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Índice
Declaração de honra ........................................................................................................... 4

Dedicatória ......................................................................................................................... 5

Agradecimentos.................................................................................................................. 6

Resumo .............................................................................................................................. 7

Introdução .......................................................................................................................... 8

CAPÍTULO I: VIDA, OBRAS E INFLUÊNCIAS AO PENSAMENTO DE KARL MARX


......................................................................................................................................... 10

1.1. A vida de Karl Marx (1918-1883) .......................................................................... 10

1.2. Influências ao pensamento de Karl Marx................................................................ 11

1.2.1. Influências históricas .......................................................................................... 12

1.2.2. Influências filosófico – educacionais .................................................................. 14

1.2.2.1. Friedrich Wilhelm Hegel (1770-1831) ................................................................. 15

1.2.2.2. Ludwig Feuerbach (1804-1872) ........................................................................... 15

1.3. Descrição das obras de Karl Marx .......................................................................... 15

CAPÍTULO II: FUNDAMENTAÇÃO FILOSÓFICA DO MATERIALISMO HISTORICO


DE KARL MARX ............................................................................................................ 19

2.1. Interpretação do conceito Materialismo ..................................................................... 19

2.2. Conceito de Materialismo Histórico ........................................................................... 19

2.2.1. Conceito de Materialismo Dialéctico ...................................................................... 20

2.2.2. Conceito de modo de produção ............................................................................... 21

2.3. Conceito de divisão social de trabalho e suas consequências: a propriedade privada, o


Estado, a alienação da actividade social ............................................................................ 22

2.3.1. Conceito de estrutura e superestrutura ..................................................................... 22

2.3.2. Conceito de alienação do trabalhado ....................................................................... 24

2.3.3. Conceitos de Classes sociais e estrutura social ........................................................ 25

2.4. Conceito de história e seu substrato material .............................................................. 27

2.4.1. Conceito de Estado como instrumento de opressão para classe dominante .............. 28
iii3

CAPÍTULO III: A INSTAURAÇÃO DA JUSTIÇA SOCIAL COMO FIM DA PRÉ-


HISTÓRIA ....................................................................................................................... 34

3.1. Conceito de luta de classes como motor da história ................................................ 34

3.2. Conceito a construção do socialismo para uma nova sociedade .................................. 36

CAPÍTULO IV: ANALISE CRÍTICA DA TEORIA DA RELAÇÃO ENTRE HISTÓRIA E


JUSTIÇA ......................................................................................................................... 38

4.1. Os Prós do pensamento de Karl Marx ........................................................................ 38

4.2. Friedrich Engels (1820-1895) .................................................................................... 38

4.2.1. Terry Eagleton (1943) ............................................................................................. 38

4.2.2. Os contra do pensamento de Karl Marx .................................................................. 41

4.3. Max Weber (1864-1920)............................................................................................ 42

4.3.1. Seymour Martin Lipset (1922-2006) ....................................................................... 42

Conclusão......................................................................................................................... 44

Bibliografia ...................................................................................................................... 46
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Declaração de honra
Declaro que esta monografia é resultado da minha pesquisa pessoal sob-orientação do meu
supervisor, o seu conteúdo é original e todas as fontes consultadas estão devidamente
mencionadas no texto e na bibliografia final.

Declaro ainda que este trabalho não foi apresentado em nenhuma outra instituição para
obtenção de qualquer grau académico.

Nampula, Agosto de 2018

_______________________________

(Abreu Lima De Abreu Júnior)


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Dedicatória

Aos meus filhos, Célia Lima de Abreu, Shania Lima de Abreu, Luísa Lima de
Abreu e Paulo Lima de Abreu!
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Agradecimentos
Agradeço aos meus pais: Lima de Abreu, que Deus o tenha em paz; à dona Muanis Paulo,
pelo esforço e dedicação na transmissão de valores que moldaram o meu ser, e que hoje estou
a colher os frutos; aos meus irmãos, Abreu Lima de Abreu, Cordeiro Lima de Abreu, Abdul
Lima de Abreu que me deram o apoio incondicional, aos meus colegas de trabalho e aos meus
etairoi. Os agradecimentos são extensivos de um modo especial, à minha esposa amada Céria
Francisco Raivoso assane pelas broncas que temos tido mas que continuamos firmes e
convictos pela nossa razão.

Agradeço também, a todos docentes da Universidade pedagógica (UP), delegação de


Nampula em particular o meu supervisor Ernesto Valoi pela sua forma sábia, e não queria
esquecer o meu grande amigo do Clube 5, José Faquira, pela sua forma realista de ver as
coisas como são.

De um modo geral, os agradecimentos vão para todos aqueles de uma forma directa e
indirecta deram o seu contributo e calor nesta longa caminhada infinita; e aos meus inimigos,
a final de contas contribuem para o meu crescimento.

Meu muito obrigado!


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Resumo
A presente monografia tem como tema: Materialismo Histórico em Defesa da Justiça Social segundo Karl Marx.
Com este tema, pretendemos reflectir sobre os aspectos ligados a Justiça social, visto que o materialismo
histórico consiste na tese segundo a qual não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas sim, o seu
ser social que determina a sua consciência. Onde a produção das ideias, as representações da consciência, em
primeiro lugar está directamente ligada à actividade material e às relações materiais dos homens, linguagem da
vida real. As representações e os pensamentos, bem como o intercâmbio espiritual dos homens, são emanações
directas do seu comportamento material. Assim sendo, a ideologia é uma consciência equivocada, falsa, da
realidade que expressa situações e interesses radicados nas relações materiais, de carácter económico, que os
homens agrupados em classes sociais estabelecem entre si. Não são, portanto, a ideia Absoluta, o Espírito, a
Consciência Critica, os conceitos de Liberdade e Justiça, que movem e transformam as sociedades. Os factores
dinâmicos das forças produtivas sociais devem ser buscados no desenvolvimento das forças produtivas e nas
relações que os homens são compelidos a estabelecer entre si ao empregar as forças produtivas por eles
acumuladas a fim de satisfazer suas necessidades materiais. Não o Estado, como pensava Hegel, que cria a
sociedade civil: ao contrário, é a sociedade civil que cria o Estado. Porém, a concepção materialista da história
implica a reformulação radical da perspectiva do socialismo, logo, o comunismo fundamentado na abundância,
implica o desaparecimento das classes. E isto será atingido quando a sociedade puder escrever nas suas
bandeiras: de cada um segundo suas capacidades, e cada um segundo as suas necessidades; o socialismo e o
comunismo são duas etapas, dois momentos sucessivos da história.

Palavras-chave: Comunismo, Estado, Luta de Classes, Modo de produção.


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Introdução
A obra e o pensamento de Marx não podem separar-se da sua acção, das suas lutas, das
polémicas que sustentou contra os ideólogos do seu tempo. A vida tempestuosa de Marx,
revolucionário perseguido, escorraçado da sua pátria, condenado ao exílio, permitiu-lhe
confrontar todas as ideias de uma época de profunda fermentação teórica, social e politica. Foi
assim que pôde compreender e fundir num só corpo de doutrina o materialismo francês do
século XVIII, a tradição francesa de pensamento racional e o socialismo francês do século
XIX, com a filosofia alemã no seu apogeu (hegelianismo) e a economia politica inglesa
clássica.

Portanto, o marxismo não é uma corrente de ideias exteriores à cultura moderna. Contudo,
frente a qualquer exame verdadeiramente objectivo, apresenta-se completamente diferente de
um eclectismo, de uma soma ou de um emaranhado ideológico. Cada uma das doutrinas que
aceitou foi por Marx submetidas a uma severa crítica, em função da sua experiência e das suas
meditações. Essas polémicas permitiram-lhe esclarecer e expor seu próprio pensamento.

Daí, o materialismo histórico que consiste na tese segundo a qual não é a consciência dos
homens que determina o seu ser, mas, sim, o seu ser social que determina a sua consciência.
Isso leva a especificar a relação existente entre a estrutura económica e superestrutura
ideológica.

Portanto, a produção das ideias, as representações, da consciência, em primeiro lugar, está


directamente entrelaçada à actividade material e às relações materiais dos homens, linguagem
da vida real. As representações e os pensamentos, bem como o intercâmbio espiritual dos
homens, ainda aparecem aqui como emanação directa do seu comportamento material.

Com esta abordagem, pretendemos reflectir sobre os aspectos ligados há classes sociais, luta
de classes e a justiça social, visto que, é o modo de produção através de relações materiais e
forças produtivas que cria o antagonismo de duas classes, burgueses e proletariados em outras
palavras, os exploradores e os explorados. Uma luta interminável e que uma das classes deve
desaparecer para formar a nova sociedade isto, equivale dizer que: A distribuição da riqueza é
desigual, através destas barbaridades vimos a sociedade dividida em classes.

Não obstante, Marx vai dizer que o homem relaciona-se com outros seres humanos, dando
origem às relações de produção e o conjunto dessas relações leva ao modo de produção. Esse
sistema de produção divide a sociedade em duas classes distintas: a dos proprietários e a dos
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não proprietários das ferramentas de trabalho ou dos meios de produção. Pois, para sobreviver
esta ultima, é obrigada a vender para a primeira sua única propriedade, a força de trabalho.

Esse processo gera uma desigualdade muito grande entre as classes, porém, a classe dos
proprietários, a fim de acumular capital, explora a classe dos expropriados como se fosse
parte de sua propriedade, o que caracteriza o capitalismo.

A metodologia usada para elaboração desta monografia foi a de consulta e leitura de obras
que estão na devida bibliografia. E ainda está estruturada da seguinte maneira: Primeiro
Capitulo – vai retratar a vida, obras e influências de Karl Marx, Influencias essas que são:
históricas e filosófico-educacionais, onde falaremos sobre Friedrich Hegel e Luduing
Feuerbach como maiores influentes do pensamento de Marx; segundo capítulo; pretendemos
apresentar a fundamentação filosófica do materialismo histórico de Karl Marx; terceiro
capítulo; vai abordar a instauração da justiça social como fim da pré-história e finalmente o
quarto capítulo; faremos uma análise crítica da teoria da relação entre história e justiça onde
vão suscitar algumas ideias a respeito do pensamento de Karl Marx.
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CAPÍTULO I: VIDA, OBRAS E INFLUÊNCIAS AO PENSAMENTO DE KARL


MARX

Este capítulo abordará a vida, obras e influências a Marx, influências essas que são históricas
e filosófico-educacionais, onde falaremos sobre Friedrich Hegel e Luduing Feuerbach como
maiores influentes ao pensamento de Karl Heinrich Marx.

1.1. A vida de Karl Marx (1918-1883)

Karl Heinrich Marx, Filósofo, economista, ativista, e político socialista alemão, nasceu em
Tréveros, em 15 de Maio de 1818, filho de Heinrich, advogado e de Henriette Pressburg, dona
de casa. O pai e a mãe de Marx eram de origem judaica, entretanto, em 1816 a 1817, em
virtude das leis anti-semitas em vigor na Renânia, quando teve que escolher entre sua fé a
profissão de advogado, Heinrich escolheu a profissão. Realizou seus estudos secundários em
Tréveros e, depois, foi para Bonn, a fim de estudar a lei.

Em, Bonn, Karl preferia a vida goliardesca ao estudo. Assim, seu pai tomou a decisão de fazer
com que conseguisse seus estudos na mais austera Universidade de Berlim. Desse modo, em
1836, Marx se transferiu para Berlim. Ainda no verão daquele ano, fica noivo em segredo
com Jenny Von Westphalen, a mais graciosa jovem de Treveros, moça de família aristocrática
que Karl Marx desposaria em 1843 (Jenny tinha um irmão, Fernando, que foi Ministro do
Interior da Prússia de 1850 a 1860). Em Berlim, Karl seguiu os cursos de Karl Von Savigny e
de Edurd Gans.

Tornou-se assíduo frequentador do doktor – clube círculo de jovens intelectuais hegelianos


alinhados em posições radicais, onde, entre outros, conheceu o professor de história Karl
Friedrich Koppen e o teólogo Bruno Bauer. Em 15 de Abril de 1841 laureou-se em Filosofia,
em Berlim com a tese intitulada diferença entre a filosofia da natureza de Demócrito e de
Epicuro (Cfr. REALE & ANTISERI, 1991:184).

