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na Bahia-Brasil
Maria Helena Ochi FLEXOR
mecânicas, havendo aquelas, conforme citado acima, que eram ocupadas apenas por
brancos, outras exclusivamente por negros e outras que podiam ser exercidas por
brancos livres, tanto quanto pelos escravos ou libertos4.
Nessa publicação tratava-se de algumas atividades, especialmente ligadas à
elaboração de mobiliário, que podia envolver, além do marceneiro, o torneiro, o
entalhador, o carpinteiro, o correeiro, o serralheiro. O estudo não abarcava toda a
gama de atividades mecânicas existentes, mas dava notícias de sua organização e
funcionamento, que não diferiam daqueles envolvidos na confecção de mobiliário.
Os ofícios, ou grupo de ofícios, eram normatizados por regimentos específicos.
Os oficiais mecânicos, na realidade, regiam-se por dois regulamentos: um civil,
normalmente contido nas séries de posturas do Senado da Câmara e, outro religioso,
o Compromisso da Irmandade à qual os artífices estavam ligados, geralmente tendo
como orago o protetor da profissão. Formavam, pois, dois corpos diferentes: o do
ofício, com seu regimento e juízes, e a confraria, com seu compromisso e mesários.
Imiscuíam-se uns nos assuntos dos outros. Encontram-se, nos compromissos, regras
que pertenciam à competência da regulamentação camarista, ou regulamentação
das irmandades repetida em algumas das posturas. A vida religiosa fazia parte do
cotidiano dos homens seiscentistas e setecentistas, a ponto de não haver distinção
entre administrar as regras pertinentes ao ofício ou à Irmandade do ofício.
Os artífices, na maior parte dos ofícios, herdaram os regimentos lusos, em especial
os de Lisboa, que foram adaptados aos novos locais, como o Brasil, especialmente
devido à presença dos índios e dos escravos.
Isso pode ser verificado no documento existente no Arquivo Histórico Ultramarino,
o Compromisso da Confraria de São José, ou seja o Compromisso e Regimento Economico
dos Officios de Carpinteiro e Pedreiro e dos mais agregados a Bandeira do Gloriozo S.
Iozé e sua Confraria erecta na See Cathedral da Cidade da Bahia Dedicado ao mesmo
Glorioso Santo e Feito na diata Cidade no Anno de 1780 (AHU, doc. N. 1283,1780)5.
Esse compromisso foi copiado do Regimento e Compromisso da Mesa dos Offiçios de
Pedreiro e Carpinteiro da Bandeira do Patriarcha São Ioseph anno de 1709, de Lisboa6.
Diferenciava-se apenas em dois capítulos e acrescentamentos, mostrados em
negrito, nos registros abaixo. O item 5, do Cap. VIII, do regimento lisboeta, rezava
Não poderá Official algum ser admitido no referido exame sem mostrar primeiro Certidão
do Mestre com quem aprendeo, de ter acabado o seu tempo.
4 As informações, colhidas pelo CEFET-BA, do CEFET-PR, contém inúmeros equívocos, aliás, como toda a Resenha
Histórica, veiculada na Internet pelo seu serviço de Comunicação Social (www.cefetba.br/comunicacao/introducao.
html, capturado em 10 nov. 2006). É preciso rever essas noções. A Bahia, como primeira Capital do Brasil, recebeu,
desde logo, a mesma estrutura organizacional dos ofícios mecânicos portugueses, como foi dito acima. Os artífices
eram denominados oficiais mecânicos e não tinham nenhuma ligação com mecânica, como informa o referido
site.
5 FLEXOR, 1974: 72-82.
6 LANGHANS, 1943: 274-282.
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Não poderá ser admitido ao dito exame Negro de qualidade alguma e só sim Pardo que seja
forro pello Pay assim o permitir7.
E sendo cazo, que algum Official se queira examinar do officio de Canteiro e Alvíneo, será
obrigado a mostrar que aprendeo hum, e outro Officio por Certidão dos Mestres delles; e sendo
assim examinados, serão obrigados a Registrar a sua Carta no Senado da Câmara; e sendo
achado, que antes do referido exame vzão dos ditos Officios serão condemnados todas as vezes
que forem compreendidos, em seis mil reis, metade para o Senado e a outra para o Officio.
