Você está na página 1de 141

Criação Musical

Prof. Me. Adriano de Carvalho Batista


1ª Edição
Autoria

Prof. Me.
Adriano de Carvalho Batista

Mestre em Música pela Universidade Estadual de Campinas UNICAMP, sob a área de concen-
tração em Harmonia e Música Popular. É também Bacharel em Música pela Faculdade de Ar-
tes Alcântara Machada (2000). . Atuou como Coordenador Artístico-Pedagógico no Programa
Vocacional da Prefeitura Municipal de São Paulo nas edições de 2009 a 2011. Músico, instru-
mentista (guitarrista), já tocou com Zé Eduardo Nazário, Lelo Nazário, Frank Herzberg, Marta
Karasawa, Ulisses Rocha, André Juarez, Tito Martino, Alexandre Zamith, Hot Line Jazz Band,
Traditional Jazz Band. Desenvolve trabalho de pesquisa sobre a Evolução da Improvisação na
Guitarra Jazzística. Possui experiência em Educação Musical, Educação Superior na Área de Mú-
sica e Performance.

Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1133318285366235


BATISTA, Adriano de Carvalho. Criação Musical. Varginha: GEaD-U-
NIS/MG, 2020.

140 p.

1.Análise Musical; 2.Composição; 3.Criação Musical;

Unis EaD
Cidade Universitária – Bloco C
Avenida Alzira Barra Gazzola, 650,
Bairro Aeroporto. Varginha /MG
ead.unis.edu.br

5
Olá caro amigo!

Bem-vindo ao curso de Criação Musical!

Nessa disciplina abordaremos diversos aspectos relacionados à arte da composição


musical. Os assuntos abordados terão como ponto de partida análises realizadas em diversas
peças musicais, visando estabelecer um gradual entendimento da utilização e da relação des-
tes elementos em toda a trama musical.
Utilizaremos como base, o conceito de análise descrito por Corrêa: “Análise é entendida
como o processo de decomposição em partes dos elementos que integram um todo. Esse fra-
cionamento tem como objetivo permitir o estudo detido em separado desses elementos cons-
tituintes, possibilitando entender quais são, como se articulam e como foram conectados de
modo a gerar o todo de que fazem parte. Justifica-se esse procedimento por admitir-se que a
explicação do detalhe sobre o conjunto conduz a um melhor entendimento global. No caso da
música, o processo pode ser compreendido em duas etapas básicas: identificação dos diversos
materiais que compõem a obra em questão e definição (constatação e explicação) da maneira
como eles interagem fazendo a obra “funcionar”. (Corrêa, A. F. ,2006)
Assim sendo, a partir das análises apresentadas, buscaremos criar conceitos de escrita
e elaboração musical que poderão servir de modelos a novas composições, ou então, servirão
de referências comparativas para a implementação de novas experiências composicionais.
Espero que vocês possam aproveitar ao máximo o curso e aprimorar seus conhecimentos mu-
sicais com a ajuda deste material.

Bons estudos!

Prof. Adriano de Carvalho


Ementa
Desenvolvimento de conhecimento e habilidades composicionais e improvisati-
vas por meio de processos disciplinares, interdisciplinares, transdisciplinares de
atividades de criação e improvisação musical.

Orientações
Ver Plano de Estudos da disciplina, disponível no ambiente virtual.

Palavras-chave
Análise Musical; Composição; Criação Musical;
Sumário
Unidade 1 - Análise de Pequenas Peças Musicais – parte 1 12
1.1. Exemplo 1 12
1.2. Exemplo 2 17
1.3. Exemplo 3 22

Unidade II - Análise de Pequenas Peças Musicais – Parte 2 29


2.1. Exemplo 4 29
2.2. Exemplo 5 31
2.3. Exemplo 6 34
2.4. Exemplo 7 37

Unidade III - Análise de Pequenas Peças Musicais – parte 3 43


3.1. Exemplo 8 43
3.2 Exemplo 9 46
3.3. Exemplo 10 48
3.4. Exemplo 11 52

Unidade IV- Análise de Pequenas Peças Musicais – parte 4 59


4.1. Exemplo 12 59
4.2. Exemplo 13 61
4.3. Exemplo 14 63
4.4. Exemplo 15 64
4.5. Exemplo 16 67

Unidade V - Recursos de Criação e Elaboração Musical 70


5.1. Exemplos de Ornamentações Melódicas 71
5.2. Outros Elementos Relacionados à Elaboração Musical 76

Unidade VI–Variações de Elementos para a Criação e Elaboração Musical


79
6.1. Variações Relacionadas à Harmonia 79
6.2. Variações Relacionadas ao Ritmo 87
6.3. Variações Relacionadas à Intensidade 90
6.4. Variações Relacionadas a Timbre 90
6.5. Variações Relacionadas à Textura 90
6.6. Variações Relacionadas à Articulação 93

Unidade VII - Análise Harmônica de Peças do Repertório da Música Popular


95
7.1. Músicas que utilizam acordes de um mesmo Campo Harmônico 95
Músicas que utilizam acordes Dominantes Secundários 103

