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Instituto Federal de Minas Gerais - Campus Ibirité

REIDVERSO: ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE OS LIVROS DA AUTORA


TAYLOR JENKINS REID

Por Vitoria Moreira Prado e Yasmin Fernandes Simão Santana


Realizado entre Abril e Maio de 2023.
Introdução

Taylor Jenkins Reid é uma das escritoras norte-americanas mais famosas e influentes da
modernidade. Seus livros ganharam muito "hype" 1 através do TikTok2 durante a pandemia e,
desde então, vem sendo muito prestigiada pelas obras que serão citadas e analisadas neste artigo.
A ascendência de sua fama está muito interligada com a criação de um novo ambiente
sobre livros na internet: o "booktok"3. Ambos foram influenciados pela pandemia, durante um
período em que todos procuravam por diferentes formas de entretenimento na internet.
Tanto é que as booklovers deste artigo 4 foram muito motivadas, ainda mais, pela
literatura através dessa comunidade. Dessa forma, conheceram os livros da autora em questão e
se apaixonaram por sua escrita.
A motivação das booklovers para a escolha da autora proposta está diretamente ligada
com a vontade de indicar as suas obras e analisar as personagens principais delas. Vale ressaltar
que as PP’s5 não serão comparadas a fim de diminuir nenhuma delas, mas com o princípio de
analisar como elas são desenvolvidas diferentemente, apesar de serem criadas pela mesma
pessoa.
Este artigo tem como objetivo também, levantar problemáticas em torno da imagem das
mulheres e as obrigações que são impostas a elas. As mulheres são julgadas por todas as suas
atitudes, posições e escolhas. E isso não se aplica apenas ao mundo literário, mas é perceptível
em todos os âmbitos da sociedade, principalmente no que tange outras minorias étnico-raciais.

Dessa forma, esses aspectos são retratados nas obras do ReidVerso, onde diferentes
mulheres (não somente as PP’s) têm suas vidas interligadas por homens. Apesar de apresentarem
essências próprias e motivações pessoais, elas estão sempre à sombra de algum homem, sendo
sexualizadas ou inferiorizadas. Os trechos abaixo comprovam isso:

1 Hype é o exagero de algo, ou em marketing uma estratégia para enfatizar alguma coisa, ideia ou um produto. É
um assunto que está dando o que falar, é algo que está na moda e que é comentado por todo mundo.
2 TikTok é uma rede social em que as pessoas compartilham vídeos curtos (danças, receitas, fofocas..).
3 “Book” vem do inglês e significa livro. “Tok” vem de TikTok. Booktok é uma comunidade para amantes
literários, onde há indicações e resenhas de diversos livros.
4 “Booklovers deste artigo” é um pseudônimo das autoras deste artigo. Ao decorrer, será utilizado apenas
“booklovers”.
5 Personagens principais.

1
"KAREN: Era um mundo totalmente masculino. O mundo inteiro era dominado pelos
homens, mas a indústria fonográfica… não era fácil. A gente precisava da aprovação dos
homens para fazer qualquer coisa, e parecia só ter duas opções. Ou se comportava como um
dos caras – que foi o caminho que resolvi seguir –, ou dava uma de menininha e tentava ganhar
todo mundo na base do charme. Eles gostavam disso." - Daisy Jones & The Six - Página 100.
“Afinal, ela era uma mulher, e vivia em um mundo feito pelos homens. E sempre soubera
que aqueles cretinos protegiam uns aos outros. Não sabiam ser fiéis a ninguém, mas estavam
sempre acobertando o que os outros faziam.” - Malibu Renasce - Página 80.

