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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS VERNÁCULAS


SETOR DE LÍNGUA PORTUGUESA

COMPARAÇÃO ESTRUTURADA POR CONECTORES NOS MANUAIS DE


PLE: UMA PROPOSTA DE REVISÃO À LUZ DO FUNCIONALISMO

LUIZ HERCULANO DE SOUSA GUILHERME

RIO DE JANEIRO
FEVEREIRO DE 2020

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS VERNÁCULAS
SETOR DE LÍNGUA PORTUGUESA

COMPARAÇÃO ESTRUTURADA POR CONECTORES NOS MANUAIS DE


PLE: UMA PROPOSTA DE REVISÃO À LUZ DO FUNCIONALISMO

Luiz Herculano de Sousa Guilherme

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de


Pós-Graduação em Letras Vernáculas da
Universidade Federal do Rio de Janeiro como
requisito para a obtenção do Título de Doutor em
Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).
Orientadora: Prof.ª. Doutora Violeta Virginia
Rodrigues
Coorientador: Prof. Doutor Marcelo da Silva
Amorim

Rio de Janeiro
Fevereiro de 2020

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Comparação estruturada por conectores nos manuais de PLE: uma proposta de
revisão à luz do Funcionalismo
Luiz Herculano de Sousa Guilherme

Orientadora: Professora Doutora Violeta Virginia Rodrigues


Coorientador: Prof. Doutor Marcelo da Silva Amorim

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras


Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro como requisito para a obtenção
do Título de Doutor em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).

Em 10 de fevereiro de 2020.

EXAMINADA POR:

_________________________________________________
Presidente, Profa. Doutora Violeta Virginia Rodrigues
_________________________________________________
Coorientador, Prof. Doutor Marcelo da Silva Amorim – UFRN
_________________________________________________
Profa. Doutora Rosa Marina de Brito Meyer – PUC-Rio
_________________________________________________
Profa. Doutora Patricia Maria Campos de Almeida – UFRJ
_________________________________________________
Profa. Doutora Amanda Heiderich Marchon – UNINCOR
_________________________________________________
Prof. Doutor Marcos Luiz Wiedemer – UERJ
_________________________________________________
Profa. Doutora Gesieny Laurett Neves Damasceno – UFES, Suplente
_______________________________________________
Profa. Doutora Eliete Figueira– UFRJ, Suplente

Rio de Janeiro

Fevereiro de 2020

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SINOPSE

Análise e descrição da comparação estruturada por


conectores nos manuais de PLE. Investigação de
cunho qualitativo e de base teórico-metodológica
funcionalista.

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Comparação estruturada por conectores nos manuais de PLE: uma proposta de
revisão à luz do Funcionalismo
Luiz Herculano de Sousa Guilherme

Orientador: Prof.ª Dr.a Violeta Virginia Rodrigues


Coorientador: Prof. Dr. Marcelo da Silva Amorim

Resumo da Tese de Doutorado em Língua Portuguesa submetida ao Programa de Pós-


Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ,
como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Doutor em Letras
Vernáculas (Língua Portuguesa).

Resumo
A demanda por ensino de Língua Portuguesa no mundo aumentou bastante nos últimos
quinze anos. Tal fato favoreceu o crescimento de pesquisas e trabalhos na área do
ensino de Português para Estrangeiros (PLE) direcionados à descrição linguística e
cultural em torno do Português. Nesse cenário, insere-se este trabalho que tem como
tema central a comparação estruturada por conectores, à luz das pesquisas realizadas por
Rodrigues (2001, 2009, 2010, 2013 e 2014) e Rodrigues e Tota (2013), contrastando-as
ao tratamento dado à comparação pelas gramáticas normativas (GT). Constitui-se
também como aporte teórico deste estudo a teoria funcionalista, que leva em conta a
visão de língua em uso; para tal abordagem usamos como base a proposta de Moura
Neves (1997). Assim, esta tese objetiva propor uma descrição do fenômeno linguístico
da comparação estruturada por conectores a partir daquilo que encontramos nos
manuais de PLE. A análise realizada tem como corpus vinte e cinco manuais de PLE,
comercializados e oriundos de projetos acadêmicos, nos quais se verificaram a presença
e/ou ausência destas estruturas, estratégias e trechos que abordassem a comparação.
Com base nesta análise, pudemos confirmar que nossa hipótese inicial de que os
manuais não abordam este tema de modo a vê-lo como uma ferramenta linguística,
discursiva e interacional confirmou-se, reforçando a necessidade de propor novas
estratégias e/ou abordagens para o tema, de forma a construir uma nova perspectiva
centrada no uso das estruturas comparativas.

Palavras-chave: comparação, Funcionalismo, PLE.

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Comparação estruturada por conectores nos manuais de PLE: uma proposta de
revisão à luz do Funcionalismo

Luiz Herculano de Sousa Guilherme

Orientador: Prof.ª Violeta Virginia Rodrigues


Coorientador: Prof. Dr. Marcelo da Silva Amorim

Resumo da Tese de Doutorado em Língua Portuguesa submetida ao Programa de Pós-


Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ,
como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Doutor em Letras
Vernáculas (Língua Portuguesa).

ABSTRACT
The demand for the teaching of Portuguese language around the world has greatly
increased in the past fifteen years. This fact promoted the development of studies in the
area of teaching of Portuguese as a Foreign Language (PFL), the purpose of which is to
linguistically and culturally describe the environment of Portuguese language. In this
scenario is to be regarded this doctoral dissertation, which holds as its main subject the
phenomenon of comparison as structured by connectors, in light of the research projects
conducted by Rodrigues (2001; 2009; 2010; 2013; 2014) and Rodrigues e Tota (2013),
contrasting them to the treatment given to comparison by normative grammar
handbooks. This dissertation is also based on the functionalist theories, which take into
account the perspective of the language in use; for such an approach, we lay our
foundations on the proposals by Moura Neves (1997). Thus, this work aims at the
description of the linguistic phenomenon of comparison as structured by connectors,
taking descriptions found in PFL handbooks as a point of departure. The analysis
undertaken here scrutinizes a corpus comprised of twenty-five PLE handbooks – which
are the outcome of academic project and available for purchase – in which the
presence/absence of such structures, strategies and procedures addressing comparison
can be found. Therefrom we could find evidence to confirm our initial hypothesis that
the aforementioned handbooks do not approach the phenomenon of comparison in a
way that addresses it as a linguistic, discursive and interactive tool. That reinforces the
need to propose new strategies to approach this theme, in order to construct a new
perspective centered on the use of comparative structures.

Keywords: comparison, functionalism, PFL.

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Comparação estruturada por conectores nos manuais de PLE: uma proposta de
revisão à luz do Funcionalismo
Luiz Herculano de Sousa Guilherme
Orientador: Prof.ª Dra. Violeta Virginia Rodrigues
Coorientador: Prof. Dr. Marcelo da Silva Amorim

Resumo da Tese de Doutorado em Língua Portuguesa submetida ao Programa de Pós-


Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ,
como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Doutor em Letras
Vernáculas (Língua Portuguesa).

Resumen
La demanda por la enseñanza de la Lengua Portuguesa en el mundo ha aumentado
bastante los últimos quince años. Tal hecho resultó el crecimiento de investigaciones y
trabajos en el área de enseñanza de Portugués para Extranjeros (PLE) orientados a la
descripción lingüística y cultural alrededor del Portugués. En este escenario se inserta
este trabajo de investigación que tiene como tema central los conectores de
comparación, bajo investigaciones realizadas por Rodrigues (2001, 2009, 2010, 2013 e
2014) y Rodrigues y Tota (2013), contrastándolas al tratamiento dado a la
comparaciones por gramáticas normativas (GT). Se constituye también como aporte
teórico de este estudio la teoría funcionalista, que considera la perspectiva de la lengua
en uso; por tal abordaje usamos como fundamentación la propuesta de Moura Neves
(1997). Por lo tanto, este estudio de tesis tiene como objetivo proponer una descripción
del fenómeno lingüístico de la comparación estructurada por conectores a partir de lo
que encontramos en manuales de PLE. El análisis realizado tiene como corpus
veinticinco manuales de PLE, comercializados y oriundos de proyectos académicos, los
cuales se verifican la presencia y/o ausencia de estas estructuras, estrategias y
fragmentos que abarquen la comparación. Basado en este análisis, pudimos confirmar
que nuestra hipótesis inicial que los manuales no tratan de este tema pensándolo como
una herramienta lingüística, discursiva e interacional y que refuerza la necesidad de
proponer nuevas estrategias y/o abordajes para el asunto, de forma a construir una nueva
perspectiva centrada en el uso de estructuras comparativas.

Palabras clave: comparación, Funcionalismo, PLE.

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AGRADECIMENTOS

É incrível que após quatro anos tudo tenha mudando tanto e vitórias alcançadas e
não reconhecidas hoje são glórias de um presente que parecia ser verdadeiramente
impossível, ou melhor, improvável. Não sou fã de lugares-comuns, mas preciso ter
sempre em mente que tempestades não são eternas e antes e depois delas há sempre
muito sol. Outro fato a destacar, é que até mesmo uma tempestade tem um papel
fundamental no equilíbrio do mundo e, por que não, das pessoas.
Por tudo isso e muito mais, eu sou muito grato a Deus, aos orixás, santos, santas
e a todos aqueles do plano astral que nunca me abandonaram e colocaram na minha vida
pessoas que foram, são e serão sempre especiais para mim e que me permitiram trilhar
esse caminho tão difícil.
A Francisco, Izabel e Maria Elisia, pai, mãe e irmã, obrigado pela compreensão,
amor, afeto e acolhimento também durante esse difícil período, vocês sabem o quanto
eu quis seguir meus estudos e nunca me desencorajaram ou me deixaram fraquejar,
obrigado.
Aos Tios, tias, primos e primas sou muito grato a vocês por tudo o que vocês
fizeram, a fim de que essa minha vitória pudesse ser alcançada. Cada oração, cada
lembrança, cada sorriso, cada incentivo e cada possibilidade, isso fez-me muito bem e
me ajudou muito a chegar até aqui.
À Prof.ª Dra. Violeta Rodrigues por todos ensinamentos passados desde a minha
graduação. A gratidão pelas suas contribuições durante minha IC com o Prof. Dr. Mario
Martelotta e pelas lições essenciais no curso de Português VIII, curso este que me fez
querê-la tanto como minha orientadora. Obrigado por me auxiliar a pensar, entender e
ver a sintaxe de um modo único agora no doutorado e antes na graduação. Mais uma
vez obrigado por ser essa pessoa tão singular, sua competência, sua sinceridade e sua
empatia foram grandes combustíveis para mim durante todo esse período.
Ao Prof. Dr. Marcelo da Silva Amorim por ter aceitado ser meu coorientador,
aconselhando sempre a fazer as escolhas mais acertadas, a fim de que esse trabalho
ficasse mais claro, organizado e significativo.
Alunxs, ex-alunxs, colegas educadorxs, a todxs vocês que ficaram muito felizes
em saber que mais um sonho pôde ser realizado. Tudo o que escrevi foi também
pensando nos conselhos recebidos, nas aulas dadas e nas conversas que tivemos.

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Amigxs de lá e de cá, de verdade, vocês foram espetaculares e sim foram molas
propulsoras para que eu pudesse realizar esse trabalho de maneira tão singular.
A Germano, Elaine, Heitor, Chris, Raul, Lulu, Mariana, Luciana, Pedro, Renato,
Claudia, Sofia, Reinaldo, Hugo, Andrea, Bernardo, Mariana, Girlanda... vocês foram
um porto seguro aí no Rio, obrigado por tudo
D. Maria Stella, Guth, Isabel, Silvinha, Luís Carlos, Marina e Vinicius, Rafael e
Valéria, Tia Regina e Bernardo obrigado por todas as palavras de incentivo e pelos
conselhos valorosos.
Sandra Pottmeier, minha grande companheira de curso, uma amiga de todas as
horas, sou muito grato a você pelas caronas, pelas publicações, pelas leituras, pelas
conversas e pelas risadas nas estradas da vida.
A Luiz Henrique, Pedro Augusto, Ana Christine, Thiago Luiz, Rita de Cássia,
Everton Anselmini, Patricia Tafarel, Daniel e Julia, Watson Beck, Marcio Watanabe,
Thiago Sene e família, Caroline Reis, Luiziane Silva, Vanessa Arlésia, Yuri Salomão,
Felipe Feminella, Diego Goltara, Graciane Pereira, Hendrie Nunes, Cinthia di Bona,
Daiane Carvalho, Gislaine Sousa, Hagar Oliveira, Fernanda Trentini, Guilherme Jubett,
Fernando Mezadri, Clenio Denargini, Sabrina Planca, Marcelo Elias, vocês todos me
fizeram mais feliz, tranquilo, seguro e confiante durante todo esse período longe da
minha terra natal, da minha família, dos meus amigos fluminenses.
À Ana Paula Kuczmynda, Renata Pimenta, Thiago Paes pelas leituras do meu
texto, incentivo e força sempre e principalmente pela preocupação.
Eduardo Zimdars, Pedro Trindade, e Anderson Zimdars por terem sido grandes
companheiros de moradia, obrigado por tudo, vocês foram grandes irmãos
À Alissan Maria da Silva, Sandra Lucena, Emmanuel Vilas Boas, Marcos Brasil,
Carlos Henrique Nascimento, Marcus Miguel, Peter Hildebrandt, Nirmal Singh,
Américo Sobrinho, Gabriela, Vera Lucia, Jorge Ferraz, Elson Lima e Rosiane Espinola
por todo incentivo e por todos os momentos de escuta.
A Anderson Honorato pela companhia no IFSC, na BR-101, na BR-470 nas
nossas idas e vindas das aulas no curso de doutorado (eu na UFRJ e você na UEL) e dos
eventos do IFSC.
Ao IFSC, por ser um espaço que me propiciou desenvolver meus estudos e meus
projetos de ensino, pesquisa e extensão de maneira espetacular.
Aos colegas da sala D-15 pela parceria de sempre, vocês são espetaculares.

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À UFRJ, por mais uma vez, ter sido um ambiente de ensino e aprendizagem em
diversas possibilidades.
Ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas por ter sido um espaço de
ensino e pesquisa muito frutíferos.
Por fim, agradeço aos bolsistas de iniciação científica e extensão que foram
grandes contribuidores de muitas reflexões presentes nesse trabalho e pela ampliação do
meu olhar a respeito da área de PLE no Brasil. João Pedro Schneider, Maria Antonia
Paiano do Nascimento, Pedro Vinicius Pamplona, Maria Luiz Dix Reis, Nathalia
Krause, Douglas Afonso Porto Moreira, Heloisa M. da Silva, Lucas Higert Sembarski,
Daniel Trainoti, Felipe Matheus Nogueira, André Pereira Martins, Iáscara Zultanski
Nogueira, Lucas Sandro Rotermel Franco, Camila Zimmerman, Daniela Araújo,
Danielle Manerich, Bárbara Duwe e Manoela Marie Mülhmman, vocês foram essenciais
nessa etapa da minha vida como pesquisador e extensionista.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO E APRESENTAÇÃO DO TEMA....................................................16

2. OBJETO DE ESTUDO...............................................................................................23

3. CONTEXTUALIZAÇÃO..........................................................................................30
3.1. O ensino de PLE..................................................................................................30
3.2. Abordagem comunicativa no ensino de línguas..................................................35
3.3. O CELPE-Bras e o QuaREPE.............................................................................37
3.3.1. O CELPE-Bras...........................................................................................38
3.3.2. O QuaREPE................................................................................................41

4. APORTE TEÓRICO..................................................................................................48
4.1. Funcionalismo......................................................................................................48
4.2. As orações comparativas......................................................................................52
4.2.1. No âmbito da tradição gramatical...............................................................52
4.2.2. Em abordagens descritivas........................................................................53
4.2.3. Em abordagens mais recentes...................................................................62

5. METODOLGOIA E CORPUS....................................................................................65

6. ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS.....................................................................69


6.1.1. Avaliação de aspectos gerais da obra.................................................................70
6.1.2. Avaliação relativa a aspectos teórico-metodológicos........................................75
6.1.3. Atividades e exercícios.......................................................................................87

7. RESULTADOS DA ANÁLISE..................................................................................96

8. CONCLUSÃO...........................................................................................................114

9. REFERÊNCIAS........................................................................................................119

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ANEXOS.......................................................................................................................127
LISTA DE QUADROS E FIGURAS

Quadro 1- Distribuição de conjunções comparativas pelas gramáticas..........................24


Quadro 2 - Níveis de proficiência do Exame Celpe-Bras...............................................39
Quadro 3 - Conectores comparativos não canônicos presentes em textos escritos.........63
Quadro 4 – Manuais de ensino de PLE..................................................................... 66-67
Quadro 5 – Espaço ocupado pelo verbo nos manuais.....................................................73
Quadro 6 – Distribuição das respostas das perguntas de “a” a “j”.............................84-85
Quadro 7 – Perguntas e respostas da ficha de análise de livros didáticos ......................88
Quadro 8 – Avaliação objetiva dos manuais (1), (2), (3), (4) e (5), de acordo com as
respostas positivas...........................................................................................................90
Quadro 9 – Avaliação objetiva dos manuais (6), (7), (8), (9) e (10), de acordo com as
respostas positivas...........................................................................................................90
Quadro 10 – Avaliação objetiva dos manuais (11), (12), (13), (14) e (15), de acordo com
as respostas positivas.......................................................................................................91
Quadro 11 – Avaliação objetiva dos manuais (16), (17), (18), (19) e (20), de acordo com
as respostas positivas.......................................................................................................91
Quadro 12 – Avaliação objetiva dos manuais (21), (22), (23), (24) e (25), de acordo com
as respostas positivas.......................................................................................................92
Quadro 13 – Presença ou ausência da comparação nos manuais....................................93
Quadro 14 – Formato da comparação nos manuais de PLE............................................94
Quadro 15 – Itens comparativos presentes nos manuais de ensino de PLE....................96

Figura 1 - QuaREPE ficha modular – Nível A2..............................................................46


Figura 2 – Manual (7)......................................................................................................71
Figura 3 – Manual (12)..................................................................................................102
Figura 4 – Manual (13)..................................................................................................107
Figura 5 – Manual (14)..................................................................................................108
Figura 6 – Manual (15)..................................................................................................108
Figura 7 – Manual (15)..................................................................................................109

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas


CC – Componente Curricular
CELPE-Bras – Certificado de Proficiência em Língua Portuguesa para Estrangeiros
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IES - Instituições de Ensino Superior
IFSC – Instituto Federal de Santa Catarina
GT – Gramática Tradicional
L2 – Segunda Língua
L1 – Língua Materna
LE – Língua Estrangeira
LP – Língua Portuguesa
PB – Português Brasileiro
PE – Português Europeu
PLND – Programa Nacional do Livro Didático
QuaREPE – Quadro de Referência para o Ensino Português no Estrangeiro
QECR- Quadro Europeu Comum de Referência
MEC – Ministério da Educação e da Cultura
MC – Metodologia comunicativa ou abordagem comunicativa
MT – Metodologia tradicional
NURC – Projeto da Norma Urbana Oral Culta do Rio de Janeiro
UC – Unidade Curricular
UFJF – Universidade Federal de Juiz de Fora
UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro

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1. INTRODUÇÃO E APRESENTAÇÃO DO TEMA

O ensino de língua portuguesa apresenta uma série de questões complexas em


relação à abordagem existente nas salas de aulas e nos materiais circulantes que visam a
promover seu ensino e aprendizagem. Mais especificamente na área de sintaxe, é
possível perceber que a vasta quantidade de trabalhos acadêmicos contribui para a uma
nova visão a respeito de várias dessas questões linguísticas ainda não promoveu
mudanças substanciais no que se refere ao papel de certos temas no ensino.
Quando trazemos nosso recorte para a área de Português como Língua Estrangeira
(PLE), há muito mais a ser feito, visto que é uma área que, apesar de ter muitas
pesquisas, dispõe poucos espaços para a formação do professor e para a produção de
materiais que tragam propostas pedagógicas menos prescritivas e que levem ao
estudante a língua inserida em contextos reais de uso. Com isso, a crescente procura por
trabalhos acadêmicos que visem a solucionar os desafios encontrados por profissionais
da área de PLE em diversas instituições tornou-se uma importante demanda também no
ambiente acadêmico. Nesse sentido, percebemos que alguns temas não foram
plenamente contemplados como objetos de pesquisa dentro dessa área, como, por
exemplo, questões relativas à formação do profissional que atua nas salas de PLE e a
preparação de materiais didáticos mais diversificados.
Assim, nosso trabalho pretende contribuir com a área de PLE promovendo uma
investigação de orientação funcionalista acerca do tratamento dado à comparação
estruturada por conectores nos manuais de PLE. Sabemos que esse tema figura como
um relevante tópico de investigação, visto que a maneira como a produção de textos e
enunciados é proposta nos manuais didáticos de PLE não atende integralmente as
necessidades comunicativas dos estudantes.
A temática escolhida justifica-se pelo fato de esse aspecto apresentar status de
saber gramatical, já que se materializa na Língua Portuguesa em sua variante brasileira
como uma estratégia muito recorrente tanto na vertente falada quanto na escrita, além de
ainda ocorrer nos diversos níveis de formalidade do idioma. A ação de comparar ou
simplesmente a noção de comparação é algo presente nas línguas como um todo, por
isso sua presença é marcante em diversas atividades dentro dos livros didáticos de PLE.
Muitos manuais solicitam ao estudante que realize uma atividade e depois compare com
a de seu colega, ou ainda que compare tal situação ou fato aqui do Brasil com a mesma
situação ou fato de seu país natal. Entretanto, isso feito de modo, muitas vezes, não

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vinculado a certos conteúdos ou em contextos nos quais a produção de textos ou
enunciados deve ser feita segundo a intuição do aluno para executar tal tarefa. Não há
propostas que construam um percurso no qual a comparação seja vista como uma
estratégia linguístico-discursiva construída por meio de termos e estruturas que podem
variar tanto da escrita para a oralidade, quanto do mais coloquial ao mais formal.
O Dicionário online do Português apresenta as seguintes definições para
comparação:

Comparar, Do latim comparare, 1. Examinar alguma coisa, juntamente


com outra, buscando estabelecer semelhanças, diferenças, conexões ou
relações entre elas: comparar suas ideias com as minhas. 2. Estar diante
de outra coisa ou pessoa para estabelecer paralelos, analogias,
semelhanças; confrontar-se, igualar-se: comparava ideologias políticas a
opiniões religiosas; comparava-se a um super-herói. 3.Assumir como
semelhante, igual, análogo; igualar, equiparar: comparar a inflação
brasileira; comparar um filho com outro.
(https://www.dicio.com.br/comparar/)

As três acepções dadas pelo dicionário já sinalizam para a necessidade de se


compreender a noção semântica de comparação de mais de um modo. Isso pode ser
explicado também pela quantidade de sinônimos que o verbo comparar apresenta. Além
disso, devemos ter a clara percepção de que cada um de seus sinônimos é aplicável em
diferentes contextos de uso e interação, fato que explica a sua versatilidade e confirma
que seu uso atua na mudança de seu comportamento no discurso.
As gramáticas tradicionais (GT), de orientação mais prescritiva, têm seu olhar
mais focado na sistematização de regras e na fixação de estruturas oriundas, na maioria
das vezes, da escrita formal, colhidas por meio de exemplos literários. Tal fato torna-se
um problema para o ensino e aprendizagem de Língua Portuguesa e também para o
trabalho em PLE, pois a proposição de uma abordagem centrada na língua em uso, com
exemplos e textos autênticos presentes em gêneros diversos orais e escritos, não ocorre.
A comparação é encontrada nas GT em três capítulos diferentes: o primeiro deles
é na parte destinada ao ensino das classes de palavras. Nessa seção da gramática,
chamada por muitos autores de morfologia, a comparação aparece na classe dos
adjetivos no tópico referente ao Grau dos adjetivos. O segundo capítulo é o da
morfologia, no tópico conjunções subordinativas comparativas. E, por fim, no terceiro
capítulo, destinado a descrever a sintaxe, ocorre no tópico orações subordinadas
adverbiais comparativas. Assim, a abordagem apresentada nas GT não promove um

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diálogo entre essas três seções, de modo a mostrar que elas devem ser entendidas, ou
melhor, estudadas de forma integrada.
Para Bechara (2009), por exemplo, considera-se comparação a relação entre dois
ou mais seres em que se compara a qualidade de um em detrimento à do outro,
estabelecendo entre eles uma igualdade, uma superioridade e uma inferioridade. Ele
mostra essa divisão na parte de sua gramática destinada a apresentar a classe dos
adjetivos e suas flexões, por isso um olhar a respeito da comparação no momento de
falar do grau dos adjetivos. Vejamos os exemplos dados pelo gramático (BECHARA,
2009, p. 126):

a) uma igualdade: “O rapaz é tão cuidadoso quanto (ou como) os outros.”


b) uma superioridade: “O rapaz é mais cuidadoso que (ou do que) os outros.”
c) uma inferioridade: “O rapaz é menos cuidadoso que (ou do que) os outros.”

Esse autor afirma que essas construções explicitam uma gradação, ou seja, atuam
na formação de níveis que variam entre o superior e o inferior passando pelo
intermediário, que seria o de igualdade. Além desses, o gramático também fala da
existência de um nível chamado de positivo, no qual há simplesmente a enunciação da
qualidade do ser em questão (BECHARA, 2009, p. 126), como se nota em:

“O rapaz é cuidadoso.”

Uma questão interessante apresentada por esse autor ainda na parte dos adjetivos é
o uso da comparação no lugar do superlativo. Em algumas expressões idiomáticas da
língua portuguesa, segundo ele, construímos essa estratégia linguística com o objetivo
de traduzir melhor o que desejamos expressar. É o que podemos verificar a seguir em
alguns exemplos que ele atribui a esse uso (BECHARA, 2009, p. 126):

“Pobre como Jó (= paupérrimo), feio como a necessidade (feiíssimo), claro como água,
escuro como breu, esperto como ele só, malandro como ninguém.”

Esses exemplos marcam um uso mais próximo de dados reais, visto que
funcionam como termos pertencentes à variante coloquial da língua. Paralelamente a
isso, Bechara (2009) descreve novamente a comparação, mas na parte de orações

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subordinadas comparativas. A sua proposta para essas orações consiste em dividi-las
em assimilativas e quantitativas: as primeiras são aquelas que estabelecem uma relação
de semelhança entre dois seres, coisas, fatos ou qualidade; já as outras são as que
comparam algo na sua quantidade, intensidade, pessoa, coisa ou fato. Dessa forma, a
tipificação igualdade, superioridade e inferioridade fica restrita ao segundo tipo, por
esse apresentar-se exatamente do modo que favoreça tal construção.
Desse modo, o gramático apresenta somente como conectores que constroem
enunciados comparativos assimilativos aqueles estruturados por COMO e QUAL, que,
segundo ele, podem ou não vir correlacionados com ASSIM e TAL. Além desses,
ASSIM COMO pode também funcionar estabelecendo relação de comparação com
valor de assimilação, isso seria configurado em sentenças do tipo “José corre com um
raio” ou “A inteligência do Arthur é grande assim como sua disposição para brincar e
correr”. Todas essas configurações apresentadas não levam em conta a língua em uso e
desconsideram a ocorrência de outros itens atuando como conectores comparativos.
Isso constitui um problema na abordagem do gramático, pois ele não considera outras
estruturas, como as comparativas não canônicas e as não prototípicas. O uso de TIPO,
FEITO, IGUAL e QUE NEM como elementos que estruturam a comparação,
amplamente apresentado nos trabalhos de Rodrigues (2001, 2009, 2010, 2013 e 2014) e
Rodrigues e Tota (2013), não constitui algo considerado na abordagem feita por
Bechara (2009).
Por isso, ao se verificar esse contexto, é possível pensar que no caso do PLE há
um grande desafio para ensinar a Língua Portuguesa para estrangeiros. Ou seja, como os
manuais de PLE tem as GT como base e norteadores, a apresentação de temas e
conteúdos segue uma orientação mais prescritiva e distante do uso. A descrição da
comparação estruturada por conectores, por exemplo, não é adequada ao ensino da
língua materna e certamente semelhante tratamento deve ser o dado pelos manuais de
PLE a esse conteúdo. Logo, isso constitui um problema relevante sobre o qual
pretendemos nos debruçar nesta tese com o intuito de o descrever e de lhe apontar
algumas soluções. Outra questão que também merece destaque reside no fato de a
diversidade de situações trazidas pelos manuais não promover uma abordagem eficiente
para o pleno desenvolvimento das habilidades de compreensão e produção oral e escrita.
Nesse contexto se insere a comparação estruturada por conectores.
Os trabalhos de Rodrigues (2001, 2009, 2010, 2013 e 2014) serviram como
motivação para construir uma proposta de pesquisa que conectasse a sintaxe à área de

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PLE. Sabemos que um material didático é uma grande ferramenta em sala de aula, pois
auxilia o professor na construção das aulas e daquilo que ele vai ensinar. No caso da
área de PLE, não há no Brasil nenhum documento orientador que possa auxiliar os
profissionais que atuam em cursos em universidades na definição daquilo que deve ou
não ser ensinado ao aluno estrangeiro. Boa parte dos materiais didáticos de PLE
comercializados e/ou produzidos no Brasil são exportados e, por isso, muitos foram
construídos com base, por exemplo, no Quadro de Referência para o Ensino Português
no Estrangeiro (QuaREPE), documento criado em 2011 por autoridades educacionais
portuguesas que objetiva ser um orientador do ensino de PLE. Contudo, isso é não uma
unanimidade, visto que existem muitos projetos universitários ou que não utilizam
materiais próprios com fins que vão além da questão comunicativa somente, por
exemplo, os projetos destinados à preparação para o CELPE-Bras, ou aqueles para
emissão de certificados e/ou declarações para refugiados ou apátridas.
Esse contexto somado a experiência do autor dessa tese como professor de PLE
por quase cinco anos em duas escolas internacionais no Rio de Janeiro e as questões
suscitadas pelas aulas voltadas mais aos aspectos gramaticais do Português como
Língua Estrangeira constituíram um ambiente em que diversas dúvidas surgiram sobre
como pensar/trabalhar com sintaxe e, mais especificamente, a comparação, de maneira
não prescritiva junto aos alunos estrangeiros.
A comparação constitui-se como um tema muito relevante para a área de PLE,
visto que a ação de comparar faz parte de muitas tarefas presentes em manuais didáticos
de PLE, contudo, o tratamento dado a esse tema não é adequado. Assim, inspirados
pelos trabalhos de Rodrigues (2001, 2009, 2010, 2013 e 2014), já citados, desejamos
investigar como se dá o tratamento da comparação estruturada por conectores nos
manuais de PLE. A orientação prescritiva com base nas GT é uma característica comum
a muitos manuais e configura um problema, visto que algumas reflexões não são
construídas por esses materiais. Dessa forma, nosso trabalho segue a corrente
funcionalista com o objetivo de ter os conceitos de língua e linguagem entendidos à luz
dos princípios estabelecidos pelo Funcionalismo. Não será nosso foco tratar de temas
como gramaticalização ou iconicidade, contudo, buscamos a Linguística Funcionalista
para um olhar mais adequado a respeito da língua em uso e todas as demandas que um
processo de ensino e aprendizagem suscitam, para assim trazer para nossa análise as
estruturas nas quais cada manual apresenta a comparação estruturada por conectores,
identificar quais itens gramaticais são indicados como comparativos e verificar se a

20
descrição dada aos conectores segue o previsto nas GT ou apresentam um tratamento
diferenciado com base no uso.
Frente a esse cenário, com o objetivo de resolver nosso problema de pesquisa e
analisar os dados, estabelecemos como nossos pressupostos teóricos a Linguística
Funcionalista, para tratar da língua em uso. Nesse campo, as ideias de Neves (1997)
orientarão nosso debate a esse respeito; já na parte da comparação estruturada por
conectores, os trabalhos de Rodrigues (2001, 2009, 2010, 2013 e 2014) são os que
promoverão nossa discussão sobre esse tema e estabelecerão a integração com o
Funcionalismo.
Nossa metodologia de pesquisa centra-se numa investigação em manuais
didáticos de PLE com base num modelo de ficha de análise de livros didáticos de língua
materna (cf. Anexo 1) para melhor explicitar aquilo que desejamos descrever e para
servir também como uma ferramenta de análise mais objetiva, tendo em vista os
aspectos que estabelecemos para essa pesquisa. Além disso, a divisão em aspectos
gerais e aspectos ligados ao tema de nossa tese favorece uma descrição mais sistemática
e clara de nossa análise e uma melhor identificação de nossos dados.
Nossa descrição será pautada nos princípios do Funcionalismo e buscará proceder
uma discussão com base no que foi coletado de cada manual, identificando os contextos
nos quais o dado foi encontrado e como ele está ligado ao que nessa tese consideramos
relevante para uma proposta de ensino e aprendizagem de PLE. Nossos resultados
trarão mais especificamente aquilo que revelado pela análise dos dados com destaque às
situações mais singulares à luz daquilo que estabelecemos como nossos objetivos e
referenciais teóricos. Por fim, nossas conclusões mostrarão o que tivemos de
aprendizado com os dados coletados, as reflexões e as propostas de trabalhos futuros a
partir de tudo que encontramos.
Esse trabalho está organizado em oito capítulos. O capítulo 1 é a Introdução que
traz o tema desse estudo, os objetivos, a motivação, a justificativa e o problema de
pesquisa a ser resolvido. No capítulo 2, encontra-se uma discussão acerca do objeto de
estudo de nossa tese em que abordamos a Língua Portuguesa e sua relação com o PLE e
as intersecções com a comparação estruturada por conectores e como isso está presente
nos manuais. No capítulo 3, apresentamos uma contextualização a respeito do ensino
de PLE na contemporaneidade, das metodologias de ensino de línguas, em que
destacamos a abordagem comunicativa e sua relevância para a área de PLE e como ela
constrói as bases dos materiais didáticos de PLE; e, finalmente como o QuaREPE e

21
CELPE-Bras se inserem no contexto do PLE e auxiliam ou não na produção de manuais
didáticos dessa área. No capítulo 4, elucidamos nosso aporte teórico com qual
analisaremos os dados coletados. Nele fazemos uma breve discussão sobre o
Funcionalismo e sua relevância para nossa investigação e realizamos uma descrição
sobre as orações comparativas no âmbito da tradição gramatical, em abordagens mais
descritivas e em abordagens mais recentes. No capítulo 5, descrevemos nossa
metodologia e o corpus que utilizamos para nossa coleta de dados e posterior análise
dos aspectos suscitados pelo que encontramos nos manuais. O capítulo 6 compõe-se da
descrição e análise dos dados coletados nos 25 manuais didáticos de PLE, tendo como
aspectos orientadores a Avaliação de aspectos gerais da obra, a Avaliação relativa a
aspectos teórico-metodológicos e as Atividades e exercícios. O capítulo 7 apresenta os
resultados obtidos por meio da investigação dos manuais didáticos de PLE, focados no
tratamento dado ao tema pesquisado. O capítulo 8 apresenta as conclusões a que
chegamos com a presente análise, retomando apontamentos importantes com base na
descrição dos dados analisados. Por fim, a última parte deste trabalho mostra as
referências bibliográficas utilizadas para a construção desse trabalho.