Unidade VIII- Análise Harmônica de Peças do Repertório da Música Popular


com cadência II V I 105
8.1. A Cadência II - V 105
8.2. Análise de Cadências II – V – I 106
Análises envolvendo acordes Diminutos e Dominantes Substitutos 111

Unidade IX - Análise Harmônica de Transcrições 115


9.1. Análise de Rearmonizações de harmonias de Blues 115
9.2. Considerações sobre a análise. 122

Unidade X - Análise de Rearmonizações para harmonia de Rhythm Changes


124
10.1. Considerações sobre a análise: 134

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 140


I
Unidade I -
Análise de
Pequenas Peças
Musicais – parte 1

Objetivos da Unidade
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta unidade, você
seja capaz de:

• Reconhecer os diversos elementos que constituem o sistema


composicional da música tonal.
• Compreender de que forma tais elementos são organizados
de maneira coerente e equilibrados em uma peça musical;
• Utilizar a análise das peças como modelos para a criação de
novas composições.
Unidade 1 - Análise de Pequenas Peças Musicais – parte 1

Nessa Unidade, iniciaremos a análise de pequenas peças musicais, com o objetivo de


identificarmos os elementos constituintes da composição e de que forma estão relacionados
na peça.
As peças escolhidas trazem uma gradual evolução em relação ao tipo de tratamento
dado aos diversos elementos que a compõem, introduzindo novas técnicas composicionais a
cada exemplo e expandindo as relações musicais.
Todas as peças são Tonais, uma vez que é este, o sistema objeto de nosso estudo.

1.1. Exemplo 1

Fórm ula harm ônica

I V I I V I

Neste primeiro exemplo, temos uma pequena peça de quatro compassos na tonalida-
de de Dó Maior. A composição está escrita a duas vozes, onde, basicamente, a segunda voz é
responsável por definir a harmonia da composição, tocando somente as fundamentais dos

12
acordes.
Embora se trate de uma peça simples, de quatro compassos, é possível verificarmos em
sua estrutura composicional, muita coerência e equilíbrio entre todos os elementos constituin-
tes da composição.

Construção melódica:

Ao analisarmos a construção melódica de uma música, é importante conseguirmos vi-


sualizar a ideia central da melodia, separando possíveis ornamentações, anacruses, etc. Dessa
forma, é possível entendermos o caminho proposto pelo compositor no desenvolvimento des-
sa ideia, e, a partir disso, visualizarmos também, diferentes possibilidades a partir da mesma
ideia.
Na melodia acima, basicamente temos uma melodia composta por duas frases1 .

Note que as notas sol e fá que antecedem o início da 2ª frase tem, simplesmente, a fun-
ção de impulsionar o início da frase. Isso também pode ser observado quando comparamos as
duas frases e percebemos que a segunda frase é o retrógrado2 da primeira.
Esse aspecto já demonstra a relação existente entre a construção musical das duas fra-
ses. Embora sejam frases distintas, fazem parte de uma mesma música.
Em ambas as frases temos a presença de três notas da escala de Dó Maior – dó / ré / mi.

______________________________________________
1 Trecho de música, com relativa autonomia e com ideias musicais suficientes para lhe garantir uma independên-
cia. (Lima, M. R. R. Harmonia, 2010)

2 Repetição de um segmento musical de trás para frente.

13
Motivo

Entende-se por motivo, “o mais curto elemento ou ideia principal que caracteriza o
tema de uma obra musical, intervindo, mais ou menos modificado em todo o seu desenvol-
vimento” (Borba e Graça, 1963 apud D’Ávila, N. R.). Segundo Arnold Schoenberg, em seu livro,
Fundamentos da Composição, até mesmo frases simples envolvem a invenção e o uso de mo-
tivos. Ainda, segundo o autor, o motivo deve “produzir unidade, afinidade, coerência, lógica,
compreensibilidade e fluência do discurso”.
Um motivo constitui-se de características rítmicas e intervalares. Pode ser considerado
o “germe” da ideia musical, como coloca Schoenberg:

“Visto que quase todas as figuras de uma peça revelam algum tipo de afinidade para com ele,
o motivo básico é frequentemente considerado o “germe” da ideia: se ele inclui elementos, em
última análise, de todas as figuras musicais subsequentes, poderíamos então, considera-lo como
o “mínimo múltiplo comum”; e como ele está presente em todas as figuras subsequentes, poderia
ser denominado “máximo divisor comum”.
(Schoenberg, A., 1965).

Trataremos o motivo, em princípio, a partir de sua estrutura rítmica.


Assim sendo, poderíamos destacar neste primeiro exemplo, a seguinte ideia motívica:

Notas Estranhas à Harmonia

Neste exemplo, podemos observar que toda melodia está baseada nas tríades dos acor-
des. A única nota estranha à harmonia encontra-se no 2º compasso. Trata-se da nota fá, em re-
lação ao acorde de C. Como essa composição tem um caráter mais triádico, a nota fá, para que

14
não seja percebida como parte da estrutura harmônica, foi tratada3 como nota de passagem.

Aspecto Harmônico

Já foi visto que uma escala maior pode ser harmonizada pelos três acordes que repre-
sentam as funções principais da harmonia – tônica (I); Subdominante (IV) e Dominante (V).

