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Faculdade de Letras da Universidade do Porto

História do Mundo Contemporâneo

Sebenta

Por Rita Ferreira Cardoso

Abigail Oliveira Baptista

LICENCIATURA EM CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO: JORNALISMO, ASSESSORIA E


MULTIMÉDIA
Índice

Por Rita Ferreira Cardoso.............................................................................................................0

Índice............................................................................................................................................1

Conceitos básicos para a explicação do mundo contemporâneo: teorias do “imperialismo” e da


circulação de capitais...................................................................................................................4

As teorias anteriores às guerras mundiais – a exportação de capitais como explicação para a


nova ordem internacional............................................................................................................6

John Hobson (1903).................................................................................................................6

Rudolf Hilferding (1910)...........................................................................................................7

Rosa Luxemburgo (1913)..........................................................................................................8

A distinção entre “imperialismo” e “impérios”............................................................................8

As teorias do “imperialismo” depois de 1945: as causas do “subdesenvolvimento” e da


“dependência”...........................................................................................................................11

Imperialismos com Impérios Coloniais.......................................................................................13

Grã-Bretanha nas vésperas da 1ª G.M...................................................................................13

França nas vésperas da 1ªG.M...............................................................................................14

Alemanha nas vésperas da 1ªG.M..........................................................................................15

O Império Russo nas vésperas da 1ªG.M................................................................................17

1
Império Otomano nas vésperas da 1ªG.M.............................................................................19

A emergência do Japão – industrialização e primeira expansão continental – Guerra com a


China (1894-1895) e com a Rússia (1904-1905).....................................................................21

A emergência dos Estados Unidos - industrialização e primeiras conquistas coloniais - guerra


com a Espanha (1898-1899) e construção do canal do Panamá (1901-1914)........................23

Os conflitos imperialistas – fatores de conflito entre as potências............................................25

Fatores de aproximação entre potências...................................................................................31

A disputa pela influência no Império Otomano e o petróleo do Médio Oriente – acordos


anglo-alemães (1912-1914)....................................................................................................31

Acordos anglo-alemães sobre as colónias portuguesas (1898; 1912-1914)...........................33

A 1ª Guerra Mundial..................................................................................................................34

O fracasso dos planos da guerra de curta duração (1914).....................................................34

O alargamento das frentes e os impasses (1915-1916)..........................................................35

A procura da "decisão": guerra submarina alemã, revoluções russas e intervenção dos EUA
(1917).....................................................................................................................................38

O ano de 1918: ofensivas militares finais e revolução europeia............................................41

A ordem mundial do Pós-1ªGuerra............................................................................................42

Tratados de Paz......................................................................................................................44

A exportação de capitais entre as guerras e a depressão 1929-1933........................................49

O endividamento dos países europeus e os investimentos dos EUA na Europa....................49

Os aumentos de produtividade e a fase de “prosperidade” da década de 1920....................52

A recessão da década de 1930: a crise bolsista nos EUA (1929) e a sua transformação em
recessão mundial...................................................................................................................54

A recessão e as alterações políticas – regimes antiparlamentares na Europa e no Mundo.. .59

A 2ª Guerra Mundial..................................................................................................................63

A hegemonia alemã até 1942.................................................................................................67

O recuo alemão depois de Estalinegrado e dos desembarques americanos..........................69

A Guerra no Pacífico...............................................................................................................70

A passagem para a guerra nuclear.........................................................................................72

2
A nova ordem mundial após a 2ªG.M....................................................................................73

O fim dos impérios coloniais..................................................................................................74

Fatores para as políticas "anti-coloniais": a hegemonia EUA/URSS; a ONU; os novos


organismos multilaterais........................................................................................................76

A descolonização asiática (1947-1953).......................................................................................82

A descolonização da Índia britânica e o conflito Índia-Paquistão (1947-1948)..................82

A descolonização das Índias Holandesas e a República da Indonésia (1945-1950)................87

A descolonização da Indochina francesa e a intervenção dos EUA (1945-1975)....................88

A descolonização da Coreia e o primeiro grande conflito regional do pós-2ª Guerra............90

As descolonizações do Médio Oriente e a África do Norte........................................................92

Os estados árabes sob a tutela britânica e francesa, o mandato da Palestina e a génese do


conflito israelo-árabe.............................................................................................................92

A evolução do Egipto – da independência formal de 1922 à República Árabe Unida (1958). 97

A guerra colonial na Argélia e o seu impacto na França (1954-1962)..................................101

As descolonizações em África (1957-1990)..............................................................................104

As descolonizações inglesas e francesas na Africa Ocidental e Oriental (1957-1964)..........104

A descolonização portuguesa (1974-1975)..........................................................................108

Os processos rodesiano e sul-africano (1965-1990).............................................................114

A emergência da China.............................................................................................................117

A implantação da República e a unificação do nacionalismo chinês através do Kuo Min Tan


(1911 – 1927).......................................................................................................................118

O decénio de Nankin e a guerra civil – 1927-1937...............................................................120

Da invasão japonesa à 2º reunificação da China republicana (1937-1949)..........................121

Os planos quinquenais até ao fim do Grande Salto em Frente............................................122

A rutura com a URSS e a “Revolução Cultural”.....................................................................124

A nova política de internacionalização.................................................................................125

Os equilíbrios mundiais na época da Guerra Fria.....................................................................127

A última fase da Guerra Fria (1979-1990): Os obstáculos dos conflitos regionais................141

Médio Oriente e a Guerra de Outubro de 1973...............................................................141

3
América Latina e o golpe de Estado no Chile (1973)........................................................143

A guerra civil em Angola (1974-1975)..............................................................................146

A revolução iraniana (1978).............................................................................................147

A invasão soviética no Afeganistão..................................................................................148

A ordem mundial depois de 1991............................................................................................149

Conceitos básicos para a explicação do mundo


contemporâneo: teorias do “imperialismo” e da
circulação de capitais
O Capitalismo designa um modelo de organização social e económica. Baseia-se na
propriedade privada dos meios de produção, na livre iniciativa (possibilidade de qualquer
indivíduo criar fontes de rendimento), tendendo para uma economia de mercado, de livre
empresa, vocacionada para o lucro.

Capital corresponde ao conjunto de bens que pode proporcionar ao seu proprietário


uma renda se forem emprestados ou investidos.

No limiar do século XX, assistimos à formação de monopólios de outro género:


primeiro, uniões monopolistas de capitalistas em todos os países de capitalismo desenvolvido;
segundo, situação monopolista de uns poucos países riquíssimos, nos quais a acumulação do
capital tinha alcançado proporções gigantescas. Constituiu-se um enorme "excedente de
capital" nos países avançados.

O excedente de capital não é consagrado à elevação do nível de vida das massas do


país, pois significaria a diminuição dos lucros dos capitalistas, mas ao aumento desses lucros
através da exportação de capitais para o estrangeiro, para os países menos desenvolvidos.

Nesses países, o lucro é em geral elevado, pois os capitais são escassos, o preço da
terra e os salários relativamente baixos, e as matérias-primas baratas.

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A necessidade de exportação de capitais (exportação de valor com o objetivo de
obtenção de valor suplementar [em forma de mais-valia, juros, lucros não económicos ou não
equivalentes] decorre da lei económica fundamental do capitalismo em resultado do carácter
limitado da aplicação do capital dentro do país, com taxa de lucro máxima. No Imperialismo do
século XX, a consolidação da exportação de capitais dá um sentido diferente dos imperialismos
antigos.

Já Lenine afirmava que: “ (…) O que caracteriza o capitalismo moderno, no qual impera
o monopólio, é a exportação de capital”, uma exportação que serve o capitalismo, modelo de
organização direcionado para os “grandes” se aproveitarem do pouco dos “pequenos”.

Deste modo, a possibilidade de exportação de capitais diz respeito ao carácter desigual


do desenvolvimento económico de diferentes países capitalistas, o que possibilita os
investimentos nos países menos desenvolvidos. Além disso, nos países imperialistas forma-se o
excedente de capital. Este excedente é relativo, já que os capitais que são exportados podem
ser aplicados dentro dos países exportadores para ampliação da produção, eliminação do
desemprego, da inflação, etc. Os impérios modernos eram sinónimos de exportação de
capitais. Portanto, havia uma mudança de paradigma nas relações políticas, já que certas
nações procuravam controlar o governo de outros países para os quais exportavam. Para
comprovar tal facto, o livro de História Moderna: O Imperialismo refere que “ (…) Na época do
Imperialismo, os capitalistas (…) tratavam de exportar fundamentalmente o excedente dos
seus capitais para os países pouco desenvolvidos industrialmente, onde o emprego desse
capital lhes proporcionava grandes lucros. Os capitais são também exportados para as
colónias, assim como para os países independentes.”

Nas vésperas da 1ª Guerra Mundial, o mundo encontrava-se, então, sob controlo


político das potências europeias. De facto, de 1890 a 1910, assiste-se à conquista e
administração de grandes partes de territórios pelos Europeus. Este domínio concretizava-se
numa nova fase de expansão europeia que remontava à segunda metade do século XIX. Pode
dizer-se que a Europa partilhava o mundo entre si. O movimento ficou conhecido por
imperialismo.

O Imperialismo é um conceito proveniente do pensamento político e económico e


designa uma fase do desenvolvimento do liberalismo capitalista. Trata-se de uma fase
superior, que vigorou no fim do século XIX e no início do século XX, caracterizada pela
concentração do capital na metrópole, onde se cria uma oligarquia financeira que domina o
resto da economia. A nível político, a metrópole aplica a sua vontade aos restantes povos

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incluídos nos enormes espaços geográficos. A organização do império é sempre supranacional
e autoritária, impondo a metrópole a forma e a substância da organização política. América,
África, Ásia e Oceânia foram ocupadas e transformadas em províncias, dependentes política,
económica e militarmente da metrópole europeia. As colónias, os territórios ocupados,
serviam para obter matérias-primas baratas e para lá exportar os excedentes e do capital. A
exportação de capital é, pois, feita da metrópole para a colónia.

Nasceu, então, um novo tipo de colonialismo, de caráter imperialista. Este apresentou-


se, pois, sob a forma de conquista territorial e colonização, com uma sujeição política indireta,
dando origem aos protetorados, e sob a forma de controlo económico, pela necessidade
sentida pela Europa industrializada de conseguir novos mercados (as colónias), abastecedores
de matérias-primas e escoadores dos produtos industrializados.

Esta expansão europeia inscreve-se, então, numa estratégia de controlo de uma vasta
extensão territorial com vista à satisfação das necessidades económicas das metrópoles, e foi,
sobretudo, marcada pelo colonialismo que fez de África e da Ásia locais especialmente
cobiçados. Aliás, o caso mais evidente de imperialismo e de colonialismo ocorreu
relativamente à ocupação do continente africano. Em 1885, a Conferência de Berlim ditou as
regras de partilha do continente africano e asiático. Consagrou o princípio da ocupação efetiva
do território, em detrimento dos direitos históricos de descoberta. Em 1914, já só restavam
como Estados independentes, em África, a Etiópia e a Libéria. Já na Ásia, a expansão territorial
europeia não foi intensa. A Índia ficou sob domínio inglês, a Indochina, francês, a Insulíndia,
holandês. Só o Japão e a China permaneceram independentes.

Nas origens do imperialismo, encontram-se motivações de ordem económica: só os


novos territórios (colónias) podiam fornecer as matérias-primas indispensáveis e garantir o
escoamento da produção industrial, além de abrir possibilidades de investimento e colocação
de capitais.

Deste modo, antes da 1ªG.M., o mundo vivia sob um equilíbrio de forças que conduziu
à sua divisão, em que as sociedades capitalistas exportavam capital para fora da Europa,
submetendo as restantes nações política e militarmente aos seus interesses oportunistas.

Nas vésperas da 1ªG.M., as grandes potências imperialistas eram também grandes


metrópoles coloniais (sobretudo a Inglaterra).

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As teorias anteriores às guerras mundiais – a exportação
de capitais como explicação para a nova ordem
internacional

John Hobson (1903)


Foi o primeiro autor a abordar o fenómeno do imperialismo de forma mais profunda e
sistemática. Este autor estabelece uma relação muito direta entre o funcionamento do sistema
económico e o imperialismo. Para ele, a existência de um amplo excesso de capitais nos
grandes países industriais é o fator determinante do imperialismo. Ao não encontrar no
interior mercados suficientes, os industriais e os banqueiros buscam, no exterior, esferas de
inversão vantajosas. Então, o imperialismo responde a interesses setoriais da economia.

Hobson demonstrou que o motor da política de expansão imperial é a busca e o


controlo das esferas de inversão no exterior e que este movimento é consequência de um
excedente de capitais nos grandes países industrializados.

Assim, o fenómeno devia-se à acumulação de capital excedente que devia ser


exportado. Seriam motivações financeiras importantes do expansionismo a busca de novas
fontes de matérias-primas e de mercados.

Aqui reside a grande contribuição de Hobson na discussão teórica sobre a natureza do


imperialismo. Ele identifica que o novo colonialismo tem motivações essencialmente
económicas, relacionadas com o papel do capital financeiro nas sociedades capitalistas
modernas ("A raiz económica do imperialismo é o desejo de poderosos interesses financeiros e
industriais de assegurar mercados privados para os seus bens e capitais excedentes, às custas
do dinheiro público e da força pública").

Rudolf Hilferding (1910)


Utiliza a expressão “imperialismo” como geopolítica para se referir à rivalidade entre
os estados do centro, que implicava uma relação de domínio da periferia. Essa expressão
refere-se ao auge do capital financeiro numa nova era de monopó lio.

Rudolf sistematiza a teoria do imperialismo moderno. Ele partilhava a ideia de que é a


troca, e não a produção, o fator decisivo da economia.

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Para Hilferding, a organização do capital sob égide do capital financeiro,
correspondente a uma expansão extraordinariamente rápida dos monopólios capitalistas, leva
a um processo de “aglomeração nacional”, de nacionalização e a uma luta cada vez mais dura
no mercado mundial. Hilferding chegou à conclusão de que o capital financeiro necessitava de
um grande apoio estatal para se obter proteção económica, territórios para inverter e
matérias-primas e, igualmente, para dispor de mercados para os seus produtos. Assim, a
exportação de capitais adquire uma importância muito especial como causa do imperialismo.

Nesta perspetiva, o capitalismo tem necessidade de maneira imperiosa da expansão


imperialista, a menos que renuncie ao que constitui o seu motor, isto é, o benefício. Hilferding
defende que a rápida expansão do capitalismo, que permite as exportações de capitais, “é a
condição vital de manutenção da sociedade capitalista”. Assim, o imperialismo é para o
capitalismo, na era dos monopólios, uma necessidade económica absoluta, constituindo o
estado supremo da evolução do sistema capitalista.

Rosa Luxemburgo (1913)


Partilhando a visão de Hilferding, Rosa Luxemburgo considera o imperialismo como a
consequência da evolução do sistema capitalista na sua última fase. Não obstante, dá outro
tipo de explicação económica do fenómeno capitalista. O imperialismo provém de uma
contradição essencial do capitalismo: a contradição entre as forças produtivas e os limites do
mercado.

Em finais do século XIX, o capital e a sua acumulação passam a depender da expansão


imperialista. Este movimento de expansão é, inclusive, a expressão política dos processos de
acumulação.

Para a autora, esta expansão só pode dar um prolongamento ao capitalismo, pois a


base de acumulação deste último diminui à medida que o imperialismo se apropria (para
finalmente destruí-las) das economias “naturais” das últimas regiões do globo subtraídas até
então a sua influência. Então, a economia capitalista expandia os mercados até ao ponto em
que a exportação e acumulação excessiva de capitais levaria a uma Guerra Mundial. Ao
contrário de Hilferding, acreditava fatalmente que a competitividade entre países imperialistas
acarretava uma guerra mundial.

A autora mostra que a articulação com outras formações sociais é indispensável ao


capitalismo para que possa existir acumulação. Na época dos monopólios, este processo de
articulação adota a forma do imperialismo, já que o nível de evolução a que chegaram as

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economias capitalistas obriga-as a assegurar o controlo das formações sociais não capitalistas
situadas na periferia.

A distinção entre “imperialismo” e “impérios”


O Imperialismo é um conceito proveniente do pensamento político e económico e
designa uma fase superior do desenvolvimento do liberalismo capitalista. Trata-se do tipo de
política expansionista das principais nações europeias que vigorou no fim do século XIX e no
início do século XX (aqui o conceito foi usado com um conteúdo próprio), caracterizada pela
concentração de capital na metrópole, onde se cria uma oligarquia financeira que domina o
resto da economia. No fundo, uma política de expansão e domínio territorial, cultural e
económico de uma nação sobre outras, ou sobre uma ou várias regiões geográficas
(normalmente mais fracas e subdesenvolvidas), com base na dominação e subordinação. É a
prática através da qual, nações poderosas procuram ampliar e manter controlo ou influência
sobre povos ou nações mais pobres.

A nível político, a metrópole aplica a sua vontade aos restantes povos incluídos nos
enormes espaços geográficos. A organização do império é sempre supranacional e autoritária,
impondo a metrópole a forma e a substância da organização política. América, África, Ásia e
Oceânia foram ocupadas e transformadas em províncias, dependentes política, económica e
militarmente da metrópole europeia. As colónias, os territórios ocupados, serviam para obter
matérias-primas baratas e para lá exportar os excedentes e do capital. A exportação de capital
é, pois, feita da metrópole para a colónia.

Imperialismo refere-se, em geral, ao controlo e influência que é exercido tanto formal


como informalmente, direta ou indiretamente, política ou economicamente, imperando o
domínio do mais forte que pretende submeter o mais fraco, como foi ao longo de toda a
História, aliás, desde a sociedade esclavagista.

Nasceu, então, um novo tipo de colonialismo, de caráter imperialista. Este apresentou-


se, pois, sob a forma de conquista territorial e colonização, com uma sujeição política indireta,
dando origem aos protetorados, e sob a forma de controlo económico, pela necessidade
sentida pela Europa industrializada de conseguir novos mercados (as colónias), abastecedores
de matérias-primas e escoadores dos produtos industrializados.

Esta expansão europeia inscreve-se, então, numa estratégia de controlo de uma vasta
extensão territorial com vista à satisfação das necessidades económicas das metrópoles, e foi,

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sobretudo, marcada pelo colonialismo que fez de África e da Ásia locais especialmente
cobiçados. Aliás, o caso mais evidente de imperialismo e de colonialismo ocorreu
relativamente à ocupação do continente africano. Em 1885, a Conferência de Berlim ditou as
regras de partilha do continente africano e asiático. Consagrou o princípio da ocupação efetiva
do território, em detrimento dos direitos históricos de descoberta. Em 1914, já só restavam
como Estados independentes, em África, a Etiópia e a Libéria. Já na Ásia, a expansão territorial
europeia não foi intensa. A Índia ficou sob domínio inglês, a Indochina, francês, a Insulíndia,
holandês. Só o Japão e a China permaneceram independentes.

Existem três traços para caracterizar o imperialismo: a concentração da produção cria


o monopólio; a fusão do capital bancário com o capital industrial cria o capital financeiro; e a
estagnação da taxa de lucro origina a exportação do capital. Nas origens do imperialismo,
encontram-se motivações de ordem económica: só os novos territórios (colónias) podiam
fornecer a mão-de-obra barata e as matérias-primas indispensáveis e garantir o escoamento
da produção industrial, além de abrir possibilidades de investimento e colocação de capitais
através da busca de mercado consumidor.

“ (…) Na época do Imperialismo, os capitalistas (…) tratavam de exportar


fundamentalmente o excedente dos seus capitais para os países pouco desenvolvidos
industrialmente, onde o emprego desse capital lhes proporcionava grandes lucros. Os capitais
são também exportados para as colónias, assim como para os países independentes.”, in livro
de História Moderna: O Imperialismo.

No Imperialismo do século XX, a consolidação da exportação de capitais/investimentos


dá um sentido diferente aos imperialismos antigos, pois agora o que caracterizava os Impérios
de tipo novo era o fluxo oposto: antes o país explorador retirava a riqueza dos sítios, enquanto

depois começaram a exportar os capitais para o local. Nos séculos XX e XXI houve uma enorme
massa de capitais exportados. Esta prática era feita na expetativa de se receber mais do que o
investido. De outro modo, colocava-se riqueza para gerar mais riqueza. Os países que
começaram a ficar mais comprometidos com estes capitais procuravam garantir que os países
para onde enviavam os capitais eram os países que eles esperavam (cumpriam as regras
impostas). Assim, procuravam controlar os governos dos países para onde exportavam.

Os ingleses eram o maior investidor de capitais nos Impérios coloniais. O Reino Unido
concentra grande parte das exportações de capitais nos seus territórios coloniais. Já a França
era o segundo maior exportador de capitais e foi paulatinamente oferecendo bens a outros
países, sem receber a compensação merecida (só exportava 8,9% para as colónias e o resto

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para outros países independentes). Verifica-se aqui a distinção entre imperialismo e
colonialismo. As relações internacionais eram dominadas pela tentativa de alguns países
exercerem influência sobre outros e assim exportar o seu capital (no início do século XX eram
consideradas potências aquelas que mais exportavam).

Não era necessário que fosse uma relação colonial (China, Império Otomano e América
Latina pediam empréstimos aos grandes centros financeiros de Londres e Paris, sendo países
independentes). Então, o imperialismo do século XX não está associado à criação de colónias
(países como Portugal têm impérios coloniais mas não são imperialistas; países como os EUA
não têm impérios coloniais mas são imperialistas). Esta relação podia ser feita entre dois países
independentes, ou seja, não está associado à posse de colónias.

No início do séc. XX, a exploração de capitais podia ser feita de duas formas:
investimento direto ou investimento indireto. O investimento direto era feito diretamente por
empresas que se instalam no exterior (as multinacionais). Se os mercados não fossem
fechados seria mais fácil aumentar a produção dentro já do país instalado. O capital em
excesso torna-se produtivo num mercado fechado. Já o investimento indireto (ou de carteira)
é feito normalmente por bancos (acionistas), que aplicam o investimento e compram dívidas
públicas (empréstimos públicos feitos a governos). Essas dívidas condicionam muito a política
dos países importadores, conduzindo, muitas vezes, a situações de ruturas de pagamentos,
expondo um determinado país com menos capacidade de pagamento a um ataque ao seu
orgulho.

Os Impérios são grupos de Estados ou reinos com domínio sobre extensos territórios
subordinados a um chefe supremo, o imperador, apresentando também um poder
hegemónico em certa área de influência. Esses grupos formaram-se, quer pela sua livre
associação, geralmente com objetivo de defesa mútua, quer pela dominação de vários estados
por um estado dominante. Foi desta forma que se formaram os grandes impérios coloniais.

O império também é uma forma de governo monárquico, cujo chefe é um imperador.


Em sentido restrito, designa a própria autoridade ou poder de um soberano, imperador ou
imperatriz. Também se denomina império ao conjunto dos territórios que rege um estado
imperial.

Nas vésperas da I Guerra Mundial, o mundo encontrava-se sob controlo político das
potências europeias. De facto, de 1890 a 1910, assiste-se à conquista e administração de
grandes partes de territórios pelos Europeus. Este domínio concretizava-se numa nova fase de

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expansão europeia que remontava à segunda metade do século XIX. Pode dizer-se que a
Europa partilhava o mundo entre si. O movimento ficou conhecido por imperialismo.

As teorias do “imperialismo” depois de 1945: as causas do


“subdesenvolvimento” e da “dependência”
Após a 1ª Guerra Mundial e no período entre guerras, as potências vencedoras
consolidaram os seus impérios coloniais. Os anos 20 e 30 foram o apogeu dos impérios
coloniais. Mas depois da 2ªG.M., a situação volta a mudar com a desagregação dos impérios
coloniais e a bipolarização política do mundo. O imperialismo passou a ser designado como um
fenómeno social que explicava as diferenças e o desfasamento de riqueza entre países
desenvolvidos e não-desenvolvidos, que, apesar de tudo, já não é um tema que é novidade na
História Mundial.

A teoria da dependência pensava que as relações políticas se explicavam pela oposição


entre os países do centro e os países da periferia. O agravamento deste fosso é um fenómeno
previsível, já que os países ricos ficavam cada vez mais ricos, ao passo que os pobres
reforçavam essa condição. Países centrais no âmbito da economia mundial são identificados
como espaços onde ocorre a manifestação do meio técnico científico informacional em escala
ampliada e os fluxos de capital surgem igualmente com mais intensidade, ou seja, acumulam o
seu nível de rendimentos do mercado mundial face à periferia.

Os países periféricos (países subdesenvolvidos ou do terceiro mundo) apresentam-se


como aqueles espaços onde os fluxos, o desenvolvimento da ciência, da técnica e da
informação ocorrem em menor escala e as interações em relação ao centro se dão
gradativamente. Nos anos 30, o rendimento do centro era quatro vezes superior ao da
periferia.

Os teóricos da dependência viam desenvolvimento e subdesenvolvimento como


posições funcionais dentro da economia mundial, ao invés de estágios ao longo de uma escala
de evolução das nações. A teoria da dependência trata do relacionamento das economias dos
países da periferia com as economias dos países do centro e que estas relações económicas
“dependentes” por parte dos países periféricos em relação às economias centrais criavam
redes de relações políticas e ideológicas que moldavam formas determinadas de
desenvolvimento político e social nos países “dependentes” ou “periféricos”.

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A dependência expressa subordinação, a ideia de que o desenvolvimento desses países
está submetido (ou diria limitado) ao desenvolvimento de outros países e não era forjada pela
condição agrário-exportadora ou pela herança pré-capitalista dos países subdesenvolvidos mas
pelo padrão de desenvolvimento capitalista do país e pela sua inserção no capitalismo mundial
dada pelo imperialismo. Portanto, a superação do subdesenvolvimento passaria pela rutura
com a dependência e não pela modernização e industrialização da economia, o que pode
implicar inclusive a rutura com o próprio capitalismo, o que, a meu ver, pode justificar as
políticas de extremas direita/esquerda, bem como o longo processo das descolonizações que
se sucederam no séc. XX.

No ensaio “O desenvolvimento do subdesenvolvimento”, Gunder-Frank argumenta


que o subdesenvolvimento “não é devido à sobrevivência de instituições arcaicas e à existência
de escassez de capital em regiões que permaneceram isoladas do fluxo da história mundial. Ao
contrário, o subdesenvolvimento era e ainda é gerado pelos mesmos processos históricos que
também geraram desenvolvimento económico: o próprio desenvolvimento do capitalismo”.
Nesta visão, o que estava a ser reproduzido juntamente com o desenvolvimento dos
estados no centro da economia capitalista mundial era o subdesenvolvimento e sob
circunstâncias normais a subordinação permanente daqueles estados na periferia. A conversão
de regiões periféricas em novos centros faz-se pela acumulação interna de capitais até serem
exportadoras.

Imperialismos com Impérios Coloniais


Nas vésperas da 1ª Guerra Mundial, as grandes potências imperialistas, os países que
exportavam capitais, eram também metrópoles coloniais.

Estes estavam sobretudo instalados na Europa. Paralelamente havia alguns outsiders,


como o Japão e os EUA. A maior parte da superfície terrestre do globo estava plenamente na
posse física e legal de nações europeias ou dos seus rebentos ultramarinos, nações novas,
como o Canadá ou a Austrália, ou derivados mais antigos dos impérios europeus, como as
repúblicas americanas, do Norte e do Sul.

Grã-Bretanha nas vésperas da 1ª G.M.


A Grã-Bretanha era o país mais industrializado e também possuía o maior nível de
exportação de capitais, pelo que detinha um vasto império colonial, composto por domínios
(com governo próprio), protetorados (white sttlements) e colónias (colonial offices).

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Por ser o país mais industrializado e com maior nível de exportação de capitais, tinha
uma posição contra a guerra e os próprios impérios coloniais, dependendo do mercado livre e
sem barreiras (era contra o protecionismo). O seu domínio hegemónico assentava em bases
navais para que pudesse exercer um controlo do comércio e das próprias rotas de acesso,
evitando, simultaneamente a concorrência. Até porque “[a]Inglaterra era fortemente rica e
possuía um vasto império ultramarino. (…) [a]s suas indústrias eram responsáveis por uma
grande parte do comércio mundial. A sua posição global era garantida por uma marinha
colossal. (…)”, tal como já afirmava Norman Stone, no livro Primeira Guerra Mundial.

Deste modo, a Inglaterra tinha interesse em ter uma rede marítima mundial e o
controlo das regiões mais populosas, como a da Índia. Desde meados do século XIX que a
Inglaterra controlava grande parte da Índia.

A Índia era a maior fonte de riqueza britânica, tornando-se o centro de gravidade do


império, pois situava-se no centro das comunicações marítimas. Detinha um estatuto
administrativo (o governo inglês controlava diretamente uma parte do território, sendo que a
restante estava nas mãos de príncipes locais), sendo que os ingleses ainda controlavam a
defesa e os transportes para a região. Deste modo, a abertura do canal do Suez (na década de
1860), que ligava o Mar Vermelho ao Mar Mediterrâneo, ao aproximara Europa e a Ásia fez
com que, em 1882, o Egito (que controlava o canal do Suez) fosse invadido pelos ingleses,
passando estes a deter o poder político do canal. Os ingleses sempre se salientaram na História
pela sua astúcia e inteligência.

Os ingleses consideravam a África Oriental também como prioridade, devido à


proximidade com a Índia e à imensa extensão do rio Nilo que abrangia esta área africana e que
podia facilitar o acesso à Índia, o que acabou por acontecer. Assim, os ingleses promoveram a
conquista imperialista no Egito e o domínio do Canal de Suez, bem como nas regiões
circundantes da Índia. “ (…) A marinha de guerra foi sempre a alavanca mais importante da
burguesia inglesa para a conquista colonial. A sua frota tornava possível o transporte de
quantas tropas eram necessárias para as guerras coloniais e as expedições de castigo. A
burguesia inglesa esforçava-se para que a sua marinha de guerra fosse a mais forte do
mundo.”, in História Moderna: O Imperialismo (página 107).

Os impérios coloniais ocupavam quase metade do mundo, pelo que o segundo maior
exportador de capitais antes da 1ªG.M. era a França.

14
França nas vésperas da 1ªG.M.
O império francês estava melhor localizado do que o inglês. A geopolítica francesa
centrava-se na África Ocidental e na Indochina. À exceção da Argélia, todos os territórios
foram conquistados em plena fase do imperialismo. Na África, as possessões francesas
situavam-se em áreas desérticas de difícil acesso. A nível administrativo, estes territórios
estavam divididos em África Ocidental Francesa (AOF), com sede administrativa em Dakar e
que integrava territórios como o Senegal, o Mali, a Níger…; e África Equatorial Francesa (AEF),
cujos países integrados eram o Congo, o Gabão, a República Centro-Africana e Chade, que
mantinham a comunicação entre si. É de salientar que as suas colónias mais rentáveis eram a
Indochina (Vietname, Laos, Camboja, Malásia, Myanmar Singapura e Tailândia), o Congo e a
Costa de Marfim.

Porém, a França também tinha domínios no Mar Vermelho, em Madagáscar, e na


Polinésia Francesa.

Uma vez que só 4% do capital francês era exportado para as colónias, pode-se afirmar
que a França detinha um colonialismo muito pouco imperialista, até porque o seu poder se
encontrava muito reduzido devido às guerras perdidas no séc. XIX, sendo que uma delas
estava relacionada com o facto das pretensões francesas no território africano irem de
encontro com as pretensões inglesas. E a verdade é que os ingleses, muito raramente
permitiam que alguém se “atravessasse no meio” das suas pretensões e/ou ambições e saísse
impune.

Os objetivos estratégicos franceses colidiam com os dos ingleses, pois a tendência era
expandir para o Nilo (no sentido oeste-leste, em direção ao Sudão). O incidente de Fachoda
(cidade localizada atualmente no Sudão do Sul) ocorreu entre 1898 e 1899, quando França e
Inglaterra decidiram construir ferrovias para ligar suas colónias africanas. A referida cidade
situava-se na intersecção das linhas. Uma expedição militar francesa foi enviada a Fachoda
antes que a força expedicionária britânica, originária do Egito, chegasse à cidade. Porém, os
franceses tiveram que se retirar da cidade devido à sua inferioridade militar. Embora o exército
francês continental fosse considerado maior e mais poderoso que o britânico, nada poderia
fazer no contexto africano sem o devido apoio naval, já que a Grã-Bretanha possuía a mais
poderosa marinha do planeta.

15
Alemanha nas vésperas da 1ªG.M.
A Alemanha era um país recente (unificado apenas 1971) e, apesar das suas colónias
pouco significativas, era a potência mais próxima de Inglaterra, tentando igualá-la ou superá-la
constantemente, principalmente a nível de frota naval (no início do séc. XX, a Alemanha e a
Inglaterra travaram uma corrida ao armamento entre elas), de modo a assegurar os seus
investimentos nas colónias, até porque durante muito tempo, a Alemanha este sem condições
para exportar capital. Na época imperialista, a Alemanha passou a controlar colónias em
África, mas não foi exportadora de capitais, pois queria garantir a proteção dos seus
investimentos nas colónias, constituindo então, um bom exemplo de uma nação que não era
um império colonial, mas que era uma nação imperialista. O império alemão não tinha
qualquer objetivo colonialista, aspirava ser uma potência naval e possuir um domínio
industrial.

A Alemanha tinha um grande problema de crescimento: não tinha domínio comercial


colonial equivalente à sua capacidade industrial. Portanto, tentava potenciar um modelo que
colidia com o dos ingleses – queria ser uma potência naval (principal ponto de fricção entre
ingleses e alemães). Tudo isto trazia para a Inglaterra um problema de segurança e tirava-lhe o
domínio naval mantido até à altura.

A proximidade do poderio económico da Alemanha e da Inglaterra fez com que


houvesse uma rivalidade entre estes dois países. A rivalidade anglo-alemã não era só em
termos de exportação de capitais, económicos, mas também em termos políticos.

Ao exportar capital para um país, o exportador fica ligado ao importador e pede


garantias de pagamento das dívidas. Ao emprestar capital a um país, a potência exportadora
vai receber os pagamentos dessas exportações com juros – os países importadores ficam em
dívida para com elas.

“Por que não haveria a Alemanha de adquirir um império ultramarino (…)? (…) o
poderio alemão e a sua expressão disparatada tornaram-se um – o – problema europeu.”, por
Norman Stone em Primeira Guerra Mundial. Tanto que a rivalidade anglo-alemã não era só em
termos de exportação de capitai, mas também em termos políticos. Além desta, a Alemanha
também acabou por comprar uma rivalidade com a França ao anexar ao seu território Alsácia e
Lorena, após a Guerra Franco-Prussiana (1870-1871), o que lhe valeu o isolamento político
quando a França se uniu com a Rússia, nesse mesmo sentido. Pois, a França sabia que a união
política alemã criaria um Estado forte, extremamente perigoso para a sobrevivência francesa.

16
Então, Rússia uniu-se com a França porque esta lhe emprestava capital, pelo que estava como
em dívida para com ela.

Se este fenómeno acompanha as relações das potências imperialistas, essas potências


vão discutir áreas de influência. Veja-se que a rivalidade com Inglaterra não tinha
forçosamente que levar à guerra por si só: o que a originou foram os sistemas de alianças de
ambos os países.

Neste contexto, Bismarck – responsável pela unificação política germânica –, de modo


a preservar todos os ganhos obtidos, praticou uma inteligente política externa que consistiu na
promoção da Liga dos imperadores, uma série de conferências onde através de negociações
políticas a Alemanha conseguia todos os seus objetivos, e na condução do Congresso de
Berlim, realizada pelo chanceler prussiano em 1878, evidenciando que a negociação política
seria uma ótima forma de realizar os seus interesses nacionais. E a nível interno, Bismarck
adotou políticas que permitiram o crescimento de todos os estados alemães. A Alemanha
preparava-se para se transformar num dos Estados mais fortes do Mundo.

A Inglaterra tinha uma política de não entrar em alianças, mas França e Alemanha
começavam a criar sistema de alianças defensivas/ofensivas. As potências estavam
organizadas em mercados fechados efetuavam e alianças com estados médios. Mais tarde
(1904), os ingleses resolvem desequilibrar os pratos da balança e aliar-se à França, formando a
Entente Cordiale. Após chocarem, os interesses coloniais tornaram-se num convénio de
interesses contra terceiros. Estavam traçados os dados geopolíticos que causaram a 1ªG.M..
Nada como interesses capitalistas para unir dois países com desavenças, até porque como o
velho ditado afirma, “A união faz a força” e é essa força que a Inglaterra nunca pretende
perder.

A política externa do Império Alemão era extremamente agressiva. Em 1875, o


Governo Imperial estava disposto a empreender uma nova guerra contra a França a fim de
dominar completamente este país e de o converter em seu vassalo. Valeu a intervenção da
Rússia. É que tal como a França, ela temia um novo fortalecimento da Alemanha.

Para terminar, salienta-se só os limites do território, de modo a deixar uma ideia mais
concreta do espaço geográfico e da dimensão da ameaça para a Inglaterra, já que esta tanto
temia o crescimento da Alemanha. A Alemanha, a par do Império Austro-Húngaro, constituía
os impérios centrais. A Prússia era o estado principal dos Estados do Império: todos os outros
eram muitos mais pequenos e fracos (África Ocidental Alemã [protetorados do Togo e
Camarões], África Oriental Alemã [Tanganyica, Burundi e Ruanda], Sudoeste Africano Alemão

17
[Namíbia], bases na China [Baía de Kiauchau, Tianjin e Qingdao] e ilhas do Pacífico tropical
[protetorados de Nova Guiné Alemã e Samoa Alemã]).

O Império Russo nas vésperas da 1ªG.M.


O império russo foi construído a partir do século XVI, com a expansão do principado de
Moscovo (e que viria a crescer até ao Alasca), e detinha um império colonial continental, onde
não era exportador, mas sim importador de capital, considerando-se uma potência
imperialista de 2ªordem (ou seja, pouco imperialista).

Porém, no início da vaga imperialista de 1890, a Rússia já era uma grande potência
colonial, ascendente a potência imperialista devido à rápida industrialização que fomentou a
exportação de capital.

Pouco tempo depois, as pretensões expansionistas russas na Ásia vão de encontro com
as posses e outras potências imperialistas, nomeadamente o Japão, que ocupava a China e a
Coreia, sendo que o principal interesse estratégico russo era a China. A “Rússia” preferia
expandir para o sudeste asiático devido às oportunidades comerciais que o Pacífico lhe
oferecia, pois o lado Este, correspondente ao Mar Negro, já estava repleto de concorrência
(Império Otomano – adversário perigoso, visto que estava protegido pelos impérios
ocidentais). Para além disso, o grande problema do Império Russo era o facto de não ter
acesso a um mar navegável. Tinha apenas acesso ao Mar Báltico, mas este encontrava-se
gelado. De resto, grande parte do seu território era marcado por uma grande planície gelada,
ou seja, não podia ser uma potência naval por causa do clima.

Deste modo, a “Rússia” alimentava o objetivo de chegar a uma zona do Pacífico em


que pudessem ter acesso a mares quentes e territórios que permitissem desenvolver a sua
expansão, atingindo zonas habitadas (China do Norte), havendo o obstáculo do império
japonês. O avanço pautava-se para sudeste através de um grande caminho-de-ferro
transiberiano (ao chegar à China, este inverte para Sul até Pt. Arthur).

Foi criada uma capital, São Petersburgo, a partir da qual se iniciou a expansão para
Ocidente e depois para Oriente. A Rússia detinha já o Mar Negro, a zona do Cáucaso,
Cazaquistão, Turquestão, tendo, depois, conseguido atingir o Oceano Pacífico.

Assim, quando começa a vaga imperialista de finais do século XIX, a Rússia detinha já
um império colonial do tamanho de um continente. Já era, pois, uma grande potência colonial,

18
ascendente como potência imperialista devido à rápida industrialização que fomentou a
exportação de capital.

Mas, nesta época imperialista, a Rússia começou a ver-se impedida pela Inglaterra na
sua intenção de se expandir para o sul da Ásia, o que levou a choques entre as duas potências.
Mais uma vez, a Inglaterra evidencia que a hegemonia só pode ser dela e que o lugar no pódio
é pouco se este não for no primeiro lugar.

Houve também uma colisão de interesses com o Japão, com quem a “Rússia”
disputava territórios, sobretudo a Manchúria. Aliás, em 1904-1905, dá-se a Guerra Russo-
Japonesa devido a interesses económicos nessa região (a Manchúria possuía grandes jazidas
minerais), como sempre, vêm à tona os interesses económicos. Desta guerra, sai vencedor o
Japão, o qual acaba por ocupar a zona, sendo que o Império Russo saiu economicamente
debilitado.

Ainda assim, “[e]m 1913, verificou-se [na Rússia] o aumento decisivo: um «grande
programa» destinado a converter a Rússia numa «superpotência». Este programa teria dotado
a Rússia de mais canhões do que a Alemanha (…) ” (Norman Stone), ao lado da França e da
Inglaterra, o objetivo só poderia ser, então, vencer.

Império Otomano nas vésperas da 1ªG.M.


O Império Otomano foi criado no século XV e, no século XVI, já agregava toda a bacia
do Mediterrâneo até à Argélia e do Danúbio (zona dos Balcãs). Agregava, também, povoações
muito diferentes a nível étnico e cultural. No século XVII chegou a querer invadir Viena, mas
depois, com a entrada da concorrência ocidental (Inglaterra e França) no Mediterrâneo,
começou a decair.

Deste modo, no século XIX, vivia na eminência de desagregação, o que acabou por não
se verificar devido às divergências de opinião entre todas as nações do Império. Além disso, os
países rivais não conseguiram chegar a acordo acerca de quem iria tirar partido dos territórios
do Império e foi essa pressão que permitiu que este ainda se mantivesse. Por exemplo, a
Inglaterra não tinha influência suficiente para desagregá-lo, mas tinha poder para impedir que
outros (nomeadamente a Rússia) o fizessem. Mais uma vez, nada pode destronar os desejos
ingleses, eles sempre se quiseram assumir como os mais e os melhores e não admitiam
partilhar o primeiro lugar do pódio com ninguém.

19
A sua estrutura era muito diferente dos outros impérios. A partir do século XIX, houve
um grande fluxo de capitais estrangeiros destinados ao Império Otomano, nomeadamente
franceses e ingleses, empréstimos para tentar modernizar-se e, decerto, para a Grã-Bretanha
manter o Império Turco sob controlo.

Em 1830/40, este Império conheceu, então, um grande número de reformas políticas e


económicas. O poder do sultão foi enfraquecendo cada vez mais e, em 1908, houve mesmo
uma tentativa de instaurar uma monarquia constitucional, tal como eu afirmei anteriormente,
a ajudar dos britânicos não podia ser em vão.

A Alemanha era a potência que estava a ter mais hegemonia ao nível militar e do
investimento, havendo uma tentativa de unir, por caminho-de-ferro, Berlim a Bagdad (The
Berlin Bagdad-Railway), e que atravessaria regiões influenciadas pela Alemanha, um projeto
que não se chegou a realizar antes da 1ª G.M..

Em 1914, o Império Otomano incluía a Bulgária, Anatólia e partes da Península Arábica


(exceto a extremidade sul e leste), indo até ao fim do Golfo Pérsico. A zona entre o Mar
Vermelho e o Golfo do Pérsico constituía o Médio Oriente. Depois, havia o Extremo Oriente
(como a China).

No Golfo Pérsico a potência dominante era a Inglaterra, como não é de admirar, visto
que parece que não há nenhum local que a Inglaterra não queria controlar. Recorde-se que as
áreas sob influência inglesa eram a Índia e o Egipto (relativamente ao canal do Suez). Tal como
tinha acontecido com a China, o Império Otomano estava cada vez mais dominado pelas
políticas imperialistas. Para a Rússia era um alvo estratégico, pois podiam finalmente ter
acesso a um mar quente em zonas europeias. Havia, portanto, um choque entre o Império
Russo e as colónias inglesas.

Decorrente deste choque entre o Império Russo e a Grã-Bretanha, é relevante explicar


que o islão não é uniforme, já que existem duas grandes linhas religiosas (sunismo [a maior
corrente islâmica] e xiismo). Na Pérsia, a corrente do mundo muçulmano é maioritariamente a
corrente xiita e não a sunita. Esta região tinha, então, dois focos de pressão: a Inglaterra e a
Rússia, desde Este da China até aos Balcãs, onde os imperialismos estavam em contacto,
sobretudo nas zonas de passagem (isto fazia com que a Inglaterra e a Rússia fossem
adversários durante todo o século XIX, se calhar, foi pelo Império Russo ter comprado tantos
inimigos que a sua situação era tão deplorável quando se deu a Revolução de Fevereiro em
1917). A Inglaterra já tinha conseguido algumas bases navais no Mar Mediterrâneo Oriental
(Chipre). Já a Sérvia constituía um protetorado russo. A Roménia e a Bulgária foram criadas nos

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estilhaços do fim do Império Otomano. A Bulgária era mais ligada aos Impérios Centrais. A
Grécia apoiava-se mais na Inglaterra. Ao atuar, este tipo de forças retardaram a guerra.

O Tratado de Berlim, concluído em 13 de julho de 1878, foi acordado entre as


principais potências da Europa e o Império Otomano o estabelecimento de um verdadeiro
regime de controlo permanente sobre a administração interna do Império, de maneira a
garantir o que os europeus invocavam como um mínimo aceitável de direitos, em particular a
"liberdade religiosa" para os cidadãos submetidos à lei turca. Assim, a Bósnia fica na influência
do Império Austro-Húngaro (aliado da Alemanha), ou seja, é visível que a situação era muito
instável nas vésperas da 1ªG.M..

A emergência do Japão – industrialização e primeira expansão


continental – Guerra com a China (1894-1895) e com a Rússia (1904-
1905)
O Japão cresce nos princípios do século XX e tinha feito uma expansão continental com
a ocupação da China e da Coreia, em busca de minério e de novas áreas de exportação, de
modo a fazer concorrência com a Europa. Não tinha acesso a matérias-primas necessárias à
industrialização, como o carvão, ferro e borracha. Tratava-se, também, de uma potência
imperialista sem império colonial.

No século XIX, o Japão fechou-se ao comércio europeu, evoluindo de forma autónoma


para evitar cair numa espécie de colónia. Assim, tem um papel fulcral nas guerras e na política
mundial do século XX. Esteve quase na órbitra do Imperialismo Ocidental, mas as frotas
americanas entraram no Japão na década de 1950, invadindo os seus portos.

Quando os americanos chegam ao Japão em meados do século XIX e obrigam-no a


abrir as portas à economia internacional, os japonenses iniciam um programa de
modernização: começaram a importar tecnologia e capitais (economia centralizada), mediante
um controlo político definido. Assim, o Japão foi o primeiro país asiático a modernizar a sua
economia através de uma industrialização acelerada e surpreendente (recorrendo
basicamente ao capital)

A modernização japonesa foi personificada pelo imperador Mutsu-Hito, que lançou o


país numa era de progresso: o período/dinastia Meiji (era das luzes), que se estendeu de 1868
a 1912. Em poucos anos, o Japão, de país agrícola e atrasado, converteu-se numa potência
imperialista militar e competitiva, com uma enorme base industrial e com interesses na Ásia. O
impulso industrializador ficou a dever-se, sobretudo, ao Estado que promoveu a entrada de

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capitais e técnicos estrangeiros, adquiriu no estrangeiro os equipamentos necessários à
modernização, financiou a criação de novas indústrias, às quais concedeu exclusivos e outros
privilégios e promoveu a construção de uma rede ferroviária. Na atualidade, o capitalismo de
estado da China assemelha-se bastante ao do Japão no século XIX.

