha porta da frente. Eu o arrasto para fora do
caminho e alcanço atrás dele a velha caixa de batedeira de utensílios de cozinha.
Acho que nem tenho uma batedeira.
— Você não tem uma batedeira — Luka diz, dobrando alguns suéteres atrás
de mim. — Posso ajudá-la com algo, ou…
Há frustração ali, uma pitada de tristeza também. Ele acabou de abrir seu
coração e eu estou vasculhando meu armário.
— Aqui está — eu abro a tampa da caixa e a viro, centenas de pequenas
árvores de papelão no chão entre nós. Elas deslizam umas sobre as outras em
uma pequena cachoeira de pinheiros velhos e bordas verdes onduladas, as cordas
emaranhadas. Luka abandona sua dobradura e pega uma, sobrancelhas franzidas
em confusão. — Eu tenho alguns dados para você — digo a ele, a voz oscilando
nas bordas. — Depois daquele dia que você me levou para comer um queijo
grelhado, eu pensava no seu sorriso toda vez que passava pela loja de ferragens.
Ainda penso no seu sorriso toda vez que passo pela loja de ferragens. Eu compro
creme de leite para chantilly quando vou ao supermercado porque você me disse
uma vez que o chantilly caseiro é melhor do que as coisas enlatadas. Você sabe
quantas caixas de creme eu desperdicei? Às vezes finjo que não vi um filme, só
para que você possa apontar as melhores partes. — Eu respiro profunda e
tremulamente. — Aquele show quando eu usei aquele vestido rosa? Eu queria te
beijar também. Quando fizemos aquela primeira viagem de acampamento para a
praia e eu acordei com você em volta de mim, eu podia sentir seu batimento
cardíaco nas minhas costas. Foi a primeira vez em anos que não acordei sozinha e
triste.
É um alívio liberar cada pensamento secreto, cada sentimento oculto. Limpo
os dedos sob os olhos e tento controlar minha respiração. Está tudo quieto entre
nós e eu olho para as árvores espalhadas pelo meu chão.
Luka limpa a garganta, as mãos me alcançando.
— Acho que analistas de dados… — Sua voz se interrompe e ele para, se
recompõe e tenta novamente. — Acho que os analistas de dados se referem a isso
como uma tendência de longo prazo.
— Eu quero todas as suas árvores — digo a ele. — Você sabe que eu escrevi
namorado naquele aplicativo de propósito? — Eu espelho a honestidade dele da
cozinha com um pouco da minha. — Eu tinha acabado de desligar o telefone
com você. Você estava rindo de um comercial que acabou de ver e tinha aquelas
q q
linhas em seus olhos… — Eu estendo a mão e acaricio as linhas de sorriso fracas
em seu olho esquerdo. — Essas. Logo depois que desligamos, preenchi a
inscrição para o concurso e escrevi namorado. Eu só estava pensando em você.
Eu queria uma desculpa, ter que fingir. Eu pensei que poderia ter você por uma
semana e seria o suficiente para fazer meus sentimentos irem embora. — Olho
para minhas mãos e começo a empilhar as árvores. — Mas tudo o que esta
semana fez foi tornar mais fácil para mim amar você. Lamento não ter sido
honesta. Me desculpe por ter machucado você. Eu não lidei com nada direito.
Eu não sei, todas as minhas desculpas parecem estúpidas agora.
Lembro-me do que disse a Layla. Que se algo tivesse que acontecer, teria
acontecido. Eu sou tão idiota. As coisas acontecem há anos, só tenho medo de
vê-las.
Luka fica de joelhos na minha frente, afastando as árvores do caminho. Ele
enrola as mãos sobre minhas coxas, abaixa a cabeça até poder olhar para mim.
— E foi o suficiente? Para seus sentimentos irem embora?
Eu balanço minha cabeça.
— Não.
— Como você se sente agora?
Você está disposta a ser honesta?
Eu respiro profundamente.
— Ainda estou com medo — digo a ele. Eu seguro seus olhos, esperando que
ele veja o quão séria, aterrorizada e estupidamente apaixonada eu estou. — Estou
realmente com medo. Você é meu melhor amigo. Preciso saber se fizermos isso,
que ainda posso ficar com você se não funcionar.
— Você vai — diz ele, as palmas das mãos se movendo para cima e para baixo,
se aproximando. — Você não vai conseguir se livrar de mim, eu prometo.
— Eu quero autenticado — eu fungo e corro uma mão trêmula debaixo do
meu nariz.
— Podemos fazer com que seja autenticado em cartório. Alex faz isso, certo?
