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Copyright © 2021 Cora Menestrelli

O Que Você Não Vê


Coraverso
1° edição
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte dessa obra poderá ser
reproduzida ou transmitida por qualquer forma, meios eletrônicos ou
mecânicos sem consentimento ou autorização por escrito do autor.
Os personagens e eventos retratados neste livro são fictícios. Qualquer
semelhança com pessoas reais, vivas ou falecidas, é coincidência e não
intencional por parte do autor.
Capa: Laís Aranda
Revisão: Sabrina Mendes
Diagramação: C. Oliveira

Créditos de Imagem a Canva Plataforma Digital


Para Triz.
Que me fez voltar a ver o bom em mim.
Sem você, novas histórias nunca teriam acontecido.
Algumas histórias de amor não são romances épicos.
São contos. Mas isso não as deixa menos repletas de amor.
(Sex and the City)
Sumário
SOBRE O CORAVERSO
PARTE UM — O QUE VOCÊ VÊ...
PARTE DOIS — O QUE VOCÊ NÃO VÊ
PARTE TRÊS — O QUE NINGUÉM VÊ
AGRADECIMENTOS
O Coraverso nasceu quando me dei conta de que todos os meus
roteiros seguiam um certo padrão: todos envolviam esportes de uma
maneira ou outra. Um mistério? Com algum esporte. Um romance? Mais
um esporte. Então, por que não fazer disso um único universo?
O Coraverso não possui uma ordem definitiva para ser lida, mas
definitivamente possui uma ordem cronológica dentro de si. Seus
personagens, eventualmente, podem acabar se encontrando casualmente em
algum momento de suas vidas.
Sinto muito, caro leitor, tal ordem cronológica nunca será revelada
diretamente por mim. Teremos que descobrir acompanhando cada obra de
seu universo. Espero tê-lo nessa jornada que, posso assegurar, não acabará
tão cedo.
“Bruno Campos e Ivan Nikolaev se enfrentam antes de treino; Suas
equipes afirmam que o clima de competição aumentou desde a última
temporada”
“Campos afirma ‘Não tenho absolutamente nada a dizer sobre
Nikolaev, não me dou ao trabalho’ e diz que está confiante para a próxima
corrida”
“Ivan Nikolaev perde a paciência durante coletiva e exclama: ‘Outras
equipes e outros pilotos nunca me assustaram, não vejo por que me
assustaria com o maldio brasileiro’”
Bruno sabia que não seria um bom dia. Ele disse a si mesmo na
segunda-feira que não seria uma boa semana.
Era sábado, e seus pensamentos apenas se provaram certeiramente
corretos. E estava nervoso pelo domingo — há anos o domingo havia
deixado de ser o primeiro dia da semana para ele.
O caminho até a entrada dos autódromos sempre era sufocante, mas,
naquele sábado em especial, as coisas pioraram. Um grupo de quinze ou
vinte jornalistas esportivos se aproximou, jogando todo o seu espaço
pessoal para o lixo.
Maldito seja, Ivanoskolixo. O brasileiro abriu um sorriso quase
receptivo demais para a sua verdadeira vontade interna de pedir, não tão
educadamente, que todos se afastassem, porque tinha uma classificatória
para ganhar.
— Campos, Ivan o procurou para tirar satisfações depois da batida
entre seus carros?
Não havia sido uma batida. A culpa de Bruno diminuía
significativamente sempre que alguém chamava de contato potencialmente
perigoso. Porque se era apenas potencialmente, não era completamente.
Fazia sentido na sua cabeça.
Embora soubesse que provavelmente funcionava de forma diferente na
visão de Ivan. Apesar de estarem sempre competindo pelos mesmos
lugares, havia um cuidado para não alimentar os boatos de que eles queriam
matar um ao outro. Porque não queriam. No máximo, Bruno aceitaria dar
alguns chutes naquela bunda dura para ver se o russo tomava algum juízo
sempre que fazia uma curva quase o jogando para fora da pista. Na maioria
das vezes em que um acidente quase acontecia, a culpa era dele — mesmo
que Campos já estivesse acostumado o bastante para saber quando tinha que
mandar o orgulho para o inferno e desacelerar para evitar algo pior.
Na semana anterior, porém, o contato potencialmente perigoso havia
sido sua culpa.
— Não tive qualquer contato com ele após aquela corrida. — Isso era
mentira: teve que passar a noite inteira no hospital apenas por precaução, o
russo e sua equipe já estavam longe quando o liberaram.
Mas Ivan lhe havia mandado mensagens.
— E você pretende se vingar?
Respire, Bruno. Respire. O brasileiro tocou um ombro para se afastar.
E continuar o seu caminho.
— A colisão aconteceu por minha culpa e fui penalizado por ela, não
vejo por que haveria qualquer necessidade de uma vingança da minha parte.
— Ele parou em frente à entrada do autódromo, mas virou-se novamente na
direção dos jornalistas. — Agora, alguém tem alguma pergunta de verdade
para me fazer? Porque eu tenho uma classificatória e odiaria me atrasar.
Todos se calaram. Típico. Ele acenou levemente com a cabeça antes de
entrar no que significaria alguns segundos de paz. Apenas alguns, porque
logo se juntaria à sua equipe.
Em um dos corredores, ele viu o russo vindo na direção oposta,
acompanhado por seu parceiro de equipe. Ele já vestia parte do traje de
segurança e lhe lançou um olhar por um milésimo de segundo quando o viu
ali, mas logo o desviou para voltar a conversar. Em russo. Aquele saco de
batatas internacional poderia perfeitamente estar xingando-o e jamais
saberia.
Bruno manteve o olhar no mais alto — irritantemente seis centímetros
mais alto —, e estreitou os olhos ainda mais quando percebeu que Nikolaev
realmente parecia disposto a não lhe devolver o olhar.
Ele era… algo. Nunca haveria palavras que pudesse descrever o que
diabos Ivan lhe causava.
Babaca. Nenhum “olá, Bruno”? Ou “olá, maldito brasileiro”, se o que
ele queria mesmo era irritá-lo. “Olá, cara que perdeu completamente o
controle do próprio carro na semana passada e me fez perder a corrida
inteira.”
Nada. Ivan passou por ele como se nem mesmo existisse. E Campos
ainda tinha que se acostumar que aquilo deveria ser normal.
Afinal, eles se odiavam. Tinha a certeza absoluta de que se odiavam
até a morte, e deveria ser assim.
Ele estava impaciente, nervoso e avoado o suficiente para que o dia
passasse como uma flecha. Nada demais aconteceu nas classificatórias —
ele largaria em primeiro, com o russo logo em seguida —, assim como nada
demais aconteceu na reunião com sua equipe. Nada nunca acontecia nas
reuniões além de comentários sobre o quanto iam bem nas paradas para
trocas de pneus e manutenção, o que tornava aqueles momentos a
oportunidade perfeita para que Bruno cochilasse, em vez de prestar atenção
no que já lhe era óbvio. Pedro, seu parceiro de equipe espanhol, já havia
desistido de socar-lhe o ombro sempre que acontecia.
Porque, pelo resto dos dias de sábado, ele pertencia única e
exclusivamente ao seu pai. O que era extremamente mais exaustivo que
qualquer treino, classificatória ou corrida. Não que não precisasse lidar com
o Campos mais velho no dia a dia. Afinal, seu pai era o engenheiro-chefe de
sua equipe.