Para o progresso industrial japonês, alicerçado nos setores da seda, do algodão, da


siderurgia e da construção naval, contribuíram também o forte crescimento demográfico (que
proporcionou abundante mão-de-obra barata) e o orgulho nacional, que incutiu nos japoneses
o sentido de superioridade rácica relativamente aos demais povos asiáticos.

Houve também aqui uma mistura estranha entre capitalismo e feudalismo, pois
manteve uma grande aristocracia e mentalidade feudal, mas ao mesmo tempo adotou o
capitalismo. De resto, a indústria japonesa era controlada por proprietários que eram nobres
da aristocracia. Para a industrialização, o Japão aproveitou o facto de não ser uma colónia
como a China (era um arquipélago – fechava mais facilmente as portas estrangeiras – e
detinha um sistema feudal por ser mais fraco do que o chinês) e aproveitou a base da
apropriação do excedente rural camponês e posterior transferência para a indústria ou para o
Estado, que depois arrendava a indústrias. Na Europa Ocidental, a industrialização surge
também através de excedentes agrícolas. O aumento da produtividade agrícola/rural conduz
ao aumento do excedente. Isso faz aumentar os lucros/riquezas, que depois são transferidas
para a indústria.

Entre 1894 e 1895, os japonenses tentaram entrar na China e na península coreana (1º
Guerra Imperialista Sino-Japonesa). A China era um país bastante rural e pobre, que foi,
durante a maioria do imperialismo semicolonial (vários países a tentarem ganhar influências
na China). O conflito entre o Japão e a China terminou em março de 1895, com os dois países a
assinarem o tratado de Shimonoseki, que levou os chineses a aceitar a concessão aos
japoneses da Ilha Formosa, das Ilhas Pescadores e de Liaodong e a perda de alguma influência
que outrora exercera na Coreia. No entanto, nesse mesmo ano, a Rússia, que via a expansão
de Japão como um perigo aos seus interesses geopolíticos na zona, apoiada pela França e Grã-
Bretanha, pressionaram o governo japonês para que amistosamente reconsiderasse as
vantagens obtidas pelo Tratado de Shimonoseki.

O Japão, que se via incapaz, no momento, de enfrentar a Rússia, sobretudo por esta
estar apoiada pelos franceses e pelos britânicos (a afronta britânica sempre foi terrivelmente
temida) cedeu e teve de renunciar em favor da Rússia, aos direitos adquiridos sobre a

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península de Liaodong e a sua cobiçada praça estratégica de Port Arthur. Apesar de conservar
os restantes ganhos territoriais e a influência sobre a Coreia, este facto criou um considerável
ânimo de vingança entre os japoneses, pelo que considero que a partir daí tenha vindo a
crescer fortemente o orgulho japonês. Assim, a desforra surgiria sensivelmente dez anos mais
tarde, com a guerra russo-japonesa.

Em 1904 o Japão começou a conquistar território chinês e tentou entrar na área que
colidia com a Rússia. Posto isto, em 1905 deu-se a guerra russo-japonesa (especial destaque
para a batalha naval de Tsushima, em que os japonenses atacaram as frotas russas
provenientes do Báltico, derrotando um adversário bastante fragilizado que teve de mudar o
seu trajeto para fora dos canais regulares de transporte marítimo, de forma a reduzir as
hipóteses de deteção ao aproximar-se das águas japonesas). Esta guerra terminou com a
vitória surpreendente do Japão, e tornou-se na primeira grande derrota do Imperialismo
Europeu (o Japão ganhava estatuto). O Japão passou a retomar algumas posições russas (em
1910, a Coreia torna-se num protetorado japonês). O protetorado consiste num sistema de
proteção em que um país domina o outro, apesar de ambos serem independentes. De resto,
isto antecipava aquilo que viria a constituir a 2ªG.M..

Após a industrialização e a supracitada vitória, o Japão procurava, através da sua


importante indústria têxtil e pesada (fabrico de armas), crescer em termos de área de
expansão, de influência e de investimento (especialmente no Pacífico tropical). De outro
modo, procurava o investimento externo através de novas áreas de exportação. É que
exportar uma considerável quantidade de capitais obrigava à necessidade de matérias-primas.
No entanto, esta expansão para o resto do Pacífico colidia com os interesses dos europeus que
possuíam colónias na Ásia tropical e com o crescimento imperial dos EUA (potência em
ascensão). Apesar de tudo, o Japão revelou um crescimento e um desenvolvimento dos mais
positivos e surpreendentes da História.

A emergência dos Estados Unidos - industrialização e primeiras


conquistas coloniais - guerra com a Espanha (1898-1899) e construção
do canal do Panamá (1901-1914)
Até à Guerra Civil (1861-1865), os EUA eram um país pouco desenvolvido que
exportava maioritariamente matérias-primas como madeira e algodão, ou seja, era um país
maioritariamente agrícola. Depois desta guerra, o seu enorme mercado interno já era um
estímulo para a sua própria industrialização, o que tornou os EUA num império em ascensão,

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com um crescimento muito rápido. Grande parte desta industrialização é feita com a
importação de capitais ingleses. Chegaram a ultrapassar a Inglaterra e a Alemanha na
produção de aço no início do século XX. Importa referir que outros países com grandes
territórios não puderam crescer enquanto potências pois não tinham controlo interno político.

Deste modo, criaram barreiras pautais (impostos alfandegários) para transferir


excedente camponês para a indústria e proteger o seu mercado, tornando-se o país mais
protecionista de todas as economias capitalistas. No fundo, industrializaram-se numa
economia fechada (com poucas influências externas e poucas importações). Até ao século XIX
os EUA eram uma fortaleza comercial, o que decerto que não agradava à “toda poderosa” Grã-
Bretanha. Só no princípio do século XX, quando já constituíam uma potência industrial e naval,
é que os EUA começaram a exportar capital e já eram capazes de ter a sua própria política
externa para a proteção dos capitais.

Os EUA eram uma potência imperialista, sem império colonial, em crescimento


galopante. Iniciou-se com a compra, conquista ou anexação de várias colónias independentes
como o Louisiana, Oklahoma, Ohio, Texas, Novo México. Apesar de não terem colónias, tinham
um grande potencial imperialista.

Durante o século XIX, os EUA estavam isolados do resto do mundo, porque não
importavam nada. Os americanos tinham acesso a muitas matérias-primas e eles próprios as
transformavam. Aliás, os EUA exportavam maioritariamente matérias-primas como a madeira
e o algodão, sendo esta última a base industrial europeia. Possuía um vasto mercado interno e
estava independente.

A partir do momento em que estavam industrializados, os EUA tinham um grande


interesse na América Central e na América do Sul. Como nestas regiões havia um equilíbrio até
à 1ªG.M., os americanos tentaram contrariar as influências europeias (que detinham alguma
predominância) através da Doutrina Monroe, que tinha como objetivo impedir a influência e
interferência europeia principalmente nos territórios vizinhos mas também no resto do
continente americano, pois defendia o ideal “América para os Americanos”. Seguem-se outros
territórios vizinhos e também as Filipinas. Os interesses coloniais americanos centram-se
especialmente no Pacífico, em pequenas ilhas.

“Os capitalistas norte-americanos (…) tinham um interesse especial em ver [Cuba]


ocupada pelo seu governo. Os EUA começaram a preparar a guerra contra a Espanha.
Decidiram aproveitar-se do movimento de libertação nacional que se propagava a Cuba, e ao
mesmo tempo, a outra colónia espanhola, as Filipinas. (…) Em 1898 o Congresso dos EUA

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declarou guerra à Espanha (…) esta guerra revelou a todos a debilidade e o estado de
desagregação interna da monarquia espanhola, que sofreu rápida derrota e teve de se
resignar a pedir a paz.” (In História Moderna: O Imperialismo)

A paz foi assinada no Tratado de Paris de 1898, negociado em condições favoráveis


para os EUA, que permitiu o seu controlo temporário sobre o protetorado de Cuba e cedeu por
tempo indeterminado a autoridade colonial sobre Porto Rico, Guam e as ilhas das Filipinas.
Simultaneamente, a Espanha renunciou todas as suas pretensões sobre a ilha de Cuba,
entrando o seu império em declínio. Os Estados Unidos passaram a ter interesses concretos no
Pacífico e ganharam várias posses insulares em todo o globo e um novo debate rancoroso
sobre a sabedoria do expansionismo.

O centro de gravidade político dos EUA encontrava-se a Leste, nas principais bases
navais americanas. Contudo, os americanos construíram em 1901 o Canal do Panamá. Isto
tinha um duplo interesse. Por um lado, um interesse estratégico e comercial, pois a frota de
guerra americana encurtava e, por conseguinte, facilitava bastante a passagem marítima do
Atlântico para o Pacífico através do istmo. Por outro lado, possibilitava ao país a consolidação
da sua hegemonia no Extremo Oriente e na América Latina. De resto, o Pacífico constituía a
zona de exploração norte-americana. O arquipélago das ilhas do Havai transformou-se em
Estado americano, distanciando-se a 3500km da costa californiana.

Também entram num conflito de interesses com os ingleses e os alemães, como já


seria de esperar, tendo em conta que a Inglaterra é assim mesmo, mas este foi resolvido
pacificamente, ao contrário da expansão para Oeste, onde houve uma guerra com o Japão
(duas potências com interesse no Pacífico) que só viria a ser resolvida após a 2ª Guerra
Mundial. A 2ªG.M. era, então, anunciada ainda antes do início da primeira. Estava aberto,
assim um período que nunca mais teria fim, o período da hegemonia americana. A Grã-
Bretanha foi ultrapassada e não podendo ser melhor do que os americanos, juntou-se a eles,
garantindo, simultaneamente, um lugar no pódio mundial também para si.

Os conflitos imperialistas – fatores de conflito entre as


potências
A filosofia do imperialismo sugeria que a exportação contínua de capitais para as
colónias causava a necessidade absoluta de possuir territórios ultramarinos. Como todos os
impérios queriam alargar a sua zona de domínio, aconteceu, no início do século XX, uma feroz

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competição entre eles. A Itália lançou-se na conquista da África do Norte, enquanto a
Alemanha reivindicou territórios ultramarinos para si. Logo, a competição económica passou a
ser uma rivalidade política.

Desde a guerra franco-prussiana de 1870-1871 e até 1914, nenhum conflito grave


perturbou a paz na Europa, embora ela tenha estado sempre ameaçada. O fenómeno
imperialista foi acompanhado de graves tensões e rivalidades económicas e políticas. Décadas
de imperialismo e colonialismo originaram acesas disputas territoriais. Havendo interesses de
conflitos, era fundamental que existisse uma guerra. Um dos principais fatores da eclosão do
primeiro grande conflito mundial foi o choque imperialista entre as grandes potências
europeias, ou seja, a disputa por mercados consumidores e fornecedores, pelo que “[o]
mundo de 1901 era um mundo de impérios cujo problema residia na sua fraqueza e não na sua
força”, Niall Ferguson, em “A Guerra do Mundo”.

O principal antagonismo era entre os impérios britânico e alemão. O Reino Unido era
a força hegemónica do mundo e a Alemanha era o seu principal desafiador. A poderosa
indústria alemã necessitava de acesso às matérias-primas e do controlo dos novos mercados
para exportação da enorme quantidade dos seus produtos. O caminho da afirmação
internacional alemã passava pela construção de uma marinha mercantil e de uma marinha de
guerra. Isso os britânicos nunca podiam permitir. As duas principais rivais imperialistas
travavam uma corrida ao armamento naval. Para contrariar a Alemanha, a Inglaterra tinha de
entrar na futura Aliança entre a França e a Rússia. Mas a Inglaterra tinha problemas com a
Rússia por esta estar a expandir-se para sul na Ásia, ameaçando invadir a Índia. Para além
disto, Rússia e Inglaterra já tinham olhos na Pérsia devido ao petróleo e ambas estavam em
situação territorial estratégica. Em 1890, o novo imperador da Alemanha, Guilherme II,
demitiu o seu velho chanceler Bismarck. Com ele desapareceu a arte da negociação
internacional, que foi substituída por uma nova política externa, conhecida como weltpolitik.
Tratava-se de uma ideia de redistribuição das colónias do mundo, tendo em conta os
interesses alemães. A realização dessa nova visão alemã devia ser conseguida através da
realpolitik, isto é, por meio da utilização de toda a sua força internacional. Como exemplo,
temos a instalação dos alemães no Sudeste africano, que impediu a concretização do sonho
britânico de construir um Império do Cabo ao Cairo. Esta rivalidade não tinha forçosamente de
levar à Guerra nem a constituição de impérios coloniais era um fator decisivo para a Guerra.
Os problemas entre as grandes potências podiam ser resolvidos com acordos porque estas não
dependiam dos mercados coloniais. Aparentemente, as potências imperialistas ganhavam mais
se não combatessem mutuamente. Mas a tensão entre os impérios britânico e alemão

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aumentava dia após dia. Apesar das várias tentativas entre Inglaterra e Alemanha para criar
uma boa relação entre si (ambas não tinham interesses numa guerra mundial), a verdade é
que estes dois países não encontravam uma solução para os seus conflitos de interesses.

A segunda maior rivalidade era entre o império francês e o império alemão. A


oposição da França à Alemanha explica-se, por um lado, pela disputa da Alsácia e Lorena,
território perdido para a Alemanha em 1871, e, por outro, pelo desenvolvimento do novo
Império Alemão que retirou à França parte da preponderância económica que este detinha
sobre a Europa. Em contrapartida, a França contrariou as pretensões germânicas em África e
conseguiu dominar grande parte do Norte do continente. Estes dois impérios (francês e
alemão) eram vizinhos, enfrentaram-se ao longo da História, e, em 1781, a Alemanha
destroçara a França. Por isso, a França só esperava uma boa oportunidade para ripostar. Como
não podia fazer isso sozinha, procurava aliados: qualquer tensão entre a Alemanha e um outro
país era favorável às expectativas da França. Para evitar uma desforra da França, a Alemanha
decidiu isolá-la recorrendo a um sistema de alianças. Começou por afastar dois potenciais
aliados da França: Áustria e Rússia. De facto, em 1882, até se havia assinado um tratado formal
de aliança entre a Alemanha e a Áustria-Hungria. Assim, a França passava a não ter aliados na
retaguarda da Alemanha. Contudo, a França começou a fazer empréstimos à Rússia, o que
levou à mudança de aliança da Rússia, como sempre, o dinheiro move aquilo que for preciso
ao longo da História. Por outro lado, a Rússia até tinha interesses em derrotar o Império
Austro-Húngaro.

Aliás, a terceira maior rivalidade decorria entre os impérios Austro-Húngaro e russo.


Os interesses destes dois gigantes continentais confrontavam-se nos Balcãs, uma região de
povos eslavos. De facto, o Império Otomano, já muito debilitado, estava a abandonar o
controlo daqueles territórios. Um dos candidatos para a sua substituição era o Império
austríaco, como indicava o seu avanço territorial para Leste, tido como o seu direito natural. O
mesmo pensava o império russo, evocando o pan-eslavismo, mas imaginando principalmente
uma saída para os mares quentes através do controlo de estreitos de Bósforo e Dardanelos. O
Império Russo mal disfarçava os seus propósitos de controlar os estreitos do Mar Negro e de
alcançar uma saída para o Mediterrâneo. Neste contexto, Bill Fawcett salienta, em “Os 100
Grandes Erros da História”, que “[E]m 1913, a tensão racial e política estava a subir em toda a
Europa, muito especialmente no Império Austro-Húngaro. Este império dos Habsburgos
apresentava vários problemas. E um deles era o facto de ser composto por diversas nações e
etnias. Muitos desses grupos raciais desconfiavam uns dos outros, ou odiavam-nos mesmo
mais do que aos inimigos externos da Áustria”, acrescentando na sua opinião, com a qual

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concordo, que “a complicar ainda mais esta mistura tão instável estava o facto de dezenas de
etnias diferentes no interior do império estarem a ser apoiadas por países como a Rússia e a
Alemanha”.

Sendo assim, em 1894, a França alia-se à Rússia (aliança franco-russa), pois a primeira
queria cercar a Alemanha e a segunda queria cercar o Império Austro-Húngaro.

A Inglaterra mantinha-se sempre fora destes conflitos. Aliás, a sua política,


tradicionalmente, era não comprometer-se com Estados Continentais. Evitava participar na
Guerra para não ficar reduzida a uma balança comercial fraca. É que cronicamente
apresentava uma balança comercial negativa (mais importações que exportações). Mas o saldo
da balança de pagamentos era positivo (através dos pagamentos que eram feitos aos ingleses).
Em função deste panorama, a Inglaterra era pacifista, pois equilibrava os seus saldos com a
exportação e capitais (algo que não seria possível em clima de guerra).

“As contradições imperialistas entre a Inglaterra e a Alemanha, bem como as que


opunham a França à Alemanha e a Rússia à Áustria-Hungria, haviam provocado a formação de
dois blocos militares inimigos: a aliança austro-alemã e a Entente.”, in História Moderna: O
Imperialismo.

Explicitando a citação acima feita: estas três rivalidades, que eu tenho vindo a explicar,
foram cruciais para o desencadear de um conflito europeu generalizado. As rivalidades
políticas entre os impérios provocaram uma corrida ao armamento, a formação de grandes
blocos político-militares e à assinatura de pactos militares secretos. Ficou conhecida como
Tríplice Entente a coalizão militar constituída na primeira década do século XX, onde os
Impérios Britânico, Russo e República Francesa se uniram para fazer frente à política
expansionista de outro bloco, a Tríplice Aliança (constituída pelos Impérios Alemão, Italiano e
Austro-Húngaro), formado em 1882.

Esse processo de alianças na transição do século XIX para o XX reflete uma mudança
que ocorria no cenário político europeu: as antigas potências, Grã-Bretanha e França, com os
seus vastos impérios coloniais distribuídos pelo globo, estavam a sofrer a concorrência de
novas forças como Alemanha e Itália, recentemente constituídos estados nacionais unificados,
que rapidamente conquistavam tantas fatias importantes dos mercados globais como
inauguravam os seus próprios impérios coloniais.

Esta concorrência de novas forças políticas, naturalmente, gerou graves atritos. A


solução para resolver as discórdias foi a constituição de acordos económicos, políticos e

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militares onde países com interesses semelhantes se reuniam. Assim, dois blocos distintos
destacaram-se: a “Tríplice Aliança” e a “Tríplice Entente”. Esta criação de alianças, combinada
com a diplomacia secreta, prática comum na política europeia da época, foram fatores
determinantes para o início da 1ª Guerra Mundial, em 1914.

A França e a Rússia formam uma aliança em 1894, pois partilhavam o mesmo inimigo:
a Alemanha. No fundo, trata-se de um pacto de amizade firmado para defender a causa da
Sérvia, apoiada pelo Montenegro, contra a pretensão do Império Austro-Húngaro
relativamente ao território da Bósnia-Herzegovina, também disputado pelos sérvios. A França
e o Reino Unido também queriam resolver as suas disputas coloniais em África e na Ásia para
que pudessem conjuntamente enfrentar o perigo alemão. Para isso, fizeram um pacto com o
nome francês “entente cordiale” (entendimento cordial). A sua assinatura marcou o fim de
quase um milénio de conflitos intermitentes entre as duas nações e seus Estados antecessores,
e a formalização da coexistência pacífica que já existia desde o fim das guerras napoleónicas
em 1815. Por exemplo, a França reconhece o controlo britânico sobre o Egito, enquanto a Grã-
Bretanha é recíproca a respeito da França em Marrocos.

A este entendimento juntou-se a Rússia, também convidada pelos britânicos para


resolverem os seus problemas fronteiriços na Índia, Afeganistão e Paquistão (também como já
foi referido, a Rússia queria derrotar a Áustria-Hungria). Assim, formou-se a Triple Entente
Cordiale (triplo entendimento cordial), consolidando os acordos bilaterais anteriores: a
Entente Anglo-Russa (1907), a Aliança Franco-Russa (1891) e a Entente Cordiale, entre a França
e o Reino Unido (1904). Deste modo, três potências que apresentavam diferenças significativas
finalmente se aproximavam e coligavam. Tal aliança foi um dissuasor eficaz para a Tríplice
Aliança e também veio ao encontro dos planos franceses de impedir as expansões alemãs e
austro-húngaras pela Europa.

Do outro lado, a Alemanha unifica-se em 1871. Em 1879 a aliança austro-alemã define


que os dois países comprometeram-se a ajudarem-se um ao outro em caso de um ataque por
parte da Rússia. Além disso, cada Estado se comprometeu a uma neutralidade benevolente
para com o outro, se um deles for atacado por outra potência europeia. As potências da
Europa Central (Alemanha, Império Austro-Húngaro e Itália) fizeram um acordo militar entre si,
originando a “Tríplice Aliança”, estabelecida formalmente em 20 de Maio de 1882. Estas
políticas expansionistas formaram então um grande bloco de países aliados no centro da
Europa. Cada uma das nações garantia apoio às demais no caso de algum ataque de duas ou
mais potências sobre uma das partes. O principal objetivo era construir uma barreira político-
militar que isolasse a França na Europa Ocidental.

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Porém, o acordo entre a Alemanha e a Itália neste ponto era bem específico,
afirmando que o seu apoio não se estenderia na defesa contra um ataque vindo do Reino
Unido, o “temível”. A situação da Itália neste acordo era instável na medida em que a sua
população era desfavorável ao estabelecimento de um acordo com o Império Austro-Húngaro,
antigo inimigo do processo de unificação da Itália. Além disso, os territórios da Ístria, do
Trentino e da Dalmácia, sob controlo da Áustria, tinham também populações italianas (entre
outras), que não tinham sido incorporadas na Itália unificada.

Caso ocorresse um conflito e a Alemanha saísse vitoriosa, esta poderia tornar-se


senhora do comércio internacional, país preponderante politicamente na Europa e ainda
conquistar vários territórios coloniais, expandindo o seu império. Enfim, era o sonho máximo
dos pan-germanistas, os simpatizantes de uma supremacia política e económica alemã,
apoiada ainda pelo velho Império Austro-Húngaro. Por ocasião da guerra, a Itália unir-se-ia à
Tríplice Entente a partir de um tratado feito com a Inglaterra.

Quando se formaram estes dois sistemas de aliados, a pressão mundial subiu e


intensificou-se. Cada sistema de alianças tinham tinha elementos que queriam derrotar algum
elemento do outro sistema, nomeadamente, enquanto uma das alianças controlava as
colónias, a outra pretendia controlá-las, e bastava um pequeno conflito entre dois elementos
para que se desencadeasse uma situação altamente bélica, pois todas as nações de cada
aliança envolver-se-iam.

A guerra não podia ser evitada. Porém, segundo a opinião do General William T.
Sherman, “[s]omente aqueles que nunca deram um tiro, nem ouviram os gritos e os gemidos
dos feridos, é que clamam por sangue, vingança e desolação. A guerra é o inferno.”

A faísca que incendiou a Europa ocorreu na Bósnia. Tratava-se de uma província do


Império Otomano deixada ao cuidado do Império Austro-Húngaro, na sequência da
Conferência de Berlim. No entanto, o I. Austro-Húngaro decide anexá-la em 1907, o que vai de
encontro com os interesses da Sérvia, pois a Bósnia era sua vizinha e composta
maioritariamente por sérvios, considerando-a, assim, o seu espaço vital. Estava, então, criada
uma alta tensão com a Sérvia e, indiretamente, com o Império Russo também, pois a Sérvia já
se tinha libertado do I. Otomano, mas tinha ligações preferenciais com os russos.

Em 1912 começa uma Guerra entre os países balcânicos. O nacionalismo da Sérvia


serviu, consequentemente, de causa imediata para o início da 1ªGuerra Mundial, até porque o
“patriotismo é o ovo das guerras” (Guy de Maupassant). O império austro-húngaro englobava
uma diversidade de culturas, sendo que o seu ponto fraco residia na fronteira como os Balcãs.

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Contudo, foi a 28 de junho de 1914 que o arquiduque Francisco Fernando, herdeiro do
trono austro-húngaro, enquanto visitava Sarajevo (capital da Bósnia), foi assassinado por um
jovem nacionalista sérvio.

Como represália da Sérvia não ter cumprido com o seu castigo composto por 30
pontos, o I. Austro-Húngaro decide invadir a Sérvia, convencidos de que o I. Russo não se
envolveria, uma vez que havia pouca coisa em causa para o seu império.

Ao contrário do que se pensava, a Rússia acaba por declarar guerra à Áustria-Hungria,


invocando a defesa dos povos eslavos. A Alemanha, ligada por um pacto militar à Áustria-
Hungria, declarou guerra ao I. Russo, acabando também por declarar guerra à França, que já se
encontrava em mobilização devido à aliança com a “Rússia”.

A Alemanha queria iniciar o ataque pelo lado que considerava mais fraco, isto é, o da
europa ocidental (mais precisamente, França), o que significou entrar pela Bélgica,
protetorado inglês, violando a sua neutralidade. Tendo isto, a Inglaterra declara a guerra ao I.
Alemão, porque por muitos defeitos que a Inglaterra tenha por agir maioritariamente em
função do interesse económico, a verdade é que é sempre amigo do seu amigo e um caso vivo
disso é a sua relação com Portugal ao longo da História.

Em poucos dias, todas as grandes potências europeias estavam em guerra, sendo que
a única que se proclamou formalmente neutral foi a Itália, mas até esta, um ano depois (1915),
se juntou à Tríplice Entente Cordiale.

A Tríplice Entente foi, então, apoiada pela Sérvia, Bélgica, Japão, Roménia, Portugal,
Grécia, China e por vários Estados da América Latina. E a Tríplice Aliança recebeu ajuda do I.
Otomano e da Bulgária. Era o fim da paz armada e o início da 1ª Guerra Mundial.

Nesta época, o petróleo tornou-se fundamental para a Marinha de Guerra. O ouro


negro começava, então, a mover interesses e “oportunismos”. A Inglaterra e o I. Alemão, que
eram as duas marinhas mais fortes da altura, não tinham acesso direto ao petróleo, pelo que
as relações com o I. Otomano, onde já se tinha descoberto petróleo em 1904, ganharam outra
importância.

A 1ªGM era um fenómeno inevitável. Este conflito já se esperava desde a última


década do século XIX, com a escalada armamentista. Só não tinha acontecido antes, porque
havia um interesse em que se contivesse uma guerra que traria a destruição e que impediria a
transferência de capital para as colónias.

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Fatores de aproximação entre potências

A disputa pela influência no Império Otomano e o petróleo do Médio


Oriente – acordos anglo-alemães (1912-1914)
O Império Otomano tinha endividamentos e perdeu sucessivamente uma boa parte da
sua autonomia política. Foi a tentativa de se modernizar que acabou por deixá-lo numa
enorme dependência de empréstimos externos. É nesta altura que as relações com o Império
Otomano ganham uma nova importância.

A partir de finais do século XIX, regista-se uma maior importância dos alemães nesta
região. Houve o projeto The Berlin Bagdad-Railway, que era um caminho-de-ferro que
atravessava todo o Império e ligava Berlim ao Golfo Pérsico (onde se situavam os lençóis
petrolíferos do Médio Oriente), sendo construído com fundos do Deutsch Bank. Este causou
um grande descontentamento e consequente oposição por parte de Inglaterra e França (e da
própria Sérvia), pois a construção do mesmo só iria aumentar o poderio alemão e,
consequentemente, ameaçar a hegemonia britânica na região, o que era inconcebível para
estes e para o seu ego gigantesco. É que o caminho-de-ferro tinha como vantagem a
possibilidade de transportar grandes e várias mercadorias e garantir a influência alemã da
Arábia. No fundo, era uma espécie de autoestrada de comunicações e interesses, como se
comprova no livro da História Moderna: O Imperialismo: “ (…) O caminho-de-ferro de Bagdade
devia facilitar as conquistas que os imperialistas alemães se propunham efetuar para Leste.
Depressa a Turquia se viu submetida à total influência alemã”.

Durante a construção deste caminho-de-ferro, os alemães descobriram na


Mesopotâmia (a sul de Bagdade) um largo de petróleo, que rapidamente suscitou um grande
interesse. Este petróleo começou a ser transportado para o Golfo Pérsico e além de servir de
alternativa à eletricidade para efeitos de iluminação, o petróleo é também um instrumento útil
para a navegação, sendo uma arma estratégica para a marinha.

Nesta altura, o petróleo não era valorizado, apesar de vir a ter mais potencial do que o
carvão. Até então, o carvão era a matéria-prima mais usada para constituir-se como o
combustível dos navios. Mas, para as potências imperialistas, o poderio naval era
determinante e deste facto advém a importância do petróleo. É que os países necessitavam de
uma grande frota de Guerra e as frotas militares navais moviam-se a vapor. Usavam carvão

32
para produzir o vapor, que tinha de ser disponibilizado ao longo do oceano, em ponto de
apoio, para que os barcos não parassem.

O petróleo já era conhecido na antiguidade para queimas. Em 1862 forma-se um grupo


industrial nos EUA chamado Standard Oil, para inventar a técnica de perfuração. No princípio
do século XX houve uma série de invenções técnicas que alteraram este panorama.

Rudolf Diesel, engenheiro alemão, inventou em 1899 o primeiro motor de explosão


que utilizava combustíveis líquidos (diesel). O motor Diesel começa a ser aplicado para usos
industriais. A certa altura entendeu-se a vantagem que era modernizar os navios com este tipo
de combustível. Os navios de guerra a carvão não tinham grande autonomia, pois o carvão
teria de ser levado para dentro do navio, ocupando grande espaço. O diesel dava uma enorme
autonomia e eficiência, permitia um menor consumo e atingia velocidades maiores. Ocupando
menos espaço, era mais económico e possibilitava o armazenamento de mais artilharia.
Portanto, era fundamental que as potências convertessem as suas frotas de carvão em frotas a
diesel. O petróleo tornou-se, então, numa matéria-prima fundamental e estratégica no século
XX. A única palavra de ordem que um leitor compreende desta descrição histórica é “vitória”,
todos queriam vencer, mas como em tudo e em todo o lado, tem que haver vencedores e
vencidos, como mais tarde veremos

Os países que tinham maior facilidade de acesso ao petróleo eram americanos ou do


Leste europeu. A Rússia produz sobretudo na região do Mar Cáspio. Já a Roménia estava muito
ligada à Alemanha. Contrariamente à atualidade, não existe nenhuma região do Médio Oriente
referenciada. É que hoje em dia, dois terços das reservas de petróleo encontram-se em países
desta região. Ao invés, a Inglaterra e a Alemanha, as maiores marinhas de guerra do mundo,
não tinham acesso direto ao petróleo e tiveram de tentar aceder a ele.

Para terminar, e remetendo ao ponto acerca do projeto The Berlin Bagdad-Railway, os


grandes carregamentos petrolíferos eram feitos pelos petroleiros, que teriam de atravessar
por mar o Golfo Pérsico. Mas esta exportação do petróleo implicava um entendimento anglo-
alemão em relação ao Kuwait. Os ingleses tinham igualmente o Mar do Golfo sob o seu
protetorado. Inglaterra e Alemanha começam a procurar regiões onde possam extrair petróleo
para terem Marinha de guerra (o petróleo é a arma estratégica da Marinha). É assim que, em
1912, começam as negociações entre estes dois países e foi criada uma companhia – a Turkish
Petroleoum Company, resultado dos acordos anglo-alemães, escusado será dizer que em
tempo de guerra, não se olha a meios para atingir os fins, nem que para isso a grande potência
inglesa tenha de fazer um acordo com o seu grande rival. Na véspera da 1ª Guerra Mundial, o

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petróleo do Império Otomano estava dividido pela Alemanha e Inglaterra, o que mostra que é
possível os interesses imperialistas chegarem a um consenso.

Acordos anglo-alemães sobre as colónias portuguesas (1898; 1912-


1914)
O entendimento entre a Inglaterra e a Alemanha estava mesmo em bom pé, mas isso
poderia ser mau para outras nações, como, por exemplo, para Portugal. Os acordos anglo-
alemães não se cingiram só à questão do petróleo, mas também acerca das colónias
portuguesas. Houve, então, dois acordos secretos de divisão colonial entre Inglaterra e
Alemanha, depois de os alemães terem feito imensas pressões para a modificação do mapa
colonial (consideravam que o seu era muito desfavorável). Através do acordo entre estas duas
potências, foi possível ver-se que o entendimento era algo positivo e acessível.

Neste sentido, o tratado anglo-alemão de 1898 previa uma partilha de Angola,


Moçambique e Timor, já que devido às dificuldades financeiras de Portugal, provavelmente,
este país se veria obrigado a empenhar as colónias para resolver a crise. Ou seja, o empréstimo
era dado a Portugal sob hipoteca. Os alemães pretendiam ligar à África Oriental Alemã à África
Sudoeste Alemã, mas dependia do governo português efetivar este acordo. Contudo,
depreende-se que esta ajuda não é uma mera questão de solidariedade, uma vez que estamos
a falar de dois “gigantes” da ordem mundial.

Os mesmos países que integraram este tratado celebraram em 20 de Outubro de 1912


um tratado de revisão do anterior. O governo português voltou a pedir um empréstimo. Caso
deixasse de liquidar a dívida, o acordo era ativado. Apesar de a guerra acabar por impedir esta
divisão das colónias portuguesas, a verdade é que este acordo só serve para tirar património
histórico a uma nação extremamente pequena e já economicamente debilitada.

Porém, este acordo revela ainda que as duas potências, apesar das divergências, são capazes
de manter uma boa relação e, quando possível, dividiriam colónias que teriam um grande
interesse para ambos os lados.

Quatro meses antes do início da guerra, ingleses e alemães tinham acertado as contas
em termos de exploração do petróleo, pois era fácil chegar a um entendimento. O governo
inglês detinha a maioria da Anglo Persian (hoje British Petroleum - BP), criada para resolver

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estrategicamente a falta de petróleo da Inglaterra (explorar o Golfo Pérsico), sendo que a
Gulbenkian era o grande mediador destes negócios.

A 1ª Guerra Mundial

O fracasso dos planos da guerra de curta duração (1914)


Nenhum dos lados estava preparado nem esperava uma guerra tão longa e tão fatal
como a 1ªGuerra Mundial se constituiu entre 1914 e 1918. Os maiores Estados envolvidos na
guerra achavam que esta iria durar meras semanas, talvez porque já na altura deviam pensar
como George Orwell, “A maneira mais rápida de acabar com a guerra é perdê-la.”

Além disso, esta guerra não era desejada por nenhum governo, nem mesmo pela
Inglaterra ou pela Alemanha, como se compreende através da realização dos acordos
anteriormente falados.

De um lado havia os imperialistas do I. Austro-húngaro que queriam: afirmar o seu


domínio sobre 30 milhões de checos, eslavos, polacos, ucranianos, sérvios, croatas, eslovenos,
romenos e italianos; submeter, à sua forte autoridade, os Estados eslavos independentes da
Sérvia, Bulgária e do Montenegro; e fortalecer o domínio austro-húngaro em toda a península
balcânica.

Por outro lado o imperialismo britânico pretendia conservar e ampliar o seu império
colonial e debilitar a sua mais importante rival: a Alemanha. Já o imperialismo francês lutava
pela restituição da Alsácia e da Lorena, que a Alemanha recuperara em 1871, enquanto o
Imperialismo russo aspirava varrer da Turquia e dos Balcãs a influência alemã e austríaca e
estabelecer aí a sua própria esfera de influência.

O alargamento das frentes e os impasses (1915-1916)


A Guerra na Europa desenrolava-se em três frentes distintas: a frente ocidental, a
frente oriental/do Leste e a frente Balcânica.

Os campos de batalha a Oeste da Alemanha eram chamados de Frente Ocidental. O


Plano Schlieffen previa resolver uma questão que preocupava os alemães em caso de conflito:
uma guerra em duas frentes, ou seja, uma guerra contra a França e, muito provavelmente,
contra o Reino Unido, na frente ocidental e, simultaneamente, uma guerra contra a Rússia, na
frente oriental.

35
A Frente Ocidental localizou-se perto de Paris, em França, devido à investida alemã
para conquistar e controlar todo o território francês. Mas os conselheiros do imperador
alemão também se enganaram; o Reino Unido entrou na guerra contra os cálculos daqueles.
Logo em setembro de 1914, foi travado o avanço alemão com o esforço conjunto das tropas
francesas, britânicas e belgas. Criou-se um impasse, pois as linhas fortificadas francesas
impediram o avanço alemão e os ganhos territoriais eram mínimos. Como ninguém esperava
este impasse, a guerra alargou-se em 1915. O Plano Schlieffen falhou no seu principal, que era
obter uma vitória rápida e decisiva a ocidente para, em seguida, transferir forças para oriente
e ali obter outra vitória decisiva.

Em 1916, os alemães organizaram uma segunda grande tentativa de quebrar a


resistência francesa. E dessa vez, os aliados da Entente conseguiram resistir. Passaram pela
Bélgica, dizimando o território, e penetraram em França, chegando quase a Paris, mas sendo
detidos a 13km da capital francesa. Com a ajuda de militares belgas e ingleses, os franceses
(muito mais atrasados em termos militares) conseguiram construir uma linha de trincheiras e
fortificações defensivas ao longo de toda a fronteira com a Alemanha. Esta frente tornou-se
numa “máquina de massacre” pois duas das piores batalhas da guerra (Verdun e Somme)
aconteceram na Frente Ocidental em 1916.

Mas, na primavera de 1917 a situação tornou-se muito complicada para os franceses e


britânicos, que dificilmente podiam aguentar um terceiro ataque maciço dos alemães.
Enquanto em terra a batalha estava igualada, a Triple Entente conseguiu uma vitória clara na
Guerra Naval. A superioridade marítima dos britânicos e franceses foi evidente e a frota alemã
foi rapidamente destruída. Mas a Alemanha já se preparava para um novo tipo de guerra – a
guerra de submarinos. Recorde-se que a Grã -Bretânha impediu a Alemanha de construir uma
marinha.

Na Frente Oriental, os exércitos moviam-se com maior rapidez. Em 1914, os exércitos


russos vieram pelo Oeste até a Alemanha e o I. Austro-Húngaro e em 1915 os alemães
expulsaram o ineficaz exército russo da Polónia, estabilizando a frente do leste e obrigando o
governo de Czar a relegar-se a uma ação defensiva de retaguarda. Mediante a necessidade de
reforçar o lado russo, Churchill (primeiro-ministro inglês) em 1915 desenha um plano para
chegar à Rússia pelo Mediterrâneo, o qual foi um fracasso total. O I. Russo recuava cada vez
mais e o descontentamento do seu povo era cada vez maior. O país foi obrigado a retirar-se da
guerra em 1917 devido às Revoluções Bolcheviques que nasciam no seu Interior.

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Já a Frente Balcânica, localizada no sul da Europa, era dominada pelas potências
centrais (Alemanha e Áustria-Hungria). Os aliados não conseguiram fazer progressos até à
queda das potências do centro da Europa. De resto, a Sérvia fez uma resistência
surpreendente, conseguindo, logo em 1914, travar e até expulsar o exército austríaco.

Mas em 1915 já não podia fazer nada contra o conjunto das forças armadas austríaca e
alemã. A partir deste ano, a guerra move-se mais para os países balcânicos, que vão entrando
nela consoante as promessas que as potências lhes fazem. Os sérvios recuaram para a Grécia
e, depois de receberem a ajuda dos aliados franceses, reapareceram na batalha da frente no
Sudoeste. O adversário principal das potências centrais no Leste era, obviamente, o I. Russo.

Adicionalmente, a “Rússia” pretendia uma larga fatia do Império Otomano. Os ingleses


tentaram levar os russos a apoiar um ataque a Constantinopla. De resto, a Inglaterra chegou a
efetuar um ataque à zona dos estreitos, mas não obteve sucesso, pois o Império Otomano
estava bem preparado para poder responder aos ataques. Contudo, conseguem convencer
algumas dinastias árabes a fazerem uma revolta contra os otomanos, com a promessa de que
toda a área árabe iria ser unificada sob a dinastia Hachemita. Então, em 1916 inicia-se a
revolta árabe no Império Otomano, promovida pela Inglaterra.

Em 1915 ocorreu uma batalha alpina entre a Itália e a Áustria-Hungria. Os aliados da


Tríplice Entente ofereceram à Itália, para entrar na guerra, mais do que a Alemanha e o I.
Autro-húngaro podiam dar, nomeadamente o controlo do outro lado da costa adriática (sul da
Turquia). A guerra correu mal à Itália, ou seja, foi totalmente derrotada pelos austríacos. Só a
ajuda urgente dos britânicos e franceses salvou a Itália de uma rápida capitulação. Em 1915 a
Itália entra em guerra ao lado da Entente. Um país inicialmente neutro era, então, arrastado
para a Guerra.

Portugal entra oficialmente na guerra a 1916 ao lado dos Aliados, o que estava de
acordo com as orientações da República ainda recentemente instaurada. Porém, a Inglaterra,
que mantinha desde há muito uma aliança com Portugal, moveu influências para que o país
não participasse ativamente na Guerra. O Partido Democrático, que estava no poder na altura,
movido também pelo facto de já existirem combates entre tropas portuguesas e alemãs junto
às fronteiras das colónias em África, desde cedo demonstrou interesse em se tornar parte
beligerante do conflito.

Sabia de antemão que uma vitória alemã na guerra levaria à perda de grande parte dos
seus territórios coloniais. Como tal, em Setembro de 1914 eram enviadas as primeiras tropas
para África onde as esperariam uma série de derrotas perante os alemães, na fronteira do sul

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de Angola com o Sudoeste Africano Alemão (Desastre de Naulila) e na fronteira norte de
Moçambique com a África Oriental Alemã. Apesar destes combates, a posição oficial do Estado
português era claramente ambígua. Os partidos de cariz esquerdista estavam ao lado dos
regimes da França e da Inglaterra, enquanto os da direita simpatizavam-se com os regimes das
potências centrais (Alemanha e Austro-Hungria). Porém, a questão que se colocava era se
Portugal entraria na guerra ou não, já que a entrada de Portugal na guerra seria sempre ao
lado da Inglaterra e França.

No entanto, o principal oponente à entrada de Portugal na Primeira Guerra Mundial foi


a Inglaterra. Em Fevereiro de 1916, o antigo aliado português decidiu pedir ao Estado
português o apresamento de todos os navios alemães e austro-húngaros que estavam
ancorados na costa portuguesa. Esta atitude justificou a declaração oficial de guerra a Portugal
pela Alemanha, a 9 de Março de 1916 (apesar dos combates em África desde 1914). Neste
esforço de guerra, chegaram a estar mobilizados quase 200 mil homens.

As perdas atingiram quase 10 mil mortos e milhares de feridos, além de custos


económicos e sociais gravemente superiores à capacidade nacional. Os objetivos que levaram
os responsáveis políticos portugueses a entrar na guerra saíram gorados na sua totalidade. A
unidade nacional não seria conseguida por este meio e a instabilidade política acentuar-se-ia
até à queda do regime democrático em 1926.

Além destas frentes, a guerra travava-se também a nível aéreo e naval. O avião fora
inventado apenas uma década antes do início da guerra. A princípio, a Alemanha usava mais
aeróstatos dirigíveis chamados zepelins do que aviões para bombardear o Reino Unido. Então,
os britânicos construíram armas antiaéreas para derrubar os zepelins. Durante o conflito, os
dois lados construíram vários tipos de aviões de guerra. Os caças tinham metralhadoras que
disparavam noutros aviões. Em 1917, os alemães começaram a lançar bombas a partir dos
aviões. Estes bombardeamentos mataram cerca de 1.300 pessoas e feriram aproximadamente
3 mil no Reino Unido.

A procura da "decisão": guerra submarina alemã, revoluções russas e


intervenção dos EUA (1917)
Deste modo, vimos que a Primeira Guerra Mundial (o primeiro conflito mecanizado)
não se deu apenas em terra. A nível naval, a marinha britânica conseguia impedir alguns navios
de chegar a portos alemães, numa ação denominada de bloqueio naval. Queriam usar a sua
superioridade naval para asfixiar a economia e comércio alemão. Os britânicos, porém, não

38
conseguiam deter os submarinos alemães. Em 1915, os alemães anunciaram que tentariam
afundar todos os navios inimigos em águas britânicas. O grande objetivo era isolar a ilha
britânica e não permitir que os navios da marinha britânica alcançassem a ilha e abastecessem
o país.

Aliás, a Alemanha desenvolveu submarinos e começou mesmo a abater navios ingleses


na costa inglesa, provocando um desfasamento na economia e na indústria britânica. Os
ataques submarinos no Atlântico debilitaram o Reino Unido. Em abril de 1917, um em cada
quatro navios de abastecimento que partiu do país jamais retornou. No final desse mês, o país
tinha um suprimento de grãos suficiente para apenas seis semanas. Os Aliados tentaram
defender os seus navios de abastecimento dotando-os de armamentos e despachando-os em
comboios, ou grupos, escoltados por navios de guerra. No total, submarinos alemães causaram
a perda de cerca de 6 mil navios dos Aliados. Só o Reino Unido perdeu 13 mil vidas nesses
ataques.

Entretanto, na Rússia a situação estava cada vez mais complicada, tal como já foi
referido anteriormente. Na verdade, a Rússia encontrava-se fraca e pouco capaz de aguentar
os esforços de guerra. Em 1917 a Rússia conheceu duas revoluções. A primeira, a Revolução de
Fevereiro, foi contra o regime vigente, causada pela insatisfação geral com o esforço de
guerra. Essa revolução derrubou o czar e proclamou a república, mas não alterou a situação na
frente. Dito de outro modo, a Rússia, a partir dessa revolta, praticamente não combatia, o que
se transformou num problema grave para os franceses e britânicos que tinham, a partir de
1917, de defrontar-se sozinhos com o todo-poderoso exército alemão. A Revolução
Bolchevique de Outubro de 1917 começou com Lenine que, estando na Finlândia e ao analisar
a situação da Rússia, achou que estava na hora de tomar o poder e por isso regressou e criou
um comité revolucionário junto do soviete de Petrogado, presidido por Trotsky. Na noite de 25
de Outubro, o II Congresso dos Sovietes, dominado pelos bolcheviques, legalizou a revolução e
designou para governar o país um Conselho dos Comissários do Povo, presidido por Lenine. O
partido de Lenine vencia então a luta interna.

Esta revolução levou imediatamente à retirada definitiva tanto da aliança como do


conflito mundial, através do Tratado de Brest-Litovsk, assinado a 3 de Março de 1918. Este
tratado foi feito com a Alemanha e forçou a Rússia a abandonar a Polónia e os Países Bálticos e
a evacuar as suas tropas da Ucrânia e da Finlândia, reconhecendo a sua independência. No
fundo, declarava um acordo de paz separada com a Alemanha. Desaparecia, então, a frente
oriental. Logo depois, o país seria tomado por uma onda revolucionária na qual emergirá um
novo ente que herdará as fronteiras do antigo império, a União Soviética.

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Para os alemães, era uma questão de tempo até que a guerra estivesse ganha: a
Inglaterra estava sem marinha de guerra (tenta isolar os impérios centrais dos abastecimentos
marítimos, afetando a indústria militar alemã, mas os germânicos intercetam os navios
britânicos através de submarinos); a França estava a perder força; e a Rússia encontrava-se
inativa. O novo tipo de combate (numa única frente) dificultou ainda mais a situação militar
franco-britânica, mas foi também a razão formal para os EUA declararem guerra à Alemanha. A
revolução Russa viria a favorecer os Impérios Centrais e a entrada dos Estados Unidos viria a
favorecer a Entente.