22
2. OBJETO DE ESTUDO

No ensino de Língua Portuguesa atual, ganha crescente expressão e espaço na sala


de aula de língua materna a busca por um ensino que, ao mesmo tempo, contemple as
habilidades e as competências necessárias ao pleno domínio de mais do que uma
variante linguística. Contudo, ainda persistem abordagens que privilegiam a mera
repetição de regras gramaticais presentes nas gramáticas tradicionais (GT). É o caso, por
exemplo, da abordagem dada à sintaxe em muitos livros didáticos que adotam a visão
prescritiva, deixando de considerar os saberes da gramática internalizada do aluno e a
sua própria variante linguística.
Com certa frequência, tal orientação norteia também muitos dos manuais usados
para o ensino de Português Língua Estrangeira (PLE), o que faz com que eles
apresentem, como resultado, uma língua em situação comunicativamente desvinculada
da interação. Dessa forma, o material assim idealizado propõe ao estudante estrangeiro
estratégias de construção de frases e enunciados pautados em usos um tanto artificiais
ou, pelo menos, pouco embasados na naturalidade do idioma corrente. Isso pode ser
verificado pela quantidade de tópicos e exercícios centrados na prescrição e focados na
norma padrão, que tem na língua escrita e literária sua fonte mais recorrente.
A decisão sobre como ensinar um tópico linguístico ou cultural em material
didático de língua estrangeira (LE) deveria levar em conta, entre outros fatores, a
frequência de recorrência nas frases e enunciados das situações de comunicação. No
caso da comparação estruturada por conectores (como, por exemplo, o uso das orações
comparativas), observamos, todavia, que há uma tendência de o material didático de
PLE seguir as mesmas orientações já preconizadas nas gramáticas tradicionais.
De modo geral, a comparação pode ser definida como o estabelecimento de um
referencial e/ou paralelo entre dois ou mais termos com o objetivo de confrontá-los, de
modo a estabelecer semelhanças e/ou diferenças entre eles. De modo específico, nos
compêndios de gramática tradicional, a comparação é abordada tanto na seção sobre
morfologia (graus do adjetivo) quanto na de sintaxe (orações subordinadas adverbiais
comparativas).
Rodrigues e Tota (2013) realizaram uma pesquisa na qual sintetizam, por meio de
um quadro, as conjunções comparativas apresentadas em algumas abordagens mais
tradicionais e sua aplicação ao ensino de língua materna por meio dos livros didáticos.
Segundo os autores, os gramáticos listam como conjunções subordinativas comparativas

23
tanto as que aparecem na forma simples, quanto as que aparecem na forma correlata,
sem demonstrar, contudo, preocupações com o comportamento discursivo de cada uma
delas, nem com uma possível reordenação ou inserção de algum outro conector que
pudesse ser acrescentado ao proposto por eles. A seguir reproduzimos o quadro
elaborado por esses estudiosos.

Quadro 1: Distribuição de conjunções comparativas pelas gramáticas


(RODRIGUES e TOTA, 2013, p. 315)

Autores Conjunções Comparativas


Bechara (1987, p. 162) Como; qual (dentro das comparativas assimilativas)
Que; do que (depois de mais menos, maior, menor,
melhor e pior); qual (depois de tal); quanto (depois de
Cunha e Cintra (1985, p. 588)
tanto); como; assim como; bem como; como se; que
nem
Kury (1987, p. 91) Como, qual, tal como, como assim (assimilativa)
Luft (1976, p. 154) Como
Que; do que (relacionados a mais, menos, maior,
menor, pior); qual (relacionado a tal); como
Rocha Lima (1983, p. 187)
(relacionado a tal); como (relacionado a tal, tão e
tanto); como se; etc.

Algumas inovações de uso encontradas nos trabalhos de Rodrigues (2001, 2009,


2010, 2013 e 2014) e Rodrigues e Tota (2013), que explicitaremos mais adiante, não
estão contempladas nas gramáticas tradicionais por eles investigadas, permitindo uma
reflexão a respeito da comparação estruturada por conectores. As propostas desses
pesquisadores instigaram/motivaram a revisão do quadro conjuncional no que diz
respeito à comparação estruturada por conectores nos manuais de PLE nesta tese,
ensejando reflexões sobre os materiais, por exemplo, que possam apresentar propostas
mais inovadoras e que considerem os itens gramaticais não contemplados em
perspectivas mais tradicionais da Língua Portuguesa. Dessa maneira, apresenta-se neste
estudo nossa disposição em investigar como os manuais de ensino de PLE abordam o
fenômeno da comparação. Embora nossa atenção esteja centrada principalmente sobre a
comparação estruturada por conectores – ou seja, as orações comparativas –, caso outras
possibilidades de materialização da comparação se encontrem nos manuais, elas
também serão analisadas.

24
Enquanto pesquisa linguística que analisa língua em uso, lançamos mão de
preceitos da corrente funcionalista, porque eles servem como base para o entendimento
não só das várias faces do fenômeno da comparação, como também para a compreensão
de que a situação de uso do idioma favorece várias possibilidades de leitura e produção
de sentidos. Assim sendo, ao abordar esse tópico linguístico interacional, seguimos na
esteira da reflexão proposta por Moura Neves (1997, p. 15), quando a autora assim
discorre sobre competência comunicativa:

Quando se diz que a gramática funcional considera a competência


comunicativa, diz-se exatamente que o que ela considera é a
capacidade que os indivíduos têm de não apenas codificar ou
decodificar expressões, mas também de usar e interpretar essas
expressões de uma maneira interacionalmente satisfatória.

É nessa perspectiva que se deve entender que o docente que trabalha com o ensino
de Português, seja como LE ou materna, deve ser levado a refletir sobre como se fará o
ensino da gramática. Ele deve inteirar-se das prescrições atuais sobre tal ensino e do que
os pesquisadores têm produzido sobre o assunto. As dificuldades inerentes ao seu
contexto de atuação não devem ser compreendidas como impedimentos, mas como
parte inerente a qualquer trabalho, e devem servir para se pensarem possibilidades de
ação que abordem a gramática de modo mais significativo para os alunos.
Tardelli (2015) afirma que todo docente deve refletir não só sobre sua prática,
como também sobre aquilo que pretende ensinar. Diante desse espectro, é importante
retomar a proposta de Meyer (2015, p. 15-16) sobre o ensino de PLE:

[...] para atender essa demanda, cada vez mais instituições de países
falantes de outras línguas passam a oferecer a disciplina Língua
Portuguesa como uma nova opção dentre as línguas tradicionalmente
oferecidas; cada vez mais universidades estrangeiras buscam parcerias
entre as universidades brasileiras; cada vez mais empresas
multi/transnacionais consideram se estabelecer no Brasil ou nos países
africanos de Língua Portuguesa; cada vez mais imigrantes falantes de
português consideram explorar profissionalmente o seu conhecimento
dessa língua; assim por diante.

Como dissemos anteriormente, as reflexões encontradas em Rodrigues (2001,


2009, 2010, 2013 e 2014) – em que a autora oferece uma revisão do quadro de
conjunções comparativas e propõe um novo olhar acerca das construções comparativas

25
com base nas variantes formal e informal da Língua Portuguesa – motivaram nosso
interesse pelo tema da comparação nos materiais didáticos usados no ensino de PLE.
A proposta de Rodrigues (2001) serviu de base para analisar como a comparação é
apresentada aos alunos pelos manuais. A autora, em sua tese de doutorado, faz um
estudo à luz da vertente sociolinguística acerca das construções comparativas em língua
falada e escrita, contrastando tais usos apresentados na tradição gramatical e nas
gramáticas descritivas. Os resultados de sua análise comprovam não existir uma
uniformidade no tratamento dado à classificação das conjunções subordinativas
comparativas, nem entre gramáticos tradicionais, nem entre os linguistas. Ainda durante
a pesquisa, a estudiosa encontrou, em seus dados, outros elementos que passaram a
figurar como itens conectores de orações que estabeleciam entre si valor semântico de
comparação. Assim, além dos prototípicos como, mais que, menos que, maior que,
dentre outros, a pesquisadora identificou outros elementos que têm por função
estabelecer relação de comparação, tais como feito, tipo, igual e que nem.
Quando se leem os prefácios e as referências bibliográficas de manuais de PLE e
se analisam os seus exercícios e seções em que figura a comparação, é possível
verificar que o tratamento dispensado ao tópico se restringe à proposta de o estudante
memorizar estruturas que não privilegiam a pluralidade de possibilidades que o tema
propicia, tal como verificado em língua materna.
Em um dos livros de nosso corpus, a comparação é apresentada da seguinte
forma:

Exemplo 1: Livro Novo Avenida Brasil 1


B3/6 – 9 Comparação com mais do que: preferência
1. Compare
Exemplo: teatro - cinema
Teatro é mais interessante do que cinema.

(LIMA, Emma Eberlein O. F.; IUNES, Samira A. Novo Avenida Brasil 1: Curso Básico de Português
Para Estrangeiro - Livro-texto + Livro de Exercícios: Volume 1. São Paulo: Epu, 2008. 138p.)

O exemplo 1 já demonstra que o manual Novo Avenida Brasil 1, por exemplo,


restringe o fenômeno linguístico analisado a apenas um tipo de construção. Isso
promove um entendimento restrito da relação de comparação por parte do aluno, pois o

26
fenômeno é apresentado apenas pela possibilidade de estruturar sentenças em que se
deseja fazer a comparação. Assim, o livro não explora outras possibilidades
significativas e recorrentes na língua em uso; ademais, sequer reproduz o próprio
tratamento dado pela gramática tradicional às construções comparativas, já que não
apresenta nem mesmo os itens gramaticais como, qual, assim como e tal apontados por
Bechara (2009) ou os itens quanto, qual, como, assim como, bem como, como se, que
nem e que listados por Cunha e Cintra (2008; 2013).
Além disso, não há uma contextualização da situação comunicativa de uso da
comparação. Esta sequer aparece na seleção de textos trazidos no manual. Por sua vez, o
exercício apresentado no Exemplo 1 pauta-se no comando implícito do “siga o modelo”,
com uma estrutura pronta, formada pelos dois elementos a serem comparados, que são
dados – teatro e cinema. Além do mais, afirma-se que há uma preferência que se faça a
comparação usando-se mais do que, sem se prover nenhuma explicação sobre tal
conjectura.
Dessa forma, quando se pensa em uso de uma palavra, frase ou termo em uma
língua – no nosso caso, PLE –, evidencia-se que as escolhas a serem levadas para a sala
de aula precisam tomar como base tais reflexões, afastando-se de uma perspectiva que
se proponha apenas a oralizar a língua escrita formal ou a apresentar tópicos de maneira
desvinculada da realidade cultural do aluno. É muito importante, portanto, não perder de
vista que existem diversas variantes linguísticas muito úteis ao aprendente em seu
contexto de interação e que tais variantes precisam ganhar o devido espaço na sala de
aula. Dessa forma, elas se imbuem de significado para o estudante que está adquirindo a
língua, ajudando no aperfeiçoamento de sua proficiência. Este aspecto relaciona-se
diretamente ao tema desta tese, visto que a comparação estruturada por conectores,
muitas vezes, tem sua descrição, nos manuais – didáticos ou não didáticos –,
apresentada apenas no tópico “grau dos adjetivos”. Tal restrição contempla apenas uma
proposta de estruturação da comparação na perspectiva da língua escrita formal,
descartando os outros níveis de formalidade, bem como outras possibilidades de
materialização da comparação, que pode ser estruturada por meio de palavras que não
são, em geral, consideradas conjunções pela GT. O uso de itens como tipo, feito e igual,
por exemplo, ilustram essa possibilidade.
Assim, evidencia-se que, ao abordarmos a comparação estruturada por conectores
em uma abordagem que se pretende comunicativa, é recomendável que se problematize
tal conteúdo, a fim de que ele não fique restrito a apenas uma norma linguística. Para

27
isso também é necessário que se busquem fontes genuínas e alternativas do uso corrente
da língua portuguesa, tais como entrevistas com falantes nativos, propagandas, cartazes,
dentre vários outros exemplos de gêneros em que o tema apareça. Certamente, dessa
forma, ampliaremos a possibilidade de chegarmos a uma proposta de abordagem que
desvie seu foco de um aspecto único e, às vezes, pouco produtivo, aproximando-nos
mais de uma perspectiva que considera a necessidade de se formarem usuários da língua
que sejam (pelo menos, minimamente) multidialetais, como geralmente o são (ou
deveriam ser) os falantes nativos do vernáculo.
Ao pensarmos o ensino de língua sob tal inspiração, trazemos para o ensino-
aprendizagem de PLE alguns usos linguísticos vistos como não canônicos, ou seja, que
não estão descritos nem previstos pela Gramática Tradicional e que sequer constam nos
livros didáticos de língua materna. Isso só reforça a necessidade de que esses usos sejam
incluídos em propostas de ensino-aprendizagem de PLE que vise a explorar a língua de
em uso, de alguma forma, minimamente interativa. Um olhar sobre a língua que tenha
esse viés seria ideal para a construção de materiais didáticos realmente direcionados a
um ensino-aprendizagem mais qualificado e no qual os estudantes se comuniquem em
vários graus de formalidade, utilizando diversos níveis de linguagem.
Diante desse espectro, é preciso entender que dotar o material de autenticidade
dentro de uma abordagem comunicativa – e, por que não, inovadora – de PLE é uma
tarefa que exige de seus autores uma pesquisa descritiva a respeito de que variantes da
Língua Portuguesa serão apresentadas aos seus estudantes.
No caso dessa tese, propusemo-nos a problematizar a comparação como um
fenômeno estruturado por conectores e não por conjunções. No âmbito da Gramática
Tradicional, a classe das conjunções tem seu escopo de uso bem restrito. Estudos
discursivos mostram que a noção de conector é mais abrangente e permite ao professor
abarcar vários vocábulos que prototipicamente não são conjunções, mas que funcionam
como se o fossem no uso, como é o caso de feito, tipo, igual e que nem. Dessa forma, é
possível fazer com que o estudante compreenda o porquê de a palavra conector dar mais
conta do papel desempenhado pelas palavras na língua que o termo conjunção. Além
disso, é preciso acrescentar também a necessidade de se explorar a multifuncionalidade
dos conectores que atuam na língua e, naturalmente, nas estruturas comparativas.
Nesse trabalho, não optamos por defender esta ou aquela metodologia de ensino,
mas assumimos aqui o compromisso de refletir sobre os diversos contextos e níveis de

28
ensino e aprendizagem da oralidade e escrita dentro de vários graus de formalidade em
PLE.

29
3. CONTEXTUALIZAÇÃO

O capítulo que se segue visa a fazer uma reflexão sobre aquilo que concebemos
como essencial para a abordagem da comparação nesta tese. Dessa forma, falar sobre o
ensino de PLE e suas intersecções com o ensino do Português como língua materna;
falar da abordagem comunicativa como uma metodologia bem difundida na área de
PLE; e mostrar o papel do CELPE-Bras e do QuaREPE como norteadores das propostas
de ensino de PLE serão nossas discussões dentro dessa seção.

3.1. O ensino de PLE

Nas últimas três décadas, houve uma grande mudança no que diz respeito ao
ensino da língua materna no Brasil. Tal fato pode ser observado, por exemplo, nas
abordagens apresentadas por inúmeras obras de cunho didático que passaram a fazer
parte do conjunto de livros escolhidos pelo Programa Nacional do Livro Didático
(PLND). Isso pode ser comprovado por meio das escolhas de autores que têm ou
tiveram uma trajetória expressiva e bastante produtiva dentro da pesquisa linguística
com temática direcionada à língua materna, como é o caso dos Professores Magda
Soares, Luiz Carlos Travaglia e Carlos Alberto Faraco. As reflexões desses teóricos
somadas a outras propostas por muitos pesquisadores constituíram-se como um forte
arcabouço teórico-metodológico em prol de um novo olhar acerca daquilo que se estava
e se está fazendo na sala de aula de Português como língua materna (PL1).
Nessa perspectiva, empreende-se uma das mudanças mais significativas a serem
consideradas no ensino de PL1, que foi a ideia de se trabalhar com a língua em uso e
abandonar a noção de estaticidade do idioma. Carvalho (2013), citando Bakhtin (2003),
afirma que a língua não é um produto terminado e imutável, pois, dessa maneira, ela
assumiria o caráter de língua morta, isto é, não apresentaria mudanças nem permitiria a
interação entre os seus usuários/falantes. Desse modo, segundo o mestre russo, ao
contrário do que muitos pensam, por se constituir no fluxo da comunicação verbal, não
é possível transmiti-la, já que “ela dura e perdura sob a forma de um processo evolutivo
contínuo” (Bakhtin, 2004 apud CARVALHO, 2013, p. 43). Assim, a noção de interação
comunicativa é o que permeia esse discurso e mostra que a ideia de língua em uso
também precisa e deve ser trazida para o contexto da sala de aula de LE.

30
Além disso, Bakhtin (2003 apud CARVALHO, 2013, p. 46) afirma que “classes
sociais diferentes se servem de uma só e mesma língua”, isto é, utilizam “um único e
mesmo código ideológico de comunicação” e pelo confronto de interesses sociais
divergentes é que “torna o signo vivo e móvel, capaz de evoluir”. Essa reflexão favorece
o reconhecimento e a construção de estratégias e ferramentas que possam ser úteis na
produção de materiais didáticos e paradidáticos para o contexto da sala de aula,
propiciando a existência de um ambiente que reproduza o uso do idioma em situação de
fala nativa.
Reflexões como essas promoveram uma revolução não só no ensino, como já foi
aqui explicitado, mas também no processo de formação daquele que ensina o idioma
vernáculo, uma vez que sua perspectiva de análise passou a ser a de uma língua que é
trazida pelo aluno e deve, por isso, ser considerada. A assertiva de Marchuschi (1997, p.
4) a seguir confirma isso:

Também é possível analisar níveis de uso da língua, bem como formas


de realização, desde o mais coloquial até o mais formal, seja na fala
ou na escrita, sem se ater a aspectos estritamente lexicais, como
costumam fazer os autores de manuais. Há, sobre a questão, muito
trabalho publicado e, de modo especial, sabe-se que é de interesse
distinguir as várias maneiras de se dirigir ao interlocutor considerando
algumas de suas características específicas, tais como idade, posição
social, sexo, profissão (cargo), papel social etc. Aspectos relativos à
polidez, ao tratamento interpessoal, às relações interculturais e muitos
outros que podem ser facilmente observados na produção lingüística
na própria sala de aula.

Diante disso, é importante ressaltar que também o ensino de PLE modificou-se,


nele se iniciando um processo de inserção de novas metodologias, a fim de que o
estudante conseguisse mais facilmente adquirir a língua-alvo e chegar mais próximo de
um conhecimento de língua semelhante ao do falante nativo. Para atingir tal objetivo,
fez-se necessário assim rever práticas pedagógicas e orientações metodológicas outrora
consideradas ideais no aprendizado de uma língua.
Dessa forma, faz-se necessário entender que o ensino de uma língua, sobretudo do
Português, precisa e deve levar em conta o protagonismo desse idioma em diversos
contextos e as ações ligadas à globalização e aos processos de internacionalização da
educação formal e informal como um todo. Logo, construir uma proposta de ensino de
língua somente focada na apresentação de regras de funcionamento da gramática desse
idioma, sem propor atividades direcionadas a todos as conexões que são suscitadas no

31
contexto da sala de aula, torna-se um problema que diretamente incide sobre a rotina
pedagógica do docente.
Castro (2009, p. 5) afirma que tornar o Português uma língua internacional não é
sinônimo de exportá-la. Isso porque muitos estrangeiros que estudam a Língua
Portuguesa no Brasil se identificam com os autores, os linguajares, a literatura e o modo
de se fazer ciência no Brasil e se tornam agentes da difusão dessas nossas características
quando retornam para seus países.
Desse modo, à medida que se sucedem os grupos de formação de docentes com
vistas ao trabalho junto a estudantes de PLE em formação surgem questões relacionadas
não apenas à maneira como o conteúdo a ser ensinado a esse público deve ser
distribuído, organizado e transmitido, mas também com relação à forma como
consideramos mais apropriado reagir aos impasses que surgem em sala de aula e com
relação a outros aspectos do ensino-aprendizagem de PLE.
A discussão iniciada por Guilherme (2012), em sua dissertação de mestrado, ao
abordar a noção de família presente nos manuais de PLE, aponta uma grande
preocupação desses livros em priorizar a sistematização excessiva de regras gramaticais,
desconsiderando quaisquer possibilidades de reflexão ou revisão de algum fenômeno,
seja ele linguístico ou extralinguístico. O trabalho mostra como crítica fundamental aos
manuais didáticos de PLE a inexistência de um ensino reflexivo focado na introdução
de traços da cultura e da literatura brasileira apenas.
Os estudos mais recentes na área de Língua Portuguesa apontam para uma real
necessidade de se valorizar a língua em uso e promover a reflexão acerca do fenômeno
linguístico estudado e não somente reproduzi-lo. Nesse sentido, entende-se também que
o ensino do PLE deve centrar seu olhar nos fenômenos mais produtivos da língua,
trazendo para o aluno estrangeiro a aprendizagem do idioma que ele encontrará nas
conversas com falantes nativos. Assim, a partir desta perspectiva, pode-se entender que
a principal justificativa para o tema por nós proposto está associada a, muitas vezes,
parecer haver uma grande preocupação dos materiais didáticos para o ensino do PLE em
fazer com que o estudante tenha um saber gramatical extremamente formal, bem
distante da realidade linguística por ele vivenciada. Meyer (2004, p. 80) assim se
pronuncia a esse respeito:

Reunindo estes aspectos da identidade social do brasileiro, podemos,


com razoável facilidade, compreender o que eles representam em
relação ao uso da linguagem. O português do Brasil é – e não poderia

32
ser de outra maneira – diverso, flexível, informal, sensual. E é
exatamente por causa dessa natureza múltipla que ensinar português
para falantes de inglês torna-se especialmente desafiador: quando o
foco desse processo de ensino/aprendizagem está colocado no
comportamento linguístico esperado do falante de português, não
apenas em estruturas e/ou regras gramaticais, há todo um universo de
conhecimento, todo um conjunto de valores, atitudes, crenças, rituais
sociais a serem conhecidos, assimilados, aceitos e, espera-se,
utilizados com eficiência.

Assim, pode-se compreender que, mesmo ao ensinar PLE, torna-se fundamental


fornecer ao aluno explicações acerca daquilo que se pretende ensinar. Para além disso,
há necessidade de explicitar para o discente a(s) variante(s) linguística(s) que será(ão)
ensinada(s) por meio deste ou daquele manual, a fim de que o estudante se informe dos
objetivos do processo em que está inserido. É certo que os manuais de ensino de PLE
propõem-se a apresentar ao aluno a variante formal escrita e falada da língua, focando
seu olhar nos conteúdos propostos pela Gramática Tradicional, conforme já elucidado.
No aprendizado de uma segunda língua (L2), é necessário que se compreenda que
as mesmas características fundamentais para o aprendizado da língua materna (L1),
muitas vezes, servem para a L2, no que diz respeito, por exemplo, à interação entre os
falantes e aos conteúdos gramaticais.
Revuz (1998) apresenta o conceito de LE identificando-a como aquela aprendida
por um falante depois do aprendizado de sua L1, a qual está já presente em sua primeira
infância. Com esse conceito, Revuz (1998) reforça a ideia de que a L1 traz consigo todo
o conhecimento extralinguístico e intralinguístico exigidos para a comunicação por
meio dela. Assim, saberes e competências ligados à L2 são construídos por seus
falantes, e isso precisa ser algo presente não só na sala de aula de L2, mas também nos
manuais que ensinam esse idioma. Logo, pode-se afirmar que o falante não terá somente
uma estrutura gramatical ideal, mas todos os elementos que formaram seu conhecimento
acerca desse primeiro idioma, ou seja, sua história linguística em tal língua levará em
conta também as questões linguísticas, socioculturais, sociointeracionais e históricas
que tragam informações fundamentais para a plena inserção do estudante nesse novo
contexto de aprendizagem. Um exemplo disso é falar que no Brasil há a presença de um
cenário no qual a questão racial deve ser um tópico a ser discutido com os alunos.
A partir do conceito de LE de Revuz (1998) e das noções de língua e linguagem
mais ligadas às questões interacionais, podemos concluir que, ao ensinar uma L2, não se
pode dissociá-la do contexto em que ela está inserida, ou seja, não se pode excluir o

33
novo falante da L2 de alguns traços que sejam fundamentais ao melhor aprendizado
dessa língua. É importante ressaltar que não só a escrita formal, mas também a língua
escrita coloquial e a fala (em seus diferentes graus de formalidade) devem ser
trabalhadas em sala de aula com o aluno estrangeiro. Dessa forma, um estudo que visa a
ensiná-lo a escrever e a ler na L2 precisa dar conta também de boa parte dos elementos
textuais presentes nessa língua-alvo. Nesse caso, ressalte-se aqui a importância não só
da tradução, mas da explicação acerca de quais fenômenos ele encontrará nesse novo
idioma.
Almeida Filho (1993) apresenta uma crítica produtiva à abordagem comunicativa
no atual ensino de línguas. Para ele, ensinar e aprender uma LE em uma universidade,
por exemplo, configura-se como um cenário de artificialidade, que necessita ser assim
minimizado pelo professor, para, então, aproximar o aluno da língua que este deseja
aprender. Cada instituição que ensina uma LE passa a ser moldada a partir de tradições
de ensino e aprendizagem construídas por esse lugar. Essas ideias estão fortemente
ligadas a metodologias direcionadas a propostas de ensino inovadoras, mas que, ao
mesmo tempo, evidenciam uma realidade que não é possível em alguns contextos, já
que exigem mudanças significativas na relação professor-aluno. Todos esses aspectos
influenciam a postura do professor que, por sua vez, leva para o ensino disposições
pessoais e valores desejáveis da sua própria abordagem de ensino. Desse modo, há que
se considerar que a formação de um contexto ideal de aprendizagem não ocorre de
modo simples. Há, assim, a real necessidade de se construir um cenário complexo e que
atenda a expectativas e demandas oriundas do próprio ensino. Para tanto, é
imprescindível que o professor tenha clareza sobre o conceito de LE a ser adotado para
uma melhor reflexão sobre o seu ensino e, conseguir, assim, “desestrangeirizar” essa
língua.
Almeida Filho (1993) também apresenta algumas definições de abordagem que
funcionam como uma filosofia de trabalho. Para ele, o ato de ensinar uma LE envolve
as seguintes características: a) ter um conjunto de pressupostos explicitados, princípios
estabilizados ou mesmo crenças intuitivas quanto à natureza da linguagem humana, de
uma língua estrangeira em particular; b) de aprender e de ensinar línguas; c) da sala de
aula de línguas; e d) de papéis de aluno e de professor de uma outra língua.
Diante disso, o planejamento das unidades de um curso e a produção e/ou seleção
de materiais didáticos necessitam ser elaborados de acordo com diretrizes que não
desconsiderem os elementos extra e intralinguísticos, como já apontado por Meyer

34
(2004) e Revuz (1998). Experiências na, com e sobre a língua-alvo realizadas com os
alunos, principalmente, dentro, mas também fora, da sala de aula e avaliação de
rendimento dos alunos são práticas que, segundo Almeida Filho (1993), devem ser
consideradas ao se ensinar a L2. Todavia, para realizar uma abordagem de ensino que se
proponha a seguir as características propostas pelo autor, é preciso fazer um trabalho
diferenciado em sala de aula, já que os manuais de PLE não dão conta dessa perspectiva
inovadora. Além disso, quaisquer outros aspectos necessários à aprendizagem da LE
terão de ser apresentados pelos manuais ou por quem os utiliza.

