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2º CICLO

LINGUÍSTICA

A Reportagem de Divulgação Científica na


Revista Superinteressante: contributo para a
caracterização do género

Ana Filipa Silva Fonseca

M
2021
Ana Filipa Silva Fonseca

A Reportagem de Divulgação Científica na


Revista Superinteressante: Contributo para a
Caracterização do género

Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em Linguística, orientada pela Professora


Doutora Maria de Fátima Henriques da Silva

Faculdade de Letras da Universidade do Porto

2021
Ana Filipa Silva Fonseca

A Reportagem de Divulgação Científica na


Revista Superinteressante: contributo para a
caracterização do género

Dissertação realizada no âmbito do Mestrado em Linguística, orientada pela Professora


Doutora Maria de Fátima Henriques da Silva

Membros do Júri
Professor Doutor (escreva o nome do/a Professor/a)

Faculdade (nome da faculdade) - Universidade (nome da universidade)

Professor Doutor (escreva o nome do/a Professor/a)

Faculdade (nome da faculdade) - Universidade (nome da universidade)

Professor Doutor (escreva o nome do/a Professor/a)

Faculdade (nome da faculdade) - Universidade (nome da universidade)

Classificação obtida: (escreva o valor) Valores


«Aparelhei o barco da ilusão

E reforcei a fé de marinheiro

Era longe o meu sonho, e traiçoeiro

O mar…»

(Miguel Torga)

Dedico este trabalho aos meus pais, Anabela e Filipe, por tudo o que fazem e fizeram
por mim.

1
Sumário

Declaração de honra ..................................................................................................................... 5


Agradecimentos ............................................................................................................................ 6
Resumo.......................................................................................................................................... 7
Abstract ......................................................................................................................................... 8
Índice de Figuras ........................................................................................................................... 9
Índice de Tabelas ......................................................................................................................... 10
Índice de Gráficos ........................................................................................................................ 11
Lista de abreviaturas e siglas....................................................................................................... 12
Introdução ................................................................................................................................... 14
1.Género Reportagem................................................................................................................. 16
1.1. Algumas Considerações Sobre o Conceito de Género ....................................................... 16
1.1.1. A relação do género com as atividades sociais: o conceito de domínio discursivo .... 16
1.1.2. O conceito de género................................................................................................... 17
1.1.3. A perspetiva de Bakhtin ............................................................................................... 17
1.1.4. Na linha do Interacionismo Sociodiscursivo: Bronckart .............................................. 18
1.1.5. Na linha da Linguística Textual: Adam ......................................................................... 19
1.1.6. A dimensão composicional e o plano de texto ............................................................ 20
1.1.7. Síntese.......................................................................................................................... 23
1.2. O género Reportagem ........................................................................................................ 23
1.2.1. Conceito ....................................................................................................................... 23
1.2.2. Características gerais ................................................................................................... 26
1.2.3. Parâmetros que caracterizam o género ...................................................................... 29
1.2.4. Hiperestrutura ............................................................................................................. 30
1.2.5. Estrutura externa ......................................................................................................... 32
1.2.6. Estrutura interna.......................................................................................................... 35
1.2.7. Trabalhos Relacionados ............................................................................................... 36
1.2.8. Síntese.......................................................................................................................... 38
2.Género Reportagem de Divulgação Científica ......................................................................... 40
2.1. O Conceito de Divulgação Científica................................................................................... 40
2.2. Definição de divulgação científica ...................................................................................... 41

2
2.3. Géneros de Divulgação Científica ....................................................................................... 43
2.4. Reportagem de Divulgação Científica ................................................................................ 44
2.4.1. Conceito ....................................................................................................................... 44
2.4.2. Características e Propriedades .................................................................................... 45
2.4.3. Proposta de Análise ..................................................................................................... 48
2.4.4. Trabalhos Relacionados ............................................................................................... 50
2.5. Síntese ................................................................................................................................ 53
3.Explicação ................................................................................................................................. 54
3.1. Definição do Conceito de Explicação.................................................................................. 54
3.2. Explicação como Modo Discursivo ..................................................................................... 54
3.3. A Explicação nos Géneros de Divulgação Científica ........................................................... 58
3.4. Síntese ................................................................................................................................ 62
4.Estudo Empírico ....................................................................................................................... 63
4.1. Corpus................................................................................................................................. 63
4.2. Metodologia ....................................................................................................................... 65
4.3. Recolha e Tratamento do Corpus ....................................................................................... 66
4.4. Análise dos Dados............................................................................................................... 66
4.4.1. Hiperestrutura das Reportagens ................................................................................. 66
4.4.2. Títulos .......................................................................................................................... 72
4.4.3. Análise das Funções Retóricas ..................................................................................... 76
4.5. A Explicação nas Reportagens ............................................................................................ 97
4.5.1. Reformulação............................................................................................................... 97
4.5.2. Definição ...................................................................................................................... 99
4.5.3. Denominação ............................................................................................................. 101
4.5.4. Exemplificação ........................................................................................................... 103
4.5.5. Comparação ............................................................................................................... 104
4.5.6. Metáfora .................................................................................................................... 106
4.5.7. Citação ....................................................................................................................... 108
4.6. Discussão dos Resultados ................................................................................................. 109
Considerações Finais ................................................................................................................. 112
Referências Bibliográficas ......................................................................................................... 114
Anexo ........................................................................................................................................ 122

3
4
Declaração de honra
Declaro que a presente dissertação é de minha autoria e não foi utilizado previamente
noutro curso ou unidade curricular, desta ou de outra instituição. As referências a outros
autores (afirmações, ideias, pensamentos) respeitam escrupulosamente as regras da
atribuição, e encontram-se devidamente indicadas no texto e nas referências
bibliográficas, de acordo com as normas de referenciação. Tenho consciência de que a
prática de plágio e auto-plágio constitui um ilícito académico.

Porto e Faculdade de Letras, 30 de setembro 2021

Ana Filipa Silva Fonseca

5
Agradecimentos
Agradeço, antes de tudo, a Deus.

Agradeço à Professora Doutora Maria de Fátima Henriques da Silva por ter aceitado
orientar-me, por ter aceitado explorar este tema, por todo o apoio, conselhos,
sugestões, correções, por todas as vezes que me deu na cabeça e incentivou a continuar.

Agradeço às funcionárias da Biblioteca Municipal Almeida Garrett por terem sido


extremamente prestáveis e atenciosas.

Agradeço aos meus pais por sempre acreditarem nas minhas capacidades. Agradeço ao
meu pai todas as vezes em que ele me obrigou a sair de casa para me distrair e ajudou
a acalmar-me e agradeço à minha mãe todo o colo que me deu nos dias mais difíceis.

Agradeço à Sophs por estar sempre disponível para me encorajar, aconselhar e auxiliar
em tudo e pela paciência com que o fez.

À Criança, agradeço por ser, para mim, um exemplo de determinação, persistência na


luta pelos nossos sonhos e pela disponibilidade com que me ouviu sempre que precisava
de ser ouvida.

Agradeço a toda a minha família e a todos os meus amigos por sempre me apoiarem.

Agradeço ainda aos artistas, em particular os da área da música, que me permitiram


manter a minha sanidade quase todos os dias.

A todos os que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho,


o meu agradecimento sincero.

6
Resumo

Este trabalho tem como objeto de análise o género reportagem de divulgação científica,
focando essencialmente na caracterização de algumas das suas propriedades e no modo
papel que a explicação pode desempenhar neste género.
Com esse objetivo, selecionámos um corpus de 37 reportagens da revista
Superinteressante, publicadas entre 2018 e 2020, que foram sujeitas a uma metodologia
de análise mista, qualitativa e quantitativa no que se refere à análise hiperestrutural e
estrutural das reportagens, sendo seguida uma análise qualitativa e descritiva no que
diz respeito à análise dos processos e funções da explicação na sua textualização.
A consecução destes objetivos está subjacente à estruturação do trabalho, que se
subdivide em duas partes, a primeira das quais consiste na fundamentação teórica que
servirá de base ao estudo empírico, realizado na segunda parte.
A primeira parte está distribuída por três capítulos. O primeiro capítulo relaciona-se com
o género reportagem e, sobretudo, a sua caracterização (propriedades gerais,
hiperestrutura, estruturas internas e externas). O segundo trata especificamente da
reportagem de divulgação científica, procurando elencar as suas principais
características. Finalmente, o terceiro tem como foco a explicação, nele são apontadas
algumas propostas de classificação das estratégias discursivas e estruturas linguísticas
que tipicamente lhes estão associadas, assim como a sua função.
Na segunda parte, apresenta-se o estudo empírico, com a apresentação do corpus, a
metodologia seguida, a análise dos dados relativos à hiperestrutra das reportagens, em
especial as formas e funções dos títulos, delimitação das funções retóricas ocorrentes e
anotação de algumas estratégias explicativas recorrentes. A finalizar esta parte,
procede-se à discussão dos resultados obtidos.
Os resultados obtidos evidenciam que estas reportagens possuem traços tipicamente
referidos na caracterização do género reportagem de divulgação científica, ou seja, que
denotam genericidade; mas também possuem, no seu conjunto, traços próprios que
decorrem, pelo menos parcialmente, das condições da sua produção.

Palavras-chave: reportagem, divulgação científica, funções retóricas, explicação

7
Abstract

The object of analysis of this dissertation is the genre of science reporting. It focuses
mainly on the characterization of several of its properties and the role that explanation
can play in this genre.
To this end, we selected a corpus of 37 reports from Superinteressante magazine,
published between 2018 and 2020, which were subjected to a mixed qualitative and
quantitative analysis methodology with regard to the hyperstructural and structural
analysis of the reports, followed by a qualitative and descriptive analysis regarding the
analysis of the processes and functions of explanation in their textualization.
The achievement of these objectives underlies the structuring of the work, which is
divided into two parts, the first of which consists of the theoretical foundation that will
serve as a basis for the empirical study carried out in the second part.
The first part is divided into three chapters. The first chapter is related to the reportage
genre, mainly its characterization (general properties, hyperstructure, internal and
external structures). The second chapter deals specifically with the science
popularization Reportage, trying to list its main characteristics. Finally, the third chapter
focuses on explanation. It presents several classifications of discourse strategies and
linguistic structures that are typically associated with them, as well as their function.
In the second part, we present the empirical study, with the corpus and methodology
description, the analysis of the data concerning the hyperstructure of the reports, in
particular the forms and functions of the titles, the delimitation of the rhetorical
functions, and the annotation of some recurrent explanatory strategies.
The results obtained show that these reports possess traits typically referred to in the
characterization of the genre of science reporting, that is, that convey genericity; but
they also have their own traits that arise, at least partially, from the conditions of their
production.

Key-words: Reportage, scientific diffusion, rhetorical functions, explanation

8
Índice de Figuras
FIGURA 1: PÁGINA DUPLA DE T12 ...................................................................................................... 67
FIGURA 2: ANTETÍTULO, TÍTULO E LEAD DE T29 .................................................................................... 68
FIGURA 3: EXEMPLO DE DESTAQUE EM T1 ........................................................................................... 69
FIGURA 4: CAIXA DE TEXTO EM T30 .................................................................................................... 70
FIGURA 5: RELAÇÃO ENTRE O TEXTO E A CAIXA DE TEXTO (T30)............................................................... 71
FIGURA 6: INFOGRÁFICO (T37) .......................................................................................................... 72

9
Índice de Tabelas
TABELA 1: QUADRO-SÍNTESE DAS ESTRATÉGIAS E ESTRUTURAS EXPLICATIVAS. ............................................ 60
TABELA 2: FUNÇÕES RETÓRICAS ......................................................................................................... 78
TABELA 3: SUBFUNÇÕES DE FR1A ...................................................................................................... 78
TABELA 4: SUBFUNÇÕES DE FR1B ...................................................................................................... 79
TABELA 5: SUBFUNÇÕES DE FR2 ........................................................................................................ 79
TABELA 6: SUBFUNÇÕES DE FR3 ........................................................................................................ 79
TABELA 7: SUBFUNÇÕES DE FR4 ........................................................................................................ 79

10
Índice de Gráficos
GRÁFICO 1: SUBFUNÇÕES DE FR1A .................................................................................................... 80
GRÁFICO 2: SUBFUNÇÕES DE FR1B..................................................................................................... 82
GRÁFICO 3: SUBFUNÇÕES DE FR2 ...................................................................................................... 85
GRÁFICO 4: SUBFUNÇÕES DE FR3 ...................................................................................................... 88
GRÁFICO 5: SUBFUNÇÕES DE FR4 ...................................................................................................... 93

11
Lista de abreviaturas e siglas
DC ......................................................................... DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

U.P ........................................................................ UNIVERSIDADE DO PORTO

U.PORTO ............................................................... UNIVERSIDADE DO PORTO

SGA ....................................................................... SERVIÇO DE GESTÃO ACADÉMICA

SRI ......................................................................... SERVIÇO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

E.S .......................................................................... ENSINO SUPERIOR

GRH ....................................................................... GESTÃO DOS RECURSOS HUMANOS

SI ........................................................................... SISTEMA DE INFORMAÇÃO

SPSS ...................................................................... STATISTICAL PACKAGE FOR SOCIAL SCIENCE

12
13
Introdução
O discurso de divulgação científica tem vindo a ser estudado por vários autores de
diversas áreas, à luz de múltiplas perspetivas teórico-metodológicas, dada a sua função
de “dar ao vulgo os bens culturais da ciência e do conhecimento” (Rojo 2008: 587-588),
isto é, compete à divulgação científica estabelecer uma ponte entre o universo científico
tipicamente restrito aos especialistas e à comunidade académica e o público geral, leigo.
É precisamente nessa função que é possível identificar uma relação de proximidade do
discurso científico com os discursos didáticos. Aliás, como afirma Leibruder (2000: 241),
a didaticidade é uma característica fundamental deste discurso.

Com base nesta ideia, e centrando-nos somente no género reportagem de divulgação


científica, partimos das seguintes questões de investigação:

(i) quais são as características da reportagem de divulgação científica?;

(ii) qual é o papel da explicação na reportagem de divulgação científica?

No sentido de dar resposta a estas questões, constituímos um corpus de 37 reportagens


de divulgação científica em suporte de papel publicadas na revista Superinteressante
entre 2018 e 2020, que se inserem em diversas áreas científicas, e procedemos à análise
qualitativa e quantitativa dos elementos supramencionados. Com a sua análise,
pretense-se verificar como se materializam os seus elementos hiperestruturais, assim
como a sua macroestrutura (nomeadamente, ao nível das funções retóricas cumpridas
pelos vários elementos da reportagem) e, finalmente, investigar de que modo se realiza
a explicação neste género textual.

A organização deste trabalho e, por conseguinte, a sua respetiva estrutura é composta


por duas partes. A primeira diz respeito à fundamentação teórica, que servirá de base
ao estudo empírico, enquanto a segunda consiste no próprio estudo empírico. Nesse
sentido, a primeira parte subdivide-se em três capítulos. O primeiro descreve o género
reportagem, tendo em consideração, primeiro, a noção geral de género e, depois, mais
especificamente, o conceito da reportagem enquanto género e as suas características
gerais (incluindo, entre outros, a sua hiperestrutura, e as estruturas externa e interna).

14
O segundo capítulo, focando na reportagem de divulgação científica, introduz a noção
de divulgação científica, para depois descrever este tipo específico da reportagem,
nomeadamente o seu conceito e as suas propriedades. O terceiro, e último capítulo da
primeira parte, apresenta a noção de explicação e em que consiste a explicação
enquanto modo discursivo e, em seguida, estabelece uma relação entre explicação e os
géneros de divulgação científica. Já a segunda parte, dedicada ao estudo empírico,
engloba a descrição do corpus, a explicitação da metodologia utilizada na recolha,
tratamento e análise de dados, a apresentação dos resultados da análise e a sua
discussão. Por fim, expomos algumas considerações finais.

15
1. Género Reportagem
Neste capítulo, começaremos por introduzir a noção de género, tendo por base os
pressupotos teóricos de Bakhtin (1997 [1984]), Bronckart (2010) e Adam (2002). De
seguida, apresentaremos algumas definições que existem na literatura sobre
reportagem, bem como as características que lhe são associadas. Finalmente,
apontaremos os trabalhos que têm sido propostos sobre este género textual para a
língua portuguesa, mas também para outras línguas.

1.1. Algumas Considerações Sobre o Conceito de Género

1.1.1. A relação do género com as atividades sociais: o conceito de domínio


discursivo

De acordo com Marcuschi (2002), um domínio discursivo é “uma esfera ou instância de


produção discursiva ou de atividade humana” (Marcuschi 2002: 23) que proporciona o
aparecimento de discursos próprios. Por outras palavras, trata-se de uma prática
discursiva, que possui uma dada finalidade discursiva associada a uma situação
específica (Oliveira 2012: 5), dentro da qual é possível a identificação de um conjunto
de géneros textuais próprios que funcionam como práticas comunicativas
institucionalizadas. A título de exemplo, podemos referir a atividade jurídica, a atividade
religiosa e a atividade jornalística.

Cada atividade discursiva tem por base a articulação de três núcleos, a saber: o sujeito,
o contexto situacional e o instrumento (material ou simbólico) associado a um dado
esquema de utilização (Miranda 2017: 816). Partindo deste pressuposto, o género é o
instrumento simbólico que o sujeito, numa determinada situação e recorrendo a um
conjunto de conhecimentos, coloca em funcionamento.

Em suma, como resume Coutinho (2005: 83), para as diversas atividades existentes,
temos à disposição, com relativa estabilidade inerente à época e à cultura em que nos
inserimos, diversos géneros “que regulam a produção de textos empíricos”.

16
1.1.2. O conceito de género

Todas as esferas da atividade humana relacionam-se, segundo Bakhtin (1997 [1984]:


279), com a utilização da língua. Como vimos, é nessa utilização que se inserem os
géneros, noção que iremos agora aprofundar.

Os géneros são alvo de múltiplas definições, que, de algum modo, corroboram o


posicionamento teórico de cada um dos autores (Charaudeau 2002: 279). De acordo
com Charaudeau (2002: 280), ora considera-se, preferencialmente, o caráter social do
discurso, ora o seu caráter comunicacional, ora as regularidades de âmbito
composicional dos próprios textos, ou ainda as suas propriedades formais. Contudo,
conforme esclarece o autor, existem duas teses centrais sobre géneros: “celle qui est
plutôt tournée vers les textes justifiant la dénomination « genres de texte », celle plutôt
tournée vers les conditions de production du discours justifiant la dénomination «
genres de discours ».” (Charaudeau 2002: 280).

1.1.3. A perspetiva de Bakhtin

Bakhtin (1997 [1984]) define o género como sendo “um dado tipo de enunciado,
relativamente estável do ponto de vista temático, composicional e estilístico” (Bakhtin
[1984] 1997: 283) gerado por cada uma das esferas da atividade humana. Assim, o autor
sublinha, duas ideias centrais. Por um lado, o facto de os géneros serem “relativamente
estáveis”, isto é, independentes de decisões individuais e dificilmente manipuláveis,
funcionando, por isso, como “geradores de expectativas de compreensão mútua”
(Marcuschi 2002: 15). Por outro lado, Bakhtin (1997 [1984]) enfatiza também a
dependência entre os géneros e os tipos de atividades humanas, na medida em que
defende que a variedade dos primeiros é definida pela variedade dos segundos. Nas
palavras do autor:

A riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas, pois a variedade virtual da
atividade humana é inesgotável, e cada esfera dessa atividade comporta um repertório
de gêneros do discurso que vai diferenciando-se e ampliando-se à medida que a própria
esfera se desenvolve e fica mais complexa. (Bakhtin 1997 [1984]: 279)

17
Além disso, Bakhtin (1997 [1984]: 281), estabelece uma distinção entre géneros
primários (mais simples), como é o caso da carta pessoal, por exemplo, e géneros
secundários (mais complexos ao nível cultural e ideológico), como o romance. O autor
refere ainda a possibilidade de os géneros primários serem absorvidos e transmutados
pelos secundários, tornando-se, dessa forma, componentes destes (Bakhtin 1997
[1984]: 281).

Na perspetiva deste autor, os géneros possuem três propriedades distintivas (Bakhtin


1997 [1984]: 283), a saber: os temas, a organização composicional e o estilo.

1.1.4. Na linha do Interacionismo Sociodiscursivo: Bronckart

Tendo como base o quadro teórico do Interacionismo Sociodiscursivo (doravante, ISD),


que pressupõe que “qualquer texto constitui uma ação de linguagem que é realizada
mediante a interação com um dos modelos de géneros sincronicamente disponíveis”
(Rosa 2020: 43), Bronckart (2010: 170) afirma que os géneros são modelos indexados –
considerados adaptadas a uma determinada atividade ou situação comunicativa –
disponíveis no arquitexto, um repertório de géneros disponíveis numa determinada
comunidade verbal, numa dada época.

O autor sublinha o dinamismo e a variabilidade característicos dos géneros, como


explica Rosa (2020: 44), o que significa que, apesar de os géneros emergirem para
cumprir objetivos comunicativos específicos, consoante as necessidades sociais, é
possível que, de acordo com as alterações que acontecem nas sociedades e que, por
conseguinte afetam também o funcionamento social dos géneros, eles adquiram novas
finalidades.

Inclusive, conforme refere Miranda (2017: 816-817), não é possível estabelecer uma
relação biunívoca ou estável entre géneros e atividades, pois se, por um lado, existe a
possibilidade dos géneros serem reutilizados e reelaborados noutros campos práticos
sem ser aquele onde foram primeiramente produzidos, por outro, os géneros podem
relacionar-se com práticas distintas e mesmo dentro de um determinado género podem
estar articuladas formas de linguagem tipicamente associadas a diversas atividades.

18
Um outro aspeto enfatizado por Bronckart é a dupla relação de adoção e adaptação
instituída entre um texto empírico e o género no qual se insere (Coutinho 2007: 643).
Como clarifica Rosa (2020: 46), para produzir um determinado texto, é necessário,
depois de selecionar o modelo de género a utilizar, dentro dos que existem no
arquitexto, adaptá-lo, tendo por base as representações que o produtor possui. Não
basta copiar o modelo.

Esta possibilidade de adaptação atesta o dinamismo e a variabilidade dos géneros,


defendido por Bronckart. Segundo Caldes (2009), é desta característica “que advém da
capacidade que estes possuem de se moldarem aos contextos de uso particulares (por
vezes inesperados e imprevisíveis) a que se aplicam, o que faz deles objectos em
(re)adaptação permanente no contexto das respectivas formações” (Caldes 2009: 155-
156).

Em suma, e de modo a sintetizar as duas posições até agora enunciadas em relação aos
géneros, para Bakhtin, o género é responsável pela articulação de um texto a um
determinado tipo de discurso, recebendo, por isso, a designação de “género discursivo”,
enquanto para Bronckart, o género é visto como “uma dimensão mais textual que
discursiva” (Oliveira 2012: 10), o que justifica a designação “género textual”. Note-se,
porém, que, mesmo com diferenças terminológicas, teóricas e metodológicas, duas
características são relativamente consensuais, como aponta Rosa (2020: 39): o cariz
social e a inscrição histórica.

1.1.5. Na linha da Linguística Textual: Adam

Para Adam (2001: 38), autor que se insere no ramo da Linguística Textual, os géneros
são regulados através de dois princípios: o princípio da identidade, relacionado com a
repetição e com a reprodução, e o princípio da diferença, associado à variação e à
inovação.

Estes dois princípios surgem no seguimento do processo de seleção e adaptação dos


géneros, ou seja, da dupla relação de adoção e adaptação já mencionada entre os textos
empíricos e os géneros, uma vez que se espera que desse processo “resultem
exemplares com características singulares decorrentes das propriedades específicas da

19
situação da ação e características (mais ou menos estáveis) do modelo de género
associado” (Rosa 2020: 46).

O autor, nesse mesmo trabalho (Adam 2001: 38-39), e seguindo a abordagem de


Bakhtin, caracteriza os géneros como reguladores das práticas sociodiscursivas bem
como dos enunciados discursivos; indispensáveis tanto para a produção como para a
receção de um determinado texto e prototípicos.

Com respeito às propriedades descritivas dos géneros, Adam (2001: 40-41) identifica
oito dimensões distintas: (i) enunciativa, (ii) pragmática, (iii) composicional, (iv)
semântica, (v) estilístico-fraseológica, (vi) material, (vii) peritextual e (viii) metatextual.

As dimensões enunciativa e pragmática correspondem às propriedades relacionadas


com aspetos externos aos textos, tais como os papéis socioprofissionais dos sujeitos, a
área de atividade, ou ainda os objetivos da situação comunicativa em questão (Adam
2002: 40). As propriedades referentes à organização dos textos, ou seja, à sua estrutura
(onde se inserem, na perspetiva de Adam (2001: 40), as sequências, o plano de texto e
as relações entre elementos verbais e elementos não-verbais) situam-se na componente
composicional. As propriedades textuais de caráter microlinguístico inserem-se, de
acordo com o autor (Adam 2001: 40), na dimensão estilístico-fraseológica, enquanto
que as propriedades relativas ao suporte físico, ao meio de produção e circulação, ou
ainda a aspetos gráficos (entre os quais a paginação e a formatação tipográfica). Na
dimensão peritextual, situam-se os componentes textuais que ocorrem nas fronteiras
dos textos. E, finalmente, na dimensão metatextual, Adam (2001: 41) inclui “discours
sur le genre propre à la formation socio-discursive, d'une part aux théories développées
sur le genre en question, d'autre part” (Adam 2001: 41).

1.1.6. A dimensão composicional e o plano de texto

Tendo em conta a importância da dimensão composicional – que, por um lado,


enquanto propriedade intrínseca aos géneros, assume um papel fundamental na sua
definição e delimitação (Silva 2016: 183) e, por outro, enquanto dimensão inerente
também ao texto empírico, influencia a relação estabelecida entre ambos –, esta será
agora abordada com maior pormenor.

20
Para isso, salientamos os contributos de Jean-Michel Adam e de Jean-Paul Bronckart. O
primeiro é autor de uma extensa reflexão sobre os elementos de composição textual,
desde os simples períodos até aos planos de texto, passando ainda pelas sequências
textuais (narrativas, descritivas, argumentativas, explicativas e dialogais) (cf., a título de
exemplo, Adam 2001: 30-31). Já Bronckart, apesar de não abordar a descrição de
géneros, mas a de texto, também tece, como refere Coutinho (2007: 641), algumas
considerações sobre a dimensão composicional ao elencar como elementos da
infraestrutura geral do texto o plano de texto (responsável pela organização temática),
os tipos de discurso (também designados de modos de enunciação), as modalidades
responsáveis pela articulação entre os tipos discursivos, as sequências e ainda outras
formas de planificação (tais como a esquematização e o script).