Desenvolvimento

Os 4 livros analisados e suas respectivas PP’s, foram:


Livro 1: Daisy Jones & The Six - PP 1: Daisy Jones;
Livro 2: Os sete maridos de Evelyn Hugo - PP 2: Evelyn Hugo;
Livro 3: Malibu Renasce - PP 3: Nina Riva;
Livro 4: Amor(es) Verdadeiro(s) - PP 4: Emma Blair.
Seguem abaixo, as descrições de cada uma:

● PP 1 - Daisy Jones:

Nasceu em 1951, criada em Hollywood Hills, em Los Angeles, na Califórnia. O pai era
um renomado pintor e a mãe uma modelo francesa. Ganhou fama no fim dos anos 1960, em
Sunset Strip.
Ela era uma menina branca, com grossos e ondulados cabelos acobreados, que roubavam
a cena. As maçãs de seu rosto pareciam quase inchadas, de tão protuberantes. A voz era incrível,
não precisava se esforçar (nunca fez aula de canto). Sempre usava argolas.
Seus olhos azuis enormes (azul cobalto, bem escuro) e chamavam bastante atenção:
“Uma das minhas histórias favoritas sobre ela é que, nos anos 80, uma fabricante de
lentes de contato coloridas criou um tom chamado ‘azul Daisy’.” - Página 13.

Daisy nasceu rica e com acessos a tudo que quisesse (artistas, drogas, casas noturnas);
tudo estava ao seu dispor. Dessa forma, começou a frequentar lugares reservados a maiores de

2
idade quando ainda era adolescente, e viciou-se em drogas pesadas logo cedo. Apesar de
misturar muitos remédios, “ela nunca dormia” (página 17).
Logo, apesar do livre acesso a todos os tipos de substâncias e da liberdade que possuía,
Daisy era muito sozinha e carente, então buscava não se sentir assim através do uso de
entorpecentes e de saídas noturnas regadas a álcool e drogas ilícitas.
Inclusive, a própria personagem destaca que todos à sua volta eram maiores de idade e,
no entanto, se mantiam indiferentes ao fato dela ser bem nova. Muito pelo contrário, eles se
aproveitavam de sua inocência. Vale ressaltar também, que os relacionamentos de Daisy eram
sempre abusivos e com homens mais velhos, que só tiravam proveito dela. Ela, por sua vez,
afirmava que não sabia como um relacionamento deveria funcionar, justamente por sua
imaturidade relacionada à idade.
“Mas não tinha ninguém. Nem irmãos, nem familiares próximos em Los Angeles. Com
pais tão fechados em seu próprio mundinho que ignoravam sua existência.” - Página 13.
“Ela não passava de uma menina desesperada para criar vínculos com as pessoas” -
Página 14.
“Bebi e fumei tudo o que aparecesse na minha frente.” - Página 15.
“Ninguém se importava com a minha idade.” Página 15.
“DAISY6: Eu já estava morando com a Simone fazia duas semanas quando fui para casa
pegar mais roupas. Meu pai perguntou: "Foi você que quebrou a cafeteira hoje de manhã?”. Eu
respondi: ‘Pai, eu nem moro mais aqui." - Página 18.
“A grande qualidade de Daisy era que ela conseguia atrair todos os olhares”. - Página
50.

Quando tinha apenas 15 anos, ela saía com vários homens ao mesmo tempo. Entre eles,
estava Wyatt Stone, compositor do Breeze7, que chegou a escrever uma música sobre a garota:
“Enfim, nessa noite, depois que Wyatt foi deitar, eu não consegui dormir. Aí encontrei
um papel com uma letra de música que ele estava escrevendo, e estava na cara que era sobre
mim. Falava sobre uma ruiva e mencionava os brincos de argola que eu sempre usava. O refrão
6 Em algumas citações usadas pelas booklovers, haverá o nome do personagem seguido com sua fala. Isso porque o
livro está em um formato de entrevista, feita com o intuito de revelar segredos sobre a banda e o real motivo para o
seu término.
7 Banda fictícia do livro.

3
dizia que eu tinha um coração grande, mas sem nenhum amor dentro dele.” - Página 21.

Daisy era uma inspiração para todos, poderia até mesmo ser considerada a it girl8 daquela
época. E mesmo com toda a atenção que recebia, ela não gostava de ser associada como uma
parte de alguém, ela queria ser esse alguém e construir sua própria identidade, tanto musical
quanto pessoal.
“As coisas eram assim na época. O meu papel era servir de inspiração para uma grande
ideia de um cara qualquer.” - Página 22.
“DAISY: Eu não tinha o menor interesse em ser a porra da musa de alguém. Eu não sou
a musa. Eu sou esse alguém. E assunto encerrado.” - Página 22.

