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ANA ROSA
2021
Copyryght © 2021 – Ana Rosa
Cheguei à corte do Vice-rei no Rio de Janeiro no ano de 1790 com meu marido.
Tivemos anos de paz e sossego e eu quase pude esquecer do que fiz à minha
irmã odiosa, mas acabei conhecendo o amor nos braços de um negro livre e
isso Antônio não conseguiu aceitar.
Mas aquele homem, João, havia dominado toda a minha lógica e razão.
Não podia ficar longe dele e não permitiria que ninguém ficasse no caminho
do nosso amor. Então fiz a única coisa que podia: tirei a vida de meu marido
com uma punhalada na nuca, no meio da madrugada, enquanto ele dormia.
Perdi acesso à corte mesmo que outro culpado tivesse sido acusado em meu
lugar. Passei a viver com João... eu o amava loucamente. Mas depois de algum
tempo passei a odiá-lo na mesma medida.
Sem Antônio para tomar conta das finanças, logo me descobri sem minha
riqueza, isso se deu no mesmo período em que vieram à tona as várias traições
de João. Eu não aceitava que mesmo depois de tudo o que fiz, ele ainda fosse
capaz de me trair…
A única forma de me manter era vender meu corpo. Passava as noites no Arco
do Teles, esperando por algum cliente que me quisesse.
Mas com o tempo fui acometida por doenças que roubavam minha saúde e
minha beleza. Quando dei por mim estava feia, amarga e meus clientes haviam
me abandonado.
Entrei em desespero.
Numa noite em que vagava perto do mar com uma garrafa de vinho de má
qualidade não mãos, vi o Feiticeiro. Ele estava de pé na beira do mar e me
chamou.
Não me importei nem um pouco com a vida dos cães e gatos de rua que
degolava. Cometi atos obscenos e indescritíveis, mas minha boa aparência não
retornou, pelo contrário, a doença estava se mostrando mais e mais agressiva.
Por fim, me contou sobre um método ainda mais perverso: eu devia me banhar
com sangue ainda morno de crianças.
Não sei se foi meu desespero, a lepra ou os dois, mas fiquei esperançosa com
a ideia de que esse feitiço funcionaria. Em nenhum momento a perversidade
do ato de matar crianças acusou minha consciência. Talvez estivesse ficando
louca, mas para mim pouco importava.
Não tinha preferência, mas as crianças pequenas e pobres eram mais fáceis
de capturar.
Deste dia em diante, todas as noites eu rondava a Santa Casa, esperando que
alguma mulher em situação desesperada entregasse uma criança aos
cuidados das freiras.
Estava fria, a água… mas entrei mesmo assim. Minhas saias molhadas
pesavam uma tonelada no mar, mas eu continuei nadando.
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12 de Fevereiro de 1825
As autoridades pedem aos pais que não descuidem de suas crianças. Ainda
não se sabe se as Bruxa está solta ou morta.
Sobre a autora:
Viciada em livros, cria histórias desde que aprendeu a escrever e divide seu tempo
entre o trabalho, a família, o Grimório Tropical e a leitura.
Site: grimoriotropical.com.br