3.2. Abordagem comunicativa no ensino de línguas

Nesta seção, objetivamos mostrar a abordagem comunicativa e sua importância no


ensino de LE; e como são construídos os manuais que ensinam PLE à luz dessa
metodologia. Logo, não se fará aqui uma descrição exaustiva de cada uma das
abordagens existentes no ensino e aprendizagem de LE, já que este não se configura
como objetivo deste trabalho. Assim, tal seção somente apresentará o modo pelo qual a
língua chega até o estudante de LE e que aspectos dessa metodologia se aplica aos
manuais que serão analisados.
As metodologias que compuseram o caminho que construiu as bases para a
abordagem comunicativa serão aqui apenas apresentadas sucintamente, conforme
dissemos, com base nos trabalhos de Almeida Filho (1986), Oliveira e Paiva (2001),
Leffa (1999), Barcelos (2007) e Matos e Valério (2010). Esses autores servirão como
norteadores para uma definição de cada uma das metodologias de ensino de LE. É
importante ressaltar que a necessidade de se ter esta seção reside no fato de que essas
metodologias são aquelas usadas nas salas de aula e pelos materiais responsáveis pelo
ensino do PLE. Deve-se esclarecer ainda que no ensino Português língua materna outras
estratégias e ferramentas são usadas e, por vezes, não se configuram como eficientes
para o ensino ou para a abordagem que se deseja ter na sala de aula de PLE.
Os autores supracitados apresentam como metodologias de ensino de línguas os
seguintes métodos: a) tradicional ou gramática e tradução, considerado o primeiro
utilizado para se ensinar um idioma; b) direto, caracterizado pelo foco na língua escrita;
c) audiolingual ou áudio-oral, responsável pela difusão da ideia de que língua é fala e
não escrita; d) audiovisual, direcionado ao aprendizado em uma perspectiva mais
conectada a questões políticas e econômicas; e, por fim, e) abordagem comunicativa,

35
que se consolidou como um método de ensino-aprendizagem de línguas que teve como
objetivo constituir-se como uma reação às metodologias anteriores, desejando suprir
suas limitações.
Na parte seguinte, faremos um breve resgate histórico da abordagem
comunicativa, tendo em vista seu destaque nos manuais e propostas de ensino e
aprendizagem de PLE, visto que muitos dos manuais analisados por esse trabalho
afirmam, em suas apresentações, construírem sua abordagem centrada na metodologia
comunicativa. Assim, trazê-la aqui torna-se uma necessidade, já que essa afirmação
servirá como uma de nossas ferramentas de análise dos dados.
A abordagem comunicativa teve seu início na década de 1970 como uma resposta
à insatisfação com abordagens mais formais e que não propunham uma visão de ensino
na qual se pudesse dar mais autonomia ao professor. Com essa metodologia, busca-se
promover uma proposta de ensino intercultural e que faça dos papéis do professor e do
aluno algo mais dinâmico, eficiente e mais focado na produção de um ambiente em que
a comunicação em uma dada língua realmente acontecesse. Assim, segundo Weininger
(2008), essa abordagem passa a tomar o lugar de outras que, por conta disso, ficaram
conhecidas como mais formais ou mais conservadoras. Desse modo, para dar conta do
ensino de línguas estrangeiras, diante das necessidades crescentes de um mundo que
ensaiava seus primeiros passos rumo à globalização, surgiu a abordagem comunicativa.
Essa metodologia propiciou uma revolução em tudo o que se conhecia como
proposta de ensino de LE, já que sua visão, mais voltada para uma abordagem
intercultural e direcionada a um caminho mais inovador, gerou a necessidade de um
ensino que pudesse dar novo sentido à competência linguística (KLEIMAN, 2005). A
partir disso, entende-se que não basta apenas ensinar as regras gramaticais, pois, nesse
método, o estudante deve desenvolver uma competência linguística e uma competência
cultural no contexto em que já está inserido. Recorremos novamente à reflexão proposta
por Almeida Filho (2002, p. 15): “aprender uma língua estrangeira significa aprender a
significar nessa nova língua e gradualmente desestrangeirizar a língua-alvo”. Então,
destaque-se que essa metodologia quer mostrar que, no processo de aprendizagem de
uma LE, é imprescindível ensinar aos alunos sobre a cultura da sociedade da LE, sem
supervalorizá-la e sem esquecer a do aluno, adotando, portanto, uma perspectiva
intercultural.
Barcelos (2007) ressalta que a proposta da abordagem comunicativa pretendia
revolucionar o ensino de LE. Ela tinha como objetivo desenvolver a competência

36
comunicativa, ou seja, construir no processo de ensino e aprendizagem a noção de usar
para aprender. Assim, essa abordagem não mais permitiu que se visse a língua como
uma estrutura, mas sim um meio, uma maneira, um recurso para se criarem significados.
Dessa maneira, o processo de aprendizagem de uma LE deixava de lado, nesse
momento, a ideia que outrora esteve como a dominante, isto é, a necessidade de se
conhecer uma expressiva quantidade de estruturas e regras para se ser considerado
proficiente naquele idioma. Modesto e Valerio (2007) afirmam que a abordagem
comunicativa, para tanto, trouxe consigo o uso maciço de recursos dinâmicos como
ferramentas de aprendizagem que criavam significados a tudo aquilo que era
apresentado ao estudante. Além disso, essas autoras também ressaltam que tal
metodologia, apesar de muito eficiente na opinião de vários especialistas, não contribui
para a formação de estratégias de um letramento crítico em LE. Assim, resgatam a
reflexão de Almeida Filho (2001), já que este autor informa que, mesmo após mais de
30 anos da implementação do ensino comunicativo no Brasil, regras gramaticais ainda
predominam em muitas salas de aula de LE. Segundo esse autor, uma estratégia que
promovesse uma aprendizagem por meio do uso autêntico e significativo da língua-alvo
ainda não é empregada no cenário nacional. Desse modo, os estudantes não
vislumbram, ainda, nas salas de aula de LE, situações reais de comunicação, fato este
que somente mostra que essa abordagem carece de aperfeiçoamentos e de reflexões que
promovam seu êxito.
À luz dessa discussão fica claro que essa metodologia de ensino, ao ser nomeada
comunicativa, traz para o contexto da sala de aula a necessidade de se apresentar uma
visão de língua que seja o mais próxima possível de uma situação real de comunicação.
Trata-se, portanto, de uma concepção que possa trazer para esse contexto aquilo que
verdadeiramente se vê na interação entre os nativos de uma determinada língua que vai
ser ensinada e/ou aprendida por alguém.

3.3. O CELPE-BRAS e o QUAREPE

Para se ensinar e aprender PLE existem alguns documentos que funcionam como
norteadores desse processo. Apesar de o CELPE-Bras não ser um documento
propriamente dito, visto que é um exame, ele desempenha o papel de norteador para a
elaboração de materiais e cursos voltados à área de PLE. Já em outro nível, em um viés
mais metodológico, há o QuaREPE, documento orientador a respeito da construção de

37
uma base comum para a elaboração de tudo aquilo que tenha como fim o ensino, a
aprendizagem e a avaliação em PLE.
Os dois documentos apresentam um percurso histórico em seu desenvolvimento e
propostas de usos distintos; contudo, complementam-se por trazerem à área de PLE um
olhar mais comunicativo, com vias a desenvolver e avaliar as habilidades e as
competências necessárias nas diversas situações da vida diária nas quais a língua é
utilizada. Além disso, cabe destacar que tanto um quanto o outro buscam sempre
ancorar suas bases e reflexões em uma visão de língua que tenha nos materiais para suas
questões no caso do CELPE-Bras e para as aulas e instrumentos de avaliação, no caso
do QuaREPE, o uso de materiais autênticos, ou seja, não há nesses dois documentos o
predomínio de materiais pedagogicamente construídos para aquele contexto específico.

3.3.1. O Celpe-Bras

O exame oficial brasileiro que certifica o nível de proficiência de pessoas que não
falam português como língua materna chama-se Celpe-Bras – Certificado de
Proficiência em Língua Portuguesa para Estrangeiros. Quando foi criado, pensava-se em
atender as demandas das universidades federais, que recebiam frequentemente, através
de convênios, alunos internacionais que estavam aqui para estudar e aprender a Língua
Portuguesa.
O Celpe-Bras tem como norteadora a ideia de promover uma avaliação na qual o
candidato tenha aferida sua proficiência quanto ao uso adequado da Língua Portuguesa
com vias a identificá-lo como alguém que terá no idioma uma ferramenta importante
para sua interação/comunicação em PLE. A presença da palavra “adequado” na
descrição da concepção teórica do exame já sinaliza que a proposta metodológica
presente em sua construção se fundamenta na ideia de uma visão de língua pautada na
variação, mudança e reflexão frente a diversos contextos de uso dos quais provêm as
situações que certamente comporão as questões desse exame. Logo, a preocupação não
só em contextualizar textos de gêneros diversos em suportes variados, mas também de
apresentar uma perspectiva de língua que constrói um retrato fiel daquilo que o
candidato encontra na interação com falantes nativos e vê na televisão, nas redes sociais
e demais ambientes nos quais o Português brasileiro aparece. Assim, aspectos
importantes – como os fatores de textualidade, a diversidade de temas e abordagens
neles envolvidas, além de extrapolar a mera oposição língua oral e língua escrita – são

38
parte essencial da proposta do exame. Tudo isso mostra a natureza comunicativa desse
teste, possibilitando a integração de atividades e propostas de questões em PLE que
promovem a avaliação do desempenho do candidato dentro de um certo nível de
proficiência. Não é objetivo do exame, portanto, avaliar a aprendizagem formal, um
curso ou avaliar os docentes de PLE, mas sim ser uma ferramenta de aferição de
proficiência.
É possível perceber, assim, que o exame é adequado a todos aqueles que desejam
obter um certificado de proficiência em Língua Portuguesa, seja para fins acadêmicos,
seja para questões relativas à aquisição de visto de residência ou trabalho. Além disso,
cabe ressaltar que o Celpe-Bras possui a colaboração de uma comissão técnico-
científica composta por professores de Língua Portuguesa para falantes de outras
línguas, selecionados por meio de chamada pública. Essa é uma característica do exame
que traz consigo a diversidade de discursos, saberes e competências que fazem o Celpe-
Bras ser acessível a candidatos de todas as partes do Brasil e do mundo onde é aplicado,
visto que a diversidade da comissão técnica propicia um olhar plural quando se vai
construir o exame. Nesse sentido, a prova passa a ser algo não regionalizado e, portanto,
mais inclusiva e acessível.
Entretanto, o exame apresenta uma fragilidade na avaliação dos níveis de
proficiência, pois o primeiro nível de entrada para recebimento de certificação do
candidato é o intermediário. Tal sistema de classificação faz com que os candidatos que
obtiveram pontuação abaixo desse patamar fiquem sem certificação e, portanto, sem
nenhum feedback quanto a seu aproveitamento no exame, conforme se pode verificar no
quadro a seguir:

Quadro 2: Níveis de proficiência do Exame Celpe-Bras

Fonte: Celpe-Bras

39
Tal fator torna-se muito relevante na contemporaneidade, pois se sabe que o
Celpe-Bras atende a públicos que são, em sua maioria, específicos e que se encontram
em situações que, por vezes, não são contempladas pelo design do exame, como por
exemplo, os refugiados e os apátridas. As pessoas nesses grupos, por estarem no Brasil
devido a circunstâncias de saída forçada de seus países (muitas vezes, sem sequer terem
terminado seus processos de escolarização), apresentam necessidades bastante urgentes
de adquirirem sua regularização junto aos órgãos governamentais para aqui se
estabelecerem. Entretanto, não é senão com muita dificuldade que conseguem fixar
residência legalmente, visto que, naturalmente, suas primeiras demandas são suprir a
hipossuficiência em relação às questões mais básicas como moradia e alimentação.
Assim, esse fato, por vezes, dificulta ou mesmo inviabiliza sua busca, por
exemplo, por informações sobre a certificação para esse exame ou de como se preparar
adequadamente para ele. Tal documento, todavia, é de suma importância para a
sobrevivência desses grupos, pois garante a muitos a possibilidade do visto de
permanência e continuidade de emprego. Algumas empresas, por exemplo, já têm
exigido nível comprovado de proficiência para que estrangeiros consigam manter-se em
seus cargos.
Outro fator que deve ser considerado também na gestão do Celpe-Bras é o fato de
o mesmo exame ser aplicado a todos os candidatos, mesmo aqueles que não se
encontram em um contexto de uso de PLE. Um candidato que esteja no Brasil, por
exemplo, vivenciando experiências linguísticas, culturais e pragmáticas da Língua
Portuguesa realiza o mesmo exame que outro candidato que necessita da certificação,
mas faz aulas e estuda no exterior, distante de uma situação real de interação com
falantes nativos do Português Brasileiro. Apesar de termos na contemporaneidade
acesso irrestrito a conteúdos por meio das redes e mídias sociais, isso pode facilitar o
contato com materiais e outras questões pertinentes ao Brasil, sua cultura e sua língua,
porém pode não favorecer uma interação ou uma aproximação mais direta com certas
situações de uso da língua que só são possíveis no seu espaço não virtual.
Diante disso, mesmo com certas questões que carecem de uma revisão mais
acertada e de uma reflexão à luz do movimento imigratório para o Brasil
contemporâneo, o exame cumpre um papel importante na manutenção e na construção
da identidade social, cultural e linguística de PLE frente ao resto do mundo. A presença
de um exame que seja específico para aqueles que desejam ser avaliados quanto a sua
proficiência no Português garante também que essa demanda não se restrinja somente a

40
Portugal, por exemplo. Assim, mesmo sendo um exame, fica claro o papel do Celpe-
Bras como uma importante medida de difusão e promoção da língua e da cultura
brasileira e portuguesa.

3.3.2. O QuaREPE

O Quadro Europeu Comum de Referência para o Ensino do Português no


Estrangeiro (QuaREPE, 2005, p. 12) afirma que “aprender a língua e aprender a
comunicar são duas acções que não podem ser dissociadas das tarefas que o aprendente
tem de realizar enquanto utilizador da língua, seja esta língua materna ou língua não
materna”. Essa reflexão nos mostra que a aprendizagem de línguas envolve seu uso em
situação real de comunicação. Assim, a interação e a comunicação surgem como
ferramentas essenciais no processo de ensino e aprendizagem e não podem ser
desconsideradas, de forma alguma, quando se pretende ensinar uma língua, conforme já
dissemos em outros momentos deste trabalho.
Aprender uma língua fora de seu contexto real de uso implica a artificialidade do
processo, e isso promove uma série de problemas que acarretam dificuldades de
comunicação/interação que podem levar à construção de equívocos comunicativos.
Outro fator a ser considerado é a associação necessária entre língua e cultura(s), visto
que o espaço no qual aquele idioma é falado engloba várias questões fundamentais para
a efetividade da comunicação. Dessa forma, não considerar esses aspectos promove a
ausência de possibilidade de discussões acerca de vários fenômenos linguísticos,
sociais, culturais e interacionais. Assim, a compreensão oral, a leitura, a
produção/interação oral e a produção/interação escrita permitem um olhar que vai além
da caracterização geral de cada nível de proficiência para descrever mais claramente a
habilidade e a competência que estão ali para serem alcançadas.
Cabe destacar ainda que o documento foi concebido para a variante europeia do
Português, fato esse que, muitas vezes, propicia discussões interessantes em relação a
questões no âmbito da política linguística, visto que as situações e contextos de criação
desse documento no cenário português se distanciam bastante do cenário brasileiro. Um
exemplo disso é a concepção e o tratamento dado ao estrangeiro naquele país e a
maneira pela qual atende às demandas de PLE no contexto nacional, pois a construção
do QuaREPE gerou um entendimento de que, naquele local, segui-lo é uma estratégia
que harmoniza práticas e outras ações ligadas ao ensino e à aprendizagem, como

41
formações para aplicadores de exames, para elaboradores de questões e materiais. Isso
tudo favoreceu que a maneira como se olha para Portugal nesse quesito mostrasse uma
gestão em PLE mais robusta que a encontrada no Brasil, por exemplo, ou em outros
países da CPLP.
Mesmo com todas essas questões, a adoção do QuaREPE por professores,
instituições, formadores e empresas brasileiras ocorre devido ao papel desse documento
como norteador para a construção de tudo que há em PLE. Muitos dos manuais de PLE
se orientam por tal documento para serem construídos e, principalmente, para serem
aceitos no mercado editorial mundial como metodologias de ensino e aprendizagem de
PLE, porque é o QuaREPE que define as habilidades, competências, conteúdos e
conhecimentos necessários para se atingir cada um dos níveis estabelecidos nos graus de
formalidade e nas esferas orais e escritas, tendo em vista o domínio de tipos e gêneros
textuais. Isso não só norteia o que deve ou não ser ensinado e aprendido em cada etapa,
mas também constrói o itinerário formativo do estudante de PLE. Diante disso, os níveis
A1, A2 e B1 atuam como definidores de aprendizes que são avaliados do nível
elementar ao nível intermediário, pois esses níveis são para os iniciantes e deles partirão
os subsídios para atingir as etapas posteriores e se estabelecerá o início da comunicação
do estudante em PLE. Já os níveis B2 e C1 são os mais avançados, nesses são exigidas
as habilidades e competências que fazem o estudante compreender uma quantidade bem
expressiva de processos e situações de comunicação, sempre levando em conta o
contexto sociocultural com discussões mais complexas.
É relevante destacar que, por ter se tornado um documento de referência, o
QuaREPE atende aos mais diversos contextos de ensino e aprendizagem de PLE no
mundo. Tal documento promoveu também uma revisão no que havia em alguns espaços
destinado ao PLE e ao Português como língua materna. Dessa forma, o estudante que
frequenta escolas, IES, cursos livres, projetos e espaços de educação formal e não
formal de PLE possuem uma abordagem que segue um fluxo específico para seu nível e
pode com isso sentir-se mais seguro quando em situação de mobilidade, contexto esse
de estudantes intercambistas; de funcionários de embaixadas e consulados; de
refugiados, apátridas e migrantes; e de demais sujeitos que necessitem mudar de uma
localidade para outra e que terão a possiblidade de continuar seus estudos.
Além disso, é importante ressaltar nessa tese como o QuaREPE se fundamenta e
como sua proposta metodológica foi construída. As concepções de sujeito e sociedade
preveem um processo de ensino e aprendizagem centrado no uso e nas transformações

42
que a língua sofre por meio dessas duas entidades. Assim, não considerar tal diretriz na
construção de materiais, atividades e tarefas é não seguir as orientações dadas pelo
QuaREPE, pois isso é o que permite construir a competência plurilíngue e pluricultural
presente no ambiente em que a língua materna está. Assim, preconiza-se a inclusão das
variantes linguísticas, sociais e culturais, bem como se abre espaço para um olhar que
garanta uma expressiva flexibilidade no trabalho com o idioma, levando sempre em
conta contextos, situações e ambientes nos quais reconhecidamente a língua é um objeto
de uso e estudo. Com isso, entende-se que, dos usos mais simples aos mais complexos,
tudo deve ser apresentado ao aluno, de modo que ele, estudante, possa fazer usos e
escolhas, de acordo com suas reais necessidades naquele momento de interação.
A noção de flexibilidade veiculada pelo documento propõe que o professor possa
aproveitar todas as oportunidades de aprendizado da língua, mesmo aquelas não
previstas nas suas fichas orientadoras, nos seus métodos, atividades e programas, já que
estes são momentos nos quais o ensino e a aprendizagem podem ser mais significativos
para o estudante. Essa importante recomendação do documento é um de seus princípios
norteadores, pois, para seus autores, transparência, abertura e coerência; autonomia do
ensino e da aprendizagem são considerados fundamentais para que o QuaREPE não seja
somente um papel com um monte de ideias não aplicáveis.
Mais especificamente no que diz respeito à concepção de Língua Portuguesa, o
QuaREPE aborda a língua por meio das competências que o estudante deve adquirir ao
longo de seu itinerário formativo e em cada nível de proficiência. Para tal, o documento
apresenta como as competências gerais em Língua Portuguesa serão abordadas, de
modo a propor reflexões a respeito, por exemplo, da indissociabilidade entre língua,
cultura e sociedade, dando a cada uma delas seu papel e como elas constroem o
conhecimento do sujeito. Além disso, o QuaREPE descreve as competências
relacionadas a outras áreas do currículo, a consciência cultural, as competências
comunicativas em língua e uso da língua. Em nossa tese, não detalharemos cada uma
delas, já que não são nosso foco. Assim apresentaremos como as competências
comunicativas em língua e o uso da língua relacionam-se com a comparação estruturada
por conectores, tema desse estudo.
Quando se pensa em preparar materiais ou cursos para ensino e aprendizagem de
uma determinada língua, é fundamental ter como foco que o desafio maior é o
desenvolvimento da competência comunicativa. A comunicação e a interação são dois
importantes componentes dos processos de ensino, aprendizagem e avaliação que

43
figuram como essenciais para garantir o êxito do estudante no uso do idioma nas mais
diversas situações. O QuaREPE teve como um de seus aportes teóricos e norteador o
QECR para que se pudesse realizar uma abordagem da língua nos mesmos moldes que
o Conselho da Europa havia definido para o ensino, a aprendizagem e a avaliação de
outras línguas, como o inglês e o francês, por exemplo. Assim, o quadro utiliza a
divisão do QECR para as competências comunicativas em língua. São elas:
competências linguísticas (lexical, gramatical, semântica, fonológica, ortográfica e
ortoépica), competências sociolinguísticas e competências pragmáticas (competência
discursiva e competência funcional) e competência estratégica. Um trabalho pautado
nessa divisão foi adaptado para o QuaREPE, a fim de atender aos contextos de ensino,
aprendizagem e a avaliação do Português no estrangeiro. Com isso, o quadro detalha as
competências lexical e gramatical, objetivando apresentar como essas duas abordagens
devem ser trabalhadas.
A competência linguística fundamenta-se mais diretamente sobre como o
estudante aprenderá o vocabulário da língua, dando espaço a um trabalho que promove
uma aprendizagem mais ativa da língua em uso com expressões idiomáticas,
regionalismos, ditados populares e demais termos que estão nesse âmbito. Dessa forma,
tal competência orienta quanto à abordagem e ao tratamento que deve ser dado às
classes de palavras, ou seja, propõe uma visão que extrapole a sistematização de regras
definidas pelas gramáticas tradicionais. Assim, cada palavra pode ter seu significado e
seu uso aproveitado de forma diversa, visto que estará sempre inserida em algum
contexto de uso real. Relações como sinonímia, antonímia e polissemia são pensadas à
luz de sua inserção no discurso, da mesma forma que os elementos aqui definidos como
gramaticais, como por exemplo artigos, pronomes, preposições e conjunções, devem ter
suas multifuncionalidades como umas de suas características quando abordados nas
aulas ou nos materiais.
Paralelamente a isso, a competência gramatical traz ao documento a ideia de
gramática como um conjunto de princípios que promove a combinação de elementos
das sentenças e enunciados da língua. Essa visão propicia a construção de um olhar por
parte tanto do professor quanto do estudante de que a língua possui uma dinâmica de
funcionamento que é também matéria das aulas de modo a explorar isso de forma não
prescritiva. Dentro dessa competência podem ser abordadas ainda as questões sociais,
culturais e discursivas no que diz respeito ao uso do idioma associadas de modo a
implementar e organizar a interação e a intersecção entre elas.

44
Além da competência gramatical, o QuaREPE também apresenta uma descrição
bem detalhada a respeito do modo pelo qual o quadro concebe a ideia de uso da língua.
Nesse espaço, encontram-se os meios com os quais o quadro materializará as
competências até então descritas, mostrando de forma mais concreta como cada uma
delas poderá ser trabalhada. Por isso, sugere uma lista de temas e tarefas de modo que
isso seja apenas um conjunto de possibilidades de uso, visto que a heterogeneidade do
público e das diversas perspectivas de uso do idioma favorecem a construção de uma
abordagem bem interessante.
Por fim, cabe destacar que o QuaREPE traz como orientação tabelas com seus
descritores nas quais indica em cada nível de proficiência a competência em língua a ser
atingida, conforme cada um dos aspectos definidos na caracterização geral, na
compreensão oral, na leitura/compreensão, na produção/interação oral e na
produção/interação escrita. Nas fichas modulares, mostra, além das competências, os
conteúdos gramaticais, o campo lexical, os exemplos de realizações linguísticas e as
sugestões de gêneros textuais a serem trabalhados nas aulas e abordados nos materiais.
Cada um dos níveis possui um tema gerador e uma faixa etária na qual se devem
abordar esse ou aquele conteúdo, texto, competência, texto e afins.
No caso da presença da comparação estruturada por conectores, tema dessa tese, o
QuaREPE não traz especificamente a palavra comparação (nos quadros definidores de
níveis de proficiência), mas apresenta o conteúdo gramatical Graus dos adjetivos. Esse
conteúdo aparece como indicação para ser abordado inicialmente na página 7, sob o
tema “Eu e a Escola” do nível A2, para a faixa etária dos 8 aos 10 anos); em seguida,
surge na página 16, sob o tema “Higiene e Saúde”, no nível A1, também para a faixa
etária de 8 a 10 anos; e, finalmente, na página 18, também sob o tema “Higiene e
Saude”, no nível B1, para a faixa etária de 11 a 14 anos. A título de exemplificação,
apresentamos aqui, na Figura 1, o primeiro caso elencado:

Figura 1 – QuaREPE – Fichas Modulares

45
Fonte: QuaREPE (2005, p. 7)

Ao observarmos a ficha modular referente ao nível A2, tematizada como “Eu e a


Escola” para estudantes de 8 a 10 anos, percebemos que o tratamento dado ao conteúdo
gramatical “Graus dos adjetivos” objetiva promover o reconhecimento dessa ferramenta
linguística por parte do estudante. Esse entendimento é possível porque, ao
correlacionar as colunas, percebemos a necessidade de se realizar uma abordagem
contextualizada, tendo situações reais de uso como a motivação para o aprendizado de
tal conteúdo. Assim, a presença, na coluna “Campo Lexical”, dos seguintes temas
“Caracterização de colegas e amigos”, “Nacionalidades”, “Países, capitais e outras
cidades”, dentre outros, aponta para a proposição de uma abordagem que enxergue
nessas temáticas contextos de usos dos graus dos adjetivos. Além disso, na coluna
“Exemplos de realizações linguísticas”, há sugestões de estruturas que auxiliam na
construção e pesquisa por materiais que apresentem esse conteúdo. Cabe destacar que o
QuaREPE traz, na coluna “Textos”, diversos gêneros nos quais se pode construir um
bom trabalho na sala de aula ou com o material que será produzido. Além de figurar
nesse nível, o conteúdo Grau dos adjetivos também consta no nível A1, indicado para

46
crianças de 8 a 10 anos e tematizado “Higiene e saúde”. Nesse nível, a abordagem
sugerida é mais simples, visto que, por ser o primeiro nível, deseja apresentar tal
conteúdo ao estudante. Isso pode ser confirmado por meio dos outros conteúdos
direcionados a esse nível e pela leitura que se pode fazer da coluna “Exemplos de
realizações linguísticas”, pois os exemplos são mais diretos e adequados a quem está no
início do processo de ensino e aprendizagem de PLE.
Embora saibamos que o QuaREPE tenha dado à comparação um único espaço em
suas fichas modulares, entende-se que o quadro evidencia uma flexibilidade muito
grande para a execução do trabalho a ser feito em sala de aula ou na construção de
materiais. Além disso, é possível notar que a parte de “Conteúdos Gramaticais”
funciona como um norteador e que adaptações podem ser feitas dentro de cada nível e
entre os níveis, sendo, assim, uma importante ferramenta para o professor. Outro fator a
se destacar reside no fato de as colunas “Campo Lexical”, “Exemplos de realizações
linguísticas” e “Textos” ampliarem a possibilidade de se produzirem materiais e aulas
com materiais genuínos, visto que as sugestões dadas pelo quadro são inúmeras e
funcionam como orientações, não como uma prescrição a ser seguida.
Assim, mesmo não apresentando a comparação estruturada por conectores de
maneira direta, vemos a possibilidade de se construir uma abordagem na qual tal
conteúdo esteja presente, por exemplo, quando se for trabalhar com conectores ou
expressões idiomáticas nos níveis B1, B2 e C1. Por não ser uma proposta restritiva,
favorece a construção de um trabalho focado no uso em que, por exemplo, o tema dessa
tese poderia ser descrito por meio de situações reais de uso nas quais a comparação
estruturada por conectores ocorre, refletindo acerca da ideia de algo que não é
simplesmente a possibilidade de apresentar o grau de um adjetivo, mas de também
mostrar como os conectores possuem um importante papel na estruturação dos
enunciados da língua, no nosso caso, sobre como a comparação é construída por eles.

47
4. APORTE TEÓRICO

A abordagem dada à comparação estruturada por conectores nos manuais de PLE


tem como aporte teórico o Funcionalismo. Essa teoria (cf. Moura Neves, 1997) constitui
a base também dos estudos sobre estruturas comparativas que utilizamos para entender
como os manuais apresentam tal conteúdo (cf. Rodrigues, 2001, 2009, 2010, 2013 e
2014). Ressalte-se, ainda, que a visão de língua em uso e as reflexões trazidas pelos
referidos trabalhos foram fundamentais para que pudéssemos construir nossa análise
dos dados encontrados nos manuais e chegar às nossas conclusões.

4.1. Funcionalismo

No âmbito dos estudos linguísticos, diversos autores abordam língua e linguagem


a partir de prismas epistemológicos diferentes. Contudo, em boa parte das definições
existentes, observa-se que os conceitos de comunicação, interação e contato são a eles
relacionados.
O conceito de linguagem é muito importante para se compreender o ensino de
uma língua, pois a relação entre língua e linguagem, por exemplo, figura como um dos
principais objetos de estudo da Linguística. Igualmente, pensar língua e linguagem
implica refletir sobre a comunicação no âmbito de uma dada cultura e, mais
amplamente, no diálogo entre diferentes culturas e no campo do multiculturalismo.
Logo, entende-se que as noções de linguagem, língua, comunicação e, também, cultura
estão intimamente ligadas e são importantes para o estabelecimento de estratégias e
ferramentas direcionadas ao ensino de uma língua.
A Linguística, enquanto ciência, teve o cuidado de definir não somente
“linguagem”, mas também “língua” e de defender que essas duas noções não devem ser
entendidas de maneira separada, já que estão profundamente imbricadas.
Cunha (2009), adotando a proposta funcionalista, define linguagem como
instrumento de interação social, ao mesmo tempo em que aponta a relação profunda e
intrínseca existente entre linguagem e sociedade. Por esse viés, descrevem-se os
fenômenos extra e intralinguísticos com vias a contemplar a situação comunicativa na
qual está inserido o discurso. Assim, analisar as regularidades envolvidas no processo
comunicativo e interacional, bem como as condições de uso da língua e da linguagem
em cada contexto específico tornaram-se matéria do Funcionalismo.

48
Dik (apud Moura Neves, 1997) explica que uma língua, à luz da corrente
funcionalista, deve ser compreendida como um instrumento de interação social entre
seres humanos com o objetivo primeiro de estabelecer entre seus usuários relações
comunicativas. Nessa definição, percebe-se que o papel da língua é a mediação da
comunicação entre sujeitos que constituem a sociedade ao mesmo tempo em que por ela
são constituídos. Segundo essa perspectiva, então, língua, linguagem e relações sociais
são conceitos interdependentes.
No âmbito do Formalismo, no que se refere à língua e à linguagem, apresentamos
um comentário de Kennedy (2008, p. 189):

Com o gerativismo, as línguas deixam de ser interpretadas como um


comportamento socialmente condicionado e passam a ser analisadas
como uma faculdade mental natural. A morada da linguagem passa a
ser a mente humana.

