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ASPECTOS REMUNERATÓRIOS DO ATLETA PROFISSIONAL DE FUTBOL:


ANÁLISE E EFEITOS JURÍDICOS

Daniel Renan Albarello1


André Rodrigues2

RESUMO: O presente trabalho de conclusão de curso foi desenvolvido com o propósito de


estudar os principais aspectos remuneratórios do atleta profissional de futebol e a sua natureza
jurídica. Os objetivos estabelecidos no início do trabalho foram; analisar a remuneração
normalmente paga aos atletas profissionais de futebol, verificar a sua natureza salarial ou
indenizatória a partir do entendimento doutrinário e jurisprudencial e analisar o contrato de
trabalho dos atletas profissionais a partir da legislação aplicável. A metodologia de pesquisa
aplicada para o desenvolvimento do trabalho consiste na bibliográfica, utilizando doutrinas,
artigos científicos, julgados recentes do Tribunal Superior do Trabalho e revistas científicas.
Com a conclusão é possível verificar que diante da jurisprudência e da doutrina apresentada,
as verbas pagas as aos atletas profissionais, em sua maioria, possuem natureza jurídica
salarial, levando em consideração o princípio protetivo, sendo que o caráter salarial é mais
benéfico ao trabalhador. Ademais, denota-se que as decisões para caracterização de verbas
com natureza jurídica indenizatória estão relacionadas com questões de fraudes à legislação
trabalhista.

Palavras-chave: atleta profissional de futebol; natureza salarial; natureza indenizatória;


contrato especial de trabalho desportivo.

ABSTRACT: This course conclusion work was developed to study the main remuneration
aspects of the professional soccer player and their legal nature. The objectives established at
the beginning of the work were; to analyze the remuneration usually paid to professional
soccer players, verify their salary or compensation nature based on the doctrinal and
jurisprudential understanding, and analyze the employment contract of professional athletes
based on the applicable legislation. The applied research methodology for the development of
the work consists of a bibliography, using doctrines, scientific articles, recent judgments of
the Superior Labor Court, and scientific journals. With the conclusion, it is possible to verify
that given the jurisprudence and the doctrine presented, the amounts paid to professional
athletes, for the most part, have a legal salary character, taking into account the protective
principle and the salary character is more beneficial to the worker. Furthermore, it is denoted
that the decisions for the characterization of funds with a legal indemnity character are related
to issues of fraud in the labor legislation.

Keywords: professional soccer player; salary character; compensatory character; special


sports contract.
1
Acadêmico do X semestre do Curso de Direito da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das
Missões, URI – Campus de Frederico Westphalen. E-mail: dani_albarello@hotmail.com
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Mestre em Direito, pelo PPGD da UNOESC-SC. Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho,
pelo IPEJUR. Especialista em Direito Público, pelo IMED. Advogado e docente do Curso de Graduação em
Direito da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, URI – Campus de Frederico
Westphalen E-mail: andre@uri.edu.br
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1 INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como intuito compreender todas as nuances e dúvidas que
cercam a natureza jurídica das principais verbas pagas aos atletas profissionais de futebol,
destacando os direitos e obrigações desta categoria de trabalhadores. Sabe-se que a
remuneração de um atleta profissional no futebol brasileiro ainda é um tema complexo,
apresentando diversas particularidades em relação aos trabalhadores comuns, uma vez que
envolve questões jurídicas, aspectos esportivos, financeiros e culturais.
O futebol é um esporte muito popular no Brasil, estando presente em nosso cotidiano
através de conversas e discussões. Porém, além de ser uma paixão nacional, o futebol passou
a ser tratado como um produto altamente rentável, através de suas cifras milionárias,
possibilitando aos atletas da modalidade remunerações astronômicas.
Destaca-se ainda a importância pela compreensão da Lei 9.615 de 24 de março de
1998, ou também conhecida como Lei “PELÉ”, recentemente alterada parcialmente pela lei
12.365/11, importante legislação desportiva brasileira, que surgiu com o objetivo de
regulamentar a prática do esporte, estabelecendo diretrizes para a organização e gestão do
desporto, além de assegurar a proteção dos direitos trabalhistas dos atletas profissionais. Além
disso, a referida legislação trouxe significativas mudanças ao estabelecer as diferenças entre
um contrato de trabalho convencional para o especial, que engloba direitos peculiares em
relação a um trabalhador comum.
Ademais, o futebol através de seu grande destaque comercial e financeiro,
principalmente pelo pagamento de salários e remunerações exorbitantes, torna fundamental
um estudo sobre o que determina o caráter indenizatório ou salarial das principais verbas
pagas ao atleta profissional de futebol, quais sejam; “Luvas”, “Bicho”, “Direito de Arena”,
“Direito de Imagem” e “Salário Utilidade ou in natura”. Além disso a presente pesquisa busca
apresentar dados que demonstrem a média de valores pagos para essa classe de trabalhadores.

