(CASTRO, Manoel Manrique. História do Serviço Social na América Latina. São Paulo: Cortez, 2000). CAPÍTULO I Como o Serviço Social surgiu na América Latina? A primeira escola de Serviço Social na América Latina surge no Chile em 1925, por nome: Alejando Del Río. A data da primeira escola marca a institucionalização do Serviço Social neste continente, sob uma forte influência – quase um reflexo – europeia. Entre 1925 e 1940 foi tributário em especial do influxo belga, francês e alemão, posteriormente, recebendo a influência quase exclusiva dos EUA. A primeira escola é fundada por um médico, que entendia na época que poderiam cercar-se de sub-profissionais para garantir o atendimento médico em todas as suas frontes sem exaurir-se. Logo, o assistente social é convocado para participar desse movimento. Em seguida, os profissionais que irão requisitar o “apoio” das assistentes foram os advogados, seguidos pelas instituições de caridade e filantropia. Há três fases sucessivas que marcam sua gênese: Assistência Social, Serviço Social e o Trabalho Social. A Assistência Social desenvolve um projeto de fazer o bem por meio da técnica, é o exercício da caridade. O Serviço Social possui preocupações técnico-científicas de ajustamento dos indivíduos, nessa etapa, há uma elevação do nível do estatuto profissional, uma psicologização e um tecnicismo neutro e asséptico. O surgimento do Serviço Social não está ligado diretamente à luta de classes e ao desenvolvimento das forças produtivas, ele se deu sob a dependência de forças derivadas de outros meios, como a requisição por outros profissionais. “Como pôde nascer o Serviço Social latino-americano se este foi, por largos anos, um mero reflexo do Serviço Social europeu e, depois, do norte-americano? ”. (p. 18). O surgimento do Serviço Social a nível continental não pode ser simplificado a um evento, ao surgimento de uma escola em um único país desse continente, sem correr o risco de ser insuficiente para dar conta do complexo fenômeno que se trata. A década de 1920 no Chile é marcada pela emergência de novas classes sociais, em razão da integração das economias latino-americanas ao mercado mundial capitalista. Em contrapartida, é um momento de organização da classe trabalhadora em prol de melhores condições de vida e de trabalho. Nesse aspecto, o Estado se colocava a partir de uma “aliança” de classes, que considerava aos trabalhadores a impossibilidade do atendimento integral de suas requisições. O desenvolvimento das forças produtivas e o acumulo do capital no Chile trouxe todas as sequelas das consequências desse desenvolvimento: “Miséria, crescimento urbano caótico, migrações de camponeses expulsos de suas terras, etc., instauraram o solo fértil e propício para a emergência e a proliferação de agentes encarregados de trabalhar estes fenômenos – agentes entre os quais, naturalmente, contam-se os assistentes sociais”. (p. 20). Não é à toa que um médico, posteriormente, um corpo de advogados, encabeçam a iniciativa de uma escola de Serviço Social. No contexto tratado no Chile, eram esses profissionais que dominavam as ações estatais nas instituições. Considerando as condições de vida e de trabalho da classe trabalho, e a negação do capitalismo em dar respostas a esse fenômeno, foi quase natural que os profissionais buscassem outros meios que fugiam às suas atribuições e competências. O surgimento de novos fenômenos diante do desenvolvimento e da acumulação do capital requerem o trato diferenciado e mais preparado da ação social sob as consequências desses fenômenos. Entretanto, não surgem novas forças de ação social para excluir as anteriores. Ora, a nosso juízo, se se recorreu à Europa como modelo para legislação trabalhista, para a previdência social ou para a assistência pública, foi porque existia uma compatibilidade entre os projetos de classe que algumas faixas das classes dominantes sustentavam e o conteúdo e a mensagem das fórmulas de ação importadas. Era este nível de identidade que criava as condições para que se visualizassem naquelas fórmulas um mecanismo de ação aplicável às realidades de nossos países. (p. 21). Não é possível compreender o nascimento da profissão sob a ótica exclusiva do espírito visionário de Alejando Del Río, é preciso considerar o processo amplo em que isso se insere, reconhecendo a importância de sua iniciativa. Boris Lima acentua que o