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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE- UFRN CENTRO

DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS - CURSO DE DIREITO DISCIPLINA:


SOCIOLOGIA E ANTROPOLOGIA GERAL

DOCENTE: DOUGLAS ARAÚJO


DISCENTE: MATHEUS ANDRADE SILVA – 20230016751

RESENHA SOBRE OS CAPÍTULOS 2 E 3 DO LIVRO DA DIVISÃO DO


TRABALHO SOCIAL DE ÉMILE DURKHEIM

CAPÍTULO 2 - SOLIDARIEDADE MECÂNICA

O livro "Da Divisão do Trabalho Social", escrito pelo renomado sociólogo


Émile Durkheim, é uma obra seminal que desempenhou um papel crucial no
desenvolvimento da sociologia como disciplina acadêmica. O capítulo 2 do livro
"Da Divisão do Trabalho Social" de Émile Durkheim aborda o conceito de
Solidariedade Mecânica, que é um dos pilares fundamentais da teoria
sociológica do autor. Neste capítulo, Durkheim explora uma série de ideias
relacionadas à solidariedade mecânica, incluindo a relação entre crime,
repressão social, normas, e a coesão da sociedade.

Durkheim começa o capítulo observando que, na sociedade, existem


vários tipos de crimes, e todos eles têm um aspecto comum que é a reação que
provocam na sociedade. Ele não se limita a considerar apenas os crimes
reconhecidos pelo direito penal, mas também as atitudes que são punidas por
diferentes realidades sociais. O que ele está interessado em compreender é por
que a sociedade reage de forma tão enérgica a certos atos, classificando-os
como crimes.

O autor aponta para a importância de se entender que o crime não deve


ser limitado apenas ao direito repressivo, pois esse tipo de direito ocupa um lugar
central em muitas sociedades. Ou seja, o direito penal, que é o sistema legal que
lida com a punição de crimes, é uma parte fundamental da sociedade. No
entanto, é importante destacar que o crime não é apenas uma questão de
legislação; envolve uma dimensão social e moral.

Durkheim argumenta que a noção de crime não pode ser definida


simplesmente como um ato que é nocivo à sociedade. Em vez disso, ele propõe
uma definição mais ampla, afirmando que atos criminosos são aqueles que
parecem nocivos à sociedade que os reprime. Isso implica que o que é
considerado crime em uma sociedade pode não ser assim em outra, uma vez
que depende das normas e valores daquela sociedade específica.

Uma característica comum a todos os crimes, segundo Durkheim, é que


eles são atos socialmente reprovados. No entanto, ele reconhece que há
exceções a essa regra. Por exemplo, ele menciona o incesto, que é geralmente
moralmente reprovado, mas não é considerado crime em todas as sociedades.
Isso ilustra a complexidade da definição do que é ou não um crime.

Durkheim argumenta que o sentimento que corresponde ao crime deve


ser singularizado, ou seja, deve ser uma emoção que tem uma intensidade
média e que esteja fortemente gravada nas consciências da maioria dos
membros da sociedade. Essa é a razão pela qual as leis penais tendem a ser
estáticas e evoluem muito lentamente, uma vez que são baseadas na resistência
dos sentimentos coletivos aos quais correspondem.

Além disso, Durkheim observa que os sentimentos que encarnam as


regras penais devem ser determinados e uniformes na sociedade. Eles devem
ser precisos e fortes. Isso significa que as normas que definem o que é crime
não podem ser vagas ou sujeitas a interpretações variadas. Em vez disso, elas
devem ser claramente definidas e amplamente aceitas pela sociedade.

