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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE- UFRN

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS - CURSO DE DIREITO

DISCIPLINA: SOCIOLOGIA E ANTROPOLOGIA GERAL


DOCENTE: DOUGLAS ARAÚJO
DISCENTE: MATHEUS ANDRADE SILVA – 20230016751

RESENHA SOBRE A OBRA TOTEM E TABU DO ESCRITOR SIGMUND


FREUD

INTRODUÇÃO À PRIMEIRA EDIÇÃO

No "Prefácio da Edição Inicial", o livro anuncia de antemão sua intenção


de explorar os conceitos de totem e tabu, com o adicional de aproximar as
perspectivas de antropólogos e psicanalistas. Compromete-se a apresentar e
aprofundar uma nova linha de pensamento, destacando a relevância desse
ponto de convergência entre campos distintos, que sugere uma colaboração
interdisciplinar na pesquisa. É importante ressaltar também a breve crítica feita
neste prefácio acerca dos tabus, frequentemente vistos de forma negativa, que
ainda persistem mais em nossa sociedade do que os próprios totens.

CAPÍTULO I: O HORROR AO INCESTO

O livro se inicia com a categorização de um horror infalível ao incesto. De


inicio, somos primeiramente introduzidos ao conceito de Totem, descrito como o
ancestral comum de um clã, podendo ser transmitido tanto pela linhagem
feminina quanto pela masculina. O capítulo começa por informar que a pesquisa
se baseou em tribos australianas, e ao longo do capítulo, são exploradas as
relações dessas tribos com seus totens, que, em sua maioria, serviam como
referências fundamentais para suas interações sociais. É interessante notar a
ideia proposta pelo psicanalista de que onde havia totens, também existia uma
rígida proibição de relações incestuosas entre pessoas do mesmo totem,
posteriormente referida como tabu. Essas restrições sexuais eram evitadas a
todo custo por esses povos, ilustradas pelas diversas formas de "evitação"
descritas no capítulo, indicando um medo profundo de transgredir essas
proibições.

Além disso, algo que merece destaque, embora não seja amplamente
abordado por Freud, é quando ele explana sobre os diferentes graus de
parentesco dos australianos estudados, que são notavelmente distintos dos
nossos padrões. Eles chamam de "mãe" ou "pai" qualquer pessoa que poderia
ter ocupado essas funções, não necessariamente os pais biológicos. Isso é
semelhante ao nosso costume de chamar os pais dos amigos de "tio" ou "tia" e
aqueles da igreja de "irmão em Cristo", algo que raramente paramos para refletir.

Por outro lado, deve-se observar que nem tudo mencionado na obra é
replicável. Em alguns momentos breves, o texto sugere uma "obrigação" de ter
filhos para um casamento bem-sucedido, argumentando que "Uma mãe, à
medida que envelhece, se salva disso colocando-se a si própria no lugar dos
filhos", e afirma que "Quando um casamento é estéril, a mulher perde uma das
coisas que mais lhe poderiam ajudar a suportar a resignação que o casamento
exige dela." Isso, na opinião pessoal, parece ser uma crença retrógrada, já que
a presença de filhos não é mais uma garantia de sucesso no casamento nos
padrões contemporâneos.