Serviço Social dá o primeiro passo para se tornar científico quando começa a questionar as razões e bases dos fenômenos que chegam ao profissional como demandas. O que demonstra uma visão endógena do desenvolvimento da profissão. CAPÍTULO II O surgimento da primeira escola de Serviço Social na América Latina cristaliza uma situação prévia e traz mudanças significativas para a própria profissão. As formas de organização das classes trabalhadoras foram impondo novas exigências. Em resposta, as classes dominantes foram buscando enquadrar as reivindicações a legislação burguesa, da qual o Estado é o encarregado do controle. O objetivo era tornar a luta pelos direitos uma concessão da burguesia. Entretanto, as formas de controle vão se tornando insuficientes e carecendo de maior complexidade. Ao desenvolverem novos métodos de controle e de intervenção na luta dos trabalhadores, a burguesia se instaura no campo ideológico, sob mecanismos que possibilitam a ampliação do capital. É esse o ponto central do surgimento da profissão, sob a necessidade de desenvolvimento de novos mecanismos. A vida do proletário começa a ser reorganizar em prol de sua condição de trabalhador, de vendedor da sua força de trabalho: “Os hábitos, a organização do consumo de toda a economia doméstica, o papel da mulher no lar, o uso do tempo livre etc., todos esses aspectos passam a organizar-se em consonância com a sua condição básica de proletário”. (p. 25). Esse processo de adaptação é acompanhado e moldado por profissionais de diversas áreas. Como os assistentes sociais, que moldavam e organizavam a vida do proletariado sob as exigências da burguesia. A relação entre o Serviço Social e a Igreja também precisa ser reconhecida sobre as mudanças que o sistema impôs ao catolicismo, sobre as práticas caritativas. Tudo se molda e se transforma sobre esse sistema. Os elementos que mais colaboram para o surgimento do Serviço Social têm sua origem na Ação Católica – intelectualmente laica, estritamente ligada à hierarquia católica –, que propugna, com visão messiânica, a recristianização da sociedade através de um projeto de reforma social. A Ação Católica busca recuperar a hegemonia católica, adentrando espaços do Estado e lutando contra as ideias liberais e comunistas. Os dogmas emitidos pela Igreja tinham objetivos mais profundos do que apenas levar a verdade, entre eles, era manter-se no centro do poder, mesmo em meio a luta de classes. Por isso, monopolizaram o conhecimento por muito tempo, favorecendo ora um e ora outro, desde que tudo sempre girasse em torno de si própria. A Igreja estava perdendo seus espaços em razão das modificações provocadas pelo capital, tornando os trabalhadores – e os burgueses – adeptos da ideologia marxista ou das ideias liberais, com isso, para acompanhar esse processo, a Igreja difundiu ainda mais seu alcance: “Nestes, cabe destacar o ensino confessional, os centros de estudo, a Ação Católica, as universidades, os sindicatos católicos, as novas formas de ação paroquiais, etc”. (p. 27). As encíclicas papais são uma das normas genéricas para o exercício da fé católica. Durante a institucionalização do Serviço Social no meio universitário, duas encíclicas papais tiveram maior expressividade entre a categoria: Rerum Novarum (1891) e a Quadragesimo Anno (1931). A encíclica Rerum Novarum é dividia entre as soluções: do socialismo e da Igreja. Ela começa deixando clara a sua intenção de versar sobre a Questão Social, entretanto, impõe a solução de suas expressões como atribuição exclusiva da Igreja, em razão desta última ter em mente o bem comum e coletivo. Se coloca criticamente contra a ganância da burguesia, embora seja favorável a permanência da propriedade, em uma posição claramente antissocialista: “De acordo com a encíclica, o direito à propriedade é um direito natural que procede da generosidade divina: quando Deus concedeu a terra ao homem – diz-se –, fê-lo para que a use e desfrute sem que isto se oponha, em qualquer grau, à existência humana”. (p. 28). Defendem que Deus deu a terra para os homens, mas não a repartiu para eles, deixando nas mãos das leis e vontade humana, a repartição e a dominância sobre ela. Assim, a encíclica, que data do último decênio do século passado, elude a desigualdade central que remete à exploração do proletariado e a sua incontornável brutalidade, mesmo que estas fossem tão cruas