A artista almejava a independência e não queria que tomassem decisões por ela. No
entanto, a falta de apoio que recebia no ramo musical fez com que ela parasse de compor por um
tempo, mesmo sendo a composição de letras, a sua maior paixão. Enquanto isso, o abuso de
drogas continuava sem limites.
“A partir daí, eu passava o dia a base de dexedrina e a noite a base de seconal. Com
champanhe, para ajudar tudo a descer fácil.” - Página 54.
“Eu passava os dias tomando sol e as noites me drogando. Tinha parado de compor
porque não via sentido em continuar, já que não iam me deixar gravar minhas músicas.” -
Página 85.

Daisy sempre se impôs como uma pessoa muito determinada e teimosa no que tangia a
música e a sua carreira. Porém, quando se tratava de sua saúde, ela não se cuidava e utilizava
tóxicos o tempo todo. Ela tomava dexedrina de dia e seconal a noite, não se limitando em contar
a quantidade que era ingerida. Um dia, foi barrada por entrar e dormir escondida na casa dos
pais (porque eles não a reconheceram) e, apesar de tirarem a queixa, acabou sendo presa por ter
saquinhos de pó no sutiã e baseados guardados na bolsinha de moedas.
“Sou uma artista. Então, é melhor vocês me deixarem gravar o disco que quero, caso
contrário não vou aparecer no estúdio. Nunca.
Teddy respondeu: Daisy… uma pessoa que insiste em ter as condições perfeitas para produzir

8 O termo it girl é utilizado para se referir a mulheres, geralmente muito jovens, que criam tendências.

4
não é uma artista. É uma imbecil. Bati a porta na cara dele” - Página 86.
“Eu não estava nem aí se ia ser famosa ou não. Para mim não fazia diferença cantar no
disco de um ou de outro. Eu só queria fazer uma coisa interessante, original e bacana. (...) Eu
usava o que quisesse, quando quisesse. Eu fazia o que quisesse com quem quisesse. E quem não
gostasse podia ir a merda.” Página 100.
“KAREN9: Alguém que parece estar acima das coisas mundanas, né? Daisy era meio
assim, não queria nem saber como o mundo real funcionava” - Página 100.

O amor que Daisy sentia pela música era perceptível por todos que a ouvissem cantar. A
sua voz era admirável e continha uma essência única.
“NICK HARRIS10: A química entre essas duas vozes - a vulnerabilidade dele, a
fragilidade dela - é uma coisa que prende. A voz dele, mais profunda e suave, e a dela, mais
aguda e rouca, de alguma forma se fundiam sem esforço, como se os dois cantassem juntos há
anos." - Página 101.
“BILLY11: A voz dela era explosão pura. Ela sorria o tempo inteiro enquanto cantava.
Acho que dá pra perceber isso só de ouvir. A coisa passa para o som. Nisso Daisy era ótima. Dá
para ouvir ela sorrindo junto com a música.” - Página 107.
“É por isso que eu sempre amei fazer música. Não pelo som, pela fama e pela diversão,
e sim pelas palavras que a gente pode deixar fluir enquanto canta - as emoções, as histórias, as
verdades. A música consegue ir fundo, saca? É como pegar uma pá e começar a escavar o peito
até encontrar alguma coisa.” - Página 125.

Apesar do seu vício em drogas a acompanhar durante muitos anos (principalmente


quando ela estava em turnê), Daisy consegue ficar sóbria e adota seu filho, coisa que ela achava
impossível de acontecer, já que não acreditava poder ser uma boa mãe (apesar de querer muito
ser). Ao final, ela conclui que, apesar de não ter percebido antes o quanto precisava de ajuda em
relação ao seu vício, essa foi a melhor decisão de sua vida.

9 Tecladista da banda Daisy Jones & The Six.


10 Crítico - fictício - de rock comentando sobre a interação entre Billy e Daisy, em "Honeycomb" (primeira música
que eles apresentaram juntos).
11 Vocalista e compositor da banda Daisy Jones & The Six.