CAPÍTULO II: O TABU E A AMBIVAÊNCIA DOS SENTIMENTOS

Este capítulo se concentra em explorar a presença do tabu nas


sociedades primitivas. Inicialmente, define o tabu como uma palavra de
significado amplo e origem desconhecida, variando entre sagrado e perigoso. No
entanto, em nossa sociedade contemporânea, tendemos a associá-lo
principalmente com proibições e restrições. É interessante observar que os
primeiros sistemas legais humanos estavam relacionados ao tabu, com punições
muitas vezes cruéis para aqueles considerados tabu, incluindo isolamento social
e privação de alimentos.
Outro aspecto fascinante é como as pessoas consideradas tabu eram
comparadas a objetos eletrificados, possuindo um poder transmitido pelo
contato, que poderia ter efeitos destrutivos se os indivíduos que o provocassem
fossem fracos demais para resistir. Além disso, o capítulo explora a ideia de que
o tabu era contagioso, semelhante a uma doença, o que pode ser visto na
passagem: "Pessoas ou coisas consideradas tabu podem ser comparadas a
objetos carregados de eletricidade; são a sede de um imenso poder
transmissível por contato e que pode ser liberado com efeito destrutivo se os
organismos que provocam sua descarga são fracos demais para resistir a ele."
O tabu também era propagado pela desobediência a proibições, o que torna
intrigante a sensibilidade dessas sociedades em relação a esse assunto.

Além disso, o capítulo aborda questões como o tratamento de inimigos, o


tabu em relação aos governantes e o tabu relacionado aos mortos.
Surpreendentemente, até mesmo aqueles que tiravam a vida de seus inimigos
eram submetidos a métodos de "purificação" e isolamento, devido ao medo
supersticioso dos fantasmas dos assassinados. Isso demonstra como o tabu era
profundamente enraizado na psique desses povos primitivos.

Um aspecto surpreendente relacionado ao tratamento dos inimigos é que,


à primeira vista, poderíamos esperar que aqueles que tiravam a vida de seus
inimigos fossem celebrados, mas, curiosamente, eram submetidos a várias
formas de "purificação" e isolamento. Isso se devia ao medo supersticioso dos
fantasmas dos assassinados, conforme indicado na passagem: "Esses povos
são dominados por um temor supersticioso dos fantasmas dos assassinados.”

De maneira intrigante, mesmo os governantes, que normalmente


poderiam ser vistos como os mais privilegiados pelo sistema de tabu, eram
afetados por essas restrições. Em algumas sociedades primitivas, eles estavam
sujeitos a regras estritas de tabu, como não podiam tocar certos objetos ou não
podiam ser tocados por outros. A passagem a seguir ilustra isso: "No Egito, o rei
tinha de se submeter a uma longa série de tabus; por exemplo, não era permitido
tocar o solo, que era sagrado; ele tinha de usar um par de sandálias de ouro com
sola de madeira e o brilho do ouro era para afastar o perigo. Tampouco se lhe
permitia pôr os pés no solo durante os ritos." Isso sugere que mesmo aqueles
em posições de poder estavam sujeitos a restrições tabu significativas em suas
vidas diárias.

Por fim, o capítulo explora o tabu em relação aos mortos, destacando


como o tabu da morte estava profundamente enraizado nas sociedades
primitivas. Os mortos eram frequentemente considerados tabu, e suas
interações com os vivos eram altamente regulamentadas. Essas
regulamentações variavam de sociedade para sociedade, mas muitas vezes
incluíam restrições sobre como os corpos dos mortos deveriam ser tratados,
como o luto deveria ser observado e como os espíritos dos mortos deveriam ser
apaziguados.

No geral, o capítulo II explora a natureza complexa e multifacetada do


tabu nas sociedades primitivas, destacando como essa noção desempenhava
um papel fundamental em todas as áreas da vida dessas culturas, desde o
tratamento dos inimigos até as relações com os mortos. Também lança luz sobre
a dualidade emocional associada ao tabu, que podia oscilar entre o sagrado e o
perigoso, e como essas emoções moldavam as práticas sociais e religiosas
dessas sociedades.

CEPÍTULO 3: ANIMISMO, MAGIA E ONIPOTÊNCIA DOS


PENSAMENTOS

No capítulo III, Freud explora o papel do lamento e do tabu nas sociedades


primitivas. Ele começa destacando a importância do lamento na vida social
dessas culturas, observando que o lamento era uma prática comum em muitos
rituais, especialmente em contextos de luto e morte.