Para qualquer pessoa isso seria um privilégio. E seria para Bruno, se
seu pai sequer o quisesse na equipe ou competindo naquele meio.
Eles almoçaram em uma churrascaria — péssima escolha de seu pai, já
que o filho era vegetariano e teve que se contentar com um almoço reduzido
a folhas — e conversaram sobre estratégias para a equipe. Trabalho,
trabalho e mais trabalho. Bruno já tinha aceitado que aquelas supostas
tardes de lazer eram apenas mais uma extensão do que ele já fazia durante
todos os finais de semana.
— Você precisa parar de ter medo de acelerar quando o russo tenta te
ultrapassar. — Ricardo grunhiu, impaciente com o que quer que estivesse se
passando em sua cabeça, enquanto cortava um bife de forma mais ignorante
do que era necessário. Bruno mal podia esperar pelo momento em que o
prato se partiria ao meio por causa daquilo. — Ele te coloca em risco todos
os finais de semana, e tivemos um prejuízo fodido na corrida passada.
— A corrida passada foi minha culpa, eu já disse. — Bruno suspirou,
terminando de beber o resto do que havia sobrado do seu suco de laranja. —
A ultrapassagem seria minha e eu calculei mal, mas ainda tivemos sorte de
que não aconteceu nada com ele. O problema seria maior do nosso lado se
ferrássemos um piloto que é bem mais experiente que eu.
E do lado de Ivan também.
— Foda-se o russo! E é bom que assuma a culpa diante das câmeras,
faz com que pareça… eu não sei, humilde? Mas quero que tenha
consciência de que o errado não é você.
Por Deus, Bruno não queria parecer humilde. Ele nem mesmo sabia se
poderia ser chamado dessa forma por aquela situação.
— O que eu quero dizer, filho, é que não deve ter medo de ser julgado
pela mídia. Aquele maldito piloto vive fazendo merda em todos os cantos, e
todos o amam.
— Estou bem da forma como estou, não ligo.
— É claro que não, sou eu que faço a sua imagem.
Campos mordeu a língua para não deixar escapar que, na verdade,
quem fazia a sua imagem era a sua assessoria, não o seu engenheiro barra
pai em meio período. Mas estava prestes a completar vinte e sete anos — o
quão cruel era a data cair exatamente no domingo da corrida seguinte? —, e
brigar com o pai que só lhe dirigia a palavra para falar sobre trabalho não
estava em sua lista imensa de prioridades.
— Como está a sua namorada? — Ricardo insistiu em um assunto. —
Ouvi dizer que terminaram.
Há três anos. Ricardo achava mesmo que fazia a imagem do filho
quando nem mesmo sabia um dos maiores tópicos sobre ele, depois do
drama raivoso com o piloto russo?
— No Brasil. — Ele fingiu uma tosse, antes de se levantar. — Vou
pagar a conta e ir para a casa do Pedro, foi um dia cansativo.
— Achei que iríamos visitar os museus daqui. Você sempre quis visitar
Barcelona, é uma boa oportunidade, em vez de perder a tarde na cama.
Ele quase fazia soar como se se importasse.
— Eu realmente não deveria me cansar demais na véspera de uma
corrida, você sabe. Posso vir para Barcelona em outro momento.
— Posso vir para Barcelona em outro momento. — Seu pai repetiu, e
Bruno revirou os olhos ao perceber o discurso que viria a seguir. — Você
fala como um garotinho rico.
— Por favor, não vamos discutir sobre o que eu faço com o dinheiro
que passei a ganhar com o meu trabalho.
— Só acho que deveria se preocupar em guardar um pouco também.
— Ricardo insistiu no assunto, mesmo na pequena fila para o caixa. —
Você sabe, estão sempre tentando acabar com a sua carreira.
Porque um brasileiro como ele em uma posição como a sua parecia
incomodar. Seu pai costumava dizer que só estava ali porque sua pele
escura ainda era clara demais para se preocuparem com a impressão que ele
poderia causar.
Não que Bruno sequer fosse o primeiro naquela posição, mas era um
dos primeiros. Poderia ser considerado o segundo. Um caminho de merda
havia sido construído para ele até aquele momento, mas não era um paraíso
— ainda. Precisava lidar com falas ridículas direcionadas para terceiros que
poderiam facilmente ser aplicadas a ele, caso também o enxergassem como
o que realmente era. Precisava lidar com os pedidos de silêncio quando se
colocava em posicionamento contra ou a favor de algo que ele queria
defender até a sua morte.
Restavam-lhe os protestos discretos. Camisetas usadas no caminho
para autódromos, legendas em publicações de redes sociais, pequenas falas
em coletivas de imprensa. Porque ele não poderia se arriscar em seu maior
local de visibilidade semanal.
Era ridículo. Fazia com que quisesse desistir nos momentos em que se
tornava algo pior.
Como se não bastassem os momentos em que ele mesmo questionava a
si sobre o que era.
— Não, não quero falar sobre isso. Não agora, não hoje. — Ele o
interrompeu antes que o pai pudesse continuar. — E eu guardo meu
dinheiro. Não me lembro de qualquer situação onde me viu gastando com
coisas das quais eu não precisava. Você sabe bem como eu sou.
Era a verdade. Considerando que sua equipe era tida como a melhor do
momento — no mínimo a segunda, competindo fervorosamente com a de
Ivan —, e ainda se levasse em conta os trabalhos publicitários, tinha uma
remuneração admirável. Mas sabia que isso poderia acabar ou diminuir a
qualquer momento. Por isso, parte ia para sua mãe no Brasil, e parte para
uma poupança dividida com ela. Tinha certeza de que já tinham o suficiente
para alimentar até sua próxima geração, mas era a forma como ele podia se
manter tranquilo para qualquer ocasião inesperada.
— Foi só um comentário. — Ricardo se defendeu com um grunhido,
enquanto o filho falava com a atendente do restaurante em um espanhol que
ele sabia que poderia ser considerado vergonhoso, mas era o básico que
tinha aprendido com o passar dos anos. Talvez devesse dedicar seu tempo
apenas ao inglês que já era admirável.
E ao russo. Assim, poderia saber o que infernos Ivan dizia quando
passava por perto.
Tinha certeza que envolvia algo como “fedorento”, “uma dor na
bunda” ou “ridículo”.
Antes que seu pai pudesse dizer qualquer coisa, Bruno fez questão de
pegar o celular e chamar um carro para ele. Sim, para ele apenas. Porque
Bruno poderia perfeitamente voltar para onde ficaria hospedado sozinho,
andando. Seria até mesmo melhor. Afinal, era a casa de seu parceiro de
equipe.
Perdeu alguns minutos enviando algumas mensagens depois que o pai
se foi, antes de checar mais uma vez o endereço para sair do lugar. Foi
parado três ou quatro vezes, mas apenas por fãs. Nesses casos, Bruno
amava parar e conversar, poderia fazê-lo por horas.
Ele chegou à casa de Pedro mais tarde do que pretendia, mas um tanto
melhor.