A denominação ‘plano de texto’ corresponde tipicamente à organização global do texto.


Esta, como clarifica Caldes (2009: 160), é marcada tanto pela natureza das unidades
composicionais que o constituem, como pela disposição que essas mesmas unidades
adotam no espaço material do texto.

Para Adam (2002), é devido ao plano de texto que os textos formam uma sequência
ordenada e hierarquizada de expressões. Nas palavras do autor: « Le fait que tout texte
ne soit pas un tas mais une suite ordonnée et hiérarchisée d'énoncés se traduit par des
plans de textes qui jouent un rôle capital dans la composition macro-textuelle du sens.»
(Adam 2002 : 433).

De facto, o plano de texto refere-se à ordenação e articulação dos conteúdos no texto,


bem como aos mecanismos de segmentação textual (Silva 2016: 189-190). Ou seja,
como resume Silva (2016: 193), o plano de texto inclui, por um lado, a distribuição de
conteúdos e, por outro, no suporte escrito, a segmentação formal.

No que concerne à distribuição de conteúdos, estes podem ser dispostos tendo em


consideração as relações cronológicas, temáticas, de analogia, de contraste, de
causalidade, alfabéticas, de proximidade, entre outros. Como explica o autor (Silva 2016:
194), é na distribuição que se inserem os tipos de sequências e as suas modalidades de
articulação (coordenação, inserção ou alternância) (cf. Adam 2001: 31) e os mecanismos

21
de coesão textual, que frequentemente também estabelecem ligação entre conteúdos.
Contudo, como acrescenta Silva, na linha do pensamento retórico, é ainda “possível
destacar os movimentos argumentativos e as ações que as diversas partes de um dado
plano permitem concretizar (como o modelo CARS proposto por Swales)” (Silva 2016:
194).

Já a segmentação, conforme explica Silva (2016: 194), abrange mecanismos como


secções e capítulos, títulos e intertítulos, períodos e parágrafos, cantos, versos e
estrofes, entradas lexicais e artigos, dado que envolve a divisão formal do texto, que,
muitas vezes, é realizada consoante os conteúdos inseridos no texto. Além dos
mecanismos já mencionados, o autor realça a possibilidade de elementos como o tipo e
o corpo de letra, o uso de carateres não verbais, de maiúsculas e/minúsculas ou ainda a
formatação em itálico ou negrito, também poderem funcionar como mecanismos de
segmentação (Silva 2016: 914).

Geralmente, os mecanismos de segmentação estão ao serviço da distribuição dos


conteúdos no texto, embora exista um relação de “estreita interdependência entre as
duas dimensões” (Silva 2016: 194). No entanto, é possível que a segmentação, ou seja,
a estrutura formal, determine previamente o plano do texto de um determinado género,
como ocorre no soneto, por exemplo.

As duas dimensões que constituem o plano de texto, de acordo com Silva (2016: 195),
equivalem às macro e microestruturas semânticas e às macro e microestruturas
estilístico-formais, sendo o nível macroestrutural correspondente à estrutura global do
texto enquanto que o nível microestrutural diz respeito à organização no interior de
“segmentos de extensão inferior à totalidade do texto” (Silva 2016: 195).

Consideramos ainda relevante destacar a distinção entre planos de texto convencionais


e planos de texto ocasionais, sublinhada por Adam (2002). Para o autor, o primeiro é
fixado pelo género do discurso e, por conseguinte, nesse caso, “le texte entre
pleinement ou partiellement dans le plan prévu” (Adam 2002: 434). Esta distinção é
importante pois, quer a distribuição e a segmentação, como os níveis macro e

22
microestrutural, são enquadrados por esta oposição, conforme defende Silva (2016:
195), que é gradual.

1.1.7. Síntese

Neste capítulo, apresentamos, ainda que de forma sumária, algumas considerações que
nos parecem fundamentais para compreender de forma global o conceito de género.
Nesse contexto, abordamos a relação do género com as atividades socias, explicitando
o conceito de domínio discursivo, analisamos a conceção de género em diversas
propostas teóricas (Bakhtin, Bronckart, Adam, e.o.), procurando delimitar algumas das
suas características e componentes. Tendo em conta a dimensão da
composicionalidade, considerámos o conceito de plano de texto na dupla vertente de
segmentação estruturação. Os conceitos abordados neste primeiro capítulo constituem
uma base a partir da qual tratamos um género específico - a reportagem – no segundo
capítulo deste trabalho.

1.2. O género Reportagem

1.2.1. Conceito

A palavra ‘reportagem’ provém do verbo francês ‘reporter’, que tem, por sua vez,
origem no infinitivo latino ‘reportare’, “que significa trazer ou levar uma notícia,
anunciar, referir, informar” (Cruz 2018: 17). Desta forma, de uma maneira geral,
‘reportagem’ significa informação. Contudo, na verdade, a reportagem implica mais do
que apenas informar e, enquanto género jornalístico, possui determinadas
características próprias, mais ou menos fixas que serão aqui tratadas.

A reportagem é considerada, por muitos estudiosos, um dos géneros mais importantes


do jornalismo moderno (Kindermann 2005, Durand 2011, Saraiva 2016). De acordo com
Saraiva (2016: 103), ela distingue-se da notícia na medida em que, ao contrário desta,
não tem por objetivo apenas informar, mas tratar o assunto tendo por base um ou mais
ângulos. Por outro lado, a reportagem também se distingue do artigo de opinião, por
exemplo, uma vez que, apesar de se fazer notar a subjetividade do repórter (em maior

23
ou menor grau) na leitura que este faz dos factos em questão – com o objetivo de,
descrevendo-os, contribuir para a formulação da opinião do leitor acerca do assunto
tratado – o observador não explicita o seu juízo de valor sobre a matéria em questão.

Com efeito, para o autor, a interpretação é a característica principal da reportagem, ou


seja, esta tem como objetivo central “explicar e mostrar antecedentes e suas
perspectivas” (Dittrich 2003, p. 31, apud Saraiva 2016, p. 103) um determinado tema.

Ainda seguindo a descrição de Dittrich (2003: 31 apud Saraiva 2016, p. 103), importa
referir, também, que a reportagem decorre, normalmente, da recolha de material
procedente de pesquisas ou investigações que é analisado e selecionado e,
posteriormente, transformado no texto final a que o público leitor tem acesso.

De facto, a reportagem é um género bastante complexo conforme especificaremos a


seguir. Esta complexidade característica dificulta a sua definição e caracterização
enquanto género textual, resultando em propostas divergentes por parte dos autores
que se dedicam ao estudo da reportagem.

De um modo geral, podemos afirmar que existem duas grandes correntes (Kindermann
2005: 2; Saraiva 2016: 123; Barros & Maia 2017: 122): a reportagem enquanto notícia
ampliada e a reportagem como género autónomo.

Na perspetiva de Bahia (1990), por exemplo, toma em consideração apenas as


reportagens que partem de factos, desconsiderando as reportagens que têm como
ponto de partida um determinado tema ou assunto (Barros & Maia 2017: 122). Para
Bahia (1990), conforme explicado por Barros & Maia (2017: 122), o que distingue uma
notícia de uma reportagem é que a segunda apresenta mais detalhes, questionando
causas e efeitos, e ganha, desse modo, uma nova dimensão narrativa.

Já na perspetiva de Lage (2001), apud Saraiva (2016: 355) e Barros & Maia (2017: 122),
a reportagem pode, consoante o seu facto gerador, ser uma complementação de uma
dada notícia (se partir de um facto recente) ou um género autónomo, se partir de temas
atuais de interesse público, porém sem qualquer ligação a uma notícia, tais como o meio
ambiente, ou questões relacionadas com a saúde, por exemplo.

24
Como já referido, a reportagem é um género onde o jornalista, para além de informar,
também deve interpretar os factos, explicando-os cuidadosamente. Com efeito, de
acordo com informação de Gonçalves & Santos (2014: 5) e Gonçalves, Santos & Renó
(2015: 228), Beltrão considera a reportagem um género informativo e interpretativo,
enquanto Assis & Melo (2010) defendem tratar-se de um género exclusivamente
informativo; por outro lado, Muñoz, referido por Mesa (2004: 195-196), defende que se
trata de um género exclusivamente interpretativo. Diferentemente, Chaparro (1998),
referido por Gonçalves & Santos (2014: 5) e por Gonçalves, Santos & Renó (2015: 228),
considera a reportagem como um relato, ou seja, uma espécie de narrativa.

Contudo, não podemos afirmar que alguma destas perspetivas esteja errada ou menos
correta do que as restantes, pois o que varia é somente o ângulo com que se observa e
descreve o mesmo objeto, conforme explicam Gonçalves & Santos (2014: 5) e
Gonçalves, Santos & Renó (2015: 228):

Considerar a reportagem como “informativo” é caracterizá-la pelo objetivo em relação


ao outro (atuar sobre o interlocutor de forma a fazer saber algo); como “interpretativo”
recorta-se a posição do locutor em relação aos factos; como “relato”, enfatiza-se a
tipologia textual empregada na sua elaboração.

Existem, ainda, outros estudiosos, como Machado (2012), que consideram a reportagem
como género narrativo, uma vez que, embora não haja narrativa pura – na medida em
que, enquanto o repórter narra também descreve e argumenta – a narração, isto é, a
história tem um papel fundamental, pois é onde se encontra a essência da reportagem.

Outros autores, como Mesa (2004: 195), destacam também o facto de a reportagem ser
um género composto, ou seja, um género que reúne (ou que pode reunir) em si outros
géneros, resultando num género mais completo e diversificado, acentuando a sua
complexidade. Nas palavras do autor supramencionado:

Existe un género periodístico que contiene en su texto —o puede contener—, todos y


cada uno de los demás géneros. Es informativo, pero también de opinión. Puede tratar
de la actualidad, aunque también permite la inclusión de algún texto de creación.
Muchos autores lo consideran un híbrido entre los escritos informativos y los
interpretativos, pero realmente se trata de la fusión de todos los géneros periodísticos.
Es el reportaje. (Mesa 2004: 195)

25
Saraiva (2016: 103-104) salienta que a reportagem é um género híbrido, pois concilia
simultaneamente características argumentativas típicas, por exemplo, do ensaio, com o
caráter informativo, que podemos encontrar na notícia. Conforme indica o autor, “Os
fatos ou informações são apresentados de um ângulo pré-determinado.” (2016: 103).
Essa seleção relativamente à informação que se pretende transmitir ao leitor, à forma
como ela é organizada no texto, ao léxico utilizado, ou seja, todas as escolhas realizadas
pelo repórter denotam uma determinada “linha ideológica marcada linguisticamente e,
por que não dizer, visualmente também (leiaute) pelo relevo que esses itens remontam
no conjunto global do texto” (Saraiva 2016: 103-104).

Portanto, nesta perspetiva, ainda que de maneira distinta da que se manifesta num
texto opinativo, na reportagem também se verifica potencial de argumentação.

Finalmente, consideramos importante referir o trabalho de Coimbra (1993) que, embora


não apresente uma definição concreta sobre a reportagem, foca-se nos aspetos
tipológicos textuais do género, e o trabalho de Sodré & Ferrari (1986), onde a
reportagem é descrita como uma mensagem direcionada para a comunicação de caráter
narrativo-expositivo (Barros & Maia 2017: 122).

Apesar de, como vimos, existir alguma divergência por parte dos estudiosos no que diz
respeito à definição e caracterização da reportagem e de se tratar de um género
complexo e diversificado, podemos apontar algumas especificidades descritas na
literatura, como veremos em seguida.

1.2.2. Características gerais

A reportagem é um género jornalístico que, quanto à função que desempenha em


relação ao jornal ou revista onde circula, é considerado género livre, segundo a
perspetiva de Bonini (2004), pois pode estar em qualquer secção do jornal e é (assim
como a notícia, ou a nota, igualmente presentes no jornal) responsável pelo seu
funcionamento comunicativo.

Relativamente ao tema, o repórter é livre para escolher entre “problemas ou


acontecimentos de interesse actual ou humano” (Cruz 2018: 20), não existindo qualquer

26
restrição específica. Como refere a autora, é, inclusive, possível tratar acontecimentos
ou factos que já sejam conhecidos, desde que através da explicação e reconstrução eles
permitam entender melhor o presente. Isto é, mesmo recorrendo a uma perspetiva
retrospectiva, a reportagem deve ser atual (Cruz 2018: 20).

Assim, este é um género cujas temáticas se dirigem a públicos muito diversos, conforme
referido por Saraiva (2016: 114), desde leitores sem qualquer conhecimento ou muito
pouco conhecimento sobre o assunto em questão até a leitores especializados na área
onde se insere o tema abordado, passando por leitores que, embora saibam algo sobre
o assunto, procuram aprofundar os seus conhecimentos, pois não são especializados
nem exercem uma profissão na área relacionada com o assunto tratado. Como sumaria
a autora (Saraiva 2016: 114), ainda que uma reportagem seja escrita tendo em
consideração um público-alvo específico, ela é construída “com possibilidades de
diversificação e aprofundamento a fim de atingir o maior número possível, já que disso
depende a sobrevivência da revista” ou do jornal.

A reportagem tem como principal função explicar, isto é, “tornar um facto ou problema
actual inteligível, colocá-lo em perspectiva” (Cruz 2018: 25), apresentando
antecedentes, causas e consequências para, finalmente, analisar todos os factos e levar,
dessa forma, informações mais abrangentes do que aquelas que são transmitidas, por
exemplo, através da notícia que relata o facto apenas como imediatez (Kindermann
2005: 7).

Além disso, como menciona Cruz (2018: 25), é possível associar a este género uma
função educativa, pois, muitas vezes, contribui para a promoção de reflexão crítica por
parte dos leitores, auxiliando-os a alargar os seus horizontes. Alguns autores referem
ainda a “função de instrumento social” (Cruz 2018: 25), visto que a reportagem analisa
um acontecimento ou problema social, procurando chegar ao fundo da questão.

Para conseguir explicar o tema tratado o mais completamente possível e de maneira a


torná-lo inteligível, é necessário um trabalho de pesquisa e investigação (cf. Saraiva
2016: 103). A informação proveniente dessa pesquisa ou investigação será submetida a
um tratamento exaustivo, numa tentativa de esgotar o tema sem deixar nada de

27
importante por dizer (Cruz 2018: 22), ou seja, uma característica fundamental da
reportagem é o aprofundamento do assunto abordado (cf. Saraiva 2016: 99; Cruz 2018:
21-22; UNECT Universidad Virtual (s/d): 27). Como enfatizado por Cruz (2018: 21), “a
reportagem quer-se profunda”.

Outro aspeto igualmente importante para que a explicação e o aprofundamento do


tema ou facto em questão sejam devidamente compreendidos consiste na forma como
as ideias são transmitidas. Com efeito, de acordo com UNECT Universidad Virtual ((s/d):
28), é fundamental que haja clareza de ideias e transparência expositiva, precisão e
fluidez narrativa e expositiva. Isto consegue-se, como explicado nessa Antologia,
recorrendo (i) a enunciados e parágrafos simples, não muito extensas e sem
subordinação; (ii) a palavras correntes, isto é, à linguagem corrente, tendo a
preocupação de explicar qualquer termo técnico ou menos conhecido que possa criar
alguma dúvida na leitura e interpretação do texto; (iii) ao rigor lógico-psicológico para a
construção de frases, a fim de evitar ambiguidades que possam dificultar a compreensão
do texto.

Sublinha-se, ainda, na Antologia mencionada, que se deve evitar neologismos


desnecessários, repetições e redundâncias. No entanto, embora se procure uma
linguagem clara e se recorra à linguagem corrente, não se deve evitar palavras cultas, se
estas forem concretas. Além disso, considera-se “especialmente relevante la presencia
de adjetivos, paralelismos, anáforas, comparaciones, metáforas, etc.” (UNECT
Universidad Virtual s/d: 28).

Efetivamente, os recursos expressivos, geralmente mais associados a textos literários,


são importantes, pois contribuem para manter o leitor interessado no texto. Aliás, como
explica Cruz (2018: 22), espera-se que a reportagem tenha alguma qualidade literária
por esse mesmo motivo: é sobretudo a capacidade de escrita do jornalista que vai
cativar ou não o leitor para continuar a ler.

Como já foi mencionado, o texto final da reportagem é resultado de um processo de


seleção contínuo (cf. Dittrich 2003: 32 apud Saraiva 2016: 103-104; Gonçalves & Santos
2014: 5; Gonçalves; Santos & Renó 2015: 228). Esse processo começa, como explicam

28
os autores, com a seleção do tema que será abordado e pelas fontes de informação que
serão consideradas, prosseguindo com a seleção lexical, assim como com a seleção do
estilo de narrativa que melhor se adequa ao tratamento do assunto.

Como referem Gonçalves & Santos (2014: 5) e Gonçalves, Santos & Renó (2015: 228):

Em cada forma de seleção e em cada opção de como articular as informações


podem ser encontradas as marcas da subjetividade do jornalista, que não se mostra
abertamente, mas deixa-se ver pelas escolhas e pelo tom que emprega ao narrar
ou comentar os fatos.

Em suma, esta seleção lexical deixa transparecer, ainda que não de forma explícita
(como acontece, por exemplo, nos textos de opinião), a subjetividade do repórter. Com
efeito, conforme já mencionámos, existem, inclusive, autores que referem que a
reportagem, além de informar, também tem um caráter argumentativo, muito próprio
e distinto do caráter argumentativo presente nos textos opinativos.

Por fim, consideramos relevante referir o caráter dialógico subjacente a este género. De
acordo com Bakhtin (1997 [1984]), um texto possui sempre caráter dialógico, pois “A
palavra quer ser ouvida, compreendida, respondida e quer, por sua vez, responder à
resposta, e assim ad infinitum” (Bakhtin 1997 [1984]: 357).

No caso específico da reportagem, como explicado por Gonçalves & Santos (2014: 4) e
por Gonçalves, Santos & Renó (2015: 227), para além de dialogar com outros textos, o
repórter está simultaneamente a dialogar diretamente com os leitores e com as fontes
de informação que selecionou.

1.2.3. Parâmetros que caracterizam o género

Sendo um género composto, a reportagem pode reunir, conforme enuncia Saraiva


(2016: 110): um resumo (parágrafo(s) introdutório(s) que, às vezes, surge(m)
separado(s) do corpo do texto, contextualizando o leitor sobre aquilo que irá ler e, dessa
forma, marcando a orientação discursivo-argumentativa do texto); três tipos de
depoimentos (depoimento participante – isto é, depoimento de pessoas que participam
diretamente na situação ou tema abordado na reportagem; depoimento secundário –
depoimento de pessoas que, embora não participem diretamente na situação ou tema,

29
“têm alguma relação com os participantes diretos” (Saraiva 2016: 110); depoimento
especialista, que, tal como o nome indica, é proferido por “profissionais especializados
na área relacionada ao tema ou situação abordada na reportagem” (Saraiva 2016: 110));
entrevistas (tanto a especialistas como a indivíduos que, de algum modo, se encontram
ligados ao assunto em questão); notícia; e, por fim, infográficos, dos quais falaremos a
seguir ao abordar a hiperestrutura da reportagem.

Importa ainda referir que, dado o caráter composto deste género e a sua complexidade,
podemos observar nele todas as sequências textuais, consoante a motivação inicial da
reportagem (se for uma notícia ou um tema) (Saraiva 2016: 111).

1.2.4. Hiperestrutura

De acordo com Essono (2019), a hiperestrutura é um elemento intermédio da


estruturação da informação, localizada entre o jornal – elemento superior da
estruturação da informação – e o texto jornalístico (constituído pelo próprio texto, mas
também por elementos peritextuais que circundam o texto, como, por exemplo, o
título), que é o elemento inferior da estruturação, que “peut s’entendre comme
l’ensemble rédactionnel (multitexte et hyperstructure)” (Essono 2019: 189).

Tipicamente, são apontados os seguintes elementos hiperestruturais: caixas de texto,


imagens ou fotografias legendadas e infográficos (Essono 2019: 191). Estes elementos,
apesar de não serem todos da mesma natureza, dado que as caixas de texto são de
natureza verbal e as imagens legendadas e os infográficos são verbo-visuais, partilham,
segundo o autor, a função central de facilitar a leitura do texto e evitar estruturas
complexas que possam dificultar a compreensão do leitor, como a apresentação de um
background (Essono 2019: 199).

As caixas de texto são definidas por Essono (2019: 191) como pequenos artigos
vinculados ao texto principal que expandem, detalhando ou esclarecendo, um aspeto
particular associado ao assunto temático do artigo principal. O autor adianta ainda que,
tipicamente, estes textos de menor extensão surgem destacados por uma moldura e um
por um fundo colorido (cf. Essono 2019: 191).

30
Os infográficos distinguem-se das imagens legendas, pois, enquanto estas são,
sobretudo, ilustrativas, aqueles funcionam como elementos complementares de
informação que, conciliando texto visual com texto verbal curto, apresentam
informações de forma sucinta e atraente aos olhos do leitor (Barroso 2013: 2).

Assim, os infográficos, para além de chamarem a atenção do leitor, também o auxiliam


a compreender melhor o texto, pois oferecem informações adicionais e
complementares que apenas o texto verbal principal (neste caso, a reportagem) não
seria capaz de oferecer (Barroso 2013: 45; Cortina 2020: 4). Alguns conteúdos, se forem
tratados e explicados apenas através da linguagem verbal, podem tornar-se pesados e
aborrecidos; por outro lado, se forem esclarecidos apenas através da linguagem visual,
é possível que não fiquem claros e, inclusive, deixem lacunas no entendimento da
informação, como elucida Barroso (2013: 45).

Portanto, para além de serem atrativos, os infográficos “são uma nova forma de explicar
certos conteúdos” (Barroso 2013: 45) e, como afirma Barroso (2013: 45), podem mesmo
“facilitar a leitura, na medida em que trazem de maneira mais clara uma representação
dos sujeitos, do tempo e do espaço do fenômeno abordado ou do fato narrado.”

Macedo & Grillo (2010), num estudo onde tratam reportagens da revista
Superinteressante, ao recuperarem a noção de link, normalmente associado ao meio
digital, que consiste na ligação entre páginas e textos distintos, referem a expressão
“nexos hipertextuais” para designar essa relação dialógica entre diferentes páginas e
elementos hiperestruturais.

Segundo as autoras, é possível distinguir três tipos de nexos: (i) os quadros adicionais;
(ii) os quadros complementares e (iii) os conclusivos (cf. Macedo & Grillo 2010: 71-77).
Os primeiros caracterizam-se por fornecer ao leitor curiosidades ou aspetos discutidos
que se inserem no tema amplo abordado pela reportagem. Os segundos, embora
apresentem, igualmente, “tópicos que apenas tangenciam o tema principal” (Macedo &
Grillo 2010: 74), distinguem-se dos anteriores na medida em que apresentam
esclarecimentos essenciais para a verdadeira compreensão da reportagem. Finalmente,
os quadros conclusivos, surgindo perto do fecho da reportagem, apresentam

31
esquematicamente uma conclusão onde são reunidas as principais informações da
reportagem e comparam, geralmente recorrendo a tabelas, todos os aspetos tratados
(cf. Macedo & Grillo 2010: 76).

Conforme referido, na hiperestrutura da reportagem coexistem, ou podem coexistir,


elementos verbais (caixas de texto) e elementos verbo-visuais. Torna-se, por isso,
relevante referir uma característica típica da reportagem: a multimodalidade.

De acordo com Leal (2018: 30), podemos definir a multimodalidade como sendo “a
presença de diversos modos semióticos presentes na comunicação humana”.

De facto, o género reportagem é descrito como um género multimodal, por excelência,


pois, mesmo quando o seu suporte é em papel, encontramos fotografias, tabelas,
infográficos, bem como formatações de letra distintas, que representam tipos de modos
semióticos variados (cf. Leal 2018: 27).

1.2.5. Estrutura externa

No que diz respeito à estrutura externa da reportagem, alguns autores propõem uma
divisão tripartida. Saraiva (2016: 127), na linha de outros autores, aponta para a
existência de: (i) um título, que dá a conhecer o facto ou assunto que será tratado; (ii)
um lead, que o autor descreve como sendo o clímax do texto; (iii) o desenvolvimento da
história, narrativa ou texto, que corresponde à narrativa dos factos propriamente ditos.

Por sua vez, Martínez Albertos, apud Mesa (2004: 198), não faz referência ao título na
sua proposta e, portanto, defende a existência de: (i) um lead, onde se apresenta a tese
ou ponto de vista que serve de base ao texto em questão; (ii) o corpo do texto, que
consiste na exposição e tratamento dos dados que justificam a tese proposta; e (iii) uma
conclusão, onde é reforçada a ideia apresentada inicialmente no lead.

Porém, conforme temos vindo a constatar, a reportagem é um género livre e complexo


e, na verdade, a sua titulação não é assim tão simples, na medida em que se usam
subtítulos, antetítulos e resumos, por exemplo. Além disso, o próprio texto admite a
inclusão de uma vasta diversidade de dados e informação, seja em testemunhos e
depoimentos, entrevistas, ou mesmo em infográficos (cf. Mesa 2004: 198-199).

32
De facto, uma vez que o título tem como principal função chamar a atenção do leitor,
ainda que possa ser parcialmente informativo e o lead (entradilla) deve conter dados
objetivos e informativos, Mesa (2004: 200) defende que estes dois elementos da
reportagem devem ser analisados separadamente. O autor, sublinhando, ainda, a
importância da ilustração (fotografias e infográficos, por exemplo) enquanto parte
essencial da reportagem, defende que esta também devia ser considerada enquanto
elemento autónomo. Por isso, Mesa (2004: 200) propõe uma estrutura externa dividida
em quatro partes, salientando, contudo, que, em cada uma destas partes, é possível
distinguir várias componentes: (i) a titulação, onde se inserem o antetítulo, o título e o
subtítulo e que deve ser marcada pela originalidade para atrair o leitor; (ii) o lead, que
deve apresentar dados sobre as fontes de informação e, se se verificar oportuno,
estabelecer alguma ligação entre o assunto tratado e outros acontecimentos da
atualidade; (iii) a ilustração, que inclui fotografias, infografias e ainda fotocópias de
documentos; (iv) o corpo do texto, constituído por dados, argumentação e conclusão.

O título, como explicam Cruz (2018: 20) e a Antologia de NECT Universidad Virtual (s/d:
29), para além de informar o leitor acerca do conteúdo do texto, deve chamar a atenção
e ser apelativo, levando-o a que tenha vontade de continuar a ler, já que se situa no
primeiro nível de leitura e é o primeiro contacto do leitor com a reportagem (cf. também
Essono 2019: 209).