A assertiva do autor permite-nos demonstrar uma visão racionalista de língua,


atrelada a questões de ordem cognitiva e ancorada a uma perspectiva inatista, que
compreende a língua como capacidade inata do ser humano. Isso explicaria por que as
línguas vão apresentar características que as unem e as distanciam umas das outras.
Freitas (2015, p. 7-8), por sua vez, possibilita-nos acrescentar mais considerações
sobre o tema ao apresentar a concepção chomskiana de faculdade da linguagem:

Na concepção de Chomsky (2005), a faculdade humana de linguagem


consiste em uma propriedade da espécie, de modo a variar
pouquíssimo entre os seres humanos, podendo ser considerada um
“órgão da linguagem” (p. 31) à medida que se têm sistemas visual,
imunológico, circulatório etc. como órgãos do corpo.

Segundo Chomsky (2005), tal órgão, assim como os demais que compõem a
estrutura biológica humana, é um sistema de estrutura complexa, possuindo expressão
genética. Ademais, cada linguagem é a culminância da inter-relação do estado inicial –
comum à espécie –, concebido como um sistema de aquisição de linguagem, e o curso
da experiência, que serve de input e fornece a linguagem como output – o qual é
representado na mente/cérebro. Isso comprova uma visão de linguagem pautada em um
componente biológico e não no social, apesar de o input ser gerado pela convivência
entre os sujeitos dessa espécie, ou seja, o gatilho da linguagem se dá na interação.
Dessa maneira, percebe-se que, segundo a visão formalista, o que é básico na
linguagem não é o dado social, mas sim a sua natureza intrínseca ao ser, que lhe é

49
constitutiva desde a origem, um dado genético, diferenciador da espécie humana.
Logicamente é importante destacar que Chomsky (2005) não nega o componente social,
mas o relaciona ao input que faz com que o sistema de aquisição de linguagem, próprio
ao ser humano, forneça com o output a linguagem. Isso nos mostra mais uma vez, como
supracitado, que existe uma clara necessidade de considerar a interação como algo
presente nesse processo.
Outro linguista a contribuir para a discussão do conceito de linguagem é Sapir
(1929). Com base em uma perspectiva estruturalista, ele a define como “um método
puramente humano e não instintivo de se comunicarem ideias, emoções e desejos por
meio de símbolos voluntariamente produzidos” (SAPIR, 1929, p. 8).
Vê-se que a concepção de linguagem proposta por Sapir (1929) subsidia uma
abordagem antropológica da linguagem que teve importante influência nos estudos
linguísticos da primeira metade do século XX. Assim como Chomsky (2005), Sapir
(1929) atribui a linguagem a uma característica do ser humano, portanto, antropológica,
porém, em lugar de lhe atribuir natureza cognitiva, compreende-a como método
consciente – já que não instintivo – de comunicação. Sapir (1929) realça, ainda, a
natureza simbólica da linguagem e ainda que o componente social não seja o foco de
sua discussão, vincula à linguagem o papel de comunicar “ideias”, “emoções” e
"desejos” – os quais, inegavelmente, têm raízes socioculturais.
No âmbito dos estudos estruturalistas, Saussure (2006) afirma que a linguagem
tem um lado individual e um lado social, sendo impossível conceber um sem o outro. A
linguagem, para este linguista, implica, ao mesmo tempo, um sistema estabelecido e
uma evolução: a cada instante ela é uma instituição atual e um produto do passado.
Portanto, também Saussure (2006), ao falar de linguagem, afirma sua natureza social,
ainda que não a eleja como objeto de estudo. Segundo ele,

Língua é, ao mesmo tempo, produto social da faculdade da linguagem


e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social
para permitir o exercício dessa faculdade nos indivíduos. Tomada em
seu todo, a linguagem é multiforme e heteróclita [...] ao mesmo tempo
física, fisiológica e psíquica, ela pertence além disso ao domínio
individual e ao domínio social; não se deixa classificar em nenhuma
categoria de fatos humanos, pois não se sabe como inferir sua
unidade. (SAUSSURE, 2006, p. 16-7)

No campo dos estudos sociolinguísticos, Cezário e Votre (2009), ao abordarem a


natureza da linguagem, apontam que o ser, o sujeito que se insere e se constrói em uma

50
dada comunidade, partilhará com ela e no seu contexto sociocultural, as experiências e
as atividades que a assinalam, que dela são próprias, ao mesmo tempo em que cria com
essa comunidade e com os outros sujeitos que a constituem, traços comuns que se
expressam em ações, escolhas, valores, mas, sobretudo, na linguagem. Esses traços
constituem elos coesivos, de identificação e pertencimento a uma dada comunidade
linguística e a um dado grupo social.
Ainda que o vínculo entre linguagem, língua, sociedade e cultura se mostre
fundamental no âmbito da Sociolinguística, também as correntes de estudos atreladas
ao Estruturalismo e ao Gerativismo, ainda que voltem seu olhar, sobretudo,
respectivamente, ao sistema da língua e ao processo de aquisição da linguagem e suas
implicações, reconhecem que linguagem, comunicação, sociedade e cultura estão
intimamente relacionados.
O que se nota com essas asserções de diferentes perspectivas teóricas e de
momentos distintos da história da Linguística é que, independentemente da corrente de
estudos linguísticos investigada, aos conceitos de língua e linguagem está atrelada a
dimensão sociocultural e comunicativa. A linguagem não tem natureza estanque; ao
contrário, é resultante de um processo dinâmico, vivo e ininterrupto de construção
própria do ser humano, mas em cujo andamento a sociedade tem papel fundamental.
Assim, pensar o processo de ensino e aprendizagem de uma língua implica
necessariamente pensar e discutir usos linguísticos nas situações comunicativas reais,
uma das preocupações da proposta funcionalista que adotamos.
Funcionalismo é uma corrente linguística que procura explicar os fenômenos
linguísticos de forma mais ampla, levando em consideração os aspectos pragmáticos,
como o contexto de produção e as condições dos falantes, que influenciam no resultado
da interação comunicativa – o discurso. Desse modo, a teoria funcionalista considera
que uma língua se encontra frequentemente em um processo de mudança, ou seja, a
variabilidade do idioma passa a ser um fator determinante para seu estudo e seu
entendimento.
Moura Neves (1997) afirma que somente descrever um enunciado, uma sentença e
desconsiderar a interação comunicativa e todos os elementos nela envolvidos torna a
análise do item linguístico, em certa medida, parcial. Assim, entende-se que a
competência comunicativa precisa ser levada em conta ao se abordar qualquer
fenômeno linguístico.

51
Na área de PLE, os estudos de Júdice e Trouche (2005) merecem destaque.
Segundo as autoras, existe no processo de ensino de uma segunda língua a real
necessidade de se trabalharem questões de cunho gramatical; porém, estas devem estar
sempre sendo apresentadas ao estudante com foco no uso que se faz delas durante a
interação social. Assim, a mera ação de decorar ou memorizar certos itens não vai
satisfazer o afã do aluno em falar o novo idioma plenamente e fará do professor alguém
que ensina algo diferente da realidade linguística em que o estudante está ou estará
inserido.
Desse modo, as estudiosas entendem que adquirir uma língua significa, então, ter
um desempenho satisfatório em situações concretas de convívio social e não
simplesmente ter o domínio de regras gramaticais, muitas vezes, arcaicas e fora da
realidade do discente. Atualmente, muitos manuais têm melhorado nesse sentido e na
escolha de textos e valores culturais a serem apresentados ao aluno. No entanto, torna-se
essencial que se elaborem materiais que auxiliem alunos e professores a entenderem e a
aceitarem a variação linguística, aspecto ainda pouco explorado.

4.2. As orações comparativas

A presente seção tem como finalidade descrever alguns dos estudos existentes
sobre orações comparativas ou construções comparativas. Primeiramente, fazemos uma
breve descrição daquilo que é apresentado pela tradição gramatical, posteriormente,
apresentamos abordagens descritivas de orientações diversas e, por fim, abordagens
linguísticas mais recentes.

4.2.1. No âmbito da tradição gramatical

A maior parte das Gramáticas Tradicionais de Língua Portuguesa classifica as


orações comparativas como um tipo de oração subordinada adverbial. Tais orações
veiculam conteúdo semântico de comparação, que “serve para esclarecer um
pensamento ou um conceito mostrando a semelhança, a igualdade (ou desigualdade), ou
aquilo com que outra coisa está ou deixa de estar de acordo” (SAID ALI, 1969, p. 144).
Com relação à classificação formal, há dois aspectos a ressaltar: a forma do verbo
e a presença/ausência de conjunção. Assim, caracterizam-se as comparativas por

52
apresentarem o verbo sempre na forma desenvolvida e serem introduzidas por
conjunção. Há, todavia, usos em que o verbo não aparece.
Há que se destacar também que não há consenso entre os gramáticos Said Ali
(1966; 1969), Luft (1976; 1978), Cunha e Cintra (1985), Bechara (1987), Kury (1987),
Cunha (1990), Bechara (1992) e Rocha Lima (1998) sobre a classificação das
comparativas como correlatas, o que se verifica em Oiticica (1942; 1952) e Nascentes
(1959), aspecto que não será aqui abordado.
De modo geral, os gramáticos classificam as comparativas em comparativas de
igualdade, superioridade e inferioridade, e as inserem entre as orações adverbiais,
indicando os elementos formais que as formam – mais, menos, ...que, ...como.
Geralmente, os critérios empregados para a definição de comparação são
semânticos e/ou formais. Segundo o critério semântico, consideram-se comparativas as
orações que expressam o resultado de uma comparação entre dois conceitos, que, do
ponto de vista do modo, qualidade ou quantidade dos mesmos, aparecem como
semelhantes, iguais ou desiguais. De acordo com o critério formal, denominam-se
comparativas as estruturas em que há, no primeiro segmento da comparação, intensivos
do tipo mais, menos ou tanto e em que o segundo seja introduzido por que, de ou como.

4.2.2. Em abordagens descritivas

No âmbito dos estudos descritivos sobre as comparativas em Língua Portuguesa,


há aqueles que descrevem as comparativas como orações subordinadas adverbiais,
como, por exemplo, Senna (1991), que não se desprende da classificação tradicional.
Há, também, aqueles como Azeredo (1990) e Mateus et alii (1983), que não adotam a
classificação tradicional, já que ambos as colocam em um grupo à parte das orações
adverbiais.
Segundo Senna (1991), as comparativas integram o grupo das adverbiais
tipicamente subordinadas. No entanto, o próprio Senna (1991, p. 144) destaca: “nem
tudo o que se denomina oração comparativa é de fato uma subordinada adverbial, assim
como entre as adverbiais comparativas há dois tipos distintos”. Conforme o autor, as
orações comparativas diferenciam-se pela relação que estabelecem com seus
antecedentes, que podem ser intensificador ou verbo. Sendo assim, classificam-se em
comparativas determinantes de intensificador e comparativas determinantes de não-
intensificador.

53
As comparativas determinantes de intensificador são as estruturas caracterizadoras
da comparação de igualdade, superioridade e inferioridade, conforme se pode observar
nos exemplos a seguir de Senna (1991, p. 144):

“Esta cerveja é tão cara quanto uísque importado .”


“Helena fala tanto quanto a Maria .”

As comparativas determinantes de não-intensificador são as estruturas que


modificam o predicado da oração principal, podendo ser deslocadas com alterações
entonacionais. Seguem-se exemplos de Senna (1991, p. 144) para esse caso:

“Helena fala tal qual Maria .”


“Tal qual Maria, Helena fala .”
“Helena, tal qual Maria, fala.”

Observando-se a tipologia proposta por Senna (1991), verifica-se que as


comparativas determinantes de não-intensificador são móveis e que as determinantes de
intensificador não o são.
Segundo Azeredo (1990), as orações comparativas não fazem parte dos casos por
ele denominados de SAdv e transposição: as orações adverbiais. O autor fará referência
a tais orações ao falar das construções intensivas. Para ele, há processos gramaticais que
servem para expressar igualdades ou desigualdades entre dois conceitos considerados,
ou em relação à quantidade (substantivos) ou em relação à intensidade (verbos,
adjetivos ou advérbios), que ele chama de relação comparativa. Esses processos são
exemplificados a seguir (Cf. Azeredo, 1990, p. 110-111):

• igualdade: “A pele dela é branca como neve.”


• desigualdade: “A pele dela é mais/menos branca do que neve.”

Orações proporcionais como Quanto mais pago essa dívida, tanto mais ela
aumenta também pertencem a esse grupo. Segundo Azeredo (1991), as proporcionais
são um tipo de comparação, já que que possibilitam tratar os fatos comparados como

54
causa e efeito concomitantes; são, por isso, segundo ele, uma forma enfática de
proporção.
Com relação ao segundo termo da comparação, o autor afirma que este pode ser
uma oração plena, como “Ele lava carros há tanto tempo quanto [eu vendo sandálias]”
(Cf. Azeredo, 1990, p. 112); uma oração elíptica, como “Não penso como [você
(pensa)]” (Cf. Azeredo, 1990, p. 112); ou um SN, como “Ele lava carros há tanto tempo
quanto [eu]” (Cf. Azeredo, 1990, p. 112). O que ele denomina de oração elíptica e de
SN, na verdade, são casos em que se observa a elipse do verbo, podendo, assim, ser
analisados da mesma maneira.
Azeredo (2000) revê a abordagem antes explicitada, isto é, não deixa as
comparativas à parte, incorporando-as em um dos grupos por ele estabelecidos. Assim,
contrariamente à Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB), que enumera nove
subclasses semânticas de orações subordinadas adverbiais, Azeredo (2000, p. 224)
estabelece quatro grupos para a classificação semântica das adverbiais:

• Grupo 1: causalidade (englobando as causais, condicionais, finais,


consecutivas);
• Grupo 2: situação (englobando as temporais, locativas, proporcionais);
• Grupo 3: comparação (englobando as comparativas, conformativas);
• Grupo 4: contraste (englobando as contrastivas, concessivas).

Ressalte-se que, no grupo comparação, entram duas subclasses semânticas e que


tais orações são analisadas como orações subordinadas adverbiais.
Azeredo (2000, p. 222-223) afirma que as comparativas ou “orações que fazem
par comparativo com um termo intensificado na oração principal” apresentam
características que as diferenciam do padrão usual de oração adverbial pela forma
correlata que apresentam. Contudo, para ele, “a correlação é um expediente retórico, de
rendimento enfático no discurso, e não um processo sintático distinto da coordenação e
da subordinação” (Cf. Azeredo, 2000, p. 156).
O autor ainda diz que a oração comparativa “tende a ser uma construção elíptica,
uma vez que as partes do significado da frase que ela e a oração principal têm em
comum só vêm explícitas na principal” (Cf. Azeredo, 2000, p. 235).

55
Assim como Azeredo (1990), Mateus et alii (1983) deixam as comparativas e as
consecutivas em um grupo à parte das adverbiais. As linguistas aproximam as
comparativas das consecutivas, visto que estas também podem se articular com ADJ,
SN, ADV e V. Assim, as orações que se encaixem em outra, mas cuja análise envolve
também o conhecimento de noções lógico-semânticas integram o que as estudiosas
denominam de construções de graduação. Portanto, segundo elas, entram aí as orações
comparativas, as consecutivas e certos complementos adjetivais frásicos introduzidos
por advérbios quantificadores envolvendo proposições que expressam grau.
No que se refere à articulação com os ADJ, vale lembrar que a estrutura do
sintagma adjetival envolve não só o ADJ, que é o seu núcleo, mas também os
especificadores, todos os elementos que quantificam o núcleo, tradicionalmente
denominados graus do adjetivo, e, ainda, os complementos, SPrep e F que aparecem à
direita do ADJ.
Seguem-se alguns exemplos de Mateus et alii (1983, p. 305-306) para isso:

1) “A Inês é mais alta que a Paula”.


2) “A Inês é tão alta como a Paula”.
3) “A Inês é tão alta que bate no teto”.

Por meio dos exemplos anteriores, não só ilustramos a proximidade das


comparativas com as consecutivas bem como a estrutura interna do sintagma adjetivo.
Para essas autoras, os complementos do SAdj sublinhados nos dois primeiros períodos –
que a Paula e como a Paula – ainda que, na Estrutura-S, não caracterizem orações, na
Estrutura-P, equivalem a orações comparativas. No que tange ao ADJ, tais
complementos constituem o segundo elemento do que tradicionalmente se conhece
como grau comparativo. No terceiro período, o complemento do SAdj que bate no teto
é formado por uma oração consecutiva.
Grau, em sentido amplo, é uma categoria linguística que afeta adjetivos, nomes,
advérbios e verbos, e que só contextualmente pode ser definido, de acordo com elas. O
grau comparativo é constituído pela conjugação dos ADV mais, menos, tão e do
complemento do ADJ que/do que SN ou como SN e tem três modalidades:

56
1. comparativo de superioridade: “O Luís é mais inteligente que o João”1;
2. comparativo de inferioridade: “O Luís é menos inteligente que o Mário”;
3. comparativo de igualdade: “O Luís é tão inteligente como o António”.

Todavia, para Mateus et alii (1983), do ponto de vista semântico, essas


modalidades podem reduzir-se a duas - um grau que consiste na relação
superior/inferior e outro, que consiste na relação de igualdade (interseção da relação
superioridade/inferioridade).
Em resumo, para as linguistas, as construções de graduação podem envolver (Cf.
MATEUS et alii, 1983, p. 482-491):

• os adjetivos graduáveis (o grau positivo), como em “O teu filho é inteligente”;


• o grau elevado (o superlativo absoluto), como em “O teu filho é muito
inteligente”;
• o grau comparativo - as orações comparativas, como em “O Luís é mais
inteligente do que o Mário é trabalhador”;
• o superlativo relativo, como em “O Luís é o mais inteligente dos filhos do
António”;
• as construções comparativas com N, como em “Eu comprei mais livros do que
a Teresa”; com ADV como em “A Helena escreve à máquina melhor do que a
Ana”; e com V como em “A Maria emagreceu mais do que a Helena”;
• as construções aparentadas com as que envolvem comparativas, como “Ele é
teimoso assim como desajeitado, Ele procedeu como esperávamos e Ele fala
conforme escreve”.

Destaquem-se dos itens antes explicitados, o grau comparativo - as orações


comparativas, as construções comparativas com N, ADV e V e as construções
aparentadas com as que incluem comparativas.
Nas construções comparativas com N, são comparadas quantidades dos mesmos
ou de diferentes objetos entre duas constantes (no grau comparativo) ou entre uma
constante e uma variável universalmente quantificada (no grau superlativo). Segue-se

1
Os exemplos de 1 a 3 são de Mateus et alii (1983, p. 484-485).

57
um exemplo de Mateus et alii (1983, p. 488): “Eu comprei mais livros do que a Teresa
(comprou) cadernos”.
Nas construções com ADV, são comparadas qualidades dos mesmos ou de
diferentes processos ou ações. Veja-se o exemplo de Mateus et alii (1983, p. 489): “A
Helena escreve à máquina melhor do que a Ana (escreve) à mão”.
Nas construções com V, incluem-se os casos que podem ser comparados ou
superlativizados. Entre os V graduáveis encontram-se os que significam mudança de
estado, como emagrecer, envelhecer, empalidecer etc. Observe-se um exemplo de
Mateus et alii (1983, p. 490): “A Maria emagreceu mais do que a Helena engordou.”
Nas construções aparentadas com as que incluem comparativas, estão casos em
que certos conectores aparentemente comparativos, apresentam outro valor associado ao
valor comparativo. Entre esses, as linguistas citam (Cf. MATEUS et alii, 1983, p. 491):

1. como, bem como, assim como, tal como, com valor comparativo e conjuntivo;
2. como, com valor comparativo e relativo2;
3. conforme, com valor comparativo e não-comparativo.

Os estudos funcionalistas priorizam a análise do texto como unidade semântica e


concebem a linguagem como instrumento de comunicação/interação. As orações
comparativas são descritas como uma relação conjuntiva aditiva, na abordagem de
Halliday e Hasan (1976), ou como uma oração subordinada adverbial que envolve a
redução por elipse, na abordagem de Haiman e Thompson (1984). Em Língua
Portuguesa, Abreu (1997) aplica os graus de vinculação estabelecidos por Haiman e
Thompson (1984) para categorizar as orações.
Halliday e Hasan (1976) tratam a articulação entre orações sob a nomenclatura de
conjunção. Conjunção, segundo os autores, é um dos mecanismos de coesão textual.
Essa mesma ideia é acolhida por Mateus et alii (1983, p. 191), que é gerativista, que
chamam de junção ou coesão interfrástica aos “processos de sequencialização que
exprimem vários tipos de interdependência semântica das frases que ocorrem na
superfície textual”, sendo os conectores frásicos e as pausas os elementos linguísticos
que promovem essa junção.

2
Emprega-se, aqui, o termo relativo para se fazer referência ao introdutor das orações relativas (orações
adjetivas na GT).

58
As principais relações conjuntivas são a aditiva, a adversativa, a causal e a
temporal; estas podem ocorrer em dois planos: o externo (referencial ideacional) e o
interno (interpessoal textual).
Nas relações do tipo aditivo, estão as comparativas, que podem indicar
similaridade (do mesmo modo, similarmente) ou dissimilaridade (por outro lado, em
oposição a).
Thompson (1984) e Haiman e Thompson (1984) defendem que as estruturas
envolvidas pela nomenclatura subordinação são bem distintas e que não devem ser
diferenciadas por um único critério. Por isso, estabelecem uma análise calcada nos
modos de articulação e na qual levam em conta algumas propriedades formais da
subordinação. Uma das propriedades da subordinação de Haiman e Thompson (1984), a
redução por elipse, caracteriza as orações subordinadas adverbiais comparativas. Em um
período como “Beethoven era tão talentoso como Mozart” (Cf. ABREU, 1997, p. 33), a
oração comparativa normalmente está incompleta. Se estivesse completa, teríamos
“Beethoven era tão talentoso como Mozart era talentoso”. De acordo com Abreu (1997,
p. 34), isso acontece para evitar redundância discursiva, já que os falantes preferem
deixar elípticos elementos do predicado dessas orações.
Segundo ele, esse mesmo tipo de elipse pode ser verificado ainda em orações
coordenadas (Cf. ABREU, 1997, p. 34) como as que se seguem:

1a.) “Fernando saiu de casa às dez horas e eu, (saí) às onze”.


2a.) “Marta comprou dois vestidos e Carla, (comprou) três”.
3a.) “Mário está apaixonado pela Valéria e Telmo, também. (está apaixonado pela
Valéria)”

Portanto, o linguista reconhece que a elipse acontece tanto na subordinação


quanto na coordenação. Com base na análise dessas sentenças, para Abreu (1997), o
falante manifesta uma intenção comparativa, já que no terceiro período, por exemplo,
poderíamos ter Mário e Telmo estão apaixonados pela Valéria.
A proposta de análise de Abreu (1997) evidencia a interferência de fatores
pragmático-discursivos nos processos sintáticos de coordenação e subordinação. Assim,
em uma análise gramatical não se pode desconsiderar os objetivos
comunicativos/interacionais com que os falantes usam a sua linguagem.

59
Abreu (1997), ao empregar a proposta de Haiman e Thompson (1984), assevera
que em relação à propriedade redução de uma das orações, esta acontece por
redundância discursiva e uma das formas de ela se manifestar é por elipse.
Moura Neves (2000), com base na gramática de usos, caracteriza as construções
comparativas, do ponto de vista sintático, pela interdependência de dois elementos e, do
ponto de vista semântico, pelo cotejo desses mesmos elementos. Sendo assim, tais
construções são formadas, segundo ela, de uma oração nuclear ou principal e uma
oração comparativa, que constitui o segundo termo da comparação em relação à
principal, ou seja, constituída do somatório dessas duas partes: o primeiro termo da
comparação e o segundo termo da comparação.
A linguista subdivide as comparativas em dois tipos principais:

1o. tipo: construções comparativas correlativas;


2o. tipo: construções comparativas não-correlativas.

As correlativas podem exprimir relações de igualdade e desigualdade, e as não-


correlativas, introduzidas por conjunção ou locução conjuntiva, expressam igualdade
(Cf. MOURA NEVES, 2000, p. 900), determinando, por consequência, o
estabelecimento de dois subtipos:

1o. construções comparativas de igualdade;


2o. construções comparativas de desigualdade.

As comparativas de desigualdade podem ser de superioridade ou inferioridade e


se iniciam por que ou do que.
Da mesma forma que a maioria dos autores consultados, Moura Neves (2000)
assevera que, normalmente, na oração comparativa, há elipse de termos. No entanto,
diferencia-se deles ao indicar maneiras possíveis de reconstrução desse segundo
elemento da comparação que é elíptico. Vejamos, então, o que a linguista apresenta (Cf.
MOURA NEVES, 2000, p. 897):

1o. recuperação no contexto (cotexto precedente ou situação);


2o. recuperação no conhecimento compartilhado entre falante e ouvinte.

60
Portanto, segundo ela, a oração comparativa pode ser reconstituída ou a partir do
contexto ou do conhecimento compartilhado entre os interlocutores. Todavia, essa
reconstituição por parte dos falantes não acontece da mesma maneira, já que é subjetiva.
No âmbito da abordagem discursiva, as propostas de classificação das orações de
Koch (1992, p. 84-89) e de Fávero (1992, p. 52-82) adotam o critério semântico e a
terminologia tradicional. Essas autoras, porém, não resolvem as distinções estruturais
abarcadas pela classificação.
Fávero (1992), ao abordar os processos de sequencialização dos enunciados, não
incorpora as comparativas entre eles.
Koch (1992), descrevendo os conectores interfrásticos, estabelece uma proposta
para o ensino desses elementos, visando ao desenvolvimento da competência textual em
língua materna. Sendo assim, a linguista trabalha com dois elementos de conexão
interfrástica ⎯ os conectores lógicos e os encadeadores discursivos. Os conectores
lógicos relacionam-se às subordinadas e indicam o tipo de relação lógica entre o
conteúdo de duas proposições ⎯ trata-se de um único enunciado, resultante de um
único ato de fala. Já os encadeadores discursivos são responsáveis pelo encadeamento
sucessivo de enunciados, conferindo-lhes uma orientação discursiva e os estruturando
em texto. Ligam-se à coordenação semântica, podendo ser de dois tipos ⎯ operadores
argumentativos e operadores de sequencialização.
No âmbito dos operadores argumentativos, responsáveis pela orientação
discursiva global dos enunciados que encadeiam, estão os operadores de comparação,
isto é, as conjunções comparativas. Para Koch (1992), operadores de comparação como
tanto, tal...como, mais...(do) que, menos ...(do) que promovem entre dois termos uma
relação de comparação.
Partindo do pressuposto de que a forma fundamental de comparação linguística é
determinar um objeto por referência a um outro, Vogt (1977, p. 60), ao estudar a
comparação e alguns operadores argumentativos como mesmo, ainda e também,
defende a premissa de que a relação de comparação possui um caráter essencialmente
argumentativo.
Segundo Vogt (1977, p. 183), as estruturas comparativas representam para os
adjetivos o que as estruturas relativas representam para os nomes, isto é, são
especificadores do adjetivo, tal como as relativas o são dos nomes.

61
Evidencia-se, pelas abordagens aqui apresentadas, que ora se aplicam critérios
estritamente semânticos, ora formais e ora se conjugam os dois para se definir
comparação.

4.2.3. Em abordagens mais recentes

O tratamento dado às construções comparativas pela gramática tradicional foi um


dos objetos de estudo do trabalho de Rodrigues (2001). A pesquisadora, neste estudo,
constatou que a comparação pode ocorrer de duas formas distintas – oracional e não
oracional.
Assim, ao rever a descrição apresentada pela GT, a autora amplia a noção de
oração comparativa, passando a considerá-la construções comparativas. A adoção de tal
nomenclatura permitiu à pesquisadora contemplar melhor a função destas estruturas na
língua.
Destaque-se que a revisão feita pela autora pode ser aplicada ao ensino de PLE,
visto que ela considerou como corpus de pesquisa dados de língua escrita e oral de
textos escritos dos séculos XVIII, XIX e XX e orais gravados no decorrer das décadas
de 70 e 90. Portanto, usos produzidos em situações comunicativas/interativas de fato.
Assim, Rodrigues (2001) mostra que, no que tange ao ensino e descrição linguística, a
análise da comparação deve partir sempre do uso.
Outro aspecto que merece destaque no estudo desta autora é o fato de ela ter
encontrado em seu corpus conectores como feito, tipo, igual e que nem, que não se
encontram no conjunto de exemplos e listas constantes na GT e livros didáticos.
O aporte teórico-metodológico da pesquisadora em sua tese de doutorado foi a
sociolinguística variacionista laboviana; posteriormente, ela adota em suas
investigações a corrente funcionalista. Assim, ela acrescenta aos seus estudos sobre as
construções comparativas, por exemplo, o conceito de prototipicidade e a noção de
mudança linguística via processo de gramaticalização. Com isso, ela pôde ampliar o
recorte e a maneira como analisava seus dados, pois a contribuição da teoria
funcionalista mostrou-se a partir disso mais adequada para descrever as construções
comparativas.
Rodrigues (2013) analisou, em roteiros de 53 filmes nacionais, o comportamento
das orações comparativas de igualdade não canônicas, ou seja, aquelas introduzidas por
vocábulos que não se comportam, segundo a tradição gramatical, como conjunções, a

62
fim de verificar o comportamento deles na língua escrita. O quadro a seguir reproduzido
do trabalho de Rodrigues (2014, p. 130) mostra os conectores comparativos de
igualdade encontrados por ela:

Quadro 3: Conectores comparativos não-canônicos presentes em textos escritos

A autora encontrou 606 ocorrências dos conectores chamados pela GT de


comparativos, a saber: como, do que, que, quanto mais, quanto, tal como, tal qual,
tanto...quanto, assim como. No entanto, o escopo do estudo eram as estruturas
comparativas com valor de igualdade, chamadas por ela de não-canônicas, ou seja,
aquelas não presentes e não descritas pela GT, as introduzidas por feito, igual, tipo e
que nem. Nesse trabalho, a pesquisadora encontrou 145 ocorrências desses itens, das
quais 89 de “que nem”, 41 de “feito”, 15 de “igual” e, por fim, 8 de “tipo”. Esses dados
nos mostram que, do total das ocorrências, 23,9% eram estruturas comparativas de
igualdade não-canônicas. Tal fato fez a autora concluir que esses itens, pertencentes à
língua falada, segundo ela mesma afirma, com base no que se encontra na GT,
constituem inovação, já que extrapolam os usos nela pré-estabelecidos. Além disso,
inserem-se em contexto de mudança linguística, conduzida pelo fenômeno da
gramaticalização, ou seja, deixaram sua categorização lexical original como verbo (no
caso de feito), adjetivo (no caso de igual) e substantivo (no caso de tipo) para
assumirem um papel mais centrado na articulação de estruturas (conectores
comparativos), conforme podemos ver nos exemplos a seguir, retirados do corpus
analisado por Rodrigues (2014, p. 137-138):

(1) TELMA — É isso aí. Depila não. Se o Edgar tá com outra, não merece você
lisinha, bonitinha. Fica cabeluda até ele tomar vergonha.