Diferentemente de Campos, Perez parecia gostar de gastar, e sua casa
demostrava bem isso. Bruno não estaria exagerando se dissesse que a
mansão do amigo era maior do que todos os minúsculos apartamentos que
morou no Brasil. Pedro era ótimo, um amigo incrível, muito melhor do que
Bruno poderia esperar para alguém com quem estava competindo, de
qualquer forma.
Algo que Bruno amava quase tanto quanto a comida de Pedro: o
banheiro da casa de Pedro. Não era tão grande quanto o quarto, mas era
espaçoso. Bastante. Era quase uma crueldade ter que escolher entre uma
banheira com hidromassagem e um chuveiro que parecia valer mais que o
seu carro.
Isso porque a suíte do maldito tinha uma sauna. Ridículo. Campos
também queria uma.
— Boa noite, Bruno! — Pedro gritou em português da cozinha,
imitando o maldito meme que Campos se arrependeria de ter mostrado para
o colega pelo resto de sua vida. Poderiam ser cinco horas da manhã, e Perez
ainda o cumprimentaria com um “boa noite, Bruno!” mais animado do que
era realmente necessário.
— Vai se foder. — Campos se aproximou da bancada da cozinha. — O
que o meu chef favorito vai me dar para o jantar?
— Você realmente me vê como o seu cozinheiro pessoal, sí? — O mais
alto lhe estendeu uma colher para que experimentasse o que quer que
estivesse fazendo, algo que o brasileiro aceitou sem nem mesmo olhar. O
talento de Pedro na cozinha era indiscutível. — Se chama Fideuá. É bem
comum por aqui. Fiz um pouco sem o camarão pra você, é claro.
— Minha mãe te amaria… — Foi tudo o que Bruno conseguiu dizer,
enquanto se inclinava para tentar pegar mais. Perez acertou sua testa com o
pano que estava pendurado em seu ombro. — Argh, talvez nem tanto assim.
— Sim, ela me amaria. Já conversamos em chamada de vídeo, lembra-
se?
Sim, ele se lembrava. Não teria como esquecer as vezes em que serviu
como tradutor para que os dois pudessem conversar como se não fosse
claramente próximo de ambos.
— Você começou a preparar tudo bem cedo, teremos visitas?
— Ah, sim. Minha noiva e alguns amigos. — Pedro desviou o olhar
para suas queridas panelas, e Bruno aproveitou para tirar uma foto dele e
colocar em seu Twitter. Adoravam quando postavam fotos um do outro no
tempo fora das corridas. — Algum problema? Você pode dormir mais cedo.
Sei que gosta de descansar antes das corridas.
— Ah, não. Eu não perderia a chance de participar de um jantar tão
especial. — Ele se levantou, e suspirou longamente. — Vou tomar banho,
estou com a energia de Ricardo Campos sobre mim.
— Ele é seu chefe, pirralho.
— E meu pai, tenho passe livre pra falar mal! — Bruno se defendeu, já
no meio do corredor. Era incrível como em apenas cinco segundos havia se
transformado em uma conversa de gritos. — Qual é o meu quarto, porra?
Tem dezenas só nesse corredor.
— São só cinco, payaso, e o seu é o último da direita!
Bruno riu baixo, e começou a abrir os botões da camisa que usava
enquanto a mão livre mexia pelas redes sociais.
Mas ele parou na metade do quarto ao ver alguém deitado em sua
cama.
Não um alguém qualquer. Ivan.
— Ah, oi. Como você entrou aqui? — Bruno sabia que acabaria
falando com Ivan em um momento ou outro, mas não esperava, de forma
alguma, que ele fosse aparecer ali, na casa de Pedro.
— Invadi a casa do seu amigo, entrei pela janela. — Nikolaev não fez
questão de esconder a ironia em seu tom de voz enquanto escrevia algo de
forma entediada no celular. Era ainda mais perceptível em seu sotaque
russo. — Por Deus, Campos. Ele me chamou e me deixou entrar. Pelos
fundos, mas eu não sou tão estrelinha a ponto de exigir entrar pela porta da
frente.
— Você é um babaca.
— O Twitter está enlouquecendo com a foto que você postou agora. —
Ele ignorou a suposta ofensa, e ainda nem mesmo tinha dirigido o olhar
para Bruno. — Me diz, qual é o sentido que algumas pessoas enxergam em
dizer que você e Pedro têm um relacionamento secreto? Ele vai se casar,
puta merda.
— Devo enxergar isso como ciúmes ou é apenas um comentário? —
Bruno deixou o celular sobre a mesinha do quarto, e terminou de tirar a
camisa antes de se abaixar para mexer na mala que estava no chão.
— Dá um tempo, Campos. O Perez é um velho.
— Ele só é quatro anos mais velho que você.
— Está me chamando de velho? — Pela primeira vez, Ivan o olhou.
Bruno ainda estava pegando a roupa que usaria depois do banho, embora
seu olhar parecesse mais perdido do que realmente olhando a mala. — Dia
ruim?
— Semana ruim. — Campos admitiu. — Desculpa, eu gostaria de te
receber melhor. Você saiu do hotel pra me ver. Não é nada pessoal, é…
— O velho encheu o seu saco outra vez?
— É um bom jeito de resumir. É.
— Mande ele para o inferno.
Bruno riu, e passou as mãos pelos cabelos ao respirar fundo.
— Vou tomar um banho, você vai ficar mais?
— Posso ficar pela noite, mas vou embora cedo. Reunião de equipe
antes da corrida, sabe como é. — Nikolaev se levantou e se aproximou do
brasileiro, segurando o seu rosto com as duas mãos. — Você tá com uma
cara de merda.
— Você é um porre, sabia?
— Eu sei, e você me ama. — O russo piscou um olho na sua direção.
— Eu não poderia pensar em um castigo pior. — O outro empurrou
seu ombro, tentando falhamente esconder um sorriso.
Mas não antes de beijar o rosto dele.
Ele não fez questão de ser rápido no banho, e agradeceu por Ivan lhe
dar o espaço pessoal. Ele era ótimo nisso.
Na verdade, Ivan parecia ser ótimo em todos os aspectos possíveis.
Estavam naquilo há alguns meses, desde a temporada passada. Estava
bem longe de ter sido algo sequer planejado, apenas aconteceu.
Afinal, Bruno Campos e Ivan Nikolaev nunca se odiaram. Não de
verdade, mas a mídia parecia obcecada demais em ver algo inexistente para
enxergar que nunca tinham sequer se tocado em público. Alguns olhares e
palavras fora de contexto e pronto. O boato estava circulando como nunca.
Não se odiavam, mas também não conversavam. A distância entre as
equipes por serem as maiores rivais não colaborava para isso.
Mudou em uma das festas que eventualmente aconteciam, organizadas
pelos próprios pilotos. Pedro fez questão de arrastá-lo, porque, de acordo
com o espanhol, precisava parar de ser um chato antissocial e perder o
medo de interagir com concorrentes.
Não era medo. Bruno apenas ainda achava estranho se ver em meio a
tantas pessoas que cresceram de forma tão diferente da dele. O dinheiro que
a maioria ganhava ali não era nada novo. O caminho para eles havia sido
fácil, no mínimo um tanto puxado, mas nada como comparado ao de
Campos. Ter o pai entre uma das equipes não havia sido uma vantagem de
forma alguma, ao contrário do que todos achavam.
