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Faculdade de letras da universidade do porto

História do Mundo Contemporâneo

Resumos

João Pedro Sousa


LICENCIATURA EM CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO: JORNALISMO, ASSESSORIA,
MULTIMÉDIA
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Índice
Conceitos bá sicos para a explicaçã o do mundo contemporâ neo: teorias do “imperialismo” e da
circulaçã o de capitais............................................................................................................................................................... 4
As teorias anteriores à s guerras mundiais – a exportaçã o de capitais como explicaçã o para a nova
ordem internacional................................................................................................................................................................. 6
John Hobson (1903)............................................................................................................................................................6
Rudolf Hilferding (1910)...................................................................................................................................................7
Rosa Luxemburgo (1913).................................................................................................................................................8
A distinçã o entre “imperialismo” e “impérios”...........................................................................................................10
As teorias do “imperialismo” depois de 1945: as causas do “subdesenvolvimento” e da
“dependência”........................................................................................................................................................................... 14
Imperialismos com Impérios Coloniais.........................................................................................................................16
Grã Bretanha........................................................................................................................................................................16
França..................................................................................................................................................................................... 18
A Alemanha pó s Bismarck.............................................................................................................................................19
O Império Russo.................................................................................................................................................................22
A emergência do Japã o – industrializaçã o e primeira expansã o continental – Guerra com a China
(1894-1895) e com a Rú ssia (1904-1905).............................................................................................................23
A emergência dos Estados Unidos - industrializaçã o e primeiras conquistas coloniais - guerra
com a Espanha (1898-1899) e construçã o do canal do Panamá (1901-1914)......................................26
O Império Otomano.......................................................................................................................................................... 29
Os conflitos imperialistas.....................................................................................................................................................31
Fatores de conflito entre as potências......................................................................................................................31
Fatores de aproximaçã o entre potências......................................................................................................................38
A disputa pela influência no Império Otomano e o petró leo do Médio Oriente – acordos anglo-
alemã es (1912-1914)...................................................................................................................................................... 38
Acordos anglo-alemã es sobre as coló nias portuguesas (1898; 1912-1914)...........................................40
A I Guerra Mundial.................................................................................................................................................................. 41
As operaçõ es militares.................................................................................................................................................... 41
O fracasso dos planos da guerra de curta duraçã o (1914)..............................................................................43
O alargamento das frentes e os impasses (1915-1916)...................................................................................44
A procura da "decisã o": guerra submarina alemã , revoluçõ es russas e intervençã o dos EUA
(1917)..................................................................................................................................................................................... 47
O ano de 1918: ofensivas militares finais e revoluçã o europeia...................................................................50
A ordem mundial do pó s I Guerra....................................................................................................................................52
Os Tratados de Paz............................................................................................................................................................54
A exportaçã o de capitais entre as guerras e a depressã o 1929-1933..............................................................60
O endividamento dos países europeus e os investimentos dos EUA na Europa....................................60
Os aumentos de produtividade e a fase de “prosperidade” da década de 1920....................................62

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A recessã o da década de 1930: a crise bolsista nos EUA (1929) e a sua transformaçã o em
recessã o mundial............................................................................................................................................................... 64
A recessã o e as alteraçõ es políticas – regimes antiparlamentares na Europa e no Mundo..............68
A II Guerra Mundial................................................................................................................................................................ 74
A hegemonia alemã até 1942.......................................................................................................................................78
O recuo alemã o depois de Estalinegrado e dos desembarques americanos...........................................80
A Guerra no Pacífico......................................................................................................................................................... 81
A passagem para a guerra nuclear.............................................................................................................................84
A ordem internacional apó s a II Guerra Mundial................................................................................................85
O fim dos impérios coloniais.........................................................................................................................................86
Factores para as políticas "anti-coloniais": a hegemonia EUA/URSS; a ONU; os novos organismos
multilaterais......................................................................................................................................................................... 87
As descolonizaçõ es asiá ticas (1947-1953)..................................................................................................................95
A descolonizaçã o da Índia Britâ nica e o conflito Índia-Paquistã o (1947-48).........................................95
A descolonizaçã o das Índias Holandesas e a Repú blica da Indonésia (1945-1950)............................99
A descolonizaçã o da Indochina francesa e a intervençã o dos EUA...........................................................100
A descolonizaçã o da Coreia e o primeiro grande conflito regional do pó s-II Guerra........................103
As descolonizaçõ es do Médio Oriente e da Á frica do Norte...............................................................................106
Os estados á rabes sob tutela britâ nica e francesa, o mandato da Palestina e a génese do conflito
israelo-á rabe..................................................................................................................................................................... 106
A evoluçã o do Egito – da independência formal de 1922 à Repú blica Á rabe Unida (1958)..........112
A guerra colonial na Argélia e o seu impacto em França (1954-1962)...................................................116
As descolonizaçõ es em Á frica – 1957-1990..............................................................................................................119
As descolonizaçõ es inglesas e francesas na Africa Ocidental e Oriental - 1957-1964......................119
A descolonizaçã o portuguesa - 1974-1975.........................................................................................................122
Os processos rodesiano e sul africano (1965-1990).......................................................................................127
A emergência da China....................................................................................................................................................... 131
A implantaçã o da Repú blica e a unificaçã o do nacionalismo chinês através do Kuo Min Tan –
1911 - 1927....................................................................................................................................................................... 132
O decénio de Nankin e a guerra civil – 1927-1937...........................................................................................134
Da invasã o japonesa à 2º reunificaçã o da China republicana – 1937-1949..........................................135
As dificuldades da industrializaçã o chinesa - o campesinato como base da acumulaçã o e as
hesitaçõ es do crescimento..........................................................................................................................................136
Os planos quinquenais até ao fim do "Grande salto em frente”..................................................................137
A rutura com a URSS e a “Revoluçã o Cultural”...................................................................................................139
A nova política de internacionalizaçã o..................................................................................................................141
Os equilíbrios mundiais na época da Guerra Fria...................................................................................................144
A URSS entre 1945-1964 – fragilidades do crescimento e alteraçõ es de políticas; a rutura sino-
soviética.............................................................................................................................................................................. 145

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A rutura sino-soviética.................................................................................................................................................148
A corrida ao armamento nuclear - bloqueios na acumulaçã o mundial para a URSS e para os EUA:
do míssil gap ao tratado de nã o proliferaçã o nuclear (1968).....................................................................148
A “détente”......................................................................................................................................................................... 151
O Acordo Salt 1.................................................................................................................................................................152
A Conferência de Helsínquia......................................................................................................................................154
A ú ltima fase da guerra fria (1979-1990)............................................................................................................154
A Ordem Mundial depois de 1991.................................................................................................................................159
Anexos....................................................................................................................................................................................... 162
Os obstá culos dos conflitos regionais....................................................................................................................162
Médio Oriente e a Guerra de Outubro de 1973............................................................................................162
América Latina e o golpe de Estado no Chile (1973).................................................................................163
A guerra civil em Angola (1974-1975)............................................................................................................165
A revoluçã o iraniana (1978)................................................................................................................................166
A invasã o soviética no Afeganistã o...................................................................................................................167

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Conceitos básicos para a explicação do mundo


contemporâneo: teorias do “imperialismo” e da
circulação de capitais

O Capitalismo designa um modelo de organizaçã o social e econó mica. Baseia-se


na propriedade privada dos meios de produçã o, na livre iniciativa (possibilidade de
qualquer indivíduo criar fontes de rendimento), tendendo para uma economia de
mercado, de livre empresa, vocacionada para o lucro.

Capital corresponde ao conjunto de bens, que podem proporcionar ao seu


proprietá rio uma renda se forem emprestados ou investidos.

No século XX, a economia mundial viveu grandes mudanças. A tecnologia da


Revoluçã o Industrial aumentou ainda mais a produçã o, o que gerou uma grande
necessidade de mercado consumidor para esses produtos e uma nova corrida por
matérias-primas. Passaram a existir uns poucos países riquíssimos, nos quais a
acumulaçã o do capital tinha alcançado proporçõ es gigantescas originando um enorme
"excedente de capital”.

O excedente de capital nã o é consagrado à elevaçã o do nível de vida das massas


do país, pois significaria a diminuiçã o dos lucros dos capitalistas, mas ao aumento
desses lucros através da exportação de capitais para os países menos desenvolvidos
do estrangeiro.

Nesses países, o lucro é em geral elevado, pois os capitais são escassos, o


preço da terra e os salários relativamente baixos, e as matérias-primas baratas.

A necessidade de exportação de capitais (exportação de valor com o objetivo


de obtenção de valor suplementar [em forma de mais-valia, juros, lucros nã o
econó micos ou nã o equivalentes] decorre da lei económica fundamental do
capitalismo em resultado do carácter limitado da aplicação do capital dentro do
país, com taxa de lucro máxima. No Imperialismo do século XX, a consolidaçã o da
exportaçã o de capitais dá um sentido diferente dos imperialismos antigos.

A possibilidade de exportação de capitais diz respeito ao carácter desigual


do desenvolvimento económico de diferentes países capitalistas, o que possibilita
os investimentos nos países menos desenvolvidos. Além disso, nos países

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

imperialistas forma-se o excedente de capital. Este excedente é relativo, já que os


capitais que são exportados podem ser aplicados dentro dos países exportadores
para ampliação da produção, eliminação do desemprego, da inflação, etc. Os
impérios modernos eram sinónimos de exportação de capitais. Portanto, havia uma
mudança de paradigma nas relaçõ es políticas, já que certas nações procuravam
controlar o governo de outros países para os quais exportavam.

Nas vésperas da 1ª Guerra Mundial, o mundo encontrava-se sob controlo


político das potências europeias. De facto, de 1890 a 1910, assiste-se à conquista e
administração de grandes partes de territórios pelos Europeus. Este domínio
concretizava-se numa nova fase de expansão europeia que remontava à segunda
metade do século XIX. Pode dizer-se que a Europa partilhava o mundo entre si. O
movimento ficou conhecido por imperialismo.

“ (…) O que caracteriza o capitalismo moderno, no qual impera o monopólio, é a


exportação de capital.”

Lenine

O Imperialismo é um conceito proveniente do pensamento político e


económico e designa uma fase do desenvolvimento do liberalismo capitalista. Trata-
se de uma fase superior, que vigorou no fim do século XIX e no início do século XX,
caracterizada pela concentração do capital na metrópole, onde se cria uma
oligarquia financeira que domina o resto da economia. A nível político, a metrópole
aplica a sua vontade aos restantes povos incluídos nos enormes espaços
geográficos. A organização do império é sempre supranacional e autoritária,
impondo a metrópole a forma e a substância da organização política. América,
África, Ásia e Oceânia foram ocupadas e transformadas em províncias, dependentes
política, económica e militarmente da metrópole europeia. As colónias, os
territórios ocupados, serviam para obter matérias-primas baratas e para lá
exportar os excedentes e do capital. A exportação de capital é, pois, feita da
metrópole para a colónia.

Nasceu, entã o, um novo tipo de colonialismo, de cará ter imperialista. Este


apresentou-se, pois, sob a forma de conquista territorial e colonizaçã o, com uma sujeiçã o
política indirecta, dando origem aos protectorados, e sob a forma de controlo econó mico,
pela necessidade sentida pela Europa industrializada de conseguir novos mercados (as
coló nias), abastecedores de matérias-primas e escoadores dos produtos industrializados.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Esta expansão europeia inscreve-se, então, numa estratégia de controlo de


uma vasta extensão territorial com vista à satisfação das necessidades económicas
das metrópoles, e foi, sobretudo, marcada pelo colonialismo que fez de Á frica e da Á sia
locais especialmente cobiçados. Aliá s, o caso mais evidente de imperialismo e de
colonialismo ocorreu relativamente à ocupaçã o do continente africano. Em 1885, a
Conferência de Berlim ditou as regras de partilha do continente africano e asiá tico.
Consagrou o princípio da ocupaçã o efectiva do territó rio, em detrimento dos direitos
histó ricos de descoberta. Em 1914, já só restavam como Estados independentes, em
Á frica, a Etió pia e a Libéria. Já na Á sia, a expansã o territorial europeia nã o foi intensa. A
Índia ficou sob domínio inglês, a Indochina, francês, a Insulíndia, holandês. Só o Japã o e a
China permaneceram independentes.

Nas origens do imperialismo, encontram-se motivações de ordem


económica: só os novos territórios (colónias) podiam fornecer as matérias-primas
indispensáveis e garantir o escoamento da produção industrial, além de abrir
possibilidades de investimento e colocação de capitais.

“ (…) Na época do Imperialismo, os capitalistas (…) tratavam de exportar


fundamentalmente o excedente dos seus capitais para os países pouco desenvolvidos
industrialmente, onde o emprego desse capital lhes proporcionava grandes lucros. Os
capitais são também exportados para as colónias, assim como para os países
independentes.”

História Moderna: O Imperialismo

As teorias anteriores às guerras mundiais – a exportação


de capitais como explicação para a nova ordem
internacional

John Hobson (1903)

Foi o primeiro autor a abordar o fenó meno do imperialismo de forma mais


profunda e sistemá tica. Este autor estabelece uma relaçã o muito directa entre o
funcionamento do sistema econó mico e o imperialismo. Para ele, a existência de um
amplo excesso de capitais nos grandes países industriais é o factor determinante do
imperialismo. Ao não encontrar no interior mercados suficientes, os industriais e os
banqueiros buscam no exterior esferas de inversão vantajosas. Então, o
imperialismo responde a interesses sectoriais da economia.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

O imperialismo é definido pelo autor inglês como “a política de um Estado se


expandir para além dos limites da sua nacionalidade”. Nã o se tratava de uma etapa
necessá ria ou intrínseca ao sistema capitalista, mas sim de uma distorção no
desenvolvimento do capitalismo e de uma política adotada por grupos dominantes
para avançar os seus interesses às custas do resto da nação.

“A busca incessante de novos mercados e a diferença entre o poder de produção dos


industriais e o poder de compra dos consumidores constituem a prova irrefutável da má
distribuição das receitas. O imperialismo é produto desse sistema, ao qual apenas uma
reforma social poria fim”.

Hobson demonstrou que o motor da política de expansão imperial é a busca e


o controlo das esferas de inversão no exterior e que este movimento é consequência
de um excedente de capitais nos grandes países industrializados.

Assim, o fenómeno devia-se à acumulação de capital excedente que devia ser


exportado. Seriam motivações financeiras importantes do expansionismo a busca
de novas fontes de matérias-primas e de mercados.

Aqui reside a grande contribuiçã o de Hobson na discussã o teó rica sobre a natureza
do imperialismo. Ele identifica que o novo colonialismo tem motivaçõ es essencialmente
econó micas, relacionadas com o papel do capital financeiro nas sociedades capitalistas
modernas ("A raiz económica do imperialismo é o desejo de poderosos interesses financeiros
e industriais de assegurar mercados privados para os seus bens e capitais excedentes, às
custas do dinheiro público e da força pública").

Este autor tem uma visão do imperialismo muito parecida com a minha, com base
nos conhecimentos adquiridos. Efetivamente, o imperialismo responde a interesses sectoriais
das economias dos países ditos imperialistas. Eles complementam as suas economias graças
às colónias. Assim, são as motivações financeiras deles que estão na base da exportação de
capital e consequente “salvamento” dos países (através dos lucros gerados).

Rudolf Hilferding (1910)

Utiliza a expressã o “imperialismo” como geopolítica para se referir à rivalidade


entre os estados do centro, que implicava uma relaçã o de domínio da periferia. Essa
expressã o refere-se ao auge do capital financeiro numa nova era de monopó lio.

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Rudolf sistematiza a teoria do imperialismo moderno. Ele partilhava a ideia de que


é a troca, e nã o a produçã o, o fator decisivo da economia.

Para Hilferding, a organizaçã o do capital sob égide do capital financeiro,


correspondente a uma expansão extraordinariamente rápida dos monopólios
capitalistas, leva a um processo de “aglomeração nacional”, de nacionalização e a
uma luta cada vez mais dura no mercado mundial. Hilferding chegou à conclusã o de
que o capital financeiro necessitava de um grande apoio estatal para se obter proteçã o
econó mica, territó rios para inverter e matérias-primas e, igualmente, para dispor de
mercados para os seus produtos. Assim, a exportação de capitais adquire uma
importância muito especial como causa do imperialismo.

Nesta perspetiva, o capitalismo tem necessidade de maneira imperiosa da


expansão imperialista, a menos que renuncie ao que constitui o seu motor, isto é, o
benefício. Hilferding defende que a rápida expansão do capitalismo, que permite as
exportações de capitais, “é a condição vital de manutenção da sociedade capitalista”.
Assim, o imperialismo é para o capitalismo, na era dos monopólios, uma
necessidade económica absoluta, constituindo o estádio supremo da evolução do
sistema capitalista.

Concordo parcialmente com a visão deste autor. É que ele mostra, corretamente, que
a expansão do imperialismo é uma consequência da expansão do capitalismo. Isto faz todo o
sentido. É que a expansão de capitais vai levar a um fenómeno de “aglomeração nacional” de
capitais e isto vai fomentar a exportação de capitais, logo, há necessidade de expansão
imperialista – exportar capitais para as colónias, para o alívio da asfixia da metrópole.
Porém, o autor não aprofunda as tão debatidas motivações e interesses económicos que os
países do centro (metrópoles) têm sobre os países da periferia (colónias).

Rosa Luxemburgo (1913)

Partilhando a visão de Hilferding, considera o imperialismo como a


consequência da evolução do sistema capitalista no seu último estádio. Não
obstante, dá outro tipo de explicação económica do fenómeno capitalista. O
imperialismo provém de uma contradição essencial do capitalismo: a contradição
entre as forças produtivas e os limites do mercado.

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Em finais do século XIX, o capital e a sua acumulação passam a depender da


expansão imperialista. Este movimento de expansão é inclusivamente a expressão
política dos processos de acumulação.

Para a autora, esta expansão não pode senão dar um prolongamento ao


capitalismo, pois a base de acumulação deste último diminui à medida que o
imperialismo se apropria, para finalmente destruí-las, das economias “naturais” das
últimas regiões do globo subtraídas até então a sua influência. Então, a economia
capitalista expandia os mercados até ao ponto em que a exportação e acumulação
excessiva de capitais levaria a uma Guerra Mundial. Ao contrário de Hilferding,
acreditava fatalmente que a competitividade entre países imperialistas acarretava
uma guerra mundial.

A autora mostra que a articulação com outras formações sociais é


indispensável ao capitalismo para que possa existir acumulação. Na época dos
monopólios, este processo de articulação adota a forma do imperialismo, já que o
nível de evolução a que chegaram as economias capitalistas obriga-as a assegurar o
controlo das formações sociais não capitalistas situadas na periferia.

Esta autora tem uma visão parecida com a de Hilferding. Mas acabo por concordar
mais com ela, pois transmite uma visão mais completa daquilo que é o imperialismo. Tal
como o economista austríaco, Rosa Luxemburgo mostra que o imperialismo é uma
consequência do capitalismo na sua fase final. Mas vai mais avante e explica que também é
uma consequência de uma contradição entre a produção e os limites do mercado. Assim, a
acumulação dos capitais só é “salva” graças ao imperialismo, que se apropria das colónias e
das suas “economias naturais”. Então, a economia capitalista expandia os mercados até ao
ponto em que a exportação e acumulação excessiva de capitais levaria a uma Guerra
Mundial.

Lenine defendia o Imperialismo enquanto fase final do capitalismo (1916). Tal


como Rosa Luxemburgo, acreditava no fatalismo da guerra (a ú ltima fase da competiçã o
imperialista).

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A distinção entre “imperialismo” e “impérios”

O Imperialismo é um conceito proveniente do pensamento político e


económico e designa uma fase superior do desenvolvimento do liberalismo
capitalista. Trata-se do tipo de política expansionista das principais nações
europeias que vigorou no fim do século XIX e no início do século XX (aqui o conceito
foi usado com um conteú do pró prio), caracterizada pela concentração de capital na
metrópole, onde se cria uma oligarquia financeira que domina o resto da economia.
No fundo, é uma política de expansão e domínio territorial, cultural e económico de
uma nação sobre outras, ou sobre uma ou várias regiões geográficas (normalmente
mais fracas e subdesenvolvidas), com base na dominação e subordinação. É a
prática através da qual, nações poderosas procuram ampliar e manter controlo ou
influência sobre povos ou nações mais pobres.

A nível político, a metrópole aplica a sua vontade aos restantes povos


incluídos nos enormes espaços geográficos. A organização do império é sempre
supranacional e autoritária, impondo a metrópole a forma e a substância da
organização política. América, Á frica, Á sia e Oceâ nia foram ocupadas e transformadas em
províncias, dependentes política, econó mica e militarmente da metró pole europeia. As
colónias, os territórios ocupados, serviam para obter matérias-primas baratas e
para lá exportar os excedentes e do capital. A exportação de capital é, pois, feita da
metrópole para a colónia.

Imperialismo refere-se, em geral, ao controlo e influência que é exercido tanto


formal como informalmente, direta ou indiretamente, política ou economicamente.

Nasceu, entã o, um novo tipo de colonialismo, de cará ter imperialista. Este


apresentou-se, pois, sob a forma de conquista territorial e colonizaçã o, com uma sujeiçã o
política indireta, dando origem aos protetorados, e sob a forma de controlo econó mico,
pela necessidade sentida pela Europa industrializada de conseguir novos mercados (as
coló nias), abastecedores de matérias-primas e escoadores dos produtos industrializados.

Esta expansão europeia inscreve-se, então, numa estratégia de controlo de


uma vasta extensão territorial com vista à satisfação das necessidades económicas
das metrópoles, e foi, sobretudo, marcada pelo colonialismo que fez de Á frica e da Á sia
locais especialmente cobiçados. Aliá s, o caso mais evidente de imperialismo e de
colonialismo ocorreu relativamente à ocupaçã o do continente africano. Em 1885, a

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Conferência de Berlim ditou as regras de partilha do continente africano e asiá tico.


Consagrou o princípio da ocupaçã o efetiva do territó rio, em detrimento dos direitos
histó ricos de descoberta. Em 1914, já só restavam como Estados independentes, em
Á frica, a Etió pia e a Libéria. Já na Á sia, a expansã o territorial europeia nã o foi intensa. A
Índia ficou sob domínio inglês, a Indochina, francês, a Insulíndia, holandês. Só o Japã o e a
China permaneceram independentes.

Os grandes impérios repartiam entre si a maior parte da superfície terrestre


do globo. Assim, considera-se uma distinçã o entre dois tipos de impérios: os impérios do
tipo antigo (exploraçã o das coló nias, pagamento de tributos, fluxo das coló nias para o país
imperialista - impérios da Europa Oriental, Otomano e China eram exemplos mais
flagrantes) e do tipo novo (desenvolvimento e investimento nas posses coloniais
ultramarinas, fluxo do país para as coló nias [com vista a colocar riqueza no exterior e
retirar lucros futuros] - capitalismo dos nossos dias). Todos exerciam o seu poder sobre
outros povos. Os do segundo tipo pareciam estar ainda em expansã o e refletiam, na sua
forma mais ó bvia, a hegemonia mundial da minoria branca da Humanidade. Estava
patente aqui uma mudança de paradigma nas relaçõ es políticas, já que certas naçõ es
procuravam controlar o governo dos países para os quais exportavam capitais,
quando as economias capitalistas não cabem mais nos seus territórios.

Existem três traços para caracterizar o imperialismo: a concentraçã o da produçã o


cria o monopó lio; a fusã o do capital bancá rio com o capital industrial cria o capital
financeiro; a estagnaçã o da taxa de lucro origina a exportaçã o do capital. Nas origens do
imperialismo, encontram-se motivações de ordem económica: só os novos
territórios (colónias) podiam fornecer a mão-de-obra barata e as matérias-primas
indispensáveis e garantir o escoamento da produção industrial, além de abrir
possibilidades de investimento e colocação de capitais através da busca de mercado
consumidor.

A principal característica do imperialismo passava pela transferência de


riqueza em detrimento da sua receção. Os países dominantes procuravam retorno
(lucros) com a exportação de capitais para os países dominados. De outra forma, a
nação imperialista levava capital para as nações dominadas do que das nações
dominadas.

No Imperialismo do século XX, a consolidação da exportação de


capitais/investimentos dá um sentido diferente aos imperialismos antigos, pois
agora o que caracterizava os Impérios de tipo novo era o fluxo oposto: antes o país

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

explorador retirava a riqueza dos sítios, enquanto depois começaram a exportar os

capitais para o local. Nos séculos XX e XXI houve uma enorme massa de capitais
exportados. Esta prática era feita na expetativa de se receber mais do que o
investido. De outro modo, colocava-se riqueza para gerar mais riqueza. Os países
que começaram a ficar mais comprometidos com estes capitais procuravam
garantir que os países para onde enviavam os capitais eram os países que eles
esperavam (cumpriam as regras impostas). Assim, procuravam controlar os
governos dos países para onde exportavam.

As sociedades capitalistas exportavam capital para fora da Europa,


acompanhadas por uma subalternização política e militar, originando grandes
rivalidades entre os países detentores de esferas de influência, o que concretizou o
principal motivo da I Guerra Mundial, dando princípio à “nova era imperialista".

Os ingleses eram o maior investidor de capitais nos Impérios coloniais. O


Reino Unido concentra grande parte das exportações de capitais nos seus
territórios coloniais. Já a França era o segundo maior exportador de capitais e foi
paulatinamente oferecendo bens a outros países, sem receber a devida compensaçã o (só
exportava 8,9% para as coló nias e o resto para outros países independentes). Verifica-se
aqui a distinção entre imperialismo e colonialismo. As relações internacionais eram
dominadas pela tentativa de alguns países exercerem influência sobre outros e
assim exportar o seu capital (no início do século XX eram consideradas potências
aquelas que mais exportavam).

Não era necessário que fosse uma relação colonial (China, Império Otomano
e América Latina pediam empréstimos aos grandes centros financeiros de Londres e
Paris, sendo países independentes). Então, o imperialismo do século XX não está
associado à criação de colónias (países como Portugal têm impérios coloniais mas
não são imperialistas; países como os EUA não têm impérios coloniais mas são
imperialistas). Esta relação podia ser feita entre dois países independentes [não
está associado à posse de colónias].

A exploraçã o de capitais pode ser feita de duas formas (inícios do século XX):
investimento direto ou investimento indireto. O investimento direto era feito diretamente
por empresas que se instalam no exterior (as multinacionais). Se os mercados nã o fossem
fechados seria mais fá cil aumentar a produçã o dentro já do país instalado. O capital em

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

excesso torna-se produtivo num mercado fechado. Já o investimento indireto (ou de


carteira) é feito normalmente por bancos (acionistas), que aplicam o investimento e
compram dívidas pú blicas (empréstimos pú blicos feitos a governos). Essas dívidas
condicionam muito a política dos países importadores (situaçõ es de ruturas de
pagamentos).

Na minha opinião, os países imperialistas apenas queriam satisfazer as suas próprias


necessidades e interesses. Como tal, eram bastante “egoístas”, na medida em que se
aproveitavam das suas colónias, que viam como complemento das suas economias. Assim,
promoviam economias muito desequilibradas. (ver citação “na época do imperialismo”).

Os Impérios são grupos de Estados ou reinos com domínio sobre extensos


territórios subordinados a um chefe supremo, o imperador, apresentando também
um poder hegemónico em certa área de influência. Esses grupos formaram-se, quer
pela sua livre associação, geralmente com objetivo de defesa mútua, quer pela
dominação de vários estados por um estado dominante. Foi desta forma que se
formaram os grandes impérios coloniais.

O império também é uma forma de governo monárquico, cujo chefe é um


imperador. Em sentido restrito, designa a própria autoridade ou poder de um
soberano, imperador ou imperatriz. Também se denomina império ao conjunto dos
territórios que rege um estado imperial. Por extensão, "império" pode referir-se
também a etapa histórica onde um país tomou esta política ou bem a potencia que
exerce uma forte influência política, económica e cultural.

Nas vésperas da I Guerra Mundial, o mundo encontrava-se sob controlo


político das potências europeias. De facto, de 1890 a 1910, assiste-se à conquista e
administração de grandes partes de territórios pelos Europeus. Este domínio
concretizava-se numa nova fase de expansão europeia que remontava à segunda
metade do século XIX. Pode dizer-se que a Europa partilhava o mundo entre si. O
movimento ficou conhecido por imperialismo.

No início do século XIX, o imperialismo estava mais vinculado à caracterizaçã o de


sistemas de governo dominados pela figura de um imperador. Só mais tarde é que a
expressã o passou a ter um significado aproximadamente semelhante ao da linguagem
comum de hoje - a açã o de um Estado no sentido de estender a sua soberania sobre outros
povos, naçõ es e territó rios. O pano de fundo para esta mudança no significado do termo foi

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

a grande corrida de expansã o colonial das grandes potências europeias nas três ú ltimas
décadas do século XIX.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

As teorias do “imperialismo” depois de 1945: as causas do


“subdesenvolvimento” e da “dependência”

Apó s a I Guerra Mundial e no período entre guerras, as potências vencedoras


consolidaram os seus impérios coloniais. Os anos 20 e 30 foram o apogeu dos impérios
coloniais. Mas depois da IIGM a situação volta a mudar, com a desagregaçã o dos
impérios coloniais e a bipolarizaçã o política do mundo. O imperialismo passou a ser
designado como um fenómeno social que explicava as diferenças e o desfasamento
de riqueza entre países desenvolvidos e não-desenvolvidos.

As teorias do “imperialismo” que surgem após a II Guerra Mundial, a meu ver, fazem
todo o sentido. Após a II Guerra Mundial, o imperialismo vai passar a ser explicado como um
fenómeno social que explicava as diferenças e o desfasamento de riqueza entre países
desenvolvidos e não-desenvolvidos. Aliás, para mim, isto nem é uma nova explicação; é mais
uma confirmação do que já se via anteriormente.

A teoria da dependência pensava que as relações políticas se explicavam pela


oposição entre os países do centro e os países da periferia. O agravamento deste
fosso é um fenómeno previsível, já que os países ricos ficavam cada vez mais ricos,
ao passo que os pobres reforçavam essa condição. Países centrais, como centro da
economia mundial (pode nã o ser o centro geográ fico) será identificado nos espaços
em que ocorrem a manifestação do meio técnico científico informacional em escala
ampliada e os fluxos igualmente fluam com mais intensidade. Acumulam o seu nível
de rendimentos do mercado mundial face à periferia.

Os países periféricos (países subdesenvolvidos ou do terceiro mundo)


apresentam-se como aqueles espaços onde os fluxos, o desenvolvimento da ciência,
da técnica e da informação ocorram em menor escala e as interações em relação ao
centro se dão gradativamente. Nos anos trinta, o rendimento do centro era quatro vezes
superior ao da periferia; esta ú ltima representa um maior crescimento demográ fico nas
regiõ es da periferia, nos anos setenta.

No meio disto tudo, o que acho mais “absurdo” é que os teóricos da dependência viam
desenvolvimento e subdesenvolvimento como posições funcionais dentro da economia
mundial, ao invés de estágios ao longo de uma escala de evolução das nações.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Os teóricos da dependência
viam desenvolvimento e subdesenvolvimento como posições funcionais dentro da
economia mundial, ao invés de estágios ao longo de uma escala de evolução das
nações. A teoria da dependência trata do relacionamento das economias dos países
da periferia com as economias dos países do centro, e que estas relações
económicas "dependentes" por parte dos países periféricos em relação às
economias centrais, criavam redes de relações políticas e ideológicas que moldavam
formas determinadas de desenvolvimento político e social nos países
"dependentes" ou "periféricos".

Isto, para mim, seria piorar a situação e agravar o fosso entre os países desenvolvidos
e os não desenvolvidos, o que levaria à promoção de economias desequilibradas.

A dependência expressa subordinação, a ideia de que o desenvolvimento


desses países está submetido (ou limitado) pelo desenvolvimento de outros países e
não era forjada pela condição agrário-exportadora ou pela herança pré-
capitalista dos países subdesenvolvidos mas pelo padrão de desenvolvimento
capitalista do país e por sua inserção no capitalismo mundial dada
pelo imperialismo. Portanto, a superação do subdesenvolvimento passaria pela
rutura com a dependência e não pela modernização e industrialização da economia,
o que pode implicar inclusive a rutura com o próprio capitalismo.

No ensaio "O desenvolvimento do subdesenvolvimento", Gunder-Frank


argumenta que o subdesenvolvimento "não é devido à sobrevivência de instituições
arcaicas e à existência de escassez de capital em regiões que permaneceram
isoladas do fluxo da história mundial. Ao contrário, o subdesenvolvimento era e
ainda é gerado pelos mesmos processos históricos que também geraram
desenvolvimento económico: o próprio desenvolvimento do capitalismo". Nesta
visão, o que estava a ser reproduzido juntamente com o desenvolvimento dos
estados no centro da economia capitalista mundial era o subdesenvolvimento e sob
circunstâncias normais a subordinação permanente daqueles estados na periferia.
A conversão de regiões periféricas em novos centros faz-se pela acumulação interna
de capitais até serem exportadoras.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Imperialismos com Impérios Coloniais

Nas vésperas da I Guerra Mundial, as grandes potências imperialistas, os


países que exportavam capitais, eram também metrópoles coloniais.

Estavam sobretudo instalados na Europa. Paralelamente havia alguns outsiders,


como o Japã o e os EUA. A maior parte da superfície terrestre do globo estava plenamente
na posse física e legal de naçõ es europeias ou dos seus rebentos ultramarinos, naçõ es
novas, como o Canadá ou a Austrá lia, ou derivados mais antigos dos impérios europeus,
como as repú blicas americanas, do Norte e do Sul.

Grã Bretanha

A Grã-Bretanha era o país mais industrializado e com o maior nível de


exportação de capitais. Era o maior império colonial e era composto por domínios ( com
governo e parlamento autó nomo), protectorados (subordinados a um governador geral inglês, mas
mantendo as autoridades tradicionais), e coló nias. Por ser o país mais industrializado e com
maior nível de exportaçã o de capitais, tinha uma posiçã o contra a guerra e os pró prios
impérios coloniais, dependendo do mercado livre e sem barreiras (era contra o
protecionismo). O seu domínio hegemónico assentava em bases navais para que
pudesse exercer um controlo do comércio e das próprias rotas de acesso (para evitar
a concorrência). Tinha interesse em ter uma rede marítima mundial e o controlo das
regiões mais populosas, como a da Índia. Desde meados do século XIX que a
Inglaterra controlava grande parte da Índia. Aliás, a Índia era a maior fonte de
riqueza para o império britânico, tornando-se o centro de gravidade do império,
pois situava-se no centro das comunicações marítimas. Detinha um estatuto
administrativo (o governo inglês controlava diretamente uma parte do território,
sendo que a restante estava nas mãos de príncipes locais). Controlava a defesa e os
transportes para a região, em termos estratégicos. Era de lá que retiravam maior
rendimento líquido, o que a tornaria determinante na forma como o Império Inglês
tinha crescido.

O Imperialismo inglês definia-se, em especial, pelo seu carácter colonial,


porque a exploração das colónias revestia, para o capitalismo inglês, um valor
fundamental. Na década de 1860, havia-se aberto o Canal do Suez, que abriu
artificialmente a separação entre o Mediterrâneo e o Mar Vermelho e facilitava o

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

transporte de mercadorias e de matérias-primas para a Índia. Este canal era


controlado pelo governo egípcio e, mais tarde, este país, endividou-se e a Inglaterra
comprou a sua dívida, fornecendo dinheiro para o salvamento do país. É assim que,
em 1882, as tropas britânicas instalam-se às margens do Canal do Suez para
protege-lo. Os britânicos, passaram, então, a deter o controlo político do canal.

Os ingleses consideravam a África Oriental como prioridade, de forma a


prevenir outras potências de controlar o território indiano. No mapa do Império
Britânico verifica-se que as colónias inglesas em África encontram-se
maioritariamente na parte oriental do continente. O eixo de expansão da Inglaterra
era centrado nesta parte desde a nascente do rio Nilo até à sua foz. Assim, os
ingleses promoveram a conquista imperialista no Egito e o domínio do Canal de
Suez, bem como nas regiões circundantes da Índia.

Por outro lado, a região a sul do Egito, o Sudão, foi anexada mesmo antes dos
ingleses chegarem. O Egito era uma região desértica, mas muito populosa, e a sua
agricultura dependia do rio Nilo, que nascia na Etiópia, a sul do Sudão. Ora, o
governo egípcio instalou fortalezas militares no Sudão para que conseguisse
controlar o Vale do Nilo. É que, se os ingleses priorizavam a Índia, tinham de
priorizar o Egito; e se priorizavam o Egito, davam grande importância ao Vale do
Nilo. A partir do Egipto nasce a necessidade do controlo para Sul, para controlarem
as áreas do Nilo (Sudã o, Uganda, Rodésia, etc.) até à África do Sul (país com grande
investimento de capital e grandes reservas de ouro).

O Império Inglês era bastante espalhado pelo mundo, tendo interesses e


bases navais em todas as colónias. A sua principal área de exportação era o domínio
colonial. É que a Inglaterra ganhava muito mais riqueza do que aquela que colocava
na Índia.

Com o final da IGM, a área de influência inglesa alargou-se mais. A derrota da


Alemanha originou uma redistribuição das suas colónias pelos países vencedores.
Esses territórios foram entregues como mandatos, sendo subordinados aos países
europeus até que reunissem as condições necessárias para governar de forma
independente. A Inglaterra passava a controlar a Tanganyika. No Médio Oriente, com a
desagregaçã o do Império Otomano, os ingleses passaram a controlar algumas regiões
que proporcionavam uma ligação ao Egito (Iraque, Palestina, Transjordâ nia). Na China,
os ingleses controlavam uma instalação naval em Hong Kong.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

“A Inglaterra era fortemente rica e possuía um vasto império ultramarino. (…) as


suas indústrias eram responsáveis por uma grande parte do comércio mundial. A sua
posição global era garantida por uma marinha colossal. (…) ”

Primeira Guerra Mundial, Norman Stone

“ (…) A marinha de guerra foi sempre a alavanca mais importante da burguesia


inglesa para a conquista colonial. A sua frota tornava possível o transporte de
quantas tropas eram necessárias para as guerras coloniais e as expedições de
castigo. A burguesia inglesa esforçava-se para que a sua marinha de guerra fosse a
mais forte do mundo.”

História Moderna: O Imperialismo (página 107)

A Grã-Bretanha possuía todas as características necessárias para se constituir


enquanto maior império colonial. A sua frota naval é o maior exemplo disso.