2 PROFISSIONALIZAÇÃO E REGULAMENTAÇÃO DO FUTEBOL BRASILEIRO

A origem histórica do futebol e o percurso até a sua chegada e posterior


profissionalização no Brasil ainda é cercada de controvérsias e dúvidas, porém há registros de
que a modalidade teve seu início nas civilizações antigas, sendo encontrada na Grécia Antiga,
Roma e entres os Maias durante toda a idade média. Seguindo uma linha histórica, existem
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ainda registros da prática de futebol em meados do século XIV, na região de Florença, sendo
que a modalidade era chamada de “cálcio Fiorentino” (SOARES, 2018).
No entanto, embora existam registros antigos da modalidade, o futebol como
entendemos hoje, nasceu na Inglaterra durante o Século XIX, devido as condições sociais,
econômicas, políticas e culturais. A prática da modalidade estava inserida como uma
concepção educacional, valorizando a atividade desportiva como uma maneira de formar
homens fortes em físico e caráter. (SOARES, 2018)
O primeiro registro de profissionalização e regulamentação do futebol remete a data de
26 de outubro de 1863, onde membros de clubes, escolas e universidades da Inglaterra
criaram a Football Association, entidade responsável por organizar e disciplinar as primeiras
regras para a prática do esporte. Após isso, no ano de 1886 ocorre a criação da International
Football Association Board, reunindo, membros da Inglaterra, País de Gales, Escócia e
Irlanda. A presente entidade surge com o a ideia precípua de unificar as regras existentes e
elaborar normas complementares que fossem necessárias. A partir deste movimento, o futebol
ganha projeção em todo continente europeu, provocando um crescente número de associações
nacionais, tornando fundamental a internacionalização da modalidade. Assim, visando uma
organização internacional, no ano de 1904 foi fundada a Fédération Internationale de
Football Association (FIFA), sendo a responsável por uniformizar e comandar o futebol em
todo o mundo (SOARES, 2018).
Compreendendo a origem do Futebol, sua profissionalização e regulamentação a nível
mundial, passamos a entender como a modalidade chegou ao Brasil e o seu caminho até seu
aprimoramento profissional e normatização. O futebol em nosso país é introduzido no final do
século XIX, precisamente no ano de 1894, através do jovem anglo-brasileiro Charles William
Miller, que trouxe a modalidade após passar um período na Inglaterra. Incialmente o futebol
foi difundido entre a elite brasileira, sendo ensinado como uma parte para a formação de
jovens elegantes e nobres, não havendo espaço para negros, trabalhadores e classes mais
baixas. Contudo, a prática da modalidade avançou rapidamente pelo Brasil, sendo que a partir
do século XX começaram a fundar alguns dos principais clubes do futebol brasileiro, virando
uma paixão nacional e assumindo grande protagonismo social (SOARES, 2018).
No ano de 1915, no estado de São Paulo, foi criada a Federação Brasileira de Futebol,
no entanto, neste mesmo ano e após dois meses, no Rio De Janeiro, é criada a Federação
Brasileira de Esportes. Ambas entidades tinham como objetivo de controlar e representar
oficialmente o futebol brasileiro no cenário internacional. Diante da rivalidade entre as duas
organizações, no dia 18 de junho de 1916 foi fundada a Confederação Brasileira de Futebol de
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Desportos (CBD), com respaldo e autorização para representar o esporte Brasileiro no cenário
Internacional, principalmente junto a FIFA (SOARES, 2018).
Após esse período, já na década de 1930 surgem os primeiros indícios de
regulamentação, através do Direito Desportivo, formalizando a relação entre atleta e clube. O
ano de 1933 marca oficialmente o inicio da profissionalização do futebol em nosso país,
quando é realizada a partida entre São Paulo e Santos, tendo o primeiro gol de um atleta
remunerado do futebol brasileiro (NETO, 2010).
Na década de 30, iniciou-se o processo de regulamentação da profissão do atleta de
futebol, buscando adentrar em uma das categorias trabalhistas e assim consolidando a
presente modalidade como um trabalho de fato. Durante essa fase surgiram diversas normas
esportivas, porém as mais importantes foram; Decreto nº 1.056/39, que criou a Comissão
Nacional de Desportos; Decreto nº 3.199/41, responsável pelo implemento das bases de
organização do desporto em todo o país; Decreto nº 5.342/43, estabeleceu a necessidade de
registrar os contratos dos atletas profissionais, instituiu garantias como a carteira do atleta e
regulou as transferências de jogadores entre os clubes (GOÉS; CÁUS, 2013).
Em 1964 surge o Decreto-Lei nº 53.820, o qual contribuiu com regulamentação das
relações empregatícias entre atletas e clubes, sendo que pela primeira vez surgem definições
sobre os contratos de trabalho e seus prazos, estipulando o mínimo de três meses e o máximo
de dois anos, contração de atleta a partir dos dezesseis anos e a adoção do “passe”, que
definia e regulava a participação do desportista no valor de venda do clube cedente ao
cessionário (GOÉS; CÁUS, 2013).
Ainda no contexto regulatório, a partir da promulgação da nova Constituição Federal
(1988), inicia-se o período legislativo voltado para o desporto com sua proteção constitucional
fixada no Art. 217 da Carta Magna, juntamente com outras leis como a Lei Zico (Lei nº
8.762/93) e Lei Pelé (Lei nº 9.615/98). Destaca-se que o surgimento da Lei Pelé provocou a
revogação da Lei Zico, e atualmente conta com alterações nas relações de trabalho entre
atletas profissionais e entidades de práticas desportivas, ocorridas com a Lei nº .9.891/2000,
Lei 10.672/2003, Lei n. 12.395/2011 e a mais recente alteração pela Lei 13.155/2015
(VEIGA, 2020).
Ademais, a prática desportiva profissional, de acordo com o Artigo 28 da Lei 9.615/98
é caracterizada por remuneração pactuada em contrato especial de trabalho desportivo. Nesse
sentido, o aludido contrato configura a relação entre atleta profissional e a entidade
desportiva, contendo peculiaridades que diferenciam das demais relações jurídicas e de
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contratos de trabalhos regidos pela legislação trabalhista, merecendo uma análise e um estudo
criterioso. (BRASIL, 1998)