O momento crucial na resolução da Guerra aconteceu em abril de 1917, quando os


EUA entraram na guerra a favor de Triple Entente, mudando substancialmente o rumo dos
conflitos e originando um grande alcance político que alterava até então os dados da guerra.
Os EUA apresentavam um grande crescimento industrial e não tinham necessidades
comerciais externas. A principal razão para a entrada americana na guerra foi o bloqueio
alemão à marinha inglesa, o qual fez com que a economia inglesa estagnasse. As transferências
de capitais ingleses (mas também franceses) para os EUA começaram a dissipar-se, os países
em guerra começaram a depender cada vez mais de terceiros e os interesses norte-americanos
viam-se ameaçados, transformando-se em credores das potências europeias. A indústria
americana passou a depender muito da exportação das matérias-primas europeias e, com a
guerra, não se faziam as transferências de capital de que os EUA necessitavam, pelo que a
indústria americana estava a estagnar. Foi esta «ameaça» que incitou os EUA a entrar na
guerra em 1917, ao lado dos aliados. Mesmo com a manutenção de um discurso neutralista, os
dois candidatos às eleições presidenciais de 1916 adotavam esta postura. É que se os Aliados
perdessem a guerra, os bancos americanos eram arrastados para a falência.

Se antes até lucravam com a guerra, pois conseguiam aumentar as exportações para a
Europa (cereais, petróleo, borracha, aço, medicamentos, etc.), agora forneciam-lhe
empréstimos e tornavam-na dependente e por isso consideraram-se neutros (1914), a partir
de 1917 sentiram que deveriam intervir e tentar defender os seus interesses. Com a chegada
de tropas americanas houve o fecho de muitos mercados na América do Sul e na Alemanha, o
que fez com que a Alemanha não conseguisse resolver a guerra para o seu lado. A entrada dos
EUA ao lado da Tríplice Entente traz uma nova energia à guerra e conduz os aliados ao sucesso,
forçando os países da Aliança a assinarem a rendição. Fortalecidos, os países da Entente
conseguiriam romper o imobilismo em que se encontrava a disputa.

Por outro lado, estes também queriam a luta pela liberdade, que passava por
combater a ditadura do Kaiser (imperador), como chamavam ao chefe do Estado Alemão,

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Guilherme II. Como o regime da Alemanha era considerado pelos EUA como uma ditadura,
então as democracias francesa e britânica deviam ser apoiadas contra o autoritarismo alemão.
A partir deste diagnóstico, a opinião pública foi preparada para aceitar a guerra. Faltava só
criar os meios militares. Os EUA praticamente não tinham forças armadas, exceto a marinha de
guerra. Aliás, a marinha de guerra norte-americana já combatia os submarinos alemães. Logo
depois da declaração de Guerra à Alemanha, foi introduzido nos EUA o serviço militar
obrigatório, tendo sido recrutados três milhões de soldados. Sem dúvida alguma, a força dos
EUA resolveu a I Guerra Mundial. Chegaram dois milhões de soldados, apoiados por uma
enorme capacidade económico-financeira e pela produção industrial. Essa força foi decisiva. As
ofensivas alemãs pararam e, em novembro de 1918, a Alemanha capitulou. A 1ª Guerra
Mundial acabou.

No entanto, venceram a guerra devido a três fatores: Expansão territorial até início
do século XX (constituíam um dos maiores territórios do mundo e o maior império do Mundo,
com especial destaque para o Canal do Panamá); força económica: novas e maiores
oportunidades de crescimento económico (liberalismo económico, território rico em recursos
naturais e mineiros, revolução Industrial ampliada no novo mundo, investimento na ciência e
na tecnologia e culto da inovação prática). Este crescimento teve uma paragem durante a
Guerra Civil, devido a razões económicas (o Norte necessitava dos escravos para as suas
fábricas e o Sul queria-os para trabalhos na agricultura) e reformas no sistema
social/progressismo (para diminuir desigualdades, como investimentos públicos, educação
para todos ou igualdade entre homens e mulheres); e o Isolacionismo: política externa eficaz e
útil (Doutrina Monroe – potências europeias não interferiam no território norte-americano e
vice-versa).

O ano de 1918: ofensivas militares finais e revolução europeia.


Durante a maior parte dos mais de quatro anos em que o planeta se viu engolfado na
mais cáustica batalha de sua História, a Alemanha esteve sempre um passo em frente. Não
foram poucas as vezes que o alto comando germânico, com absoluta propriedade, pensou
estar próximo de celebrar o triunfo definitivo contra a aliança de seus férreos antagonistas.
Parecia que Grã-Bretanha, França e Rússia, mesmo abraçadas, seriam incapazes de conter o
inigualável ímpeto ofensivo tedesco. Nem sequer o anúncio da entrada dos Estados Unidos nas
hostilidades refreou os ânimos dos oficiais alemães, confiantes no magnífico poderio de sua
máquina de guerra. Sem dúvida, a Alemanha ofereceu inúmeras demonstrações do seu

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estarrecedor colosso militar. E, mesmo rodeada por aliados que se revelariam pouco
resilientes, ao final das contas, quase garantiu a vitória. Quase.

No dia 11 de novembro de 1918, consolidou-se a arrebatadora virada aliada verificada


nos últimos meses no teatro de operações da Grande Guerra. Com a assinatura do armistício
entre as delegações beligerantes, chegam ao fim as hostilidades que consumiram pouco mais
de 4 anos e três meses do planeta. Através do acordo, os alemães aceitavam as condições de
rendição estabelecidas pelos países vitoriosos. Assim, a Alemanha, que no início parecia ter
tudo para vencer este conflito, acabou por sair derrotada da guerra, enquanto os Aliados
saíram vitoriosos. É, então, obrigada a pedir a paz porque os seus aliados estão à beira do
colapso e percebe que não poderá vencer aos Aliados que contam com a ajuda dos EUA.
Posteriormente, o Império Alemão dará origem à República da Alemanha. O Império Austro-
Húngaro foi desmantelado, dando lugar a novos Estados. A Rússia também sai derrotada, uma
vez que perde territórios.

A ordem mundial do Pós-1ªGuerra


Com o Final da 1ª Guerra Mundial, era necessário agora fazer um balanço da mesma.

“A Grande Guerra e o modo como ela termina anunciam o declínio da Europa. (…) a Europa (…)
foi materialmente devastada e quase toda sangrada e empobrecida pelo conflito militar. (…)
[N]a economia mundial o papel da Europa diminuiu, em proveito (…) dos EUA (…).”, Jacques
Nére, História Universal: O mundo contemporâneo.

Explicitando, em termos demográficos, a 1ª Guerra Mundial ultrapassou todas as


guerras anteriores (em termos mais destrutivos), sendo catastrófica e destruindo toda ou
quase toda a capacidade militar efetiva. Era considerada a maior guerra existente até à altura
(os contemporâneos pensavam de forma generalizada que esta seria a última guerra). Houve
uma mortalidade anormal, não só influenciada pela dita guerra, mas por pneumonias, que
mataram milhares de europeus (a gripe espanhola propagou-se rapidamente devido ao
enfraquecimento e à subnutrição das pessoas). Isto traduziu-se numa totalidade de 20 milhões
de perdas humanas/militares. As principais perdas deram-se na Alemanha (país com maior
número de baixas), França (cerca de 14% da população ativa) e Rússia (países diretamente
envolvidos na guerra), bem como na Bulgária, Sérvia e Turquia.

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Houve também perdas materiais. Após a Guerra, os principais devedores aos EUA
(principal credor europeu) eram o Reino Unido, a França, a Itália, Rússia e a Polónia. Este
endividamento levou à perda ou destruição de 1/3 dos ativos ingleses e franceses e de 1/4 dos
ativos alemães. Assim, houve perdas materiais e um endividamento maiores nos países da
Entente do que nos países da Europa Central.

Além do fim de 4 Impérios (Alemão, Austro-Húngaro, Otomano e Russo), esta Primeira


Grande Guerra de Massas mobilizou todos os cidadãos, todas as atividades económicas e
revolucionou processos mecânicos e tecnológicos ao configurar o complexo militar. O recurso
à mão-de-obra feminina aumentou, pois os homens estavam na guerra e era necessário
manter a produção. Por fim, e a consequência mais visível foram os êxodos forçados e
massacres em grande escala de populações e milhões de refugiados e o primeiro genocídio
moderno em território europeu (genocídio dos arménios pelos turcos).

Durante a Guerra, sucedeu-se a queda do Império Russo devido à Revolução


bolchevista em 1917. Após os tratados, desmoronaram os Impérios Alemão, Austro-Húngaro e
Otomano (Turco), permitindo a proliferação de estados nação, agora libertos da opressão
imperial e com a tão desejada independência política.

Deste modo, o império russo deu lugar à Rússia Soviética, Finlândia, Estónia, Letónia,
Lituânia e Polónia. E o império austro-húngaro à Checoslováquia, Áustria, Hungria e Jugoslávia.
Sem contar com as alterações que também atingiram o médio-oriente, onde o Império Turco
dividiu-se na Turquia, Síria, Iraque, entre outros. Estenderam-se, então, os regimes
republicanos e as democracias parlamentares.

Em termos de capacidade destrutiva, foi uma evolução que foi usada para fragilizar os
países. A certa altura, deixou de poder ser usada em pleno. Até aí, era uma capacidade
crescente, que permitia a evolução da indústria e o crescimento económico. É que, nas
economias capitalistas, em épocas de guerra, as indústrias doa armamento desenvolvem-se e
lucram mais do que em tempos anteriores, já que têm de produzir mais para satisfazer a
procura. Durante a guerra, o Estado compra a crédito a produção das indústrias. Os Estados
capitalistas investem na compra de produtos com dinheiro de lucros, de salários e, quando isso
não chega, imprimem novo dinheiro para que haja forma de pagar o que é necessário comprar
às indústrias. Apesar de haver uma canalização de recursos para o esforço de guerra, não
houve necessariamente uma estagnação económica, pelo contrário. Em períodos de guerra, as
potências capitalistas tendem a crescer economicamente, devido a uma maior facilidade de
escoar os bens (não há restrições em termos de procura, visto que esta é feita pelo Estado.

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Muitas vezes a produção torna-se deficitária face à procura do Estado). Houve, então, uma
inflação de procura e consumo.

Uma das consequências mais importantes desta guerra foi a inversão da tendência das
exportações líquidas em termos de comércio mundial. A Europa deixou de englobar as
potências imperialistas dominantes no domínio político-militar e começou a depender de
novos países a nível de alimentos. De resto, os aliados (que tinham recebido dinheiro
americano) endividaram-se muito mais do que a Alemanha. Os EUA eram os que
transportavam mais mercadorias para a Europa, passando assim de devedores para credores.

(No final da Guerra, os investimentos dos EUA na Europa continuaram, especialmente


para a Alemanha. Tanto que algumas multinacionais americanas começavam a expandir-se
nesta altura (exemplos disso são IBM, General Motors e Ford, que eram os grandes produtores
de automóveis e aparelhos mecânicos nos EUA).

É possível assim afirmar que a guerra, o endividamento (provocava baixos salários) e o


protecionismo dos países europeus (fechava mais o comércio) levaram à entrada de capitais
americanos na Europa nos anos 20. Se antes as potências europeias exportavam capitais para
os EUA, agora estes passavam a ser credores dos europeus (que deixaram de ser credores dos
americanos). Os governos europeus endividaram-se e muitos capitalistas europeus foram
obrigados a vender as suas ações aos americanos (situação que se repetiu aquando da
2ªG.M.). A solução das grandes empresas supracitadas passava por se instalarem nos países
europeus.

Por outro lado, em termos de comércio internacional, a estrutura alterou-se. O dólar


passou a ser a moeda forte, suplantando as moedas europeias. Em 1920, deu-se uma crise de
recessão devido à adaptação à Paz, que era algo que afetava toda a Europa. 1919 e 1920
foram anos de quase “pré-guerra civil”, tal era a agitação a nível político. As classes
trabalhadoras queriam ser recompensadas pelo esforço material e humano da guerra. Nesta
altura, já a Rússia havia começado a mudar o regime. Aliás, a Revolução Russa deu-se em 1917.
E, em 1918, generalizou-se um golpe revolucionário e a Rússia envolveu-se numa guerra civil
que durou de 1918 a 1919. Também na Alemanha já se deu uma revolução em 1918 (entre os
partidos mais conservadores e os que pretendiam uma profunda mudança social), controlada
e apaziguada pelo exército alemão, antes de ter sido desmantelado.)

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Tratados de Paz
Como já é caracterizador na História, depois da guerra, vem a paz, por isso Churchill
afirma que “a guerra é uma invenção da mente humana. E a mente humana também pode
inventar a paz”. A Conferência de Paz iniciou-se em janeiro de 1919, em Paris, com a presença
de 27 representantes das potências vencedoras, tendo especial participação a Itália (Vittorio
Orlando), a Grã-Bretanha (Lloyd Geoge), a França (Clemenceau) e os EUA (Wilson), numa
altura em que ainda se vivia na Europa uma enorme instabilidade social.

A Itália só queria alargar o seu território na costa adriática e no Norte de África, pelo
que ficou pouco satisfeita com a expansão territorial conseguida em Paris. O Reino Unido
preocupava-se em salvar o seu império colonial, conseguindo estabelecer novas fronteiras
aparentemente desfavoráveis a Londres. A França pensava unicamente numa forma de
controlar a Alemanha, através de imposições (diktat). Nesta situação, foram os EUA que
dirigiram a Conferência de Paz. Os EUA são contra anexações territoriais, não se considerando
aliados, mas sim associados da Entente. Por isso, agrada-lhes o fim dos Impérios, para terem
mais mercados disponíveis, não protegidos.

As negociações basearam-se na mensagem dos 14 pontos do presidente Woodrow


Wilson dos EUA, um programa de paz apresentado em Janeiro de 1918 ao Congresso norte-
americano, onde este defendia, acima de tudo, a prática de uma diplomacia transparente, a
liberdade de navegação e de trocas, a redução dos armamentos, o respeito para com as
nacionalidades, a evacuação das tropas estrangeiras do território russo, a restauração da
Bélgica, a resolução do problema de Alsácia e Lorena, a reformulação das fronteiras dos
Estados balcânicos, a autonomia para os povos do Império Austro-Húngaro, novas fronteiras
da Sérvia com saída para o mar, a fundação da Polónia independente e a criação da Sociedade
das Nações. Deste modo “Uma potência extraeuropeia (…) exerceu a influência decisiva no fim
do conflito e, em grande parte, impôs conceções e métodos novos para a elaboração dos
tratados de paz”, Jacques Nére.

Os acordos de paz surgiram a partir de junho de 1919 através dos tratados de


Versalhes; de Nevilly sur Seine; de Saint-Germaine-en-Laye; de Sèvres; e de Trianon
assinados com os derrotados e que definiram uma nova geografia política e uma nova ordem
internacional.

O Tratado de Versalhes impunha à Alemanha, entre outras coisas: perda de Alsácia e


Lorena para a França (país interessado na vingança pois a memória da guerra franco-prussiana
de 1871 ainda estava viva); capacidade militar reduzida e entrega da região do Sarre à

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Sociedade das Nações, devido às minas de carvão que lá existiam; cedência de territórios à
Polónia, à Dinamarca e à Bélgica; reconhecimento da independência da Áustria e da
Checoslováquia; destituição de todas as suas colónias, que passaram para os aliados; e serviço
militar deixou de ser obrigatório. Para além de tudo isto, e ainda de acordo com o Tratado de
Versalhes, a Alemanha foi obrigada a pagar indemnizações aos países vencedores bem como a
reparar financeiramente todos os prejuízos da guerra, uma vez que foi considerada por este
Tratado como culpada da Guerra. As tão controversas reparações de guerra, exigidas a um país
que já se encontrava na penúria.

Neste contexto, na época, André François Poncet (embaixador francês em Berlim de


1931 a 1938) já difundia que a “[a] Alemanha não deixava de contar co uma paz negociada
(…); mas de depois de, no armistício, lhe terem sido levadas as suas armas e os seus meios de
defesa, os Aliados (…) isolaram os seus representantes em Versalhes (...) e impuseram à
Alemanha, sob a ameaça da invasão, uma paz não livremente negociada, mas ditada, um
diktat.” O Tratado de Versalhes nunca foi aprovado pelos EUA, os quais optam por uma
política isolacionista e de neutralidade, deixando a Europa entregue a si própria e às suas
dificuldades. Já a França, grande rival da Alemanha, tencionava aplicar à letra o Tratado de
Versalhes, pelo que os grandes objetivos do Tratado de Versalhes era enfraquecer a
Alemanha; refazer o mapa da Europa; dominar a força militar alemã; e beneficiar a França. A
Alemanha via, assim, o seu forte orgulho ferido. É nas condições deste tratado que estão as
bases da 2ª Guerra Mundial. Neste mesmo sentido e, para agravar, Keynes, economista
britânico, afirma, em 1919, que o Tratado de Versalhes “não inclui quaisquer disposições
destinadas à recuperação económica da Europa – nada que faça dos impérios derrotados da
Europa Central bons vizinhos, nada que estabilize os novos Estados da Europa, nada que
permita recuperar a Rússia; também não promove de modo nenhum uma convenção de
solidariedade económica entre os próprios aliados; em Paris, não se chegou a um acordo que
permitisse restaurar as finanças desorganizadas da França e da Itália ou ajustar os sistemas do
Velho e do Novo Mundo. […]”

Não é de esquecer a importância dos outros tratados. O Tratado de Saint-Germain-en


Laye foi celebrado a 10 de Setembro de 1919 e obrigou a Áustria a reconhecer a
independência da Hungria, Checoslováquia, Polónia e Jugoslávia e a ceder alguns territórios à
Itália. Proibiu também a união política ou económica ao Reich alemão (para precaver uma
futura aliança com a Alemanha) e limitou o exército profissional a 30 mil soldados. Foram
igualmente estabelecidas compensações económicas pelos prejuízos causados pela guerra,
embora o dinheiro nunca tenham sido entregue.

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O Tratado de Trianon foi assinado a 4 de Junho de 1920, determinando que a Hungria
cede territórios à Checoslováquia, Jugoslávia e Roménia (criando expressivas minorias
húngaras nestes locais). Através da fragmentação do território (a Hungria perdeu 2/3),
pretende dar resposta à diversidade étnica. Além disso, os húngaros perderam o acesso ao
mar que possuía através da Croácia e o seu exército teria no máximo 35 mil soldados.

O Tratado de Neuilly-sur-Seine foi um acordo de paz firmado a 27 de novembro de


1919. Determinou que a Bulgária reconheceria o novo Reino da Jugoslávia, pagaria uma
indemnização e reduziria o seu exército. Também perdia uma faixa de território ocidental para
a Jugoslávia e cedia a Trácia Ocidental à Grécia, perdendo assim o acesso ao Mar Egeu.

O Tratado de Sèvres foi um acordo de paz assinado entre os Aliados e o Império


Otomano em 10 de outubro de 1920. Apesar de nunca ter sido ratificado pelo Parlamento
Turco (logo, não foi colocado em prática pelo Império Otomano), as suas cláusulas
consagravam que a Turquia fosse obrigada a ceder territórios à Grécia e à Itália, a reconhecer a
independência da Arménia e que o seu exército fosse limitado a 50 mil soldados. Tirando este
exemplo referente ao Médio Oriente árabe, as alterações políticas na Europa modificaram o
mapa da Europa central e oriental.

Estes países foram obrigados a pagar indemnizações aos países vencedores (as tão
controversas reparações de guerra, exigidas a países que se encontravam na penúria). Estes
tratados também criaram um «cordão sanitário» da influência russa, para que a Europa não
caísse nas mãos do socialismo, nem sofresse qualquer tipo de influência por parte da Rússia.
Foi, portanto, uma tentativa de isolar a Rússia, logo após a revolução socialista e o final da
1ªGuerra Mundial, quando o país era visto como uma ameaça ao capitalismo. Este cordão
consistiu em criar um embargo comercial para tentar asfixiar e matar a economia socialista.

Estas cláusulas foram mal vistas pelos EUA e pela Inglaterra. Os primeiros não
concordaram especialmente com o Tratado de Versalhes, pois achavam as decisões demasiado
duras, tinham uma política de neutralidade (recusando-se a associar-se a algum lado) e
queriam que os pagamentos das reparações da Alemanha fossem feitos muito faseadamente –
para custar menos ao Estado Alemão e para não prejudicar a importância alemã à Inglaterra e
aos EUA, sob a consequência de gerar uma recessão mundial. É que as empresas americanas
começavam a estabilizar na Europa e os EUA, uma vez que eram credores de muitos países
europeus. Por outro lado, a França foi a que mais concordou com estes tratados, pois a
Alemanha era o seu maior rival, e muitas das decisões iriam beneficiar os franceses. Portanto,

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contava com o pagamento dos alemães e queria enfraquecê-los, tomando uma posição
favorável à entrada destes numa recessão.

Observando este prisma, as divergências entre os aliados aumentaram


consideravelmente. Como os franceses estavam preocupados com o renascimento alemão,
obrigaram estes a pagar as suas dívidas, fazendo esforços com muitos dos países novos para
que estes formassem alianças militares e políticas (Polónia, Jugoslávia e Checoslováquia, todos
saídos do império austro-húngaro), de modo a que pudessem ser uma espécie de pequena
Entente (Rússia), produzindo efeitos semelhantes aos dos russos na 1ªGM. Tudo isto depois de
a Rússia se ter tornado soviética e a França ter emprestado bastantes capitais aos russos, o
que não conduziu à formação de uma nova aliança.

O cumprimento das disposições consagradas nos tratados celebrados no pós-guerra e


a necessidade de evitar novos conflitos tornaram necessária a criação de uma nova ordem
internacional, capaz de garantir a paz e a direção da vida internacional. Os princípios em que
se devia basear a reorganização do mundo depois da guerra tinham sido definidos pelo
presidente norte-americano Woodrow Wilson, na mensagem dos 14 pontos. O último destes
pontos constituintes do preâmbulo de todos os tratados de paz. Propunha a constituição de
“uma organização geral das nações” que tivesse por objetivo “assegurar as garantias mútuas
de independência política e integridade territorial tanto aos pequenos como aos grandes
estados”.

Uma das consequências do pós-guerra foi, então, a criação da Sociedade das Nações
(SDN). A proposta do presidente Wilson foi concretizada através da Sociedade das Nações
(uma organização internacional multilateral) em 1919, sediada em Genebra, cujo Pacto
organizador foi assinado pelos 27 representantes na Conferência e posteriormente integrado
no próprio texto do Tratado de Versalhes. Aí reuniam-se regularmente os estados-membros da
Assembleia Geral. A SDN era, então, uma assembleia de deputados diplomáticos que tinha
ação muito limitada devido à falta de verbas, pelo que pouco fazia no contexto internacional.
Contudo, era composta por cinco membros: o Secretariado, o Conselho, a Assembleia Geral, o
Tribunal de Justiça Internacional e várias comissões especializadas.

Ainda assim, a SDN era a esperança de que a Grande Guerra tivesse sido a última, uma
vez que tinha como objetivos:

1. A promoção da paz através da cooperação entre os povos;


2. A promoção do desarmamento;
3. A procura da solução dos litígios pela via da arbitragem pacífica;

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4. A promoção da autodeterminação dos povos.

Para tal, todos os estados comprometem-se a respeitar os princípios do direito


internacional. O país que infringisse qualquer destes princípios era boicotado
economicamente. Desde modo, o papel da SDN foi contribuir para uma Europa próspera e
pacífica.

Porém, tudo foi um fracasso. Os vencidos da Guerra, além de se sentirem humilhados


por terem de cumprir com um tratado que não elaboraram e com que não concordam, não
foram convidados para colaborar na SDN como estados-membros (a Alemanha só se juntou
em 1926). Nem todos os vencedores estavam satisfeitos com os ganhos obtidos, a Itália não
adquiriu as terras prometidas pelos franco-britânicos. A regulamentação minuciosa das
fronteiras e a não resolução satisfatória da questão das “minorias nacionais” dificultaram as
relações internacionais e instalaram um clima tenso nas povoações, pelo que o princípio das
nacionalidades do séc. XIX apenas foi parcialmente aplicado. Outros povos, aos milhões,
decidiram abandonar as suas residências e deslocaram-se para os seus novos estados, dando
origem a uma das mais violentas movimentações de povos da História. A inoperância e a
incapacidade perante posteriores conflitos armados (quando a Itália agrediu a Etiópia ou
quando o Japão invadiu a China e a SDN limitou-se a discutir os assuntos, não organizando
nenhuma força militar para travar essas agressões). E, ainda, o facto de a França querer
receber o dinheiro alemão o mais rápido possível, de modo a saldar as suas dívidas, enquanto
a Inglaterra e os EUA defendiam um pagamento faseado, de forma a ser menos doloroso para
economia alemã, fizeram com que os EUA se afastassem progressivamente, passado a adotar
uma política externa isolacionista. Preferiam focar as suas atenções no Pacífico. O lugar dos
EUA na SDN foi preenchido pela China, que se foi juntar à França, Inglaterra, Itália e Japão.

Deste modo, sem o apoio americano, que lhe conferia credibilidade, e sem
mecanismos que lhe permitissem responder às contínuas violações territoriais que se
sucederam, pois limitava-se a discutir as questões sem pôr um termo com força militar, a SDN
viu-se impossibilitada de desempenhar o seu papel de organizadora da Paz. A SDN é ignorada
e, a partir de 1939, extingue-se lentamente, dissolvendo-se em 19 de Abril. A 1ªG.M. acabou,
mas a paz duradoura não se iniciou.

49
A exportação de capitais entre as guerras e a depressão
1929-1933

O endividamento dos países europeus e os investimentos dos EUA na


Europa
Para além das alterações geopolíticas, a Primeira Guerra Mundial provocou profundas
transformações na situação económica e financeira do Velho Continente. A Guerra afetou de
modo desigual as economias nacionais e as trocas internacionais. Assim, enquanto provocou o
declínio da Europa, beneficiou países extraeuropeus, sobretudo os EUA, elevados a 1ª potência
mundial.

A Europa ficou completamente arruinada, tanto a nível humano (10 milhões de


europeus, sendo que 7 milhões se tornaram inválidos, além de 15 milhões gravemente
feridos), como material, uma vez que ao longo da Guerra tornou-se dependente dos EUA, o
seu grande fornecedor, e acumulou dívidas. Deste modo, as economias europeias tiveram
grandes dificuldades de reconversão. Deixaram de poder produzir material bélico, a que as
suas indústrias estavam tão habituadas e cingidas devido às necessidades da Guerra. Os
campos, queimados, não produziam. As fábricas, as minas e as frotas estavam, em grande
parte, destruídas. E as finanças desorganizadas, pelo que a Europa, mesmo após a Guerra,
continuou a comprar bens e serviços americanos e, por isso, a agravar as dívidas. Ainda assim,
Niall Ferguson opina no seu livro “A Guerra do Mundo” que “[E]mbora o desvio temporário da
produção europeia para o negócio da destruição tivesse permitido aos produtores asiáticos e
americanos uma grande expansão, estes não conseguiram compensar plenamente a ruptura
causada pela guerra. Tratava-se de um mercado global de vendedores”.

Neste seguimento, é necessário recuperar urgentemente o que ficou destruído, formar


recursos humanos e reconverter a dita produção industrial. Para tal, é preciso dinheiro, o qual
os estados não têm. De modo a reverter a situação, recorreu-se a medidas internas,
nomeadamente a emissão massiva de notas para multiplicar os meios de pagamento e fazer
face às dívidas. E a medidas externas (recurso a medidas protecionistas, através do
levantamento de taxas aduaneiras e da instituição de restrições cambiais; recurso ao mercado
de bens/serviços e empréstimos americanos, colocando toda a economia na sua dependência).

No entanto, a circulação de uma maior quantidade de moeda fiduciária, sem um


incremento correspondente na produção, provocou uma desvalorização monetária que se
traduziu numa alta de preços interna. Para agravar, a fraqueza da moeda já era notória desde

50
o início da Guerra devido ao abandono do padrão-ouro e à consequente inconvertibilidade das
moedas.

Sendo assim, em 1920, a Europa sofreu uma inflação galopante que atingiu proporções
gravíssimas para os vencidos da Guerra, obrigados a pagar pesadas indemnizações, grande
parte com o dinheiro dos EUA. Os preços de bens essenciais subiram devido à elevada procura
desses bens sem a equivalente resposta por parte da produção. As exportações eram quase
inexistentes, o que tornava muito difícil equilibrar a balança de pagamentos. A contração de
novos empréstimos era o recurso inevitável dos governos. O agravamento do défice dos
estados era a consequência imediata.

Porém, memórias de um alemão afirmar, passando a citar, que “[n]enhuma outra


nação do mundo conheceu uma experiência comparável à dos alemães em 1923. Todas
conheceram uma guerra mundial, a maioria passou revoluções, crises sociais, greves, reveses
de fortuna e desvalorizações de moeda. Mas nenhuma experimentou o exagero grotesco de
todos estes fenómenos em simultâneo, como se verificou na Alemanha, em 1923. […] Não só se
desvalorizou a moeda, mas todos os outros valores. […]”

Donos de uma riqueza vastíssima e fornecedores da Europa e do Mundo, em 1919, os


EUA apresentavam uma imagem de sucesso assente na sua grande capacidade de produção e
na sua excelente balança de pagamentos. Ainda assim, em virtude das dificuldades da Europa,
os EUA sofreram uma breve crise, em 1920/21, relacionada com a diminuição da procura
externa. A produção industrial desceu, os preços diminuíram e o desemprego aumentou.
Dificuldades que foram ultrapassadas, tanto na Europa como nos EUA, com a aplicação dos
métodos de racionalização do trabalho do taylorismo, assim reduziram-se os custos de
produção e manteve-se a viabilidade de muitas empresas. Neste mesmo sentido, a
concentração capitalista das empresas também foi importante.

No entanto, a recuperação económica europeia ficou a dever-se aos créditos


americanos, que consistiram em empréstimos avultados à Europa, que se sucederam a partir
de 1924, principalmente para a Alemanha, permitindo-lhe pagar as reparações da Guerra à
França e à Inglaterra que, por sua vez, pagavam com esse mesmo dinheiro aos EUA as dívidas
da Guerra e os empréstimos entretanto pedidos.

Deste modo, a partir de 1924, surgiu o Plano Dawes, um plano provisório de ajuda
económica direcionado à Alemanha da pós-Primeira Guerra Mundial, com o intuito de que
esta pudesse reerguer a sua economia e pagar as dívidas e reparações a ela impostas. Este
plano foi elaborado pelo norte-americano Charles Dawes, e procurava resolver o problema do

51
não cumprimento por parte dos alemães das dívidas acordadas em Versalhes com o final da
guerra. As propostas eram na verdade bastante simples, pois mantinham-se as somas a serem
pagas pelo país, mas com pagamentos anuais reduzidos e mais distanciados, dando tempo ao
país de acumular os valores devidos para libertar os seus débitos de guerra.

A dependência face aos EUA era, então, notória, pelo que a importância do dólar foi
cada vez maior, assumindo-se como a moeda mais forte.

Apesar de todos os países europeus terem revitalizado a sua situação por volta de
1925, este crescimento encontrava-se assente numa base frágil, devido à instabilidade social
existente e o aumento lento do protecionismo. A Europa passou de credora a devedora dos
EUA e Londres perdeu para Nova Iorque o seu papel de polo central/epicentro da economia
mundial. Os EUA são, agora, a dinâmica de todas as economias industriais. Possuem um vasto
mercado interno, com um poder de compra razoável, que absorve a maior parte da produção,
cada vez mais estandardizada. É nos EUA que abundam os capitais e a importância do dólar
americano é cada vez maior.

Apesar deste dinamismo, o que se verifica é uma interdependência, com os capitais


americanos a fluírem para a Europa, acabando os mesmos por regressar aos Estados Unidos na
forma de pagamento dos débitos contraídos. Em consequência, cerca de metade dos stocks
mundiais de ouro concentravam-se nos Estados Unidos. Se, na primeira década do século XX, a
Europa ainda podia ostentar, orgulhosamente, a sua hegemonia, a partir de 1914 passou para
uma irreversível situação de dependência em relação aos EUA. Os EUA, que durante a guerra
forneceram à Europa matérias-primas, alimentos e armas, passam a contar, no fim do conflito,
com um excelente mercado para continuarem a colocar, não só bens de primeira necessidade,
como investimentos e financiamentos com que a Europa inicia a sua reconstrução. De resto, a
Europa chegou a perder mercados para os EUA, assistindo ao desenvolvimento industrial de
algumas colónias europeias (exemplos da Índia, Austrália e Nova Zelândia).

Os aumentos de produtividade e a fase de “prosperidade” da década de


1920
À medida que a situação estabiliza e que as unidades de produção voltam a laborar
para uma economia de paz, a Europa recupera grande parte do seu poder económico anterior
à guerra, nomeadamente ao nível das exportações, mas está agora sempre um passo atrás dos
EUA, que acabaram por beneficiar muito com a situação económica da Europa. É no período
de 1921 a 1924 que surgem os primeiros sinais de estabilização da situação económica, que

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não tem, todavia, o reflexo esperado ao nível dos défices orçamentais, que se mantêm muito
elevados, muito por culpa dos endividamentos externos. Isto quer dizer que esta recuperação
provocou efeitos diretos na economia norte-americana. Apesar de tudo, os países europeus
procuraram dinamizar as suas respetivas produções e tornar-se menos dependentes dos
produtos norte-americanos.

Enquanto a Europa se erguia com dificuldade dos escombros da guerra e tentava


recuperar do caos, tanto a nível económico como político e social, os EUA arrancavam para um
tempo de intensificação do seu desenvolvimento industrial e viviam um período de grande
prosperidade económica. Esta prosperidade era marcada pelo signo da organização racional
das empresas. Algumas multinacionais americanas começavam a expandir-se nesta altura
(exemplos da IBM, General Motors e Ford, que eram os grandes produtores de automóveis e
aparelhos mecânicos nos EUA). Paralelamente, foi proporcionada pelo facto do território não
ter sido “palco” de guerra, ou seja, não sofreu as consequências fatais que a Europa sofreu
com a guerra. Ocorre uma crescente ligação entre a economia europeia e o capital americano.
A solução das grandes empresas supracitadas passava então por se instalarem nos países
europeus.

Além disso os EUA possuíam um vasto mercado interno, com um poder de compra
razoável, que absorve a maior parte da produção e havia uma grande abundância de capitais
devido à especulação bolsista, baseada na crescente produção industrial e na cada vez maior
importância do dólar. A aplicação de novos métodos de racionalização do trabalho como o
taylorismo, o fordismo e a estandardização contribuíram também para a grande prosperidade
e avanço dos Estados Unidos.

A década de 20 do século XX foi, nos EUA, sinónimo de prosperidade. De facto, à


medida que a produção crescia, aumentava o consumo interno. Apesar de continuar a haver
pobres, eram mais os confortavelmente acomodados, os prósperos e endinheirados. Os
negócios prosperavam e permitiam lucros que subiam rapidamente. Os EUA viviam dos
rendimentos da 1ª Guerra Mundial: hegemonia do dólar, exportações maciças para uma
Europa em reconstrução e para a América Latina. Havia, portanto, gradualmente um período
continuado de prosperidade que parecia não ter fim.

Em 1928, os norte-americanos acreditavam na sua prosperidade infindável. Sentiam-se


orgulhosos de todos os seus progressos, desde as suas fábricas à azáfama das suas cidades
associada, também, ao consumismo desmedido de um tempo de euforia da recuperação do
pós-guerra. Tanto que o presidente da época afirmava que a pobreza e o desemprego eram

53
“males” em vias de extinção. Afinal, devido à miséria europeia do pós-guerra, os EUA eram os
grandes fornecedores da Europa.

No entanto, foi esta mesma prosperidade que, como sabemos, se vai revelar precária,
ou frágil se quisermos, até porque:

1. Várias indústrias não tinham recuperado os níveis anteriores à breve crise de 1920-21.
2. Persistia um desemprego crónico associado à intensa mecanização.
3. A Europa melhorava e já não carecia de muitos produtos americanos.
4. A agricultura não era compensadora para quem se dedicava a ela. As produções
excedentárias originavam preços baixos e queda de lucros.
5. A política de facilitação de crédito mantinha, artificialmente, o poder de compra
americano, pelo que a compra de automóveis, imóveis e eletrodomésticos realizava-se
com base no crédito e nos pagamentos a prestações. Assim como acontecia na
aquisição de ações de empresas.

No entanto, para alguns historiadores, não é claro que os EUA sejam, no período entre
as duas guerras mundiais, a área económica dominante, e que se possa afirmar que Europa é
dependente dos EUA. O que se verifica é uma interdependência, com os capitais americanos a
fluírem para a Europa, e com os juros pagos pelos empréstimos a serem reinvestidos, em
grande parte, no reforço da economia americana, sustentando, ainda, a especulação bolsista
de Wall Street. Confirma-se assim, que na segunda metade da década de 20 se viveu um clima
de acalmia económica na Europa.

Deste modo, os americanos, crentes numa boa situação económica, muitos eram os
que investiam na Bolsa, onde a especulação crescia, ultrapassando, muitas vezes, entre 1927 e
1929, o valor da produção industrial. É, então, precisamente na Bolsa de Nova Iorque em Wall
Street que se irão manifestar os primeiros sinais da crise de 1929. Porém, esta já tinha
precedentes.

A recessão da década de 1930: a crise bolsista nos EUA (1929) e a sua


transformação em recessão mundial
Facto é que a perda de poder da Europa para os EUA foi uma das consequências da 1ª
Guerra Mundial. Neste contexto, e para explicar melhor a recessão da década de 30, deve-se
ter em conta que a Alemanha não teve a Guerra no seu próprio território e, por isso, a
indústria alemã, embora arruinada, estava fisicamente intacta. Isto fez com que grande parte

54
do dinheiro americano tenha ido para lá – para reavivar a indústria. Com o risco de uma
recessão devido à guerra e com o poder que os EUA exerciam agora na Europa do pós-guerra,
a indústria alemã cresceu bastante, em grande parte graças à massificação do consumo dos
produtos alemães na Europa.

Assim, os anos 20 foram uma época de grande produtividade e de diferenças


qualitativas no que diz respeito aos produtos: a Alemanha cresceu, bem como a França, ainda
que de forma menos intensa – foi uma época de prosperidade. O crescimento da economia
mundial arrastou outras economias pré-industrializadas. Na segunda metade dessa década, a
Europa, graças à recuperação económica que vinha alcançando, deixou de estar tão
dependente dos bens e serviços americanos, o que se traduziu numa redução das exportações
com destino ao velho continente. A prosperidade não atingia todos os países da mesma forma:
uns cresciam mais do que outros, uns consumiam mais do que outros, e nuns países havia mais
excedentes do que noutros.

Isto levou à criação de barreiras protecionistas, o que provocou um crescimento na


produção de cada país, que fez com que se chegasse a uma superprodução e que se lançasse
uma sobrevalorização das matérias-primas, pelo que os seus custos se tornaram insuportáveis.
Foi esta sobrevalorização das matérias-primas que provocou a recessão. Esta crise não pode
ser somente explicada pela crise bolsista – muito antes da crise na bolsa, já a produção estava
em superprodução. A crise bolsista apenas acelerou o processo recessivo.

Ora, percebe-se, assim que a crise teve origem, por um lado, na especulação bolsista.
As cotações das ações da bolsa, cada vez mais altas, não correspondiam à situação real das
empresas. A facilidade de recurso ao crédito mantinha os cidadãos na ilusão de uma
prosperidade interminável. Os bancos estimulavam esta especulação bolsita, pois concediam
créditos ao consumo privado de forma pouco criteriosa e a pessoas que não possuíam
capacidade, acabavam-se por endividar. Tratava-se do recurso ao crédito para aplicação na
compra de ações. Ora, quanto mais se consumia, mais os bancos emprestavam, numa espiral
que só podia conduzir a um fim – a rutura do sistema financeiro e, consequentemente,
produtivo. As pessoas não pagavam aos bancos o que lhes deviam e deixaram de consumir por
não terem meios para tal. Porém, neste contexto, salienta-se que “Hoover tornou-se uma das
figuras mais determinantes na expansão económica do início dos anos vinte, um período
marcado por um alargamento excessivo do crédito, que trazia maus pronúncio para o futuro”,
avaliação feita por Bill Fawcett que, como veremos em pormenor, mais correta não poderia
estar.

55
A crise teve origem, por outro lado, na superprodução de bens de consumo. Na euforia
da recuperação do pós-guerra, produz-se demasiado rápido para as necessidades reais das
sociedades desenvolvidas. Acumulam-se, pois, os excedentes, que são o rastilho da crise. E,
com a referida retração do consumo privado, as empresas veem-se com uma enorme
quantidade de stocks acumulados, o que vai levar à deflação, isto é, à baixa dos preços, a qual
penaliza as empresas, que veem os seus lucros diminuir, obrigando-as a despedimentos, o que
conduzirá ao desemprego e à queda do poder de compra. Para este facto, Bill Fawcett, autor
do livro os “Os 100 Grandes erros da História”, atribui um culpado,"Hoover [(presidente dos
EUA da época)] tentou manter os salários dos trabalhadores industriais elevados demais [na
época de prosperidade], e o resultado foi o aumento do desemprego com impacto negativo no
PIB”.

Também, as ações de muitas empresas estavam perigosamente sobrevalorizadas.


Começam a surgir, nos mercados bolsistas, grandes quantidades de ordens de venda dessas
ações e, perante a queda contínua dos preços, no dia 24 de outubro, na “quinta-feira negra”,
não havia compradores para a quantidade de títulos disponíveis a preços baixíssimos. Foi o
crash da bolsa de Wall Street, que se repercutiu sobre todos os sectores da economia.

A desgraça abateu-se sobre os EUA: muitas fortunas «virtuais» esfumaram-se em


poucas horas, de um momento para o outro muitos foram os que se viram sem nada. Face a
este crash bolsista, rapidamente se revelaram as consequências provocadas pelo mesmo.

Milhares de bancos foram à falência, as fábricas fechavam e lançavam no desemprego


milhares de trabalhadores, famílias inteiras ficaram na miséria e as empresas diminuíram os
preços e o volume da produção. As empresas faliram, pois com a queda do valor das suas
ações perderam capital e deixaram de poder recorrer ao crédito. Opoder de compra caiu em
flecha, devido à subida galopante da taxa de desemprego. Como tal, a procura diminuiu e os
preços caíram (na tentativa de escoar a produção agrícola e industrial em excesso).

Nos campos, os pequenos agricultores, desesperados, destruíam os excedentes


agrícolas para que a lei da oferta e da procura funcionasse, ou seja, para a oferta diminuir,
levando assim à subida dos preços e, intrinsecamente, dos lucros. A fome proliferava e as
cidades que, ao longo dos anos 20, transpiravam prosperidade, agora mergulhavam na
desolação. Acumulavam-se as filas para a sopa dos pobres, amontoavam-se os desempregados
que se ofereciam para trabalhar a troco de remunerações irrisórias para tarefas para as quais
não tinham qualificação e barracas multiplicavam-se nas proximidades dos centros urbanos,
uma vez que não havia dinheiro para custear rendas de casa.

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Os desequilíbrios trazidos pelos tratados de paz e pela instabilidade social agravaram-
se através desta crise bolsista (e consequente recessão). Assim, ela teve uma repercussão
generalizada nos EUA e na Europa. Enquanto primeira potência económica do mundo, os EUA
mantinham relações comerciais com todo o mundo capitalista, pelo que a falência da
economia americana conduziu à falência da economia mundial. A verdade é que quem sofreu
mais com esta crise foram, de facto, os EUA. A Europa ficou abalada, mas não foi de forma tão
grave como nos EUA. Os países europeus, como dependiam muito do pagamento dos
empréstimos americanos para a reconstrução do pós-guerra, viram-se sem apoios, pois os
capitais injetados pelos EUA foram resgatados pelos bancos americanos, de modo tentar salvar
a sua economia. Os países que dependiam da exportação de matérias-primas deixaram de ter
compradores e os países em vias de desenvolvimento ficaram sem mercados para o
escoamento dos seus produtos, procedendo à diminuição dos níveis de produção. A Alemanha
foi o país europeu mais afetado, já que os EUA investiram muito na economia alemã e
respetiva indústria.

O crescimento per capita antes da guerra é, em média, inferior ao crescimento


verificado nos anos 30. Os EUA correspondem ao país que mais ilustra a ideia de recessão. Este
é um período de forte crescimento para japonenses e soviéticos. O facto História de os
japonenses disporem de uma população agrícola bastante maior mascarava o desemprego
existente. A URSS foi a que melhor escapou à crise, havendo até um crescimento da sua
economia, o que se deveu ao facto de ser um país comunista e, assim, estar arredada do
sistema capitalista, e graças à planificação e direção económica promovida pelo próprio estado
soviético (a exportação de capitais aumentou bastante).

Os mercados norte-americanos, japonês e soviético eram praticamente fechados,


apesar de um grande fluxo de capitais. A URSS, os EUA e a Alemanha procuravam comprar
cada vez menos e apostar na compra de matérias-primas baratas. Nos anos 30, a maior parte
das empresas estavam sediadas nos seus países de origem. A tendência dos últimos 60 anos
passava por perder a base nacional capitalista e ajustar o grau de abertura do mercado. O
paradoxo dos anos trinta (havia um fluxo de capitais, mas os países fecharam-se) colidia com a
base das empresas capitalistas e as economias nacionais fechadas. Isto mostra que esta crise
teve efeitos desiguais, não apresentando um padrão uniforme e estimulando a procura do
mercado interno (e o consequente fecho dos mercados).

A recessão durou anos. As diferentes economias tentaram de tudo para parar a crise. A
maior parte dos países procurou tornar-se autossuficiente, iniciando-se um período de adoção
de políticas fortemente protecionistas (estavam autocentrados e tinha tendência a fechar-se).

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Outros apostaram em verbas públicas na economia nacional para incentivar o crescimento
económico (os países capitalistas fizeram isto para acelerar a produção de capital) e ainda
outros apostaram nas políticas de redistribuição de rendimentos.

Os EUA demoraram a sair da recessão, pois o governo gastou muito tempo na


realização das injeções de capital público sobre uma situação económica recessiva. Criaram
grandes obras públicas, como edifícios públicos, barragens, drenagem de pântanos e
autoestradas. “[P]ara financiar diversos projectos de obras públicas no final do seu mandato,
Hoover inverteu estes cortes [(onde anteriormente Mellon tinha baixado os impostos aos
escalões mais elevados de 73 para 24%)], e a consequência de um aumento de impostos tão
grande acabou por ser um crescimento económico substancialmente mitigado”, frisa Bill
Fawcett, em “Os 100 grandes erros da História”.

A Alemanha também fez tudo isso e até criou uma fábrica de construção de
automóveis (Volkswagen). Era uma empresa estatal, financiada pelo Estado e por instituições
públicas. Outros países também desenvolveram programas destes para o incentivo do
desenvolvimento económico, ainda que em menor escala.

No meio de toda esta situação, o pior residiu ainda no facto das autoridades
americanas, não conscientes da dimensão da crise, terem acabado por acentuar ainda mais a
deflação com medidas desastrosas. “A recessão foi impulsionada por uma desaceleração
cíclica do mercado de capitais e depois exacerbada por uma política económica mal orientada.
E foi a inépcia de Hoover que agravou a crise. Embora ele, e de certa forma justificadamente,
tenha sido um bode expiatório da crise económica, o seu fracasso não foi invertido pelo seu
sucessor, Roosevelt, e as ações combinadas de ambos fizeram com que a Grande Depressão
durasse mais tempo e se intensificasse ainda mais” (Bill Fawcett) Assim, logo em 1930, os EUA:

1. Aumentaram de 26% para 50% as taxas sobre as importações (para proteger a sua
economia).
2. Criaram dificuldades acrescidas a outros países que ficaram sem condições para
adquirir a produção americana (, o que provocou o declínio do comércio mundial).
3. Aumentaram os impostos, buscando novas receitas para o orçamento.