Para conseguir captar a atenção do leitor, o título deve ser original e criativo. Nesse
sentido, uma estratégia muito utilizada pelo jornalista, como sugerido na referida
Antologia (UNECT Universidad Virtual s/d: 29-30), é a utilização de recursos estilísticos,
como o paradoxo, o duplo significado (também designado de jogo de palavras), a
antítese, as diferentes formas de metáfora (como a metonímia e a sinédoque) e a
hipérbole.

Mesa (2004), ao abordar o género notícia, explicita uma classificação proposta por
Daniel Jorques que distingue os títulos tendo em conta a sua ligação com a restante
informação, bem como a ordem em que aparecem as partes que o constituem, o que
nos parece relevante ter em consideração também no género reportagem. Deste modo,
o autor distingue os títulos que estão diretamente ligados com o corpo da notícia (não

33
havendo um lead, antetítulo ou subtítulo para realizar explicitamente a transição) de
títulos de intervalo aberto (nas palavras do autor, los titulares de intervalo abierto) e,
por oposição, os títulos com continuidade (titulares com continuidad), que, de acordo
com o que explica Mesa (2004: 55), “se apoyan en el lead, antetítulos y subtítulos como
un conjunto sumarial completo”.

Já em relação à sua referência, amplitude e concretização, Mesa (2004: 54) descreve a


classificação de Josep Lluis Gómez Momparat e acrescenta ainda dois critérios, a saber:
composição do título e grau de informação. Assim, considerando ambas classificações,
para além de poderem ser classificados como títulos de intervalo aberto ou títulos com
continuidade, os títulos podem ainda ser: objetivos (se sintetizam o assunto da notícia)
ou subjetivos (se procuram, antes, atrair o leitor e não informá-lo); amplos ou
concentrados, consoante a sua extensão (se tiverem mais de 10 palavras são amplos,
caso contrário são considerados concentrados); completos ou explícitos, se contêm a
informação fundamental da notícia, por oposição a incompletos ou implícitos, se
fornecem ao leitor apenas parte da informação tratada na notícia.

Entendemos estas classificações como relevantes, embora tenham sido apontadas para
o género notícia, pois julgamos ser possível aplicar os mesmos princípios à análise da
reportagem.

O lead, uma vez que se trata da introdução ao texto, deve ser claro, conciso, simples e,
principalmente, interessante. Segundo Bahia (1990), citado por Saraiva (2016: 127),
Barros & Maia (2017: 123) e Cruz (2018: 20-21), embora possa dar, na medida do
possível, respostas às questões habituais: “o quê?”; “quem?”; “quando?”; “onde?”;
“como?”; “porquê?”, o lead deve preocupar-se, sobretudo, por, recorrendo a uma
linguagem clara e apresentando “veracidade e fidelidade dos facto” (Barros & Maia
2017: 123), manter o interesse do público leitor, pois, como sublinha Cruz (2018: 20), “a
preocupação de despertar interesse no leitor é transversal à reportagem, da estrutura
à linguagem utilizada”.

Quanto ao corpo da reportagem, consideramos relevante realçar que não existe uma
ordem específica para a exposição dos dados e, por isso, o jornalista tem liberdade para

34
combinar dados essenciais com dados complementares, de modo a manter a
intensidade da narração. Na conclusão, “lo habitual es que en el párrafo final, el
periodista desmenuce, aclare y concluya de forma sintética el relato” (UNECT
Universidad Virtual s/d: 31). No entanto, dada a liberdade característica deste género
jornalístico, o repórter pode finalizar com a citação de uma personalidade entrevistada,
com a síntese das informações mais recentes sobre o assunto tratado ou ainda deixando
em aberto uma questão para o leitor refletir sobre a mesma.

Efetivamente, a conclusão vai depender da temática da reportagem, do seu objetivo, do


espaço disponibilizado para a publicação da mesma e também do próprio estilo do
jornalista (UNECT Universidad Virtua s/d: 31).

1.2.6. Estrutura interna

Para além das variações que já foram referidas (como a que diz respeito ao tema, ao
objetivo da reportagem, ao espaço disponível e ao próprio estilo do jornalista), é
possível verificar a existência de variações relativamente à estrutura interna da
reportagem, ou seja, à forma como assunto tratado é exposto ao longo do texto.

Tendo em consideração a estrutura interna da reportagem, os manuais americanos de


jornalismo, como referido na Antologia (UNECT Universidad Virtual s/d: 32), apresentam
três modelos estruturais: (i) a reportagem de acontecimentos (“fact-story”), muito útil
para descrições, uma vez que, seguindo o esquema de pirâmide invertida, é constituída
por um conjunto de parágrafos em ordem decrescente de interesse, isto é, parte do
facto mais importante para o menos importante; (ii) a reportagem de ação (“action-
story”), que, apesar de adotar também a forma de pirâmide invertida – começando pelo
incidente inicial, complementa depois o desenvolvimento da narração dos
acontecimentos –, distingue-se da anterior por apresentar uma visão mais dinâmica dos
factos, na medida em que o repórter oferece uma perspetiva do sucedido desde de
dentro, permitindo ao leitor reviver o que aconteceu; e (iii) reportagem de citações,
designada por alguns autores como reportagem documental, que se caracteriza pela
alternância entre as palavras do entrevista e as narrações ou descrições do jornalista e
que pode, inclusive, adotar a forma de pergunta/resposta.

35
1.2.7. Trabalhos Relacionados

Há ainda poucos estudos sobre reportagem realizadas com foco na análise de


reportagens publicadas por revistas e jornais portugueses, indicando-se seguidamente
alguns.

Cruz (2018), a partir de um estudo de caso, procurou entender a importância do género


no Jornal de Notícias. Para isso, recorreu a uma análise quantitativa relativa à produção
de reportagens na publicação mencionada, bem como a um inquérito através de um
questionário dirigido aos jornalistas do Jornal de Notícias.

Leal (2018), seguindo a proposta teórica da Semiótica Social, analisou duas reportagens
da revista Visão, a fim de estudar a importância do não-verbal neste género, bem como
o modo como o visual está vinculado à função social do género reportagem. Conforme
explica a autora (cf. Leal 2018: 31), neste estudo, recorre a um modelo de análise que
tem por base a gramática do design visual, uma gramática para o não-verbal que
distingue três (meta)funções, baseadas nas três metafunções desenvolvidas por Halliday
(1978) – interpessoal, ideacional e textual –, a saber: representacional; interacional e
composicional,.

Por oposição, no Brasil, existe uma literatura variada, no âmbito da qual salientamos de
seguida alguns trabalhos.

Kindermann (2005) tem como objetivo definir o modo como o género é constituído, de
acordo com a forma como circula no jornal. Recorre, para isso, à microanálise de um
corpus constituído por 32 reportagens. Essa microanálise tem como base três critérios,
considerados sequencialmente (Kindermann 2005: 5): i) constatar se a reportagem
evidenciava características de género autónomo ou se decorriam de uma notícia
publicada anteriormente; ii) distinguir entre reportagens puras e reportagens
“contaminadas por outros géneros” (Kindermann 2005: 5), com seleção para estudo
apenas das primeiras; iii) delimitar a estrutura geral da reportagem. Esta análise
permitiu à autora evidenciar quatro subgéneros de reportagem, já mencionados.

Ferreira (2006), com o objetivo de comprovar se, neste género, ocorrem com a mesma
frequência e função, as funções referenciais avaliativas que fortalecem a argumentação

36
do artigo de opinião, compara ambos os processos de referenciação. Recorre a uma
análise comparativa entre ambos os géneros, tomando em consideração como critérios:
“a) tipo de remissão: anafórica ou catafórica; b) tipo de recuperação: por
encapsulamento anafórico, por dêitico-discursivo nominal, por recategorizações
anafóricas; e c) valor argumentativo ou não-argumentativo da expressão” (Ferreira
2006: 266). O seu estudo permitiu concluir que as expressões referenciais avaliativas
ocorrem com intensidade equivalente em ambos os géneros em causa, o que demonstra
que também a reportagem “avalia” (Ferreira 2006: 268).

Messias (2006), trabalhando igualmente os processos de referenciação, neste caso no


que concerne à nominalização, ao encapsulamento anafórico e à expressão nominal,
utilizando uma análise de caráter qualitativo, também dá conta de que, embora a
reportagem seja um género informativo, possui também um caráter argumentativo
inerente ao procedimento referencial executado nesse género.

Rubio (2009) pretende colocar em evidência as características que podem aproximar ou


afastar produções textuais que circulam no mesmo contexto cultural e social, assim
como no mesmo suporte. Para este estudo, o autor estabelece uma análise comparativa
entre duas reportagens da revista semanal Época, observando, para isso, algumas
características, como a presença ou ausência de recursos expressivos (metonímias,
metáforas, eufemismos, entre outros), as referências utilizadas, as legendas, as imagens
(fotos) e a intertextualidade presente nos textos. As conclusões deste trabalho
destacam a diversidade característica da reportagem, que não se limita apenas ao
conteúdo, isto é, ao tema tratado, mas também à forma como esse conteúdo é exposto.

Santos (2009) ocupa-se da caracterização da reportagem enquanto género textual


factual.

Peixoto (2011) tem como objetivo “compreender o processo de construção de sentido


da anáfora associativa no gênero reportagem jornalística” (Peixoto 2011: 9) e segue,
neste estudo, uma abordagem descritiva-interpretativa de caráter qualitativo.

Barroso (2013) procura perceber como se lê e que recurso se utiliza na leitura de textos
compostos por duas modalidades de linguagem (linguagem verbal e não verbal), como

37
é o caso da reportagem. Para isso, a autora observa de que modo alunos universitários
leem e entendem uma reportagem de divulgação científica que surge complementada
por um infográfico, mais precisamente, de que modo agiam, quais eram as estratégias
de leitura utilizadas e, por fim, de que forma a presença do infográfico influenciava a
leitura da reportagem. Trata-se, portanto, de um estudo de caráter qualitativo, onde se
utiliza, porém, para além da análise qualitativa dos dados, a análise quantitativa, pois,
nas palavras da autora “além de descrevê-los e interpretá-los, fizemos a quantificação
dos mesmos, a fim de apresentá-los de forma mais sistemática e poder fazer algumas
generalizações e comparações” (Barroso 2013: 47).

Gonçalves & Santos (2014) e Gonçalves, Santos & Renó (2015) refletem sobre o género,
considerando a narrativa como elemento constitutivo fundamental e tendo por base as
principais classificações de reportagem, como Kindermann (2003) e Machado (2012),
entre outros. Ou seja, realizam esta reflexão através de um levantamento de
referências.

Saraiva (2016) pretende contribuir para a caracterização do género reportagem de


magazine em revistas impressas, confrontando-a com a caracterização da notícia. A
autora adota uma análise “teórico-analítica, documental, comparativa e qualificativa”
(Saraiva 2016: 26).

Finalmente, quanto a trabalhos propostos para outras línguas sobre este género,
destacamos Mesa (2004), que se debruça sobre a caracterização da reportagem
enquanto género jornalístico e Durand (2011), que retrata a emergência da reportagem
e a consequente evolução do jornalismo em França no século XIX, referindo a
importância que a influência anglo-saxónica/americana teve nesse acontecimento.

1.2.8. Síntese

Neste capítulo, tínhamos como objetivo caracterizar o género reportagem, ilustrando a


sua complexidade e diversidade. Para isso, apresentámos definições propostas por
vários autores, que apontavam para vários aspetos característicos da reportagem.
Depois destacámos as principais características que são associadas a este género, bem
como a sua estrutura externa e a sua estrutura interna. Por fim, apontamos alguns

38
trabalhos que têm sido propostos sobre a reportagem, tanto para a língua portuguesa,
como para outras línguas.

Neste trabalho, procuramos contribuir para o tratamento do género, tendo como


enfoque as regularidades presentes num conjunto de reportagens de uma revista que
tem em comum o facto de tratar assuntos de divulgação científica. Trata-se, por
conseguinte de um tipo específico de reportagem aquele que nos ocupará no estudo
empírico realizado e que descrevemos no próximo capítulo.

39
2. Género Reportagem de Divulgação Científica
Neste capítulo começaremos por introduzir o conceito de divulgação científica,
apresentando as descrições existentes na literatura (como Authier-Revuz (1998) e
Zamboni (1997)) e descrevendo alguns dos géneros associados a esta modalidade
discursiva. De seguida, especificando o caso da reportagem de divulgação científica, que
é o objeto de estudo deste trabalho, descreveremos este género, apontando algumas
das suas principais características. Por fim, apontaremos alguns trabalhos sobre a
reportagem de divulgação científica.

2.1. O Conceito de Divulgação Científica

A divulgação científica é um conceito que gera muita discussão relativamente à sua


definição, pois os diferentes autores que se debruçam sobre este fenómeno apresentam
definições variadas, consoante a hipótese teórica adotada no respetivo trabalho. No
entanto, no seu sentido mais amplo, a divulgação científica é entendida como
“phénomène social de diffusion des connaissances” (Mortureux 1985: 825).

A discussão em torno da divulgação científica não diz respeito somente à sua definição,
mas também aos próprios termos utilizados. Isto é, conforme mostrado por Costa (2012:
21) verifica-se uma determinada variação terminológica, na medida em que se recorre
a diferentes termos (como difusão científica, disseminação científica, jornalismo
científico, popularização da ciência) para referirmos este fenómeno.

Alguns autores, porém, propõem uma distinção entre os termos mencionados, como é
o caso de Bueno (1985). Com efeito, o autor clarifica o significado de ‘difusão científica’,
‘disseminação científica’ e ‘divulgação científica’. ‘Difusão científica’, o conceito mais
abrangente, consiste em “todo e qualquer processo ou recurso utilizado para a
veiculação de informação científica e tecnológicas” (Bueno 1985: 1420). A ‘disseminação
científica’, por seu turno, subdivide-se em dois níveis distintos: ‘disseminação
intrapares’, que “diz respeito à circulação de informações científicas e tecnológicas
entre especialistas de uma área ou de áreas conexas” (Bueno 1985: 1421), e
‘disseminação extrapares’, que “diz respeito à circulação de informações científicas e

40
tecnológicas para especialistas que se situam fora da área-objeto da disseminação”
(Bueno 1985: 1421). Ou seja, a disseminação científica tem como alvo um público
especializado. Por oposição, a divulgação científica, de acordo com o autor,
“compreende a utilização de recursos, técnicas e processos para a veiculação de
informações científicas e tecnológicas ao público geral” (Bueno 1985: 1421).

2.2. Definição de divulgação científica

Na literatura, existem duas perspetivas teóricas centrais sobre a divulgação científica:


alguns autores, como Authier-Revuz (1998), consideram a divulgação enquanto prática
de reformulação de um discurso-fonte (doravante D1), o discurso científico esotérico,
que se caracteriza por uma linguagem especializada, num discurso-segundo (doravante
D2), o discurso de divulgação científica, com uma linguagem acessível ao público em
geral (cf. Authier-Revuz 1998: 108); enquanto outros, como Zamboni (1997), vêem a
divulgação científica, não como uma reformulação, mas como uma formulação de um
novo discurso (cf. Zamboni 1997: 10). Descreveremos, de seguida, com maior pormenor,
estes dois posicionamentos.

Para Authier-Revuz (1998), a divulgação científica corresponde a uma prática de


reformulação, conforme mencionado, por consistir, segundo a autora, na “transmissão
de um discurso existente em função de um novo receptor” (Authier-Revuz 1998: 108).
A autora explica também que essa prática de reformulação difere da prática de tradução
pois, ao contrário do que ocorre nesta, o D2 produto-de-DC “longe de esconder a
maquinaria, ele a mostra sistematicamente” (Authier-Revuz 1998: 109), deixando,
assim, explícito, o facto de ser um resultado de reformulação de D1. Isso torna-se
evidente (i) na dupla realização discursiva, uma vez que “D2 mostra a enunciação do D1
que ele pretende relatar, ao mesmo tempo em que se mostra em uma atividade de
relato” (Authier-Revuz 1998: 114) e, desse modo, D1, além de fonte discursiva, assume
ainda o papel de objeto mencionado de D2; (ii) no próprio “fio do discurso”
heterogéneo, onde a passagem da linguagem especializada do discurso científico à
linguagem corrente acessível ao grande público se torna explícita através de um

41
conjunto de operações locais intrínsecas à reformulação, tais como a citação, a glosa, o
ajuste e a tradução (cf. Authier-Revuz 1998: 109; 115).

Adotando esta visão de que, de facto, a divulgação científica constitui uma prática de
reformulação do discurso científico, é possível considerar, como refere Jacobi (1985:
156), a divulgação científica como uma atividade metalinguística.

Já Zamboni (1997), dialogando com a proposta teórica de Authier-Revuz, desenvolve a


hipótese de a divulgação científica ser uma formulação de um novo discurso e, mais
concretamente, um género discursivo autónomo. A autora começa por sustentar a sua
tese refletindo sobre o polo de receção: o leitor da divulgação científica não é o mesmo
leitor do discurso científico esotérico; mesmo que o emissor possa ser o mesmo, existe
uma mudança de lugar do leitor e uma mudança de lugar do emissor e, por isso, de
acordo com a noção de dialogismo de Bakhtin, se a cena enunciativa é outra, a forma
de transmissão também devia de ser outra. Nas palavras da autora:

“uma vez serem outros os protagonistas do discurso, consideradas as cenas enunciativas


do discurso científico e do discurso de vulgarização científica, deveria ser outra também
a forma de transmissão de conteúdo (…) para tornar a comunicação mais compreensível
ao público leigo.” (Zamboni 1997: 30)

De seguida, tomando em consideração a ideia de Authier-Revuz de que a divulgação


científica possui a particularidade de mostrar o seu discurso-fonte, Zamboni (1997: 79-
80) esclarece que a enunciação do discurso do “outro” não pode ser visto como um traço
intrínseco à divulgação científica, pois o discurso relatado está igualmente presente em
vários outros discursos (inclusive, no discurso científico, mas também no discurso
quotidiano).

Na opinião da autora, o discurso do “outro” (neste caso, dos cientistas) está relacionado
com o facto do discurso de divulgação científica ser um discurso de transmissão e,
enquanto discurso de transmissão de informação especializada, “a voz dos cientistas e
da ciência adquire uma feição argumentativa nesse género, porque imprime um caráter
de autoridade e seriedade ao tratamento dado à notícia” (Zamboni 1997: 82).

42
Contudo, Zamboni (1997: 89) não nega que o discurso científico entra na enunciação da
divulgação científica, apenas defende que o faz enquanto “um dos ingredientes
constantes das condições de produção da DC” e não enquanto discurso-fonte que,
através da reformulação, dá origem a um discurso segundo, que é o discurso de
divulgação científica.

Além destas duas perspetivas, consideramos relevante referir a proposta teórica de


Grillo (2013) por ser aquela com a qual nos identificamos, como Lima & Giordan (2017).
De acordo com a autora, a divulgação científica não é um género discursivo, mas uma
forma particular de “relação dialógica entre a esfera científica e outras esferas da
atividade humana”, que se manifesta através de diversos géneros discursivos (Grillo
2013: 88), conforme veremos.

2.3. Géneros de Divulgação Científica

No seu trabalho, Grillo (2013: 93) descrevendo o fenómeno da divulgação científica no


Brasil, refere que esta ocorre, principalmente, em três esferas da atividade humana, a
saber, na científica, na educacional e na jornalística. Para cada uma destas esferas, a
autora aponta alguns géneros: na esfera científica, o artigo; na esfera educacional, os
livros e manuais didáticos e paradidáticos e as aulas, entre outros; por último, na esfera
jornalística, a notícia, a reportagem, o artigo e ainda as perguntas do leitor (Grillo 2013:
93-95). A autora alude ainda outras duas esferas da atividade humana onde a divulgação
científica ocorre com menor frequência: a literária e a cultura (por exemplo, nos painéis
de exposição dos museus).

Dado que o objeto deste estudo é a reportagem de divulgação científica, vamos centrar-
nos na esfera jornalística. A esse respeito, Teixeira (2018: 147) menciona que, em
Portugal, na imprensa atual, existem três géneros textuais que são utilizados para
divulgar ciência: notícia, reportagem e entrevista.

Na próxima secção, atentaremos na caracterização da reportagem de divulgação


científica.

43
2.4. Reportagem de Divulgação Científica

Na literatura, não são conhecidos muitos trabalhos que tenham como objeto de estudo
especificamente a reportagem de divulgação científica e, por isso, a definição e
caracterização do género reportagem de divulgação científica é um tema complexo,
como referido por Barros & Maia (2017: 121).

Antes de apresentarmos a definição do género, revela-se fundamental esclarecer a


denominação utilizada.

Rojo (2008) distingue divulgação científica de jornalismo científico, tendo como critério
as respetivas esferas de produção e de circulação. Assim, para a autora, a divulgação
científica diz respeito aos produtos verbais que tenham como esfera de produção a
esfera científica e como esfera de circulação a esfera jornalística; por outro lado, o
jornalismo científico engloba aqueles cuja esfera de produção e de circulação é a
jornalística, como é o caso da revista Superinteressante (mencionada, inclusive, pela
autora como exemplo). Com efeito, como explicam Barros & Maia (2017: 121),
enquanto os primeiros são escritos por especialistas (cientistas ou jornalistas
especializados), os segundos são produzidos por jornalistas (especializados ou não),
sendo, na verdade, menos comprometidos com o rigor científico.

Embora concordemos com a distinção apresentada pela autora, continuaremos a utilizar


a designação reportagem de divulgação científica, pois, apesar de se tratar do género
reportagem e de ter como esfera de produção e de circulação a jornalística, tem como
objetivo “dar ao vulgo os bens culturais da ciência e do conhecimento” (Rojo 2008: 587-
588), que coincide, precisamente, com o objetivo da divulgação científica.

2.4.1. Conceito

A reportagem de divulgação científica consiste num tipo específico de reportagem – e,


como tal, é um género, conforme já referimos, que é produzido e que circula na esfera
jornalística – que objetiva a divulgação e a discussão de assuntos científicos ou
relacionados com as descobertas científicas para um público leigo, isto é, não
especializado (Santos & Ramos 2021: 10). Para isso, como esclarecem os autores (Santos
& Ramos 2021: 10), o produtor deste género procura tratar o científico de forma

44
interessante de modo a atrair e cativar o leitor, com recurso à explicação de termos
técnicos e ainda com uma linguagem corrente, de maneira a tornar o conteúdo científico
acessível ao público em geral.

Note-se, porém, que este género se subdivide em dois subgéneros, segundo Barros &
Maia (2017: 126): (i) a reportagem de pesquisa, que tem por base uma pesquisa
científica que foi divulgada recentemente; (ii) a reportagem de temas ou factos
científicos, que, embora possa abordar alguma pesquisa, não se centra na sua
divulgação, mas antes em abordar temas ou factos científicos atuais e que sejam
socialmente relevantes.

De seguida, trataremos algumas particularidades associadas à reportagem de


divulgação científica.

2.4.2. Características e Propriedades

Dada a já mencionada escassez de trabalhos que têm como foco a reportagem de


divulgação científica em particular (Barros & Maia 2017: 121), para descrevermos as
características deste tipo específico de reportagem tomaremos em consideração, por
um lado, o que já mencionámos no capítulo 1 como propriedades características do
género reportagem – que iremos retomar de forma sumária – e, por outro,
acrescentaremos algumas características-chave que, tipicamente, são atribuídas aos
textos de divulgação científica.

Assim, como constatámos no capítulo 1, a reportagem é um género composto por


outros géneros (como o resumo e a entrevista, por exemplo), que se caracteriza
sobretudo pelo trabalho de pesquisa e investigação (Dittrich 2003: 31) que o repórter
necessita de realizar para conseguir apresentar antecedentes, causas e consequências e
ainda analisar todos os factos e levar, deste modo, informações abrangentes e
aprofundadas sobre o assunto tratado, bem como pela liberdade temática que possui.
Ou seja, a principal função da reportagem é “tornar um facto ou problema actual
inteligível, colocá-lo em perspetiva” (Cruz 2018: 25).

Outra particularidade da reportagem é o seu caráter multimodal, isto é, trata-se de um


género que “apresenta vários tipos de modos semióticos, tais como fotografias,

45
infográficos, tabelas, entre outros, além do uso da cor e do tamanho da letra para
salientar uma informação específica” (Leal 2018: 27).

Com respeito às reportagens de divulgação científica, além das características


supramencionadas, podemos elencar outras que são tipicamente associadas aos textos
de divulgação científica, dado que, como já mencionámos, a reportagem de divulgação
científica é um tipo de reportagem que se caracteriza por esta modalidade discursiva
que é a divulgação científica.

Conforme vimos, os textos de divulgação científica relacionam-se com o discurso


científico, pois buscam transmitir conhecimentos científicos ao público em geral, e,
como tal, procuram manter a objetividade que caracteriza o discurso da ciência. A
objetividade é, assim, uma propriedade da reportagem de divulgação científica, visível,
sobretudo, no recurso à voz do cientista e ao apagamento do sujeito, como indica
Leibruder (2000).

A voz de especialistas, como explica a autora, concede “um caráter de confiabilidade e


veracidade” (Leibruder 2000: 239) à tese defendida na reportagem. Por isso, os autores
recorrem a citações de cientistas, nomeadamente de identidades de prestígio e renome
na área, para autenticar a perspetivem que defendem.

Quanto ao apagamento do sujeito, a autora esclarece que consiste em encobrir a


existência do autor, colocando na posição de sujeito os objetos e noções abordados pelo
texto (cf. Leibruder 2000: 240). Esta estratégia concede à reportagem de divulgação
científica um caráter neutro, universal e objetivo, próprio do discurso científico e serve,
por isso, para legitimar o seu texto.

Contudo, dado que a objetividade é um princípio praticamente inalcançável, pois, como


afirma Saraiva (2016: 95), “Qualquer manifestação linguística carrega significações
ideológicas”, a reportagem de divulgação científica também se caracteriza por
apresentar alguns índices de subjetividade, como elucida Leibruder (2000: 240-241).
Efetivamente, qualquer seleção linguística realizada tem motivações ideológicas, ainda
que inconscientes. Porém, no caso da reportagem de divulgação científica a
subjetividade do autor é ainda mais notória naquilo que o autor designa de “elementos

46
didatizantes”, isto é, “recursos lingüísticos e extra-lingüísticos cuja finalidade é a
explicação do texto tendo em vista aproximar o leitor da temática abordada” (Leibruder
2000: 239).

São exemplos de elementos didatizantes os seguintes recursos: a definição, a


nomeação, a exemplificação, a comparação, as metáforas e a reformulação (ou, nas
palavras da autora, “parafrasagem”)1.