França

O império francês estava melhor localizado do que o inglês. A geopolítica


francesa centrava-se na África Ocidental e na Indochina. À exceçã o da Argélia, todos os
territó rios foram conquistados em plena fase do imperialismo. Na África, as possessões
francesas baseavam-se em desertos. Administrativamente, os territórios africanos
nesse continente estavam divididos em duas zonas:
 África Ocidental Francesa (AOF), com sede administrativa em Dakar e que
integrava territó rios como o Senegal, o Mali, a Níger…;
 África Equatorial Francesa (AEF), cujos países integrados eram o Congo, o
Gabã o, a Repú blica Centro-Africana e Chade.

A AOF e a AEF comunicavam entre si.

Existiam, ainda, domínios franceses no Mar Vermelho, em Madagáscar, e a


Polinésia Francesa.

Contudo, apesar do vasto império colonial, apenas 4% do capital francês era


exportado para as coló nias.

A geopolítica francesa centra-se mais na África Ocidental, devido aos


interesses comerciais em portos. A França tinha um poder extremamente reduzido
em função das guerras perdidas no século XIX e exportava relativamente pouco
para o seu império colonial, pois grande parte dele correspondia a zonas desérticas

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

(Deserto do Saara). Então, dava a impressão de ser um império muito grande,


quando, na verdade, grande parte dele era apenas deserto (ilusã o geográ fica).

Tinha como colónias mais rentáveis a Indochina (Vietname, Laos, Camboja,


Malásia, Myanmar Singapura e Tailândia), o Congo e a Costa de Marfim.

Destaca-se o confronto entre Inglaterra e França. Os objetivos estratégicos


franceses colidiam com os dos ingleses, pois a tendência era expandir para o Nilo
(no sentido oeste-leste, em direçã o ao Sudã o). Só que isso fazia entrar em rota de
colisão com o eixo do império inglês. O incidente de Fachoda (cidade localizada
atualmente no Sudã o do Sul) ocorreu entre 1898 e 1899, quando França e Inglaterra
decidiram construir ferrovias para ligar suas colónias africanas. A referida cidade
situava-se na intersecção das linhas. Uma expedição militar francesa foi enviada a
Fachoda antes que a força expedicionária britânica, originária do Egito, chegasse à
cidade. Porém, os franceses tiveram que se retirar da cidade devido à sua
inferioridade militar. Embora o exército francês continental fosse considerado
maior e mais poderoso que o britânico, nada poderia fazer no contexto africano sem
o devido apoio naval, já que a Grã-Bretanha possuía a mais poderosa marinha do
planeta. A Inglaterra não cedeu e fez um ultimato aos franceses (parecido com o que
fizeram aos portugueses), acabando estes últimos por ceder. Os choques coloniais não
desencadearam a guerra, pois a exportação de capitais faz-se maioritariamente
para fora das colónias. Na Ásia do Sul, os conflitos coloniais não eram suficientes
para causar uma guerra. As potências hegemónicas não precisavam dos impérios
coloniais para o serem. Importa salientar que a Indochina tinha um impacto muito
menor do que a Índia.

A França dava mesmo a entender que se podia equiparar ao grande império


britânico, mas a verdade é que o seu império era muito inferior. Para começar, apesar da
geopolítica francesa (África Ocidental e Indochina) estar melhor localizada do que a do
Império Britânico, a França exportava pouco para o seu império colonial, pois grande parte
dele correspondia a zonas desérticas. Depois no seu conflito com a Inglaterra, perdeu porque
não tinha uma marinha poderosa como a da Inglaterra.

A Alemanha pós Bismarck

A Alemanha era a potência colonial mais próxima da Inglaterra. Era a


principal potência em crescimento na Europa. Na época imperialista, a Alemanha

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

passou a controlar colónias em África, mas não foi exportadora de capitais, pois
queria garantir a protecção dos seus investimentos nas colónias. A Alemanha
constitui, então, um exemplo de uma nação que não era um império colonial, mas
que era uma nação imperialista. O império alemão não tinha qualquer objectivo
colonialista. Aspirava ser uma potência naval e possuir um domínio industrial. De
resto, teve um tardio e rápido desenvolvimento industrial no final do século XIX
(acabando até por ultrapassar a Inglaterra em muitos aspetos aquando da I GM), que teve
como causas a unificação do país, a formação de um mercado interno unificado, a
anexação da alsácia e de uma parte da Lorena, o reforço inegável da exploração da
classe operária e a aplicação das últimas técnicas e das novidades científicas.

Enquanto outras potências exportavam capitais, a Alemanha não se podia


dar a esse luxo (devido à necessidade de recuperar esse desfasamento face às
potências imperialistas). Ainda assim, começa a exportar capitais, fazer
empréstimos a outros Estados e bancos estrangeiros.

A par do Império Austro-Húngaro, constituía os impérios centrais. A Prússia


era o estado principal dos Estados do Império: todos os outros eram muitos mais
pequenos e fracos (Á frica Ocidental Alemã [protetorados do Togo e Camarõ es], Á frica
Oriental Alemã [Tanganyica, Burundi e Ruanda], Sudoeste Africano Alemã o [Namíbia],
bases na China [Baía de Kiauchau, Tianjin e Qingdao] e ilhas do Pacífico tropical
[protetorados de Nova Guiné Alemã e Samoa Alemã ]).

A Alemanha tinha um grande problema de crescimento: não tinha domínio


comercial colonial equivalente à sua capacidade industrial. Portanto, tentava
potenciar um modelo que colidia com o dos ingleses – queria ser uma potência
naval (principal ponto de fricçã o entre ingleses e alemã es). Tudo isto trazia para a
Inglaterra um problema de segurança e tirava-lhe o domínio naval mantido até à
altura.

Outro problema era a proximidade do poderio económico da Alemanha e da


Inglaterra, que fez com que houvesse uma rivalidade entre estes dois países. A
rivalidade anglo-alemã não era só em termos de exportação de capitais,
económicos, mas também em termos políticos.

Ao exportar capital para um país, o exportador fica ligado ao importador e


pede garantias de pagamento das dívidas. Ao emprestar capital a um país, a

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

potência exportadora vai receber os pagamentos dessas exportações com juros – os


países importadores ficam em dívida para com elas.

Se este fenómeno acompanha as relações das potências imperialistas, essas


potências vão discutir áreas de influência. Veja-se que a rivalidade com Inglaterra
não tinha forçosamente que levar à guerra por si só: o que a originou foram os
sistemas de alianças de ambos os países.

Evitar um isolamento a nível continental. A Alemanha era um país


relativamente jovem, cujo perfil geográfico tinha 44 anos. Em 1871, os estados
alemães uniram-se na criação do Império Alemão sob a liderança da Prússia. Se os
confrontos que travou com a Áustria nunca constituíram um verdadeiro problema,
a França praticava um estado de permanente hostilidade face à Alemanha.

O estado de permanente tensão entre França e Alemanha. A França fez uma


aliança com a Rússia (grande parte dos seus capitais eram exportados para a
Rússia).

A Inglaterra tinha uma política de não entrar em alianças, mas França e


Alemanha começavam a criar sistema de alianças defensivas/ofensivas. As potências
estavam organizadas em mercados fechados e efetuavam alianças com estados médios.
Mais tarde (1904), os ingleses resolvem desequilibrar os pratos da balança e aliar-
se à França, formando a Entente Cordiale. Após chocarem, os interesses coloniais
tornaram-se num convénio de interesses contra terceiros. Estavam traçados os
dados geopolíticos que causaram a IGM.

A Política externa do Império Alemão era extremamente agressiva. Em 1875,


o Governo Imperial estava disposto a empreender uma nova guerra contra a França
a fim de dominar completamente este país e de o converter em seu vassalo. Valeu a
intervenção da Rússia. É que tal como a França, ela temia um novo fortalecimento
da Alemanha.

“Por que não haveria a Alemanha de adquirir um império ultramarino (…)? (…) o
poderio alemão e a sua expressão disparatada tornaram-se um – o – problema
europeu.”

Primeira Guerra Mundial, Norman Stone

Para mim, a maior importância relativa à Alemanha imperialista reside no


facto de esta aspirar ser uma potência naval, o que provocava receio na Grã-
Bretanha, que tinha a maior marinha. Estas duas potências coloniais viriam a gerar

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

uma enorme rivalidade que, depois de um grande processo que levaria à formação de
alianças, viria a constituir um grande motivo da I Guerra Mundial.

O Império Russo

O império russo foi construído a partir do século XVI com a expansão do


principado de Moscovo. Este principado viria a expandir-se até ao Alasca.

O grande problema da Rússia era o facto de não ter acesso a um mar


navegável – tinha acesso ao Mar Báltico, mas este encontrava-se gelado. De resto,
grande parte do seu território era marcado por uma grande planície gelada, ou seja,
não podia ser uma potência naval por causa do clima (gelo).

A Rússia alimentava o objetivo de chegar a uma zona do Pacífico em que


pudessem ter acesso a mares quentes e territórios que permitissem desenvolver a
sua expansão, atingindo zonas habitadas (China do Norte). É que quase todos os portos
do Bá ltico eram operacionais apenas numa parte do ano e a maior parte dos portos russos
nã o podiam ser usados com o gelo. Havia, então, a necessidade de procurar
mares/portos com utilização ininterrupta. Tem-se, então, um significativo problema
de crescimento russo.

Por um lado, no Mediterrâneo, os portos da costa do Mar Negro tinham o


inconveniente de o avanço russo esbarrar no Império Otomano (adversá rio perigoso
protegido pelos impérios ocidentais). A Rússia foi uma das causadoras dos problemas
balcânicos. Por outro lado, os portos instalados no Pacífico obrigavam a Rússia a
descer até ao norte da China, havendo o obstáculo do império japonês. O avanço
pautava-se para sudeste através de um grande caminho-de-ferro transiberiano (ao chegar
à China, este inverte para Sul até Pt. Arthur).

Foi criada uma capital, São Petersburgo, a partir da qual se iniciou a


expansão para Ocidente e depois para Oriente. A Rússia detinha já o Mar Negro, a
zona do Cáucaso, Cazaquistão, Turquestão, tendo, depois, conseguido atingir o
Oceano Pacífico.

Assim, quando começa a vaga imperialista de finais do século XIX, a Rússia


detinha já um império colonial do tamanho de um continente. Já era, pois, uma
grande potência colonial, ascendente como potência imperialista devido à rápida
industrialização que fomentou a exportação de capital.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Mas, nesta época imperialista, a Rússia começou a ver-se impedida pela


Inglaterra na sua intenção de se expandir para o sul da Ásia, o que levou a choques
entre as duas potências. As questões relacionadas com o petróleo começam já a ser
dominantes (russos e ingleses tinham interesses no Golfo Pérsico). Importa salientar que
a França era o seu principal aliado.

Também houve uma colisão com o Japão, com quem a Rússia disputava
territórios, sobretudo a Manchúria. Aliás, em 1904-1905, dá-se a Guerra Russo-
Japonesa devido a interesses económicos nessa região (a Manchú ria possuía grandes
jazidas minerais). Desta guerra, sai vencedor o Japão, o qual acaba por ocupar a zona.
Depois desta derrota, a Rússia passa a concentrar os seus esforços nos Balcãs
(perdendo a influência quase total na zona do Pacífico Médio). A Rússia tinha um porto
(Pt. Arthur) praticamente em frente a Pequim. Se estivesse sozinha, teria feito da
China o mesmo que a zona da Ásia Central. Só que havia outras potências
interessadas.

“Em 1913, verificou-se [na Rússia] o aumento decisivo: um «grande programa»


destinado a converter a Rússia numa «superpotência». Este programa teria dotado a
Rússia de mais canhões do que a Alemanha (…) ”

Primeira Guerra Mundial, Norman Stone

Na minha opinião, o Império Russo até teve uma industrialização bastante rápida,
mas tinha dois grandes problemas: em primeiro lugar, a sua planície era gelada e, por esse
motivo, não podia ser uma potência naval como a Inglaterra; em segundo e último lugar, os
seus interesses colidiam sempre com os de outras potências, como a Inglaterra e o Japão. E
também teve problemas nos Balcãs com o Império Otomano.

A emergência do Japão – industrialização e primeira expansão


continental – Guerra com a China (1894-1895) e com a Rússia (1904-
1905)

O Japão cresce nos princípios do século XX e tinha feito uma expansão


continental com a ocupação da China e da Coreia, em busca de minério e de novas
áreas de exportação, de modo a fazer concorrência com a Europa. Não tinha acesso a
matérias-primas necessárias à industrialização, como o carvão, ferro e borracha.
Tratava-se, também, de uma potência imperialista sem império colonial. No século XIX
fechou-se ao comércio europeu, evoluindo de forma autónoma para evitar cair
numa espécie de colónia. Assim, tem um papel fulcral nas guerras e na política

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

mundial do século XX. Esteve quase na órbita do Imperialismo Ocidental, mas as


frotas americanas entraram no Japão na década de 1950, invadindo os seus portos.

Quando os americanos chegam ao Japão em meados do século XIX e obrigam-


no a abrir as portas à economia internacional, os japonenses iniciam um programa
de modernização: começaram a importar tecnologia e capitais (economia
centralizada), mediante um controlo político definido. Assim, o Japão foi o primeiro
país asiático a modernizar a sua economia através de uma industrialização
acelerada e surpreendente (recorrendo basicamente ao capital).

A modernização japonesa foi personificada pelo imperador Mutsu-Hito, que


lançou o país numa era de progresso: o período/dinastia Meiji (era das luzes), que se
estendeu de 1868 a 1912. Em poucos anos, o Japão, de país agrícola e atrasado,
converteu-se numa potência imperialista militar e competitiva, com uma enorme
base industrial e com interesses na Ásia. O impulso industrializador ficou a dever-
se, sobretudo, ao Estado que promoveu a entrada de capitais e técnicos
estrangeiros, adquiriu no estrangeiro os equipamentos necessários à
modernização, financiou a criação de novas indústrias, às quais concedeu exclusivos
e outros privilégios e promoveu a construção de uma rede ferroviária. Na atualidade,
o capitalismo de estado da China assemelha-se bastante ao do Japã o no século XIX.

Para o progresso industrial japonês, alicerçado nos setores da seda, do


algodão, da siderurgia e da construção naval, contribuíram também o forte
crescimento demográfico (que proporcionou abundante mã o-de-obra barata) e o
orgulho nacional, que incutiu nos japoneses o sentido de superioridade rácica
relativamente aos demais povos asiáticos.

Houve também aqui uma mistura estranha entre capitalismo e feudalismo, pois
manteve uma grande aristocracia e mentalidade feudal, mas ao mesmo tempo adotou o
capitalismo. De resto, a indústria japonesa era controlada por proprietários que eram
nobres da aristocracia. Para a industrialização, o Japão aproveitou o facto de não ser
uma colónia como a China (era um arquipélago – fechava mais facilmente as portas
estrangeiras – e detinha um sistema feudal ser mais fraco do que o chinês) e aproveitou a
base da apropriação do excedente rural camponês e posterior transferência para a
indústria ou para o Estado, que depois arrendava a indústrias. Na Europa Ocidental,
a industrialização surge também através de excedentes agrícolas. O aumento da

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

produtividade agrícola/rural conduz ao aumento do excedente. Isso faz aumentar


os lucros/riquezas, que depois são transferidas para a indústria.

Entre 1894 e 1895, os japonenses tentaram entrar na China e na península


coreana (1º Guerra Imperialista Sino-Japonesa). A China era um país bastante rural
e pobre, que foi, durante a maioria do imperialismo, semicolonial (vá rios países a
tentarem ganhar influências na China). O conflito entre o Japão e a China terminou em
março de 1895, com os dois países a assinarem o tratado de Shimonoseki, que levou
os chineses a aceitar a concessão aos japoneses da Ilha Formosa, das Ilhas
Pescadores e de Liaodong e a perda de alguma influência que outrora exercera na
Coreia. No entanto, nesse mesmo ano a Rússia, que via a expansão de Japão como
um perigo aos seus interesses geopolíticos na zona, apoiada pela França e Grã-
Bretanha, pressionaram o governo japonês para que amistosamente reconsiderasse
as vantagens obtidas pelo Tratado de Shimonoseki.

O Japão, que se via incapaz, no momento, de enfrentar a Rússia, sobretudo


por esta estar apoiada pelos franceses e pelos britânicos, cedeu e teve de renunciar
em favor da Rússia, aos direitos adquiridos sobre a península de Liaodong e a sua
cobiçada praça estratégica de Port Arthur. Apesar de conservar os restantes ganhos
territoriais e a influência sobre a Coreia, este facto criou um considerável ânimo de
vingança entre os japoneses. Assim, a desforra surgiria sensivelmente dez anos mais
tarde, com a guerra russo-japonesa.

Em 1904 o Japão começou a conquistar território chinês e tentou entrar na


área que colidia com a Rússia. Os interesses de ambas as potências colidiam. Posto
isto, em 1905 deu-se a guerra russo-japonesa (especial destaque para a batalha naval
de Tsushima, em que os japonenses atacaram as frotas russas provenientes do Bá ltico,
derrotando um adversá rio bastante fragilizado que teve de mudar o seu trajeto para fora
dos canais regulares de transporte marítimo, por forma a reduzir as hipó teses de deteçã o
ao aproximar-se das á guas japonesas). Esta guerra terminou com a vitória
surpreendente do Japão, e tornou-se na primeira grande derrota do Imperialismo
Europeu (o Japã o ganhava estatuto). O Japão passou a retomar algumas posições
russas (em 1910, a Coreia torna-se num protetorado japonês). O protetorado
consiste num sistema de proteção em que um país domina o outro, apesar de ambos
serem independentes. De resto, isto antecipava aquilo que viria a constituir a IIGM.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Após a industrialização e a supracitada vitória, o Japão procurava, através da


sua importante indústria têxtil e pesada (fabrico de armas), crescer em termos de
área de expansão, de influência e de investimento (especialmente no Pacífico tropical).
De outro modo, procurava o investimento externo através de novas áreas de
exportação. É que exportar uma considerável quantidade de capitais obrigava à
necessidade de matérias-primas. No entanto, esta expansão para o resto do Pacífico
colidia com os interesses dos europeus que possuíam colónias na Ásia tropical e
com o crescimento imperial dos EUA (potência em ascensã o).

Do meu ponto de vista, o Japão teve uma industrialização surpreendente, que foi
muito ajudada pelo orgulho que caracteriza o país. Essa mesma industrialização também foi
inovadora, pois o Japão aproveitou o excedente agrícola para canalizar os investimentos na
indústria. Outro facto que mostra que o Japão se tornou numa grande potência foi a vitória
em duas guerras. Em primeiro lugar, derrotou a China. Mas a Rússia, que via a expansão
japonesa como um perigo, pressionou o Japão a devolver algumas áreas à China e este teve
de ceder, por temer a Rússia (também ajudada pela França e pela Inglaterra). Mas o Japão,
ambicioso, vingou-se na guerra russo japonesa, dez anos mais tarde, da qual saiu vitorioso.

A emergência dos Estados Unidos - industrialização e primeiras


conquistas coloniais - guerra com a Espanha (1898-1899) e construção
do canal do Panamá (1901-1914)

Até à Guerra Civil (1861-1865), os EUA eram um país pouco desenvolvido


que exportava maioritariamente matérias-primas como madeira e algodão (era um
país agrícola). Depois desta guerra, o seu enorme mercado interno já era um
estímulo para a sua própria industrialização, o que tornou os EUA num império em
ascensão, com um crescimento muito rápido. Grande parte desta industrialização é
feita com a importação de capitais ingleses. Chegaram a ultrapassar a Inglaterra e a
Alemanha na produção de aço no início do século XX. Importa referir que outros países
com grandes territó rios nã o puderam crescer enquanto potências pois nã o tinham
controlo interno político.

Deste modo, criaram barreiras pautais (impostos alfandegá rios) para


transferir excedente camponês para a indústria e proteger o seu mercado,
tornando-se o país mais protecionista de todas as economias capitalistas. No fundo,
industrializaram-se numa economia fechada (com poucas influências externas e

27
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

poucas importações). Até ao século XIX os EUA eram uma fortaleza comercial. Só no
princípio do século XX, quando já constituíam uma potência industrial e naval, é que
os EUA começaram a exportar capital e já eram capazes de ter a sua própria política
externa para a proteção dos capitais.

Os EUA eram uma potência imperialista, sem império colonial, em


crescimento galopante. Iniciou-se com a compra, conquista ou anexação de várias
colónias independentes como o Louisiana, Oklahoma, Ohio, Texas, Novo México.
Apesar de não terem colónias, tinham um grande potencial imperialista.

Durante o século XIX, os EUA estavam isolados do resto do mundo, porque


não importavam nada. Os americanos tinham acesso a muitas matérias-primas e
eles próprios as transformavam. Aliás, os EUA exportavam maioritariamente
matérias-primas como a madeira e o algodão, sendo esta última a base industrial
europeia. Possuía um vasto mercado interno e estava independente.

A partir do momento em que estavam industrializados, os EUA tinham um


grande interesse na América Central e na América do Sul. Como nestas regiões havia
um equilíbrio até à IGM, os americanos tentaram contrariar as influências
europeias (que detinham alguma predominância) através da Doutrina Monroe, que
tinha como objetivo impedir a influência e interferência europeia principalmente
nos territórios vizinhos mas também no resto do continente americano, pois
defendia o ideal “América para os Americanos”. Seguem-se outros territórios
vizinhos e também as Filipinas. Os interesses coloniais americanos centram-se
especialmente no Pacífico, em pequenas ilhas.

Em 1898-1899, dá-se a guerra hispano-americana (primeira intervenção


militar), com os EUA a entrarem em guerra contra o governo espanhol pelos
territórios de Cuba, Porto Rico e Filipinas (que eram pertencentes ao império
colonial espanhol). Os americanos apoiavam os nacionalistas cubanos e
alimentavam as suas emboscadas no espírito da Doutrina Monroe, não tolerando os
esforços dos governos europeus para colonizar as terras do continente americano.

O resultado foi o Tratado de Paris de 1898, negociado em condições


favoráveis para os EUA, que permitiu o seu controlo temporário sobre o
protetorado de Cuba e cedeu por tempo indeterminado a autoridade colonial sobre
Porto Rico, Guam e as ilhas das Filipinas. Simultaneamente, a Espanha renunciou

28
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

todas as suas pretensões sobre a ilha de Cuba, entrando o seu império em declínio.
Os Estados Unidos passaram a ter interesses concretos no Pacífico e ganharam
várias posses insulares em todo o globo e um novo debate rancoroso sobre a
sabedoria do expansionismo.

O centro de gravidade político dos EUA encontrava-se a leste, nas principais


bases navais americanas. Contudo, os americanos construíram em 1901 o Canal do
Panamá. Isto tinha um duplo interesse. Por um lado, um interesse estratégico e
comercial, pois a frota de guerra americana encurtava e, por conseguinte, facilitava
bastante a passagem marítima do Atlântico para o Pacífico através do istmo. Por
outro lado, possibilitava ao país a consolidação da sua hegemonia no Extremo
Oriente e na América Latina. De resto, o Pacífico constituía a zona de exploração
norte-americana. O arquipélago das ilhas do Havai transformou-se em Estado americano,
distanciando-se a 3500km da costa californiana.

Também entram num conflito de interesses com os ingleses e os alemães,


mas este foi resolvido pacificamente, ao contrário da expansão para Oeste, onde
houve uma guerra com o Japão (duas potências com interesse no Pacífico) que só
viria a ser resolvida apó s a II Guerra Mundial. A IIGM era entã o anunciada ainda antes do
início da IGM. É que os EUA também queriam aceder à China, sendo que a IGM só eliminou
a Alemanha da China.

“Os capitalistas norte-americanos (…) tinham um interesse especial em ver [Cuba]


ocupada pelo seu governo. Os EUA começaram a preparar a guerra contra a
Espanha. Decidiram aproveitar-se do movimento de libertação nacional que se
propagava a Cuba, e ao mesmo tempo, a outra colónia espanhola, as Filipinas. (…)
Em 1898 o Congresso dos EUA declarou guerra à Espanha (…) esta guerra revelou a
todos a debilidade e o estado de desagregação interna da monarquia espanhola, que
sofreu rápida derrota e teve de se resignar a pedir a paz.”

História Moderna: O Imperialismo

Os EUA, para além de terem conseguido um enorme crescimento sozinhos,


ainda foram ambiciosos ao ponto de contrariar as influências europeias no
continente americano. Venceram a guerra hispano-americana de 1898-1899 e ainda
construíram o Canal do Panamá, que veio a contribuir enormemente para o seu
prestígio.

29
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

O Império Otomano

O Império Otomano foi criado no século XV. No século XVI, englobava toda a
bacia do Mediterrâ neo até à Argélia e do Danú bio (zona dos Balcãs). Englobava,
também, povoações muito diferentes a nível étnico e cultural. No século XVII chegou
a querer invadir Viena, mas depois, com a entrada da concorrência ocidental
(Inglaterra e França) no Mediterrâneo, começou a decair. No século XIX, vivia na
eminência de desagregação, mas manteve-se devido à incerteza de países rivais. Os
seus rivais não chegavam a acordo quanto a quem iria tirar partido dos seus
territórios e foi essa pressão que permitiu que o império otomano se mantivesse.
Por exemplo, a Inglaterra nã o tinha influência suficiente para desagregá -lo, mas tinha
poder para impedir que outros (nomeadamente a Rú ssia) o fizessem.

A sua estrutura era muito diferente dos outros impérios. A partir do século
XIX, houve um grande fluxo de capitais estrangeiros destinados ao império
otomano, nomeadamente provenientes da Grã-Bretanha e da França - empréstimos
para tentar modernizar-se. Em 1830/40, conheceu um grande número de reformas
políticas e económicas. O poder do sultã o foi enfraquecendo cada vez mais e, em 1908,
houve mesmo uma tentativa de instaurar uma monarquia constitucional.

A Alemanha era a potência que estava a ter mais hegemonia ao nível militar e
do investimento, havendo uma tentativa de unir, por caminho-de-ferro, Berlim a
Bagdad (The Berlin Bagdad-Railway), com investimento alemão e que atravessaria
regiões influenciadas pela Alemanha, um projeto que não se chegou a realizar antes
da I Guerra Mundial. Em 1914, o império otomano incluía a Bulgária, Anatólia e
partes da Península Arábica (exceto a extremidade sul e leste), indo até ao fim do
Golfo Pérsico. A zona entre o Mar Vermelho e o Golfo do Pérsico constituía o Médio
Oriente. Depois, havia o Extremo Oriente (como a China).

No Golfo Pérsico, a potência dominante era a Inglaterra. Recorde-se que as


áreas sob influência inglesa eram a Índia e o Egipto (relativamente ao canal do
Suez). Tal como tinha acontecido com a China, o Império otomano cada vez mais
dominado pelas políticas imperialistas. Para a Rússia era um alvo estratégico, pois
podiam finalmente ter acesso a um mar quente em zonas europeias. Havia,
portanto, um choque entre o Império Russo e as colónias inglesas.

30
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

O islão não é uniforme, já que existem duas grandes linhas religiosas


(sunismo [a maior corrente islâmica] e xiismo). Na Pérsia, a corrente do mundo
muçulmano é maioritariamente a corrente xiita e nã o a sunita. Esta região tinha dois
focos de pressão: a Inglaterra e a Rússia, desde o Este da China até aos Balcãs, onde
os imperialismos estavam em contacto, sobretudo nas zonas de passagem (isto fazia
com que a Inglaterra e a Rússia fossem adversários durante todo o século XIX). A
Inglaterra já tinha conseguido algumas bases navais no Mar Mediterrâneo Oriental
(Chipre). Já a Sérvia constituía um protetorado russo. A Roménia e a Bulgária foram
criadas nos estilhaços do fim do Império Otomano. A Bulgária era mais ligada aos
Impérios Centrais. A Grécia apoiava-se mais na Inglaterra e a Sérvia na Inglaterra.
Ao atuar, este tipo de forças retardaram a guerra.

O Tratado de Berlim, concluído em 13 de julho de 1878, foi acordado entre as


principais potências da Europa e o Império Otomano, e determinou o
estabelecimento de um verdadeiro regime de controlo permanente sobre a
administração interna do império, de maneira a garantir o que os europeus
invocavam como um mínimo aceitável de direitos, em particular a "liberdade
religiosa" para os cidadãos submetidos à lei turca. Assim, a Bó snia fica na influência do
Império austro-hú ngaro (aliado da Alemanha). A situaçã o muito instá vel nas vésperas da
IGM.

O Império Otomano, a meu ver, teve um crescimento bastante paradoxal e não muito
feliz. No século XIX, vivia na iminência da desagregação e só não se dissolveu graças às
outras potências coloniais, que nele queriam exercer influência. A Alemanha lançou o projeto
do caminho-de-ferro; e a Inglaterra e a Rússia disputavam áreas de influência neste império.
Para mim, o Império Otomano era mais um palco de luta para potências que queriam
dominar as suas zonas.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Os conflitos imperialistas
Fatores de conflito entre as potências

A filosofia do imperialismo sugeria que a exportação contínua de capitais


para as colónias causava a necessidade absoluta de possuir territórios
ultramarinos. Como todos os impérios queriam alargar a sua zona de domínio,
aconteceu, no início do século XX, uma feroz competição entre eles. A Itá lia lançou-se
na conquista da Á frica do Norte, enquanto a Alemanha reivindicou territó rios
ultramarinos para si. Logo, a competiçã o econó mica passou a ser uma rivalidade política.

Desde a guerra franco-prussiana de 1870-1871 e até 1914, nenhum conflito grave


perturbou a paz na Europa, embora ela tenha estado sempre ameaçada. O fenómeno
imperialista foi acompanhado de graves tensões e rivalidades económicas e
políticas. Décadas de imperialismo e colonialismo originaram acesas disputas
territoriais. Havendo interesses de conflitos, era fundamental que existisse uma
guerra. Um dos principais fatores da eclosão do primeiro grande conflito mundial
foi o choque imperialista entre as grandes potências europeias, ou seja, a disputa
por mercados consumidores e fornecedores.

O principal antagonismo era entre os impérios britânico e alemão. O Reino


Unido era a força hegemónica do mundo e a Alemanha era o seu principal
desafiador. A poderosa indústria alemã necessitava de acesso às matérias-primas e
do controlo dos novos mercados para exportação da enorme quantidade dos seus
produtos. O caminho da afirmação internacional alemã passava pela construção de
uma marinha mercantil e de uma marinha de guerra. Isso mesmo os britânicos não
podiam permitir. As duas principais rivais imperialistas travavam uma corrida ao
armamento naval. Para contrariar a Alemanha, a Inglaterra tinha de entrar na
futura Aliança entre a França e a Rússia. Mas a Inglaterra tinha problemas com a
Rússia por esta estar a expandir-se para sul na Ásia, ameaçando invadir a Índia.
Para além disto, Rússia e Inglaterra já tinham olhos na Pérsia devido ao petróleo e
ambas estavam em situação territorial estratégica. Em 1890, o novo imperador da
Alemanha, Guilherme II, demitiu o seu velho chanceler Bismarck. Com ele
desapareceu a arte da negociação internacional, que foi substituída por uma nova
política externa, conhecida como weltpolitik. Tratava-se de uma ideia de
redistribuição das colónias do mundo, tendo em conta os interesses alemães. A
realização dessa nova visão alemã devia ser conseguida através da realpolitik, isto é,

32
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

por meio da utilização de toda a sua força internacional. Como exemplo, temos a
instalaçã o dos alemã es no Sudeste africano, que impediu a concretizaçã o do sonho
britâ nico de construir um Império do Cabo ao Cairo. Esta rivalidade não tinha
forçosamente de levar à Guerra nem a constituição de impérios coloniais era um
fator decisivo para a Guerra. Os problemas entre as grandes potências podiam ser
resolvidos com acordos, porque estas não dependiam dos mercados coloniais.
Aparentemente, as potências imperialistas ganhavam mais se não combatessem
mutuamente. Mas a tensão entre os impérios britânico e alemão aumentava dia
após dia. Apesar das vá rias tentativas entre Inglaterra e Alemanha para criar uma boa
relaçã o entre si (ambas nã o tinham interesses numa guerra mundial), a verdade é que
estes dois países não encontravam uma solução para os seus conflitos de interesses.

A segunda maior rivalidade era entre o império francês e o império alemão.


A oposição da França à Alemanha explica-se, por um lado, pela disputa da Alsácia e
Lorena, território perdido para a Alemanha em 1871, e, por outro, pelo
desenvolvimento do novo Império Alemão que retirou à França parte da
preponderância económica que este detinha sobre a Europa. Em contrapartida, a
França contrariou as pretensões germânicas em África e conseguiu dominar grande
parte do Norte do continente. Estes dois impérios (francês e alemã o) eram vizinhos,
enfrentaram-se ao longo da história, e, em 1781, a Alemanha destroçara a França.
Por isso, a França só esperava uma boa oportunidade para ripostar. Como não podia
fazer isso sozinha, procurava aliados: qualquer tensão entre a Alemanha e um outro
país era favorável às expectativas da França. Para evitar uma desforra da França, a
Alemanha decidiu isolá-la recorrendo a um sistema de alianças. Começou por
afastar dois potenciais aliados da França: Áustria e Rússia. De facto, em 1882, até se
havia assinado um tratado formal de aliança entre a Alemanha e a Áustria-Hungria.
Assim, a França passava a não ter aliados na retaguarda da Alemanha. Contudo, a
França começou a fazer empréstimos à Rússia, o que levou à mudança de aliança da
Rússia. Por outro lado, a Rússia até tinha interesses em derrotar o Império Austro-
Húngaro.

Aliás, a terceira maior rivalidade decorria entre os impérios austríaco e


russo. Os interesses destes dois gigantes continentais confrontavam-se nos Balcãs,
uma região de povos eslavos. De facto, o império otomano, já muito debilitado,
estava a abandonar o controlo daqueles territórios. Um dos candidatos para a sua
substituição era o império austríaco, como indicava o seu avanço territorial para
leste, tido como o seu direito natural. O mesmo pensava o império russo, evocando o

33
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

pan-eslavismo, mas imaginando principalmente uma saída para os mares quentes


através do controlo de estreitos de Bósforo e Dardanelos. A Rússia mal disfarçava os
seus propósitos de controlar os estreitos do mar Negro e de alcançar uma saída para
o Mediterrâneo.

Deste modo, em 1894, a França alia-se à Rússia (aliança franco-russa), pois a


primeira queria cercar a Alemanha e a segunda queria cercar o Império Austro-
Húngaro.

A Inglaterra mantinha-se sempre fora destes conflitos. Aliás, a sua política,


tradicionalmente, era não comprometer-se com Estados Continentais. Por outro
lado, evitava participar na Guerra para não ficar reduzida a uma balança comercial
fraca. É que cronicamente apresentava uma balança comercial negativa (mais
importaçõ es que exportaçõ es). Mas o saldo da balança de pagamentos era positivo
(através dos pagamentos que eram feitos aos ingleses). Em função deste panorama,
a Inglaterra era pacifista, pois equilibrava os seus saldos com a exportação e
capitais (algo que não seria possível em clima de guerra).

Estas três rivalidades foram cruciais para o desencadear de um conflito


europeu generalizado. As rivalidades políticas entre os impérios provocaram uma
corrida ao armamento, a formação de grandes blocos político-militares e à
assinatura de pactos militares secretos. Ficou conhecida como Tríplice Entente a
coalizã o militar constituída na primeira década do século XX, onde os Impérios Britâ nico,
Russo e Repú blica Francesa se uniram para fazer frente à política expansionista de outro
bloco, a Tríplice Aliança (constituída pelos Impérios Alemã o, Italiano e Austro-Hú ngaro),
formado em 1882.

Esse processo de alianças na virada do século XIX para o XX reflete uma


mudança que ocorria no cenário político europeu: as antigas potências, Grã-
Bretanha e França, com seus vastos impérios coloniais distribuídos pelo globo,
vinham sofrendo a concorrência de novas forças como Alemanha e Itália,
recentemente constituídos estados nacionais unificados, que rapidamente
conquistavam tantas fatias importantes dos mercados globais como inauguravam
seus próprios impérios coloniais.

Esta concorrência de novas forças políticas naturalmente gerou graves


atritos. A solução para resolver as discórdias foi a constituição de acordos

34
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

económicos, políticos e militares onde países com interesses semelhantes se


reuniam. Assim, dois blocos distintos destacaram-se: a "Tríplice Aliança" e a "Tríplice
Entente". Esta criaçã o de alianças, combinada com a diplomacia secreta, prá tica comum
em meio à política europeia na época, foram fatores determinantes para o início da I
Guerra Mundial, em 1914.

A França e a Rússia formam uma aliança em 1894, pois partilhavam o mesmo


inimigo: a Alemanha. No fundo, trata-se de um pacto de amizade firmado para
defender a causa da Sérvia, apoiada pelo Montenegro, contra a pretensão do
Império Austro-Húngaro relativamente ao território da Bósnia-Herzegovina,
também disputado pelos sérvios. Também, a França e o Reino Unido queriam
resolver as suas disputas coloniais em África e na Ásia para que pudessem
conjuntamente enfrentar o perigo alemão. Para, fizeram um pacto com o nome
francês “entente cordiale” (entendimento cordial). A sua assinatura marcou o fim de
quase um milénio de conflitos intermitentes entre as duas naçõ es e seus Estados
antecessores, e a formalizaçã o da coexistência pacífica que já existia desde o fim das
guerras napoleó nicas em 1815. Por exemplo, a França reconhece o controlo britâ nico
sobre o Egito, enquanto a Grã -Bretanha é recíproca a respeito da França em Marrocos.

A este entendimento juntou-se a Rússia, também convidada pelos britânicos


para resolverem os seus problemas fronteiriços na Índia, Afeganistão e Paquistão
(também como já foi referido, a Rússia queria derrotar a Áustria-Hungria). Assim,
formou-se a Tríplice Entente (triplo entendimento), consolidando os acordos
bilaterais anteriores: a Entente Anglo-Russa (1907), a Aliança Franco-Russa (1891)
e a Entente Cordiale, entre a França e o Reino Unido (1904). Deste modo, três
potências que apresentavam diferenças significativas finalmente se aproximavam e
coligavam. Tal aliança foi um dissuasor eficaz para a Tríplice Aliança e também veio ao
encontro dos planos franceses de impedir as expansõ es alemã s e austro-hú ngaras pela
Europa.