Naquela noite, ele e Ivan ficaram pela primeira vez — o que estava
claramente bem longe do conceito de Pedro de interação, mas ninguém
poderia reclamar se não contassem para ninguém. Afinal, não passou de
alguns amassos embriagados no banheiro, algo que Bruno achava que não
daria em lugar algum. Já foi uma surpresa completa descobrir que pelo
menos uma pessoa entre todos aqueles caras não era hétero.
Bruno via-se como bissexual há anos, mas era apenas mais uma das
coisas das quais ele não podia abrir a boca para falar. Sua mãe sabia, seus
amigos mais próximos sabiam, mas a Federação descobrir seria um
pesadelo.
Na semana seguinte, aconteceu outra vez. Ivan era uma pessoa de
poucas palavras, e eles mal conversavam entre si virtualmente, mesmo
tendo o número um do outro. Ainda assim, bastou uma troca de olhares para
que Bruno o encontrasse na primeira sala vazia de um autódromo que viu.
Bruno imaginou que daí viessem as conversas sobre se odiarem.
Aparentemente, o famoso olhar de ódio que todos falavam era o típico olhar
de Ivan que queria dizer “me encontre em cinco minutos, sem roupa”.
Quando os encontros rápidos em escritórios vazios deixou de ser o
suficiente, eles passaram a dar um jeito de acabarem se hospedando nos
mesmos hotéis e fingirem que era apenas uma coincidência cruel para dois
inimigos supostamente declarados. Isso aumentou a conversa da mídia
sobre eles, mas, sinceramente, não importava. Suas assessorias gostaram, e
eles definitivamente também.
Foram nessas situações — invasões da madrugada ao quarto um do
outro — que começaram a realmente conversar. A rivalidade era algo
natural entre todos os pilotos, mas, ao contrário do que todos pareciam
achar, era algo que existia apenas durante as corridas. Fora delas, eram
quase como uma grande família. Aos poucos, com a ajuda de Pedro e a
discreta participação de Ivan, que também era alguns anos mais experiente,
Bruno conseguiu se inserir também.
Fora no mínimo interessante ver Ivan Nikolaev ir do homem quieto,
profissional e sério para alguém com quem Campos gostava de conversar
sobre os assuntos mais idiotas possíveis.
Ele estava definitivamente apaixonado, e já sabia disso há algumas
semanas. Soube com certeza após o final da temporada do ano anterior,
quando finalmente ficou de férias, mas isso significou ficar longe de
Nikolaev por meses. Conversando por mensagens, é claro, porém ainda era
algo completamente diferente.
O russo era mais ocupado que ele, mesmo durante a pausa entre uma
temporada de corridas e outra. Ivan precisava lidar com os projetos dos
quais era representante, uma empresa da família, viagens para gravação de
entrevistas e até comerciais.
Bruno mudava de canal toda vez que seu fodido ficante aparecia em
uma propaganda de carros, tênis e até mesmo shampoo. Era um saco. Sua
mãe o olhava atravessado sempre que o fazia, mas ele ao menos poderia
usar a tal rivalidade falsa para algo.
— Ele parece ser um bom garoto… — Dona Maria disse, uma vez.
Bom saber que gosta do seu pretendente a genro, ele mordeu a língua.
Campos se limitou a dizer que Ivan tinha quase trinta e cinco anos, e não
poderia mais ser considerado um garoto, e que a cara fechada dele era um
saco por si só.
Não era bem uma mentira. Bruno vivia com a vontade de arrancar
aquela expressão de tédio eterno do rosto do russo. Talvez fosse por isso
que gostasse tanto de cada vez que ele apresentava um mínimo sorriso
quando estavam juntos.
Conviver com Ivan Nikolaev era um saco. Um saco por Bruno não
saber o que infernos ele sentia na presença do homem. Tinha quase vinte e
sete anos, e se sentia um maldito adolescente. Achou que aquela fase
tivesse passado quando se apaixonou pela primeira vez no ensino médio,
mas não. Era quase como se estivesse revivendo tudo aquilo.
Meses depois, com o início da nova temporada e também a volta de
seus encontros secretos, isso apenas piorou.
Piorou ou melhorou? Era um questionamento que ele fazia a si mesmo
todos os dias. Se seu coração seria completamente despedaçado por um cara
como aquele, talvez devesse se sentir honrado.
Bruno deixou a banheira antes que começasse a se sentir deprimido
demais — mais do que já estava. Não se preocupou em arrumar demais os
cabelos escuros e voltou para o quarto. Podia ouvir as vozes vindas da sala
de estar, e imaginou que as visitas de Pedro já estivessem por lá. Assim
como ele, a noiva de Perez também sabia do caso entre os dois pilotos, mas
não poderia arriscar deixar que mais pessoas descobrissem ou
desconfiassem.
Ivan pareceu perceber para onde estava indo com os pensamentos
rapidamente.
Fato número um sobre Ivan Nikolaev: era quase impossível esconder,
omitir e mentir para o russo. O maldito era excepcionalmente bom em ler,
ou o que quer que fosse, o olhar e a mente das pessoas. Com Bruno não era
diferente.
— Você pode ir jantar com Pedro, eu comi antes de vir.
— Não seja ridículo, eu posso muito bem trazer a comida pra cá.
— É falta de educação em Barcelona. Ou em toda a Espanha, algo
assim.
Fato número dois: ele era irritantemente inteligente quando se tratava
de culturas e costumes que não lhe pertenciam. Talvez por já ter viajado o
mundo inteiro para correr mais vezes do que Bruno poderia contar, mas não
importava. Era apenas mais uma entre várias características admiráveis do
russo.
— Para a nossa sorte, não sou da Espanha e muito menos ficarei aqui
por mais do que três dias. — O brasileiro jogou a toalha sobre uma cadeira,
e deitou-se ao lado de Ivan, que pulava de canal em canal na televisão. A
cara entediada fez Bruno revirar os olhos.
Nikolaev suspirou de forma frustrada, antes de desligar a televisão e
virar para olhar o homem ao seu lado. Por um momento, eles apenas se
olharam, antes que o mais velho o chamasse com a mão.
— Vem cá. — Sua voz soou calma, e Campos se aproximou para
deitar com a cabeça no seu ombro. Ivan parecia diferente, um tanto mais
solto e também aberto na sua presença. Via isso há algum tempo, mas
parecia cada vez mais evidente. Quer dizer, estavam abraçados na cama, e
não após o sexo. O russo costumava ser mais contido que isso às pequenas
demonstrações mais abertas de afeto. — Quer assistir algo?
— Se você quiser, mas eu posso acabar dormindo no meio do filme.
— Como se isso já não acontecesse normalmente.
— Você é um saco. — Bruno bocejou demoradamente, arrumando-se
sob o cobertor enquanto Ivan tornava a mexer no celular. Estava prestes a se
desculpar outra vez por não estar com a mínima energia que normalmente
tinha, mas mudou de ideia quando percebeu a expressão irritada do outro.
— Estão te procurando? A sua assessoria.
— Tanto faz, vou dizer que estou no hotel e quero paz. Acho que eles
têm medo de que eu suma para passar a noite em uma boate ou algo assim,
como se não fosse só algo inventado pela mídia.
O brasileiro deixou escapar um suspiro quase irritado. Porque ainda
não gostava da ideia do russo largar a rotina com a qual tinha se
acostumado apenas para vê-lo. Quando se hospedavam no mesmo hotel era
uma coisa, bastavam alguns passos de um corredor ou andar até o outro.