Leibruder (2000: 241) esclarece que estes recursos denotam a subjetividade do autor
pois implicam que ele se baseie na sua própria interpretação para procurar explicar com
uma linguagem mais acessível os termos técnicos. A autora, exemplificando, indica o
que ocorre no caso da metáfora: “Ao empregar uma metáfora, por exemplo, o autor se
revela como aquele que interpreta os fatos a partir de um ponto de vista determinado
historicamente e, portanto, perpassado pela subjetividade.” (Leibruder 2000: 241).

Em suma, conforme defende a autora (cf. Leibruder 2000: 241), a objetividade é ilusória
e funciona como uma estratégia argumentativa que tem como objetivo legitimar os
discursos.

Outra característica da reportagem de divulgação científica apontada por Leibruder


(2000: 234) reside no caráter metalinguístico que diferencia os géneros de divulgação
científica de géneros de outras modalidades discursivas. De facto, como é igualmente
mencionado pela autora (cf. Leibruder 2000: 234-235), o trabalho do jornalista ou
divulgador é tornar acessível o discurso científico, utilizando uma linguagem mais
próxima do leitor e, nesse sentido, a reportagem de divulgação evidencia uma
capacidade de se autoexplicar que encontramos também em textos e discursos
didáticos, por exemplo. Isto é, dada a opacidade da linguagem científica faz-se
necessário que o divulgador, recorrendo a um registo mais coloquial e a estratégias
como explicações, exemplificações, entre outras, e tendo atenção à seleção lexical e à
utilização de elementos visuais, procure aproximar o leitor do assunto abordado.

1
Nesta secção, não desenvolveremos os elementos didatizantes, uma vez que estes serão tratados de
forma mais detalhada no capítulo 3, dedicado à explicação.

47
2.4.3. Proposta de Análise

Santos & Ramos (2021), pretendendo identificar a organização retórica do género


reportagem de divulgação científica, adotou o modelo CARS (Create a Research Space),
proposto por Swales (1990), adaptando-o a fim de analisar vinte reportagens (dez da
revista Superinteressante e dez da revista Galileu).

Como esclarecem os autores (cf. Santos & Ramos 2021: 7), explicitando o modelo de
Swales, há três movimentos retóricos (moves) que se subdividem em passos (steps),
correspondendo cada movimento a uma unidade retórica ou discursiva com uma função
comunicativa coerente (Swales 2004: 228). No caso do seu trabalho, estes autores
optarão pela utilizarão da designação de função retórica (FR) e subfunção.

A adaptação do modelo proposto por Swales (1990) deu-se consoante a sua própria
dinâmica, isto é, os autores, focando num excerto textual previamente definido,
identificam a função que este realiza, de acordo com determinadas pistas linguísticas
que indicam a informação que está a ser expressa (cf. Santos & Ramos 2021: 11). No
decorrer do processo, comparam-se as semelhanças e diferenças encontradas nos
planos léxico-gramatical e textual de cada exemplar do corpus, pois, como afirmam os
autores, “os exemplares do corpus servem de parâmetro um para o outro” (Santos &
Ramos 2021: 11).

Santos & Ramos (2021: 13) referem ainda que, na sua análise, tiveram em consideração
a plasticidade do género (ou seja, o facto de a reportagem ser um género multimodal,
por exemplo). Os resultados indicaram a presença de 4 funções retóricas nas
reportagens de divulgação científica que constituíam o corpus do seu estudo, a saber:
(i) incitar o público-alvo a ler a reportagem (FR1); (ii) contextualizar o tema da
reportagem (FR2); (iii) problematizá-lo (FR3); (iv) concluir a reportagem (FR4).

Cada uma destas funções subdivide-se em diversas subfunções.

- FR1 (incitar o público-alvo a ler a reportagem) é cumprida, segundo o que os


autores apuraram, ou pela chamada de capa, ou pelo título ou pelo subtítulo,
recorrendo: A – à apresentação de um título persuasivo (a chamada de capa ou
o próprio título despertam a curiosidade do leitor); B – à apresentação de um

48
contexto afetante para o público-alvo (consiste em provocar o interesse do
leitor em ler a reportagem); C – à indicação de que será contada uma história
interessante (ou, por outras palavras, “uma narrativa com fatos inusitados”
(Santos & Ramos 2021: 14); D – à apresentação de uma hipótese, que poderá,
ou não, ser confirmada no decorrer da reportagem (esta subfunção, tipicamente,
é cumprida pelo subtítulo).

- FR2 (contextualizar o tema), que, segundo os resultados da sua análise, ocorre


no princípio do texto principal da reportagem, pode realizar-se por meio de três
subfunções: A – descrição do facto ou evento que deu origem ao tema; B –
descrição de um caso que exemplifica o tema tratado na reportagem; C – fazer
generalizações sobre o tema.

- FR3 (problematizar o tema), é cumprida pelo corpo do texto da reportagem e


pode ser concretizada através de doze subfunções: A – apresentar o âmbito
político do tema (que, como explicam os autores (Ramos & Santos 2021: 15),
“descreve como instituições públicas e não públicas, leis, agências, etc.
relacionam-se com o tema”); B – apresentar o âmbito histórico do tema
(consiste na apresentação de histórias que, tendo função explicativa, servem de
background para o tema); C – citar pesquisas (que legitimam o ponto de vista
defendido na reportagem e marca também a natureza científica do género); D –
inserir voz de autoridade (apresentando teses ou explicações de especialistas ou
instituições prestigiadas que estejam associadas ao assunto tratado); E – inserir
infográficos; F – inserir imagens; G – explicar termos técnicos (sobre os quais,
possivelmente, o leitor não tem conhecimento); H – desmistificar conceitos
equivocados; I – marcar a ação investigativa (“evidencia a presença da revista
como agente do processo investigativo da reportagem”, de acordo com os
autores (Santos & Ramos 20021: 17)); J- apresentar contraposições; K-
estabelecer o escopo do contexto afetante (isto é, especificar que indivíduos
podem ser afetados pela situação abordada na reportagem); L – sugerir
conteúdos extra relacionados ao tema.

49
- FR4 (concluir a reportagem) pode concretizar-se por meio de cinco subfunções:
A – tecer previsões sobre o tema (quando existe uma apresentação de
conjeturas sobre o assunto tratado); B – retomar o âmbito político do tema
(quando se resgata aspetos políticos associados ao tópico da reportagem); C –
retomar o âmbito histórico do tema (quando se recupera aspetos históricos
referidos na reportagem); D – retomar voz de autoridade (quando se recupera,
através de declarações de especialistas ou instituições já referidas na
reportagem, a intertextualidade); E – apresentar possíveis soluções e/ou
contribuições (que, segundo os autores (Ramos & Santos 2021: 19), “encerra a
reportagem apresentando formas de mitigar ou solucionar a questão abordada,
ou apontando contribuições da própria reportagem para a sociedade”).

Face a estes resultados, e em modo conclusivo, Santos & Ramos (2021: 19) destacam o
facto de a organização retórica de cada reportagem variar consoante os efeitos retóricos
pretendidos pelo autor da reportagem.

2.4.4. Trabalhos Relacionados

Tal como mencionado relativamente ao género reportagem, também são escassos os


estudos sobre reportagem de divulgação em Portugal.

Apesar de não tratar exclusivamente o género reportagem, é, contudo, indispensável


referir o projeto “Promoção da Literacia Científica” da Universidade NOVA de Lisboa,
que decorreu em 2016, cujo principal objetivo visava a criação de estratégias para
fomentar o nível de literacia científica no ensino básico e secundário. A coordenadora
deste projeto, a Professora Matilde Gonçalves, defende que a investigação em
linguística e a investigação em didática do português devem, em conjunto, procurar
desenvolver ferramentas de leitura e de compreensão de textos de divulgação2.

No âmbito deste projeto, foi publicado, em 2018, um livro intitulado “Literacia científica
na escola”, onde se reuniram diversos estudos realizados pela equipa: numa primeira

2
Para uma informação mais detalhada sobre o projeto, consultar o seguinte link:
http://www.literaciacientifica.pt/apresentacao.

50
parte, encontramos textos teóricos sobre a literacia científica atualmente e, numa
segunda parte, trabalhos mais direcionados para a didática do português, que abordam
a literacia científica na sala de aula, em particular, na aula de Português. É, inclusive,
neste livro que se insere o trabalho de Teixeira (2018) sobre os géneros de divulgação
científica na imprensa atual, já aqui citado.

Outro estudo que consideramos importante mencionar, ainda que não trate a
reportagem de divulgação científica, é o de Ramos, Marques & Duarte (2015), que
analisam textos de divulgação científica mediática direcionados para as crianças, de
modo a perceber a sua estrutura e o seu modo de funcionamento, nomeadamente no
que concerne a interação entre aspetos verbais e aspetos não-verbais (cf. Ramos;
Marques & Duarte 2015: 133).

Tal como referimos para a reportagem em geral, é mais extensa a literatura existente
no Brasil. Neste contexto, referimos apenas alguns desses trabalhos, salientando
aqueles que se relacionam de forma mais próxima com o foco do nosso trabalho.

Olímpio (2006), com o objetivo de expor o modo como o tópico da saúde é tratado numa
reportagem de capa da revista Superinteressante, mais precisamente no que diz
respeito à articulação entre elementos verbais e elementos não-verbais, analisou
dezassete edições da publicação.

Ferraz (2007) analisa géneros de divulgação científica (mais concretamente, reportagem


e artigo) com o intuito de verificar de que modo as relações dialógicas hipertextuais
subjacentes à utilização de links eletrónicos influenciam a construção do discurso nestes
géneros. A autora, para isso, realiza uma análise comparativa dos géneros em causa
relativamente ao recurso do link eletrónico “de forma quantitativa e diacrônica” (Ferraz
2007: 3).

Ramos (2008) elaborou um projeto de leitura de reportagens de divulgação científica


em sala de aula. Para isso, analisou um corpus constituído por cinco reportagens de
divulgação científica, que têm em comum tratar do meio ambiente e terem sido
publicadas pela revista VEJA entre 2006 e 2007. Nesta análise, segue a metodologia
própria de um estudo qualitativo-interpretativo.

51
Com o objetivo de estudar a frequência com que uma publicação local edita textos de
divulgação científica e a organização retórica desses textos, Moreira & Motta-Roth
(2008) analisam a configuração retórica de 44 edições de 2007, do Diário de Santa
Maria. As autoras realizam uma análise macrotextual, discriminando os movimentos
retóricos que existem em cada parte da reportagem (título e subtítulo; introdução;
desenvolvimento; conclusão; referências).

Macedo & Grillo (2010) analisaram, qualitativa e quantitativamente, seis reportagens de


divulgação científica publicadas na revista Superinteressante (três publicadas antes da
Internet, e as restantes após a Internet), de modo a investigar se as características do
hipertexto digital influenciaram os textos impressos (e de que forma o fizeram).

Giering (2012), pretendendo analisar as inscrições anafóricas na hiperestrutura, de


modo a perceber como se realiza a produção de sentidos relacionados com tópicos
científicos, analisou aspetos semântico-pragmáticos das anáforas, bem como as suas
relações com as imagens de sete reportagens de divulgação.

Farias & Santos (2014) centraram-se na leitura do género reportagem de divulgação


científica enquanto género multimodal. Para isso, analisaram uma reportagem da
Superinteressante e concluíram que o estudo sobre a informatividade visual é relevante
para compreender de que modo ela influencia o leitor e influencia também o sentido
que construímos enquanto lemos um texto.

Barros & Maia (2017) apresentam um modelo teórico de reportagem, descrevendo dois
subgéneros: a reportagem de pesquisa e a reportagem de temas/factos científicos.
Considerando um corpus constituído por onze reportagens de divulgação científica de
temas variados, as autoras deste estudo, na sua análise, tentam fazer uma articulação
com as tipologias de Sodré e Ferrari (1986) e Kindemann (2014).

Cortina (2020) estuda o sincretismo da reportagem, mais especificamente, como é que


os textos criam unidade de significado, usando duas modalidades de linguagem
(linguagem verbal e não verbal). Para isso, analisa de que forma o problema dos
pesticidas são abordados nas revistas Superinteressante e Pesquisa Fapesp.

52
Finalmente, embora já tenhamos descrito o trabalho de Santos & Ramos (2021) na
secção anterior, consideramos relevante realçar aqui a sua importância para o estudo
da organização retórica da reportagem de divulgação científica, pois fornece pistas de
como abordar este género em contexto sala de aula, mas também para os estudos sobre
géneros textuais.

2.5. Síntese

Neste capítulo, definimos e caracterizamos a reportagem de divulgação científica,


demonstrando que tem características do género reportagem associadas, apresentando
também propriedades tipicamente vinculadas à divulgação científica. Para isso,
baseamo-nos, principalmente, na proposta de Leibruder (2000) sobre o discurso de
divulgação científica, pois dado que a reportagem de divulgação científica é um tipo
específico de reportagem que se distingue por ter como objetivo “dar ao vulgo os bens
culturais da ciência e do conhecimento” (Rojo 2008: 587-588), ou seja, por estar ao
serviço da divulgação, considerámos que partilha com ela as propriedades já descritas:
o caráter metalinguístico do texto (isto é, a sua capacidade de se autoexplicar); a
existência de traços de objetividade, por meio da presença da voz do cientista, bem
como por meio da impessoalidade (apagamento do sujeito); e a existência de
subjetividade nas escolhas linguísticas do autor, nomeadamente no que diz respeito ao
que a autora designa de elementos didatizantes (como a definição, a exemplificação, a
comparação e a metáfora). Por fim, apontamos alguns trabalhos que tratam a
reportagem de divulgação científica.

53
3. Explicação
Neste capítulo começaremos por introduzir um conceito geral de explicação, de acordo
com Plantin (2002) e, focando, depois, na explicação enquanto modo discursivo,
apresentaremos as propostas de Adam (2008) e de Moirand (1999). De seguida,
centrando a nossa atenção na relação da explicação com o discurso de divulgação
científica, apontaremos as principais estruturas e estratégias utilizadas.

3.1. Definição do Conceito de Explicação

No Dictionnaire d’Analyse du Discours, a explicação é definida por Plantin (2002: 253),


por estas palavras: “Dans l’usage ordinaire, le mot «explication» désigne des segments
de discours ou des séquences interactives succédant à des questions de nature
extrêmement diverse, produites lorsque quelque chose n’est pas compris”. E, na
continuação, o autor especifica que a explicação pode ser dada na resposta a pedidos
de definições, interpretações, paráfrases ou traduções; ou a teorizações e
esquematizações; ou ainda de instruções ou demonstrações, por exemplo.

De uma maneira sintetizada, podemos afirmar, de acordo com o mesmo autor, que a
explicação tem, na sua base, uma determinada necessidade de natureza cognitiva, ou
uma dúvida, que acaba por cumprir, produzindo, em consequência, “uma sensação de
compreensão e intercompreensão” (Plantin 2002: 253).

Em suma, o verbo ‘explicar’ engloba muitos significados específicos, pois pode ter, na
sua origem, pedidos muito variados, mas, apesar disso, parte sempre da existência de
informação, como referem Blancafort & Valls (2007: 297).

3.2. Explicação como Modo Discursivo

Segundo Blancafort & Valls (2007: 298), enquanto atividade discursiva, “la explicación
consiste en hacer saber, hacer comprender y aclarar, lo cual presupone un conocimiento
que, en principio, no se pone en cuestión sino que se toma como punto de partida”.
Para isso, prosseguem as autoras (Blancafort & Valls 2007: 298), é necessário um locutor
que possua um determinado saber (que será o agente explicativo) e um interlocutor
(singular ou não, no caso de público), que necessitará de um esclarecimento, disposto a

54
interpretar esse saber, tendo por base o seu próprio conhecimento prévio. A relação
entre ambos os intervenientes da situação comunicacional é, desta forma, assimétrica:
o primeiro tem acesso à informação, possui conhecimento e, com efeito, podemos dizer
que é, de algum modo, um especialista; enquanto o segundo, uma vez que não tem
experiência nem acesso a fontes que lhe transmitem conhecimento sobre o assunto, é
um leigo.

Acerca do objetivo da explicação, as autoras afirmam:

El propósito propio de la explicación no es convencer ni influir en el


comportamiento del interlocutor sino en todo caso cambiar su estado epistémico,
logrando que una información que ofrece dificultad, o que no ha sido accesible para
el destinatario, o que el propio emisor no ha logrado formular con claridad, se
convierta en un «bocado digerible». (Blancafort & Valls 2007: 298)

Ou seja, a explicação visa tornar um determinado assunto mais compreensível para


alguém, de modo que o interlocutor o entenda com clareza.

À luz da perspetiva pragmático-discursiva da semiologia, a explicação é vista como um


ato discursivo que, simultaneamente, pressupõe e estabelece um contrato, cujas
condições pragmáticas Grize (1981) sumaria da seguinte forma: (i) o fenómeno de
explicar é incontestável (trata-se de um facto ou de uma observação); (ii) a questão que
origina a explicação é, geralmente, incompleta e reflete, desse modo, a lacuna
informativa que caracteriza a situação; (iii) aquele que explica está em condições de o
fazer, isto é, uma vez que o interlocutor deve reconhecer que o locutor tem competência
para explicar, é necessário que o locutor seja neutro, objetivo e tenha, de facto,
legitimidade para elaborar uma explicação fiável.

Efetivamente, não é suficiente querer explicar algo a alguém: é necessária legitimidade


social para o fazer. Por isso é que existem pessoas (como os especialistas, técnicos ou
professores) cuja autoridade para auxiliar na compreensão dos temas é reconhecida
socialmente e, com efeito, estão legitimadas para contribuir com explicações fiáveis e
adequadas em determinadas situações.

55
Na literatura sobre a explicação enquanto modo discursivo, encontramos duas vertentes
teóricas: a de Jean-Michel Adam, com a teorização sobre a sequência explicativa, e a de
Moirand (1999), com a proposta do modo discursivo explicativo.

Silva (2012: 126) resume desta forma a noção de texto que serve de base à proposta
teórica de Adam: “estrutura hierárquica complexa que inclui sequências (completas ou
elípticas) do mesmo tipo ou de tipos diferentes”. De facto, como esclarece a seguir o
autor, nesta perspetiva de Adam, que evidencia a relevância das sequências textuais,
um texto é composto por n sequências, que são constituídas, por sua, vez, por n
macroproposições, sendo cada macroproposição composta por n proposições.

Uma sequência textual é “um fragmento de texto dotado de alguma autonomia no


âmbito do texto em que se insere” e, como supramencionado, formado por
macroproposições, isto é, segmentos prototípicos que “possuem uma estrutura com
características específicas, e concretizam modelos abstratos de organização de
conteúdos que correspondem a representações mentais” (Silva 2012: 125).

Adam (2008) propõe cinco sequências textuais, a saber: (i) narrativa; (ii) descritiva; (iii)
argumentativa; (iv) explicativas; (v) dialogais.

Uma vez que o nosso trabalho foca a explicação, trataremos de descrever apenas a
sequência explicativa.

Tendo em consideração Adam (2008), Blancafort & Valls (2007) e Silva (2012), a
sequência explicativa é composta por três macroproposições. A primeira é introduzida
pelo operador porquê? (ou como?) e corresponde à problematização de uma dada
situação ou objeto ou à apresentação de uma dúvida. A segunda, que é inserida pelo
operador porque, consiste numa fase de resolução onde é proposta uma resposta
apropriada à questão inicial, levantada na fase anterior. Efetivamente, como refere Silva
(2012: 165), “a dúvida inicial (explicitada pelo alocutário ou inferida pelo locutor)
legitima o surgimento da macroproposição correspondente à Resolução”. No entanto,
apesar de existir essa dependência, esta macroproposição é o núcleo da sequência
explicativa, pois as restantes duas podem ser inferidas (não ocorrendo, portanto, no
texto), mas a macroproposição da resolução consiste no momento decisivo e realmente

56
explicativo da sequência. Aliás, normalmente, esta segunda macroproposição é a mais
extensa das três, o que denota a sua importância (cf. Silva 2012: 165). Por fim, a terceira
macroproposição funciona como uma conclusão que retoma as ideias principais
apresentadas na resolução e pode, também, conter uma asserção indiscutível ou um
juízo de valor, consoante a resposta proposta na macroproposição anterior (cf. Adam
(2008: 132), Blancafort & Valls (2007: 298-299) e Silva (2012: 164-165)).

Note-se que esta estrutura não possui uma ordem fixa (Silva: 2012: 165). E, inclusive, é
possível que, antes destas três macroproposições, ocorra uma inicial que esquematize
de forma breve (por exemplo, apresentando o objeto ou situação desconhecidos e de
difícil compreensão).

Moirand (1999), ancorada numa perspetiva enunciativo-comunicacional, discute a


noção de explicação. Para a autora, o ponto de vista de Grize (1997) é demasiado
restritivo, uma vez que só é adequado à explicação de factos estáveis e reconhecidos
como incontestáveis por toda a comunidade científica, não correspondendo às
interações discursivas explicativas espontâneas, por exemplo.

A própria polissemia subjacente ao verbo ‘explicar’, também referida por Grize (1981),
faz Moirand (1999: 142) questionar-se sobre a natureza da explicação.

No seu trabalho, a autora sugere analisar a explicação enquanto categoria construída


pelo discurso. Para isso, investiga traços que possibilitem a identificação da explicação
na materialidade dos textos, “a partir de estruturas sintático-semânticas que, além da
forma verbal “explicar”, permitem propor alguns elementos de análise daquilo que ela
denomina de dimensões cognitivas e comunicativas da explicação” (Follman 2012: 41).

A autora explicita que uma representação estereotipada da explicação comum


(correspondente à representação de uma didaticidade do dia-a-dia) assenta numa
estrutura de três actantes: A explica algo a B. A e B são actantes animados cujas posições
interacionais são assimétricas devido à assimetria de conhecimentos, já aqui
mencionada.

Contudo, numa situação interacional onde esta assimetria de posições não se verifique,
como, por exemplo, numa interação entre pares, esta representação não é aplicável.

57
Num contexto como o de um cientista a refletir sobre o que acabou de observar, onde
ele necessita de testar as suas hipóteses colocando-as à prova de modelos teóricos
explicativos, Moirand (1999) defende que a explicação se pode representar na seguinte
estrutura: X explica Y. Nesta representação, X e Y são dois actantes não animados, pois
o locutor científico apresenta-se como “testemunha reconhecida (esclarecido,
informado, dotado de saberes acumulados pela memória do domínio), capaz de
compreender o que se passa no universo” (Follmann 2012: 41).

Já num contexto de transmissão de conhecimentos, a autora esclarece que a explicação,


uma vez que se move entre as dimensões comunicativas da representação didática da
explicação e as dimensões da representação da explicação como atividade cognitiva,
pode ser representada como A explica a B que (X explica Y).

3.3. A Explicação nos Géneros de Divulgação Científica

Conforme descrevemos no capítulo anterior, os textos de divulgação científica


estabelecem uma ponte entre o universo científico (geralmente, restrito a especialistas
e a pessoas com conhecimentos) e o público em geral, leigo. É nesta relação que é
possível identificar uma relação de proximidade entre textos e discursos de divulgação
científica e textos e discursos de didáticos, pois ambos recorrem a explicações e
definições, a fim de dar ao texto um tom interessante, esclarecedor e didático. Na
verdade, como afirma Leibruder (2000: 241), a didaticidade é considerada uma
característica fundamental do discurso de divulgação científica pelo facto de, dado que
é voltado para o público leigo, o autor necessitar de utilizar uma linguagem mais
acessível e estratégias e estruturas explicativas para conseguir aproximar os seus
leitores do tema tratado no texto, ultrapassando, assim, o obstáculo da opacidade
característica da linguagem científica.

Nos últimos anos, vários autores debruçaram-se sobre as estratégias e estruturas


explicativas. De seguida, apresentaremos algumas dessas propostas, dando particular
destaque àquelas que têm como objeto de estudo o discurso de divulgação científica.

Landry (1992) descreve operações retórico-discursivas aplicadas pelo jornalista ou


divulgador para tornar o texto acessível a um público-alvo não especialistas. Nesse

58
sentido, o autor refere a reformulação (ou paráfrase), na qual se insere a definição, mais
concretamente, e seguindo a proposta de Loffer-Laurian (1984), cinco formas
específicas de definir um termo, a saber: (i) a denominação; (ii) a equivalência; (iii) a
caracterização; (iv) a análise; (v) a função. Além disso, o autor menciona ainda a
analogia, que se pode realizar por meio da comparação ou da metáfora (cf. Landry 1992:
81-89).

Leibruder (2000: 240-246), já aqui mencionado, aponta seis recursos linguísticos e extra-
linguísticos que servem a explicação textual, os “elementos didatizantes”, nas palavras
da autora: (i) definição; (ii) nomeação; (iii) exemplificação; (iv) comparação; (v)
metáfora; (vi) reformulação (ou “parafrasagem”, na designação do autor).

Blancafort & Van Dijk (2004: 372), no trabalho onde investigam o discurso de divulgação
científica e o conhecimento sobre a sequenciação do genoma humano, referem a
existência de vários tipos de explicação, enumerando, em seguida, os seguintes: (i)
denominação; (ii) definição / descrição; (iii) reformulação (ou paráfrase); (iv)
exemplificação; (v) generalização; (vi) analogias, através de comparações e metáforas.

Já num âmbito mais geral, Blancafort & Valls (2007: 299-300) elencam seis
procedimentos próprios da sequência explicativa, a saber: (i) definição; (ii) classificação;
(iii) reformulação; (iv) exemplificação; (v) analogia, por meio de comparações e
metáforas; (vi) citação.

Feita esta breve apresentação de quatro trabalhos que incidem, de algum modo, sobre
as estratégias e estruturas explicativas, expomos, no quadro-síntese que se segue, os
mecanismos explicativos indicados por cada estudo mencionado, de modo a vermos os
mecanismos que se sobrepõem, isto é, que são referidos em todos os trabalhos e quais
são aqueles que se distinguem de proposta para proposta.

59
Tabela 1: Quadro-síntese das estratégias e estruturas explicativas.

Autor(es) (ano Leibruder Blancafort & Blancafort &


Landry (1992)
de publicação) (2000) Van Dijk (2004) Valls (2007)
Reformulação / Reformulação ou
Parafrasagem Reformulação
paráfrase paráfrase
Definição (por
Definição /
meio de 5 Definição Definição
descrição
maneiras:
Estruturas e denominação, Nomeação Denominação Classificação
estratégias equivalência,
explicativas caracterização, Exemplificação
Exemplificação Exemplificação
análise, função) Generalização
Analogia Comparação Analogia Analogia
(comparação e (comparação e (comparação e
metáfora) Metáfora metáfora) metáfora)
- - - Citação

Como se pode constatar, existem algumas estruturas e estratégias que são transversais
a todas as propostas, nomeadamente a reformulação (ou paráfrase), a definição e a
analogia (que tipicamente se concretiza através da comparação ou metáfora). Note-se,
de igual modo, o caso da exemplificação que é mencionada em três das quatro
propostas, bem como o caso semelhante da denominação (ou nomeação, em Leibruder
(2000)), que só não é referida por Blancafort & Valls (2007).