63
MARIA (Sorri, triste) — Queria ser durona [FEITO você.]
(Corpus Roteiro de Cinema - Bendito Fruto, 2004)

(2) JORGINHO – Cala a boca, Júnior. Hippie é IGUAL gente. Faz tudo que
gente faz, só não toma muito banho.
(Corpus Roteiro de Cinema - Carro de paulista, 2010)

(3) BRUNO (afobado) Mãe, mãe, deixa eu pôr o CD? Deixa, deixa, deixa?!
Fabi, meio contrariada, ajuda o filho a colocar o CD. É algo [TIPO
rouge/rebelde.] A criançada pira no som. O volume é alto. Os adultos estão dispersos
pela sala. A câmera passeia pelos rostos alterados pela bebida. Rocco e Ronaldo
reparam na calça branca e apertada de Fabi.
(Corpus Roteiro de Cinema – Feliz Natal, 2008)

(4) Agora vocês têm que fazer QUE NEM eu. Atenção! 1, 2, 3, 4...
(Corpus Roteiro de Cinema - O contador de histórias, 2009)

Os trabalhos desta autora atuam não só como uma proposta de revisão do que já
existe em termos de ensino de orações comparativas em língua materna, mas também
podem ajudar na melhoria e revisão da maneira como se ensina o mesmo conteúdo em
PLE. Com base nos resultados de frequência de uso das construções comparativas nos
diversos estudos desta autora, podemos nos guiar com relação ao uso dos conectores
comparativos em sala de aula de PLE. Assim, podemos entender a comparação
estruturada por conectores como um importante fenômeno da língua em uso tanto na
escrita quanto na fala, dentro dos diversos níveis de linguagem que compõem a Língua
Portuguesa nos textos e gêneros orais e escritos.

64
5. METODOLOGIA E CORPUS

Conforme já apontamos, objetiva-se com esta tese realizar uma investigação de


viés qualitativo acerca do fenômeno da comparação estruturada por conectores presente
nos manuais que trabalham com PLE. Para tal, buscamos coletar dados para este estudo
por meio da análise de livros que se proponham a ensinar PLE com o intuito de
identificar como esse fenômeno é apresentado e descrito nesses materiais – se por
estruturas sintáticas ou discursivas, se por itens lexicais ou ainda com palavras que
façam a comparação dentro do discurso e na interação.
Assim, utilizamos manuais de PLE comercializados no Brasil, nas lojas físicas, na
Internet e aqueles oriundos de projetos de ensino de Português para Estrangeiros e
Refugiados em universidades, associações, instituições religiosas e em outros espaços
formais ou não nos quais essa prática pedagógica ocorre. Assim, queremos verificar se
e como o manual usado em universidades e escolas de idiomas, por exemplo, aborda o
ensino das orações comparativas. Sendo assim, é importante destacar que, ao ler a
apresentação de muitos desses manuais, percebemos uma preocupação de preparar os
alunos para o exame Celpe-Bras. Em outros, nota-se que a necessidade de auxiliar o
aprendiz na comunicação se dá apenas com foco direcionado à sistematização de regras
gramaticais. Tal aspecto torna-se prejudicial tanto para o aprendiz quanto para quem vai
ensiná-lo, porque não se considera o plano interacional e tampouco a possibilidade de o
estudante encontrar-se em situação de imersão.
Esses aspectos motivaram a investigação não só de como cada manual explica,
esclarece ou entende por comparação estruturada por conectores, mas também, se isso
não é feito, como mostrar a necessidade de se pensar em maneiras de modificar tal
realidade, propondo às editoras novas propostas de abordagem deste tópico. Isso incita a
prática de um ensino reflexivo, focado no aluno, na interação deste com o professor e
em uma situação de língua em uso, conforme sugerem Moura Neves (1997) e Almeida
Filho (1993; 1997).
Dessa maneira, o tratamento dos dados divide-se em três partes: primeiramente,
realizamos a análise dos manuais em busca das ocorrências da comparação em todas as
suas materializações, a fim de verificar como essa se apresenta em cada um deles.
Posteriormente, construímos um quadro no qual listamos os resultados da investigação,

65
de acordo com a maneira que aparecem, se sintática, lexical, discursiva3, ou outras que
identificássemos a partir da coleta dos dados. Por fim, buscamos identificar qual das
ocorrências é mais produtiva e porque ela é mais ou menos frequente nos manuais.
Vale ressaltar que não pré-estabelecemos um grupo ou dupla de vocábulos ou
estruturas específicas que manifestassem a relação de comparação. Portanto,
consideramos todas as possibilidades destas encontradas no material elencado como
amostra para a pesquisa. No entanto, pelo que já sabemos dos manuais de língua
materna, esperávamos encontrar mais orações comparativas e uso de conectores
comparativos nos manuais. Partimos da hipótese, portanto, de que as estratégias
presentes nos manuais de PLE para o ensino da comparação estruturada por conectores
não são adequadas a uma proposta comunicativa tal como ocorre em língua materna.
Nossa amostra, constitui-se dos seguintes manuais didáticos:

Quadro 4: Manuais de PLE analisados


Identificação Título da Obra
(1) Português para Estrangeiros – Nível Avançado (livro de exercícios)
(2) Bem-Vindo! A Língua Portuguesa no mundo da Comunicação
(3) Novo Avenida Brasil 1 – Curso Básico de Português para Estrangeiros
Livro texto + Livro de Exercícios
(4) Novo Avenida Brasil 2 - Curso Básico de Português para Estrangeiros
Livro texto + Livro de Exercícios
(5) Novo Avenida Brasil 3 - Curso Básico de Português para Estrangeiros
Livro texto + Livro de Exercícios
(6) Passagens – Português para estrangeiros
(7) Gramática do Português do Brasil para Estrangeiros
(8) Português do Brasil para estrangeiros: Tudo Bem? Volume 1
(9) Português do Brasil para estrangeiros: Tudo Bem? Volume 2
(10) Falar...Ler...Escrever...Português: Um Curso Para Estrangeiros Com a
Nova Ortografia
(11) Bons Negócios – Português do Brasil Para o Mundo do Trabalho
(12) Pode entrar - Português do Brasil para Refugiadas e Refugiados
(13) Português para Estrangeiros I– Curso Básico 2015
(14) Português para Estrangeiros II – Nível intermediário 2015
(15) Português Para Estrangeiros II - Nível intermediário 2017
(16) Brasil Intercultural: língua e cultura brasileira para estrangeiros – Ciclo
Básico Níveis 1 e 2
(17) Brasil Intercultural: língua e cultura brasileira para estrangeiros – Ciclo
Intermediário Níveis 3 e 4
(18) Brasil Intercultural: língua e cultura brasileira para estrangeiros – Ciclo

3
Consideramos materialização sintática o caso das orações comparativas; materialização lexical, o caso
dos graus do adjetivo; e discursiva aqueles que só entendemos no contexto de uso e que, normalmente,
fogem do escopo das descrições da GT.

66
Avançado Níveis 5 e 6
(19) Brasil Intercultural: língua e cultura brasileira para estrangeiros – Ciclo
Avançado Níveis 7 e 8
(20) Brasil Intercultural: língua e cultura brasileira para estrangeiros – Ciclo
Básico Níveis 1 e 2 – Livro de Exercícios
(21) Brasil Intercultural: língua e cultura brasileira para estrangeiros – Ciclo
Avançado Níveis 5 e 6 – Livro de Exercícios
(22) Lições Brasileiras
(23) Bom Dia, Brasil
(24) Aprendendo Português do Brasil
(25) Brasileirinho: Português para crianças e pré-adolescentes

Fonte: Elaborado pelo autor (2019).

Cabe destacar que os manuais de PLE aqui analisados apresentam orientações


metodológicas e abordagem diferentes. O primeiro grupo centra-se nos livros vendidos
para quem deseja aprender o Português de forma autônoma. São eles os manuais 1, 2, 3,
4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 23, 24 e 25. Dentre esses, existem subgrupos. Um é composto de
manuais produzidos para se ensinar PLE na Argentina. São eles 16, 17, 18, 19, 20 e 21.
Contudo, esses manuais, apesar de parecerem destinados a falantes de espanhol, são
amplamente difundidos e encontrados também no Brasil e em outras partes do mundo,
sendo bastante utilizados por se pautarem na abordagem comunicativa e por
apresentarem textos e exercícios em uma versão bem atualizada. Além desse, há o
manual 25, que se destaca dos demais por ser um material destinado exclusivamente a
crianças e pré-adolescentes. A proposta é uma edição do Grupo Editorial Nacional,
E.P.U., o mesmo que edita os manuais 3, 4, 5, 7 e 10; entretanto, a orientação
pedagógica é bastante diferente dos outros, não só porque o público-alvo é outro, mas
também porque o autor, Claudenir Gonçalves, atende a um projeto pessoal, haja vista
sua larga experiência à frente de aulas de PLE para crianças e pré-adolescentes no Brasil
e na Alemanha. Cabe destacar que essa característica do autor propiciou que o livro
trouxesse uma visão de ensino de PLE na qual o uso se destacasse, assim como um
olhar que auxiliasse esse público a acompanhar as aulas de Língua Portuguesa nas
escolas regulares e bilíngues.
Já o segundo grupo de manuais conta com o material didático desenvolvido pelo
grupo de pesquisa em PLE da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), liderado
pela Prof.ª Dr.ª Denise Weiss (manuais 13, 14 e 15), presente na Internet no site do
projeto. Conta também com mais dois manuais: um produzido pelo ACNUR - Agência
Central das Nações Unidas para Refugiados, e o outro pelo MRE - Ministério das

67
Relações Exteriores por meio da Rede Brasil Cultural na Divisão de Promoção da
Língua Portuguesa, que é gerenciada pelo Itamaraty. Esses dois últimos manuais foram
construídos por equipes de pesquisadores de universidades brasileiras que têm larga
experiência na área de PLE e na produção de material didático para estrangeiros. O
manual Pode Entrar – Português do Brasil para Refugiados e Refugiadas (12),
produzido em 2015, apresenta doze unidades e se direciona a pessoas recém-chegadas
ao país na situação específica de refugiado. O manual Lições Brasileiras (22) é dividido
em nível 1, 2 e 3, perfazendo um total de 83 módulos bem interativos com muitos links
e com temática bem atual. Ambos os manuais estão disponibilizados na Internet de
forma gratuita e acessível a quem deles necessitar.
É importante ressaltar que os manuais 13, 14 e 15, por serem parte de um projeto
de ensino universitário de PLE – ou seja, são parte de uma unidade curricular (UC) da
UFJF – apresentam um direcionamento focado na preparação para o exame Celpe-Bras.
Isso justifica-se pelo fato de este ser um material oriundo de uma demanda frequente
nas universidades brasileiras, os intercambistas. Muitos deles necessitam ter seu nível
de proficiência em Língua Portuguesa avaliado pelo exame Celpe-Bras, para que
possam concluir seu processo de intercâmbio e validar as unidades e os componentes
curriculares cursados no Brasil. Assim, muitas instituições de ensino superior (IES)
promovem diversas iniciativas pedagógicas com intuito de ensinar a Língua Portuguesa
e a cultura brasileira para os alunos estrangeiros em situação de intercâmbio. Por esse
motivo, há nas IES materiais didáticos construídos por docentes que assumem essa
tarefa, e o da UFJF é um desses.
Diante desse espectro, é provável que os manuais analisados nessa tese ensinem o
PLE com objetivos e propostas metodológicas distintas. Para melhor interpretar os
dados e as propostas trazidas pelos manuais analisados, utilizamos como ferramenta de
análise uma adaptação da ficha de avaliação de livros didáticos de Língua Portuguesa
formulada pelo Ministério da Educação utilizada pelos avaliadores de livros didáticos
do Programa Nacional do Livro Didático (PLND). Apesar de sabermos que esta ficha
foi elaborada para a avaliação de livros de língua materna, sua utilização nos permite ter
um panorama geral dos materiais didáticos elencados, além de possibilitar verificar
também se há diferenças substanciais nos manuais de PLE em relação aos de PLM no
que diz respeito ao ensino da comparação. No próximo capítulo, apresentamos algumas
considerações gerais dos materiais didáticos analisados segundo a ficha (cf. anexo).

68
6. ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS

Conforme já dissemos, o corpus deste trabalho foi elaborado com base numa
amostra de vinte e cinco manuais de ensino de PLE com o objetivo de responder às
seguintes perguntas:

1. Aparece no manual a noção de comparação? Caso a resposta seja sim, em que


nível (sentencial, discursivo, intersentencial) ela se manifesta?
2. O enfoque dado ao tema da comparação pode ser avaliado de que maneira
(gramatical, descritivo, reflexivo etc.)?
3. Que tipos de construções comparativas (simples, complexas) aparecem nos
manuais?

As questões antes listadas serviram de base para a análise dos vinte e cinco
manuais que ensinam português para estrangeiros editados nos últimos anos e
amplamente comercializados e anteriormente arrolados. Contudo, para a realização de
uma investigação em que tivéssemos parâmetros de análise mais claros e objetivos,
optamos pelo uso da ficha (cf. anexo), que se assemelha àquela utilizada para a análise
de livros didáticos de Língua Portuguesa feita pelo Programa Nacional do Livro
Didático (PNLD). A escolha desta ferramenta visa a uma descrição mais sistemática e
consistente dos manuais, conforme já dissemos, além de possibilitar a reflexão sobre
algumas questões consideradas para língua materna que já se encontram no ensino de
PLE.
Assim, para cada manual, a análise por meio da ficha organiza-se em três grandes
seções: a) Avaliação de aspectos gerais da obra, contemplando os aspectos formais,
aspectos estruturais, linguagem verbal, linguagem não verbal e preceitos éticos; b)
Avaliação relativa a aspectos teórico-metodológicos, englobando Leitura e produção
de textos e Metodologia de ensino, visando a identificar as atividades de leitura e de
produção de textos; c) Atividades e exercícios, objetivando a avaliação das atividades e
exercícios propostos pelo livro.
Assim, no que se refere aos aspectos específicos, relativos às perguntas
envolvidas por cada aspecto geral antes mostrado, o parâmetro de avaliação pauta-se em
respostas do tipo SIM e NÃO para questões mais objetivas, ou seja, que visam a
identificar simplesmente a presença ou ausência de um determinado quesito da

69
avaliação. Já as perguntas subjetivas foram controladas por meio da legenda O, para
ótimo; B, para bom; S, para suficiente e I, para insuficiente. Todavia, para as perguntas
relacionadas à comparação, houve necessidade de estabelecermos outros quesitos de
análise, tendo em vista o fato de estarmos adaptando a ficha de análise criada e adotada
para avaliação dos manuais de PLM, para que atendesse, portanto, aos objetivos desse
estudo. Assim, M, foi usado para quando a comparação estivesse presente em sua
configuração morfológica, por exemplo, em situações de adjetivação. SIN, para os
contextos em que a estruturação desse fenômeno pelo viés sintático se fizesse presente;
SEM, para as ocorrências nas quais a noção semântica de comparação ali se construísse;
DIS, para os contextos em que essa estratégia acontecesse por meio do discurso e, por
fim N, quando não houvesse nenhuma ocorrência ligada à comparação.
Então, com a ideia de facilitar a discussão e a leitura dos resultados da análise dos
manuais com base nos critérios anteriormente comentados e de acordo com a ficha (cf.
anexo), utilizamos como identificação dos livros aquela proposta no quadro 1.

6.1. Avaliação de aspectos gerais da obra

Nesta seção, observamos que, no que se refere aos aspectos formais, a maioria dos
manuais apresenta um sumário que reflete a organização interna dos livros de maneira
clara e que permite a localização de informações nesses manuais por parte do usuário.
Contudo, percebemos, em alguns casos, a sobreposição de conteúdos gramaticais,
levando o estudante a não conseguir encontrar rapidamente o que necessita. Isso foi
constatado, por exemplo, no manual (7), que fornece um sumário pouco claro, ou seja, a
sua organização não permite ao estudante encontrar com facilidade aquilo que o livro
apresenta. Outro manual pelo qual se ilustra esse aspecto é o (6), que traz uma
organização dos seus conteúdos pouco clara, o que pode gerar dificuldade para o
estudante ao procurar o conteúdo desejado nesse livro, conforme pode ser visto na
Figura 2.

70
Figura 2 – Manual (7)

Fonte: Do autor, 2019.

A figura 2 mostra o modo como o manual (7) organiza seus conteúdos. A


disposição das ideias e a separação das atividades e propostas presentes no manual não
são claras o suficiente para promover ao estudante uma localização fácil de todas as
informações presentes. Além disso, cabe destacar que isso impede que o aluno tenha a
possibilidade de escolher as atividades, textos e conteúdos que deseje trabalhar.
Os recursos gráficos relativos à estruturação do livro, como seções, títulos e
subtítulos, na maioria dos manuais, auxiliam na localização e compreensão da
informação. Contudo, muitos ainda trazem isso de forma muito sucinta, o que pode

71
exigir do estudante dispender maior tempo para buscar um determinado conteúdo,
conforme podemos verificar nos manuais (1) e (6). Ainda assim, a maneira como os
manuais (8), (9) e (11) organizam o sumário permite uma apresentação bem interessante
e que auxilia na busca por informações.
É sempre interessante lembrar que, muitas vezes, o estudante não se encontra no
Brasil e nem tem apoio de um professor e/ou tutor para orientá-lo quanto ao processo de
aprendizagem e entendimento sobre o funcionamento/organização do manual. Assim,
ter esta parte bem organizada facilita não só a leitura, mas também a compreensão de
uma série de processos envolvidos na aquisição da língua e da cultura.
Quantos aos critérios de legibilidade, as referências bibliográficas e a impressão,
não há problemas, pois todos os manuais mostraram muito cuidado ao trabalhar esses
quesitos. Dessa forma, podemos afirmar que a leitura e a compreensão dos tópicos
presentes em cada manual não são prejudicadas por esses quesitos. É importante
lembrar que, em muitos manuais, o cuidado com os recursos relativos à legibilidade
(tais como a possibilidade de se converter os símbolos ali apresentados em ideias e/ou
conceitos), por exemplo, destacam-se nos aspectos formais
Na parte estrutural, os manuais organizam os assuntos, temas, conteúdos e textos
em diversas possibilidades, usam como nomes de capítulos e/ou unidades situações
cotidianas e dentro dessas distribuem os conteúdos. Já outros usam listas e alguns
dividem os conteúdos em gramática, leituras, exercícios e apêndice.
Como sabemos, o ensino de uma língua e o processo de aprendizagem por parte
de um estudante e, até mesmo da metodologia a ser empregada pelo professor, vincula-
se com o material didático escolhido, segundo nos orienta Almeida Filho (2005). Assim,
para que haja uma dinâmica eficiente nessa interação, é fundamental haver
harmonia/equilíbrio naquilo que é apresentado pelos manuais de ensino de língua, ou
mesmo no livro didático de qualquer disciplina, ou seja, é essencial dosar os conteúdos
para produzir uma abordagem harmônica e coerente. Entretanto, isso não foi verificado
em todos os manuais, pois alguns trazem uma grande quantidade de tópicos
relacionados ao mesmo tema. Ousamos dizer, inclusive, que, em boa parte dos manuais,
a predominância é de temas ligados ao uso de verbos de forma não contextualizada. É
importante destacar que não há incoerência nos manuais na abordagem deste conteúdo,
mas sim falta contextualização a respeito de alguns tópicos, como veremos mais adiante
neste trabalho. A seguir apresentamos um quadro que indica a quantidade de tópicos,

72
temas, unidades, capítulos ou páginas dedicadas ao tema verbos encontrados em cada
manual:

Quadro 5 – Espaço ocupado pelo verbo nos manuais

Manual Total Quantidade encontrada


(1) 137 páginas Ocupa 68 páginas
(2) 20 unidades Presente em 08 unidades
(3) 06 lições Presente em todas as lições como tópico central
(4) 06 lições Presente em todas as lições como tópico central
(5) 08 lições Presente em todas as lições como tópico central
(6) 222 unidades Presente em 137 unidades
(7) 238 páginas Presente em 31 páginas
(8) 10 unidades Presente em todas as unidades
(9) 10 unidades Presente em 9 unidades
(10) 18 unidades Presente em todas as unidades
(11) 20 unidades Presente em 19 unidades
(12) 12 unidades Presente em todas, mas não como tópico central
(13) 40 tópicos Presente em 18 tópicos
(14) 07 unidades Presente em 5 unidades
(15) 18 tópicos Presente em 10 tópicos
(16) 08 unidades Presente em 7 unidades
(17) 08 unidades Presente em 4 unidades
(18) 08 unidades Presente em 3 unidades
(19) 08 unidades Presente em 3 unidades
(20) 07 unidades Presente em 6 unidades
(21) 08 unidades Presente em 7 unidades
(22) 80 módulos Conteúdo contextualizado com ênfase na comunicação e na
interação
(23) 36 lições Presente em 25 lições
(24) 13 unidades Presente em todas as unidades
(25) 08 unidades Presente em todas as unidades

Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

73
O quadro anteriormente explicitado evidencia a predominância do conteúdo
gramatical “verbo” em boa parte dos manuais. Somente um manual, o (22), não
apresenta um capítulo, lição, tópico ou item direcionado à sistematização desse
conteúdo. Tal constatação permite diversas conclusões a respeito da abordagem
presente nos manuais, pois se pode observar que o espaço destinado ao tema indica que,
certamente, outros tópicos deixaram de ser trabalhados ou nem foram considerados. Isso
é importante destacar, pois ao pensar nos manuais que são volumes únicos, entende-se
que esse destaque pode levar o aprendiz de PLE a achar que nossa língua depende do
uso do “verbo” a todo tempo e que parece não haver um espaço destinado a outras
classes gramaticais, por exemplo.
Outro aspecto analisado foi o modo pelo qual cada manual utiliza as linguagens
verbal, não verbal, mista e digital. Isso influencia diretamente na abordagem que os
livros dão a determinados conteúdos, como, por exemplo, a maneira como trabalham
temas ligados ou não à variação linguística ou à mudança de registro linguístico. A
predominância de tópicos, capítulos, lições, ou seja, espaços destinados a verbos,
conforme explicitado antes, já nos dá alguns indícios sobre como os manuais trazem
esses tipos de linguagem em suas seções. Diante disso, no que diz respeito ao uso da
linguagem, percebe-se que a modalidade não verbal caracteriza a maioria dos manuais.
Contudo, a presença ou ausência de ilustrações, por exemplo, varia de acordo a proposta
pedagógica e a condução dada no que diz respeito à metodologia ou ao viés teórico do
manual. Assim, os manuais (1) e (7) não apresentam ilustrações por terem como foco
principal as questões gramaticais, independentemente de um ser uma gramática e o
outro um livro didático para alunos de nível mais avançado.
Utilizar ou não ilustrações não se caracteriza como uma obrigatoriedade nos
materiais didáticos, entretanto, a ausência deste recurso nas atividades de aprendizagem
pode furtar do estudante, muitas vezes, a possibilidade de experienciar um conteúdo por
meio de outro viés que não o estritamente verbal. Cabe destacar que os manuais (2), (3),
(4), (5), (6), (8), (9), (10), (11), (12), (13), (14), (15), (16), (17), (18), (19), (20), (21),
(22), (23) e (25) possuem partes de seus conteúdos em formato multimídia e/ou digital
para assim auxiliar o aluno no aprendizado.
Os textos, os gráficos, as tabelas e as ilustrações estão identificadas em relação às
fontes e suas linguagens estão claras e se apresentam adequadas ao grau de escolaridade
a que se propõe grande parte dos manuais. Não identificamos em nenhuma obra
inadequações graves no que se refere ao uso da variante padrão da Língua Portuguesa.

74
Contudo, sentimos falta de uma discussão mais aprofundada a respeito da variação
linguística em alguns livros, conforme explicitamos mais à frente.
Sobre os preceitos éticos, podemos afirmar que nenhuma das obras analisadas
empregam discursos, textos, imagens, ideias ou ideologias que promovam
discriminação ou disseminem o preconceito em nenhuma de suas formas. Além disso,
não há também a difusão de conteúdos que destoem da legislação vigente e tampouco
construa uma proposta focada na depreciação dos direitos humanos, do meio ambiente
ou demais regulamentações dessas áreas. Cumpre ressaltar, ainda, a não vinculação ou
fidelização dos manuais a artigos, serviços ou organizações comerciais, salvo casos em
que isso é material pedagógico.

6.2. Avaliação relativa a aspectos teórico-metodológicos

Nesta seção, abordamos primeiramente os dados referentes à Leitura e Produção


de Textos no âmbito dos Conceitos Gerais, posteriormente os da Metodologia de
ensino, no que se refere à leitura. Assim, em relação à concepção de texto, identificamos
abordagens diferentes por parte dos manuais, já que até mesmo a ideia de conceber um
conteúdo não verbal como texto, explicitando todas as potencialidades para os
exercícios de leitura, interpretação e análise não constitui a perspectiva de todos os
livros.
Entendemos, assim como Koch (1997), que o texto não pode ser visto como um
produto desvinculado da situação comunicativa, já que o compreendemos como o
resultado da atividade comunicativa, ou seja, texto implica interação, comunicação.
Assim, a compreensão do que é um texto relaciona-se a processos, operações e
estratégias presentes na mente humana e que, segundo autora, são colocados em ação
em situações concretas de interação social. Segundo essa perspectiva, não se pode
desvincular o texto do discurso e, portanto, da comunicação, ou seja, para se ensinar
uma língua, tal concepção precisa ser considerada, tendo em vista a necessidade de
interação e interlocução do aprendiz para adquirir esse novo idioma.
Essa visão corrobora com a que é adotada como parâmetro na ficha e que norteou
a análise dos manuais à luz desse critério. Então, dos vinte e cinco manuais analisados,
cinco apresentam uma visão de texto não diretamente relacionada à abordagem trazida
por esse trabalho – os manuais (1), (3), (4), (5) e (7). Nesses manuais, a visão utilizada

75
concebe o texto como um elemento não dinâmico e este é empregado nos livros
somente como pretexto para abordagem de conteúdo gramatical.
O manual 7 é uma grámatica de PLE que apresenta uma abordagem descritiva,
mas ainda alicercada nas regras da gramática tradicional, pois não há sequer uma alusão
ao conceito de variação linguística ou à possibilidade de se ensinar a língua em uso ou
ainda de contemplar a oralidade. Assim, a gramática, mesmo trazendo a origem de
palavras e termos que compõem a Língua Portuguesa, exerce o papel de ser um livro de
consulta ou de aprendizagem de regras da GT. Na apresentação do livro, o autor afirma
que construiu esse material com a função de ele, o manual, ser ao mesmo tempo,
científico, acessível e prático, entretanto, o cumprimento dessas três metas somente é
possível, segundo nosso olhar, para estudantes que possuam um acompanhamento com
outros materiais e com um professor para fazê-lo entender plenamente a lógica da
metodologia do livro. Além disso, cabe destacar que o uso de textos, a fim de promover
uma abordagem centrada no uso ou na contextualização dos conteúdos a serem
apresentados, não ocorreu no manual.
Há muitos manuais que carecem de uma adaptação/incorporação das
reflexões/contribuições advindas dos estudos linguísticos em relação à produção de
textos e de materiais didáticos. É de suma importância deixar claro que esse trabalho
não se propõe a avaliar as questões didático-pedagógicas envolvidas na construção dos
manuais de PLE, pois este não é o foco desta tese. Contudo, sabemos que essas questões
têm extrema relevância no processo de ensino e aprendizagem e na própria construção
do material em si, perpassando, muitas vezes, os comentários feitos ao longo da análise
empreendida.
No concernente à leitura, cumpre pontuar que, ao avaliar a concepção de leitura,
concordamos com a adotada na ficha que a concebe como a multiplicidade de sentidos
construídos a partir do texto. Ao se proceder a análise dos materiais à luz desse critério,
constatamos que em três obras a concepção de leitura como exploração dos múltiplos
sentidos que um texto possa suscitar não foi plenamente atendida – os manuais em que
verificamos isso foram (1), (3), (4), (5), (7), (11) e (24). Já nos demais, a presença de
uma diversidade grande de textos de gêneros distintos, a apresentação de muitos
contextos de uso da língua e dos textos e de uso de diferentes variantes linguísticas
propiciaram mais oportunidades ao estudante de ampliar sua leitura. Assim, a leitura
concebida a partir de um único viés e como mera decodificação de palavras ficou
inviabilizada nesses casos.

76
A concepção de leitura considerada por esta investigação entende que o processo
de compreensão de um texto seja ele de qualquer gênero deve se dar de modo pleno e
claro, a fim de proporcionar ao estudante a possibilidade de um letramento na língua
que está aprendendo. Leffa (1999) entende a leitura como um processo dinâmico de
decodificação de palavras que propicia ao leitor a compreensão do texto, bem como a
construção de seu sentido.
O manual (1) traz um texto para leitura e compreensão presente em uma tarefa a
ser desenvolvida pelo estudante. Entretanto, isso é feito de modo não contextualizado e
bem desconectado da concepção de leitura e linguagem que temos nesse estudo, pois
concebemos tanto a leitura quanto a linguagem como experiências comunicativas,
interacionais, e não só linguísticas. Nossa reflexão toma como base a proposta de
Geraldi (1997), na qual esse autor é enfático ao apresentar o caráter comunicativo
dessas duas instâncias citadas. À luz disso, é possível notar a ausência da fonte do texto
e se percebe também que o texto se propõe a ser um informativo a respeito da educação
no Brasil, temática essa bem relevante e que suscita discussões e diversas intersecções
com a cultura do aluno aprendiz. Contudo, a falta de uma contextualização adequada
dificulta não só a leitura, bem como a compreensão do papel daquele texto e daquele
tema para o processo de aprendizagem do estudante estrangeiro.
O manual (3), apresenta uma proposta mais interessante no que diz respeito ao
exercício da prática leitora do estudante, já que utiliza textos de gêneros diversos que se
unem pelo desdobramento de uma mesma temática, a rotina. Isso promove espaço para
leitura e compreensão de situações de comunicação que têm como foco uma visão de
língua em uso. Nos textos, é muito clara a reprodução do cotidiano de famílias
brasileiras, entretanto, essa abordagem ainda apresenta uma certa artificialidade de
alguns conteúdos e gera dúvidas também em relação ao foco dos exercícios, já que
muitos deles propõem-se à sistematização de regras gramaticais e não à aplicação dos
fatores de textualidade.
Nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (PCN), há a
instrução ao professor de que este deve levar o aluno a produzir textos por meio de
gêneros, tornando-o não apenas um escritor competente, mas também um leitor
competente, capaz de criticar e reformular seu próprio texto. Assim, configura-se um
trabalho de produção textual, que implica as seguintes etapas: planejamento, execução e
revisão. Nos manuais analisados, percebemos a utilização de atividades que propunham
a redação/construção de um texto, contudo, as etapas de planejamento e revisão

77
encontram-se apenas implícitas na maioria deles. Portanto, notamos que o foco de boa
parte dos manuais, tais como (1), (3), (4), (5), (6), (7), (11) e (24) é na produção do
texto sem uma contextualização adequada, ou seja, os fatores de textualidade
(aceitabilidade, situacionalidade, informatividade, intertextualidade e conectividade)
não foram plenamente considerados na atividade por eles proposta.
O manual 11 apresenta um tópico chamado “Produção Escrita”, nesse espaço há
pela primeira vez, no manual, uma menção à ideia de comparação, contudo, a proposta
não se integra à temática do nosso trabalho, visto que o manual pede que o estudante
exercite sua habilidade de comparar dois textos por meio da escrita. Não se vê na
atividade a utilização de nenhum recurso e/ou estrutura linguística comparativa que
possa auxiliar o estudante na produção de sua comparação.
No Manual (6), é possível observar que, mesmo trazendo um projeto gráfico
moderno no que diz respeito a imagens e tamanhos e tipos de fontes diversificados, as
atividades propostas não têm como foco a produção textual do aluno. A expressiva
quantidade de atividades no formato Complete as lacunas e Siga o modelo fazem do
manual ser mais um reprodutor de uma estratégia utilizada por outros manuais já citados
aqui nesse trabalho. Isso permite-nos concluir que a estratégia e/ou metodologia de
construção de textos é algo bem ineficiente no que diz respeito à noção de texto como
discurso e como interação.
Mesmo considerando que o estudante estrangeiro traz consigo saberes,
competências e habilidades de sua língua materna e, por intuição, possa conseguir
desempenhar muitas das atividades propostas, como a de produção textual, isso não é
justificativa para que o manual não a aborde de modo mais integrado à noção de
comunicação/interação. Assim, é preciso que seja apresentada ao aluno a atividade de
produzir texto como produção e construção de sentido na interação. Além disso, é
relevante destacar o papel que essa produção terá no processo de ensino e aprendizagem
como uma ferramenta que vai além da ideia de apenas se expressar, adquirir vocabulário
ou fixar tempos verbais. Portanto, torna-se imprescindível entender o quão importante é
a produção textual na aquisição dessa nova língua por parte do estudante.
O processo de escrita envolve construir a temática, pensar sobre o tema, vê-lo
como algo semelhante ou fruto da realidade, refletir sobre sua utilidade, entender seu
lugar na sociedade e seu papel no processo de comunicação, como nos orienta Geraldi
(1997).