Assim sendo, a peça trabalha com a relação funcional primária do Sistema Tonal - a re-
lação entre Tônica – Dominante.

______________________________________________
3 O tratamento de dissonâncias faz com que notas estranhas ao acorde (diferentes das notas da tríade) não sejam
percebidas no plano harmônico. Assim, mesmo se tratando de uma dissonância, a nota não é percebida como tal.

15
Neste exemplo, o estabelecimento da harmonia acaba por gerar a linha melódica da 2ª
voz – fundamentais dos acordes.

Cadências

A ideia de frase musical também está associada a um procedimento cadencial. Assim, as


frases são delimitadas pela presença de diferentes cadências. No caso deste primeiro exemplo,
temos, tanto na 1ª, como na 2ª frase, terminações com Cadências Autênticas – que se caracte-
rizam pelo movimento harmônico V – I.
No caso da primeira frase, trata-se de uma Cadência Autêntica Imperfeita, já que a frase
termina com a nota mi – 3ª do acorde. E, no caso da 2ª frase, temos uma Cadência Autêntica
Perfeita, pois a melodia se encerra na própria tônica da escala. Ou seja, temos a resolução do
ponto de vista harmônico (V – I) e melódico (nota dó).

16
Proposta de Exercício:

Crie uma composição com as seguintes características:

• 2 vozes (2ª voz só com fundamentais dos acordes)


• 4 compassos
• 2 frases
• Melodia com retrogrado na 2ª frase
• Cadência Autêntica Imperfeita – 1ª frase
• Cadência Autêntica Perfeita – 2ª frase
• Harmonia – Tônica e Dominante
• Tonalidade e fórmula de compasso – Livre

1.2. Exemplo 2

Fórmula Harmônica

I V I V I V I V I

17
Neste exemplo, temos uma composição de 8 compassos, também dividida em duas fra-
ses, nesse caso de quatro compassos cada. O papel da segunda voz continua sendo determinar
a relação harmônica com a melodia.

Construção melódica

Assim como no exemplo anterior, a melodia desta peça também é composta de duas
frases.

Nessa peça, podemos observar um outro aspecto interessante – o uso de uma sequ-
ência ou progressão melódica, que consiste em se transpor uma ideia melódica progressiva-
mente, ascendente ou descendentemente. No caso, a melodia se inicia com um intervalo de
3ª e, no compasso seguinte, apresenta o mesmo intervalo uma 2ª acima. Por se tratar de uma
frase curta, de apenas quatro compassos, a progressão teve de ser quebrada já no terceiro
compasso para que a frase fosse concluída. O mesmo acontece na segunda frase, que também
utiliza a mesma progressão, porém realiza uma terminação diferente, para se adequar à cadên-
cia empregada. As frases cujo contorno melódico é semelhante, mas que utilizam cadências
distintas são chamadas de frases similares.
Caso tivéssemos um exemplo com uma frase maior, o compositor poderia optar em
desenvolver por mais tempo essa ideia.

18
Continuando a progressão, teríamos:

Outro aspecto muito interessante sobre a construção da melodia desse exemplo pode
ser observado ao isolarmos a ideia central da construção melódica. Basicamente, assim como o
exemplo 1, a melodia faz um movimento ascendente da nota dó até a nota mi, e a progressão,
funciona como uma espécie de ornamentação destas notas, onde, as notas do segundo tempo
trabalham como se fossem “apojaturas” do tempo forte seguinte.

Motivo

Notas Estranhas à Harmonia

Aqui, a única nota da melodia que não se trata de uma nota da tríade do acorde sobre
a qual está escrita, é a nota fá em relação ao acorde de G. Nesse caso, trata-se da 7ª do acorde.
Por se tratar do acorde Dominante, a 7ª é uma dissonância que, necessariamente, não tem
o mesmo rigor em relação ao seu tratamento, mesmo em melodias baseadas na tríade dos
acordes, pois é uma nota que se relaciona diretamente à função Dominante deste acorde. Ou

19
seja, pode ser considerada como uma nota estrutural, assim como as demais notas da tríade.
Embora não necessite estar tratada, geralmente a 7ª de um acorde Dominante é resolvida por
grau conjunto descendente. E é o que acontece neste exemplo.

Aspecto Harmônico

Ainda utilizando somente os graus I e V – Tônica e Dominante respectivamente, nesse


exemplo temos a seguinte harmonia.

Note que, praticamente, as duas frases possuem a mesma sequência de acordes. A dife-
rença está somente no penúltimo compasso onde há a necessidade de se utilizar dois acordes
para que a música seja finalizada sobre o I grau, no oitavo compasso.
Além disso, podemos observar uma “discreta” variação na linha do baixo no 4º compas-
so, onde o compositor optou em variar a oitava da fundamental do acorde. Em princípio po-
deríamos pensar que trata-se simplesmente de se utilizar a mesma nota na oitava abaixo. Em-
bora, o que tenha sido feito, do ponto de vista técnico, seja exatamente isto, é importante nos
atentarmos para alguns aspectos que foram decisivos nessa variação. O primeiro deles é o fato
de que, na melodia, temos uma nota longa no final da frase. Ou seja, se o baixo também fosse
escrito dessa maneira, teríamos um breve momento de estagnação da música, onde não have-

20
ria, nem movimento melódico, nem harmônico. Embora não haja nenhuma regra que proíba
tal procedimento, estamos falando de uma composição de oito compassos. Ou seja, para que
a dinâmica do discurso musical seja mantida, já que a melodia está “parada” a linha do baixo
adquire mais liberdade para se movimentar. E, além disso, estamos exatamente no final da
frase, o que faz com essa movimentação na voz do baixo também funcione como um impulso
ao início da 2ª frase, sobre o acorde da Tônica. Perceba que, caso o compositor tivesse optado
em utilizar essa variação no 2º compasso, não haveria uma justificativa coerente, baseada nos
elementos musicais dessa composição, a não ser uma escolha abstrata do compositor.