Um exemplo que Durkheim dá para ilustrar a necessidade de precisão nas


normas é o caso do "filho mau". Se a sociedade não consegue determinar com
precisão em que grau um filho é considerado "mau" em relação a seus pais, fica
difícil aplicar sanções consistentes para casos desse tipo.
Em suma, a gente ente que o capítulo 2 de "Da Divisão do Trabalho
Social" de Émile Durkheim explora a ideia de solidariedade mecânica, que está
ligada à forma como a sociedade lida com o crime e a repressão. O autor
argumenta que o crime não pode ser simplesmente definido com base em seus
efeitos nocivos, mas sim em relação às normas e valores de uma sociedade
específica. A reação à criminalidade está enraizada em sentimentos coletivos, e
as normas que definem o crime devem ser precisas e uniformes para manter a
coesão social. Durkheim abre uma discussão profunda sobre a relação entre
crime, normas sociais, repressão e a base da solidariedade social em
sociedades tradicionais. Esse capítulo é fundamental para entender a
abordagem de Durkheim à sociologia e sua teoria sobre a coesão social e a
divisão do trabalho.

CAPÍTULO 3 - SOLIDARIEDADE ORGÂNICA

O capítulo 3 do livro "Da Divisão do Trabalho Social" de Émile Durkheim


é um importante ponto de discussão sobre a Solidariedade Orgânica. Neste
capítulo, Durkheim aprofunda a análise da solidariedade social e explora como
ela é influenciada pela divisão do trabalho e pelo sistema de direito restitutivo.
Vamos examinar as principais ideias e conceitos abordados neste capítulo.

Durkheim inicia o capítulo enfatizando que a natureza das sanções


restritivas já fornece uma pista sobre a natureza da solidariedade social a que
corresponde o direito. Ele observa que essa forma de sanção não é expiatória,
ou seja, não se baseia em punir o transgressor, mas sim em restaurar o equilíbrio
quebrado. Isso significa que, ao contrário das sanções punitivas, as sanções
restritivas não visam necessariamente à punição, mas à correção e à
restauração.

No sistema de direito restritivo, o juiz não determina penas, mas declara


o direito. As indenizações por perdas e danos, que fazem parte desse sistema,
não têm caráter penal. Em vez disso, elas têm o propósito de restituir a situação
ao que era antes da infração, na medida do possível. Isso reflete uma abordagem
muito mais objetiva e menos passional em relação às violações das normas
sociais.

A ideia de que as custas judiciais são pagas pela parte que perde o
processo também é mencionada. Isso se baseia na noção de que, dado que a
justiça não é ministrada gratuitamente, é justo que aquele que provocou o
processo arque com as despesas. Essa abordagem é menos voltada para a
punição e mais para a restauração da justiça.

Durkheim também destaca a ideia de que, enquanto o direito repressivo


tende a permanecer difuso na sociedade, o direito restitutivo cria órgãos cada
vez mais especializados. Esses órgãos, como tribunais consulares, tribunais
trabalhistas e tribunais administrativos, lidam com casos específicos de acordo
com as normas de direito restitutivo. Isso reflete o fato de que o direito restitutivo
se concentra na restauração do equilíbrio social e, portanto, requer uma estrutura
mais especializada.

Durkheim também destaca que o direito é essencialmente uma


construção social. Ele argumenta que o direito é uma coisa social por excelência
e que seu objeto é muito diferente dos interesses individuais dos litigantes. Isso
destaca a importância do direito como um instrumento para manter a ordem e a
coesão social.

Uma distinção fundamental que Durkheim faz é entre duas espécies de


solidariedade social: negativas e positivas. A solidariedade negativa é baseada
em uma abstenção, ou seja, em não prejudicar os outros. Ela existe onde existe
uma solidariedade de natureza positiva, da qual é uma resultante e uma
condição. A solidariedade negativa é necessária apenas na medida em que as
pessoas já estão unidas por algum vínculo de sociabilidade.

A solidariedade negativa é representada pelo respeito aos direitos dos


outros e pela abstenção de comportamentos prejudiciais. No entanto, Durkheim
enfatiza que, para que os homens se reconheçam e se garantam mutuamente
direitos, é necessário que haja uma base mais profunda, um certo grau de
afeição mútua e de ligação à mesma sociedade.
A ideia de justiça da caridade também é introduzida. A justiça da caridade
é representada pelo simples respeito aos direitos dos outros, sem qualquer ato
que vá além dessa virtude puramente negativa. Para Durkheim, a justiça é
inseparável da caridade, pois para que os homens reconheçam e protejam
mutuamente seus direitos, é necessário que sintam afeição e se apeguem uns
aos outros como membros de uma mesma sociedade.