Do outro lado, a Alemanha unifica-se em 1871. Em 1879 a aliança Austro-


alemã define que os dois países comprometeram-se a ajudarem-se um ao outro em
caso de um ataque por parte da Rússia (esta era apoiada pela França). Além disso,
cada Estado se comprometeu a uma neutralidade benevolente para com o outro, se
um deles for atacado por outra potência europeia. As potências da Europa Central
(Alemanha, Império Austro-Húngaro e Itália) fizeram um acordo militar entre si,

35
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

originando a “Tríplice Aliança”, estabelecida formalmente em 20 de Maio de 1882.


Estas políticas expansionistas formaram então um grande bloco de países aliados
no centro da Europa. Cada uma das nações garantia apoio às demais no caso de
algum ataque de duas ou mais potências sobre uma das partes. O objetivo principal
era construir uma barreira político-militar que isolasse a França na Europa
Ocidental.

Porém, o acordo entre a Alemanha e a Itália neste ponto era bem específico,
afirmando que o seu apoio não se estenderia na defesa contra um ataque vindo do
Reino Unido. A situação da Itália neste acordo era instável na medida em que sua
população era desfavorável ao estabelecimento de um acordo com o Império
Austro-Húngaro, antigo inimigo do processo de unificação da Itália. Além disso, os
territórios da Ístria, do Trentino e da Dalmácia, sob controlo da Áustria, tinham
também populações italianas (entre outras), que não tinham sido incorporadas na
Itália unificada.

Caso ocorresse um conflito e a Alemanha saísse vitoriosa, esta poderia


tornar-se senhora do comércio internacional, país preponderante politicamente na
Europa e ainda conquistar vários territórios coloniais, expandindo o seu império.
Enfim, era o sonho máximo dos pan-germanistas, os simpatizantes de uma
supremacia política e económica alemã, apoiada ainda pelo velho Império Austro-
Húngaro. Por ocasião da guerra, a Itália seria convencida a unir-se à Entente a partir
de um tratado feito com a Inglaterra.

A guerra não podia ser evitada. Quando se formaram estes dois sistemas de
aliados, a pressão mundial subiu e intensificou-se. Cada sistema de alianças tinham
tinha elementos que queriam derrotar algum elemento do outro sistema, e bastava
um pequeno conflito entre dois elementos para que se desencadeasse uma situação
objectivamente belicosa – todas as nações de cada aliança envolver-se-iam.

A faísca que incendiou a Europa ocorreu na Bósnia. Tratava-se de uma


província do Império Otomano cedida ao cuidado do Império Austríaco, que, em
1908, decidiu anexar esse território. Consta que a maioria da população da Bósnia
eram Sérvios e a Sérvia considerava a Bósnia como seu espaço vital. A anexação
austríaca da Bósnia criou uma alta tensão com a Sérvia e também com a Rússia. Em
1912 começa uma Guerra entre os países balcânicos. O nacionalismo da Sérvia
serviu de causa imediata para o início da I Guerra Mundial. O império austro-

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

húngaro englobava uma diversidade de culturas, sendo que o seu ponto fraco
residia na fronteira como os Balcãs. Em 1914, o arquiduque Francisco Fernando,
futuro imperador da Áustria-Hungria, visitava Sarajevo, a capital da Bósnia. Nesse
dia, um jovem nacionalista sérvio assassinou o arquiduque. Este atentado foi
considerado pela Áustria-Hungria como um ato de Guerra, o que levou o imperador
Francisco José da Áustria-Hungria a declarar guerra à Sérvia. A Rússia, por sua vez,
declarou guerra à Áustria-Hungria, invocando a defesa dos povos eslavos. A
Alemanha, ligada por um pacto militar à Áustria-Hungria, declarou guerra à Rússia.
Também declarou guerra à França, que já estava em mobilização. Logo, o Reino
Unido declarou guerra à Alemanha, também por esta violar a neutralidade da
Bélgica, etc. Em poucos dias todas as grandes potências europeias estavam em
guerra; a única que se proclamou formalmente neutral foi a Itália. Mas, um ano
depois, a Itália passou para o lado das potências centrais, britânicos e franceses. A
Triple Entente foi apoiada pela Sérvia, Bélgica, Japã o, Roménia, Portugal, Grécia, China. A
Tripla Aliança recebeu a ajuda do Império Otomano, da Bulgá ria. Era o fim da paz
armada e o início da 1ª Guerra Mundial.

A IGM era um fenómeno inevitável. Este conflito já se esperava desde a última década
do século XIX, com a escalada armamentista. Só não tinha acontecido antes, porque havia
um interesse em que se contivesse uma guerra que traria a destruição e que impediria a
transferência de capital para as colónias.

“As contradições imperialistas entre a Inglaterra e a Alemanha, bem como as que


opunham a França à Alemanha e a Rússia à Áustria-Hungria, haviam provocado a
formação de dois blocos militares inimigos: a aliança austro-alemã e a Entente.”

História Moderna: O Imperialismo

“Em 1913, a tensão racial e política estava a subir em toda a Europa, muito
especialmente no Império Austro-Húngaro. Este império dos Habsburgos
apresentava vários problemas. E um deles era o facto de ser composto por diversas
nações e etnias. Muitos desses grupos raciais desconfiavam uns dos outros, ou
odiavam-nos mesmo mais do que aos inimigos externos da Áustria”, acrescentando
na sua opiniã o, com a qual concordo, que “a complicar ainda mais esta mistura tão
instável estava o facto de dezenas de etnias diferentes no interior do império estarem
a ser apoiadas por países como a Rússia e a Alemanha”.

Bill Fawcett - Os 100 Grandes erros da história

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Na minha opinião, a I Guerra Mundial foi, sem margem para dúvidas, um fenómeno
inevitável. A filosofia do imperialismo sugeria que a exportação contínua de capitais para as
colónias causava a necessidade absoluta de possuir territórios ultramarinos. Como todos os
impérios queriam alargar a sua zona de domínio, aconteceu, no início do século XX, uma
feroz competição entre eles O maior antagonismo era entre a Inglaterra e a Alemanha. Mas
esta rivalidade não tinha forçosamente de levar à Guerra. O que a originou foi o sistema de
alianças de ambos os países. Por outro lado, não creio que a eclosão da Grande Guerra tivesse
sido uma consequência direta do imperialismo. Para mim, as pretensões dos diversos países
podiam perfeitamente ser resolvidas através de acordos (caso do petróleo). Simplesmente,
isso não aconteceu, porque realmente não havia maneira nenhuma de se chegar a consensos.
E as guerras que diversos países travaram entre si no passado só vinham piorar a situação. O
desejo de vingança estava evidentemente presente. E, a partir do momento em que se
formaram os sistemas de aliados, a pressão mundial subiu e intensificou-se. Cada sistema de
alianças tinha elementos que queriam derrotar algum elemento do outro sistema, e bastava
um pequeno conflito entre dois elementos para que se desencadeasse uma situação
objetivamente belicosa – todas as nações de cada aliança envolver-se-iam. A Guerra não
podia ser evitada.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Fatores de aproximação entre potências

A disputa pela influência no Império Otomano e o petróleo do Médio


Oriente – acordos anglo-alemães (1912-1914)

O Império Otomano tinha endividamentos e perdeu sucessivamente uma boa


parte da sua autonomia política (a tentativa de se modernizar acaba por criar uma
enorme dependência de empréstimos externos). É nesta altura que as relações com
o império otomano ganharam uma nova importância (as potências credoras ficavam
com grande parte das receitas das alfâ ndegas turcas).

A partir de finais do século XIX, regista-se uma maior importância dos


alemães nesta região. Houve o projeto The Berlin Bagdad-Railway, que era um
caminho-de-ferro que atravessava todo o Império e ligava Berlim ao Golfo Pérsico
(onde se situavam os lençóis petrolíferos do Médio Oriente), sendo construído com
fundos do Deutsch Bank. Este causou um grande descontentamento e consequente
oposição por parte de Inglaterra e França (e da pró pria Sérvia), pois a construção do
mesmo só iria aumentar o poderio alemão e, consequentemente, ameaçar a
hegemonia britânica na região. É que o caminho-de-ferro tinha como vantagem a
possibilidade de transportar grandes e várias mercadorias e garantir a influência
alemã da Arábia. No fundo, era uma espécie de auto-estrada de comunicações e
interesses.

Durante a construção do mesmo, os alemães descobriram na Mesopotâmia (a


sul de Bagdade) um lago de petróleo, que rapidamente suscitou um grande interesse.
Este petróleo começou a ser transportado para o Golfo Pérsico e além de servir de
alternativa à electricidade para efeitos de iluminação, o petróleo é também um
instrumento útil para a navegação, sendo uma arma estratégica para a marinha.

Nesta altura, o petróleo não era valorizado, apesar de vir a ter mais potencial
do que o carvão. Até entã o, o carvã o era a matéria-prima mais usada para constituir-se
como o combustível dos navios. Mas, para as potências imperialistas, o poderio naval
era determinante e deste facto advém a importância do petróleo. É que os países
necessitavam de uma grande frota de Guerra e as frotas militares navais moviam-se
a vapor. Usavam carvão para produzir o vapor, que tinha de ser disponibilizado ao
longo do oceano, em ponto de apoio, para que os barcos não parassem.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

O petró leo já era conhecido na antiguidade para queimas. Em 1862 forma-se um


grupo industrial nos EUA chamado Standard Oil, para inventar a técnica de perfuraçã o. No
princípio do século XX houve uma série de invençõ es técnicas que alteraram este
panorama.

Rudolf Diesel, engenheiro alemão, inventou, em 1899, o primeiro motor de


explosão que utilizava combustíveis líquidos (diesel). O motor Diesel começa a ser
aplicado para usos industriais. A certa altura entendeu-se a vantagem que era
modernizar os navios com este tipo de combustível. Os navios de guerra a carvão
não tinham grande autonomia, pois o carvão teria de ser levado para dentro do
navio, ocupando grande espaço. O diesel dava uma enorme autonomia e eficiência,
permitia um menor consumo e atingia velocidades maiores. Ocupando menos
espaço, era mais económico e possibilitava o armazenamento de mais artilharia.
Portanto, era fundamental que as potências convertessem as suas frotas de carvão
em frotas a diesel. Quando se desenvolveram os primeiros motores de explosão, a
potência mais poderosa era a que possuía mais petróleo. O petróleo, tornou-se,
então, numa matéria-prima fundamental e estratégica no século XX.

Os países que tinham maior facilidade de acesso ao petróleo eram


americanos ou do leste europeu. A Rússia produz sobretudo na região do Mar
Cáspio. Já a Roménia estava muito ligada à Alemanha. Contrariamente à actualidade,
nã o existe nenhuma regiã o do Médio Oriente referenciada. É que hoje em dia, 2/3 das
reservas de petróleo encontram-se em países desta regiã o. Ao invés, a Inglaterra e a
Alemanha, as maiores marinhas de guerra do mundo, não tinham acesso direto ao
petróleo e tiveram de tentar aceder a ele.

Voltando atrás, quanto à Alemanha, os grandes carregamentos petrolíferos


eram feitos pelos petroleiros, que teriam de atravessar por mar o Golfo Pérsico. Mas
esta exportação do petróleo implicava um entendimento anglo-alemão em relação
ao Kuwait. Os ingleses tinham igualmente o mar do Golfo sob o seu protetorado.
Inglaterra e Alemanha começam a procurar regiões onde possam extrair petróleo
para terem Marinha de guerra (o petróleo é a arma estratégica da Marinha). É assim
que, em 1912, começam as negociações entre estes dois países e foi criada uma
companhia – a Turkish Petroleoum Company, resultado dos acordos anglo-alemães.
Na véspera da 1ª Guerra Mundial, o petróleo do Império Otomano estava dividido

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

pela Alemanha e Inglaterra, o que mostra que é possível os interesses imperialistas


chegarem a um consenso.

“ (…) O caminho-de-ferro de Bagdade devia facilitar as conquistas que os


imperialistas alemães se propunham efetuar para Leste. Depressa a Turquia se viu
submetida à total influência alemã”

História Moderna: O Imperialismo

Eu considero que o petróleo foi fundamental, não só em termos estratégicos para


possíveis guerras, mas também porque funcionou como uma espécie de fator de união entre a
Inglaterra e a Alemanha, duas potências que sempre rivalizaram entre si. É que a Alemanha,
para os seus carregamentos petrolíferos, necessitava de passar pelo Golfo Pérsico, e este era
dominado pela Inglaterra. Havia, então, uma necessidade de entendimento anglo-alemão.
Ironicamente, as duas potências conseguiram chegar a acordos e dividiram o petróleo entre
si. Ao mesmo tempo, não sei até que ponto é que a Alemanha se estava aproveitar destes
acordos com a Inglaterra para simplesmente desenvolver a sua frota marinha com o
petróleo…

Acordos anglo-alemães sobre as colónias portuguesas (1898; 1912-


1914)

O entendimento entre a Inglaterra e a Alemanha estava mesmo em bom pé,


mas isso poderia ser mau para outras nações, como, por exemplo, para Portugal.
Outro dos fatores de aproximação entre as potências foram os acordos anglo-
alemães sobre as colónias portuguesas. Houve dois acordos secretos de divisão
colonial entre Inglaterra e Alemanha, depois de os alemães terem feito imensas
pressões para a modificação do mapa colonial (consideravam que o seu era muito
desfavorável). Através do acordo entre estas duas potências, foi possível ver-se que
o entendimento era algo positivo e acessível.

O tratado anglo-alemão de 1898 previa uma partilha de Angola, Moçambique


e Timor, já que devido às dificuldades financeiras de Portugal, provavelmente, este
país se veria obrigado a empenhar as colónias para resolver a crise. Ou seja, o
empréstimo era dado a Portugal sob hipoteca. Os alemães pretendiam ligar à África
Oriental Alemã à África Sudoeste Alemã, mas dependia do governo português
efetivar este acordo.

41
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Os mesmos países que integraram este tratado celebraram em 20 de


Outubro de 1912 um tratado de revisão do anterior. O governo português voltou a
pedir um empréstimo. Caso deixasse de liquidar a dívida, o acordo era ativado. A
guerra acabaria por impedir esta divisão das colónias portuguesas. Isto mostra que,
apesar das divergências entre as duas potências, a verdade é que ambas tentavam
manter uma boa relação e, quando possível, dividiam colónias que teriam um
grande interesse para ambos os lados.

Quatro meses antes do início da guerra, ingleses e alemães tinham acertado


as contas em termos de exploração do petróleo, pois era fácil chegar a um
entendimento. O governo inglês detinha a maioria da Anglo Persian (hoje British
Petroleum - BP), criada para resolver estrategicamente a falta de petróleo da
Inglaterra (explorar o Golfo Pérsico), sendo que a Gulbenkian era o grande
mediador destes negócios.

Um outro fator que, a meu ver, poderia incitar a uma boa relação entre a Inglaterra
e a Alemanha eram os acordos anglo-alemães sobre as colónias portuguesas. Estes acordos
mostraram que ambas podiam manter boas relações e que podiam dividir colónias que
teriam grande interesse para ambos os lados. Mas, por outro lado, acho que estas duas
potências só queriam servir os seus interesses e aproveitar-se do facto de Portugal se
encontrar na ruína económico-financeira para este país lhes “fornecer” as suas colónias, caso
não tivesse mais dinheiro para pagar dívidas.

A I Guerra Mundial
As operações militares

A entrada de novas potências industriais imperialistas no cenário


internacional aumentava a rivalidade entre as disputas económicas e a divisão de
mercados e territórios, criando conflitos entre os países, na busca pelo poder
económico e político e na corrida ao armamento. O Imperialismo chegou ao seu
ponto de saturação no início do século XX, quando as tensões nacionalistas se
tornaram mais veementes. A Primeira Guerra Mundial é fruto direto dessa
saturação.

Houve também uma explosão do nacionalismo: O nacionalismo, que se


expandia rapidamente pela Europa na época, alimentado pelas guerras perdidas,

42
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

rivalidades, contribuiu bastante para a Guerra. Os cidadãos da Sérvia e do Império


Austro-húngaro clamavam por uma guerra, para defender a sua honra.

Os precedentes bélicos passam pela Guerra hispano-americana (1898);


Guerra Anglo-Boer (1899/1902) (até ao sé culo XIX, os países europeus ocupavam apenas territó rios da costa
africana. A partir deste sé culo, estes passam a explorar o interior de Á frica, pelo que os territó rios acabam por ter de ser
divididos na Conferê ncia de Berlim. A Á frica do Sul era ocupada e colonizada por britâ nicos e holandeses. Os alemã es tentam
expandir a sua presença em Á frica, por meio de acordos com os “Boers” - ocupantes brancos da Á frica do Sul. Os britâ nicos

nã o aceitaram e abriram guerra colonial.) Guerra russo-japonesa (1905); e Guerras balcânicas


(nacionalismo sérvio que veio dar origem ao conflito que despoletou a I Guerra
Mundial - 1912).

Os Capitalistas austríacos exerciam uma grande e poderosa influência na


economia sérvia, tornando a Áustria-Hungria num obstáculo ao desenvolvimento da
indústria sérvia, pois esta não tinha poder de decisão e estava constantemente
dependente do governo austro-húngaro.

A faísca que incendiou a Europa ocorreu na Bó snia. Tratava-se de uma província


do Império Otomano cedida ao cuidado do Império Austríaco, que, em 1908, decidiu
anexar esse territó rio. Consta que a maioria da populaçã o da Bó snia eram sérvios e a
Sérvia considerava a Bó snia como seu espaço vital. A anexaçã o austríaca da Bó snia (que
pertencia ao Império Otomano) criou uma alta tensã o com a Sérvia e também com a sua
aliada Rú ssia. Em 1912 começa uma Guerra entre os países balcâ nicos. O nascimento do
imperialismo tornou a situaçã o dos povos eslavos oprimidos ainda mais intolerá vel. Os
imperialistas alemã es e austro-hú ngaros constituíam uma ameaça à pró pria existência dos
povos eslavos. Desta forma, as guerras balcâ nicas culminaram num exacerbado
nacionalismo eslavo, que serviu de causa imediata para o início da I Guerra Mundial. O
império austro-hú ngaro englobava uma diversidade de culturas, sendo que o seu ponto
fraco residia na fronteira como os balcã s.

No dia 28 de junho de 1914, o arquiduque Francisco Fernando, futuro imperador


da Á ustria-Hungria, visitava Sarajevo, a capital da Bó snia. Nesse dia, um jovem estudante
nacionalista sérvio assassinou o arquiduque. Este atentado foi considerado pela Á ustria-
Hungria (sistema de alianças alemã o) como um ato de Guerra, o que levou o imperador
Francisco José da Á ustria-Hungria a fazer um ultimato e, por fim, declarar guerra à Sérvia.
A origem da I Guerra Mundial localizava-se assim num acontecimento intraeuropeu, de
cariz nacionalista.

43
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Os governadores do Império Austro-hú ngaro aconselharam-se com o seu aliado


alemã o sobre, se deveriam, ou nã o, começar uma guerra com a Sérvia, em que era certa a
entrada de uma Rú ssia forte (e dos seus aliados ocidentais), mas também de uma
Alemanha disposta a combater o grande inimigo russo. A Alemanha consentiu a declaraçã o
de guerra à Sérvia, e assim, a Europa mergulhou numa guerra de violentos massacres do
Homem pelo Homem. Quando o governo austríaco declarou guerra à Sérvia, a questã o
tornou-se europeia: atrá s da Sérvia há a Rú ssia e atrá s da Á ustria a Alemanha. A Rú ssia,
por sua vez, declarou guerra à Á ustria-Hungria, invocando a defesa dos povos eslavos (e
naturalmente dos sérvios). A partir daí, o sistema de alianças funcionou automaticamente.
A Alemanha, ligada por um pacto militar à Á ustria-Hungria, declarou guerra à Rú ssia e à
França, que já estava em mobilizaçã o. Logo, o Reino Unido declarou guerra à Alemanha
(também por esta violar a neutralidade da Bélgica).

O conflito começou com os Balcã s, mas podia ter iniciado com outros conflitos
regionais (nomeadamente em Marrocos, na Á frica). Porém, as coló nias e os conflitos de
interesses com coló nias nã o eram meios suficientemente importantes para levarem a uma
guerra. Em poucos dias todas as grandes potências europeias estavam em guerra; a ú nica
que se proclamou formalmente neutral foi a Itá lia. Mas, um ano depois, a Itá lia passou para
o lado das potências centrais, britâ nicos e franceses. A Triple Entente foi apoiada pela
Sérvia, Bélgica, Japã o, Roménia, Portugal, Grécia, China. A Tripla Aliança recebeu a ajuda
do Império Otomano, da Bulgá ria. Era o fim da paz armada e o início da I Guerra Mundial,
um conflito que envolveu milhõ es de pessoas nos vá rios continentes.

A IGM era um fenó meno inevitá vel. Este conflito já se esperava desde a ú ltima
década do século XIX, com a escalada armamentista. Resulta de uma constante acumulaçã o
de tensã o permanente, na qual estã o presentes o nacionalismo, o desejo de expansã o
imperialista e a concorrência de economias nacionais de cará ter capitalista. Só nã o tinha
acontecido antes, porque havia um interesse em que se contivesse uma guerra que traria a
destruiçã o e que impediria a transferência de capital para as coló nias.

O fracasso dos planos da guerra de curta duração (1914)

Nenhum dos lados estava preparado nem esperava uma guerra tão longa e
tão fatal como a I Guerra Mundial constituiu entre 1914 e 1918. Os Estados maiores
envolvidos na guerra achavam que esta iria durar meras semanas. Além disso, como
já referenciado, esta guerra nã o era desejada por nenhum governo, nem mesmo a
Inglaterra ou a Alemanha.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

De um lado havia os imperialistas da Á ustria-Hungria que queriam: afirmar o seu


domínio sobre 30 milhõ es de checos, eslavos, polacos, ucranianos, sérvios, croatas,
eslovenos, romenos e italianos; submeter, à sua forte autoridade, os Estados eslavos
independentes da Sérvia, Bulgá ria e do Montenegro; e fortalecer o domínio austro-
hú ngaro em toda a península balcâ nica.

Por outro lado o imperialismo britâ nico pretendia conservar e ampliar o seu
império colonial e debilitar a sua mais importante rival: a Alemanha. Já o imperialismo
francês lutava pela restituiçã o da Alsá cia e da Lorena, que a Alemanha recuperara em
1871 enquanto o Imperialismo russo aspirava varrer da Turquia e dos Balcã s a influência
alemã e austríaca e estabelecer aí a sua pró pria esfera de influência

O alargamento das frentes e os impasses (1915-1916)

A Guerra na Europa desenrolava-se em três frentes distintas: a frente


ocidental, a frente oriental/do leste e a frente Balcânica.

Os campos de batalha a oeste da Alemanha eram chamados de Frente Ocidental. O


Plano Schlieffen previa resolver uma questão que preocupava os alemães em caso
de conflito: uma guerra em duas frentes, ou seja, uma guerra contra a França e,
muito provavelmente, contra o Reino Unido, na frente ocidental e, simultaneamente,
uma guerra contra a Rússia, na frente oriental.

A Frente Ocidental localizou-se perto de Paris, em França, devido à investida


alemã para conquistar e controlar todo o território francês. Mas os conselheiros do
imperador alemã o também se enganaram; o Reino Unido entrou na guerra contra os
cálculos daqueles. Logo em setembro de 1914, foi travado o avanço alemão com o
esforço conjunto das tropas francesas, britânicas e belgas. Criou-se um impasse,
pois as linhas fortificadas francesas impediram o avanço alemão e os ganhos
territoriais eram mínimos. Como ninguém esperava este impasse, a guerra alargou-se
em 1915. O Plano Schlieffen falhou no seu principal, que era obter uma vitória
rápida e decisiva a ocidente para, em seguida, transferir forças para oriente e ali
obter outra vitória decisiva.

Em 1916, os alemães organizaram uma segunda grande tentativa de quebrar


a resistência francesa. E dessa vez, os aliados da Entente conseguiram resistir.
Passaram pela Bélgica, dizimando o território, e penetraram em França, chegando
quase a Paris, mas sendo detidos a 13km da capital francesa. Com a ajuda de militares

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

belgas e ingleses, os franceses (país muito mais atrasado em termos militares)


conseguiram construir uma linha de trincheiras e fortificações defensivas ao longo
de toda a fronteira com a Alemanha. Esta frente tornou-se numa “máquina de
massacre” pois duas das piores batalhas da guerra (Verdun e Somme) aconteceram
na Frente Ocidental em 1916.

Mas, na primavera de 1917 a situação tornou-se muito complicada para os


franceses e britânicos, que dificilmente podiam aguentar mais um terceiro ataque
maciço dos alemães. Enquanto em terra a batalha estava igualada, a Triple Entente
conseguiu uma vitória clara na Guerra Naval. A superioridade marítima dos
britânicos e franceses foi evidente e a frota alemã foi rapidamente destruída. Mas a
Alemanha já se preparava para um novo tipo de guerra – a guerra de submarinos .
Recorde-se que o Império Britânico impediu a Alemanha de construir uma marinha.

Na Frente Oriental, os exércitos moviam-se com maior rapidez. Em 1914, os


exércitos russos vieram pelo oeste até a Alemanha e a Áustria-Hungria e em 1915 os
alemães expulsaram o ineficaz exército russo da Polónia, estabilizando a frente do
leste e obrigando o governo de Czar a relegar-se a uma açã o defensiva de retaguarda.
Mediante a necessidade de reforçar o lado russo, Churchill em 1915 desenha um plano
para chegar à Rú ssia pelo Mediterrâ neo (fracasso total). A Rússia recuava cada vez mais
e o descontentamento do seu povo era cada vez maior. O país foi obrigado a retirar-
se da guerra em 1917 devido às Revoluções Bolcheviques que nasciam no seu
Interior.

Já a Frente Balcânica, localizada no sul da Europa, era dominada pelas


potências centrais (Alemanha e Áustria-Hungria). Os aliados nã o conseguiram fazer
progressos até à queda das potências do centro da Europa. De resto, a Sérvia fez uma
resistência surpreendente, conseguindo, logo em 1914, travar e até expulsar o exército
austríaco.

Mas em 1915 já não podia fazer nada contra o conjunto das forças armadas
austríaca e alemã. A partir deste ano, a guerra move-se mais para os países
balcânicos, que vão entrando nela consoante as promessas que as potências lhes
fazem. Os sérvios recuaram para a Grécia e, depois de receberem a ajuda dos aliados
franceses, reapareceram na batalha da frente no sudoeste. O adversário principal das
potências centrais no leste era, obviamente, a Rússia.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Adicionalmente, a Rússia pretendia uma larga fatia do Império Otomano. Os


ingleses tentaram levar os russos a apoiar um ataque a Constantinopla. De resto, a
Inglaterra chegou a efetuar um ataque à zona dos estreitos, mas não obteve sucesso,
pois o Império Otomano estava bem preparado para poder responder aos ataques.
Contudo, conseguem convencer algumas dinastias árabes a fazerem uma revolta
contra os otomanos, sob a promessa de que toda a área árabe iria ser unificada sob
a dinastia Hachemita. Então, em 1916 inicia-se a revolta árabe no Império Otomano,
promovida pela Inglaterra.

Em 1915 ocorreu uma batalha alpina entre a Itália e a Áustria-Hungria. Os


aliados da Triple Entente ofereceram à Itália, para entrar na guerra, mais do que a
Alemanha e a Áustria podiam dar, nomeadamente o controlo do outro lado da costa
adriá tica (sul da Turquia). A guerra correu mal à Itália, ou seja, foi totalmente
derrotada pelos austríacos. Só a ajuda urgente dos britânicos e franceses salvou a
Itália de uma rápida capitulação. Em 1915 a Itália entra em guerra ao lado da
Entente. Um país inicialmente neutro era entã o arrastado para a Guerra.

Portugal entra oficialmente na guerra a 1916 ao lado dos Aliados, o que


estava de acordo com as orientaçõ es da Repú blica ainda recentemente instaurada. A
Inglaterra, que mantinha desde há muito uma aliança com Portugal, moveu influências
para que o país nã o participasse activamente na Guerra. O Partido Democrático, então
no poder, movido também pelo facto de já existirem combates entre tropas
portuguesas e alemãs junto às fronteiras das colónias em África, desde cedo
demonstrou interesse em tornar-se parte beligerante do conflito.

Sabia de antemã o que uma vitória alemã na guerra levaria à perda de grande
parte dos seus territórios coloniais. Como tal, em Setembro de 1914 eram enviadas
as primeiras tropas para África onde as esperariam uma série de derrotas perante
os alemães, na fronteira do sul de Angola com o Sudoeste Africano Alemão (Desastre
de Naulila) e na fronteira norte de Moçambique com a África Oriental Alemã. Apesar
destes combates, a posiçã o oficial do Estado português era claramente ambígua. Os
partidos de cariz esquerdista estavam ao lado dos regimes da França e da Inglaterra,
enquanto os da direita simpatizavam-se com os regimes das potências centrais (Alemanha
e Austro Hungria). Porém, a questã o que se colocava era se Portugal entraria na guerra ou
nã o, já que a entrada de Portugal na guerra seria sempre ao lado da Inglaterra e França.

No entanto, o principal oponente à entrada de Portugal na Primeira Guerra


Mundial foi a Inglaterra. Em Fevereiro de 1916, o antigo aliado português decidiu

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

pedir ao Estado português o apresamento de todos os navios alemães e austro-


húngaros que estavam ancorados na costa portuguesa. Esta atitude justificou a
declaração oficial de guerra a Portugal pela Alemanha, a 9 de Março de 1916
(apesar dos combates em África desde 1914). Neste esforço de guerra, chegaram a
estar mobilizados quase 200 mil homens.

As perdas atingiram quase 10 mil mortos e milhares de feridos, além de


custos económicos e sociais gravemente superiores à capacidade nacional. Os
objetivos que levaram os responsá veis políticos portugueses a entrar na guerra saíram
gorados na sua totalidade. A unidade nacional nã o seria conseguida por este meio e a
instabilidade política acentuar-se-ia até à queda do regime democrá tico em 1926.

Além destas frentes, a guerra travava-se também a nível aéreo e naval. O


avião fora inventado apenas uma década antes do início da guerra. A princípio, a
Alemanha usava mais aeróstatos dirigíveis chamados zepelins do que aviões para
bombardear o Reino Unido. Então os britânicos construíram armas antiaéreas para
derrubar os zepelins. Durante o conflito, os dois lados construíram vários tipos de
aviões de guerra. Os caças tinham metralhadoras que disparavam em outros aviões.
Em 1917, os alemães começaram a lançar bombas a partir dos aviões. Estes
bombardeamentos mataram cerca de 1.300 pessoas e feriram aproximadamente 3
mil no Reino Unido.

A procura da "decisão": guerra submarina alemã, revoluções russas e


intervenção dos EUA (1917)

Vimos assim que a Primeira Guerra Mundial (o primeiro conflito


mecanizado) não se deu apenas em terra. A nível naval, a marinha britânica
conseguia impedir alguns navios de chegar a portos alemães, numa ação
denominada de bloqueio naval. Queriam usar a sua superioridade naval para
asfixiar a economia e comércio alemão. Os britânicos, porém, não conseguiam deter
os submarinos alemães. Em 1915, os alemães anunciaram que tentariam afundar
todos os navios inimigos em águas britânicas. O grande objectivo era isolar a ilha
britânica e não permitir que os navios da marinha britânica alcançassem a ilha e
abastecessem o país.

Aliás, a Alemanha desenvolveu submarinos e começou mesmo a abater


navios ingleses na costa inglesa, provocando um desfasamento na economia e na
indústria britânica. Os ataques submarinos no Atlântico debilitaram o Reino Unido.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Em abril de 1917, um em cada quatro navios de abastecimento que partiu do país jamais
retornou. No final desse mês, o país tinha um suprimento de grã os suficiente para apenas
seis semanas. Os Aliados tentaram defender os seus navios de abastecimento dotando-os
de armamentos e despachando-os em comboios, ou grupos, escoltados por navios de
guerra. No total, submarinos alemã es causaram a perda de cerca de 6 mil navios dos
Aliados. Só o Reino Unido perdeu 13 mil vidas nesses ataques.

Entretanto, na Rússia a situação estava cada vez mais complicada (tal como
foi referido anteriormente). Na verdade, a Rússia encontrava-se fraca e pouco capaz
de aguentar os esforços de guerra. Em 1917 a Rússia conheceu duas revoluções. A
primeira, a Revolução de Fevereiro, foi contra o regime vigente, causada pela
insatisfaçã o geral com o esforço de guerra. Essa revoluçã o derrubou o czar e proclamou a
repú blica, mas nã o alterou a situaçã o na frente. Dito de outro modo, a Rú ssia, a partir
dessa revolta, praticamente não combatia, o que se transformou num problema
grave para os franceses e britânicos que tinham, a partir de 1917, de defrontar-se
sozinhos com o todo-poderoso exército alemão. A Revolução Bolchevique de
Outubro de 1917 começou com Lenine que, estando na Finlâ ndia e ao analisar a situaçã o
da Rú ssia, achou que estava na hora de tomar o poder e por isso regressou e criou um
comité revolucioná rio junto do soviete de Petrogado, presidido por Trotsky. Na noite de
25 de Outubro, o II Congresso dos Sovietes, dominado pelos bolcheviques, legalizou a
revoluçã o e designou para governar o país um Conselho dos Comissá rios do Povo,
presidido por Lenine. O partido de Lenine vencia entã o a luta interna.

Esta revolução levou imediatamente à retirada definitiva tanto da aliança


quanto do conflito mundial, através do Tratado de Brest-Litovsk, assinado a 3 de
Março de 1918. Este tratado foi feito com a Alemanha e forçou a Rú ssia a abandonar a
Poló nia e os Países Bá lticos e a evacuar as suas tropas da Ucrâ nia e da Finlâ ndia,
reconhecendo a sua independência. No fundo, declarava um acordo de paz separada com a
Alemanha. Desaparecia, então, a frente oriental. Logo depois, o país seria tomado por
uma onda revolucioná ria na qual emergirá um novo ente que herdará as fronteiras do
antigo império, a Uniã o Soviética.

Para os alemães, era uma questão de tempo até que a guerra estivesse ganha:
a Inglaterra estava sem marinha de guerra (tenta isolar os impérios centrais dos
abastecimentos marítimos, afetando a indú stria militar alemã , mas os germâ nicos
intercetam os navios britâ nicos através de submarinos); a França estava a perder força;
e a Rússia encontrava-se inativa. O novo tipo de combate (numa única frente)

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

dificultou ainda mais a situação militar franco-britânica, mas foi também a razão
formal para os EUA declararem guerra à Alemanha. A revolução Russa viria a
favorecer os Impérios Centrais e a entrada dos Estados Unidos viria a favorecer a
Entente.

O momento crucial na resolução da Guerra aconteceu em abril de 1917,


quando os EUA entraram na guerra a favor de Triple Entente, mudando
substancialmente o rumo dos conflitos e originando um grande alcance político que
alterava até entã o os dados da guerra. Os EUA apresentavam um grande crescimento
industrial e nã o tinham necessidades comerciais externas. A principal razão para a
entrada americana na guerra foi o bloqueio alemão à marinha inglesa, o qual fez
com que a economia inglesa estagnasse. As transferências de capitais ingleses (mas
também franceses) para os EUA começaram a dissipar-se, os países em guerra
começaram a depender cada vez mais de terceiros e os interesses norte-americanos
viam-se ameaçados, transformando-se em credores das potências europeias. A
indústria americana passou a depender muito da exportação das matérias-primas
europeias e, com a guerra, não se faziam as transferências de capital de que os EUA
necessitavam, pelo que a indústria americana estava a estagnar. Foi esta «ameaça»
que incitou os EUA a entrar na guerra em 1917, ao lado dos aliados. Mesmo com a
manutençã o de um discurso neutralista (os dois candidatos à s eleiçõ es presidenciais de
1916 adotavam esta postura). É que se os Aliados perdessem a guerra, os bancos
americanos eram arrastados para a falência.

Se antes até lucravam com a guerra, pois conseguiam aumentar as exportaçõ es


para a Europa (cereais, petró leo, borracha, aço, medicamentos, etc.), fornecer
empréstimos e torná -la dependente e por isso consideraram-se neutros (1914), a partir
de 1917 sentiram que deveriam intervir e tentar defender os seus interesses. Com a
chegada de tropas americanas houve o fecho de muitos mercados na América do Sul e
na Alemanha, o que fez com que a Alemanha não conseguisse resolver a guerra para
o seu lado. A entrada dos EUA ao lado da Tríplice Entente traz uma nova energia à
guerra e conduz os aliados ao sucesso, forçando os países da Aliança a assinarem a
rendição. Fortalecidos, os países da Entente conseguiriam romper o imobilismo em que
se encontrava a disputa.

Por outro lado, estes também queriam a luta pela liberdade, que passava por
combater a ditadura do Kaiser (imperador), como chamavam ao chefe do Estado
Alemão, Guilherme II. Como o regime da Alemanha era considerado pelos EUA como

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

uma ditadura, então as democracias francesa e britânica deviam ser apoiadas


contra o autoritarismo alemão. A partir deste diagnó stico, a opiniã o pú blica foi
preparada para aceitar a guerra. Faltava só criar os meios militares. Os EUA praticamente
nã o tinham forças armadas, exceto a marinha de guerra. Aliá s, a marinha de guerra norte
americana já combatia os submarinos alemã es. Logo depois da declaraçã o de Guerra à
Alemanha, foi introduzido nos EUA o serviço militar obrigató rio, tendo sido recrutados
três milhõ es de soldados. Sem dúvida alguma, a força dos EUA resolveu a I Guerra
Mundial. Chegaram dois milhões de soldados, apoiados por uma enorme capacidade
económico-financeira e pela produção industrial. Essa força foi decisiva. As
ofensivas alemãs pararam e, em novembro de 1918, a Alemanha capitulou. A 1ª
Guerra Mundial acabou.

No entanto, venceram a guerra devido a três fatores: Expansão territorial até


início do século XX (constituíam um dos maiores territó rios do mundo e o maior império do Mundo, com
especial destaque para o Canal do Panamá ) ; força económica: novas e maiores oportunidades
de crescimento económico (liberalismo econó mico, territó rio rico em recursos naturais e mineiros,
revoluçã o Industrial ampliada no novo mundo, investimento na ciência e na tecnologia e culto da inovaçã o
prá tica). Este crescimento teve uma paragem durante a Guerra Civil, devido a razõ es econó micas (o Norte
necessitava dos escravos para as suas fá bricas e o Sul queria-os para trabalhos na agricultura) e reformas no
sistema social/progressismo (para diminuir desigualdades, como investimentos pú blicos, educaçã o para todos

ou igualdade entre homens e mulheres); e o Isolacionismo: política externa eficaz e ú til (Doutrina
Monroe – potências europeias nã o interferiam no territó rio norte-americano e vice-versa).

