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Escolha de Tensoativo

Livre de Sulfato
Rodrigo Marcelino Matias
Innospec Performance Chemicals, São Paulo SP, Brasil

até hoje. São, seguramente, os principais


tensoativos aniônicos utilizados pelo
mercado de cosméticos em termos de
quantidades consumidas anualmente.
Porém, os tensoativos sulfatados
passaram a ter conotação negativa em
relação aos demais tensoativos também
utilizados em shampoos e sabonetes
líquidos. Isso ocorreu devido às des-
vantagens que os sulfatados apresentam
por serem considerados irritantes para a
pele e as mucosas e, por consequência,
por ocasionar ressecamento de cabelos
e da pele. Os motivos serão abordados
mais adiante.
Essa conotação negativa atribuída
aos sulfatados por parte dos consumi-
dores é frequentemente declarada na

A
s primeiras preocupações e dis- Afinal, o que são os sulfatos? internet por meio de expressões como
cussões sobre o uso de sulfatos em “coceira e irritação do couro cabelu-
As formulações cosméticas livres do”, “interferência na manutenção da
formulações cosméticas aconte- de sulfatos são as dos produtos que não
ceram há mais de 15 anos. Na época, oleosidade natural do cabelo e da pele”,
contêm tensoativos sulfatados em sua “desbotamento da cor de cabelos tin-
acreditava-se que as formulações sem composição. Geralmente, esses produ- gidos” e “ressecamento dos cabelos e
sulfato seriam apenas uma tendência de tos são shampoos e sabonetes líquidos da pele”. Essas declarações estão in-
curta duração e de pouca aderência. Esse produzidos sem a adição de tensoativos trinsicamente associadas à detergência
conceito era principalmente difundido aniônicos cujo grupo polar seja sulfatos. (ao poder de limpeza) dos tensoativos
via internet, por meio de blogs em que se Dessa forma, é importante esclarecer sulfatados e ao grau dos danos capilares
comentavam os malefícios aos cabelos que o termo “livre de sulfato” não se refe- que eles causam. Elas são feitas princi-
causados pelo uso de shampoos que con- re aos sais inorgânicos (sulfato de sódio, palmente por consumidoras que tiveram
tinham sulfatos, principalmente aos os por exemplo), mas sim ao tensoativo seus cabelos expostos a tratamentos que
cabelos cacheados e/ou danificados por aniônico sulfatado, mais especificamen- podem danificar a fibra capilar e agredir
tratamentos capilares (cabelos tingidos, te aos álcoois graxos sulfatados ou aos o couro cabeludo (descoloração, alisa-
descoloridos, alisados etc.). álcoois graxos etoxilados sulfatados, mento químico e físico etc.) – condições
Hoje, sabemos que os consumidores que não devem estar presentes na for- que exigem produtos específicos e com
de shampoos estão atentos aos rótulos de mulação. maior suavidade.
produtos e continuam preocupados com Alquil sulfatos e alquil éter sulfa-
a presença de sulfatos nas formulações tos são tradicionalmente utilizados pela Sulfate Free no Brasil
cosméticas. O debate sobre a substitui- indústria cosmética, sendo seus princi- No Brasil, os produtos cosméticos
ção de sulfatos tomou dimensão global, pais representantes, respectivamente, o sulfate free são majoritariamente sham-
motivando empresas líderes de mercado sodium lauryl sulfate (SLS) e o sodium poos. Nos últimos anos, houve cresci-
locais e mundiais a desenvolver e lançar lauryl ether sulfate (SLES), incluindo mento expressivo do número de pessoas
novos produtos cosméticos sulfate free, suas versões com diferentes contraíons que estão optando por ter cabelos natu-
ampliando assim a demanda por maté- (amônio, TEA etc.) - Figura 1. rais e volumosos, e esta expressão tem
rias-primas fabricadas pela indústria A introdução desses tensoativos aniô- ecoado: “Os cachos estão de volta”. Os
química que atendam aos requisitos dessa nicos no mercado ocorreu nas décadas de cabelos cacheados são mais sensíveis
nova e crescente categoria de produtos. 1930 e 1940, mantendo sua importância e propensos ao ressecamento e, conse-
Figura 1. Representação esquemática dos grupos quentemente, são alvo dos shampoos livres de sulfato, que se
sulfatos de tensoativos sulfatados caracterizam pela suavidade.
De acordo com dados da Mintel, em 2017, foram lançados
O O cerca de 100 shampoos sulfate free no mercado brasileiro, dos
Porção quais quase 60% carregavam o claim “livre de sulfato”. Em 2018,
R – OSO3 - M + polar sulfato
S o número de lançamentos desse tipo de shampoo no primeiro
Alquil sulfato
O O semestre superou em 11% o do mesmo período do ano anterior.
Portanto, é um mercado promissor e que continua a crescer
-
R – (O – CH2 – CH2)n – OSO3 M + (Gráfico 1).
R = cadeia graxa hidrofóbica
Alquil éter sulfato M+ = contraíon
Critérios para a Escolha de Tensoativo
sem Sulfato
Gráfico 1. Número de lançamentos de produtos Desafio técnico
sulfate free no mercado brasileiro As principais considerações a respeito de shampoos sulfate
free feitas por profissionais de P&D das indústrias cosméticas
100 costumam ser:
Total de lançamento de - Espuma: geralmente, para atingir uma quantidade de es-
80 shampoos sulfate free puma adequada ao padrão de aceitação do consumidor, deve-se
Total de shampoos com
claims de sulfate free utilizar uma dosagem mais elevada de tensoativos sulfate free
60 comparada à dose usual de SLES.
- Viscosidade: formulações com tensoativos sem sulfatos
40 não respondem facilmente a eletrólitos, o que exige a utilização
de agentes espessantes e modificadores reológicos propriamente
20 ditos.
- Desempenho: formulações sulfate free, quando compara-
0 das diretamente com formulações tradicionais contendo tensoati-
2014 2015 2016 2017 1º. sem 2018
vos sulfatados, não possuem desempenho comparável ao destas,
Fonte: Mintel
não atendendo às expectativas dos consumidores.
Figura 2. Representação esquemática do processo de Escolha de Tensoativo Livre de Sulfato