No que diz respeito à solidariedade orgânica, Durkheim destaca que ela


é uma forma de solidariedade social positiva que deriva da divisão do trabalho.
Ele enfatiza a relação entre a divisão do trabalho e o direito contratual. O contrato
é visto como a expressão jurídica da cooperação. A cooperação, por sua vez,
pode ser unilateral ou gratuita, como no caso de doações, ou envolver
obrigações recíprocas, como em contratos verdadeiramente cooperativos.

A reciprocidade de deveres, de acordo com Durkheim, só é possível onde


existe cooperação, e a cooperação, por sua vez, não pode existir sem a divisão
do trabalho. A divisão do trabalho é essencial para a criação de uma sociedade
complexa, pois permite que os indivíduos se especializem em funções
específicas.

Durkheim faz uma distinção entre a divisão do trabalho simples, em que


uma tarefa comum é dividida em tarefas qualitativamente similares, e a divisão
do trabalho composta, em que as tarefas são de natureza diferente. Ele aponta
que o contrato de sociedade, que envolve a divisão do trabalho simples, coloca
todos os associados no mesmo nível, com contribuições semelhantes. Por outro
lado, o contrato de casamento, que envolve a divisão do trabalho composta, não
apresenta a mesma igualdade de contribuição.

O contrato é visto como um símbolo de troca na sociedade. Todas as


funções da sociedade são vistas como funções sociais, assim como as funções
de um organismo são orgânicas. Para Durkheim, as relações reguladas pelo
direito cooperativo, que envolvem sanções restitutivas, resultam da divisão do
trabalho social.

Finalmente, Durkheim introduz a ideia de duas espécies de solidariedade


positiva: a solidariedade de crenças e a solidariedade de interesses. A
solidariedade de crenças é baseada em sistemas coletivos de crenças e valores
compartilhados por membros da sociedade. Por outro lado, a solidariedade de
interesses é baseada na interdependência econômica e na cooperação para
atingir objetivos comuns.

Em síntese, neste capítulo, Émile Durkheim explora a noção de


Solidariedade Orgânica, que é característica de sociedades complexas com alta
divisão do trabalho. Nesse tipo de sociedade, o sistema legal se concentra na
restauração e correção de desequilíbrios sociais, em oposição ao castigo
punitivo. Durkheim ressalta a importância da cooperação, da divisão do trabalho
e dos contratos como elementos fundamentais na construção da solidariedade
social nesses contextos. Além disso, ele diferencia entre solidariedade de
crenças e de interesses como formas de solidariedade positiva nas sociedades
complexas. Esse capítulo oferece insights valiosos sobre como as sociedades
modernas funcionam e como o sistema legal se adapta a diferentes contextos
sociais.

CONSLUSÃO E OPINIÃO SOBRE OS CAPÍTULOS

A análise dos capítulos 2 e 3 do livro "Da Divisão do Trabalho Social" de


Émile Durkheim proporciona uma compreensão profunda das noções de
solidariedade mecânica e orgânica, bem como suas implicações nas sociedades
e no sistema legal. Ambos os conceitos são fundamentais para a teoria
sociológica de Durkheim e ajudam a explicar como as sociedades mantêm sua
coesão interna e como o sistema legal se adapta às necessidades de diferentes
contextos sociais.

No capítulo 2, Durkheim explora a solidariedade mecânica, que


caracteriza as sociedades tradicionais e simples. Essa forma de solidariedade é
baseada na semelhança e na homogeneidade dos membros da sociedade. A
solidariedade mecânica é construída sobre a consciência coletiva, na qual as
normas e valores compartilhados são fortes e rígidos. Nesse contexto, a
repressão social desempenha um papel fundamental na manutenção da ordem,
e os crimes são vistos como uma ameaça direta à coesão da sociedade.
Durkheim argumenta que, nas sociedades caracterizadas pela
solidariedade mecânica, as normas e os sentimentos coletivos são tão uniformes
que a reação ao crime é frequentemente guiada por reações passionais. As
sanções penais são aplicadas com base em sentimentos de indignação, raiva e
repulsa, em vez de critérios racionais ou legalmente definidos. É a intensidade
das emoções coletivas que determina a resposta da sociedade ao crime. A
ênfase aqui está na punição, na vingança e na restauração do equilíbrio
ameaçado.

