Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
BHILA, H.H.K. – A região ao sul do Zambeze, História Geral da África V, organizado por
Bethwell Allan Ogot, capítulo 22.
2. Origem e Formação dos prazos
E. RODRIGUES
Prazos
Foi na segunda metade do século XVI que os portugueses estabeleceram no Vale do Zambeze
uma nova instituição – os prazos da coroa. Os prazos da coroa foram inicialmente quer terras
conquistadas por aventureiros, soldados e mercadores de missanga, à testa de exércitos de
cativos, quer terras que chefes locais lhes cederam em troca de saguates ou de ajuda militar
contra chefes rivais. Pode-se sustentar que os prazos nasceram com a penetração portuguesa no
vale a partir de 1530.
Porém, os prazos que muitos historiadores pretendiam ver como a primeira forma de colonização
portuguesa em Moçambique e particularmente no vale do Zambeze, acabaram sendo
essencialmente bolsas de escoamento de mercadorias (ouro, marfim numa primeira fase e de
escravos numa segunda fase) que aproveitaram o rio Zambeze como via natural.
Todavia, os prazos foram o resultado do cruzamento de dois sistemas sociais de produção: um
pré-existente na sociedade Chona, com dois níveis o dos camponeses das mushas vivendo num
regime de relativa autarcia e o da aristocracia dominante formada pelos mambos e fumos e outro
sistema que se sobrepôs ao primeiro composto pelos prazeiros (mercadores, ex-soldados
desertados, fugitivos que cumpriam penas de degredo), elite dominante e por exércitos de cativos
guerreiros, os chamados A-chicunda. Por outras palavras, os prazeiros mantiveram o sistema
social anterior.
3. Actividade Económica
O comércio de ouro e o marfim configurou a base da economia dos Prazos da coroa até finais do
século XVIII e dos escravos mais tarde. Os camponeses das Mushas tinham a seu cargo a
produção material de subsistências canalizadas parcialmente para a aristocracia prazeira através
da relação de produção expressa no mussoco, uma renda em géneros. Porém, milhares de cativos
alimentados pelos camponeses garantiam a segurança militar dos Prazos e o livre escoamento
dos produtos excedentários dos camponeses. A esses cativos eram conhecidos por A-chicundas.
Os A-chicundas garantiam a defesa dos Prazos, organizavam as operações de caça aos escravos
nos territórios vizinhos e cobravam impostos e estavam divididos em regimentos
chamados Butacas, (herança). Havia dentro dos Prazos um grupo de mercadores negros
especializados designados Mussambazes. Havia ainda uma espécie de inspectores que residiam
junto dos Mambos e Fumos que davam informação regular aos prazeiros, conhecidos
por Chuangas. Há que referir a um grupo de cativas organizadas em colectivos de trabalho
designados por Ensacas, cujas chefes destas ensacas conhecidas por Niacodas.
“De salientar que nos prazos primeiramente a actividades de comércio de ouro e marfim foi a
principal e mais tarde começaram a desenvolver o comércio de escravos ao longo da costa.
Os prazeiros controlavam o comércio de ouro e marfim com a ajuda dos escravos onde os
mesmos eram obrigados a caçarem os elefantes e a escavarem o ouro que era comercializados e
mandado para o comércio com a costa, uma vez que os prazeiros já não tinham a cultura
portuguesa e os mesmos tinham adaptados a cultura africana”.
4. O subtema escolhido foi Donas
Parecer de Rodrigues
As donas, enquanto categoria social que identifica mulheres de grande riqueza e poder,
decorrentes da posse de terras, do comércio e do domínio de pessoas, existiram um pouco por
todo o império português moderno. Porém, as donas ficaram fundamentalmente associadas às
detentoras de prazos do vale do Zambeze. Notando-se já como possessoras fundiárias salientes
em Seiscentos, as mulheres tornaram-se, no século XVIII, as principais titulares de terras. Em
1798, por exemplo, detinham 65% dos títulos de aforamento. No contexto de uma colonização
fundamentalmente masculina, elas acederam às terras em resultado da elevada mortalidade dos
europeus, de estratégias familiares para estabelecer alianças com recém-chegados e de opções
políticas para fixar reinóis. Numa região de África onde as mulheres detinham posições de
autoridade nas estruturas políticas, sociais e religiosas nativas (matrilineares ou patrilineares),
as donas puderam construir um imenso poder baseado não apenas nos bens que detinham, mas,
ainda, no controlo das populações africanas, incluindo aí escravos e livres. Dadas as
características da colonização de Moçambique, estas mulheres eram, maioritariamente, mestiças
(descendentes de africanas e de europeus e goeses). Algumas goesas, sobretudo no século XVIII,
tiveram, igualmente, um papel relevante na construção do estatuto das donas. Geralmente, estas
mulheres partilhavam aspectos culturais africanos e falavam mal o português. Sucessivamente
viúvas, muitas contraíam múltiplos casamentos ao longo da vida.
Segundo Bhila
As formas de autoridade pública que as mulheres exerceram nas sociedades africanas na área do
rio Zambeze parecem terem influenciado o poder que elas construíram no contexto da
colonização portuguesa do vale.
A designação “prazos” aplicava-se às terras que, tendo sido agregadas à coroa portuguesa, por
conquista ou tratados de vassalagem com os chefes africanos, eram cedidas sob um regime
jurídico que combinava as normas da enfiteuse com a concessão de bens da Coroa.