78
Koch e Elias (2014) trazem também algumas estratégias de construção de texto
aplicáveis ao ensino de língua materna, que, podem ser muito coerentes com uma
proposta adequada ao ensino de PLE, visto que ativar os conhecimentos sobre os
componentes da situação comunicativa, selecionar, organizar, desenvolver ideias e
revisar a escrita ao longo do processo de construção do texto são imprescindíveis para a
construção de quaisquer textos e em quaisquer línguas.
Os manuais (8) e (9), por exemplo, veem a produção do texto como um processo
dinâmico e que necessita ter algumas etapas prévias para a construção do texto.
No manual 8, pode se observar a presença de uma contextualização da proposta
de atividade a ser realizada pelo estudante. Assim como no manual 9, segundo volume
da coleção da qual faz parte, constroi-se um encadeamento das tarefas com objetivo de
ampliar a discussão do tema da unidade e fazer o estudante perceber como a temática se
desdobra dentro da unidade em diversas atividades. Entretanto, a maneira pela qual os
manuais 8 e 9 trazem as atividades de produão textual ainda está distante do ideal por
não contemplar integralmente as habilidades e as competências necessárias para que a
prática da escrita textual seja eficiente, faça sentido e promova a aquisição da língua e,
por que não, também, da cultura.
O manual 12 apresenta um contexto de produção bem distinto do grupo de livros
vendidos para quem deseja aprender o Português de forma autônoma e daqueles
produzidos para um grupo de falantes de uma língua específica. Assim, esse manual
possui um papel social muito relevante, pois, além de ensinar a língua e a cultura,
funciona também como um orientador para pessoas que vêm para o Brasil como
refugiados ou migrantes forçados, situação de pessoas oriundas de países como Congo,
Síria, Venezuela e Haiti, por exemplo. Dessa forma, a maneira pela qual esse manual
conduz suas atividades leva em conta as etapas de entrada desse cidadão estrangeiro em
território brasileiro, de modo a conseguir auxiliá-lo nos processos de registro e
organização de sua estada aqui. Nessa perspectiva, é preciso considerar que os
conteúdos a serem trabalhados trazem para o processo de ensino e aprendizagem outra
lógica de ensino de PLE, uma que envolve situações diretamente ligadas a um conjunto
de demandas que só quem está em situação de refugiado ou migrante forçado vai passar.
Podemos citar como exemplo o uso emergencial do SUS ou a necessidade de abrir
conta em banco. Por isso, é possível entender a escolha dos gêneros textuais e o modo
como eles são essenciais para tal público-alvo. Com isso, o foco em gêneros da esfera
do trabalho e do registro civil, torna-se uma necessidade e não só uma mera

79
apresentação de uma tarefa descontextualizada. Isso propicia a esse estudante a inclusão
por meio de um esquema de letramento baseado na realidade na qual ele se está
inserido.
O manual (22) foi elaborado pelo Ministério das Relações Exteriores Brasileiro
por meio da Rede Brasil Cultural na Divisão de Promoção da Língua Portuguesa.
Apesar de estar disponibilizado em sua totalidade na internet no site do Itamaraty,
assemelha-se ao livro (12), já que também se destina a estrangeiros que chegam ao
Brasil em situação diferente de intercâmbio, como podemos ver nos programas das
universidades públicas brasileiras. Além disso, é possível pensar ainda que esse manual
é utilizado nos países onde o Brasil possui atividades de leitorado ou tem ações ligadas
à promoção da arte e da cultura brasileiras nas embaixadas, consulados e centros
culturais brasileiros pelo mundo afora. Assim, pode-se deduzir que tal material foi
construído com a intenção de ser um norteador para os programas governamentais
brasileiros no exterior e/ou as iniciativas não governamentais presentes no Brasil e que
são também espaços de ensino de PLE.
É importante ressaltar ainda que a abordagem dada aos conteúdos, tópicos
gramaticais e atividades de produção de textos e leitura foram produzidos de modo a
simular situações reais de uso do idioma e aquisição da cultura, envolvendo tudo que a
circunda. Desse modo, as propostas presentes nas lições em todos os níveis foram
pensadas para serem práticas e auxiliarem o aprendiz no que fosse essencial para sua
estada aqui no Brasil. Portanto, o tratamento dado à língua e à linguagem por parte do
manual pressupõe um olhar que contempla os fatores de textualidade e, sobretudo, a
interação comunicativa e a significância de textos orais e escritos de vários gêneros. Por
fim, a abordagem do manual (22) torna-se única, na medida em que deixa de lado
muitas das práticas adotadas por diversos manuais analisados por esse trabalho. Assim,
o foco na sistematização de regras da gramática tradicional, na produção somente de
textos escritos e numa visão de língua como sinônimo de reprodução da norma culta
não fazem parte de sua proposta.
A partir de agora apresentamos o que foi encontrado referente à metodologia de
ensino proposta por cada manual e os impactos dela no que diz respeito ao ensino de
PLE.
Na seção Metodologia de ensino, mostramos os resultados referentes à leitura, ou
seja, como esta é construída nos manuais, buscando identificar como os textos são
mostrados ao estudante. Nesse sentido, seguimos as orientações de Marcuschi (2005)

80
referentes aos gêneros textuais, tendo em vista a relevância desses para a plena
compreensão sobre como cada manual apresenta ao estudante a diversidade de gêneros
e quais são mais ou menos frequentes naquela língua/cultura.
Dentre os manuais analisados, oito não apresentam seus textos a partir de
orientação mais direcionada ao trabalho com a diversidade de gêneros textuais,
conforme sugere Marcuschi (2005). Constatamos isso nos livros (1), (3), (4), (5), (6),
(7), (11) e (24), em que se pode observar uma concepção de texto e de gênero textual
mais preocupada com a sistematização, por exemplo, de regras gramaticais ou de uma
utilização dos textos ou dos gêneros textuais menos integrada ao cotidiano do estudante.
Isso demonstra que a abordagem adotada por estes manuais se centra numa leitura
superficial dos textos e não propicia ao estudante um contato com os gêneros circulantes
no Brasil, por exemplo.
Com isso, as reflexões apresentadas antes em relação aos manuais (1) e (7) podem
ser comprovadas à luz daquilo já expresso em outros contextos dentro deste estudo,
visto que ambos os manuais propõem somente a sistematização de regras da gramática
tradicional e a leitura unilateral dos textos presentes nessas obras. Além disso, pode-se
notar que o foco desses manuais é o ensino e a aprendizagem da norma culta escrita da
língua numa perspectiva não interacional e sem considerar as outras variantes como
parâmetro de referência e fator de comunicação. Portanto, a visão a respeito da própria
concepção de língua é bem restrita, já que não envolve as variantes linguísticas e os
demais fatores que se aplicam ao contexto de aprendizagem de um idioma em uso. Cabe
ressaltar também que a predominância de textos da esfera escrita mais formal e textos
produzidos pelos autores não favorece um olhar sobre aquilo que circula na cena
cultural pertencente àquela língua. Com base nisso, verifica-se que a compreensão das
múltiplas linguagens presentes não é eficiente, na opinião desses autores, para o
processo comunicativo, pois a prevalência da linguagem verbal mostra um
direcionamento para um único caminho, pressupondo que o aluno terá contato com
outras linguagens em outros espaços e que o manual não o auxiliará nisso.
Os manuais (3), (4) e (5), apesar de se diferenciarem dos outros supracitados por
apresentarem um trabalho que se propõe a ser mais efetivo e buscarem uma abordagem
que tenha como fim a comunicação, também falham em diversos aspectos. Percebe-se,
nesses manuais, uma tentativa de abordagem centrada na comunicação, contudo, isso
deixa de ser prioridade, quando observamos em todas as lições que o direcionamento
dado visa aos conteúdos gramaticais, isto é, a motivação para a seleção de conteúdos

81
não está focada na comunicação/interação. Outra questão a ser colocada é que
distintamente dos manuais (1) e (7), observa-se a utilização das linguagens verbais, não
verbais e mista, com um projeto gráfico que apresenta ao estudante fotos reais,
desenhos, gráficos e tabelas, entretanto, isso é feito, muitas vezes, de modo
descontextualizado, o que inviabiliza a aprendizagem por meio desses recursos. A não
consideração da diversidade de variantes linguísticas presentes e a presença maciça da
norma culta mostram uma preocupação ligada à necessidade da aprendizagem focada
nos princípios de “certo” e “errado”, e não de “adequado” ou “inadequado”. Embora
possamos perceber, em muitas lições, o uso de exercícios que propõem debate e
discussão entre os estudantes, a escrita é muito mais praticada que a oralidade, sendo
essa última mostrada, por vezes, em espaços/situações formais ou de forma
artificializada.
Todo o panorama antes delineado configura um cenário que não favorece uma
aprendizagem adequada do idioma e de toda a situação sociocultural que o envolve.
Assim, não apresentar textos literários ou gêneros textuais de maior circulação social,
por exemplo, que se ligam diretamente à experiência do aluno, cria barreiras para a
aquisição desse idioma. Além disso, o compromisso de ampliar o repertório cultural do
aluno, o vocabulário, dentre outras ações que decorrem dessa demanda, restringem-se a
uma oferta de textos bem pequena. Cabe ressaltar que o trabalho com textos também
facilita não só a leitura, a compreensão, a interpretação e a análise das ideias envolvidas
por cada texto, mas ainda toda a situação de produção, planejamento, suporte e escrita.
Verificamos em muitos manuais que o apreço excessivo às regras gramaticais
impossibilita o aluno estrangeiro de ter a oportunidade de ter contato com textos de usos
variados e que o ajudariam a aprimorar o seu processo de ensino e aprendizagem.
Cumpre ressaltar, ainda, que muitos textos (inclusive os literários) são inseridos nas
obras em forma de fragmentos ou fora de seus suportes e contextos, o que inviabiliza
uma leitura e/ou análise mais completa destes. Isso, muitas vezes, não permite que o
estudante consiga fazer inferências relativas à intenção do autor ao produzir o texto,
prejudicando a identificação dos fatores de textualidade no processo de compreensão da
mensagem do texto por parte do estudante.
O manual (17) aborda os conectores como itens linguísticos que se vinculam
frequentemente ao tempo verbal citado. Tal abordagem mostra ao estudante que o uso
de um conector está diretamente condicionado à presença ou à ausência desse tópico
gramatical. Isso segue uma lógica não centrada na interação e nem mesmo naquilo que

82
prescreve a GT. Então, essa visão reduzida caracteriza-se por ir além da
descontextualização, já que propõe um trabalho estruturado por uma lista aleatória de
itens e que não informa ao aluno a origem desses e como eles possuem uma autonomia
na produção de sentenças
Como citado anteriormente, a não consideração dos fatores de textualidade por
alguns manuais promove perdas significativas no que diz respeito à interpretação e a
análise do texto a ser estudado pelo discente estrangeiro.
A relevância desses fatores no ensino de PLE justifica-se pela necessidade de uma
abordagem que possibilite um olhar para além da simples contextualização, pois a
aprendizagem da língua está diretamente ligada a isso. Entretanto, é importante destacar
que, muitos dos manuais, buscam realizar um trabalho focado em aspectos que
promovam uma visão mais descritiva de alguns fenômenos linguísticos, além de
trazerem uma concepção de texto que propicia uma proposta de ensino mais voltada à
contextualização, descrição, análise e interpretação do texto e dos gêneros textuais, de
modo que isso seja entendido pelo aluno da maneira mais próxima de uma situação real
de comunicação, aproximando a proposta de ensino do manual às ideias de Marcuschi
(2005) no que se refere aos fatores de textualidade.
Em boa parte dos manuais, a forma e o conteúdo dos textos são a construção de
um processo no qual o aluno é protagonista, ou seja, a perspectiva que faz do manual
uma ferramenta de ensino dinâmica, é construída. Assim, o uso de textos para promover
a aprendizagem de um idioma deve ter como um de seus princípios o caráter
interpretativo, inferencial e crítico do texto, além, é claro, de estimular uma leitura
subjetiva, de modo a ajudar a decodificar a mensagem ali envolvida. Isso foi
identificado na maioria dos manuais em formatos diversos e associada a esta estratégia
pudemos identificar uma abordagem contextualizada dos elementos linguísticos, o que a
caracteriza como uma visão mais pautada num ensino descritivo. Contudo, em alguns
manuais, uma visão mais tradicional, pautada na fixação de regras da gramática
tradicional e que usa o texto como pretexto para o ensino de regras gramaticais também
foi encontrada. Nesses livros, o texto não foi adotado como produto da comunicação e
interação com seu leitor/produtor, como defende Geraldi (1997).
Assim, com base na análise da parte de leitura desses manuais, é possível entender
de modo muito claro e objetivo a necessidade e o papel que cada um deles tem no
processo de ensino e aprendizagem do aluno estrangeiro. Dessa forma, quando o
material não explora os componentes de cada gênero textual, não prevê seu papel na

83
interação comunicativa, não os vincula a outro(s) gênero(s), desconsidera o processo de
construção desse gênero, não contempla a intertextualidade ou as inter-relações
construídas entre forma e conteúdo e, finalmente, não constrói uma articulação das
atividades de produção textual com os conhecimentos literários e linguísticos, promove
no ensino e aprendizagem a exclusão de diversos espaços/momentos que poderiam ter
sido aproveitados para a melhor aquisição do idioma. Isso tudo aqui descrito deve ser
entendido como características que se esperam encontrar em manuais de língua
estrangeira, contudo, nem sempre esse caminho é o escolhido por muitos dos autores,
fato que inviabiliza uma abordagem comunicativa de fato nesses materiais.
Até o momento, vimos a parte de leitura contemplada pela seção Metodologia de
ensino; a partir de agora nossa análise apresenta o que cada manual propõe na parte de
produção textual. Assim, é importante lembrar que a ficha que utilizamos para analisar
os manuais de PLE concebe leitura e escrita como competências essenciais no processo
de ensino/aprendizagem.
Em relação às atividades de produção textual, observamos que dois manuais, (1) e
(7), não propuseram em nenhuma de suas atividades algo que visasse a fazer o aluno a
atingir propósitos comunicativos nas mais diversas situações de interação social. Já o
restante das obras buscou, de alguma maneira, promover de forma razoavelmente
satisfatória tal abordagem, procurando tornar o estudante um produtor reflexivo de
textos de gêneros textuais diversos e que estivessem inseridos em situações e/ou
contextos reais de uso linguístico. Entretanto, é importante deixar claro que as obras
analisadas fizeram isso de modo bem diversificado e tais possibilidades de abordagem
nos levaram a avaliá-las como Ótimo, Bom, Satisfatório e Insatisfatório, conforme pode
ser observado no modelo da ficha de análise, presente no Anexo 1. Para ilustrar o que
antes se explicitou, apresentamos os quadros a seguir que mostram como cada manual
foi avaliado conforme esse critério. Cabe ressaltar que mostramos apenas os exemplos
mais interessantes, tendo em vista as explicações já apresentadas nesta seção a respeito
dos outros aspectos suscitados pelos dados coletados.

Quadro 6 – Distribuição das respostas das perguntas de “a” a “j”


Perguntas Sim Não
a) objetivam a formação do aluno como autor, que visa a atingir 22 03
propósitos comunicativos nas diversas situações de interação social?
b) levam em consideração os fatores de textualidade? 18 07
c) consideram os elementos de contextualização, em especial o 20 05

84
destinatário, a situação, a finalidade? (Ou se limitam a propor um tema
para redação?)
d) consideram as etapas de planejamento, execução e revisão? (Ou 17 08
privilegiam o produto final?)
e) desenvolvem estratégias para garantir a progressão temática no 17 08
desenvolvimento de textos?
f) desenvolvem a capacidade de construção textual a partir de
elementos formais, tais como uso do vocabulário, mecanismos 20 05
coesivos, organização do período, estruturação em parágrafos?
g) exploram a estrutura dos tipos básicos de texto (descrição, narração, 20 05
dissertação expositiva/argumentativa)?
h) propiciam o desempenho do aluno em relação a diversos gêneros 22 03
textuais da modalidade oral?
i) propiciam o desempenho do aluno em relação a diversos gêneros 22 03
textuais da modalidade escrita?
j) desconsideram a articulação com as atividades de leitura e com os 05 20
conhecimentos linguísticos e literários?

O quadro anteriormente mostrado possui grande relevância em nossa


investigação, pois foi ele que orientou nossa percepção acerca dos detalhes apresentados
pelos dados das fichas de cada manual. Assim, a predominância de respostas positivas
indica que a intenção dos autores de cada livro/coletânea mostra sua preocupação em
promover uma abordagem na qual a língua, a linguagem e a comunicação são
protagonistas do processo de ensino e aprendizagem.
Essa reflexão fica mais clara quando olhamos para os dados referentes às
respostas da pergunta “a”, vinte e dois manuais de um total de 25 deixam claro seu
objetivo de atingir propósitos comunicativos nas situações de interação social. Por outro
lado, os manuais (1), (7) e (24) apresentam esse objetivo de modo indireto, visto que
suas orientações metodológicas seguem uma tendência mais ligada à prescrição de
regras da GT.
Além disso, cabe ressaltar que os fatores de textualidade também foram aqui
considerados para a produção do texto, contudo, nos manuais (1), (3) (4), (5), (6), (7),
(11) e (24) estes nãos se fizeram presentes de forma plena, visto que apenas um ou outro
fator foi inserido nas atividades. Isso não permite que a produção de texto seja realizada
de forma eficiente e mostra a não integração entre os fatores de textualidade. Tal
abordagem não segue as orientações dadas por Koch e Travaglia (2011) quanto ao uso
dos fatores de textualidade, pois esses autores são enfáticos ao afirmar que a relação de
dependência existente entre aqueles é um dos elementos que garante ao texto clareza,
por exemplo.

85
Os fatores de textualidade não podem ser restritos àqueles já citados, mas se
espera que eles atuem na garantia de seu grau de informatividade, mostrem a
intencionalidade do autor e do próprio texto, promovam a aceitabilidade desse texto
frente àquele que com ele interaja, de modo a apresentar ao produtor e ao leitor a
situação de comunicação na qual se insere seu texto e quem com ele dialoga e, por fim,
as relações que há entre esse texto e outro(s) circulante(s) na sociedade.
Ao se analisar a presença de elementos de contextualização (destinatário, situação
ou finalidade) e das etapas da construção textual (planejamento, execução e revisão),
observa-se que o tratamento dado por alguns manuais contempla somente o produto
final: o texto escrito, já que a oralidade, por exemplo, não foi contemplada em boa parte
das abordagens aqui elencadas. Logo, os gêneros da esfera oral não foram
contemplados, de forma plena nos manuais e suas características e/ou possibilidades de
leitura e interação não ocorreram.
Paralelamente a isso, soma-se também a não garantia de uma boa progressão
temática e uma plena inserção da ideia de se trabalhar a tipologia textual (narração,
descrição, dissertação expositiva ou argumentativa e injunção), bem como suas inter-
relações. Isso pode ser visto quando mais uma vez as atividades de produção textual
apenas centram-se no produto, sem levar em consideração seu processo de execução.
Além disso, cabe destacar que os usos e a versatilidade com a qual os nativos de uma
dada língua têm com cada um desses tipos de texto não foi considerada na preparação
de muitas atividades aqui analisadas.
Na busca pela identificação de uma abordagem mais descritiva e interacional,
verificamos também como os elementos formais dos textos estavam ou não presentes.
Assim, no que diz respeito ao uso eficiente do vocabulário, por exemplo, observamos se
havia nos manuais uma lista de palavras com seus significados descontextualizados,
sem algo que pudesse orientar o estudante quanto ao uso desse ou daquele vocábulo.
Notamos que há uma clara preocupação com a contextualização e com o uso do
vocabulário que não se limita a uma lista estática de palavras. Isso mostra que nos
manuais (8), (9), (12), (13), (14), (15), (16), (17), (18), (19), (20), (21) e (25) tal
abordagem ocorreu de forma a mostrar o vocabulário contextualizado em toda a unidade
de trabalho. Essa possibilidade favorece não só o aprendizado no instante da leitura,
mas também na realização da conexão daquilo que se aprende com a situação de
comunicação.

86
A necessidade de trabalhar também com mecanismos coesivos, com as estratégias
de organização das frases e/ou períodos, com a paragrafação e com os conhecimentos
linguísticos e literários mostra-se como algo essencial na aprendizagem de uma língua.
Além disso, é importante que o manual possa propiciar ao estudante sua autoavaliação
nas tarefas para entender seu desempenho nas modalidades orais e escritas das
produções.
Apesar de haver em nosso corpus muitos materiais produzidos por linguistas e/ ou
autores da área de PLE, podemos observar a falta de mais atividades que fomentem a
produção oral do estudante, pois boa parte dessas centra-se somente em alguns gêneros
como o debate e a entrevista. Assim, alguns outros gêneros circulantes não são
contemplados e não têm sua estrutura e sua funcionalidade descritas ou reconhecidas
pelo aluno.

6.3. Atividades e exercícios

Nesta seção, analisamos como foram construídos as atividades propostas e os


exercícios dos manuais, utilizando nove perguntas que serviram como ferramenta de
análise, a saber:

a) estimulam o aluno a observar, interpretar, descrever e analisar o conteúdo,


propiciando, assim, o debate de ideias por meio de seu posicionamento crítico?
b) Contêm perguntas que exigem inferências para a busca de respostas? (Ou
contêm perguntas que se limitam à cobrança de conhecimentos
automatizados?)
c) Estimulam a complementação das informações por meio de pesquisa em outras
fontes?
d) Consideram o universo de referências culturais do estudante estrangeiro?
e) Trabalha na perspectiva da gramática descritiva com exercícios
contextualizados?
f) Apresenta o tópico orações comparativas ou conectores, conjunções ou
conectivos comparativos?
g) Existe no livro alguma menção à ideia de comparação ou estrutura
comparativa?
h) A comparação, quando presente, apresenta-se em que nível?

87
i) As orientações quanto às respostas aos exercícios preveem flexibilidade na
aplicação? (Ou funcionam como rígida prescrição para guiar o trabalho do
professor?)

Nessa parte da análise, decidimos colocar todas as perguntas, porque esta é a etapa
do trabalho que contempla mais especificamente o tema central desse trabalho, a
comparação estruturada por conectores. Assim, ao explicitar as questões, bem como
suas respostas, desejamos apresentar de forma bem detalhada os resultados referentes às
atividades propostas e aos exercícios dos manuais. Desse modo, adotamos como meio
de apresentação dos resultados um quadro contendo os dados das perguntas de “a” a “e”
e “i”. Já os itens “f”, “g” e “h” serão apresentados na forma de texto, com fotos para
melhor expor aquilo que foi encontrado.
O quadro a seguir apresenta a quantidade de respostas “sim” e “não” para as
perguntas de “a” a “e” e “i”.

Quadro 7 – Perguntas e respostas da Ficha de análise de livros didáticos


Pergunta Sim Não
a) estimulam o aluno a observar, interpretar, descrever e analisar o
conteúdo, propiciando, assim, o debate de ideias por meio de seu 19 06
posicionamento crítico?
b) contêm perguntas que exigem inferências para a busca de respostas?
(Ou contêm perguntas que se limitam à cobrança de conhecimentos 19 06
automatizados?)
c) estimulam a complementação das informações por meio de pesquisa
22 03
em outras fontes?
d) consideram o universo de referências culturais do estudante
22 03
estrangeiro?
e) trabalha na perspectiva da gramática descritiva com exercícios
16 09
contextualizados?4
i) As orientações quanto às respostas aos exercícios preveem
flexibilidade na aplicação? (Ou funcionam como rígida prescrição para 19 06
guiar o trabalho do professor?)
Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Os dados do quadro 3 apresentam reflexões relevantes e que complementam


aquilo já detalhado e descrito em outras partes deste estudo, visto que na visão
funcionalista, entendemos que a língua deve ser descrita de acordo com seu uso, sua

4
As perguntas “f”, “g” e “h” serão apresentadas mais à frente.

88
prática. Ou seja, de modo contextualizado, de forma a reproduzir com fidelidade as
situações cotidianas de interação comunicativa. Tudo isso pautado na necessidade de
construir exercícios que foquem nesses tópicos e nas possibilidades diversas de
realização de certas estruturas e estratégias linguísticas de comunicação.
Apesar de haver um número expressivo de manuais que respondem positivamente
às questões “a” e “b”, percebe-se que isso somente mostra o outro lado, isto é, os que
não realizam uma abordagem que pelo menos tenta construir uma visão menos centrada
nas respostas automatizadas e mais direcionadas à interação. Nos manuais com
respostas negativas, é possível perceber o apreço por regras de sistematização de
conteúdos prescritos numa visão mais voltada à gramática tradicional. Isso inviabiliza
muitas possibilidades de construção de trabalhos e/ou outros exercícios que tragam ou
propiciem uma orientação mais descritiva.
As perguntas “c” e “d” permitem evidenciar aspectos interessantes, já que houve
para ambas muitas respostas positivas, fato que necessita de comentário. Nos manuais,
os meios pelos quais um determinado conteúdo é abordado depende da proposta
pedagógica nele estabelecida, pois é possível encontrar desde manuais em que se orienta
a busca por dados em dicionários e enciclopédias como outros em que se sugere o
acesso a plataformas, ambientes e conteúdos digitais.
Na questão cultural, é possível verificar manuais com uma visão restrita de língua,
utilizando textos pouco elucidativos para o estudante estrangeiro. Nesses, o uso da
língua está totalmente desvinculado do contexto cultural. Cabe dizer que o referente
cultural do estudante é estimulado nos exercícios, unidade e capítulos dos manuais por
meio de atividades centradas na comparação e/ou socialização de experiências com os
demais colegas de classe. Entretanto, a simplicidade de algumas dessas propostas não
contribui muito para o pleno entendimento, por parte do estrangeiro, no que diz respeito
à cultura e a seus aspectos mais ligados ao uso da Língua Portuguesa.
Os quadros a seguir evidenciam uma proposta de avaliação mais detalhada dos
dados extraídos das perguntas compreendidas no intervalo de “a” a “e”. Nos quadros,
adotam-se os critérios presentes na ficha anexa, como “O” para ótimo; “B”, para bom;
“S”, para suficiente; “I”, para insuficiente e “N” para os casos em que o manual não
tenha tal item ou não use tal abordagem. Deixamos claro que houve a necessidade de
usar mais de um quadro para que se pudesse entender como mais clareza os dados
oriundos da análise de cada manual, pois a apresentação dos dados em forma de gráfico
não propiciaria uma leitura adequada daquilo que se deseja aqui expor.

89
Quadro 8: Avaliação objetiva dos manuais (1), (2), (3), (4) e (5), de acordo com as
respostas positivas

Manuais 1 2 3 4 5
A N S N B N
B N S N B N
C N S N B N
D N B I S N
E N N N I N
I N S N S N
Fonte: Elaborado pelo autor, 2019

A ausência de respostas positivas nas avaliações dos manuais (1), (3) e (5) mostra
que a abordagem presente nesses livros exclui as habilidades de observar, analisar,
interpretar e descrever de forma eficiente um conteúdo. Com isso, o debate de ideias e
conceitos de modo a promover no estudante estrangeiro estratégias de construção da
crítica e da criticidade na língua que está aprendendo não foi algo fundamental, segundo
a leitura que se pode fazer desses manuais no que se refere às metodologias de ensino de
línguas estrangeiras. Mesmo os manuais (2) e (4) trazendo uma avaliação distinta da
apresentada pelos outros, isso não garantiu que eles fossem avaliados com nota máxima
em todos os critérios, pois o trabalho feito ainda é distante do ideal para um
desempenho excelente na aprendizagem de PLE.

Quadro 9 – Avaliação objetiva dos manuais (6), (7), (8), (9) e (10), de acordo com as
respostas positivas
Manuais 6 7 8 9 10
A B N S S S
B B N S S B
C B N S S B
D S N S S B
E I N N N S
I S N S S B
Fonte: Elaborado pelo autor, 2019

O quadro 9 destaca os manuais (6), (8), (9) e (10) frente ao manual (7), pois os
quatro primeiros apresentam uma abordagem totalmente distinta desse último, conforme
podemos observar no quadro. A presença de resposta negativa em todas as perguntas

90
sinaliza para uma metodologia que não contempla nenhuma das habilidades e
competências presentes esperadas para o ensino e aprendizagem de uma língua.

Quadro 10 – Avaliação objetiva dos manuais (11), (12), (13), (14) e (15), de acordo com
as respostas positivas
Manuais 11 12 13 14 15
A S B S B B
B B B B B B
C B O B B B
D B O B S B
E N B S S S
I B B S S S
Fonte: Elaborado pelo autor, 2019

O quadro 10 apresenta uma situação bem diferente dos antecessores, visto que
podemos notar que os manuais analisados atuam no sentido de promover um trabalho
no qual as habilidades e competências ligadas à interação e à comunicação fizeram-se
presentes de forma predominantemente boa e satisfatória. Cabe destacar que o manual
(12) foi avaliado como Ótimo no que se refere ao estímulo à pesquisa em outras fontes e
o modo como considera as referências culturais do aluno estrangeiro.

Quadro 11 – Avaliação objetiva dos manuais (16), (17), (18), (19) e (20), de acordo com
as respostas positivas
Manuais 16 17 18 19 20
A B B B B B
B B B B B B
C B B B B B
D B B B B B
E B B B B B
I B B B B B
Fonte: Elaborado pelo autor, 2019

O quadro 12 mostra que em todas as perguntas a maneira como os manuais


trouxeram cada uma das habilidades e competências foi avaliada como Boa. Contudo, é
importante ressaltar que, apesar de nenhum desses livros ter sido avaliado como Ótimo,
são eles manuais que em suas orientações metodológicas e em suas seções tiveram uma

91
maior preocupação sobre como e por que trabalhar de modo a pensar que a interação
comunicativa faz parte do processo de ensino e aprendizagem de uma língua.