5
● PP 2 - Evelyn Hugo:

Evelyn Hugo, aos 13 anos, já tinha mais de um metro e setenta. Seus cabelos castanhos-
escuros eram bem longos e brilhantes. Tinha pernas compridas, pele morena e um busto que
quase rebentavam os botões dos seus vestidos. Desde muito nova, teve que aprender a viver
sozinha já que, aos 11 anos perdeu sua mãe pela pneumonia, tinha um pai abusivo e nenhuma
menina queria mais ser sua amiga.
Evelyn sempre soube que a vida não seria fácil para ela e que, se quisesse conquistar
algo, teria que dar tudo de si para os outros. Tudo mesmo, incluindo seu corpo, atributo que
ajudou muito na formação de sua fama. Ela não queria muita coisa grandiosa, apenas se mudar e
viver uma vida melhor, longe da pobreza e miséria. Para isso, teve que perder a coisa mais
preciosa da vida de uma menina de 14 anos: sua virgindade. Evelyn queria ir para Hollywood,
lugar onde poderia viver uma nova vida, e Ernie Diaz 12 atendeu seu pedido. Infelizmente, para
isso acontecer, ela precisou se casar com ele, fingindo ser maior de idade e tendo a assinatura de
seu próprio pai na papelada.
Evelyn Herrera se torna Evelyn Hugo, abandona os estudos e seus aspectos latinos – ela
muda a cor do cabelo, emagrece, perde seu sotaque e não fala mais espanhol.
“Eu não queria ninguém; esse era o problema. Sendo bem clara e direta, não demorei
muito para compreender como meu corpo funcionava. Não precisava de garotos para
experimentar sensações boas. E esse entendimento me proporcionou um grande poder. Eu não
tinha interesse por ninguém em termos sexuais. Mas queria, sim, uma coisa. Queria ir para bem
longe de Hell’s Kitchen. Queria sair daquele apartamento, sair de perto do bafo de tequila e da
mão bruta do meu pai. Queria alguém que cuidasse de mim. Queria uma casa bonita e dinheiro
no bolso. Queria fugir, escapar da minha vida. Queria ir para onde minha mãe tinha prometido
que a gente moraria um dia.” - Página 44.
“Demorei anos para entender que a vida não se torna mais fácil só porque ficou mais
glamorosa. Mas eu não tinha como entender isso aos catorze anos. Então coloquei meu vestido
verde favorito, que já ficara pequeno. E fui bater na porta do sujeito que, segundo ouvi dizer,
estava indo para Hollywood. Só de olhar para a cara dele deu para perceber que Ernie Diaz
ficou contente em me ver. E foi assim que perdi minha virgindade: em troca de uma carona até

12 “O pobre Ernie Diaz”. Nome do capítulo que conta os acontecimentos que a levaram ao seu primeiro casamento.

6
Hollywood.” - Página 30.
“Ernie e eu nos casamos em 30 de janeiro de 1953. Eu me tornei Evelyn Diaz. Tinha só
quinze anos na época, mas meu pai topou assinar a papelada. Acho que Ernie desconfiava que
eu era menor de idade. Mas menti na cara dura, e ele não pareceu dar muita bola [...].” -
Página 45.

Seu maior segredo, que só revelou depois de velha, era quem havia sido o amor da sua
vida. Ela casou para ser uma nova pessoa; casou para abafar os rumores de que estava em um
relacionamento homoafetivo com Celia St. James; casou para conseguir voltar a aparecer em
manchetes; casou para poder viver seu romance proibido 13… Todos os seus casamentos tiveram
um propósito, tudo foi meramente calculado. Por estar em uma época onde todos eram
homofóbicos, Evelyn teve que esconder sua sexualidade através dos seus maridos. Ela tinha
medo do que poderia acontecer com a sua reputação se todos descobrissem sobre sua
sexualidade mas, ao final, ela admite isso para todos em sua biografia. A musa de Hollywood
nunca se envergonhou por ser bissexual.
“Eu disse: ‘Isso não te incomoda? Que seus maridos tenham se tornado um assunto tão
importante, mencionado tantas vezes nas manchetes, que quase ofuscaram você e seu trabalho?
Que aquilo que todo mundo menciona quando fala de você são os sete maridos de Evelyn
Hugo?’. E a resposta foi pura Evelyn Hugo. ‘Não’, ela me disse. ‘Porque eles são só maridos. A
Evelyn Hugo sou eu. E, de qualquer forma, acho que, quando souberem a verdade, as pessoas
vão se interessar muito mais pela minha esposa.’” - Página 352.