As mulheres tornaram-se, também, senhoras dos prazos, inicialmente, de uma forma transitória,
na qualidade de sucessoras de parentes, e, ainda no século XVII, por direito próprio, enquanto
detentoras das cartas de aforamento passadas pela Coroa portuguesa.
O reconhecimento por parte da Coroa portuguesa da titularidade dos prazos nessas mulheres
baseava-se no pressuposto de que os seus maridos seriam os cabeças-de-casal, conforme o
estipulado pela legislação portuguesa. No entanto, enquanto consorciadas, elas tinham uma
participação activa na gestão das suas casas e assumiam-na na totalidade depois de viúvas, uma
situação frequente, dada a elevada mortalidade dos homens europeus. Essas mulheres ficaram
conhecidas por donas, uma forma de tratamento que se difundiu a partir das primeiras décadas de
Setecentos e que indicava a sua pertença à elite local.
4 – b). Compare os aspectos semelhantes e diferentes sobre o subtema entre os três autores.
As semelhanças existentes nos três autores sobre o tema escolhido é que nos três textos
demonstram-se as mulheres como sendo detentoras de um certo poder nos prazos.
No contexto de uma colonização fundamentalmente masculina, elas acederam às terras em
resultado da elevada mortalidade dos europeus, de estratégias familiares para estabelecer alianças
com recém-chegados e de opções políticas para fixar reinóis. Numa região de África onde as
mulheres detinham posições de autoridade nas estruturas políticas, sociais e religiosas nativas
(matrilineares ou patrilineares).
Nos três autores que retratam o assunto das donas de terras nos prazos não a nenhuma
divergência entre eles apenas apresentam pontos convergentes.
Com efeito, em função das relações de género, as quais estavam embebidas nos laços de
parentesco e também variavam segundo os contextos culturais, incluindo religiosos, havia papéis
que eram preenchidos unicamente por homens, enquanto outros cabiam apenas a mulheres e,
finalmente, alguns recaíam indistintamente em homens e mulheres. Como esses papéis se
alteraram ao longo do tempo e se diferenciaram, ou não, em função do género é uma questão que
necessita de ser aprofundada.
O papel dessas mulheres foi culturalmente específico e, por isso, não assumiu a mesma
configuração em todas as sociedades aqui referidas.
Na administração central dos estados, as mulheres não tinham apenas influência. Elas actuavam
em algumas áreas como governantes de direito próprio e não como esposas de soberanos ou na
falta de herdeiros ou regentes masculinos, o que era, provavelmente, um entre outros
mecanismos de balancear o poder dos soberanos.
Provavelmente, a maior diferença entre as sociedades de parentesco patrilinear e matrilinear
consideradas neste texto residia nas funções simbólicas e nas formas de autoridade religiosa que
as mulheres assumiam mais notoriamente nestas últimas sociedades, conquanto o poder
espiritual das mulheres, sobretudo das mais velhas, também existisse nas primeiras. Nas
sociedades de parentesco matrilinear, as mulheres eram representadas intimamente ligadas à
maternidade social, como fundadoras e guardiãs das linhagens, desempenhando papéis religiosos
que se articulavam com formas de autoridade pública, actuando, enfim, como co-governantes.
5. A Coroa portuguesa concedia o direito dos senhores aos prazos, sendo esta relação
essencialmente jurídica, e acarretando funções militares e económicas no terreno.
Não obstante, o seu quotidiano encontrava-se ligado a África e ser prazeiro implicava
importantes funções sociais junto do seu campesinato nativo, como é exemplo a execução da
justiça e das funções rituais. Segundo Ernesto Vilhena, para a população, o prazeiro era “o amo,
juiz, tutor de todos os actos da sua vida, e até o chefe que os conduzia aos combates”. Mais do
que uma verdade absoluta, esta afirmação identifica a extensão das funções do enfiteuta junto
das estruturas locais presentes no seu terreno.
A sociedade dos prazos do Zambeze nos séculos XVII e XVIII engloba dinâmicas sociais que
abrangem um tempo e espaço demasiadamente latos para serem generalizados como uma
realidade única. No mapa geopolítico da região, independentemente da presença portuguesa, as
voláteis chefaturas africanas apresentavam uma estrutura de governação diferente dos modelos
de matriz europeia. Estes reinos, com fronteiras mais fluídas e importantes convulsões políticas,
muito influíram na evolução dos territórios portugueses, tendo o seu estudo acompanhado
também as dinâmicas da região. São exemplo destes momentos definidores a invasão
Changamire no final de seiscentos e a massificação do tráfico de escravos em setecentos. Se o
primeiro momento alteraria para sempre a geografia dos prazos, o segundo seria definidor da
ascensão de novos prazeiros.
A política mais usual da administração era, porém, tentar casar essas mulheres, sobretudo as
detentoras de largos tratos de terras e de inúmeros dependentes, com maridos julgados
apropriados para gerir os seus bens. Evidentemente, pretendia-se também conseguir para estes
homens, geralmente ligados aos governantes por laços de parentesco ou de clientelismo, uma
situação económica e social adequada. Por vezes, a intervenção das autoridades falhava quando
as candidatas casavam secretamente e à revelia das directivas de governadores e eclesiásticos.
NB: para os autores por mim trazido neste estudo todos são unânimes em afirmarem que os
prazos como eram independentes com cultura não portuguesas e estavam mais submissas a
culturas africanas assim conseguiam dominar quase o mundo.