E o Cap. X, dizia
Attendendo que tendo os Mestres muitos aprendizes, nem estes poderão sahir bons Officiais,
nem as obras feitas como convem. Não poderá Mestre algum ter mais de dous aprendizes; e
para constar de como não excedem a dispozição deste Capitulo; serão os Mestres obrigados a
fazer prezentes a Mezaos aprendizes que ensina, e sendo achado que ensinão mais de dous como
fica dito; serão condenados em oito mil reis para a Meza do Officio; e lhe serão tirados os taes
aprendizes, que demais tiverem. Na mesma forma incorrerá qualquer mestre que tomar aprendis
que seja Negro, nem ainda Mulato cativo; pois só ensignará Brancos, ou Mulatos forros8.
Os oficiais mecânicos pediam licença à Câmara, para exercer seus ofícios publi-
camente, depois de fazer exame perante os juizes de ofício; prestava juramento de
bem servir ao público, pagando fiança, válida por um ano, ou seis meses, para os
que recebiam pagamento de terceiros. As licenças para os escravos eram tiradas em
nome de seus senhores, os quais pagavam a fiança. Nem todos os oficiais mecânicos
de Salvador cumpriram essas duas obrigações: licença e fiança.
A maioria dos marceneiros e torneiros era branca, sendo raros os negros e mulatos
forros ou escravos. Na documentação consultada no Arquivo Histórico da Prefeitura
Municipal do Salvador, hoje sob a guarda da Fundação Gregório de Mattos, no
transcorrer de um século e meio – 1700-1850 –, estavam registrados apenas oito
homens de cor entre os quais negros e crioulos forros9. Como se percebe, eram poucos
no ofício de marceneiro.
Por outro lado, encontrava-se um maior número de negros, especialmente escravos,
em determinadas profissões, como alfaiate, sapateiro, carapina, tanoeiro, calafate,
ferreiro, vendeiro, vendeira de porta ou ganhadora de rua. Eram os negros que
exerciam, especialmente, ofícios que envolviam a lida com sangue, como sangradores,
aplicadores de sanguessugas e de ventosas, barbeiros, parteiras. Interessante era a
figura do barbeiro que, além de suas atividades específicas – cortar cabelos e fazer
7 Acrescentamento feito no ao Cap. 4º – dos Juizes do Ofício –, de Lisboa. LANGHANS, 1943: 278-279. FLEXOR,
1974: 79.
8 A última frase foi acrescentada ao Cap. 2º – Das obrigações do ofício pertencentes em comum – de Lisboa. IDEM,
p. 279 Vide FLEXOR, 1974, p. 80. A Irmandade de São José do Rio de Janeiro não fazia concessões nem aos pardos
ou mulatos.
9 José Teixeira, preto forro (1740) (CARTAS DE EXAME, 1741-1770, fl. 140-141), Bento, escravo do Padre Bernardo
Francisco Pereira (1788) (LICENÇA, 1785-1791), Luis Antonio (1801-1802), Ambrozio (1805-1806), escravos de
João Ribeiro de Vasconcelos (LICENÇAS, 1801-1811), João (1804), escravo do Capitão Antonio da Rocha Barros
(IDEM), João Batista Santana, crioulo forro (1804-1827) (IDEM), José de Souza, crioulo (1816-1822) (LICENÇAS,
1815-1820).
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barbas –, também encanava pernas e braços quebrados, tirava dentes, aplicava ven-
tosas, sanguessugas e fazia sangrias10, além de ensinar música. Não raras vezes tinha
um conjunto musical e sua presença ficou marcada nas despesas, por exemplo, das
festas de Santo Antônio ou São Francisco, dos frades franciscanos, que registravam
a música de barbeiros, além da música do organista. Outro testemunho é dado pelos
franciscanos que registraram, na década de 1830, a compra de oito navalhas, quatro
lancetas e dois boticões para seus escravos barbeiros11.