Karl Marx cresceu num ambiente liberal e culto, e os seus estudos que fez no liceu não foram
especialmente brilhantes. Em 1834 no liceu, circulavam panfletos políticos de espírito liberal
e democrático, portanto, o jovem Marx não era estranho à redacção desses panfletos. Nessa
época a situação económica da Província onde nascera agravara-se; a miséria dos vinhateiros
da Mosela, a regressão do comércio e do artesanato, a constituição do sistema aduaneiro da
Prússia, simultaneamente com um regime burocrático, ridiculamente minucioso e opressivo,
dera grande impulso a este movimento (Cfr. LEFEBVRE, 1966:105).
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Ainda estudante Marx filiou-se no Clube dos Poetas, onde escrevia poemas e quisera
consagrar-se à literatura. Na Primavera de 1836, um violento conflito eclodiu entre estes
clubes independentes e o Korps Borussia, era uma organização aristocrática e reacionária.
Karl bateu-se em duelo com um membro do Korps e recebeu um ferimento acima do olho
esquerdo. Dai Marx envia uma carta a Lassalle para explicar o duelo. Na carta escreve: dada a
estreiteza da vida nas condições burguesas, pode acontecer que a individualidade não possa
manifestar-se senão por formas desusadas. Em 1842, aos 24 anos, Karl Marx começou a sua
vida de revolucionário. Desaparecido o pai, zanga-se com a mãe que teria morto muito mais
tarde, a pós ter pronunciado esta frase, digna de ficar célebre: Karl teria feito melhor em
juntar capital do que escrever livros sobre o capital. Apesar da violenta oposição de sua
família, apesar do futuro (ou falta de futuro em linguagem burguesa) que lhe oferecia o seu
noivo, Jenny conservou o seu amor por ele e manteve a sua promessa.

O casamento de Karl Marx e de Jenny Von Westphalen teve lugar no dia 23 de Junho de
1843, em Kreuznach. Não só o tempo do seu romance e do seu noivado, mas toda a sua vida,
foi impregnado de amor e ternura. Por uma sorte única na história, Marx encontrara numa
amiga de infância a companheira de que precisava. Jenny Marx soube acompanhar e apoiar o
marido em todas as suas lutas. Nunca a sua confiança nele enfraqueceu. No decorrer das mais
duras provas, rodeou-o de afecto, foi a confidente dos seus pensamentos, ajudou-o nas suas
pesquisas e partilhou a sua vida sem fraquezas (Cfr. LEFEBVRE, 1966:105).

1.2. Influências ao pensamento de Karl Marx

A obra e o pensamento de Karl Marx não podem separar-se da sua acção, das suas lutas, das
polémicas que sustentou os ideólogos do seu tempo. Esta acção, estas lutas, estas polémicas,
também não podem ser compreendidas separadamente dos acontecimentos e condições
históricas nas quais viveu e interveio. Para seguir o desenvolvimento do seu pensamento, para
reencontrar o seu movimento, numa palavra, para compreender a formação do marxismo,
impõe-se um processo de exposição: dos aspectos que influenciaram – a Marx apesar da
forma que ele pensou. Como afirma Lefebvre (1966:10).

Não se deve pensar que o marxismo surgiu de uma só vez, quer do


pensamento de um indivíduo de génio chamado Karl Marx, quer das
circunstâncias económicas e políticas do século XIX. A análise e a história
encontram a vida e as obras de Marx as mais complexas e múltiplas
influências, como se costuma dizer. Uma influência de ideias e correntes! Os
historiadores que – com toda a razão – estudam os antecedentes e origens
das grandes doutrinas, dedicaram já obras compactas a essas influências
(Cfr. LEFEBVRE, 1966:99-100).
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A formação do pensamento de Karl Marx foi uma confluência de vários pensamentos


clássicos do tempo, onde a sua primeira concepção filosófica não podia deixar de ser idealista.
Assimilou a ética do imperativo categórico de Kant e o princípio da actividade subjectiva de
Fichte. Aceito a Ideia hegeliana na versão que lhe davam os jovens hegelianos, isto é, os
hegelianos de oposição. Se Karl Marx devia começar sua trajectória filosófica pela Filosofia
idealista dominante, não o fez sem imprimir já neste ponto de partida características pessoas,
que se desenvolveriam através de sua vida. As características da crítica, sempre despertam e
dão impulso para a prática (Cfr. MARX, 2001:IX).

1.2.1. Influências históricas

Portanto, o pensamento de Karl Marx é também o resultado de condições históricas concretas


que se desenvolveram ao longo da história, em particular entre o final do século XVIII e
primeiras décadas do século XIX. Em meados do século XVIII veio a 1ª Revolução Industrial
(1750-1850), que por sua vez trouxe inúmeras consequências para a sociedade. Dentre elas
podemos citar algumas, tais como:

 Consolidação do modo de produção capitalista como dominante;

 Aumento da média de vida da população;

 Revolução Agrícola, e mais.

Porém, por outro lado, essa mudança repercutiu bastante na sociedade, e acabou por gerar:

 Surgimento de duas novas classes na sociedade: Burguesia e proletariado;

 Exploração do trabalho humano;

 Conflito entre operários e empresários; (Cfr. MAGELA, 2007:16).

A revolução industrial contribuiu para o crescimento ainda mais na exploração do operariado.


Houve um intenso êxodo rural; as cidades ficaram superlotadas; as pessoas viviam em
pensões sem um mínimo de higiene; as condições de trabalho nas fábricas eram péssimas; os
trabalhadores tinham de enfrentar uma jornada de trabalho de 12 horas; havia a ausência de
direitos do operário bem como de segurança no trabalho; e ainda cresceu exageradamente a
exploração das mulheres e crianças; onde o salário pago era mais baixo (Cfr. GUSMÃO,
2006:200-201).
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Segundo Magela (2007:16), o capitalismo então foi se desenvolvendo, e junto a esse


desenvolvimento, cresceu também a opressão e a exploração dos trabalhadores, onde estes
foram condenados à miséria e a um trabalho escravo nas fábricas. Tudo isso porque a
máquina havia criado por um lado riquezas, e por outro, condições de vida intoleráveis para
os trabalhadores. Não demorou para que começassem a surgir movimentos operários, como o
Ludismo, o Cartismo, as greves, a formação dos primeiros Sindicatos e as primeiras batalhas
históricas travadas pelo proletariado contra a exploração burguesa.

Foi nesse período portanto, em que o tecido social no qual se ergueu o marxismo como
corrente teórico-política é do modo de produção capitalista, isto é, um conjunto de relações de
produção e reprodução da vida material, base da sociedade burguesa moderna. Por vários
séculos, a Europa esteve mergulhada em relações sociais de produção baseadas na servidão
camponesa, no domínio da nobreza e do clero e numa economia fundada basicamente na
produção agrícola no âmbito dos feudos. No feudalismo, as famílias camponesas, presas à
gleba, produziam a riqueza material (econômico -social) a partir do trabalho servil no campo.

Na perspectiva de (PEREIRA, 2015), o capitalismo como modo de produção desenvolveu-se


de condições objectivas e subjectivas criadas no seio do sistema feudal e das suas
contradições, cujas relações sociais de produção (a propriedade da terra, o artesanato, a
economia mercantil simples de subsistência), tornavam-se cada vez mais estreitas diante do
avanço do comércio, da demanda por mercadorias, da urbanização crescente, do
desenvolvimento cultural e científico. Juntem-se aos elementos acima o processo de
acumulação de capital na Europa, nas mãos de classe de comerciantes burgueses nascentes,
por meio da exploração e a colonização e exploração de povos.

Segundo Marx na sua obra “O Capital de 1867”, “o capitalismo, não foi fruto de uma
tendência natural dos burgueses ao comércio e à acumulação, nem muito menos de um
espírito absoluto, que tudo produz e determina, mas de um conjunto de acontecimentos
históricos que ele denomina de acumulação primitiva de capital, que levou, de um lado, à
formação e concentração da riqueza nas mãos da burguesia comercial nascente e, de outro, à
expropriação dos produtores (camponeses e artesãos) direitos de suas condições e meios de
trabalho, forçando-os a integrar-se ao trabalho assalariado” (MARX Apud PEREIRA, 2015).

Para tanto, a burguesia, a fim de se tornar classe politicamente dominante, teve de levar a
frente a sua luta política contra a nobreza e o clero, que ainda se encontravam no poder do
Estado. As revoluções democrático-burguesas, em especial na Inglaterra (século XVII) e na
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França (século XVIII) abriram caminho à ascensão política da burguesia e sepultaram


definitivamente as bases do poder da antiga nobreza, influenciando movimentos em outros
países. As ideias de liberdade, igualdade e fraternidade foram erguidas contra os privilégios
políticos e econômicos da nobreza e do clero, expressando, na verdade, as novas relações de
produção capitalistas em formação, baseadas na produção de mercadorias e nas trocas
mercantis. No Manifesto Comunista, Marx e Engels expressam esse processo de avanço da
burguesia, enquanto classe econômica e politicamente dominante e, na sua base, o
desenvolvimento das relações de produção capitalistas.

Portanto, estas foram as condições históricas que contribuíram à vida e ao pensamento de


Marx, visto que a sua intelectualidade deve muita influência dos clássicos e dos seus
contemporâneos.

1.2.2. Influências filosófico – educacionais

Não se deve pensar que o marxismo surgiu de uma só vez, quer do pensamento de um
indivíduo de génio chamado Karl Marx, que das circunstâncias económicas e politicas do
seculo XIX. Como referimos nalguns trechos acima, mas também, Karl Marx conheceu e em
certo sentido, aceitou diversas ideias ou doutrinas do seu tempo que pode interpretar-se em
dois sentidos diferentes: Os adversários do marxismo; e os certos pseudo-marxistas, (falsos
marxistas).

Marx conheceu a Filosofia alemã do seu tempo e foi discípulo e continuador de Hegel
(hegeliano de esquerda); conheceu as obras do materialista Ludwig Feuerbach; sofreu a
influência dos socialistas franceses Saint-Simon, Fourier, Proudhon, e dos socialistas ingleses,
como o caso de Owen. Teve também conhecimento dos trabalhos dos economistas ingleses
Petty, Smith, Ricardo. Deste conjunto de influências teria saído uma doutrina aparentemente
nova, mas na realidade, resultante quase mecânica destes antecedentes (Cfr. LEFEBVRE,
1966:99-100).

Foi assim, que pôde compreender e fundir num só corpo de doutrina o materialismo francês
do século XVIII, a tradição francesa de pensamento racional e o socialismo francês do século
XIX, com a Filosofia alemã no seu apogeu (hegelianismo) e a economia política inglesa
“clássica” (idem:1001).
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1.2.2.1. Friedrich Wilhelm Hegel (1770-1831)

Friedrich Wilhelm Hegel nasceu em Stuttgart – Alemanha, em 27 de Agosto de 1770. Foi


considerado um simples discípulo de Schelling. Iniciou os estudos de Teologia e Filosofia em
Tübingen em 1788, em 1807 com a publicação da Fenomenologia do Espirito, começou a
construção de um sistema metafisico, que exerceu enorme influência. Deu aulas em uma
escola e em várias Universidades antes de ocupar uma cátedra em Berlim. Nesta construção
de seu sistema metafisico, revolucionou o método dialéctico no seu sentido moderno para
compreender a história como movimento. Hegel morreu em 14 de Novembro de 1831 (Cfr.
COOPER, 2002:336-337).

1.2.2.2. Ludwig Feuerbach (1804-1872)

Ludwig Feuerbach, filósofo e antropólogo alemão, é reconhecido por sua Teologia humanista
e pela influência que seu pensamento exerceu sobre Karl Marx. Inicialmente estudou Teologia
em Heidelberg, mais tarde foi para Berlim, curioso para entrar em contacto com Hegel e sua
Filosofia. Em 1830, lecionou em Erlagen e, em 1848, em Heidelberg. Feuerbach procurou
introduzir a dialéctica materialista combatendo a doutrina hegeliana, que, apesar de seu
método revolucionário, concluía-se por uma doutrina eminentemente conservadora. Assim, da
crítica à dialéctica idealista, partiu Feuerbach à crítica da religião e da essência do
cristianismo. De acordo com sua Filosofia, a religião é uma forma de alienação que projecta
os conceitos do ideal humano em um ser supremo. Mas mesmo assim, apesar de recusar o
idealismo de seu predecessor Hegel, assim como ele não conseguiu aplicar uma Filosofia à
história e à sociedade humana. Mas, de qualquer maneira, suas filosofias continham certos
requisitos que posteriormente foram reformulados por Marx, Engels e Lênin e usados
posteriormente para a formulação de uma Filosofia revolucionária (Cfr. MYNAYEV,
1967:19).