Uma das ideias-chave discutidas neste capítulo é a conexão entre o


lamento e o tabu. Freud argumenta que o lamento pode ser visto como uma
expressão da ambiguidade emocional que está no cerne do tabu. O lamento
muitas vezes envolve uma mistura de emoções contraditórias, como tristeza e
raiva, amor e ódio. Essas emoções ambíguas refletem a complexidade do tabu,
que pode ser tanto uma restrição sagrada quanto uma proibição perigosa.
Além disso, o capítulo explora como o lamento era usado como uma forma
de lidar com a ambiguidade emocional associada ao tabu. O lamento permitia
que as pessoas expressassem suas emoções de uma maneira socialmente
aceitável, ao mesmo tempo em que evitavam transgredir as proibições do tabu.

Freud também discute o papel do lamento na religião e na mitologia das


sociedades primitivas. Ele argumenta que o lamento desempenhava um papel
importante em muitos rituais religiosos e mitos, muitas vezes relacionados à
morte e à ressurreição. Essas histórias mitológicas refletiam a ambiguidade
emocional e simbólica do tabu.

No geral, o capítulo III examina a relação complexa entre lamento, tabu e


ambiguidade nas sociedades primitivas. Ele demonstra como o lamento era uma
resposta emocional fundamental às restrições do tabu e como essa ambiguidade
emocional estava entrelaçada com as práticas sociais e religiosas dessas
culturas.

CAPÍTULO IV: O RETORNO DO TOTEMISMO NA INFÂNCIA

O quarto capítulo é uma parte fundamental da obra de Freud e apresenta


conceitos que tiveram um impacto duradouro na teoria psicanalítica. Neste
capítulo, Freud explora a relação entre o tabu do incesto e o complexo de Édipo,
dois conceitos centrais em sua teoria.

Freud começa examinando como o tabu do incesto, que proíbe relações


sexuais entre membros da mesma família, desempenha um papel fundamental
na organização da sociedade. Ele argumenta que o tabu do incesto é uma das
primeiras proibições sociais que uma criança encontra e que desempenha um
papel crucial na formação da moralidade e da cultura.

Em seguida, Freud introduz o conceito de complexo de Édipo, que é uma


das pedras angulares da teoria psicanalítica. Ele descreve como o complexo de
Édipo se desenvolve na infância, quando uma criança desenvolve sentimentos
de desejo sexual pelo progenitor do sexo oposto e sentimentos de rivalidade e
hostilidade em relação ao progenitor do mesmo sexo. Freud argumenta que o
complexo de Édipo é uma parte normal do desenvolvimento psicossexual da
criança e que a resolução bem-sucedida desse complexo leva à formação de
uma personalidade saudável.

No entanto, Freud também argumenta que o tabu do incesto desempenha


um papel crucial na resolução do complexo de Édipo. O tabu do incesto proíbe
as relações sexuais entre pais e filhos, o que, por sua vez, ajuda a criança a
superar seus desejos incestuosos e a direcionar sua energia sexual para outras
áreas.

Freud também discute como o tabu do incesto e o complexo de Édipo


estão intimamente relacionados à religião e à mitologia. Muitos mitos e rituais
religiosos podem ser vistos como tentativas de lidar com as questões
relacionadas ao tabu do incesto e ao complexo de Édipo.

Freud argumenta que, embora essas teorias tenham mérito em partes,


elas não fornecem uma explicação completa do fenômeno do tabu. Em vez
disso, ele propõe sua própria teoria, baseada na ideia de ambiguidade
emocional. Freud sugere que o tabu é resultado de uma ambiguidade emocional
profunda, na qual objetos ou conceitos podem ser simultaneamente amados e
odiados. Ele argumenta que essa ambiguidade emocional surge das complexas
relações familiares e do desejo incestuoso presente no complexo de Édipo. O
tabu do incesto, portanto, é uma tentativa de lidar com essa ambiguidade
emocional, proibindo as relações sexuais com membros da família.

Além disso, Freud explora como o tabu se manifesta em diferentes


culturas e contextos, observando que as formas específicas do tabu podem
variar, mas a ambiguidade emocional subjacente permanece a mesma. Ele
também destaca como o tabu desempenha um papel importante na religião e na
moralidade, moldando as normas e os valores de uma sociedade.