Mas ele tinha deixado o próprio hotel para estar ali.
— Ivan.
— Não, não vem com esse “Ivan” como se estivesse prestes a me dar
uma bronca. Sei o que eu estou fazendo.
— Você não pode…
— Calado.
—… sair como se não tivesse nada a fazer e…
Bruno teria continuado, se não fosse pela boca de Ivan o
interrompendo. Maldito. O russo o calou com um beijo calmo, mas intenso.
Durou tão pouco que ele ainda se inclinou na sua direção quando Ivan se
afastou, procurando por mais.
— Não posso, mas já estou aqui. E sair a essa altura não é uma opção
no momento. Você pode parar de ser um saco agora. — Ele passou os dedos
longos entre o cabelo loiro, respirando fundo antes de desligar o celular e
jogá-lo como se não fosse nada na mesinha ao lado da cama. — Além
disso, eu não te vejo desde o acidente e, puta merda, você quase me matou
com aquilo.
O brasileiro suspirou, assentindo levemente.
— Eu sei, consegui não fazer tanta merda quando desviei de você.
— Não, Bruno, eu não estou falando de mim. Não sei como consegui
continuar aquela corrida sabendo que você tinha ficado machucado com a
batida. Tive que gritar no ouvido da minha equipe pelo rádio até que me
dessem a certeza absoluta de que você estava bem. — Aquilo
definitivamente o pegou de surpresa. Quer dizer, é claro que sabia que ele
tinha ficado preocupado. Afinal, seu celular estava cheio de mensagens dele
no outro dia. Mas não pensou que tivesse sido daquela forma. — Acho até
que a maioria possa desconfiar que não nos odiamos tanto assim agora, mas
não importa. Eu só queria ver se você estava bem.
— Você me viu ontem e hoje no autódromo.
— De longe.
— Bom, até onde eu sei, estou bem vivo. Só uma dor chata no pé, mas
minha médica disse que não é nada demais.
— Bom saber.
— É.
Ivan ficou ali, olhando como se quisesse ter certeza de que não
começaria a sangrar a qualquer momento. Bruno estava sendo sincero, não
tinha se machucado demais e a noite no hospital foi apenas uma precaução.
Sua mãe também o fez voltar para o Brasil no dia seguinte ao acidente para
vê-lo de cima a baixo. Até o levou para o médico da família apenas para ter
certeza de que não estava prestes a perder o filho.
Foi… engraçado. Se ignorasse que foi um saco no primeiro momento.
— Para de me olhar assim. — Ele pediu, por fim.
— Assim como?
— Parece a minha mãe. Eu não vou morrer, foi só um susto.
Ivan revirou os olhos, e, em seguida, sorriu. Foi um sorriso curto e
discreto, assim como tudo o que ele fazia. Mas ainda era um sorriso.
— Aprendi uma nova. Hiraeth.
Fato número três, e um dos que Bruno mais gostava: Nikolaev tinha
uma estranha e interessante fixação com palavras que existiam em apenas
um idioma e eram quase intraduzíveis. Em momentos aleatórios,
casualmente, ele poderia soltar uma palavra completamente estranha para
definir o que ele via ou sentia. Não havia um motivo para isso, ou uma
explicação exata. Ele apenas gostava. O brasileiro descobriu isso em uma
noite que estavam juntos em seu quarto, no meio de uma ligação com sua
mãe, e Ivan pareceu subitamente interessado quando ele disse “cafuné”.
— O que essa significa?
— Em galês, é sentir falta de um lar, que não é realmente um lar, ou
um lugar. Me lembra de você.
Um lar. Ivan havia acabado de insinuar que Bruno era algo como um
lar, e que estava com saudades dele.
— Bom, e eu tenho outra para você. — Respondeu, quando o primeiro
choque passou. Ivan assentiu, incentivando-o a continuar. — Saudade. É em
português.
— Prossiga.
— Sentir falta de algo, ou alguém. Me lembra de você.
— Ainda vou precisar de um caderno para anotar tudo que é em
português. Isso é bonito. — Ele esticou o braço para alcançar o celular, e
Bruno sabia que ele estava acrescentando a palavra a suas notas. — Ainda
quero visitar, um dia. Espero que você seja meu guia.
— Sabe que seria estranho se nos vissem no mesmo lugar.
— A menos que eu aparecesse acidentalmente no mesmo lugar que
você, um belo e inesperado acontecimento. Vai ser uma desculpa para você
me chamar de… cabra da peste outra vez.
Bruno riu. E percebeu que apenas aqueles poucos minutos em que
estava com o russo fizeram toda a péssima semana valer a pena.
Ele se perguntou se existia alguma palavra para aquilo.
A semana seguinte passou voando. Talvez pelo Grande Prêmio da
semana ser no Japão, e visitar o Japão sempre parecera algo grande para
Bruno. Não apenas para ele, mas também para a mãe, que exigiu que ele
levasse uma lembrança sequer do lugar para ela. Fez questão de dizer ao pai
que não poderia passar a tarde com ele exclusivamente para dedicar um
tempo a isso — e, sinceramente, também a si mesmo, porque raras eram as
vezes em que se livrava dele.
Ivan passou a semana inteira praticamente indisponível. Depois de
ganhar a corrida da semana anterior — Bruno o xingou carinhosamente por
isso até que ele aparecesse novamente na casa de Pedro para compensar —,
sua agenda se tornou cheia novamente. Tudo apontava que ele ganharia
mais uma vez o mundial, e o brasileiro estava apenas alguns pontos atrás
dele.
Não era o suficiente para abalar o que quer que havia entre eles, mas
era para deixar Campos um tanto frustrado consigo mesmo. Parecia ridículo
ter feito a promessa interior de que ganharia a corrida do dia do seu
aniversário quando o russo parecia sempre um passo a frente — ou
quilômetro, o que quer que colocasse a situação em termos
automobilísticos.
Na sexta de treino, eles não se viram. Houve um momento em que
Ivan o puxou para uma sala vazia, mas não durou muito, porque quase
foram pegos.
— Não consegue esperar até mais tarde, idiota?
— Tenho uma festa essa noite. — Ivan suspirou, e Bruno quase sentiu
seus ombros caírem. — Bom, não é uma festa. É um encontro com uns
caras importantes que patrocinam a equipe. Desculpa.
Bruno lhe respondeu que ele não lhe devia desculpas.
No sábado de classificatórias, então, mal tiveram tempo de trocar um
olhar. Era quase desanimador. Pelo menos conseguiu a posição para largar
em primeiro lugar. Não era uma vitória garantida no dia seguinte, mas
parecia um bom jeito de começar seu aniversário.
O desafio da tarde seria encontrar um lugar com algo que sua mãe
pudesse gostar. Bruno andou demais, e nada. O fato de estar chovendo não
era de ajuda alguma, também, e tinha a certeza de que não encontraria
alguém na rua que falasse inglês para ajudá-lo tão facilmente.
Um toque no ombro interrompeu a sua sessão mental de xingamentos.
— Se perdeu?
Ivan, debaixo de seu guarda-chuva, usava óculos escuros mesmo que o
sol já parecesse inexistente naquele lugar. O cabelo loiro estava penteado
para trás — do jeito que ele odiava, o que fez Bruno pensar que havia
acabado de sair de algum dos milhares de compromissos que ele odiava
igualmente.