na Europa de então (como na América Latina de hoje) e mesmo que subordinação do trabalho ao capital não só acrescesse sofrimentos centenários, mas novos padecimentos que multiplicavam as denúncias à capacidade capitalista. (p. 29). Sendo a propriedade privada – segundo a encíclica – um bem divino e sagrado, o Estado, as formas de organização da sociedade e o próprio sistema de classes também se faz de acordo com a vontade de Deus, logo, se colocar contra isso é ir de encontro à vontade divina. Por essa razão, os católicos se colocam contra os socialistas, defendendo que não se trata de eliminar a propriedade privada e o Estado, mas de humanizar as ações dos proprietários capitalistas. Por isso, defendem que não há solução viável fora dos muros da Igreja. As demais entidades envolvidas, inclusiva as classes sociais, podem ser subsidiárias no processo de transformação. “Na sociedade civil não pode haver igualdade” [trecho da encíclica] (p. 29). Não só reconhecem a desigualdade como processo natural da humanidade e parte da vontade divina, mas enxergam ela como necessária para a variedade de talentos e ofícios. O sistema capitalista propõe uma visão de igualdade para a sociedade, é objetivo ideológico que todos – especialmente os trabalhadores – pensem estarem vivenciando pesos e medidas iguais entre as classes. O salário é o que é devido ao trabalhador pelo trabalho que possui, e por não ser detentor de nada além de sua força de trabalho; o capitalista se apossa da mais-valia por ser dono dos meios de produção e ter domínio sobre a própria força de trabalho. Os trabalhados designados pela encíclica para as classes sociais assim se designam: aos trabalhadores é aconselhado que não façam uso da força ao reivindicar seus direitos, que executem seu trabalho e não se oponham aos seus patrões; aos proprietários, é pedido que não sejam tão cruéis e insensíveis com os seus trabalhadores. Como já indicamos, a mensagem papal parte da ideia de que o operário faz uso de sua liberdade ao aceitar o jugo do capital. Juridicamente isto é certo, mas de trata de uma liberdade sem opção – a única maneira de exercê-la é entregar-se ao dono do capital, que se beneficia daquela “liberdade”. (p. 30). A encíclica assume um caráter eminentemente político ao se posicionar favorável ao consenso de classe. Estabelece a Igreja acima de todas as classes, consequentemente, de sua luta. A encíclica estabelece um papel ideológico e político para além da palavra divina e da caridade, assumindo um papel exclusivo no bojo da luta de classes. A Quadragesimo Anno (1931) é iniciada por um apelo aos católicos para que assumam a responsabilidade de educação cristã dos indivíduos, para livrá-los do paganismo e das mazelas ideológicas do mundo. Por ter sido desenvolvida em um contexto histórico de pós-Revolução Russa, Primeira Guerra Mundial e Crise de 1929, ela possui uma conotação mais radical do que a sua antecessora. A encíclica reconhece a importância do trabalho que vinha sendo desenvolvido pelos assistentes sociais e reforça a sua interligação com as doutrinas da Igreja. Tratar a luta de classes através da harmonia entre elas era prejudicial aos trabalhadores e vantajoso aos capitalistas. Ao se considerar as condições insalubres e violentas – para dizer o mínimo – de vida e de trabalho, sob a ótica do assistencialismo que era ofertado, disso resultava o bloqueio das lutas reivindicatórias e barateava ainda mais o valor pago à força de trabalho. “Realizada com profunda fé religiosa e dedicada caridade ao próximo, a distribuição de alimentos, de roupas, remédios, leite para crianças, etc [...]” (p. 35). O associativismo foi fomentado para que os trabalhadores assumissem cada vez mais a responsabilidade por sua subsistência (caixas de socorro e ajuda mútua) tornavam a atuação do Estado mais distante e favorecia aos capitalistas. O desenvolvimento de uma série de métodos de intervenção pela Ação Social foi possibilitando ao Serviço Social delimitar o seu próprio perfil profissional, bem como o perfil dos seus usuários e as demandas atendidas. Que em geral, culminavam em uma individualização e uma singularização dos problemas sociais. A doutrina social da Igreja pode se infiltrar na sociedade civil e demais polos pois as condições históricas prevalecentes no continente assim o permitiam. A burguesia entendia Igreja como uma medida de intervenção viável