● PP 3 - Nina Riva:

Nina Riva nasceu em julho de 1958, em Malibu (onde passou toda sua vida), foi uma
grande modelo, filha de um artista famoso em Hollywood, Mick Riva. Ela tinha lindos olhos
castanhos-escuros, seus cabelos da mesma cor, eram compridos e cheios de vida, e as suas
sobrancelhas eram grossas. Alta e esguia, Nina tinha a marca registrada dos Rivas: os lábios com

13 Isso aconteceu duas vezes. Evelyn casou com Harry, seu melhor amigo, para que ambos conseguissem ficar com
quem amavam (ela com Celia e Harry com o “marido” de Celia, John), e também se casou com Robert, irmão de
Celia.

7
o inferior carnudo e o superior mais fino.
Teve uma infância conturbada e cresceu em um lar disfuncional, em meio a traições e
brigas por parte do pai e o alcoolismo da mãe. Sua mãe faleceu quando Nina ainda tinha 17 anos
e, com seus irmãos ainda pequenos (os mais velhos tinham 16 anos e a mais nova 12), ela tomou
a liderança da casa para si. Por ter sido abandonada por seu pai, Nina teve que abandonar seus
estudos – que já não estavam tão bons assim – para conseguir manter o restaurante de sua mãe
funcionando e, consequentemente, trazer sustento para seus irmãos. Com isso, ela resolveu se
mostrar forte, apesar de toda dor que sentia pela perda. A consequência disso tudo foi não
conseguir ter a coragem de evitar situações que a deixavam desconfortável já que, como
aprendeu a ignorar seus sentimentos desde cedo, acabou deixando de colocar sua própria saúde -
e vida - em primeiro lugar, para colocar a vida dos outros no topo de tudo.
“Nina se perdia de si mesma por colocar os outros sempre em primeiro lugar [...] Mas
Nina nunca dizia não, nunca atrapalhava ninguém, nunca exigia nada. Se você pedisse cinco
pratas para ela, Nina daria dez.” Página 113.
“Quando Nina chegou em casa na manhã seguinte, encontrou a mãe desfalecida e
imóvel na banheira.” - Página 145.
“Ela sabia que era sua responsabilidade dizer o que precisava ser dito. Fazer o que
precisava ser feito. Quem está sozinha no mundo não tem como escolher as tarefas que quer
fazer, não pode se considerar incapaz para determinada coisa. E não existe espaço para
aversão ou fraqueza. É preciso fazer de tudo. Toda a feiura e a tristeza, todas as coisas que a
maioria das pessoas não suporta nem pensar — é preciso encarar tudo isso. É preciso ser capaz
de tudo.” - Página 146.
“‘Mamãe morreu’, Nina disse, e viu os três irmãos desabarem. E, em um instante, soube
que precisava dar um jeito de apoiá-los. Precisava ser capaz de segurá-los enquanto gritavam,
enquanto a água encharcava suas meias e inundava seus sapatos. E foi isso o que ela fez. Sabe
o peso que um corpo pode ter quando desaba nos seus braços, desamparado? Multiplique isso
por três. Nina carregou tudo isso. Todo esse peso, em seus braços, em suas costas.” - Página
146.
“‘Nós vamos ficar bem’, Nina disse em um tom tranquilizador. Ela faria dezoito anos em
breve. ‘Deixem comigo’.” - Página 150.
“Nesse momento ela entendeu, mais do que nunca, que não tinha a opção de