Bruno precisou conter-se para não estender a mão e bagunçar os fios
dourados ali mesmo.
— Preciso comprar um presente pra minha mãe.
— Posso ajudar se quiser.
— E se nos virem?
— Acredite, Bruno, nós somos a última preocupação das pessoas
daqui. Adoro esse lugar. E é uma oportunidade para ficarmos juntos.
Também tenho um presente a comprar para alguém.
Por um segundo, ele se questionou se Ivan saberia ou não que seu
aniversário era no dia seguinte. Provavelmente não, pois nunca chegaram a
falar sobre o assunto para que dissesse. Não importava, de qualquer
maneira.
Ivan estava tão lindo que era simplesmente impossível negar a sua
companhia.
E era deprimente que, mesmo que ele dissesse que não existia
problema em estarem juntos ali, não pudesse beijá-lo.
Ele se limitou a assentir e segui-lo pelas ruas abarrotadas de gente.
Aparentemente, Ivan conhecia bem o lugar, pois o levou nas melhores lojas
da categoria "presente para mães". Olharam roupas, acessórios e utensílios
de casa. Por fim, acabou escolhendo um porta-jóias com ilustrações
coloridas e delicadas, um pequeno cenário japonês. Para a sua surpresa (e
confusão), Ivan também comprou algo para ela.
— É, acho que ela vai gostar. — Comentou, enquanto Ivan fazia o
pagamento. Não se surpreendeu nem um pouco ao descobrir que o
desgraçado também falava japonês. — Você é inacreditável.
— Isso é um elogio ou uma ofensa? — O loiro perguntou, antes de
dizer algumas palavras indecifráveis para a atendente, que começou a
embrulhar o presente.
— Não sei. Você só é.
— Entendo. — Ele respondeu, no mesmo tom que indicava que ele
não entendia coisa nenhuma. — Estou até comprando presentes para a sua
mãe, quando eu vou conhecê-la?
A pergunta o pegou desprevenido. Talvez Ivan não tivesse perguntado
com maiores intenções, mas ainda era o cara de quem gostava insinuando
que gostaria de conhecer a sua mãe. Apresentar Pedro para ela era uma
coisa, e Ivan… outra.
— Ah, bom. Preciso ter uma conversa com ela antes, sobre o meu
inimigo declarado não ser um inimigo tanto assim, mas podemos organizar
uma chamada de vídeo. Ou apresento vocês quando chegar a corrida no
Brasil. — Primeiro ele dizia que queria visitar o país na sua companhia, e
agora isso.
Bruno odiava se iludir, mas lá estava ele, imaginando que o russo
poderia, talvez, querer algo de verdade. Não necessariamente público, mas
de verdade.
— Me parece bom. — Ele disse, apenas, como se o brasileiro ao seu
lado não estivesse a um passo de colapsar.
— Você disse que tinha que comprar algo para alguém, não gostou de
nada no caminho?
— Não sei, você gostou?
— Como eu vou decidir um presente por você, imbecil?
Ivan parou na calçada, bem na sua frente. Havia um sorriso divertido
em seu rosto.
Era uma situação incomum o bastante para que ele entendesse o que
Ivan queria dizer.
— Ah, o presente é para mim.
— Sim, imbecil. Eu imagino que você não vá querer nada das lojas de
mãe, mas sou igualmente horrível em presentes. Quero que você escolha.
— Como sabe o meu aniversário?
— Você é mais pesquisado no Google do que imagina, aparentemente.
— Você pesquisou? Por que não me perguntou?
Ivan deu de ombros.
— O plano era fazer alguma surpresa, mas não consegui pensar em
nada. Nem mesmo Pedro conseguiu me dar uma ideia.
O pensamento de que Ivan chegou a pesquisar o seu aniversário na
Internet e ainda procurou por Pedro por ideias para um presente era… algo.
Algo. Algo. Algo. O russo não parecia se cansar de deixá-lo sem
palavras. Era um ótimo momento para que ele viesse com mais uma de suas
palavras intraduzíveis para momentos indescritíveis.
Por enquanto, era apenas algo.
— Não precisa me dar presente algum. Podemos jantar juntos no meu
quarto do hotel, e está de bom tamanho.
— Você acha mesmo que eu deixaria o seu aniversário passar sem um
presente?
— Sei lá, você me parabeniza quando eu venço um Grande Prêmio
com boquetes.
Ivan revirou os olhos, e abriu novamente o guarda-chuva acima deles.
Ainda estavam na calçada, e não caía a chuva sobre eles, mas Bruno
percebeu que era uma ótima oportunidade de mascarar seus rostos quando o
russo se aproximava demais.
Perfeito. Se vazasse algo sobre eles, pelo menos não veriam a incrível
e grandiosa cara de panaca no seu rosto.
— Bom, é diferente. Aprecio aniversários, e… aprecio você. Eu o
conheço de verdade há quase um ano, e gostaria de demonstrar de alguma
forma o quanto você é bom para mim.
— Ainda acho que um boquete está de bom tamanho.
— Bruno. — Em qualquer outra situação, ele amaria ver o próprio
nome saindo da boca do russo. Seu foco quase se perdeu de forma
definitiva ao pensar nisso. Lembranças dos momentos em que estavam
sozinhos e Ivan o fazia baixinho. A única coisa que manteve sua mente no
lugar foi a expressão dele enquanto esperava por uma resposta.
— Argh, o “Bruno” impaciente. — O brasileiro suspirou, e desviou o
olhar. — Não sei o que espera que eu diga.
— Não espero nada. Estou tentando dizer que quando eu digo que
gosto de você, não estou falando apenas do que nós temos. É legal, sim. Eu
adoro. Mas me interessei por você.
— Foi bem do nada, aliás. Achei que você me odiasse de verdade até
descobrir que era só a sua cara de merda integral. — Bruno o interrompeu
antes mesmo de perceber que tinha o feito, e comprimiu os lábios assim que
viu o olhar impaciente do russo. — Estou nervoso. Continue.
Para a sua surpresa, antes de continuar, Ivan o beijou. Foi rápido e
carinhoso.
— Não foi do nada, Campos. Você é novato entre a turma, mas todos
sabem quem você é.
— Um cara extremamente bonito e gostoso?
— Isso apenas eu acho, espero. — Ele apertou levemente o seu nariz,
o que lhe rendeu um leve tapa na mão. — Não, todos sabem que você
também lutou pra estar aqui. Eu sei que você pensa que todos acham que
você chegou onde está por causa do seu pai, mas… acredite, todo mundo
sabe que ele é uma dor na bunda. E é legal como você ainda fala sobre o
quanto queria que todos no seu país tivessem a mesma oportunidade de
fazer parte disso.
— Fofo. Sempre quis que alguém falasse mal do meu pai durante uma
declaração.
Era impossível simplesmente calar a boca e ouvir. Estava nervoso
demais para isso. Era bom que Ivan se acostumasse.
— O ponto é, sempre te observei de longe. Você sempre foi tão gentil
com todos, e a maioria chega se sentindo no direito de se achar maior que
outros que ficaram atrás. Você não. É bom demais, na pista e fora dela.
— Olha quem fala.