O ano de 1918: ofensivas militares finais e revolução europeia.

Durante a maior parte dos mais de quatro anos em que o planeta se viu engolfado
na mais cá ustica batalha de sua histó ria, a Alemanha esteve sempre um passo adiante
dos seus oponentes. Nã o foram poucas as vezes em que o alto comando germâ nico, com
absoluta propriedade, pensou estar pró ximo de celebrar o triunfo definitivo contra a
aliança dos seus férreos antagonistas. Parecia que a Grã-Bretanha, a França e a Rússia,
mesmo abraçadas, seriam incapazes de conter o inigualável ímpeto ofensivo
alemão. Nem sequer o anúncio da entrada dos Estados Unidos nas hostilidades
refreou os ânimos dos oficiais alemães, confiantes no magnífico poderio de sua
máquina de guerra. Sem dúvida, a Alemanha ofereceu inúmeras demonstrações do
seu estarrecedor colosso militar. E, mesmo rodeada por aliados que se revelariam
pouco resilientes, ao final das contas, quase garantiu a vitória. Quase.

No dia 11 de novembro de 1918, consolidou-se a arrebatadora virada aliada


verificada nos ú ltimos meses no teatro de operaçõ es da Grande Guerra. Com a assinatura

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

do armistício entre as delegaçõ es beligerantes, chegam ao fim as hostilidades que


consumiram pouco mais de 4 anos e três meses do planeta. Através do acordo, os
alemães aceitavam as condições de rendição estabelecidas pelos países vitoriosos.
Assim, a Alemanha, que no início parecia ter tudo para vencer este conflito, acabou
por sair derrotada da guerra, enquanto os Aliados saíram vitoriosos. É, então,
obrigada a pedir a paz porque os seus aliados estão à beira do colapso e percebe que
não poderá vencer os Aliados que contam com a ajuda dos EUA. Posteriormente, o
império alemão dará origem à República da Alemanha. O Império Austro-Húngaro
foi desmantelado, dando lugar a novos Estados. A Rússia também sai derrotada,
uma vez que perde territórios.

52
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A ordem mundial do pós I Guerra

Com o Final da I Guerra Mundial, era necessá rio agora fazer um balanço da mesma.
Em termos demográficos, a I Guerra Mundial ultrapassou todas as guerras anteriores
(em termos mais destrutivos), sendo catastrófica e destruindo toda ou quase toda a
capacidade militar efetiva. Era considerada a maior guerra existente até à altura (os
contemporâ neos pensavam de forma generalizada que esta seria a ú ltima guerra). Houve
uma mortalidade anormal, não só influenciada pela dita guerra, mas por
pneumonias, que mataram milhares de europeus (a gripe espanhola propagou-se
rapidamente devido ao enfraquecimento e à subnutriçã o das pessoas). Isto traduziu-se
numa totalidade de 20 milhões de perdas humanas/militares. As principais perdas
deram-se na Alemanha (país com maior nú mero de baixas), França (cerca de 14% da
populaçã o ativa) e Rússia (países diretamente envolvidos na guerra), bem como na
Bulgá ria, Sérvia e Turquia.

Houve também perdas materiais. Após a Guerra, os principais devedores aos


EUA, que passaram a ser os principais credores, eram o Reino Unido, a França, a Itália,
Rússia e a Polónia. Este endividamento levou à perda ou destruição de 1/3 dos
ativos ingleses e franceses e de 1/4 dos ativos alemães. Assim, houve perdas
materiais e um endividamento maiores nos países da Entente do que nos países da
Europa Central.

Além do fim de 4 Impérios (Alemã o, Austro-Hú ngaro, Otomano e Russo), esta


Primeira Grande Guerra de Massas mobilizou todos os cidadãos, todas as atividades
económicas e revolucionou processos mecânicos e tecnológicos ao configurar o
complexo militar. O recurso à mão de obra feminina aumentou, pois os homens
estavam na guerra e era necessário manter a produção. Por fim, e a consequência mais
visível foram os êxodos forçados e massacres em grande escala de populações e
milhões de refugiados e o primeiro genocídio moderno em território europeu
(genocídio dos arménios pelos turcos).

Em termos de capacidade destrutiva, foi uma evolução que foi usada para
fragilizar os países. A certa altura, deixou de poder ser usada em pleno; até aí, era uma
capacidade crescente, que permitia a evoluçã o da indú stria e o crescimento econó mico. É
que, nas economias capitalistas, em épocas de guerra, as indústrias doa armamento
desenvolvem-se e lucram mais do que em tempos anteriores, já que têm de produzir

53
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

mais para satisfazer a procura. Durante a guerra, o Estado compra a crédito a


produção das indústrias. Os Estados capitalistas investem na compra de produtos
com dinheiro de lucros, de salários e, quando isso não chega, imprimem novo
dinheiro para que haja forma de pagar o que é necessário comprar às indústrias.
Apesar de haver uma canalização de recursos para o esforço de guerra, não houve
necessariamente uma estagnação económica, pelo contrário. Em períodos de
guerra, as potências capitalistas tendem a crescer economicamente, devido a uma
maior facilidade de escoar os bens (não há restrições em termos de procura, visto
que esta é feita pelo Estado; muitas vezes a produção torna-se deficitária face á
procura do Estado). Houve uma inflaçã o de procura e consumo.

Uma das consequências mais importantes desta guerra foi a inversão da


tendência das exportações líquidas em termos de comércio mundial. A Europa
deixou de englobar as potências imperialistas dominantes no domínio político-
militar e começou a depender de novos países a nível de alimentos. De resto, os
aliados (que tinham recebido americano) endividaram-se muito mais do que a Alemanha.
Os EUA eram os que transportavam mais mercadorias para a Europa, passando
assim de devedores para credores. No final da Guerra, os investimentos dos EUA na
Europa continuaram, especialmente para a Alemanha. Algumas multinacionais
americanas começavam a expandir-se nesta altura (exemplos da IBM, General Motors e
Ford, que eram os grandes produtores de automó veis e aparelhos mecâ nicos nos EUA).

É possível assim afirmar que a guerra, o endividamento (provocava baixos


salá rios) e o protecionismo dos países europeus (que se fechavam mais ao comércio)
levaram à entrada de capitais americanos na Europa nos anos 20. Se antes as
potências europeias exportavam capitais para os EUA, agora estes passavam a ser
credores dos europeus (que deixaram de ser credores dos americanos). Os governos
europeus endividaram-se e muitos capitalistas europeus foram obrigados a vender
as suas ações aos americanos (situaçã o que se repetiu aquando da IIGM). A soluçã o das
grandes empresas supracitadas passava por se instalarem nos países europeus.

Por outro lado, em termos de comércio internacional, a estrutura alterou-se.


O dólar passou a ser a moeda forte, suplantando as moedas europeias. Em 1920, deu-
se uma crise de recessão devido à adaptação à Paz, que era algo que afetava toda a
Europa. 1919 e 1920 foram anos de quase “pré-guerra civil”, tal era a agitação a
nível político. As classes trabalhadoras queriam ser recompensadas pelo esforço material
e humano da guerra. Nesta altura, já a Rússia havia começado a mudar o regime.

54
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Aliás, a Revolução Russa deu-se em 1917. E, em 1918, generalizou-se um golpe


revolucionário e a Rússia envolveu-se numa guerra civil que durou de 1918 a 1919.
Também na Alemanha já se deu uma revolução em 1918 (entre os partidos mais
conservadores e os que pretendiam uma profunda mudança social), controlada e
apaziguada pelo exército alemão, antes de ter sido desmantelado.

“A Grande Guerra e o modo como ela termina anunciam o declínio da Europa. (…) a
Europa (…) foi materialmente devastada e quase toda sangrada e empobrecida pelo
conflito militar. (…) na economia mundial o papel da Europa diminuiu, em proveito
(…) dos EUA (…) Uma potência extraeuropeia, os EUA, exerceu a influência decisiva
no fim do conflito e, em grande parte, impôs conceções e métodos novos para a
elaboração dos tratados de paz.”

Jacques Nére, História Universal: O mundo contemporâneo

Os Tratados de Paz

Foi nesta base de revoluçõ es que se começaram a negociar os Tratados de Paz


entre os governos dos países que se encontravam num clima de enorme instabilidade
social, por forma a implementar uma nova ordem internacional. Após a devastação
causada pela I Guerra Mundial, as potências vencedoras impuseram uma série de
rigorosas exigências aos países derrotados. Através destes, os EUA passaram a
intervir na política europeia. Na sequência da aplicação destes acordos de paz, a
Alemanha foi o país mais castigado a todos os níveis. O Tratado de Versalhes (Paris)
foi o mais destacado de todos os acordos de paz assinados em 1919. Realizou-se
entre Janeiro e Junho do referido ano na Conferência de Paz, na qual se encontravam
os 27 representantes das potências vencedoras da guerra, com destaque para o Conselho
dos Quatro: EUA (Wilson), Reino Unido (Lloyd George), França (Clemenceau) e Itá lia

55
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

(Vittorio Orlando). Algum tempo depois este conselho passaria a Conselho dos Três, apó s a
saída da Itá lia, que considerava que os seus interesses nã o estavam a ser ouvidos.

Em termos de preocupações dos Estados, a Itália pretendia alargar o seu


território para o Norte de África, a Grã-Bretanha queria salvar o império colonial e
estabelecer novas fronteiras e França controlar a Alemanha, através de imposições
(diktat). Os EUA são contra anexações territoriais, não se considerando aliados, mas
sim associados da Entente. Por isso, agrada-lhes o fim dos Impérios, para terem
mais mercados disponíveis, nã o protegidos. Este tratado constituiu a primeira
interferência americana na política europeia e foi orientado nos Catorze Pontos de
Woodrow Wilson (democrata defensor do imperialismo), um programa de paz
apresentado em Janeiro de 1918 ao Congresso norte-americano, quando a guerra já se
inclinava já claramente a favor dos Aliados, tendência virada a partir da entrada dos EUA,
no conflito, em 1917. A intenção passava por estabelecer relações internacionais sem
conflitos. A principal ideia consistia em impor leis ao mundo e construir instituições
internacionais suficientemente fortes para obrigar os Estados a respeitar essas
mesmas leis – sistema de segurança coletiva. Eis algumas das exigências impostas à
Alemanha pelo Tratado de Versalhes: A Alemanha perde a Alsá cia e a Lorena para a França
(país interessado na vingança pois a memó ria da guerra franco-prussiana de 1871 ainda
estava viva); ficava com a sua capacidade militar reduzida e entregava a regiã o do Sarre à
Sociedade das Naçõ es; cede territó rios à Poló nia, à Dinamarca e à Bélgica; reconhece a
independência da Á ustria e da Checoslová quia; e foi destituída de todas as suas coló nias,
que passaram para os aliados. Para além de tudo isto, e ainda de acordo com o Tratado de
Versalhes, a Alemanha foi obrigada a pagar indemnizaçõ es aos países vencedores. As tã o

controversas reparaçõ es de guerra, exigidas a um país que se encontrava na penú ria.

Para os alemã es, este nã o era um tratado, era, sim uma imposiçã o, um diktat. O
Tratado de Versalhes nunca foi aprovado pelos EUA, os quais optam por uma
política isolacionista e de neutralidade, deixando a Europa entregue a si própria e
às suas dificuldades. Já a França, grande rival da Alemanha, tencionava aplicar à
letra o Tratado de Versalhes. É nas condições deste tratado que estão as bases da II
Guerra Mundial.

Não é de esquecer a importância dos outros tratados. O Tratado de Saint-


Germain-en-Laye foi celebrado a 10 de Setembro de 1919 e obrigou a Áustria a
reconhecer a independência da Hungria, Checoslováquia, Polónia e Jugoslávia e a
ceder alguns territórios à Itália. Proibiu também a união política ou económica ao

56
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Reich alemão (para precaver uma futura aliança com a Alemanha) e limitou o exército
profissional a 30 mil soldados. Foram igualmente estabelecidas compensações
económicas pelos prejuízos causados pela guerra, embora o dinheiro nunca tenham
sido entregue.

O Tratado de Trianon foi assinado a 4 de Junho de 1920, determinando que a


Hungria cede territórios à Checoslováquia, Jugoslávia e Roménia (criando
expressivas minorias hú ngaras nestes locais). Através da fragmentaçã o do territó rio (a
Hungria perdeu 2/3), pretende dar resposta à diversidade étnica. Além disso, os
húngaros perderam o acesso ao mar que possuía através da Croácia e o seu exército
teria no máximo 35 mil soldados.

O tratado de Neuilly-sur-Seine foi um acordo de paz firmado a 27 de


novembro de 1919. Determinou que a Bulgária reconheceria o novo Reino da
Jugoslávia, pagaria uma indemnização e reduziria o seu exército. Também perdia
uma faixa de território ocidental para a Iugoslávia e cedia a Trácia Ocidental à
Grécia, perdendo assim o acesso ao Mar Egeu.

O Tratado de Sèvres foi um acordo de paz assinado entre os Aliados e o


Império Otomano em 10 de outubro de 1920. Apesar de nunca ter sido ratificado pelo
Parlamento Turco (logo nã o foi colocado em prá tica pelo Império Otomano), as suas
cláusulas consagravam que a Turquia fosse obrigada a ceder territórios à Grécia e à
Itália, a reconhecer a independência da Arménia e que o seu exército fosse limitado
a 50 mil soldados. Tirando este exemplo referente ao Médio Oriente á rabe, as alterações
políticas na Europa modificaram o mapa da Europa central e oriental.

Estes países foram obrigados a pagar indemnizações aos países vencedores


(as tã o controversas reparaçõ es de guerra, exigidas a países que se encontravam na
penú ria). Estes tratados também criaram um «cordão sanitário» da influência russa,
para que a Europa não caísse nas mãos do socialismo, nem sofresse qualquer tipo de
influência por parte da Rússia. Foi, portanto, uma tentativa de isolar a Rússia, logo
após a revolução socialista e o final da I Guerra Mundial, quando o país era visto
como uma ameaça ao capitalismo. Este cordão consistiu em criar um embargo
comercial para tentar asfixiar e matar a economia socialista.

Ora, com a Guerra, criaram-se novos países a partir do desmembramento dos


Impérios. Eis os novos Estados europeus, criados desde o Bá ltico ao Mar Mediterrâ neo:
Finlâ ndia, Poló nia, Estó nia, Letó nia, Lituâ nia, Checoslová quia, Á ustria, Hungria e

57
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Jugoslá via (que integrava seis países: Sérvia, Croá cia, Eslovénia, Montenegro, Macedó nia e
Bó snia).

Estas cláusulas foram mal vistas pelos EUA e pela Inglaterra. Os primeiros
não concordaram especialmente com o Tratado de Versalhes, pois achavam as
decisões demasiado duras, tinham uma política de neutralidade (recusando-se a
associar-se a algum lado) e queriam que os pagamentos das reparações da Alemanha
fossem feitos muito faseadamente – para custar menos ao Estado Alemão e para não
prejudicar a importância alemã à Inglaterra e aos EUA, sob a consequência de gerar
uma recessão mundial. É que as empresas americanas começavam a estabilizar na
Europa e os EUA eram credores de muitos países europeus. Por outro lado, a França
foi a que mais concordou com estes tratados, pois a Alemanha era o seu maior rival,
e muitas das decisões iriam beneficiar os franceses. Portanto, contava com o
pagamento dos alemães e queria enfraquecê-los, tomando uma posição favorável à
entrada destes numa recessão.

Observando este prisma, as divergências entre os aliados aumentaram


consideravelmente. Como os franceses estavam preocupados com o renascimento
alemão, obrigaram estes a pagar as suas dívidas, fazendo esforços com muitos dos
países novos para que estes formassem alianças militares e políticas (Poló nia,
Jugoslá via e Checoslová quia, todos saídos do império austro-hú ngaro), de modo a que
pudessem ser uma espécie de pequena Entente (Rú ssia), produzindo efeitos
semelhantes aos dos russos na IGM. Tudo isto depois de a Rú ssia se ter tornado
soviética e a França ter emprestado bastantes capitais aos russos, o que nã o conduziu à
formaçã o de uma nova aliança.

O cumprimento das disposições consagradas nos tratados celebrados no pós-


guerra e a necessidade de evitar novos conflitos tornaram necessária a criação de
uma nova ordem internacional, capaz de garantir a paz e a direção da vida
internacional. Os princípios em que se devia basear a reorganização do mundo
depois da guerra haviam sido definidos pelo presidente norte-americano Woodrow
Wilson, numa mensagem dirigida ao Congresso em Janeiro de 1918, conhecida como
os Catorze Pontos. O último destes pontos constituintes do preâmbulo de todos os
tratados de paz propunha a constituição de “uma organização geral das nações” que
tivesse por objectivo “assegurar as garantias mútuas de independência política e
integridade territorial tanto aos pequenos como aos grandes estados”.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Uma das consequências do pós-guerra foi a criação da Sociedade das Nações


(SDN). A proposta de Wilson seria materializada em 1919 na Conferência de Paris,
através da instituição da Sociedade das Nações, uma instituição europeia com sede
em Genebra (Suíça), cujo Pacto organizador foi assinado pelos 27 representantes na
Conferência e posteriormente integrado no pró prio texto do Tratado de Versalhes. A SDN
era composta por cinco membros: o Secretariado, o Conselho, a Assembleia Geral, o
Tribunal de Justiça Internacional e vá rias comissõ es especializadas.

Segundo o pacto da SDN, a organização tinha como objetivo fundamental


desenvolver a cooperação entre as nações e garantir a paz e a segurança
internacional através da resolução dos conflitos por via pacífica. Para tal, todos os
estados comprometem-se a respeitar os princípios do direito internacional. Para
salvaguardar esses princípios, eram previstas medidas tendentes ao
desarmamento, ao respeito pela integridade territorial e pela independência
recíproca. O país que infringisse qualquer destes princípios era boicotado
economicamente. Desde modo, o papel da SDN foi contribuir para uma Europa
próspera e pacífica. Porém, a SDN está votada ao fracasso. Dificilmente os seus
mecanismos militares fariam cumprir as suas decisões e compensar os
desequilíbrios existentes nos diversos tratados de paz. Depois, os países derrotados
(Alemanha à cabeça) e a Rússia foram excluídos na elaboração dos textos e na
própria SDN. Isso debilitou a SDN: inoperância e incapacidade perante posteriores
conflitos mundiais, pois limitava-se a discutir, não conseguindo organizar uma força
militar para travar agressões. A questã o das minorias nacionais nã o foi devidamente
considerada. Por interesses particulares de quem decidia, uma multiplicidade de povos
ficou espalhada por vá rios dos novos países, sem respeito pela sua identidade ética e
cultural. Outros povos, aos milhõ es, decidiram abandonar as suas residências e
deslocaram-se para os seus novos estados, dando origem a uma das mais violentas
movimentaçõ es de povos da Histó ria. Por fim, alguns dos povos vencedores estavam
insatisfeitos com as resoluções dos tratados de paz. As decisões dependiam muito
da opinião e dos interesses das principais potências (França e Grã -Bretanha). Os
países vencedores obrigaram os países derrotados a pagar indemnizações àqueles
países. Rapidamente, a SDN se mostrou incapaz de desempenhar o papel de
mediadora de conflitos, o que comprometeu os fundamentos da sua existência. Os
EUA, país cujo presidente é o mentor do projeto, apesar de constituírem uma
potência que afirmava o seu poder económico e o seu protagonismo político, não
integraram a SDN e não aprovaram o Tratado de Versalhes, adotando novamente
uma política de isolacionismo (neutralidade) e contribuindo para o descrédito da
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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

organização. Preferiam sufocar as suas atençõ es no Pacífico. O lugar dos EUA na SDN foi
preenchido pela China, que se foi juntar à França, Inglaterra, Itália e Japão. A SDN é
ignorada e, a partir de 1939, extingue-se lentamente, dissolvendo-se em 19 de Abril.
Enfrentando todas estas e outras questões às quais foi incapaz de reagir, a SDN
fracassa.

60
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A exportação de capitais entre as guerras e a depressão


1929-1933

O endividamento dos países europeus e os investimentos dos EUA na


Europa

Para além das alteraçõ es geopolíticas, a Primeira Guerra Mundial provocou


profundas transformações na situação económica e financeira do Velho Continente.
A Europa Ocidental do pós-guerra, devastada a diversos níveis, entra numa
profunda crise económica e social. As perdas humanas, a diminuição da mão-de-
obra, o excedente da população feminina, as infra-estruturas destruídas e os
terrenos inutilizados constituíam a imagem da Europa em ruínas. Também, a
produção industrial, orientada para a produção de armamento, sofreu uma quebra
significativa.

Calcula-se que como resultado da guerra foram mortos cerca de 10 milhões


de europeus, sendo que 7 milhões se tornaram inválidos, além de 15 milhões
gravemente feridos, soma que é mais assustadora se considerarmos que a esmagadora
maioria dessas baixas foram de homens jovens em condiçõ es plenas de trabalho, o que
deixava todos os países europeus envolvidos na guerra sem mã o-de-obra capaz para
reerguer seus parques industriais. Isso sem contar com a destruição de terrenos,
imóveis e indústrias, levando a uma situação de crise económica e social para a
Europa como um todo.

É necessário recuperar urgentemente o que ficou destruído, formar recursos


humanos e reconverter a dita produção industrial. Para tal, é preciso dinheiro, o
qual os estados não têm. Assim, no período do pós-guerra apresentam-se medidas
extraordinárias que tentam colmatar os problemas económicos mais prementes.
Estas medidas ou estratégias de recuperação foram realizadas a nível interno
(emissão massiva de notas de modo a multiplicar os meios de pagamento) e externo
(recurso a medidas protecionistas, através do levantamento de taxas aduaneiras e
da instituição de restrições cambiais; recurso ao mercado de bens/serviços e
empréstimos americanos, colocando toda a economia na sua dependência).

Os EUA, entrados na guerra mais tarde, sofrem menos as consequências.


Tinham consciência que o declínio económico-financeiro da Europa os poderia vir

61
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

ainda a afetar, dadas as ligações comerciais com o velho continente. Era, por isso,
urgente reavivar a economia europeia, injetando capitais. Os EUA emprestaram
avultadas quantias à Inglaterra e Alemanha, permitindo aos alemães pagarem as
indeminizações de guerra à França e à Inglaterra, servindo-se estes países desses
capitais para pagar as dívidas que haviam contraído com os EUA.

Neste sentido, foi criado em Agosto de 1924 o Plano Dawes, um plano


provisório de ajuda económica direcionado à Alemanha da pós-Primeira Guerra
Mundial, com o intuito de que esta pudesse reerguer a sua economia e pagar as
dívidas e reparações a ela impostas. Este plano foi elaborado pelo norte-americano
Charles Dawes, e procurava resolver o problema do não cumprimento por parte dos
alemães das dívidas acordadas em Versalhes com o final da guerra. As propostas
eram na verdade bastante simples, pois mantinham-se as somas a serem pagas pelo
país, mas com pagamentos anuais reduzidos e mais distanciados, dando tempo ao
país de acumular os valores devidos para libertar os seus débitos de guerra.

A Europa sofreu, porém, o fenómeno da inflação. Os preços de bens


essenciais subiram devido à elevada procura desses bens sem a equivalente
resposta por parte da produção. A procura excedia, pois, a oferta. Para combater as
dificuldades, os Estados recorriam ao aumento da massa monetária em circulação,
que não era acompanhado pelo desenvolvimento do sector produtivo. A situação da
Europa agravava-se, pois as exportações eram quase inexistentes, o que tornava
muito difícil equilibrar a balança de pagamentos. A contracção de novos
empréstimos era o recurso inevitável dos governos. O agravamento do défice dos
estados era a consequência imediata.

Apesar de todos os países europeus terem revitalizado a sua situação por


volta de 1925, este crescimento encontrava-se assente numa base frágil, devido à
instabilidade social existente e o aumento lento do protecionismo. A Europa passou
de credora a devedora dos EUA e Londres perdeu para Nova Iorque o seu papel de
polo central/epicentro da economia mundial. Os EUA são, agora, a dinâmica de
todas as economias industriais. Possuem um vasto mercado interno, com um poder
de compra razoável, que absorve a maior parte da produção, cada vez mais
estandardizada. É nos EUA que abundam os capitais e a importância do dólar
americano é cada vez maior.

Apesar deste dinamismo, o que se verifica é uma interdependência, com os


capitais americanos a fluírem para a Europa, acabando os mesmos por regressar

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

aos Estados Unidos na forma de pagamento dos débitos contraídos. Em


consequência, cerca de metade dos stocks mundiais de ouro concentravam-se nos
Estados Unidos. Se, na primeira década do século XX, a Europa ainda podia ostentar,
orgulhosamente, a sua hegemonia, a partir de 1914 passou para uma irreversível
situação de dependência em relação aos EUA. Os EUA, que durante a guerra
forneceram à Europa matérias primas, alimentos e armas, passam a contar, no fim
do conflito, com um excelente mercado para continuarem a colocar, não só bens de
primeira necessidade, como investimentos e financiamentos com que a Europa
inicia a sua reconstrução. De resto, a Europa chegou a perder mercados para os EUA,
assistindo ao desenvolvimento industrial de algumas coló nias europeias (exemplos da
Índia, Austrá lia e Nova Zelâ ndia).

Os aumentos de produtividade e a fase de “prosperidade” da década de


1920

À medida que a situação estabiliza e que as unidades de produção voltam a


laborar para uma economia de paz, a Europa recupera grande parte do seu poder
económico anterior à guerra, nomeadamente ao nível das exportações, mas está
agora sempre um passo atrás dos EUA, que acabaram por beneficiar muito com a
situação económica da Europa. É no período de 1921 a 1924 que surgem os primeiros
sinais de estabilizaçã o da situaçã o econó mica, que nã o tem, todavia, o reflexo esperado ao
nível dos défices orçamentais, que se mantêm muito elevados, muito por culpa dos
endividamentos externos. Isto quer dizer que esta recuperaçã o provocou efeitos diretos
na economia norte-americana. Apesar de tudo, os países europeus procuraram
dinamizar as suas respetivas produções e tornar-se menos dependentes dos
produtos norte-americanos.

Enquanto a Europa se erguia com grande dificuldade dos escombros da


guerra e tentava recuperar do caos, tanto a nível econó mico como político e social, os EUA
arrancavam para um tempo de intensificação do seu desenvolvimento industrial e
viviam um período de grande prosperidade económica. Esta prosperidade era
marcada pelo signo da organização racional das empresas. Algumas multinacionais
americanas começavam a expandir-se nesta altura (exemplos da IBM, General Motors
e Ford, que eram os grandes produtores de automó veis e aparelhos mecâ nicos nos EUA).
Paralelamente, foi proporcionada pelo facto do território nã o ter sido “palco” de
guerra, ou seja, não sofreu as consequências fatais que a Europa sofreu com a guerra.
Ocorre uma crescente ligação entre a economia europeia e o capital americano. A

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

solução das grandes empresas supracitadas passava então por se instalarem nos
países europeus.

Além disso, os EUA possuíam um vasto mercado interno, com um poder de


compra razoável, que absorve a maior parte da produção e havia uma grande
abundância de capitais devido à especulação bolsista, baseada na crescente
produção industrial e na cada vez maior importância do dólar. A aplicaçã o de novos
métodos de racionalizaçã o do trabalho como o taylorismo, o fordismo e a estandardizaçã o
contribuíram também para a grande prosperidade e avanço dos Estados Unidos.

A década de 20 do século XX foi, nos EUA, sinónimo de prosperidade. De


facto, à medida que a produção crescia, aumentava o consumo interno. Apesar de
continuar a haver pobres, eram mais os confortavelmente acomodados, os
prósperos e endinheirados. Os negócios prosperavam e permitiam lucros que
subiam rapidamente. Os EUA viviam dos rendimentos da I Guerra Mundial:
hegemonia do dólar, exportações maciças para uma Europa em reconstrução e para
a América Latina. Havia, portanto, gradualmente um período continuado de
prosperidade que parecia não ter fim.

Confiantes no futuro, os EUA haviam-se transformado numa sociedade de


consumo. Inebriados pela publicidade, os norte-americanos passaram a considerar o
automó vel e seus desejos, recorriam ao crédito, bastante facilitado na altura. O mercado
financeiro de Wall Street, que até aí estava confinado a uma elite, generalizou-se a uma
vasta camada da sociedade. Os mass media faziam eco das fortunas feitas de um dia para o
outro. As poupanças de uma vida eram canalizadas para a compra de açõ es.

No entanto, para alguns historiadores, não é claro que os EUA sejam, no


período entre as duas guerras mundiais, a área económica dominante, e que se
possa afirmar que Europa é dependente dos EUA. O que se verifica é uma
interdependência, com os capitais americanos a fluírem para a Europa, e com os
juros pagos pelos empréstimos a serem reinvestidos, em grande parte, no reforço
da economia americana, sustentando, ainda, a especulaçã o bolsista de Wall Street.
Confirma-se assim, que na segunda metade da década de 20 viveu-se um clima de
acalmia económica na Europa. Nos EUA, a “era da prosperidade” levava os norte-
americanos a consumir desenfreadamente. Contudo, essa prosperidade era frá gil.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A recessão da década de 1930: a crise bolsista nos EUA (1929) e a sua


transformação em recessão mundial

A perda de poder da Europa para os EUA foi uma das consequências da I


Guerra Mundial. Deve-se, também, ter em conta que a Alemanha não teve a Guerra
no seu próprio território e, por isso, a indústria alemã, embora arruinada, estava
fisicamente intacta. Isto fez com que grande parte do dinheiro americano tenha ido
para lá – para reavivar a indústria. Com o risco de uma recessão devido à guerra e
com o poder que os EUA exerciam agora na Europa do pós-guerra, a indústria alemã
cresceu bastante, em grande parte graças à massificação do consumo dos produtos
alemães na Europa.

Assim, os anos 20 foram uma época de grande produtividade e de diferenças


qualitativas no que diz respeito aos produtos: a Alemanha cresceu, bem como a
França, ainda que de forma menos intensa – foi uma época de prosperidade. O
crescimento da economia mundial arrastou outras economias pré-industrializadas.
Na segunda metade dessa década, a Europa, graças à recuperação económica que
vinha alcançando, deixou de estar tão dependente dos bens e serviços americanos, o
que se traduziu numa redução das exportações com destino ao velho continente. A
prosperidade não atingia todos os países da mesma forma: uns cresciam mais do
que outros, uns consumiam mais do que outros, e nuns países havia mais
excedentes do que noutros.

Isto levou à criação de barreiras proteccionistas: provocou um crescimento


na produção de cada país, que fez com que se chegasse a uma superprodução e que
se lançasse uma sobrevalorização das matérias-primas – os seus custos tornaram-se
insuportáveis. Foi esta sobrevalorização das matérias-primas que provocou à
recessão. Esta crise não pode ser somente explicada pela crise bolsista – muito antes
da crise na bolsa, já a produção estava em superprodução. A crise bolsista apenas
acelerou o processo recessivo.

Ora, percebe-se, assim que a crise teve origem, por um lado, na especulação
bolsista. As cotações das acções da bolsa, cada vez mais altas, não correspondiam à
situação real das empresas. A facilidade de recurso ao crédito mantinha os cidadãos
na ilusão de uma prosperidade interminável. Os bancos estimulavam esta
especulação bolsita, pois concediam créditos ao consumo privado de forma pouco
criteriosa e a pessoas que não possuíam capacidade de endividamento. Tratava-se
do recurso ao crédito para aplicação na compra de acções. Ora, quanto mais se

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

consumia, mais os bancos emprestavam, numa espiral que só podia conduzir a um


fim – a rutura do sistema financeiro e, consequentemente, produtivo. As pessoas
não pagavam aos bancos o que lhes deviam e deixaram de consumir por não terem
meios para tal.

A crise teve origem, por outro lado, na superprodução de bens de consumo.


Na euforia da recuperação do pós-guerra, produz-se demasiado rápido para as
necessidades reais das sociedades desenvolvidas. Acumulam-se, pois, os
excedentes, que são o rastilho da crise. E, com a referida retracção do consumo
privado, as empresas veem-se com uma enorme quantidade de stocks acumulados, o
que vai levar à deflação, isto é, à baixa dos preços, a qual penaliza as empresas, que
vêem os seus lucros diminuir, obrigando-as a despedimentos. Isto leva ao
desemprego e à queda do poder de compra. Também, as acções de muitas empresas
estavam perigosamente sobrevalorizadas. Começam a surgir, nos mercados
bolsistas, grandes quantidades de ordens de venda dessas acções e, perante a queda
contínua dos preços, no dia 24 de outubro não havia compradores para a
quantidade de títulos disponíveis. Foi o crash de Wall Street, que se repercutiu
sobre todos os sectores da economia.

O ano de 1928 foi, então, o último ano em que os Estados Unidos se


mostraram esplendorosos. No dia que ficou para a história como a quinta-feira
negra, as ordens de venda das ações multiplicaram-se. Contudo, não havia
compradores, o que provocou a queda acentuada do preço das mesmas. Perante
esta descrença no sistema financeiro, os grandes banqueiros injetaram capital
outrora investido em território alemão para suprir a desvalorização das ações,
adquirindo ações a um preço mais elevado do que aquele a que estavam a ser
vendidas.

Porém, no dia 29 de Outubro (terça-feira negra), a avalanche de ordens de


venda parecia impossível de conter. Desta vez, os grandes banqueiros nada podiam
fazer para atenuar a queda. A desgraça abateu-se sobre os EUA: muitas fortunas
«virtuais» esfumaram-se em poucas horas, de um momento para o outro muitos
foram os que se viram sem nada. Face a este crash bolsista, rapidamente se
revelaram as consequências provocadas pelo mesmo.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Milhares de bancos foram à falência, as fábricas fechavam e lançavam no


desemprego milhares de trabalhadores, famílias inteiras ficaram na miséria e as
empresas diminuíram os preços e o volume da produção. As empresas faliram, pois
com a queda do valor das suas ações perderam capital e deixaram de poder
recorrer ao crédito. O poder de compra caiu em flecha, devido à subida galopante da
taxa de desemprego. Como tal, a procura diminuiu e os preços caíram (na tentativa
de escoar a produçã o agrícola e industrial em excesso).

Nos campos, os pequenos agricultores, desesperados, destruíam os


excedentes agrícolas para que a lei da oferta e da procura funcionasse, ou seja, para
a oferta diminuir, levando assim à subida dos preços e, intrinsecamente, dos lucros.
A fome proliferava e as cidades que, ao longo dos anos 20, transpiravam
prosperidade, agora mergulhavam na desolação. Acumulavam-se as filas para a
sopa dos pobres, amontoavam-se os desempregados que se ofereciam para
trabalhar a troco de remunerações irrisórias e barracas multiplicavam-se nas
proximidades dos centros urbanos.

Os desequilíbrios trazidos pelos tratados de paz e pela instabilidade social


agravaram-se através desta crise bolsista (e consequente recessão). Assim, ela teve
uma repercussão generalizada nos EUA e na Europa. Enquanto primeira potência
econó mica do mundo, os EUA mantinham relaçõ es comerciais com todo o mundo
capitalista. Como todo o Mundo dependia da prosperidade económica dos EUA, a
falência da economia americana arrastou a falência da economia mundial. A verdade
é que quem sofreu mais com esta crise foram, de facto, os EUA. A Europa ficou abalada,
mas nã o foi de forma tã o grave como nos EUA. Os países europeus, como dependiam
muito do pagamento dos empréstimos americanos para a reconstrução do pós-
guerra, viram-se sem apoios, pois os capitais injetados pelos EUA foram resgatados
pelos bancos americanos, de modo tentar salvar a sua economia. Os países que
dependiam da exportação de matérias primas deixaram de ter compradores e os
países em vias de desenvolvimento ficaram sem mercados para o escoamento dos
seus produtos, procedendo à diminuição dos níveis de produção. A Alemanha foi o
país europeu mais afetado, já que os EUA investiram muito na economia alemã e
respetiva indústria.

O crescimento per capita antes da guerra é, em média, inferior ao


crescimento verificado nos anos 30. Os EUA correspondem ao país que mais ilustra

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

a ideia de recessão. Este é um período de forte crescimento para japonenses e


soviéticos. O facto História dos japonenses disporem de uma população agrícola
bastante maior mascarava o desemprego existente. A URSS foi a que melhor
escapou à crise, havendo até um crescimento da sua economia. Isto deveu-se ao
facto de ser um país comunista e, assim, estar arredada do sistema capitalista, e
graças à planificação e direção económica promovida pelo próprio estado soviético
(a exportaçã o de capitais aumentou bastante).

Os mercados norte-americanos, japonês e soviético eram praticamente


fechados, apesar de um grande fluxo de capitais. A URSS, os EUA e a Alemanha
procuravam comprar cada vez menos e apostar na compra de matérias-primas baratas.
Nos anos 30, a maior parte das empresas estavam sediadas nos seus países de origem. A
tendência dos ú ltimos 60 anos passava por perder a base nacional capitalista e ajustar o
grau de abertura do mercado. O paradoxo dos anos trinta (havia um fluxo de capitais,
mas os países fecharam-se) colidia com a base das empresas capitalistas e as
economias nacionais fechadas. Isto mostra que esta crise teve efeitos desiguais, não
apresentando um padrão uniforme e estimulando a procura do mercado interno (e
o consequente fecho dos mercados).

A recessão durou anos. As diferentes economias tentaram de tudo para parar


a crise. A maior parte dos países procurou tornar-se autossuficiente, iniciando-se
um período de adoção de políticas fortemente protecionistas (estavam
autocentrados e tinha tendência a fechar-se). Outros apostaram em verbas públicas
na economia nacional para incentivar o crescimento económico (os países
capitalistas fizeram isto para acelerar a produção de capital) e ainda outros
apostaram nas políticas de redistribuição de rendimentos.

