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O nascimento do Bardo Destemperado

De cedo ouviram-se os contos Mas ninguém lhe deu ouvidos


De tarde cantaram canções Porque Dona Zema dizia
Diziam que um homem nascera “Quando vê assim é a Morte
Para encantar multidões Querendo fazer moradia
De uma ou duas, dezenas, Por isso, não falem com ela
Quem sabe até de centenas Deixem lá em sua querela
Cabeças grudadas em corações Essa nefasta vadia”

Assim começamos a lida A figura manteve-se ali


Como qualquer trovoada Parada no meio da rua
Que em seu percurso se valida Por meses, anos a fio
De fato, numa encruzilhada Passavam e lá estava ela, nua.
É nesse recanto da vida Pedia comida diariamente
Que surge, pedindo comida E ninguém lhe dava sequer aguardente
Uma figura estranhada. Pra lhe içar dali, tal qual uma grua.

Diz-se que veio em dia De repente apareceu


De lua cheia, menino. Uma moça de nome Rabeca
Acharam que era lobisomem Dizia que não aguentava
Ou o bebum, seu Firmino Ver o homem naquela fubeca
Se assustaram com o homem Aproximou-se do rapaz
Vindo morrendo de fome Com uma trouxa de pano atrás
E sem um pano no tino. E disse: “Tome, uma cueca!”

Dizia: “me deem de comer “Mas eu queria era comida”,


Que eu prometo pagar Disse o cabra na encruzilhada
Não sei se vai ser do agrado “Comida eu não posso lhe dar,
Mas nem Jesus pôde agradar Que Dona Zema ia ficar retada.
Mesmo assim eu lhes digo Mas pelo menos se vista
Se encher o meu bucho até furar o Que eu não quero ver sua crista
umbigo Assim por aí, toda arreganhada”
A paz eu trago a este lugar”
“Pois então, me perdoe Pôs-se então a cantar
Mas terei que recusar. “Me deram o de comer
A mim foi ordenado que Quiseram me alimentar
Só um alimento pode me salvar Que bom que ainda existem
E assim eu prometo a você Pessoas que fazem bem
Que se me der o de comer Sem mesmo olhar a quem
A paz trago a este lugar” O bem vai alcançar”

Rabeca ficou mais irritada E seguiu na cantoria


E jogou a trouxa no chão Toda a cidade a escutar
Disse: “Pois então fique aí, Sua voz era doce, quente
Não lhe ajudo mais não. Como um sol de manhã fria a chegar
E peço por favor que me esqueça “Amanhã, será um lindo dia
E se me ver, desconheça Da mais louca alegria
Que eu nunca lhe falei um grão”. Que se possa imaginar”

Só quando ela se retirou Assim seguiu cantando


Que o homem pôde enxergar Até sumir na estrada
Havia algo de diferente Agradeceu pela estadia
Um cheiro peculiar Sua vida era encantada
Na trouxa de roupa trazida Não poderia permanecer
Numa das peças, escondida Porém ao povo que o viu nascer
Rabeca pôs bolo de fubá Iria compor uma linda toada

Eita que o cabra se destemperou Diz-se nos dias de hoje


E “fundou” dentro da refeição Que o homem segue seguindo
Se fartou de tanto comer Em várias cores, sabores,
Cada mordida uma emoção Formatos e corpos, vai indo.
Sua fronte brilhou É espírito da canção
E como em mágica retirou Parte de uma inspiração
Dos céus um lindo violão Do próprio amor do Divino
Falam assim as histórias
Que aqui lhe tenho contado
Se não acreditar agora
Lhe peço perdão e cuidado
Pois é pra ficar na memória
E ser celebrado em glória
As aventuras do Bardo Destemperado!

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