Cadências

Neste exemplo, por se tratar de frases similares, as cadências são diferentes. A primeira
frase termina com uma Cadência Suspensiva, ou seja, a frase se encerra sobre o acorde da Do-
minante – V. Já a segunda frase, termina com uma Cadência Autêntica Perfeita.

21
Proposta de Exercício:

Crie uma composição com as seguintes características:

• 2 vozes (2ª voz só com fundamentais dos acordes)


• 8 compassos
• 2 frases
• Utilize alguma progressão melódica
• Cadência Suspensiva – 1ª frase
• Cadência Autêntica Perfeita – 2ª frase
• Harmonia – Tônica e Dominante
• Tonalidade e fórmula de compasso – Livre

1.3. Exemplo 3

Fórmula Harmônica

I V V I I I V I

22
Este exemplo mantém as características formais dos exemplos anteriores – oito com-
passos e duas frases.

Construção melódica

Neste exemplo temos a utilização de outro recurso no desenvolvimento da melodia – o


uso de bordaduras. A bordadura é um tipo de ornamentação da melodia que possibilita que
notas estranhas à harmonia não sejam percebidas na perspectiva harmônica. Podemos obser-
var a utilização de bordaduras na 1ª frase. Já na 2ª frase, o compositor optou em desenvolver a
melodia trabalhando com notas de passagem.

É interessante notar que, mais uma vez, ao isolarmos a ideia central da melodia, que foi
baseada na fórmula harmônica inicial, teríamos a seguinte situação:

23
Ou seja, a melodia é baseada nas notas dó – ré – mi, assim como nos outros exemplos.

Motivo:

2 – Cadências

Na construção das frases, as cadências trabalhadas foram, respectivamente – Cadência


Autêntica Imperfeita e Cadência Autêntica Perfeita.

Note que, mais uma vez, podemos observar uma pequena variação na linha do baixo
(2ª voz) no final da 1ª frase. Nesse caso a harmonia encontra-se sobre o acorde de C. Como a
função da 2ª voz tem sido tocar as fundamentais dos acordes, poderíamos supor que, no 2º
tempo do 4º compasso, teríamos um acorde de G. Porém, ao analisarmos a 1ª voz, veremos que
a melodia encontra-se na nota mi durante todo o compasso. Ou seja, no 2º tempo temos a nota
mi e sol, configurando assim o acordo do I grau. O interessante neste caso, é o fato de que, essa
variação do baixo, trata-se essencialmente de uma variação melódica, uma vez que há uma
nota longa na melodia no final da frase. Foi utilizada, assim como ocorreu no exemplo anterior,
para que a composição não ficasse estagnada ao longo de todo o compasso. A mesma coisa
acontece quando um baixista cria uma linha de baixo no acompanhamento de um samba e

24
toca a fundamental a e quinta do acorde, criando uma condução de baixo característica nesse
gênero musical. Isso não implica na inversão do acorde uma vez que a função dessa linha do
baixo é essencialmente melódica.

Proposta de Exercício:

Crie uma composição com as seguintes características:

• 2 vozes
• 8 compassos
• 2 frases
• Uso de bordaduras e notas de passagem
• Cadência Autêntica Imperfeita – 1ª frase
• Cadência Autêntica Perfeita – 2ª frase
• Harmonia – Tônica e Dominante
• Tonalidade e fórmula de compasso – Livre

Síntese dos Exemplos em Dó Maior

Nos exemplos analisados anteriormente, podemos observar as seguintes situações na


construção musical destas peças:

Fórmulas Harmônicas:

I V I I V I

25
I V I V I V I V I

I V V I I I V I

Melodias Reduzidas

Cadências

Cadência Autêntica Im perfeita Cadência Autêntica Perfeita

Cadência Suspensiva Cadência Autêntica Perfeita

Cadência Autêntica Im perfeita Cadência Autêntica Perfeita

Tratamento de Dissonâncias / Ornamentações

26
Nota de Passagem

Progressão

Bordadura e Nota de Passagem

27
II
Unidade II -
Análise de
Pequenas Peças
Musicais – Parte 2

Objetivos da Unidade
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta unidade, você
seja capaz de:

• Reconhecer os diversos elementos que constituem o sistema


composicional da música tonal.
• Compreender de que forma tais elementos são organizados
de maneira coerente e equilibrados em uma peça musical;
• Utilizar a análise das peças como modelos para a criação de
novas composições.
Unidade II - Análise de Pequenas Peças Musicais – Parte 2

2.1. Exemplo 4

Fórmula Harmônica

I V I V I V V I

A partir do modo menor, deveremos estar atentos à alteração do 7º grau da escala (sen-
sível) sobre os acordes de função Dominante.
Na construção dessa melodia, precisamos, antes de tudo, entendermos o tipo de ca-
dência utilizada em cada frase. Assim como nos exemplos anteriores, aqui, temos duas frases
de quatro compassos cada, onde, a primeira frase termina em uma Cadência Suspensiva e a
segunda, em uma Cadência Autêntica Perfeita. Assim, temos diferentes resoluções melódicas
para cada situação.