8
desmoronar. Nina precisava agir como gostaria que seus irmãos agissem. Eles não ficariam
bem se ela não estivesse. Então ela precisava encontrar um jeito de ficar bem.” - Página 151.
“Nina se tornou o que precisava se tornar. Ela fazia as compras no supermercado.
Preparava o jantar. Ajudava Kit com a lição de matemática enquanto estudava para sua prova
de química. Se encarregava do pagamento dos impostos. Quando um dos seus irmãos caía no
choro, Nina o abraçava.”- Página 151.
“As preocupações nutricionais tinham ficado para segundo plano depois que eles
perderam a mãe. Os donuts de supermercado, os cereais açucarados e os achocolatados
dominaram a cozinha. Kit, que ainda não tinha nem treze anos, bebia café com creme, leite e
quatro colheres de açúcar. Nina se esforçava para fazê-los ter pelo menos uma refeição com
proteína.” - Página 153.
“June tinha morrido havia quatro meses. Mick não mandou nem um cartão de
condolências. E, em algum momento durante aqueles dias, semanas e meses em que o telefone
não tocou, Nina perdeu a fé na humanidade do pai.” - Página 155.
“Durante sua vida toda, Nina tinha sido programada para aceitar. Aceitar que seu pai
tinha ido embora. Aceitar que sua mãe morreu. Aceitar que devia cuidar dos irmãos. Aceitar
que era vista pelo mundo como objeto de luxúria. Aceitar, aceitar, aceitar. Nina acreditava que
essa era sua maior força – ser capaz de suportar, ser capaz de aguentar firme, ser capaz de
aceitar tudo e seguir em frente. Era uma coisa estranha para ela, essa ideia de declarar que
alguma coisa era inaceitável.”14 - Página 267.
Ao longo do livro, ela demonstra sua insatisfação ao ser sempre vinculada à imagem do
pai (ou de qualquer outro homem) e não como alguém individual. Ainda mais por conta das
atitudes irresponsáveis dele e o descaso de todos os anos com ela e com seus irmãos. Essa
insegurança de estar sempre a sombra aumenta ao longo do tempo, quando ela é traída
publicamente por seu marido.
Há uma significativa semelhança entre o relacionamento de seus pais e o seu próprio
relacionamento. Nina foi deixada de lado pelo seu marido porque o mesmo alegou ter encontrado
o amor da sua vida – uma outra mulher. A mesma coisa aconteceu com June, sua mãe. O que
14 Nina chega a essa conclusão quando a amante do seu marido invade sua festa (uma tradição entre os irmãos
Riva), para saber, aos berros, o motivo de ter sido deixada de lado. Ela percebe que nunca teria a coragem de Carrie
para “esbravejar e resmungar e espernear e chorar em público e gritar com as pessoas” que a magoam (citação
retirada da página 266)

9
pode ser considerado em si é a forma como cada uma delas reagiu a isso. June voltou para Mick
e, quando foi trocada de novo, esperou até o dia da sua morte, a volta do seu marido. Nina
decidiu, depois de anos, se colocar em primeiro lugar e fazer suas próprias escolhas, então
mandou seu ex marido para fora de casa, não aceitando suas falsas declarações.
Ela odiava viver a forma que foi criada na sua infância, apesar de que muitos dos
acontecimentos se repetiram no futuro. Nina, ainda, se deparou com a fama antecedida pelo pai e
sua vida adulta foi marcada pela presença de paparazzi15 e jornalistas.
Os acontecimentos de sua infância viraram traumas durante toda a sua vida adulta. Nina,
apesar da fama e prestígio que recebia, era muito insegura e não sabia, de fato, qual o futuro que
queria para si.
“Nina foi retratada na capa como a mulher abandonada por um homem famoso e como
a filha de um homem famoso no interior da revista. Sempre que pensava nisso, ela cerrava os
dentes.” - Página 15.
“Ela sentia falta dos pais que nunca a entenderam de verdade, do homem que nunca a
amou de verdade, do futuro que ela achava que estava construindo para si mesma, da jovem que
costumava ser.” - Página 133.
“Ela teve que escolher o que, das coisas que herdou das pessoas que vieram antes dela,
ela queria apresentar. E o que, do passado, ela queria deixar para trás.” - Página 354.