3 CONTRATO ESPECIAL DE TRABALHO DESPORTIVO

O estudo e análise sobre as características especiais dos contratos de trabalho


desportivos dependem diretamente da conceituação do contrato como instrumento jurídico e
entendimento do contrato de trabalho, assim permitindo adentrarmos nas peculiaridades do
contrato especial de trabalho desportivo.
Nesse sentido, Gagliano e Filho (2019) entendem que o contrato se trata de um
negócio jurídico bilateral decorrente da convergência de manifestações de vontade
contrapostas. Orlando Gomes (2019) colabora com o aludido entendimento ao referir que para
a existência de um contrato, são necessárias pelo menos duas partes, com conduta idônea para
a satisfação dos interesses regulados.
Contudo o contrato de trabalho é compreendido como um instrumento bilateral, pelo
qual um trabalhador, Pessoa Física, se obriga a prestar serviços para uma pessoa jurídica ou
física de forma não eventual, subordina e onerosa. Na esfera legal, o Artigo 442 da
Consolidação das Leis Trabalhista (CLT) define o contrato de trabalho como um acordo tácito
ou expresso, correspondente a uma relação de emprego. Por sua vez a relação de emprego
abarca empregado e empregador e suas definições estão presentes nos Artigos 2º e 3º da CLT,
in verbis;

Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo


os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de
serviço.
§ 1º - Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de
emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações
recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores
como empregados.
Art. 3º - Considera-se empregada toda pessoa física que prestar serviços de natureza
não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Em relação ao Contrato Especial de Trabalho Desportivo (CETD), é necessário


compreender que este rege a relação empregatícia entre atleta e clube, possuindo como objeto
principal a participação do jogador nas competições, sua preparação e recuperação e
remunerações pactuadas. Diante de tantas particularidades e características próprias, sabe-se
que o contrato de trabalho individual, previso no Artigo 442 da CLT, não pode ser aplicável
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para um desportista, condicionando assim a utilização de um contrato especial de trabalho.


(RAMOS, 2022)
A Lei 9.615/98 (Lei Pelé) apresenta diversas especificidades entre os contratos de
trabalho tradicionais para o do atleta profissional de futebol. Em razão disso, os contratos de
trabalho desportivos são considerados uma modalidade especial, contendo particularidades
sobre a forma de celebração, duração, cláusulas indenizatórias e compensatórias e ainda a
extinção do instrumento (RAMOS, 2022).
O primeiro ponto onde reside uma diferença significativa entre os contratos de
trabalho tradicionais para o desportivo é quanto à forma de celebração. De acordo com o
Artigo 442 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) existem duas formas de celebração,
podendo ser tácita (verbal) ou expressa (escrita). No entanto os contratos de trabalho
desportivos são caracterizados por sua solenidade, ou seja, obrigatoriedade de formulação
escrita. Esse entendimento em relação a forma do contrato está presente no Artigo 28 da Lei
9.615/98 (Lei Pelé), e dispõe que a atividade profissional é caracterizada pela remuneração
pactuada em contrato especial de trabalho desportivo (ZAINAGHI, 2015).
Domingos Sávio Zainaghi (2020) destaca que o legislador quis referir-se ao contrato
escrito, uma vez que na tradição da legislação desportiva, era obrigatório que o contrato de
trabalho fosse celebrado sempre por escrito. Além disso, para o Futebol, em razão do vínculo
federativo, para que um atleta possa participar de competições é necessário que o contrato
especial de trabalho seja devidamente registrado nos órgãos competentes, que em nosso país
será a Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Ainda no que tange ao atleta profissional de
futebol, o Artigo 94 da Lei Pelé, estabelece a obrigatoriedade de celebração do contrato
especial de trabalho desportivo.
A segunda peculiaridade existente no contrato de trabalho desportivo em relação aos
demais contratos reside na duração ou prazo de vigência. Sabe-se que os contratos de trabalho
tradicionais, podem ser estipulados por prazo indeterminado ou por tempo determinado, já na
esfera esportiva, os contratos somente podem ser assinados por tempo determinado (RAMOS,
2022).
A obrigatoriedade de contratação por prazo determinado está prevista no Artigo 30 da
Lei Pelé, que estabelece que a duração mínima do contrato deve ser de três meses e no
máximo cinco anos, garantindo estabilidade para as duas partes e prevenindo duração
excessiva. Contudo, com o advento da Pandemia de COVID-19, os prazos de vigência
sofreram alterações, inicialmente através da Medida Provisória n. 984 de 18 de junho de 2020,
onde esta modalidade de contrato passou a contar com prazo mínimo de 30 dias. Logo após, a
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Lei 14.117/21, através do Artigo 5º torna extinta a referida MP, porém manteve o Artigo 30-A
na Lei Pelé, assegurando a vigência mínima de 30 dias para o período em que haja Estado de
Calamidade Pública Nacional, reconhecido pelo Congresso Nacional em decorrência de
doença internacionalmente contagiosa (RAMOS, 2022).
A relação labora desportiva justifica a existência de um regime jurídico próprio que
rege uma relação trabalhista, o contrato de trabalho específico e uma fusão entre atividade
laboralista e prática desportiva do atleta, tendo em vista a excepcionalidade da relação
emprego entre atleta e clube, é que a lei exige os demais elementos que devem constar do
contrato (ZAINAGHI, 1998, p. 60).
Desta forma, outra particularidade do contrato de trabalho desportivo, era a
obrigatoriedade de pactuação da cláusula penal desportiva. Ocorre que, a partir da publicação
da Lei n. 12.395/2011, são criadas as cláusulas indenizatórias desportiva e cláusula
compensatória desportiva, alterando substancialmente o Artigo 28 da Lei Pelé e acabando
com as divergências em relação a cláusula penal. A abordagem das cláusulas indenizatória e
compensatória necessita inicialmente da compreensão sobre a Lei do Passe e a Cláusula
Penal, as quais perduraram por um período nas relações contratuais desportivas (RAMOS,
2022).
O instituto jurídico do “Passe” foi criado através da Lei 6.354/76, e representava o
vínculo esportivo entre atleta e clube, necessitando da primeira inscrição e registro na
federação desportiva, concedendo direitos de preferência, permanência ou transferência do
jogador ao clube detentor do seu passe. Em síntese, o passe era uma alternativa que
compensava os clubes em assegurar seu investimento no atleta contratado. Destaca-se ainda
que valor do passe deveria ser previsto no contrato de trabalho, conforme Artigos 3º, V, 11 e
13 da revogada lei n. 6.354/76;