29
A partir da nota de finalização de cada frase – nota de chegada – podemos perceber
alguns aspectos muito interessantes em relação à construção dessa melodia. O primeiro diz
respeito ao aspecto rítmico. Perceba que as duas frases possuem a mesma rítmica. Além disso,
na primeira frase, a melodia se inicia pela nota sol, realiza um movimento descendente até o
terceiro compasso, ataca as notas do acorde por salto de terça e finaliza por movimento as-
cendente no quarto compasso. Na segunda frase, temos praticamente, a mesma ideia, só que
nesse caso, a melodia se inicia uma terça abaixo, na nota mi. Faz o movimento descendente
até o sétimo compasso, e, aproveitando a mesma ideia de salto de 3ª, finaliza a melodia no
movimento oposto ao da primeira frase. Ou seja, praticamente temos um espelho da melodia
da primeira frase, na segunda.

Em relação às notas estranhas à harmonia, no 2º compasso temos a presença da nota


fá – 7ª do acorde, e no 6º compasso a nota dó – 4ª. Ambas foram tratadas como notas de pas-
sagem. Em bora a 7º do acorde Dominante esteja tratada, é importante lembrar que, como já
foi dito, por se tratar de uma nota que potencializa a função deste acorde, não precisa, neces-
sariamente, estar tratada. Mas devemos prestar atenção quanto à sua resolução, que deve ser
feita por movimento descendente em grau conjunto.

Em relação à linha do baixo – 2ª voz, ainda mantém a função de representar as funda-


mentais dos acordes. A variação que acontece no 4º compasso já foi mostrada em exemplos
anteriores.
30
Motivo:

Proposta de Exercício:

Crie uma composição com as seguintes características:

• 2 vozes
• 8 compassos
• 2 frases
• Uso de 7ª da Dominante na melodia
• Cadência Autêntica Suspensiva – 1ª frase
• Cadência Autêntica Perfeita – 2ª frase
• Harmonia – Tônica e Dominante
• Tonalidade menor
• Fórmula de Compasso - livre

2.2. Exemplo 5

Fórmula Harmônica

I V I V I V I V I

31
Ao analisarmos a ideia central da melodia, teremos a seguinte situação:

Assim como no exemplo anterior, o contorno melódico está associado às resoluções


das frases, onde, a 1ª termina em uma Cadência Suspensiva e a 2ª em uma Cadência Autêntica
Perfeita.

O desenvolvimento da melodia se deu com a utilização de bordaduras na 1ª frase e no-


tas de passagem na 2ª. É interessante notar que, em cada frase, utilizou-se um padrão melódico
diferente no desenvolvimento da mesma melodia. Ou seja, a sequência mi – ré – dó, na primei-
ra frase, teve seu desenvolvimento baseado no emprego de bordaduras, e na segunda frase,
ainda aproveitando características da primeira, acrescentou-se mais uma nota ascendente, ge-
rando um padrão que pode ser interpretado, inclusive, como uma variação da célula rítmica
apresentada na 1ª frase.

32
Além da utilização das bordaduras e notas de passagem já citadas, a novidade deste
exemplo acontece no final da primeira frase onde o compositor utiliza um tipo de ornamen-
tação melódica conhecida como retardo. Esse tipo de figuração caracteriza-se pelo atraso da
resolução da melodia, que acontece no tempo fraco do compasso.

Melodia sem retardo na 1ª frase.

Melodia com retardo na 1ª frase.

Assim, a delimitação da frase acontece no 2º tempo do 4º compasso.

Motivo:

33
Proposta de Exercício:

Crie uma composição com as seguintes características:

• 2 vozes
• 8 compassos
• 2 frases
• Melodia com a utilização de progressão (sequência) e retardo.
• Cadência Suspensiva – 1ª frase
• Cadência Autêntica Perfeita – 2ª frase
• Harmonia – Tônica e Dominante
• Tonalidade e fórmula de compasso – Livre
• Tonalidade menor
• Fórmula de Compasso – livre

2.3. Exemplo 6

Fórmula Harmônica

I V V I I V V I

34
Neste exemplo, podemos considerar como ideia central da composição, a seguinte me-
lodia:

Trata-se de uma composição de oito compassos e que também possui duas frases de
quatro compassos cada.
A melodia foi desenvolvida utilizando-se passagens diatônicas onde, todas as dissonân-
cias foram tratadas como notas de passagem:

No caso do penúltimo compasso, é interessante notar que a nota mi também pode ser
tratada como nota de passagem, mesmo com a nota anterior (fá) sendo a 7ª do acorde. Como
se trata da 7ª do Acorde Dominante, essa nota é entendida como uma nota estrutural do acor-
de, assim como as notas da tríade.
As cadências utilizadas na composição foram – Cadência Autêntica Imperfeita na 1ª
frase e Cadência Autêntica Perfeita na 2ª frase.