No entanto, com o decorrer do livro, Nina ganha confiança aos poucos e percebe que não
precisa mais fazer de tudo por seus irmãos. Apesar do passado horrível e da maturidade precoce
que ela foi obrigada a construir, seu futuro está nas suas mãos e ela pode seguir os próprios
planos. Essa mudança de percepção ocorre lentamente com o passar dos anos e não é uma
construção fácil, afinal ela cresceu pensando que deveria dar conta de tudo e de todos. Porém, ao
se desprender de tudo, ela se sente livre e leve. Nina, finalmente, está vivendo a sua própria vida.
“Era doloroso partir, mas Nina sabia que a maioria das coisas boas tinha também um
lado negativo. Nina não precisava de nada além de sua família. De seus irmãos. E, talvez, agora
que eles não precisavam mais dela, pudesse ter um pouco de paz e tranquilidade. E um pouco de
sol. E de privacidade. Afinal, os membros da sua família eram todos adultos. E não é

15 PAPARAZZI: sinônimo do fotógrafo insistente que persegue celebridades para tirar fotos de preferência
indiscretas ou comprometedoras.

10
exatamente por isso o que as pessoas tanto esperam? Pelo dia em que as crianças crescem e
podem fazer o que quiserem da vida?” - Página 360.

● PP 4 - Emma Blair:

Emma Blair nasceu em Acton, Massachusetts. Tinha cabelos nem loiros nem escuros,
olhos meio castanhos e meio esverdeados e acumulava sardas em seu rosto. Filha de donos de
uma livraria local, ela sempre viveu na sua cidade de naturalidade, mas almejava viajar o mundo
todo. Tinha receio de ter um futuro igual ao dos pais e pretendia, literalmente, voar para bem
longe.
Desde nova sempre foi muito insegura, principalmente em relação à irmã mais velha, que
sempre foi o exemplo de garota perfeita: linda, popular e que atraia os olhares de todos por onde
passava. Dessa forma, Emma se inferiorizava em relação à irmã, principalmente pelas diferenças
de estrutura corporal e de popularidade. Ela se sentia deslocada na própria família. Suas
inseguranças se perpetuavam por todo o seu corpo e ela sempre se incomodava com a sua
aparência.
“Marie gostava de todo mundo, e todo mundo gostava de Marie. Ela era a menina de
ouro, destinada a ser a favorita da família. Minha amiga Olive se referia a ela pelas costas
como ‘a filha dos livreiros’, porque era a cara dela ser uma garota cujos pais tinham uma
livraria, como se existisse um estereótipo para isso e Marie preenchesse todos os requisitos com
méritos.” - Página 17.
“E ninguém — ninguém mesmo — seria capaz de dizer que eu era uma garota popular.
Meus pais brincavam que a enfermeira devia ter entregado a criança errada para eles no
hospital, e eu sempre dava risada, mas não foram poucas as vezes em que fiquei observando
fotos dos dois quando crianças e me olhando no espelho à procura de semelhanças, para me
certificar de que aquela era de fato minha família.” - Página 18.
“Minha bunda estava ficando cada dia maior, enquanto meus peitos pareciam
estagnados. Li numa edição da revista Glamour da minha mãe que esse tipo de corpo era
definido como “formato de pera”. Minha barriga era reta, mas meus quadris estavam se
alargando. (...) Mas, sendo bem sincera, o que eu queria mesmo era o tipo físico que Marie
herdou da minha mãe. Bunda não muito grande, peitos de tamanho médio, cabelos castanhos,

11
olhos verdes e cílios grossos.” - Página 19.

Emma tinha muita dificuldade para dizer o que realmente pensava, principalmente
quando o assunto era suas próprias opiniões. Portanto, sempre as escondia com medo de afastar
as pessoas e fazer com que elas deixassem de achá-la interessante, simplesmente por ter opiniões
distintas.
“Ele baixou o volume, mas não desligou a música, que aos poucos foi tomando conta do
ambiente do carro. (...) ‘Quem é esse?’, perguntei. (...) ‘Charles Mingus’, ele explicou. ‘Você
gosta de jazz?’ ‘Não costumo ouvir’, respondi. ‘Então não sei.’ ‘Certo’, Sam disse, aumentando
o volume. ‘Vamos ouvir, e aí você vai saber.’ Assenti e dei um sorriso para mostrar que topava.
O único problema é que três segundos depois eu já sabia que Charles Mingus não era muito
para mim, e fiquei sem graça de pedir para ele desligar. Então não pedi.” - Página 30.