Os EUA demoraram a sair da recessão, pois o governo gastou muito tempo na


realização das injeções de capital público sobre uma situação económica recessiva.
Criaram grandes obras públicas, como edifícios públicos, barragens, drenagem de
pântanos e autoestradas. A Alemanha também fez tudo isso e até criou uma fábrica
de construção de automóveis (Volkswagen). Era uma empresa estatal, financiada
pelo Estado e por instituições públicas. Outros países também desenvolveram
programas destes para o incentivo do desenvolvimento económico, ainda que em
menor escala.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

“Hoover tornou-se uma das figuras mais determinantes na expansão


económica do início dos anos vinte, um período marcado por um alargamento
excessivo do crédito, que trazia maus pronúncio para o futuro”

Bill Fawcett, Os 100 Grandes Erros da História

“Quando os EUA espirram, o resto do mundo constipa-se.”

“A recessão foi impulsionada por uma desaceleração cíclica do mercado de capitais e


depois exacerbada por uma política económica mal orientada. (…)”

Bill Fawcett, Os 100 Grandes Erros da História

A recessão e as alterações políticas – regimes antiparlamentares na


Europa e no Mundo

Nos anos 30 havia já um paradoxo no capitalismo: havia um fluxo de capitais,


mas os países fecharam-se. Imergidos nesta profunda crise, os governos ocidentais
delinearam estratégias para se reerguerem economicamente. O quadro económico
vivido pela Europa não era favorável à consolidação do triunfo conseguido com a
Primeira Guerra Mundial. Era um continente assolado por sérias dificuldades
económico-financeiras e este quadro negativo originava complicadas perturbações
no continente. Por um lado, existe um mercado no qual existe circulação de capitais.
Por outro lado, existe um mercado onde os países se fecham e criam grandes
restrições para a circulação comercial. Os países procuravam ganhar vantagens às
custas de outros Estados, sendo que as grandes economias passavam a funcionar em
circuito fechado. A evolução paradoxal do capitalismo teria como consequência
política uma nova guerra.

A proteção da economia nacional foi o objetivo que todos os chefes de Estado


perseguiram. Com este intuito, procederam à aplicação de taxas aduaneiras sobre
os produtos importados, de modo a escoar a produção interna (protecionismo e
nacionalismo económico). O Estado passou a regulamentar a atividade económico-
financeira (intervencionismo estatal), colocando entraves ao crédito fácil e criando
organismos de supervisão económica. As grandes potências procuravam sair da
recessão através de uma política agressiva e da redução de custos militares. Alguns
países desenvolveram-se mais rapidamente que outros numa política de
crescimento em base fechada. Os americanos estavam mais longe de procurar uma

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nova guerra do que alemães ou japoneses, pois foram o país mais retardado na
contenção das despesas militares.

A recessão trouxe consigo o reacender do fervor revolucionário de esquerda


e a defesa de alternativas económicas anticapitalistas. Isto ocasionou alterações
políticas em todos os países. Muitos deles, com estruturas políticas muito frágeis,
evoluíram para regimes ditatoriais (fórmulas autoritárias e conservadoras de
direita). O tempo das ditaduras, dos fascismos, aproximava-se. O facto de os Estados
tentarem sair da recessão numa base nacional (passando a crise para outros) levou-
os a uma nova guerra.
Uma das características do período que decorre entre as duas guerras
mundiais é a crise das democracias liberais. As dificuldades do primeiro pós-guerra,
a reação bolchevique e a crise de 1929 são algumas das causas de regressão
democrática na Europa.

As primeiras democracias a serem atingidas neste processo foram as de mais


recente implantação, ou seja, as da Europa Central e mediterrânica, caracterizadas
por uma economia frágil e dependente de capitais estrangeiros. Nos países em que
esta tradição existia, a democracia resistiu melhor, apesar os inequívocos sintomas
de crise. Esta radicalização é sobretudo notória em França, Alemanha e Itália, com
particular destaque para os dois últimos países, onde regimes autoritários de
extrema-direita formaram governo.

O regime fascista é uma ditadura que anula as instituições democráticas e


substitui as liberdades individuais por um feroz controlo político dos cidadãos. O
fascismo também significa o predomínio absoluto de um partido político. O sistema
político do fascismo é corporativo. A representação do povo através de corporações
foi vista como democracia orgânica, isto é, uma maneira natural de participação
política do povo. No entanto, as corporações fascistas não serviram de
representação do povo, pelo contrário, serviram para controlá-lo através da cúpula
política liderada pelo chefe supremo do regime. Para reforçar esse sistema
totalitário, os seus líderes faziam frequentemente uma exaltação nacionalista e
racista. Como a ditadura é cronicamente insegura perante o povo, os movimentos
fascistas transformaram-se em organizações paramilitares armadas. A nível
económico, este regime, preservando a propriedade privada, aproximou-se de uma

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

economia de planeamento, controlada pelo governo, pelo partido único e pelo seu
líder. No plano externo, o fascismo teve um projecto de expansão territorial.

O fascismo surgiu primeiro em Itália, em 1919. Este país não ficou feliz com a
sua participação na Primeira Guerra Mundial, pois gastou imensos recursos e não
obteve compensações significativas. Nomeadamente a expansão territorial italiana
que ficou aquém do esperado e desejado. A não satisfação das suas reivindicações
na Conferência de Paz em 1919, deram à população uma “vitória incompleta”. A
Itá lia atravessava entã o uma grave crise moral e econó mica (posteriormente agravada
pela recessã o). Nesta situaçã o, a maioria da populaçã o estava recetiva a uma soluçã o
radical. Foi Benito Mussolini que tomou o poder em 1922. Foi o primeiro regime fascista a
ser implementado definitivamente. Este movimento só pô de ser implantado, porque
encontrou uma ampla base social de apoio e condiçõ es propícias ao seu desenvolvimento.

Também na Alemanha se instala um regime de índole fascista. Com o fim da I


Guerra Mundial, a Alemanha (grande derrotada) foi varrida por uma crise
económico-financeira sem precedentes (foi o país europeu mais devastado
economicamente). À crise económica, marcada pela hiperinflação e pelo
desemprego, juntou-se a humilhação do Tratado de Versalhes (os alemã es tinham a
seu cargo o pagamento de pesadas indemnizaçõ es aos aliados). Os governantes alemã es
deparavam-se com o profundo ressentimento que o seu povo sentia pelo diktat de
Versalhes. As humilhaçõ es infligidas à Alemanha estavam presentes na memó ria alemã .
Assim, o exacerbado nacionalismo persistia e uma camada de população recordava
com nostalgia os tempos do Império Alemão. Dias após a sua nomeação como
Chanceler, Hitler dissolve o Reichstag na esperança de que, com novas eleições,
consiga a maioria. A ascensão de Hitler deve-se à sua habilidade política, às divisões
dos partidos políticos tradicionais e à desagregação das instituições republicanas, à
incapacidade do velho presidente Hindenburg, mas sobretudo ao recurso à
violência, à propaganda e ao apoio dos descontentes, das classes médias e dos
capitalistas industriais e financeiros. O nazismo reforça o lado protecionista alemão.

Na Alemanha, as suas ações têm como objetivo construir aquilo que Hitler
denomina por “Espaço Vital”. Esta teoria do Espaço Vital constituiu a
fundamentação ideológica de uma série de ocupações dos territórios vizinhos. Um
Estado dinâmico, com um grande crescimento económico, necessita de espaço. A
necessidade básica territorial de sobrevivência é considerada espaço vital, mas se a

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economia cresce, esse espaço deve ser alargado. Por outras palavras, as fronteiras
podem ser alteradas em conformidade com o aumento da força de um Estado. A
Alemanha estava em pleno crescimento económico, necessitava de território, de
que os outros Estados não iam desistir sem luta. Em 1935, o território do Sarre que,
de acordo com o Tratado de Versalhes ficava sob o controlo da SDN, passou para a
Alemanha. Em 1936, Hitler remilitariza a Renânia, desobedecendo ao Tratado de
Versalhes; celebrou com Mussolini o Eixo Roma-Berlim; Afirma com o Japão um
pacto, com o objectivo de combater o expansionismo do comunismo soviético. Esta
aproximação do Japão à Alemanha deve-se, essencialmente, à viragem da política
japonesa para uma direcção mais nacionalista e autoritária; Em 1938, Hitler anexou
a Áustria (Anchluss); no mesmo ano, anexou a região checa dos Sudetas; Em 1939,
Hitler, pretendendo evitar complicações a leste, celebra um pacto de não-agressão
com a URSS, que incluía a partilha da Polónia e a integração na URSS dos países
bálticos.

Na década de 30, perante as dificuldades económicas derivadas dos efeitos


da grande recessão, numerosos países aderiram aos regimes autoritários. O
fascismo irradiou-se pelo Mundo. Podemos salientar o exemplo da Itália, da
Alemanha, de Portugal, o caso de Espanha: o general Franco, apó s a vitó ria na Guerra
Civil, em que contou com os apoios da Alemanha e da Itá lia. E Portugal, estabeleceu um
regime ditatorial; e o caso do Japão: em 1926, a subida ao poder do Hirohito marca o
fim do processo de democratização e ocidentalização encetado em meados do
século XIX. Mas noutros países como a Bulgá ria, a Grécia, a Roménia, a Argentina, o Chile
e o Brasil também se fez sentir o avanço dos totalitarismos.

A crise mundial do capitalismo levou o imperialismo japonês, mais fraco que


o seu concorrente no pacífico, os EUA, ao paroxismo nacionalista, formando um
governo dominado por uma casta militar fascista que se organizou para esmagar
completamente os seus vizinhos asiáticos e retirá-los da esfera de influência dos
imperialismos rivais dos EUA, da Inglaterra e da França como uma vida de saída da
crise. Tratava-se de um país que dependia muito do comércio mundial, uma vez que
necessitava de matérias-primas e de mercados externos para exportar. O principal
objetivo visado pelo imperialismo japonês era dominar a China. A subida ao poder
de Hirohito em 1926 marca o fim do processo de democratização e ocidentalização
encetado em meados do século XIX. Por outro lado, o Japão pôde crescer
industrialmente (através de uma política agressiva) e criou uma burguesia e uma força

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militar (através do aumento das despesas militares). De resto, sentiu a recessão de


uma forma intensa, tornando-se num regime dominado pelos militares e elevando a
pressão pela procura de colónias. Houve mesmo o plano Tanaka, que se baseava na
ideia de conquistar outros territórios para que diminuísse a dependência do
comércio internacional. O Japão invadiu a Manchúria, mesmo sendo membro
permanente da SDN. Quando saiu desta, criou o protetorado da Manchúria, que fora
retirado à China. Era uma estratégia de abrir portas ao mercado chinês. O
Governante Chinês Kai-Chek deu conta da intenção invasora do Japão e não gostou.
A recusa na Carta da SDN do seu pedido de tratamento racial igualitário fez
exacerbar o sentimento nacionalista japonês, considerando-se uma necessidade a
construção de um império, à semelhança do espaço vital alemão. É por isto que, em
1937, o Japão invade a China e avança pelo seu território sem encontrar grande
oposição (instala um governo provisó rio em Nankin). Pode-se concluir que a IIGM
iniciou-se no momento em que surge a segunda fase da expansão da China (1937)
por parte do Japão. Algumas das grandes cidades chinesas ficaram sob domínio
japonês até 1938, tudo isto antes do começo da IIGM na Europa.

Os regimes totalitários afirmavam sem quaisquer reservas o seu carácter


militarista e imperialista. Com efeito, as suas bases sociais de apoio foram
alimentadas com promessas ultranacionalistas de alargamento das fronteiras dos
respectivos territórios pela agressão expansionista, nem que para isso tivessem de
violar todos os tratados e convenções internacionais. Assim, em particular a
Alemanha, a Itália e o Japão marcaram os anos 30 pelas sistemáticas agressões à
nova ordem internacional, inviabilizando todas as intenções de paz e de cooperação
entre os estados-membros da Sociedade das Nações.

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A II Guerra Mundial

A II Guerra Mundial deu-se entre 1939 e 1945. Esta foi uma guerra essencialmente
ideoló gica, onde se verificou um conflito entre Liberalismo, Comunismo e Fascismo. Pode
dizer-se que as causas (além do surgimento dos regimes totalitá rios) desta guerra
estiveram nas determinaçõ es do Tratado de Versalhes. Este Tratado, assinado em 1919 e
que encerrou oficialmente a Primeira Grande Guerra, determinava que a Alemanha
assumisse a responsabilidade por ter causado a IGM e obrigava o país a pagar uma dívida
aos países prejudicados, além de outras exigências como o impedimento de formar um
exército reforçado e o reconhecimento da independência da Á ustria. Isso é claro, trouxe
revolta aos alemã es, que consideraram estas obrigaçõ es uma verdadeira humilhaçã o.

Para os alemã es, as fronteiras definidas pelo Tratado de Versalhes forneciam ainda
mais motivos para a existência de um nacionalismo xenó fobo. Alguns alemã es encaravam
desfavoravelmente a separaçã o entre os Austríacos de língua alemã e a Alemanha, bem
como o domínio dos checos sobre alemã es que se seguiu à queda da monarquia dos
Habsburgo e à criaçã o da Checoslová quia.

A base do capitalismo alemã o era uma base nacional, apesar da presença de


empresas americanas. Alguns historiadores chegam mesmo a dizer que os capitalistas
americanos trouxeram aos capitalistas alemã es o apoio financeiro e político possível à
agressã o hitleriana. O desejo de Hitler consistia em expandir os domínios territoriais da
Alemanha e ampliar, desta forma, a obtençã o de poder e recursos materiais
(principalmente matérias-primas). Em termos de ajuda econó mica, apó s Versalhes, os
bancos e os “trusts” americanos multiplicaram na Alemanha investimentos de capitais e
créditos. Como conclusã o, a primeira condiçã o da agressã o hitleriana foi o renascimento
da indú stria metalú rgica e química de guerra na Alemanha. Este renascimento só foi
possível graças ao auxílio dos meios dirigentes do capital e da política dos EUA (grande
parte do armamento do exército alemã o era produzido pelos americanos). Estes objetivos
militaristas e expansionistas também estavam presentes, no final da década de 1930, na
Itá lia fascista de Mussolini e no Japã o. Em 1934, a Itá lia encontrava-se ao lado das
potências vencedoras da IGM (França eInglaterra). A Alemanha tentou anexar a Á ustria e a
Itá lia, algo que nã o acontece devido à Conferência de Stresa. É garantida a independência
da Á ustria, bem como é impedido a promoçã o do rearmamento alemã o (um dos objetivos
de Hitler). Os italianos nã o queriam sair da sombra porteira dos vencedores da IGM e,
portanto, fazem um pacto com Inglaterra e França.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A Itá lia entrou num processo de conquistas coloniais na década de 30. Em Outubro
de 1935, a Itá lia (cujos militares estavam instalados na Somá lia e na Eritreia) afirmou seu
imperialismo invadindo a Etió pia, país independente situado no nordeste da Á frica e que
constituía o ú nico Estado que ainda nã o tinha sido dividido. Este é o ponto de viragem na
política mundial estando na base da IIGM. A Inglaterra (que controlava o Nilo) nã o
aceitava que a França controlasse a Etió pia, pois isso iria pô r em causa o seu pró prio
controlo, e por isso, a SDN determinou que seus Estados membros restringissem o
comércio com a Itá lia.

Tal proibiçã o, no entanto, nã o chegou a afetar a Itá lia, porque naçõ es fortes como
os Estados Unidos e a Alemanha - que nã o faziam parte da SDN - continuaram a vender-lhe
matérias-primas essenciais, como petró leo e carvã o. A conquista da Etió pia pela Itá lia,
consumada em 1936, provou ao mundo que a SDN era incapaz de assegurar a paz mundial.
Isto provocou um ponto de rutura/colisã o entre Itá lia e a Entente Anglo-Francesa. A
Alemanha alia-se aos transalpinos e celebrava entã o um pacto com Mussolini (Eixo Roma-
Berlim), onde foram anexadas vá rias regiõ es que permitiam regular o comércio e a política
externa de países como a Á ustria e a Checoslová quia. O "Eixo Roma-Berlim" tornou-se
uma aliança militar em 1939 com o Pacto de Aço. Foi um acordo entre os governos da
Itá lia fascista e da Alemanha nazista, firmado em 1939, que estabelecia uma aliança em
caso de ameaças internacionais, bem como ajuda imediata e suporte militar em caso de
guerra e colaboraçã o na produçã o bélica e no campo militar. Além disso, nenhuma das
partes poderia firmar paz sem o consentimento da outra. As anexaçõ es territoriais da
Á ustria e da regiã o checa dos Sudetas foram realizadas pela Alemanha em 1938.
Posteriormente, em 1939 Mussolini anexa a Albâ nia.

A expansã o japonesa interferia também na política europeia. A Alemanha afirma


com o Japã o um pacto anticomunista em 1936 (Pacto Anti-Komintern), cujo objetivo era
combater o expansionismo do comunismo soviético. Em caso de ataque da URSS contra
a Alemanha ou o Japã o, os dois ú ltimos comprometiam-se a efetuar consultas acerca das
medidas a serem tomadas para proteger os seus interesses comuns. Também
concordaram que nenhum dos dois concluiria tratados políticos com a URSS. Esta
aproximaçã o do Japã o à Alemanha deve-se, essencialmente, à viragem da política japonesa
para uma direçã o mais nacionalista e autoritá ria. Em 1937, a Itá lia aderiu a este pacto.
Apó s ter firmado com a Alemanha o Pacto do Aço, integra os seus objetivos militares em
1940, com o Pacto Tripartite. Através deste, formalizou a aliança conhecida como Eixo

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Roma-Berlim-Tó quio. Foi idealizado por Hitler para intimidar os EUA e tentar mantê-lo
como país neutro durante a guerra. Porém, na prá tica acabou legitimando a entrada
americana no conflito europeu, quando este declarou guerra ao Japã o, apó s o ataque
japonês a Pearl Harbor.

Perante o desrespeito das normas dos tratados de paz e dos termos do pacto da
SDN, as democracias ocidentais reagiram muito passivamente. A SDN manifestou uma
atitude displicente em relaçã o aos países que violaram as clá usulas do seu pacto. O Reino
Unido e a França nã o impediram Hitler de atuar logo em 1938 porque ambos nã o estavam
preparados para a guerra. A nível econó mico, financeiro e industrial eram muito mais
fracos do que a Alemanha. Para além disso, os britâ nicos e os franceses nã o tinham
nenhuma vontade psicoló gica de entrar numa nova guerra depois das terríveis perdas que
tiveram durante a IGM. Também, sem o apoio dos EUA, os exércitos francês e inglês
tinham poucas probabilidades de resistir perante as forças armadas de Hitler.

Outra razã o encontrava-se na esfera ideoló gica. Os regimes liberais consideravam


a revoluçã o bolchevique como o inimigo principal e, por isso, nã o pensavam, de maneira
alguma, que fosse possível uma aliança militar com a URSS. Acreditando nas promessas
feitas por Hitler de que, resolvido o problema dos Sudetas, nã o haveria mais problemas na
Europa, as democracias ocidentais cederam na celebraçã o do Pacto de Munique, em 1938,
aceitando a integraçã o daquela regiã o nas fronteiras alemã s. Estes sã o os principais
exemplos da atitude passiva das democracias, as quais nã o notavam que, com as suas
tentativas de pacificaçã o, estavam a dar oportunidades à Alemanha e à Itá lia de testarem
as suas armas.

O ú ltimo obstá culo à guerra foi a posiçã o da URSS. A França já tinha tentado fazer a
Guerra e em 1934 ofereceu um lugar à Rú ssia na SDN. Esta ao início pensou em aceitar o
lugar, mas depois mudou de opiniã o por causa da Poló nia (um novo país criado na
sequência dos tratados e que ninguém queria), pois achava que tinha sido criada numa
á rea que já tinha influência (só aceitaria se tivesse livre acesso ao territó rio em questã o). A
França nã o quis sacrificar a aliança com a Poló nia e a URSS desistiu do seu possível lugar
na SDN e da sua aliança com a França.

Em 23 de agosto de 1939, Hitler, pretendendo evitar complicaçõ es a leste, celebra


um pacto de nã o-agressã o com a URSS, que incluía a partilha da Poló nia e a integraçã o na
URSS dos países bá lticos. Alemanha e URSS (que mudara a sua política externa)

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

comprometeram-se a nã o se atacarem uma à outra e a manterem-se neutras se uma delas


fosse atacada por uma terceira potência. Num protocolo adicional secreto ficou combinada
uma divisã o da Poló nia e da Finlâ ndia, sendo que os Estados bá lticos e Bessará bia foram
prometidas à URSS. Oito dias antes do ataque alemã o à Poló nia, o protocolo referia uma
“reorganizaçã o politico-territorial” do Estado polaco e de uma invasã o pelas tropas de
Wehrmacht (conjunto das forças armadas da Alemanha durante o Terceiro Reich entre
1935 e 1945).

Quando em 1939, a Alemanha anexa toda a Checoslová quia, é que as democracias


ocidentais começaram a perceber que os acordos do Munique tinham sido mais uma
cedência à política de chantagem dos ditadores. Ou seja, com tanta preocupaçã o pelo
perigo da URSS, ninguém deu a devida atençã o ao perigo que o fascismo na Alemanha
proporcionava, chegando até a ajudar só para conseguirem derrotar a URSS. A 3 de
setembro de 1939, dois dias apó s a entrada das tropas alemã s no territó rio polaco (que
quebrava o pacto de nã o-agressã o), a França e a Inglaterra declaram guerra à Alemanha.
Iniciaram também um bloqueio naval à Alemanha, que tinha como objetivo danificar a
economia do país e o seu esforço de guerraFoi o início da II Guerra Mundial, o conflito
mais violento da Histó ria. Portanto, uma das causas desta guerra foram os desejos
expansionistas.

“Os Tratados de Versalhes não resolveram as contradições entre concorrentes


Capitalistas (…). Os beneficiários do estatuto de 1919 pretenderam conservá-lo[s],
mas a Alemanha, a Itália e o Japão uniram-se para destruí-lo[s]. Um tratado entre
potências capitalistas consagra simplesmente uma repartição do mundo em função
de uma relação de forças e assim traz em si o germe de uma outra guerra por uma
nova repartição do mundo, logo que a relação de forças de altera.”

Fonte (?)

“Era imprescindível para o sucesso dos Nazis e para a eventual aceitação de Hitler
por parte dos Alemães, no que diz respeito à política externa, que o povo alemão
acreditasse que os seus infortúnios económicos e políticos eram uma consequência da
imposição e da aplicação do Tratado de Versalhes por parte dos predadores
estrangeiros. Poucos alemães sentiam qualquer «culpabilidade» especial em relação
à Primeira Guerra Mundial e não sentiam que as suas dolorosas consequências,
encarnadas no Tratado de Versalhes, representassem um castigo justificado.”

R.A.C. Parker, História da 2ª Guerra Mundial

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

“No entanto, e porque as potências europeias queriam impedir o avanço da URSS,


não houve protestos por parte de França, Inglaterra e EUA quando a Alemanha
anulou unilateralmente o artigo do Tratado de Versalhes de 1919 sobre a limitação
dos efetivos do exército e do armamento do Estado alemão. Pouco depois, era
proclamado no país o serviço militar obrigatório. A Alemanha nazi-fascista criou um
exército, uma armada e uma aviação poderosos.”

Lições da Segunda Guerra Mundial – Oleg Rjechévski

“Tendo desistido de conseguir a colaboração dos Polacos contra a URSS, Hitler


começou a procurar a ajuda da URSS contra a Polónia. No dia 23 de Agosto de 1939
foi assinado o Pacto Germano-Soviético, que incluía cláusulas secretas no que
respeitava às esferas de interesse soviético nos países fronteiriços com a URSS e,
como se tornou evidente em Setembro, planos para uma divisão da Polónia.”

R.A.C. Parker, História da II Guerra Mundial

A hegemonia alemã até 1942

Quando a guerra se iniciou, era previsível que as potências com um capitalismo de


base mais fechado conseguissem algumas vantagens iniciais. Nos primeiros meses de
guerra, assistiu-se ao avanço impará vel dos alemã es por quase toda a Europa. Em menos
de um ano, a Europa continental caiu sob o poder alemã o, tã o rá pida e poderosa foi a sua
ofensiva militar. Pela primeira vez é utilizada em larga escala a estratégia da Guerra
Relâ mpago (blitzrieg). Durante a II Guerra Mundial, existiam duas grandes frentes. A
frente oriental iniciou-se com bombardeamentos maciços realizados pela aviaçã o
(luffwaffle) a Varsó via (primeira capital europeia a conhecer as agruras do bombardeio
aéreo). Os alemã es tencionavam conquistar o territó rio polaco rapidamente, antes que as
chuvas de outono tornassem os movimentos mais difíceis e que os franceses pudessem
atacar a oeste.

Os comandantes polacos esperavam poder resistir aos ataques alemã es até que a
ofensiva francesa, com a qual contavam, fizesse recuar as tropas alemã s. Face a esta
invasã o, a Inglaterra e a França enviam ultimatos, exigindo a retirada imediata das forças
alemã s do territó rio polaco - dando-lhes um prazo de vinte quatro horas - findo os quais
automaticamente se declarariam em guerra com a Alemanha. A 3 de Setembro, chegam à
Chancelaria alemã as declaraçõ es de guerra. Apesar dos esforços, os polacos nã o têm

79
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

condiçõ es de deter a poderosa má quina militar germâ nica. Em apenas três semanas, a
Poló nia caiu em poder dos alemã es, acabando por se render incondicionalmente.

A Frente Ocidental foi a segunda maior frente e mais importante durante a II


Guerra Mundial. Em abril de 1940, capitulavam a Dinamarca e a Noruega; em maio, deu-se
a invasã o da Holanda e da Bélgica, por onde se processou a entrada em França, cuja capital
cedeu ao avanço triunfante dos alemã es, em meados de junho. Em pouco mais de um mês,
praticamente todo o territó rio francês estava ocupado pelos nazis.

Dominada a França, Hitler arranca imediatamente com o plano de invasã o da


Inglaterra. O grande objectiva era destruir a Royal Air Force (RAF). Para o efeito, submeteu
as á reas estratégicas de Londres a um intensíssimo bombardeamento. Porém, apesar de
isolado, o Reino Unido resistiu, ajudado pela recente invençã o do radar e graças ao talento
dos pilotos da RAF. A 15 de setembro de 1940, na que ficou conhecida como a batalha de
Inglaterra, os céus do Canal da Mancha assistiram à derrota da força aérea alemã . Sem
conseguir a vitó ria, o comando alemã o decidiu suspender a invasã o da Inglaterra e virar-
se para a conquista do Leste europeu. A frente ocidental permaneceu intacta desde 1940
até a Batalha da Normandia, em junho de 1944.

A frente oriental foi a principal frente europeia durante a II Guerra Mundial, e


constituiu o teatro de guerra entre o Reich Alemã o e a Uniã o Soviética entre de junho de
1941 e maio de 1945. A frente cobriu a Europa Central e Oriental, foi aberta pela
Alemanha nazista ao invadir a Poló nia em 1939 e encerrada pela URSS ao capturar Berlim
em 1945, mantendo-se temporariamente inativa em 1940. A Propaganda nazi apelidou o
conflito de "batalha pela sobrevivência contra o bolchevismo" ou "cruzada contra o
bolchevismo". Em todos as propagandas soviéticas e na maioria das fontes russas, o
conflito militar no Leste da Europa é referido como Grande Guerra Patrió tica, mas à s vezes
essa expressã o também inclui operaçõ es contra o Japã o Imperial em 1945

Em junho de 1941, a guerra sofreu, pois, uma mudança radical. Hitler rompe o
pacto germano-soviética e as forças armadas deram início à invasã o da URSS. O ataque foi
fulminante. Perante um exército mal preparado e mal dirigido, a Wehrmacht (infantaria
alemã ), em menos de um mês, chegava à s portas de Leninegrado e, em mais de três meses,
instalava-se nos arredores de Moscovo. O pacto de nã o-agressã o, uma aliança entre dois
ditadores e dois Estados com regimes completamente opostos -, que deveria possibilitar
aos dois parceiros conquistas territoriais e políticas de grandes proporçõ es e, ao mesmo

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

tempo, mudar o equilíbrio político na Europa, é considerada por muitos uma má cula na
histó ria. Os alemã es nã o estavam interessados em conquistar grandes cidades russas,
queriam apenas alcançar grandes zonas petrolíferas dentro do territó rio para assim
controlarem o petró leo russo.

Verifica-se entã o uma hegemonia alemã , que rapidamente invadiu territó rios e
exerceu a sua força e poder, para alcançar mercados protegidos e expandir a sua base
nacional. Os alemã es nã o estavam interessados em conquistar grandes cidades russas,
queriam apenas alcançar grandes zonas petrolíferas dentro do territó rio para assim
controlarem o petró leo russo (este recurso era uma arma estratégica para os exércitos). A
Rú ssia era um reservató rio da produçã o industrial e energética e o segundo maior
produtor de petró leo mundial, que era proveniente do Azerbaijã o). Era uma regiã o
estratégica, pois dava ligaçã o ao Mar Cá spio e ao Médio Oriente. Se chegassem a esta zona,
teriam praticamente tudo sob controlo.

O recuo alemão depois de Estalinegrado e dos desembarques


americanos

Face a esta invasã o, os russos sabiam que tinham algum tempo até que os alemã es
chegassem, e por isso prepararam tudo (transferiram grande parte das suas unidades
industriais para as zonas circundantes do rio Volga). A 17 de Julho de 1942 deu-se a
Batalha de Estalinegrado. Esta batalha realizada no Cá ucaso foi uma operaçã o militar
conduzida pelos alemã es e seus aliados contra as forças russas pela posse da cidade de
Stalingrado e durou até 1943. Os soviéticos, ajudados pelo seu vasto territó rio e
recorrendo a todo o tipo de recursos/mã o-de-obra que tinham, organizam um contra-
ataque ao exército alemã o, que perde milhares de militares e começa a recuar.

No mesmo ano, os alemã es tentam, novamente, enfraquecer a URSS. O exército


alemã o promove investidas sobre o Cá ucaso para ganhar mais territó rio. No entanto,
vêem-se cercados pelos soviéticos e rendem-se em Estalinegrado. Esta batalha constitui
assim o primeiro ponto de viragem nesta guerra, colocando em causa a hegemonia alemã
consolidada até à altura.

Entretanto, em 1942, a Líbia e o Egito caem em poder dos alemã es. A guerra no
Mediterrâ neo intensificava-se com a ocupaçã o do Norte de Á frica pelos exércitos nazis,
com o objetivo de defender o Sul da Europa de uma possível invasã o por parte da
resistência aliada, que acabou por suceder. Quando os EUA entraram em Guerra,

81
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

desembarcaram em Á frica e obrigaram a Alemanha a recuar. Os alemã es recuaram tanto


que acabar por se dispersar de Á frica, regressando à Guerra na Europa. Até 1942 nã o
havia praticamente coordenaçã o nenhuma entre os aliados. A partir daqui, os soviéticos
exigiram que os americanos abrissem frentes na Europa. No final de 1942, a guerra
estendia-se a todo o mundo.

Todavia, a partir de 1943, começa a derrocada do Eixo. Os alemã es sã o derrotados


no Norte de Á frica por tropas americanas e inglesas, iniciando-se a invasã o aliada da
Sicília, que foi reconquistada em julho desse ano. Em julho de 1944, os aliados entraram
em Roma.

No leste, depois da vitó ria de Estalinegrado, os soviéticos iniciam o avanço para


Ocidente e, nos dois anos seguintes, conquistam a Roménia, a Poló nia, a Bulgá ria, a
Checoslová quia e a Hungria.

A Guerra no Pacífico

No Mediterrâ neo, o avanço dos alemã es contava com o apoio dos exércitos de
Mussolini e com a ascensã o, por toda a Península Balcâ nica, de regimes conservadores.
Muitos deles, sob pressã o de Hitler, integraram também o Eixo Berlim-Roma-Tó quio,
entretanto constituído pelas potências totalitá rias. Portanto, sem só lidos apoios no Sul da
Europa, a força aérea inglesa, obrigada a utilizar as bases no Egito e na Líbia, encontrava
grandes dificuldades em suster a iminente entrada dos Alemã es no Norte de Á frica.

A hegemonia sobre o Pacífico, onde os americanos detinham grande poder e


influência, levou o Governo japonês a atacar a base naval americana de Pearl Harbor em
dezembro de 1941, o que provou o envolvimento imediato dos EUA no conflito, ao lado
das democracias europeias. O Japã o invadiu o Havai por forma a estes nã o se conseguirem
defender; assim, os japoneses poderiam ocupar os territó rios asiá ticos percententes à
Holanda, França, Inglaterra e Portugal.

O conflito estendia-se, agora, ao Pacífico e ao continente asiá tico, onde os


japoneses, graças à s suas ofensivas militares vinham edificando um poderoso impérios
que lhes assegurava o controlo de ricas fontes de matérias primas essenciais para a sua
indú stria e, ao mesmo tempo, o domínio de importantes á reas estratégicas que se
estendiam da Manchú ria até à Oceâ nia.

82
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

O Japã o entrou na frente ocidental pois interessavam-lhe os mercados fechados do


Pacífico e a zona das Índias Orientais (Indonésia, Malá sia e Indochina), uma regiã o
produtora de petró leo. Os japoneses decidiram ocupar as coló nias europeias do Pacífico,
declarando guerra à s potências ocidentais. Entre 1940 e 1941, começam a desenvolverse
tecnologicamente e a promover o seu domínio no Sudoeste Asiá tico, que pertencia aos
norte-americanos. Assim, ocupam toda a regiã o do Pacífico tropical.

Apesar de ter assinado o Pacto Tripartite em 1940, o grande problema do Japã o


era o interesse e a dependência em relaçã o aos EUA. A tensã o com os EUA aumenta ainda
mais, com os americanos (principais produtores de petró leo) a deixaram de vender
petró leo ao Japã o, por este ser aliado da Alemanha. Portanto, os EUA entram abertamente
em conflito com o Japã o. A hegemonia sobre o Pacífico, onde os americanos detinham
grande poder e influência, levou o Governo japonês a atacar a base naval americana de
Pearl Harbor em dezembro de 1941.

Isto provocou o envolvimento imediato dos EUA no conflito, ao lado das


democracias europeias. A sua participaçã o na guerra era, até entã o, indireta já que
preparavam os seus exércitos e armamentos nas suas bases localizadas em pontos
estratégicos do planeta. Este ataque constituiu o segundo ponto de viragem, pois levou à
entrada dos EUA na II Guerra Mundial. O conflito estendia-se, agora, ao Pacífico e ao
continente asiá tico, onde os japoneses, graças à s suas ofensivas militares, vinham
edificando um poderoso império que era governado por um autoritá rio imperador e que
lhes assegurava o controlo de ricas fontes de matérias-primas essenciais para a sua
indú stria e, ao mesmo tempo, o domínio de importantes á reas estratégicas que se
estendiam da Manchú ria até à Oceâ nia. Perante o ataque ao aliado asiá tico, Hitler declara
guerra aos EUA.

O primeiro dos acordos firmados entre a Rú ssia (Josef Stalin), os EUA (Franklin
Delano Roosevelt) e a Inglaterra (Winston Churchill) ocorreram no ano de 1943, em
Teerã o. Além de lançarem bases quanto à s definiçõ es de partilhas, decidiu-se que as forças
anglo-americanas interviriam conjuntamente com as forças orientais soviéticas na França,
completando o cerco de pressã o à Alemanha (dia D). Deliberou-se ainda sobre a divisã o da
Alemanha e as fronteiras da Poló nia ao terminar a guerra, além de se formularem
propostas de paz com a colaboraçã o de todas as naçõ es. Os Estados Unidos e o Reino

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Unido reconheceram, ainda, a fronteira soviética no Ocidente, com a anexaçã o da Estó nia,
da Letó nia, da Lituâ nia e do Leste da Poló nia.

O dia D aconteceu em 6 de junho de 1944, quando as forças aliadas


desembarcaram, surpreendentemente, na Normandia e teve início a reconquista da
Europa Central. As forças norte-americanas, inglesas e francesas e seus aliados invadiram
a França, entã o ocupada pelos alemã es. Foi uma decisã o política para manter a liberdade
na Europa, ocorrida depois da derrota alemã para o Exército Vermelho, na famosa Batalha
de Stalingrado (1942/1943). Com a entrada dos soviéticos em Berlim, em maio de 1945, a
derrota de Hitler passa a ser uma questã o de dias. Efetivamente, a rendiçã o total e
incondicional da Alemanha veio a ser assinada pelo alto comando nazi, em 7 de maio, já
com Hitler morto. O Dia da Vitó ria na Europa constitui entã o a data formal da derrota da
Alemanha Nazi em favor dos Aliados na II Guerra Mundial.

Faltava resolver uma outra guerra que se arrastava desde 1941: a Guerra do
Pacífico. Esta foi dividida em duas etapas. Entre 1937 e junho de 1942, quando o Japã o se
manteve na ofensiva e foi vitorioso na ocupaçã o de grande parte do territó rio chinês e
também na destruiçã o da frota americana em Pearl Harbor, assim como na tomada de
Hong Kong e Singapura, na invasã o e ocupaçã o da Tailâ ndia, Birmâ nia, Malá sia, Filipinas,
Nova Guiné, Índias Orientais Holandesas, Ilhas Salomã o e das bases americanas de Guam e
Wake.Já em 1942 tem-se a vitó ria da marinha e da aviaçã o norte-americana na batalha
naval de Midway, o que impediu o desembarque das tropas japonesas no atol e resultou na
destruiçã o dos quatro principais porta-aviõ es do Japã o. A ofensiva passou, entã o, para os
aliados, que, nos três anos seguintes reconquistariam todos os territó rios tomados,
através de grandes batalhas terrestres e navais (Guadalcanal, no Mar de Coral, Tarawa,
Golfo de Leyte, Filipinas, Saipan, Iwo Jima e Okinawa).

Apesar de destruírem as bases americanas, os japoneses acabaram por nã o


destruir as reservas de petró leo existentes. Com o ressurgimento da sua frota, os
americanos acabaram por superar os seus adversá rios e começaram a retirar as coló nias
europeias que o Japã o tinha ocupado.

A guerra no Pacífico inverteu-se para o lado dos Aliados, em junho de 1942. A


partir de 1943, os americanos recuperam o controlo do Pacífico e só uma resistência
suicida dos japoneses ia conseguindo suster um avanço mais rá pido das tropas americanas

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

e australianas. Era o tempo dos kamikazes, pilotos japoneses que lançavam os seus aviõ es
contra os alvos inimigos.