Quadro 12 – Avaliação objetiva dos manuais (21), (22), (23), (24) e (25), de acordo com
as respostas positivas
Manuais 21 22 23 24 25
A B O S N B
B B O S N B
C B O S S B
D B O B I B
E B O S N B
I B O B N B
Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

O quadro 12 apresenta uma situação bem interessante, pois os manuais (22) e (24)
constituem abordagens antagônicas no que se refere às habilidades e competências
presentes nesta parte da ficha anexa. Por isso, pode-se entender que a avaliação do
manual (22) como ótima em todas as perguntas caracteriza a proposta de ensino e
aprendizagem do livro como algo extremamente relevante de ser considerada quando se
pensa em aprender PLE ou quando uma pessoa busca uma material que seja eficiente e
promova um ensino focado essencialmente na interação e na perspectiva da língua em
uso. Outro fator a se registrar sobre esse manual é seu caráter inclusivo e fomentador de
uma visão plural de vários temas dos universos extra e intralinguístico.
Por outro lado, o manual (24) configura-se como um material muito limitado no
que diz respeito às possibilidades de construção de um universo favorável ao ensino e
aprendizagem de PLE. Sua orientação metodológica muito centrada na língua escrita e
na GT permite-nos perceber o porquê de sua avaliação conter tantas respostas negativas,
visto que as habilidades e competências presentes numa abordagem centrada no uso não
foram entendidas como o objetivo do manual.
Após a análise dos aspectos gerais relativos aos 25 (vinte e cinco) manuais que
compuseram nossa amostra, pudemos identificar em que partes e/ou unidades destes a
relação de comparação era abordada e como esta se materializava. Assim, para fechar a
apresentação dos dados da Ficha de Análise de livros didáticos, apresentamos a seguir
as respostas às perguntas “f”, “g” e “h”:

92
Quadro 13 – Presença ou ausência da comparação nos manuais
Pergunta Sim Não
f) apresenta o tópico orações comparativas ou conectores,
07 18
conjunções ou conectivos comparativos?
g) existe no livro alguma menção à ideia de comparação ou
15 10
estrutura comparativa?
Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

É possível notar que o fenômeno da comparação estruturada por conectores, tema


central de nossa tese, aparece apenas em sete manuais num total de 25. Tal resultado
mostra que essa importante ferramenta linguístico-textual não foi uma escolha da
maioria dos manuais analisados. Além disso, a ausência da comparação nesse formato
também aponta para a ideia de que o trabalho com a produção de textos e enunciados
não parte de um olhar que tenha como norteadores os fatores de textualidade e as etapas
de produção de um texto, bem como a tipologia desses textos e seus gêneros nos
ambientes orais e escritos.

Quadro 14 – Formato da Comparação nos manuais de PLE

93
h) a comparação, quando presente, apresenta-se
M SIN SEM DIS N
em que nível?
(1) X
(2) X X X
(3) X X
(4) X
(5) X
(6) X X X
(7) X X X
(8) X
(9) X
(10) X X
(11) X X
(12) X
(13) X
(14) X
(15) X
(16) X
(17) X
(18) X
(19) X
(20) X
(21) X
(22) X
(23) X
(24) X
(25) X
Fonte: Elaborado pelo autor, 2019.

Nos 25 manuais analisados, encontramos 25 ocorrências do fenômeno da


comparação. Essas ocorrências estão distribuídas em 16 manuais, assim em nove livros
não se registrou a presença de tal fenômeno. Deixamos claro que nossa investigação
coletou os casos de comparação do ponto de vista gramatical, ou seja, aquela encontrada
nas GT e outras que fazem parte de abordagens mais descritivas, por exemplo. Nesses
casos incluem-se os usos de formas não oracionais e não canônicas e aqueles
pertencentes a variantes linguísticas distintas da norma padrão.

94
Os livros (1), (4), (5), (9), (12), (13), (14), (15) e (17) não trouxeram a
comparação em nenhum formato, fato que priva o aluno de PLE de ser apresentado a tal
conteúdo, ou a essa estratégia de construção de enunciados e textos. Com isso, podemos
observar que esse tema tão relevante para o ensino e aprendizagem de PLE não compôs
o conjunto de temas selecionados pelos manuais para construir sua proposta de
abordagem. Trabalhar com estruturas que são compostas por conectores é promover
uma abordagem na qual o uso é o foco e as questões decorrentes desse tornam-se
material para as aulas e para as discussões em sala de aula.
Entretanto, sabemos que a comparação, quando esteve presente nos manuais
analisados apareceu majoritariamente na parte do manual destinada ao ensino do grau
dos adjetivos. Assim, na visão de muitos manuais, essa configura-se como a única
estratégia que permite ao falante nativo estabelecer a comparação entre itens, seres ou
pessoas. Por isso, outras possibilidades ou formatos da comparação estruturada por
conectores ficaram restritas a atividades isoladas ou não foram contempladas.
Mais uma vez, confirma-se a hipótese de que boa parte dos manuais constrói suas
unidades, capítulos ou lições com base na sistematização das regras prescritas pela GT e
se esquecem da noção de língua em uso e da variação como um fenômeno intrínseco a
todas as línguas.

95
7. RESULTADOS DA ANÁLISE

Com o objetivo de explicitar os resultados da análise sobre a comparação nos


materiais didáticos de PLE, construímos um quadro indicando, na primeira coluna, o
número do manual; na segunda, a parte/unidade do livro em que a relação de
comparação estava; na terceira, como ela se materializava (por itens, orações etc.); e, na
quarta, a frequência disto.

Quadro 15: Materialização da relação de comparação nos manuais didáticos de PLE

No* Localização Item (ns) F


Exercício sobre modo subjuntivo p.
Não há palavras ou expressões que
(1) 45; somente aparecem alguns 0
exprimam COMPARAÇÃO.
conectores.
Como, assim como, tal como, como
Unidade 13 – Tema O Local de
se, (tão)...como, tanto como, tanto
(2) Trabalho – Item Conjunções 11
quanto, tal, qual, tal qual, que
Subordinativas.
(combinado com menos ou mais) etc.
Lição 5 – Tema Moradia – Presente Mais do que, tão ... quanto, menor do
(3) 3
em exercícios. que.
(4) Inexistente Nenhum 0
Aparece o conector COMO em um
(5) Lição 5 – Tema Comércio e Serviços exercício que aborda o uso do modo 1
verbal subjuntivo
Passagens 4 – Aparece comparação
(6) semântica, contextual, mas não Nenhum. 0
sintática.
1 – Conjunções e Locuções
conjuntivas; Como, assim como, bem como, ...do
(7) 2 – Exercícios de conjunções e que; do que, tão...quanto; mais do que 8
locuções conjuntivas e subordinativas; e mais do que.
3 – Classificação da oração composta.
Maior que, menor(do) que, melhor e
Unidade 6 – Tema: Hora da Diversão - pior, todos associados ao que.
(8) Comparação estruturada por adjetivos, Ocorreram também mais...que e tão... 4
variação de grau. quanto. Não há a presença de outro
tipo de estrutura comparativa.
Não há palavras ou expressões que
Unidade 1 – Volta às aulas: Hora de exprimam COMPARAÇÃO.
(9) cair na real – Apresentação das Destacamos mais uma vez o conector 0
conjunções COMO sendo apresentado somente
com valor semântico de conformidade.
Comparação estruturada por adjetivos, Não há a presença de outro tipo de
(10) 7
variação de grau; presença de estrutura comparativa, mas há a

96
conectores comparativos. presença dos conectores: tanto (s)
quanto (s), mais...do que, menos...do
que, melhor do que, maior do que,
menor do que e pior de que.
Unidade 10 – Importações e
Mais ...do que, mais alto do que, mais
Exportações – presença da
(11) baixo do que, maior do que e menor 5
comparação nos textos da área de
do que.
negócios.
Não há menção às conjunções
(12) Conjunções coordenativas. 0
comparativas.
Não há menção às conjunções
(13) Inexistente. 0
comparativas.
Não há menção às conjunções
Unidade 2 – Revendo os tempos
comparativas. Destacamos mais uma
verbais: pretérito perfeito e pretérito
(14) vez o conector COMO sendo 0
imperfeito.
apresentado somente com valor
Tópico Frases complexas.
semântico de conformidade.
Não há menção às conjunções
comparativas. Destacamos mais uma
Terceira Parte: Tópicos Gramaticais
(15) vez o conector COMO sendo 0
Frases complexas.
apresentado somente com valor
semântico de conformidade.
Tão...quanto; tanto...quanto;
Unidade 3 – Ciclo Básico
(16) tão...como; mais... (do) que e menos... 5
Grau dos Adjetivos
(do) que
Unidade 2 – Ciclo Intermediário – Não há menção às conjunções
Exercícios sobre uso de conjunções e comparativas. Apenas aparece a
(17) 1
sua relação com o futuro do palavra COMO numa lista para
Subjuntivo completar espaços em um exercício
Como; que; do que (depois de mais
Apêndice Gramatical – Conjunções menos, maior, menor, melhor e pior);
(18) 7
Subordinativas Comparativas qual (depois de tal); quanto (depois de
tanto ou tão); assim como; bem como
Unidade 3 – Ciclo Avançado Operadores que estabelecem relação
Superior- Texto Argumentativo; de comparação: tão...que;
(19) 1; 3
Apêndice Por dentro da Língua - Tão...quanto, mais...do que e menos...
Operadores Argumentativos do que
Unidade 3 – Nível 1- Exercícios que Mais...(do) que; menos ...(do) que;
(20) 5
propõe usar estruturas comparativas tanto...quanto; tão...quanto/como
Unidade 7 – Ciclo Avançado – Coisas
Nossas
(21) Exercício sobre o poema Que nem 1
“Descobrimento”, do poeta
modernista Mário de Andrade
A comparação não aparece Não há menção às conjunções
(22) 0
explicitamente comparativas.
Não há menção às conjunções
(23) Conjunções coordenativas. 0
comparativas.

97
Mais...(do) que; menos... (do) que;
Unidade 7 – Carnaval de antigamente tão...quanto/como
(24) – Comparação (1) Mais...(do) que; menos... (do) que; 4; 3
Comparação (2) tantos... (do) que

Mais...do que; mais...que; maior do


Módulo 3 – O que vamos fazer hoje?
(25) que; melhor do que; menor do que; 6
Adjetivos em Comparação
pior do que

Fonte: Elaborado pelo autor (2018).

O quadro 15 mostra que os manuais, de um modo geral, apesar de serem, em sua


maioria, defensores de uma abordagem de ensino distante da tradição/prescrição
gramatical já presente na abordagem da língua materna, segundo nos informa Moura
Neves (1997), falham ao não apresentarem com clareza uma explanação a respeito das
variantes linguísticas a serem contempladas nessa perspectiva de ensino. Assim,
evidencia-se a proposta de Meyer (2004), já que se pode perceber que os manuais
constroem uma concepção de língua distinta da esperada para um ensino que favoreça a
comunicação com os falantes nativos.
Com base no quadro de conectores proposto por Rodrigues e Tota (2013), bem
como pelos estudos sobre comparativas aqui revisitados, observa-se que a proposta dos
manuais analisados está distante não só da GT, porque apresenta uma visão reducionista
das comparativas, mas também da perspectiva da língua em uso, tendo em vista que não
privilegia situações comunicativas em que tais construções são usadas.
Embora o uso de conectores que exprimem comparação devesse ser uma marca do
cuidado do manual em relação à variante que apresenta aos estudantes, isso não foi uma
unanimidade, conforme pudemos observar.
No manual (1), notamos a ausência da comparação, seja em nível morfológico,
quando feita por adjetivos, seja em nível sintático, por meio das orações comparativas.
Há apenas neste manual a presença de uma lista de algumas conjunções que se
localizam em exercícios que primam por ensinar o uso prescritivo do subjuntivo. Tal
abordagem não é exclusiva desse manual, mas mostra que o trabalho com conectivos
somente leva em conta seu uso como forma dependente do verbo e não como conector,
ou seja, uma apresentação desse item centrada no uso não foi o que propôs o manual.
Levando em consideração que conector é uma unidade linguística que serve para
ligar vocábulos uns com os outros, orações, partes de textos e, até mesmo, parágrafos,
compreende-se o motivo de essa noção ter nos ajudado a identificar o quão falha é a

98
abordagem dos materiais de PLE sobre a comparação, mesmo no nível intersentencial.
Isso ocorre porque esta centra-se na designação conjunção, que se restringe ao âmbito
das orações.
Já no manual (2), foram encontradas onze ocorrências de conectores comparativos
presentes em uma tabela que elenca as conjunções subordinativas e coordenativas
previstas pela GT. Contudo, apesar de se ter um exercício relacionado a um quadro, não
há uma orientação acerca do contexto de uso, bem como a qual nível de linguagem está
ligada cada conjunção. A abordagem não prevê também uma clara aplicação para o uso
desses itens gramaticais nem a possibilidade de mudança de significado motivada pelo
uso. Desse modo, entendemos que predominou nesse manual uma abordagem
prescritiva que não auxilia o estudante no uso desses itens gramaticais nem propicia
uma visão que mostre sua variabilidade dentro da Língua Portuguesa. Assim, para além
de não mostrar a língua em uso, considerando suas variantes e os níveis de formalidade
nos quais o falante se insere no dia a dia, também não previu uma orientação
direcionada à leitura, produção e análise textuais, visto que a significância desses termos
possui um papel muito relevante para o ensino e aprendizagem da Língua Portuguesa e
dos textos e gêneros circulantes. Com isso, mesmo trazendo um número expressivo de
itens, fazendo desse o manual que mais apresentou conectores comparativos, não
conseguiu mostrar o papel de cada um deles na língua.
A utilização de lista de conectores, no nosso caso específico, comparativos,
conforme já mostrado por Rodrigues (2001, 2009, 2010, 2013 e 2014) e Rodrigues e
Tota (2013) é uma realidade no ensino de Língua Materna e que se transfere para o
ensino de PLE, conforme já tivemos oportunidade de ressaltar em outras seções deste
estudo. Os autores nos alertam sobre o fato de com isso ficarem de fora usos de
conectores bastante frequentes no Português em uso, vide os casos de feito, que nem,
tipo e igual, mencionados ao longo desta tese. São inovações de uso que mostram não
só aspectos relacionados à variação linguística, porque tais conectores em princípio
caracterizavam a linguagem de jovens em situação de comunicação menos monitorada;
e que, atualmente, se estenderam para contextos de língua escrita e não só de uso por
jovens. Ademais, se pelo menos os exemplos fossem inseridos num contexto (um
parágrafo, uma tirinha, uma propaganda, um pequeno texto escrito, um poema), enfim,
fossem contextualizados, conforme também já defendemos aqui, seria mais eficiente
para o estrangeiro perceber seu uso na interação; enfim, teríamos um ensino mais
produtivo.

99
No manual (3), podemos observar a presença de três conectores. Contudo, a
maneira como estão dispostos no capítulo em que estão inseridos não auxilia no
entendimento do tópico por parte do usuário, carecendo assim de uma intervenção
adicional. A apresentação desses três itens sugere somente que, para se comparar em
LP, existam essas únicas formas. Cabe destacar também que, quando um trabalho não
se centra em uma abordagem focada no uso, peca por não auxiliar claramente quanto à
utilização de uma estrutura ou termo, tanto a sua relevância no idioma. Desse modo, o
estudante dependerá de um apoio do professor ou da Internet para resolver suas
possíveis dúvidas no que diz respeito ao tema.
Não há problema algum em o discente prescindir da ajuda do professor em suas
atividades de ensino-aprendizagem. No entanto, espera-se que um livro didático sirva de
suporte e apresente situações comunicativas que promovam certa autonomia ao aluno.
Assim, espera-se que sua linguagem seja clara e objetiva e que os conteúdos por ele
abordados sejam organizados, definidos, caracterizados, problematizados,
exemplificados. Enfim, há que se primar pela sistematização dos conteúdos e por uma
abordagem adequada dos mesmos, visando sempre à interação.
O manual (4) não apresenta a comparação em nenhum formato. Já o manual (5) a
apresenta de modo semelhante ao manual (1) e a vincula ao modo verbal subjuntivo,
mostrando somente o conector COMO. Sendo assim, a visão desse manual a respeito da
comparação, ou melhor, das estruturas comparativas, é bem reduzida e distante de algo
ideal para aprendizagem de um estudante de PLE, pois certamente ele, aluno, encontrará
diferenças significativas entre aquilo que aprende na sala de aula com o manual e sua
interação com falantes nativos. Tal hipótese pode ser confirmada por meio dos outros
inúmeros contextos em que a comparação se faz presente e o uso do subjuntivo, não.
Nesse caso, deixa-se de explorar a multifuncionalidade dos conectores, aspecto
por nós já apresentado neste trabalho. Como, assim como a maioria dos vocábulos que
articulam orações, é polifuncional, ou seja, pode dar pistas ao estudante do conteúdo
que emerge da articulação de uma sentença com a outra no contexto de uso. Por isso,
pode ser encontrado no âmbito da chamada subordinação adverbial, em orações
comparativas, causais, condicionais, em sua forma simples, além de compor conectores
compostos como tal, como se e correlatos como assim ... como, tal ... como etc. Segundo
a maioria dos trabalhos sobre comparação, como é considerado o conector prototípico
dessa relação semântica. Portanto, mais um motivo de termos estranhado que ele não
fosse mostrado pelo material didático ao estrangeiro.

100
O livro (6) sequer trouxe alguma possibilidade de abordagem do tema,
impossibilitando o estudante de ter contato com os processos de comparação presentes
na língua que estuda.
Nos livros (7) e (8), encontram-se diversos itens gramaticais responsáveis pelo
fenômeno da comparação. No entanto, a proposta é marcadamente focada em exercícios
que se propõem a fazer metalinguagem ou estimular apenas o aluno a decorar estruturas
ideais para a reprodução em produções textuais. No manual (7), é possível observar a
presença de uma atividade de classificação de oração, fato que mostra uma abordagem
baseada numa leitura muito superficial a respeito dos conceitos que compreendem a
sintaxe da LP, bem como da ideia de valor semântico de uma estrutura e/ou termo.
Paralelamente a isso, o manual (8) apresenta a comparação somente ligada ao tópico
grau dos adjetivos de forma descontextualizada e trazendo as formas presentes na GT.
Logo, bem distante de um ensino de língua que seja específico para alguém que deseje
aprender a língua em uso. Ambos os manuais não construíram uma abordagem que se
dispusesse a ensinar o estudante a entender e utilizar o fenômeno da comparação,
conhecer e reconhecer as estruturas ligadas a ele.
É muito comum identificarmos nos livros didáticos a utilização da metalinguagem
gramatical sem a sua respectiva explicação. O problema não está nem na nomenclatura
e nem na definição. O que não se pode é pressupor que sozinho o leitor, nesse caso, o
estrangeiro, vá sozinho conseguir inferir a situação de uso dos conectores com base na
sua intuição linguística e em sua gramática internalizada. Também não podemos mais
pressupor que decorar uma estrutura com base em um modelo tornará o aluno
proficiente em PLE. Novamente, há que se atentar para a contextualização dos usos
linguísticos, seja em PLE, seja em L1.
No manual (9), encontramos o conector COMO; entretanto, o valor semântico
atribuído a ele é o de conformidade e não o de comparação. Ao analisar esta abordagem
se poderia esperar que o manual construísse uma proposta de trabalho na qual mostrasse
a multifuncionalidade do item COMO e destacasse seu uso mais frequente como
conector comparativo e assim seguisse tratando tanto da comparação como da noção de
conector em LP. Contudo, isso não foi feito e a compreensão que se extrai desse pode
ser considerada um problema para o estudante de PLE, visto que esse vê o item COMO
sendo amplamente usado como comparativo, conforme nos orientam os trabalhos de
Rodrigues (2001; 2010), nos quais a pesquisadora apresenta os dados da frequência
desse item em LP em suas vertentes falada e escrita.

101
O manual (10) apresenta a comparação estruturada por adjetivos, dentro da
variação de grau. Nesse contexto, encontram-se alguns itens que funcionam como
conectores comparativos. Entretanto, mais uma vez, encontramos um manual que segue,
em parte, a lista de itens comparativos da GT e indica somente uma estrutura possível
para a comparação.
Já o manual (11) mostra uma proposta diferente de ensino, visto que adota um uso
contextualizado dos conectores. Contudo, não há a presença da palavra comparação
nem de outros meios ou estruturas que configuram esse fenômeno. A maneira como o
manual constrói sua abordagem está mais direcionada ao uso, porém, sabemos que, por
se tratar de um manual direcionado à área de negócios, explora tal assunto à luz dessa
área e de suas demandas para o uso dos conteúdos que aborda. Por isso, podemos
entender o modo como mostra o fenômeno da comparação, pois o vê como mais uma
possibilidade de recurso de escrita formal e que auxilia na produção textual de vários
gêneros desse contexto.
No entanto, mesmo assim, poderia ter sido adotada a noção de língua em uso,
utilizando textos de gêneros mais voltados ao domínio discursivo privilegiado nas
atividades, exatamente, para demonstrar a adequação dos usos linguísticos aos
contextos de uso mais formais, o que foi demonstrado por Rodrigues (2001).
Por fim, cabe destacar a presença do conector comparativo MAIS (BAIXO) DO
QUE. Tal uso se justifica nesse contexto, visto que se insere como um jargão muito
frequente na área de negócios em sentenças como: Hoje o dólar está mais baixo (do)
que o Euro e isso se deve à alta do barril do petróleo por conta da crise Irã X EUA.
Assim, pode-se verificar que esse uso caracteriza um olhar mais focado nessa estrutura,
pois ela se torna pertinente ao contexto do manual (11). Dessa maneira, entende-se que,
nesse caso, os autores propiciaram um contato com um conector que provém do
ambiente linguístico no qual o estudante se insere. Entretanto, podemos observar a
baixa frequência de conectores comparativos, até mesmo a ausência de itens como o
COMO, fato esse que mostra uma restrição ao uso das estruturas comparativas e um
trabalho que não prevê uma visão em que a variação no uso dessas seja relevante.
Os manuais (12), (13) e (14) não apresentam conectores comparativos integrando
seus conteúdos. Também pode se observar que esses itens gramaticais não estão
presentes nem nos capítulos e/ou partes chamados conjunções ou conectivos. Em alguns
manuais, é possível ver exercícios que focalizam a construção textual e nesses
exercícios podem se ver atividades que solicitam aos estudantes que escrevam textos

102
comparando o Brasil e seus países ou algum traço cultural do país ao qual esse
estudante pertence. Entretanto, nessas abordagens, não se vê uma proposta que detalhe
ou descreva estratégias ou ferramentas construídas que ensinem o aluno a comparar.
Logo, o tema de pesquisa proposto por esse trabalho não é contemplado à luz do que se
definiu aqui como ideal para que o discente desenvolva um conhecimento centrado na
construção de saberes ligados ao processo de comparação.
Cabe ressaltar que, no manual (12), diferentemente da parte anterior da análise,
apresenta-se um contexto no qual aparece apenas a palavra comparação. Observemos
isso na Figura 3 a seguir:

Figura 3 – Manual (12)

O trecho destacado anteriormente mostra uma tarefa pertencente ao manual (12).


Esse excerto é uma atividade de produção textual que propõe realizar a escrita de uma
comparação a respeito de uma situação social. Por se tratar de um manual direcionado a
refugiados, a temática ligada à saúde se justifica e se faz necessária, tendo em vista a
situação do aluno que utilizará o manual. Já no que diz respeito mais diretamente ao
escopo desta pesquisa, pode-se dizer que o comando da tarefa não orienta claramente o
estudante sobre como se constrói uma estrutura textual que tenha a comparação como

103
direcionamento. Dessa forma, essa abordagem não contempla totalmente as questões
apresentadas no início dessa análise, pois, apesar de empregar uma noção de
comparação ao aluno, em nível semiformal e escrito, não constrói uma proposta de uso
dessa ferramenta de modo claro. Além disso, não apresenta, por exemplo, conectores
comparativos, nem os contemplados pela GT, nem aqueles considerados informais ou
que não estão incluídos nas gramáticas tradicionais, como tipo, igual, feito e que nem.
Com isso, o estudante terá de construir sua comparação apenas com base nos
conhecimentos adquiridos por meio da interação com falantes nativos ou necessitará
buscar esse tópico por meio de pesquisa em outros materiais.
O comando da atividade de produção textual pressupõe que apenas mandar o
aluno “comparar” é suficiente para que ele faça isso na língua que está aprendendo.
Parte-se da ideia de que o conhecimento de mundo que está adquirindo no país em que
está juntamente com sua gramática internalizada são suficientes para o desenvolvimento
de sua competência comunicativa. Conforme já vimos nos trabalhos de PLE, isso é uma
falácia.
Logicamente que a necessidade de comparar incitada no aluno pela proposta do
exercício poderá acionar estruturas em que conectores típicos à comparação possam ser
usados – como em “O atendimento ao doente no Canadá é mais rápido do que no
Brasil”, mas poderá também ganhar materialização por meio de outras estruturas em
que a comparação se fará mais implicitamente, como, por exemplo, por meio de uma
construção de uma oração subordinada temporal, em que o estudante produzirá um
enunciado como “Enquanto no Brasil o paciente espera por horas na fila do hospital, no
Canadá o doente é atendido prontamente”. Sendo assim, para que se consiga alcançar
uma interrelação mais eficaz entre a competência que se deseja trabalhar (a de comparar
atendimentos em instituições de saúde em países distintos, por exemplo) e os tópicos
gramaticais necessários para sua eficiente operacionalização (em vários níveis de
variação), é imprescindível que se oportunizem situações nas quais, por meio de gêneros
diversos, os fenômenos pretendidos apareçam materialmente corporificados em
estruturas adequadas, vernaculares e que representem um maior número de pontos no
continuum entre a comparação prototípica e a não prototípica ou, até mesmo, entre a que
se faz por meio de conectores e a que dispensa o seu uso.
O manual (13) não apresenta a comparação estruturada por conectores em nenhum
de seus capítulos. Apesar de ser um material fruto de um projeto de pesquisa, seguiu em

104
alguns aspectos uma orientação linguística muito pautada na prescrição de regras
gramaticais mais ligadas à norma padrão.
Nesse caso, uma pergunta se impõe: não se usam estruturas comparativas na
norma padrão? Evidentemente que a resposta a essa indagação é positiva. Recorrendo
aos estudos sobre comparação revisitados por essa tese, podemos afirmar que a
comparação independe de a norma ser padrão ou não. Na verdade, a estrutura
comparativa relaciona-se muito mais ao caráter argumentativo dos textos, conforme se
vê em Rodrigues (2007).
Ainda sobre o manual 13, cumpre registrar um exemplo de atividade na qual havia
a necessidade de o estudante estabelecer uma comparação entre os textos presentes na
atividade e sua rotina cotidiana. A proposta encontra-se na figura 4 a seguir:

Figura 4 – Manual (13)

A proposta de atividade apresenta alguns pontos interessantes a serem discutidos.


O primeiro deles reside no fato de ela partir de textos não autênticos, ou seja, foram
construídos com o objetivo de atender a demandas pedagógicas. Outro item a ser
considerado é o modo como as perguntas auxiliam na construção da reflexão que o
estudante terá de fazer sobre a rotina: elas não estabelecem entre si uma clara relação de
complementação que terão como resultado o estudante construir e/ou refletir sobre sua
rotina. Além disso, há um comando que sugere que o estudante compare a rotina dele
com aquelas inseridas nos textos da atividade, contudo, observa-se a ausência de

105
orientações a respeito de como o aluno pode realizar tal ação. Não houve por parte da
atividade sugestão de estruturas ou conectores comparativos ou mesmo uma sugestão de
uso da comparação por meio de metáforas, por exemplo. Assim, percebemos que o ato
de comparar concretizou-se como um fim, não como um dos objetivos da atividade, já
que ela estava inserida na parte do capítulo destinada a sistematizar o uso do Presente
do Indicativo. Assim, mais uma vez, destaca-se a predominância do trabalho com o
tópico verbos ou tempos verbais.
O manual (14) assemelha-se, na identificação do conector COMO, ao manual (9),
visto que traz esse item gramatical com valor semântico de conformidade. Segundo já
destacamos antes na análise do manual (9), essa visão constitui-se como uma
abordagem que destoa daquilo existente na língua em uso quanto à frequência do item
COMO na estruturação da comparação. Assim, pode-se entender que a variante
linguística e/ou o contexto de ocorrência de tal item não leva em consideração o uso,
mas sim uma escolha feita pelos autores do manual. Além do mais, não se explora
sequer a multifuncionalidade desse conector na Língua Portuguesa.
Não há problema algum em mostrar o como como conector conformativo, o que
não se pode deixar de fazer é destacar que essa é uma dentre as possibilidades de uso
que encontramos para ele, por exemplo, no discurso acadêmico, encontrado nos livros
didáticos, nas aulas expositivas, nas conferências, nos congressos, nos seminários etc.
Perde-se, assim, uma excelente oportunidade de mostrar a variação de registros em
Língua Portuguesa para o estrangeiro.
Cabe destacar ainda em relação ao manual (14) no tópico “Ampliando o
vocabulário”, a presença de um quadro que apresenta diversas noções semânticas e a
cada uma delas atribuem-se palavras ou expressões que exprimem determinado
significado. É importante ressaltar que as palavras ou expressões estão dispostas de
maneira descontextualizada, isto é, fora de textos ou enunciados, nos quais se inserem e
constroem um sentido àquela situação de comunicação. O fato que chama a atenção
para esse estudo encontra-se presente na Figura 5 a seguir:

Figura 5 – Manual (14)

106
O conteúdo trazido pelo quadro objetiva orientar o estudante na confecção de
textos acadêmicos, conforme podemos ver na figura 5. Isso pode ser entendido, pois o
manual (14) é direcionado a estudantes, oriundos de programas de intercâmbio, que
estão no nível intermediário no estudo da Língua Portuguesa. Assim, o conhecimento de
termos que estruturem o discurso de modo eficiente constitui-se como uma demanda
para esse contexto. Entretanto, observamos que no campo destinado ao valor semântico
de comparação há a determinação das relações de semelhança e comparação como
correspondentes. Outro fator a ser destacado é a ausência de conectores que
verdadeiramente expressem a comparação, visto que os itens presentes não trarão aos
contextos em que forem inseridos o valor semântico de comparação de modo claro, eles
estabelecem valores diversos entre si. Além disso, podemos ainda constatar que a não
ocorrência de conectores comparativos, sejam eles canônicos ou não canônicos, induz o
estudante a construir em seus textos relações de significado que não expressam aquilo
que desejam.

107
Observamos no quadro uma intenção de fugir à prescrição e trabalhar o
vocabulário, ou seja, ampliá-lo. A ideia é muito interessante, mas é preciso que os
campos semânticos envolvidos pelo que se denominou “semelhança, comparação”
realmente apresentem palavras a ele relacionadas como é o caso de “igualmente”. Não
parece ser o caso das outras.
As orações comparativas, conforme vimos na abordagem tradicional, são
abordadas no âmbito do período composto, na parte da subordinação adverbial. Em
abordagens linguísticas mais recentes, adota-se a noção de frase complexa para o que a
tradição gramatical denomina período composto. É o que podemos verificar em Mateus
et alii (1983), por exemplo.