Em suma, todos os países em crise pretendiam evitar despesas e aumentar as receitas.


Mas, ao organizarem obstáculos ao investimento e à elevação do poder de compra, não havia
procura e sem procura, não havia lançamento possível da economia.

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Instava-se, então, a descrença do capitalismo liberal, necessitando-se de uma maior
intervenção na regulação das atividades económicas.

“Roosevelt aprofundou muitas das medidas economicamente ruinosas de Hoover e,


com isso, deixou que a Depressão se prolongasse. O desemprego manteve-se elevado durante
todo o período do New Deal [(programa de intervenção na economia americano)], de
Roosevelt, e foi só no rescaldo da Segunda Guerra Mundial que os Estados unidos conseguiram
realmente sair do buraco em que se encontravam”, por Bill Fawcett.

A recessão e as alterações políticas – regimes antiparlamentares na


Europa e no Mundo
Nos anos 30 havia já um paradoxo no capitalismo: havia um fluxo de capitais, mas os
países fecharam-se. Imergidos nesta profunda crise, os governos ocidentais delinearam
estratégias para se reerguerem economicamente. O quadro económico vivido pela Europa não
era favorável à consolidação do triunfo das nacionalidades e da democracia conseguido com a
Primeira Guerra Mundial. Era um continente assolado por sérias dificuldades económico-
financeiras e este quadro negativo originava complicadas perturbações no continente. Por um
lado, existe um mercado no qual existe circulação de capitais. Por outro lado, existe um
mercado onde os países se fecham e criam grandes restrições para a circulação comercial. Os
países procuravam ganhar vantagens às custas de outros Estados, sendo que as grandes
economias passavam a funcionar em circuito fechado. A evolução paradoxal do capitalismo
teria como consequência política uma nova guerra.

A proteção da economia nacional foi o objetivo que todos os chefes de Estado


perseguiram. Com este intuito, procederam à aplicação de taxas aduaneiras sobre os produtos
importados, de modo a escoar a produção interna (protecionismo e nacionalismo económico).
O Estado passou a regulamentar a atividade económico-financeira (intervencionismo estatal),
colocando entraves ao crédito fácil e criando organismos de supervisão económica. As grandes
potências procuravam sair da recessão através de uma política agressiva e da redução de
custos militares. Alguns países desenvolveram-se mais rapidamente que outros numa política
de crescimento em base fechada. Os americanos estavam mais longe de procurar uma nova
guerra do que alemães ou japoneses, pois foram o país mais retardado na contenção das
despesas militares.

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A recessão trouxe consigo o reacender do fervor revolucionário de esquerda e a defesa
de alternativas económicas anticapitalistas. Isto ocasionou alterações políticas em todos os
países. Muitos deles, com estruturas políticas muito frágeis, evoluíram para regimes ditatoriais
(fórmulas autoritárias e conservadoras de direita). O tempo das ditaduras, dos fascismos,
aproximava-se. O facto de os Estados tentarem sair da recessão numa base nacional (passando
a crise para outros) levou-os a uma nova guerra.

Uma das características do período que decorre entre as duas guerras mundiais é a
crise das democracias liberais. As dificuldades do primeiro pós-guerra, a reação bolchevique e
a crise de 1929 são algumas das causas de regressão democrática na Europa.

As primeiras democracias a serem atingidas neste processo foram as de mais recente


implantação, ou seja, as da Europa Central e mediterrânica, caracterizadas por uma economia
frágil e dependente de capitais estrangeiros. Nos países em que esta tradição existia, a
democracia resistiu melhor, apesar dos inequívocos sintomas de crise. Esta radicalização é
sobretudo notória em França, Alemanha e Itália, com particular destaque para os dois últimos
países, onde regimes autoritários de extrema-direita formaram governo.

O regime fascista é uma ditadura que anula as instituições democráticas e substitui as


liberdades individuais por um feroz controlo político dos cidadãos. O fascismo também
significa o predomínio absoluto de um partido político. O sistema político do fascismo é
corporativo. A representação do povo através de corporações foi vista como democracia
orgânica, isto é, uma maneira natural de participação política do povo. No entanto, as
corporações fascistas não serviram de representação do povo, pelo contrário, serviram para
controlá-lo através da cúpula política liderada pelo chefe supremo do regime. Para reforçar
esse sistema totalitário, os seus líderes faziam frequentemente uma exaltação nacionalista e
racista. Como a ditadura é cronicamente insegura perante o povo, os movimentos fascistas
transformaram-se em organizações paramilitares armadas. A nível económico, este regime,
preservando a propriedade privada, aproximou-se de uma economia de planeamento,
controlada pelo governo, pelo partido único e pelo seu líder. No plano externo, o fascismo teve
um projeto de expansão territorial.

O fascismo surgiu primeiro em Itália, em 1919. Este país não ficou feliz com a sua
participação na Primeira Guerra Mundial, pois gastou imensos recursos e não obteve
compensações significativas. Nomeadamente a expansão territorial italiana que ficou aquém
do esperado e desejado. A não satisfação das suas reivindicações na Conferência de Paz em
1919, deram à população uma “vitória incompleta”. A Itália atravessava então uma grave crise

60
moral e económica (posteriormente agravada pela recessão). Nesta situação, a maioria da
população estava recetiva a uma solução radical. Foi Benito Mussolini que tomou o poder em
1922. Foi o primeiro regime fascista a ser implementado definitivamente. Este movimento só
pôde ser implantado, porque encontrou uma ampla base social de apoio e condições propícias
ao seu desenvolvimento.

Também na Alemanha se instala um regime de índole fascista. Com o fim da 1ª Guerra


Mundial, a Alemanha (grande derrotada) foi varrida por uma crise económico-financeira sem
precedentes (foi o país europeu mais devastado economicamente). À crise económica,
marcada pela hiperinflação e pelo desemprego, juntou-se a humilhação do Tratado de
Versalhes (os alemães tinham a seu cargo o pagamento de pesadas indemnizações aos
aliados). Os governantes alemães deparavam-se com o profundo ressentimento que o seu
povo sentia pelo diktat de Versalhes. As humilhações infligidas à Alemanha estavam presentes
na memória alemã. Assim, o exacerbado nacionalismo persistia e uma camada de população
recordava com nostalgia os tempos do Império Alemão. Dias após a sua nomeação como
Chanceler, Hitler dissolve o Reichstag na esperança de que, com novas eleições, consiga a
maioria. A ascensão de Hitler deve-se à sua habilidade política, às divisões dos partidos
políticos tradicionais e à desagregação das instituições republicanas, à incapacidade do velho
presidente Hindenburg, mas sobretudo ao recurso à violência, à propaganda e ao apoio dos
descontentes, das classes médias e dos capitalistas industriais e financeiros. O nazismo reforça
o lado protecionista alemão.
Na Alemanha, as suas ações têm como objetivo construir aquilo que Hitler denomina
por “Espaço Vital”. Esta teoria do Espaço Vital constituiu a fundamentação ideológica de uma
série de ocupações dos territórios vizinhos. Um Estado dinâmico, com um grande crescimento
económico, necessita de espaço. A necessidade básica territorial de sobrevivência é
considerada espaço vital, mas se a economia cresce, esse espaço deve ser alargado. Por outras
palavras, as fronteiras podem ser alteradas em conformidade com o aumento da força de um
Estado. A Alemanha estava em pleno crescimento económico, necessitava de território, de que
os outros Estados não iam desistir sem luta. Em 1935, o território do Sarre que, de acordo com
o Tratado de Versalhes ficava sob o controlo da SDN, passou para a Alemanha. Em 1936, Hitler
remilitariza a Renânia, desobedecendo ao Tratado de Versalhes; celebrou com Mussolini o Eixo
Roma-Berlim; Afirma com o Japão um pacto, com o objectivo de combater o expansionismo do
comunismo soviético. Esta aproximação do Japão à Alemanha deve-se, essencialmente, à
viragem da política japonesa para uma direcção mais nacionalista e autoritária; Em 1938, Hitler
anexou a Áustria (Anchluss); no mesmo ano, anexou a região checa dos Sudetas; Em 1939,

61
Hitler, pretendendo evitar complicações a leste, celebra um pacto de não-agressão com a
URSS, que incluía a partilha da Polónia e a integração na URSS dos países bálticos.

Na década de 30, perante as dificuldades económicas derivadas dos efeitos da grande


recessão, numerosos países aderiram aos regimes autoritários. O fascismo irradiou-se pelo
Mundo. Podemos salientar o exemplo da Itália, da Alemanha, de Portugal, o caso de Espanha:
o general Franco, após a vitória na Guerra Civil, em que contou com os apoios da Alemanha,
Itália e Portugal, estabeleceu um regime ditatorial; e o caso do Japão: em 1926, a subida ao
poder do Hirohito marca o fim do processo de democratização e ocidentalização encetado em
meados do século XIX. Mas noutros países como a Bulgária, a Grécia, a Roménia, a Argentina, o
Chile e o Brasil também se fez sentir o avanço dos totalitarismos.

A crise mundial do capitalismo levou o imperialismo japonês, mais fraco que o seu
concorrente no pacífico, os EUA, ao paroxismo nacionalista, formando um governo dominado
por uma casta militar fascista que se organizou para esmagar completamente os seus vizinhos
asiáticos e retirá-los da esfera de influência dos imperialismos rivais dos EUA, da Inglaterra e
da França como uma vida de saída da crise. Tratava-se de um país que dependia muito do
comércio mundial, uma vez que necessitava de matérias-primas e de mercados externos para
exportar. O principal objetivo visado pelo imperialismo japonês era dominar a China.

A subida ao poder de Hirohito em 1926 marca o fim do processo de democratização e


ocidentalização encetado em meados do século XIX. Por outro lado, o Japão pôde crescer
industrialmente (através de uma política agressiva) e criou uma burguesia e uma força militar
(através do aumento das despesas militares). De resto, sentiu a recessão de uma forma
intensa, tornando-se num regime dominado pelos militares e elevando a pressão pela procura
de colónias. Houve mesmo o plano Tanaka, que se baseava na ideia de conquistar outros
territórios para que diminuísse a dependência do comércio internacional. O Japão invadiu a
Manchúria, mesmo sendo membro permanente da SDN. Quando saiu desta, criou o
protetorado da Manchúria, que fora retirado à China. Era uma estratégia de abrir portas ao
mercado chinês. O Governante Chinês Kai-Chek deu conta da intenção invasora do Japão e não
gostou. A recusa na Carta da SDN do seu pedido de tratamento racial igualitário fez exacerbar
o sentimento nacionalista japonês, considerando-se uma necessidade a construção de um
império, à semelhança do espaço vital alemão. É por isto que, em 1937, o Japão invade a China
e avança pelo seu território sem encontrar grande oposição (instala um governo provisório em
Nankin). Pode-se concluir que a 2ªG.M. iniciou-se no momento em que surge a segunda fase
da expansão da China (1937) por parte do Japão. Algumas das grandes cidades chinesas
ficaram sob domínio japonês até 1938, tudo isto antes do começo da 2ªG.M. na Europa.

62
Em suma e, neste contexto, Niall Ferguson, no livro “A Guerra do Mundo” afirma que
“A economia planificada tinha um insaciável apetite não só por trabalhadores, mas também
por matérias-primas. A União Soviética tinha herdado ambos, em copiosa quantidade, do
Império Czarista. Todavia, os outros países que haviam adoptado o modelo totalitário eram
menos dotados. Na Alemanha e no Japão, a economia planificada estabeleceu um ritmo
político muito diferente da sincopada batida da era do jazz. Em meados dos anos 30, já as
pessoas haviam deixado de dançar; em vez disso, marchavam.”

Deste modo, os regimes totalitários afirmavam sem quaisquer reservas o seu carácter
militarista e imperialista. Com efeito, as suas bases sociais de apoio foram alimentadas com
promessas ultranacionalistas de alargamento das fronteiras dos respetivos territórios pela
agressão expansionista, nem que para isso tivessem de violar todos os tratados e convenções
internacionais. Assim, em particular a Alemanha, a Itália e o Japão marcaram os anos 30 pelas
sistemáticas agressões à nova ordem internacional, inviabilizando todas as intenções de paz e
de cooperação entre os estados-membros da Sociedade das Nações.

“Em termos globais, o colapso da democracia não pode ser facilmente atribuído à
Depressão; como já pudemos ver, demasiadas democracias sobreviveram às profundas crises
económicas e demasiadas ditaduras formaram antes da súbita queda ou no rescaldo de
declínios bastante modestos da produção”, Niall Ferguson.

A 2ª Guerra Mundial
A 2ª Guerra Mundial deu-se entre 1939 e 1945. Esta foi uma guerra essencialmente
ideológica, onde se verificou um conflito entre Liberalismo, Comunismo e Fascismo. Pode
dizer-se que as causas (além do surgimento dos regimes totalitários) desta guerra estiveram
nas determinações do Tratado de Versalhes. Este Tratado, assinado em 1919 e que encerrou
oficialmente a Primeira Grande Guerra, determinava que a Alemanha assumisse a
responsabilidade por ter causado a 1ªG.M. e obrigava o país a pagar uma dívida aos países
prejudicados, além de outras exigências como o impedimento de formar um exército
reforçado e o reconhecimento da independência da Áustria. Isso é claro, trouxe revolta aos
alemães, que consideraram estas obrigações uma verdadeira humilhação.

Para os alemães, as fronteiras definidas pelo Tratado de Versalhes forneciam ainda


mais motivos para a existência de um nacionalismo xenófobo. Alguns alemães encaravam
desfavoravelmente a separação entre os Austríacos de língua alemã e a Alemanha, bem como

63
o domínio dos checos sobre alemães que se seguiu à queda da monarquia dos Habsburgo e à
criação da Checoslováquia.

A base do capitalismo alemão era uma base nacional, apesar da presença de empresas
americanas. Alguns historiadores chegam mesmo a dizer que os capitalistas americanos
trouxeram aos capitalistas alemães o apoio financeiro e político possível à agressão hitleriana.
O desejo de Hitler consistia em expandir os domínios territoriais da Alemanha e ampliar, desta
forma, a obtenção de poder e recursos materiais (principalmente matérias-primas). Em termos
de ajuda económica, após Versalhes, os bancos e os “trusts” americanos multiplicaram na
Alemanha investimentos de capitais e créditos. Como conclusão, a primeira condição da
agressão hitleriana foi o renascimento da indústria metalúrgica e química de guerra na
Alemanha. Este renascimento só foi possível graças ao auxílio dos meios dirigentes do capital e
da política dos EUA (grande parte do armamento do exército alemão era produzido pelos
americanos). Estes objetivos militaristas e expansionistas também estavam presentes, no final
da década de 1930, na Itália fascista de Mussolini e no Japão. Em 1934, a Itália encontrava-se
ao lado das potências vencedoras da 1ªG.M. (França e Inglaterra). A Alemanha tentou anexar a
Áustria e a Itália, algo que não acontece devido à Conferência de Stresa. É garantida a
independência da Áustria, bem como é impedido a promoção do rearmamento alemão (um
dos objetivos de Hitler). Os italianos não queriam sair da sombra porteira dos vencedores da
1ªG.M. e, portanto, fazem um pacto com Inglaterra e França.

A Itália entrou num processo de conquistas coloniais na década de 30. Em Outubro de


1935, a Itália (cujos militares estavam instalados na Somália e na Eritreia) afirmou seu
imperialismo invadindo a Etiópia, país independente situado no nordeste da África e que
constituía o único Estado que ainda não tinha sido dividido. Este é o ponto de viragem na
política mundial estando na base da 2ªG.M.. A Inglaterra (que controlava o Nilo) não aceitava
que a França controlasse a Etiópia, pois isso iria pôr em causa o seu próprio controlo, e por
isso, a SDN determinou que seus Estados membros restringissem o comércio com a Itália.

Tal proibição, no entanto, não chegou a afetar a Itália, porque nações fortes como os
Estados Unidos e a Alemanha - que não faziam parte da SDN - continuaram a vender-lhe
matérias-primas essenciais, como petróleo e carvão. A conquista da Etiópia pela Itália,
consumada em 1936, provou ao mundo que a SDN era incapaz de assegurar a paz mundial.
Isto provocou um ponto de rutura/colisão entre Itália e a Entente Anglo-Francesa. A Alemanha
alia-se aos transalpinos e celebrava então um pacto com Mussolini (Eixo Roma-Berlim), onde
foram anexadas várias regiões que permitiam regular o comércio e a política externa de países
como a Áustria e a Checoslováquia. O "Eixo Roma-Berlim" tornou-se uma aliança militar em

64
1939 com o Pacto de Aço. Foi um acordo entre os governos da Itália fascista e da Alemanha
nazista, firmado em 1939, que estabelecia uma aliança em caso de ameaças internacionais,
bem como ajuda imediata e suporte militar em caso de guerra e colaboração na produção
bélica e no campo militar. Além disso, nenhuma das partes poderia firmar paz sem o
consentimento da outra. As anexações territoriais da Áustria e da região checa dos Sudetas
foram realizadas pela Alemanha em 1938. Posteriormente, em 1939 Mussolini anexa a
Albânia.
Todo este processo de expansão ia contra o Tratado de Versalhes que os alemães
sempre reprovaram e culpavam pela sua situação de penúria no imediato pós-guerra, até
porque, segundo, R. A. C. Parjer, em a História da 2ª Guerra Mundial, “[E]ra imprescindível
para o sucesso dos Nazis e para a eventual aceitação de Hitler por parte dos Alemães, no que
diz respeito à política externa, que o povo alemão acreditasse que os seus infortúnios
económicos e políticos eram uma consequência da imposição e da aplicação do Tratado de
Versalhes por parte dos predadores estrangeiros. Poucos alemães sentiam qualquer
«culpabilidade» especial em relação à Primeira Guerra Mundial e não sentiam que as suas
dolorosas consequências, encarnadas no Tratado de Versalhes, representassem um castigo
justificado.”
A expansão japonesa interferia também na política europeia. A Alemanha afirma com
o Japão um pacto anticomunista em 1936 (Pacto Anti-Komintern), cujo objetivo era combater
o expansionismo do comunismo soviético. Em caso de ataque da URSS contra a Alemanha ou o
Japão, os dois últimos comprometiam-se a efetuar consultas acerca das medidas a serem
tomadas para proteger os seus interesses comuns. Também concordaram que nenhum dos
dois concluiria tratados políticos com a URSS. Esta aproximação do Japão à Alemanha deve-se,
essencialmente, à viragem da política japonesa para uma direção mais nacionalista e
autoritária. Em 1937, a Itália aderiu a este pacto. Após ter firmado com a Alemanha o Pacto do
Aço, integra os seus objetivos militares em 1940, com o Pacto Tripartite. Através deste,
formalizou a aliança conhecida como Eixo Roma-Berlim-Tóquio. Foi idealizado por Hitler para
intimidar os EUA e tentar mantê-lo como país neutro durante a guerra. Porém, na prática
acabou legitimando a entrada americana no conflito europeu, quando este declarou guerra ao
Japão, após o ataque japonês a Pearl Harbor.
Perante o desrespeito das normas dos tratados de paz e dos termos do pacto da SDN,
as democracias ocidentais reagiram muito passivamente. A SDN manifestou uma atitude
displicente em relação aos países que violaram as cláusulas do seu pacto. O Reino Unido e a
França não impediram Hitler de atuar logo em 1938 porque ambos não estavam preparados
para a guerra. A nível económico, financeiro e industrial eram muito mais fracos do que a

65
Alemanha. Para além disso, os britânicos e os franceses não tinham nenhuma vontade
psicológica de entrar numa nova guerra depois das terríveis perdas que tiveram durante a
1ªG.M.. Também, sem o apoio dos EUA, os exércitos francês e inglês tinham poucas
probabilidades de resistir perante as forças armadas de Hitler.

Outra razão encontrava-se na esfera ideológica. Os regimes liberais consideravam a


revolução bolchevique como o inimigo principal e, por isso, não pensavam, de maneira
alguma, que fosse possível uma aliança militar com a URSS. As potências liberais estavam tão
preocupadas com a URSS e com o seu regime que “não houve protestos por parte [destas]
quando a Alemanha anulou unilateralmente o artigo do Tratado de Versalhes de 1919 sobre a
limitação dos efetivos do exército e do armamento do Estado alemão. Pouco depois, era
proclamado no país o serviço militar obrigatório. A Alemanha nazi-fascista criou um exército,
uma armada e uma aviação poderosos.”, por Oleg Rjechévski no livro “Lições da Segunda
Guerra Mundial”.

Acreditando nas promessas feitas por Hitler de que, resolvido o problema dos Sudetas,
não haveria mais problemas na Europa, as democracias ocidentais cederam na celebração do
Pacto de Munique, em 1938, aceitando a integração daquela região nas fronteiras alemãs.
Estes são os principais exemplos da atitude passiva das democracias, as quais não notavam
que, com as suas tentativas de pacificação, estavam a dar oportunidades à Alemanha e à Itália
de testarem as suas armas.

O último obstáculo à guerra foi a posição da URSS. A França já tinha tentado fazer a
Guerra e em 1934 ofereceu um lugar à Rússia na SDN. Esta, ao início, pensou em aceitar o
lugar, mas depois mudou de opinião por causa da Polónia (um novo país criado na sequência
dos tratados e que ninguém queria), pois achava que tinha sido criada numa área que já tinha
influência (só aceitaria se tivesse livre acesso ao território em questão). A França não quis
sacrificar a aliança com a Polónia e a URSS desistiu do seu possível lugar na SDN e da sua
aliança com a França.

Em 23 de agosto de 1939, Hitler, pretendendo evitar complicações a Leste, celebra um


pacto de não-agressão com a URSS, que incluía a partilha da Polónia e a integração na URSS
dos países bálticos. Alemanha e URSS (que mudara a sua política externa) comprometeram-se
a não se atacarem uma à outra e a manterem-se neutras se uma delas fosse atacada por uma
terceira potência. Num protocolo adicional secreto ficou combinada uma divisão da Polónia e
da Finlândia, sendo que os Estados bálticos e Bessarábia foram prometidas à URSS. Oito dias
antes do ataque alemão à Polónia, o protocolo referia uma “reorganização politico-territorial”

66
do Estado polaco e de uma invasão pelas tropas de Wehrmacht (conjunto das forças armadas
da Alemanha durante o Terceiro Reich entre 1935 e 1945).

Quando em 1939, a Alemanha anexa toda a Checoslováquia, é que as democracias


ocidentais começaram a perceber que os acordos do Munique tinham sido mais uma cedência
à política de chantagem dos ditadores. Ou seja, com tanta preocupação pelo perigo da URSS,
ninguém deu a devida atenção ao perigo que o fascismo na Alemanha proporcionava,
chegando até a ajudar só para conseguirem derrotar a URSS. A 3 de setembro de 1939, dois
dias após a entrada das tropas alemãs no território polaco (que quebrava o pacto de não-
agressão), a França e a Inglaterra declaram guerra à Alemanha. Iniciaram também um bloqueio
naval à Alemanha, que tinha como objetivo danificar a economia do país e o seu esforço de
guerra. Foi o início da 2ª Guerra Mundial, o conflito mais violento da História. Portanto, uma
das causas desta guerra foram os desejos expansionistas.

A hegemonia alemã até 1942


Quando a guerra se iniciou, era previsível que as potências com um capitalismo de
base mais fechado conseguissem algumas vantagens iniciais. Nos primeiros meses de guerra,
assistiu-se ao avanço imparável dos alemães por quase toda a Europa. Em menos de um ano, a
Europa continental caiu sob o poder alemão, tão rápida e poderosa foi a sua ofensiva militar.
Pela primeira vez é utilizada em larga escala a estratégia da Guerra Relâmpago (blitzrieg).

Durante a 2ª Guerra Mundial, existiam duas grandes frentes. A frente oriental iniciou-
se com bombardeamentos maciços realizados pela aviação (luffwaffle) a Varsóvia (primeira
capital europeia a conhecer as agruras do bombardeio aéreo). Os alemães tencionavam
conquistar o território polaco rapidamente, antes que as chuvas de outono tornassem os
movimentos mais difíceis e que os franceses pudessem atacar a oeste.

Os comandantes polacos esperavam poder resistir aos ataques alemães até que a
ofensiva francesa, com a qual contavam, fizesse recuar as tropas alemãs. Face a esta invasão, a
Inglaterra e a França enviam ultimatos, exigindo a retirada imediata das forças alemãs do
território polaco - dando-lhes um prazo de vinte quatro horas - findo os quais
automaticamente se declarariam em guerra com a Alemanha. A 3 de Setembro, chegam à
Chancelaria alemã as declarações de guerra. Apesar dos esforços, os polacos não têm
condições de deter a poderosa máquina militar germânica. Em apenas três semanas, a Polónia
caiu em poder dos alemães, acabando por se render incondicionalmente.

67
A Frente Ocidental foi a segunda maior frente e mais importante durante a 2ª Guerra
Mundial. Em abril de 1940, capitulavam a Dinamarca e a Noruega; em maio, deu-se a invasão
da Holanda e da Bélgica, por onde se processou a entrada em França, cuja capital cedeu ao
avanço triunfante dos alemães, em meados de junho. Em pouco mais de um mês,
praticamente todo o território francês estava ocupado pelos nazis.

Dominada a França, Hitler arranca imediatamente com o plano de invasão da


Inglaterra. O grande objetiva era destruir a Royal Air Force (RAF). Para o efeito, submeteu as
áreas estratégicas de Londres a um intensíssimo bombardeamento. Porém, apesar de isolado,
o Reino Unido resistiu, ajudado pela recente invenção do radar e graças ao talento dos pilotos
da RAF. A 15 de setembro de 1940, na que ficou conhecida como a batalha de Inglaterra, os
céus do Canal da Mancha assistiram à derrota da força aérea alemã. Sem conseguir a vitória, o
comando alemão decidiu suspender a invasão da Inglaterra e virar-se para a conquista do
Leste europeu. A frente ocidental permaneceu intacta desde 1940 até a Batalha da
Normandia, em junho de 1944.

A frente oriental foi a principal frente europeia durante a II Guerra Mundial, e


constituiu o teatro de guerra entre o Reich Alemão e a União Soviética entre de junho de 1941
e maio de 1945. A frente cobriu a Europa Central e Oriental, foi aberta pela Alemanha nazista
ao invadir a Polónia em 1939 e encerrada pela URSS ao capturar Berlim em 1945, mantendo-se
temporariamente inativa em 1940. A Propaganda nazi apelidou o conflito de "batalha pela
sobrevivência contra o bolchevismo" ou "cruzada contra o bolchevismo". Em todos as
propagandas soviéticas e na maioria das fontes russas, o conflito militar no Leste da Europa é
referido como Grande Guerra Patriótica, mas às vezes essa expressão também inclui
operações contra o Japão Imperial em 1945

Em junho de 1941, a guerra sofreu, pois, uma mudança radical. Hitler rompe o pacto
germano-soviética e as forças armadas deram início à invasão da URSS. O ataque foi
fulminante. Perante um exército mal preparado e mal dirigido, a Wehrmacht (infantaria
alemã), em menos de um mês, chegava às portas de Leninegrado e, em mais de três meses,
instalava-se nos arredores de Moscovo. O pacto de não-agressão, uma aliança entre dois
ditadores e dois Estados com regimes completamente opostos -, que deveria possibilitar aos
dois parceiros conquistas territoriais e políticas de grandes proporções e, ao mesmo tempo,
mudar o equilíbrio político na Europa, é considerada por muitos uma mácula na história. Os
alemães não estavam interessados em conquistar grandes cidades russas, queriam apenas
alcançar grandes zonas petrolíferas dentro do território para assim controlarem o petróleo
russo.

68
Verifica-se então uma hegemonia alemã, que rapidamente invadiu territórios e
exerceu a sua força e poder, para alcançar mercados protegidos e expandir a sua base
nacional. Os alemães não estavam interessados em conquistar grandes cidades russas,
queriam apenas alcançar grandes zonas petrolíferas dentro do território para assim
controlarem o petróleo russo (este recurso era uma arma estratégica para os exércitos). A
Rússia era um reservatório da produção industrial e energética e o segundo maior produtor de
petróleo mundial, que era proveniente do Azerbaijão). Era uma região estratégica, pois dava
ligação ao Mar Cáspio e ao Médio Oriente. Se chegassem a esta zona, teriam praticamente
tudo sob controlo.

O recuo alemão depois de Estalinegrado e dos desembarques


americanos
Face a esta invasão, os russos sabiam que tinham algum tempo até que os alemães
chegassem, e por isso prepararam tudo (transferiram grande parte das suas unidades
industriais para as zonas circundantes do rio Volga). A 17 de Julho de 1942 deu-se a Batalha de
Estalinegrado. Esta batalha realizada no Cáucaso foi uma operação militar conduzida pelos
alemães e seus aliados contra as forças russas pela posse da cidade de Stalingrado e durou até
1943. Os soviéticos, ajudados pelo seu vasto território e recorrendo a todo o tipo de
recursos/mão-de-obra que tinham, organizam um contra-ataque ao exército alemão, que
perde milhares de militares e começa a recuar.

No mesmo ano, os alemães tentam, novamente, enfraquecer a URSS. O exército


alemão promove investidas sobre o Cáucaso para ganhar mais território. No entanto, vêem-se
cercados pelos soviéticos e rendem-se em Estalinegrado. Esta batalha constitui assim o
primeiro ponto de viragem nesta guerra, colocando em causa a hegemonia alemã consolidada
até à altura.
Entretanto, em 1942, a Líbia e o Egito caem em poder dos alemães. A guerra no
Mediterrâneo intensificava-se com a ocupação do Norte de África pelos exércitos nazis, com o
objetivo de defender o Sul da Europa de uma possível invasão por parte da resistência aliada,
que acabou por suceder. Quando os EUA entraram em Guerra, desembarcaram em África e
obrigaram a Alemanha a recuar. Os alemães recuaram tanto que acabar por se dispersar de
África, regressando à Guerra na Europa. Até 1942 não havia praticamente coordenação
nenhuma entre os aliados. A partir daqui, os soviéticos exigiram que os americanos abrissem
frentes na Europa. No final de 1942, a guerra estendia-se a todo o mundo.

69
Todavia, a partir de 1943, começa a derrocada do Eixo. Os alemães são derrotados no
Norte de África por tropas americanas e inglesas, iniciando-se a invasão aliada da Sicília, que
foi reconquistada em julho desse ano. Em julho de 1944, os aliados entraram em Roma.

No leste, depois da vitória de Estalinegrado, os soviéticos iniciam o avanço para


Ocidente e, nos dois anos seguintes, conquistam a Roménia, a Polónia, a Bulgária, a
Checoslováquia e a Hungria.

A Guerra no Pacífico
No Mediterrâneo, o avanço dos alemães contava com o apoio dos exércitos de
Mussolini e com a ascensão, por toda a Península Balcânica, de regimes conservadores. Muitos
deles, sob pressão de Hitler, integraram também o Eixo Berlim-Roma-Tóquio, entretanto
constituído pelas potências totalitárias. Portanto, sem sólidos apoios no Sul da Europa, a força
aérea inglesa, obrigada a utilizar as bases no Egito e na Líbia, encontrava grandes dificuldades
em suster a iminente entrada dos Alemães no Norte de África.

A hegemonia sobre o Pacífico, onde os americanos detinham grande poder e


influência, levou o Governo japonês a atacar a base naval americana de Pearl Harbor em
dezembro de 1941, o que provou o envolvimento imediato dos EUA no conflito, ao lado das
democracias europeias. O Japão invadiu o Havai por forma a estes não se conseguirem
defender; assim, os japoneses poderiam ocupar os territórios asiáticos pertencentes à
Holanda, França, Inglaterra e Portugal.

O conflito estendia-se, agora, ao Pacífico e ao continente asiático, onde os japoneses,


graças às suas ofensivas militares vinham edificando um poderoso impérios que lhes
assegurava o controlo de ricas fontes de matérias-primas essenciais para a sua indústria e, ao
mesmo tempo, o domínio de importantes áreas estratégicas que se estendiam da Manchúria
até à Oceânia.

O Japão entrou na frente ocidental pois interessavam-lhe os mercados fechados do


Pacífico e a zona das Índias Orientais (Indonésia, Malásia e Indochina), uma região produtora
de petróleo. Os japoneses decidiram ocupar as colónias europeias do Pacífico, declarando
guerra às potências ocidentais. Entre 1940 e 1941, começam a desenvolver-se
tecnologicamente e a promover o seu domínio no Sudoeste Asiático, que pertencia aos norte-
americanos. Assim, ocupam toda a região do Pacífico tropical.

70
Apesar de ter assinado o Pacto Tripartite em 1940, o grande problema do Japão era o
interesse e a dependência em relação aos EUA. A tensão com os EUA aumenta ainda mais,
com os americanos (principais produtores de petróleo) a deixaram de vender petróleo ao
Japão, por este ser aliado da Alemanha. Portanto, os EUA entram abertamente em conflito
com o Japão. A hegemonia sobre o Pacífico, onde os americanos detinham grande poder e
influência, levou o Governo japonês a atacar a base naval americana de Pearl Harbor em
dezembro de 1941.

Isto provocou o envolvimento imediato dos EUA no conflito, ao lado das democracias
europeias. A sua participação na guerra era, até então, indireta já que preparavam os seus
exércitos e armamentos nas suas bases localizadas em pontos estratégicos do planeta. Este
ataque constituiu o segundo ponto de viragem, pois levou à entrada dos EUA na II Guerra
Mundial. O conflito estendia-se, agora, ao Pacífico e ao continente asiático, onde os japoneses,
graças às suas ofensivas militares, vinham edificando um poderoso império que era governado
por um autoritário imperador e que lhes assegurava o controlo de ricas fontes de matérias-
primas essenciais para a sua indústria e, ao mesmo tempo, o domínio de importantes áreas
estratégicas que se estendiam da Manchúria até à Oceânia. Perante o ataque ao aliado
asiático, Hitler declara guerra aos EUA.

O primeiro dos acordos firmados entre a Rússia (Josef Stalin), os EUA (Franklin Delano
Roosevelt) e a Inglaterra (Winston Churchill) ocorreram no ano de 1943, em Teerão. Além de
lançarem bases quanto às definições de partilhas, decidiu-se que as forças anglo-americanas
interviriam conjuntamente com as forças orientais soviéticas na França, completando o cerco
de pressão à Alemanha (dia D). Deliberou-se ainda sobre a divisão da Alemanha e as fronteiras
da Polónia ao terminar a guerra, além de se formularem propostas de paz com a colaboração
de todas as nações. Os Estados Unidos e o Reino Unido reconheceram, ainda, a fronteira
soviética no Ocidente, com a anexação da Estónia, da Letónia, da Lituânia e do Leste da
Polónia.

O dia D aconteceu em 6 de junho de 1944, quando as forças aliadas desembarcaram,


surpreendentemente, na Normandia e teve início a reconquista da Europa Central. As forças
norte-americanas, inglesas e francesas e seus aliados invadiram a França, então ocupada pelos
alemães. Foi uma decisão política para manter a liberdade na Europa, ocorrida depois da
derrota alemã para o Exército Vermelho, na famosa Batalha de Stalingrado (1942/1943). Com
a entrada dos soviéticos em Berlim, em maio de 1945, a derrota de Hitler passa a ser uma
questão de dias. Efetivamente, a rendição total e incondicional da Alemanha veio a ser
assinada pelo alto comando nazi, em 7 de maio, já com Hitler morto. O Dia da Vitória na

71
Europa constitui então a data formal da derrota da Alemanha Nazi em favor dos Aliados na II
Guerra Mundial.

Faltava resolver uma outra guerra que se arrastava desde 1941: a Guerra do Pacífico.
Esta foi dividida em duas etapas. Entre 1937 e junho de 1942, quando o Japão se manteve na
ofensiva e foi vitorioso na ocupação de grande parte do território chinês e também na
destruição da frota americana em Pearl Harbor, assim como na tomada de Hong Kong e
Singapura, na invasão e ocupação da Tailândia, Birmânia, Malásia, Filipinas, Nova Guiné, Índias
Orientais Holandesas, Ilhas Salomão e das bases americanas de Guam e Wake. Já em 1942
tem-se a vitória da marinha e da aviação norte-americana na batalha naval de Midway, o que
impediu o desembarque das tropas japonesas no atol e resultou na destruição dos quatro
principais porta-aviões do Japão. A ofensiva passou, então, para os aliados, que, nos três anos
seguintes reconquistariam todos os territórios tomados, através de grandes batalhas terrestres
e navais (Guadalcanal, no Mar de Coral, Tarawa, Golfo de Leyte, Filipinas, Saipan, Iwo Jima e
Okinawa).

Apesar de destruírem as bases americanas, os japoneses acabaram por não destruir as


reservas de petróleo existentes. Com o ressurgimento da sua frota, os americanos acabaram
por superar os seus adversários e começaram a retirar as colónias europeias que o Japão tinha
ocupado.

A guerra no Pacífico inverteu-se para o lado dos Aliados, em junho de 1942. A partir de
1943, os americanos recuperam o controlo do Pacífico e só uma resistência suicida dos
japoneses ia conseguindo suster um avanço mais rápido das tropas americanas e australianas.
Era o tempo dos kamikazes, pilotos japoneses que lançavam os seus aviões contra os alvos
inimigos.

A passagem para a guerra nuclear


Em 1944, os japoneses já tinham sido expulsos de muitos territórios asiáticos.
Entretanto, alemães e americanos desenvolveram muitos projetos ao longo da 2ªGM.
Separadamente, desenvolveram armas estratégicas novas, como o míssil e a arma nuclear
(bomba atómica). Em fevereiro de 1945, os aliados desembarcavam no arquipélago japonês.

A Conferência de Potsdam ocorreu na Alemanha em julho de 1945, entre o presidente


Harry Truman dos EUA, o primeiro-ministro Clement Attlee da Grã-Bretanha e o marechal
Stalin, presidente da URSS. Destinou-se a fixar a política a seguir para com a Alemanha

72
(vencida na 2ª Guerra Mundial), a lançar os fundamentos da paz futura na Europa e no mundo,
e a resolver todas as dificuldades provocadas pela guerra, terminada apenas a 7 de maio desse
mesmo ano. A Conferência teve lugar em Potsdam, por esta cidade ser considerada o centro
simbólico do militarismo e da agressividade prussiana, com o que se quis demonstrar o fim
desses valores.

Numa fase inicial, os americanos queriam que os soviéticos declarassem guerra ao


Japão. Para facilitar a ocupação do terreno nipónico, pretendiam esta intervenção já em 1945.
Só que, no final da conferência, os americanos tinham completamente preparada a bomba
atómica. Por esta razão recuaram nas suas pretensões para com os soviéticos. Perante a
resistência já irracional dos japoneses, os americanos, numa demonstração da sua força como
superpotência, lançam em agosto de 1945 bombas atómicas em Hiroshima e Nagasaki. Um
discreto e solitário avião ("Enola Gay") lançou o mais poderoso artefacto de guerra de todos os
tempos - a Bomba Atómica - sobre a desprotegida cidade de Hiroshima, massacrando mais de
cem mil pessoas e ferindo outros tantos. Três dias depois é a cidade de Nagasaki que vai
conhecer os horrores da explosão nuclear. Ao Japão nada mais lhe restava senão render-se. A
17 de agosto de 1945, o Japão (última nação da aliança do Eixo a render-se) assinou a sua
rendição incondicional. As armas nucleares eram usadas na guerra. Terminava, portanto, a
Segunda Guerra Mundial.

O ataque a Hiroshima tinha sido decidido pelo presidente dos Estados Unidos Truman,
desejoso de acabar com o conflito tão rapidamente quanto possível, ainda mais porque a
Alemanha já se tinha rendido em maio desse mesmo ano. O presidente foi informado do mais
secreto projeto aliado durante a guerra, conhecido como projecto «Manhattan», destinado a
conseguir a cisão do átomo e assim dominar a tecnologia que permitiria produzir um engenho
explosivo atómico

A principal razão apontada pelos historiadores para justificar o fim da 2ª Guerra


Mundial e a consequente rendição do Japão após a explosão da segunda bomba, decorre de,
no mesmo dia em que rebentou a segunda bomba atómica, a União Soviética ter declarado
guerra ao Japão. Seguros de que não seria possível enfrentar tanto os americanos quanto os
soviéticos, a maioria dos militares tendeu a aceitar a rendição, por mais desonrosa que ela
fosse para os japoneses mais tradicionalistas. Potência naval por excelência, que tinha perdido
a guerra no mar, o Japão não poderia opor-se em terra ao poder do exército russo, contra o
qual os japoneses tinham tido uma amarga experiência em 1939. A Guerra na Europa é ganha
pelas novas potências dominantes, os EUA e a URSS. O Japão é derrotado, começando a recuar
e a desocupar os territórios anteriormente anexados.

73
A nova ordem mundial após a 2ªG.M.
Calcula-se que morreram entre 40 a 52 milhões de pessoas. A 2ªG.M. causou graves
consequências a todos os níveis. Verificou-se um grande grau de destruição, milhões de baixas
e falta de liquidez para pagar as importações. As cidades estavam destruídas, os campos
arrasados e as vias de transporte e comunicações intransitáveis. Aliás, a evolução científica e
técnica proporcionou aos beligerantes armas muito mais mortíferas do que as existentes
durante a Primeira Guerra Mundial. O alcance dos canhões, metralhadoras e espingardas
aumentou, mas foram sobretudo os meios de guerra aérea que causaram as baixas civis. Os
aviões bombardearam insistentemente e causaram enorme destruição, bem como numerosas
vítimas humanas. Pela sua capacidade de destruição destacou-se uma nova arma: a bomba
atómica. Como a força de guerra dependia muito da capacidade económica, nomeadamente
da produção de armas e de comida, as fábricas tornaram-se alvos legítimos dos bombardeiros.
Depois, outros alvos civis foram proclamados legítimos ao considerar-se que os trabalhadores
nas outras fábricas apoiavam também as máquinas de guerra.

Pode dizer-se que foi praticada uma espécie de guerra total que visava destruir todos
os recursos do adversário para o derrotar igualmente dessa maneira. Das vítimas civis, vale a
pena destacar os milhões de civis que morreram nos campos de concentração. O Estado que
sofreu mais baixas foi a URSS. Mais de 20 milhões de cidadãos da União Soviética morreram
nos combates ou foram vítimas da fúria alemã.

O acordo de Potsdam pretendia dar ao povo germânico a oportunidade de retomar a


sua vida em bases democráticas e pacíficas, e banir toda a legislação nazi discriminatória
quanto a raça, crença religiosa e opinião política. A nível político foram feitas alterações no
mapa político mundial: o território alemão foi dividido em quatro zonas ocupadas e
administradas pela URSS, Inglaterra, EUA e França (o mesmo aconteceu com a cidade de
Berlim). Os comandantes-chefes das quatro principais nações aliadas passariam a controlar,
cada um, uma zona definida da Alemanha, cabendo à URSS a parte oriental e aos EUA, França
e Inglaterra a parte ocidental. Esta divisão daria origem à formação de dois blocos que
disputarão a hegemonia mundial: Bloco Leste (liderado pela URSS) e Bloco Ocidental (liderado
pelos EUA). Para comprová-lo, foi, então, no contexto da nova ordem internacional que
Winston Churchill disse a Charles de Gaulle que “[n]a vida política, como na estratégia, vale
mais persuadir os fortes do que afronta-los. […] Os Americanos possuem recursos imensos […].
A Rússia é um grande animal que teve fome demasiado tempo. Não podemos, hoje, impedi-lo
de comer […]. Mas é importante que não coma de mais. Procurarei moderar Estaline […].”

74
O fim dos impérios coloniais
Uma importante consequência do fim da 2ª Guerra Mundial foi o fim dos impérios
coloniais e, consequente, arranque irreversível dos processos de descolonização. Os dois
acontecimentos que vieram debilitar as relações dos europeus com as suas colónias
correspondem às duas guerras mundiais.

Com o fim da I GM, as potências mundiais aproveitaram para consolidar as suas


ocupações e previa-se que este período de entendimento e Paz estava para durar. O período
entre guerras foi, aliás, uma época de apogeu para as potências coloniais (representavam
cerca de 42% do planeta). Foi nesta altura que a SDN fez mais considerações relativas às
colónias: havia impérios que iam ser dissolvidos e havia que integrar as suas colónias como
mandatos noutros impérios, nos vencedores. Portanto, para as potências com territórios
coloniais, a crise colonial havia terminado.

No final da 1ªG.M., a Europa perdeu o estatuto de centro do poder mundial. Portanto,


era de prever que tivessem existido perturbações nos impérios coloniais. As colónias
começaram a obter um maior poder reivindicativo. As colónias foram, de uma certa forma,
industrializadas e começaram a produzir. As potências europeias travaram guerras nas
colónias, usando grandes quantidades de recursos materiais. De resto, as metrópoles fizeram
grandes requisições de tropas coloniais. Estando as condições políticas das colónias mudadas,
o carácter nacionalista das mesmas foi desenvolvido, o que fez com que estas se opusessem ao
retorno à situação existente antes da guerra.

Mas a 2ª Guerra Mundial foi muito mais séria. A crise foi definitiva. A correlação de
forças entre a metrópole e as colónias alterou-se profundamente, pois algumas metrópoles e
colónias foram ocupadas pelo inimigo. Com o final da 2ªGM, origina-se o colapso material dos
países europeus. Como não tinha liquidez para a manutenção dos impérios coloniais,
dependiam das exportações americanas. A perda de importância das outrora potências
mundiais, que agora estavam arruinadas, causou o fim desses impérios coloniais. Isto levou à
reconfiguração dos territórios a nível geográfico. Neste processo decorre o surgimento de
novos países.

Contudo, em todo este processo, é de salientar também os pesados sacrifícios às


colónias (muitos países usaram as suas colónias como recurso humano para combater na
Guerra; os homens eram recrutados forçadamente, não só para combater mas também servir
como força de trabalho), o que “acordou” os povos para a injustiça da dominação estrangeira,

75
sentindo a 2ªGuerra como uma luta pela liberdade. Deste modo, a guerra fomentou o espírito
rebelde dos dominados e revelou as fragilidades da Europa, incapaz de defender os seus
territórios da invasão estrangeira.

Imponentes, os países coloniais nada puderam fazer para suster a vaga


independentista que assolou a Ásia e a África em 1945.

Fatores para as políticas "anti-coloniais": a hegemonia EUA/URSS; a


ONU; os novos organismos multilaterais
A ordem política modificou-se mais na 2ª GM do que na 1ªG.M., significando perda
total da hegemonia europeia para os EUA. Acentuou-se muito mais o panorama do Dollar Gap
(falta de liquidez dos países europeus para pagar as dívidas). Todos os países europeus
acabaram numa posição de inferioridade face aos americanos. Isto levou os países a
negociarem com os EUA, elevando as exportações de capitais para a Europa (o próprio
fornecimento alimentar estava dependente das exportações americanas, pois tinha havido
uma hecatombe alimentar).

As duas guerras proporcionaram uma recombinação de poderes e a queda das


potências imperialistas, tendo apenas restado os EUA e a URSS. A 2ªGM funcionou como um
acelerador de crescimento económico e desenvolvimento técnico (sobretudo armamento)
para as duas potências que daí advieram. Os EUA queriam fazer exportações para solo alemão,
com o objetivo de que este crescesse. Tinham muito dinheiro investido nos mais diversos
países europeus e esses países não tinham como pagar esses empréstimos.