Art 3º. O contrato de trabalho do atleta, celebrado por escrito, deverá conter:
[...]
V - os direitos e as obrigações dos contratantes, os critérios para a fixação do preço
do passe e as condições para dissolução do contrato;
Art 11. Entende-se por passe a importância devida por um empregador a outro, pela
cessão do atleta durante a vigência do contrato ou depois de seu término, observadas
as normas desportivas pertinentes.
Art 13. Na cessão do atleta, poderá o empregador cedente exigir do empregador
cessionário o pagamento do passe estipulado de acordo com as normas desportivas,
segundo os limites e as condições estabelecidas pelo Conselho Nacional de
Desportos.

Gize-se que o passe era um instituto independente do vínculo empregatício,


perdurando mesmo após a extinção do contrato de trabalho, revelando flagrante violação ao
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livre exercício de trabalho, uma vez que o empregador possuía exclusivamente poderes para
negociar a condição de jogo do atleta.
Em relação a cláusula penal desportiva prevista no Artigo 28, caput, §§3º e 5º da Lei
Pelé, era caracterizada por reger o encerramento do contrato de trabalho desportivo, podendo
ser acionada durante a vigência contratual, a partir de um descumprimento de contrato pelo
atleta, ou quando o empregador despedia imotivadamente o jogador (RAMOS, 2022).
A cláusula penal, de acordo com Orlando Gomes (1981), deve ser compreendida como
uma obrigação acessória pelo qual as partes asseguravam o valor das perdas e danos se
ocorresse inexecução culposa da obrigação. Desta forma, o referido instituto funcionava como
uma pena pecuniária por descumprimento contratual, evitando saídas de jogadores a custo
zero. Impende ressaltar que a cláusula penal foi motivo de grande discussão e divergência
diante de sua previsão no Artigo 31 da Lei 9.615/98, o qual determinava a aplicação do Artigo
479 da CLT nos casos de rescisão indireta por atraso salarial do empregador.
Por outro lado, o Artigo da mesma lei, entendia que a cláusula penal seria acionada por
descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral, ocasionando assim um conflito quanto a
sua aplicação, se somente quando um atleta rompia antecipadamente o contrato ou se também
era extensível contra o clube que dispensava o jogador. Essa divergência histórica ficou
conhecida como unilateralidade x bilateralidade da cláusula penal (RAMOS, 2022).
Contudo, com a extinção da Lei 6.354/76 e o advento da lei 12.395/11, o passe e a
cláusula penal foram expurgados do nosso sistema jurídico, dando origem a Cláusula
Indenizatória Desportiva e Cláusula Compensatória Desportiva, buscando resolver a
controvérsia jurídica entre unilateralidade e bilateralidade da cláusula penal (RAMOS, 2022).
Primeiramente, a cláusula indenizatória é entendida como um instrumento jurídico a
ser acionado pelo Clube por descumprimento contratual antes de findar o prazo estipulado,
seja para transferências nacionais ou internacionais. Prevista no Artigo 28, §1º da Lei Pelé,
assim dispõe:

Art. 28. A atividade do atleta profissional é caracterizada por remuneração pactuada


em contrato especial de trabalho desportivo, firmado com entidade de prática
desportiva, no qual deverá constar, obrigatoriamente: (Redação dada pela Lei nº
12.395, de 2011).
§ 1º O valor da cláusula indenizatória desportiva a que se refere o inciso I do caput
deste artigo será livremente pactuado pelas partes e expressamente quantificado no
instrumento contratual: (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011).
I - até o limite máximo de 2.000 (duas mil) vezes o valor médio do salário
contratual, para as transferências nacionais; e (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011).
II - sem qualquer limitação, para as transferências internacionais. (Incluído pela Lei
nº 12.395, de 2011).
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Desta forma, observa-se que o novo sistema de regência e cessão dos contratos trazido
pela cláusula indenizatória é devido exclusivamente ao clube, sendo possível determinar que o
valor da cláusula poderá ser celebrado até o montante de 2.000 (duas mil) vezes o valor médio
contratual para transferências nacionais. Quanto a transferências internacionais, não há
qualquer limitação, sendo totalmente válida diante do poder econômico de uma equipe
estrangeira (RAMOS, 2022).
No que tange a cláusula compensatória desportiva, sua previsão legal está expressa no
Artigo 28, II, §3º da Lei Pelé, vejamos;

Art. 28. A atividade do atleta profissional é caracterizada por remuneração pactuada


em contrato especial de trabalho desportivo, firmado com entidade de prática
desportiva, no qual deverá constar, obrigatoriamente: (Redação dada pela Lei nº
12.395, de 2011).
II - cláusula compensatória desportiva, devida pela entidade de prática desportiva ao
atleta, nas hipóteses dos incisos III a V do § 5º
§ 3º O valor da cláusula compensatória desportiva a que se refere o inciso II do
caput deste artigo será livremente pactuado entre as partes e formalizado no contrato
especial de trabalho desportivo, observando-se, como limite máximo, 400
(quatrocentas) vezes o valor do salário mensal no momento da rescisão e, como
limite mínimo, o valor total de salários mensais a que teria direito o atleta até o
término do referido contrato. (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011).