Consideramos relevante destacar ainda os aspetos distintivos de cada trabalho,


igualmente visíveis na tabela A. Assim, em Landry (1992) sobressai a subdivisão da
definição em cinco formas específicas (entre as quais se insere a denominação). Já no
estudo de Blancafort & Van Dijk (2004) destaca-se a generalização. Finalmente, em
Blancafort & Valls (2007) nota-se a referência de duas estratégias que não surgem em
nenhum dos outros trabalhos: a classificação e a citação.

O facto de existirem mecanismos explicativos que ocorrem nos quatro estudos (e outros
que ocorrem em três desses quatro) denota alguma estabilização e concordância
relativamente a esses mecanismos servirem, efetivamente, a explicação. Deste modo,
trataremos, em seguida, essas estruturas e estratégias explicativas, apresentando uma
síntese descritiva para cada e apontando, sempre que possível, pistas linguísticas
próprias de cada uma.

60
A reformulação é uma operação metalinguística que consiste na expressão de uma
forma mais inteligível aquilo que foi previamente formulado com termos técnicos
específicos que resultam opacos e de difícil compreensão para o interlocutor (cf.
Blancafort & Valls (2007: 299-300) e Leibruder (2000: 246). Como indicam Leibruder
(2000: 246) e Blancafort & Valls (2007: 300), linguisticamente, este mecanismo é
introduzido por marcadores de reformulação, tais como: ‘ou seja’, ‘isto é’, ‘por outras
palavras’, ‘melhor dito’ (Lopes 2020: 2693-2694).

A definição reside na delimitação de um determinado objeto ou ideia, através da


atribuição das suas propriedades características que o especifiquem, mas também de
traços característicos que permitem a sua associação a uma determinada classe (cf.
Balncafort & Valls 2007: 299). Segundo Blancafort & Valls (2007: 299), “la definición
constituye el primer paso para la aclaración de un problema de conocimiento”.

Por oposição à definição, temos a denominação que consiste na atribuição de uma


designação depois de já terem sido mencionadas as suas características próprias (cf.
Leibruder 2000: 243). Assim, na denominação, primeiro são apresentadas as
propriedades do objeto ou noção e só posteriormente é realizada a sua identificação.
Nas palavras de Loffer-Laurian (1984: 95), a denominação está vinculada à seguinte
aceção: « Désignation d’un être ou d’un chose, d’une catégorie d’êtres ou de choses par
un nom qui en marque l’état, la qualité ou la fonction (…) par un nom qui en indique
l’état, les propriétés. ».

A analogia é, conforme definido em Blancfort & Valls (2007: 300), a ação de aclarar ou
ilustrar um conceito ou um conjunto de conceitos recorrendo a outros associados a um
campo semântico distinto e pode se manifestar linguisticamente, como temos vindo a
referir, por meio de dois recursos: a comparação e a metáfora. Como explica Leibruder
(2000: 244-245), a primeira trata de aproximar conceitos ou noções de campos
semânticos semelhantes; a segunda consiste na “transferência de um determinado
termo para um campo semântico distinto daquele ao qual comumente é associado” e
implica uma mudança de sentido, consoante o novo contexto em que o termo foi
inserido. Neste sentido, podemos afirmar que são as semelhanças entre objetos, seres
ou noções que nos leva a construir comparações ou analogias, mecanismos tipicamente

61
utilizados num contexto discursivo explicativo, onde o assunto que é objeto de
explicação não é familiar ao leitor – como é o caso da divulgação científica (cf. Leibruder
2000: 244).

Finalmente, a exemplificação tem como objetivo tornar uma formulação abstrata ou,
de algum modo, mais geral, mais concreta e, por conseguinte, mais próxima do leitor
(cf. Blancafort & Valls 2007: 300). Como referem os autores Blancafort & Valls (2007:
300), os exemplos podem ser de ordem variada, desde factos, a objetos ou até histórias.
Tipicamente, a expressão metalinguística ‘por exemplo’ é a forma mais comum para
introduzir este mecanismo no discurso, como descrito por Leibruder (2000).

3.4. Síntese

Neste capítulo, pretendíamos abordar o conceito de explicação, demonstrando a


complexidade deste objeto de estudo através da apresentação de duas perspetivas
teóricas distintas: a sequência explicativa de Adam e o modo discursivo explicativo de
Moirand. Feita essa pequena introdução, estabelecemos uma relação entre a explicação
e o discurso de divulgação científica, de modo a compreendermos de que maneira a
explicação se insere na reportagem de divulgação científica. No seguimento desta breve
incursão à explicação e à sua relação com a divulgação (nomeadamente, por meio da
didaticidade característica desta modalidade discursiva), identificamos um conjunto de
estruturas e estratégias explicativas tipicamente utilizados no discurso de divulgação
científica, a saber: reformulação (ou paráfrase); definição; analogia (por meio de
comparações e metáforas); exemplificação; e, por fim, denominação. Estes serão,
portanto, os mecanismos que analisaremos em reportagens de divulgação científica na
segunda parte deste trabalho.

62
4. Estudo Empírico
Tendo em conta o enquadramento teórico apresentado, assumiremos a reportagem de
divulgação científica enquanto género jornalístico que, ao ser de divulgação científica,
se insere numa forma particular de relação dialógica entre a esfera científica e diversas
esferas da atividade humana ou cultural. Nesta segunda parte, apresentamos o estudo
realizado, que se centra na análise da hiperestrutura das reportagens e da sua
composicionalidade e textualização, focando em particular nos mecanismos explicativos
recorrentes. Assim, começaremos por descrever o corpus utilizado neste estudo, bem
como os critérios subjacentes à sua construção; descreveremos depois a metodologia
de análise; em seguida, apresentaremos a análise dos dados, seguindo-se, finalmente, a
discussão dos resultados.

4.1. Corpus

O corpus é composto por 37 reportagens impressas publicadas na revista


Superinteressante entre 2018 e 2020. Todas as reportagens recolhidas surgem de forma
independente nas revistas, exceto “Idade de ouro astronáutica” (T22), “Próxima
paragem: a Lua” (T23) e “A caminho de Marte” (T24), que, apesar de serem consideradas
individualmente, fazem parte de um dossiê comum, intitulado “Espaço 2040”, que
partilha o mesmo autor e um tema central – o progresso previsto, nas investigações e
atividades espaciais, até 2040. Dessas 37, 17 (45,95%) são reportagens de capa. No
entanto, a única diferença marcante entre essas e as restantes reside na atratividade,
uma vez que as reportagens de capa podem atrair mais leitores precisamente por se
encontrarem na capa, isto é, naquele que é o primeiro contacto do leitor com a revista.

Em média, as reportagens têm 2097 palavras (considerando, apenas, o texto principal


das reportagens e os seus intertítulos). A maior tem 2989 palavras (T36) e a menor, 1468
(T22). Na revista, as reportagens ocupam, em média, 7 páginas, que incluem, além do
texto principal da reportagem, imagens, caixas de texto e infográficos3.

3
Para uma análise mais detalhada sobre o número de páginas e o número de palavras das reportagens
recolhidas, ver anexo A.

63
Para constituirmos este corpus, tivemos em consideração dois critérios centrais. Por um
lado, atendemos à existência de alguma homogeneidade, na medida em que
trabalharemos uma única publicação (a Superinteressante) e um único género textual,
pois apenas estudaremos reportagens de divulgação científica (isto é, excluímos as
reportagens que fossem de âmbito cultural, por exemplo). Por outro lado, seguimos um
critério de heterogeneidade, no que diz respeito à área temática, que engloba diversos
temas, entre os quais: biologia, ambiente, etologia, astronomia, medicina, astrofísica,
ciência, e aos anos em que os textos foram publicados (2018, 2019 e 2020).

Optámos por seguir o critério da homogeneidade relativamente à publicação – apesar


de termos consciência do risco de os resultados obtidos serem aplicáveis apenas nesse
universo limitado – dado que não existem muitas publicações, em Portugal, que se
dediquem à divulgação científica. Efetivamente, jornais e revistas como,
respetivamente, o Público ou a Sábado também possuem uma vertente direcionada
para a divulgação científica, mas são publicações generalistas, isto é, o seu objetivo
principal é o jornalismo de informação e não divulgar ciência, concretamente. Por
oposição, conforme veremos, a Superinteressante assume-se como meio de divulgação
científica.

A diversidade temática que se verifica nos textos em análise justifica-se pelo facto de o
trabalho se centrar sobre a reportagem e os seus mecanismos de textualização, não
focando especificamente uma dada área científica.

Quanto à abrangência temporal do corpus, procurámos reunir textos que não fossem
muito distantes temporalmente em relação ao presente e, por isso, a maioria (59,46%)
dos textos foi publicada em 2020. No entanto, optámos por não limitar o nosso estudo
a um único ano, a fim de conseguirmos um número considerável de textos. Deste modo,
temos 8 textos (21,62%) de 2018, 7 (18,92%) de 2019 e 22 (59,46%) de 2020.

Como esclarece a própria revista, “A Superinteressante é uma revista mensal de


divulgação científica e cultura que aborda de uma forma aprofundada e acessível os
grandes temas da atualidade, aliando o prazer de saber ao fascínio da descoberta.”
(http://superinteressante.pt/super/index.php). Trata-se de uma revista de publicação

64
internacional (pois é publicada em vários países, mesmo que, nessas publicações, não
circulem os mesmos textos) que, recorrendo a diferentes géneros textuais (como a
reportagem, o artigo, a entrevista e a crónica, por exemplo), torna acessível temas atuais
das diversas áreas científico-tecnológicas, bem como da cultura. Além da versão
impressa, a revista Superinteressante é também publicada em ambiente digital tem
como público-alvo o cidadão comum, que não se insere na comunidade científica.

Esta revista já foi objeto de vários estudos, com especial incidência no Brasil,
nomeadamente Fossey (2006), Rocha (2007), Macedo & Grillo (2010), Souza (2012),
Gonçalves (2013), Santos & Queiroz (2011), Lima (2013), Guimarães (2016, 2018),
Martins, Oliveira & Valle (2020). Em alguns desses trabalhos, os autores apontam
algumas características da Superinteressante brasileira que consideramos dignas de
nota, a saber: o perfil comercial, dado o elevado número de páginas dedicadas a
anúncios publicitários (Gonçalves 2013: 214); a linguagem simples e próxima do registo
coloquial (Lima 2013: 67); e, finalmente, ser dirigida a jovens adultos (cf. Fossey 2006:
12; Macedo & Grillo 2010: 60; Lima 2013: 67; Guimarães 2016: 234; Santos & Queiroz
2011: 1512 e Gonçalves 2013: 212).

É importante ressalvar, porém, que estamos conscientes de que as características


supramencionadas dizem respeito à publicação brasileira e não se deve fazer uma
extrapolação desses dados para o universo português, onde, até ao momento, não
verificámos quaisquer estudos relativamente ao perfil da revista ou do seu público-alvo,
embora consideremos, pelo confronto de algumas reportagens, que estas
características também se poderiam aplicar, em termos globais, ao nosso corpus.

4.2. Metodologia

Para este estudo, optámos por uma metodologia diferenciada em duas etapas da
análise, utilizando uma metodologia mista, qualitativa e quantitativa, para a análise da
hiperestrutura e composicionalidade das reportagens e uma metodologia descritiva e
qualitativa na análise dos mecanismos linguístico-discursivos de natureza explicativa.
Relativamente à anotação, esta foi realizada manualmente pelo autor e depois validade
por um outro anotador especialista em Linguística.

65
A investigação segue as etapas a seguir enunciadas: (i) recolha do corpus; (ii) tratamento
dos textos; (iii) análise dos dados; (iv) apresentação dos resultados; (v) discussão dos
resultados. Nas secções seguintes explicitaremos de que modo procedemos em cada
uma dessas etapas.

4.3. Recolha e Tratamento do Corpus

Para a recolha e tratamento do corpus, primeiro, extraímos os textos da revista impressa


através da sua digitalização e, posteriormente, convertemos as digitalizações em
versões editáveis, a fim de facilitar o manuseamento e, por conseguinte, a análise das
reportagens.

4.4. Análise dos Dados

Focando apenas na componente hiperestrutural, analisámos quantitativamente os


elementos que ocorriam em cada reportagem. Ainda nesta primeira fase de análise,
atentámos nas caixas de texto, com o objetivo de comprovar se todas as reportagens
tinham caixa de texto e qual seria a sua função neste género. Depois, centrámos a nossa
atenção no primeiro contacto que o leitor tem com as reportagens, isto é, nos títulos de
cada reportagem. A seguir, já entrando no plano de texto, analisámos as funções
retóricas presentes em cada reportagem tendo por base o modelo de análise de Santos
& Ramos (2021), que adaptámos ao presente estudo. Finalmente, tendo em conta a
textualização das reportagens, fizemos uma análise exploratória dos recursos
discursivos e linguísticos de natureza explicativa nelas ocorrentes.

4.4.1. Hiperestrutura das Reportagens

Na análise da componente material das reportagens, considerámos, em primeiro lugar,


a divisão da reportagem em página de abertura e as restantes páginas e tomámos como
parâmetros de análise elementos que, na nossa hipótese, constituem, tipicamente, a
hiperestrutura do género reportagem.

Assim, com respeito à página de abertura, temos os seguintes critérios: ter (ou não)
página dupla; área temática; antetítulo; título; imagens com legendas; lead; e,
finalmente, caixa de texto. Já em relação às restantes páginas, os critérios são: ter (ou

66
não) intertítulos; imagens com legendas; infográficos; destaques; caixas de texto;
paginação e, por fim, autor.

Constatámos que existem alguns parâmetros homogéneos, isto é, que se verificam nas
37 reportagens que constituem o corpus deste estudo. Na página de abertura, todas as
reportagens analisadas têm página dupla (a página de abertura consiste, na verdade,
em duas páginas da revista impressa). A este respeito, veja-se, a título ilustrativo, a
figura 1. Quanto às restantes páginas, os parâmetros homogéneos são os seguintes:
intertítulos, informação do número de página e indicação do autor, por meio de siglas.

Figura 1: Página dupla de T12

Relativamente ao uso de imagens com legenda, quer na página de abertura, quer nas
restantes páginas, duas reportagens destacam-se por serem as únicas que, embora
apresentem imagens a ilustrar e a acompanhar tanto o título como o seguimento do
texto principal, não possuem qualquer legenda que as descreva. Referimo-nos a “Que
fiasco!” (T9) e “Liberte a sua criatividade” (T28). Por outras palavras, 35 reportagens
(94,59%) têm imagens com legendas na página de abertura, bem como nas restantes
páginas.

67
Ainda em relação à página de abertura, constatámos que 34 reportagens (91,89%) têm
indicação da área temática na qual se insere o conteúdo da reportagem, além de
antetítulo e lead, como se ilustra na figura 2 (T29).

Figura 2: Antetítulo, título e lead de T29

Quanto às restantes páginas, verificámos que as mesmas 34 reportagens


supramencionadas (o que corresponde a 91,89% do corpus) têm destaques, conforme
ocorre na figura 3:

68
Figura 3: Exemplo de destaque em T1

Relativamente à ocorrência de caixas de texto, notámos que 29 reportagens (78,38%)


apresentam, pelo menos, uma caixa de texto, como a ilustrada na figura 4. Apesar disso,
contabilizámos 56 caixas de texto, tendo a mais pequena 80 palavras (T31) e a maior
1002 (T31). Portanto, em média, as caixas de texto em análise têm 266,59 palavras.

69
Figura 4: Caixa de texto em T30

Todas as caixas de texto surgem demarcadas do texto principal da reportagem,


geralmente pela formatação em coluna, pelo tipo de letra distinto do que é utilizado no
corpo da reportagem, pelo surgimento de um título com formatação diferente dos
intertítulos do texto principal e ainda pela formatação distintiva da letra inicial com que
começa o corpo da caixa de texto (semelhante à demarcação da letra inicial com que se
inicia o texto principal da reportagem). Veja-se, novamente, a figura 4 como exemplo.

Quanto às funções das caixas de texto, constatámos que as 56 (100%) caixas de texto
das reportagens em análise caracterizam-se por terem uma função adicional em relação

70
ao texto principal da reportagem, através de uma remissão indireta, isto é, que não é
marcada metalinguisticamente, mas que decorre de assuntos presentes no texto,
contendo frequentemente palavras ou expressões pista, como se pode verificar na
figura 5.

Figura 5: Relação entre o texto e a caixa de texto (T30)

Em relação à ocorrência de infográficos, verificámos que é um elemento residual em


comparação com os restantes, uma vez que só surge em 7 reportagens (ou seja, 18,92%
do corpus), sendo o seu principal objetivo facilitar a compreensão dos leitores, na
medida em que torna o discurso dos assuntos científicos abordados menos
incompreensível ou hermético (cf. figura 6).

71
Figura 6: Infográfico (T37)

O recurso à esquematização, a imagens ilustrativas, a diferentes cores, bem como a


blocos de texto particularmente curtos, para além de atrair o leitor para a página
impressa, facilita em certa medida a leitura e compreensão do assunto que um elemento
meramente verbal, por exemplo, não forneceria.

4.4.2. Títulos

Na análise realizada aos títulos das reportagens que constituem o corpus deste estudo,
considerámos três critérios principais: (i) a sua extensão; (ii) o grau de cientificidade
presente nas escolhas lexicais que estão na base de cada título; (iii) as estruturas
linguísticas utilizadas.

72
Com a nossa análise, comprovámos que os títulos são breves: o maior tem 8 palavras
(cf. “O que não dizem os testes de AND” - T11,) e os menores, 2 (cf., a título de exemplo,
T8, intitulado “Arte imersiva”).

Em relação à seleção lexical subjacente à construção dos títulos, verificámos que 20


reportagens (54,05%) recorrem, de algum modo, a uma expressão lexicalizada. Por
exemplo, o título “A vida secreta do subsolo” (T1), é constituído pela expressão “a vida
secreta de…”, onde, depois, se integra um termo técnico, neste caso ‘subsolo’. A
expressão lexicalizada referida é reconhecida de filmes (“A vida secreta dos nossos
bichos”, “A vida secreta das palavras”), porém não é previsível que sirva de título de um
discurso científico. Além disso, “A vida secreta do subsolo” não transmite ao leitor
informação relevante sobre o assunto que será abordado no corpo da reportagem.
Outro exemplo é “Fraude alternativa” (T32), que, apesar de não recorrer a uma
expressão lexicalizada corrente, como o título anterior, recorre a um termo técnico que,
à partida, será familiar ao leitor e adapta-o (cf. fraude alternativa < medicina
alternativa).

Note-se, contudo, que existem 4 reportagens (10,81%) onde, pela seleção lexical, se
denota um grau de cientificidade incomum comparativamente aos restantes títulos, a
saber: “Toxicologia do Nuclear” (T7), “Potência Quântica” (T19), “A ciência do
coronavírus” (T26), “O cérebro quântico” (T27). Como se pode observar, nestes títulos
não existem termos correntes.

Outro título do corpus que consideramos relevante mencionar é “Que fiasco!” (T9).
Trata-se de uma expressão que, novamente, não transmite qualquer informação por si
só acerca conteúdo da reportagem, embora expresse marque a atitude do locutor
perante o que vai ser abordado. Dado o seu registo coloquial, também não é previsível
que seja, de algum modo, relacionado com um texto científico.

Com respeito à estrutura, verificámos que a maioria dos títulos (78,38%) é formada por
um sintagma nominal (SN), mais precisamente, 13 reportagens (35,14%) são
constituídas por um SN antecedido de um determinante (cf. “Os maiores desafios” (T18)
e “O cérebro quântico” (T27)) e 16 reportagens (43,24%), por um SN sem determinante

73
(cf. “Destruidores de Mundos” (T25) e “Idade de ouro astronáutica” (T21)). Isto
demonstra uma ligeira predominância de títulos formados por um SN sem
determinante, o que é típico dos títulos jornalísticos. Há ainda 3 títulos (8,11%)
formados por um sintagma preposicional (SP), como é o caso de “A caminho de Marte”
(T23) e “Nas mãos do povo” (T2), e outros 3 constituídos por uma oração (cf. “O que não
dizem os testes de ADN” (T11) e “O que nos move?” (T16)).

Finalmente, “Estamos vigiados” (T15) e “Liberte a sua criatividade!” (T28) são os únicos
casos em que o título corresponde a uma frase.

Ao analisarmos os títulos, os subtítulos e os leads das reportagens do nosso corpus,


constatámos que existe uma relação direta do lead com o título e o antetítulo: o lead
complementa a informação transmitida pelo título e pelo antetítulo, expandindo e
contextualizando estes. Nesse sentido, estamos perante títulos com continuidade (cf.
Mesa 2004: 55). Atentemos no exemplo 1, de T3:

(1) “A ameaça das cianobactérias” (título)

“Reservas de água potável em risco” (antetítulo)

“Estes micro-organismos que obtêm energia por fotossíntese e vivem na água


são imprescindíveis para a vida, mas, quando ultrapassam certos níveis, tornam-
se um perigo muito sério. A sua atual proliferação em todo o tipo de superfícies
hídricas a nível global coloca em risco a disponibilidade de água potável, assim
como a saúde dos ecossistemas.” (lead)

O título e o antetítulo, por si só, não transmitem informação suficiente ao leitor sobre o
conteúdo da reportagem, considerando que o público-alvo não possui, à partida,
conhecimento suficiente para perceber de que trata a reportagem. Efetivamente, é a
relação destes com o lead que irá facultar ao leitor uma contextualização desse
conteúdo. Apenas lendo o lead o leitor compreende o que são as cianobactérias e a sua
importância para a vida, mas também que podem representar um perigo em
determinadas circunstâncias. Com efeito, é o lead que justifica e esclarece a relação
entre o título “A ameaça das cianobactérias” e o antetítulo “Reservas de água potável
em risco”.

74
Note-se ainda que esta relação do lead com o título e o antetítulo é muitas vezes
reforçada pela recuperação lexical. No caso que estamos a utilizar como exemplo, “Estes
micro-organismos” recupera “cianobactérias” através do demonstrativo “Estes” e do
hiperónimo “micro-organismos”.

Atentemos agora no caso de (2) (T13):

(2) Mistério explosivo (título)

O que são as FRB? (antetítulo)

De origem ainda desconhecida, as explosões rápidas de rádio (FRB, na sigla inglesa)


são descargas inesperadas de energia que intrigam a comunidade científica. Alguns
especialistas atribuem-nas a civilizações extraterrestres, mas o mais provável é que
provenham de fenómenos cósmicos ultraviolentos. (lead)

Este exemplo torna mais evidente a relação entre estes três elementos que antecedem
o corpo do texto da reportagem e o facto de se complementarem, funcionado em
conjunto. Novamente, o título e o antetítulo não transmitem informação suficiente ao
leitor acerca do conteúdo da reportagem. No entanto, neste caso, o título apresenta o
conceito de mistério, que tipicamente é utilizado quando alguém, por qualquer motivo,
não sabe alguma coisa. O antetítulo especifica esse mistério (explosivo), traduzindo-o
numa interrogação (“O que são as FRB?”). E, na sequência, o lead começa precisamente
por fornecer essa resposta ao leitor (“De origem ainda desconhecida, as explosões
rápidas de rádio (FRB, na sigla inglesa) são descargas inesperadas de energia que
intrigam a comunidade científica”), fornecendo mais informação sobre o conteúdo da
reportagem e justificando, também, o título e o antetítulo. Cabe, por conseguinte, ao
lead o papel de clarificar o leitor acerca do que se irá tratar na reportagem.

Tendo em consideração tudo o que foi mencionado e tendo por base a classificação de
Mompart, descrita em Mesa (2004: 56) e apresentada no Capítulo 2 da Parte 1 deste
estudo, podemos afirmar que os títulos das reportagens em análise são (i) subjetivos,
pois não contêm informação, mas procuram atrair o leitor; (ii) concentrados, porque,
como vimos são breves; (iii) incompletos, na medida em que o leitor necessita de ler o
subtítulo e o lead para entender realmente o conteúdo da reportagem; (iv) compostos,

75
uma vez que, conforme já foi referido, todas as reportagens, para além de título, têm
ainda um subtítulo e um lead; (v) de impacto, pelo menos a maior parte deles, pois
procuram ser chamativos, recorrendo a poucas palavras e não transmitindo nenhuma
informação concreta sobre o tema (cf. “Nas mãos do povo” (T2) e “Que fiasco!” (T9)).
No entanto, alguns títulos, como “Toxicologia do Nuclear” (T7), “Potência Quântica”
(T19), “A ciência do coronavírus” (T26) e “O cérebro quântico” (T27) podem ser
classificados como apelativos, dado que mencionam o assunto em causa de forma
sintética, sob a forma de uma expressão chave, sem fornecerem, no entanto,
informação mais substancial sobre o tema.

4.4.3. Análise das Funções Retóricas

As reportagens em análise apresentam uma estrutura composicional fixa geral,


apresentada, tipicamente, em colunas, que consideramos relevante descrever.
Primeiro, com um bloco introdutório composto por um ou mais parágrafos,
contextualizam o assunto. Depois, em blocos de conteúdo, os autores desenvolvem o
tema em questão. Esses blocos de conteúdo são introduzidos por intertítulos que,
marcando as macroestruturas da reportagem, sintetizam o conteúdo de cada bloco que
introduzem, funcionam como um guião para o leitor. De facto, são os intertítulos que
estabelecem a derivação ou mudança de um tema para o outro. Finalmente, a
reportagem é encerrada por um bloco conclusivo, também composto por um ou mais
parágrafos, que pode apresentar uma conclusão aberta ou fechada, consoante os
objetivos comunicativos do seu autor.

A análise dos dados relativos à macroestrutura das reportagens, mais concretamente,


às funções retóricas presentes nestas, foi feita com base na proposta de Santos & Ramos
(2021). Estes autores consideram 4 funções retóricas, às quais associam,
respetivamente, 4, 3, 12 e 5 subfunções, definidas na no capítulo 2, da Parte 1 deste
trabalho.

