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*O Concílio de Laodicéia*

Tornou-se costume, a apresentação de falsos ensinos sobre o Concílio de Laodicéia, visando


tirar-lhe toda autoridade legislativa para a igreja romana. O intuito é evidente: enfraquecer
nossa argumentação baseada em um dos cânones votados por aquele sínodo da igreja
apostatada. Veremos, no entanto, como também essa investida não atinge os objetivos, e falha
completamente.

Quem lê nossa literatura percebe que, de fato, costumamos citar o Concílio de Laodicéia como
outro forte sustentáculo da implantação da observância do falso dia de repouso. Essa
assembléia eclesiástica, cuja data mais admissível é 364 d.C., depois de alguma discussão
sobre a disparidade do dia de guarda, e motivada em parte pela vigência do edito
constantiniano, estabeleceu no Cânon 29:
"Os cristãos não devem judaizar e descansar no sábado, mas sim trabalhar neste dia;
devem honrar o dia do Senhor e descansar, se for possível, como cristãos. Se, entretanto,
forem encontrados judaizando, sejam excomungados por Cristo." - Hefele, History of the
Councils of the Church, vol. II, livro 6, sec. 93, pág. 318.
Aí está, com a maior fidelidade possível, a transcrição do Cânon 29, legislado sobre o dia de
guarda. Os cristãos fiéis observavam o sábado. Contudo a apostasia gradual já se manifestava
com certa ascendência nos meios eclesiásticos, tendo tomado vigoroso impulso com o célebre
edito do imperador Constantino em 321, além de outras leis dominicais promulgadas por ele
nos anos seguintes. Contudo, o sábado continuava sendo observado. Eis alguns depoimentos:
"O sábado foi religiosamente observado na Igreja do Oriente, durante mais de trezentos anos
depois da paixão do Salvador." - E. Brerwood (professor do Gresham College de Londres),
Learned Treatise of the Sabbath, pág. 77.

Outro historiador sincero, criterioso e imparcial, afirma: "Retrocedendo mesmo até o quinto
século, foi contínua a observância do sábado judaico na igreja cristã, mas com rigor e
solenidade gradualmente decrescentes, até ser de todo abolida." - Lyman Coleman, Ancient
Christianity Exemplified, cap. 26, seção 2.

Mais forte se nos afigura ainda o depoimento do historiador Sócrates, que escreveu em
meados do quinto século. Diz ele: "Quase todas as igrejas do mundo celebram os sagrados
mistérios no sábado de cada semana; não obstante os cristãos de Alexandria e de Roma, em
vista de alguma antiga tradição, recusarem-se a fazê-lo." - Eclesiastical History, livro V, cap. 22.

Sozomen, outro historiador do mesmo período, escreveu: "O povo de Constantinopla e de


outras cidades, congregam-se tanto no sábado como no dia imediato; costume esse que nunca
é observado em Roma." - Eclesiastical History, livro VII, cap. 19.

Estas citações provam que o sábado era observado pelos fiéis, naquele tempo, mas a igreja de
Roma e as de sua órbita de influência já começaram a implantar o domingo. O "festival da
ressurreição", sem nenhum caráter de dia de guarda, tivera grande incremento com a
imposição oficial pelo edito de Constantino. O resultado foi a confusão, a guarda de ambos os
dias por muito tempo. Pois bem, é um ambiente assim que o Concílio de Laodicéia vota o
Cânon 29. Nesse contexto histórico é que se vê a apostasia ganhando terreno, e melhor se
percebe o sentido desse voto.

Ninguém pode negar que esse cânon foi estabelecido, e salta à vista que se trata de uma lei
eclesiástica impondo a guarda do domingo. Se a observância dominical era, na ocasião, ponto
pacífico, fato estabelecido, coisa indiscutível - como querem alguns - então por que o Concílio
de Laodicéia cogitou deste assunto em suas sessões? Por que legislou a respeito de um ponto
líquido e certo?

O fato inegável é que o conclave traçou diretrizes a respeito do dia de guarda. É vão, inútil o
esforço com o objetivo de minimizar a autoridade desse concílio, alegando que se realizara no
Oriente e não em Roma, que a cidade de Laodicéia era grega e não romana, que a igreja de
Roma não esteve presente nele, que era concílio local, sem amplitude, que só havia 33 bispos
e outras arengas.

Tudo isso, no entanto, em nada, absolutamente em nada, enfraquece a tese adventista. Não
destrói o fato de um concílio católico, ou melhor, um concílio da igreja chamada cristã mas
praticamente em plena integração da apostasia, ter legislado solenemente a respeito do dia de
guarda.

Mas perguntamos: Para que invocar o sábado, se ele fora cancelado na cruz e ninguém se
lembrava mais dele?