1.3. Descrição das obras de Karl Marx

Karl Marx foi um filósofo, sociólogo, economista e ativista social alemão, o seu pensamento e
a sua doutrina são prodigiosamente ricos de aspectos como veremos adiante. Segundo Henri
Lefebvre (1976:84), “é bastante difícil compreender o pensamento de Marx nas suas obras,
pelo facto de ele não ter exposto as suas descobertas num tratado geral. A maior parte das
suas obras são polémicas”, o próprio pensamento de Karl Marx formou-se através de lutas
ideológicas e politicas, sempre se definiu contra uma posição doutrinal ou politica. Cada
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passo do pensamento marxista fez-se acompanhar de uma critica e, frequentemente, de uma


autocritica, de uma critica da sua própria posição.

Carlos Sell (2001:70) afirma, que “interpretar a obra de Karl Marx é sempre uma tarefa
difícil, porque o seu pensamento era dinâmico e jamais foi sistematizado pelo autor,
permanecendo, inclusive, inacabado”. Karl Marx escreveu tantas obras, dentre elas
destacamos as seguintes:

Diferença entre as Filosofias da natureza em Demócrito e Epicuro (1972) – Esta obra


reflecte sobre a incompatibilidade entre a Filosofia e a Religião, embora tenha escrito numa
linguagem perfeitamente hegeliana e muito influenciada ainda pela Filosofia de Hegel, deixa
antecipadamente a originalidade de Marx em relação ao pensamento do seu mestre. Portanto,
aqui revela-nos a profunda acuidade crítica e o rigor intelectual com uma Filosofia inserida no
real e empenhada na destruição dos muitos que se encaminha já no sentido de uma praxis
atuante.

A tese de doutoramento de Marx Diferença Entre as Filosofias da Natureza


Em Demócrito e Epicuro, possibilitou-lhe aprofundar uma crítica ao
idealismo hegeliano, fazendo-o aprofundar-se no materialismo filosófico.
Para Lukács, isso lhe conferiu superioridade filosófica e política em relação
a outros integrantes da esquerda hegeliana (Cfr. LUKÁCS, 2007).

O 18 Brumário de Luís Bonaparte (2011) – Nesta obra historiográfica escrita em 1852, Karl
Marx examina pela perspectiva do materialismo histórico, o golpe de Estado que Luís
Bonaparte desferiu na França em 2 de dezembro de 1851. Desenvolve, com base no exemplo
francês, o estudo do papel da luta de classes como força motriz da história e evidencia o
carácter limitado e contraditório da democracia burguesa. Aprofunda a teoria do Estado,
sobretudo no que tange à doutrina da ditadura do proletariado, e demonstra que todas as
revoluções burguesas apenas assumiram o antigo aparato estatal e o aperfeiçoaram para
oprimir as classes espoliadas. Criando a base por essa observação, Karl Marx propõe, pela
primeira vez a tese de que o proletariado não deve assumir o velho aparato estatal, mas
desmantela-lo (Cfr. MARX, 2011:7-10).

A sagrada família (2011) – Escrita em 1844 e publicada em princípios de 1845, A sagrada


família foi o primeiro livro em que Marx e Engels apareceram na condição de coautores.
Trata-se de obra caracteristicamente polêmica, que assinala o rompimento com a esquerda
hegeliana. O título sarcástico identifica os irmãos Bruno, Edgar e Egbert Bauer e dá o tom do
texto. Enquanto a esquerda hegeliana depositava as esperanças de renovação da Alemanha nas
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camadas cultas, aptas a alcançar uma consciência crítica, excluindo, assim – os trabalhadores,
Marx e Engels enfatizaram a impotência da consciência crítica que não se tornasse a
consciência dos trabalhadores. Aspecto peculiar do livro reside na defesa de Proudhon, com o
qual Karl Marx mantinha amiúde encontros pessoais em Paris.

O Capital (2013) – É a principal obra sobre a ideologia proposta por Karl Marx onde explica
em como funciona a sociedade capitalista, descrevendo suas características implícitas dentro
das civilizações que a representam e como ela é organizada e fundamentada. A definição do
capitalismo proposta por Karl Marx utiliza a tese de que o “trabalhador não obtém vantagens
e subsídios necessários com o capitalismo, gerador do acúmulo de riquezas que o faz trabalhar
e ganhar menos do que deveria, além da concepção sobre o pilar fundamental do acúmulo de
riquezas nesse sistema económico” (Cfr. MARX, 2013:28).

A obra originalmente escrita na época foi dividida em quatro volumes, cada uma abordando
sobre um determinado aspecto do capitalismo: O Processo de Produção do Capital (publicado
em 1865); O Processo de Circulação do Capital (publicado em 1885); O Processo Global da
Produção Capitalista (publicado em 1894) e Teoria da mais-valia (publicado em 1905). Os
três últimos volumes foram publicados após a morte de Marx, ficando a responsabilidade da
edição das obras para Engels, seu seguidor na teoria marxista.

A ideologia alemã (2007) – Esta obra iniciada em Paris, a sua redação completa em Bruxelas,
onde Marx se viu obrigado a buscar refúgio, pois o governo de Guizot, pressionado pelas
autoridades prussianas, o expulsou da França sob acusação de actividades subversivas. O livro
não encontrou editor e só foi publicado em 1932, também na União Soviética. Na verdade, A
ideologia alemã encerra a primeira formulação da concepção histórico-sociológica que
receberia a denominação de materialismo histórico. Trata-se, pois, da obra que marca o ponto
de virada ou, na expressão de Althusser, o corte epistemológico na evolução do pensamento
dos fundadores do marxismo.

A formulação do materialismo histórico desenvolve-se no corpo da crítica às várias


manifestações ideológicas de maior consistência que disputavam, então, a consciência da
sociedade germânica, às vésperas de uma revolução democrático-burguesa. A crítica dirige-se
a um elenco que vai de Hegel a Stirner. A parte mais importante é a inicial, dedicada a
Feuerbach. O rompimento com este se dá sob o argumento do carácter abstrato de sua
antropologia filosófica.
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Segundo Marx & Engels (2007:40), “a história nada mais é do que o suceder-se de gerações
distintas, em que cada uma delas explora os materiais, os capitais e as forças de produção a
ela transmitidas pelas gerações anteriores”. Na história que se deu até aqui é sem dúvida um
facto empírico que os indivíduos singulares, com a expansão da actividade numa actividade
histórico-mundial, tornaram-se cada vez mais submetidos a um poder que lhes é estranho
(cuja opressão eles também representavam como um ardil do assim chamado espírito
universal e), um poder que se torna cada vez maior e que se revela, em última instância, como
mercado mundial.

A principal obra deste trabalho é “O 18 Brumario de Luís Bonaparte”, visto que Marx
examina pela perspectiva do materialismo histórico, o golpe de Estado, desenvolve o estudo
do papel da luta de classes como força motriz da história e evidencia o carácter limitado e
contraditório da democracia burguesa. Aprofunda a teoria do Estado, sobretudo no que tange
à doutrina do proletariado, e demonstra que todas as revoluções burguesas apenas assumiram
o antigo aparato estatal e o aperfeiçoaram para oprimir as classes espoliadas.
19

CAPÍTULO II: FUNDAMENTAÇÃO FILOSÓFICA DO MATERIALISMO


HISTORICO DE KARL MARX

Neste capítulo, vamos abordar os conceitos fundamentais do materialismo histórico que Karl
Marx constrói para sua filosofia em seus estudos da sociedade e suas estruturas.

2.1. Interpretação do conceito Materialismo

Materialismo é uma teoria que em seu sentido mais amplo, afirma que tudo o que existe é
apenas matéria ou, pelo menos, depende da matéria. “Em sua forma mais geral, afirma que
toda realidade é essencialmente material; em sua forma mais específica, que a realidade
humana o é” (Cfr. BOTTOMORE, 2013). Na tradição marxista, tem prevalecido, de modo
geral, um materialismo do tipo menos rígido, não reducionista; mas o conceito tem sido
desenvolvido de várias maneiras. As definições propostas adiante procuram estabelecer, de
início, uma certa clareza terminológica.

2.2. Conceito de Materialismo Histórico

Materialismo histórico é Expressão que designa o corpo central de doutrina da concepção


materialista da história, núcleo científico e social da teoria marxista. De acordo com a
“Introdução” que Engels escreveu em 1892 para Do socialismo utópico ao socialismo
científico, o materialismo histórico designa uma visão do desenrolar da história que procura a
causa final e a grande força motriz de todos os acontecimentos históricos importantes no
desenvolvimento econômico da sociedade, nas transformações dos modos de produção e de
troca, na consequente divisão da sociedade em classes distintas e na luta entre essas classes.

Engels sempre fez questão de reconhecer que Karl Marx fora o criador do
materialismo histórico; e encarava a concepção do materialismo histórico
como uma das duas grandes descobertas científicas de Karl Marx (a outra era
a teoria da mais-valia). Karl Marx, por sua vez, afirmava que Engels havia
chegado independentemente à concepção materialista da história. Nos termos
da própria teoria, pode-se dizer que ambos puseram em evidência as
precondições históricas e materiais para a sua formulação (Cfr.
BOTTOMORE, 2013).

Embora os estudiosos discordem quanto ao grau de continuidade de vários temas nos escritos
iniciais e nas obras posteriores de Marx, poucos negariam que a concepção materialista da
história, que Marx e Engels começaram a formular na época em que escreveram A ideologia
alemã (1845-1846) embora não o pudessem ter feito sem os seus antecedentes intelectuais
constitui aquilo que é, e que eles próprios acreditavam ser, característico de sua visão do
mundo. Rigorosamente falando, o materialismo histórico não é uma filosofia; parece melhor
20

considerá-lo antes como uma teoria empírica (ou, talvez mais exactamente, como uma
colecção de teses empíricas).

Karl Marx, ao fazer estudo da sociedade moderna e seu modo de produção material, fez fundir
das teses de materialismo dialéctico para posteriori, construir a sua doutrina, não deixando das
polémicas que se envolvia com os hegelianos e os socialistas utópicos, e muito mais.

2.2.1. Conceito de Materialismo Dialéctico

O materialismo dialéctico é a concepção do mundo do partido marxista-leninista. Chama-se


materialismo dialéctico porque a sua concepção, o seu método de estudo e de conhecimento
dos fenómenos da natureza é dialéctico, e a sua interpretação, o seu conceito, a sua teoria dos
fenómenos da natureza é materialista, por isso, materialismo dialéctico.

Nesse caso, o materialismo histórico é a aplicação das teses do materialismo dialéctico ao


estudo da vida da sociedade e dos seus fenómenos, ao estudo da sociedade e da sua história,
como dissemos a cima.

Nesse contexto, a noção de dialéctica possui uma longa histórica no pensamento filosófico,
visto que esta história começa com Heraclito, passando por Platão, Kant e outros pensadores;
até chegar a Hegel, vai sistematizar o método dialéctico no seu sentido moderno. Karl Marx
adopta o método dialéctico, mas conservará uma atitude critica diante do mesmo, como ele
mesmo declara nesta passagem famosa, escrita já no posfácio da 2ª edição do Capital, de
1873:

Meu método dialéctico, por seu fundamento, difere do método hegeliano, em


Hegel a dialéctica esta de cabeça para baixo. É necessário pô-la de cabeça
para cima, a fim de descobrir a substância racional dentro do invólucro
místico (Cfr. MARX Apud SELL, 2001:73).

Na verdade, seus estudos nasceram da prática e das necessidades políticas do movimento


socialista, ao pretender analisar a sociedade burguesa. Como dissemos apriori, Karl Marx
sofreu influências dos economistas franceses, do socialismo da Inglaterra sobretudo, pela
parte de Hegel e Feuerbach uniu o útil ao agradável (dialéctica hegeliana e materialismo
antropológico feuerbachiano) para posterior criar o seu materialismo histórico.