— Sim — eu aceno. — Ok.
— Ok — ele balança a cabeça, um sorriso começando no canto da boca. O
sol que entra pela minha janela ilumina seus olhos em tons de ouro, as sardas em
seu nariz são uma explosão de estrelas. — Viu, foi tão difícil assim?
Eu ri. Só tem sido a coisa mais difícil da minha vida.
— Estou muito feliz por ter pedido para você ser meu namorado falso —
confesso.
— Estou muito feliz por ter concordado em ser seu namorado falso.
— Eu te amo — eu suspiro, e a mudança em seu rosto é instantânea. Seu
sorriso suaviza e se espalha até que seu rosto inteiro brilha com ele, as mãos em
minhas coxas deslizando até meus quadris. Ele deixa cair sua testa na minha até
que ele esteja apenas colorido. Dourado, castanho, rosa pálido. Suspiro e fecho os
olhos. — Eu te amo tanto.
Eu posso sentir seu sorriso contra o meu, brilhante e lindo. Suas mãos
apertam meus quadris, minhas costelas e então sobem para cobrir minhas
bochechas. Seus polegares alisam a área sob meus olhos.
— Porra, finalmente.
Quando ele me beija, tem gosto de café com leite de avelã, a borda de um
mini pinheiro cavando meu joelho.
Finalmente.
Epílogo
Luka
Demorou quase uma década, mas finalmente consegui me recompor.
Para ser justo, Stella também fez seu quinhão de arrastar os pés. Acho que
isso nos faz um bom par, tirando a mágoa desnecessária. Eu digo isso a ela
enquanto estamos deitados no chão do quarto dela, minha pele ainda pegajosa
de suor e meus dedos traçando entre suas omoplatas, sua pele pálida brilhando
ao sol da tarde. Tenho certeza de que há um sapato cravado nas minhas costas,
mas Stella continua se aconchegando mais perto, seu cabelo fazendo cócegas no
meu queixo, e eu não me moveria se Beckett e todos os seus gatinhos chutassem a
porta. Stella inclina a cabeça para me encarar com meu comentário, mas eu a vejo
escondendo um sorriso também. Meu sorriso favorito de Stella, covinhas
piscando em suas bochechas.
Eu provavelmente deveria dizer a ela que ela precisa tirar o sutiã da árvore.
Ela suspira em meu bíceps e parte de mim se move, rola e se acomoda. Eu tive
minhas dúvidas de que chegaríamos a este ponto. Antes dessa coisa de mídia
social, meu plano para dizer a Stella como eu me sentia sobre ela era apenas um
desgaste geral, eu acho. Continue vindo, continue alimentando-a com
bolonhesa, talvez tente segurar a mão dela. Eu disse a Beckett que era um jogo
longo. Ele tinha me chamado de idiota. Quando expliquei o plano para Charlie,
ele apenas me deu um tapa na cabeça e roubou o resto da minha cerveja.
Eu não acho que ela percebe isso, mas nós meio que namoramos nos últimos
nove anos. Mesmo quando ela está com alguém, eu sou o cara para quem ela liga
quando tranca o carro com as chaves dentro no posto de gasolina. Eu sou o cara
para quem ela liga quando acidentalmente coloca gelo seco na pia e tem medo de
explodir seu encanamento. Estou muito feliz por ser o cara para quem ela liga
quando precisa de um namorado falso.
A fazenda vai ficar bem. Com as prestações mensais que Dane faz Hewett
pagar por causa de todos os danos que ele causou, Stella nem precisará do
dinheiro do concurso. E ela ainda não sabe, mas Charlie me mandou uma
mensagem mais cedo enquanto Stella estava vagando pelos campos.
Elle decidiu que largará Bill. Aparentemente, houve um incidente com sua
secretária e outras sete mulheres na firma. Não tenho certeza se você pode
chamar de incidente quando o número é mais de dois, mas eu não perguntaria.
Como presente de despedida, Charlie decidiu comprar todas as árvores mortas e
distorcidas do pasto sul e deixá-las cair no gramado da frente da casa de seu pai.
Acho que é uma boa maneira de celebrar a ocasião. Tenho certeza que Stella vai
concordar.
Stella dá um beijo no meu queixo e eu aliso minha palma pela sua espinha.
Aqui está a verdade disso. Quando Stella me perguntou qual era minha
estratégia de saída para essa coisa de namorado falso, eu não tinha uma.