A referida cláusula é devida pela entidade esportiva ao atleta (empregado) nas


hipóteses de rescisão indireta e na despedida imotivada. Conforme citado acima, o valor da
cláusula compensatória deve ser pactuado entre as partes e descrito no contrato laboral
desportivo, podendo ser fixado até o limite máximo de 400 (quatrocentas) vezes o seu atual
salário no momento da rescisão (RAMOS, 2022).
Ademais, quanto a extinção do contrato especial de trabalho desportivo, é o momento
onde ocorre a avaliação de toda a trajetória do atleta empregado, sendo considerado todas as
circunstâncias que contribuíram para esse evento (RAMOS, 2022).
Nesse sentido, a cessação do contrato especial, disposta no Artigo 28, §5º, I a V da Lei
Pelé, pode ocorrer através de duas formas, sendo normal com o término regular da vigência
do contrato ou ter alcançado o propósito acordado e a forma excepcional, a qual está
relacionada aos fatores que esgotam a continuidade do contrato de trabalho.

Art. 28. A atividade do atleta profissional é caracterizada por remuneração pactuada


em contrato especial de trabalho desportivo, firmado com entidade de prática
desportiva, no qual deverá constar, obrigatoriamente:
§ 5º O vínculo desportivo do atleta com a entidade de prática desportiva contratante
constitui-se com o registro do contrato especial de trabalho desportivo na entidade
de administração do desporto, tendo natureza acessória ao respectivo vínculo
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empregatício, dissolvendo-se, para todos os efeitos legais: (Redação dada pela Lei nº
12.395, de 2011).
I - com o término da vigência do contrato ou o seu distrato; (Incluído pela Lei nº
12.395, de 2011).
II - com o pagamento da cláusula indenizatória desportiva ou da cláusula
compensatória desportiva; (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011).
III - com a rescisão decorrente do inadimplemento salarial, de responsabilidade da
entidade de prática desportiva empregadora, nos termos desta Lei; (Incluído pela Lei
nº 12.395, de 2011).
IV - com a rescisão indireta, nas demais hipóteses previstas na legislação trabalhista;
e (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011).
V - com a dispensa imotivada do atleta. (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011).

A primeira forma de extinção do Contrato de Trabalho Desportivo trata do curso


regular do contrato de trabalho desportivo até o termo final de sua vigência, extinguindo a
relação empregatícia sem ensejar qualquer pagamento de cláusula indenizatória ou
compensatória. Desta forma, alcançando o termo final e não havendo renovação contratual,
qualquer cláusula restritiva ou que dificulte a transferência de um atleta para outro clube,
configura uma afronta constitucional ao princípio da Liberdade de trabalho, prevista no Artigo
5º, XIII da CRFB.
A cessação do contrato desportivo através do distrato ocorre antes do termo final do
contrato com o consentimento extrajudicial das próprias partes envolvidas. Destaca-se que o
distrato tem o intuito de dissolver plenamente a relação trabalhista e o vínculo desportivo,
podendo as partes convencionar as indenizações recíprocas. Insta salientar que a extinção do
contrato pelo acordo entre as partes não pode conter vício por coação, dolo, fraude, erro ou
ignorância, estado de perigo e lesão.
Contudo, uma das principais formas de cessação do contrato de trabalho desportivo
decorre do inadimplemento salarial por parte do empregador desportivo. Destaca-se que a
mora salarial contumaz é configurada pelo atraso do clube empregador em pagar o salário
contratual ao atleta, durante o período de três meses ou mais, conforme artigo 31, caput, da
Lei Pelé. Nesse modo, confirmando a rescisão por mora salarial, ocorre a incidência do
pagamento da cláusula compensatória e demais haveres devidos ao atleta, além de ocorrer o
afastamento da incidência da cláusula indenizatória. Ademais, a rescisão indireta descrita no
Artigo 28, §5º, IV da Lei Pelé, remete a possibilidade de justa causa do empregador quando
incorrer nos termos do Artigo 483 da CLT.
Destaca-se ainda a dispensa imotivada como forma de cessação do contrato de
trabalho desportivo, configurando-se por iniciativa do clube que não deseja contar com o
atleta. Impende ressaltar que diante da despedia sem motivo antes do término do contrato, é
devido o pagamento da cláusula compensatória desportiva ao atleta. Por fim, a justa causa do
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empregador também configura uma forma de extinção do contrato de trabalho desportivo.


Nessa modalidade de rescisão, o atleta pratica uma falta grave e por sua exclusiva culpa, a
entidade empregadora é obrigada a romper a relação contratual, podendo ainda aplicar o
exposto no Artigo 482 da CLT.
Desse modo, observamos peculiaridades importantes do contrato especial de trabalho
desportivo desde a sua celebração até a extinção, demonstrando a especialidade da profissão
com relação ao trabalhador comum.

4 REMUNERAÇÃO E SALÁRIO NO EMPREGO DESPORTIVO

A onerosidade é compreendida como a principal característica em uma relação de


emprego, sendo materializada através do pagamento de salário ou remuneração estando
previstos nos Artigos 76 e 457 da CLT, respectivamente. Embora transmitam a mesma ideia
de onerosidade, é fundamental salientar que os termos supracitados possuem sentidos
diversos, gerando efeitos em cálculos trabalhistas e devem ser observados com atenção
(BRASIL, 1943).
Inicialmente a remuneração é o conjunto de prestações recebidas habitualmente pelo
empregado pela prestação de serviços, seja em dinheiro ou em utilidades, provenientes do
empregador ou de terceiros, mas decorrentes do contrato de trabalho, de modo a satisfazer
suas necessidades básicas e de sua família (MARTINS, 2023, p. 162).
Em consonância delineia Gustavo Filipe Barbosa Garcia (2014, p 393): “Assim,
perante o sistema jurídico em vigor, a remuneração é o termo mais amplo, ou seja, o gênero
que engloba como espécies o salário e a gorjeta”.
Quanto ao salário, Maurício Godinho Delgado (2013. p. 713) destaca: “salário é o
conjunto de parcelas contraprestativas pagas pelo empregador ao empregado em função do
trabalho”. Desta forma, verifica-se que o pagamento do salário é feito somente pelo
empregador e não por terceiros, além de não existir a adição das gorjetas, ao contrário da
remuneração.
Para a compreensão do presente estudo sobre as verbas pagas aos atletas é
fundamental analisarmos os Artigos 457 da CLT juntamente com os Artigos 28, caput e 31 da
Lei Pelé, uma vez que as Luvas, Bicho, Direito de Arena, Direito de Imagem e Salário
Utilidade ou in natura compõem as principais parcelas de remuneração desta categoria de
profissionais (BRASIL, 1943; 1998).
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Inicialmente as luvas, na esfera jurídica, são definidas como uma parcela de