para atenuar os males sociais. CAPÍTULO III Na década de 1920, no Chile, o movimento operário passa por um meio processo de organização da classe trabalhadora. Nesse mesmo período, havia um clima de instabilidade política sob o país, em razão das intensas transformações do mercado e a pressão dos trabalhadores. O surgimento de todas as escolas de Serviço Social parte de duas iniciativas: pelo Estado ou pela Igreja. A primeira escola do Chile parte da necessidade de expansão estatal. A Escola Elvira Matte de Cruchaga, fundada em 1929, por Miguel Cruchaga, um notável homem público, possibilitou um grande investimento desde as suas bases. É interessante pensar o que levou a criação de uma segunda escola, quando a primeira tinha acabado de ser inaugurada. “O projeto da nova escola representava para a Igreja uma tentativa de responder – de forma complementar e não antagônica – à criação da escola de Del Río. É certo que ambas compartilhavam uma base doutrinária comum, como o atesta – entre outros aspectos – o estrito laço com o Serviço Social belga. Mas há diferenças”. (p. 39). A escola não se ateve a nenhum campo de atuação profissional específico, ampliando suas possibilidades de formação. Há uma intensa valorização da vocação, embora exija o desenvolvimento da ciência e da técnica como aliadas ao trabalho desenvolvido. “Ciência que oferece a compreensão dos problemas sociais e indica os meios para remediar os males; caridade, que dá o estímulo à ação desinteressada e generosa”. (p. 39). Enquanto isso, a escola de Del Río, embora estivesse sobre a direção de uma assistente social europeia, seguia os parâmetros definidos pelo corpo médico. A Escola Elvira Matte foi uma requisição da Igreja para que pudesse organização um Serviço Social dentro de suas próprias exigências. Nessa escola, os antecedentes das alunas eram tão importantes quanto a formação oferecida. Os requisitos eram: idade entre 21-35 anos, boa saúde, honorabilidade e recomendação paroquial, estudos em ciências humanas, apresentação de um texto manuscrito sobre a história de vida pessoal da aluna. A prática que orientava a seleção diferia conforme os casos, mas se direcionava sempre segundo um óbvio elitismo, de modo que quase só as “damas da sociedade” conseguiam preencher tais requisitos – e isto sem mencionar as taxas de matrícula e, ainda, todas as provas de uma sólida educação religiosa. (p. 41). A grade curricular era dividida entre as atividades teóricas e as práticas, sendo: Atividades teóricas: Atividades práticas: Religião, psicologia, pedagogia, Tratamento de caso individual, sociologia, econômica, legislação, encaminhamentos, técnicas de escritório, direito, instrução cívica, direito, ética estatística, primeiros socorros, cuidados profissional, anatomia e fisiologia, domiciliares a doentes, puericultura, higiene privada e pública, etc. nutricionismo, oratória, etc.
A ênfase nos conteúdos relacionados à saúde se dava pela proximidade entre o
Serviço Social e a Enfermagem, além dos problemas decorrentes das péssimas condições de salubridade em que viviam as classes trabalhadoras. A Escola propõe soluções aos problemas sociais para além das paredes da Igreja, focalizadas mais no âmbito do Estado. Isso é fomentado pela requisição de demandas crescente do Estado, como o desenvolvimento de estudos quanto à condição salarial de dada comunidade, etc. “Dada a magnitude do problema [pobreza extrema], em julho de 1931 o Governo criou o Comitê Central de Ajuda aos Desempregados, que passou a ser presidido, conjuntamente, pelo Ministério de Bem-Estar e pelo Arcebispo de Santiago”. (p. 45). “[...] as autoridades [...] dirigiram-se às escolas de Serviço Social existentes, solicitando sua colaboração. A resposta da Escola Elvira Matte de Cruchaga foi imediata e, em seguida, um numeroso grupo de estudantes e docentes lançou-se à ação”. (p. 45). É surpreende a rapidez com que a Escola consegue providenciar tarefas que deram subsídio aos problemas apontados pelo Governo, tornando a atuação cada vez mais notada e solicitada. A Escola passou a promover anualmente uma Semana de Conferências, que não contribuía para o processo de formação das alunas, mas fortalecia a atuação profissionais das assistentes. Possuíam uma bancada de pessoas importantes, que facilitava o permanente contato das profissionais com a Escola. A Escola Elvira Matte teve forte influência