Fácil de
Porção polar espessar?

Classe de Tensoativo
Grupo químico Irritabilidade Espuma pH
tensoativo sulfate free

Porção apolar Fácil de usar?

número de tentativas e erros nos testes de bancada e buscam a re-


Tabela 1. Grupos de tensoativos analisados
dução de tempo e o aumento de eficácia no processo (Figura 2).
Grupos químicos (INCI) Marca comercial*
1 Acyl isethionates Pureact I Grupo químico
2 Acyl methyl isethionates Iselux O processo é iniciado com o entendimento de quais grupos quí-
3 Alkyl ether carboxylates Empicol C micos de tensoativos para a produção de shampoo sulfate free
4 Acyl glycinates Pureact SLG podem ser utilizados. Portanto, o autor propõe uma lista de 16
5 Alkyl amphoacetates/amphociacetates Empigen CDR60 grupos de tensoativos que poderão ser visualizados na Tabela 1.
e 5151 Conhecer melhor os detalhes de cada tipo de tensoativo pode
6 Alpha olein sulfonates Nansa LSS também auxiliar os profissionais de marketing a explorar e criar
7 Methyl acyl taurates Pureact WS novos apelos de mercado. Por exemplo, o acyl methyl lactylates
8 Alkyl polyglucoside Pureact Gluco é um grupo de tensoativos derivados de ácido lático, oriundo
9 Betaines Empigen B de processo biotecnológico (fermentação) e de ácidos graxos
10 Sarcosinates Pureact LSR oriundos de fontes vegetais. Portanto, são tensoativos aniônicos
11 Alkyl ether sulfosuccinates Empicol SDD/O 100% naturais e biotecnológicos.
12 Acyl methyl lactylates Pureact 138 O alkyl polyglucosides e o acyl methyl lactylates são as úni-
13 Acyl glutamates cas opções de tensoativos sulfate free 100% derivados de fontes
14 Fatty acid soaps naturais, não sintéticas.
15 Sulfoacetates
16 Sultaines Porção polar do tensoativo
*marcas comerciais da Innospec Performance Chemicals Os tensoativos sulfatados apresentam um carga negativa ver-
dadeira que está associada à presença de 4 átomos de oxigênio
(elemento muito eletronegativo), que reforçam a característica
Abordagem técnica
de polaridade negativa dessa parte da molécula. Assim, deve-
De maneira geral, as abordagens técnicas mais recentes para
-se selecionar o tensoativo com porção hidrofílica mais similar
o desenvolvimento de formulações de shampoos sulfate free
possível ao grupo –O-SO3- presente nos principais tensoativos
costumam ser: (1) obviamente, a substituição do SLES por
sulfatados, SLES e SLS.
tensoativo não sulfatado; (2) a utilização de maior dosagem
Dessa forma, devem-se selecionar preferencialmente ten-
de tensoativo secundário à formulação; e (3) o uso de maior
soativos com porções polares –SO3- seguidos dos tensoativos
número de tensoativos na fórmula. Entretanto, muitas vezes,
com porções polares –COO - (carboxilato) e, por último, os
essa abordagem gera, respectivamente: (1) maior potencial de
tensoativos com porções polares sem carga negativa verdadeira
irritação causado pela formulação; (2) maiores custos; e (3) (os alkyl polyglucosides, por exemplo, que possuem uma porção
maior complexidade no desenvolvimento do produto, além de hidrofílica formada por poliaçúcares – cadeia cíclicas de carbono
maior número de etapas no processo produtivo da formulação contendo hidroxilas).
em questão. Tensoativos como acyl methyl isethionates e methyl acyl
taurates, por apresentar porções polares –SO3-, têm maior ten-
A Escolha do Tensoativo dência a possuir polaridade negativa muito próxima ao SLES,
Para fazer frente ao grande desafio técnico que as formu- por exemplo.