valorização da carreira do atleta, além de ser um incentivo para a anuência do atleta ao
contrato. Insta salientar o seu pagamento deve ser estabelecido de maneira minuciosa e pode
ser realizado em cota única ou em parcelas, podendo possuir um valor fixo ou variável,
repassada em dinheiro, imóveis ou até em automóveis, conforme assevera Alice Monteiro de
Barros (2012, p.111).

As luvas traduzem importância paga ao atleta pelo seu empregador, “na forma que
for convencionada pela assinatura do contrato”; compõem a sua remuneração para
todos os efeitos legais (artigo 31, parágrafo 1º, da lei nº 9615 de 1998). Elas podem
ser em dinheiro, títulos ou bens, como automóveis. Seu valor é fixado tendo em
vista a eficiência do atleta antes de ser contratado pela entidade desportiva, ou seja,
o desempenho funcional já demonstrado no curso de sua vida profissional.

Destaca-se ainda que a natureza jurídica salarial das luvas independe de sua forma de
pagamento, além de já estar pacificada na jurisprudência, entendendo ser uma parcela de
natureza salarial acrescida ao salário-base ao logo do período contratual, conforme decisão do
Tribunal Superior do Trabalho:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO


PELO RECLAMADO FUTEBOLISTA. CONTRATO DE TRABALHO.
AJUSTE DE CESSÃO TEMPORÁRIA ENTRE CLUBES DESPORTIVOS.
EMPRÉSTIMO DE ATLETA. PRAZO DETERMINADO. OCORRÊNCIA DE
LESÃO. PRORROGAÇÃO PELO PERÍODO DE RECUPERAÇÃO.
JUNTADA DE CONTRATO EM LÍNGUA ESTRANGEIRA. ESPANHOL.
(...)
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE. ATLETA
PROFISSIONAL. FUTEBOLISTA. "LUVAS". NATUREZA JURÍDICA.
A matéria não admite maiores discussões, tendo em vista que já se encontra
firmado o entendimento desta Corte superior de que o valor pago a título de
"luvas" aos atletas profissionais possui nítida natureza salarial. Destaca-se que,
com base em tal posicionamento já consolidado, esta Corte vem estendendo a sua
aplicação para os casos de outras profissões notadamente bancários e altos
profissionais do setor financeiro, em que, ante o reconhecimento pelo seu
desempenho e resultados alcançados, recebem pagamentos de valores a título de
"luvas", também em fase pré-contratual, funcionando, assim, como um incentivo
para a sua contratação, exatamente como ocorre com os atletas profissionais. Mesmo
nessas hipóteses, tendo em vista que se trata de valor pago em razão do trabalho,
verifica-se a natureza eminentemente salarial da verba (precedentes). Recurso de
revista conhecido e provido.
(Processo: ARR-119700-08.2008.5.02.0034, 2ª Turma, Relator Ministro Jose
Roberto Freire Pimenta, DEJT 06/10/2017).

José Martins Catharino (1969. p. 32) referia-se ao bicho como “Bôlo Esportivo”,
considerando como uma parcela remuneratória ilícita por se tratar de um complemento à
remuneração proveniente dos jogos de azar. No entanto, este instituto no meio desportivo é
entendido como um ativo financeiro variável e condicional entre atleta e clube esportivo para
13

um bônus nos casos de vitórias, classificações e na conquista de títulos, podendo ser


estabelecido contratualmente ou verbalmente entre clube empregador e atleta empregado.
Ressalta-se que ao longo dos anos existiam discussões acerca da natureza jurídica do
“bicho”, sendo que para a doutrina e a jurisprudência prevalece o entendimento de que essas
verbas possuem natureza salarial, uma vez há uma negociação contratual entre as partes e
estas estabelecem critérios para pagamento.
Ocorre que a partir da edição da lei 13.467/17 (reforma trabalhista), os prêmios
passam a não se caracterizar salário, adotando o entendimento do Artigo 457. §§2º e 4º da
CLT. Em razão disso, os bichos seguiram o mesmo entendimento jurídico, deixando de
possuir natureza jurídica salarial ou parcela incorporada ao contrato especial de trabalho
desportivo.
Em sequência há a figura da parcela denominada como Salário-Utilidade ou In Natura.
O termo salário in natura nem sempre revela seu conteúdo, pois o empregador muitas vezes
não paga o salário com coisas, mas em serviços (MARTINS, 2023. p. 167).
Previsto no Artigo 458 da CLT, é permitido ao empregador o pagamento em utilidades,
como alimentação, habitação, vestuário ou em outras prestações.

Art. 458 - Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os


efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações "in natura"
que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao
empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcoólicas ou
drogas nocivas.