— Para alguém que começou no ano passado, você tem uma imagem
muito boa.
— Metade da minha fama veio por sua causa, obrigado por
supostamente me odiar.
— Cala a boca. — Mais uma vez, ele o beijou rapidamente. Talvez
tivesse realmente percebido que era a melhor tática para fazê-lo se calar. —
Não importa. Não importa porque independente de onde tenha vindo a
atenção que você recebe, você a merece, e ainda merece mais.
— Estou tentando entender por que você está tendo esse tipo de
conversa comigo no meio de uma rua lotada no Japão, achando que esse
guarda-chuva realmente impediria algum jornalista de nos reconhecer?
— Porque as chances de você fugir do assunto quando não tem pra
onde correr são menores.
— Isso faz… muito sentido. Obrigado. Mas ainda não entendo o
motivo para que você esteja falando tudo isso.
— É claro que não, você é uma lesma.
— Seboso. — Ele rebateu, em português. O russo fez uma expressão
de confusão diante da palavra desconhecida, mas apenas balançou a cabeça
e suspirou. Bruno limpou a garganta, e se aproximou para ficar mais perto
dele.
— O que eu quero dizer é que você é bem mais do que um ficante
qualquer pra mim, não que eu ficasse com muitos antes, e eu gosto de você
muito mais do que gosto do que temos, se é que isso faz algum sentido. —
Ele murmurou algo, e Bruno não precisava perguntar para saber que era
algum palavrão russo. Era a primeira vez que via Ivan parecer nervoso, o
que parecia realmente adorável. — E eu gostaria que fosse mais do que os
nossos encontros no hotel. Bom, não que possamos revelar, de qualquer
modo… Mas entre nós.
Houve um momento de silêncio. Bruno continuou o encarando,
esperando que ele dissesse qualquer coisa que indicasse que era apenas uma
brincadeira e que tinha caído direitinho.
Não aconteceu. Na verdade, o silêncio apenas pareceu deixar o russo
mais nervoso. Ainda era estranho perceber que era o motivo para que ele
estivesse daquele jeito. Ivan Nikolaev, sempre tão intocável, nervoso por
achar que estava prestes a levar um fora de alguém.
— É claro que vou entender completamente se você não quiser. Ter um
relacionamento em segredo é realmente um porre, mas…
— Mas eu quero. Só não achei que você quisesse.
— Ah, eu quero. Como pode ver, da mesma forma que você não é bom
em deixar os outros falarem, eu não sou bom com palavras.
— Eu até te xingaria por isso, mas ainda estou surpreso com a
situação.
Ivan sorriu — sorriu de verdade, era provavelmente o sorriso mais
largo que Bruno já tinha visto no rosto do russo —, e o puxou para mais um
beijo. Um demorado, dessa vez, exatamente como os que tinham no quarto
quando estavam sozinhos. Ivan deslizou os dedos entre os cachos do seu
cabelo, puxando-os levemente enquanto o beijo era intensificado.
Ainda era… algo. Em todas as vezes que ele esteve com alguém,
nunca se sentira dessa forma.
Nem mesmo colocar seu carro na velocidade máxima lhe causava um
sentimento tão grande.
Tão…
Algo.
O loiro o olhou ao interromper o beijo, e passou carinhosamente os
dedos pelo seu rosto, antes de beijar a sua testa.
— Não pense que eu esqueci do seu presente de aniversário. Me
aguarde.
Ivan era… algo. E ele nunca decepcionava.
Já fazia três anos desde o momento em que o russo e Bruno decidiram
que seriam algo mais.
Há dois, o brasileiro ganhou o primeiro mundial.
Há um, Ivan Nikolaev se aposentou — apesar de que ele odiava falar
dessa forma, porque Bruno sempre aproveitava para fazer alguma piada
sobre seus humildes trinta e sete anos. Para ele, o termo "tempo para focar
em outras atividades sem previsão de volta" se encaixava melhor. As outras
atividades, no caso, era trabalhar na equipe de Bruno, porque ele não tinha a
menor vergonha na cara e era bom com a mecânica dos carros. Seu pai
adorava o mais velho — era cômico se considerassem que Ivan o odiava
silenciosamente —, então não foi algo difícil de conseguir.
Bruno continuava fazendo piadas com a sua idade constantemente.
Principalmente quando ele reclamava de dor nas costas depois de arrumar o
seu motor. Na frente de todos. A sessão de xingamentos em russo que
acompanhava em seguida também era feita na frente do resto da equipe. Ele
sabia que qualquer um acabaria perdendo a paciência uma hora ou outra,
mas Nikolaev não parecia pessoalmente ligar para aquilo, então ele
continuava o enchendo até que finalmente pudessem ficar sozinhos para
que ele o calasse com um beijo. Dois. Três. Por vezes, mais que beijos.
Era bom. Não havia nada melhor do que um relacionamento que era
apenas seu em todos os sentidos possíveis. É claro, havia sua mãe, que
passou a falar mais com o genro do que com o próprio filho quando ligava
em momentos em que estavam juntos, mais um bico de tradutor que
Campos pessoalmente adorava fazer, porque era incrível ver o quanto eles
se davam bem. Ivan até mesmo fez questão de aprender o básico de
português para falar melhor com ela. Havia Pedro e sua esposa — que, por
sinal, já estava grávida. Havia parte da família de Ivan, o que não foi tão
bom por não serem tão agradáveis assim.
Mas era deles. Não havia ninguém os vigiando — com o tempo, a
mídia pareceu cansar de procurar por vestígios de ódio entre os dois —,
ninguém dizendo se pareciam estar felizes como casal ou se um término era
uma possibilidade. Pareciam apenas colegas de equipe.
Que continuavam invadindo o quarto um do outro durante a
madrugada.
Daquela vez, porém, era o primeiro Grande Prêmio do Brasil em que
estariam na mesma equipe.
Assim como seria a primeira vez que Ivan dormiria na sua casa. É
claro que ele já tinha encontrado sua mãe anteriormente, mas apenas dentro
do autódromo brasileiro. Foram quase quarenta minutos de Dona Maria
apertando seu rosto, abraçando-o e dizendo o quanto ele era lindo, e Ivan se
comunicando em um português horrível — finalmente poderia dizer que ele
era ruim em algo! Bruno passou o resto do dia sentindo a mandíbula doer
de tanto sorrir.
De vez em quando, Bruno pensava que havia sim uma palavra para
definir Ivan, e definir o que sentia e definir o que havia entre eles. Amor.
Mas ainda isso parecia pouco perto do quanto seu peito ficava perto de
explodir toda vez que o loiro o beijava, o tocava e dizia coisas bonitas que
ele nunca achou que o russo com a cara fechada diria.
Daquela vez, eles dormiriam juntos em uma de suas casas. Poderia não
parecer algo grande, mas era.
Ivan chegou de seu voo de madrugada, o que facilitou o processo de
irem para seu apartamento sem serem notados. Era uma quarta, e ele havia
arranjado uma desculpa qualquer para fazer a viagem antes do resto da
equipe.
Ele dormiu até as dez da manhã, o que também era incomum para a
sua rotina.
Eles não deixaram o quarto até as cinco da tarde. Tanto porque Bruno
não estava com a menor vontade de levantar quanto por Ivan também não
estar colaborando muito para que ele sentisse qualquer vontade de deixar a
cama. Não era uma reclamação, de modo algum.