Porém, tendo em conta a relação constatada entre título, antetítulo e lead, uma vez que
nas reportagens em análise os títulos utilizados são títulos com continuidade (Mesa
2004: 55-56), considerámos relevante adaptar este modelo de análise a este contexto,

76
associando o lead à função FR1 (incitar o público-alvo a ler a reportagem). Assim, na
nossa análise, temos FR1a, que é cumprida pelo título ou pelo antetítulo e a função
FR1b, que é cumprida pelo lead. No entanto, tendo consciência de que o lead, embora
cumpra, efetivamente, a mesma função geral do título e do antetítulo e que estes três
elementos hiperestruturais funcionam em conjunto, possui subfunções distintas que o
caracterizam, criámos 3 subfunções específicas, a saber: A – Enquadrar o tema da
reportagem, que ocorre sempre que o lead transmite informação ao leitor sobre o
assunto que será tratado na reportagem; B – Dar pistas sobre os objetivos da
reportagem, que está presente sempre que de forma explícita ou implícita o lead aponta
para os objetivos da reportagem; e C – Interpelar o leitor, que ocorre sempre que, no
lead, os autores da reportagem interpelam diretamente o leitor, por exemplo,
recorrendo a interrogações que o provoquem ou que o levem a refletir sobre o assunto
da reportagem (cf. “Aceitaria que o seu melhor amigo lhe pagasse para aconselhá-lo
sobre o que deve fazer perante uma situação complicada? Provavelmente, não.” (T16)),
ou ainda através da modalização (cf. “Temos de compreender a sua atividade
magnética” (T20)).

A nível linguístico, estamos perante a subfunção FR1bA quando existe a menção de um


elemento relacionado com o tema, ou seja, um ponto de situação que, normalmente,
parte de uma asserção (mas pode também partir de uma interrogação como em “Quem
não deseja ser criativo?” (T28)) e, depois, a partir daí pode ou não haver uma expansão
para uma problematização, por exemplo. Muitas vezes, além de uma exposição que
aponta, de algum modo, para o tema a ser tratado, temos a remissão para a voz da
autoridade, isto é, para os especialistas, conforme já veremos. Com efeito, trata-se,
principalmente, de uma pista lexical.

A subfunção FR1bB ocorre quando, no lead, surge uma referência metatextual à própria
reportagem (cf., a título de exemplo, “Contamos aqui a sua história (…)” (T4) ou
“Revelamos aqui os últimos avanços e inventos (…)” (T17)) ou o recurso ao tempo verbal
Pretérito Perfeito do modo Indicativo, que, indicando uma ação terminada em relação
ao momento da enunciação, faz referência à ação já executada para escrever a
reportagem (cf. “Pusemos à prova (…)” (T11).

77
Já a subfunção FR1bC torna-se evidente, como já referimos, através do recurso a
questões que provoquem o leitor ou o levem a refletir, tais como “Aceitaria que o seu
melhor amigo lhe pagasse para aconselhá-lo sobre o que deve fazer perante uma
situação complicada?” (T16), mas também questões provocadoras construídas com a
primeira pessoa do plural (nós inclusivo), como “Estará ao nosso alcance?” (T18) ou
“Poderemos evitar esse tipo de fenómenos que causam estragos na biosfera e explicam
algumas das grandes extinções ocorridas no planeta?” (T25). Além disso, como também
já mencionámos, uma outra pista linguística para identificar esta subfunção é o recurso
à modalidade deôntica, com expressões como “temos de” (cf. “Temos de compreender
a sua atividade magnética” (T20) ou com o uso do imperativo “descubra” (cf. “Descubra
os últimos prodígios da biologia sintética” (T35)).

O modelo de análise aplicado ao corpus é sintetizado nas tabelas 1 a 6, apresentando-


se na primeira uma síntese das funções e nas subsequentes, a discriminação das
subfunções dentro de cada função.

Tabela 2: Funções retóricas

FR1
FR2 FR3 FR4
FR1a FR1b
Incitar o público-alvo a ler a Contextualizar Problematizar o Concluir a
reportagem o tema tema reportagem

Tabela 3: Subfunções de FR1a

FR1a
Incitar o público-alvo a ler a reportagem
(cumprida pela capa, pelo título ou pelo subtítulo)
A B C D
Apresentar um Indicar que será
Apresentar um título Apresentar uma
contexto que afeta o apresentada uma
persuasivo hipótese
público-alvo história interessante

78
Tabela 4: Subfunções de FR1b

FR1b
Incitar o público-alvo a ler a reportagem
(cumprida pelo lead)
A B C
Enquadramento do tema da Dar pistas sobre os objetivos
Interpelar o leitor
reportagem da reportagem

Tabela 5: Subfunções de FR2

FR2
Contextualizar o tema
(“ocorre no início do texto da reportagem”)
A B C
Descrever o facto que deu Descrever um caso Fazer generalizações sobre o
origem ao tema exemplificador do tema tema

Tabela 6: Subfunções de FR3

FR3
Problematizar o tema
A B C D
Apresentar o âmbito Apresentar o âmbito Retomar voz de
Citar pesquisas
político do tema histórico do tema autoridades
E F G H
Desmistificar
Explicar termos
Inserir infográficos Inserir imagens conceitos
técnicos
equivocados
I J K L
Marcar a ação Sugerir conteúdos
Apresentar Estabelecer o escopo
investigativa da extra relacionados
contraposições do contexto afetante
reportagem com o tema

Tabela 7: Subfunções de FR4

FR4
Concluir a reportagem
A B C D E
Apresentar
Retomar o Retomar o
Tecer previsões Retomar voz de possíveis
âmbito político âmbito histórico
sobre o tema autoridades soluções e/ou
do tema do tema
contribuições

79
Seguidamente, apresentam-se os resultados da análise, sintetizados nos gráficos 1 a 5.

FR1a
50%
40,54%
40% 35,14%
29,73%
30%
21,62%
20%

10%

0%
A B C D

Gráfico 1: Subfunções de FR1a

Como se pode constatar no gráfico 1, a função FR1a ocorre nas 37 reportagens e é


cumprida, sobretudo, recorrendo às subfunções FR1aC (indicar que será apresentada
uma história interessante) e FR1aA (apresentar um título persuasivo), uma vez que estas
subfunções correspondem, respetivamente, a 15 (40,56%) e a 13 (35,14%) reportagens
do nosso corpus.

Veja-se os exemplos (3)-(6):

(3) “A vida secreta do subsolo” (título, T1)

(4) “Mistério explosivo” (título, T13)

(5) “Liberte a sua criatividade!” (título, T28)

(6) “Já não é preciso sofrer” (antetítulo, T29)

Os dois primeiros são exemplos de títulos que indiciam que será contado, no corpo da
reportagem, algo interessante, ou seja, exemplos de títulos onde constatamos a
subfunção FR1aC. Inclusive, isso é notório na seleção lexical: o uso do adjetivo atributivo
‘secreta’ em (3) e o uso do nome ‘mistério’ em (4) possuem, no seu significado, uma
relação com factos inusitados, não conhecidos por todos e, por isso, interessantes.

80
Já os dois últimos, exemplificam os títulos onde verificámos a ocorrência da subfunção
FR1aA. Apesar de terem como finalidade atrair o leitor e despertar-lhe curiosidade
suficiente para ler o resto da reportagem, desafiam factos que, eventualmente, o leitor
tenha como verdades quase absolutas, mas fazem-no de forma diferente entre si.

Normalmente, o uso do conjuntivo com valor imperativo “Liberte a sua criatividade!”,


um ato de fala diretivo que interpela o leitor, gera curiosidade suficiente para incentivar
à leitura da reportagem em busca de mais informação que explicite como fazê-lo.

Finalmente, a dor é uma sensação que, apesar de incómoda, é entendida como sendo
comum à condição humana. Aliás, esse é um facto tido como verdade pela maior parte
das pessoas. Por isso, o leitor, à partida, estará habituado à ideia de ter dores, seja do
que for, de vez em quando, e a ideia de poder haver uma forma de erradicar esse
desconforto interessa-lhe bastante e, por conseguinte, desperta-lhe a curiosidade para
saber como se pode deixar de sofrer.

Um exemplo onde se pode observar a subfunção FR1aB, presente em 11 reportagens


(29,73%), é o 7, retirado de T15:

(7) “Estamos vigiados” (título)

“Liberdade e privacidade em risco” (antetítulo)

Neste caso, através da conjugação do verbo ‘estar’ na primeira pessoa do plural


combinada com o particípio passado ‘vigiados’ é visível que a presente reportagem
indicará ao leitor tratar-se de um assunto que o afeta. Contudo, caso a utilização do ‘nós’
não seja suficiente para captar o interesse do leitor, no antetítulo são referidas a
liberdade e a privacidade, direitos considerados indispensáveis para o ser humano. Mais
do que serem meramente referidas, no antetítulo, é realmente uma afirmação de que
estão em perigo. Ao ler isto, e por ser uma parte interessada em saber como pode
proteger a sua liberdade e a sua privacidade, independentemente de que perigo se
esteja a falar, o leitor ficará potencialmente interessado e curioso para perceber porquê.

A subfunção FR1aD, que surge apenas em 8 reportagens (21,62%), é visível, por sua vez,
no exemplo (8):

81
(8) “O outro berço da humanidade” (título, T10)

“Talvez tenhamos vindo da Ásia” (antetítulo, T10)

Aqui, o antetítulo explicita o porquê de haver um “outro berço da humanidade”, que


não é aquele que, em princípio, o leitor já conhece, estabelecendo-se, por conseguinte,
uma oposição através do demonstrativo ‘outro’. Mas, além disso, indica uma hipótese
(“Talvez tenhamos vindo da Ásia”) que, no decorrer da reportagem, poderá ser
confirmada ou desenvolvida. Linguisticamente, vemos que se trata de uma hipótese
pela escolha do tempo verbal, pois “tenhamos” corresponde ao Presente do modo
Conjuntivo, um modo tipicamente associado ao plano hipotético, bem como pelo
recurso ao advérbio ‘talvez’ que, geralmente, indica uma possibilidade.

De seguida, apresentam-se os resultados relativos a FR1b (gráfico 2).

FR1b
100,00%
100%
80%
60%
40% 27,03%
16,22%
20%
0%
A B C

Gráfico 2: Subfunções de FR1b

A função FR1b, embora também ocorra nas 37 reportagens, denota uma predominância
clara, como é visível no gráfico acima, relativamente à ocorrência da subfunção FR1bA
(contextualizar o conteúdo da reportagem), que corresponde a 100%. Ou seja, esta é
uma subfunção que está presente em todos os leads e, inclusive, 21 leads (56,77%)
caracterizam-se por desempenharem única e exclusivamente esta subfunção (cf., por
exemplo, (9)).

(9) “A colaboração entre voluntários amadores e investigadores profissionais em


projetos científicos é cada vez mais comum. Os defensores da prática dizem que

82
amplia e democratiza o conhecimento; para os críticos, retira qualidade ao trabalho
e é uma forma encoberta de exploração económica.” (lead, T2)

Este lead do T2 (reportagem intitulada “Nas mãos do povo”, que tem como antetítulo
“A ajuda dos amadores é útil?”) fornece, de facto, informação ao leitor sobre o conteúdo
da reportagem e, por isso, tem como função a sua contextualização, na medida em que
explica que existem dois pontos de vista opostos sobre uma única prática, o
voluntariado amador em investigações e projetos científicos: por um lado, os defensores
“dizem que amplia e democratiza o conhecimento”; por outro, os críticos, que
defendem que “retira qualidade ao trabalho e é uma forma encoberta de exploração
económica”. É esta discussão que será o assunto abordado nesta reportagem.

Já a segunda subfunção que, ainda que ocorrendo apenas em 10 reportagens (27,03%),


surge com alguma frequência no lead é a de interpelar o leitor, ou seja, FR1bC. Vejamos
(10):

(10) “Todos os dias, caem sobre as nossas cabeças cem toneladas de poeira e rocha
provenientes do espaço. A maior parte desintegra-se na atmosfera, mas mais cedo
ou mais tarde, um grande asteroide ou um cometa irá colidir com a Terra, como,
de facto, já aconteceu. Poderemos evitar esse tipo de fenómenos que causam
estragos na biosfera e explicam algumas das grandes extinções ocorridas no
planeta? (lead, T25)

Neste lead, temos duas asserções que apresentam o tema (“Todos os dias, caem sobre
as nossas cabeças cem toneladas de poeira e rocha provenientes do espaço. A maior
parte desintegra-se na atmosfera, mas mais cedo ou mais tarde, um grande asteroide
ou um cometa irá colidir com a Terra, como, de facto, já aconteceu.”), enquadrando,
desta forma, o leitor acerca do assunto que será tratado na reportagem (neste caso, a
queda de cometas e asteróides). Depois, surge um ato diretivo, sob a forma de uma
interrogação, que permite problematizar a questão e interpelar o leitor elevá-lo a
refletir, sendo pistas linguísticas centrais a primeira pessoa do plural e o futuro.

Por fim, um exemplo de lead onde os autores indicam o que pretendem fazer na
reportagem – ação correspondente à subfunção FR1bB, menos representativa no
corpus, pois surge apenas em 6 reportagens (16,22%) – é o de T26 (11):

83
(11) “Semeia o pânico, infetou milhões de pessoas, paralisou países e fustigou
impiedosamente a economia. O que tem de tão especial o SARS-CoV-2, o
coronavírus surgido, em dezembro de 2019, num mercado da China? Porque é tão
contagioso? Conseguiremos travá-lo? Quando haverá uma vacina? É um risco
escrever sobre o tema numa revista que leva duas semanas, pelo menos, a chegar
às mãos dos leitores, e numa situação de colaboração internacional nunca antes
vista, que proporciona desenvolvimentos a cada dia que passa. No entanto,
julgamos útil recordar aspetos sobre a pandemia de Covid-19 que talvez escapem
à espuma dos noticiários quotidianos. Assumimos o risco, em troca de proporcionar
informação científica sólida, para melhor enquadrar o fluxo de dados.” (lead, T26)

Neste caso, novamente, temos um lead que começa com uma asserção que introduz o
tópico da reportagem, a Covid-19 (“Semeia o pânico, infetou milhões de pessoas,
paralisou países e fustigou impiedosamente a economia.”). Partindo daí, existe uma
expansão através da colocação de várias questões. Depois, os autores falam do próprio
ato de escrever sobre a Covid-19 (“É um risco”); explicam o porquê de ser, do seu ponto
de vista, um risco escrever sobre esse tema e terminam afirmando: “Assumimos o risco,
em troca de proporcionar informação científica sólida, para melhor enquadrar o fluxo
de dados”.

Esta última afirmação revela as intenções dos autores ao escrever esta reportagem:
“proporcionar informação científica sólida, para melhor enquadrar o fluxo de dados”,
dado que, como referem os autores, é possível que, no meio de tantas notícias sobre o
assunto, tenha escapado ao leitor informação verdadeiramente relevante e de caráter
científico sobre esta doença que preocupa o mundo.

No entanto, embora neste último exemplo, as pistas sobre os objetivos da reportagem


sejam linguisticamente explícitas, é possível que os autores indiquem o que pretendem
implicitamente (cf. (12)):

(12) "Segundo estudos realizados em vários países, cada vez mais pessoas confiam
nas chamadas "terapias alternativas ou complementares", apesar de não haver
qualquer prova científica da sua eficácia, muito pelo contrário. Se não passam de
um placebo, porque são tão populares? Porque são "reguladas"? Como
desmascarar estas práticas lucrativas mas perigosas?" (lead, T32)

84
Mais uma vez, o lead começa com uma asserção que introduz o tema da reportagem –
as terapias alternativas ou complementares –, mas fá-lo já recorrendo à voz de
autoridade, ou seja à voz da ciência (“Segundo estudos”). Depois desta introdução ao
assunto, onde o leitor fica a perceber do que tratará a reportagem, o autor coloca uma
série de questões (“Se não passam de um placebo, porque são tão populares? Porque
são “reguladas”? Como desmascarar estas práticas lucrativas mas perigosas?”). Ao fazer
isso, implicitamente, o autor dá a entender ao leitor que, no decorrer da reportagem,
tentará dar resposta a estas questões.

Passamos, de seguida, aos resultados da análise de FR2 (gráfico 3).

FR2
60% 56,76%

40%
21,62% 24,32%
20%

0%
A B C

Gráfico 3: Subfunções de FR2

Quanto à função FR2 (Contextualizar o tema), surge, igualmente, em todas as


reportagens, como as funções anteriores, e revela uma predominância da subfunção
FR2A (Descrever o facto que deu origem ao tema), que surge em 21 reportagens
(56,76%) e, muitas vezes, não só descreve o facto que deu origem ao tema, mas,
sobretudo, um evento (cf. (13)).

(13) "“Crianças e animais - Evitar na medida do possível o seu acesso ao rio


para beber ou brincar", dizia a recomendação lançada pelos responsáveis do
Parque Nacional da Serra de Guadarrama, na Comunidade de Madrid, no verão
passado. A causa do alerta era a proliferação na bacia do rio Manzanares da
cianobactéria Phormidium, que pode libertar uma toxina que constitui, em certas

85
circunstâncias, um problema para a saúde pública e pode tornar-se tão letal para
os humanos como para outros animais." (primeiro parágrafo, T3)

Como se pode observar, a reportagem T3, intitulada “A ameaça das cianobactérias”,


começa com um alerta (“Crianças e animais – Evitar na medida do possível o seu acesso
ao rio para beber ou brincar”), que é contextualizado espacial e temporalmente
(“Parque Nacional da Serra de Guadarrama, na Comunidade de Madrid, no verão
passado”). E, no seguimento da reportagem, percebe-se que o facto de existir uma
recomendação para as crianças evitarem ir para o rio é seguido de uma justificação (“ a
causa do alerta era”) que vai permitir desenvolver o tema da reportagem: as
cianobactérias (“A causa do alerta era a proliferação na bacia do rio Manzanares da
cianobactéria Phormidium, que pode libertar uma toxina que constitui, em certas
circunstâncias, um problema para a saúde pública e pode tornar-se tão letal para os
humanos como para outros animais.”). Ou seja, é o alerta descrito inicialmente que vai
permitir ao autor contextualizar o leitor relativamente ao assunto que será tratado.

Por oposição, as restantes subfunções subjacentes a esta função apresentam uma


frequência semelhante, sem grande destaque. FR2C (Fazer generalizações sobre o tema)
surge em 9 textos (24,32%). Vejamos um exemplo (14):

(14) "Conhecemos os vírus por provocarem terríveis doenças, mas o seu campo de
ação é muito mais vasto: são as entidades "vivas" mais abundantes e diversificadas
do planeta, desempenharam um papel fundamental na evolução das espécies e
estão em todo o lado, das nuvens aos nossos intestinos." (primeiro parágrafo, T14)

Neste primeiro parágrafo da reportagem T14, intitulada “O planeta dos Vírus”, o autor,
de modo a especificar a importância dos vírus e, possivelmente, desmistificar, também,
a informação que o leitor poderá ter sobre o assunto, começa por apresentar um
conjunto de generalizações sobre os vírus: “são as entidades "vivas" mais abundantes e
diversificadas do planeta, desempenharam um papel fundamental na evolução das
espécies e estão em todo o lado, das nuvens aos nossos intestinos”. Dado tratar-se de
uma construção com o verbo ‘ser’ que caracteriza, de forma geral, algo (neste caso, os
vírus), podemos considerar que se trata de uma definição.

86
Já a subfunção FR2B (Descrever um caso exemplificador do tema), presente somente
em 8 reportagens (21,62%), é visível, por exemplo, no excerto (15):

(15) "A melhor terapia contra o cancro da mama é ficar quieto, não fazer nada. Foi o
que disse o "naturapata" basco Txumari Alfaro no congresso "Um Mundo Sem
Cancro - O que o Seu Médico Não Diz", realizado em Barcelona no início do ano
passado. Falava para uma audiência constituída maioritariamente por mulheres, a
quem também garantiu que, se uma criança desenvolve um tumor maligno, é
porque não foi desejada pela mãe." (primeiro parágrafo, T32)

Este excerto corresponde ao primeiro parágrafo do texto T32, intitulado “Fraude


alternativa”. Como é possível constatar, o parágrafo inicia com uma citação (“A melhor
terapia contra o cancro da mama é ficar quieto, não fazer nada. Foi o que disse o
“naturapata” basco Txumari Alfaro no congresso “Um Mundo Sem Cancro – O que o Seu
Médico Não Diz”, realizado em Barcelona no início do ano passado.”). Uma vez que, após
a leitura do título, do antetítulo e do lead, percebemos que o assunto desta reportagem
será a medicina alternativa, ao ler este início compreendemos que o autor, para
contextualizar o tema, descreve um caso que exemplifica uma medicina alternativa,
uma vez que se trata de uma “naturapata”.

Os resultados da função FR3 (Problematizar o problema) são apresentados no gráfico 4.

87
FR3
100,00% 100,00%
100%
90%
80% 75,68% 75,68%
70% 62,16% 64,86%
60%
50% 40,54%
40%
30%
18,92%
20% 10,81% 8,11%
10% 2,70%0,00%
0%
A B C D E F G H I J K L

Gráfico 4: Subfunções de FR3

também ocorre em todas as reportagens analisadas, existindo duas subfunções que, do


mesmo modo, encontrámos em todos textos: FR3D (Inserir voz de autoridade) e FR3F
(Inserir imagens). Dado que o foco da nossa análise, neste ponto, são os elementos
verbais da reportagem, apresentaremos apenas um caso ilustrativo de FR3D, (16), e não
exemplificaremos FR3F.

(16) “O segredo reside num lugar que a vista não alcança: o subsolo. As raízes das
árvores (que podem expandir-se até quatro vezes o diâmetro da copa) entrelaçam-
se com os micélios, a massa de finos filamentos subterrâneos dos fungos, para
formar gigantescas redes de informação que transportam não apenas água e
nutrientes como, também, mensagens de ânimo e de perigo. “Comunicam através
do seu sistema. Não são indivíduos que crescem por sua conta, a fim de ser o mais
bem-sucedido: fazem parte de uma rede em constante interação, em que a
colaboração é primordial”, indica Simard, que, antes de se dedicar à investigação,
trabalhou na indústria madeireira, planificando abates e plantações para produção,
até perceber que algo não estava bem.” (T6)

Neste excerto, podemos perceber que o autor, com o objetivo de explicar o que
mencionou antes (“As raízes das árvores (que podem expandir-se até quatro vezes o
diâmetro da copa) entrelaçam-se com os micélios, a massa de finos filamentos

88
subterrâneos dos fungos, para formar gigantescas redes de informação que transportam
não apenas água e nutrientes como, também, mensagens de ânimo e de perigo.”), isto
é, o facto de existir comunicação entre as várias espécies de árvores, traz o
posicionamento de uma especialista (“indica Simard…”), que foi introduzida ao leitor,
logo no início da reportagem, e que é, aqui, vista como autoridade científica. Esta
intertextualidade ajuda o autor a trazer para a reportagem credibilidade e rigor
tipicamente associados ao discurso científico.

Também com uma elevada frequência temos a subfunção FR3B (Apresentar o âmbito
histórico do tema), ilustrada em (17), e a subfunção FR3G (Explicar termos técnicos),
exemplificada em (18). Ambas ocorrem em 28 reportagens (75,68%).

(17) “Coube ao Homo erectus ser o primeiro a lavrar a terra. Há cerca de 700 mil anos,
os membros dessa espécie que se tinham estabelecido nas grutas de Zhoukoudian,
a cerca de 40 quilómetros da atual Pequim, aprenderam a fabricar ferramentas de
pedra consideravelmente mais avançadas do que as dos seus predecessores.” (T10)

Neste excerto, o autor da reportagem T10, intitulada “O outro berço da humanidade”,


introduz uma sequência narrativa (“Há cerca de 700 mil anos, os membros dessa espécie
que se tinham estabelecido nas grutas de Zhoukoudian, a cerca de 40 quilómetros da
atual Pequim, aprenderam a fabricar ferramentas de pedra consideravelmente mais
avançadas do que as dos seus predecessores”) com o objetivo de explicar o que disse
anteriormente (“Coube ao Homo erectus ser o primeiro a lavrar a terra.”).
Linguisticamente, é visível essa apresentação de âmbito histórico na preocupação de
localizar temporalmente, com alguma exatidão, a ação que decorreu: “Há cerca de 700
mil anos” e o uso da sequência temporal típica da narração (tempos verbais: Pretérito
Perfeito Simples, Pretérito Mais que Perfeito, localizador temporal).

(18) “Já sabe. Se permanecer aferrado aos seus preconceitos ou cultivar uma postura
demasiado rígida, não passará no teste. Tem de fazer exatamente o contrário:
estimular a plasticidade cerebral, isto é, a capacidade dos neurónios para criar
novas ligações.” (T28)

Antecipando a possibilidade de o leitor não ter conhecimento do significado da


expressão “plasticidade cerebral”, o autor da reportagem explica em que consiste esse

89
conceito, recorrendo a uma reformulação que é introduzida pelo marcador discursivo
de reformulação ‘isto é’. Ou seja, ‘plasticidade cerebral’ é equivalente à ‘capacidade dos
neurónios para criar novas ligações’, só que a primeira, como é um termo técnico, não
é de conhecimento geral e, por isso, o autor preferiu explicar o seu significado em
linguagem corrente.

A subfunção FR3C (Citar pesquisas), representada em (19), e a subfunção FR3A


(Apresentar âmbito político do tema), ilustrada em (20), também apresentam uma
frequência significativa, estando presentes em 24 (64,86%) e 23 reportagens (62,16%),
respetivamente.

(19) “Trata-se da mesma conclusão a que chegou uma equipa de investigação do


Centro de Estudos sobre o Risco, da Universidade de Cambridge (Inglaterra),
publicado, em janeiro de 2017, na revista Space Weather Journal.” (T20)

Este início de parágrafo, inserido na reportagem T20, intitulada “Reféns do Sol”, é


antecedido de um alerta para o facto de o mundo estar tão dependente dos sistemas
de comunicação e do abastecimento elétrico que, caso houvesse uma tempestade solar
e, por conseguinte, toda a tecnologia deixasse de funcionar, testemunharíamos uma
crise económica global nunca antes vista. E, como se pode observar, no excerto
transcrito, é apresentada uma pesquisa que corrobora a tese anteriormente defendida.
Este recurso para além de ajudar na sustentação da tese, também enfatiza o caráter
científico do género.

(20) Por sua vez, o governo russo multou em 11 500 euros o serviço de mensagens
instantâneas Telegram por se recusar a fornecer às autoridades as chaves para
desencriptar as suas mensagens, e ameaçou expulsá-lo da Rússia. (T15)

Neste excerto, presente na reportagem T15, intitulada “Estamos vigiados”, o autor


apresenta o âmbito político do tema, na medida em que descreve o modo de atuar do
governo russo numa circunstância particular relacionada com o assunto da reportagem:
o facto de os governos mundiais controlarem os seus cidadãos por meio das tecnologias.
Isso é visível na referência direta ao governo russo, que tem a função sintática de sujeito
da frase complexa transcrita.