Repetimos que essas alegações são de todo improcedentes. Analisemo-las. O local da


instalação do concílio nada significa contra a autoridade, eis que os primeiros concílios, e
concílios gerais, ecumênicos e importantes da igreja romana realizaram-se no Oriente. Por
exemplo:

O primeiro concílio geral realizou-se em Nicéia (Ásia Menor) no ano 325 d.C., e na mesma
cidade o segundo em 787 d.C.
Em Constantinopla (Turquia) houve nada menos que quatro concílios, sendo o primeiro em 381
d.C., o segundo em 553 d.C., o terceiro em 681d.C. e o quarto em 889 d.C.
Em Calcedônia (Ásia Menor) reuniu-se o concílio de 551 d.C.
Excetuando-se o Concílio de Éfeso em 431 d.C., só a partir de 1123 d.C. os concílios romanos
tiveram lugar em cidades européias. E mais ainda: em Roma propriamente dita só se
realizaram os cinco concílios de Trento, e o do Vaticano em 1870. O fato de a maioria desses
sínodos se terem realizados fora de Roma não lhes enfraquece a autoridade, por isso que a
tese é insustentável.
A afirmação de que era concílio local, sem amplitude, revela ignorância dos fatos, pois essa
assembléia foi totalmente confirmada pelo concílio geral de Calcedônia, sendo aí aceitos,
ratificados e oficializados todas as suas decisões e cânones, inclusive o Cânon 29, o cânon
que ordena a guarda do domingo. À vista deste fato, o Concílio de Laodicéia pode ser
considerado geral. Tem o mesmo peso de autoridade.

A História e os fatos desmentem as afirmações levianas, pois o que interessa saber é se as


medidas ali tomadas ficaram circunscritas a Laodicéia apenas, ou tornaram-se diretrizes para
toda a cristandade de então. Isto é fundamental. O Cânon 29 do Concílio de Laodicéia, que
veda o trabalho no domingo, tornou-se diretriz para a igreja romana, e é neste ponto
indesmentível que baseamos nossa tese.

Mais ainda. Este concílio teve autoridade de estabelecer o cânone dos livros sagrados da
Escritura, excluindo, como excluiu, os livros apócrifos. Essa medida também foi de aplicação
universal. Nessa ocasião o livro do Apocalipse não foi aceito, porém foi ele finalmente incluído
no cânon no Novo Testamento por outro concílio local, realizado também fora dos domínios
romanos: o Concílio de Cartago (África) no ano 397 d.C.

Notemos bem: graças a esses dois concílios locais, realizados fora de Roma, e mesmo com
pequena representação da igreja romana, é que os nossos acusadores possuem hoje suas
Bíblias como está, com o cânone em ordem, com todos os livros inspirados, e excluídos os
deuterocanônicos. Por isso não se deve minimizar a autoridade do Concílio de Laodicéia, eis
que suas decisões tornaram-se leis e regras da igreja. Verdade é que, na contra-reforma, a
igreja romana voltou a incluir no cânon os apócrifos, com o fim evidente de combater o
protestantismo.

Diz Eduardo Carlos Pereira: "O Concílio de Laodicéia (364), confirmado pelo Concílio de Tolo
e pelo Concílio Geral de Calcedônia (451), excluiu do seu catálogo os livros apócrifos." - O
Problema Religioso na América Latina, pág. 78.

Diz a abalizada Enciclopédia New Schaff-Herzog: "Também [nesse Concílio de Laodicéia] se


estabeleceu o cânone dos livros sagrados, com exclusão do Apocalipse."

E a Enciclopédia Britânica acrescenta: "Todos os cânones [do Concílio de Laodicéia] foram


confirmam pelo Concílio de Calcedônia em 451."

Tanto isto é verdade que o "Cânon n.º 1" do Concílio Geral de Calcedônia, assim começa: "Os
cânones até esta data elaborados pelos santos pais em todos os concílios terão validade." -
Hefele, obra citada, vol. 3, pág. 385.

E ainda mais: o imperador Justiniano tomou conhecimento desta ratificação de decisões


sinodais, em sua Novella 131, quando se refere aos cânones adotados e confirmados pelos
primeiros quatro concílios gerais. E esses cânones foram incorporados no código imperial, com
força de lei civil, constituindo sua infração crime contra o Estado.

E a afirmação bastante conhecida de William Prynne, em seu livro Dissertation on The Lord's
Day, págs. 33, 34 e 44: "O sábado do sétimo dia... solenizado por Cristo, pelos apóstolos, e
pelos cristãos primitivos, até que o Concílio de Laodicéia, de certo modo, aboliu sua
observância... O Concílio de Laodicéia (364 d.C.)... primeiro estabeleceu a observância do dia
do Senhor."
De tudo isto é fatal a conclusão de que a igreja apostatada, em conluio com o Estado, é
responsável pela mudança do dia de repouso, fato que ocorreu gradualmente, a princípio com
a celebração cerimonial do "festival da ressurreição" na parte matinal do primeiro dia da
semana, depois foi se consolidando com leis civis e com decisões sinodais.
Jamais afirmamos, que um determinado papa aboliu o sábado como dia de guarda. Repetimos
que a mudança foi um processo lento, porém sob a tutela do papado, como chefe visível,
ostensivo e diretivo da igreja. É bom esclarecer que nos referimos ao papado como instituição,
que existia embrionária e em potencial, mesmo nos primeiros séculos da nossa era. Essa
instituição cuidou de "mudar os tempos e a lei". (Daniel 7:25). E o fez com maestria, embora a
longo prazo.

Os catecismos romanos estão cheios de citações que reconhecem a autoridade da igreja


romana como responsável pela mudança do dia de repouso. O fato essencial é que tal
mudança não tem aprovação das Escrituras Sagradas, nem um preceito de Cristo, nem
recomendação apostólica. Não é, portanto, bíblica. Ao contrário, tem fundamento unicamente
na tradição. E tradição, para nós, não constitui regra de fé e prática. Deve, pois, ser rejeitada.

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