35
Motivo:

Síntese dos Exemplos em Dó Menor


Nos exemplos analisados anteriormente, podemos observar as seguintes situações na
construção musical destas peças:

Fórmulas Harmônicas:

I V I V I V V I

I V I V I V I V I

I V V I I V V I

36
Melodias – Ideia Central

Cadências

Cadência Suspensiva Cadência Autêntica Perfeita

Cadência Suspensiva Cadência Autêntica Perfeita

Cadência Autêntica Im perfeita Cadência Autêntica Perfeita

Tratamento de Dissonâncias / Ornamentações

Nota de Passagem

Progressão – Bordadura – Nota de Passagem - Retardo

Nota de Passagem

2.4. Exemplo 7

Fórmula Harmônica

37
I IV I V I V I I

A partir dos exemplos na tonalidade de Sol Maior podemos perceber a presença no IV


grau da tonalidade – acorde de função Subdominante, nas composições.
Ainda trabalhando com peças de oito compassos divididas em duas frases, podemos
considerar como ideia melódica central a seguinte melodia:

A partir desta ideia, percebemos que a melodia foi desenvolvida a partir de uma pro-
gressão melódica baseada em saltos de 3ª, atingindo notas do próprio acorde, gerando um
motivo de 3 semínimas:

Motivo:

38
Um aspecto interessante deste exemplo foi à variação feita na progressão na 2ª frase.
Ao invés de manter a relação intervalar original, optou-se em realizar um salto de 5ª, atingindo
outra nota do acorde.

Mantendo-se a mesma ideia, teríamos a seguinte possibilidade:

Basicamente, nesta composição, todas as notas pertencem às tríades dos acordes. A


única exceção acontece sobre o acorde de D7, que utiliza a 7ª na melodia nos compassos 4 e 6.
Mas, como já foi dito, trata-se de uma nota estrutural deste acorde.
Uma característica muito interessante desta composição pode ser percebida ao anali-
sarmos a ideia central da peça.

Podemos notar que a melodia tem apenas 7 compassos. Ou seja, a 2ª frase tem apenas
3 compassos.

39
Porém, se realmente a música fosse finalizada nesse compasso, teríamos um problema
relacionado à quadratura da composição. Tradicionalmente, a música tonal está sedimentada
em critérios composicionais que se relacionam também às suas estruturas formais. Assim sen-
do, espera-se, a partir de uma composição cuja estética esteja baseada nestes princípios, que
suas relações de forma possibilitem o equilíbrio e a coerência de seus elementos constitutivos.
Assim sendo, o recurso encontrado, nos mostra um bom exemplo que pode ser empre-
gado em situações similares:
Em primeiro lugar, a nota sol foi repetida na melodia, como se estivesse reforçando a
ideia do final. E, na linha do baixo, o compositor mudou a oitava em que foi escrita a fundamen-
tal do acorde, utilizando uma passagem arpejada, o que possibilitou a conclusão da música no
8ª compasso, preservando a quadratura das frases.

Em relação às Cadências utilizadas, na 1ª frase, temos a presença de uma Cadência Sus-


pensiva e, na 2ª frase, uma Cadência Autêntica Perfeita – compassos 6 e 7.

40
Proposta de Exercício:

Crie uma composição com as seguintes características:

• 2 vozes
• 8 compassos
• 2 frases
• Uso de progressão melódica
• Finalize a 2ª frase no 7º compasso e use algum recurso de complementação
• Cadência Suspensiva – 1ª frase
• Cadência Autêntica Perfeita – 2ª frase
• Harmonia – Tônica, Dominante e Subdominante
• Tonalidade Maior
• Fórmula de compasso – Livre

41
III
Unidade III -
Análise de
Pequenas Peças
Musicais – Parte 3

Objetivos da Unidade
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta unidade, você
seja capaz de:

• Reconhecer os diversos elementos que constituem o sistema


composicional da música tonal.
• Compreender de que forma tais elementos são organizados
de maneira coerente e equilibrados em uma peça musical;
• Utilizar a análise das peças como modelos para a criação de
novas composições.
Unidade III - Análise de Pequenas Peças Musicais – parte 3

Nessa Unidade, continuaremos a análise de pequenas peças musicais, com o objetivo de iden-
tificarmos os elementos constituintes da composição e de que forma estão relacionados na
peça.
Tal como na unidade anterior, as peças escolhidas trazem uma gradual evolução em relação ao
tipo de tratamento dado aos diversos elementos que a compõem, introduzindo novas técnicas
composicionais a cada exemplo e expandindo as relações musicais.
Todas as peças são Tonais, uma vez que é este, o sistema objeto de nosso estudo.
Ao final da Unidade, será possível utilizarmos estas “peças-modelos” para criarmos novas com-
posições orientadas, as quais possibilitarão avaliarmos o domínio técnico do conteúdo estu-
dado.
Algumas das peças analisadas já foram abordadas ao longo do curso, porém com outros obje-
tivos. A retomada desse repertório, além de atender às necessidades propostas pela disciplina,
também servirão como material de revisão de alguns assuntos estudados em outras discipli-
nas, fazendo uma síntese de conteúdos trabalhados durante o curso.