Jean Batiste Debret (TOLEDO, 2006), no século XIX, dizia:
… O oficial de barbeiro no Brasil é quase sempre um negro ou pelo menos escravo. Esse
contraste, chocante para o europeu, não impede ao habitante do Rio de entrar com confiança
numa dessas lojas, certo de aí encontrar numa mesma pessoa um barbeiro hábil, um cabeleireiro
exímio, um cirurgião familiarizado com o bisturi e um destro aplicador de sanguessugas12.
Após 1808, 84% dos pedidos para sangrador, feitos à Fisicatura-mor, no Rio de
Janeiro, eram compostos de forros ou escravos. Em Minas Gerais, entre 1832 e 1871,
todos os barbeiros eram dessa condição.
Os dispositivos, relativos à proibição da participação dos negros nos ofícios, foram
se adaptando à nova realidade do Brasil à medida que o tempo avançava. Assim,
verifica-se que, apesar dessa proibição do Compromisso citado, supondo que outros
compromissos continham as mesmas proibições, a regra foi rompida, pois encontram-se
vários oficiais de pedreiros e carpinteiros escravos, no século XVIII e XIX. Mesmo
assim, havia diferenças nas diversas atividades, separando as dos brancos das dos
negros ou aproximando-as.
Mais recentemente, para comprovar essa hipótese, foi feita pesquisa, buscando
informações sobre as atividades dos escravos nos Inventários e Testamentos, entre
1730 e 1830, sob a guarda do Arquivo Público do Estado da Bahia, num total de
263 processos, escolhidos aleatoriamente, tendo sido arrolados 2.399 escravos, na
Cidade do Salvador e seu termo, que compreendia Itaparica, São Bartolomeu de
Pirajá, Santo Amaro de Ipitanga13, Matuim, Paripe, Catu, Passe, Aratu, Mata de São
João, etc. onde se encontravam propriedades rurais ou semi-rurais.
Embora o termo alargasse a Cidade da Bahia, como sempre foi chamada Sal-
vador, a vida urbana se reduzia a um espaço bastante restrito, visto que existiam
engenhos, ou alambiques, sítios ou roças em Água de Meninos, Barbalho, Barreiras
do Cabula, Brotas, Matatu ou Rio Vermelho. Tomás Caetano de Aquino tinha dez
10 As sangrias eram feitas por meio de ventosas, escariações ou aplicação de sanguessugas ou, ainda, por via arterial
(arteriotomia) ou venal (flebotomia), em diferentes partes do corpo, no local onde o mal se alojava e devia ser
extirpado. Podia obedecer as estações do ano. Também faziam escariações a navalha, permitindo o sangue aflorar,
aplicando ventosas (JESUS, 2001: 90).
11 Livro de Guardiães, 1978: 43.
12 Os cabeleireiros só começaram a exercer a sua função de cuidar exclusivamente de cabelos e perucas na segunda
metade do século XVIII. Por vezes qualquer escravo se dava ao préstimo de sangrar, mesmo sem ser perito no ofício
de barbeiro, como Gabriel, gêge, em 1793, escravo de Manoel Gonçalves Branco, proprietário de fazenda em
Itaparica (INVENTÁRIOS, 04/1588/1057/07).
13 Atual município de Lauro de Freiras.
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14 Não identificada.
15 Aqui só foram excluídos os moleques e molecões sem ocupação. Os ativos são contados no total apresentado.
16 Descontam-se também 14 citações de idades ilegíveis.
17 Liberdade prevista.
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18 Joaquim, crioulo, ainda moço, escravo de José Siqueira Braga, morador em Santo Antônio Além do Carmo, em
1808, estava certo para viagem para Costa da Mina (INVENTÁRIOS 45/2948/2519/15).
19 Utiliza-se a grafia da época. Posteriormente os autores têm grafado houçás, aussás, hauçás.
20 Que diferiam dos ganhadores de rua. Eram os que executavam serviços de compras, por exemplo.
21 INVENTÁRIOS 04/1768/2238/03. Pertenciam a Francisca Barbosa de Vasconcelos, eram do gentio da Costa da
Mina e moravam em Itapagipe de Baixo. Os língua geral eram muito conhecidos entre os índios e foi a língua geral
a forma mais conhecida de comunicação, especialmente no litoral, mas também no sertão, depois do contato com
os brancos, em especial com os jesuítas.