Segundo Henri Lefebvre (1969:25), “a dialéctica pode ser exposta como (teoria,
procedimento, ou conceito) de várias maneiras: a partir da natureza (material) – a partir da
história e a partir da (o) lógica (o)”. A primeira exposição tornou-se clássica desde que Engels
(discípulo de Schelling, filósofo da natureza, mais do que Hegel, filósofo da história) que
21

retira seus argumentos do exame das forças em conflito, das lutas e da relação entre homem e
ambiente.

Ainda diz, o materialismo claramente vincula-se, então, à presença da natureza, à descoberta


do determinismo (gravitação, energia). Continua, é possível expor a dialéctica e fundá-la
sobre a história, o materialismo histórico, assinado por Karl Marx e Friedrich Engels, se
define como sua descoberta crucial, como uma virada decisiva no conhecimento que
implicaria, assim, essa fundação da dialéctica.

Nessa ordem de ideias, o materialismo histórico procura as causas de desenvolvimento e


mudanças na sociedade humana, nos meios pelos quais os seres humanos produzem
colectivamente as necessidades da vida. As classes sociais e a relação entre elas, além das
estruturas políticas e formas de pensar de uma dada sociedade, seriam fundamentadas em sua
actividade económica.

2.2.2. Conceito de modo de produção

Quando Karl Marx escreveu que o primeiro acto histórico é, portanto, a produção da própria
matéria, é porque foi verificar que este era uma condição fundamental de toda a história, que
ainda hoje, tal como há milhares de anos, tem de ser realizado dia a dia, hora a hora, para ao
menos manter os homens vivos. Sendo satisfeitas as primeiras necessidades do homem, a
acção da satisfação e o instrumento já adquirido da satisfação, conduz a novas necessidades, e
esta produção de novas necessidades é o primeiro acto histórico.

Sendo assim, a produção da vida, tanto da própria matéria, no trabalho, como da alheia, na
produção, surge agora imediatamente como uma dupla relação: por um lado como relação
natural, por outro como relação social – social porque se entende como uma cooperação de
vários indivíduos seja em que circunstâncias for e não importa de que modo e com que fim
(Cfr. MARX & ENGELS, 1982:20-21).

Assim sendo, na sua obra (Obras escolhidas em três Tomos, de 1982) escreve: todo este
processo resulta que um determinado modo de produção, ou fase industrial, está sempre
ligado a um determinado modo da cooperação, que é ele próprio uma “força produtiva”; e que
a qualidade das forças produtivas acessíveis aos homens condiciona o estado da sociedade, e
portanto a “história da humanidade” tende a ser sempre estudada e tratada em conexão com
história da indústria e da troca, que se revela assim, logo de princípio, uma conexão
22

materialista dos homens entre si, a qual é condicionada pelas necessidades e pelo modo de
produção e tão velha como os próprios homens, uma conexão que assume sempre formas
novas e que não exista um qualquer absurdo politico ou religioso que una ainda mais os
homens (Cfr. MARX & ENGELS, 1982:20-22).

2.3. Conceito de divisão social de trabalho e suas consequências: a propriedade privada,


o Estado, a alienação da actividade social

Com a divisão do trabalho, na qual estão dadas todas estas contradições, e a qual por sua vez
assenta na divisão natural do trabalho na família e na separação da sociedade em família
individuais e opostas umas às outra, está ao mesmo tempo dada também a repartição, e
precisamente a repartição desigual, tanto quantitativa como qualitativa, do trabalho e dos seus
produtos, e portanto a propriedade, a qual já tem o seu embrião, a sua primeira forma, na
família, onde a mulher e os filhos são os escravos do homem, com a divisão do trabalho, está
dada ao mesmo tempo, a condição entre o interesse de cada um dos indivíduos ou de cada
uma das famílias e o interesse comunitário de todos os indivíduos que mantêm intercambio
um com os outros; e a verdade é que este interesse comunitário de modo nenhum existe
meramente na representação, como “universal”, mas antes de mais na realidade, como
dependência reciproca dos indivíduos entre os quais o trabalho está dividido (Cfr. MARX &
ENGELS, 1982:24).

Portanto, é precisamente por esta contradição do interesse particular e do interesse


comunitário que o interesse comunitário assume uma forma autónoma como Estado, separado
dos interesses reais dos indivíduos e do todo, e ao mesmo tempo, como comunidade ilusória,
mas sempre sobre a base real dos laços existentes em todos e especialmente, como mais tarde
desenvolveremos, das classes desde logo condicionadas pela divisão do trabalho e que se
diferenciam em todas essas massas de homens e das quais uma domina todas as outras.

2.3.1. Conceito de estrutura e superestrutura

O conjunto das forças produtivas e das relações sociais de produção de uma sociedade forma
sua base ou estrutura que, por sua vez, é o fundamento sobre o qual se constituem as
instituições políticas e sociais. A estrutura social e o Estado resultam constantemente do
processo vital de indivíduos determinados; mas não resultam daquilo que esses indivíduos
aparentam perante si mesmos ou perante outros e sim daquilo que são na realidade, isto é, tal
como trabalham e produzem materialmente. Segundo a concepção materialista da história, na
23

produção da vida os homens geram também outra espécie de produtos que não têm forma
material: as ideologias políticas, concepções religiosas, códigos moraís e estéticos, sistemas
legais, de ensino, de comunicação, o conhecimento filosófico e científico, representações
colectivas de sentimentos, ilusões, modos de pensar e concepções de vida diversos e
plasmados de um modo peculiar. A classe inteira os cria e os plasma derivando-os de suas
bases materiais e das relações sociais correspondentes. Esta é a superestrutura ou supra-
estrutura.

Marx e Engels sintetizam a articulação entre esses dois níveis na seguinte crítica ao idealismo:

São os homens que produzem as suas representações, as suas ideias, mas os


homens reais, atuantes, e tais como foram condicionados por um determinado
desenvolvimento das suas forças produtivas e do modo de relações que lhe
corresponde, incluindo até as formas mais amplas que estas possam tomar, a
consciência, nunca pode ser mais que o Ser consciente, e o Ser dos homens é
o seu processo da vida real. Assim sendo, a moral, a religião, a metafísica e
qualquer outra ideologia, tal como as formas de consciência que lhes
correspondem, perdem imediatamente toda aparência de autonomia. Não têm
história, não têm desenvolvimento; serão, antes, os homens que,
desenvolvendo a sua produção material e as suas relações materiais,
transformam, com esta realidade que lhes é própria, o seu pensamento e os
produtos deste pensamento. Não é a consciência que determina a vida, mas
sim a vida que determina a consciência (Cfr. MARX apud QUINTANEIRO,
2002).

Assim sendo, a explicação das formas jurídicas, políticas, espirituais e de consciência


encontra-se na base econômica e material da sociedade, no modo como os homens estão
organizados no processo produtivo. No caso das sociedades onde se dá a apropriação privada
dos meios para produzir, esta base relaciona-se directamente à forma adoptada por suas
instituições. Esta base material é, portanto, expressa no conceito de modo de produção que
serve para caracterizar distintas etapas da história humana. Na medida em que uma
diversidade de factores contribui para a configuração das maneiras como se produz em
diferentes sociedades e épocas, de suas estruturas de classes, assim como de suas leis,
religiões, regimes políticos e outros elementos superestruturais, o conceito de modo de
produção é abstrato o suficiente para contemplar as formas particulares que se apresentam
historicamente.

Karl Marx faz menção ou registo aos modos de produção comunista primitiva, antigo, feudal
e capitalista nas sociedades ocidentais, ao asiático que compreende as sociedades orientais e
as pré-colombianas da América do Sul, e finalmente ao comunista. Com isso, não pretendia
dizer que o progresso social encaminhava-se linearmente e numa direcção única: aquela
trilhada pelas sociedades ocidentais mais avançadas. O êxito da Revolução socialista na
24

Rússia czarista em 1917 contribuiu para mostrar que nem todas as sociedades tinham que
passar pelas mesmas etapas.

Portanto, os conceitos-chave para a compreensão do materialismo histórico foram sintetizados


por Karl Marx ao narrar sua própria trajectória intelectual:

O meu primeiro trabalho, que empreendi para esclarecer as dúvidas que me


assaltavam, foi uma revisão crítica da Filosofia do Direito de Hegel, Nas
minhas pesquisas cheguei à conclusão de que as relações jurídicas - assim
como as formas de Estado - não podem ser compreendidas por si mesmas,
nem pela dita evolução geral do espírito humano, inserindo-se, pelo contrário,
nas condições materiais de existência de que Hegel compreende o conjunto
pela designação de “sociedade civil”; por seu lado, a anatomia da sociedade
civil deve ser procurada na economia política. A conclusão geral a que
cheguei e que, uma vez adquirida, serviu de fio condutor dos meus estudos
pode formular-se resumidamente assim: na produção social de sua existência,
os homens estabelecem relações determinadas, necessárias, independentes da
sua vontade, relações de produção que correspondem a um determinado grau
de desenvolvimento das forças produtivas materiais. O conjunto dessas
relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base
concreta sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual
correspondem determinadas formas de consciência social (Cfr. MARX apud
QUINTANEIRO, 2002).

Porém, o modo de produção da vida material condiciona o desenvolvimento da vida social,


política e intelectual em geral. Karl Marx disse que, “não é a consciência dos homens que
determina o seu ser; é o seu ser social que determina a sua consciência” como dissemos
acima. Em certo estádio de desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade
entram em contradição com as relações de produção existentes, ou, o que é a sua expressão
jurídica, com as relações de propriedade no seio das quais tinham-se movido até então. De
formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas relações transformam-se no seu
entrave. Surge, então, uma época de revolução social. A transformação da base econômica
altera, mais ou menos rapidamente, toda a imensa superestrutura (Idem).

2.3.2. Conceito de alienação do trabalhado

O conceito de alienação deriva da filosofia de Hegel, que surge em Karl Marx como processo
em que o ser humano se afasta de sua real natureza, torna-se estranho a si mesmo na medida
em que já não controla sua actividade principal (trabalho), pois o que produz adquire
existência independente de seu poder. Assim, a industrialização, a propriedade privada, e o
salário alienam o trabalhador tanto dos meios de produção – ferramentas, matéria, terra,
maquina, que se tornaram propriedade do capitalista, quanto do fruto de seu trabalho. Assim
Karl Marx continua, a alienação do homem tem também, uma dimensão de natureza política,
oriunda do liberalismo, que criou a ideia falsa da imparcialidade do Estado, que na realidade,
25

na sociedade de classes representa apenas a classe dominante e age de acordo com seus
interesses.

Segundo Marx, os economistas de seu tempo não reconhecem a historicidade dos fenômenos
que se manifestam na sociedade capitalista, por isso suas teorias são comparáveis às dos
teólogos, para os quais toda religião estranha é pura invenção humana, enquanto a deles
próprios é uma emanação de Deus. Ele questiona a perspectiva para a qual as relações
burguesas de produção são naturais, estão de acordo com as leis da natureza, como se fossem
“independentes da influência do tempo”, sendo por isso consideradas como leis eternas que
devem reger sempre a sociedade (Cfr. MARX Apud QUINTANEIRO, 2002).

Nessa perspectiva, a divisão de trabalho é igualmente responsável pela alienação do homem,


pois, é parcial e reflecte necessariamente o pensamento de grupo em que os produtos de sua
actividade económica, politica, social e espiritual passam a existir como realidade
independente, chegando a dominar e a oprimir o homem. Uma vez alienado, o homem só
pode recuperar sua condição humana “pela crítica radical ao sistema económico à política e à
filosofia que excluíram da participação efectiva da vida social” (Cfr, MARX Apud ROSA,
2012:339-340).