— Você está me tornando um idiota preguiçoso, assim como você. —
O russo murmurou, enquanto esperava pelo café que estava sendo
preparado por Bruno.
— Você gosta.
— Descobriu agora o meu gosto por idiotas?
Bruno lhe mostrou o dedo do meio ao colocar a xícara na sua frente.
— Tenho uma surpresa para você, aliás. — Ivan bebeu um pouco, e se
levantou. — Vai se trocar, eu cuido da louça.
— Nós vamos sair?
— Não vamos se você não calar a boca e se arrumar. — O russo deu
um peteleco na sua testa. — Vaza daqui.
Bruno pensou em rebater, mas a curiosidade o venceu e ele se afastou
para vestir algo. Não havia nenhuma possibilidade em sua cabeça de algo
que Ivan poderia ter arrumado em um país que ele nunca visitou e
conheceu, e, enquanto se preparava, ele notou que o russo parecia mais
animado que o habitual, então era o suficiente para deixá-lo ansioso.
Ivan saiu de sua casa coberto demais para o calor de São Paulo, mas
era como ele fazia para não ser tão notado ao saírem juntos.
— E como nós vamos? — Bruno o encarou, enquanto ele mexia
tediosamente no celular.
— Chamei um carro.
— Eu tenho um carro. Você poderia ter me dito o endereço.
— Cacete, você não sabe lidar com surpresas, não é? — O loiro
levantou os óculos escuros para ajeitá-los sobre os cabelos loiros que já
precisavam de um corte, revirando os olhos. — Se você ficar calado até
chegarmos lá, eu pago o jantar no restaurante que você quiser.
Não que Bruno não tivesse o próprio dinheiro, mas jantar fora em seu
país com Ivan parecia uma programação incrível. Ele não precisou de muito
para realmente se calar.
Mesmo que, enquanto isso, tivesse se pendurado no pescoço do loiro
para beijar e suspirar contra a sua pele. O suficiente para que Ivan nem
mesmo chegasse a pensar que estavam no meio da rua.
E não durou muito. Assim que entraram no carro, Bruno disparou a
falar e tentar adivinhar para onde estavam indo. Sobrou para o pobre
motorista, porque nem Ivan saberia explicar o lugar, se não fosse pelo
endereço enviado para o seu celular pela mãe de seu namorado. Dona Maria
tinha, de fato, uma participação naquilo, mas Campos ainda não precisava
saber.
Ivan quase riu da sua expressão confusa e quase decepcionada quando
o carro parou em frente a uma grande construção abandonada.
Bom, nunca tinha dito que seria um presente completo e imediato.
— Que porra é essa, Nikolaev?
— Quanta agressividade…
— O que você tem pra me mostrar aqui? É, tipo… um prédio caindo
aos pedaços, com mato em volta. Aliás, nem de mato dá pra chamar isso. É
grama.
— Por enquanto. — O russo ergueu um dedo no ar, e tirou alguns
papéis do casaco. Um a um, colocou-os nas mãos de Bruno. — Contratos,
algumas autorizações, listas de materiais de construção, funcionários… Ah,
certo. A autorização para uma obra.
O brasileiro analisou os papéis por um tempo, antes de tornar a olhar
para o namorado.
— Não entendi.
— Você é o dono desse prédio. Não apenas do prédio, mas do terreno
ao redor.
Os olhos dele se arregalaram, o que foi o suficiente para fazer Ivan
sorrir ainda mais.
— Eu… ainda não entendo.
Não era uma surpresa. A ideia do que estava acontecendo naquele
momento era algo que estava distante na mente de Bruno. Ivan imaginou
que ele sequer fosse desconfiar.
— Vem, eu vou te mostrar. — Ele estendeu a mão, esperando que o
brasileiro a pegasse. — Essa pode ser a entrada principal. Teremos algumas
exposições sobre a sua trajetória, painéis com fotografias, e naquelas salas
podem ficar os escritórios para atender os novatos. No andar de cima,
podemos fazer algumas salas para passar a parte teórica.
— Ivan…
— A área de trás é o suficiente para fazer algumas pistas. Kart,
principalmente. Mas é assim que todos começam.
— Isso é…
— Gosto de pensar que vai se chamar Instituto Campos. É. — O russo
o olhou. — Você disse que queria que houvesse mais oportunidades aqui.
Esse lugar pode ser o início disso. Eu consegui todas as autorizações para
que ensine aqui os cursos obrigatórios. Alguns professores também, e a
maioria tem um português admirável. Eu posso ajudar na medida do
possível nos cursos, também. De acordo com a empresa de obras, deve ficar
pronto em cinco ou seis meses.
Bruno não costumava ficar em silêncio. Nunca. Por isso o silêncio
sempre parecia algo tão estranho para o russo. Era incomum demais.
O brasileiro olhou ao redor, boquiaberto.
— Nem… fodendo.
Ivan sorriu ainda mais, se é que era possível, enquanto ele continuava.
— Quanto dinheiro você deu nisso? Quanto dinheiro você ainda vai
dar? Cacete, Ivan. Isso vai custar pra caralho, e se levar em conta que você
é um fresco e só vai contratar os melhores pra isso…
— Não me importo. É o seu sonho, e eu sei que um dia você faria isso.
Estou adiantando o processo porque também é algo que eu gostaria de fazer.
Bruno o encarou ainda mais, antes de pular no seu pescoço para um
abraço.
Talvez devesse parar de procurar por qualquer palavra que definisse
todo o universo de coisas que Ivan lhe causava, porque estava começando a
duvidar que isso sequer pudesse existir.
Isso parecia bom. Nem tudo que é bom demais precisa ser limitado a
uma única palavra.
Especialmente algo que não pertencia a mais ninguém além deles.
OQVNV foi um conto escrito em dois dias — três, se contarmos a
revisão e toda a preparação de seus últimos detalhes. Algo completamente
fora da minha agenda de publicação. Apenas fluiu. Bruno e Ivan, de certa
forma, são uma grande representação do que eu senti no momento da
escrita, de várias formas diferentes. Algumas mais óbvias e outras, talvez
nem tanto.
Agradeço Triz. Ao grupo “Crio e Falculistas”, que me xingaram todas
as vezes que eu quis desistir do conto que não é um conto. Laís, que fez
essa capa incrível em tão pouco tempo, porque tudo aconteceu rápido
demais. Para Clara que, além de fazer essa diagramação incrível, está
sempre aberta a me ouvir reclamando dos meus próprios livros. Para
Englantine, que tem literalmente todos os créditos do título desse conto.
Sem ela, eu provavelmente teria escolhido uma opção bem ruim.
Para quem esperava que eu lançasse MQC primeiro, mas esteve ao
meu lado quando essa obra inesperada nasceu.
Para todo mundo que me segue no Instagram(@coraescrita) ou
Twitter(@devilscheck). Sem essas pessoas, eu também não teria coragem o
suficiente. Obrigada por confiarem em mim.
Table of Contents
SOBRE O CORAVERSO
PARTE UM — O QUE VOCÊ VÊ...
PARTE DOIS — O QUE VOCÊ NÃO VÊ
PARTE TRÊS — O QUE NINGUÉM VÊ
AGRADECIMENTOS

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