A passagem para a guerra nuclear

Em 1944, os japoneses já tinham sido expulsos de muitos territó rios asiá ticos.
Entretanto, alemã es e americanos desenvolveram muitos projetos ao longo da IIGM.
Separadamente, desenvolveram armas estratégicas novas, como o míssil e a arma nuclear
(bomba ató mica). Em fevereiro de 1945, os aliados desembarcavam no arquipélago
japonês.

A Conferência de Potsdam ocorreu na Alemanha em julho de 1945, entre o


presidente Harry Truman dos EUA, o primeiro-ministro Clement Attlee da Grã -Bretanha e
o marechal Stalin, presidente da URSS. Destinou-se a fixar a política a seguir para com a
Alemanha (vencida na II Guerra Mundial), a lançar os fundamentos da paz futura na
Europa e no mundo, e a resolver todas as dificuldades provocadas pela guerra, terminada
apenas a 7 de maio desse mesmo ano. A Conferência teve lugar em Potsdam, por esta
cidade ser considerada o centro simbó lico do militarismo e da agressividade prussiana,
com o que se quis demonstrar o fim desses valores.

Numa fase inicial, os americanos queriam que os soviéticos declarassem guerra ao


Japã o. Para facilitar a ocupaçã o do terreno nipó nico, pretendiam esta intervençã o já em
1945. Só que, no final da conferência, os americanos tinham completamente preparada a
bomba ató mica. Por esta razã o recuaram nas suas pretensõ es para com os soviéticos.
Perante a resistência já irracional dos japoneses, os americanos, numa demonstraçã o da
sua força como superpotência, lançam em agosto de 1945 bombas ató micas em Hiroshima
e Nagasaki. Um discreto e solitá rio aviã o ("Enola Gay") lançou o mais poderoso artefacto
de guerra de todos os tempos - a Bomba Ató mica - sobre a desprotegida cidade de
Hiroshima, massacrando mais de cem mil pessoas e ferindo outros tantos. Três dias depois
é a cidade de Nagasaki que vai conhecer os horrores da explosã o nuclear. Ao Japã o nada
mais lhe restava senã o render-se. A 17 de agosto de 1945, o Japã o (ú ltima naçã o da aliança
do Eixo a render-se) assinou a sua rendiçã o incondicional. As armas nucleares eram
usadas na guerra. Terminava, portanto, a Segunda Guerra Mundial.

O ataque a Hiroshima tinha sido decidido pelo presidente dos Estados Unidos
Truman, desejoso de acabar com o conflito tã o rapidamente quanto possível, ainda mais
porque a Alemanha já se tinha rendido em maio desse mesmo ano. O presidente foi
85
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

informado do mais secreto projeto aliado durante a guerra, conhecido como projecto
«Manhattan», destinado a conseguir a cisã o do á tomo e assim dominar a tecnologia que
permitiria produzir um engenho explosivo ató mico

A principal razã o apontada pelos historiadores para justificar o fim da II Guerra


Mundial e a consequente rendiçã o do Japã o apó s a explosã o da segunda bomba, decorre de
no mesmo dia em que rebentou a segunda bomba ató mica, a Uniã o Soviética ter declarado
guerra ao Japã o. Seguros de que nã o seria possível enfrentar tanto os americanos quanto
os soviéticos, a maioria dos militares tendeu a aceitar a rendiçã o, por mais desonrosa que
ela fosse para os japoneses mais tradicionalistas. Potência naval por excelência, que tinha
perdido a guerra no mar, o Japã o nã o poderia opor-se em terra ao poder do exército russo,
contra o qual os japoneses tinham tido uma amarga experiência em 1939. A Guerra na
Europa é ganha pelas novas potências dominantes, os EUA e a URSS. O Japã o é derrotado,
começando a recuar e a desocupar os territó rios anteriormente anexados.

A ordem internacional após a II Guerra Mundial

Calcula-se que morreram entre 40 a 52 milhões de pessoas. A IIGM causou


graves consequências a todos os níveis. Verificou-se um grande grau de destruição,
milhões de baixas e falta de liquidez para pagar as importações. As cidades estavam
destruídas, os campos arrasados e as vias de transporte e comunicações
intransitáveis. Aliás, a evolução científica e técnica proporcionou aos beligerantes
armas muito mais mortíferas do que as existentes durante a Primeira Guerra
Mundial. O alcance dos canhões, metralhadoras e espingardas aumentou, mas foram
sobretudo os meios de guerra aérea que causaram as baixas civis. Os aviões
bombardearam insistentemente e causaram enorme destruição, bem como
numerosas vítimas humanas. Pela sua capacidade de destruição destacou-se uma
nova arma: a bomba atómica. Como a força de guerra dependia muito da capacidade
económica, nomeadamente da produção de armas e de comida, as fábricas
tornaram-se alvos legítimos dos bombardeiros. Depois, outros alvos civis foram
proclamados legítimos ao considerar-se que os trabalhadores nas outras fábricas
apoiavam também as máquinas de guerra.

Pode dizer-se que foi praticada uma espécie de guerra total que visava
destruir todos os recursos do adversário para o derrotar igualmente dessa maneira.
Das vítimas civis, vale a pena destacar os milhões de civis que morreram nos

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

campos de concentração. O Estado que sofreu mais baixas foi a URSS. Mais de 20
milhões de cidadãos da União Soviética morreram nos combates ou foram vítimas
da fúria alemã.

O acordo de Potsdam pretendia dar ao povo germânico a oportunidade de


retomar a sua vida em bases democráticas e pacíficas, e banir toda a legislação nazi
discriminatória quanto a raça, crença religiosa e opinião política. A nível político
foram feitas alterações no mapa político mundial: o território alemão foi dividido
em quatro zonas ocupadas e administradas pela URSS, Inglaterra, EUA e França (o
mesmo aconteceu com a cidade de Berlim). Os comandantes-chefes das quatro
principais nações aliadas passariam a controlar, cada um, uma zona definida da
Alemanha, cabendo à URSS a parte oriental e aos EUA, França e Inglaterra a parte
ocidental. Esta divisão daria origem à formação de dois blocos que disputarã o a
hegemonia mundial: Bloco Leste (liderado pela URSS) e Bloco Ocidental (liderado pelos
EUA).

O fim dos impérios coloniais

Uma importante consequência do fim da II Guerra Mundial foi o fim dos


impérios coloniais e, consequente, arranque irreversível dos processos de
descolonização. Os dois acontecimentos que vieram debilitar as relações dos
europeus com as suas colónias correspondem às duas guerras mundiais.

Com o fim da I GM, as potências mundiais aproveitaram para consolidar as


suas ocupações e previa-se que este período de entendimento e Paz estava para
durar. O período entre guerras foi, aliás, uma época de apogeu para as potências
coloniais (representavam cerca de 42% do planeta). Foi nesta altura que a SDN fez
mais considerações relativas às colónias: havia impérios que iam ser dissolvidos e
havia que integrar as suas colónias como mandatos noutros impérios, nos
vencedores. Portanto, para as potências com territórios coloniais, a crise colonial
havia terminado.

No final da IGM, a Europa perdeu o estatuto de centro do poder mundial.


Portanto, era de prever que tivessem existido perturbações nos impérios coloniais.
As colónias começaram a obter um maior poder reivindicativo. As colónias foram,
de uma certa forma, industrializadas e começaram a produzir. As potências
europeias travaram guerras nas colónias, usando grandes quantidades de recursos
materiais. De resto, as metrópoles fizeram grandes requisições de tropas coloniais.

87
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Estando as condições políticas das colónias mudadas, o carácter nacionalista das


mesmas foi desenvolvido, o que fez com que estas se opusessem ao retorno ao
status quo existente antes da guerra.

Mas a II Guerra Mundial foi muito mais séria - a crise foi definitiva. A
correlação de forças entre a metrópole e as colónias alterou-se profundamente, pois
algumas metrópoles e colónias foram ocupadas pelo inimigo. Com o final da IIGM,
origina-se o colapso material dos países europeus. Como não tinha liquidez para a
manutenção dos impérios coloniais, dependiam das exportações americanas. A
perda de importância das outrora potências mundiais, que agora estavam
arruinadas, causou o fim desses impérios coloniais. Isto levou à reconfiguração dos
territórios a nível geográfico. Neste processo decorre o surgimento de novos países.

Factores para as políticas "anti-coloniais": a hegemonia EUA/URSS; a


ONU; os novos organismos multilaterais

A ordem política modificou-se mais na IIGM do que na IGM, significando


perda total da hegemonia europeia para os EUA. Acentuou-se muito mais o panorama
do Dollar Gap (falta de liquidez dos países europeus para pagar as dívidas). Todos os
países europeus acabaram numa posição de inferioridade face aos americanos. Isto
levou os países a negociarem com os EUA, elevando as exportações de capitais para
a Europa (o pró prio fornecimento alimentar estava dependente das exportaçõ es
americanas, pois tinha havido uma hecatombe alimentar).

As duas guerras proporcionaram uma recombinação de poderes e a queda


das potências imperialistas, tendo apenas restado os EUA e a URSS. A IIGM
funcionou como um acelerador de crescimento económico e desenvolvimento
técnico (sobretudo armamento) para as duas potências que daí advieram. Os EUA
queriam fazer exportações para solo alemão, com o objetivo de que esta crescesse.
Tinham muito dinheiro investido nos mais diversos países europeus e esses países
não tinham como pagar esses empréstimos.

As potências europeias que outrora tinham muito poder no panorama


internacional, estavam agora completamente falidas e decadentes. Por isso, tornou-
se difícil manter as áreas de influência que estes detinham antes da guerra. Todos
os países beligerantes acabaram a guerra destruídos e arruinados, numa escala

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

muito maior que a IGM. O grande problema era descobrir como é que a recessão do
pós-guerra podia ser evitada.

Inglaterra e URSS tentaram negociar o crédito. Nas suas cimeiras com os EUA,
discutiram-se a recuperação europeia e o pós-guerra. Entre 1945 e 1947 verificou-
se que a Europa necessitaria muito mais de créditos a curto prazo e que os
americanos não se interessavam com muitos acordos bilaterais. Recorde-se que os
EUA tentavam evitar uma recessão, pois isso teria um forte impacto sobre a sua
economia. Os EUA necessitavam cada vez mais da Europa como mercado. Mas, com a
IGM, aprenderam que uma potência colonial não poderia sobreviver num espaço
económico fechado.

Os EUA verificaram que já nã o lhes interessavam acordos bilaterais devido ao que


aconteceu depois da I GM. Preocupados com a recessão e com as necessidades de
reconstrução da Europa, os EUA fizeram uma grande pressão para que os acordos
fossem feitos multinacional e não bilateralmente, pois o capitalismo já não era
compatível com base nacional. Queriam que a economia europeia deixasse de estar
fechada em ambientes herméticos. Isso implicaria naturalmente uma abertura da
Europa e dos mercados coloniais (um prolongamento dos espaços econó micos
nacionais). Portanto, era necessário levar os países europeus a encontrarem
empresas para gerir estes fluxos de capitais americanos.

Com a derrota do Eixo, vieram ao de cima os antagonismos ideoló gicos que tinham
sido esquecidos durante a IIGM. Designou-se por Guerra Fria o ambiente de tensã o que
caracterizou as relaçõ es entre os governos americanos e soviéticos, desde o final da IIGM
em 1945 até à dissoluçã o da URSS em 1991. Diz-se guerra fria porque os países se
abstiveram de recorrer diretamente à s armas. Utilizavam formas de propaganda
ideoló gica, faziam corridas ao armamento, organizavam açõ es de espionagem, etc…

Os EUA, fazendo uso da sua posição de força, obrigaram os estados europeus


a organizarem-se de uma forma multinacional (ou multilateral). Defendiam um
regime político democrático-liberal e uma economia inspirada no modelo
capitalista. Por seu turno, a URSS estava numa posiçã o de força político-militar. Defendia
um regime socialista do centralismo democrá tico e uma economia coletivizada e
planificada. Além disso, tinha uma força político-militar muito forte. Devido ao facto de os
Estados Unidos nã o quererem acordos bilaterais e como sabia que lhe iriam pedir

89
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

contrapartidas político-militares enormes e que se fosse originado um grande


investimento nos países ocupados por eles, isso iria acarretar problemas, a URSS nã o
estava disposta a negociar com os EUA e criou uma enorme barreira entre os estados
soviético e americano.

É importante referir que ainda o fim da guerra estava longe de todas as previsõ es,
já as forças democrá ticas ocidentais representadas pela Inglaterra e EUA revelavam as
suas preocupaçõ es relativamente à definiçã o do novo quadro geopolítico do mundo pó s-
guerra, perante os sinais expansionistas evidenciados por Estaline.

As sucessivas conferências realizadas à medida que a derrota do Eixo se ia


confirmando como uma questã o de tempo, apesar dos acordos conseguidos, nã o
conseguiam esconder a divisã o do mundo em á reas de influência antagó nicas, tanto
quanto o eram os interesses geoestratégicos e políticos das novas potências aliadas.

Em 1947 entram em vigor os Tratados de Paz elaborados ainda durante a IIGM. O


novo traçado da Europa nã o conseguiu esconder a divisã o do velho continente em duas
á reas perfeitamente delimitadas, dois blocos (ideoló gicos, políticos e econó micos)
antagó nicos: a ocidente do meridiano 12, uma Europa atlâ ntica destruída, incapaz de
rivalizar com as duas novas superpotências, e reconstruída graças à s ajudas econó micas
dos EUA (que abandonam a sua política isolacionista e reforçam o seu papel no cená rio
político mundial) em cuja esfera de influência acabará por cair; a leste do referido
meridiano, uma Europa também destruída, liberta da ocupaçã o nazi graças à açã o do
Exército Vermelho e onde governos comunistas ascendem ao poder.

Em relaçã o aos EUA e à URSS, o confronto ideoló gico entre as duas superpotências
materializou-se na organizaçã o de alianças entre os países de cada um dos blocos. A ruína
econó mica da Europa ocidental e o perigo de os países resvalarem para o campo
comunista, levou o presidente Truman a conceber um plano de recuperaçã o econó mica
europeia. O presidente norte-americano já havia anunciado, em março de 1947, um
programa de ajuda militar e econó mica à Grécia e à Turquia, ocasionado pelo inesperado
anú ncio do governo britâ nico, apenas duas semanas antes, de que já nã o podia suportar os
custos de apoiar aqueles dois países. O Plano Marshall (Economia Recovery Program),
anunciado em junho de 1947, foi proposto no sentido relançar imediatamente a economia
europeia, para permitir a posterior autonomia nacional de cada país. Mas era necessá rio

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

decidir quais os países que deveriam receber os empréstimos. Era preciso criar
mecanismos que permitissem o pagamento posterior desses capitais emprestados.

Para coordenar os fundos do Plano Marshall, organizou-se uma conferência em


Paris, tentando organizar os fundos americanos para a reconstruçã o europeia. O Plano
Marshall nã o só contribuiu para a recuperaçã o dos países da Europa ocidental, como
também reforçou os laços entre os mesmos. Os EUA também beneficiaram da sua
implementaçã o: contiveram o avanço comunista e conseguiram incluir na sua á rea de
influência uma Europa dependente e em recuperaçã o, consumidora dos excedentes da sua
pró spera indú stria. Estaline caiu na armadilha que o Plano Marshall lhe armou.

Apanhado desprevenido, enviou uma grande delegaçã o a Paris para discutir a


participaçã o soviética. Depois retirou-a e proibiu os países sob sua alçada de aceitar a
ajuda, que era oferecida a qualquer país que a solicitasse, com exceçã o da Espanha (por
causa do apoio prestado ao regime nazi durante a II Guerra Mundial). Estaline reagiu ao
Plano Marshall exatamente como os EUA previram: reforçando o seu domínio onde quer
que fosse possível. Criou o Kominform (Secretariado de Informaçã o Comunista, 1947:
tinha como objetivos promover a troca de informaçõ es e dirigir a açã o dos partidos
comunistas sob orientaçã o soviética, assim como exercer um maior controlo sobre os
países de Leste, reforçando a hegemonia soviética nessa parte da Europa), bloqueou a
zona ocidental da cidade de Berlim e formou o COMECON (Conselho para Assistência
Econó mica Mú tua, 1949. Decorrente do Plano Molotov, procurava constituir uma resposta
direta ao Plano Marshall: procurava promover a cooperaçã o econó mica do Leste europeu
e exercer um controlo econó mico mais apertado sobre os países satélites).

Entre 1945 e 1949, os EUA apareceram como uma potência “super imperialista”
numa época de necessidade e de carência econó mica e produtiva. Por outro lado, viam
agora nascer um novo rival econó mico e ideoló gico, capaz de contaminar a Europa que se
encontrava em ruínas, e, por isso, havia uma grande preocupaçã o em conter o avanço da
esfera soviética. Havia uma preocupaçã o, desde logo na Grécia, onde se temia que os
soviéticos avançassem, pois a Inglaterra nã o tinha forças para intervir e, caso nã o
houvesse uma substituiçã o por parte dos americanos, supunha-se que os soviéticos
avançassem. Neste período de recessã o econó mica, dada a grande influência da URSS,
França e a Itá lia faziam parte das grandes incertezas no que diz respeito ao benefício do
Plano Marshall - o comunismo estava muito presente e era capaz de ganhar as eleiçõ es,
pelo que os países estavam ainda em estudo. Em 1948, houve eleiçõ es em Itá lia, e os EUA

91
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

fizeram tudo para impedir a chegada do comunismo ao poder. Desta forma, foi possível
impedir o poder comunista e houve meios para dar ajuda aos italianos.

Com o Plano Marshall, os EUA conseguiriam ver quais os países que poderiam
servir de aliados e também encontrar destinos de exportaçã o de capital. Os americanos
nã o podiam abdicar da economia japonesa e foi, entã o, criado o Plano Dodge, com as
mesmas características do Marshall, para desenvolver o Japã o e para exportar o capital
americano.

Entretanto, a Conferência de Ialta permitiu decidir o que iria acontecer aos


impérios coloniais. É aqui que vemos a hegemonia dos Estados Unidos e da URSS. As
directrizes afirmadas nesta reuniã o determinaram boa parte da ordem durante a Guerra
Fria, precisando as zonas de influência e açã o dos blocos antagó nicos, capitalista e
socialista. O anticolonialismo foi a política adotada pelas potências após a IIGM, em
1945, porque era inadmissível que países como França e Inglaterra, oprimissem
colónias africanas e asiáticas, quando juntas lutaram contra o nazi-fascismo. Essa
prática foi amplamente apoiada pelos EUA e pela URSS (interessados em áreas de
influência), movidos pela Guerra Fria.

Os Estados Unidos eram a potência mais anticolonial, pois desejavam abrir


os mercados coloniais e conquistar novos mercados, quebrando a barreira
protecionista imposta pelas metrópoles. Eram contra a colonização, favoreciam a
autodeterminação dos povos. Concederam a independência às Filipinas, Porto Rico
e Cuba, fruto da sua política anticolonial. Os Governos de Nixon e Roosevelt
praticaram e fizeram cumprir medidas descolonizadoras. No entanto, na prática
também esta posição não foi permanente, havendo mesmo situações em que
punham o anticolonialismo de lado. Em situações de países que eram seus aliados e
não tinha problemas com a abertura do seu mercado colonial (Inglaterra, França e
Portugal), foi permitida a manutenção dos seus impérios coloniais, pois estes não
estavam fechados aos capitais americanos e alinhavam-se com a política americana.
Tornavam-se, portanto, favoráveis à existência de impérios coloniais. Mas esta
posição americana não foi permanente nem intransigente.

A URSS ocupava também uma política anticolonial, mas ao mesmo tempo não
queria estragar as relações que tinha com os outros países. Nos anos 20 tinha
discutido a questão colonial, e uma maneira de dar resposta às guerras civis dentro
do seu território era levar a corrente comunista a esses governos, pelo que a URSS
apoiou também partidos comunistas aquando das eleições em países asiáticos. No

92
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

entanto, caso houvesse outros movimentos com maior hipótese de sucesso, era
esses que a URSS apoiava. Os soviéticos tinham o facto de outros países não terem a
situação política definida para não fazerem muita pressão anticolonial. Eram países
com colónias, mas que hesitavam sobre o que fazer em termos de blocos. Um dos
exemplos é a Itália. Neste contexto, os soviéticos não queriam tomar uma postura
anticolonial, para não empurrar os países para fora da sua área de influência.

Em suma, as potências (EUA e URSS) não eram sistematicamente nem


simultaneamente colonialistas ou anticolonialistas. É neste sentido que a ONU,
formada em 1945, apoiou a autodeterminação dos povos. Nos termos da sua carta,
mantinha a ideia de que certos territó rios poderiam ser anexados. A França e a Inglaterra
tinham acesso direto ao Conselho de Segurança. Era uma organização anticolonialista e
esta orientação levou-a a defender a descolonização de todos os territórios. No
entanto, como não pode intervir nos Estados e nunca poderia impor políticas em
territórios no poder de metrópoles, teve um papel muito limitado no processo de
descolonização, isto é, uma intervenção praticamente nula, pois quando foi criada, a
ONU tinha 45 membros, quase todos defensores do status quo existente. Só depois,
com a entrada de novos membros e o alcance de algumas independências, isto
mudou, passando a tomar posições anti coloniais. O seu orçamento encontra-se
dependente dos estados-membros, pelo que a sua intervençã o é muito reduzida. Não
podia agir, mesmo que houvesse necessidade. Não podia proceder a intervenções
anticolonialistas, pois isso correspondia a um assunto interno dos países. O seu
papel acabou por ser muito reduzido no que diz respeito à descolonização.

Tanto os americanos como os soviéticos não atuaram constantemente para


forçar as descolonizações. Mas não era por causa destas pressões que os impérios
iriam deixar de ter colónias. Existiram três fases de descolonizações: na Ásia, no
Médio Oriente e, por fim, em África. Só na fase final do processo de descolonização
africano é que a ONU teve alguma influência, estando por detrás do caso da Rodésia.
Quando se formou, esta organização apresentava 45 membros, quase todos eles
favoráveis ao status quo. No entanto, foram necessárias

Outras organizações anticolonialistas passam pela Liga Árabe. Alguns


territórios árabes que estavam entregues a potências europeias sob forma de
mandatos, passaram a ter independências fictícias – a maioria sob o poder de

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Inglaterra. A Inglaterra teve a ideia de formar uma organização para integrar esses
estados “livres”, a que Liga Árabe.

Em terceiro lugar, há o caso da OUA: criada em 1963, mas não foi um


acelerador da descolonização. Os novos estados africanos, quando foram declarados
independentes, decidiram manter as fronteiras que haviam sido definidas pelas
potências que as exploraram até aí. Isto aconteceu, porque caso mudassem as
fronteiras, iriam desencadear um conjunto de conflitos entre os países africanos.
Alguns deles acederam à independência com maiores territórios, mas, para evitar
esses conflitos, a OUA declarou que as fronteiras coloniais seriam respeitadas e
mantidas.

Por fim, o Movimento dos Não Alinhados. Foi um fenómeno acentuado nos
anos 50 e desenvolveu encontros regulares para servir de contrapesa às mais
poderosas metrópoles. A sua criaçã o remonta à Revoluçã o Russa: muitas das populaçõ es
asiá ticas que tinham sido conquistadas pelos bolcheviques decidiram organizar uma
assembleia – Congresso do Médio Oriente – em 1920. Isto deu origem a outras reuniões
e congressos que viriam a motivar o MNA. Este era formado por estados asiáticos e
africanos, por países recém-emancipados da dominação colonial e que tinham em
vista a denúncia e condenação do colonialismo. Mas muitos dos Estados ainda não
eram independentes. Quando se deu a independência de muitos desses, criou-se um
esboço para a primeira conferência: Asian Relations Conference, na Nova Deli,
mesmo antes da independência da Índia. Importa ressalvar que aquele dito
Movimento dos Não Alinhados surgiu em 1955, na Conferência de Bandung, com
estados, como já referi, independentes.

Em suma, no pós-guerra, as potências europeias tinham imensas dificuldades


materiais. Muitas delas seriam obrigadas a desfazer-se dos seus impérios coloniais.
Mas os EUA, a URSS e as próprias organizações internacionais não faziam muita
pressão sobre as metrópoles nem foram determinantes para este processo de
descolonização. Contava mais a correlação de forças entre as colónias e a metrópole,
bem como as dificuldades sentidas por estas.

Como uma das consequências da II Guerra Mundial foram o fim dos Impérios
Coloniais, iniciou-se assim a época das descolonizações. Estas descolonizações
formais foram constituídas por 3 vagas:

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

 1ª vaga: 1947-53 (descolonizações asiáticas) + fim do Império Otomano


 2ª vaga: 1957-64 (descolonizações africanas)
 3ª vaga: 1975-80/94 (descolonizações africanas [portuguesas])
“ (…) jamais nos esqueceremos que fomos a primeira colónia a conquistar a
independência. E não demos um cheque em branco a nenhuma potência colonial. Não
temos a mínima dúvida de que o processo de transição do estatuto colonial à
autonomia deve ser completamente realizado.”
John Foster Dules, secretário de Estado norte-americano, em 1953

“ (…) os povos das colónias não querem mais viver como no passado. As classes
dominantes das metrópoles já não podem governar as colónias da mesma forma. As
tentativas de esmagamento dos movimentos de libertação nacional pela força militar
chocam (…) com uma residência armada crescente dos povos colonizados e
conduzem a guerras coloniais prolongadas: os Países Baixos, na Indonésia, a França,
no Vietname.”

Andrei Jdanov, secretá rio do Comité Central do Partido Comunista da URSS, em 1947

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

As descolonizações asiáticas (1947-1953)

A descolonização da Índia Britânica e o conflito Índia-Paquistão (1947-


48)
A Índia era um territó rio complexo, com muita diversidade cultural, política e
econó mica.

Em meados do século XIX, praticamente todo o territó rio indiano estava sob
administraçã o inglesa, uns sob administraçã o direta e outros através do Rajput (os Rajá s
governavam mas atendiam à Inglaterra). Era uma manta de retalhos fiscalizada pelos
ingleses, pois estes controlavam a política externa e o essencial da política interna. Quase
metade do rendimento líquido indiano era canalizado para a Inglaterra. O mercado estava
protegido por ela.

Mas nada impediu que os Rajputs se começassem a agrupar e formassem um


Partido do Congresso, que se considerava com um dos grandes partidos das elites
indianos, e em que faziam reivindicaçõ es comerciais, principalmente. Nesse congresso,
formaram-se duas correntes principais, atribuídas a dois indivíduos:

 O Tilak – defensor da tradiçã o indiana;


 E o Gokhale – defensor da perseguiçã o da evoluçã o.

Antes da I Guerra Mundial, o governo Inglês até chegou a fazer algumas concessõ es
à s regiõ es indianas, como a participaçã o de conselheiros locais nos conselhos
governativos. Mas isto era compensado com o aumento de impostos sobre a populaçã o.
Como nã o houve uma grande abertura política, o partido reorganizou-se e passou a ter
uma implantaçã o popular enorme.

Depois da Guerra, apareceu uma terceira corrente, a de Ghandi, que consistia em


usar a tradiçã o indiana para se conseguir alcançar a modernidade. Ghandi começou a
lançou famosas campanhas de dinamizaçã o popular que eram uma tentativa do partido
ganhar apoio popular e pressionar os ingleses para obter concessõ es políticas. O seu
objetivo era tornar a Índia numa naçã o independente. Para tal, efectuou campanhas de
rebeldia, em que deixaria de pagar impostos, sendo esta a principal fonte de rendimento
dos ingleses. As elites locais iam criando uma burguesia nacional. Mas isto era insuficiente
para que as metró poles fizessem concessõ es políticas. Outras coló nias sofreram o mesmo,
ainda que em menor escala.

96
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

No decurso da IIGM, os ingleses foram acumulando dívidas em relaçã o à Índia. No


final da mesma, os créditos obrigavam os ingleses a negociarem com os indianos. Estavam,
portanto, numa posiçã o de força perante a Inglaterra. Os ingleses estavam completamente
impotentes face a estes confrontos e nã o tinham capacidade militar para intervir.
Acabaram a guerra totalmente destroçados e nem apresentavam capacidade para
responder à pressã o política na Índia. Até chegaram a declarar aos EUA que nã o tinham
condiçõ es para manter a sua base naval no Pacífico. Começava entã o a ponderar-se a
hipó tese da retirada total da Índia e, consequente, atribuiçã o da independência a este país.

O Partido do Congresso reorganizou-se e passou a ter uma orientaçã o popular


muito maior, começando a fazer pressã o sob a administraçã o inglesa para lhes
concederem poderes políticos.

No final da IIGM, o Japã o foi derrotado. Os europeus encontraram o cará ter


nacionalista nas coló nias asiá ticas. É que durante a guerra, a ocupaçã o japonesa alterou o
seu status quo, influenciando as populaçõ es locais. No caso da Índia, embora nã o tivessem
chegado lá , a situaçã o político-militar era favorá vel aos japoneses, pois fizeram concessõ es
políticas à Índia. Para resistir à pressã o japonesa, era necessá ria a atribuiçã o de
concessõ es políticas, através de promessas ou da divisã o do Partido do Congresso (partido
comunitá rio da burguesia indiana). Este partido nã o pretendia a criaçã o e qualquer tipo de
divisã o, pelo que pô s de pé as suas reivindicaçõ es políticas e nã o aceitou a promessa
inglesa de conceder um autogoverno aos indianos. Adotou a resoluçã o “QuitIndia”,
indicando que queria a independência total e nã o um governo autó nomo. Desta forma,
alguns elementos desse partido organizaram um pequeno exército e pediram ajuda aos
nazis e ao Japã o. Os ingleses estavam entã o sujeitos a uma enorme pressã o para iniciar as
negociaçõ es. O mesmo se passou na á rea holandesa e Indochina francesa.

Em Julho de 1945, o Governo trabalhista britâ nico de Clement Attlee iniciou as


negociaçõ es para a independência, todavia o processo foi atrasado devido aos
antagonismos religiosos e políticos que separam as duas principais comunidades indianas:
a hindu e a muçulmana (existiam muitos polos de maioria muçulmana nos estados norte e
centro da Índia). Isto porque Inglaterra decidiu introduzir artificialmente uma divisã o no
Partido do Congresso (em termos religiosos). Isto deu tempo aos ingleses para criarem um
partido muçulmano: a Liga Muçulmana: Territó rio dos Puros (Pakistan).

No ano de 1945, a Inglaterra, resolveu realizar a Conferência dos Himalaias com o


Congresso Indiano e a Liga Muçulmana, para mostrar que havia uma grande rivalidade
entre os dois. Esta rivalidade passou da teoria à prá tica: houve confrontos em grande

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

escala. Quando a Inglaterra os quis reunir, já nã o havia relaçõ es amigá veis entre as duas
organizaçõ es. O Partido do Congresso, das elites hindus (unidade cultural, cuja base era
religiosa), liderado por Gandhi e Nehru, mostrou-se favorá vel à manutençã o da uniã o
indiana, uma ideia contrariada pela Liga Muçulmana, de Muhammad Ali, que propô s a
divisã o do territó rio em duas partes. O partido indiano foi forçado a ceder e a aceitar a
divisã o. Colocou-se a questã o de potenciar a independência de dois territó rios, proposta
que nã o foi aceite pelo partido do Congresso. Mountbatten propô s entã o aos Rajá s que
escolhessem em qual dos dois países que daí iriam surgir é que queriam viver. No fundo,
que certas localidades pudessem escolher as suas preferências.

Lord Mountbatten, que já ia com a intençã o de conceder a independência à Índia,


foi encarregue de estabelecer essa cisã o do territó rio indiano e assegurar a transferência
da soberania. Assim, a 15 de agosto de 1947 foram criados dois Estados independentes: a
Índia, de maioria hindu, e o Paquistã o, predominantemente ocupado por Muçulmanos. O
territó rio indiano estava dividido em três blocos, pois o Paquistã o formou-se como um
estado “esquisito”, estando dividido pela Índia (havia o Paquistã o ocidental e oriental).
Ambas as partes faziam parte do mesmo país, mas nã o comunicavam entre si.

O estabelecimento de novas fronteiras provocou a transferência de populaçõ es


entre os dois territó rios, que ocorreu num clima de violência, apesar dos fortes apelos à
paz e à tolerâ ncia de Gandhi. Neste clima rebentou uma guerra civil. Gandhi, tido como um
dos símbolos da paz, foi uma vítima da intolerâ ncia, ao ser assassinado por Hindus
radicais (30 de janeiro de 1948), inconformados com a divisã o. O conflito entre estes dois
Estados persiste na atualidade, sobretudo, motivado pela disputa do territó rio de
Caxemira, pois a Índia queria anexar esta regiã o, mas o Paquistã o nã o concordava (o Rajá
escolheu a Índia, mas 75% da populaçã o do Estado era Muçulmana, querendo, portanto,
integrar o Paquistã o). Este conflito vai estar na origem de 4 Guerras Indo Paquistanesas
entre a Índia e o Paquistã o, que só foram apaziguados pela ONU. Uma das razõ es que
levaram a estas guerras foi o facto de se encontrarem em jogo potências nucleares, que
criaram conflitos que se estendem até ao século XXI.

De resto, houve um fenó meno de arrastamento. Uma vez dada a independência à


India, outras coló nias que constituíam uma barreira protetora (Ceilã o, Birmâ nia) foram
acedendo à independência.

A Guerra indo-paquistanesa de 1947 foi um conflito ocorrido entre a Índia e o


Paquistã o pela regiã o da Caxemira entre 1947-1948. Foi a primeira das quatro guerras

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

ocorridas entre as duas novas naçõ es independentes. Os resultados da guerra continuam a


afetar a geopolítica de ambos os países.

A guerra indo-paquistanesa de 1965 começou quando o Paquistã o lançou a


Operaçã o Gibraltar, para infiltrar guerrilheiros nas províncias de Jammu e Caxemira para
liderar uma revolta e realizar atos de sabotagem, precipitando assim uma insurreiçã o do
Estado contra o domínio indiano. A tá tica, no entanto, foi rapidamente desarticulada pelas
autoridades indianas, cujo exército fechou a fronteira, a linha de cessar-fogo antes do
ataque, e atravessou a parte da Caxemira sob administraçã o paquistanesa. O Paquistã o
lançou um contra-ataque a 1 de Setembro (Operaçã o Grand Slam) para assumir o controlo
da cidade de Akhnoor. Mas foi um fracasso e, mais uma vez, a Índia respondeu enviando
suas tropas para a fronteira entre os dois países. As cinco semanas de guerra causaram
milhares de vítimas em ambos os lados. A 22 de setembro, o Conselho de Segurança da
ONU aprovou uma resoluçã o exigindo o fim das hostilidades, o conflito cessou no dia
seguinte. Sob a égide da URSS, os dois países assinaram um acordo prevendo a retirada
das tropas para um retorno as fronteiras anteriores, que ocorreu eficazmente mais tarde
em Fevereiro de 1966. A guerra, terminou num mandato das Naçõ es Unidas de cessar-fogo
e a posterior emissã o da Declaraçã o de Tashkent.

A guerra indo-paquistanesa de 1971 esteve estreitamente associada à Guerra da


Independência de Bangladesh. Embora haja divergências sobre as datas exatas da guerra,
as hostilidades entre a Índia e o Paquistã o oficialmente começara na tarde de 3 de
Dezembro de 1971, na Operaçã o Gengis Khan (um ataque preventivo do Paquistã o a 11
bases aéreas indianas). Durante o decurso da guerra, as forças indianas e paquistanesas
entraram em confronto nas frentes oriental e ocidental. A guerra efetivamente chegou ao
fim apó s o Comando Oriental das Forças Armadas Paquistanesas assinarem o Termo de
Rendiçã o, na sequência do qual o Paquistã o Oriental se separou da parte ocidental e
originou o Estado independente de Bangladesh. Tudo isto com o consentimento indiano.

Nos finais da década de 90 houve um agravamento das relaçõ es, já tensas, entre a
Índia e o Paquistã o por ocasiã o da corrida à s armas nucleares e, mais tarde, da eclosã o de
um quarto conflito armado (a Guerra de Kargil). De facto, esta guerra deve ser analisada
tendo em conta três fases sequenciais. Em primeiro lugar, a “captura” paquistanesa de
territó rios estrategicamente vitais pertencentes à Caxemira indiana. À medida que as
semanas iam passando, variadíssimas operaçõ es eram postas em prá tica em Kargil pelos
respetivos infiltradores, no sentido de desafiar o domínio indiano na regiã o, tentando
derrubá -lo de vez. Quando, em maio de 1999, Atal B. Vajpayee teve conhecimento deste

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

processo infiltrador, foi lançada uma outra operaçã o (a Operaçã o Badr), de maior
dimensã o, que acabou por dar início à quarta guerra indo-paquistanesa. Em segundo
lugar, as forças indianas protegeram estradas de grande importâ ncia estratégica. Por fim,
houve o recuo das tropas paquistanesas e dos respetivos infiltradores da regiã o.

A descolonização das Índias Holandesas e a República da Indonésia


(1945-1950)

Ao lado da Índia, desenvolveu-se uma descolonizaçã o com algumas características


semelhantes. A evoluçã o desta descolonizaçã o foi semelhante à s coló nias francesas – que
também haviam sido ocupadas pelo Japã o. Eram ricas em especiarias, borracha, petró leo e
em plantaçã o.

Coló nia holandesa desde o século XVII, o vasto arquipélago indonésio foi ocupado
pelos japoneses durante a II GM, dada a sua riqueza em matérias-primas. O Japã o teve um
grande efeito dissolvente na Á sia colonial e queria estimular o nacionalismo local, de
modo a que a regiã o indiana se pudesse desligar das antigas metró poles. Para tal,
conseguiu o apoio de homens importantes (pertencentes a algumas elites) com a
promessa de independência – 1945. Aparecia como libertador do colonialismo ocidental,
embora tenha feito recrutamento de capital humano para força de trabalho e de guerra.

Os holandeses haviam criado uma burguesia nas ilhas, composta maioritariamente


por muçulmanos. Também formou um movimento – Sarekat Islam; o nacionalismo foi
influenciado pela URSS – Partido Comunista Indonésio, que evoluiu para o Partido
Nacional, fundado por homens influentes: Hattar e Sukarno.

Os laços de uniã o entre a Holanda e a Insulíndia encontravam-se num ponto tal por
esta altura que, dois dias depois da capitulaçã o do Japã o, os nipó nicos nã o cumpriram a
promessa, pelo que a Indonésia alcançou a independência sozinha e instaurou a repú blica
em agosto de 1945 por Sukarno e Hatta. Depois, os japoneses tentaram recuperar algumas
ilhas, mas já que eram independentes, os indonésios nã o o permitiram. No entanto,
acabaram por ceder-lhe algumas ilhas para que tivessem acesso a matérias-primas.