sobre a constituição e gestação das escolas ao redor da América Latina. O amplo alcance que essa Escola teve – diferente da Del Río – está na influência que obteve da Igreja Católica. Fomentada pela UCISS, a Escola Elvira Matte levava a bandeira do Serviço Social católico, demonstrando sua força ao se estabelecer em outros países da América Latina. “Trata-se, indubitavelmente, de uma instituição pioneira, que serviu como modelo a outros centros de formação”. (p. 50). As atividades desenvolvidas na Escola eram duais: diziam respeito ao enfrentamento das mazelas do capitalismo, embora entendendo-as como inerentes ao ser humano; e tratavam do próprio processo de expansão do Serviço Social como área de formação e atuação. A Escola Elvira Matte foi usada como um instrumento de poder. Não é possível explicar – ou compreender – o surgimento das escolas de Serviço Social sem levar em conta a participação decisiva da Igreja Católica. Como no Chile, o caso da atuação da Igreja no Brasil se deu pela perca exponencial da hegemonia católica, isso levou ao desenvolvimento de estratégia de captação dos fiéis, bem como colocou a Igreja em um acirrado jogo de contradições de classe. O ano de 1917 foi marcado no país pelo levante da classe trabalhadora contra o Estado. Um enorme movimento sacudiu a cidade de São Paulo e outras do interior, sob o pedido de redução da jornada de trabalho para 8 horas diárias e aumento de salários. Em 1918, as greves e movimentações da classe trabalhadora ganharam mais força, se estendendo para outras cidades do país, embora duramente reprimidos. Em 1922 o Partido Comunista Brasileiro foi fundado, com conquistas expressivas para os trabalhadores: legislação sobre habitação popular, criação das CAPs, etc. A partir de Revolução de 1930, a Igreja é convocada para a intervenção de uma forma mais ampla. A Igreja passa a exigir maior espaço de influência diante do Estado e consegue, em 1934, o catolicismo é considerada a religião oficial do país, sendo englobado como parte da grade de ensino básico nas escolas. O CEAS foi considerado como o vestíbulo da profissionalização do Serviço Social no Brasil – e aqui também, como no caso chileno, o trabalho de organização e preparação dos leigos se apoia numa base social feminina de origem burguesa respaldada por assistentes sociais belgas, que oferecem a sua experiência para possibilitar a fundação da primeira escola católica de Serviço Social. (p. 53). O CEAS tinha o objetivo de fortalecer o processo de formação das assistentes sociais, estabelecendo um padrão de estudos a ser alcançado, todo baseado na Doutrina Social da Igreja. A Ação Católica e a Ação Social foram as inspirações para a criação da primeira escola de Serviço Social no país, em São Paulo em 1936. A Escola tinha seu estudo baseado nas duas encíclicas papais: Rerum Novarum e Quadragesimo Anno. Que acreditavam na reforma das instituições e na melhoria dos costumes como a principal estratégia para a solução dos problemas sociais. Só assim se torna inteligíveis as incontáveis funções das assistentes sociais junto à família operária, em face do matrimônio, da educação e do cuidado dos filhos, da destinação do salário, dos menores delinquentes, da segurança social, dos enfermos – tratava-se de uma atividade para reformar e melhorar os costumes. (p. 55). A Escola do Rio de Janeiro surge também por influência da Igreja, na busca por livrar o povo das influências consideradas nocivas para o povo (liberal e socialista). A primeira Escola de Serviço Social no Peru foi fundada em 1937. Ela foi criada em conjunto com o Ministério da Saúde Pública, Trabalho e Previsão Social, quase que em conjunto. O surgimento da Escola está mais relacionado com a expansão das estatais do que com a demanda do setor privado. O surgimento da Escola não marca o surgimento da profissão, pois o Serviço Social já existia e se gestava no Peru, o que essa Escola traz é um salto para a profissão. 