Francamente, eu estava muito ocupado com a ideia de tocá-la, abraçá-la, estar
com ela do jeito que eu sempre quis. Mas assim que ela perguntou, eu sabia qual
era a minha resposta. Eu disse a ela que continuaríamos e eu realmente quis dizer
isso.
Eu tenho essa memória do meu pai que vem a mim em pedaços. Sorvete de
baunilha. Calor de verão pegajoso. Umidade que fazia minhas roupas parecerem
pesar cinco mil quilos. E as meias do meu pai, uma mais alta que a outra, presas
na perna da calça. Garrafas minúsculas de ketchup nelas, um presente da minha
mãe.
Eu tinha dado um soco no rosto de Jimmy Tomilson no parquinho da escola
e meu pai me pegou mais cedo. Ele estava em silêncio no carro e em silêncio
quando paramos na frente da sorveteria. Em silêncio na fila até que pediu dois
cones para a viagem. Ele nos acompanhou pela rua até um pequeno jardim
escondido, cercado por roseiras com uma fonte vazia no meio. Eu estava
apavorado com o que ele poderia dizer, a ameaça de sua decepção pairando sobre
mim como uma nuvem espessa.
— Por que você fez isso? — ele havia perguntado.
Eu disse a ele que Jimmy estava implicando com Sarah Simmons, jogando
lascas de palha nela e fazendo-a tropeçar toda vez que ela tentava pular no
escorregador. Eu disse para ele parar e quando ele não ouviu, eu dei um soco na
g p p q
cara dele. Meu pai não disse nada, apenas deu outra mordida lenta em sua
casquinha de sorvete. Ele sempre fez isso. Morder o sorvete em vez de lamber.
Minha mãe chamava isso de bárbaro.
— Você nem sempre vai saber qual é a coisa certa — ele disse. — Quando
isso acontece, você continua.
Eu pisquei para ele, o sorvete derretendo na lateral do meu cone e sobre meus
dedos.
— Continuar o quê?
— Você vai descobrir. — Outra mordida de sorvete. — Continue. Escute.
Você encontrará o seu caminho.
Eu tentei descobrir esse conselho à medida que cresci. Sempre esteve lá no
fundo da minha mente, toda vez que fiquei confuso, frustrado ou impaciente.
Continue. Escute. Mas agora, pela primeira vez, acho que entendi.
Vou continuar enchendo a dispensa de Stella com pão integral e barras de
proteína e frutas da vida real porque Cup O'Noodles e Oreos não são uma dieta
razoável. Vou dançar com ela na cozinha, seus pés descalços pisando em meus
dedos a cada dois passos. Cozinhar sua bolonhesa e ravióli e manicotti e pão de
alho com queijo extra porque seu rosto se ilumina quando ela me vê em seu
fogão, seu queixo no meu ombro enquanto ela tenta chegar em cima de mim
para provar. Eu vou segurar a mão dela quando ela precisar, aconchegá-la perto
quando ela precisar também.
Vou amá-la de todas as maneiras silenciosas, lentas, barulhentas e
desagradáveis. Meu coração está se movendo firmemente nessa direção desde que
ela caiu dos degraus de uma loja de ferragens, direto em meus braços.
— Por que você está sorrindo assim? — Ela murmura em meu peito, um
olho semicerrado, seu dedo cutucando a linha na minha bochecha. Eu afasto a
mão dela e enrosco nossos dedos. — É estranho.
— Hmm, você tem jeito com as palavras. Alguém já te disse isso?
Ela se apoia em um cotovelo, o cabelo escuro caindo em cascata sobre o
ombro em uma profusão de cachos. Ela está deslumbrante assim, em sua pele
nua e bochechas rosadas, cabelos emaranhados e um chupão na curva do ombro.
Eu empurro todo aquele cabelo para longe de seu rosto e traço a linha de sua
mandíbula, o pequeno buraco em seu queixo, seu lábio inferior cheio e tentador.
Eu não sei como eu mantive minhas mãos controladas por tanto tempo. Ela
pressiona um beijo na palma da minha mão e tudo em mim se acalma. Juro que
não sabia o quanto estava chacoalhando lá dentro até que Stella enrolou a mão
em volta do meu coração e puxou.
— Falando sério, qual é a do olhar?
— Só pensando — digo a ela. Eu deixo cair minha cabeça de volta para o
chão. — Apenas feliz.
Ela cantarola com isso, um pequeno movimento de seu corpo contra o meu.
O silêncio é um conforto caloroso entre nós, seu tornozelo enganchado sobre o
meu. O vento assobia nas janelas, o velho relógio em seu corredor faz um tique-
taque irregular. É lento em um segundo, rápido demais no próximo. Eu olho
para o espelho no canto do quarto dela e tenho algumas ideias.