Em contrapartida, o capítulo 3 explora a solidariedade orgânica, que é


característica das sociedades complexas e modernas. A solidariedade orgânica
baseia-se na divisão do trabalho, na interdependência e na cooperação entre os
membros da sociedade. Nesse contexto, o sistema legal é dominado pelo direito
restitutivo, em oposição ao direito repressivo. O foco não é mais na punição, mas
na restauração e na correção das violações das normas sociais.

Nas sociedades com solidariedade orgânica, as sanções restritivas têm


um papel fundamental. Essas sanções visam restaurar o equilíbrio social
perturbado e corrigir os danos causados pela infração. O sistema legal é mais
especializado e oferece soluções detalhadas para uma variedade de disputas e
conflitos. Os tribunais e outras instituições jurídicas tornam-se mais complexos
e adaptados à crescente divisão do trabalho na sociedade.

Durkheim destaca a diferença entre a solidariedade negativa e a


solidariedade positiva nas sociedades com solidaridade orgânica. A
solidariedade negativa está relacionada à abstenção de prejudicar os outros e
ao respeito pelos direitos individuais. Ela é baseada na consciência individual,
na interdependência e na necessidade de cooperação. A solidariedade positiva
envolve cooperação, divisão do trabalho e obrigações mútuas. As pessoas se
unem não porque são iguais, mas porque são diferentes e precisam umas das
outras.

Na conclusão deste resumo, é importante destacar algumas observações


e reflexões. Durkheim descreve esses dois tipos de solidariedade como ideais-
tipo, o que significa que raramente as sociedades se enquadram perfeitamente
em uma categoria ou na outra. Muitas sociedades contemporâneas exibem
elementos de ambas as formas de solidariedade, embora uma possa ser mais
predominante.

A transição da solidariedade mecânica para a orgânica reflete a evolução


das sociedades ao longo do tempo. Nas sociedades tradicionais, onde a
semelhança e a homogeneidade eram características proeminentes, a ênfase
recaía na repressão e no controle. À medida que as sociedades se tornaram
mais complexas, com uma divisão do trabalho mais acentuada e maior
diversidade de funções sociais, a solidariedade orgânica tornou-se uma
característica mais proeminente. A cooperação e a restauração do equilíbrio
social passaram a ser centrais para o sistema legal.

Essas ideias de Durkheim têm implicações significativas na compreensão


da dinâmica social e da justiça. A teoria da solidariedade mecânica e orgânica
nos faz refletir sobre como as sociedades lidam com o crime e a punição. Mostra
como as normas sociais, a reação ao crime e o sistema legal estão
intrinsecamente ligados à natureza da coesão social e à complexidade da divisão
do trabalho.

Além disso, esses conceitos têm relevância contemporânea. Vivemos em


um mundo onde a globalização e a diversidade cultural tornaram a
interdependência entre as sociedades mais evidente do que nunca. Nesse
contexto, a teoria da solidariedade orgânica de Durkheim nos desafia a repensar
como o sistema legal e o entendimento da justiça podem ser adaptados para
refletir essa interdependência e diversidade.

Em resumo, os capítulos 2 e 3 do livro "Da Divisão do Trabalho Social" de


Émile Durkheim apresentam uma análise profunda das noções de solidariedade
mecânica e orgânica, e como esses conceitos influenciam a reação ao crime, as
normas sociais e o sistema legal. Essas ideias oferecem uma visão valiosa sobre
como as sociedades mantêm sua coesão interna e como o sistema legal se
adapta a diferentes contextos sociais. A transição da solidariedade mecânica
para a orgânica reflete a evolução das sociedades ao longo do tempo, e a
interação entre esses dois tipos de solidariedade é uma parte essencial da
dinâmica social. Essa análise também tem implicações importantes na
compreensão da justiça e da coesão social nas sociedades contemporâneas.

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