3.1. Exemplo 8

Fórmula Harmônica

I I IV V I IV V I

43
Neste exemplo, temos uma melodia que trabalha, basicamente, com notas de passa-
gem, e é composta, quase que exclusivamente, por graus conjuntos.

A principal característica desta peça, em relação às analisadas anteriormente, diz res-


peito à estrutura de suas frases.
Mais uma vez, temos uma composição de oito compassos formada por duas frases. Só
que aqui, observamos uma intersecção entre as frases. Ou seja, a 1ª frase termina na mesma
nota em que a frase seguinte se inicia. Assim, a 1ª frase se encerra no 5º compasso, e não no 4º,
como foi visto em todos os exemplos anteriores.

Note que, nesse caso, a cadência utilizada na 1ª frase trata-se é uma Cadência Autêntica
Imperfeita, pois a movimento harmônico do final da frase compreende os acordes de D7 – G,
e a melodia se encerra na 3ª do acorde. Como já é de se esperar nestes casos, a 2ª frase acaba
com uma Cadência Autêntica Perfeita.
Outro detalhe a ser observado neste exemplo, é o início de uma certa independência na
voz do baixo.
Como ambas as frases terminaram em Cadências Autênticas, ou seja, o penúltimo
compasso da frase é uma acorde Dominante e, aproveitando o fato da composição ser em
44
compasso ternário, a linha do baixo faz uma passagem ascendente da fundamental do acorde
Dominante (ré) até a fundamental do acorde de Tônica (sol). Nesse caso, por se tratar de um
movimento com um caráter essencialmente melódico da voz do baixo, não se configura uma
inversão de acorde, mesmo quando a nota do baixo é a 3ª do acorde (no 3º tempo).

Proposta de Exercício:
Crie uma composição com as seguintes características:

- 2 vozes
- 8 compassos
- 2 frases – com intersecção
- Ornamentação melódica livre
- Cadência Autêntica Imperfeita – 1ª frase
- Cadência Autêntica Perfeita – 2ª frase
- Harmonia – Tônica, Dominante e Subdominante
- Tonalidade Maior
- Fórmula de compasso – Livre

45
3.2 Exemplo 9

I V V I I IV V I

A principal característica desta peça é apresentada na primeira frase da composição.


Trata-se da progressão melódica criada com o uso de retardos. Perceba que, nos compassos 2 e
4 a melodia só é resolvida no tempo fraco do compasso. Além disso, note que, a primeira frase
utiliza uma melodia baseada em saltos. Buscando criar um contraste entre as duas frases, a 2ª
trabalha somente por graus conjuntos. Além disso, a ideia escalar criada na 2ª frase, tem como
ponto culminante a nota mais aguda da melodia, que, por sinal, se trata da chegada ao acorde
da Subdominante, o que potencializa o contraste harmônico, levando a composição ao seu
ápice.

Melodia sem o uso dos retardos

46
Note que, a primeira frase termina somente quando a melodia resolve na nota si bemol,
caracterizando assim, uma Cadência Autêntica Imperfeita. Já a 2ª frase termina com uma Ca-
dência Autêntica Perfeita. Como na 2ª frase, o acorde Dominante da cadência foi precedido por
um acorde de função Subdominante, alguns autores classificam esse movimento harmônico
como Cadência Completa.
Em relação à linha do baixo, o exemplo não traz nenhuma novidade em relação às ou-
tras análises, e continua representando as fundamentais dos acordes.

Proposta de Exercício:
Crie uma composição com as seguintes características:

- 2 vozes
- 8 compassos
- 2 frases
- Ornamentação melódica com uso de retardo
- Cadência Autêntica Imperfeita – 1ª frase
- Cadência Autêntica Perfeita – 2ª frase
- Harmonia – Tônica, Dominante e Subdominante
- Tonalidade Menor
- Fórmula de compasso – Livre

47
3.3. Exemplo 10

Fórmula Harmônica

I I V V I IV V I

Neste exemplo, a redução melódica poderia ser interpretada dessa forma:

A partir da redução, podemos perceber os vários aspectos do desenvolvimento dessa


melodia. Perceba que, no aspecto rítmico, as pausas começam a fazer parte na estruturação do
motivo.

Além disso, é utilizada uma figuração melódica que ainda não havia aparecido em ou-
tros exemplos. Trata-se da bordadura cromática. Basicamente, esse tipo de bordadura tem
as mesmas características da bordadura diatônica. A diferença é que utiliza notas que não se
encontram na escala natural, fazendo uso de notas que estejam separadas por semitons cro-
máticos.