lações sem sulfato representam, o autor deste artigo apresenta
e propõe a seguir uma sequência de verificações que, quando Classe do tensoativo
são executadas, auxiliam na escolha do tensoativo adequado à Os melhores tensoativos para a formação de espuma rica
formulação sulfate free. Portanto, essas verificações reduzem o e estável são os tensoativos ânionicos, que possuem porção
polar com carga negativa verdadeira. Porém, deve-se aten- na rotina diária do processo de desenvolvimento de produtos,
tar ao fato de que tensoativos anfóteros possuem 2 cargas tanto na indústria química quanto na indústria cosmética. Dessa
opostas, cuja carga final (positiva ou negativa) dependerá do forma, é muito importante atentar-se ao fato de que as porções
pH do meio. A mudança da carga dessa classe de tensoativo hidrofóbicas de alguns tensoativos podem ser oriundas de
é balizada por seu ponto isoelétrico (do pH em que ocorre a fontes sintéticas não renováveis.
mudança de cargas). Alguns tensoativos do grupo dos alkyl ether carboxylates
Portanto, ao selecionar um tensoativo que possui um grupo podem possuir porção apolar derivada de fonte sintética, porém
de carga negativa verdadeira, deve-se verificar a que classe de a grande maioria dos tensoativos sem sulfatos é derivada de
tensoativo a molécula pertence. No caso de tensoativos anfóteros, fontes renováveis. O acyl methyl isethionates, por exemplo,
o pH final da formulação será determinante para as características possui mais do que 80% de carbono de origem vegetal.
de espuma, detergência, viscosidade etc.
Tensoativos como betaines e sarcosinates, dois exemplos, Agente espessante mais adequado
merecem atenção, pois tensoativos anfóteros (também não Alguns tensoativos sem sulfatos não apresentam resposta sa-
iônicos) são mais utilizados como cotensoativos, exercendo tisfatória ao incremento da viscosidade pela adição de eletró-
efeitos sinérgicos em relação ao tensoativo principal aniônico litos. Dessa maneira, é necessário adicionar modificadores de
(redução da irritabilidade do tensoativo principal, estabilidade reologia, como polímeros e derivados de celulose, para atingir
de espuma etc.). a viscosidade desejada para shampoos e sabonetes líquidos.
O methyl acyl taurates e o acyl methyl isethionates, por
Porção apolar do tensoativo exemplo, respondem facilmente à adição de eletrólitos para
A porção hidrofóbica dos tensoativos é formada por cadeias o aumento da viscosidade. É possível formular shampoos
carbônicas que têm entre 8 e 20 carbonos, geralmente. Essa com viscosidade satisfatória utilizando tensoativos anfóteros
cadeia graxa é derivada de três possíveis fontes: animal (gor- (cocoamido propil betaína – CAPB, por exemplo) em asso-
duras), vegetal (óleos) e sintética (derivados petroquímicos). ciação com acyl methyl isethionates, uma vez que tensoativos
Formulações sulfate free não precisam necessariamente con- anfotéros têm alto conteúdo de cloretos.
ter matérias-primas de origem vegetal, pois o conceito principal Os alkyl polyglucosides, especificamente o lauryl poly-
dessas formulações é justamente serem isentas de tensoativo glucoside, são sinérgicos com tensoativos aniônicos para a
sulfatado. construção de viscosidade. Além disso, foi observado que o
Entretanto, os temas associados à sustentabilidade fazem alkyl polyglucosides tem melhor resposta a eletrólitos em pH
parte das principais tendências da indústria e estão presentes menores do que 5.