90
Note-se ainda que a subfunção FR3J (Apresentar contraposições) surge em 15
reportagens, o que corresponde a 40, 54%. Atentemos em (21):

(21) “Quer façamos ou não voluntariado, a motivação é a força interior que nos faz
agir. Em contrapartida, o incentivo provém de fora e o seu objetivo é estimular essa
motivação a troco de uma recompensa ou de um resultado.” (T16)

Este início de parágrafo da reportagem T16, intitulada “O que nos move?”, é um


exemplo de contraposição, pois apresenta duas perspetivas distintas da mesma
questão: por um lado, a motivação e, por outro, o incentivo. Isto é visível, sobretudo, no
uso do marcador discursivo ‘Em contrapartida’ que, tipicamente, serve para introduzir
uma ideia ou posição contrária àquele que foi apresentada antes. Neste caso, a oposição
reside no facto de a motivação ter origem no interior (“a motivação é a força interior”)
e o incentivo ter origem no exterior (“o incentivo provém de fora”).

Já as restantes subfunções são praticamente residuais. Ainda assim, apresentaremos um


exemplo para cada uma, exceto para a subfunção FR3E (Inserir infográficos) – que
conforme se pode verificar no gráfico (4) tem uma frequência correspondente a 18,92%,
pois surge apenas em 7 reportagens –, dado que, na análise aos componentes
hiperestruturais da reportagem, já referimos os infográficos, embora não o tenhamos
feito detalhadamente, por não ser esse o foco da nossa análise.

A subfunção FR3H (Desmistificar conceitos equivocados), que foi visível em 4


reportagens (10,81%), surge agora ilustrada no exemplo (22):

(22) “É também comum dizer-se que a ciência cidadã promove uma investigação mais
democrática (alguns chamam-lhe "demociência"), mas o que tem isso a ver com
colocar milhares de pessoas a reunir dados? Além disso, quase todas as iniciativas
do género decorrem das necessidades de grupos de especialistas com interesses
específicos. Uma verdadeira ciência democrática exigiria que não fossem apenas os
cientistas a decidir o que investigar, mas também os cidadãos.” (T2)

Neste excerto, retirado da reportagem intitulada “Nas mãos do povo”, o autor confronta
o leitor com o significado da expressão “ciência democrática”, esclarecendo que, apesar
de ser comum referir-se à ciência cidadã como ciência democrática, na verdade, “uma
verdadeira ciência democrática exigiria que não fossem apenas os cientistas a decidir o

91
que investigar, mas também os cidadãos” e isso não ocorre na ciência cidadã porque a
maioria das iniciativas surge tendo por base os interesses específicos de especialistas.

A subfunção FR3I (Marcar a ação investigativa da reportagem), apresenta apenas uma


frequência de 8,11 %, uma vez que foi observada somente em 3 reportagens (cf. (23)).

(23) “Segundo o neurocientista espanhol David López Pérez, da Universidade de


Varsóvia, que faz parte do grupo, "medir o ruído pode, efetivamente, servir para
quantificar como se ativam diferentes zonas do cérebro ou para limpar o sinal de
uma ressonância magnética, por exemplo", explica, quando o interrogamos sobre
a utilidade das experiências.” (T27)

Neste excerto, extraído da reportagem T27, “O cérebro quântico”, é visível o papel da


revista enquanto agente de investigação na utilização do verbo ‘interrogar’, que,
tipicamente, está associado ao querer saber mais sobre um determinado assunto, bem
como, à sua conjugação na primeira pessoa do plural, uma vez que podemos interpretar
esse ‘nós’ como sendo um ‘nós’ que inclui a pessoa do jornalista e a equipa da revista,
dado que, na identificação do autor, surge apenas uma indicação, isto é, uma única
pessoa.

Temos ainda a subfunção FR3K (estabelecer o escopo do contexto afetante) que ocorre
uma única vez (cf. (24)):

(24) “Quem suspeita ou sabe que tem uma doença genética minoritária pode
beneficiar da existência destes testes. Desde que a pessoa suspeita que tem uma
doença rara e consulta o médico até obter um diagnóstico correto podem passar
entre cinco e dez anos, e alguns especialistas defendem que os cuidados de saúde
primários deveriam incluir uma especialidade médica de genética, e que todos os
profissionais de medicina deveriam ser obrigados a atualizar os seus
conhecimentos em genómica, um campo relativamente novo e revolucionário.”
(T11)

Este excerto, retirado da reportagem T11, “O que não dizem os testes de ADN”,
especifica o tipo de indivíduo que pode beneficiar com os testes de ADN: “Quem
suspeita ou sabe que tem uma doença genética minoritária pode beneficiar da

92
existência destes testes”. A seguir, o autor esclarece o motivo de considerar
particularmente útil estes testes para este grupo de pessoas.

Note-se que a subfunção FR3L (Sugerir conteúdos extra relacionados com o tema) não
foi observada em nenhuma das reportagens do nosso corpus.

Por fim, apresentamos os resultados da função FR4 no gráfico 5.

FR4
80%
59,46%
60%

40% 27,03%
18,92%
20%
2,70% 2,70%
0%
A B C D E

Gráfico 5: Subfunções de FR4

Esta função (Concluir a reportagem) não se verificou em todas as reportagens, pois,


seguindo este modelo de análise, T18 não conclui a reportagem (cf. (25)).

(25) Como se não bastasse, não se trata da única carta que o universo utiliza para se
rir na cara dos físicos. Há outra questão que os deixa igualmente perplexos: a
existência da matéria escura. Embora não emita radiação eletromagnética e não
possa ser observada, exerce um efeito gravitacional mensurável sobre as galáxias.
Por isso, foi possível determinar que representa aproximadamente 27% de tudo o
que o universo contém. A matéria convencional que conhecemos, como a que
integra as estrelas, os planetas e tudo o resto, incluindo nós, representa apenas 5%.

Os cientistas andam às voltas com esta questão há décadas, mas ainda não sabem
o que é nem qual a proveniência da matéria escura. A única coisa que dão por certa
é que a sua existência não está prevista no modelo-padrão da física de partículas.
Contudo, este também possui os seus próprios problemas. Um é o esquivo
neutrino: o modelo-padrão prevê que não deveria ter massa, mas, no entanto, tem.
Só surpresas... [últimos dois parágrafos da reportagem]

93
Como se pode ver na transcrição acima, esta reportagem não termina tecendo previsões
sobre o tema (FR4A), nem retomando o âmbito político ou histórico do tema (FR4B e
FR4C), nem retomando voz de autoridades (FR4C). E tampouco termina apresentando
possíveis soluções ou contribuições (FR4D).

Na verdade, a reportagem deixa uma conclusão em aberto, reforçada pela pontuação


(recurso às reticências), mas também pela última frase com elisão do verbo, que, à
partida, não seria previsível numa conclusão (“Só surpresas”), dada a sua
expressividade.

Com respeito aos restantes 36 textos (97,30%), constatou-se uma predominância da


subfunção FR4D (Retomar voz de autoridade), uma vez que, como é visível no gráfico 5,
esta ocorre em 22 reportagens (59, 46%). Veja-se o exemplo (26):

(26) “"É necessário muito mais investigação, com uma ampla variedade de
tipos celulares e organismos, para se poder entender melhor o prime editing e
aperfeiçoá-lo", reconheceu a equipa de Liu quando o seu trabalho foi publicado na
Nature. Montoliu também se mostra cauteloso, enquanto outros grupos de
cientistas não testarem a nova ferramenta. Apenas isso "nos poderá dizer se este
procedimento inovador para editar genomas terá possibilidade e trajeto
terapêutico, ou se não passará de mais uma das dezenas de propostas com
alternativas à CRISPR que surgem todas as semanas", explica. O tempo dirá.”
(último parágrafo, T4)

Neste último parágrafo da reportagem intitulada “Corta-e-cola nos genes”, constatamos


duas retomas de voz da autoridade: a primeira declaração proferida pela “equipa de Liu
quando o seu trabalho foi publicado na Nature”; a segunda, por Monoliu (“Monteliu
também se mostra cauteloso, enquanto outros grupos de cientistas não testarem a nova
ferramenta. Apenas isso “nos poderá dizer se este procedimento inovador para editar
genomas terá possibilidade e trajeto terapêutico, ou se não passará de mais uma das
dezenas de propostas com alternativas à CRISPR que surgem todas as semanas”,
explica.”). Trata-se de retomas, porque estes especialistas já foram apresentados ao
leitor e já participaram, por meio de outras declarações, no decorrer da reportagem.

94
A segunda subfunção com maior frequência é FR4A (Tecer previsões sobre o tema), em
10 reportagens (27,03%), de que é exemplo (27):

(27) “Terminou o período de defeso. No final deste ano, o CHIME irá consagrar
grande parte do seu tempo à caça de FRB, tal como o Australian Square Kilometer
Array Pathfinder, uma rede de 36 antenas parabólicas idênticas. Se tudo correr
bem, dentro de alguns anos entrará em funcionamento o HIRAX, uma série de mil
radiotelescópios com uma abertura de seis metros, colocados de forma a conseguir
uma configuração muito compacta, no deserto sul-africano de Karoo. Estaremos
prestes a resolver o mistério?” (último parágrafo, T13)

Neste parágrafo, que encerra a reportagem T13, “Mistério explosivo”, podemos


observar que são apresentadas conjeturas sobre o tema da reportagem (neste caso as
explosões rápidas de rádio, ou FRB na sigla inglesa). Isso é visível no uso do Futuro do
modo Indicativo (“irá”, “entrará”); nas expressões de localização temporal, tais como
“No final deste ano”, “dentro de alguns anos”; e na expressão condicional “Se tudo
correr bem”, que mostra que a informação que introduz é apenas uma previsão e, por
isso, pode ou não concretizar-se.

A terceira subfunção mais frequente nas conclusões das reportagens analisadas é FR4E
(Apresentar possíveis soluções e/ou contribuições), que se verificou em 7 textos
(18,92%). Atentemos no exemplo (28):

(28) “Para a ciência cidadã poder prosperar, é preciso envolver a sociedade em algo
que ultrapasse a mera recolha de dados: tem de poder tomar decisões sobre a
investigação. Essa nova mentalidade deverá permear a mente dos profissionais,
fazendo-os abandonar a postura pretensiosa perfeitamente definida por um
cientista europeu numa reunião em Bruxelas sobre comunicação científica: "A
ciência é demasiado importante para afastá-la da mão dos cientistas."
Precisamente por isso, talvez tenha chegado a altura de fazê-lo. É preciso refletir
sobre o assunto e as suas consequências.” (último parágrafo, T2)

Como se pode constatar neste último parágrafo da reportagem “Nas mãos do povo”, o
autor encerra o texto apresentando possíveis soluções para a questão abordada (neste
caso, a ciência cidadã). Isso é observável na construção “Para a ciência cidadã poder

95
prosperar, é preciso…”, que introduz aquilo que parece ser necessário fazer, no
entender do autor, para a ciência cidadã ter maior sucesso, tendo, por conseguinte, um
valor modal deôntico. Note-se que o SV “é preciso” volta a surgir no final do parágrafo
para reforçar uma ideia que, para o autor, é fundamental para solucionar a problemática
que envolve a ciência cidadã: “refletir sobre o assunto e as suas consequências.”.

As subfunções FR4B (Retomar o âmbito político do tema) e FR4C (Retomar o âmbito


histórico do tema) estão associadas apenas a uma ocorrência, T31 (cf. (29)) e T34 (cf.
(30)), respetivamente.

(29) “Os especialistas recordam igualmente que a transição energética deverá ser
justa e solidária com os diferentes setores, os trabalhadores e os lugares que
poderão sofrer perdas ou alterações, não deixando alguém para trás. Essa
necessidade é também sublinhada, por exemplo, pela Declaração da Silésia,
assinada na Cimeira do Clima de Katowice (Polónia). Em suma, a tecnologia está
praticamente pronta, faltam objetivos e política. É preciso quebrar essa inércia para
podermos caminhar rumo a um mundo melhor, dizem os especialistas. António
Guterres tentou dar um impulso na direção certa, vamos ver em que se traduz.”
(último parágrafo, T31)

Neste exemplo, extraído da reportagem “Guerra total ao CO2”, a retoma de aspetos


envolvidos é particularmente evidente na frase final (“António Guterres tentou dar um
impulso na direção certa, vamos ver em que se traduz.”), uma vez que António Guterres,
sendo o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) é o indivíduo que
representa esta organização e a ação da ONU foi mencionada no desenvolvimento da
reportagem: foi apresentado um relatório, que se baseia no conhecimento científico
disponível, onde se sublinha a necessidade de “medidas urgentes”. É essa ação que é
aqui retomada na pessoa de Guterres. Essa ação é uma tentativa de levar os países a
agir corretamente para tentar amenizar o problema em torno das emissões de CO2 ,
embora vá depender, depois, da ação de cada governo, e, por isso, o autor afirma
“António Guterres tentou dar um impulso na direção certa, vamos ver em que se
traduz.”

96
(30) “Torna-se, assim, a primeira prova de uma emigração da nossa espécie para fora
de África. Recorde-se que Qafzeh, com os seus 120 mil anos, era considerada até
agora a jazida mais antiga, fora do continente africano, com fósseis de seres
humanos modernos. Hoje, podemos afirmar que os nossos antepassados remotos
já tinham saído de África e chegado ao Médio Oriente pelo menos 60 mil anos
antes, e também que o intercâmbio de genes e de cultura lítica com os neandertais
pode ter-se produzido há cerca de 180 mil anos.” (último parágrafo, T34)

Neste último parágrafo da reportagem “A longa viagem do Homo Sapiens”, é visível o


resgate de aspetos históricos abordados no texto no recurso a expressões de localização
temporal. Primeiro há uma contraposição entre o que se pensava antes e o que, com as
descobertas recentes, se passou a conhecer: “Recorde-se que Qafzeh, com os seus 120
mil anos, era considerada até agora a jazida mais antiga, fora do continente africano,
com fósseis de seres humanos modernos. Hoje, podemos afirmar que os nossos
antepassados remotos já tinham saído de África e chegado ao Médio Oriente pelo
menos 60 mil anos antes”. Depois, localiza-se o “intercâmbio de genes e de cultura lítica
com os neandertais” através da sua associação à expressão localizadora “há cerca de
180 mil anos”.

4.5. A Explicação nas Reportagens

Tendo em conta o que vimos na fundamentação teórica relativamente à explicação e,


mais concretamente, relativamente à relação entre a explicação e a divulgação
científica, e os mecanismos apontados por Landry (1992), Leibruder (2000), Blancfort &
Van Dijk (2004) e Blancfort & Valls (2007), procedemos à análise descritiva dos seguintes
mecanismos: reformulação, definição, denominação, exemplificação, comparação e
metáfora.

4.5.1. Reformulação

Com respeito à reformulação, vejamos os exemplos:

(31) “Graças à avalancha de informação, Mojica pôde investigar se as repetições que


encontrara na H. mediterranei (um microbio halófilo, isto é, que prolifera em

97
ambientes muito salinos) também surgiam noutras espécies. Para grande surpresa
do especialista, não tardou a confirmá-lo.” (T4)

(32) “Nas palavras do astrónomo Seth Shostak, do Instituto SETI, "a FRB 121102 é como
um latido muito forte de um cão pequeno": sai do interior de uma galáxia anã,
várias dezenas de vezes mais pequena do que a Via Láctea, com baixa metalicidade
(ou seja, com deficiência de elementos químicos, exceto hidrogenio e hélio) e onde
se está a formar um grande número de estrelas. À semelhança do jogo de detetives
Cluedo, são estas as pistas de que dispomos para poder resolver o mistério.” (T13)

(33) “O facto de ser grande indica que o vírus é "inteligente", isto é, tem recursos para
se adaptar a múltiplas condições ambientais. Por outras palavras, quanto maior o
tamanho, menor a vulnerabilidade.” (T26)

(34) “Para as autoras do estudo, o conflito necessário para que possa surgir o humor
obriga o cérebro a contemplar em simultâneo ambos os significados da segunda
frase, ou seja, tem de se encontrar num estado de sobreposição quântica. Da
mesma forma que uma sobreposição de partículas colapsa quando se toma uma
medida e o objeto em questão adquire uma única posição, entender algo
engraçado deve-se ao facto de o cérebro optar por uma das possíveis
interpretações da frase, o que resolve o conflito.” (T27)

(35) “A equipa de Holliger criou enzimas artificiais de AXN que leem os filamentos do
ácido xenonucleico original e criam cópias de ADN, as quais são, por sua vez,
transcritas para AXN, isto é, para as suas descendentes. Por outras palavras,
podem evoluir!” (T35)

Verificamos que a estratégia explicativa da reformulação é marcada, formalmente,


através de marcadores próprios, como ‘isto é’, ‘ou seja’, ‘por outras palavras’, que
introduzem uma nova formulação mais inteligível para o público leigo a fim de explicar
o enunciado anterior. Esse enunciado anterior, na maioria dos casos, é um termo técnico
(cf. (31), (32) e (35)) que, à partida, o leitor não conhecerá. Assim, em (31), a formulação
introduzida por “isto é” (“que prolifera em ambientes muito salinos”) esclarece o termo
científico “micróbio halófilo”; em (32), “ou seja” introduz “com deficiência de elementos
químicos, exceto hidrogenio e hélio”, que consiste na explicação da expressão “baixa
metalicidade”; em (35), novamente o marcador discursivo de reformulação “isto é”

98
introduz uma formulação com termos correntes que explica ao leitor o termo “AXN”,
enunciado no segmento anterior.

No entanto, como se pode observar em (34), também é possível que a nova formulação
torne mais claro um processo (neste caso, “obriga o cérebro a contemplar em
simultâneo ambos os significados da segunda frase”), que, numa forma mais
simplificada é o mesmo que “tem de se encontrar num estado de sobreposição
quântica” ou, inclusive, o recurso a um termo da linguagem comum num contexto
inesperado (que é, por isso, assinalado por meio de aspas), como ocorre em (33), com
“inteligente” a qualificar um vírus, que é esclarecido através formulação “tem recursos
para se adaptar a múltiplas condições ambientais”.

Repare-se que no exemplo (31), a reformulação surge no seguimento de uma definição,


introduzida por parênteses, que trataremos em seguida. Isto é, “micróbio halófilo”, a
expressão clarificada pela formulação introduzida pelo marcador de reformulação “isto
é”, está a definir o termo científico “H. mediterranei”. Os mecanismos, porém, não se
sobrepõem, apenas ocorrem em cadeia.

Quanto ao marcador “por outras palavras” – veja-se (33) e (35) –, introduz uma
explicação no seguimento de uma explicação, igualmente por meio de reformulação,
antecedente, que sintetiza de uma forma inteligível para o leitor, o que foi dito
anteriormente. Com efeito, em (33), “quanto maior o tamanho, maior a
vulnerabilidade”, segmento introduzido por “por outras palavras”, esclarece o
significado do vírus ter “recursos para se adaptar a múltiplas condições ambientais”
(segmento introduzido pelo marcador de reformulação com função explicativa “isto é”),
ou seja, ser “inteligente”; já em (35), “por outras palavras” clarifica e resume o
significado do que foi enunciado anteriormente “as quais são, por sua vez, transcritas
para AXN, isto é para as suas descendentes”, introduzindo o segmento “podem evoluir”.

4.5.2. Definição

Relativamente ao mecanismo da definição, atentemos nos casos que se seguem:

(36) “Graças à avalancha de informação, Mojica pôde investigar se as repetições que


encontrara na H. mediterranei (um microbio halófilo, isto é, que prolifera em

99
ambientes muito salinos) também surgiam noutras espécies. Para grande surpresa
do especialista, não tardou a confirmá-lo.” (T4)

(37) “A canadiana Suzanne Simard descobriu que a comunidade arbórea, nas


plantações, não interage em liberdade. ""Observei que as árvores adoeciam e se
tornavam mais vulneráveis aos ataques de insetos quando se retirava algumas
espécies, separando-as das vizinhas. Queria perceber a razão e pensei que a
resposta podia estar debaixo de terra"", explica. Não só nas raízes das árvores,
como na rede de ajuda mútua que formam com as micorrizas, ou associações
entrelaçadas dos micélios dos fungos e das raízes das plantas.

Uma micorriza é a simbiose da raiz de uma planta com um fungo. Este coloniza a
raiz e recebe compostos que a planta produz através da fotossíntese. A relação é
de proveito mútuo, pois o fungo, através da sua extensa rede de micélios, capta
água e minerais que transfere para a planta. Os fungos entrelaçam-se como um
emaranhado de filamentos, ao longo de quilómetros, sob a superfície. " (T6)

(38) “Os seres humanos podem apreciar as cores do arco-íris com comprimentos de
onda que variam entre os 400 e os 750 nanómetros (milionésimos de milímetro).”
(T17)

(39) “As vencedoras foram a rede neural padrão (RND, um conjunto de regiões do
encéfalo relacionadas com a meditação, a fantasia e os momentos Eureka, que se
ativa quando não estamos concentrados numa tarefa), a rede de controlo
executivo (encarregada de tomar decisões, planificar, raciocinar e manter o
controlo emocional) e a rede de prominência, que funciona como um interruptor
entre as duas anteriores, determinando que perceções passam ou não para o lado
consciente.” (T28)

(40) “Embora os corais, cujos pólipos (cada um dos organismos multicelulares que
compõem uma colónia) são mais pequenos do que um grão de arroz, filtrem a água
e se alimentem do plâncton que as correntes arrastam, dependem em grande
medida da atividade fotossintética de pequenas algas que alojam no seu interior:
as zooxantelas.” (T37)

Esta estratégia, como se pode observar, consiste na apresentação de uma descrição das
propriedades que caracterizam um determinado objeto, ser ou noção, cuja designação

100
foi previamente introduzida. Linguisticamente, pode concretizar-se por meio de
estruturas muito diversas, mas a mais frequente, conforme se pode constatar nos casos
transcritos, consiste no recurso a parênteses para introduzir, imediatamente após o
termo técnico, as suas características ou funções. Atentemos em (36), (38) e (40) – o
primeiro caso já foi analisado brevemente quando tratamos da estratégia explicativa
anterior, mas agora centraremos a nossa atenção apenas na descrição presente nesse
excerto. Nos três exemplos, temos um termo técnico (“H. mediterranei”, “nanómetros”
e “pólipos”) que, tipicamente, o homem comum não conhece e, por isso, não
compreende, explicado entre parênteses imediatamente a seguir (“um micróbio
halófilo”, “milionésimos de milímetro” e “cada um dos organismos multicelulares que
compõem uma colónia”).

Já em (39), embora a explicação com a descrição das características do termo técnico


surja igualmente inserida por parênteses, ocorre apenas depois de um esclarecimento
em relação à sigla adequada à expressão técnica e, deste modo, cumpre a função de
tipo apositivo.

Concentremos agora a nossa atenção para (37). Trata-se de um exemplo interessante


pois a definição cumpre-se por meio de uma estrutura diferente. Temos o termo técnico
(“micorrizas”) seguido da sua definição (“associações entrelaçadas dos micélios dos
fungos e das raízes das plantas”), aqui apresentada como alternativa ao vocabulário
técnico através do marcador “ou” antecedido por uma vírgula. Além disso, na
continuação a esta estratégia explicativa, surge um parágrafo que se inicia também com
uma definição explicativa acerca do mesmo termo (“Uma micorriza é a simbiose da raiz
de uma planta com um fungo.”).

4.5.3. Denominação

Em relação à denominação, podemos ver os exemplos seguintes:

(41) “Desde então, as denominadas "repetições palindrómicas curtas agrupadas e


regularmente interespaçadas" (CRISPR, na sigla inglesa) e as sequências de
espaçadores (a informação genética encontrada nos espaços entre as repetições)

101
começaram a funcionar como ferramentas para identificar estirpes de bactérias,
um processo conhecido por "caracterização genotípica".” (T4)

(42) “Tal como os seres humanos satisfazem caprichos ou proporcionam a si próprios


cuidados para se animar ou melhorar o seu bem-estar, os animais também o fazem.
Por exemplo, usam remédios naturais para tratar problemas de saúde, um
fenómeno designado por "zoofarmacognosia".” (T5)

(43) “Há pouco mais de 200 mil anos, enquanto os neandertais prosperavam na Europa
em muitos dos lugares anteriormente ocupados pelos Homo heidelbergensis, e os
primeiros Homo sapiens faziam o mesmo em África, outro grupo humano, do qual
ainda se sabe pouco, mas provavelmente relacionado com os heidelbergenses,
também deixava há já algum tempo a sua pegada na Ásia: os denisovanos.” (T10)

(44) “Quando a temperatura sobe, a simbiose desaparece. Não se sabe se os pólipos


expulsam as algas ou se são estas que optam por partir. Seja como for, quando a
relação simbiótica coral-alga cessa, os recifes tornam-se longas extensões
clareadas, fenómeno conhecido por "branqueamento".” (T37)

(45) “Embora os corais, cujos pólipos (cada um dos organismos multicelulares que
compõem uma colónia) são mais pequenos do que um grão de arroz, filtrem a água
e se alimentem do plâncton que as correntes arrastam, dependem em grande
medida da atividade fotossintética de pequenas algas que alojam no seu interior:
as zooxantelas.” (T37)

Nesta estratégia explicativa, depois de apresentadas determinadas características ou


funções, ou seja, depois de realizada uma descrição, identifica-se a designação que as
compreende. Formalmente, conforme é visível nos exemplos transcritos, a
denominação pode ser preenchida por meio de construções como ‘Y, fenómeno
conhecido por X’ e sua variantes – veja-se (41), (42) e (44), onde “identificar estirpes de
bactérias” através das CRISPR e das sequências de espaçadores, o uso de “remédios
naturais para tratar problemas de saúde” por parte de animais e o cessar da “relação
simbiótica coral-alga”, respetivamente, recebem, nos segmentos introduzidos por
“processo conhecido por”, “um fenómeno designado por” e “fenómeno conhecido por”,
a designação vinculada à descrição enunciada (“caracterização genotípica”,
“zoofarmacognosia” e “branqueamento”, respetivamente) – ou recorrendo à

102
pontuação, mais especificamente aos dois pontos, como acontece em (43) e (45), onde
a descrição do ser a ser explicado através da denominação (“outro grupo humano, do
qual ainda se sabe pouco, mas provavelmente relacionado com os heidelbergenses” e
“pequenas algas que alojam” o interior dos corais e com as quais os eles possuem uma
relação de dependência) surge apenas no final da frase antecedida pela já referida
pontuação.