As potências europeias, que outrora tinham muito poder no panorama internacional,


estavam agora completamente falidas e decadentes. Por isso, tornou-se difícil manter as áreas
de influência que estes detinham antes da guerra. Todos os países beligerantes acabaram a
guerra destruídos e arruinados, numa escala muito maior que a 1ªG.M.. O grande problema
era descobrir como é que a recessão do pós-guerra podia ser evitada.

Inglaterra e URSS tentaram negociar o crédito. Nas suas cimeiras com os EUA,
discutiram-se a recuperação europeia e o pós-guerra. Entre 1945 e 1947 verificou-se que a
Europa necessitaria muito mais de créditos a curto prazo e que os americanos não se
interessavam com muitos acordos bilaterais. Recorde-se que os EUA tentavam evitar uma
recessão, pois isso teria um forte impacto sobre a sua economia. Os EUA necessitavam cada

76
vez mais da Europa como mercado. Mas, com a 1ªG.M., aprenderam que uma potência
colonial não poderia sobreviver num espaço económico fechado.

Os EUA verificaram que já não lhes interessavam acordos bilaterais devido ao que
aconteceu depois da 1ªG.M.. Preocupados com a recessão e com as necessidades de
reconstrução da Europa, os EUA fizeram uma grande pressão para que os acordos fossem
feitos multinacional e não bilateralmente, pois o capitalismo já não era compatível com base
nacional. Queriam que a economia europeia deixasse de estar fechada em ambientes
herméticos. Isso implicaria naturalmente uma abertura da Europa e dos mercados coloniais
(um prolongamento dos espaços económicos nacionais). Portanto, era necessário levar os
países europeus a encontrarem empresas para gerir estes fluxos de capitais americanos.

Com a derrota do Eixo, vieram ao de cima os antagonismos ideológicos que tinham


sido esquecidos durante a 2ªG.M.. Designou-se por Guerra Fria o ambiente de tensão que
caracterizou as relações entre os governos americanos e soviéticos, desde o final da 2ªG.M.,
em 1945, até à dissolução da URSS em 1991. Diz-se guerra fria porque os países se abstiveram
de recorrer diretamente às armas. Utilizavam formas de propaganda ideológica, faziam
corridas ao armamento, organizavam ações de espionagem, etc…

Os EUA, fazendo uso da sua posição de força, obrigaram os estados europeus a


organizarem-se de uma forma multinacional (ou multilateral). Defendiam um regime político
democrático-liberal e uma economia inspirada no modelo capitalista. Por sua vez, a URSS
estava numa posição de força político-militar. Defendia um regime socialista do centralismo
democrático e uma economia coletivizada e planificada. Além disso, tinha uma força político-
militar muito forte (exército vermelho). Devido ao facto de os Estados Unidos não quererem
acordos bilaterais e como sabia que lhe iriam pedir contrapartidas político-militares enormes e
que se fosse originado um grande investimento nos países ocupados por eles, isso iria
acarretar problemas, a URSS não estava disposta a negociar com os EUA e criou uma enorme
barreira entre os estados soviético e americano.

É importante referir que ainda o fim da guerra estava longe de todas as previsões, já as
forças democráticas ocidentais representadas pela Inglaterra e EUA revelavam as suas
preocupações relativamente à definição do novo quadro geopolítico do mundo pós-guerra,
perante os sinais expansionistas evidenciados por Estaline.

As sucessivas conferências realizadas à medida que a derrota do Eixo se ia


confirmando como uma questão de tempo, apesar dos acordos conseguidos, não conseguiam

77
esconder a divisão do mundo em áreas de influência antagónicas, tanto quanto o eram os
interesses geoestratégicos e políticos das novas potências aliadas.

Em 1947 entram em vigor os Tratados de Paz elaborados ainda durante a 2ªG.M.. O


novo traçado da Europa não conseguiu esconder a divisão do velho continente em duas áreas
perfeitamente delimitadas, dois blocos (ideológicos, políticos e económicos) antagónicos: a
ocidente do meridiano 12, uma Europa atlântica destruída, incapaz de rivalizar com as duas
novas superpotências, e reconstruída graças às ajudas económicas dos EUA (que abandonam a
sua política isolacionista e reforçam o seu papel no cenário político mundial) em cuja esfera de
influência acabará por cair; a leste do referido meridiano, uma Europa também destruída,
liberta da ocupação nazi graças à ação do Exército Vermelho e onde governos comunistas
ascendem ao poder.

Em relação aos EUA e à URSS, o confronto ideológico entre as duas superpotências


materializou-se na organização de alianças entre os países de cada um dos blocos. A ruína
económica da Europa ocidental e o perigo de os países resvalarem para o campo comunista,
levou o presidente Truman a conceber um plano de recuperação económica europeia. O
presidente norte-americano já havia anunciado, em março de 1947, um programa de ajuda
militar e económica à Grécia e à Turquia, ocasionado pelo inesperado anúncio do governo
britânico, apenas duas semanas antes, de que já não podia suportar os custos de apoiar
aqueles dois países. O Plano Marshall (Economia Recovery Program), anunciado em junho de
1947, foi proposto no sentido relançar imediatamente a economia europeia, para permitir a
posterior autonomia nacional de cada país. Mas era necessário decidir quais os países que
deveriam receber os empréstimos. Era preciso criar mecanismos que permitissem o
pagamento posterior desses capitais emprestados.

Para coordenar os fundos do Plano Marshall, organizou-se uma conferência em Paris,


tentando organizar os fundos americanos para a reconstrução europeia. O Plano Marshall não
só contribuiu para a recuperação dos países da Europa ocidental, como também reforçou os
laços entre os mesmos. Os EUA também beneficiaram da sua implementação: contiveram o
avanço comunista e conseguiram incluir na sua área de influência uma Europa dependente e
em recuperação, consumidora dos excedentes da sua próspera indústria. Estaline caiu na
armadilha que o Plano Marshall lhe armou.

Apanhado desprevenido, enviou uma grande delegação a Paris para discutir a


participação soviética. Depois retirou-a e proibiu os países sob sua alçada de aceitar a ajuda,
que era oferecida a qualquer país que a solicitasse, com exceção da Espanha (por causa do

78
apoio prestado ao regime nazi durante a II Guerra Mundial). Estaline reagiu ao Plano Marshall
exatamente como os EUA previram: reforçando o seu domínio onde quer que fosse possível.
Criou o Kominform (Secretariado de Informação Comunista, 1947: tinha como objetivos
promover a troca de informações e dirigir a ação dos partidos comunistas sob orientação
soviética, assim como exercer um maior controlo sobre os países de Leste, reforçando a
hegemonia soviética nessa parte da Europa), bloqueou a zona ocidental da cidade de Berlim e
formou o COMECON (Conselho para Assistência Económica Mútua, 1949. Decorrente do Plano
Molotov, procurava constituir uma resposta direta ao Plano Marshall: procurava promover a
cooperação económica do Leste europeu e exercer um controlo económico mais apertado
sobre os países satélites).

Entre 1945 e 1949, os EUA apareceram como uma potência “super imperialista” numa
época de necessidade e de carência económica e produtiva. Por outro lado, viam agora nascer
um novo rival económico e ideológico, capaz de contaminar a Europa que se encontrava em
ruínas, e, por isso, havia uma grande preocupação em conter o avanço da esfera soviética.
Havia uma preocupação, desde logo na Grécia, onde se temia que os soviéticos avançassem,
pois a Inglaterra não tinha forças para intervir e, caso não houvesse uma substituição por parte
dos americanos, supunha-se que os soviéticos avançassem. Neste período de recessão
económica, dada a grande influência da URSS, França e a Itália faziam parte das grandes
incertezas no que diz respeito ao benefício do Plano Marshall - o comunismo estava muito
presente e era capaz de ganhar as eleições, pelo que os países estavam ainda em estudo. Em
1948, houve eleições em Itália, e os EUA fizeram tudo para impedir a chegada do comunismo
ao poder. Desta forma, foi possível impedir o poder comunista e houve meios para dar ajuda
aos italianos.

Com o Plano Marshall, os EUA conseguiriam ver quais os países que poderiam servir de
aliados e também encontrar destinos de exportação de capital. Os americanos não podiam
abdicar da economia japonesa e foi, então, criado o Plano Dodge, com as mesmas
características do Marshall, para desenvolver o Japão e para exportar o capital americano.

Já antes do fim da Guerra, a Conferência de Ialta (Fevereiro de 1945) permitiu decidir o


que iria acontecer aos impérios coloniais. É aqui que vemos a hegemonia dos Estados Unidos e
da URSS. As diretrizes afirmadas nesta reunião determinaram boa parte da ordem durante a
Guerra Fria, precisando as zonas de influência e ação dos blocos antagónicos, capitalista e
socialista. O anticolonialismo foi a política adotada pelas potências após a 2ªGM, em 1945,
porque era inadmissível que países como França e Inglaterra, oprimissem colónias africanas e

79
asiáticas, quando juntas lutaram contra o nazi-fascismo. Essa prática foi amplamente apoiada
pelos EUA e pela URSS (interessados em áreas de influência), movidos pela Guerra Fria.

Os Estados Unidos eram a potência mais anticolonial, pois desejavam abrir os


mercados coloniais e conquistar novos mercados, quebrando a barreira protecionista imposta
pelas metrópoles. Eram, então, contra a colonização, favoreciam a autodeterminação dos
povos. Concederam a independência às Filipinas, Porto Rico e Cuba, fruto da sua política
anticolonial. Os Governos de Nixon e Roosevelt praticaram e fizeram cumprir medidas
descolonizadoras. No entanto, na prática também esta posição não foi permanente, havendo
mesmo situações em que punham o anticolonialismo de lado. Em situações de países que
eram seus aliados e não tinha problemas com a abertura do seu mercado colonial (Inglaterra,
França e Portugal), foi permitida a manutenção dos seus impérios coloniais, pois estes não
estavam fechados aos capitais americanos e alinhavam-se com a política americana.
Tornavam-se, portanto, favoráveis à existência de impérios coloniais. Esta posição americana
não foi permanente nem intransigente. Ainda assim, neste contexto, John Foster Dules,
secretário de Estado norte-americano, em 1953, afirma, em defesa da posição americana
quanto à questão das descolonizações que “[t]emos bons motivos para desejar manter a
unidade com os nossos aliados ocidentais mas jamais nos esqueceremos que fomos a primeira
colónia a conquistar a independência. E não demos um cheque em branco a nenhuma potência
colonial. Não temos a mínima dúvida de que o processo de transição do estatuto colonial à
autonomia deve ser completamente realizado.”

A URSS ocupava também uma política anticolonial, mas ao mesmo tempo não queria
estragar as relações que tinha com os outros países. Nos anos 20 tinha discutido a questão
colonial, e uma maneira de dar resposta às guerras civis dentro do seu território era levar a
corrente comunista a esses governos, pelo que a URSS apoiou também partidos comunistas
aquando das eleições em países asiáticos. No entanto, caso houvesse outros movimentos com
maior hipótese de sucesso, era esses que a URSS apoiava. Os soviéticos tinham o facto de
outros países não terem a situação política definida para não fazerem muita pressão
anticolonial. Eram países com colónias, mas que hesitavam sobre o que fazer em termos de
blocos. Um dos exemplos é a Itália. Neste contexto, os soviéticos não queriam tomar uma
postura anticolonial, para não empurrar os países para fora da sua área de influência. Neste
contexto, Andrei Jdanov, secretário do Comité Central do Partido Comunista da URSS em 1947,
afirmava, nesse mesmo ano que “[o]s povos das colónias não querem mais viver como no
passado. As classes dominantes das metrópoles já não podem governar as colónias da mesma
forma. As tentativas de esmagamento dos movimentos de libertação nacional pela força

80
militar chocam (…) com uma residência armada crescente dos povos colonizados e conduzem a
guerras coloniais prolongadas: os Países Baixos, na Indonésia, a França, no Vietname.”,
acusando, desde logo, o lado ocidental.

Em suma, as potências (EUA e URSS) não eram sistematicamente nem


simultaneamente colonialistas ou anticolonialistas. É neste sentido que a ONU, formada em
1945, apoiou a autodeterminação dos povos. Nos termos da sua carta, mantinha a ideia de
que certos territórios poderiam ser anexados. A França e a Inglaterra tinham acesso direto ao
Conselho de Segurança. Era uma organização anticolonialista e esta orientação levou-a a
defender a descolonização de todos os territórios. No entanto, como não pode intervir nos
Estados e nunca poderia impor políticas em territórios no poder de metrópoles, teve um papel
muito limitado no processo de descolonização, isto é, uma intervenção praticamente nula, pois
quando foi criada, a ONU tinha 45 membros, quase todos defensores da colonização existente.
Só depois, com a entrada de novos membros e o alcance de algumas independências, esta
situação mudou, passando a tomar posições anticoloniais. O seu orçamento encontra-se
dependente dos estados-membros, pelo que a sua intervenção é muito reduzida. Não podia
agir, mesmo que houvesse necessidade. Não podia proceder a intervenções anticolonialistas,
pois isso correspondia a um assunto interno dos países. O seu papel acabou por ser muito
reduzido no que diz respeito à descolonização. Foi, então, na ONU, a 7 de dezembro de 1988,
que Mikhail Gorbatchev resumiu a situação da descolonização numa frase: “[O] problema é
que o fosso entre os países desenvolvidos e a imensa maioria dos países em desenvolvimento
não se reduz, e constitui uma ameaça cada vez maior à escala mundial. […]”

Tanto os americanos como os soviéticos não atuaram constantemente para forçar as


descolonizações. Mas não era por causa destas pressões que os impérios iriam deixar de ter
colónias. Existiram três fases de descolonizações: na Ásia, no Médio Oriente e, por fim, em
África. Só na fase final do processo de descolonização africano é que a ONU teve alguma
influência, estando por detrás do caso da Rodésia.

Outras organizações anticolonialistas passam pela Liga Árabe. Alguns territórios árabes
que estavam entregues a potências europeias sob forma de mandatos, passaram a ter
independências fictícias – a maioria sob o poder de Inglaterra. A Inglaterra teve a ideia de
formar uma organização para integrar esses estados “livres”, a que Liga Árabe.

Em terceiro lugar, há o caso da OUA: criada em 1963, mas não foi um acelerador da
descolonização. Os novos estados africanos, quando foram declarados independentes,
decidiram manter as fronteiras que haviam sido definidas pelas potências que as exploraram

81
até aí. Isto aconteceu, porque caso mudassem as fronteiras, iriam desencadear um conjunto
de conflitos entre os países africanos. Alguns deles acederam à independência com maiores
territórios, mas, para evitar esses conflitos, a OUA declarou que as fronteiras coloniais seriam
respeitadas e mantidas.

Por fim, o Movimento dos Não Alinhados. Foi um fenómeno acentuado nos anos 50 e
desenvolveu encontros regulares para servir de contrapesa às mais poderosas metrópoles. A
sua criação remonta à Revolução Russa: muitas das populações asiáticas que tinham sido
conquistadas pelos bolcheviques decidiram organizar uma assembleia – Congresso do Médio
Oriente – em 1920. Isto deu origem a outras reuniões e congressos que viriam a motivar o
MNA. Este era formado por estados asiáticos e africanos, por países recém-emancipados da
dominação colonial e que tinham em vista a denúncia e condenação do colonialismo. Mas
muitos dos estado ainda não eram independentes. Quando se deu a independência de muitos
desses, criou-se um esboço para a primeira conferência: Asian Relations Conference, na Nova
Deli, mesmo antes da independência da Índia. Importa ressalvar que aquele dito Movimento
dos Não Alinhados surgiu em 1955, na Conferência de Bandung, com estados, como já referi,
independentes.

Em suma, no pós-guerra, as potências europeias tinham imensas dificuldades


materiais. Muitas delas seriam obrigadas a desfazer-se dos seus impérios coloniais. Mas os
EUA, a URSS e as próprias organizações internacionais não faziam muita pressão sobre as
metrópoles nem foram determinantes para este processo de descolonização. Contava mais a
correlação de forças entre as colónias e a metrópole, bem como as dificuldades sentidas por
estas.

Iniciou-se, assim, a época das descolonizações. Estas descolonizações formais foram


constituídas por 3 vagas:

1ª vaga: 1947-53 (descolonizações asiáticas) + fim do Império Otomano

2ª vaga: 1957-64 (descolonizações do médio oriente e da áfrica do Norte)

3ª vaga: 1975-80/94 (descolonizações africanas do Sul - portuguesas)

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A descolonização asiática (1947-1953)

A descolonização da Índia britânica e o conflito Índia-Paquistão (1947-


1948)
A Índia era um território complexo, com muita diversidade cultural, política e
económica.

Em meados do século XIX, praticamente todo o território indiano estava sob


administração inglesa, uns sob administração direta e outros através do Rajput (os Rajás
governavam mas atendiam à Inglaterra). Quase metade do rendimento líquido indiano era
canalizado para a Inglaterra. O mercado estava protegido por ela. Mas nada impediu que os
Rajputs se começassem a agrupar e formassem um Congresso em que faziam reivindicações
comerciais, principalmente. Nesse congresso, formaram-se duas correntes principais,
atribuídas a dois indivíduos:

 O Tilak – defensor da tradição indiana;


 E o Gokhale – defensor da perseguição da evolução.

Antes da I Guerra Mundial, o governo Inglês até chegou a fazer algumas concessões às
regiões indianas, como a participação de conselheiros locais nos conselhos governativos. Mas
isto era compensado com o aumento de impostos sobre a população. Como não houve uma
grande abertura política, o partido reorganizou-se e passou a ter uma implantação popular
enorme.

Depois da Guerra, apareceu uma terceira corrente, a de Ghandi, que consistia em usar
a tradição indiana para se conseguir alcançar a modernidade. Ghandi começou a lançou
famosas campanhas de dinamização popular que eram uma tentativa do partido ganhar apoio
popular e pressionar os ingleses para obter concessões políticas. O seu objetivo era tornar a
Índia numa nação independente. Para tal, efetuou campanhas de rebeldia, em que deixaria de
pagar impostos, sendo esta a principal fonte de rendimento dos ingleses. As elites locais iam
criando uma burguesia nacional. Mas isto era insuficiente para que as metrópoles fizessem
concessões políticas. Outras colónias sofreram o mesmo, ainda que em menor escala.

No decurso da 2ªG.M., os ingleses foram acumulando dívidas em relação à Índia. No


final da mesma, os créditos obrigavam os ingleses a negociarem com os indianos. Estavam,
portanto, numa posição de força perante a Inglaterra. Os ingleses estavam completamente
impotentes face a estes confrontos e não tinham capacidade militar para intervir. Acabaram a
guerra totalmente destroçados e nem apresentavam capacidade para responder à pressão

83
política na Índia. Até chegaram a declarar aos EUA que não tinham condições para manter a
sua base naval no Pacífico. Começava então a ponderar-se a hipótese da retirada total da Índia
e, consequente, atribuição da independência a este país.

O Partido do Congresso reorganizou-se e passou a ter uma orientação popular muito


maior, começando a fazer pressão sob a administração inglesa para lhes concederem poderes
políticos.

No final da 2ªGM, o Japão foi derrotado. Os europeus encontraram o caráter


nacionalista nas colónias asiáticas. É que durante a guerra, a ocupação japonesa alterou o seu
estado, influenciando as populações locais. No caso da Índia, embora não tivessem chegado lá,
a situação político-militar era favorável aos japoneses, pois fizeram concessões políticas à
Índia. Para resistir à pressão japonesa, era necessária a atribuição de concessões políticas,
através de promessas ou da divisão do Partido do Congresso (partido comunitário da
burguesia indiana). Este partido não pretendia a criação e qualquer tipo de divisão, pelo que
pôs de pé as suas reivindicações políticas e não aceitou a promessa inglesa de conceder um
autogoverno aos indianos. Adotou a resolução “Quit Índia”, indicando que queria a
independência total e não um governo autónomo. Desta forma, alguns elementos desse
partido organizaram um pequeno exército e pediram ajuda aos nazis e ao Japão. Os ingleses
estavam então sujeitos a uma enorme pressão para iniciar as negociações. O mesmo se passou
na área holandesa e Indochina francesa.

Decorrente da resolução “Quit Índia”, o Comíté do Congresso Nacional Indiano afirma


que este “reitera veemente a exigência da retirada do poder britânico da Índia. […]” e que a
“liberdade da Índia deve ser o símbolo e o prelúdio da liberdade de todas as outras nações
asiáticas sob o domínio estrangeiro. […] Para defesa do direito inalienável da Índia à liberdade
e independência, o Comité decide sancionar uma luta de massas, de caráter não violento, na
maior escala possível, de forma que o país possa utilizar toda a força não violenta que
acumulou nos últimos vinte anos de luta pacífica. […]”.

Em Julho de 1945, o Governo trabalhista britânico de Clement Attlee iniciou as


negociações para a independência, todavia o processo foi atrasado devido aos antagonismos
religiosos e políticos que separam as duas principais comunidades indianas: a hindu e a
muçulmana (existiam muitos polos de maioria muçulmana nos estados norte e centro da
Índia). Isto porque Inglaterra decidiu introduzir artificialmente uma divisão no Partido do
Congresso (em termos religiosos). Isto deu tempo aos ingleses para criarem um partido
muçulmano: a Liga Muçulmana: Território dos Puros (Pakistan).

84
No ano de 1945, a Inglaterra, resolveu realizar a Conferência dos Himalaias com o
Congresso Indiano e a Liga Muçulmana, para mostrar que havia uma grande rivalidade entre os
dois. Esta rivalidade passou da teoria à prática: houve confrontos em grande escala. Quando a
Inglaterra os quis reunir, já não havia relações amigáveis entre as duas organizações. O Partido
do Congresso, das elites hindus (unidade cultural, cuja base era religiosa), liderado por Gandhi
e Nehru, mostrou-se favorável à manutenção da união indiana, uma ideia contrariada pela Liga
Muçulmana, de Muhammad Ali, que propôs a divisão do território em duas partes. O partido
indiano foi forçado a ceder e a aceitar a divisão. Colocou-se a questão de potenciar a
independência de dois territórios, proposta que não foi aceite pelo partido do Congresso.
Mountbatten propôs então aos Rajás que escolhessem em qual dos dois países que daí iriam
surgir é que queriam viver. No fundo, que certas localidades pudessem escolher as suas
preferências.

Lord Mountbatten, que já ia com a intenção de conceder a independência à Índia, foi


encarregue de estabelecer essa cisão do território indiano e assegurar a transferência da
soberania. Assim, a 15 de agosto de 1947 foram criados dois Estados independentes: a Índia,
de maioria hindu, e o Paquistão, predominantemente ocupado por Muçulmanos. O território
indiano estava dividido em três blocos, pois o Paquistão formou-se como um estado
“esquisito”, estando dividido pela Índia (havia o Paquistão ocidental e oriental). Ambas as
partes faziam parte do mesmo país, mas não comunicavam entre si.

O estabelecimento de novas fronteiras provocou a transferência de populações entre


os dois territórios, que ocorreu num clima de violência, apesar dos fortes apelos à paz e à
tolerância de Gandhi. Neste clima rebentou uma guerra civil. Gandhi, tido como um dos
símbolos da paz, foi uma vítima da intolerância, ao ser assassinado por Hindus radicais (30 de
janeiro de 1948), inconformados com a divisão. O conflito entre estes dois Estados persiste na
atualidade, sobretudo, motivado pela disputa do território de Caxemira, pois a Índia queria
anexar esta região, mas o Paquistão não concordava (o Rajá escolheu a Índia, mas 75% da
população do Estado era Muçulmana, querendo, portanto, integrar o Paquistão). Este conflito
vai estar na origem de 4 Guerras Indo Paquistanesas entre a Índia e o Paquistão, que só foram
apaziguados pela ONU. Uma das razões que levaram a estas guerras foi o facto de se
encontrarem em jogo potências nucleares, que criaram conflitos que se estendem até ao
século XXI.

Houve, também, um fenómeno de arrastamento. Uma vez dada a independência à


India, outras colónias que constituíam uma barreira protetora (Ceilão, Birmânia) foram
acedendo à independência.

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A Guerra indo-paquistanesa de 1947 foi um conflito ocorrido entre a Índia e o
Paquistão pela região da Caxemira entre 1947-1948. Foi a primeira das quatro guerras
ocorridas entre as duas novas nações independentes. Os resultados da guerra continuam a
afetar a geopolítica de ambos os países.

A guerra indo-paquistanesa de 1965 começou quando o Paquistão lançou a Operação


Gibraltar, para infiltrar guerrilheiros nas províncias de Jammu e Caxemira para liderar uma
revolta e realizar atos de sabotagem, precipitando assim uma insurreição do Estado contra o
domínio indiano. A tática, no entanto, foi rapidamente desarticulada pelas autoridades
indianas, cujo exército fechou a fronteira, a linha de cessar-fogo antes do ataque, e atravessou
a parte da Caxemira sob administração paquistanesa. O Paquistão lançou um contra-ataque a
1 de Setembro (Operação Grand Slam) para assumir o controlo da cidade de Akhnoor. Mas foi
um fracasso e, mais uma vez, a Índia respondeu enviando suas tropas para a fronteira entre os
dois países. As cinco semanas de guerra causaram milhares de vítimas em ambos os lados. A
22 de setembro, o Conselho de Segurança da ONU aprovou uma resolução exigindo o fim das
hostilidades, o conflito cessou no dia seguinte. Sob a égide da URSS, os dois países assinaram
um acordo prevendo a retirada das tropas para um retorno as fronteiras anteriores, que
ocorreu eficazmente mais tarde em Fevereiro de 1966. A guerra, terminou num mandato das
Nações Unidas de cessar-fogo e a posterior emissão da Declaração de Tashkent.

A guerra indo-paquistanesa de 1971 esteve estreitamente associada à Guerra da


Independência de Bangladesh. Embora haja divergências sobre as datas exatas da guerra, as
hostilidades entre a Índia e o Paquistão oficialmente começara na tarde de 3 de Dezembro de
1971, na Operação Gengis Khan (um ataque preventivo do Paquistão a 11 bases aéreas
indianas). Durante o decurso da guerra, as forças indianas e paquistanesas entraram em
confronto nas frentes oriental e ocidental. A guerra efetivamente chegou ao fim após o
Comando Oriental das Forças Armadas Paquistanesas assinarem o Termo de Rendição, na
sequência do qual o Paquistão Oriental se separou da parte ocidental e originou o Estado
independente de Bangladesh. Tudo isto com o consentimento indiano.

Nos finais da década de 90 houve um agravamento das relações, já tensas, entre a


Índia e o Paquistão por ocasião da corrida às armas nucleares e, mais tarde, da eclosão de um
quarto conflito armado (a Guerra de Kargil). De facto, esta guerra deve ser analisada tendo em
conta três fases sequenciais. Em primeiro lugar, a “captura” paquistanesa de territórios
estrategicamente vitais pertencentes à Caxemira indiana. À medida que as semanas iam
passando, variadíssimas operações eram postas em prática em Kargil pelos respetivos
infiltradores, no sentido de desafiar o domínio indiano na região, tentando derrubá-lo de vez.

86
Quando, em maio de 1999, Atal B. Vajpayee teve conhecimento deste processo infiltrador, foi
lançada uma outra operação (a Operação Badr), de maior dimensão, que acabou por dar início
à quarta guerra indo-paquistanesa. Em segundo lugar, as forças indianas protegeram estradas
de grande importância estratégica. Por fim, houve o recuo das tropas paquistanesas e dos
respetivos infiltradores da região.

A descolonização das Índias Holandesas e a República da Indonésia


(1945-1950)
Ao lado da Índia, desenvolveu-se uma descolonização com algumas características
semelhantes. A evolução desta descolonização foi semelhante às colónias francesas – que
também haviam sido ocupadas pelo Japão. Eram ricas em especiarias, borracha, petróleo e em
plantação.

Colónia holandesa desde o século XVII, o vasto arquipélago indonésio foi ocupado
pelos japoneses durante a II GM, dada a sua riqueza em matérias-primas. O Japão teve um
grande efeito dissolvente na Ásia colonial e queria estimular o nacionalismo local, de modo a
que a região indiana se pudesse desligar das antigas metrópoles. Para tal, conseguiu o apoio
de homens importantes (pertencentes a algumas elites) com a promessa de independência –
1945. Aparecia como libertador do colonialismo ocidental, embora tenha feito recrutamento
de capital humano para força de trabalho e de guerra.

Os holandeses haviam criado uma burguesia nas ilhas, composta maioritariamente por
muçulmanos. Também formou um movimento – Sarekat Islam; o nacionalismo foi influenciado
pela URSS – Partido Comunista Indonésio, que evoluiu para o Partido Nacional, fundado por
homens influentes: Hattar e Sukarno.

Os laços de união entre a Holanda e a Insulíndia encontravam-se num ponto tal por
esta altura que, dois dias depois da capitulação do Japão, os nipónicos não cumpriram a
promessa, pelo que a Indonésia alcançou a independência sozinha e instaurou a república em
agosto de 1945 por Sukarno e Hatta. Depois, os japoneses tentaram recuperar algumas ilhas,
mas já que eram independentes, os indonésios não o permitiram. No entanto, acabaram por
ceder-lhe algumas ilhas para que tivessem acesso a matérias-primas.

Claro que a potência colonial não aceitava de bom grado esta situação. Argumentando
que a ocupação japonesa não lhe fizera perder os direitos na região, a Holanda protestou e

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empreendeu uma série de negociações que conduziram, em julho de 1946, à conferência de
Malino, onde foram lançadas as bases de uma Indonésia federal e aliada da Holanda.

Todavia, os tempos não eram calmos. Ao mesmo tempo que se realizavam todos estes
encontros e negociações, tinha início uma revolta entre partidários da República e os
holandeses, na qual interferiu a Inglaterra, que convenceu as duas fações a iniciarem um rol de
negociações ainda no fim do ano de 1945. À trégua negociada, seguiu-se o acordo de
Linggadjati, pelo qual a Holanda reconheceu a independência dos povos indonésios, aceitou a
criação de um Estado federal soberano, sob a direção de um soberano holandês.

Em 1947, a Holanda organizou uma primeira ação de policiamento do território que


causou mal-estar, apesar da intervenção das Nações Unidas, criando uma comissão de bons
ofícios. O objetivo dos ataques holandeses, que resultam no controlo de dois terços de Java,
era o controlo das zonas petrolíferas de Sumatra. Reocupando o território, em 1950 é criada
uma união neerlando-indonésia. No fim do ano voltaram a estabelecer-se contactos entre os
antagonistas.

O governo americano apoiava a independência da Indonésia, tomando uma posição


anticolonial para favorecer um processo que não colidia com os seus interesses. Em 1948, deu-
se a segunda insurreição do Partido Comunista Indonésio, que conquistou a simpatia dos EUA
(contra a República da Indonésia). Viram aí que a luta da Indonésia era credível e convenceram
a Holanda a estabelecer uma data definitiva para a independência.

Os governantes indonésios construíram um Estado que englobava uma enorme


multiplicidade étnica. Em 1954, por fim, a Indonésia renunciou à união com a Holanda e
participou na conferência que reunia os estados do Sudeste Asiático, tendo em vista uma
cooperação económica que lhe permitisse afastar a influência europeia e, ao mesmo tempo,
manter a sua integridade.

A descolonização da Indochina francesa e a intervenção dos EUA


(1945-1975)
A descolonização da Indochina foi um processo parecido com o da Indonésia. A França,
tal como a Holanda, foi afastada da sua colónia asiática pelos japoneses, que ocuparam a
Indochina durante a II Guerra (1942), quando houve o processo de grande expansão japonesa
no Pacífico.

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A Indochina já tinha, antes da guerra, um movimento nacionalista, como na Índia. Era
uma zona onde se podia desenvolver uma burguesia comercial, e formou-se o Movimento
Nacionalista VNKD, que se inspirava no partido político chinês de Kuo-Min-Tang – depois de
não conseguir nada do que reivindicava, organizou-se militarmente.

A Indochina tinha um conjunto de territórios – a Cochinchina, Tankin, Annan (estes


três formam o Vietname), Laos e Camboja.

Entre estes territórios e a Birmânia, estava um outro que nenhuma das potências havia
ocupado: o Sião (atual Tailândia), que serviu de “tampão” entre uma zona e outra.

A ocupação japonesa podia também ter impedido o Movimento Nacional VNKD que,
como não conseguiu o apoio do Japão para alcançar as suas reivindicações, juntou-se à URSS
que apoiou os “rebeldes”. A URSS, que já tinha expandido a sua política soviética por parte da
Ásia na Mongólia (1924), na Coreia do Norte (1948) e na China (1949, onde arranjou um
agradável parceria com Mao Tsé-Tung), vê agora a possibilidade de estender o comunismo
aliando-se a Ho Chi Minh na conquista da independência neste território do Sudeste Asiático.

Após o Japão ter reconhecido a derrota na guerra em 1945, a França retoma a


soberania do território, mas defronta-se com uma forte oposição liderada pelo comunista Ho
Chi Minh, que declara o território vietnamita independente no mesmo ano. De resto, os EUA,
juntamente com as forças francesas, apoiaram o Movimento que, em 1945, declarou a
independência e a República do Vietname.

Mais tarde, viria a ser acordada a criação de uma zona republicana no Norte do
Vietname e, no Sul, uma zona de controlo colonial francês. Os EUA, que sempre se declararam
anticolonialistas, não queriam que o Movimento Nacionalista invadisse a área colonial
francesa, e tudo fizeram para que isso não acontecesse. Mas tal não aconteceu. Houve uma
violenta guerra civil entre 1946 e 1954 (a Guerra da Indochina). Aliás, as políticas dos franceses
e dos vietnamitas eram inconciliáveis, já que a França queria restabelecer o regime colonial. Os
EUA intervieram e envolveram-se na Guerra, pelo lado da França, não querendo igualmente a
independência do Vietname. Já os vietnamitas eram representados pelos nacionalistas
(apoiados por chineses e soviéticos).

Esta guerra terminou quando os EUA patrocinaram uma conferência internacional em


Genebra em 1954. O território do Vietname, marcado pelas elevadas divergências ideológicas,
dividiu-se oficialmente em duas zonas distintas: Vietname do Sul, que seria regido pelos EUA e
liderado pelo antigo imperador Bao Dai; e Vietname do Norte, que seria independente,

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controlado pelos nacionalistas e chefiado até 1969 pelo comunista Ho Chi Minh. A Indochina
via assim nascer três novas nações: o Vietname, o Laos e o Camboja (estes dois últimos ficaram
neutros).

Em 1954, realizou-se, no final da Guerra com vitória para os vietnamitas, uma


conferência em Genebra que dividiu oficialmente o Vietname em duas zonas distintas:
Vietname do Sul, que seria regido pelos EUA; e Vietname do Norte, que seria independente.

Neste contexto, a Declaração de Independência da República Democrática do


Vietname sublinha que “Todos os homens foram criados iguais […]. O Criador conferiu-lhes
certos direitos inalienáveis. Entre estes conta-se a vida, a liberdade e a procura de felicidade.
Estas palavras imortais são retiradas da Declaração de Independência dos Estados Unidos da
América, em 1776. […] No entanto, durante mais de 80 anos, os imperialistas franceses,
renegando os seus princípios de «liberdade, igualdade, fraternidade», violaram a terra dos
nossos antepassados e oprimiram os nossos compatriotas. As suas ações são contrárias aos
ideais de humanidade e de justiça. […] Por estas razões, Nós, Membros do Governo Provisório,
representando a população inteira do Vietname, declaramos que, de hoje em diante, não
manteremos qualquer relação com a França imperialista. […] Todo o povo do Vietname,
inspirado pela mesma vontade, está determinado a combater até fim contra todas as
tentativas de agressão dos imperialistas franceses.” Não será por acaso que o primeiro
presidente dos Estados Unidos da América, George Washington, já afirmava que “[a]
liberdade, quando começa a ganhar raízes, é uma planta de crescimento rápido” e este
processo da descolonização é um bom exemplo disso.

O que se seguiu à Conferência foi uma espécie da segunda versão da Guerra na


Indochina, mas sem os franceses. Vietname vs. USA. Os EUA passaram a intervir diretamente
no conflito do Vietname, herdando a posição francesa no conflito presente a norte. No final de
1973, todo o país era uma zona de guerra. Apesar do poder militar e económico americano,
não foi possível continuar com a ocupação. OS EUA tornaram-se incapazes de sustentar o
Vietname do Sul e, em 1975, abandonaram o território, permitindo assim uma reunião do
Norte com o Sul.

A descolonização da Ásia durou de 1947 até 1954, e foi a partir destes conflitos houve
uma crescente preocupação da ONU em intervir nas seguintes descolonizações.

90
A descolonização da Coreia e o primeiro grande conflito regional do
pós-2ª Guerra
A partir do séc. XVI, a Coreia foi alvo de incursões estrangeiras: China, Japão, Rússia e
potências ocidentais. A partir do séc. XX, o Japão tornou-se dono da península da Coreia,
anexando-a definitivamente em 1910. Como resposta a este ato, formou-se, em seguida, uma
resistência nacionalista contra a ocupação japonesa.

Durante a 2ªG.M., essa resistência foi liderada por comunistas, com o apoio da URSS.
Isso fez com que os aliados aprovassem e apoiassem a Independência da Coreia. Quando o
Japão abandonou a Coreia, em 1945, os americanos pretendiam que os soviéticos declarassem
guerra à China, o que levou à sua instalação na Manchúria. Os dois grandes vencedores, os
EUA e a URSS, optaram por ocupar e dividir a Coreia pelo paralelo 38 (segundo a Conferência
de Postsdam), até que fossem realizadas eleições e o povo decidisse livremente o seu destino.
Cada parte da Coreia realizou eleições. No território controlado pelos soviéticos venceu o
partido comunista, enquanto no Sul, controlado pelos norte-americanos, venceram os liberais.
O pretexto era garantir a liberdade da Coreia, eliminando-se por completo a presença
japonesa.

O acordo era que, depois das eleições, as tropas soviéticas e americanas retirar-se-iam.
As forças de ocupação da URSS saíram em janeiro de 1949, deixando ao governo do norte um
significativo arsenal de armas.

Porém, ainda antes disto foi oficializada internacionalmente a divisão da Coreia: à


semelhança da resolução da questão alemã, os EUA incentivaram a proclamação da
independência do território do sul, o que aconteceu em Agosto de 1948. Nasceu, assim, a
República da Coreia (o único governo que foi reconhecido pela ONU). Um mês depois foi
proclamada no norte, com o apoio dos soviéticos, a República Democrática e Popular da
Coreia. A Coreia do Norte e a Coreia do Sul eram Estados soberanos e independentes e
podiam assinar todo o tipo de pactos, inclusive pactos militares, e iniciar a preparação para
uma guerra.

O acordo era que, depois das eleições, as tropas soviéticas e americanas retirar-se-iam.
As forças de ocupação da URSS saíram em janeiro de 1949, deixando ao governo do norte um
significativo arsenal de armas. A 24 de janeiro de 1950, os norte-coreanos exigiram a retirada
dos norte-americanos do território sul. Como estes não o fizeram, iniciou-se uma campanha
militar. Três dias depois, os norte-coreanos conseguiram ocupar Seul, capital do sul.

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Foi convocada uma reunião urgente do Conselho de Segurança da ONU, que
considerou a ação militar da Coreia do Norte como uma agressão e pediu aos Estados-
membros para preparar um exército multinacional e obrigar o agressor a retirar-se para além
do paralelo 38. Os EUA rapidamente prepararam e lideraram o exército. No fim dos anos 50, já
os norte-americanos estavam perto da fronteira com a China.

O governo comunista de Mao Tse-tung, na China, entendeu o avanço dos capacetes


azuis norte-americanos pelo território da Coreia como uma ameaça direta à sua independência
e soberania, enviando, em Novembro de 1950, as suas tropas para a Coreia do Norte. A massa
militar chinesa fez recuar o exército da ONU. O resultado desta guerra foi, então, um empate.

Os comunistas chineses atacaram e derrotaram, numa grande batalha, o exército da


maior potência mundial. Os EUA não podiam tolerar essa situação. O comandante do exército
norte-americano, formalmente o exército da ONU, propunha ao presidente Truman atacar a
China com bombas atómicas. Porém, se a China fosse atacada com armas atómica, facilmente
seria derrotada, mas o que faria a URSS que também já possuía essa arma destrutiva?

A URSS pensou que os EUA não iam defender a Coreia do Sul, porque o secretário de
Estado da administração Truman tinha definido, no início de janeiro de 1950, as zonas de
defesa da política da contenção, ou seja, Estaline concluiu que os norte-americanos iriam
deixar essas zonas ao domínio soviético. Mas, contrariamente ao que o líder soviético tinha
pensado, Truman autorizou as suas tropas a apoiar a Coreia do Sul. Apesar disso, a ação militar
teve limites. O presidente norte-americano estava preparado para conter o avanço comunista,
mas não estava pronto para uma guerra atómica.

A Guerra da Coreia foi devastadora e acabou oficialmente a 27 de julho de 1953 com a


assinatura do armistício que dividiu até hoje o povo coreano em dois Estados. No fundo,
acabou como tinha começado: uma divisão através de um paralelo. Os responsáveis do bloco
de leste compreenderam que os capitalistas seriam um osso duro de roer. Por sua vez, os
ocidentais aperceberam-se que derrotar o comunismo não seria fácil. Ambos chegaram à
conclusão que, daí em diante, qualquer conflito interno seria rapidamente internacionalizado
pelos dois blocos.

Fazendo uma comparação com a situação do Vietname, se os franceses estavam


contra os nacionalistas, na Coreia eram os americanos contra a China. Esta situação da Coreia
mostra, como já foi referido nas posições anticoloniais, que tanto a URSS como os EUA
mantinham uma posição anticolonial ou não, de acordo com os seus interesses. Neste caso,

92
seria mais viável manter o controlo da Coreia.

As descolonizações do Médio Oriente e a África do Norte

Os estados árabes sob a tutela britânica e francesa, o mandato da


Palestina e a génese do conflito israelo-árabe
Até à I Guerra Mundial, grande parte do Médio Oriente estava sob o poder do Império
Otomano. Era uma divisão administrativa do Império Otomano, sendo gerida por governantes
locais e organizada em províncias cujas delimitações físicas eram mutáveis. Para os europeus é
uma expressão que representa a zona intermediária entre o Próximo Oriente (península
balcânica) e o Extremo Oriente (Coreias, Japão e China). Ao longo dos anos, o Império
Otomano perdeu alguns territórios e dividiu-se devido às potências imperialistas,
nomeadamente a França e a Inglaterra. Nas vésperas da 1ªG.M., este império englobava uma
parte maioritariamente de língua turca e compreendia todas as regiões árabes. A Alemanha
era a potência com mais influência na política otomana. Portanto, era inevitável que o Império
Otomano entrasse na IGM ao lado da Alemanha. Isso acabou por trazer várias complicações.

Os ingleses (instalados no Egito desde o século XIX), para abrir uma frente militar na
guerra, pensaram nas elites árabes que se manifestavam contra a independência do Império
Otomano. Os aliados exploraram esta situação e, em 1916, é organizada a Revolta Árabe
contra o Império Otomano. Os ingleses convenceram o xerife Sharif Hussein a organizar,
fomentar e dirigi uma revolta dentro do próprio Império Otomano, com a promessa de que no
final da guerra toda aquela zona seria um califado árabe. Era a primeira promessa inglesa para
levar os árabes a lutar contra os otomanos. Os otomanos acabaram por ser expulsos.

No mesmo ano, os franceses estavam interessados em garantir alguns territórios no


Médio Oriente. Perceberam que se a guerra acabasse e o Império Otomano se tornasse num
estado independente, os ingleses aumentariam o seu potencial. Apesar de serem aliados, os
franceses forçaram os ingleses a partilhar algumas zonas de influência. Assim, ambas as nações
fizeram uma espécie de acordo secreto para dividir a zona árabe do Império Otomano em duas
áreas de influência. Era o Acordo de Sykes-Picot. A linha que separava essas zonas passava
mesmo no meio do território árabe do IO. A França ocupou as zonas da actual Síria e do Líbano
enquanto os ingleses as zonas atuais do Iraque, Jordânia e Palestina (saíram a ganha, pois as
zonas petrolíferas estavam sob seu domínio).

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Os franceses não estavam em grande posição de ocupar um outro território, mas foi-
lhes reconhecido o esforço que estavam a fazer durante a guerra, que contribuía para essa
divisão. Para vender o Império Otomano e passar a controlar essas zonas, era necessário criar
um processo que o permitisse. No início de 1916, os ingleses conseguiram que uma família
árabe dominante no campo político (Família Hussein, de Meca) iniciasse uma revolta contra os
turcos – cavalaria e nómadas árabes subiram até ao território turco do Império Otomano para
derrotar os turcos.

Com isto, conseguiu-se abrir uma frente até ao território turco e vencer as forças
militares do Império Otomano. No entanto, era necessário cumprir a promessa feita aos
árabes: a criação de um grande Império Árabe. Esta promessa não era compatível com o
acordo de Sykes-Picot. Uma outra promessa dos ingleses foi feita ao Movimento Sionista e foi
a criação de um destino de emigração da população para a zona da Palestina. O Sionismo era
um movimento de cariz religioso e político que defendia a fundação de um Estado judeu na
Palestina, uma região com população maioritariamente árabe. Nasceu no final do século XIX na
Europa Central e Oriental como um movimento de revitalização nacional. Os sionistas queriam,
então, um território autónomo na Palestina. O movimento defende a manutenção da
identidade judaica, opondo-se à assimilação dos judeus pelas sociedades dos países em que
viviam.

O movimento sionista ganhou novo alento, em 1917, com a Declaração de Balfour,


mediante a qual o governo britânico apoiava o estabelecimento de um território judeu
autónomo na Palestina. Com isto, a Inglaterra procurava ganhar mais apoio para a IGM.

Porém, esta declaração inglesa iria aumentar as questões problemáticas na região. Estava,
então, previsto um conjunto de cenários (Declaração de Balfour; Grande Império Árabe; e
Acordo Sykes-Picot) que não era possível acontecerem em simultâneo.

A solução foi cumprir o que era possível (com base no Tratado de Versalhes), por
forma a manter todos os envolvidos satisfeitos. No final da 1ªG.M., do acordo Sykes-Picot,
surgiu a criação de pequenos estados, ao invés de duas grandes zonas: a Inglaterra ficava com
o Iraque (englobava duas grandes reservas de petróleo, uma a norte [curda] e outra a sul
[xiita], o que levou ao estabelecimento de uma fronteira com a Turquia) e com a
Transjordânia. Dentro da zona francesa, os ingleses tinham prometido o reino árabe. A Síria
ficou sob administração francesa, tal como o Líbano (novo Estado criado e que mesclava
bastantes religiões).

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A região entre a Península do Sinai, o Líbano, a Síria e a Transjordânia era uma zona
bastante problemática. Entre 1919 e 1920, criou-se a Palestina, que ficou com o estatuto de
mandato da SDN, confiado aos ingleses. Na Arábia Saudita, os saudis derrubaram os axumitas
no final dos anos 20.

Este era o contexto das comunidades da Palestina, Síria, Líbano e da Mesopotâmia,


doravante separadas do Império Otomano e administradas por mandatários enviados por
Londres e Paris. Assim, no final da guerra a parte árabe foi dividida em vários territórios sob
influência inglesa e francesa, potências imperialistas ocidentais que se encontravam em
declínio, apesar do domínio sobre esta região que foi fornecido pelo final da 1ªG.M.