Claro que a potência colonial nã o aceitava de bom grado esta situaçã o.


Argumentando que a ocupaçã o japonesa nã o lhe fizera perder os direitos na regiã o, a
Holanda protestou e empreendeu uma série de negociaçõ es que conduziram, em julho de
1946, à conferência de Malino, onde foram lançadas as bases de uma Indonésia federal e
aliada da Holanda.

100
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Todavia, os tempos nã o eram calmos. Ao mesmo tempo que se realizavam todos


estes encontros e negociaçõ es, tinha início uma revolta entre partidá rios da Repú blica e os
holandeses, na qual interferiu a Inglaterra, que convenceu as duas façõ es a iniciarem um
rol de negociaçõ es ainda no fim do ano de 1945. À trégua negociada entã o, seguiu-se o
acordo de Linggadjati, pelo qual a Holanda reconheceu a independência dos povos
indonésios, aceitou a criaçã o de um Estado federal soberano, sob a direçã o de um
soberano holandês.

Em 1947, a Holanda organizou uma primeira açã o de policiamento do territó rio


que causou mal-estar, apesar da intervençã o das Naçõ es Unidas, criando uma comissã o de
bons ofícios. O objetivo dos ataques holandeses, que resultam no controlo de dois terços
de Java, era o controlo das zonas petrolíferas de Sumatra. Reocupando o territó rio, em
1950 é criada uma uniã o neerlando-indonésia. No fim do ano voltaram a estabelecer-se
contactos entre os antagonistas.

O governo americano apoiava a independência da Indonésia, tomando uma posiçã o


anticolonial para favorecer um processo que nã o colidia com os seus interesses. Em 1948,
deu-se a segunda insurreiçã o do Partido Comunista Indonésio, que conquistou a simpatia
dos EUA (contra a Repú blica da Indonésia). Viram aí que a luta da Indonésia era credível e
convenceram a Holanda a estabelecer uma data definitiva para a independência.

Os governantes indonésios construíram um Estado que englobava uma enorme


multiplicidade étnica. Em 1954, por fim, a Indonésia renunciou à uniã o com a Holanda e
participou na conferência que reunia os estados do Sudeste Asiá tico, tendo em vista uma
cooperaçã o econó mica que lhe permitisse afastar a influência europeia e, ao mesmo
tempo, manter a sua integridade.

A descolonização da Indochina francesa e a intervenção dos EUA

A descolonizaçã o da Indochina foi um processo parecido com o da Indonésia. A


França, tal como a Holanda, foi afastada da sua coló nia asiá tica pelos japoneses, que
ocuparam a Indochina durante a II Guerra (1942), quando houve o processo de grande
expansã o japonesa no Pacífico.

A Indochina já tinha, antes da guerra, um movimento nacionalista, como na Índia.


Era uma zona onde se podia desenvolver uma burguesia comercial, e formou-se o
Movimento Nacionalista VNKD, que se inspirava no partido político chinês de Kuo-Min-
Tang – depois de nã o conseguir nada do que reivindicava, organizou-se militarmente.

101
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A Indochina tinha um conjunto de territó rios – a Cochinchina, Tankin, Annan (estes


três formam o Vietname), Laos e Cambodja.

Entre estes territó rios e a Birmâ nia, estava um outro que nenhuma das potências
havia ocupado: o Siã o (actual Tailâ ndia), que serviu de “tampã o” entre uma zona e outra.

A ocupaçã o japonesa podia também ter impedido o Movimento Nacional VNKD


que, como nã o conseguiu o apoio do Japã o para alcançar as suas reivindicaçõ es, juntou-se
à URSS que apoiou os “rebeldes”. A URSS, que já tinha expandido a sua política soviética
por parte da Á sia na Mongó lia (1924), na Coreia do Norte (1948) e na China (1949, onde
arranjou um agradá vel parceria com Mao Tsé-Tung), vê agora a possibilidade de estender
o comunismo aliando-se a Ho Chi Minh na conquista da independência neste territó rio do
Sudeste Asiá tico.

Apó s o Japã o ter reconhecido a derrota na guerra em 1945, a França retoma a


soberania do territó rio, mas defronta-se com uma forte oposiçã o liderada pelo comunista
Ho Chi Minh, que declara o territó rio vietnamita independente no mesmo ano. De resto, os
EUA, juntamente com as forças francesas, apoiaram o Movimento que, em 1945, declarou a
independência e a Repú blica do Vietname.

Mais tarde, viria a ser acordada a criaçã o de uma zona republicana no Norte do
Vietname e, no Sul, uma zona de controlo colonial francês. Os EUA, que sempre se
declararam anticolonialistas, nã o queriam que o Movimento Nacionalista invadisse a á rea
colonial francesa, e tudo fizeram para que isso nã o acontecesse. Mas tal nã o aconteceu.
Houve uma violenta guerra civil entre 1946 e 1954 (a Guerra da Indochina). Aliá s, as
políticas dos franceses e dos vietnamitas eram inconciliá veis, já que a França queria
restabelecer o regime colonial. Os EUA intervieram e envolveram-se na Guerra, pelo lado
da França, nã o querendo igualmente a independência do Vietname. Já os vietnamitas eram
representados pelos nacionalistas (apoiados por chineses e soviéticos).

Esta guerra terminou quando os EUA uma conferência internacional em Genebra


em 1954. O territó rio do Vietname, marcado pelas elevadas divergências ideoló gicas,
dividiu-se oficialmente em duas zonas distintas: Vietname do Sul, que seria regido pelos
EUA e liderado pelo antigo imperador Bao Dai; e Vietname do Norte, que seria
independente, controlado pelos nacionalistas e chefiado até 1969 pelo comunista Ho Chi
Minh. A Indochina via assim nascer três novas naçõ es: o Vietname, o Laos e o Camboja
(estes dois ú ltimos ficaram neutros).

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Em 1954, realizou-se, no final da Guerra com vitó ria para os vietnamitas, uma
conferência em Genebra que dividiu oficialmente o Vietname em duas zonas distintas:
Vietname do Sul, que seria regido pelos EUA; e Vietname do Norte, que seria
independente.

O que se seguiu à Conferência foi uma espécie da segunda versã o da Guerra na


Indochina, mas sem os franceses = Vietname vs. USA. Os EUA passaram a intervir
diretamente no conflito do Vietname, herdando a posiçã o francesa no conflito presente a
norte. No final de 1973, todo o país era uma zona de guerra. Apesar do poder militar e
econó mico americano, nã o foi possível continuar com a ocupaçã o. OS EUA tornaram-se
incapazes de sustentar o Vietname do Sul e, em 1975, abandonaram o territó rio,
permitindo assim uma reuniã o do Norte com o Sul.

A descolonizaçã o da Á sia durou de 1947 até 1954, e foi a partir destes conflitos
houve uma crescente preocupaçã o da ONU em intervir nas seguintes descolonizaçõ es.

“ (…) Nós, Membros do Governo Provisório, representando a população inteira do


Vietname, declaramos que, de hoje em diante, não manteremos qualquer relação com
a França imperialista. […] Todo o povo do Vietname, inspirado pela mesma vontade,
está determinado a combater até fim contra todas as tentativas de agressão dos
imperialistas franceses.”

Declaração de Independência da República Democrática do Vietname

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A descolonização da Coreia e o primeiro grande conflito regional do


pós-II Guerra

A partir do séc. XVI, a Coreia foi alvo de incursõ es estrangeiras: China, Japã o,
Rú ssia e potências ocidentais. A partir do séc. XX, o Japã o tornou-se dono da península da
Coreia, anexando-a definitivamente em 1910. Como resposta a este ato, formou-se, em
seguida, uma resistência nacionalista contra a ocupaçã o japonesa.

Durante a 2ªG.M., essa resistência foi liderada por comunistas, com o apoio da
URSS. Isso fez com que os aliados aprovassem e apoiassem a Independência da Coreia.
Quando o Japã o abandonou a Coreia, em 1945, os americanos pretendiam que os
soviéticos declarassem guerra à China, o que levou à sua instalaçã o na Manchú ria. Os dois
grandes vencedores, os EUA e a URSS, optaram por ocupar e dividir a Coreia pelo paralelo
38 (segundo a Conferência de Postsdam), até que fossem realizadas eleiçõ es e o povo
decidisse livremente o seu destino. Cada parte da Coreia realizou eleiçõ es. No territó rio
controlado pelos soviéticos venceu o partido comunista, enquanto no Sul, controlado pelos
norte-americanos, venceram os liberais. O pretexto era garantir a liberdade da Coreia,
eliminando-se por completo a presença japonesa.

O acordo era que, depois das eleiçõ es, as tropas soviéticas e americanas retirar-se-
iam. As forças de ocupaçã o da URSS saíram em janeiro de 1949, deixando ao governo do
norte um significativo arsenal de armas.

Porém, ainda antes disto foi oficializada internacionalmente a divisã o da Coreia: à


semelhança da resoluçã o da questã o alemã , os EUA incentivaram a proclamaçã o da
independência do territó rio do sul, o que aconteceu em Agosto de 1948. Nasceu, assim, a
Repú blica da Coreia (o ú nico governo que foi reconhecido pela ONU). Um mês depois foi
proclamada no norte, com o apoio dos soviéticos, a Repú blica Democrá tica e Popular da
Coreia. A Coreia do Norte e a Coreia do Sul eram Estados soberanos e independentes e
podiam assinar todo o tipo de pactos, inclusive pactos militares, e iniciar a preparaçã o
para uma guerra.

O acordo era que, depois das eleiçõ es, as tropas soviéticas e americanas retirar-se-
iam. As forças de ocupaçã o da URSS saíram em janeiro de 1949, deixando ao governo do
norte um significativo arsenal de armas. A 24 de janeiro de 1950, os norte-coreanos
exigiram a retirada dos norte-americanos do territó rio sul. Como estes nã o o fizeram,

104
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

iniciou-se uma campanha militar. Três dias depois, os norte-coreanos conseguiram ocupar
Seul, capital do sul.

Foi convocada uma reuniã o urgente do Conselho de Segurança da ONU, que


considerou a açã o militar da Coreia do Norte como uma agressã o e pediu aos Estados-
membros para preparar um exército multinacional e obrigar o agressor a retirar-se para
além do paralelo 38. Os EUA rapidamente prepararam e lideraram o exército. No fim dos
anos 50, já os norte-americanos estavam perto da fronteira com a China.

O governo comunista de Mao Tse-tung, na China, entendeu o avanço dos capacetes


azuis norte-americanos pelo territó rio da Coreia como uma ameaça direta à sua
independência e soberania, enviando, em Novembro de 1950, as suas tropas para a Coreia
do Norte. A massa militar chinesa fez recuar o exército da ONU. O resultado desta guerra
foi, entã o, um empate.

Os comunistas chineses atacaram e derrotaram, numa grande batalha, o exército


da maior potência mundial. Os EUA nã o podiam tolerar essa situaçã o. O comandante do
exército norte-americano, formalmente o exército da ONU, propunha ao presidente
Truman atacar a China com bombas ató micas. Porém, se a China fosse atacada com armas
ató mica, facilmente seria derrotada, mas o que faria a URSS que também já possuía essa
arma destrutiva?

A URSS pensou que os EUA nã o iam defender a Coreia do Sul, porque o secretá rio
de Estado da administraçã o Truman tinha definido, no início de janeiro de 1950, as zonas
de defesa da política da contençã o, ou seja, Estaline concluiu que os norte-americanos
iriam deixar essas zonas ao domínio soviético. Mas, contrariamente ao que o líder
soviético tinha pensado, Truman autorizou as suas tropas a apoiar a Coreia do Sul. Apesar
disso, a açã o militar teve limites. O presidente norte-americano estava preparado para
conter o avanço comunista, mas nã o estava pronto para uma guerra ató mica.

A Guerra da Coreia foi devastadora e acabou oficialmente a 27 de julho de 1953


com a assinatura do armistício que dividiu até hoje o povo coreano em dois Estados. No
fundo, acabou como tinha começado: uma divisã o através de um paralelo. Os responsá veis
do bloco de leste compreenderam que os capitalistas seriam um osso duro de roer. Por sua
vez, os ocidentais aperceberam-se que derrotar o comunismo nã o seria fá cil. Ambos
chegaram à conclusã o que, daí em diante, qualquer conflito interno seria rapidamente
internacionalizado pelos dois blocos.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Fazendo uma comparaçã o com a situaçã o do Vietname, se os franceses estavam


contra os nacionalistas, na Coreia eram os americanos contra a China. Esta situaçã o da
Coreia mostra, como já foi referido nas posiçõ es anticoloniais, que tanto a URSS como os
EUA mantinham uma posiçã o anticolonial ou nã o, de acordo com os seus interesses. Neste
caso, seria mais viá vel manter o controlo da Coreia.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

As descolonizações do Médio Oriente e da África do Norte

Os estados árabes sob tutela britânica e francesa, o mandato da


Palestina e a génese do conflito israelo-árabe

Até à I Guerra Mundial, grande parte do Médio Oriente estava sob o poder do
Império Otomano. Era uma divisã o administrativa do Império Otomano, sendo gerida por
governantes locais e organizada em províncias cujas delimitaçõ es físicas eram mutá veis.
Para os europeus é uma expressã o que representa a zona intermediá ria entre o Pró ximo
Oriente (península balcâ nica) e o Extremo Oriente (Coreias, Japã o e China). Ao longo dos
anos, o Império Otomano perdeu alguns territó rios e dividiu-se devido à s potências
imperialistas, nomeadamente a França e a Inglaterra. Nas vésperas da IGM, este império
englobava uma parte maioritariamente de língua turca e compreendia todas as regiõ es
á rabes. A Alemanha era a potência com mais influência na política otomana. Portanto, era
inevitá vel que o Império Otomano entrasse na IGM ao lado da Alemanha. Isso acabou por
trazer vá rias complicaçõ es.

Os ingleses (instalados no Egito desde o século XIX), para abrir uma frente militar
na guerra, pensaram nas elites á rabes que se manifestavam contra a independência do
Império Otomano. Os aliados exploraram esta situaçã o e, em 1916, é organizada a Revolta
Á rabe contra o Império Otomano. Os ingleses convenceram o xerife Sharif Hussein a
organizar, fomentar e dirigi uma revolta dentro do pró prio Império Otomano, com a
promessa de que no final da guerra toda aquela zona seria um califado á rabe. Era a
primeira promessa inglesa para levar os á rabes a lutar contra os otomanos. Os otomanos
acabaram por ser expulsos.

No mesmo ano, os franceses estavam interessados em garantir alguns territó rios


no Médio Oriente. Perceberam que se a guerra acabasse e o Império Otomano se tornasse
num estado independente, os ingleses aumentariam o seu potencial. Apesar de serem
aliados, os franceses forçaram os ingleses a partilhar algumas zonas de influência. Assim,
ambas as naçõ es fizeram uma espécie de acordo secreto para dividir a zona á rabe do
Império Otomano em duas á reas de influência. Era o Acordo de Sykes-Picot. A linha que
separava essas zonas passava mesmo no meio do territó rio á rabe do IO. A França ocupou
as zonas da actual Síria e do Líbano enquanto os ingleses as zonas atuais do Iraque,
Jordâ nia e Palestina (saíram a ganha, pois as zonas petrolíferas estavam sob seu domínio).

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Os franceses nã o estavam em grande posiçã o de ocupar um outro territó rio, mas


foi-lhes reconhecido o esforço que estavam a fazer durante a guerra, que contribuía para
essa divisã o. Para vender o Império Otomano e passar a controlar essas zonas, era
necessá rio criar um processo que o permitisse. No início de 1916, os ingleses conseguiram
que uma família á rabe dominante no campo político (Família Hussein, de Meca) iniciasse
uma revolta contra os turcos – cavalaria e nó madas á rabes subiram até ao territó rio turco
do Império Otomano para derrotar os turcos.

Com isto, conseguiu-se abrir uma frente até ao territó rio turco e vencer as forças
militares do Império Otomano. No entanto, era necessá rio cumprir a promessa feita aos
á rabes: a criaçã o de um grande Império Á rabe. Esta promessa nã o era compatível com o
acordo de Sykes-Picot. Uma outra promessa dos ingleses foi feita ao Movimento Sionista e
foi a criaçã o de um destino de emigraçã o da populaçã o para a zona da Palestina. O
Sionismo era um movimento de cariz religioso e político que defendia a fundaçã o de um
Estado judeu na Palestina, uma regiã o com populaçã o maioritariamente á rabe. Nasceu no
final do século XIX na Europa Central e Oriental como um movimento de revitalizaçã o
nacional. Os sionistas queriam, entã o, um territó rio autó nomo na Palestina. O movimento
defende a manutençã o da identidade judaica, opondo-se à assimilaçã o dos judeus pelas
sociedades dos países em que viviam.

O movimento sionista ganhou novo alento, em 1917, com a Declaraçã o de Balfour,


mediante a qual o governo britâ nico apoiava o estabelecimento de um territó rio judeu
autó nomo na Palestina. Com isto, a Inglaterra procurava ganhar mais apoio para a IGM.

Porém, esta declaraçã o inglesa iria aumentar as questõ es problemá ticas na regiã o.
Estava, entã o, previsto um conjunto de cená rios (Declaraçã o de Balfour; Grande Império
Á rabe; e Acordo Sykes-Picot) que nã o era possível acontecerem em simultâ neo.

A soluçã o foi cumprir o que era possível (com base no Tratado de Versalhes), por
forma a manter todos os envolvidos satisfeitos. No final da IGM, do acordo Sykes-Picot,
surgiu a criaçã o de pequenos estados, ao invés de duas grandes zonas: a Inglaterra ficava
com o Iraque (englobava duas grandes reservas de petró leo, uma a norte [curda] e outra a
sul [xiita], o que levou ao estabelecimento de uma fronteira com a Turquia) e com a
Transjordâ nia. Dentro da zona francesa, os ingleses tinham prometido o reino á rabe. A
Síria ficou sob administraçã o francesa, tal como o Líbano (novo Estado criado e que
mesclava bastantes religiõ es).

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A regiã o entre a Península do Sinai, o Líbano, a Síria e a Transjordâ nia era uma
zona bastante problemá tica. Entre 1919 e 1920, criou-se a Palestina, que ficou com o
estatuto de mandato da SDN, confiado aos ingleses. Na Ará bia Saudita, os saudis
derrubaram os axumitas no final dos anos 20.

Este era o contexto das comunidades da Palestina, Síria, Líbano e da Mesopotâ mia,
doravante separadas do Império Otomano e administradas por mandatá rios enviados por
Londres e Paris. Assim, no final da guerra a parte á rabe foi dividida em vá rios territó rios
sob influência inglesa e francesa, potências imperialistas ocidentais que se encontravam
em declínio, apesar do domínio sobre esta regiã o que foi fornecido pelo final da IGM.

Com isto, a criaçã o de um grande Império Á rabe foi anulada. Para manter todos
contentes, os Ingleses cederam o reino da Transjordâ nia e o Iraque aos filhos do Xerife de
Meca, família Hussein. A Inglaterra esperava que estas dinastias ficassem pró -inglesas,
juntamente com as dinastias da Ará bia, que foram mais tarde substituídas pela família
Saud.

Ao abrigo da Declaraçã o de Balfour, intensificavam-se as emigraçõ es para a


Palestina. De resto, a Palestina constituía a regiã o problemá tica. As famílias sionistas
compravam cada vez mais terras aos á rabes palestinianos. Os á rabes verificaram que as
terras compradas eram irreversíveis, nã o podendo trabalhar nelas nem usufruir de
qualquer relaçã o com as mesmas. Ao excluir sistematicamente a populaçã o á rabe dessas
terras, favorecia igualmente a emigraçã o dos europeus para a Palestina.

Isto levantou cada vez mais a tensã o social, e o dirigente religioso Al-Hussein
começou a centrar à sua volta os colonos sionistas, que compravam terras tendo em vista
o seu plano de instaurar um Estado Judaico na Palestina, como já foi referido. Foi desta
forma que, nos anos 20, foram criadas organizaçõ es palestinianas que tinham como
objectivo criar um referendo, e assim acabar com o mandato, ou seja, teriam que arranjar
outra soluçã o política para a Palestina. Criou-se assim o Conselho Nacional Palestiniano

Perante o agravamento das tensõ es entre Judeus e Á rabes, a Inglaterra começa a


recuar no que diz respeito à Declaraçã o de Balfour. A política britâ nica para a regiã o
direcionou-se cada vez mais para o apaziguamento á rabe especialmente apó s a
intensificaçã o da fuga de judeus perseguidos pelo regime nazista na Europa, que
encontravam na Palestina o ú nico destino viá vel (algo que dificultava a paragem da
emigraçã o judaica para este territó rio). Os judaicos estavam a prejudicar os á rabes e os
ingleses nã o queriam que nada acontecesse à s suas dinastias pró -inglesas. Chaim

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Weizzmann e Jabotinski começaram mesmo a liderar ataques terroristas contra os á rabes,


e até contra alguns ingleses.

Ao chegar a II Guerra Mundial, os ingleses já viam que só havia uma hipó tese de
contornar estes conflitos e parar as guerras: ou criar dois estados na Palestina ou parar as
emigraçõ es sionistas para a Palestina. Assim, em 1936, os britâ nicos nomearam a
Comissã o Peel, destinado a unir esforços diante da liderança judaica

Optaram, entã o, por criar dois Estados, um para os á rabes e outros para os
sionistas, o que pô s fim ao mandato britâ nico. Esta soluçã o política foi muito difícil de pô r
em prá tica: a zona á rabe ficava separada em dois territó rios no meio de todo o territó rio
judaico. Esta soluçã o nã o era aceite por ninguém – os á rabes nã o queriam a divisã o da
Palestina e judeus nã o queriam a coexistência com um Estado á rabe. (Zona Á rabe – actual
Cisjordâ nia + territó rio conhecido Faixa de Gaza).

Entretanto, rebentou a II Guerra Mundial. Durante os anos de Guerra, o movimento


sionista propô s a criaçã o de tréguas, mas nã o tal foi aceite por todos os seus integrantes. A
compra de terras á rabes continuou e as emigraçõ es sionistas subiam. (especialmente
devido à situaçã o do holocausto). Na fase final da guerra, os ingleses tinha mais emigraçã o
europeia que sionista. Mas os á rabes continuavam a nã o aceitar a divisã o da Palestina.

Depois da guerra, a Inglaterra nã o era já capaz de desempenhar o papel de


potência mundial e entregou as suas coló nias à s Naçõ es Unidas. A Inglaterra administrava
a Palestina e foi votado em Assembleia (NU) a divisã o do territó rio palestiniano – 1947.
Nessa votaçã o, participaram os EUA e a URSS, favoravelmente e as Naçõ es Unidas
aprovaram a divisã o e o reconhecimento destes dois Estados.

Os á rabes palestinianos nã o aceitaram esta votaçã o, dado que nã o estavam lá


representados e dado que uma grande parte do territó rio iria ficar sob domínio dos
emigrantes. O clima de tensã o política multiplicou-se e os Estados á rabes, que entretanto
foram criados, declararam guerra ao futuro Estado de Israel.

Isto originou a primeira guerra israelo-á rabe, em 1948.

A guerra nã o foi justa para ambas as partes, já que os sionistas tinham o apoio dos
EUA e possuíam treino militar profissional, enquanto as tropas á rabes eram muito mais
fracas em armamento e inteligência militar.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Desta guerra resultou um fenó meno irreversível e que é algo em vigor ainda hoje:
expulsã o da populaçã o á rabe do territó rio da Palestina. Cerca de 700 mil palestinianos
á rabes foram recambiados para campos de refugiados.

A Guerra acabou, pois, com a derrota dos palestinianos á rabes.

Segue-se uma série de guerras de curta duraçã o, a Guerra do Suez, em 1957; a


Guerra dos Seis Dias, em 1967; a Guerra do Yon Kipur, em 1973, em que os exércitos
israelitas impõ em pesadas derrotas aos desorganizados e malpreparados exércitos á rabes
e acrescentam novas á reas ao Estado de Israel.

Entretanto, incapazes de afrontar Israel em campo aberto, os palestinianos


enveredam por ataques terroristas perpetrados pela organizaçã o guerrilheira Al-Fatah,
fundada por Yasser Arafat, em 1959, enquanto a OLP – Organizaçã o para a Libertaçã o da
Palestina, funda em 1964, dá forma institucional ao processo de recuperaçã o dos
territó rios perdidos para a Israel.

Esta situaçã o de desigual confrontaçã o provocou fortes reacçõ es de condenaçã o


por parte da comunidade internacional. Os EUA, em particular, dã o mostras de alguma
inflexã o nas suas posiçõ es de apoio aos israelitas.

Em 1993, iniciaram-se as negociaçõ es entre o Governo de Israel e a OLP,


conhecidas como “Acordos de Oslo”, discutidas entre Yasser Arafat e Ysaac Rabin e
mediadas pelos EUA.

Com estes acordos, os palestinianos reconheceriam o Estado de Israel e os


israelitas comprometer-se-iam a devolver os territó rios ocupados em 1967. Mas o
radicalismo das posiçõ es rapidamente tornaram ineficazes os acordos conseguidos.

Também nã o foi resolvido a situaçã o de Jerusalém e os israelitas nã o se dignaram a


estabelecer uma data para o que prometeram – ceder territó rios aos palestinianos.

Tudo isto trouxe dificuldades. Desde 1960 que os palestinianos nunca conseguiram
nada a nível político.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Em 1995, foi assinado Isaac Robin, provocando a estagnaçã o do processo. Já Yasser


Arafat morreu em 2004. Em 2005, a Palestina e Israel deram início a novas negociaçõ es
que pareciam bem encaminhadas, como confirma o abandono dos colonatos da Faixa de
Gaza em 2005, por parte dos israelitas.

Mas as dú vidas persistem, em consequência da ascensã o ao poder na Faixa de


Gaza, em 2006, do HAMAS, um movimento radical que se recusa a reconhecer o Estado de
Israel e que se envolveu em conflitos com FATAH. A frequência dos atos de violência
levados a cabo por parte de movimentos fundamentalistas religiosos de um e de outro
lado vem confirmar o difícil caminho para a paz na regiã o.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A evolução do Egito – da independência formal de 1922 à República


Árabe Unida (1958)

Os países da Á frica do Norte alcançaram a independência entre 1952 e 1962, todos


eles. A Á frica do Norte distingue-se das restantes zonas africanas pelo Deserto do Sahara,
que a divide da Á fricaa Subsariana e pela existência, em todos os seus países, de
Muçulmanos Sunitas (vs. Xiitas) – todos eles têm isso em comum. Outro ponto em comum
em todos os países da Á frica do Norte é o facto de estarem ocupados na zona do litoral e
zonas altas – nesses locais, havia uma grande densidade demográ fica, sendo o resto dos
territó rios apenas desertos. Todos os países falavam á rabe; era a sua oficial. Mas esta nã o
era a ú nica cultura existente: em todos eles, estava presente a cultura berbere – nada tem
a ver com o á rabe. A cultura berbere ainda hoje é a dominante em alguns desses estados.
Como nunca foi tornada oficial, a língua e a cultura berberes nunca foram ensinadas na
escola, fazendo com que fosse encarada como uma língua de segunda categoria.

No caso do Egito, este era um estado independente com estatuto de condomínio


anglo-egípcio. É um país que inclui também a península do Sinai, na Á sia, o que o torna um
Estado transcontinental.

Os ingleses ocuparam o Egito em 1882, como estratégia para chegar à Índia. Desde
esse ano até ao fim da I Guerra Mundial que o Egito era um condomínio anglo-egípcio.
Depois da Guerra, e dada a situaçã o inglesa, a Inglaterra teve de fazer concessõ es aos
egípcios, a nível político. O movimento nacionalista egípcio ganhou a maioria da
assembleia legislativa local. Perante o exílio do líder do partido, o país levantou-se na
primeira revolta da sua histó ria moderna. As constantes rebeliõ es por todo o país levaram
a Grã -Bretanha a proclamar, unilateralmente, a independência do Egipto, em 1922.
Declarou-se terminado o protectorado e deu a independência nominal ao país. Foi criado
um reino, governado pelo Rei Fuad I.

No entanto, o controlo da administraçã o, do exército e do Canal do Suez


mantinham-se sob o poder inglês – o Egito era gerido pela política externa inglesa e nã o
podia fugir muito dela. Formalmente, o Egito fazia ainda parte do IO no século XIX
(aquando da ocupaçã o inglesa, que levou à formaçã o do condomínio. Isto fez com que a
burguesia egípcia fizesse muitas reivindicaçõ es entre 1920 e 1930. Foi, entã o, que surgiu o
Movimento WAFD. Quando mais tarde, viria a haver uma invasã o alemã no Egipto, os
egípcios esperavam ver as suas reivindicaçõ es satisfeitas, uma vez que eram pró -alemã es.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Depois de o Movimento WAFD sofrer uma derrota na guerra da Palestina, em


1948, os militares convenceram-se de que era necessá rio mudar a política do Movimento.
De resto, a questã o da derrota dos países á rabes no médio oriente teve ondas de choque
nos restantes países. As burguesias nacionais de alguns destes países começaram a adotar
uma atitude mais antiocidental. Assim, muitos dos oficiais que participaram na guerra de
1948 contra Israel fizeram um golpe militar no Egito em julho de 1952 (Golpe dos Oficiais
Livres) Um grupo de oficiais destronou o Rei da época, Faruk, e colocou no poder uma
junta militar composta por Nasser e Neguib. Nasser era um homem muito forte e acabou
por assumir o comando. Este golpe viria a representar o ponto de viragem na vida do
Egito, já que o novo regime instalado permitiu iniciar um processo de emancipaçã o do
Egito da tutela inglesa.

Em 1952, a Inglaterra já nã o tinha a Índia, mas o controlo do Canal do Suez


continuava a ser importante, já que era por lá que passava o petró leo vindo do Médio
Oriente. Os Ingleses já nã o tinham possibilidades para manter o Canal, mas fizeram uma
proposta ao Egito para continuar a controlá -lo. Em 1956 os ingleses deram a
independência ao Sudã o, e criaram um governo controlado por eles, pois além do Sudã o
ser muito importante por causa do Nilo que percorre o Sudã o até aos Grandes Lagos, foi
uma forma de pressionar e de prejudicar o Egipto.

Nasser aumentou muito a sua base de apoio, porque tinha uma visã o de
desenvolvimento do país. Levou a cabo uma reforma agrá ria, projecto que fez com que a
junta militar ganhasse muita popularidade entre os nacionais e, até mesmo, estrangeiros.
Em 1957, dá -se a Crise do Suez e isto foi o que deu mais visã o a Nasser para o projecto de
desenvolvimento do país. Nasser queria melhorar a agricultura e desenvolver a Indú stria.
A agricultura egípcia estava muito dependente das cheias do Nilo e também a Indú stria
poderia vir a depender muito do rio, através da criaçã o de electricidade gerada por uma
barragem. Era para essa infraestrutura que Nasser precisava de adquirir recursos – podia
pedir ajuda à Inglaterra, mas isso nã o seria fá cil de obter dignamente. Os ingleses estavam
de saída, mas nã o queriam perder as suas posiçõ es no Médio Oriente. Influenciaram os
americanos a nã o emprestarem capital aos egípcios.

Entã o, Nasser nacionalizou, sem indemnizaçõ es, o Canal do Suez. O recurso que
apresentava para gerar dinheiro era o

Canal do Suez, companhia privada do século XIX e que constituía o principal ativo do Egito.
No fundo, esta açã o de Nasser tratava-se de uma declaraçã o de guerra a ingleses e
franceses.

114
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Isto, como seria de esperar, desagradou aos ingleses e foi daí que surgiu uma crise entre a
Inglaterra e o Egito. Isto convenceu os ingleses de que nã o havia condiçõ es para manter o
Canal, e decidiram dedicar-se a derrubar Nasser.

Além disso, também a França queria ver o Egito derrotado, já que o país dava apoio
aos Movimentos pela independência da Argélia. Havia também um grupo de irmã os
muçulmanos que queriam derrubar Nasser, e a Inglaterra sabia que o apoio destes dois
seria indispensá vel.

A soluçã o encontrada seria provocar uma guerra Israelo-Egípcia. O primeiro-


ministro britâ nico Anthony Eden temia que Nasser ameaçasse as remessas de petró leo do
Golfo da Pérsia e o seu comércio com o Extremo Oriente, com a perda da preponderâ ncia
no Médio Oriente. Já a França sentia-se ainda mais ameaçada do que Inglaterra, porque os
egípcios participavam ativamente no movimento de independência da Argélia. Os EUA
foram os ú nicos a rejeitar a ideia de um conflito armado. Portanto, ingleses e franceses
convenceram Israel (um inimigo conhecido do Egipto) a participar na guerra.

Para tentar derrubar Nasser, Inglaterra planeou uma ofensiva militar coordenada.
O plano era Israel fazer um ataque preventivo ao Sinal (Estado Egípcio) e formar um corpo
expedicioná rio franco-britâ nico; depois, com o pretexto de proteger o Canal, os franceses e
ingleses ocupariam o Suez. Israel invadiu, entã o, o Estado egípcio do Sinai e, três dias
depois, os franceses e os ingleses invadiram e ocuparam o controlo do Canal do Suez –
1956. Isto gerou uma guerra política sem precedentes, a Crise do Suez.

Num primeiro momento, Israel hesitou, pois tinha a consciência de que estava a
ser usado pelos interesses imperialistas das potências. No entanto, a razã o da sua
aprovaçã o ao convite dos ingleses e franceses prendeu-se com a entrada de reatores para
aquecer o urâ nio.

Em 1957, dá -se a Crise do Suez e isto foi o que deu mais visã o a Nasser para o
projecto de desenvolvimento do país. A tentativa de forçar o Egito a assinar um ultimato
fracassou. Como tal, os britâ nicos resolveram bombardear os campos aéreos egípcios. Os
EUA viriam a entrar nestes conflitos como aliados do Egito, já que nã o lhes convinha ser
contra os á rabes devido à sua posiçã o relativamente ao Médio Oriente. Confrontados com
a possibilidade de os soviéticos apoiarem os egípcios, os EUA patrocinaram o debate de
uma resoluçã o pacífica. Por outro lado, aos ingleses nã o convinha entrar numa guerra
nuclear com os EUA. O cessar-fogo tornara-se inevitá vel pelo desgaste das forças
britâ nicas. A 5 de Novembro os combates cessaram, e no ano seguinte (1957) o primeiro-

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ministro inglês abandonava as suas funçõ es, perante uma derrota inequívoca. A Inglaterra
e França perderam a sua influência, sendo humilhados com a expulsã o do Egito. Foi o fim
da influência europeia no Médio Oriente, consolidando a influência de Nasser. Israel ficou
totalmente associado ao bloco ocidental, havendo um aumento da influência dos EUA e da
URSS.

Depois desta crise, Nasser saiu como heró i dos á rabes. Isto deu-lhes a esperança
novamente da criaçã o de um grande Império Á rabe no Médio Oriente, englobando agora o
Egito (principal país á rabe). De resto, entre 1922 e 1952 houve, no Egito, uma discussã o
relativamente à identidade do povo egípcio: devia ser á rabe no sentido religioso
(somente) ou á rabe no sentido cultural, laico e político?

No Médio Oriente, havia a ideia de criar uma aliança defensiva, que tinha sido
lançada pelos ingleses para defender o Médio Oriente dos eventuais ataques do Egito. Os
povos á rabes do MO nã o queriam fazê-lo, já que a aliança seria patrocinada por um país
estrangeiro do Ocidente. (Médio Oriente – Turquia, Jordâ nia, Iraque e Irã o).

Nasser era pan-arabista = contra o Ocidente. Era ideal do pan-arabismo a criaçã o


da RAU – Repú blica Á rabe Unida – como imposiçã o ao Ocidente. Nasser era pan-arabista,
isto é, estava contra o Ocidente. Era ideal do pan-arabismo a criaçã o da RAU – Repú blica
Á rabe Unida – como imposiçã o ao Ocidente. Nasser tinha a intençã o de alterar as
fronteiras do Médio Oriente á rabe, outrora impostas pelas potências ocidentais. O projeto
pan-arabista só se conseguiu afirmar em países onde nã o houvesse burguesias pró speras e
ligadas à política. Em 1958, o Egito estava em expansã o política, a Síria já se lhe havia
juntado e o Iraque estava perto de alcançar também a independência. No entanto, a
tentativa de uniã o entre o Egito e a Síria durou apenas três anos, até 1961. Em 1958
surgue um golpe militar no Iraque, organizado pelo movimento nacionalista Baath (criado
por dois cristã os), uma espécie de organizaçã o defensora do pan-arabismo. Do outro lado,
a Jordâ nia estabeleceu-se sempre enquanto regime á rabe axumita pró -ocidental.

Conclui-se assim que a maior oposiçã o ao colonialismo britâ nico veio do Egipto,
que conseguiu a independência em 1953 depois de alguns anos de confronto entre a
resistência nacionalista e as tropas moná rquicas. A luta dos egípcios foi determinante para
a descolonizaçã o do mundo africano, uma vez que serviu de exemplo para países como o
Sudã o, que rapidamente se empenhou na conquista da independência (1956).

116
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

O problema israelo-á rabe também prejudicou o projecto pan-arabista. A tensã o


cresceu tanto de dia para dia que chegou a haver uma terceira guerra, em 1967, quando,
mais uma vez, o exército á rabe foi derrotado e humilhado.

A actual revoluçã o na Líbia tem origens anti arabistas – Kadhafi é Nasserista – pan-
arabista. Daqui é possível perceber a influência que Nasser teve e ainda tem na Política
Norte Africana/Á rabe. Os países ocidentais desde sempre viram o Movimento pan-
arabista como uma ameaça.

A guerra colonial na Argélia e o seu impacto em França (1954-1962)

A regiã o da Á frica do Norte vai desde Marrocos ao Egito. O Magrebe corresponde à


parte ocidental da Á frica do Norte enquanto o Mashrek é o oriente. Marrocos e Tunísia
eram protetorados, o Egito era um condomínio e a Argélia era uma coló nia.

A Argélia era a ú nica coló nia francesa – o resto eram protectorados. A França dizia
que o territó rio argelino era uma extensã o mediterrâ nica do territó rio francês, tendo em
conta o clima e as condiçõ es idênticas.