2.3.3. Conceitos de Classes sociais e estrutura social

Karl Marx não deixou uma teoria sistematizada sobre as classes sociais, embora este seja um
tema obrigatório para que suas interpretações a respeito das desigualdades sociais, da
exploração, do Estado e da revolução sejam compreendidas. Tal teoria acabou por ser
constituída a partir dos elementos disseminados em seus distintos trabalhos. O ponto de
partida é que a produção é “a actividade vital do trabalhador, a manifestação de sua própria
vida”, e através dela o homem se humaniza. No processo de produção os homens estabelecem
entre si determinadas relações sociais através das quais extraem da natureza o que necessitam.
Desde aí, Karl Marx reflecte sobre o significado - para o indivíduo e a sociedade - da
apropriação por não-produtores (pessoas, empresas ou o Estado) de uma parcela do que é
produzido socialmente, e desenvolve sua concepção de classe, exploração, opressão e
alienação. Enquanto as sociedades estiveram limitadas por uma capacidade produtiva exígua,
a sobrevivência de seus membros só era garantida por meio de uma luta constante para obter
da natureza o indispensável.
26

A organização social era simples e existia apenas uma divisão natural do trabalho segundo a
idade, a força física e o gênero. Ou seja, “numa época em que duas mãos não podem produzir
mais do que o que uma boca consome, não existem bases econômicas” que possibilitem que
uns vivam do trabalho de outros, seja na forma de trabalho escravo ou de qualquer outro
modo de exploração. É o surgimento de um excedente da produção que permite a divisão
social do trabalho, assim como a apropriação das condições de produção por parte de alguns
membros da comunidade os quais passam, então, a estabelecer algum tipo de direito sobre o
produto ou sobre os próprios trabalhadores. Vê-se, portanto, que a existência das classes
sociais vincula-se a circunstâncias históricas específicas, quais sejam, aquelas em que a
criação de um excedente possibilita a apropriação privada das condições de produção (Cfr.
MARX Apud QUINTANEIRO, 2002).

Pós, a renda não é um factor independente da produção: é, antes, uma expressão da parcela
maior ou menor do produto a que um grupo de indivíduos pode ter direito em decorrência de
sua posição na estrutura de classes. A configuração básica de classes nos termos expostos
acima expressa-se, de maneira simplificada, num modelo dicotômico: de um lado, os
proprietários ou possuidores dos meios de produção, de outro, os que não os possuem.
Historicamente, essa polaridade apresenta-se de diferentes maneiras conforme as relações
sociais e econômicas de cada formação social.

Karl Marx acredita que a tendência do modo capitalista de produção é separar cada vez mais o
trabalho e os meios de produção, concentrando e transformando estes últimos em capital e
aquele em trabalho assalariado e, com isso, eliminar as demais divisões intermediárias das
classes. Não obstante, as sociedades comportam também critérios e modos de apropriação e
de estabelecimento de privilégios que geram ou mantêm outras divisões e classes além
daquelas cujas relações são as que, em definitivo, modelam a produção e a formação
socioeconômica. O estabelecimento de novas relações sociais de produção com a organização
jurídica e política correspondente e, com elas, de novas classes, quase nunca representa uma
complecta extinção dos modos de produção anteriores, cujos traços às vezes só gradualmente
vão desaparecendo (MARX Apud QUINTANEIRO, 2002).

Depois dessa analogia vesse que o desenvolvimento do modo de produção capitalista tomou
rumos imprevisíveis para um analista situado, como Karl Marx, em meados do século XIX. A
organização econômica e política se ancorou cada vez mais firmemente em níveis
internacionais e, no interior de cada sociedade, esses processos adquiriram feições muito
27

singulares, referidas à diversidade de elementos que conformaram suas experiências


históricas. A crítica feita pelo Karl Marx, à propriedade privada dos meios de produção da
vida humana dirige-se, antes de tudo, às suas consequências: a exploração da classe de
produtores não-possuidores por parte de uma classe de proprietários, a limitação à liberdade e
às potencialidades dos primeiros e a desumanização de que ambos são vítimas. Mas o
domínio dos possuidores dos meios de produção não se restringe à esfera produtiva: a classe
que detém o poder material numa dada sociedade é também a potência política e espiritual
dominante.

Os indivíduos que constituem a classe dominante possuem, entre outras


coisas, uma consciência, e é em consequência disso que pensam; na medida
em que dominam enquanto classe e determinam uma época histórica em toda
sua extensão, é lógico que esses indivíduos dominem em todos os sentidos,
que tenham, entre outras, uma posição dominante como seres pensantes,
como produtores de ideias, que regulamentem a produção e a distribuição dos
pensamentos de sua época; as suas ideias são, portanto, as ideias dominantes
de sua época (Cfr, MARX & ENGELS, 1976:56).

2.4. Conceito de história e seu substrato material

Marx e Engels, escrevem na sua obra a Ideologia Alemã de (2001:XXIV), que “o ponto de
partida da história não pode ser a ideia, nem qualquer conceito”. Não se devia fazer da
história, como ocorre com Hegel, o autodesenvolvimento do conceito. Sendo assim, tampouco
seria o conceito de homem, com que começava Feuerbach, ao configurar a essência imutável
do homem como abstração inerente ao individuo. Ao individuo natural, o qual unicamente
enquanto género, enquanto universalidade interna, se liga de maneira também puramente
natural aos demais indivíduos humanos.

Portanto, na sua sexta tese sobre Feuerbach, contrapôs Karl Marx, a esta concepção a
afirmação de que a essência do homem é o conjunto das relações sociais. A conformação
corpórea natural é condição necessária do ser homem. Mas não é condição suficiente, a
humanização do ser biológico especifico só se dá dentro da sociedade e pela sociedade. A
premissa de que parte a ciência positiva da história são os indivíduos humanos reais, sua
acção e condições reais de vida. A premissa de toda é a existência de indivíduos humanos
viventes, neste facto concrecto se funda o materialismo histórico (Idem: XXIV).

Pois, importa referir que, o que distingue os indivíduos humanos é que produzem seus meios
de vida, condicionados por sua organização corpórea e associados em agrupamentos. Os
indivíduos humanos são tais como manifestam sua vida, daí, o que são coincide com sua
produção, tanto com o que produzem quanto com o modo como produzem. O que os
28

indivíduos são depende, portanto, das condições materiais de sua produção. Para que os
homens consigam fazer história, é absolutamente necessário, em primeiro lugar, que se
encontrem em condições de poder viver; de poder comer, beber, vestir-se, alojar-se, e mais.
Daí que, em cada momento dado, os homens utilizam as forças produtivas de que dispõem e
organizam formas de intercâmbio correspondentes. E a conjugação da produção material com
a forma correspondente de intercâmbio, constitui o modo de produção. Este se identifica com
o que, na época, a literatura política chamava de sociedade civil. Ou seja, a esfera das
necessidades materiais dos indivíduos, a esfera em que os indivíduos cuidam dos interesses
particulares. Por conseguinte o reino das relações económicas, em que a sociedade civil é a
base de toda história (Cfr. MARX & ENGELS, 2001:XXV).

A história é, em primeiro lugar, a história da sociedade civil, não a história do Estado. Visto
que as formas de intercâmbio a principiam, se apresentam como condições da produção
material. Mais tarde, converte-se em travas desta produção, em que a forma de intercâmbio
existente é substituída por outra nova, de acordo com as forças produtivas desenvolvidas. Em
cada fase, as condições de intercâmbio corresponde ao desenvolvimento simultâneo das
forças produtivas. Logo, a história se apresenta, assim, como sucessão de formas de
intercâmbio e de modos de produção. Estava aí delineada já a lei da correspondência
necessária entre as forças produtivas e as relações de produção, axial na concepção do
materialismo histórico.

2.4.1. Conceito de Estado como instrumento de opressão para classe dominante

Nos anos iniciais da produção intelectual de Karl Marx (1843-1845), sua obra se pauta a partir
da crítica direcionada à denominada dialéctica de Hegel. Além disso, seu foco direcionava-se
também à análise do Capitalismo e a sua consequente problematização, enquanto participava
de movimentos que efervesciam a luta política operaria na Europa. Graças à visão de
Feuerbach sobre a alienação, Karl Marx, concebe que a criação do Estado é responsável pela
alienação política, concluindo que isso permitiu a separação entre a burocracia (governo) e a
sociedade civil (governados). O Jovem Marx entendia que a superação da alienação politica
passaria necessariamente pela destruição do Estado.

Portanto, para compreendermos a origem do Estado, recorremos a obra de Friedrich Engels, A


origem da família, da propriedade privada e do Estado, na qual o autor faz um resgate de
diferentes sociedades em distintos períodos históricos para subsidiar a discussão da
procedência do Estado. A partir dessa obra constatamos que o surgimento do Estado remonta
29

das antigas gens, das uniões gentílicas, que se tratavam de uma organização simples a qual
estava adequada às condições sociais que a engendravam. Engels diz que as gens
representavam “um agrupamento espontâneo, capaz de dirimir todos os conflitos que possam
nascer no seio da sociedade a que corresponde”. (Cfr. ENGELS, 1975:178).

As sociedades gentílicas, portanto, caracterizavam-se por um regime comunitário, no qual se


produzia o necessário para ser consumido e não havia espaço para a dominação e a servidão.
De acordo com Marx e Engels (2009:26), “Esta corresponde a fase não desenvolvida da
produção em que um povo se alimenta da caça e da pesca, da criação de gado ou, quando
muito, da agricultura”. O desenvolvimento do comércio nesta sociedade estimulou a divisão
social do trabalho, que até então estava limitada “a um prolongamento da divisão natural do
trabalho existente na família”. A divisão do trabalho em dominados e dominadores ampliou a
riqueza individual destes últimos já que expropriavam dos primeiros a produção de seu
trabalho. Cada vez mais a sociedade estava dividida: de um lado os exploradores, que
usurpavam toda a riqueza material produzida pelos explorados, que, do outro lado,
empobreciam ao produzir o excedente. Esse antagonismo já não cabia no regime gentílico, no
qual, como já foi mencionado acima, não possuía dominação e servidão. Destarte, apenas um
tipo de sociedade poderia comportá-lo e intensificá-lo, inclusive para sua própria
sobrevivência: esta caracterizara-se, eminentemente, pela contradição entre as classes. (Cfr.
MARX & ENGELS, 2009:27).

Com a palavra de Engels (1975:190):

Acabava de surgir, no entanto, uma sociedade que, por força das condições
econômicas gerais de sua existência, tivera que se dividir em homens livres e
escravos, em exploradores ricos e explorados pobres; uma sociedade em que
os referidos antagonismos não só não podiam ser conciliados como ainda
tinha que ser levados a seus limites extremos. Uma sociedade desse gênero
não podia subsistir senão em meio a uma luta aberta e incessante das classes
entre si, ou sob o domínio de um terceiro poder que, situado aparentemente
por cima das classes em luta, suprimisse os conflitos abertos destas e só
permitisse a luta de classes no campo econômico, numa forma dita legal. O
regime gentílico já estava caduco. Foi destruído pela divisão do trabalho que
dividiu a sociedade em classes, e substituído pelo Estado.

O Estado emerge de dentro da sociedade em um determinado estágio de desenvolvimento


econômico que intensificava as contradições entre as classes. De acordo com Lenin (1986:9),
“O Estado aparece onde e na medida em que os antagonismos de classes não podem
30

objectivamente ser conciliados, colocando por terra a concepção vulgarizada do Estado 1


enquanto conciliador das classes colidentes”. Trata-se, portanto, de um produto da sociedade,
quando esta chega a um determinado grau de desenvolvimento, de um poder que vai atenuar
os conflitos e mantê-lo dentro dos limites da ordem. Este poder, nascido da sociedade, mas
posto acima dela se distanciando cada vez mais, é o Estado”. Para conter esses antagonismos
o Estado utiliza-se da instituição de uma força pública personificada na polícia e no exército.
Ambos representam um aparelho coercivo de controlo das lutas de classes (Cfr. ENGELS,
1975:191-92).

Lenin vai dizer que o Estado representa “um órgão de dominação de classe, um órgão de
submissão de uma classe por outra”, e que usa desse papel para amortecer “a coalizão das
classes” (LENIN, 1986:10). As palavras de Engels reforçam essa constatação de Lenin:

Como o Estado nasceu da necessidade de conter o antagonismo das classes, e


como, ao mesmo tempo, nasceu em meio ao conflito delas, é, por regra geral,
o Estado da classe mais poderosa, da classe economicamente dominante,
classe que, por intermédio dele, se converte também em classe politicamente
dominante e adquire novos meios para a repressão e exploração da classe
oprimida. Assim, o Estado antigo foi, sobretudo, o Estado dos senhores de
escravos para manter os escravos subjugados; o Estado feudal foi o órgão de
que se valeu a nobreza para manter a sujeição dos servos e camponeses
dependentes; e o moderno Estado representativo é o instrumento de que se
serve o capital para explorar o trabalho assalariado (ENGELS, 1975:193).