Com isto, a criação de um grande Império Árabe foi anulada. Para manter todos
contentes, os Ingleses cederam o reino da Transjordânia e o Iraque aos filhos do Xerife de
Meca, família Hussein. A Inglaterra esperava que estas dinastias ficassem pró-inglesas,
juntamente com as dinastias da Arábia, que foram mais tarde substituídas pela família Saud.

Ao abrigo da Declaração de Balfour, intensificavam-se as emigrações para a Palestina.


De resto, a Palestina constituía a região problemática. As famílias sionistas compravam cada
vez mais terras aos árabes palestinianos. Os árabes verificaram que as terras compradas eram
irreversíveis, não podendo trabalhar nelas nem usufruir de qualquer relação com as mesmas.
Ao excluir sistematicamente a população árabe dessas terras, favorecia igualmente a
emigração dos europeus para a Palestina.

Isto levantou cada vez mais a tensão social, e o dirigente religioso Al-Hussein começou
a centrar à sua volta os colonos sionistas, que compravam terras tendo em vista o seu plano de
instaurar um Estado Judaico na Palestina, como já foi referido. Foi desta forma que, nos anos
20, foram criadas organizações palestinianas que tinham como objetivo criar um referendo, e
assim acabar com o mandato, ou seja, teriam que arranjar outra solução política para a
Palestina. Criou-se assim o Conselho Nacional Palestiniano

Perante o agravamento das tensões entre Judeus e Árabes, a Inglaterra começa a


recuar no que diz respeito à Declaração de Balfour. A política britânica para a região
direcionou-se cada vez mais para o apaziguamento árabe especialmente após a intensificação
da fuga de judeus perseguidos pelo regime nazista na Europa, que encontravam na Palestina o
único destino viável (algo que dificultava a paragem da emigração judaica para este território).
Os judaicos estavam a prejudicar os árabes e os ingleses não queriam que nada acontecesse às
suas dinastias pró-inglesas. Chaim Weizzmann e Jabotinski começaram mesmo a liderar
ataques terroristas contra os árabes, e até contra alguns ingleses.

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Ao chegar a 2ª Guerra Mundial, os ingleses já viam que só havia uma hipótese de
contornar estes conflitos e parar as guerras: ou criar dois estados na Palestina ou parar as
emigrações sionistas para a Palestina. Assim, em 1936, os britânicos nomearam a Comissão
Peel, destinado a unir esforços diante da liderança judaica

Optaram, então, por criar dois Estados, um para os árabes e outros para os sionistas, o
que pôs fim ao mandato britânico. Esta solução política foi muito difícil de pôr em prática: a
zona árabe ficava separada em dois territórios no meio de todo o território judaico. Esta
solução não era aceite por ninguém – os árabes não queriam a divisão da Palestina e judeus
não queriam a coexistência com um Estado árabe. (Zona Árabe – atual Cisjordânia + território
conhecido Faixa de Gaza).

Entretanto, rebentou a 2ª Guerra Mundial. Durante os anos de Guerra, o movimento


sionista propôs a criação de tréguas, mas não tal foi aceite por todos os seus integrantes. A
compra de terras árabes continuou e as emigrações sionistas subiam. (especialmente devido à
situação do holocausto). Na fase final da guerra, os ingleses tinha mais emigração europeia
que sionista. Mas os árabes continuavam a não aceitar a divisão da Palestina.

Depois da guerra, a Inglaterra não era já capaz de desempenhar o papel de potência


mundial e entregou as suas colónias às Nações Unidas. A Inglaterra administrava a Palestina e
foi votado em Assembleia (ONU) a divisão do território palestiniano – 1947. Nessa votação,
participaram os EUA e a URSS, favoravelmente e as Nações Unidas aprovaram a divisão e o
reconhecimento destes dois Estados.

Os árabes palestinianos não aceitaram esta votação, dado que não estavam lá
representados e dado que uma grande parte do território iria ficar sob domínio dos
emigrantes. O clima de tensão política multiplicou-se e os Estados árabes, que entretanto
foram criados, declararam guerra ao futuro Estado de Israel.

Originou-se, então, a primeira guerra israelo-árabe, em 1948.

A guerra não foi justa para ambas as partes, já que os sionistas tinham o apoio dos EUA
e possuíam treino militar profissional, enquanto as tropas árabes eram muito mais fracas em
armamento e inteligência militar.

Desta guerra resultou um fenómeno irreversível e que é algo em vigor ainda hoje:
expulsão da população árabe do território da Palestina. Cerca de 700 mil palestinianos árabes
foram recambiados para campos de refugiados. A Guerra acabou com a derrota dos
palestinianos árabes.

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Segue-se uma série de guerras de curta duração, a Guerra do Suez, em 1957; a Guerra
dos Seis Dias, em 1967; a Guerra do Yon Kipur, em 1973, em que os exércitos israelitas
impõem pesadas derrotas aos desorganizados e malpreparados exércitos árabes e
acrescentam novas áreas ao Estado de Israel.

Entretanto, incapazes de afrontar Israel em campo aberto, os palestinianos enveredam


por ataques terroristas perpetrados pela organização guerrilheira Al-Fatah, fundada por Yasser
Arafat, em 1959, enquanto a OLP – Organização para a Libertação da Palestina, funda em
1964, dá forma institucional ao processo de recuperação dos territórios perdidos para a Israel.

Esta situação de desigual confrontação provocou fortes reações de condenação por


parte da comunidade internacional. Os EUA, em particular, dão mostras de alguma inflexão
nas suas posições de apoio aos israelitas.

Em 1993, iniciaram-se as negociações entre o Governo de Israel e a OLP, conhecidas


como “Acordos de Oslo”, discutidas entre Yasser Arafat e Ysaac Rabin e mediadas pelos EUA.

Com estes acordos, os palestinianos reconheceriam o Estado de Israel e os israelitas


comprometer-se-iam a devolver os territórios ocupados em 1967. Mas o radicalismo das
posições rapidamente tornou ineficazes os acordos conseguidos.

Também não foi resolvida a situação de Jerusalém e os israelitas não se dignaram a


estabelecer uma data para o que prometeram, isto é, ceder territórios aos palestinianos.

Tudo isto trouxe dificuldades. Desde 1960 que os palestinianos nunca conseguiram
nada a nível político.

Em 1995, foi assinado Isaac Robin, provocando a estagnação do processo. Já Yasser


Arafat morreu em 2004. Em 2005, a Palestina e Israel deram início a novas negociações que
pareciam bem encaminhadas, como confirma o abandono dos colonatos da Faixa de Gaza em
2005, por parte dos israelitas.

Mas as dúvidas persistem, em consequência da ascensão ao poder na Faixa de Gaza,


em 2006, do HAMAS, um movimento radical que se recusa a reconhecer o Estado de Israel e
que se envolveu em conflitos com FATAH. A frequência dos atos de violência levados a cabo
por parte de movimentos fundamentalistas religiosos de um e de outro lado vem confirmar o
difícil caminho para a paz na região.

97
A evolução do Egipto – da independência formal de 1922 à República
Árabe Unida (1958)
Os países da África do Norte alcançaram a independência entre 1952 e 1962, todos
eles. A África do Norte distingue-se das restantes zonas africanas pelo Deserto do Sahara, que
a divide da África Subsariana e pela existência, em todos os seus países, de Muçulmanos
Sunitas (vs. Xiitas) – todos eles têm isso em comum. Outro ponto em comum em todos os
países da África do Norte é o facto de estarem ocupados na zona do litoral e zonas altas –
nesses locais, havia uma grande densidade demográfica, sendo o resto dos territórios apenas
desertos. Todos os países falavam árabe; era a sua oficial. Mas esta não era a única cultura
existente: em todos eles, estava presente a cultura berbere – nada tem que ver com o árabe. A
cultura berbere ainda hoje é a dominante em alguns desses estados. Como nunca foi tornada
oficial, a língua e a cultura berberes nunca foram ensinadas na escola, fazendo com que fosse
encarada como uma língua de segunda categoria.

No caso do Egito, este era um estado independente com estatuto de condomínio


anglo-egípcio. É um país que inclui também a península do Sinai, na Ásia, o que o torna um
Estado transcontinental.

Os ingleses ocuparam o Egito em 1882, como estratégia para chegar à Índia. Desde
esse ano até ao fim da I Guerra Mundial que o Egito era um condomínio anglo-egípcio. Depois
da Guerra, e dada a situação inglesa, a Inglaterra teve de fazer concessões aos egípcios, a nível
político. O movimento nacionalista egípcio ganhou a maioria da assembleia legislativa local.
Perante o exílio do líder do partido, o país levantou-se na primeira revolta da sua história
moderna. As constantes rebeliões por todo o país levaram a Grã-Bretanha a proclamar,
unilateralmente, a independência do Egipto, em 1922. Declarou-se terminado o protetorado e
deu a independência nominal ao país. Foi criado um reino, governado pelo Rei Fuad I.

No entanto, o controlo da administração, do exército e do Canal do Suez mantinham-


se sob o poder inglês – o Egito era gerido pela política externa inglesa e não podia fugir muito
dela. Formalmente, o Egito fazia ainda parte do Império Otomano no século XIX (aquando da
ocupação inglesa, que levou à formação do condomínio. Isto fez com que a burguesia egípcia
fizesse muitas reivindicações entre 1920 e 1930. Foi, então, que surgiu o Movimento WAFD.
Quando mais tarde houve uma invasão alemã no Egipto, os egípcios esperavam ver as suas
reivindicações satisfeitas, uma vez que eram pró-alemães.

Depois de o Movimento WAFD sofrer uma derrota na guerra da Palestina, em 1948, os


militares convenceram-se de que era necessário mudar a política do Movimento. De resto, a

98
questão da derrota dos países árabes no médio oriente teve ondas de choque nos restantes
países. As burguesias nacionais de alguns destes países começaram a adotar uma atitude mais
antiocidental. Assim, muitos dos oficiais que participaram na guerra de 1948 contra Israel
fizeram um golpe militar no Egito em julho de 1952 (Golpe dos Oficiais Livres) Um grupo de
oficiais destronou o Rei da época, Faruk, e colocou no poder uma junta militar composta por
Nasser e Neguib. Nasser era um homem muito forte e acabou por assumir o comando. Este
golpe viria a representar o ponto de viragem na vida do Egito, já que o novo regime instalado
permitiu iniciar um processo de emancipação do Egito da tutela inglesa.

Em 1952, a Inglaterra já não tinha a Índia, mas o controlo do Canal do Suez continuava
a ser importante, já que era por lá que passava o petróleo vindo do Médio Oriente. Os Ingleses
já não tinham possibilidades para manter o Canal, mas fizeram uma proposta ao Egito para
continuar a controlá-lo. Em 1956 os ingleses deram a independência ao Sudão, e criaram um
governo controlado por eles, pois além do Sudão ser muito importante por causa do Nilo que
percorre o Sudão até aos Grandes Lagos, foi uma forma de pressionar e de prejudicar o Egipto.

Nasser aumentou muito a sua base de apoio, porque tinha uma visão de
desenvolvimento do país, uma vez que levou a cabo uma reforma agrária - projeto que fez
com que a junta militar ganhasse muita popularidade entre os nacionais e, até mesmo,
estrangeiros.

Em 1957, dá-se a Crise do Suez e tal acontecimento permitiu que Nasser obtivesse uma
melhor visão para promover o projeto de desenvolvimento do país. Nasser queria melhorar a
agricultura e desenvolver a Indústria. Contudo, a agricultura egípcia estava muito dependente
das cheias do Nilo e também a Indústria poderia vir a depender muito do rio, através da
criação de eletricidade gerada por uma barragem. Era para essa infraestrutura que Nasser
precisava de adquirir recursos – podia pedir ajuda à Inglaterra, mas para isso teria de perder a
sua “dignidade”. Os ingleses estavam de saída, mas não queriam perder as suas posições no
Médio Oriente, influenciaram os americanos a não emprestarem capital aos egípcios.

Neste contexto, Nasser nacionalizou, sem indemnizações, o Canal do Suez, o que


acabou por constituir uma declaração de guerra a ingleses e franceses. Pois, como seria de
esperar, esta ação de Nasser desagradou aos ingleses e foi daí que surgiu uma crise entre a
Inglaterra e o Egito, o que convenceu os ingleses de que não havia condições para manter o
Canal, decidindo dedicar-se ao derrube de Nasser.

Além disso, também a França queria ver o Egito derrotado, já que o país dava apoio
aos Movimentos pela independência da Argélia. E havia ainda um grupo de irmãos

99
muçulmanos que queriam derrubar Nasser. Inglaterra já sabia que o apoio destes dois seria
indispensável.

A solução encontrada seria provocar uma guerra Israelo-Egípcia. O primeiro-ministro


britânico Anthony Eden temia que Nasser ameaçasse as remessas de petróleo do Golfo da
Pérsia e o seu comércio com o Extremo Oriente, com a perda da preponderância no Médio
Oriente. Já a França sentia-se ainda mais ameaçada do que Inglaterra, porque os egípcios
participavam ativamente no movimento de independência da Argélia. Os EUA foram os únicos
a rejeitar a ideia de um conflito armado. Portanto, ingleses e franceses convenceram Israel
(um inimigo conhecido do Egipto) a participar na guerra.

Para tentar derrubar Nasser, Inglaterra planeou uma ofensiva militar coordenada. O
plano era Israel fazer um ataque preventivo ao Sinal (Estado Egípcio) e formar um corpo
expedicionário franco-britânico; depois, com o pretexto de proteger o Canal, os franceses e
ingleses ocupariam o Suez. Israel invadiu, então, o Estado egípcio do Sinai e, três dias depois,
os franceses e os ingleses invadiram e ocuparam o controlo do Canal do Suez – 1956. Isto
gerou uma guerra política sem precedentes, a Crise do Suez.

Num primeiro momento, Israel hesitou, pois tinha a consciência de que estava a ser
usado pelos interesses imperialistas das potências. No entanto, a razão da sua aprovação ao
convite dos ingleses e franceses prendeu-se com a entrada de reatores para aquecer o urânio.

Em 1957, dá-se a Crise do Suez e isto foi o que deu mais visão a Nasser para o projeto
de desenvolvimento do país. A tentativa de forçar o Egito a assinar um ultimato fracassou.
Como tal, os britânicos resolveram bombardear os campos aéreos egípcios. Os EUA viriam a
entrar nestes conflitos como aliados do Egito, já que não lhes convinha ser contra os árabes
devido à sua posição relativamente ao Médio Oriente. Confrontados com a possibilidade de os
soviéticos apoiarem os egípcios, os EUA patrocinaram o debate de uma resolução pacífica. Por
outro lado, aos ingleses não convinha entrar numa guerra nuclear com os EUA. O cessar-fogo
tornara-se inevitável pelo desgaste das forças britânicas. A 5 de Novembro os combates
cessaram, e no ano seguinte (1957) o primeiro-ministro inglês abandonava as suas funções,
perante uma derrota inequívoca. A Inglaterra e França perderam a sua influência, sendo
humilhados com a expulsão do Egito. Foi o fim da influência europeia no Médio Oriente,
consolidando a influência de Nasser. Israel ficou totalmente associado ao bloco ocidental,
havendo um aumento da influência dos EUA e da URSS.

Depois desta crise, Nasser saiu como herói dos árabes. Isto deu-lhes a esperança
novamente da criação de um grande Império Árabe no Médio Oriente, englobando agora o

100
Egito (principal país árabe). De resto, entre 1922 e 1952 houve, no Egito, uma discussão
relativamente à identidade do povo egípcio: devia ser árabe no sentido religioso (somente) ou
árabe no sentido cultural, laico e político?

No Médio Oriente, havia a ideia de criar uma aliança defensiva, que tinha sido lançada
pelos ingleses para defender o Médio Oriente dos eventuais ataques do Egito. Os povos árabes
do MO não queriam fazê-lo, já que a aliança seria patrocinada por um país estrangeiro do
Ocidente. (Médio Oriente – Turquia, Jordânia, Iraque e Irão).

Nasser era pan-arabista e, por isso, contra o Ocidente. Era ideal do pan-arabismo a
criação da RAU – República Árabe Unida – como imposição ao Ocidente. Nasser era pan-
arabista, isto é, estava contra o Ocidente. Era ideal do pan-arabismo a criação da RAU –
República Árabe Unida – como imposição ao Ocidente. Nasser tinha a intenção de alterar as
fronteiras do Médio Oriente árabe, outrora impostas pelas potências ocidentais. O projeto
pan-arabista só se conseguiu afirmar em países onde não houvesse burguesias prósperas e
ligadas à política. Em 1958, o Egito estava em expansão política, a Síria já se lhe havia juntado e
o Iraque estava perto de alcançar também a independência. No entanto, a tentativa de união
entre o Egito e a Síria durou apenas três anos, até 1961. Em 1958 surge um golpe militar no
Iraque, organizado pelo movimento nacionalista Baath (criado por dois cristãos), uma espécie
de organização defensora do pan-arabismo. Do outro lado, a Jordânia estabeleceu-se sempre
enquanto regime árabe axumita pró-ocidental.

Conclui-se assim que a maior oposição ao colonialismo britânico veio do Egipto, que
conseguiu a independência em 1953 depois de alguns anos de confronto entre a resistência
nacionalista e as tropas monárquicas. A luta dos egípcios foi determinante para a
descolonização do mundo africano, uma vez que serviu de exemplo para países como o Sudão,
que rapidamente se empenhou na conquista da independência (1956).

O problema israelo-árabe também prejudicou o projeto pan-arabista. A tensão cresceu


tanto de dia para dia que chegou a haver uma terceira guerra, em 1967, quando, mais uma
vez, o exército árabe foi derrotado e humilhado.

A atual revolução na Líbia tem origens anti arabistas – Kadhafi é Nasserista – pan-
arabista. Daqui é possível perceber a influência que Nasser teve e ainda tem na Política Norte
Africana/Árabe. Os países ocidentais desde sempre viram o Movimento pan-arabista como
uma ameaça.

101
A guerra colonial na Argélia e o seu impacto na França (1954-1962)
A região da África do Norte vai desde Marrocos ao Egito. O Magrebe corresponde à
parte ocidental da África do Norte enquanto o Mashrek é o oriente. Marrocos e Tunísia eram
protetorados, o Egito era um condomínio e a Argélia era uma colónia.

A Argélia era a única colónia francesa, os restantes territórios eram apenas


protetorados. A França afirmava que o território argelino era uma extensão mediterrânica do
território francês, tendo em conta o clima e as condições idênticas.

A Argélia fica mais perto da costa francesa, e houve emigração de franceses que foram
para a Argélia ocupar terras e desenvolver a agricultura, aliás, 10% da população da Argélia era
composta por franceses, espanhóis e italianos. Não eram só militares e políticos, sendo a
maioria dos emigrantes civis.

Ainda no século XIX, Napoleão III declarou a Argélia como colónia oficial francesa
(1830).

Entre as duas guerras, esta região foi administrada sem grandes problemas (com a
exceção do Egito). Nos anos de 1930 havia já uma burguesia argelina, um Partido Popular
Argelino (apoiado pela URSS) e movimentos independentes (liderados por Messali Hadj e
Ferhat Abbas).

Em 1945, no decurso da IIGM, houve algumas alterações. Alemães e norte-americanos


desembaraçaram na África do Norte. Existiu o supracitado caso egípcio.

É importante referir que, entre 1945 e 1954, a ausência de ocorrências na Argélia foi
apenas aparente. O PPA transformou-se no MTLD (Movimento para o Triunfo e Liberdade
Diplomáticos) tendo como grande figura Messali Hajd que, ao ver que a influência do MTLD
era quase nula, criou o CRUA, um Movimento clandestino. Dentro do CRUA, foi criado um
braço, a Frente de Libertação Nacional, que atacava explorações agrícolas francesas na Argélia.
A FLN começou a ser apoiada, não publicamente, pelo Egito. E criou-se no Cairo um grande
Movimento pan-arabista anticolonial: o Comité de Mobilização do Magreb.

Com a colonização, a Argélia criou duas grandes cidades que baseavam a sua economia
no comércio de exportação: Argel e Oran. A FLN começou a tentar fechar as fronteiras ao
exército francês – começou a guerrilhar em finais de 1954: nesta altura, já a Tunísia e
Marrocos estavam em ambiente de guerrilha e os franceses resolveram escolher apenas um
território. Dado que a Argélia era a mais importante, a França decidiu desistir de Marrocos e

102
da Tunísia, concedendo-lhes a independência em 1956. É que os Franceses não podiam
aguentar três frentes militares.

Em virtude da derrota italiana na 2ªG.M., a Líbia, outrora colónia italiana, passou para
mandato da ONU. Restava o caso da Argélia, a primeira colónia francesa, do ponto de vista
cronológico e da implantação dos interesses franceses. Tinha mais de um milhão de colonos
franceses, que se tinham apropriado das mais profícuas terras do litoral. Os franceses tinham
um grande interesse pelo facto de terem sido descobertas grandes reservas de petróleo e gás
natural na zona saariana da Argélia. Portanto, não estavam dispostos a abdicar da Argélia sem
as devidas contrapartidas.

Era um clima insustentável para as populações árabes. O francês era a língua


administrativa, mas a língua principal é o Amazigh. A partir de 1954 (até 1962), os franceses
começam uma guerra anticolonial na Argélia (primeira grande guerra colonial em África, uma
das mais violentas). A Argélia é, deste modo, obrigada a enfrentar uma guerra prolongada de
libertação em virtude da resistência dos colonos franceses, que dominam as suas melhores
terras. A opinião pública sofreu negativamente o efeito antiguerra – o recrutamento militar era
obrigatório em França, pelo que as suas tropas foram mobilizadas para a Argélia. O exército
francês bem fazia força para que se resolvesse a situação através do meio militar, para que
assim se pudesse redimir da Guerra do Vietname. Os franceses, que tinham perdido a
Indochina, não queriam perder a Argélia.

A FLN tinha o apoio do Nasser e resolveu levar a guerra para as duas principais cidades:
Argel e Oran. Fizeram isto estrategicamente, para que os colonos (os franceses) não se
pudessem esconder nas cidades.

Apesar dos esforços e dos progressos na contenção de revoluções, era impossível


controlar a situação. Os governos caíam e chegou-se a um ponto em que se resolveu chamar o
militar que sempre criticou a IVª República Francesa para pôr ordem a Argélia: De Gaulle. De
Gaulle formou um governo em 1958, mas exigiu a mudança na Constituição Francesa. Foi,
então, votada uma constituição presidencialista, desistindo do regime parlamentar. Isto foi
uma consequência direta da crise na Argélia que, na altura, estava longe de acabar.

De Gaulle achava que a França tinha um problema com a imposição de poder. Foi à
Argélia, onde achavam também que ele era melhor hipótese para a satisfação dos seus
interesses. Depois de um encontro em Argel com os dirigentes argelinos e com alguns colonos
franceses, estes, juntamente com os militares da metrópole, chegaram a fazer um Golpe de
Estado contra a política de De Gaulle.

103
Nesta altura, a situação era caótica, tanto na Argélia como na França. De Gaulle teve
que ceder a algumas reivindicações da FLN, chegando a dar-lhes a independência. O partido
FLN venceu o MNA e, depois de muitos conflitos, a França teve que reconhecer a
independência da Argélia.

A independência foi concedida em 1962, com o Tratado de Evian, sob algumas


condições impostas por De Gaulle: os colonos franceses poderiam manter dupla
nacionalidade; a França manteria as bases militares na Argélia – maioritariamente no Sahara;
e, sendo a Argélia rica em gás natural, a França manteria o acesso aos depósitos. Durante dez
anos, os argelinos não mexeram no seu próprio petróleo, pois os franceses permaneciam na
zona das concessões. De outro modo, a Argélia tornava-se independente, mas o controlo do
petróleo argelino ficava com os franceses. Até que em 1971, os argelinos nacionalizaram esse
petróleo, contra a vontade dos franceses.

Depois dos acordos de Evian, em julho de 1962, a situação caótica voltou à Argélia.
Houve uma guerra, na qual morreram 30 mil franceses e cerca de 250 mil arábes. A situação
era insustentável para a Vª República francesa e para a FLN.
No Verão de 1962, tentaram também matar de Gaulle numa operação levada a cabo
pela OAS – Organization Armée Secrete. A França começou a evacuar a Argélia, depois de
vários atentados, ataques bombistas e guerrilhas. Os colonos franceses começaram a sair do
território argelino e, para agravar, ainda eram rejeitados pelos franceses residentes em França,
que lhes chamavam Pieds Noirs.

[Este processo da Argélia equipara-se ao processo de descolonização de Angola,


colónia portuguesa: tanto na Argélia como Angola, o exército colonial controlava inicialmente
a situação nas colónias. Os portugueses chegaram até a desenvolver ainda mais o conceito de
guerrilha do que os franceses. No fim de contas, a região que França tinha que controlar era
muito mais pequena do que a região que Portugal queria dominar em Angola. E enquanto a
guerra para a França durou 8 anos, a guerra para Portugal durou 13 anos (1962 – 1974).]

104
As descolonizações em África (1957-1990)

As descolonizações inglesas e francesas na Africa Ocidental e Oriental


(1957-1964)
O continente africano possuía um grande peso nos impérios coloniais, pois
praticamente todo o território estava sob domínio colonial. A África Subsariana corresponde à
região do continente africano a sul do Deserto do Sahara, ou seja, aos países que não fazem
parte da África do Norte. Abrange, portanto, os países da África Ocidental e quase todos os
países da zona dos Grandes Lagos (Uganda, Quénia, Tanzânia e Sudão).

Nesta zona as descolonizações (transições controladas pelas metrópoles) foram feitas


de forma predominantemente pacífica, com exceção do Congo Belga. De resto, todas as
colónias que se tornaram independentes pertenciam a três metrópoles: Inglaterra, França e
Bélgica. Face ao insucesso nas descolonizações do pós-guerra, ingleses e franceses tinham
motivos suplementares para adotarem outro tipo de método na realização das mesmas nos
territórios da África Subsariana. A experiência indiana predispôs os ingleses para um outro tipo
de atitude. Já os franceses começaram a descolonização de maneira tão remitente que isso
acabou por originar duas guerras coloniais, ambas perdidas para Indochina e Argélia - esta em
termos políticos -, e grandes custos.

Durante a época colonial, o nível de investimento dos impérios coloniais era


relativamente baixo. Mas as áreas mineiras poderiam dar uma taxa de lucro superior a uma
renda. Como tal, é em África que se concentram os grandes investimentos de capital e zonas
capazes de dar alto rendimento. Na África do Sul tem-se uma grande zona mineira de ouro e
carvão (Witwatersrand), juntamente com as minas de diamante (Kimberley). No Congo Belga
(precisamente a sul, no Katanga) existem os grandes filões de cobre e diamante, que
irradiavam para Angola e a zona das Rodésias. Por fim, em Angola (Luanda) tem-se
prolongamentos periféricos como os diamantes do sudoeste africano.

Apesar disso, a verdade é que a África Subsariana era subdesenvolvida e não tinha um
grande fluxo de capitais exportados, pois o interesse era mínimo (com natural exceção das
áreas mineiras, polos de desenvolvimento que viam rapidamente um grande crescimento
causado, em grande parte, pelo investimento e pela criação de infraestruturas e polos de
industrialização). Como tal, nos anos 60, Angola tinha uma taxa de crescimento muito alta
enquanto a África do Sul era um país desenvolvido.

105
Visto praticamente não ter colonos europeus, tornou-se mais fácil fazer negócios/acordos
políticos e as independências foram dadas facilmente, pois não havia grandes interesses a
defender, nem locais que de alguma forma favorecessem a metrópole que os controlava.
Como já dito anteriormente, o próprio exemplo das guerras coloniais predispôs ingleses e
franceses a adotarem uma outra atitude.

A Inglaterra preparou diversos territórios para a sua independência. No Gana, formou-


se a Convenção da Costa do Ouro Unida, que ia contra a administração inglesa e explorava
caminhos para a independência. O Gana conseguiu-a em 1957, tornando-se na primeira nação
a alcançar o feito. Na altura, chamava-se Costa do Ouro, adotando depois o nome de Gana por
uma questão de prestígio. Nigéria (1960, sendo até então uma plataforma administrativa),
Serra Leoa (1961) e Gâmbia (1965) compõem os outros casos. Até 1965, praticamente todos os
países ingleses da África Ocidental já eram independentes.

Quanto à África Oriental, os ingleses detinham um maior número de territórios. Como


foi referenciado acima, foi concedida a independência ao Egito e ao Sudão. Os territórios
circundantes dos Grandes Lagos não apresentavam grandes cidades, minas e um grande
desenvolvimento. À exceção do Quénia, onde se criou uma classe de fazendeiros europeus,
colonos com uma mentalidade muito fechada. No Quénia, os ingleses tiveram um problema
parecido com o da França na questão da Argélia. O país era rico em montanhas e as regiões
onde a agricultura era rica foram ocupadas pelos europeus, que expulsaram de lá os Kikuyu, o
grupo étnico mais populoso do país e uma sociedade secreta que matava os europeus que
haviam ocupado terras quenianas. Apesar de um processo político bastante atribulado, os
quenianos conseguem a independência em 1963. Subtraindo este caso, as colónias ingleses
situadas na Africa Oriental passaram por um processo semelhante ao ocorrido na África
Ocidental: Uganda (1962), Quénia (1963) e Tanganyika. Quanto a este último país, em 1964,
numa ilha ao largo do território do Tanganyika, chamada Zanzibar, houve uma guerra civil
muito violenta devido à ocupação persa. Já independente, o Tanganyika deu apoio a Zanzibar
em 1964 e juntos integraram um novo país - Tanzânia.

A França ficou desligada das suas colónias durante a 2ª G.M.. Não estava disposta a ter
mais guerras coloniais e não tinha qualquer interesse em manter o controlo sob as suas
regiões na África Subsariana. Apenas queria manter a sua rede de influência na AEF e na AOF.

Logo a seguir à Guerra, já na IVª República, houve grandes mudanças na forma de


administração das colónias. Houve um grande crescimento económico: os países atingidos pela
Guerra estavam a reindustrializar-se e as matérias-primas tornaram-se muito caras: as

106
metrópoles tentaram valorizar os seus territórios coloniais com investimentos em
infraestruturas, administração, etc.; enquanto antes da guerra as colónias tinham que pagar as
próprias despesas, agora as metrópoles investiam muito capital nelas, para lucrarem mais
depois; para as metrópoles, havia sistemas políticos diferentes entre elas e as suas colónias, e
por isso achavam que as colónias necessitavam de leis diferentes; tudo o que aconteceu
aquando e depois da guerra fez com que houvesse uma mudança na forma de tratamento das
colónias, por parte das metrópoles.

Pode-se referir que a descolonização francesa foi uma consequência da guerra da


Argélia, que forçara uma alteração no regime político em 1958 (regime parlamentar para
presidencialista). Quanto De Galle chega ao poder, havia a necessidade de arranjar uma
solução para a Argélia e restantes territórios. A primeira versão da nova Constituição francesa
(V República) previu os referidos territórios sob a alçada de governos autónomos, bem como
passou a abranger os indígenas nos momentos leitorais (algo que só os cidadãos detinham
durante o período colonial). De outra forma, a massa dos indígenas transformou-se numa
massa ativa de votantes. De resto, os franceses já tinham abolido em 1946 o estatuto do
indigenato e o trabalho forçado nas colónias, ou seja, a separação política entre cidadãos e
indígenas. Portugal só aboliu em 1961, com o início da guerra colonial em Angola. Todos os
regimes coloniais apresentavam esta distinção, sendo que os processos de descolonização
aboliram naturalmente isso.

Entre 1946 e 1958 as colonias foram ganhando experiencia política. Em 1958, De


Gaulle tinha de efetuar algumas concessões. Para tal, foi realizado um referendo que permitia
aos habitantes escolher se queriam ser autónomos e continuar a fazer parte da comunidade
francesa, ou se queriam a independência total. Após a aprovação deste referendo, todos os
territórios franceses na África escolheram ter um governo autónomo dentro da comunidade
francesa, menos a Guiné Conacri, que decidiu tornar-se independente imediatamente. A Guiné
foi um dos primeiros países da África subsaariana a tornar-se independente (1958) e logo
cortou os seus vínculos políticos com a antiga metrópole, seguindo o caminho do socialismo
revolucionário e anulando qualquer influência dos seus opositores. Era liderado por um dos
históricos líderes da emancipação africana, Ahmed Sekou Touré.

No entanto, a França fez uma federação com governos próprios e a devida divisão dos
territórios que aceitaram ser autónomos dentro da comunidade francesa. Para muitos
dirigentes africanos, isto representava uma divisão de fronteiras. Começou a existir uma
fixação de fronteiras que a maior parte dos países não queria. Portanto, não aceitavam a
divisão territorial. Um deles foi a Costa do Marfim, uma colónia bastante rica e que se tornou

107
na maior exportadora de cacau. Esta nação exigia fronteiras mais pequenas, visto que o
território que a rodeava era pobre e em nada lhe favorecia. Quando alguns deles viram que
não era bom fazer parte da federação, entre 1958 e 1960 começam a pedir unilateralmente a
independência. Em 1960 (o ano de África), praticamente todos tinham encontrado os
caminhos da independência, rompendo os laços políticos com França. Assim, os países
finalmente puderam fazer as suas próprias fronteiras. Desta forma, os países ricos não se
prejudicavam e deixavam de estar ligados aos outros países pobres da África Ocidental.

A descolonização portuguesa (1974-1975)


Portugal teve três impérios coloniais. Nos séculos XVI e XVII, tinha a Índia e o Oriente.
No século XVIII, tinha o Brasil. E nos séculos XIX e XX, tinha a África – Guiné, Angola,
Moçambique, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe. Sendo assim, os regimes políticos
portugueses foram determinados pelo fator colonial.

No terceiro e último império colonial, Portugal ainda possuía “restos” de territórios


coloniais na Ásia: Índia (Goa, Damão e Diu), Indonésia (parte da ilha de Timor) e China
(Macau).

Estes territórios, organizados pela Iª República, foram depois reorganizados pelo


Estado Novo. Criou-se um documento chamado Ato Colonial, que propunha uma República
Administrativa Ultramarina. A aprovação do Ato Colonial evidencia bem as preocupações com
a política colonial. Efetivamente, o Ato Colonial de 1930 definia a posição política do regime
em relação às colónias portuguesas, ou seja, definia os direitos que Portugal detinha sobre as
colónias e afirmava a missão histórica civilizadora dos portugueses nos territórios
ultramarinos, passando a fazer parte integrante da Constituição de 1933, vincou bem a
soberania portuguesa sobre as colónias. Assim, as colónias teriam de ser um meio fornecedor
de matérias-primas para a indústria metropolitana que obtinha escoamento garantido nos
mercados coloniais, sendo que a economia das colónias teria de se subordinar aos interesses
da economia da metrópole.

A República Administrativa Ultramarina completava, ainda, o estatuto de indigenato.


Os portugueses precisavam de força de trabalho e criaram um estatuto diferente para os
trabalhadores africanos. O Estatuto só se aplicava às colónias africanas e chegou a ser
atualizado nos anos 60, vindo, mais tarde, a ser anulado.

108
Para Portugal, a primeira pressão de independência veio da Índia. A Inglaterra havia
dado a independência e a União Indiana queria que Portugal fizesse o mesmo. A partir dos
anos 50, Portugal começou a ser pressionado pela ONU e pela NATO, pelo que foi obrigado a
rever a sua política colonial.

A adaptação aos novos tempo processou-se, numa primeira fase, em duas vertentes
complementares, uma ideológica e outra jurídica.

Em termos ideológicos, fomentou-se a ideia de “singularidade da colonização


portuguesa”, inspirada nas teorias de Gilberto Freire, que afirmava que os Portugueses tinham
demonstrado uma excelente capacidade de adaptação à vida nas regiões tropicais, onde, por
ausência de racismo, se tinham entregue à miscigenação e à fusão de culturas. Esta teoria do
lusotropicalismo permitiu, nos anos 50, individualizar a colonização portuguesa, retirando-lhe
o caráter opressivo das outras nações colonizadoras e vincando o papel histórico de Portugal
como nação evangelizadora.

Em termos jurídicos, eliminou-se as expressões “colónia” e “império colonial” de todos


os diplomas legais; revogou-se o ato colonial na revisão da Constituição de 1951 e inseriu-se o
estatuto dos territórios por ele abrangidos na própria Constituição portuguesa.

Legalmente, Portugal deixou de ter colónias. Agora designadas por Províncias


Ultramarinas, detém equivalência jurídica a qualquer província do continente. O país estendia-
se desde “Minho a Timor”, constituindo, assim, o Ultramar Português. Portugal surge como um
estado pluricontinental e multiracial.

Portugal, inclusive, começou a desenvolver a educação nas colónias e quem queria


educação superior tinha que ir para a metrópole. No continente criou-se a Associação dos
Estudantes do Império, formada por estudantes das colónias, e foi daqui que surgiram os
primeiros movimentos anticolonialistas e partidos da África portuguesa.

Apesar de, externamente, a manutenção do colonialismo português ter sido posta em


causa, internamente, a presença portuguesa em África não sofreu praticamente contestação
até ao início da guerra colonial, com exceção do P.C.P. (Partido Comunista Português).

Confrontaram-se, então, duas teses divergentes: a integracionista e a federalista


(1961).

109
A integracionista defende a integração plena dos territórios ultramarinos no Estado
português, o que implicava a luta armada – tese defendida por Salazar e pelos setores mais
conservadores.

A federalista propunha a concessão de uma autonomia progressiva que conduzisse à


formação de uma federação de Estados, devido à pressão internacional e aos custos de uma
guerra em África. Apesar desta tese ter sido defendida pelas altas esferas do Governo e pelas
Forças Armadas, estes, nem com o golpe de Botelho Moniz, conseguiram exonerar Salazar e,
muito menos, demovê-lo da ideia do velho Império português intocável.

A recusa do Governo português face à possibilidade de autonomia das colónias


africanas fez extremar as posições dos movimentos de libertação que, nos aos 50 e 60, se
foram formando na África portuguesa.

Em Angola, em 1955 nasceu a UPA (União das Populações de Angola), liderada por
Holden Roberto, que, em 1962, passou a designar-se FNLA (Frente de Libertação de Angola);
em 1956, nasceu o MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), liderado por
Agostinho Neto; e em 1966, nasceu a UNITA (União para a Independência Total de Angola),
liderado por Jonas Savimbi. Em Moçambique, nasceu em 1962 a FRELIMO (Frente de
Libertação de Moçambique), liderado por Eduardo Hondlane. E na Guiné, nasce em 1956 o
PAIGC (Partido de Independência da Guiné e Cabo Verde), liderado por Amílcar Cabral.

Deste modo, em março de 1961, o confronto armado iniciou-se no Norte de Angola,


com ataques da UPA a várias fazendas e postos administrativos portugueses. O Governo
português minimizou o caso, mas enviou, de imediato, um forte contingente militar, o qual
justificou com imagens das atrocidades cometidas pela UPA para com os brancos. Na altura,
como o ditador de Portugal, Salazar, afirmava, estava na altura de partir para a luta em Angola,
“rapidamente e em força!”. Mais tarde, a luta estender-se-ia a todo o território angolano por
ação do MPLA e da UNITA.

Assim, em 1961, houve sobressaltos em Luanda, da autoria de movimentos urbanos,


que atacaram duas esquadras policiais.

Em dezembro de 1961, Diu, Goa e Damão foram invadidos pelo exército da União
Indiana, e em pouco tempo, a guerra alastrou-se pelo território, obrigando à mobilização de
milhares de portugueses.

Em 1963, o conflito estendeu-se à Guiné e, em 1964, a Moçambique. Abriram-se,


assim, três frentes de combate, que exigiram um pesado sacrifício aos portugueses:

110
mobilização de 7% da população ativa e gasto de 40% do Orçamento Geral do Estado em
Defesa. Em 13 anos de combate, morreram, ficaram feridos e incapacitados milhares de
portugueses. A resistência portuguesa ultrapassou, em muitos, os prognósticos internacionais,
que previam a capitulação rápida desta nação pequena e economicamente atrasada. Mas,
apesar da forte tenacidade com que Portugal defendia a sua causa, este tinha, à partida, muito
poucas probabilidades de sucesso.

Em Moçambique, a FRELIMO tinha base de apoio na Tanzânia e a partir de 1970, o


governo português resolveu criar uma grande barragem em Cahora Bassa – uma das maiores
do mundo, mas que implicava um grande estaleiro no país. A FRELIMO decidiu abrir outra
frente em Tete, perto de Cahora Bassa. A situação chegou a estar completamente
descontrolada. Contudo, A FRELIMO era apoiada também por bases do Norte europeu, que
estavam contra o Império Colonial português, e pela Suécia.

Na Guiné, o PAIGC tinha o apoio da URSS, acesso fácil a mísseis e outro armamento
pesado.

Em 1955, quando Portugal entrou para a ONU, a questão das colónias começou a
ganhar uma dimensão internacional. No entanto, Portugal recusou logo submeter-se à
administração de “territórios não autónomos” estipulada na Carta, argumentando que as
províncias ultramarinas eram parte integrante do território português.

Ainda assim, após o debate com os países do Terceiro Mundo na Assembleia Geral,
concluiu-se, como é óbvio, que os territórios que estavam sob a administração portuguesa
eram colónias.

Estava vincada, assim, a primeira derrota de uma série delas que, progressivamente,
foram isolando os portugueses.

Então, em 1961, Portugal destacou-se no seio das Nações Unidas, pois teimava em não
cumprir os princípios da Carta, pelo que era castigado com apelos claros para que
reconhecesse a o direito à autodeterminação das colónias africanas.

Salazar mantinha-se irredutível, pelo que Portugal perdeu prestígio e foi excluído de
vários órgãos da ONU.

Para além da adversidade da ONU, Portugal, no início dos anos 60, enfrentou a
hostilidade da administração americana, pois durante a presidência de Kennedy, os
americanos estavam convictos que o prolongamento da guerra iria favorecer os interesses

111
soviéticos, uma vez que afastava os estados africanos de Portugal e, por consequência, dos
aliados da NATO.

Deste modo, os EUA financiaram alguns grupos nacionalistas (como foi o caso da UPA)
e propuseram sucessivos planos de descolonização, a Salazar, baseados num forte auxílio
económico. Mas o ditador português preferiu afirmar que ficaríamos “orgulhosamente sós”,
palavras que não seguiu à risca ao produzir uma intensa companha diplomática junto dos seus
aliados europeus e ao produzir operações de propaganda internacional, não descartando o
trunfo da base das Lajes (Açores), vital para os americanos. Por isto é que os EUA, apesar de
não concordarem com a política colonial portuguesa, mantinham-se “calados”, insistindo
apenas em pequenas reformas, o interesse falava mais alto. Os americanos queriam que o
acordo com Portugal relativamente à base das Lajes fosse renovado e, para isso acontecer, não
insistiam muito para Portugal fazer algo que não quisesse.

Assim, o Governo português conseguiu, durante a década de 60, sustentar a posição


colonial, apesar de, internamente, as dúvidas sobre a legitimidade do conflito e sobre o
desfecho terem aumentado o descontentamento da sociedade portuguesa.

Em 1968, sabia-se já que o futuro da guerra determinaria o futuro do regime.

No princípio de 1970, a situação colonial portuguesa estava mais ou menos controlada.


A guerra em África acabou por ter uma saída. As exportações faziam-se principalmente para a
Europa e baseavam-se no têxtil e na Agricultura. Era fundamental assegurar os mercados
europeus.

Nos anos de 1970, para entrar na União Europeia, Portugal tinha de resolver a guerra
em África. Isto levou ao golpe militar de 1974, que tinha como objetivos o cumprir o famoso
movimento dos 3D’s: Democratizar, Desenvolver e Descolonizar. O governo recém-criado
começou logo a tratar das situações coloniais.

Ainda no rescaldo do golpe militar, as pressões internacionais começam a sentir-se. A


10 de maio, a ONU e a OUA apelam à Junta de Salvação Nacional a favor da independência das
colónias.

As pressões internas residiam no facto de a maioria dos partidos ser favorável à


descolonização, o que mobiliza população até às ruas para fazer grandes manifestações.

Nesta conjuntura, o presidente Spínola assina, a contra gosto, a lei 7/74, que
reconhece a direito de independência das colónias.

112
Intensificam-se, então, as negociações com o PAIGC. Em 1974, assinaram-se acordos
que levaram a eleições em Cabo Verde que, depois das eleições, ficou independente,
juntamente com a Guiné – Julho 1975. Os grandes problemas eram em Moçambique e em
Angola.

O governo português negociou com a FRELIMO e chegaram a um consenso. O


problema foi os colonos brancos que tentaram, em 1974. Ganhar o controlo do país através de
um movimento. Este movimento falhou e levou ao êxito da saída dos colonos de Moçambique.
Contudo, é de salientar que Portugal não apoiava o movimento dos brancos, já que não queria
voltar a entrar em Guerra com a FRELIMO.

Os Moçambicanos não queriam forçar os brancos a sair de lá, mas com a revolta e a
formação de movimentos para alcançar o controlo do país, foram forçados a sair mais cedo,
mesmo antes da independência de 1975.

Com a independência, punha-se o problema da Rodésia do Sul/Zimbabué e o problema


da Cahora Bassa, visto que a barragem não conseguia vender a energia produzida.

Moçambique entrou em guerra com a Rodésia e com a África do Sul e deu-se uma
guerra civil com uma resistência, a RENAMO (Resistência Nacional Moçambicana), em 1975 e
1992. Deste modo, a situação só melhorou no final da década.

Em Angola, o exército colonial controlava a situação. Os movimentos perderam os


apoios estrangeiros e depois entraram os três em acordo, na conferência de Alvor – Portugal e
os três movimentos (UNITA, MPLA e FNLA) assumiram um movimento de transição para a
independência a 11 de novembro de 1975.

Foi esta independência mal resolvida e realizada “à pressa”, uma vez que Portugal
estava preocupado com a sua situação interna instável, após uma revolução (25 de abril) que
culminou numa guerra civil (1975-2002) que depôs a UNITA, o MPLA e a FNLA.

O MPLA pediu apoio a Cuba (que tinha governo dependente da URSS e já tinha tentado
intervir em África), pelo que os cubanos enviaram armas e contingentes militares. Com isto, a
FNLA foi praticamente eliminada de Luanda. Os Angolanos não estavam preparados para
combater contra os cubanos.

O conflito angolano estava internacionalizado. UNITA depois conseguiu implantar-se


pouco a pouco nas várias cidades do país.

113
No período colonial, a Angola vivia da exportação de matérias-primas, principalmente
o café. Em 1973, Angola deixou de ter o café como principal produto exportado, passando a
ser o petróleo o produto mais importante.

A Gulf Oil tinha concessão petrolífera em Cabinda. Isto permitiu a Angola assumir um
papel de potência petrolífera, que dava mais vantagem estratégica aos angolanos.

Com o interesse no ouro negro que ainda hoje move políticas, as nações estrangeiras
decidiram dar todo o apoio ao MPLA por causa do petróleo angolano, que já tinha potencial.

No anos 80, com a África do Sul, chegou-se à Iª solução política em que se previa a
retirada dos cubanos e dos sul africanos e chegou-se a acordo político para eleições – acordo
Bicesse.

Este acordo implicou a desmobilização da UNITA e do MPLA e a formação de um


governo conjunto. O MPLA ganhou, UNITA começou uma guerra civil. Nesta altura, não havia
nem apoio russo nem americano. Neste contexto, pode-se afirmar que os movimentos
angolanos foram incapazes de ultrapassar os antagonismos.