Entre as duas guerras, esta regiã o foi administrada sem grandes problemas (com a
exceçã o do Egito). Nos anos de 1930 havia já uma burguesia argelina, um Partido Popular
Argelino (apoiado pela URSS) e movimentos independentes (liderados por Messali Hadj e
Ferhat Abbas).

Em 1945, no decurso da IIGM, houve algumas alteraçõ es. Alemã es e norte-


americanos desembaraçaram na Á frica do Norte. Existiu o supracitado caso egípcio.

É importante ter em conta que, entre 1945 e 1954, nada aparente ocorreu na
Argélia: nada mudou politicamente; o PPA transformou-se no MTLD (Movimento para o
Triunfo e Liberdade Diplomá ticos) tendo como grande figura Messali Hajd que, ao ver que
a influência do MTLD era quase nula, criou o CRUA, um Movimento clandestino; dentro do
CRUA, foi criado um braço, a Frente de Libertaçã o Nacional, que atacava exploraçõ es
agrícolas francesas na Argélia – FLN começou a ser apoiada, nã o publicamente, pelo Egito.
Criou-se no Cairo um grande Movimento pan-arabista anticolonial: o Comité de
Mobilizaçã o do Magrebe.

Com a colonizaçã o, a Argélia criou duas grandes cidades que baseavam a sua
economia no comércio de exportaçã o: Argel e Oran. A FLN começou a tentar fechar as
fronteiras ao exército francês – começou a guerrilhar em finais de 1954: nesta altura, já a

117
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Tunísia e Marrocos estavam em ambiente de guerrilha e os franceses resolveram escolher


apenas um territó rio. Dado que a Argélia era a mais importante, a França decidiu desistir
de Marrocos e da Tunísia, concedendo-lhes a independência em 1956. É que os Franceses
nã o podiam aguentar três frentes militares.

Em virtude da derrota italiana na IIGM, a Líbia, outrora coló nia italiana, passou
para mandato da ONU. Restava o caso da Argélia, a primeira coló nia francesa, do ponto de
vista cronoló gico e da implantaçã o dos interesses franceses. Tinha mais de um milhã o de
colonos franceses, que se tinham apropriado das mais profícuas terras do litoral. Os
franceses tinham um grande interesse pelo facto de terem sido descobertas grandes
reservas de petró leo e gá s natural na zona saariana da Argélia. Portanto, nã o estavam
dispostos a abdicar da Argélia sem as devidas contrapartidas.

Era um clima insustentá vel para as populaçõ es á rabes. O francês era a língua
administrativa, mas a língua principal é o Amazigh. A partir de 1954 (até 1962), os
franceses começam uma guerra anticolonial na Argélia (primeira grande guerra colonial
em Á frica, uma das mais violentas). A Argélia é, deste modo, obrigada a enfrentar uma
guerra prolongada de libertaçã o em virtude da resistência dos colonos franceses, que
dominam as suas melhores terras. A opiniã o pú blica sofreu negativamente o efeito
antiguerra – o recrutamento militar era obrigató rio em França, pelo que as suas tropas
foram mobilizadas para a Argélia. O exército francês bem fazia força para que se
resolvesse a situaçã o através do meio militar, para que assim se pudesse redimir da
Guerra do Vietname. Os franceses, que tinham perdido a Indochina, nã o queriam perder a
Argélia.

A FLN tinha o apoio do Nasser e resolveu levar a guerra para as duas principais
cidades: Argel e Oran. Fizeram isto estrategicamente, para que os colonos (os franceses)
nã o se pudessem esconder nas cidades.

Apesar dos esforços e dos progressos na contençã o de revoluçõ es, era impossível
controlar a situaçã o. Os governos caíam e chegou-se a um ponto em que se resolveu
chamar o militar que sempre criticou a IV Repú blica Francesa para pô r ordem a Argélia.
De Gaulle formou um governo em 1958, mas exigiu a mudança na Constituiçã o Francesa -
foi votada uma constituiçã o presidencialista, desistindo do regime parlamentar. Isto foi
uma consequência direta da crise na Argélia que, na altura, estava longe de acabar.

De Gaulle achava que a França tinha um problema com a imposiçã o de poder. Foi à
Argélia, onde achavam também que ele era melhor hipó tese para a satisfaçã o dos

118
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

interesses tantos franceses quanto argelinos. Depois de um encontro em Argel com os


dirigentes argelinos e com alguns colonos franceses, estes, juntamente com os militares da
metró pole chegaram a fazer um Golpe de Estado contra a política de De Gaulle. Nesta
altura, a situaçã o era caó tica, tanto na Argélia como na França. De Gaulle teve que ceder a
algumas reivindicaçõ es da FLN, chegando a dar-lhes a independência. O partido FLN
venceu o MNA e, depois de muitos conflitos, a França teve que reconhecer a independência
da Argélia.

A independência foi negociada e concedida em 1962, com o Tratado de Evian, sob


algumas condiçõ es impostas por De Gaulle: os colonos franceses poderiam manter dupla
nacionalidade (constituíram o êxodo dos colonos), a França manteria as bases militares na
Argélia – maioritariamente no Sahara e, sendo a Argélia rica em gá s natural, a França
manteria o acesso aos depó sitos. Durante dez anos, os argelinos nã o mexeram no seu
pró prio petró leo, pois os franceses permaneciam na zona das concessõ es. De outro modo,
a Argélia tornava-se independente, mas o controlo do petró leo argelino ficava com os
franceses. Até que em 1971, os argelinos nacionalizaram esse petró leo, contra a vontade
dos franceses.

Depois dos acordos de Evian, em julho de 1962, a situaçã o caó tica voltou à Argélia.
Houve uma guerra, na qual morreram 30 mil franceses e cerca de 250 mil ará bes. A
situaçã o era insustentá vel para a Vª Repú blica francesa e para a FLN.

Nesta altura, tentaram matar de Gaulle, no verã o de 1962, numa operaçã o levada a
cabo pela OAS – Organization Armée Secrete. A França começou a evacuar a Argélia, epois
de vá rios atentados, a ataques bombistas e guerrilhas. Os colonos franceses começaram a
sair do territó rio argelino e eram rejeitado pelos “verdadeiros” franceses, que lhes
chamavam Pieds Noirs.

Este processo da Argélia equipara-se ao processo de descolonizaçã o de Angola,


coló nia portuguesa: tanto na Argélia como Angola, o exército colonial controlava
inicialmente a situaçã o nas coló nias; portugueses chegaram até a desenvolver ainda mais
o conceito de guerrilha do que os franceses; regiã o que França tinha que controlar era
muito mais pequena do que a regiã o que Portugal queria dominar em Angola; e enquanto
a guerra para a França durou 8 anos, a guerra para Portugal durou 13 anos – de 1962 a
1974.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

As descolonizações em África – 1957-1990


As descolonizações inglesas e francesas na Africa Ocidental e Oriental -
1957-1964

O continente africano possuía um grande peso nos impérios coloniais, pois


praticamente todo o territó rio estava sob domínio colonial. A Á frica Subsariana
corresponde à regiã o do continente africano a sul do Deserto do Sahara, ou seja, aos países
que nã o fazem parte da Á frica do Norte. Abrange, portanto, os países da Á frica Ocidental e
quase todos os países da zona dos Grandes Lagos (Uganda, Quénia, Tanzâ nia e Sudã o).

Nesta zona as descolonizaçõ es (transiçõ es controladas pelas metró poles) foram


feitas de forma predominantemente pacífica, com exceçã o do Congo Belga. De resto, todas
as coló nias que se tornaram independentes pertenciam a três metró poles: Inglaterra,
França e Bélgica. Face ao insucesso nas descolonizaçõ es do pó s-guerra, ingleses e
franceses tinham motivos suplementares para adotarem outro tipo de método na
realizaçã o das mesmas nos territó rios da Á frica Subsariana. A experiência indiana
predispô s os ingleses para um outro tipo de atitude. Já os franceses começaram a
descolonizaçã o de maneira tã o remitente que isso acabou por originar duas guerras
coloniais, ambas perdidas para Indochina e Argélia - esta em termos políticos -, e grandes
custos.

Durante a época colonial, o nível de investimento dos impérios coloniais era


relativamente baixo. Mas as á reas mineiras poderiam dar uma taxa de lucro superior a
uma renda. Como tal, é em Á frica que se concentram os grandes investimentos de capital e
zonas capazes de dar alto rendimento. Na Á frica do Sul tem-se uma grande zona mineira
de ouro e carvã o (Witwatersrand), juntamente com as minas de diamante (Kimberley). No
Congo Belga (precisamente a sul, no Katanga) existem os grandes filõ es de cobre e
diamante, que irradiavam para Angola e a zona das Rodésias. Por fim, em Angola (Luanda)
tem-se prolongamentos periféricos como os diamantes do sudoeste africano.

Apesar disso, a verdade é que a Á frica Subsariana era subdesenvolvida e nã o tinha


um grande fluxo de capitais exportados, pois o interesse era mínimo (com natural exceçã o
das á reas mineiras, polos de desenvolvimento que viam rapidamente um grande
crescimento causado, em grande parte, pelo investimento e pela criaçã o de infraestruturas

120
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

e polos de industrializaçã o). Como tal, nos anos 60, Angola tinha uma taxa de crescimento
muito alta enquanto a Á frica do Sul era um país desenvolvido.

Visto praticamente nã o ter colonos europeus, tornou-se mais fá cil fazer


negó cios/acordos políticos e as independências foram dadas facilmente, pois nã o havia
grandes interesses a defender, nem locais que de alguma forma favorecessem a metró pole
que os controlava. Como já dito anteriormente, o pró prio exemplo das guerras coloniais
predispô s ingleses e franceses a adotarem uma outra atitude.

A Inglaterra preparou diversos territó rios para a sua independência. No Gana,


formou-se a Convençã o da Costa do Ouro Unida, que ia contra a administraçã o inglesa e
explorava caminhos para a independência. O Gana conseguiu-a em 1957, tornando-se na
primeira naçã o a alcançar o feito. Na altura, chamava-se Costa do Ouro, adotando depois o
nome de Gana por uma questã o de prestígio. Nigéria (1960, sendo até entã o uma
plataforma administrativa), Serra Leoa (1961) e Gâ mbia (1965) compõ em os outros casos.
Até 1965, praticamente todos os países ingleses da Á frica Ocidental já eram
independentes.

Quanto à Á frica Oriental, os ingleses detinham um maior nú mero de territó rios.


Como foi referenciado acima, foi concedida a independência ao Egito e ao Sudã o. Os
territó rios circundantes dos Grandes Lagos nã o apresentavam grandes cidades, minas e
um grande desenvolvimento. À exceçã o do Quénia, onde se criou uma classe de
fazendeiros europeus, colonos com uma mentalidade muito fechada. No Quénia, os
ingleses tiveram um problema parecido com o da França na questã o da Argélia. O país era
rico em montanhas e as regiõ es onde a agricultura era rica foram ocupadas pelos
europeus, que expulsaram de lá os Kikuyu, o grupo étnico mais populoso do país e uma
sociedade secreta que matava os europeus que haviam ocupado terras quenianas. Apesar
de um processo político bastante atribulado, os quenianos conseguem a independência em
1963. Subtraindo este caso, as coló nias ingleses situadas na Africa Oriental passaram por
um processo semelhante ao ocorrido na Á frica Ocidental: Uganda (1962), Quénia (1963) e
Tanganyika. Quanto a este ú ltimo país, em 1964, numa ilha ao largo do territó rio do
Tanganyika, chamada Zanzibar, houve uma guerra civil muito violenta devido à ocupaçã o
persa. Já independente, o Tanganyika deu apoio a Zanzibar em 1964 e juntos integraram
um novo país - Tanzâ nia.

121
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

A França ficou desligada das suas coló nias durante a II GM. Nã o estava disposta a
ter mais guerras coloniais e nã o tinha qualquer interesse em manter o controlo sob as suas
regiõ es na Á frica Subsariana. Apenas queria manter a sua rede de influência na AEF e na
AOF.

Logo a seguir à Guerra, já na IVª Repú blica, houve grandes mudanças na forma de
administraçã o das coló nias. Houve um grande crescimento econó mico: os países atingidos
pela Guerra estavam a reindustrializar-se e as matérias-primas tornaram-se muito caras:
as metró poles tentaram valorizar os seus territó rios coloniais com investimentos em
infraestruturas, administraçã o, etc.; enquanto antes da guerra as coló nias tinham que
pagar as pró prias despesas, agora as metró poles investiam muito capital nelas, para
lucrarem mais depois; para as metró poles, havia sistemas políticos diferentes entre elas e
as suas coló nias, e por isso achavam que as coló nias necessitavam de leis diferentes; tudo
o que aconteceu aquando e depois da guerra fez com que houvesse uma mudança na
forma de tratamento das coló nias, por parte das metró poles.

Pode-se referir que a descolonizaçã o francesa foi uma consequência da guerra da


Argélia, que forçara uma alteraçã o no regime político em 1958 (regime parlamentar para
presidencialista). Quanto De Galle chega ao poder, havia a necessidade de arranjar uma
soluçã o para a Argélia e restantes territó rios. A primeira versã o da nova Constituiçã o
francesa (V Repú blica) previu os referidos territó rios sob a alçada de governos
autó nomos, bem como passou a abranger os indígenas nos momentos leitorais (algo que
só os cidadã os detinham durante o período colonial). De outra forma, a massa dos
indígenas transformou-se numa massa ativa de votantes. De resto, os franceses já tinham
abolido em 1946 o estatuto do indigenato e o trabalho forçado nas coló nias, ou seja, a
separaçã o política entre cidadã os e indígenas. Portugal só aboliu em 1961, com o início da
guerra colonial em Angola. Todos os regimes coloniais apresentavam esta distinçã o, sendo
que os processos de descolonizaçã o aboliram naturalmente isso.

Entre 1946 e 1958 as colonias foram ganhando experiencia política. Em 1958, De


Gaulle tinha de efetuar algumas concessõ es. Para tal, foi realizado um referendo que
permitia aos habitantes escolher se queriam ser autó nomos e continuar a fazer parte da
comunidade francesa, ou se queriam a independência total. Apó s a aprovaçã o deste
referendo, todos os territó rios franceses na Á frica escolheram ter um governo autó nomo
dentro da comunidade francesa, menos a Guiné Conacri, que decidiu tornar-se
independente imediatamente. A Guiné foi um dos primeiros países da Á frica subsaariana a
tornar-se independente (1958) e logo cortou os seus vínculos políticos com a antiga
122
Histó ria do Mundo Contemporâ neo

metró pole, seguindo o caminho do socialismo revolucioná rio e anulando qualquer


influência dos seus opositores. Era liderado por um dos histó ricos líderes da emancipaçã o
africana, Ahmed Sekou Touré.

No entanto, a França fez uma federaçã o com governos pró prios e a devida divisã o
dos territó rios que aceitaram ser autó nomos dentro da comunidade francesa. Para muitos
dirigentes africanos, isto representava uma divisã o de fronteiras. Começou a existir uma
fixaçã o de fronteiras que a maior parte dos países nã o queria. Portanto, nã o aceitavam a
divisã o territorial. Um deles foi a Costa do Marfim, uma coló nia bastante rica e que se
tornou na maior exportadora de cacau. Esta naçã o exigia fronteiras mais pequenas, visto
que o territó rio que a rodeava era pobre e em nada lhe favorecia. Quando alguns deles
viram que nã o era bom fazer parte da federaçã o, entre 1958 e 1960 começam a pedir
unilateralmente a independência. Em 1960 (o ano de Á frica), praticamente todos tinham
encontrado os caminhos da independência, rompendo os laços políticos com França.
Assim, os países finalmente puderam fazer as suas pró prias fronteiras. Desta forma, os
países ricos nã o se prejudicavam e deixavam de estar ligados aos outros países pobres da
Á frica Ocidental.

A descolonização portuguesa - 1974-1975

Em 1971, a situaçã o de Á frica era semelhante à de 1964. Ainda assim, foi na Á frica
Austral que se deu a terceira fase das descolonizaçõ es. A situaçã o nã o estava normalizada
nas coló nias portugueses, na Rodésia e na Á frica do Sul. Os territó rios da Á frica Austral sã o
considerados mais desenvolvidos Eram zonas onde havia zonas mineiras, grandes
investimentos externos, populaçã o europeia e industrializaçã o. Como suscitavam mais
interesses e as metró poles nã o estavam dispostas a abdicar deles, existiram grandes
obstá culos a um processo de independência pacífico. Este foi, portanto, mais complexo e
mais tardio do que os restantes países de Á frica.

À medida que era atribuída a independência a outros territó rios africanos, na


Á frica Austral a internacionalizaçã o de outros conflitos levou ao combate das presenças
coloniais. A guerra colonial dos portugueses com Angola, Moçambique e Guiné durou
vá rios anos. Igualmente surgiram conflitos desta índole na Rodésia e movimentos de
guerrilha na Á frica do Sul. De resto, nos regimes brancos (português e sul-africano) havia
uma maior dificuldade política em os dissolverem. A superioridade militar dos governos
coloniais manifestava-se, apesar de as coló nias nã o terem capacidade para alterar o status
quo.

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

Portugal teve três impérios coloniais: nos séculos XVI e XVII, tinha a Índia e o
Oriente; no século XVIII, tinha o Brasil; e nos séculos XIX e XX, tinha a Á frica – Guiné,
Angola, Moçambique, Cabo Verde e Sã o Tomé e Príncipe). Os regimes políticos
portugueses foram determinados pelo factor colonial. No terceiro e ú ltimo império
colonial, Portugal ainda possuía “restos” de territó rios coloniais na Á sia: Índia (Goa,
Damã o e Diu), Indonésia (parte da ilha de Timor) e China (Macau). Estes territó rios,
organizados pela Iª Repú blica, foram depois reorganizados pelo Estado Novo. Criou-se um
documento chamado Ato Colonial, que propunha uma Repú blica Administrativa
Ultramarina. A aprovaçã o do Ato Colonia evidencia bem as preocupaçõ es com a política
colonial. Efetivamente, o Ato Colonial de 1930 definia a posiçã o política do regime em
relaçã o à s coló nias portuguesas. A Repú blica Administrativa Ultramarina completava,
também, o estatuto de indigenato. Os portugueses precisavam de força de trabalho e
criaram um estatuto diferente para os trabalhadores africanos. O Estatuto só se aplicava à s
coló nias africanas e chegou a ser actualizado nos anos 60, vindo, mais tarde, a ser anulado.

Para Portugal, a primeira pressã o de independência veio da Índia. A Inglaterra


havia dado a independência e a Uniã o Indiana queria que Portugal fizesse o mesmo. A
partir dos anos 50, Portugal estava a ser pressionado pela ONU para dar a independência
à s suas coló nias. No entanto, Portugal manteve-se no papel de potência colonial. Aliá s,
Portugal até começou a desenvolver a educaçã o nas coló nias e quem queria educaçã o
superior tinha que ir para a metró pole. No continente criou-se a Associaçã o dos
Estudantes do Império, formada por estudantes das coló nias, e foi daqui que surgiram os
primeiros movimentos anticolonialistas e partidos da Á frica portuguesa. Ora, a atitude
colonialista portuguesa era sistematicamente condenada e Portugal era pressionado a
arrancar com um efetivo programa de descolonizaçã o. Uma vez que Portugal nã o acatava
de modo algum estas pressõ es, foram legitimados movimentos.

Nos anos 50, Angola começou a articular-se uma resistência multifacetada contra o
domínio colonial, impulsionada pela descolonizaçã o que se havia iniciado no continente
africano, depois do fim da IIGM. Esta resistência, que visava a transformaçã o da coló nia de
Angola num país independente, desembocou a partir de 1961 num combate armado
contra Portugal. Dá -se início à guerra de libertaçã o pelas forças da UPA/FLNA (apresenta
vínculos com o Congo, EUA e Zaire). Mais tarde, a luta estender-se-ia a todo o territó rio
angolano por açã o do MPLA (cuja principal base social eram os Ambundu e a populaçã o
mestiça bem como partes da inteligência branca, e que tinha laços com partidos
comunistas em Portugal, a URSS e países escandinavos) e da UNITA (socialmente

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

enraizada entre os Ovimbundu e beneficiá ria de algum apoio por parte da China):

Logo depois do início do conflito armado, uma "ala liberal" no seio da política
portuguesa impô s uma reorientaçã o incisiva da política colonial. Revogando já em 1961 o
Estatuto do Indigenato e outras disposiçõ es discriminató rias, Portugal concedeu direitos
de cidadã o a todos os habitantes de Angola. A finalidade desta reorientaçã o foi a de ganhar
"mentes e coraçõ es" das populaçõ es angolanas para o modelo de uma Angola multirracial
que continuasse a fazer parte de Portugal, ou ficar estreitamente ligado à metró pole.

Esta opçã o foi, no entanto, rejeitada pelos três movimentos de libertaçã o, que
continuaram a sua luta. A frente do exército colonial de Angola, constituído por MPLA e
UNITA, controlou o país. Nos primeiros anos da década de 70, as hipó teses de conseguir a
independência pelas armas tornaram-se muito fracas. Na maior parte do territó rio a vida
continuou com a normalidade colonial. Do ponto de vista militar a situaçã o de Angola
estava está vel, ao contrá rio do ponto político, que nã o tinha uma soluçã o. Este conflito já
estava internacionalizado em 1965. Apesar de nã o concordarem com a política colonial de
Portugal, os EUA mantiveram-se quase “calados”, insistindo apenas em pequenas
reformas. Os americanos queriam que o acordo com Portugal relativamente à base das
Lajes fosse renovado e, para isso acontecer, nã o insistiam muito para Portugal fazer algo
que nã o quisesse. No entanto, os EUA queriam também manter boas relaçõ es com os
movimentos africanos.

Em 1963, o PAIGC (tinha o apoio da URSS, acesso fá cil a mísseis e outro


armamento pesado) que inicia a guerra pela independência da Guiné e de Cabo Verde e, no
ano seguinte, a guerra de libertaçã o estende-se também a Moçambique por açã o da
FRELIMO. Em 1961 houve ataques muito violentos da UPA e repressõ es do exército
colonial. Isto levou o governo de Lisboa a enviar um grande contingente de jovens
militares para evitar uma independência nesta fase.

Moçambique constituía a zona natural de saída das minas da Rodésia, havendo


uma grande industrializaçã o, grandes cidades (Lourenço Marques, atual Maputo, era a
capital) e muitos interesses. Com ideologias comunistas e anticoloniais a espalharem-se
por toda a Á frica, muitos movimentos políticos clandestinos foram estabelecidos a favor
da sua independência. Em 1964, uma plataforma de partidos civis cria uma força unida, a
Frente de Libertaçã o de Moçambique (FRELIMO), que iniciou uma campanha de guerrilha
contra o governo português. Este conflito, juntamente com os outros dois entretanto

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Histó ria do Mundo Contemporâ neo

iniciados nas outras coló nias portuguesas da Á frica Ocidental Portuguesa (Angola) e da
Guiné, tornou-se parte da chamada Guerra Colonial Portuguesa (1961- 1974). Do ponto de
vista militar, o exército português manteve o controlo dos centros populacionais,
enquanto as forças de guerrilha procuraram espalhar a sua influência em á reas rurais no
norte e no oeste do país. A primeira vaga de retornados data de 1964.

Em Moçambique, a FRELIMO tinha base de apoio na Tanzâ nia e a partir de 1970, o


governo português resolveu criar uma grande barragem em Cahora Bassa - uma das
maiores do mundo, mas que implicava um grande estaleiro no país. A FRELIMO decidiu
abrir outra frente em Tete, perto de Cahora Bassa. A situaçã o nã o estava tã o controlada
como a de Angola. A FRELIMO era apoiada por bases do Norte europeu, que estavam
contra o império colonial português. A Suécia estava no consó rcio para a construçã o da
barragem e ao mesmo tempo apoiava a FRELIMO.

As três frentes tiveram, ao longo dos 14 anos da guerra, diferentes evoluçõ es. No
princípio de 1970, a situaçã o colonial portuguesa estava mais ou menos controlada. A
guerra em Á frica acabou por ter uma saída. As exportaçõ es faziam-se principalmente para
a Europa e baseavam-se no têxtil e na agricultura. Era, portanto, fundamental assegurar os
mercados europeus. Nos anos de 1970, para entrar na Uniã o Europeia, Portugal tinha de
resolver a guerra em Á frica. Isto levou ao golpe militar de 1974, que tinha como objetivos
o cumprir o famoso movimento dos 3D’s: Democratizar, Desenvolver e Descolonizar.

O governo recém-criado começou logo a tratar das situaçõ es coloniais. O processo


de independência destas coló nias ocorreu numa altura em que Portugal vivia na "ressaca"
política de um golpe de Estado, que depô s o regime ditatorial, substituindo-o por uma
nova Repú blica, inicialmente de tipo socialista. A Revoluçã o do 25 de Abril e consequente
mudança do regime político possibilitou a descolonizaçã o, que se fazia com grande atraso
relativamente a outras ex-coló nias europeias. Este atraso devia-se à s dificuldades e
entraves do Estado Novo e do processo de democratizaçã o do país antes de 1974

Neste processo foram libertadas todas as ex-coló nias portuguesas, exceto Timor.
Em circunstâ ncias dramá ticas, voltaram para Portugal cerca de um milhã o de portugueses
que se tinham fixado no Ultramar. Em 1974, Portugal negociou um acordo com o PAIGC
para a independência da Guiné-Bissau. Este movimento tinha uma particularidade, pois
reivindicava a independência de Cabo Verde, algo que o governo português nã o queria.
Portanto, foi negociado a realizaçã o de um referendo em Cabo Verde. Entretanto, formou-

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se um governo que dominou a Guiné-Bissau e Cabo Verde, antes deste ú ltimo país se
tornar independente em 1975. Os grandes problemas passavam por Moçambique e em
Angola.

Em Moçambique, o governo português negociou com a FRELIMO e chegaram a um


consenso. O problema foi os colonos brancos que tentaram, em 1974, ganhar o controlo do
país através de um movimento. Este movimento falhou e levou à saída dos colonos de
Moçambique. Portugal nã o apoiava o movimento dos brancos, já que nã o queria voltar a
entrar em Guerra com a FRELIMO. Os moçambicanos nã o queriam forçar os brancos a sair
de lá , mas com a revolta e a formaçã o de movimentos para alcançar o controlo do país,
foram forçados a sair mais cedo, mesmo antes da independência de 1975.

Com a independência conseguida, punha-se agora o problema da Rodésia do Sul e


o problema da Cahora Bassa – barragem que nã o conseguia vender a energia produzida.
Moçambique entrou em guerra com a Rodésia e com a Á frica do Sul e deu-se uma guerra
civil com uma resistência, a RENAMO, em 1977. As coisas só melhoraram no final da
década.

Em Angola, o exército colonial controlava a situaçã o. Os movimentos perderam os


apoios estrangeiros e depois entraram os três em acordo, na conferência de Alvor –
Portugal e os três movimentos (UNITA, MPLA e FNLA) assumiram um movimento de
transiçã o para a independência para a independência a 11 de novembro. Partidos
tentaram depois ganhar posiçõ es no terreno. As armas entravam livremente, porque o
exército português nã o controlava isso.

Depois, apareceu um novo exército em Angola – o exército sul-africano, que subiu


para apoiar FNLA, até Benguela. Pouco depois disso, deu-se uma guerra em Luanda. O
MPLA pediu apoio a Cuba (tinha governo dependente da URSS, e já tinha tentado intervir
em Á frica). Os cubanos enviaram armas e contingentes militares; com isto, a FNLA foi
praticamente eliminada de Luanda. Os angolanos nã o estavam preparados para combater
contra os cubanos. O conflito angolano estava internacionalizado. A UNITA depois
conseguiu implantar-se pouco a pouco nas vá rias cidades do país.

No período colonial, a Angola vivia da exportaçã o de matérias-primas,


principalmente o café. Em 1973, Angola deixou de ter o café como principal produto
exportado, passando a ser o petró leo o produto mais importante. A Gulf Oil tinha

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concessã o petrolífera em Cabinda. Isto permitiu a Angola assumir um papel de potência


petrolífera, que dava mais vantagem estratégica aos angolanos. Aquando da crise
petrolífera, a Angola nã o fazia parte da OPEP. Logo, as potências ocidentais tinham
interesse em negociar concessõ es politica e petrolíferas.

O estrangeiro tratou de dar todo o apoio ao MPLA por causa do petró leo angolano,
que já tinha potencial. Nos anos 80, com a Á frica do Sul, chegou-se à primeira soluçã o
política, em que se previa a retirada dos cubanos e dos sul-africanos e chegou-se a acordo
político para eleiçõ es – acordo Bicesse. Este acordo implicou a desmobilizaçã o da UNITA e
do MPLA e a formaçã o de um governo conjunto. O MPLA ganhou, a UNITA começou uma
guerra civil em 1992 (demorou dez anos). Nesta altura, nã o havia nem apoio russo nem
americano.

Mesmo com a geraçã o de guerras civis, Angola e Moçambique conseguiram


independência em 1975 (tanto o governo de Maputo como o governo do MPLA eram
anticolonialistas). Logo de seguida, estes dois países instauraram um regime político pró -
soviético, enquanto em Portugal, o modelo socialista pó s-revoluçã o era progressivamente
abandonado, dando lugar a um regime democrá tico. As outras ex-coló nias africanas,
Guiné-Bissau, Cabo Verde e Sã o Tomé e Príncipe, também enveredaram por este tipo de
regime. Embora partissem do mesmo modelo, cada uma das novas naçõ es adaptou-o
consoante as suas experiências e as exigências conjunturais.

Os processos rodesiano e sul africano (1965-1990)

A Rodésia foi dividida nos protetorados da Rodésia do Norte e Rodésia do Sul em


1911. A parte norte encontra-se muito perto do Congo, apresentando um prolongamento
do filã o de minérios. Como era rica em minerais, teve muitos investimentos na secçã o
mineira e nos meios de transporte. Já a parte sul era um país agrícola bastante rico (com
plantaçõ es e fazendas agrícolas). Foi o destino de emigraçã o de muitos colonos europeus,
onde foram criadas grandes quintas inglesas de cereais. De resto, existia aqui um grande
nú mero de ingleses colonos que queria ser tratado de forma diferente. Acabaram por
formar um governo autó nomo que exclui a populaçã o negra. O controlo estende-se até
1923, momento em que se passa à tutela direta das autoridades britâ nicas locais.

A Rodésia do Sul era uma coló nia britâ nica, que desde o século XIX era um país
com colonos europeus. Foi por este motivo que, quando se começou a exigir a
independência, a populaçã o branca, que possuía grande poder naquele local, nã o estava

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disposta a consentir a independência da Rodésia.

Em 1953, a Inglaterra decidiu juntar a Niassalâ ndia à Rodésia do Norte e à Rodésia


do Sul, no que os britâ nicos chamaram a Federaçã o da Rodésia e Niassalâ ndia. Dadas as
diferenças existentes e a presença europeia intensa num deles, foi difícil manter a uniã o.
Os europeus nã o queriam ser uma minoria numa uniã o que integrava três países
africanos, nã o queriam perder as quintas. Em 1964, a Inglaterra concedeu a independência
aos dois territó rios do norte, a Rodésia do Norte e a Niassalâ ndia, atribuindo os nomes de
Zâ mbia e Malawi, respetivamente. Entretanto, o mesmo foi negado à Rodésia, pois a
minoria branca negava-se a transmitir o poder à maioria negra. Em 1965, os colonos
decidiram fazer uma cessaçã o das relaçõ es com a Inglaterra e o país nã o era reconhecido
internacionalmente. Esta independência foi apoiada pelos portugueses e sul-africanos,
pois significava a continuaçã o do regime colonial da Rodésia do Sul.

Importa notar que as descolonizaçõ es portuguesas e as independências de Angola


e Moçambique tiveram um efeito acelerador e despoletaram os processos de
independência do resto da Á frica Austral, pois desapareceu o apoio à Rodésia do Sul. Os
movimentos nacionalistas começaram a ter um apoio mais alargado de Moçambique, o que
alterava bastante a correlaçã o de forças entre colonos brancos. Assim, entre 1975 e 1980,
surgiram guerrilhas por todo o territó rio. Havia dois principais movimentos: Zanu (o povo
Shona, cujo principal representante era Robert Mugabe e tinha o apoio chinês e norte-
coreano) e Zapu (o povo Matabete, de Nkomo, que tinham apoio dos soviéticos). No
entanto, as guerrilhas nã o tinham condiçõ es para se desenvolver. Os países que rodeavam
a Rodésia do Sul nã o permitiam que a guerrilha tivesse apoio exterior: Botswana era
protetorado, Moçambique e Angola eram coló nias portuguesas (Portugal nã o se atrevia a
impor-se à Inglaterra) e a Rodésia do Norte e Niassalâ ndia tinham a independência há
pouco tempo e nã o se queriam envolver.

Depois de cessar relaçõ es, os ingleses descobriram um país controlado pelo povo
Matabete quando chegaram à Rodésia do Sul. Moçambique entrou em guerra com a
Rodésia e com a Á frica do Sul e deu-se uma guerra civil com uma resistência, a RENAMO,
em 1977. As coisas só melhoraram no final da década. Em 1979, a Inglaterra conseguiu
convencer a Rodésia do Sul a integrar o Sufrá gio Universal, marcado para 1980. Nessas
eleiçõ es, ganhou o partido de Robert Mugabe. Em 1980, a Rodésia do Sul foi reconhecida
como Estado independente, passando a designar-se Zimbabwe. Com a descolonizaçã o

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portuguesa e a exclusã o do problema da Rodésia, restava um ú nico territó rio onde o


regime colonial continuava em vigor.

A Á frica do Sul era uma reuniã o de vá rios estados autó nomos. Os ingleses
instalaram-se no século XIX. No Cabo cria-se uma coló nia inglesa. Por outro lado, nã o
distante do Cabo e do Natal, ficavam as terras povoadas por colonos vindos da Holanda, no
século XVII, e que recebiam o nome de boers. Estas populaçõ es começaram a migrar para
outras zonas da Á frica Austral, estabelecendo outras repú blicas bó er a norte e a leste.
Deste modo, a Á frica do Sul englobava uma populaçã o heterogénea e ficou dividida em
quatro grandes territó rios: Cabo, Natal, Orange e Transval (continha uma zona mineira).
Joanesburgo era uma cidade que permitia um fluxo mineiro entre o sul do Moçambique e o
Transval. Ao longo do século XIX, os ingleses anexaram essas regiõ es, antes de estalar a
Guerra dos Boers.

Oito anos apó s o fim da Segunda Guerra dos Boeres e apó s quatro anos de
negociaçã o, uma lei do parlamento britâ nico criou em 1910 a Uniã o Sul-Africana. A Uniã o
era um estado unilateral de domínio britâ nico que incluía as antigas coló nias holandesas
do Cabo e de Natal, bem como as repú blicas do Estado Livre de Orange e do Transvaal. Os
brancos pobres correspondem aos boers agricultores.

Quando a Á frica do Sul se torna numa zona industrial, a populaçã o bó er, dentro da
europeia, era a maia pobre. Os interesses estrangeiros passavam por um bom
funcionamento da economia sul-africana. Em 1948, o partido nacionalista boer foi eleito
com maioria e chegou ao poder. Este grupo político reforçou a segregaçã o racial, que já
tinha começado sob o domínio colonial holandês e britâ nico. O Governo Nacionalista
classificou todos os povos em três raças, com direitos e limitaçõ es desenvolvidas para cada
uma. A minoria branca controlava a muito maior maioria negra. A segregaçã o legalmente
institucionalizada ficou conhecida como Apartheid. Enquanto a minoria branca sul-
africana usufruía do mais alto padrã o de vida de toda a Á frica (compará vel aos de naçõ es
de países desenvolvidos ocidentais), a maioria negra ficou em desvantagem em quase
todos os aspetos.

Entretanto, o ANC (African National Congress) era um partido que crescia para
combater o regime instaurado. Nos anos 60 e 70, a situaçã o social e política da Á frica do
Sul foi-se degradando cada vez mais. Entretanto, a descolonizaçã o portuguesa tinha um
efeito de contá gio. Fazia-se grande pressã o diplomá tica contra Asul, que continuava a

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financiar a RENAMO em Moçambique. Nos anos 80, a conjuntura internacional levou a


uma acentuada queda dos preços do ouro. Os grandes interesses internacionais passavam
por resolver a tensã o política que se fazia sentir. Havia, portanto, uma enorme pressã o
para que que o Governo Boer começasse a ceder. A Á frica do Sul estava nesta altura a
sofrer vá rios boicotes. Havia também uma situaçã o de recessã o econó mica, condiçõ es que
fizeram com que o governo estivesse se predispusesse a negociar.

O Acordo de Nkomati foi assinado em 1984 entre o governo de Moçambique e o


presidente da Á frica do Sul. Este acordo tinha por intençã o pô r termo à guerra civil em
Moçambique. Para tal, os signatá rios do dito acordo concordaram em deixar de apoiar a
RENAMO (responsabilidade da Á frica do Sul) e o ANC (responsabilidade de Moçambique).
Apesar disto, cada parte continuou a agir por conta pró pria, e os guerrilheiros da RENAMO
prosseguiram com a guerra civil em Moçambique.

De Klerk é conhecido por fazer terminar o regime de apartheid, a política de


segregaçã o racial da Á frica do Sul, permitindo à maioria negra direitos civis iguais aos
brancos, asiá ticos ou membros de outra qualquer etnia, transformando o seu país numa
democracia. Neste sentido, em 1990, sob a liderança do presidente F. W. de Klerk, o
governo sul-africano começa a desmantelar o sistema do apartheid, libertando Nelson
Mandela, líder do ANC, e aceitando legalizar esta organizaçã o, bem como outras
antiapartheid. No mesmo ano A Namíbia torna-se independente. Os passos seguintes no
sentido da uniã o nacional sã o dados em 1991. A abertura das negociaçõ es entre os
representantes de todas as comunidades, com o objetivo de elaborar uma Constituiçã o
democrá tica e realizar um ato eleitoral, marca o fim de uma época perturbada na Á frica do
Sul que iniciou-se em 1948 e teve seu fim em 1990. Em 1994 sã o realizadas as primeiras
eleiçõ es multirraciais da histó ria sul-africana. O ANC ganha as eleiçõ es e o regime sul-
africano estabiliza. Nelson Mandela, formando um Governo de unidade nacional, torna-se
o primeiro presidente sul-africano negro. Este processo nã o constitui uma absoluta
descolonizaçã o. Porém, a situaçã o política verificada no interior dos quatro territó rios era
semelhante à situaçã o vigente nas Rodésias.

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