Ela passa os dedos pelo meu peito e, em seguida, desliza a palma da mão para
baixo.
— Qual é o plano agora? — ela pergunta, um pouco sonolenta.
Ir para a cama, eu acho. Ver quantas vezes eu posso fazer sua respiração travar.
— Hm, eu acho que é óbvio — eu digo. Inclino minha cabeça para olhar
para ela. Ela se apoia, o queixo na palma de uma mão, a outra contra minhas
costelas. Eu não acho que ela percebe isso, mas ela está tropeçando seus dedos em
cada uma das minhas sardas, pintando quadros na minha pele. Eu sorrio.
Ela bufa e cai de volta contra mim, seu rosto no meu peito.
— Não diga isso.
Eu envolvo os dois braços ao redor dela e a seguro firme. Eu sorrio para o
teto.
— Nós vamos continuar.
O FIM
Obrigada
Meu primeiro agradecimento vai para você, leitor. É uma sensação
absolutamente insana que este livro esteja no mundo sendo lido por pessoas —
pessoas da vida real! Obrigada por dar a este pequeno livro um pouco do seu
tempo. Escrever isso foi um sonho realizado e eu não poderia ter feito isso sem o
apoio de duas pessoas muito importantes.
Você sabia que esta é a primeira coisa que meu marido já leu por mim?
Obrigado, E, por seu apoio enquanto eu digitava no pátio, no sofá, no chão e em
todos os lugares entre eles. Você sempre acreditou em mim e eu te amo muito.
Prometo ouvir você falar sobre Fantasy Football agora.
Annie, minha droga de entrada para romances. Você tem torcido por mim por
quase uma década. Este livro cem por cento não seria o que é se não fosse por
você. Obrigada por editar, mas mais importante, obrigada por segurar minha
mão.
Notas
[←1]
O Abeto de Douglas é uma árvore conífera que cresce na América do
Norte. Essa árvore alta e perene é frequentemente usada como árvore de
Natal e possui um toque cítrico refrescante e adocicado.
[←2]
Palavra de origem italiana, que significa em português “destacado”.
Termo muito utilizado na música, principalmente por pianistas e
instrumentistas de sopro, por ser uma técnica mais clássica. O staccato é
basicamente a forma de tocar “batendo” nas notas, não dando
continuidade a nenhuma delas. Cada nota é tocada em forma de “pulo”
com os dedos, ou seja, você não toca deixando sua mão nas teclas, mas sim
tirando-as rapidamente.
[←3]
Sriracha é um tipo de molho de pimenta, que recebeu o nome da cidade
de Si Racha, na província de Chon Buri, Tailândia, onde foi produzido e
servido nos restaurantes de frutos do mar locais.
[←4]
O hatchback é um design automotivo que consiste num
compartimento de passageiros com porta-malas integrado, acessível através
de uma porta traseira, e o compartimento do motor à frente.
[←5]
O lúpulo é responsável pelas substâncias que conferem amargor e
aroma à cerveja. Os componentes amargos de interesse para a bebida são os
alfa-ácidos. Durante a fervura, estes compostos passam por um processo
chamado isomerização, tornando-os solúveis no mosto e assim, conferindo
o amargor.
[←6]
Um presente de elefante branco é um presente escandalosamente feio
que é muitas vezes dado em brincadeira, que ninguém realmente quer.
[←7]
Em inglês, é um trocadilho entre Deus (God) e raposa (fox), já que
ambas as palavras possuem uma pronúncia muito similar.
[←8]
Uma garra de urso é uma massa doce, fermentada, um tipo de
dinamarquês, originária dos Estados Unidos.
[←9]
Expressão que se refere a quando uma pessoa faz algo e fofoca/se gaba
sobre isso logo em seguida.
[←10]
A Spirit Night é uma oportunidade proporcionada pela escola para
arrecadar fundos para escolas ou outras organizações que desejam arrecadar
dinheiro. É um evento da Noite dos Pais onde os adolescentes desfrutam de
uma noite de diversão. Os adolescentes vão jogar/brincar até não poderem
mais, enquanto a escola arrecada dinheiro.
[←11]
Referência ao filme Férias Frustradas de Natal.
[←12]
Em inglês, o original é IGLOO (Inglewild Gift List Operation
Operation), um trocadilho com a palavra Iglu. Por isso, mais para frente, a
Stella fala sobre os acrônimos: listaram o O duas vezes para dar o som de U.
[←13]
Marca norte-americana de preservativos.