Os processos rodesiano e sul-africano (1965-1990)


A Rodésia foi dividida nos protetorados da Rodésia do Norte e Rodésia do Sul em 1911.
A parte norte encontra-se muito perto do Congo, apresentando um prolongamento do filão de
minérios. Como era rica em minerais, teve muitos investimentos na secção mineira e nos
meios de transporte. Já a parte sul era um país agrícola bastante rico (com plantações e
fazendas agrícolas). Foi o destino de emigração de muitos colonos europeus, onde foram
criadas grandes quintas inglesas de cereais. De resto, existia aqui um grande número de
ingleses colonos que queria ser tratado de forma diferente. Acabaram por formar um governo
autónomo que exclui a população negra. O controlo estende-se até 1923, momento em que se
passa à tutela direta das autoridades britânicas locais.

A Rodésia do Sul era uma colónia britânica, que desde o século XIX era um país com
colonos europeus. Foi por este motivo que, quando se começou a exigir a independência, a
população branca, que possuía grande poder naquele local, não estava disposta a consentir a
independência da Rodésia.

114
Em 1953, a Inglaterra decidiu juntar a Niassalândia à Rodésia do Norte e à Rodésia do
Sul, no que os britânicos chamaram a Federação da Rodésia e Niassalândia. Dadas as
diferenças existentes e a presença europeia intensa num deles, foi difícil manter a união. Os
europeus não queriam ser uma minoria numa união que integrava três países africanos, não
queriam perder as quintas. Em 1964, a Inglaterra concedeu a independência aos dois
territórios do norte, a Rodésia do Norte e a Niassalândia, atribuindo os nomes de Zâmbia e
Malawi, respetivamente. Entretanto, o mesmo foi negado à Rodésia, pois a minoria branca
negava-se a transmitir o poder à maioria negra. Em 1965, os colonos decidiram fazer uma
cessação das relações com a Inglaterra e o país não era reconhecido internacionalmente. Esta
independência foi apoiada pelos portugueses e sul-africanos, pois significava a continuação do
regime colonial da Rodésia do Sul.

Importa notar que as descolonizações portuguesas e as independências de Angola e


Moçambique tiveram um efeito acelerador e despoletaram os processos de independência do
resto da África Austral, pois desapareceu o apoio à Rodésia do Sul. Os movimentos
nacionalistas começaram a ter um apoio mais alargado de Moçambique, o que alterava
bastante a correlação de forças entre colonos brancos. Assim, entre 1975 e 1980, surgiram
guerrilhas por todo o território. Havia dois principais movimentos: Zanu (o povo Shona, cujo
principal representante era Robert Mugabe e tinha o apoio chinês e norte-coreano) e Zapu (o
povo Matabete, de Nkomo, que tinham apoio dos soviéticos). No entanto, as guerrilhas não
tinham condições para se desenvolver. Os países que rodeavam a Rodésia do Sul não
permitiam que a guerrilha tivesse apoio exterior: Botswana era protetorado, Moçambique e
Angola eram colónias portuguesas (Portugal não se atrevia a impor-se à Inglaterra) e a Rodésia
do Norte e Niassalândia tinham a independência há pouco tempo e não se queriam envolver.

Depois de cessar relações, os ingleses descobriram um país controlado pelo povo


Matabete quando chegaram à Rodésia do Sul. Moçambique entrou em guerra com a Rodésia e
com a África do Sul e deu-se uma guerra civil com uma resistência, a RENAMO, em 1977. As
coisas só melhoraram no final da década. Em 1979, a Inglaterra conseguiu convencer a Rodésia
do Sul a integrar o Sufrágio Universal, marcado para 1980. Nessas eleições, ganhou o partido
de Robert Mugabe. Em 1980, a Rodésia do Sul foi reconhecida como Estado independente,
passando a designar-se Zimbabwe. Com a descolonização portuguesa e a exclusão do
problema da Rodésia, restava um único território onde o regime colonial continuava em vigor.

A África do Sul era uma reunião de vários estados autónomos. Os ingleses instalaram-
se no século XIX. No Cabo cria-se uma colónia inglesa. Por outro lado, não distante do Cabo e
do Natal, ficavam as terras povoadas por colonos vindos da Holanda, no século XVII, e que

115
recebiam o nome de boers. Estas populações começaram a migrar para outras zonas da África
Austral, estabelecendo outras repúblicas bóer a norte e a leste. Deste modo, a África do Sul
englobava uma população heterogénea e ficou dividida em quatro grandes territórios: Cabo,
Natal, Orange e Transval (continha uma zona mineira). Joanesburgo era uma cidade que
permitia um fluxo mineiro entre o sul do Moçambique e o Transval. Ao longo do século XIX, os
ingleses anexaram essas regiões, antes de estalar a Guerra dos Boers.

Oito anos após o fim da Segunda Guerra dos Boeres e após quatro anos de negociação,
uma lei do parlamento britânico criou em 1910 a União Sul-Africana. A União era um estado
unilateral de domínio britânico que incluía as antigas colónias holandesas do Cabo e de Natal,
bem como as repúblicas do Estado Livre de Orange e do Transvaal. Os brancos pobres
correspondem aos boers agricultores.

Quando a África do Sul se torna numa zona industrial, a população bóer, dentro da
europeia, era a maia pobre. Os interesses estrangeiros passavam por um bom funcionamento
da economia sul-africana. Em 1948, o partido nacionalista boer foi eleito com maioria e chegou
ao poder. Este grupo político reforçou a segregação racial, que já tinha começado sob o
domínio colonial holandês e britânico. O Governo Nacionalista classificou todos os povos em
três raças, com direitos e limitações desenvolvidas para cada uma. A minoria branca
controlava a muito maior maioria negra. A segregação legalmente institucionalizada ficou
conhecida como Apartheid. Enquanto a minoria branca sul-africana usufruía do mais alto
padrão de vida de toda a África (comparável aos de nações de países desenvolvidos
ocidentais), a maioria negra ficou em desvantagem em quase todos os aspetos.

Entretanto, o ANC (African National Congress) era um partido que crescia para
combater o regime instaurado. Nos anos 60 e 70, a situação social e política da África do Sul
foi-se degradando cada vez mais. Entretanto, a descolonização portuguesa tinha um efeito de
contágio. Fazia-se grande pressão diplomática contra Asul, que continuava a financiar a
RENAMO em Moçambique. Nos anos 80, a conjuntura internacional levou a uma acentuada
queda dos preços do ouro. Os grandes interesses internacionais passavam por resolver a
tensão política que se fazia sentir. Havia, portanto, uma enorme pressão para que que o
Governo Boer começasse a ceder. A África do Sul estava nesta altura a sofrer vários boicotes.
Havia também uma situação de recessão económica, condições que fizeram com que o
governo estivesse se predispusesse a negociar.

O Acordo de Nkomati foi assinado em 1984 entre o governo de Moçambique e o


presidente da África do Sul. Este acordo tinha por intenção pôr termo à guerra civil em

116
Moçambique. Para tal, os signatários do dito acordo concordaram em deixar de apoiar a
RENAMO (responsabilidade da África do Sul) e o ANC (responsabilidade de Moçambique).
Apesar disto, cada parte continuou a agir por conta própria, e os guerrilheiros da RENAMO
prosseguiram com a guerra civil em Moçambique.

De Klerk é conhecido por fazer terminar o regime de apartheid, a política de


segregação racial da África do Sul, permitindo à maioria negra direitos civis iguais aos brancos,
asiáticos ou membros de outra qualquer etnia, transformando o seu país numa democracia.
Neste sentido, em 1990, sob a liderança do presidente F. W. de Klerk, o governo sul-africano
começa a desmantelar o sistema do apartheid, libertando Nelson Mandela, líder do ANC, e
aceitando legalizar esta organização, bem como outras antiapartheid. No mesmo ano A
Namíbia torna-se independente. Os passos seguintes no sentido da união nacional são dados
em 1991. A abertura das negociações entre os representantes de todas as comunidades, com
o objetivo de elaborar uma Constituição democrática e realizar um ato eleitoral, marca o fim
de uma época perturbada na África do Sul que iniciou-se em 1948 e teve seu fim em 1990. Em
1994 são realizadas as primeiras eleições multirraciais da história sul-africana. O ANC ganha as
eleições e o regime sul-africano estabiliza. Nelson Mandela, formando um Governo de unidade
nacional, torna-se o primeiro presidente sul-africano negro. Este processo não constitui uma
absoluta descolonização. Porém, a situação política verificada no interior dos quatro territórios
era semelhante à situação vigente nas Rodésias.

A emergência da China
A China localiza-se no Extremo Oriente e é uma potência industrial, que tem uma
unidade territorial que se manteve intacta desde a Antiguidade. Isto significa que a China não
sofreu grandes alterações em relação ao seu território durante mais de dois mil anos. Foi
durante muito tempo um país essencialmente rural, que utilizava técnicas avançadas na
produção de porcelana, seda e pólvora (produtos industriais). Isto significa que era um polo de
difusão de tecnologia, com novidades técnicas admiradas por outros países.

Até ao século XVI a China era um país fechado, pouco visitado e com escasso
reconhecimento português. Até este século, com a chegada dos Europeus por via marítima, a
rota da seda (muito extensa e não permitia transportar certos produtos) era a única rota
possível, daí que não houvesse grande relação comercial com a Europa, e daí ser considerado
um país fechado.

117
Entre os séculos XVI e XIX, passou a ser olhada com supremacia. A relação com a
Europa é invertida, com os europeus na supremacia. Com a introdução de novas culturas sul-
americanas como o milho e a chegada de plantas de alto rendimento, a China começou a ter
um grande crescimento demográfico. Se no século XVI já tinha cerca de 500 milhões de
habitantes, no século XIX a população já alcançava os 700 milhões de habitantes. Este
crescimento vai diferenciar a China dos outros países, pois é algo que não é recente. Além
disso, este crescimento desmedido provocou periodicamente o aumento das pressões
agrárias, o que conduziu a revoltas camponesas.

A nível do plano político, nos campos havia um estado central, governado por
autoridades locais. Os camponeses pagavam rendas e impostos e viviam do seu produto
produzido, o que leva a concluir que tinham uma agricultura de subsistência. Apesar do grande
rendimento, a maior parte dele ia para as rendas e impostos, o que levava à falta de
investimento. Um dos problemas da agricultura chinesa era o facto de ser muito instável, pois
estava sujeita às condições naturais.

Ainda no século XIX, ocorreu a Revolta dos Taiping (1850-60). Considerada por muitos
historiadores um dos mais sangrentos conflitos armados da história da humanidade, contou
com a participação dos Taiping (nacionalistas chineses), os quais surgiram de um duplo
protesto à presença estrangeira na China e ao governo imperial manchu. Esta revolta teve
como causas a impotência da elite tradicional e a inoperância da dinastia manchu em
enfrentar as sucessivas degradações impostas pelos ocidentais e provocou a morte de
aproximadamente 20 milhões de civis e militares e o enfraquecimento do governo central
chinês. Esta agitação acontecia paralelamente à entrada da Europa na China. É que a Europa
era agora superior à China a nível tecnológico, económico e político. Os ingleses queriam, em
especial, aproveitar o grande mercado chinês para a exportação de mercadorias inglesas e
indianas. Macau era uma região que recebia inúmeras exportações europeias.

Ainda no mesmo século, a China começou a consumir em quantidades crescentes uma


mercadoria indiana: o ópio. Este concentrado era produzido na Índia (concretamente na Costa
do Malabar, um trecho de litoral no sudoeste) e foi introduzido pelos portugueses e ingleses a
partir de Macau. Por razões comerciais e para proteger a sua balança comercial relativamente
excedentária, a China impôs barreiras à importação de produtos europeus, mas os ingleses
forçaram militarmente a China a abrir os seus portos à importação de mercadorias, gerando
assim as duas Guerras do Ópio. Estas consistiram em conflitos armados ocorridos entre a Grã-
Bretanha e a China nos anos de 1839-1842 e 1856-1860, que tiveram como causas a proibição
do tráfico do ópio por parte da China.

118
Ao mesmo tempo, a China não podia cobrar impostos, necessitando de pedir
empréstimos aos europeus. Ficava então com uma dívida, entrando num ciclo. Ao mesmo
tempo, a Rússia e o Japão foram entrando em áreas nortenhas da China e começaram a
ganhar poder, o que provocou um grande descontentamento, levando à guerra russo-japonesa
em disputa do território. A China atuava, portanto, como sujeito passivo. Embora a China não
tivesse sido uma colónia, ela esteve sob a influência do exterior durante parte do século XIX e
XX.

A implantação da República e a unificação do nacionalismo chinês


através do Kuo Min Tan (1911 – 1927)
No entanto, esta política imperial que permitia interferência estrangeira começou a ser
contestada. No princípio do século XX, a agricultura chinesa era elevada, mas instável. Nas
cidades orientais do norte e centro, a presença europeia criou um desenvolvimento urbano.
Assim, no século XX, sectores significativos da população chinesa começaram a defender a
consolidação de um movimento de natureza nacionalista. Em 1900, o médico Sun Yat-sen
capitaneou a fundação do Kuo-Min-Tan, também conhecido como Partido Nacionalista. Nessa
mesma época, a Revolta dos Boxers (1898 - 1901) também teve grande contribuição para a
articulação de um movimento defensor da autonomia chinesa e a expulsão dos estrangeiros.

A agitação provocada por tais movimentos acabou na proclamação da República, em


1911, No entanto, era uma república muito local, com um governo imperial em Pequim e sem
poder central. No fundo, era mais uma forma de querer alterar a política chinesa e incentivar à
sua autonomia, algo que não teve grande sucesso. O movimento Kuo-MinTan tentou
modernizar a China, através da aplicação da reforma agrária e da modernização da educação,
mas tinha uma base de apoio maioritariamente urbana mais ocidentalizada e não teve força
para se espalhar para o resto do território.

Mesmo com esta “conquista” e com o enfraquecimento dos imperialistas após a IGM,
a China continuava a não resistir ao interesse dos estrangeiros, principalmente dos japoneses
(cuja posição imperialista saiu favorecida da guerra) e britânicos. Quase toda a interferência
exterior ainda se mantinha. Com isso, os membros do Kuo-Min-Tan tiveram de enfrentar a
insatisfação dos chefes militares e do Partido Comunista Chinês, então criado sob a influência
da Revolução Russa. Aliás, aquando da realização da Conferência de Paz (1919), o Japão
manteve todas as suas bases na China, o que causou ainda mais descontentamento e causou
uma “segunda revolução”, pois isto não era o que esperavam quando o Japão entrou na SDN.

119
Foi neste contexto que se deu o Protesto Estudantil em Pequim, no dia 4 de maio de
1919, onde estudantes universitários chineses protestaram contra as resoluções do Tratado de
Versalhes, que atribuía terras chinesas ao Japão e concedia antigos territórios alemães na
região aos japoneses. Esta manifestação iniciou a revolução cultural na China, ou seja, a
modernidade. Chen Tu-hsiu foi um dos homens mais influentes, já que dirigia a revista “Nova
Juventude”, que se converteu na voz dos movimentos reformistas chineses.

Em 1920, enviou representantes a Moscovo para negociar com a URSS o apoio à China
(a política soviética apoiaria as colónias ocidentais na Ásia porque precisava de aliados
antiocidentais). Um dos representantes foi Chiang Kai-shek, que foi mesmo para Moscovo para
ter uma formação militar juntamente com um quadro exército chinês. A revolução russa
termina por volta de 1921/1922. Em 1923 a União Soviética (depois do triunfo dos
Bolcheviques) comprometeu-se a ajudar na unificação nacional da China. Os conselheiros
soviéticos começaram a chegar à China em 1923 para apoiar a reorganização e consolidação
do Kuo-Min-Tan com as linhas defendidas pelo Partido Comunista da União Soviética.

Kuo-Min-Tan dominava apenas uma parte do Sul da China: de Kuangtung até ao rio
Yangtse. Mesmo assim, nesta zona havia muitos militares e generais que não respondiam a
esse movimento. Mas em 1924 o apoio soviético viria a provocar um processo de unificação da
China. O Kuo-Min-Tan tinha três princípios: Democracia, Desenvolvimento e Nacionalismo,
bem como três políticas: apoio aos movimentos chineses, união com a URSS e integração com
o PCC. Assim, o PCC (Partido Comunista da China), movimento nacionalista chinês, recebeu as
instruções do Komintern para cooperar com o Kuo-Min-Tan e os seus membros foram
encorajados a juntar-se a eles, desde que as partes mantivessem suas identidades, formando
assim a Primeira Frente Unida entre as duas partes.

Com a morte de Sun Yat-sen em 1925, Chiang Kai-shek assume a liderança do partido
nacionalista. Decidido a reunificar a China, pretendia eliminar os comunistas e os senhores da
guerra. Em 1927, Chiang unificou a maior parte do território, e o país passou a ser
efetivamente controlado pelo Kuo-Min-Tan. Foi pela vontade de eliminar os comunistas que,
ainda em 1927, o Kuo-Min-Tan sofreu uma cisão interna, pois o seu líder queria livrar-se do
PCC, considerando-o um obstáculo. Este tinha apenas presença urbana, pelo que foi fácil
eliminar o partido, já que o país era maioritariamente rural. A União Soviética, por sua vez,
limitou-se a apoiar o que lhe aprecia ser o movimento mais forte.

120
O decénio de Nankin e a guerra civil – 1927-1937
Desde 1927 que o PCC, em expansão e cada vez mais afastado do modelo soviético,
havia entrado em conflito com o líder Kuo-Min-Tan Chiang Kai-shek. Desprovidos de um
exército na verdadeira aceção da palavra, os comunistas, acossados pelas tropas modernas e
prestigiadas de Kai-shek, foram obrigados a entrar na clandestinidade e a procurar refúgio nas
montanhas do Sul da China onde organizaram diversas células de intervenção local.

O período entre 1927 e 1937 ficou conhecido como Período de Nankin, que era a
capital política chinesa. Representava o período de domínio de Kuo Min Tan a partir de Nankin.
A China estava a modernizar-se, estava a adotar gradualmente o Capitalismo, numa época
seguinte ao período de recessão a nível internacional (recessão que quase não se sentiu na
China). No entanto, esta modernização era apenas superficial.

Ao longo dos anos, a população chinesa foi aumentando cada vez mais, mas a maioria
era composta por camponeses. A população camponesa era a que sustentava todo o país, toda
a superestrutura política chinesa, através de altos impostos.

Kuo Min Tan propunha um projeto de reforma agrária que acabou por deixar ficar no
papel. Desta forma, não modernizou a agricultura, alienando o apoio dos camponeses
chineses. Este projeto foi depois aproveitado pelo PCC, que tinha sido afastado das cidades,
como foi referido, e decidiu então aproximar-se da população rural para formar verdadeiros
sovietes. Os principais responsáveis por esta mudança de direção foram Peng P’ai e Mao Tsé-
Tung.

Em 1930, apesar das condições em que sobrevivia, o PCC proclamou a primeira


República Comunista Chinesa. A reação do Kuo-Min-Tan não se fez esperar. Os comunistas
foram cercados, encurralados e ameaçados de extermínio. É neste contexto que os seus
líderes decidem abandonar este refúgio, onde se destacavam as bases da província de Kiangsi,
na China do Sul, e juntar-se a um núcleo do partido entretanto constituído no Norte da China,
o Soviete de Shensi, próximo da fronteira com a URSS.

Deu-se a Grande Marcha, uma epopeia histórica de cerca de 10 mil quilómetros,


empreendida pelo exército vermelho comunista chinês entre outubro de 1934 e outubro de
1935. Em janeiro de 1935, o êxodo foi interrompido para que Mao Tsé-Tung fosse confirmado
como líder incontestado do partido.

A retirada prosseguiu depois, sempre sob condições dramáticas: desde logo, o terreno,
extremamente difícil, e as más condições climatéricas complicavam o avanço; por outro lado,

121
os ataques das forças de Chiang Kai-shek, agravados pela fome e pela doença que grassavam
entre os comunistas, provocaram baixas consideráveis. Até chegarem a Shensi, os homens da
Longa Marcha contornaram a China pelo Tibete, Koukor e Kansu. Aquilo que foi uma retirada
forçada converteu-se numa verdadeira vitória moral, num feito tornado épico, um verdadeiro
tónico na luta que conduziu o PCC ao poder.

Da invasão japonesa à 2º reunificação da China republicana (1937-


1949)
Pouco depois, terminou o Período de Nankin (1937). O Japão estendeu a sua zona de
influência ao território chinês a partir de 1931. Houve vários pretextos usados pelo Japão para
justificar a invasão, pois era um país que não tinha mais nenhum inimigo na Ásia. Começaram
com a conquista do norte do país, de Pequim a Shanghai, e até 1941 a China esteve sempre
sozinha, sem apoio para se defender da ocupação. Na China, a IIGM pode ser dividida em dois
períodos. O primeiro estendeu-se de 1937 até 1941, tendo terminado com a entrada dos EUA
no conflito. Até à entrada do Japão em guerra contra os EUA, a China manteve-se desapoiada a
lutar contra os japoneses.

O segundo período inicia-se a partir de 1941 e prossegue até 1945. Na China, o PCC
propôs ao Kuo-Min-Tan a renovação da união existente entre ambos anos antes. KuoMin-Tan
era apoiado pelos EUA e, depois, com a união com PCC, ambos os partidos estavam de mãos
dadas com os americanos.

No final da IIª Guerra Mundial, a partir de 1945, voltaram a instalar-se dois poderes
separados na China: Kuo Min Tang, perto de Nankin, com o apoio dos EUA; e o PCC, agora não
tão presente no campo, mas com apoio soviético.

Com o final da IIª Guerra Mundial, a URSS passou a apoiar o PCC e isso fez com que a
guerra civil de 1945 a 1949 levasse a China a ser dominada pelo Comunismo, quando se
proclamou República Popular da China.

Kuo Min Tan perdeu em muitos pontos.

122
Os planos quinquenais até ao fim do Grande Salto em Frente
Em 1949, a China continental foi unificada sob a República Popular da China, sendo
dominada pelo PCC. Mao Tsé-Tung tornou-se presidente em 1954. Já a Ilha Formosa formou a
República da China, sob o controlo do Kuo-Min-Tan. Criou-se duas Chinas, uma situação que
apresentava parecenças com a guerra que estalara no Vietname. A China beneficiava agora do
apoio soviético a todos os níveis. Todas as matérias-primas, alimentos e mão-de-obra
necessária eram provenientes do campo. Por outro lado, a população chinesa aumentou
bruscamente, à semelhança do que ocorrera nos EUA e na URSS. Porém, isto faria parte do
problema, pois existiam diferenças na base de apoio e a China dispunha de uma margem de
manobra mais pequena que os russos.

Mao Tsé-Tung pretendia tornar a República Popular da China numa nação


desenvolvida e socialmente igualitária em tempo recorde, acelerando a coletivização do
campo e a industrialização urbana. Queria modernizar-se a todo o custo e queria estar acima
de tudo o resto.

O maoismo caracterizou-se pela sua tendência marxista-leninista, considerando que a


estrutura tradicional da sociedade provocava um elevado nível de pobreza e desigualdade
social e recomendando uma constante análise das contradições na cultura, na sociedade e
mesmo no seio do Partido Comunista. Assim, o maoísmo, considerado uma vertente
fundamentalista do leninismo, preconizava a distribuição equitativa de bens e contrariava a
ambição pessoal, considerando que mesmo durante o período socialista existiu ainda luta
inter-classes. O primeiro plano quinquenal (1953-1957), inflexível, fez aumentar a superfície
cultivada e o aumento da produção agrícola no país. O PCC iniciou uma reforma agrária, na
qual os grandes latifundiários foram expropriados para se proceder a um justa distribuição de
terras, criando-se um cenário em que foi permitido aos que até à data tinham sido oprimidos
exercerem vingança sobre os mais favorecidos (sendo o mais comum o envio destes últimos
para os laogai, campos de trabalho). A China formou uma parceria com a URSS, que exportava
tecnologia para a China. Todos os investimentos eram direcionados para a indústria. No
entanto, a economia camponesa quase não se alterou, embora as cargas fiscais se tenham
elevado.

Com os planos quinquenais, a China cresceu quase 20%. E, para não depender tanto da
URSS a nível material, a China decidiu juntar-se ao Movimento dos Não Alinhados, criado
oficialmente na Conferência de Belgrado em 1961, a partir do impulsionamento dado por
Nehru (Índia), Nasser (Egito) e Tito (Jugoslávia), empenhados numa via política alternativa à
bipolarização mundial dos tempos da Guerra Fria.

123
Em 1950 a China tinha-se aliado à Rússia no contexto da Guerra Fria, tendo igualmente
participado na guerra da Coreia em favor da Coreia do Norte e na do Vietname contra França.
Contudo, as cordiais relações com a Rússia, que valeram à China a posse de tecnologia nuclear,
regrediram assim que Mao Tsé-Tung percebeu que os soviéticos temiam a força que uma
potência como a chinesa poderia alcançar. De facto, o "Grande Salto em Frente" (segundo
plano quinquenal, entre 1958 e 1962) procurou tornar a China uma das potências mundiais,
estipulando grandes objetivos de produção e investindo no fabrico de aço. Era o lançamento
de uma nova política, tendo em vista o redobrar de esforços, para que a China alcançasse
grandes níveis de produtividade.

A prioridade à indústria pesada foi substituída pelos campos, onde se deviam


desenvolver tanto as produções agrícolas como pequenas indústrias locais, baseadas na
tecnologia tradicional. A produção passou a ser dirigida por um elemento do partido. A vida
camponesa foi reorganizada em comunas populares que partilhavam de um modo de vida
comunitário. E ainda se realizaram campanhas para mobilizar os chineses para este socialismo
original, onde o país agrário se erguia.

Ainda assim, este processo não teve tanto êxito, já que a agricultura estava muito
“danificada” e as colheitas eram fracas e pobres, o que afetava gravemente a indústria. O
resultado foi mesmo um estrondoso fracasso, traduzido em milhões de mortos por
subnutrição, tão fortemente foram sentidas as faltas de apoios materiais e técnicos.

A rutura com a URSS e a “Revolução Cultural”


A cisão entre a China e o bloco soviético deu-se sob o governo de Mao Tsé-Tung,
particularmente nos anos 60 do século XX. Houve diversas razões para esta rutura, como o
"Grande Salto em Frente", política posta em prática por Mao e que visava tornar a China um
forte exportador a nível mundial, estabelecendo objetivos de produção impossíveis de
concretizar e investindo no fabrico de aço. Na prática, o objetivo era coletivizar a agricultura e
fomentar as pequenas indústrias. Contudo, a ajuda técnica da Rússia foi suspensa por
Khrushchev, uma vez que este considerava que a China tendia a radicalizar a expansão pelo
mundo da revolução comunista, sem esperar que as estruturas se adaptassem. Como
consequência desta falta de apoio, grassaram fomes por diversas vezes na China, no
seguimento dos problemas causados pelo "Grande Salto em Frente" (que acabou em 1960) e
do clima desfavorável.

124
Estes problemas foram reprovados pela União Soviética e, por sua vez, Mao Tsé-Tung
criticando aquilo que achava ser permissividade, como a desestalinização, suspendeu as
relações com os soviéticos entre os anos de 1960 e 1962, lutando energicamente contra o
imperialismo da América do Norte, o socioimperialismo da URSS e o revisionismo soviético
(que tentava apoderar-se do Partido Comunista para o transformar num órgão fascista ao
serviço da burguesia, com figuras proeminentes como Thorez, Khroutchev e Togliatti).

Por outro lado, criaram-se entre a China e a URSS conflitos pelo poder do mundo
comunista, agravados pela morte de Estaline e a subida ao poder de Krushchev, uma vez que
Mao, pela antiguidade, se considerou o líder da verdadeira doutrina marxista. No entanto, este
não possuía os predicados militares e políticos da Rússia, estando em inferioridade neste
sentido. Assim, o tratado assinado em 1950 com a URSS e a promessa de ajudar a conseguir a
bomba atómica para a China ficaram sem efeito, tendo sido agravadas as relações entre as
duas potências pelo bombardeamento dos ilhotes de Matsu e Quemoy (estreito da Formosa),
pertencentes a Taiwan, que era apoiada pelos EUA. Como a URSS se manteve neutral, a China
acusou os soviéticos de aliança com as potências ocidentais capitalistas, algo que desviava o
seu ideal socialista. Alinhando-se a Albânia à China em 1962, foi também nesse ano que a URSS
apoiou a Índia na luta contra a pretensão chinesa de posse do Tibete. Dois anos depois o
panorama agravou-se, uma vez que a China produziu a primeira bomba atómica.

No que diz respeito ao “Grande salto em frente”, este assemelhou-se, em termos


políticos, a uma revolução dentro do PCC. Em termos sociais, foi como se tivesse sido criado e
instaurado um novo regime na China. Portanto, era preciso eliminar tudo o que se relacionasse
com a China antiga, criando tudo de raiz para que se fundasse uma nova China moderna. Os
primórdios da Revolução Cultural (estribada num dos preceitos maoistas, em que qualquer
revolução deveria adequar-se à realidade concreta do país em questão), que se começaram a
fazer sentir em 1965, inauguraram um negro período na história da China, sendo que os jovens
Guardas Vermelhos assumiram um radicalismo da doutrina maoista desrespeitando tudo
aquilo que tinha até então formado durante milénios a China, desde a estima devida à idade às
artes tradicionais, com o intuito de acelerar a construção da sociedade comunista. Com o
objetivo de recuperar o ideal revolucionário, Mao lançou uma intensa campanha tendo em
vista a transformação radical das mentalidades. A população chinesa viu nesta revolução uma
forma de extrapolar e descarregar, dadas as dificuldades de tantos anos de fome e pobreza.
Havia mesmo o risco de esta revolução sair do controlo do PCC que, ao criar tantas revoluções,
corria agora o risco de ser alvo das mesmas. Uma das mais dinâmicas ativistas foi a própria
mulher de Mao, Jiang Ching, que governou nos últimos anos de vida do marido. Contudo, após

125
a morte do chamado Grande Timoneiro, esta revolução foi condenada. A partir de 1974, a
situação estabilizou e o PCC tomou o controlo do país. Em 1975, morreu Mao Tsé-Tung e
voltou a instabilidade à China – durou até 1977.

Deve-se ainda referir que no mundo ocidental, em países como Bélgica, Noruega,
Grécia, França, Itália, Espanha, Portugal (através da UDP, por exemplo), Alemanha e alguns dos
ditos menos desenvolvidos de outros continentes, como o Peru (guerrilha maoísta do Sendero
Luminoso), entre outros, houve tentativas de implantação da doutrina maoísta. Na Albânia,
por exemplo, o regime de Enver Hoxha foi todo ele maoista, tendo o país servido como centro
de formação de células maoístas, como por exemplo da UDP portuguesa.

A nova política de internacionalização


Após a morte de Mao Tsé-Tung, o êxito das novas economias asiáticas levou à abolição
do fracassado maoísmo em prol da “modernização” da China. A China integrou-se, então, nos
sistemas financeiro e comercial internacionais e adotou as regras da economia de mercado.

A missão de mudar a face da China foi assumida por Deng Xiaoping, este lança um
conjunto de medidas que define como socialismo de mercado, ou seja, defende que a China
deve ser um país com dois sistemas diferentes. Aproveita o capitalismo e tenta articulá-lo com
o socialismo.

Deng dividiu a China em duas áreas geográficas distintas. O interior, essencialmente


rural, permaneceria resguardado da influência externa. Mas o sistema agrário foi
reestruturado, pelo que muitas terras foram descoletivizadas e arrendadas aos camponeses,
que puderam comercializar os excedentes, num mercado livre (a produção agrícola cresceu
50%). O litoral passa a estar aberto ao capital estrangeiro, integrando-se plenamente no
mercado internacional, onde se instalaram indústrias, que agora privilegiam produtos de
consumo e a exportação, em 4 zonas económicas especiais (ZEE), dotadas de uma legislação
ultraliberal, favorável aos negócios.

Sendo assim, as empresas de todo o Mundo foram convidadas a estabelecer-se nestas


áreas através de contratos de parceria com empresas locais e da abertura de filiais, o que
resultou num crescente número de contratos a partir de 1983 e na abertura de novas cidades
ao investimento estrangeiro.

A China enceta um processo de entendimento pacífico com o Ocidente, no quadro da


sua afirmação como alternativa ao modelo socialista soviético que saía fragilizado.

126
No entanto, este processo foi facilitado pelo restabelecimento de relações
diplomáticas com o Japão e com a URSS e pela integração da China nos circuitos económicos
mundiais como o FMI, Banco Mundial (fonte de importantes fundos de auxílio económico) e o
GATT.

Desde 1981 que o crescimento económico da China tem sido impressionante, até
porque esta detém um potencial muito superior ao dos seus parceiros asiáticos em recursos
naturais e mão-de-obra, pelo que a competitividade do país se baseia na multidão de
trabalhadores mal pagos e sem regalias.

Neste país socialista, as desigualdades entre o litoral e o interior, os ricos e os pobres


crescem abruptamente, pelo que a liberalização económica jamais foi acompanhada pela
liberalização.

Contudo, esta política de abertura ao exterior manteve-se até aos dias de hoje. A
China transformou-se num grande exportador e reinveste os lucros no seu país e em países
capitalistas industrializados do Ocidente. Hoje, a China é o maior credor da dívida pública dos
EUA. Tem um controlo estatal muito elevado e um controlo sociopolítico igualmente elevado.

Neste contexto e, para concluir, o presidente Clinton afirma, em Pequim, a 27 de junho


de 1998, que a “China já não é o país que era quando o presidente Nixon, [ali foi] pela primeira
vez, há 26 anos. Nunca antes tiveram tantos chineses a oportunidade de iniciarem negócios; de
arrancarem as suas famílias à pobreza; de escolherem os locais para viver, trabalhar, viajar; de
tirarem proveito dos frutos do trabalho. Mas também há resistência à mudança, um legado da
História, que nem sempre tem sido bondosa para o povo chinês, o que deu origem a um
profundo receio de instabilidade. Hoje, em Pequim, vou reunir-me com líderes chineses para
falarmos sobre o futuro dos nossos dois países, e a relação entre nós é fundamental para a
existência, no próximo século, de um mundo pacífico, estável e próspero.

A China, com maior população do planeta, com um lugar permanente no Conselho de


Segurança das Nações Unidas e com uma economia cada vez mais ligada à nossa, é
importante para o nosso futuro. Sem a China será difícil enfrentar, com sucesso, os desafios
que nos afetam a todos.”

127
Os equilíbrios mundiais na época da Guerra Fria
Após a 2ªG.M., alteraram-se forças nas relações internacionais. A Alemanha e o Japão,
antigas potências, saíram da guerra vencidos e humilhados. O Reino Unido e a França, embora
vitoriosos, ficaram empobrecidos e dependentes da ajuda externa. Restaram, apenas, duas
potências que se agigantaram: a URSS, pela força do exército vermelho, e os EUA,
definitivamente, 1ª potência mundial.

Então, depois da 2ªGuerra, a União Soviética ganhou não só territórios, mas também
um grande prestígio internacional. A URSS abandonara a sua política isolacionista, passando a
participar na definição de novas coordenadas geopolíticas.

A URSS detinha, assim, uma clara vantagem estratégica na Europa de Leste. Apesar dos
acordos de Ialta preverem o respeito pela vontade dos povos, na prática tornava-se impossível
contrariar a hegemonia soviética que, como se impôs, entre 1946-1948, converteu todos os
países libertados pelo exército vermelho ao socialismo, isto com o objetivo de dividir o mundo
capitalista e o mundo pró-soviético; defender o seu território; e também para não perder força
mesmo após ter perdido tantos homens na Guerra.

Este rápido processo de sovietização foi, de imediato, contestado pelos ocidentais,


nomeadamente por Churchill que denuncia a criação, por parte da URSS, de uma área de
influência impenetrável, isolado do Ocidente por uma “cortina de ferro”. Perante tal afirmação
de Churchill, Estaline reage, afirmando, num entrevista ao jornal Pravda, a 14 de março de
1946, que “[o] aumento da influência do comunismo não pode ser considerado acidental. […]
Cresceu porque, durante os duros anos de domínio fascista na Europa, os comunistas foram, na
luta contra o regime fascistas em prol da liberdade dos povos, combatentes fiáveis, audazes e
com espírito de sacrifício”, o que acaba, simultaneamente por comprovar a descrição histórica
do parágrafo anterior.

Menos de um ano após a 2ª G.M. e o alargamento da influência soviética


desencadeava um novo medir de forças, entre o mundo comunista e capitalista,
desrespeitando os ideais de concórdia e fraternidade em que se baseou a criação da ONU.

Quando, em 1946, Churchill afirmou que a Europa estava dividida por uma “cortina de
ferro”, o processo de sovietização era já irreversível e, para os ocidentais, inaceitável, pois
constituía uma ameaça ao modelo capitalista e liberal.

Sob a tutela diplomática e militar da URSS, os partidos comunistas ganhavam forças e,


progressivamente, tomavam o poder. Para beneficiar esta ação, criou-se o Kominform (1947) –

128
subsidia os partidos comunistas do mundo inteiro –, que era um importante organismo de
controlo por parte da URSS – doutrina de Jadnov. Deste modo, Andrei Jdanov justifica-se, na
Conferência do Kominform, afirmando que “[o]s políticos imperialistas mais enfurecidos e
desequilibrados começaram, depois de Churchill, a estabelecer planos com vista a
organizarem, o mais depressa possível, uma guerra preventiva contra a URSS. […]”

Em 1947, os EUA assumem, fortemente, a liderança da oposição aos avanços do


socialismo. Truman expõe a sua visão de um mundo dividido em dois sistemas antagónicos:
um baseado na liberdade e outro na opressão.

Perante o enfraquecimento da Europa, os americanos teriam de liderar o mundo livre


e auxilia-lo na contenção do comunismo – doutrina de Truman.

A doutrina de Truman baseava-se na ideia de que, passando a citar, “[n]o atual


momento da história do mundo, quase todas as nações têm de escolher entre dois modos de
vida. […] Um dos modos de vida baseia-se na vontade da maioria e distingue-se pelas suas
instituições livres, por um governo representativo, por eleições livres, pelas garantias de
liberdade individual, de liberdade de expressão e de religião e pela ausência de opressão
política. O segundo modo de vida baseia-se na vontade da minoria imposta pela força à
maioria. Assenta no terror e na opressão, numa imprensa e numa rádio controladas, em
eleições viciadas e na supressão das liberdades individuais. […] Penso que a política dos
Estados Unidos deve ser a de apoiar os povos livres que se encontram a desenvolver acções de
resistência contra as tentativas de subjugação lançadas por minorias armadas e apoiadas por
pressões externas,”, começava, assim, os sucessivos ataques e reações caracterizadores do
tempo da Guerra Fria.

Além disso, a situação de miséria europeia associada às perdas humanas e materiais da


guerra e ao inverno rigoroso do imediato pós-guerra deixava clara a necessidade dos EUA
ajudarem a Europa a reerguer-se economicamente para que esta não caísse nas ideias de
igualdade e justiça marxismo.

Neste sentido, o secretário de Estado americano George Marshall criou, em junho de


1947, o Plano Marshall, que consistiu num gigantesco plano de ajuda económica à Europa.

O Plano Marshall foi oferecido a toda a Europa, incluindo os países sob influência
soviética, pelo que a URSS impede os países sob a sua influência de aceitarem o Plano norte-
americano, considerando-o uma “manobra imperialista”. Por isso é que Maurice Thorez,

129
dirigente do Partido Comunista Francês afirmou que “o Plano Marshall [era] uma máquina de
guerra contra os povos e contra o comunismo.”

Pouco depois, Andrei Jdanov formaliza a rutura entre as duas potências, afirmando
que o mundo se divide, de facto, em dois sistemas contrários: um imperialista e
antidemocrático, os EUA; e outro democrático e fraterno, a URSS – doutrina de Jdanov.

Em janeiro de 1949, como resposta da URSS, surge o Plano Molotov que estabelece as
estruturas de cooperação económica da Europa Oriental. Foi no âmbito deste plano que se
criou o COMECON (Conselho de Assistência Económica Mútua), destinado a promover o
desenvolvimento integrado dos países comunistas, sob a égide da URSS.

Os países abrangidos pelo Plano Molotov recebiam os fundos norte-americanos


através da OECE (Organização Europeia de Cooperação Económica), que os distribuía de forma
eficiente.

Deste modo, a OECE e o COMECON funcionaram como áreas transacionais, coesas e


distintas, consolidando a antagonia da liderança de duas superpotências mundiais.

O clima de desentendimento e confrontação entre a URSS e os EUA refletiu-se de


imediato na gestão conjunta do território alemão que, devido à Conferência de Potsdam, se
encontrava dividido e ocupado pelas quatro potências vencedoras.

A expansão do comunismo no primeiro ano de paz fez com que os ingleses, franceses e
americanos vissem a Alemanha como um aliado imprescindível à contenção do avanço
soviético. Por isso, o governo americano considerou necessário restaurar a independência e o
poder económico da Alemanha.

Deste modo, em março de 1948, EUA, Inglaterra e França unificaram as suas zonas de
ocupação, formando, em junho, uma assembleia constituinte e uma nova moeda.

Em junho de 1948, os soviéticos, que defendiam uma Alemanha unificada,


protestaram contra a violação dos acordos de Potsdam (que previam a ocupação, mas sempre
com a autonomia do Estado ocupado) e, uma vez que em Berlim, situado no coração da área
soviética, continuavam estacionadas as forças militares das três potências ocidentais, Estaline
bloqueia aos três aliados todos os acessos terrestres entre a área ocidental de Berlim e a
Alemanha ocidental, a fim de forçar a retirada dessas forças.

130
O Bloqueio de Berlim (junho de 1948 – maio de 1949) foi o primeiro medir de forças
entre as duas superpotências e dura apenas um ano, porque Estaline sabia que ao manter este
sistema, podia estar a promover a criação de um terceiro conflito mundial.

O Bloqueio termina e, simultaneamente, os aliados ocidentais criam uma república


federal constituída pelos territórios que se encontram sob a sua influência, a República Federal
Alemã (RFA), em maio de 1949.

Apesar do protesto soviético devido à violação dos acordos estabelecidos, a URSS, em


tom de resposta, cria, em outubro de 1949, a República Democrática Alemã (RDA). Assim,
antigos Aliados tinham-se tornado rivais e a sua rivalidade dividia o Mundo, pondo em risco os
esforços de paz.

As relações internacionais refletiram esta instabilidade e impregnaram-se de um clima


de forte tensão e desconfiança: foi o tempo da Guerra Fria.

O afrontamento entre as duas superpotências e os seus aliados prolongou-se até


meados dos anos 80, quando a URSS mostra os primeiros sinais de fraqueza.

Durante este longo período, os EUA e a URSS intimidaram-se mutuamente,


prevalecendo um clima de tensão internacional, designado por Guerra Fria (1948-1985).

A Guerra Fria caracterizou-se pela participação em conflitos regionais e pela corrida


aos armamentos, uma vez que estas duas potências tentavam superiorizar-se constantemente,
quer no armamento nuclear quer na ampliação das suas áreas de influência. Não havendo
confrontos bélicos, este clima de tensão pautava-se pelo equilíbrio das duas forças associado
ao terror que uma guerra entre estas duas potências podia gerar, pois ambas possuíam as
tenebrosas bombas atómicas. Até porque já George Washington afirmava que “estar
preparado para a guerra [era] um dos meios mais eficazes de preservar a paz”.

Simultaneamente, nas áreas de influência de cada país propagandeava-se a


superioridade do país influente em relação ao outro, fomentando também a rejeição e o
temor do lado contrário.

Mais do que duas ambições hegemónicas, estávamos perante duas superpotências


com duas conceções opostas de organização política, vida económica e estruturação social que
se confrontam: o liberalismo e o marxismo.

Deste modo, o mundo capitalista e o mundo comunista evoluíram separadamente,


mas acabando por se influenciar inevitavelmente.

131
No mundo capitalista, lançada a doutrina de Truman, os EUA empenharam-se na
contenção do comunismo. O primeiro passo foi, então, o Plano Marshall, que permitiu a
reconstrução da economia europeia ocidental em moldes capitalistas, estreitando as relações
com a Europa ocidental.

A tensão procurava pelo Bloqueio de Berlim acelerou as negociações, em termos


político-militares, das alianças entre os ocidentais, que culminaram no Tratado do Atlântico
Norte (1949), onde se fundou a Organização do Tratado do Atlântico Norte – OTAN/NATO –,
organização militar que se tornou um símbolo do bloco ocidental.

O pacto do OTAN, firmado entre os EUA, Canadá e dez nações europeias, revelava a
desconfiança que residia nas relações internacionais. E os seus membros fundadores
consideravam-se ligados por uma “herança civilizacional comum”, cuja preservação exige o
desenvolvimento da “capacidade individual ou coletiva de resistir a um ataque armado”.

Deste modo, a aliança é uma organização puramente defensiva, empenhada em


resistir à omnipresença da União Soviética e ao que ela representava para o mundo ocidental.
Foi, então, a fim de impedir o avanço do comunismo e de consolidar as áreas de influência
americanas, que os EUA se lançaram numa autêntica “pactomania” que os levou a construir
um vasto leque de alianças multilaterais (OTASE) que também lhes asseguravam uma certa
estabilidade no caso de uma possível guerra.

Em suma, e segundo J. F. Dulles, secretário de Estado norte-americano (1954), esta


“pactomania” justifica-se, uma vez que “[o] perigo [comunista] manifesta-se sob múltiplas
formas. Uma destas formas é a agressão armada aberta. Podemos reduzir grandemente este
risco declarando claramente que um ataque contra a zona coberta pelo tratado desencadearia
uma reação tão unida, tão forte e tão bem direcionada que o agressor perderia mais do que
poderia ganhar. […]”

Estas alianças foram complementadas com diversos acordos de caráter político e


económico, de tal forma que, cerca de1959, 75% do Mundo alinhava, de uma forma ou de
outra, pelo bloco americano.

No entanto, em 1955, a URSS já tinha respondido a esta estratégia com o Pacto de


Varsóvia.

No mundo comunista, em 1945, havia apenas dois países: a URSS e a Mongólia.

132
No entanto, o comunismo foi-se expandindo e, entre 1945 e 1949, implantou-se na
Europa Oriental, na Coreia do Norte e na China. Em 1950 e 60 atinge o Vietname do Norte,
Camboja e Birmânia e, mesmo perto dos EUA, chega a Cuba. Por fim, na década de 70,
conquista países asiáticos e a África Negra.

A URSS, tanto pelo seu poderio como por ser pioneiro na implantação do comunismo,
encontra-se à cabeça deste mundo comunista, onde, devido ao clima de tensão da guerra fria,
organizou, a partir do Kominform, uma campanha internacional contra os EUA. Como resposta,
nos EUA, surge uma campanha de propaganda que denunciava o perigo comunista
(Maccartismo).

A expansão do mundo comunista fez-se, em grande parte, sob a égide da URSS. Após a
2ªG.M., o reforço da posição militar soviética e o processo de descolonização criaram
condições favoráveis à expansão do comunismo e ao estreitamento dos laços e da cooperação
entre Moscovo e os países recentemente emancipados.

A URSS abandona, então, como eu já tinha referido, a sua política isolacionista que
mantinha desde a Revolução de Outubro e alarga a sua influência aos quatro continentes.

