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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS


DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
TH522 – HISTÓRIA DO BRASI – T26 (2020.2)
DOCENTE MARGARETH DE ALME (IDA GONÇALVES
DISCENTE SULAMITA F. R. LOPES 2016265548
.

Relatório

Luiz Felipe de Alencastro

Capítulo 1: “O aprendizado da Colonização”

O trato dos viventes: formação do Brasil no Atlântico Sul

São Paulo, 2000.

ALENCASTRO, Luiz Felipe de. O aprendizado da colonização. In: ________. O trato dos
viventes: formação do Brasil no Atlântico Sul. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p.
11-42.

Video: “Brasil e África no Atlântico Sul”

Organização: Programa de Pós Gradução em História da Universidade Federal de Goiás.

BRASIL E ÁFRICA no Atlântico Sul. Apresentação de Luis Felipe de Alencastro, 2017.


Parte I, 1 vídeo (1:01h). Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=zPN7v7rMj6g&list=LL&index=2&t=9s. Acesso em: 20
jun. 2021.

A perspectiva geral do capítulo em questão é voltada para a exposição e análise dos


conflitos envolvendo os colonos e a Coroa portuguesa, em relação ao controle desta última
não somente sobre o excedente comercial - que muitas vezes era extraviado das correntes
metropolitanas no ultramar ou consumido pelos próprios colonos -, mas também da
manutenção e fiscalização da função dos colonos nas terras conquistadas: fazer jus ao
propósito da colonização. Nesse sentido, Alencastro expõe os enredos nos quais se
desenvolvem os métodos empenhados pela monarquia portuguesa, a fim de manter a sua
política ultramarina, uma vez que seu equilíbrio fora comprometido pelo crescimento social e
econômico dos colonos e negociantes que compunham, por sua vez, uma nova força
emergente. O autor explora diversos aspectos dos impasses configurados pela coexistência
dessas forças que se contrapõem: uma tentando impor sua política colonial em terras
distantes, e outras buscando sua ascensão econômica e poder driblando os preceitos da
primeira. De maneira geral, ele aborda as características mais distintas entre as colônias e o
modo como o colonialismo europeu se desenvolveu em cada continente.

Alencastro descreve dois exemplos de colonização que apresentam conflitos


semelhantes entre colonos, jesuítas e a Coroa, para mostrar como o intercâmbio marítimo
surgiu como chave para esta última retomar as rédeas da colonização. A começar pelo
exemplo hispânico, com a finalidade de aproximar os dois casos, ele apresenta o caso da saída
empreendida pela monarquia vigente na América espanhola, mais precisamente no Peru, ao
empregar as Leyes Nuevas (1542-43), dando fim às Encomiendas com a finalidade de
restabelecer o domínio sobre os nativos com base numa relação de vassalagem, rompendo
assim com as condições de feudatários dos colonos. Contudo, com a revolta que isso gerou
nos governantes locais, fez-se necessário o estabelecimento de um acordo entre as parte.
Afora isto, o que determinou a consistência do projeto imperial espanhol foi o fato de o Peru
ter sido incluído na rede comercial metropolitana, após a descoberta das minas de Potosi, em
1545. O segundo exemplo apresentado pelo autor foi o caso de Angola, cujo governo era
responsabilidade de Paulo Dias Novais, que obteve a concessão da conquista como capitania
hereditária em 1571. Pouco após a batalha de Alcácer Quibir, Novaes concede terras e nativos
aos colonos e jesuítas (amos), num sistema econômico que consistia na captação de tributos
da população local, os ambundos, e no controle total dos chefes nativos, os sobas – que
poderiam ser exportados para a América como forma de quitação de débito. Diante disso, a
Coroa recupera o domínio da colônia por meio da extinção da capitania hereditária e o sistema
dos sobados, e restabelece o controle total a partir da concessão do Asiento (1594-1640), que
lhe garantia o direito ao monopólio do fornecimento de africanos escravizados para toda a
América espanhola. Essa articulação permite á Coroa o avanço da conquista africana, além de
reduzir a atuação dos colonos.

Outra situação conflitante passível de observação é a tentativa de assentamento


comercial da Coroa nas margens do Oceano Índico e a condução de seus produtos para a
metrópole, através da Rota do Cabo. O autor explica que o problema se inicia já entre os
comerciantes chamados casados, situados em Goa, e os negociantes itinerantes, os solteiros.
Os primeiros, a fim de preservar seu controle das trocas comerciais, empreenderam esforços
para obstruir a atuação dos negociantes lisboetas e seus representantes. Foi fundado, assim,
um Tribunal da Inquisição de Goa, em 1560, decorrente de acusações de complô entre os
negociantes e a antiga organização judaica de Cochim. Pouco mais tarde, a Coroa faz uma
concessão aos capitalistas de Lisboa: o monopólio do anil (1587). Todavia, a ordem tributária
imposta pela metrópole não garantiam a fidelidade dos funcionários régios. Alencastro
argumenta que, diante da grande opulência que o comércio indo-asiático representava, as leis
da metrópole não se faziam cumprir. Sendo sim, colonos apropriavam-se dos excedentes
comerciais, constituindo uma força econômica que evoluía fora da rede metropolitana.