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Gráfico 2. Equilíbrio tensoativo-livre e micelas, com Tabela 2. Faixa de pH estável de tensoativos sulfate
relação ao valor da CMC free para desenvolvimento de formulações

Faixa de pH
Tensoativos sulfate free
estável

5,0-9,0

Sodium lauroyl methyl isethionates


Espécies (%)

CMC
5,5-8,5

Sodium cocoyl isethionates


o
tiv
oa

as
ns

el
Te

5,5-8,5
ic
M

Sodium lauroyl sulfoacetate

Concentração
5,5-8,5

Figura 3. Representação esquemática do equilíbrio Sodium laureth sulfosuccinate


tensoativo livre e micelas

Grau de irritabilidade do tensoativo


Com a diluição do tensoativo em água, tanto na formulação quanto
no momento do banho, o tensoativo encontra-se em equilíbrio en-
tre micelas e tensoativo livre. O tensoativo livre é suficientemente
pequeno para penetrar na pele, causando irritação.
O efeito mais importante para a irritação é justamente a pre-
sença de tensoativo livre, pois micelas têm tamanhos maiores,
impedindo a sua penetração na pele e, consequentemente, a
irritação, apesar de também participar da remoção da camada
Figura 4. Comparação de volume de espuma e lipídica protetora da pele (Figura 3).
diâmetro de bolhas entre acyl methyl isethionates e Assim, dois fatores são importantes para o entendimento da
SLES. Soluções de tensoativo a 0,5% característica irritante de tensoativos:
- Solubilidade em água: tensoativos muito solúveis em água
Acyl methyl isethionates Volume Diâmetro geram maior concentração de tensoativos livres (efeito eviden-
ciado em tensoativos sulfatados).
- Concentração crítica micelar: a CMC (sigla em inglês que
é muito utilizada), indica a concentração mínima de tensoativo em
água para a formação de estruturas micelares. Quando menor for
o valor da CMC, menor será a quantidade de tensoativo livre na
formulação. Da mesma forma, quanto maior for a concentração
usada de tensoativo e quanto maior esta concentração for distante
do valor da CMC, maior será a quantidade de micelas formadas
0 min 10 min Aumento 10x (Gráfico 2).
A função primordial de shampoos e sabonetes líquidos é a
Lauril éter sulfato de Volume Diâmetro limpeza, ou seja, formula-se um sistema em que se busca a lim-
sódio (SLES) peza da superfície onde ele é aplicado, no caso, os cabelos ou a
pele, sendo a água o solvente. Portanto, no processo de lavagem, o
tensoativo proporciona uma mistura estável entre a sujeira apolar
(óleos, gorduras, ceras etc.) e a água.
O uso de tensoativos que possuem alto poder de detergência
(como o SLES e o SLS) em formulações cosméticas pode pro-
porcionar limpeza em demasia, ou seja, pode potencialmente
remover lipídeos, fosfolipídeos e outras substâncias que são
produzidas naturalmente pelas glândulas sebáceas presentes nos
0 min 10 min Aumento 10x folículos capilares. Essas substâncias têm a função de manter a
oleosidade natural da pele e dos cabelos.
Assim, considerando as características de detergência e o
valor da CMC dos tensoativos, é possível caracterizar quimica-
mente a suavidade de cada tensoativo. Vale lembrar também que
o uso de cotensoativos contribui para o aumento da suavidade
do sistema, pois micelas mistas tendem a ter CMCs menores do
que os valores individuais dos tensoativos para a formação de
micelas.
Os methyl acyl taurates são extremamente suaves e recomen-
dados para uso em formulações infantis e produtos para pele sen-
sível. Adicionalmente, são tensoativos que apresentam excelente
espuma em presença de óleos (indicado para peles acneicas ou
para formulações com alto conteúdo de óleos).