O Estado desde o seu surgimento dá indícios de reprodução dos ideais da classe dominante.
Ao conter, reprimir e reproduzir a classe dominada, o Estado imprimi-lhe a condição de
eterna escrava da produção do excedente, sem posses e sem acesso a riqueza material que ela
mesma produz. Suas ações atribuem-lhe a alcunha de Estado burguês, pois além de ser um
defensor dos privilégios da classe burguesa, ele é também um empecilho ao pleno
desenvolvimento da classe trabalhadora.

De acordo com Marx Apud Tonet (2010:59), o “Estado e a organização da sociedade não são,
do ponto de vista político, duas coisas diferentes. O Estado é o ordenamento da sociedade”, e
por isso não se considera o responsável pelos males sociais que a assolam. Segundo Marx
(1999:84-5), o “poder estatal centralizado, com os seus órgãos onipotentes: o exército
permanente, a polícia, a burocracia, o clero e a magistratura – órgãos criados segundo o plano
de divisão sistemática e hierárquica do trabalho – procede dos tempos da monarquia absoluta”

1
Estado: conceito de importância fundamental no pensamento marxista, que considera o Estado como a
instituição que, acima de todas as outras, tem como função assegurar e conservar a dominação e a exploração de
classe. A concepção marxista classista de Estado está expressa na famosa formulação de Marx e Engels no
Manifesto comunista: “O executivo do Estado moderno nada mas é do que um comitê para a admistração dos
assuntos comuns de toda a burguesia” (BOTTOMORE, 2013).
31

e serviu à nascente sociedade burguesa como uma arma poderosa em suas lutas contra o
feudalismo.

Entendemos com isso que, a instauração do poder do Estado tornara-se necessário para a
representação dos interesses das “classes possuidoras”. Dessa forma, à medida que se
desenvolvia o comércio se “aprofundavam o antagonismo de classe entre capital e o
trabalho”. A consequência disso, no âmbito do poder do Estado moderno, é que este “foi
adquirindo cada vez mais o carácter de poder nacional do capital sobre o trabalho, de força
pública organizada para a escravização social, de máquina do despotismo de classe”, e mesmo
com todas as tentativas de supressão do mesmo a partir das “lutas de classes”, ele “revela-se
com traços cada vez mais nítidos o seu carácter puramente repressivo” (Cfr. MARX, 1999:85-
6).

No Manifesto do partido comunista (1998:9), Marx e Engels, escreveram que as lutas de


classes sempre estiveram presentes em todas as sociedades, visto que o antagonismo entre as
mesmas é uma realidade comum. Há sempre “opressor e oprimido”, e o embate destes
culmina em “uma transformação revolucionária ou com a ruína das classes em disputa”.
Exemplo disso foi o surgimento da sociedade burguesa, a qual se ergueu sobre a sociedade
feudal, intensificou os antagonismos desta com a segregação de mais classes, com “novas
condições de opressão, novas formas de luta no lugar das antigas”. Mas o que é característico
dessa sociedade é o confronto directo entre duas classes – dominantes e dominados: a classe
burguesa e a classe proletária, as quais protagonizam um longo processo de luta de classes, no
qual a primeira está sempre impondo a sua ideologia e o seu modo de vida, enquanto a
segunda, buscam superar essa correlação de forças e construir uma sociedade das massas.

A sociedade burguesa foi se constituindo com o desenvolvimento do comércio, que por sua
vez intensificou o crescimento da indústria com a superação da manufatura, a introdução da
maquinaria e a divisão do trabalho capitalista. A acumulação de riquezas proveniente daí
culminou na formação da moderna burguesia e com tamanho poder em mãos esta conquistou
a sua “autoridade política”. Segundo os autores, “O poder executivo do Estado moderno não
passa de um comitê para gerenciar os assuntos comuns de toda a burguesia” (Cfr. MARX &
ENGELS, 1998:12).

Para Marx e Engels, “o Estado adquiriu uma existência particular a par, e fora, da sociedade
civil”, e, atrelado aos interesses da classe dominante, “ele nada mas é do que a forma de
32

organização que os burgueses se dão, tanto externa quanto internamente, para a garantia
mútua da sua particularidade e dos seus interesses” (Cfr. MARX & ENGELS, 2009:111).

Segundo Tonet & Nascimento (2009:26), Marx vê na presença do Estado a intensificação da


exploração entre os homens, da opressão e submissão entre as classes, visto que, os autores
continuam: “ele é uma categoria cuja existência está, inextricavelmente, articulada com a
sociedade de classes”. Em seguida os autores complementam: “É porque a sociedade se
encontra dividida em classes antagônicas que se faz necessária a existência do poder político”
(MARX Apud TONET & NASCIMENTO, 2009: 27). Deste modo, uma sociedade onde
inexistam classes sociais não necessitará de poder político, mas apenas da potência que
possibilite a sua autoadministração. A isso Marx chama de administração das contas em
contraposição à administração dos homens, típica das sociedades de classes.

Dessa forma, é impossível para o Estado, nascido das relações de produção, voltar-se contra
elas e alterá-las significativamente, pois ele necessita do antagonismo imposto pela
propriedade privada para sobreviver. O Estado é, assim como “a ideologia, a religião, a
ciência”, um meio utilizado pelo capital para reproduzir a sua ordem, mas ele por si só não
consegue modificar a sua essência, somente a revolução proletária alcançará este feito. Para
estes autores, o Estado é “expressão da alienação, da barbaridade humana”, e mesmo regido
pelos trabalhadores não deixaria de expressar os ditames do capital, pois “Sua natureza é
sempre de uma força de dominação do homem sobre o homem, em consequência, uma
expressão da desumanização” (Cfr. TONET & NASCIMENTO, 2009:27-8).

Marx e Engels (1998:43) deixam claro que, é a “propriedade privada o cerne de toda a
contradição entre as classes, da exploração do homem pelo homem”. A burguesia utiliza-se do
seu poder político para intensificar a contradição entre capital e trabalho, tendo em vista que
dissemina sua ideologia, a qual é absorvida pelo proletariado e reflectida em produção de
riquezas e na maior escravização do mesmo. Esta realidade só terá um fim com a superação
da propriedade privada pelos proletários, pois apenas esta classe detém esse poder
revolucionário por ser a maior prejudicada pelo ideal capitalista de produção e consumo.

Para Tonet, “o Estado é, essencialmente, uma expressão e um instrumento de reprodução dos


interesses das classes dominantes, portanto, um instrumento de opressão de classe”. Imbuído
deste papel, o Estado não possui papel revolucionário, ou seja, “é impotente para alterar a
sociedade civil”, já que sua função é reproduzir a contradição desta (Cfr. TONET, 2010:22).
33

Assim sendo, a teoria marxiana fala de supressão do Estado, não simplesmente de passá-lo às
mãos do proletariado, mas sim de sua total superação. Esta superação se dará destruindo a
base do antagonismo da sociedade civil, as classes sociais, e assim o Estado definharia. E esse
papel é, como dissemos acima, exercido pela classe trabalhadora, a qual atingirá a
emancipação humana a partir do processo revolucionário. Constatamos essa premissa ao
analisarmos que o Estado moderno não será capaz de superação das contrações entre as
classes, já que ele representa apenas os interesses de uma delas. Portanto, essa superação
sugere a tomada dos meios de produção pela classe trabalhadora e a instauração de uma forma
de sociabilidade na qual não prevaleça a exploração entre os homens.
34

CAPÍTULO III: A INSTAURAÇÃO DA JUSTIÇA SOCIAL COMO FIM DA PRÉ-


HISTÓRIA
Este capítulo vai abordar conceitos possíveis para uma sociedade justiça para todos, onde a
luta de classes é o motor da história.

3.1. Conceito de luta de classes como motor da história

Pretendendo caracterizar não apenas uma visão económica da história, mas também uma
visão histórica da economia, Karl Marx, procura explicar a evolução das relações económicas
nas sociedades humanas ao longo do processo histórico, onde há uma permanente dialéctica
das forças entre poderosos e fracos, opressores e oprimidos, onde a história da humanidade
seria constituída por uma permanente luta de classes, como deixa bem claro a primeira frase
do capítulo do Manuscrito Comunista: “ A história de toda sociedade passada é a história da
luta de classes” (Cfr. MARX & ENGELS, 1975:26).

O Manifesto comunista inicia-se com a afirmativa, segundo os autores: de que as classes


sociais sempre se enfrentaram e “mantiveram uma luta constante, velada umas vezes e noutras
francas e aberta; luta que terminou sempre com a transformação revolucionária de toda a
sociedade ou pelo colapso das classes em luta”. Portanto, a história das sociedades cuja
estrutura produtiva baseia-se na apropriação privada dos meios de produção pode ser descrita
como a história das lutas de classes. Essa expressão, antes de significar uma situação de
confronto explícito, que de facto pode ocorrer em certas circunstâncias históricas, expressa a
existência de contradições numa estrutura classista, o antagonismo de interesses que
caracteriza necessariamente uma relação entre classes, devido ao carácter dialéctico da
realidade (Idem:26).

Dado que as classes dominantes sustentam-se na exploração do trabalho daqueles que não são
proprietários nem possuidores dos meios de produção, assim como em diversas formas de
opressão social, política, intelectual, religiosa e mais, a relação entre elas não pode ser outra
senão conflictiva, ainda que apenas potencialmente.

Para o materialismo histórico, “a luta de classes relaciona-se directamente à


mudança social, à superação dialéctica das contradições existentes. É por
meio da luta de classes que as principais transformações estruturais são
impulsionadas, por isso ela é dita o ‘motor da história’. A classe explorada
constitui-se assim no mais potente agente da mudança” (Cfr. MARX &
ENGELS, 1975:27).

Para fins analíticos, Karl Marx, distingue conceitualmente as classes em si, conjunto dos
membros de uma sociedade que são identificados por compartilhar determinadas condições
35

objectivas, ou a mesma situação no que se refere à propriedade dos meios de produção, das
classes para si, classes que se organizam politicamente para a defesa consciente de seus
interesses, cuja identidade é construída também do ponto de vista subjectivo. Essa distinção
tornou-se clássica pela referência que Karl Marx fez, num texto muito conhecido, aos
camponeses pequenos proprietários da França. Estes são apresentados como uma massa de
famílias pobres que, dado seu modo de produzir, eram auto-suficientes e viviam isolados.

Nesse contesto, a consciência de classe conduz, na sociedade capitalista, à formação de


associações políticas (sindicatos, partidos) que buscam a união solidária entre os membros da
classe oprimida com vistas à defesa de seus interesses e ao combate aos opressores. Por isso é
que a coalizão persegue sempre uma dupla finalidade: acabar com a concorrência entre os
operários para poder fazer uma concorrência geral aos capitalistas. Se a primeira finalidade da
resistência se reduzia à defesa do salário, depois, à medida que os capitalistas se associam,
movidos, por sua vez, pela ideia de repressão, as coalizões, a princípio isoladas, formam
grupos, e a defesa das associações por parte dos trabalhadores frente ao capital, sempre unido,
acaba sendo para eles mais necessário que a defesa do salário.

Segundo Marx, As condições econômicas transformam primeiro a massa da população do


país em trabalhadores, e dai segue a dominação do capital que cria para esta massa uma
situação comum, interesses comuns. Assim, pois, esta massa já é uma classe com respeito ao
capital, mas ainda não é uma classe para si, logo, na luta esta massa se une, se constitui como
classe para si. Um exemplo histórico do papel revolucionário exercido por uma classe social
foi dado pela burguesia durante as revoluções ocidentais no início da Idade Moderna. Durante
aquele processo, ela representava uma nova força produtiva, datada de possibilidades
gigantescas de transformação nas relações sociais (Cfr. MARX & ENGELS 1975:48).