Ainda o inciso IV do Artigo 7º da CFRB ao tratar sobre o salário mínimo, define as


utilidades que são comportadas.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social:
IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas
necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação,
saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes
periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para
qualquer fim;

Urge destacar que são necessários o preenchimento de requisitos para o pagamento do


Salário Utilidade, o primeiro é a habitualidade ao fornecer o bem ou serviço, sendo
fundamental a reiteração no decorrer do contrato de trabalho. Se fornecida eventualmente, não
será considerado salário in natura. O segundo requisito se refere a gratuidade, devendo ser
uma prestação com a intenção de retribuir o empregado e havendo a cobrança pela utilidade, o
serviço deixará de possuir natureza salarial. (MARTINS, 2023)
14

Quanto a natureza jurídica, Sergio Pinto Martins (2023, p. 167) assevera que se a
utilidade é fornecida pela prestação dos serviços, terá natureza salarial, decorrendo da
contraprestação do trabalho desenvolvido pelo empregado.
Na relação empregatícia desportiva, o salário in natura continua bastante comum,
verifica-se naqueles casos em que o clube empregador, além do salário, oferece um carro, um
apartamento para o atleta se transportar e residir, mas sem nenhum desconto do salário
(RAMOS, 2022. p. 134).
No que concerne ao direito de arena, esse é entendido como a remuneração devida ao
atleta profissional de futebol por sua participação em jogos televisionados ou transmitidos por
rádio. Alice Monteiro de Barros (2012) caracteriza da seguinte forma:

O esporte envolve grande atração sobre os espectadores e, consequentemente, é


responsável pela importância do espetáculo desportivo no campo audiovisual, cuja
parte de programação é um negócio transformado em autêntico estádio virtual. Com
isso, a exploração econômica das imagens do desportiva é inevitável, gerando, para
este último, sua participação no preço denominado “direito de arena”. Esse direito é
considerado “conexo”, vizinho dos “direitos autorais” e ligado ao direito à imagem
do atleta

A parcela do percentual do direito de arena recebida pelo jogador empregado retribui


sua participação e cedência de sua imagem no âmbito da venda coletiva audiovisual do
espetáculo desportivo, ou seja, atrelada ao evento esportivo de forma geral (RAMOS, 2022. p.
160).
Em conformidade com a Lei n 9.615/98, art. 42, caput, a titularidade ou prerrogativa
exclusiva para negociar e contratar o direito de arena amplo com as emissoras de transmissão
e demais instituições midiáticas é das entidades de prática desportiva (clubes empregadores)
(RAMOS, 2022. p. 299).
Entretanto, vale asseverar: a prerrogativa exclusiva das entidades de prática desportiva
sobre o direto de arena amplo, jamais retira do atleta participante da obra desportiva o seu
direito a uma parcela deste direito maior, pois contribui na realização do evento de forma
direta e ativa, não podendo ter a sua parcela de retribuição na arena subtraída (RAMOS, 2022.
p. 301).
Destaca-se que em recentes alterações, o percentual em relação ao direito de arena a
ser recebido pelos atletas sofreu significativa redução, passando de 20% para ser 5%, através
da Lei 12.395/11, causando divergências sobre o tema, uma vez que configuraria grave ofensa
ao princípio da vedação do retrocesso social (BRASIL, 2011).
15

Diante das alterações e entrada em vigor da Lei 12.395/11, passou-se entender que as
parcelas do direito de arena distribuídas aos atletas possuem natureza civil, não podendo ter
integração de salário e reflexos nos pagamentos de FGTs, décimo terceiro, férias e
contribuições previdenciárias (RAMOS, 2022).
Quanto a cota para utilização de imagens de atletas que integra o Direito de Arena,
deve ser repassada diretamente ao clube no qual o atleta está vinculado, sendo que este, por
força do Artigo 42, § 1º da Lei 9.615/98 deve repassar o percentual de 5% do valor aos
sindicatos de atletas profissionais. Diante disso, os sindicatos distribuirão em partes iguais aos
atletas profissionais participantes do espetáculo (BRASIL, 1998):

Art. 42. Pertence às entidades de prática desportiva o direito de arena, consistente na


prerrogativa exclusiva de negociar, autorizar ou proibir a captação, a fixação, a
emissão, a transmissão, a retransmissão ou a reprodução de imagens, por qualquer
meio ou processo, de espetáculo desportivo de que participem. (Redação dada pela
Lei nº 12.395, de 2011).
§ 1º Salvo convenção coletiva de trabalho em contrário, 5% (cinco por cento) da
receita proveniente da exploração de direitos desportivos audiovisuais serão
repassados aos sindicatos de atletas profissionais, e estes distribuirão, em partes
iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo, como parcela de
natureza civil (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011).

Por fim, tratamos das parcelas pagas a título de Direito de imagem. A cessão do direito
de imagem do atleta representa um importante instituto no âmbito da remuneração,
compreendendo grande retorno financeiro ao jogador de futebol profissional. Como o próprio
nome prescreve, o direito de imagem é a retribuição pactuada em contrato com o empregador
pela exploração de imagem do atleta na venda de produtos ou marcas desatreladas do meio
esportivo (RAMOS, 2022).
Para Sérgio Pinto Martins (2016. p. 89), a natureza jurídica do direito de imagem é de
remuneração civil, pois depende da existência de um contrato específico à parte ou que seja
inserida cláusulas próprias ao contrato labora para exploração do uso de imagem.
Salienta-se que com o advento da lei 13.155/2015, a redação do Artigo 31 da Lei Pelé
sofreu alterações, passando a entender que o atraso no pagamento de verbas relacionadas ao
direito de imagem por três meses ou mais, poderá ensejar na rescisão indireta do contrato:

Art. 31. A entidade de prática desportiva empregadora que estiver com pagamento
de salário ou de contrato de direito de imagem de atleta profissional em atraso, no
todo ou em parte, por período igual ou superior a três meses, terá o contrato especial
de trabalho desportivo daquele atleta rescindido, ficando o atleta livre para
transferir-se para qualquer outra entidade de prática desportiva de mesma
modalidade, nacional ou internacional, e exigir a cláusula compensatória desportiva
e os haveres devidos (Redação dada pela Lei nº 13.155, de 2015).
16