1929 Surge a Escola Elvira Matte no Chile; 1936 Surge as primeiras Escolas brasileiras e colombiana; 1937 Surge a primeira Escola no Peru e no Uruguai. “Molina sustentava a importância da assistente social porque ela, com delicadeza, poderia amenizar os conflitos entre operários e patrões – tarefa que cumpriria graças à sua aproximação à vida cotidiana dos trabalhadores e às suas necessidades”. (p. 62). Para a compreensão da Escola peruana é essencial a conjunção de dois elementos: a cooptação pelo Estado – a primeira dama era diretora da unidade – e a influência religiosa – ela era uma mulher profundamente devota. Nos primeiros anos de atividade das assistentes sociais, elas estiveram envolvidas com o enfrentamento das condições de salubridade pública, muito influenciadas pela área da medicina. “A equipe docente da escola constituiu-se, majoritariamente, por profissionais de reconhecido prestígio intelectual, que se salientavam por seu desempenho universitário, o que evidencia o respaldo recebido pela ESSP do meio intelectual burguês da época”. (p. 64). A Escola era destinada para as mulheres estudadas nas melhores escolas de Lima, filhas de burgueses, com fortes valores cristãos, e uma ânsia de colocar em prática as convicções morais no meio popular. A Escola reforçava essas convicções, munindo elas de um instrumental técnico que auxiliaria na viabilização de sua atuação. “A ESSP surgia como uma alternativa de formação para um apostolado que, na sua efetivação, ultrapassava os marcos da ação social da Igreja enquanto tal e que, ainda, correspondia às suas novas orientações para os leigos”. (p. 65). Além de garantir o “bem-estar” dos operários, essas profissionais contribuíam para melhorar a visibilidade da burguesia, muito ligada à repressão e a exploração das classes, as atividades benemerentes relacionadas às classes dominantes eram instrumentos de manutenção do poder, da ordem burguesa. “Assim enquadrado, o Serviço Social forjou uma força de trabalho plenamente disponível, que não exigia equivalências entre a atividade realizada e a remuneração salarial”. (p. 66). O catolicismo era a religião professada pelo Estado peruano, eles não tiveram blocos de poder opositor a isso, não tiveram religiões protestantes, e por isso, não tiveram que “reconquistar” sua influência no Estado, como foi o caso no Brasil. Isso facilitou a sua predominância na política, consequentemente, no processo de formação do Serviço Social no Peru. Claro que a presença constante da Igreja não foi – muito menos o é até hoje – inquestionável e permanente, ela foi se adequando as mudanças operadas dentro do Estado, especialmente aquelas advindas de um bloco de poder burguês mais sólido dentro do país. CAPÍTULO IV “Quando o lema de Monroe, “A América para os americanos”, converte-se de fato em “A América para os norte-americanos”< o pan-americanismo oficial não é mais que uma estratégia dos Estados Unidos para ganhar hegemonia no continente”. (p. 68). O triunfo do bloco de países – entre eles, os Estados Unidos – na Segunda Guerra Mundial, permitiu aos EUA finalmente se estabelecer sua hegemonia a nível mundial. O desenvolvimento de comunidade era a funcional ao projeto neocolonial, mantinha os países em desenvolvimento subjugados à lógica do capital internacional, facilitava o atendimento dos interesses próprios dos Estados Unidos, controlava as pressões reivindicatórias das minorias. “A identificação das necessidades e a alocação de recursos reduzem a questão social a problemas técnicos, construindo, a partir deles, uma fórmula central que contempla múltiplas variantes de intervenção profissional”. (p. 73). O desenvolvimento de comunidade mantinha uma estratégia de disseminar entre a população imagens favoráveis ao progresso econômico e social. Diante disso, entendiam a participação popular como uma peça-chave para o desenvolvimento. A ONU desenvolveu uma série de programas de aperfeiçoamento profissional, de alcance continental, para formar um contingente de profissionais homogeneamente qualificado, “especialistas em desenvolvimento”. “[...] converter-se em instrumentos de construção do desenvolvimento significava, para os assistentes sociais, conquistar o reconhecimento social que a profissão almejou por tanto tempo”. (p. 78). O assistente social é chamado para agir como um catalizador social, impulsionando a resolução dos problemas pelos próprios membros da comunidade, mas interferindo na identificação desses problemas e na captação individual deles. O agente profissional de transformação precisa ser capaz de sentir com as pessoas com quem trabalha as tensões do desequilíbrio cultural que deflagra. E deve mostrar e representar o tipo de equilíbrio essencial dentro da tensão necessária para a saúde mental e social numa cultura que está em desenvolvimento. (p. 79).