Método de incorporação do tensoativo


A seleção de tensoativo livre de sulfato não deve permanecer
em uma discussão apenas do ponto de vista dos testes de ban-
cada. A facilidade de manuseio no processo produtivo é muito
importante. Dessa forma, a seleção de tensoativos mais solúveis
em água e que não requerem aquecimento é muito relevante.
Como exemplo: acyl methyl isethionates são apresentados em
duas versões: a) líquido transparente e solúvel em água com 30%
de ativos; e b) sólido em escamas com 80% de ativos facilmente
solúveis em água.
Já os tensoativos relacionados a seguir são dois exemplos cuja
incorporação à formulação requer atenção especial:
- acyl isethionates, que possuem aspecto físico sólido, são
pouco solúveis em água e exigem aquecimento;
- methyl acyl taurates e alkyl polyglucosides, que são produtos
com aspecto físico de pasta, portanto, preferencialmente, devem
se aquecidos para homogeneizar o conteúdo de suas embalagens.

Qualidade da espuma
Dois importantes parâmetros são considerados para a qualidade
da espuma. A primeira característica é a quantidade de espuma
que é produzida pelo tensoativo. Busca-se um tensoativo sulfate
free que tenha o mesmo perfil de volume de espuma que o SLES.
O segundo parâmetro considerado e muito valorizado pelos con-
sumidores é a cremosidade da espuma, que está ligada à caracte-
rística do tensoativo de produzir bolhas de menor diâmetro. Em
ambos os casos, os acyl methyl isethionates são muito similares
ao SLES, em uma comparação em igualdade de teores de ativos.
Como já foi citado, os methyl acyl taurates possuem ótima
compatibilidade com óleos no que se refere à formação e à estabi-
lidade de espuma. Outra característica desse grupo de tensoativos
que merece destaque é a “explosão” de espuma que é observada
nos primeiros momentos de uso de shampoos contendo esses
tensoativos (Figura 4).

Faixa de pH adequado ao tensoativo


O pH final da formulação pode influenciar a estabilidade da
formulação como um todo. Formulações cosméticas podem
apresentar redução de viscosidade, menor poder de detergência,
menor formação de espuma, entre outros efeitos, caso estejam
em um valor de pH não adequado aos tensoativos contidos nela,
ao longo do tempo.
Os tensoativos têm uma faixa de pH desejável em que suas
moléculas permanecem sem alteração estrutural, não apresentan-
do hidrólises (quebra de ligações químicas em presença de água).
Na Tabela 2 foram ilustradas as estruturas químicas de quatro
tensoativos. Destaca-se a função éster das moléculas que poderão
Tabela 3. Ferramenta para tomada de decisão para a escolha de tensoativo sulfate free
Fácil de
N° Grupo químico (INCI) Porção polar Classe Porção apolar Fácil de espessar? Irritabilidade Espuma pH
usar
1 Acyl isethionates -S0 3
-
Aniônico Natural Não Moderada Não Excelente 5,5-8,5
2 Acyl methyl isethionates -S03- Aniônico Natural Sim Moderada Não Excelente 5,0-9,0
3 Alkyl ether carboxylates -COO - Aniônico Natural Não Suave Sim Moderada >5,5
4 Acyl glycinates -COO -
Aniônico Natural Não Suave Sim Excelente >6,5
Alkyl amphoacetates/
5 -COO -
Anfótero Natural Sim Moderada Sim Moderada >5,0
amphociacetates
6 Alpha olein sulfonates -S03- Aniônico Sintético Sim Severa Sim Excelente 3,0-11,0
7 Methyl acyl taurates -S0 3
-
Aniônico Natural Sim Suave Sim Moderada 3,0-11,0
8 Alkyl polyglucoside NA Não-iônico Natural Sim Suave Sim Moderada 4,5-8,5
9 Betaines -COO - Anfótero Natural Não Suave Sim Moderada >5,0
10 Sarcosinates -COO - Anfótero Natural Não Moderada Sim Moderada 4,0-10,0
11 Alkyl ether sulfosuccinates -S03- Aniônico Natural Não Moderada Sim Moderada 5,5-8,5
12 Acyl methyl lactylates -COO - Aniônico Natural Sim Suave Sim Excelente 5,0-9,0
13 Acyl glutamates -COO - Aniônico Natural Não Suave Sim Moderada 4,0-10,0
14 Fatty acid soaps -COO -
Aniônico Natural Sim Severa Não Moderada >6,0
15 Sulfoacetates -S03- Aniônico Natural Sim Moderada Não Moderada 3,0-11,0
16 Sultaines -S03- Anfótero Natural Não Moderada Sim Moderada 3,0-11,0