A figura 6 a seguir adota essa nomenclatura, como se pode ver.

Figura 6 - Manual (15)

No manual (15), os autores, ao nomear o tópico gramatical como “Frases


Complexas”, sinalizam a ideia para uma explicação que visa a elucidar um assunto
muito importante no que tange ao estudo da construção de estruturas frasais e textuais
no contexto do ensino de PLE. A definição apresentada no início do tópico explicita a
ideia de período composto e contempla uma visão para além da simples conexão entre
sentenças ligadas por itens lexicais. Isso apresenta ao estudante uma possibilidade de
conhecer a língua por um viés mais reflexivo, já que para o docente restará a tarefa de
construir com o aluno uma série de explicações a respeito desse tema, como por

108
exemplo dizer que as “Frases Complexas” vão se diferenciar das “Frases Simples” pela
quantidade de verbos que as formam.
Nota-se na proposta a tentativa de adoção de uma visão linguística menos
prescritiva e que parece acenar com o emprego de teorias linguísticas mais recentes.
Contudo, mesmo apresentando além da lista de conectores, alguns exemplos, estes não
ultrapassam o nível sentencial e, portanto, ainda estão descontextualizados de uma
situação de interação, não refletindo a língua em uso.
Na figura 7 a seguir, trabalha-se com a relação semântica de explicação de forma
mais ampla. Isso pode ser demonstrado pelo título utilizado - “Ideia de explicação,
motivo, justificativa”. Tal fato é reforçado ainda pelo emprego de “principais elementos
indicativos dessa relação” ao invés de conjunção. Além disso, a noção de texto adotada
coaduna-se com o que vimos em Marcushi (1997), Koch (1992) e Geraldi (1997).

Figura 7 - Manual (15)

Embora do ponto de vista da Linguística Textual a noção de texto possa abarcar o


que para a gramática tradicional seria um mero período composto, como é o caso de
“Não comprei o relógio porque não tinha dinheiro” e empregada de forma adequada na
proposta da tarefa, toda a sua condução fica prejudicada com o comando do exercício

109
que a ela se segue, ou seja, “complete as frases, indicando uma explicação ou causa do
que foi apresentado”.
Ainda sobre o manual (15), vemos que as duas figuras destacadas anteriormente
trazem uma descrição das conjunções que exprimem ideia de alternância e explicação,
causa e motivo. Esses exemplos constroem uma visão que prioriza, mais uma vez, a
repetição da lista de conectores das gramáticas tradicionais. Além disso, o uso da
conjunção alternativa apresenta uma informação que não está presente na explicação
das outras, o grau de formalidade quanto ao uso dela na sentença. Isso propõe duas
formas de classificação para os itens lexicais, fato que não é esclarecido para o
estudante.
Paralelamente a isso, pode-se observar também nos conectores de explicação,
causa e motivo uma lista de itens que contempla as variantes formal e informal sem
explicação ao aluno de que uso dar a esses conectores. Além disso, o excerto apresenta
o item COMO descrito apenas com valor semântico de causa; contudo, o uso corrente
desse conector é como conjunção comparativa, de acordo com Rodrigues (2001). Vale
lembrar, ainda, sua multifuncionalidade. Assim, essa informação importante para o
processo de construção textual não é apresentada, furtando, mais uma vez, o estudante
de refletir sobre a semântica desse item em diferentes contextos de uso.
O manual (16) apresenta a comparação na parte em que aborda o grau dos
adjetivos e apresenta essa única estratégia para estabelecer tal relação semântica. Já o
manual (17), não faz menção à noção de comparação em sua proposta; contudo, mostra
em um exercício sobre o uso de conjunções e sua relação com o futuro do Subjuntivo a
palavra COMO. Na atividade, apresenta-se uma lista ao estudante em que ele deve
completar espaços, utilizando os itens dados nessa lista. A ausência da explicação e uma
abordagem prescritiva com base na GT inviabiliza uma leitura por parte do aluno
centrada no uso e no entendimento da razão da atividade que se está realizando. Além
disso, destacamos, mais uma vez, a variação linguística, a distinção dos níveis de
formalidade da língua e a multifuncionalidade do item COMO, por exemplo, não foram
exploradas pelo livro.
No manual (18), encontramos, na seção Apêndice Gramatical, uma lista de
conjunções, dentre elas as comparativas, que reproduz aquela presente na GT. Por ser
uma parte do manual direcionada à consulta e/ou pesquisa, entendemos que o valor
dado a tal conteúdo não se centra no devido destaque que esses itens gramaticais
possuem na língua para leitura, análise e produção de textos e enunciados. Por isso,

110
caberá ao professor que trabalhar com esse manual abordar essa temática de modo a
mostrar ao estudante o papel dos conectores para além de uma lista presente em um
apêndice de seu livro. Mais uma vez, confirma-se o quadro que Rodrigues (2014)
organizou com base na GT.
O manual (19) apresenta uma abordagem interessante no que diz respeito aos
conectores comparativos, pois parte do texto de feição argumentativa para mostrar o
papel do que ele chama de operadores argumentativos, conforme assevera Koch (1992)
e Vogt (1997). Apesar de nosso trabalho entender que a nomenclatura conector cumpre
melhor o papel desempenhado pelos itens gramaticais chamados tradicionalmente de
conjunção, compreendemos que o manual se propôs a apresentar esses itens com foco
centrado no uso. Apesar de ser um manual direcionado a estudantes que já tenham um
domínio vasto da LP, visto que é dirigido a pessoas que são consideradas usuárias
intermediárias da língua, ainda assim restringe a comparação a quatro possibilidades de
construção de estruturas. Além disso, é importante ressaltar que o foco da abordagem
trazida pelo livro está na língua escrita formal, não contemplando também as variantes
da LP em que ocorrem tais estruturas.
O manual (20) traz um exercício no qual se propõe utilizar estruturas
comparativas; porém, podemos observar, mais uma vez, a adaptação dessa lista de itens
comparativos com base nos prescritos pela GT. Além disso, cabe destacar que o item
COMO, aqui, é apresentado somente associado à estrutura TÃO...QUANTO/COMO e
não como um item que pode também funcionar sozinho na estruturação da comparação.
Portanto, como conector simples. Isso mostra que as estruturas apresentadas não foram
coletadas de contextos reais de uso/interação nos quais a comparação ocorre.
O manual (21) destaca-se perante os outros que compõem sua coletânea – são eles
os manuais (16), (17), (19) e (20) – por apresentar o conector QUE NEM. A presença
desse item em Exercício sobre o poema Descobrimento, do poeta modernista Mário de
Andrade, no qual o eu-lírico se compara a um brasileiro que está distante de si, mostra
que a noção de comparação pode ser realizada também com essa estratégia linguística.
Contudo, a atividade é muito breve e não contempla toda a relevância do uso desse item
no texto no qual está inserido nem trata da ideia de que esse uso pertencente ao início do
século XX é frequente na LP nos dias de hoje. Além disso, não se falou também da
variação linguística, tampouco da variação quanto ao nível de linguagem e a presença
desse item na escrita e sua frequência na língua falada. Nossa análise tem como base o
trabalho de Rodrigues (2010), no qual a pesquisadora realiza uma investigação acerca

111
do uso de que nem funcionando como conector em diversas estruturas da LP. À época, a
autora utilizou como corpus de sua investigação roteiros de cinema, apesar de esse
corpus pertencer à língua escrita, apresenta frente ao exemplo do manual (21) um novo
contexto de utilização do item fora do ambiente literário. Por fim, destacamos também
que o manual restringiu a comparação a somente uma estrutura e não se dispôs a
recuperar as outras existentes tanto na oralidade quanto na escrita para auxiliar o
estudante a melhor entender como isso funciona na LP.
Vale mencionar, ainda, que o uso de que nem foi mostrado num texto literário de
um dos modernistas que mais lutaram pela ideia de uma língua brasileira, discussão
linguística bastante atual entre teóricos que defendem que o Português Europeu e
Brasileiro são dois. Portanto, além de uma questão de variação uma questão cultural
bastante importante para uma das discussões mais pertinentes em ensino – o preconceito
linguístico – fica de fora com a proposta como está.
Os manuais (22) e (23) não apresentaram a comparação; porém, o primeiro, por
ser uma proposta feita pelo Ministério das Relações Exteriores para difusão nos centros
culturais brasileiros no exterior e nas embaixadas e consulados, constitui-se com uma
abordagem na qual a comparação e demais fenômenos linguísticos são tratados de
forma totalmente contextualizada, partindo sempre de situações reais de uso da língua e
daquelas nas quais a comunicação e o trabalho com tipos e gêneros textuais se mostram
de uma maneira bem dinâmica. Assim, não há a presença de listas de conjunções ou
exercícios que visam a sistematizar regras da GT, classificando termos e estruturas
como “certas” ou “erradas”. Já o manual (23), apesar de apresentar um tópico
relacionado a conjunções, traz apenas as coordenativas, deixando todas as outras de fora
de sua abordagem.
O manual (24) apresenta a comparação em dois momentos: em um tópico em que
há a comparação do carnaval do passado com o do presente e na parte que chama de
Comparação 2. Embora existam dois espaços em que o tema é tratado, a maneira como
isso é feito segue a orientação dada pela GT, fato que direciona o uso das estruturas
comparativas para um olhar mais centrado na escrita formal e distante do uso corrente.
Além disso, é possível observar uma repetição dos itens colocados pelo manual, pois
apenas TÃO...QUANTO/COMO e TANTOS... (DO) QUE diferenciam uma lista da
outra. O item COMO sozinho funcionando com comparativo não faz parte da lista
mostrada pelo manual, nem outros itens comparativos que pertençam a variantes
linguísticas distintas daquela abordada no livro.

112
Por fim, o manual (25) apresenta a comparação estruturada por adjetivos, pois
objetiva ensinar a seu público-alvo como se realiza esse fenômeno na língua, com foco
na norma culta. O autor faz essa abordagem, porque seu interesse é ser um manual
orientador de estudantes estrangeiros, crianças e adolescentes que venham passar um
longo tempo no Brasil e necessitem acompanhar os conteúdos curriculares de LP da
educação formal no que diz respeito ao ensino e aprendizagem de língua materna.
Assim, entende-se o motivo pelo qual esse manual opta por seguir tal orientação, ou
seja, centrada na GT e que acompanha os livros didáticos. Contudo, uma abordagem
mais centrada no uso poderia contribuir para a melhoria do trabalho apresentado pelo
manual, visto que a ausência do item COMO na estruturação da comparação mostra que
o foco no uso ou na própria prescrição gramatical não contemplam plenamente aquilo
que estudante encontra nos livros didáticos e na instituição onde for estudar.
Assim, à luz do que foi aqui apresentado, podemos afirmar que, assim como
acontece em língua materna, em PLE, os livros didáticos estão longe de contemplar a
língua em uso. A maioria deles continua reproduzindo um modelo de ensino mais
voltado para a prescrição e os poucos que usam a descrição linguística acabam não
conseguindo adotar a abordagem comunicativa no ensino de língua. O maior problema
por nós identificado foi a utilização do texto como pretexto para o ensino de regras
gramaticais e não como forma de contextualização dos usos linguísticos.
Nitidamente, sendo a comparação uma competência que pode se manifestar por
meio de uma rica gama de formas (estruturas) em Língua Portuguesa, seria de se esperar
que pelo menos algumas delas ganhassem representação nos manuais didáticos de PLE,
pois cada qual naturalmente desempenharia uma função tão cara às habilidades de
interação que pretendemos que nossos estudantes estrangeiros adquiram, diminuindo-se,
dessa forma, a distância entre o Português como língua materna e o português como
língua estrangeira. Todavia, o que se observa, na maior parte dos manuais didáticos, é
justamente o aprofundamento do fosso entre essas duas extremidades do continuum, já
que eles, frequentemente, apenas reproduzem (e de forma incompleta) a prescrição
gramatical, confiando à vivência extraclasse (quando este é o caso) as realizações não
canônicas da língua, o que consideramos, como já apontado, um equívoco
contraproducente.
Esperamos ter contribuído para uma descrição do quadro que encontramos nos
manuais de PLE no que diz respeito à comparação estruturada por conectores.
Passemos, portanto, às considerações finais.

113
8. CONCLUSÃO

O presente trabalho teve como objetivo geral investigar a utilização que os


manuais de ensino de Português como Língua Estrangeira (PLE) dão ao fenômeno da
comparação estruturada por conectores. Não estabelecemos previamente uma lista ou
tipos de conectores ou estruturas que desejávamos encontrar nos manuais, visto que
quaisquer dados relativos a esse tema seriam interessantes para nossa análise. Além
disso, devido à diversidade de manuais que utilizamos como corpora para essa tese
quisemos também entender como as atividades e propostas adotadas pelos manuais
foram construídas, ou seja, se se basearam numa perspectiva na qual a língua em uso
fosse o foco, visto que se pretende ensinar uma língua e se o trabalho com textos esteve
presente como um direcionamento das atividades. Assim, rever o que é apresentado nos
manuais de PLE a respeito da comparação passou por essas etapas.
Para auxiliar nossa investigação, partimos da seguinte hipótese: as estratégias
linguísticas encontradas nos manuais de PLE para o ensino da comparação estruturada
por conectores não são adequadas a uma abordagem comunicativa. Essa hipótese
confirmou-se, visto que observamos que em nove dos vinte e cinco manuais analisados
o fenômeno não aparece. Além disso, a comparação, quando encontrada, esteve
maciçamente apresentada no nível da sentença no tópico grau dos adjetivos,
configurando esta como única forma de se comparar em Português.
Nosso estudo trouxe também como reflexão a necessidade de pensar as
concepções de língua, linguagem e de PLE que os manuais analisados apresentam como
proposta de ensino e como material didático. Isso nos levou a construir o capítulo
Objeto de estudo para melhor entendermos a maneira como essas concepções se
entrelaçam e como elas auxiliaram nossa análise da comparação estruturada por
conectores. Além disso, vale destacar que a corrente funcionalista foi essencial para
traçarmos nossas estratégias de análise e para construir nosso olhar sobre o tema dessa
tese. Com isso, era necessário termos em mente que cada um dos manuais analisados
teria de apresentar ao estudante de PLE uma abordagem que trouxesse a língua como
uma instância dinâmica, portanto, em constante mudança e sob influência direta do uso
que seus falantes fazem dela.
Ademais cumpre ressaltar ainda o papel do Funcionalismo no reconhecimento de
estruturas, estratégias e contextos apresentados pelos manuais que mostraram o
fenômeno da comparação estruturada por conectores para assim descrevê-la de modo a

114
compreender como se dariam os processos de ensino e aprendizagem desse tema. A
clareza a respeito da variante linguística que cada manual apresentou ou pretendeu
apresentar, fosse ela norma padrão, norma urbana de prestígio ou uma norma mais
coloquial, foram importantes para melhor entender o motivo pelo qual a comparação
estruturada por conectores esteve ou não presente.
Paralelamente a isso, os trabalhos de Rodrigues (2001, 2009, 2010 e 2014) e de
Rodrigues e Tota (2013) basearam não só a identificação e/ou reconhecimento das
estruturas comparativas iniciadas por conectores, mas também serviram para mostrar
que sua frequência na Língua Portuguesa falada e escrita são bem altas. Deve-se
considerar ainda nesses trabalhos a identificação de itens gramaticais não canônicos
que, segundo nossa investigação, precisavam também estar presentes nos manuais de
PLE, a fim de promover ao estudante um contato com termos que ele encontra na língua
em uso nas situações reais de interação. Dessa forma, fica claro que o estudante precisa
ser visto como um sujeito ativo no processo de ensino e aprendizagem e que por seu
contato com falantes nativos de forma direta ou em redes sociais o faz ser alguém que é
parte essencial desse processo. Por isso, mostrar para ele o uso não canônico e as
diferentes estruturas comparativas formadas por conectores é ampliar a maneira como
entende a língua que está aprendendo.
Infelizmente, a percepção que tivemos ao construir essa tese é a de que muitos
manuais possuem um forte compromisso com o ensino e a aprendizagem de PLE,
contudo, de um modo não ativo e pouco dinâmico, mesmo aqueles que trazem
conteúdos em mídias digitais, como sites ou CD. É importante deixar claro que em
nenhum manual foram identificadas atitudes de má-fé ou um descompromisso com
quem vai utilizar o manual. Todavia, a restrição ao que é apresentado ao estudante como
recurso linguístico e gramatical se materializa na realização de exercícios estruturais e
que não mostram nem as variantes linguísticas e nem mostram a multiplicidade de usos
de um vocábulo, como, por exemplo, o caso de tipo, feito, igual e que nem funcionando
como conectores comparativos não canônicos.
À luz dessa reflexão, é importante dizer que a predominância das estruturas
comparativas ligadas ao tópico Grau dos Adjetivos apenas confirma a visão restrita que
muitos materiais analisados apresentam em relação à comparação como uma instância
que pode ser estruturada de várias maneiras e à própria concepção que muitos manuais
têm a respeito de enunciado, texto e conjunção. Além disso, cabe aqui destacar que a
restrição da comparação estruturada por conectores nos manuais ao tópico Grau dos

115
Adjetivos não segue diretamente a abordagem das GT, visto que nelas a comparação
também é encontrada no capítulo que aborda as orações subordinadas e nelas as
chamadas de comparativas. Entretanto, é necessário pontuar que nas GT o rol de
vocábulos indicados como aqueles que introduzem as orações comparativas são
praticamente os mesmos, pois integram uma lista que se repete em diversos autores.
Nos manuais analisados, a reprodução dessa lista foi verificada em alguns, mas assim
como nas GT as atividades propostas para o trabalho com esse conteúdo são estruturais
e não promovem a reflexão, por parte do estudante, acerca desse fenômeno e de sua
importância na construção dos discursos. Portanto, centra-se a relação de comparação
única e exclusivamente no conector que introduz a oração e não na relação que emerge
entre elas.
Outro aspecto que merece comentário é a possibilidade de as estruturas
comparativas poderem ser oracionais e não oracionais, conforme defende o trabalho de
Rodrigues (2001). Assim, os manuais não mostram aos estudantes outras possibilidades
de estruturação da comparação, tema dessa tese. Isso interfere diretamente na proposta
que esses manuais realizam não com os conteúdos gramaticais, mas com as relações
semânticas e com os textos. O trabalho com conteúdos gramaticais distante de uma
abordagem que considere a língua em uso e os usos inseridos em textos de tipos e
gêneros diversos, ou seja, contextualizado, promove um olhar mais prescritivo desse
conteúdo.
Por fim, COMO, considerado como conector prototipicamente comparativo e que
canonicamente estrutura a comparação em Língua Portuguesa, não foi abordado pela
maioria dos manuais. Ademais, em alguns contextos em que foi encontrado, o valor
semântico a ele atribuído foi o de conformidade. Assim, além de sua
multifuncionalidade, o seu papel como conector prototípico na estruturação da
comparação, não foram contemplados. A ocorrência de QUE NEM não possibilitou a
construção de uma atividade na qual o uso da língua fosse privilegiado, já que o texto
literário no qual se inseria não foi bem explorado. Isso mostra que, em muitos manuais,
a elaboração dos materiais tem como base a retirada de exemplos e afins na literatura ou
em produzi-los para atender a interesses pedagógicos e não comunicativos. As situações
reais de uso devem ser sempre objeto das aulas e materiais didáticos devem ser
construídos com o objetivo de se conferir autenticidade ao que será apresentado ao
estudante em sala de aula.

116
Uma abordagem linguística que siga o viés comunicativo deve envolver uma
proposta de material didático que não restrinja seu trabalho somente aquilo que
apresenta a gramática. É necessário para a construção desses materiais que seu produtor
se inquiete e se incomode com certas questões linguísticas que não são privilegiadas e
que faça delas temas de aula e/ou de capítulos. Assim, por exemplo, os graus de
formalidade linguística, como o coloquial, o informal, precisam ser parte integrante
desses materiais. Não tratar dessas questões justifica o que observamos/encontramos em
nossos resultados, ou seja, uma artificialização do uso, por meio de atividades e
exemplos que servem mais a fins pedagógicos e menos às experiências reais do
aprendente com o vernáculo. O espectro que delineamos provoca no estudante
estrangeiro uma dificuldade para ele compreender a língua, seja ela falada ou escrita.
Esse panorama se agrava ainda mais em situação de imersão, na qual cada uso feito por
um falante nativo cria para o estudante um desafio. Esse desafio poderia funcionar como
uma rica fonte de corpora autênticos para a produção de aulas e materiais. No nosso
caso, podemos dar como exemplo as variadas possibilidades de estruturação da
comparação e, até mesmo, suas ocorrências no campo mais metafórico. Esta última não
foi foco de nossa tese, fato esse que configura uma lacuna a ser preenchida por meio,
por exemplo, da ampliação de nosso recorte de estudo em pesquisas futuras.
Outra demanda também não atendida por essa pesquisa reside na necessidade de
se investigar se os professores que utilizam os manuais didáticos de PLE têm noção da
ausência de um trabalho mais centrado no uso no que diz respeito à comparação
estruturada por conectores. Mais especificamente, poderia se investigar se os alunos
conseguem associar os tópicos ligados à comparação nos manuais de PLE ao que ele a
todo momento ouve/usa como estrutura comparativa na interação com falantes nativos.
Por isso, considerar a língua em uso deve ser algo que vá além da ideia de fazer, por
exemplo, atividades com corpus oral ou com frases retiradas de diálogos de filmes ou
novelas, ou seja, a atividade didática deve de ser feita de modo a preparar para o
estudante um itinerário no qual ele reviva situações reais de interação.
Diante disso, nosso problema de pesquisa, a maneira como os manuais abordam a
comparação estruturada por conectores não é adequada a uma perspectiva da língua em
uso, o que foi identificado e descrito por nossa análise, conforme pode ser visto no
capítulo 6. Sabemos que nossa tese não esgota as possibilidades de investigação a
respeito da comparação estruturada por conectores nos manuais de PLE, contudo,
esperamos que nosso estudo possa contribuir minimamente para suprir alguma demanda

117
de pesquisas na área de PLE. Esperamos ter deixado clara a necessidade de uma análise
centrada no uso e que promova à área mais reflexões sobre a importância da
contextualização para o ensino de língua.

118
9. REFERÊNCIAS

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MENDES, Edleise; SCHRÄGLE, Isaure; MENDES, Paula Monteiro. Brasil
Intercultural - Língua e Cultura Brasileira para Estrangeiros - Ciclo Avançado -
Níveis 5 e 6. Campinas - SP: Pontes Editores, 2018. 130 p.
MENDES, Edleise. Brasil Intercultural - Língua e Cultura Brasileira para
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MENDES, Edleise; BARBOSA, Cibele Nascente; CASTRO, Giselle Nunes de. Brasil
Intercultural - Língua e Cultura Brasileira para Estrangeiros - Livro de Exercícios
Ciclo Básico - Níveis 1 e 2. Campinas - SP: Pontes Editores, 2018. 70 p.
MENDES, Edleise; SCHRÄGLE, Isaure; MENDES, Paula Monteiro. Brasil
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126
ANEXOS

FICHAS DE AVALIAÇÃO DE LIVROS DIDÁTICOS

Identificação da obra Volume único [ ] Coleção [ ]

Número de páginas:

DESCRIÇÃO GERAL DA OBRA

AVALIAÇÃO DE ASPECTOS GERAIS

Aspectos formais

a) O sumário reflete a organização interna da obra e permite a rápida localização da informação? SIM NÃO
b) Os recursos gráficos, relativos à estrutura hierárquica (seções, títulos, subtítulos), auxiliam na
localização e na compreensão das informações? SIM NÃO

c) O desenho, a cor e o tamanho da letra, bem como o espaço entre letras, palavras e linhas, SIM NÃO
atendem a critérios de legibilidade?

d) As referências bibliográficas, citadas ao longo da obra, estão completas e atualizadas de acordo SIM NÃO
com a ABNT?

e) A impressão prejudica a legibilidade no verso da página?


SIM NÃO

f) A obra está isenta de erros de revisão gráfica? SIM NÃO

Aspectos estruturais

a) A obra organiza os conteúdos em seções, capítulos, subitens? SIM NÃO

b) Os conteúdos distribuem-se pela obra de maneira dosada? SIM NÃO

O B S I

c) Entre os capítulos que compõem cada livro, há unidade de princípios, que resulta em SIM NÃO
abordagem e encaminhamento coerentes e harmônicos?
O B S I

d) Entre os volumes que compõem as coleções, há unidade de princípios, que resulta em SIM NÃO
abordagem e encaminhamento coerentes e harmônicos?
O B S I

a) As ilustrações estão integradas ao conteúdo? SIM NÃO

O B S I

Há uso excessivo de ilustrações? SIM NÃO


b) Os textos, os gráficos, as tabelas e as ilustrações estão identificados em relação às
fontes? SIM NÃO

127
c) A linguagem está adequada ao grau de escolaridade a que se destina o livro? SIM NÃO

O B S I

d) A linguagem apresenta clareza na expressão das ideias? SIM NÃO

O B S I

e) A linguagem apresenta graves inadequações no que se refere ao uso da variedade SIM NÃO
padrão?

Preceitos éticos

a) A obra veicula preconceitos e discriminações (de origem, cor, condição sócio-econômico- SIM NÃO
cultural, etnia, gênero, linguagem), privilegiando grupo, camada social ou região do País?

b) A obra divulga matéria contrária à legislação vigente para a criança e o adolescente, no SIM NÃO
que diz respeito a fumo, bebidas alcoólicas, medicamentos, drogas e armamentos, entre
outros?

c) A obra faz publicidade de artigos, serviços ou organizações comerciais (salvaguardada a SIM NÃO
exploração estritamente didático-pedagógica do discurso publicitário)?

d) A obra faz doutrinação religiosa? SIM NÃO

e) A obra veicula idéias que promovam o desrespeito ao meio ambiente? SIM NÃO

FICHAS DE AVALIAÇÃO RELATIVA A ASPECTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS

LEITURA E PRODUÇÃO DE TEXTOS

Conceitos gerais

a) O texto é concebido como um processo construído em situação de interação? SIM NÃO


(Ou é considerado apenas um produto, desvinculado da situação comunicativa?)
O B S I

b) A concepção de leitura contempla a possível multiplicidade de sentidos construídos a SIM NÃO


partir do texto?
(Ou contempla o texto como dotado de um único sentido hegemônico?) O B S I

c) A produção textual é concebida em suas diversas etapas do processo de construção: SIM NÃO
planejamento, execução e revisão?
O B S I

d) A obra apresenta problemas conceituais graves quanto à concepção de texto e quanto aos SIM NÃO
fatores de textualidade (aceitabilidade, situacionalidade, informatividade, intertextualidade e
conectividade)?

Metodologia de ensino

Da leitura

128
a) A seleção de textos propicia o contato do aluno com diversos gêneros textuais? SIM NÃO

O B S I

b) A seleção de textos contempla:


• tanto textos literários quanto não literários? SIM NÃO
• tanto textos da modalidade oral quanto da modalidade escrita? SIM NÃO
• gêneros de maior circulação social, ligados à experiência do aluno? SIM NÃO
• opções que levam em conta o compromisso de ampliar o repertório cultural do
SIM NÃO
aluno?

c) Há predominância de textos apresentados na íntegra? SIM NÃO

Caso contrário, os fragmentos constituem unidade coerente? SIM NÃO


Os fragmentos estão contextualizados em relação à obra de que foram extraídos? SIM NÃO

As atividades de leitura:

d) levam em consideração os fatores de textualidade para a construção do sentido do texto? SIM NÃO

O B S I

e) exploram os textos em seus aspectos mais significativos e pertinentes – quanto ao conteúdo e à SIM NÃO
forma?
O B S I

f) propõem questões de caráter interpretativo, inferencial e crítico? SIM NÃO


(Ou se limitam a propiciar digressões de caráter subjetivo e/ou a testar a compreensão do texto?)
O B S I

g) exploram os elementos linguísticos como recursos para a construção do sentido textual? SIM NÃO
(Ou se limitam a utilizar o texto como pretexto para exploração de conteúdos gramaticais?)
O B S I

h) desenvolvem estratégias que promovam a ampliação do vocabulário?


SIM NÃO

O B S I

i) exploram os implícitos como elementos fundamentais à construção do sentido do texto?


SIM NÃO

O B S I

j) exploram os constituintes de cada gênero aplicados à construção do texto? SIM NÃO


(Ou se limitam a descrever os gêneros textuais desvinculados da construção do texto?)
O B S I

l) contemplam a intertextualidade, de modo a motivar a inter-relação de conteúdos e/ou SIM NÃO


formas?
O B S I

129
m) propiciam a abordagem da interdisciplinaridade e o consequente diálogo com áreas SIM NÃO
afins?
O B S I

n) desconsideram a articulação com as atividades de produção textual e com os SIM NÃO


conhecimentos linguísticos e literários?

Da produção

As atividades de produção textual:

a) objetivam a formação do aluno como autor, que visa a atingir propósitos comunicativos
SIM NÃO
nas diversas situações de interação social?
O B S I

b) levam em consideração os fatores de textualidade? SIM NÃO

O B S I

c) consideram os elementos de contextualização, em especial o destinatário, a situação, a SIM NÃO


finalidade?
(Ou se limitam a propor um tema para redação?) O B S I

d) consideram as etapas de planejamento, execução e revisão? SIM NÃO


(Ou privilegiam o produto final?)
O B S I

e) desenvolvem estratégias para garantir a progressão temática no desenvolvimento de SIM NÃO


textos?
O B S I

f) desenvolvem a capacidade de construção textual a partir de elementos formais, tais como


SIM NÃO
uso do vocabulário, mecanismos coesivos, organização do período, estruturação em
parágrafos? O B S I

g) exploram a estrutura dos tipos básicos de texto (descrição, narração, dissertação


SIM NÃO
expositiva/argumentativa)?
O B S I

h) propiciam o desempenho do aluno em relação a diversos gêneros textuais da modalidade


SIM NÃO
oral?
O B S I

i) propiciam o desempenho do aluno em relação a diversos gêneros textuais da modalidade


SIM NÃO
escrita?
O B S I

j) desconsideram a articulação com as atividades de leitura e com os conhecimentos SIM NÃO


linguísticos e literários?

130
ATIVIDADES E EXERCÍCIOS

As atividades e os exercícios propostos:

a) estimulam o aluno a observar, interpretar, descrever e analisar o conteúdo, propiciando,


SIM NÃO
assim, o debate de ideias por meio de seu posicionamento crítico?
O B S I

b) contêm perguntas que exigem inferências para a busca de respostas?


SIM NÃO
(Ou contêm perguntas que se limitam à cobrança de conhecimentos automatizados?)
O B S I

c) estimulam a complementação das informações por meio de pesquisa em outras fontes?


SIM NÃO

O B S I

d) consideram o universo de referências culturais do estudante estrangeiro?


SIM NÃO

O B S I

e) trabalha na perspectiva da gramática descritiva com exercícios contextualizados?


SIM NÃO

O B S I

f) apresenta o tópico orações comparativas ou conectores, conjunções ou conectivos


SIM NÃO
comparativos?
O B S I

g) existe no livro alguma menção ideia de comparação ou estrutura comparativa?


SIM NÃO

O B S I

h) a comparação, quando presente, apresenta-se em que nível? M SIN

DIS N SEM

i) As orientações quanto às respostas aos exercícios preveem flexibilidade na aplicação?


SIM NÃO
(Ou funcionam como rígida prescrição para guiar o trabalho do professor?)
O B S I

131

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