Ainda cumpre destacar que a Lei 13.155/2015 incluiu no Artigo 87-A o parágrafo
único, passando a prever que os contratos de imagem pactuados entre clube empregador e
atleta não podem ultrapassar os 40% do valor total da remuneração atlética, pois configuraria
fraude. Sérgio Pinto Martins (2016. p. 93) destaca sobre o limite imposto:

Quando houver, por parte do atleta, a cessão de direitos ao uso da imagem para a
entidade de prática desportiva detentora do contrato especial de trabalho desportivo,
o valor correspondente ao uso da imagem não poderá ultrapassar 40% da
remuneração total paga ao atleta, composta da soma do salário e dos valores pagos
pelo direito ao uso da imagem. Visa evitar fraudes por partes do clube, no sentido de
pagar 90% da remuneração do atleta como direito de imagem

Ademais, ressalta-se que o direito de imagem não está relacionado meramente por
conta de o atleta prestar um serviço ao clube, mas principalmente pela sua capacidade de
impulsionar e dar visibilidade a entidade esportiva através de suas qualidades individuais.

5 DADOS SOBRE A MÉDIA SALARIAL PARA ATLETAS DE FUTEBOL


PROFISSIONAL NO BRASIL

De acordo com a recente pesquisa feita pelo site Salário.com.br junto a dados obtidos
no CAGED (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), e-Social e Empregador Web,
a faixa salarial em média de um atleta de profissional de futebol fica entre R$ 1.320,00 e o
teto de R$ 26.647,94. A aludida pesquisa ainda realizou um levantamento sobre a média
salarial por região, com destaque para a região sudeste, a qual possui um piso salarial
estimado em R$ 10.908,00 e um teto de R$ 14.705,00 (SALÁRIO, 2023).

Gráfico 1 – Salário de Atletas Profissionais de Futebol por Região


17

Fonte: Blog (SALÁRIO, 2023, [s.p.]).

Insta salientar que o último relatório da Confederação brasileira de Futebol (CBF)


divulgado em 2018 apontou que 55% dos atletas profissionais no futebol brasileiro recebem o
equivalente a um salário mínimo e apenas 1% dos jogadores recebem compensações entre R$
200.001,00 e R$ 500.000,00.

6 LEI GERAL DO ESPORTE – LEI 14.597/2023

A Lei Geral do Esporte – LGE (Lei 14.597/23) visa regulamentar a prática desportiva
e reunir em um único documento toda a legislação esportiva, abarcando a Lei Pelé (Lei
9.615/98), Estatuto do Torcedor (Lei 10.671/03), Lei de Incentivo ao Esporte (Lei 11.438/06)
e Lei da Bolsa Atleta (Lei 10.891/04). A nova lei geral do esporte teve origem no ano de 2017,
através do projeto de lei nº 68/201, sendo sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da
Silva no dia 15/06/2023 e posterior publicação no Diário Oficial da União (DOU) (BRASIL,
2023).
Destaca-se que dentre as principais alterações proporcionadas pela nova lei, está a
mudança no entendimento da natureza jurídica das verbas alusivas ao Bicho e as Luvas. A
partir da publicação da Lei Geral do Esporte, as duas verbas supracitadas passaram a ter
natureza jurídica indenizatória e deverão constar em contrato avulso, de acordo com o Artigo
85, §1º da Lei 14.597/2023. (BRASIL, 2017; 1998).
Ademais, destaca-se que nova lei geral do esporte representa um importante avanço na
regulamentação desportiva brasileira, proporcionando segurança e transparência na gestão
esportiva.
18

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento do presente estudo possibilitou compreender profundamente temas


atuais e bastante discutidos nos Tribunais Regionais do Trabalho, Superior Tribunal do
Trabalho e nas doutrinas de direito desportivo, acerca das principais verbas e sua natureza
jurídica normalmente pagas a atletas profissionais de futebol.
Para concluir a problemática da pesquisa, buscou-se compreender o contexto histórico
do futebol e sua regulamentação como atividade profissional até os dias atuais, além de
sintetizar as particularidades presentes nos contratos de trabalho dos profissionais desta
categoria. Dessa forma, ao compreender as especificidades de forma, duração, e conteúdo, foi
possível diferir as necessidades contratuais de um atleta para a de um trabalhador comum.
Ao tratar da remuneração e salário, o qual concentrava o objeto do estudo, foi possível
compreender sobre as verbas pagas a título de “Luvas”, sendo aquela que ocorre na
celebração do contrato, o “Bicho”, verba recebida por atingir objetivos específicos e
pactuados no contrato, o “Salário-Utilidade”, oferecido como uma vantagem para o atleta.
Além disso, observou-se a existência de verbas geradas pela particularidade da profissão,
como o Direito de Arena, percentual relativo à transmissão das partidas, e ainda o Direito de
Imagem, sendo esse individual e intransmissível, podendo apenas ser cedido após pactuado
em contrato. Ademais, em análise a jurisprudências, doutrinas e artigos constatou-se que as
principais verbas pagas aos atletas profissionais de futebol são de natureza salarial,
considerando as verbas de natureza indenizatória nos casos onde não há fraudes.
Ainda, com a presente pesquisa foi possível observar que os atletas mais bem pagos
em nosso país representam uma parcela extremamente pequena, revelando que maior parte
destes profissionais recebem em torno de um salário mínimo.
Por fim, a pesquisa também possibilitou acompanhar uma evolução legislativa em
nosso ordenamento jurídico, com a sanção da Lei 14.597/23, a qual concentrou em um único
texto todas as legislações desportivas, resguardando e ampliando direitos para os atletas de
desporto em nosso país.
Assim destaca-se que os objetivos propostos para elaboração do presente estudo foram
alcançados, permitindo uma relevante aprendizagem sobre um tema de grande discussão e
amplitude no meio jurídico.

REFERÊNCIAS
19

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