Os escravos e os ofícios mecânicos na Bahia-Brasil 329
26 Catarina de Brito, preta angola, forra, foi juíza da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, da Freguesia de
Santo Antônio Além do Carmo; irmã da Irmandade de São Benedito, da mesma freguesia (INVENTÁRIOS,
04/1577/3046/06, 1749). Tinha uma escrava e duas crias; Capitão Lourenço Rodrigues Duarte, liberto de Agueda
Roiz, solteiro, tinha dois filhos com sua escrava Damiana. Era oficial mecânico, ferreiro, e deixou, como herança,
as ferramentas do ofício a um de seus filhos (INVENTÁRIOS, 04/1577/2046/03, 1749); Paulo de Almeida, natural
do Reino de Angola, da terra do Congo, ex-escravo de Antonio de Almeida, casou-se duas vezes com pretas forras.
Tinha seis escravos (INVENTÁRIOS, 03/1006/1475/08, 1751), por exemplo.
27 Manoel Ferreira dos Santos, provavelmente traficante de escravos, fez testamento porque ia viajar para a Costa
da Mina a negócios. Era natural da Vila de Agueda, termo de Aveiro, Arcebispado de Coimbra (INVENTÁRIOS,
04/1800/2270/11, 1730-1735); Jorge de Azevedo, natural da cidade de Viseu (INVENTÁRIOS, 04/1582/2951/01,
1754); José Ferreira da Costa Braga, natural da freguesia de São Vicente do Bico do Couto, de Rendufe, do Arce-
bispado de Braga (INVENTÁRIOS, 04/1598/2067/06, 1756); Manoel Rodrigues Maltez, natural de Vila Nova de
Famalicão, Arcebispado de Braga (INVENTÁRIOS, 04/1598/2067/01, de 1756); João de Oliveira Baião, natural
do Conselho de Baião, freguesia de Santa Cruz do Douro, Bispado do Porto (INVENTÁRIOS, 04/1610/2079/02,
de 1760-1762); Manoel Dantas Barbosa, natural da vila de Viana, Freguesia de Nossa Senhora do Monte Serrate
(03/972/1441/21, 1768); Domingos da Costa Braga, natural da freguesia de Santa Maria de Rendufe, termo da
cidade de Braga (INVENTÁRIOS, 04/1575/2044/02, 1793); João da Maia Braga, natural da cidade de Braga,
batizado na freguesia de São João de Souto (INVENTÁRIOS, 04/1765/2235/04); Manoel Pinheiro Braga, natural
da freguesia de São Salvador de Lamenha, termo do Porto, Arcebispado de Braga. Curiosamente tinha um botequim
com jogo de bilhar, em 1810 (INVENTÁRIOS, 04/1708/2178/03); Antônio José Álvares de Azevedo, natural da
Freguesia de São João, termo de Guimarães, Arcebispado de Braga (INVENTÁRIOS, 04/1709/1614/08); João
da Silva Barbosa, oriundo da Vila de Viana do Minho, Foz de Lima (09/1716/2186/01); João Batista de Araújo
Bastos, capitão do brique Sitio Americano, vindo da Costa da Mina, estando a bordo gravísimamente molesto, fez
o testamento. Era natural de Cabeceira do Basto, Província do Minho, Arcebispado de Braga (INVENTÁRIOS,
05/1707/2177/05); João Nunes Ribeiro, natural da freguesia de São Veríssimo de Novogilde, Bispado do Porto
(INVENTÁRIOS, 05/2192/2661/07); José Antônio de Sá Barreto, natural da Vila de Viana do Minho, Arcebispado
de Braga (04/1743/2213/08); Antônio José Pinto, natural da freguesia de N. Salvador de Trabanca, do Arcebispado
de Braga (05/2152/2621/03); João Manoel Barbosa, natural da freguesia de São Salvador de Rendufe, termo da
vila de Ponte de Lima, Arcebispado de Braga (INVENTÁRIOS, 04/1749/2219/03); Antônio José Pereira Arouca,
natural de Arouca, Bispado de Lamego (INVENTÁRIOS, 04/1717/2187/02); Manoel José da Silva, natural da
freguesia de Lessa da Palmeira, junto a Matozinhos, Bispado do Porto (INVENTÁRIOS, 04/1507/1976/08).