sofrer hidrólise caso permaneçam em pH fora da faixa desejável. Consumer Safety (SCCS) recomendam que a quantidade máxima
A comparação das estruturas do sodium lauroyl methyl ise- segura de dioxanas em produtos cosméticos deve ser de 10 ppm.
thionate e do sodium cocoyl isethionate é muito interessante. A Se esse critério fosse adotadao, a Tabela 3 demonstraria, por
adição de um grupo metila à molécula de sodium lauroyl methyl exemplo, que os alkyl ether sulfosuccinates, tensoativos etoxi-
isethionate conferiu proteção extra à função éster da molécula, lados muito utilizados em formulações suaves e infantis, não se
ampliando sua faixa de pH na qual a molécula permanece estável. enquadrariam nesse critério.
Essa adição é significativa do ponto de vista de formulação, pois
boa parte dos conservantes utilizados pelo mercado cosmético A escolha do tensoativo
são ácidos orgânicos cuja efetividade ocorre entre pH 5,0-5,8. Finalmente, pode-se concluir que, utilizando a ferramenta
Tensoativos sulfate free com maior estabilidade hidrolítica, apresentada, o tensoativo primário com excelente espuma e
portanto, são ótimas escolhas. suavidade, derivado de fonte natural e cuja viscosidade pode ser
facilmente atingida com o uso de eletrólitos, seria representado
Conclusão pelos grupos dos methyl acyl taurates (Pureact WS), acyl methyl
Depois de serem analisadas as nove etapas do processo de se- isethionates (Iselux) e acyl methyl lactylates (Pureact 138).
leção de tensoativo sulfate free, construiu-se a Tabela 3, que deve
ser utilizada como uma ferramenta para a tomada de decisão. Referências
1. Cannon AS, Warner JC. Green Chemistry: Foundations in Cosmetic
Cada um dos grupos de tensoativos foi qualitativamente classi- Sciences. Global Regulatory Issues for the Cosmetics Industry 1-16,
ficado de acordo com cada critério anteriormente apresentado. A 2009
classificação qualitativa adotada foi uma escala de cores em que 2. Daltin D. Tensoativos: química, propriedades e aplicações, 1a. ed.,
São Paulo: Blucher, 2011
o verde, o amarelo e o vermelho representam, respectivamente, 3. FDA US Food & Drug Administration. 1,4 Dioxane in Cosmetics:
os critérios: “atende o requisito”, “pode atender o requisito com a Manufacturing Byproduct. On-line. Disponível em: www.fda.gov/
ressalvas” e “dificilmente atende o requisito”. cosmetics/productsingredients/potentialcontaminants/ucm101566.
htm. Acesso em: 3/11/2018
4. GNPD. Global New Product Data Base – Mintel Group. New Laun-
Considerando novos critérios ches, 2018
A ferramenta para a escolha de tensoativo sulfate free é simples, 5. Martins L, Cardoso D. Produção de etilenoglicóis e derivados por
reações catalíticas do óxido de eteno. Química Nova 28(2):264-273,
direta e muito versátil. Sua versatilidade encontra-se no fato de 2005
poder incluir ou excluir critérios de avaliação. Além disso, a 6. Meyers D. Surfactant Science and Technology. 20a. ed., New York:
classificação de cada requisito pode ser mais detalhada (por meio VCH Publishers, 1988
7. Schramm LL et al. Surfactants and their applications. Annual
da inclusão de maior número de cores ou até da quantificação Reports on the Progress of Chemistry, Section V 99:3-48, 2003
para cada requisito).
Como exemplo, poderia ser incluído o critério EO free, ou
seja, tensoativo livre de óxido de etileno. Resumidamente, o
processo produtivo de tensoativos etoxilados gera um resíduo
denominado 1,4 dioxana, que, sabidamente, é reconhecidamente
tóxico. Produtos livres de EO, sigla em inglês para ethylene
oxide, são, consequentemente, livres de dioxanas. Estudos con-
duzidos pela European Commission Scientific Committee on

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