Karl Marx rejeita portanto, uma interpretação subjectiva de “classe” para adoptar critérios
objectivos para a constituição de classe, como a do acesso a recursos. Engels, em Princípios
do Comunismo, de 1847, definiria o proletariado como a classe social que vive inteiramente
da venda de seu trabalho, que não recebe nenhum lucro de qualquer tipo de capital, e cuja
existência depende da demanda de trabalho; o proletariado é a classe dos trabalhadores do
século XIX (Cfr. MARX & ENGELS 1975:49).

Karl Marx alegaria não lhe caber o mérito de haver descoberto a existência das classes, nem a
luta das classes entre si, pois historiadores e economistas burgueses já tinham descrito o
36

desenvolvimento histórico dessa luta de classes, e haviam mostrado sua anatomia econômica.
Marx acrescentaria, no entanto:

O que fiz de novo foi: 1°) demonstrar que a existência das classes só está
ligada a fases de determinado desenvolvimento histórico da produção, 2°)
que a luta das classes conduz necessariamente à ditadura do proletariado, e
3°) que essa ditadura constitui apenas a transição para a abolição de todas as
classes e para uma sociedade sem classes. (carta a Joseph Weydemeyer, em 5
de março de 1852).

Segundo Marx Apud Rosa (2012:341), a “desigualdade social cria uma relação de exploração
da classe capitalista, detentora do lucro, sobre a do proletariado assalariado”. Tal exploração
tem sua raiz na propriedade privada, que obriga o trabalhador, para sobreviver, a vender sua
força de trabalho ao empresário capitalista, que se apossa do produto do trabalho. Nessas
condições, há uma contradição fundamental entre os assalariados e os capitalistas. A relação
conflituosa, inconciliável e antagônica entre essas duas classes se reflectem no interesse do
capitalista em aumentar seu lucro, pela redução do salário, ou aumento da jornada de trabalho
do assalariado; e no do proletariado, de reduzir ou eliminar essa exploração. Por ser causa
desse conflito de interesses, somente com a eliminação da propriedade privada dos meios de
produção será possível a criação de uma sociedade igualitária, logo, sem classes sociais.

3.2. Conceito a construção do socialismo para uma nova sociedade

O centro das preocupações políticas de Marx estava voltado a superação da ordem social
capitalista. Ele afirmava que “somente a classe operaria, pelo seu papel chave no capitalismo,
tinha as forças e as condições para a revolução que derrubaria a burguesia e começaria uma
nova etapa da humanidade: a sociedade comunista” (Cfr. MARX Apud SELL, 2001:89).

No entanto, para que classe operária se tornasse uma classe revolucionaria (a classe que traz
em suas mãos), ela deveria tomar “consciência dos seus interesses de classe”. Por esta razão,
o papel da teoria era fundamental para Marx, era necessário mostrar ao operariado as
condições objectivas de construção do socialismo. Todavia, engana-se quem pensa encontrar
em Marx uma manual de receitas para a construção do socialismo. Como bom cientista, Marx
sabia que conhecimento não era profecia, e que cabia a ele apenas indicar as possibilidades
objectivas para a construção de uma nova sociedade.

Porém, no Manifesto do Partido Comunista (1997:43), Marx procura superar alguns


preconceitos com relação ao comunismo e afirma que “o que caracteriza o comunismo não é a
abolição da propriedade privada em geral, mas a abolição da propriedade burguesa, com suas
37

classes e seus antagonismos de classe, surge uma associação na qual o livre desenvolvimento
de cada um é a condição para o livre desenvolvimento para todos”. Nesta passagem, Marx
deixa bem claro que uma das características essenciais da futura sociedade comunista seria a
abolição das classes sociais.

Com o fim da divisão da sociedade em classes, Marx afirmava que o Estado também deveria
ser destruído. Afinal, o Estado é um instrumento da luta de classes, e sua existência não faria
sentido em uma sociedade sem classes. A abolição do Estado, portanto, seria a segunda
condição essencial do comunismo. Mas antes de chegar a este estágio, Marx sabia que o
proletariado precisava do Estado para derrubar a burguesia. Por isso, entre o capitalismo e o
comunismo, ele afirmava que era necessário um momento de transição, que Marx chamou de
socialismo. Neste período, a burguesia seria eliminada e as bases do comunismo seriam
implantadas (Cfr. MARX Apud SELL, 2001:90).

Já na Ideologia alemã, um texto de 1846, Marx e Engels advertem que “a passagem ao


comunismo não poderia ocorrer em países atrasados”. Segundo eles, apenas a base material
muito mais desenvolvida dos países capitalistas avançados seria adequada para a superação do
capital (Cfr. MARX Apud. LESSA & TONET, 2011:102).

A forma de trabalho que funda o comunismo é o trabalho associado; a associação dos


produtores livres, uma forma de trabalho na qual todas as pessoas participam segundo as suas
possibilidades e capacidades e, por isso, todas têm, segundo as suas necessidades, acesso ao
que é produzido (Cfr. MARX 2004:75).

O comunismo 2 é a articulação do reino da necessidade com o reino da liberdade. Por reino da


necessidade ele entende a esfera do trabalho, e essa nova forma de sociabilidade implicará
uma mudança essencial da relação da humanidade com o processo histórico em geral.
Mudança tão essencial, afirmando, que todo o período de carência (das sociedades primitivas
ao capitalismo) não passa de “pré-história” da humanidade e que somente com o comunismo
terá começado a “história” propriamente dita. Só então os homens serão, conscientemente,
senhores do seu destino.

2
Segundo dicionário básico de filosofia de Japiassú e Marcondes (2001), Comunismo é todo regime político (ou
teoria política) fundado na colocação comum dos bens ou que absorve os indivíduos na coletividade. Na teoria
marxista, o comunismo. Sinônimo de marxismo-leninismo. Tanto pode designar a doutrina revolucionária que
visa à emancipação cio proletário pela apropriação coletiva elos meios de produção quanto o regime político
econômico de tipo coletivista no qual a ditadura do proletariado se estabelece pela destruição total da burguesia,
pela abolição das classes sociais e pelo desenvolvimento das forças de produção.
38

CAPÍTULO IV: ANALISE CRÍTICA DA TEORIA DA RELAÇÃO ENTRE


HISTÓRIA E JUSTIÇA

Neste capítulo, pretendemos fazer um debate crítico de maneira abrangente e diversificada,


buscando para o efeito pensadores a favor e contra o pensamento de Karl Marx em torno da
sua teoria.

4.1. Os Prós do pensamento de Karl Marx


Neste subtítulo apresentamos ideias convergentes ao pensamento de Marx, portanto,
trouxemos Friedrich Engels e Terry Eagleton que posteriori apresentamos:

4.2. Friedrich Engels (1820-1895)

Friedrich Engels foi durante quarenta anos amigo e colaborador de Karl Marx. Juntamente
com ele escreveu A sagrada família, e o Manifesto do partido comunista. Foi ele quem cuidou
da publicação póstuma de várias obras de Karl Marx, entre os quais os volumes II e III de O
Capital. Em 1845, escreveu A situação da classe operaria na Inglaterra (livro no qual descreve
o crescimento, o desenvolvimento e os efeitos da revolução industrial na Inglaterra).
Interpretou a dialéctica à natureza, segundo ele, “a dialéctica é a forma de pensamento mais
importante para a ciência natural moderna, porque só ela apresenta a analogia e, com isso, os
métodos para compreender os processos de desenvolvimento que se verificam na natureza, os
nexos gerais e as passagens de um campo de pesquisa para outro” (Cfr, ENGELS Apud.
REALI ANTISERI, 1991:204).

Ainda sustenta que todo o desenvolvimento da ciência confirma as leis da dialéctica,


reafirmando que ela é processo muito simples, que se realiza por toda parte. A dialéctica
portanto está em acção por toda parte e continuamente, é lei de desenvolvimento
extremamente geral da natureza, da história e do pensamento. Nada mais é do que a ciência
das leis gerais do movimento e do desenvolvimento da natureza, da sociedade e do
pensamento.

4.2.1. Terry Eagleton (1943)


É um filósofo e crítico literário britânico que nasceu em 22 de Fevereiro de 1943, tem 75
anos, identificado com o marxismo. Como escreve Eagleton na sua obra “Marx estava certo”,
“marxismo é uma forma de determinismo 3. Ele vê homens e mulheres como simples

3
Determinismo é normalmente entendido como a tese de que, para tudo o que acontece, há condições tais que
nada diferente poderia ter ocorrido (Cfr. BOTTOMORE, 2013). Assim, impressionado pelos espetaculares êxitos
39

instrumentos da história, o que os despoja da sua liberdade e individualidade” (2012), Marx


acreditava em certas leis férreas da história, as quais se desenvolvem com força inexorável e
as quais nenhuma acção humana é capaz de resistir. O feudalismo estava fadado a dar à luz o
capitalismo, e o capitalismo inevitavelmente cederá lugar ao socialismo. Como tal, a teoria da
história de Marx não passa de uma versão secular da Providencia ou do Destino. É ofensiva à
liberdade e à dignidade humana, assim como os Estados marxistas (Cfr. EAGLETON, 2012).
Marx acreditava numa sociedade cooperativa livre de exploração gerida pelos próprios
produtores e defende a tese de que só seria atingível por meios revolucionários.

Assim, seja o que for que Marx pensasse, a afirmação de que “toda história tem sido a história
da luta de classes” não significa que tudo que aconteceu é uma questão de luta de classes, mas
sim, que a luta de classes é o mais fundamental para a história humana, porque dá forma a
muitíssimos acontecimentos, instituições e linhas de pensamento que à primeira vista, passam
a impressão de isentos, dela, além de ter um papel decisivo na turbulência transição de uma
época da história para outra. Com história, Marx não quer dizer “tudo que já ocorreu”, mas
uma trajectória específica que lhe é subjacente, ele usa “ história” no sentido do curso
significativo de acontecimentos, não como sinônimo para o todo da existência humana até
hoje.

A questão para Marx não é sonhar com um futuro ideal, mas sonhar as contradições no
presente que impedem a ocorrência de um futuro melhor. Uma vez atingida essa meta, não
haverá mais necessidade de gente como ele. Em A guerra Civil na França, Marx escreve que
“os operários revolucionários não têm ideias a realizar excepto a libertar os elementos da nova
sociedade dos quais a velha sociedade burguesa em ruinas está prenha” (Cfr. MARX Apud,
EAGLETON, 2012).

Continua o autor, a esperança para um futuro melhor não pode ser apenas um desejoso, não
seria optimo… para que seja mais do que uma fantasia vã, um futuro radicalmente diferente
não pode ser tao somente desejável, mas também viável, e para ser viável, precisa estar
ancorado nas realidades do presente. Não pode simplesmente ser despejado no presente, vindo
de algum espaço sideral político. É preciso haver um meio de escanear ou radiografar o
presente que mostra o futuro como um potencial dentro dele, do contrário, apenas se

astronômicos da física newtoniana, Laplace (1951) afirmou que, dado apenas o conhecimento do estado
mecânico total do universo em qualquer momento do tempo, nada “seria incerto, e o futuro, como o passado,
estaria presente aos nossos olhos”. Em sua influente forma filosófica articulada por Hume, no seu tratado sobre a
natureza humana (1739-1740).
40

conseguirá fazer com que o povo deseje infrutiferamente, para Freud isso é adoecer de
neurose. Para Marx o que governa a história é a natureza humana, que:

a) Está em um estado de chocante degradação; e


b) É absolutamente inalterável.

A maior loucura com efeito, crueldade é tentar homens com ideias que lhes são
completamente inalcançáveis. O socialismo, ao contrário representa em certo sentido uma
ruptura decisiva com o presente. A história precisa ser rompida e refeita, não porque os
socialistas arbitrariamente preferem a revolução à reforma, sendo bestas sedentas de sangue
surdos à voz da moderação, mas devido à gravidade da doença que precisa ser curada. E Marx
reluta em dignificar tudo que aconteceu até agora como história, para ele, “ tudo que
conhecemos até hoje é pré-história” (EAGLETON, 2012).