Os escravos e os ofícios mecânicos na Bahia-Brasil 331
28 Muitos dos negros ou pardos, engajados na tropa, já libertos ou escravos, participaram do movimento considerado
como Conspiração dos Alfaiates, de 1798 (APEB, 1998, 2v.), que era muito mais um movimento decorrente das
influências da Revolução Francesa, em que os soldados, especialmente os pardos e negros, lutavam pela igualdade,
sobretudo na carreira militar e seu respectivo soldo. Dentre os 33 presos havia: 11 escravos, 5 alfaiates, 2 dos quais
foram exemplarmente enforcados (João de Deus do Nascimento e Manoel Faustino dos Santos Lira), 6 soldados
da tropa de linha, 3 oficiais militares, 1 negociante, 2 ourives, 1 bordador, 1 pedreiro, 1 cirurgião, 1 carapina e 1
professor (ARAÚJO, 2004). Ao contrário do que é apregoado, foi mais um movimento precursor da liberdade dos
escravos do que de Independência, visto que os processo sobre o movimento, em momento algum mostram que
os acusados tinha noção do tamanho do território da Bahia, muito menos do Brasil, para falar em Independência.
Ver FLEXOR, 2004: 203-204.
29 Segundo o mesmo autor Florentino (TOLEDO, 2006), escravos foram as maiores importações brasileiras. Um comércio
de brasileiros, independente da Metrópole.
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chilimane (6), calabar (5), gabão (2), fulanin (2), tulavin (1), catabá (1), mondobé
(1), cotocori (1), cassange37 (1), cambari (1), maguim (1), agomé (1), gabarinda (1),
estes últimos em unidades e todos já do século XIX.
Desde muito cedo houve a distinção das cores de pele38, provenientes da mistura
com brancos ou com índios e as crianças nascidas no Brasil, descendentes de pais de
origem africana. A toda a primeira geração de descendentes de africanos chamavam
crioulinhas ou crioulinhos (309), mantendo essa diferenciação até a idade adulta,
quando eram denominados crioulas ou crioulos (16), mais numerosos somente nos
fins do século XVIII e princípios do XIX. No ver de Soares39, o ser crioulo era uma
condição provisória que dizia respeito apenas a uma geração de cada descendência
e, no pensar da autora decorria daí, talvez, o fato de não constituir um grupo estável e
com interesses comuns. Por haver grande miscigenação, não houve a persistência dos
crioulos como na América hispânica.
Pardo ou parda (103) designava a mestiçagem de branco e negro e em número
mais crescente a partir dos anos de 1790. Mulatinhos ou mulatinhas (48), mulatos
ou mulatas (3), foram correntes a partir dos meados do setecentos e diziam respeito
à mistura de pardos por parte de mãe e pardos por parte de pai, o que equivale dizer,
descendentes, de ambas as partes, de mestiços de pretos e brancos. Oliveira (1998,
p. 69), tratando de libertos, na segunda metade do século XIX, coloca pardo como
sinônimo de mulato, que a documentação consultada desfaz, fazendo distinção
entre as duas designações. Karasch40 também dá pardo como sinônimo de mulato.
O viajante alemão Meyer dizia que os pardos do Rio eram um grupo distinto que se
orgulhava de ser pardo. Acrescentava que mulato era designação menos polida, usada
pelos senhores como insulto.
Soares notifica que os pardos não passavam de 10% da escravatura baiana. No
universo pesquisado, entre 1730 e 1830, chegou-se apenas a 5%. A documentação,
claramente, faz distinção entre pardo e mulato, indicada pelo grau de mestiçagem.
Os mulatos eram vistos como brancos. Na revolta de 1814, segundo Silva, o principal
alvo de ataques eram os brancos e mulatos. Raramente usavam a designação negro41,
aparece apenas o registro de três pretas, na década de 1790.
Vilhena, na virada do século XVIII para o XIX, via os pardos e mulatos, e por vezes
os crioulos, com muito maus olhos, como causadores de assassinatos de brancos, dos
maus costumes, …mulatos perniciosos, soberbos e vadios,…, prevendo que as grandes
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