Ao decorrer da história, e através de acontecimentos que marcaram sua vida, Emma se


abriu para novos planos. Dessa forma, depois de viajar por todos os continentes e viver
experiências diversas, ela ressignificou o seu futuro e percebeu que a vida que queria para si era,
na verdade, aquela que gerou tanto receio no passado. Emma esteve em milhares de lugares
diferentes, conheceu novas culturas, viveu um lindo amor e, mesmo assim, decidiu viver em sua
cidade natal e trabalhar na livraria de sua família.
“Foi difícil, mas finalmente entendi quem sou e o que quero. Na verdade, minha
identidade nunca me pareceu tão clara e cristalina. Sou Emma Blair. Livreira. Irmã. Filha. Tia.
Pianista amadora. Apaixonada por gatos. Nascida e criada na Nova Inglaterra.” - Página 265.
“Detesto parecer previsível, principalmente para os meus pais. Mas, acima de tudo, fico
aliviada por ter tomado a decisão que parecia mais acertada. Afinal de contas, eles são meus
pais. E, quando ficamos mais velhos, enfim aceitamos que na verdade eles sabem das coisas.” -
Página 271.

Conclusão:

Conclui-se que, apesar de serem personagens diferentes e com vivências distintas,


existem certas semelhanças entre elas. No âmbito familiar, Daisy e Evelyn apresentam criações
em ambientes tóxicos, onde suas necessidades emocionais não eram respeitadas e nem atingidas

12
pelos pais. Daisy tinha tudo o que queria, materialmente falando, mas não possuía nenhum
suporte em relação a sua criação pessoal. Já Evelyn não tinha nada financeiramente e nem
ninguém afetivamente ao seu lado. Enquanto isso, Nina cresceu em um lar disfuncional em
relação aos pais, mas sempre teve uma relação linda com os irmãos, ela sabia para quem voltar
quando estivesse em apuros, ao contrário de Daisy e de Evelyn. Já Emma, sempre teve pais
muito acolhedores e que sempre fizeram de tudo por ela.
No que se refere a relacionamentos, Daisy passou por namoros muito problemáticos e
abusivos com homens adultos, quando ainda era adolescente. Ao longo de todos os maridos de
Evelyn, um deles foi o seu primeiro amor, apesar de ter sido o relacionamento mais tóxico que
ela teve. A surfista e modelo, Nina, não teve sorte no que tange a relacionamentos amorosos,
visto que foi trocada e traída publicamente por seu marido. Enquanto isso, Emma Blair viveu
dois casamentos lindos repletos de conexão e amor.
Todas as 4 PP têm grandes paixões que as motivam a viver: Daisy com seu amor
incondicional pela música; Evelyn e sua ambição pela fama; Nina e sua afeição pelo mar
relacionada a devoção pelos irmãos; e Emma com sua paixão por viajar o mundo e conhecer
novas culturas, que tornou-se o amor pela leitura.
As booklovers encerram esse artigo apontando a genialidade de Taylor Jenkins Reid ao
criar personalidades tão marcantes. A escrita da autora é tão profunda e detalhada que se torna
difícil de acreditar que as personagens são fruto de mera imaginação.

Referências:

LUBEL, Bruna. O que significa “it girl” na nova novela da globo, sangue bom?. Influx, 2013.
Disponível em: <http://www.influx.com.br/blog/o-que-significa-it-girl-na-nova-novela-da-
globo-sangue-bom/#:~:text=O%20termo%20it%20girl%20%C3%A9,tamb%C3%A9m%20ser
%20chamadas%20de%20trendsetters>. Acesso em: 16 de abril de 2023.

SIGNIFICADO DE HYPE. Significados, 2023. Disponível em:


<https://www.significados.com.br/hype/>. Acesso em: 04 de maio de 2023.

SIGNIFICADO DE PAPARAZZI. Dicionário Informal, 2023. Disponível em:


<https://www.dicionarioinformal.com.br/paparazzi/#:~:text=PAPARAZZI%20ou

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%20PAPARAZZO%3B%20palavra%20italiana.%20que%20se%20refere,para%20tirar%20fotos
%20de%20prefer%C3%AAncia%20indiscretas%20ou%20comprometedoras>. Acesso em: 05
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