O autor elucida também a fragilidade da atuação da monarquia lusitana em


Moçambique. Os incorporavam feudatários num sistema de prazos, recebendo concessões de
terras do imperador Monomotapa, pagando tributo à Coroa e recebendo de seus vassalados
do povo tonga pagamentos em marfim e milho. Entretanto, a soberania portuguesa é
sublimada diante de ataques ao Monomotapa, amparados na guerra justa. Em termos
culturais, os colonos não se sobrepõem aos nativos, pelo contrário, incorporam seus
elementos e são africanizados. No âmbito das trocas comerciais oriundas do tráfico, os
portugueses não conseguem direcionar seu fluxo para dentro de sua rede no ultramar, elas
permanecerem voltadas para o Norte e Leste. A dominação portuguesa tanto se retardou, que
somente em 1756 que Moçambique recebe a primeira cobrança oficial de exportação de
escravos. Ademais, sua relevância consistia ainda na exportação do marfim para a Europa e
Ásia, e ouro para Goa, Guzerate e Canará, e também no seu porto de escala na rota da Índia,
onde os portugueses desembarcavam para esperar as monções cessar. Com o tempo, a Coroa
modifica as regras de aliança e concessões hereditárias dos prazos. Em 1626, por meio do
contrato de enfiteuse, é determinado que o prazo seria concedido em linha feminina, sendo
necessário que o prazeiro que se casasse com a herdeira fosse um reinol ou filho de um. O
prazo só era válido por três meses para a mesma família, no entanto, podia ser renovado e isso
era de interesse da Coroa. O firmamento desse pacto tinha como objetivo interromper o
ascenso dos cafres que se apropriavam das terras. Contudo, esse sistema não garante a
absoluta soberania de Lisboa na região moçambicana: muitos prazeiros mantiveram maior
relação de dependência por líderes nativos do que com a própria Coroa, como esclarece o
autor. Até que as redes metropolitanas consigam enganchar a colônia moçambicana apenas
dois séculos mais tarde, Moçambique segue com uma colonização independente a partir de
1752, em detrimento das tentativas de controle lusitano.

Voltando ao início da era das descobertas, Alencastro observa fatores determinantes


dos sistemas colonial e imperialista europeus, desde o momento de criação das capitanias
hereditárias (1534) à criação do governo geral (1549), que tinha como objetivo centralizar o
poder de todas as capitanias concedidas e aplicar as diretrizes econômicas do sistema
escravista. O autor alega que, a partir disto, é possível conceber a formação do Brasil num
contexto “aterritorial” e argumenta que, até meados (e ainda depois) do século XVII, a costa
Leste-Oeste brasileira não integrava o sistema negreiro do Brasil, enquanto Angola, situada
no outro lado do Atlântico, estava diretamente ligada a ele. Desse modo, a afirmação disposta
no prefácio do livro se faz pertinente, uma vez que preconiza que “a colonização portuguesa,
fundada no escravismo, deu lugar a um espaço econômico e social bipolar, englobando uma
zona de produção escravista situada no litoral da América do Sul e uma zona de reprodução
de escravos centrada em Angola.” (p. 9)

Na parte dedicada aos reparos da metrópole, Alencastro trata de elucidar os


acontecimentos concernentes à ideia que deu o título ao próprio capítulo. Em outras palavras,
é nessa parte que ele mostra a forma como que a Coroa encontrou de colonizar seus próprios
colonos. A fim de restringir a autonomia conferida aos colonos pelas concessões régias, a
Coroa impõe o exclusivo colonial em 1580, que previa o monopólio da Coroa sobre o
comércio ultramarino. Além disso, outra investida de controle foi a restrição de povos
estrangeiros na colônia, em 1591. É instaurada, assim, a presença da instituição mais poderosa
representativa dos ideais da Coroa: a Inquisição. Por meio da doutrinação e da coerção, ela
limitou a autonomia dos negociantes subversivos às diretivas do rei e fez-se estabelecer a
política imperial na colônia. Mais ainda, a Inquisição representava a máquina devoradora dos
comerciantes judeus, como bem esclarece o autor. Ele descreve, ao longo do texto, as
sucessões de estragos oriundos da execução do poder inquisitorial na metrópole. Para além da
atuação metropolitana, o Santo Ofício se fará presente no Brasil e na Angola, voltada
principalmente para os judeus e à repressão a de mercadores do Atlântico Sul que, acusados
de judaísmo, eram levados à metrópole para a devida punição. É desse modo que o sistema
imperialista português se consolidou, abarcando os métodos que fazem convergir a
centralização do poder ante o povoamento da colônia, o exclusivo colonial e o sistema de
vassalagem nos comércios dos cristãos novos. Além disso, o sistema escravista que impedia o
cativeiro indígena em benefício da produção com mão de obra de escravizados africanos,
tornou possível a manutenção da soberania da Coroa portuguesa nas políticas do tráfico
negreiro no ultramar e a dependência direta de seus representantes nas colônias. Vale ressaltar
um ponto importante esclarecido pelo autor: o tráfico negreiro não limitava-se a questão
meramente economicamente, mas sim de uma configuração da política portuguesa, que
consistia na abrangência dos aspectos demográficos, sociais e políticos da América
Portuguesa. Para explicar essa unidade do imperialismo português no Atlântico Sul,
Alencastro esclarece a questão dos ventos e correntes, reiterando isto em sua palestra sobre
Brasil e África, explicando assim como se davam as conexões entre as dioceses das costas sul
americana e africana. A exemplo das dioceses do Rio de Janeiro, Olinda, Luanda, Angola e
São Tomé, todas elas subordinadas ao arcebispado de da Bahia, isso por conta da facilidade
de navegação, como ele mostra nos mapas do site Slave Voyages. Além disso, como
informado no próprio capítulo, Alencastro menciona também os dados estatísticos do tráfico
negreiro, das trocas de Brasil e Angola, concluindo que o povo brasileiro é nada menos que
“uma população luso-africana”.

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