4.5.4. Exemplificação

Quanto ao mecanismo da exemplificação, observe-se os seguintes segmentos:

(46) “Até agora, parece que os critérios apresentados por Langmuir na palestra
informal são muito coerentes e ajustam-se ao que constitui um comportamento
disfuncional da ciência. Contudo, será que servem para decidir o que é ciência
patológica? Na realidade, não. Primeiro, porque nem todos os casos de ciência
patológica cumprem todos os critérios. Assim, no caso evidente dos ovnis ou da
perceção extrassensorial, o número de defensores não caiu a pique, mas mantém-
se elevado apesar do tempo decorrido. Nesse caso, basta cumprirem alguns? A
resposta é igualmente negativa, pois teríamos de catalogar como patológicas
muitas investigações sólidas. O efeito borboleta é um exemplo de que a causa pode
não ser proporcional ao efeito.” (T9)

(47) “A confidencialidade das comunicações foi sempre uma obsessão para todos os
governos do mundo, ao ponto de poder fazer vencer ou perder uma guerra. O
exemplo mais conhecido é a história do matemático britânico Alan Turing (1912-
1954), o qual conseguiu que a máquina Enigma, usada pelos nazis para transmitir
mensagens encriptadas durante a Segunda Guerra Mundial, deixasse de ser
impenetrável, ao decifrar os códigos com outra sofisticada ferramenta. A proeza
permitiu aos Aliados antecipar-se aos movimentos alemães.” (T17)

(48) “O que distingue esta inovadora abordagem das posições mais convencionais?
Vejamos um exemplo. Estamos num restaurante e o empregado pergunta se
vamos beber água ou vinho. Segundo a psicologia clássica, a nossa opinião sobre o
assunto está sempre perfeitamente definida, mesmo se enfrentarmos o dilema de
não sabermos bem o que nos apetece beber. Tomar uma decisão depende apenas
da nossa preferência a esse respeito.” (T27)

103
(49) “Há também que contar com a experiência e a persistência, outras duas
qualidades do Homo creativus. A criação acarreta muito trabalho duro. Antes de
serem famosos, os Beatles tocavam oito a nove horas seguidas, seis dias por
semana. "Fomos melhorando e adquirindo confiança em nós próprios. Tocar
durante toda a noite deu-nos muita experiência", disse John Lennon numa
entrevista.” (T28)

(50) “A imagem dos dinossauros como monstros, criada pelos primeiros filmes sobre
eles, está cada vez mais afastada, ao ponto de já termos podido ver, também no
grande ecrã, comportamentos complexos ou mesmo sentimentos maternais: a
primeira sequela de Parque Jurássico, por exemplo, mostra uma ligação emocional
entre um tiranossauro e a sua cria, o que servirá de pretexo para o argumento
transformar o bicho no mau da fita.” (T30)

Como se pode verificar, a estratégia da exemplificação serve para tornar uma


formulação anterior mais abstrata, ou de âmbito generalizado, em algo concreto e,
consequentemente, mais próximo do leitor, de modo a que ele compreenda melhor o
conteúdo do texto. Embora, tipicamente, esta estratégia seja introduzida pela estrutura
metalinguística ‘por exemplo’ (visível em (50)), no levantamento de exemplos efetuado,
encontrámos estruturas diversificadas, tais como ‘X é um exemplo de Y’ (cf. (46), em que
temos “O efeito borboleta é um exemplo de que a causa pode não ser proporcional ao
efeito”), onde X representa um caso concreto e Y a formulação geral de um determinado
fenómeno, “O exemplo mais conhecido é X” (cf. (47)), “Vejamos um exemplo.” (cf. (48).

Note-se ainda que esta estratégia pode não ser marcada linguisticamente de forma
explícita, como acontece em (49). Neste caso, o leitor infere que o caso dos Beatles é
um exemplo concreto de “experiência e persistência”. Ou seja, a exemplificação pode
também estar implícita no contexto textual.

4.5.5. Comparação

Com respeito à comparação, atentemos nos casos que se seguem:

(51) “Em fevereiro de 1985, a revista Physical Review Letters publicou um artigo em
que o investigador canadiano John J. Simpson anunciava ter encontrado provas da
possível existência de um neutrino pesado, com uma massa de 17 quiloeletrões-

104
Volt. Esta afirmação, aceite por uma publicação de prestígio, fez os cientistas abrir
a boca de espanto. Podemos definir o neutrino como o fantasma do modelo-
padrão da física de partículas. Meio a brincar, meio a sério, alguns dizem que é
como uma faca muito afiada sem cabo nem gume.” (T9)

(52) “"Se os educadores incorporassem nos seus programas a dimensão do tempo, o


ensino seria outra coisa." A frase é de Paul Kelley, neurocientista da Universidade
de Oxford (Inglaterra) que se especializou, recentemente, em dois temas: o tempo
e o espaço. Esta espécie de Einstein da neuroeducação assegura que o principal
erro cometido pelos professores, por puro desconhecimento, é "ignorar que somos
seres vivos regulados por um relógio biológico que rege boa parte do nosso
comportamento", explica.” (T12)

(53) “Outra técnica utiliza uma substância que é apenas visível sob uma lâmpada de
raios ultravioleta (UV), o que contribui para evitar falsificações. Trata-se de uma
espécie de código de barras invisível que o comprador poderá ler através de uma
aplicação no seu telemóvel. "Essa tinta fluorescente foi elaborada com algoritmos
de encriptação de cor. Depois de impressa, é quase impossível reverter a
engenharia do seu esquema cromático, isto é, averiguar como foi elaborada", diz
Chenfeng Ke, do Departamento de Química do Dartmouth College (Estados Unidos)
e um dos autores do trabalho.” (T17)

(54) “É preciso somar a tudo isto os cometas. Se um do tamanho do Halley, de 15 km


de diâmetro, nos atingisse acerca de 50 km/s, libertaria em apenas um segundo
uma quantidade de energia semelhante à da deflagração em simultâneo de todos
os arsenais nucleares do mundo. É mais ou menos como se ocorressem, ao mesmo
tempo, meio milhão de terramotos de intensidade 9 (a maior jamais registada).
Parte da atmosfera iria dissipar-se na forma de calor, e a temperatura do ar
alcançaria os 190 graus Celsius. Os mares fechados, como o Mediterrâneo,
poderiam ferver, e um manto de milhares de toneladas de pó cobriria durante anos
o que restasse da superfície” (T25)

Como se pode ver nos exemplos transcritos, existe uma aproximação entre um
determinado objeto (“o neutrino” (cf. 51), “uma substância que é apenas visível sob uma
lâmpada de raios ultravioleta (UV)” (cf. (53)), ser (“Paul Kelly, neurocientista da
Universidade de Oxford (Inglaterra) que se especializou, recentemente, em dois temas:

105
o tema e o espaço” em (52)) ou fenómeno (o caso hipotético de um cometa de 15 km
de diâmetro atingir a terra numa velocidade média de 50 km/s, em (54)) que, em
princípio, será distante da realidade do leitor, e objetos, seres e fenómenos que, de
algum modo, façam parte da memória do leitor e, por isso, facilitem a compreensão do
assunto tratado. Linguisticamente, observámos a existência de duas estruturas
principais: (i) ‘espécie de Y’, onde Y é o elemento mais próximo ao leitor leigo (“Esta
espécie de Einstein da neuroeducação” (52) e “Trata-se de uma espécie de código de
barras” (53), para facilitar a compreensão de quem é Paul Kelly e da “substância que é
apenas visível sob uma lâmpada de raios ultravioleta (UV)”, respetivamente); (ii) ‘como
se’ + Conjuntivo (cf. (54)), onde temos “É mais ou menos como se ocorressem, ao
mesmo tempo, meio milhão de terramotos de intensidade 9 (a maior jamais
registada).”).

Repare-se que este exemplo com “como se” possui um aspeto particular, dado que essa
estrutura é introduzida pela expressão “É mais ou menos”, de natureza informal, que
salvaguarda o locutor, pois denota que a relação de comparação estabelecida no
enunciado subsequente não é exata.

Temos ainda, no primeiro exemplo (51), uma comparação entre o “neutrino” e a noção
de fantasma, que é materializada linguisticamente com recurso à construção ‘Podemos
definir X como Y’, onde X é o termo específico, técnico e Y é a ideia mais próxima do
leitor, em relação à qual é estabelecida uma comparação.

4.5.6. Metáfora

No que concerne à metáfora como mecanismo de explicação encontramos apenas dois


exemplos:

(55) “FAMÍLIAS ARBÓREAS

Ao ouvir estes especialistas, dir-se-ia que há semelhanças entre a vida vegetal e a


vida afetiva das pessoas. Parece uma metáfora exagerada, mas até certo ponto é
verdadeira: "Pode haver amizade entre as árvores. Não acontece com frequência,
pois não podem escolher ao lado de quem crescem. Talvez aconteça com um em
cada cinquenta exemplares. Olhe para estas duas: as suas raízes estão firmemente

106
entrelaçadas, e os ramos não se sobrepõem para não ficarem sem luz", explica
Wohlleben no documentário Intelligent Trees, enquanto a câmara mostra dois
belos cedros. "Se uma morre, a que fica para trás sofre, adoece e morre pouco
tempo depois."" (T6)

(56) “Continuemos no encéfalo. Segundo alguns estudos, outra característica distintiva


da inspiração seria a existência de menos ligações do que é habitual entre os dois
hemisférios, o que permitiria que as ideias cozinhem mais tempo no seu local de
origem (o direito, associado à intuição e à imaginação, ou o esquerdo, ligado à
linguagem, à lógica e à matemática) antes de se fundir numa obra. Segundo uma
investigação publicada na revista Scientific American, os artistas têm geralmente
um corpo caloso (o feixe de fibras nervosas que liga os dois hemisférios) mais
estreito do que a restante população.” (T28)

No primeiro caso, a metáfora surge no intertítulo “Famílias arbóreas” e estabelece uma


associação entre as árvores e a família, um vínculo que corresponde, como o próprio
autor menciona, à “vida afetiva das pessoas”. Tipicamente, a família é, de facto,
associada aos seres humanos e, num sentido mais lato, talvez também utilizemos a
designação “família” para relações entre animais, por exemplo. No entanto, uma relação
entre família e seres vegetais causa estranheza, na medida em que se inserem em
campos semânticos distintos, como é característico desta estratégia discursiva. Esta
associação de conceitos improvável serve para chamar a atenção do leitor para o facto
de as árvores também estabelecerem, tal como nós, relações intersociais, digamos,
entre si. Formalmente, esta estratégia não é marcada por nenhuma estrutura particular.
Contudo, caso houvesse alguma dúvida se estávamos perante uma metáfora ou não,
temos uma pista metalinguística facultada pelo próprio autor: depois de realizar a
metáfora, o autor refere, falando sobre o procedimento, “Parece uma metáfora
exagerada, mas até certo ponto é verdadeira”.

Quanto ao segundo exemplo (56), embora seja a mesma estratégia explicativa, o modo
como é realizada é distinto. Neste caso, num campo semântico associado ao cérebro e
aos dois hemisférios que o constituem, surge o verbo ‘cozinhar’ (“as ideias cozinhem
mais tempo no seu local de origem”), que tipicamente não ocorre neste contexto
porque pertence a um outro campo. Normalmente, ‘cozinhar’ implica um ser com traço

107
[+ humano] e nomes que designem comida, mas não ideias, por exemplo. O autor utiliza
este recurso para dar a entender, ao leitor, o processo de amadurecimento das ideias.

4.5.7. Citação

Finalmente, dada a importância da voz de autoridade para o género da reportagem de


divulgação, nomeadamente para legitimar as teses e ideias apresentadas (conforme
vimos no capítulo 2, da Parte 1 deste trabalho), consideramos relevante analisar dois
exemplos da citação enquanto estratégia explicativa, embora a ideia de esta ser uma
estratégia explicativa seja, como vimos, apenas defendida por Blancafort & Valls (2007),
entre os quatro trabalhos que descrevemos. De facto, parece-nos que se trata de uma
estratégia frequentemente utilizada com duplo acesso: legitimação através da voz de
autoridade e explicação.

Assim, atentemos nos exemplos seguintes:

(57) “Ao ouvir estes especialistas, dir-se-ia que há semelhanças entre a vida vegetal e
a vida afetiva das pessoas. Parece uma metáfora exagerada, mas até certo ponto é
verdadeira: "Pode haver amizade entre as árvores. Não acontece com frequência,
pois não podem escolher ao lado de quem crescem. Talvez aconteça com um em
cada cinquenta exemplares. Olhe para estas duas: as suas raízes estão
firmemente entrelaçadas, e os ramos não se sobrepõem para não ficarem sem
luz", explica Wohlleben no documentário Intelligent Trees, enquanto a câmara
mostra dois belos cedros. "Se uma morre, a que fica para trás sofre, adoece e morre
pouco tempo depois."” (T6)

(58) “Por tudo isto, Curtis Suttle, biólogo da Universidade da Colúmbia Britânica
(Canadá), começou a falar, em 2005, de um novo conceito que já começa a adquirir
estatuto entre os biólogos: a virosfera. "A virosfera é o conjunto de lugares da
Terra onde há vírus e que sofrem a sua influência", explica. "Pode também fazer
referência a todos os vírus diferentes que existem. Creio que é um conceito
importante, pois enfatiza o papel dos vírus no ecossistema global."” (T14)

No primeiro caso, a citação é introduzida para explicar o motivo de o autor ter


construído a metáfora, já analisada, das famílias arbóreas. Esta relação é notória por
meio de duas pistas linguísticas fundamentais: o uso de dois pontos que antecede a

108
citação direta e, no encerrar da explicação, a utilização explícita do verbo ‘explicar’
(“explica Wohlleben”).

Já no segundo caso, a citação em causa consiste, ela própria, na definição de um termo


técnico que foi introduzido no segmento anterior (“virosfera”). Isso é visível na própria
construção com o verbo ‘ser’ utilizada pelo especialista: “A virosfera é o conjunto de
lugares da Terra onda há vírus e que sofrem a sua influência”. Além disso, novamente
temos a pista linguística da utilização do verbo ‘explicar’ para classificar a enunciação da
voz de autoridade.

4.6. Discussão dos Resultados

Nesta secção, discutimos os principais resultados obtido a partir das análises realizadas,
à luz dos objetivos apontados inicialmente para o presente estudo.

Começamos esta secção, focando nos resultados da hiperestrutura das reportagens, que
denotam a existência de alguns elementos estáveis, isto é, que são recorrentes, tais
como a página de abertura, o título, o antetítulo, o lead, a paginação, a identificação do
autor, o recurso a intertítulos, a utilização de imagens. De facto, percebemos que existe
uma certa uniformização no que diz respeito à organização, pois, para além dos
elementos supramencionados, também se notou que todas as reportagens seguem o
seguinte esquema organizacional: existe uma introdução ao assunto, que é concretizada
pelo título, pelo antetítulo, pelo lead, e pelo início do corpo da reportagem; segue-se o
desenvolvimento do tópico, através de blocos temáticos, introduzidos e segmentados
por intertítulos, que fornecem pistas ao leitor sobre o que será tratado em cada bloco;
e, finalmente, um bloco constituído por um ou dois parágrafos que encerram a
reportagem.

No entanto, também verificámos que, apesar de todas as reportagens terem imagens,


por exemplo, nem todas possuem caixas de texto ou infográficos. Ou seja, embora haja
realmente uma uniformização relativamente a alguns elementos, também é notória
alguma singularidade em cada texto empírico.

Os elementos hiperestruturais têm uma função extremamente relevante neste género,


pois, cumprindo funções específicas e possuindo significados próprios, contribuem para

109
a interpretação geral do texto, que, neste corpus, funciona como um processo
compósito. Note-se que é possível que o leitor opte por ler apenas o corpo do texto, ou
apenas o infográfico, mas o significado global da reportagem reside não só no texto
principal da reportagem, mas também na ligação do significado e interpretação de todos
os elementos.

Com respeito à análise dos títulos, verificamos que eles não funcionam, nas revistas
analisadas, como um elemento autónomo, mas sim em conjunto com o antetítulo e com
o lead, sendo possível designá-los de títulos em continuidade. Este bloco resulta numa
macroestrutura que aponta, muitas vezes através de pistas lexicais, para o tópico do
assunto (inclusive, às vezes, problematizando-o).

Contudo, os títulos em continuidade podem ser uma característica da própria


publicação (revista Superinteressante) e não uma característica geral do género, pois,
por exemplo, na análise realizada por Santos & Ramos (2021) o lead não é tido em
consideração em nenhuma função, nem existe uma subfunção para ele, o que indica
que, nos textos que os autores analisaram, este elemento seria menos relevante ou não
existia.

Um outro aspeto que constatamos reside no facto de o título materializar a relação que
caracteriza a divulgação científica, entre o mundo científico e o jornalismo, pois
evidencia a função de cativar o público, própria do jornalismo, dando a entender que a
matéria da reportagem é interessante. De facto, o jornalista tem de se preocupar não
só com a qualidade da informação, mas também com a forma como vai transmitir essa
informação a um público não especializado e, por isso, deve procurar entretê-lo,
provocá-lo, interessá-lo e cativá-lo.

Os estudos brasileiros referem que o público-alvo da Superinteressante é um público


jovem e, na análise realizada, conseguimos perceber pistas disso em alguns elementos
textuais particulares, como no léxico de alguns títulos (“Que fiasco!” de T9, por exemplo)
e em expressões utilizadas no corpo da reportagem como “só surpresas…”, que conclui
a reportagem T18.

110
Finalmente, a análise qualitativa exploratória, que realizámos relativamente às
estratégias explicativas que ocorrem nas reportagens de divulgação científica, permitiu-
nos verificar que existem estratégias diferenciadas, parecendo haver uma maior
incidência de exemplificações, reformulações e definições, aspeto que terá de ser
validado numa análise quantitativa exaustiva no futuro.

Depreendemos ainda que a explicação é um aspeto fundamental na reportagem de


divulgação científica, uma vez que está ao serviço do seu caráter didatizante, descrito
por Leibruder (2000) como característica fundamental da divulgação científica. Além
disso, a explicação, neste género, surge particularmente associada à relação assimétrica
de conhecimento entre o locutor (autor do texto) e o interlocutor (que vai receber o
texto), o público leigo. Nesse sentido, uma hipótese a ser comprovada num trabalho
futuro, seria comparar a vertente explicativa do género reportagem de divulgação
científica com a vertente explicativa presente noutras reportagens.

Em suma, o que verificámos é que as reportagens analisadas partilham de propriedades


ou parâmetros que são descritos tipicamente nos estudos que tratam a descrição e
caracterização do género reportagem de divulgação científica, mas, no entanto,
apresentam também características próprias que decorrem das condições de produção
(mais concretamente da política da revista em si e do público-alvo). Isto mostra que
genericidade e singularidade são traços que caracterizam este género e, neste contexto,
especificamente a reportagem de divulgação científica. Com efeito, embora estas
reportagens possam partilhar do mesmo objetivo, a divulgação da informação científica,
a forma como o fazem, os elementos aos quais recorrem, as estratégias linguísticas
adotadas são marcados pelas condições de produção, ou seja, pelos participantes, pela
situação comunicativa e, inclusive, pelo próprio suporte textual, pois, no suporte
impresso, todos os elementos hiperestruturais estão disponíveis, embora o leitor possa
optar por os ler ou não, enquanto no suporte digital o acesso é feito por hiperligação.

111
Considerações Finais
Na conclusão deste estudo, visando elaborar o ponto da situação relativamente ao
trabalho realizado, retomamos o percurso subjacente. No primeiro capítulo da
fundamentação teórica, dedicado ao género reportagem, descrevemos a noção de
género, o conceito de reportagem, e as suas características gerais, inclusive a sua
hiperestrutura e estruturas interna e externa. No segundo capítulo, que tem como
assunto a reportagem de divulgação científica, introduzimos o conceito de divulgação
científica e explicitamos a noção de reportagem de divulgação e as suas propriedades,
tais como o caráter metalinguístico, a impessoalidade e o recurso à voz de autoridade.
O terceiro capítulo centrou-se na explicação, onde, após uma breve descrição da
explicação enquanto modo discursivo, foram tratados vários mecanismos explicativos,
de acordo com Landry (1992), Leibruder (2000), Blancfort & Van Dijk (2004) e Blancfort
& Valls (2007). Na segunda parte, procedemos ao estudo empírico, analisando 37
reportagens impressas, de diversas áreas científicas, publicadas na revista
Superinteressante entre 2018 e 2020.

De uma foma geral, verificámos que, relativamente à hiperestrutura, existem elementos


que ocorrem em todas as reportagens, tais como a página dupla de abertura, o título, o
lead, a paginação, a identificação do autor, os intertítulos e as imagens. Em relação aos
títulos, merece particular destaque o facto de todas as reportagens terem títulos de
continuidade, isto é, o título, o antetítulo e o lead funcionam como uma macroestrutura.

Relativamente às funções e subfunções retóricas, constatámos que existe uma


relevância específica na inserção da voz de autoridade (citações), bem como na inserção
da imagem na problematização do assunto da reportagem, dado que são as únicas que
ocorrem em todas as reportagens, sendo, por isso, à partida, independentes do tópico
e da área científica tratada.

Quanto à explicação, comprovámos a existência de várias estratégias, existindo,


contudo, nesta análise preliminar descritiva, três que parecem ocorrer de forma mais
marcada: exemplificação, reformulação e definição.

112
Os resultados deste estudo mostram, portanto, que as reportagens analisadas estão
incluídas no género reportagem de divulgação científica e, nesse sentido, partilham
características que são comuns ao que é descrito na literatura sobre a conceção do
género reportagens de divulgação científica, mas também traços próprios da revista
Superinteressante (visíveis, por exemplo, na preocupação em transmitir a ideia de que
o assunto que se vai abordar, embora seja científico, é interessante, desperta
curiosidade e é de fácil acesso ao leitor, que é materializada, sobretudo, nos títulos).

Ao longo deste estudo procurámos responder às questões de investigação enunciadas


na introdução. Essa tentativa de resposta resultou, na fase final do estudo, na
formulação de novas questões decorrentes de problemas e descobertas que o processo
de investigação proporcionou. Assim, temos algumas pistas para trabalhos futuros que
decorrem da perceção de algumas das limitações deste trabalho. Uma vez que apenas
analisámos uma só publicação, pretendemos realizar um estudo comparativo que trate
reportagens de divulgação científica da revista Superinteressante e reportagens de
divulgação científica de outras publicações, de modo a ficarmos com um uma perspetiva
mais ampla do panorama deste género em Portugal. Dado que analisámos unicamente
um género de divulgação científica, consideramos, no futuro, efetuar um estudo
comparativo entre um genéro de divulgação científica, a reportagem de divulgação
científica, e um género do discurso científico, tal como o artigo científico. No que
concerne à explicação, tendo em conta que se tratou de um estudo preliminar de
natureza descritiva, consideramos ser necessário dar continuidade a essa análise através
de uma análise mais exaustiva aos mecanismos explicativos utilizados na reportagem de
divulgação científica, com análise quantitativa e qualitativa.

113
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121
Anexo

Nº Nome da reportagem Autor Ano Mês Nº Área científica Páginas

1 A vida secreta do subsolo L.M.A. 2020 agosto 268 Biologia 34 a 39


2 Nas mãos do povo M.A.S 2020 julho 267 Ciência 16 a 23
A ameaça das
3 cianobactérias A.F.M. 2020 junho 266 Ambiente 24 a 31
4 Corta-e-cola nos genes J.B., I. J. 2020 junho 266 Biotecnologia 34 a 41
5 Animais como nós S.P. 2020 maio 265 Etologia 58 a 63
6 A floresta como família L.G.R. 2020 abril 264 Ambiente 46 a 51
7 Toxicologia do Nuclear M.A.S. 2020 abril 264 Energia 52 a 57
8 Arte imersiva A.S 2020 março 263 Tecnologia 36 a 43
9 Que fiasco! M.A.S 2020 março 263 Ciência 56 a 61
O outro berço da
10 humanidade M.C. 2020 março 263 Paleoantropologia 78 a 85
O que não dizem os
11 testes de ADN E.P. 2020 fevereiro 262 Genética 54 a 59
12 Revolução na Escola E.S. 2020 janeiro 261 Neurociência 44 a 51
13 Mistério explosivo M.A.S. 2019 novembro 259 Astrofísica 10 a 15
14 O planeta dos Vírus G.L. 2019 fevereiro 250 Medicina 18 a 25
15 Estamos vigiados L.G.R. 2019 janeiro 249 Tecnologia 22 a 27
16 O que nos move? A. H. 2019 janeiro 249 Psicologia 70 a 75
17 Materiais Invisíveis L.C. 2018 agosto 244 Tecnologia 22 a 27
18 Os maiores desafios M.A.S. 2018 junho 242 Física 22 a 27
19 Potência Quântica L.M.A. 2018 abril 240 Física 52 a 59
20 Reféns do Sol L.G.R 2018 janeiro 237 Astronomia 20 a 27
Idade de ouro
21 astronáutica G.L.S 2020 agosto 268 Espaço 10 a 17
22 Próxima paragem: a lua G.L.S 2020 agosto 268 Espaço 18 a 23
24 a
23 A caminho de Marte G.L.S 2020 agosto 268 Espaço 29
Bem-Vindos à era
24 sintética E.S. 2020 julho 267 Tecnologia 30 a 37
25 Destruidores de Mundos M.A.S. 2020 junho 266 Espaço 10 a 17
26 A ciência do coronavírus E.S., U.J., A.R. 2020 maio 265 Saúde 10 a 17
27 O cérebro quântico J. B. 2020 abril 264 Neurociência 10 a 17
28 Liberte a sua criatividade! L.G.R. 2020 março 263 Neuropsicologia 28 a 35
29 Adeus, dores! F.C. 2020 fevereiro 262 Medicina 40 a 45
30 Na mente do dinossauro L.M.A. 2020 janeiro 261 Paleontologia 26 a 35

122
Guerra total ao dióxido
31 de carbono A.F.M. 2019 novembro 259 Ambiente 16 a 25
32 Fraude alternativa L.A.G., A. R. 2019 fevereiro 250 Saúde 64 a 71
33 O Outro Eu L.M. 2019 janeiro 249 Psicologia 62 a 69
A Longa Viagem do Homo
34 Sapiens M.G.B. 2018 agosto 244 Antropologia 66 a 75
35 A hora da vida sintética L.M.A. 2018 maio 241 Biologia 36 a 41
36 Os novos Drones F.J., I. J. 2018 abril 240 Tecnologia 60 a 68
37 A peste branca J. B. 2018 março 239 Natureza 16 a 23

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