A primeira vaga de expansão do comunismo atingiu a Europa Oriental, com


exceção da Jugoslávia, sob pressão direta da URSS. K. Adenauer, político alemão afirma, então,
em 1953 que “[a] União Soviética […], desde 1945, aumentou consideravelmente os territórios
sob o seu domínio. Por meio da Guerra Fria procura aumentá-los ainda mais. A União Soviética
nega a liberdade pessoal. A sua força assenta nos princípios da ditatura totalitária”, como
teremos oportunidade de ver já a seguir.Em 1948, os partidos comunistas dos países de Leste
já se assumiam como partidos únicos, reorganizando, pouco depois, a vida política, social e
económica e passando a ser designados por democracias populares. Estas defendem que a
gestão do Estado pertence, em exclusivo, às classes trabalhadoras, representantes da maioria,
que “exercem o poder” através do partido comunista, defensor dos interesses desta. Apesar
de existirem eleições de sufrágio universal, os dirigentes do Partido ocupam, também, os altos
cargos do Estado, definindo a vida política, as ações económicas e o enquadramento
ideológico e cultural dos cidadãos.

Em 1955, os laços entre as democracias populares foram reforçados com o Pacto de


Varsóvia, aliança militar que constituía uma resposta à NATO (antagonismo militar) e previa
uma resposta conjunta em caso de agressão.

133
Considerando-se a “pátria do socialismo”, a URSS impôs o seu modelo único e rígido,
do qual não admitiu desvios, pelo que Brejnev (líder soviético) assumiu, perante o mundo, que
a soberania dos países do Pacto de Varsóvia encontrava-se limitada pelos superiores interesses
do socialismo.

Foi, então, esta hegemonia comunista “intocável”, na Europa Oriental, que conduziu à
construção do Muro de Berlim (1961), símbolo da Guerra Fria na Europa e no Mundo. Porém,
em 1953, Malenkov, político soviético e líder do Partido Comunista da URSS, afirma,
contrariando K. Adenauer, que “[a] União Soviética segue e seguirá sempre invariavelmente
uma política de paz. A União Soviética não tem o propósito de atacar quem quer que seja, e os
desígnios agressivos são-lhe alheios.”

Outro caso de expansão do comunismo, a meu ver, extremamente importante para a


História no contexto da Guerra Fria, foi quando a URSS chegou à América Latina (anos 60/70),
sendo que o ponto fulcral desta expansão neste continente foi Cuba onde, em 1959, a
Revolução Cubana, dirigida por Fidel Castro e Che Guevara, derruba o regime corrompido e
opressivo de Fulgêncio Batista (pró-americano).

Embora sem ligações iniciais a Moscovo, a Cuba comunista cria a hostilidade nos EUA,
que tentam uma retoma falhada do poder por exilados anticastristas, localizados nas prisões
americanas da Baía dos Porcos (abril de 1961).

Como consequência, Fidel Castro aceita o apoio da URSS e Cuba transforma-se num
bastião avançado do comunismo na América Central. A influência soviética em Cuba é
confirmada quando, a 16 de outubro de 1962, aviões americanos obtém provas fotográficas da
instalação, na ilha, de mísseis russos de médio alcance, capazes de atingir o território
americano.

A 18 de outubro, o presidente Kennedy toma conhecimento do transporte em navios


soviéticos de mísseis em direção a Cuba e, apesar das ameaças que põem a opinião pública em
pânico, o Governo dos EUA opta pelo bloqueio naval à ilha, decretado a 22 de outubro.

No meio disto tudo, e de forma a promover a paz com receio da opinião pública, o
presidente Kennedy faz um discurso, passando a citar um breve excerto: “Apelo ao Presidente
Kruchtchev para que cesse e elimine esta ameaça clandestina, temerária e provocatória, à paz
no mundo e às relações estáveis entre as nossas duas nações. Apelo, além disso, para que
abandone esta competição pelo domínio do mundo e para que se junte a nós num esforço

134
histórico, para pôr fim à perigosa corrida aos armamentos e para transformar a história do
homem.”

Doze cargueiros russos invertem, então, a marcha, acabando por haver cedências
mutúas: Kruchtchev aceita retirar os mísseis e os EUA comprometeram-se a não tentar
derrubar, novamente, o regime cubano.

Cuba, que não pretendia ter ligações ao regime soviético, desempenhou, também, um
papel ativo na proliferação do comunismo, nomeadamente, nos anos 70, na Guatemala, El
Salvador e Nicarágua com uma pequena ajuda da URSS.

Facto é que a II Guerra Mundial veio a provocar uma acentuada quebra na


produção industrial e consequente degradação económica da URSS. Deste modo, Estaline,
agora também estimulado pela competição com os EUA, consolida a implementação dos seus
planos quinquenais, pelo que é privilegiado o desenvolvimento da indústria pesada e a
produção de armamento, no quadro político-militar da Guerra Fria. Todavia, a sua orientação
económica estalinista não tinha em conta a necessidade de produzir bens de consumo e de
criar outras condições socioeconómicas, no sentido de repor níveis de produtividade capazes
de proporcionar o bem-estar das populações. A vida do povo na URSS degradava-se cada vez
mais: a carga horária de trabalho era excessiva; os salários eram baixos; havia carência de bens
de toda a espécie; e as habitações eram precárias.

É contra esta orientação que se afirma Nikita Kruchtchev, sucessor de Estaline. Depois
do primeiro impulso industrializador, as economias planificadas começaram a mostrar, de
forma evidente, as duas debilidades.

A planificação excessiva é um obstáculo para as empresas, que não possuem


autonomia na seleção das produções, do equipamento e dos trabalhadores, na fixação de
salários e preços ou na escolha de fornecedores e clientes. Limitavam-se a seguir uma gestão
burocrática, cujo objetivo é atingir as metas do plano independentemente da qualidade do
produto ou da rentabilidade dos equipamentos e mão-de-obra.

Nas unidades agrícolas, a falta de investimento e de organização e o desânimo dos


camponeses reflete-se nos baixos níveis de produtividade, pelo que o Leste passa de
exportador de cereais para importador.

Kruchtchev apresentou, então, um relatório que criticava os erros e os crimes de


Estaline. Numerosos presos foram libertados e a política cultural liberalizou-se. No entanto,

135
sem nunca pôr em causa o sistema, e para fazer face aos sintomas de estagnação económica,
implementou, nos anos 60, um vasto conjunto de reformas em praticamente todos os países
da Europa socialista. Assim, num novo plano, iniciado em 1959: reforça os investimentos nas
indústrias de consumo, habitação e agricultura; reduz o número de horas de trabalho e da
reforma; e cria sistemas de prémios aos trabalhadores mais ativos.

Estas medidas ficaram muito aquém das expectativas e, na década de 70, Brejnev volta
a reforçar a burocracia, o que alastra uma onda de corrupção, volta a dar prioridade à indústria
pesada e à exploração de recursos naturais (ouro, gás e petróleo na Sibéria). Mas os custos
inerentes à exploração longínqua e gélida refletiram-se num período de estagnação da
economia soviética.

As dificuldades soviéticas refletiram-se em todos os países-satélite, pelo que estes


bloqueios conduziram à falência dos regimes comunistas europeus, no fim dos anos 80.

Decorrente do já falado método expansionista da URSS, a República Popular da


China é outro país que foi influenciado pelo grande estado socialista da época. Mao Tsé-Tung
proclamou, em outubro de 1949, a instauração de uma República Popular, após uma longa
luta que se iniciara nos anos 20 e se reacendera com o fim da 2ªG.M.. Apesar do apoio da
URSS não ter sido decisivo para a vitória alcançada, poucos meses depois, o Governo chinês
assinou, em Moscovo, um Tratado de Amizade, Aliança e Assistência Mútua, o que coloca a
China na esfera soviética, pelo que, até à morte de Estaline, a China seguiu o modelo político e
económico russo, tendo-se afastado dele, posteriormente.

Mao Tsé-Tung, líder do comunismo chinês, rapidamente se elevou à condição de


grande teórico marxista, ombreando Lenine e Estaline. Assim, variando a ideologia comunista,
criou o maoísmo, que tinha como objetivo a revolução total protagonizada pelas massas
(ênfase aos camponeses) e não pelas estruturas do poder. Para isso, recorreu a grandes
campanhas de natureza ideológica destinadas a mobilizar as populações para as grandes
transformações revolucionárias.

Neste contexto, e face aos maus resultados económicos derivados do “Grande Salto
em Frente” (programa de remodelação e fomento económico), Mao Tsé-Tung procurava uma
via económica diferente, criticando Kruchtvev, a sua política de coexistência pacífica e os seus
desvios do ideal socialista (denúncia do revisionismo soviético), uma vez que a China se
considerava o único país verdadeiramente socialista. Contudo, foi o fracasso da campanha
agrícola anterior que fez com que Mao Tsé-Tung fosse afastado do poder em 1960. Este, não

136
satisfeito, e a fim de recuperar o poder que lhe tinha sido tirado bem como eliminar os seus
opositores, lança mais uma campanha de massas – “Revolução Cultural” –, que leva jovens
estudantes a promoverem um movimento contra todas as estruturas que não
correspondessem à “base económica socialista”, tendo em vista criar um Homem novo através
da transformação radical das mentalidades.

A população chinesa viu nesta revolução uma forma de extrapolar e descarregar,


dadas as dificuldades de tantos anos de fome e pobreza. Sendo assim, chegou-se a correr o
risco da revolução sair do controlo do PCC, culminado em atos extremamente violentos que
colocam a China à beira da anarquia e da guerra civil. O PCC, ao criar tantas revoluções, corria
agora o risco de ser alvo das mesmas. Contudo, em 1968, o exército interveio, repondo a
ordem.

Apesar do clima conturbado, Mao Tsé-Tung retoma o poder e encaminha a China para
o papel de grande potência mundial capaz de afrontar a URSS. A partir de 1974, a situação
estabilizou e o PCC tomou o controlo do país. Em 1976, morreu Mao Tsé-Tung e voltou uma
instabilidade à China que durou até 1977.

Como referi inicialmente, é extremamente importante ter em conta que a iminência


de um conflito armado, evidenciada por frequentes crises políticas e pela violência das
acusações recíprocas, levou as grandes potências a intensificarem a escalada armamentista,

isto é, a corrida aos armamentos, de uma forma geral, e, especificamente, ao


armamento nuclear.

Nos primeiros anos do pós-2ªG.M., os EUA sentiam-se protegidos pela superioridade


técnica da bomba atómica (míssil gap – superioridade militar americana). No entanto, esta
confiança desmoronou-se em setembro de 1949, quando os russos, após intensos estudos e
canalização de importantes investimentos, no âmbito do novo plano quinquenal em que se
privilegiava o desenvolvimento científico e a sua colocação ao serviço do sector militar, fizeram
explodir a sua primeira bomba atómica.

Deste modo, em 1952, os americanos já testavam uma bomba de hidrogénio, com


poder ainda mais destrutivo, e, no ano seguinte, os russos também já a possuíam.

Estávamos, então, perante a corrida ao armamento e, consequentemente, o início da


Era Nuclear e ainda perante a multiplicação de armas “convencionais”.

No fim de 1950, os americanos já estavam convencidos de que o potencial atómico


não era suficiente para deter a expansão do comunismo nas várias regiões do Mundo.

137
O investimento ocidental nas armas convencionais desencadeou, como seria de
esperar, uma igual estratégia por parte da URSS que, ao querer quebrar a superioridade
americana, afetou, em 1952, 80% do orçamento do Estado, pelo que na ideia de Ronald
Reagan, “[h]á apenas um meio seguro e legítimo de reduzir o custo com a segurança e esse
meio é reduzir a sua necessidade”, para tal efeito, o presidente dos EUA referiu, em 1985, que
já o estava a tentar fazer, “negociando com a União Soviética”.

Os EUA e a URSS canalizavam, então, sem limites os orçamentos para o armamento


nuclear. Entre 1949 e 1972, os seus arsenais nucleares continuaram a crescer, aliás, 5% das
ogivas chegavam para destruir o planeta! Durante esta fase, os riscos de deflagração foram
muito maiores do que se pensava (Crise dos Mísseis de Cuba, 1962).

Durante este período, em que o armazenamento aumentou, houve um


armazenamento de stock de capacidade militar tão grande que nunca podia ser usado, ou seja,
era impossível começar uma guerra nuclear e acabá-la.

Estas duas grandes potências, os EUA e a URSS detinham 90% das armas nucleares. A
3ª potência a surgir foi a China. A partir daqui, foram criadas condições bilaterais. Os arsenais
começaram a ser negociados.

No fundo, o poder de destruição das novas armas introduziu na política mundial uma
característica nova: a dissuasão. Cada um dos blocos procurava persuadir o outro de que
usaria, sem hesitar, o seu potencial atómico em caso de violação das respetivas áreas de
influência. O mundo estava perante o “equilíbrio instável do terror”, pois tal como Ronald
Reagan afirmou no dia da sua tomada de posse do 2ª mandato, a 21 de janeiro de 1985,
“[a]gora e durante décadas, nós e os soviéticos vivemos sob a ameaça de uma destruição
mútua.”

É assim que é assinado o Tratado de Não Proliferação Nuclear (1968), em que os EUA,
a URSS e a Inglaterra se comprometem a não dar informações a terceiros países. A França e a
China não o assinaram, porque ainda estavam em experiências e estavam a beneficiar mais da
redução do custo da energia nuclear. Os primeiros três assinaram para que o valor da força
nuclear não descesse.

No capitalismo, a produção aumenta à medida que o tempo passa. As mercadorias


tendem a diminuir o seu valor, porque há mais produção. Só com grandes recursos é que se
podia investir na energia nuclear.

138
Nos anos 60 e 70, o preço da energia nuclear desceu, de forma que mais alguns países
tivessem acesso a ela – estava mais barata. Para que nem todos os países adquirissem acesso a
ela- estava mais barata. Para que nem todos os países adquirissem poder nuclear, assinou-se o
acordo.

Em 1969, iniciou-se o período “détente”, um período de distensão, ou seja,


nações que tinham anteriormente um relacionamento hostil (sem, no entanto, estarem num
estado de guerra declarada) passam a restabelecer relações diplomáticas e culturais,
apaziguando o seu relacionamento e diminuindo o risco de conflito declarado.

Este período começou com as negociações SALT. Em 1972, assinou-se o acordo


SALT I entre os EUA e a URSS. Cada parte do acordo queria negociar de forma a lucrar mais do
que a outra parte. Contudo, o primeiro acordo foi mais importante, porque impediu o
crescimento mesmo antes de reduzir.

Dois fenómenos contraditórios afetavam a tática da era nuclear: estava cada vez mais
acessível, tanto para fins civis como militares; e a capacidade de uso das armas tornava-as
inutilizáveis (podiam ser apenas a nível de contenção, já que ao usar o poder nuclear o planeta
corria o risco de ser destruído).

Para a correlação real de forças, os arsenais nucleares não se podiam usar – arsenais
de 70 e 80 não eram utilizáveis em panoramas regionais. Por um lado era bom, visto que era
mais fácil chegar à ideia de que os arsenais militares podiam ser desmantelados: OPÇÃO ZERO.
Para os conflitos regionais, alguma arma teria que se arranjar.

O acordo SALT II assinou-se em junho de 1979. Assinado entre os EUA e a URSS, previa
passar dos mísseis para 2400 e até 1981 para 2280.

Os EUA queriam saber por que é que a URSS estava tão interessada no acordo, pois,
provavelmente, seria por esta ter um poder mais baixo, comparativamente aos EUA, e queria
que estes reduzissem o poder nuclear para que ficassem no mesmo pé. Tal situação, acentuou-
se mais nos anos 80.

O tratado SALT II foi recusado pelo Senado americano e seria substituído mais tarde
pelo programa START. Os EUA iam também pôr em prática o Sistema de Interceção de Mísseis
Interorbital (SDI). Na época, era chamado pelo público de “Guerra das Estrelas”. Este consistiu
num programa norte-americano que pretendeu construir um escudo espacial protetor de
receção de mísseis. Face a este, o armamento soviético torna-se obsoleto, pelo que obrigada a

139
URSS a um esforço militar suplementar. Agora podiam crescer os armazenamentos nucleares
( não havia acordo SALT)

Se isto fosse verdade, as armas nucleares não seriam inúteis. Isto nunca aconteceu,
pelo que ainda faz parte agora do tema de conversa da política americana.

Em 1985, Gorbatchev é eleito secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética


(PCUS) e é nessa condição que pretende solucionar um conjunto de fatores, pondo, assim, fim
ao modelo soviético.

Este conjunto de fatores incluía sobretudo o atraso económico (diminuição do PIB na


produção industrial, agrícola e na produtividade do trabalho) e problemas sociais (corrupção
dos quadros de partido e o descontentamento generalizado da população) e o programa do
IDE (Iniciativa de Defesa Estratégica) dos EUA que incitava a URSS a gastar capital que não
possuía.

A verdade é que a base militar da URSS faliu e houve dificuldade em manter o país à
tona. Os esforços feitos, anteriormente, para a aposta no armamento tinham de ser
canalizados para outras áreas civis, como se realça no parágrafo anterior. A URSS ou parava a
sua escalada belicista ou fazia algo politicamente. Optou por sair da Guerra e cedeu perante o
poder dos americanos.

Gorbatchev inicia, então, uma política de diálogo e aproximação ao Ocidente,


procurando um clima estável que permitisse que a URSS canalizasse os seus recursos para a
reestruturação interna.

Logo nos anos 80, a URSS propôs a desnuclearização total, mas a administração
Reagan (EUA) não atendeu à proposta. A desnuclearização seria possível, mas ninguém a quer
fazer sozinha, só tinha lógica se todas as potências nucleares se desnuclearizassem.

Neste contexto, nos anos 90, houve os acordos de START I e II. No primeiro (1991) os
EUA e a URSS comprometiam-se a reduzir até 9000 ogivas e 1500 veículos. No segundo (1993),
comprometiam-se a reduzir para 3500 ogivas.

Ambos os acordos foram esboçados na Cimeira de Malta, em 1989, onde acordaram


abrir caminho para os acordos. O risco de uma grande catástrofe parecia estar resolvido no fim
dos anos 90.

140
No início dos anos 90, a URSS dissolveu-se. A grande maioria dos territórios separados
da Rússia eram territórios periféricos. Foi na periferia que a URSS se dividiu em mais Estados:
zona da Ásia Ocidental. A Rússia histórica tinha o seu centro em Kiev, na Ucrânia.

No âmbito da pacificidade, também é importante salientar o papel da Conferência


de Helsínquia.

A Conferência de Helsínquia teve como principal objeto de reflexão a segurança e a


cooperação na Europa. Iniciada em 3 de julho de 1973, na capital finlandesa, e prosseguida em
Genebra, de 18 de setembro de 1973 a 21 de julho de 1975, ficou concluída a 1 de agosto de
1975, na cidade onde teve início.

Nela participaram altos representantes da República Federal da Alemanha, República


Democrática Alemã, Áustria, Bélgica, Bulgária, Canadá, Checoslováquia, Chipre, Dinamarca,
Espanha, EUA, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Hungria, Irlanda, Islândia, Itália, Jugoslávia,
Liechtenstein, Luxemburgo, Malta, Mónaco, Noruega, Polónia, Portugal, Reino Unido,
Roménia, San Marino, Suécia, Suíça, Turquia, URSS e Vaticano. O diretor-geral da UNESCO e o
secretário-executivo da Comissão Económica para a Europa das Nações Unidas deram também
os seus contributos, durante a segunda fase da Conferência.

A assinatura do Ato Final da Conferência de Helsínquia, por 33 países europeus, o


Canadá e os Estados Unidos, não pode deixar de ser considerada um dos acontecimentos mais
importantes do após – 2ªG.M.. Com efeito, a Conferência realizou-se após as derrotas do
imperialismo no Vietname, no Laos e no Camboja, e depois do derrube do fascismo em
Portugal e na Grécia.

Assim, foi a primeira vez que um número tão elevado de países uniu os seus esforços
com a finalidade de se pôr de acordo acerca de um importante conjunto de princípios
reguladores das relações internacionais, da segurança coletiva e do desenvolvimento de
relações de cooperação entre os vários estados ocidentais. De entre esses princípios,
salientam-se a igualdade soberana dos estados, a não intervenção nas questões internas, a
resolução pacífica dos diferendos, o respeito pelos direitos humanos e liberdades
fundamentais, a igualdade de direitos e a autodeterminação dos povos.

Do programa da Conferência resultaram os seguintes pontos fundamentais: a renúncia


ao emprego da força e da ameaça do seu uso como forma de resolução de questões em litígio;
o reconhecimento das fronteiras estabelecidas na Europa a seguir à Segunda Guerra Mundial;
a dissolução simultânea do Pacto do Atlântico Norte e do Pacto de Varsóvia ou, num primeiro

141
momento, a dissolução das respetivas organizações militares; a paragem na corrida aos
armamentos de todos os tipos; a criação de zonas desnuclearizadas em várias regiões do
mundo (incluindo a Europa); o desarmamento nuclear generalizado, com redução dos efetivos
e do armamento concentrado em várias regiões do mundo, designadamente na Europa
Central; a redução geral das despesas militares, especialmente por parte das grandes
potências; a adoção de medidas preventivas do risco de eclosão acidental ou da provocação
deliberada de incidentes militares e sua transformação em crises localizadas ou mesmo em
guerras internacionais; o estabelecimento de relações de cooperação; o desenvolvimento dos
sistemas de transportes e telecomunicações.

Desta forma, a Conferência de Helsínquia representou um ponto culminante da luta


que os homens, os povos e os estados que amam a paz têm vindo a desenvolver no segundo
pós-guerra, incluindo os EUA e a URSS, que puseram as suas desavenças de lado.

A última fase da Guerra Fria (1979-1990): Os obstáculos dos conflitos


regionais

Médio Oriente e a Guerra de Outubro de 1973


Por esta atura, no Médio Oriente, apesar da maior influência se encontrar no Arco Sul -
devido à questão pela disputa do petróleo – é no Arco Norte que se assiste à emergência de
movimentos nacionalistas e anti-imperialismos.

Como resultado, em 1973, dá-se a Guerra de Outubro, também conhecida como


Guerra de Yom Kippur, Guerra Árabe- Israelense ou Guerra do Ramadão, a partir da colisão
gerada entre Estados Árabes liderados pelo Egipto e pela Síria, e Israel.

A guerra começou com um ataque conjunto surpresa por parte do Egipto e da Síria, no feriado
judaico de Yom Kippur. O Egipto e a Síria cruzam linhas de cessar-fogo no Sinai e nas Colinas do
Golã (respetivamente), já capturados anteriormente por Israel, em 1967, durante a Guerra dos
Seis dias.

Os egípcios e sírios avançam, mas o cenário inverte-se rapidamente, a favor de Israel.


Na segunda semana da guerra, os sírios são empurrados para fora das colinas de Golã. A sul de
Sinai, os israelenses atacam, cruzam o canal do Suez (onde ficava a velha linha de cessar-fogo)
e isolam o 3º exército do Egipto. Um desenvolvimento na guerra que conduziu à proteção de
Israel por parte dos EUA e dos países árabes por parte da URSS. Gera-se, assim, uma tensão

142
diplomática. Entretanto, entra em vigor um cessar-fogo das Nações Unidas, de caráter
cooperativo.

Ao término das hostilidades, as forças israelenses, já recuperadas das baixas iniciais e


com um esmagador poderio militar, entram no território dos inimigos.

Esta guerra significou implicações profundas para muitas nações. O mundo árabe, que
tinha sido humilhado pela derrota desproporcional da aliança Egípcio- Sírio-Jordaniana,
durante a Guerra dos Seis Dias, sentiu-se psicologicamente vingado pelas suas vitórias no início
do conflito, apesar do resultado final. Um sentimento de vingança que pavimentou o caminho
para o processo de paz que se seguiu, assim como liberalizações como a política de Infitah do
Egipto.

Os Acordos de Camp David (1978), que se seguiram, conduziram ao iniciar de uma fase
marcado por uma relação normalizada entre o Egipto e Israel – a 1ª vez que um país árabe
conheceu o Estado israelense. Egipto, que já se tinha afastado da União Soviética, deixou a
esfera de influência soviética de forma integral.

O presidente Gamal Abdel Nasser do Egipto morreu em Setembro de 1970. Foi


sucedido por Anwar Sadat, considerado mais moderado e pragmático do que Nasser. Como
meta para o seu governo, resolve neutralizar a política expansionista do Estado de Israel e, ao
mesmo tempo, assegurar a sua posição no mundo árabe. Decide, então, retomar a península
do Sinai. O plano passava por um ataque a Israel sem aviso, em conjunto com a Síria –
operação que recebeu o nome de “Operação Badr” (palavra árabe que significa “Lua Cheia”) e
que incluía a retomada do canal do Suez.

Os egípcios, recorrendo a bombas de sucção e usando as águas do canal como agente


de erosão hídrica, destroem as fundações da intransponível barreira de 50 metros de altura,
construída pelos israelitas, com a areia do deserto, a fim de guarnecer toda a margem a norte
do canal do Suez contra os exércitos árabes.

Desta forma, puderam abrir passagem nas fortificações integrantes da linha Bar-Lev,
alcançando o lado desprotegido dos israelitas e obrigando-os a renderem-se.

Enquanto o Egito atacava as posições israelenses desprotegidas na península do Sinai,


as forças sírias atacaram os baluartes das Colinas de Golã. Graves perdas foram infligidas ao
exército israelita. Contudo, após três semanas de luta, as Forças de Defesa de Israel (FDI)
obrigaram as tropas árabes a retroceder e as fronteiras iniciais reconfiguraram-se. Damasco, a
capital da Síria, foi bombardeado.

143
Uma das consequências desta guerra foi a crise do petróleo, uma vez que os estados
árabes, membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) boicotaram os
EUA e os países europeus que apoiavam a sobrevivência de Israel. Se a curto prazo a medida
agravou a crise económica mundial, a longo prazo a comunidade internacional aprendeu a usar
fontes alternativas de energia e, inclusive, algumas áreas do planeta começaram a descobrir
que também possuíam petróleo – caso da região do Mar do Norte, na Europa, do Alasca, nos
EUA, da Venezuela, do México, da África do Sul, da União Soviética e, de lá para cá, também do
Brasil.

América Latina e o golpe de Estado no Chile (1973)


O golpe militar chileno foi um dos acontecimentos políticos mais importantes da
história chilena e latino-americana da segunda metade do século XX. O golpe, liderado pelo
general de extrema-direita Augusto Pinochet, teve aprovação da burguesia e apoio financeiro
dos Estados Unidos. Ocorreu em 11 de setembro de 1973 e destitui violentamente do poder o
presidente socialista Salvador Allende.

Este país, desde 1830 gozava de uma atividade política e eleitoral democrática até o
golpe de 1973. Com a chegada do século XX, o Chile consolidou-se como um Estado
democrático parlamentar, com uma aliança de classes no poder sob a hegemonia da burguesia
industrial e com uma pequena participação das camadas médias e do movimento operário.

É em 1970 que esse cenário começou a ganhar novos traços, com o surgimento e
vitória do candidato da Unidade Popular o socialista Salvador Allende. O Chile elegia
democraticamente, pela primeira vez na história mundial, um presidente socialista que tinha
como proposta o projeto de transição pacífica para o socialismo, que ficou conhecido como
“via chilena ao socialismo”. Este projeto procurava a implementação de um governo socialista
através de meios pacíficos, a partir das estruturas democráticas, assegurando a liberdade e
respeitando a constituição.

Allende venceu as eleições e chegou à presidência a meio de uma crise económica.


Com os seus objetivos anticapitalistas, o governo enfrentou este momento de instabilidade
com métodos tradicionais. Durante o primeiro ano de governo, Allende avançou na estatização
de setores, chave da economia como a mineração de cobre, sistema bancário, setor petroleiro,
entre outros, além do início da reforma agrária.

144
Porém esse governo de caráter socialista não agradou à burguesia chilena, nem ao
governo dos Estados Unidos que estabeleceu, em 1971, um bloqueio económico informal ao
Chile, fazendo com que a crise se intensificasse. Assim, um período de caos é estabelecido no
país. Não era possível produzir suficientemente para toda nação bens de primeira necessidade,
bem como importar parte desses produtos. Uma vez que o Chile era historicamente
dependente das importações estadunidenses, o país viu crescer o mercado negro de
alimentos. A falta desses produtos atingiu mais as classes mais pobres do que a burguesia que,
apoiada nos EUA, tinha acesso aos produtos através do mercado ilegal.

Foi neste momento que a burguesia, outrora classe dominante do cenário político,
usou essa instabilidade a seu favor. Apoiada na força política e económica, tanto nacional
quanto internacional, inicia uma contraofensiva ao governo. Em 1972 intensifica-se a
mobilização das camadas médias, juntamente com alguns oficiais das Forças Armadas chilenas.
É também neste período que a organização fascista Patria y Libertad (braço paramilitar de
extrema direita do golpe; formada pela classe média alta, que promovia boicotes e saía às
ruas, tomando partido da violência para protestar contra Allende) ganha força política. Entre
agosto e outubro deste mesmo ano, a oposição tinha criado um plano de desobediência civil
que desestabilizou o governo. A sabotagem mais impactante foi a greve de 9 de setembro,
financiada pelos EUA, feita pelos proprietários de caminhões que impediu o plantio da safra de
1972/73.

O governo respondeu à crise de forma defensiva. Constituiu um gabinete cívico-militar


como uma tentativa de obter o apoio das Forças Armadas. A maioria da população mais pobre
e os trabalhadores continuaram a apoiar Allende e organizavam-se para que a pouca comida
pudesse chegar a todos. Operários continuavam o trabalho nas fábricas, porém, todo este
esforço para ajudar o país e o presidente não conseguiu sustentar-se por muito tempo.

A primeira tentativa de golpe aconteceu a 29 de junho de 1973, mas ainda não era
uma ação articulada globalmente com todas as forças políticas, militares e sociais que
participavam do plano oposicionista. Tal tornou possível ao governo de Allende neutralizar a
ação com a ajuda do general Prats, o último oficial legalista das Forças Armadas. A oficialidade
golpista tratou de articular um plano de desprestígio a Prats, que o levou a renunciar o seu
cargo de comandante-chefe das Forças Armadas, uma vez que se viu isolado. Allende promove
então o general Augusto Pinochet ao cargo que foi de Prats.

Ao observar a situação política do país, Allende percebeu que seu projeto socialista
deixava de ser uma alternativa política para o Chile, então entendeu que havia duas opções

145
para o país: o golpe militar ou a volta da democracia burguesa personificada pela Democracia
Cristã – partido político composto pela burguesia industrial e apoiado pelas classes alta e
média chilenas. Preferindo sempre a via constitucional, Allende decide convocar um plebiscito
em que a população votaria por sua continuidade no governo ou não. Caso perdesse, passaria
a presidência ao presidente do senado, Eduardo Frei, da Democracia Cristã. Allende faz o
anúncio público do plebiscito na noite de 11 de setembro; o erro do presidente foi ter
consultado Pinochet sobre o discurso. Na posse desta informação, Pinochet mobiliza as forças
oposicionistas e antecipa o golpe.

A 11 de setembro de 1973, Santiago – capital política e económica do Chile –


amanheceu com o ruído de aviões que sobrevoam o centro da capital. O palácio presidencial
da Moneda foi cercado por tanques das Forças Armadas. Salvador Allende fez apelos à
população contra o golpe, mas horas depois percebeu que pedir resistência ao povo chileno
custaria muitas vidas. Fez o seu último discurso ao povo na rádio da Central Única dos
Trabalhadores – única não tomada pelos militares –,onde afirmava que “as grandes alamedas
por onde avançará o povo chileno voltarão a abrir-se cedo ou tarde” e anunciava que caberia
às novas gerações de chilenos desbravar estes caminhos.

Minutos depois do discurso, o palácio foi bombardeado e invadido pelos soldados


golpistas. Allende recebeu de Pinochet um telefonema em que oferecia ao presidente e à sua
família um avião para que abandonassem o país. Allende disse que só sairia de Moneda morto;
e assim aconteceu. A versão divulgada pelo governo militar dizia que Allende matou-se com
um tiro na cabeça. Porém, há quem acredite que os soldados o alvejaram. Para solucionar este
mistério, a 15 de abril de 2011, a justiça chilena, a pedido de Izabel Allende – filha de Salvador
-, decretou a exumação do corpo para descobrir a real causa da morte.

Pinochet ficou no poder por mais de 26 anos (1973-1990) e implementou uma das
ditaduras mais sangrentas da América Latina, somando inúmeros mortos, torturados e
desaparecidos.

A guerra civil em Angola (1974-1975)


A guerra civil e a intervenção estrangeira marcaram profundamente a sociedade
angolana das últimas décadas.

Em 1975 (após a independência), os três movimentos independentistas angolanos -


FNLA (Frente Nacional de Libertação de Angola), UNITA e MPLA - formaram uma frente

146
comum e assinaram, com a representação portuguesa, os Acordos de Alvor, que previam a
participação de todos eles no Governo do país. Devido à existência de rivalidades políticas, não
se verificou um entendimento entre as três forças angolanas. Em março de 1976, registaram-
se violentos confrontos entre o MPLA e a FNLA, que marcaram o início de uma guerra longa e
sangrenta. As duas organizações procuraram apoios no exterior. A FNLA simbolizava o
anticomunismo contra a expansão da Rússia e o MPLA a luta contra o capitalismo. O MPLA
passou a controlar Luanda com o apoio de Cuba e da União Soviética, a FNLA contou com a
ajuda do Zaire, da China e de alguns países ocidentais, enquanto a UNITA foi auxiliada pela
África do Sul e pelos Estados Unidos da América. Entretanto, a UNITA e a FNLA formaram uma
frente comum para lutar contra o MPLA, e Portugal foi afastado da condução do processo
político de transição de Angola, não conseguindo impedir a internacionalização do conflito.
Kissinger, o então secretário de estado norte-americano, analisava os acontecimentos em
Angola como um prolongamento da Guerra Fria. Em 1984, a FNLA rendeu-se ao Governo, o
mesmo não acontecendo com a UNITA, que, liderada por Jonas Savimbi, continuou a sua luta
contra o regime de José Eduardo dos Santos. O ano de 1988 trouxe alguma esperança para o
povo angolano. Surgiram então várias iniciativas para a paz. As propostas do Governo não
foram, no entanto, do agrado da UNITA, que como resposta intensificou a luta, persistindo na
reivindicação de integrar um Governo de transição com o MPLA como prelúdio para a
instituição de um regime multipartidário e para a realização de eleições livres. A 24 de junho
de 1989, na sequência de uma conferência realizada em Gbadolite (Zaire) onde participaram
José Eduardo dos Santos, Jonas Savimbi e um conjunto de 18 chefes de Estado africanos, foi
acordado um cessar-fogo. Mas este acordo teve interpretações diferentes para as duas partes
em conflito. Em agosto, Savimbi anunciou o recomeço das hostilidades. Mais tarde seria a
UNITA a apresentar uma série de propostas, entre as quais a criação de uma força de paz para
a fiscalização do cessar-fogo e o reinício das negociações com o Governo de Luanda. Depois de
sucessivas rondas de negociações, primeiro apenas com a presença de Portugal e mais tarde
com observadores norte-americanos e soviéticos, a 31 de maio de 1991, em Lisboa, e com a
presença do primeiro-ministro português, Aníbal Cavaco Silva, foram formalmente assinados,
pelo presidente angolano e pelo presidente da UNITA, os Acordos de Paz para Angola
(conhecidos por Acordos de Bicesse). Mas mais uma vez, em finais de 1991, a implantação dos
acordos estava longe de se considerar satisfatória a nível político e militar. Com o
desanuviamento das relações Leste-Oeste e depois de uma guerra sangrenta de dezasseis
anos, foram finalmente realizadas eleições livres e multipartidárias em setembro de 1992, com
a mediação das Nações Unidas, que fez deslocar para o terreno uma missão de verificação e
fiscalização das eleições. O MPLA foi o vencedor oficial. A segunda força política mais votada, a

147
UNITA, recusou-se a aceitar os resultados. Angola voltou a mergulhar na guerra civil até à
assinatura do Protocolo de Lusaca (cessar-fogo), em novembro de 1994. Este protocolo iria ser
muitas vezes violado em certas zonas, mas sem haver um retorno à guerra civil generalizada. A
situação política e militar no país estão ainda por normalizar, havendo pressões por parte do
Conselho de Segurança da ONU sobre a UNITA, no sentido de obrigar esta organização a
proceder ao acantonamento dos seus soldados. O conflito fez muitos milhares de mortos e
cerca de um milhão de refugiados dispersos por várias regiões dos países vizinhos, ao mesmo
tempo que arruinou a economia angolana.

A revolução iraniana (1978)


A partir de 1977, o xá iraniano Mohamed Reza Pahlevi passou a sofrer uma forte crise
interna em seu país, em função de uma série de reformas por ele implantadas e não aceites
pela maioria de muçulmanos xiitas.

O xá baseou o seu poder no petróleo e estimulou a entrada de empresas


transnacionais no Irã, compreendendo a adoção de hábitos ocidentais como “modernização”.
Essa ocidentalização acelerada produziu uma forte resistência do clero iraniano. Os grupos de
oposição multiplicaram-se e as manifestações que começaram nas escolas secundárias em
1977 generalizaram-se em 1978.

Os distúrbios foram evidentes, culminando com a fuga do xá para o exterior, a janeiro


de 1979. Ainda no final de janeiro de 1979, retorna do exílio o líder religioso Aiatolá Ruhollah
Khomeini, que anuncia a criação da República Islâmica do Irã, a 10 de fevereiro.

O consumo de álcool foi proibido, as mulheres foram obrigadas a cobrir o rosto em


público (xador), os filmes ocidentais foram banidos. Este retorno obrigatório à doutrina e aos
costumes originais e a procura de uma maior fidelidade aos textos sagrados, com o apoio do
Estado, ficaram conhecidos como fundamentalismo islâmico.

O fundamentalismo islâmico fortaleceu-se no Irã e visava expandir-se para outros


países do Médio Oriente. Esta intenção gerou reações tanto de alguns países da região quanto
das superpotências. Por outro lado, encontrou-se acolhida nas forças políticas que se
opunham a governos pró-ocidentais e queriam fundar Estados guiados pelas leis islâmicas,
principalmente a partir da década de 1990.

148
A invasão soviética no Afeganistão
Era madrugada do dia 24 de dezembro de 1979 quando os blindados do exército da
União Soviética invadiram o Afeganistão sob o pretexto de garantir o cumprimento do Tratado
de

Amizade e Cooperação, assinado em 1978. Enquanto se aproximava a meia-noite de


23 para 24, os soviéticos organizaram também uma formidável ponte aérea com destino à
capital Cabul, que seria desencadeada horas depois, envolvendo aproximadamente 280 aviões
de transporte de tropa e cerca de três divisões com cerca de 8.500 homens cada. Em poucos
dias, os soviéticos já controlavam toda a cidade, tendo deslocado uma unidade especial para
tomar de assalto o palácio governamental de Tajberg. Membros do exército afegão leais ao
presidente Hafizullah Amin opuseram uma feroz, porém breve, resistência. O interesse pelo
Afeganistão remonta aos tempos da Rússia tzarista, devido ao interesse interesse geo-
estratégico, especialmente na saída para o Mar da Arábia. Em 1972, assistentes soviéticos
foram enviados para treinar as forças armadas locais. Em 1978, os governos assinaram um
acordo que permitiu o envio de 400 consultores soviéticos. Em dezembro do mesmo ano, a
URSS e o Afeganistão assinaram o tratado de cooperação, que permitia a entrada de tropas
soviéticas caso o governo afegão o solicitasse. Como o regime de esquerda do Partido
Democrático Popular do Afeganistão que se tinha tornado dependente dos equipamentos
militares e da assessoria soviética, e sentindo-se ameaçado por forças de oposição interna e de
países vizinhos, autorizou formalmente o ingresso do exército soviético. Os soviéticos
invadiram o Afeganistão para derrocar o presidente Hafizullah Amin, que não tinha conseguido
enfrentar os mujahedin, inimigos da União Soviética ateia. Amin foi substituído por Babrak
Karmal. A União Soviética justificou a invasão com a necessidade de preservar o regime
esquerdista afegão de seus inimigos internos e externos e manter a paz na Ásia Central. Em 27
de dezembro, Karmal, líder exilado da fação Parcham do Partido Democrático Marxista do
Povo, foi empossado como novo chefe de governo do Afeganistão. Simultaneamente, forças
terrestres soviéticas vindas do norte avançavam sobre o território afegão. Os soviéticos,
entretanto, viram-se diante de uma forte resistência quando avançaram para o interior. Os
combatentes da resistência chamados de mujahedin viam os soviéticos ateus controlando o
Afeganistão como uma profanação ao Islã, bem como à sua cultura tradicional. Proclamando a
jihad (guerra santa) contra os invasores, eles ganhavam o apoio do mundo muçulmano. Os
mujahedin empregaram táticas de guerrilha contra os soviéticos. Atacavam de surpresa em
emboscadas para desaparecer em seguida entre as montanhas e grutas de uma geografia
excecionalmente complicada, causando grande destruição, importante quantidade de baixas e
uma pressão psicológica elevada, sem que os guerrilheiros sofressem perdas ao evitar as

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batalhas campais. Os combatentes afegãos valiam-se de armamento capturado dos soviéticos
e, principalmente, do material bélico que os Estados Unidos lhes forneciam. O curso da guerra
mudou definitivamente quando Washington passou a abastecer os mujahedin, a partir de
1987, com mísseis antiaéreos Stingers, facilmente transportados e disparados dos ombros dos
combatentes. Esse armamento permitiu-lhes abater regularmente helicópteros e aviões que
voavam a baixa altitude.

A ordem mundial depois de 1991


A partir da década de 1990, os EUA passam a reunir todas as condições para se
afirmarem como única superpotência e determinarem os rumos de uma nova ordem
internacional. Esta década é, com efeito, marcada pela hegemonia dos EUA, que detêm, sobre
o resto do mundo, uma incontestada superioridade militar, beneficiam de uma próspera
situação económica e continuam a afirmar-se na vanguarda do desenvolvimento científico e
tecnológico.

Contudo, a partir do novo milénio, o modelo de organização política que permite


responder aos desafios que a nova ordem internacional coloca é de caráter multipolar, ou seja,
existem vários pólos de desenvolvimento. Este facto obedece a uma determinada lógica:
riqueza, distribuição e poder militar.

Os EUA são a primeira potência mundial e a China é a segunda, pois como confirma
George Soros, empresário húngaro-americano, em 2004: “Os Estados Unidos não são o único
país no centro do sistema capitalista dominante, mas são o mais poderoso e constituem a
principal força impulsionadora por detrás da globalização.”

De facto, a China passou de uma situação muito subalterna para segundo lugar;
aumentou a um ritmo elevado e prevê-se que permaneça assim.

Há uma grande divergência entre o poder militar e a produção de riqueza. Há grandes


potências militares que não são grandes potências económicas, como a Rússia; e há grandes
potências económicas que não o são no campo militar, como o Japão.

A situação atual é que a repartição de riqueza não tem a ver com desenvolvimento. Ao
considerarmos a China e a Índia, vemos que estes países têm vindo a aumentar as suas cotas-
partes do PIB mundial. Em 2003, representavam 20% e prevê-se que em 2030 representem
mais de 33%.

150
O chamado Bloco BRIC, constituído, respetivamente, pelo Brasil, Rússia, Índia e China
está em ascensão, no que diz respeito à produção de riqueza. Hoje, dos 27 biliões de
trabalhadores em todo o Mundo, metade encontram-se no bloco BRIC. Apenas 14% encontra-
se na União Europeia, nos Estados Unidos e no Japão.

Os trabalhadores dos países que eram os ricos têm visto os seus salários reais a
estagnar ou a descer.

Em 1960, 22% da população ativa encontrava-se nos EUA, na EU e no Japão; em 2005,


já era 14%. Já nos BRIC, em 2005 a população ativa ronda os 50%!

Agora, a correlação entre o mercado de trabalho de trabalho e a produção de riqueza


modificou-se (correlação entre capital e trabalho). Os lucros dos investimentos e os lucros dos
salários distanciam-se a cada dia.

25% das exportações são agora assegurados pelo Bloco BRIC mais no México.

Em 1960, a maioria dos investimentos eram feitos em locais onde já havia outros
investimentos. Nos últimos vinte anos, abriram-se muitos mercados de trabalho em países que
duplicaram a força de trabalho em relação ao que havia antes – esses países apresentaram
mais do dobro dos trabalhadores que havia até aí.

Como estes países são os maiores exportadores mundiais e os que vêm ganhando
importância na produção mundial, os que dantes eram os ricos têm acumulado défices
comerciais – principalmente os EUA, com um défice que representa 2% do PIB mundial/7% PIB
americano.

O valor das exportações feitas por países como o Japão, a China, mas também a UE,
aos EUA sem receberem nada em troca (a compra da dívida americana) são elevadíssimos.

Os EUA produzem cada vez menos do que consomem. Se continuarem a fazer isto, o
dólar vai perder o valor. Para os americanos poderem continuar a comprar sem vender, têm de
dar algo em troca – têm de saldar a venda.

Os EUA pagam, mas não com dinheiro; pagam com títulos de dívida.

Apesar de as exportações americanas aumentarem, o efeito na balança comercial vai


ser desastroso. Num caso normal, a moeda do país baixaria desastrosamente; mas como os
EUA pagam em notas de dívida a quem lhes vende mercadorias- Se o dólar baixasse, esses
países perderiam direitos a esses valores – o dinheiro não valeria nada.

151
É por isso que os bancos mundiais mantêm o dólar à tona. Assim, os EUA continuam a
comprar sem pagar.

O que acontece na economia mundial? Há um fluxo de capital para os EUA, mas não há
exportações americanas – poços sem fundo.

No lado americano, só procura; a oferta é inexistente.

A China detêm metade da dívida pública americana, o que acaba por ser benéfico para
os chineses, que têm, assim, maior acesso ao mercado americano, onde podem vender os seus
produtos tecnológicos. Se a China deixasse de vender aos EUA e de comprar a dívida
americana, a economia chinesa colapsava, já que não tinha para onde produzir e não
conseguia manter o crescimento. Neste momento, a economia mundial depende de um só
país – os EUA. Todos os outros países capitalistas têm beneficiado da situação americana.

As próprias multinacionais americanas que se encontram fora do país conseguem


produzir duas vezes mais do que o país inteiro.

O orçamento militar americano é “pago” pelo défice do país.

Na UE, a tendência de crescimento do PIB é a de decrescer. A taxa tende a diminuir


progressivamente. No caso dos EUA, a taxa de crescimento do PIB também tem diminuído ao
longo destes 45 anos. Já nos BRIC, a taxa é superior às dos dois outros blocos juntos desde
1990. Até aí, diminuía gradualmente.

Assim, em relação às repartições do PIB no Mundo:

Na Europa Ocidental, mais de 25% do PIB mundial era das economias europeias.
Atualmente, a tendência é continuar a diminuir. Prevê-se que até 2030 terá 13%.

Nos EUA, em 1952, representava mais de 25% (também), e a partir desse ano tem
vindo a diminuir, esperando-se que alcance os 17% em 2030.

A Rússia, em 1952, detinha mais de 9% do PIB, mas desde aí a percentagem tem vindo
a diminuir, prevendo-se que se fique pelos 3,5% em 2030.

A China, constituindo uma exceção, em 1952 detinha apenas 5% do PIB mundial.


Atualmente, detém cerca de 15%. Registou um grande crescimento e prevê-se que alcance os
23% em 2030.

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Para terminar, deixo uma pergunta retórica de Tony Blair, primeiro-ministro britânico
de 1997 a 2007, feita em 2001: “E não é possível que a Índia e a China, cada um com três vezes
mais cidadãos do que o conjunto da União Europeia, assim que as suas economias de
desenvolverem o suficiente, como seguramente acontecerá, venham a reconfigurar
completamente a geopolítica mundial ainda nos nossos dias?” Eu presumo e, aliás, já consigo
ver que sim.

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