Em resumo, busca-se oferecer uma explicação abrangente do tabu com


base na ideia de ambiguidade emocional e como essa ambiguidade emocional
está enraizada nas complexas relações familiares e no complexo de Édipo. Além
disso é explorada a relação complexa entre o tabu do incesto, o complexo de
Édipo e a organização da sociedade. Ele demonstra como esses conceitos estão
entrelaçados e desempenham um papel fundamental na teoria psicanalítica de
Freud.
CONCLUSÃO E OPINIÃO SOBRE O LIVRO

Sigmund Freud oferece um fechamento extraordinário para esta obra


seminal. Neste ponto culminante, ele sintetiza os principais pontos discutidos ao
longo do livro e sublinha a extraordinária importância do tabu no tecido da
sociedade, na forja da moralidade e na construção da cultura humana. Através
de sua análise, Freud arremessa luz sobre uma das características mais
intrigantes e fundamentais da experiência humana: a restrição e a sacralização
de certos comportamentos e objetos. Freud, em sua argumentação brilhante,
demonstra de forma contundente como o tabu está entrelaçado nas complexas
teias das relações familiares e nas emoções ambíguas que permeiam o
complexo de Édipo. Ao fazer isso, ele nos convida a mergulhar profundamente
nas profundezas da psicologia humana, onde as normas sociais, os mitos e os
rituais emergem como ferramentas para lidar com essas emoções ambivalentes
e inquietantes. Nesse sentido, o tabu, como Freud argumenta, é uma tentativa
de civilização de controlar e direcionar as pulsões mais primitivas da psique
humana.

A influência do tabu não se limita à esfera das relações humanas; ela se


estende de forma ampla à religião e à mitologia. Freud nos guia por uma jornada
intelectual onde compreendemos como muitos dos mitos e rituais encontrados
em sociedades ao redor do mundo podem ser interpretados como mecanismos
culturais para lidar com as questões do tabu, notadamente o tabu do incesto.
Esta análise, por si só, lança uma nova luz sobre o mundo das crenças religiosas
e práticas míticas, mostrando como elas são uma expressão da psicologia
profunda e universal da humanidade. No entanto, é importante reconhecer que
"Totem e Tabu" é uma obra especulativa. Freud, o pioneiro da psicanálise, não
oferece respostas definitivas, mas sim uma exploração ousada e instigante
desses conceitos. A obra é um convite à reflexão e à contínua investigação, tanto
na psicanálise quanto na antropologia. Ela é um lembrete poderoso de que a
compreensão da natureza humana é uma jornada complexa e interdisciplinar.

Considerando a relevância contemporânea de "Totem e Tabu," é inegável


que esta obra de Freud transcende seu tempo e continua a inspirar debates e
reflexões profundas. Ao mergulhar nas páginas deste livro, fui cativado pela
profundidade da análise de Freud e pela maneira como ele desvenda as
complexas relações entre psicologia individual e cultura coletiva.

Embora muitas das ideias de Freud tenham sido alvo de críticas e revisões
à luz das descobertas recentes na psicologia e na antropologia, a contribuição
histórica e intelectual deste livro permanece inabalável. As teorias de Freud
abriram caminho para um campo fértil de estudos que exploram as nuances da
psicologia cultural e as origens da sociedade. Em um mundo em constante
evolução, "Totem e Tabu" ainda nos desafia a examinar profundamente as raízes
da cultura e da psicologia humana. As análises perspicazes de Freud sobre os
mecanismos do tabu, da religião e da mitologia continuam a inspirar novas
gerações de estudiosos a explorar as complexas interações entre mente e
sociedade. Em resumo, esta obra atemporal é uma leitura obrigatória para
qualquer pessoa interessada em psicologia, antropologia e na busca contínua
pelo entendimento das intricadas teias que conectam o indivíduo à cultura.

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