O único acto verdadeiramente histórico seria abandonar essa narrativa sóbria em troca da
história propriamente dita. Se fatiarmos a história passada em qualquer ponto e examinarmos
um corte transversal, saberemos, antes mesmo de chegar a ver algo sobre o que
encontraremos. Descobriremos, por exemplo:

a) Que a grande maioria de homens e mulheres nesse período está levando vidas em
grande parte infrutíferas em benefício de uma elite governante;
b) Que o estado político, seja qual for sua forma, está preparado para usar a violência de
tempo em tempos a fim de manter tal situação; e
c) Que um pocado do mito, da cultura e do pensamento desse período fornece algum tipo
de legitimidade a essa situação. Provavelmente descobrirão algum tipo de resistência a
tal injustiça entre os explorados.

Uma vez removidos esses entraves ao florescimento humano, porém, é bem mais difícil dizer
o que há-de acontecer, porque homens e mulheres serão então, muito mais livres para se
comportar como lhes convier, dentro dos limites da sua responsabilidade uns com os outros.
Para Marx, “o socialismo é o ponto no qual começamos colectivamente a determinar o nosso
destino. Ele é a democracia assumida com plena seriedade, em vez de uma democracia (como
na maioria de vezes) uma farsa política” (Cfr. MARX Apud, EAGLETON, 2012).

Continua, o capitalismo deu à luz poderes e possibilidades extraordinários, aos quais ao


mesmo tempo, cria entraves, e é por isso que Marx pode ser esperançoso sem virar um
defensor veemente do progresso e brutalmente realista sem ser cínico ou terrorista. É
41

caracterista da visão trágica encarar o pior sem receio, mas superá-lo por meio do próprio acto
de assim agir. Marx, como vimos, é, sob certos aspectos, um pensador trágico, o que não
significa chamá-lo de pessimista. O marxismo não oferece promessa alguma de perfeição
humana, sequer promete abolir o trabalho pesado. Marx aparentemente crê que algum volume
de trabalho desagradável continuaria a ser essencial mesmo em condições de abastança. A
maldição de Adão permanecerá activa mesmo no reino da abundância.

A promessa do marxismo é sim, sanar as contradições que actualmente impedem a história


propriamente dita de acontecer, com toda a sua liberdade e diversidade. Os valores do
marxismo, porém, não são apenas materiais, para Marx, o comunismo significa o fim da
escassez e do maior trabalho opressivo, não o fim da história como muitos pretendem. A
liberdade e o lazer que isso garantia a homens e mulheres, porém, poderá então fornecer o
contexto para seu pleno desabrochar espiritual. O materialismo não é quem nega o espiritual,
mas quem nos recorda de que a realização espiritual requer das determinadas condições
materiais. Tais condições não garantem dessa realização, mas esta não pode ser alcançada sem
aquelas condições materiais (Cfr. EAGLETON, 2012).

Marx tinha em mente ao declarar no Manifesto Comunista que o “conjunto da história sempre
foi uma história de luta de classes” (Cfr. MARX Apud, EAGLETON, 2012), e mesmo em
condições de abundância, haveria muitas coisas para fazer com que nos sentíssemos ansiosos,
agressivos e possessivos. Nessa medida, é razoável afirmar que uma sociedade comunista
mostraria uma tendência bem maior para produzir seres humanos melhores do que é possível
produzir no momento actual. No entanto, esses seres humanos continuariam falíveis,
inclinados ao conflito e, às vezes, brutais e malévolas.

Como materialista, ele estava alerta à natureza complexa, recalcitrante e inacabada da


realidade e um mundo assim é incompatível com a visão de perfeição. Não é possível ter uma
ordem social na qual todos sejam iguais. A questão de que “Socialismo nos tornaria, todos
iguais” carece de fundamento. Marx não pretendia isso. Erra um inimigo figadal da
uniformidade, associava a noção de igualdade com o que ele via como a igualdade abstrata da
democracia classe média, na qual nossa igualdade formal como eleitores e cidadãos serve para
encobrir desigualdades reais de riqueza e de classe (Cfr. EAGLETON, 2012).

4.2.2. Os contra do pensamento de Karl Marx


Neste subtítulo apresentamos algumas ideias que divergem ao pensamento de Marx e
trouxemos Max Weber e Seymour Martin Lipset.
42

4.3. Max Weber (1864-1920)


Max Veber nasceu em Erfurt, Turíngia, Alemanha, no dia 21 de abril de 1864. Formou-se em
Direito e doutorou-se em Economia. Foi nomeado professor de economia da Universidade de
Heidelberg. Entre 1900 e 1918, ficou afastado do magistério em consequência de um colapso
nervoso. No período que ficou afastado, colaborou em diversos jornais alemães e realizou
diversas pesquisas. Desenvolveu importantes trabalhos na Sociologia, foi considerado um dos
fundadores da Sociologia Moderna, ao lado de Conte, Marx e Durkheim. Sua grade obra
chama-se Economia e Sociedade, onde traça um quadro do poder e da política, ou seja, das
relações de dominação. Defendia a tese de que a forma de legitimação de um poder é decisiva
para se compreender que tipo de poder é aquele.

A crítica básica de Weber ao materialismo histórico é a de que ele constitui apenas uma das
perspectivas possíveis da história baseadas em uma determinada orientação do valor; outras
perspectivas são igualmente possíveis. Weber ilustrou esse ponto de vista mostrando o papel
que as ideias religiosas (a ética protestante) poderiam ter desempenhado no desenvolvimento
do capitalismo, embora tenha deixado claro que não pretendia substituir uma interpretação
econômica unilateral por uma interpretação espiritualista igualmente unilateral (Cfr, WEBER
Apud BOTTOMORE, 2013). Em seus minuciosos estudos, Weber (1921) fez ressalvas com
respeito à concepção marxista da importância fundamental das classes e da luta de classes,
chamando a atenção para o papel dos grupos de status, questionou a concepção marxista do
Estado e aproximou-se dos teóricos das elites em seu modo de conceber o poder político, ao
mesmo tempo em que enfatizava particularmente o papel independente do Estado nacional.
Atribuiu também particular importância ao crescimento da burocracia e baseou parcialmente
sua crítica ao socialismo marxista na afirmação de que o “movimento socialista tinha maiores
probabilidades de produzir uma ditadura do funcionário do que uma ditadura do proletariado”
(Cfr. WEBER Apud BOTTOMORE, 2013).
As críticas mais recentes da teoria marxista têm incidido basicamente sobre o problema do
Estado e da política. Muitos críticos, partindo de uma perspectiva democrática pluralista (por
exemplo, Lipset 1960).

4.3.1. Seymour Martin Lipset (1922-2006)


Foi um sociólogo, cientista político, professor universitário estadunidense, filho de
imigrantes judeus russos, residiu em bairros pobres de Nova Iorque, graduou-se no City
College de Nova Iorque, em 1943, e concluiu seu doutorado, PhD, na Universidade de
Columbia, Nova Iorque, em 1949. Na juventude, sua origem operária, sua nacionalidade
43

russa, e a influência universitária o levaram a aderir ao marxismo, sendo um socialista ativo,


na vertente anti-stalinista, trotskista, e, posteriormente, a se aprofundar nas especificidades da
sociedade americana. Lipset procurou mostrar que a teoria política marxista apresenta um
quadro falso dos sistemas políticos ocidentais: “não há uma classe dominante capaz de impor
sua vontade ao Estado e transformá-lo em seu instrumento” (Cfr. LIPSET Apud.
BOTTOMORE, 2013), de qualquer modo, a natureza dos sistemas políticos ocidentais, com a
competição política e eleitoral que tais sistemas tomaram possível, impede o Estado de
colocar em prática, por um período mais longo de tempo, políticas indevidamente favoráveis a
qualquer classe ou grupo.
De uma perspectiva diferente, os críticos também argumentaram que a noção de “autonomia
relativa do Estado” não vai bastante longe e que os marxistas não levam na devida conta o
fato de que o Estado, situado num contexto internacional e competindo com outros Estados,
tem preocupações específicas, acima e além dos interesses de todas as classes e grupos da
sociedade.
44

Conclusão
O Materialismo Histórico de Karl Marx, na sua formulação, desenvolve-se no corpo da crítica
às várias manifestações ideológicas de maior consistência que disputavam, então, a
consciência da sociedade germânica, às vésperas de uma revolução democrático-burguesa,
onde para Feuerbach, o homem é um ser genérico natural, supra-histórico e não ser social
determinado pela história das relações sociais por ele próprio criadas. Daí o carácter
contemplativo do materialismo feuerbachiano, quando o proletariado carecia de ideias que o
levassem à pratica revolucionária da luta de classes. Uma síntese dessa argumentação
encontra-se nas Teses sobre Feuerbach, uma das teses Marx diz que a filosofia se limitara a
interpretar o mundo de varias maneiras, quando era preciso transformá-lo.

Assim sendo, a ideologia é, assim uma consciência equivocada, falsa, da realidade. Desde
logo, porque os ideólogos acreditam que as ideias modelam a vida material, concreta, dos
homens, quando se dá ao contrário: de maneira mistificada, fantasmagórica, enviesada, as
ideologias expressam situações e interesses radicados nas relações materiais, de carácter
económico, que os homens agrupados em classes sociais, estabelecem entre si. Não são,
portanto, a ideia Absoluta, o Espírito, a Consciência Critica, os conceitos de Liberdade e
Justiça, que movem e transformam as sociedades.

Os factores dinâmicos das forças produtivas sociais devem ser buscados no desenvolvimento
das forças produtivas e nas relações que os homens são compelidos a estabelecer entre si ao
empregar as forças produtivas por eles acumuladas a fim de satisfazer suas necessidades
materiais. Não o Estado, como pensava Hegel, que cria a sociedade civil: ao contrário, é a
sociedade civil que cria o Estado. Porém, a concepção materialista da história implica a
reformulação radical da perspectiva do socialismo, logo, o comunismo fundamentado na
abundância, implica o desaparecimento das classes. Será atingido quando a sociedade puder
escrever nas suas bandeiras: de cada um segundo suas capacidades, e cada um segundo as
suas necessidades; o socialismo e o comunismo são duas etapas, dois momentos sucessivos da
história. Isto quer dizer que, a tese central do pensamento de Marx, como vimos, é de que
somos os artífices de nossa própria história. As riquezas e as misérias são únicas e
exclusivamente fruto das ações humanas. A responsabilidade pelo nosso destino está
inteiramente em nossas mãos. Essa tese central tem um único pressuposto: os homens, para se
reproduzirem, têm que transformar a natureza, e o modo social de fazê-lo é o trabalho. Ao
trabalharem, como vimos, desencadeiam um constante desenvolvimento tanto da objetividade
quanto da subjetividade, dando origem a sociedades e a indivíduos cada vez mais complexos.
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A reprodução social é este processo pelo qual os actos singulares se sintetizam em tendências
históricas que desembocaram na atual sociedade capitalista. Nesse contexto, as necessidades
humanas são subordinadas à reprodução do capital. A lógica desumana da reprodução
capitalista, tanto na sua dimensão global quanto na sua dimensão mais individual, torna-se a
própria dinâmica da vida social. O desenvolvimento da sociedade, por isso, se converte na
intensificação das alienações, das desumanidades socialmente produzidas.

Por isso, afirma Marx, na sociedade burguesa, a liberdade não pode ter outro significado
senão a liberdade do capital. Ao submeter a humanidade às alienações capitalistas, a
sociedade burguesa destrói qualquer possibilidade do livre e pleno desenvolvimento humano.
Esta é a razão que leva Marx a afirmar que, por mais aperfeiçoada que seja a democracia
burguesa, por mais livre que ela seja, será sempre a expressão política da alienada submissão
da humanidade ao capital, dos trabalhadores aos burgueses, e dos homens às mercadorias. O
“reino da liberdade” só pode vir com a superação do capital e da sociedade burguesa. Só por
essa via será possível colocar em primeiro lugar o que é primordial: as necessidades humanas.

Ao libertá-las do jugo do capital, tornar-se-á evidente o absurdo de se promover a miséria dos


trabalhadores para se conseguir a estabilidade e o desenvolvimento econômico; tornar-se-á
patente a barbaridade que significa produzir desemprego, fome e marginalização social para
que o desenvolvimento das forças produtivas possa continuar. O “reino da liberdade”,
segundo Marx, nada mais é do que o atendimento das verdadeiras e reais necessidades
humanas, postas pelo desenvolvimento histórico-social.
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