48
Além disso, ainda apresenta algumas notas de passagem ao longo das duas frases.

Note que, mais uma vez, no penúltimo compasso, há a utilização de uma nota de pas-
sagem envolvendo a 7ª do dominante como nota estrutural do acorde.
Em relação à estrutura das frases e cadências temos a seguinte situação:

Em muitos casos, é necessário recorrermos a outros elementos para que possamos de-
finir corretamente uma frase musical, de acordo com a concepção do compositor.
No exemplo acima, poderia haver uma segunda interpretação com relação ao final da
1ª frase, que indicaria que a resolução acontece no 5º compasso, quando a melodia chega na
nota si, no acorde de Sol menor. Nesse caso, teríamos um outro exemplo de uso de intersecção,
além do fato de que, nesse caso, a cadência utilizada seria uma Autêntica Imperfeita.

49
Porém, recorrendo à partitura original, podemos perceber que há uma indicação de
ligadura que possibilita nossa correta interpretação do trecho.

Proposta de Exercício:

Crie uma composição com as seguintes características:

- 2 vozes
- 8 compassos
- 2 frases
- Ornamentação melódica com uso de bordadura cromática
- Cadência Suspensiva – 1ª frase
- Cadência Autêntica Perfeita – 2ª frase
- Harmonia – Tônica, Dominante e Subdominante
- Tonalidade Maior
- Fórmula de compasso – Livre

50
Síntese dos Exemplos em Sol Maior e Sol Menor
Nos exemplos analisados anteriormente, podemos observar as seguintes situações na
construção musical destas peças:
Fórmulas Harmônicas:

I IV I V I V I I

I I IV V I IV V I

I V V I I IV V I

I I V V I IV V I

Melodias Reduzidas

51
Cadências
Cadência Suspensiva Cadência Autêntica Perfeita

Cadência Autêntica Imperfeita Cadência Autêntica Perfeita

Cadência Autêntica Imperfeita Cadência Autêntica Perfeita

Cadência Autêntica Suspensiva Cadência Autêntica Perfeita

Tratamento de Dissonâncias / Ornamentações


Progressão

Nota de Passagem - Intersecção

Retardo – Nota de Passagem

Bordadura Cromática – Nota de Passagem

3.4. Exemplo 11

Fórmula Harmônica

I V I V I I IV V I

52
A partir dos exemplos em Fá Maior, começamos a perceber uma maior independência
da linha do baixo, principalmente pela utilização de inversões e passagens de cunho melódico.
Em relação à melodia, mais uma vez temos um exemplo de 8 compassos divididos em
2 frases de 4 compassos cada.

A 1ª frase termina em uma Cadência Suspensiva, e a 2ª, em uma Cadência Autêntica


Perfeita.
Em relação ao aspecto rítmico, podemos perceber que as duas frases têm, praticamen-
te, a mesma figuração rítmica. E, estão baseadas no motivo:

As dissonâncias estão tratadas como notas de passagem, bordaduras e também pode-


mos verificar o uso de uma escapada no final do penúltimo compasso. Inclusive, esse tipo de
escapa, como é apresentado neste exemplo, pode ser encontrada em diversas peças do reper-
tório.

53
Outro detalhe muito interessante da construção melódica dessa peça acontece no pe-
núltimo compasso de cada frase. Aqui, o compositor utiliza um processo de criação musical
conhecido como inversão. A inversão consiste na repetição dos mesmos intervalos de uma
melodia, porém na direção oposta. Ou seja, saltos ascendentes tornam-se descendentes e vi-
ce-versa.
Exemplo:

O exemplo acima mostra uma inversão tonal, ou seja, quando os intervalos perma-
necem de acordo com a tonalidade. Além disso, ainda existe a possibilidade de uma inversão
real, quando mantêm-se a relação intervalar exata.
Exemplo:

Além disso, ainda podemos criar o retrógrado da inversão. Como vimos no início
de nossas análises, o retrógrado trata-se de um procedimento de elaboração musical, onde a
melodia é reescrita de trás para frente. No caso do retrógrado da inversão, teríamos a melodia
invertida escrita de trás para frente:

54
Isso é o que acontece no exemplo em Fá Maior no penúltimo compasso da 2ª frase.
No penúltimo compasso da 1ª frase temos a seguinte melodia:

A melodia invertida ficaria assim:

E, o retrógrado da inversão:

Note que a rítmica permanece a mesma da melodia original. A inversão ocorreu somen-
te em relação às alturas das notas, e não em relação ao ritmo.
Construção da 2ª voz
A partir deste exemplo, é possível notarmos uma maior elaboração da linha do baixo,
com o uso de inversões e passagens melódicas. Analisando a 2ª voz deste exemplo, podemos
notar, logo no 2º compasso, a proposta de inversão do acorde de C7. A melodia desce em grau
conjunto e atingi a nota mi – 3ª do acorde de C. É importante perceber a direção das vozes, que
caminham em sentido oposto, valorizando a condução melódica.

55
Logo mais, no 4º compasso, o baixo faz uma passagem melódica da fundamental do
acorde dominante (dó) até a fundamental da tônica (fá) no 5º compasso. Esse trecho não chega
a configurar uma inversão de acorde, pois, como já foi visto, trata-se essencialmente de uma
abordagem melódica da linha do baixo.
Mais à frente, aproveitando o movimento ascendente da 2ª voz, temos uma outra inver-
são, nesse caso do acorde de F, 6º compasso, com a chegada à nota lá. Perceba que o movimen-
to melódico por grau conjunto não foi quebrado. Para isso, utilizou-se uma nota de passagem
(sol) do 5º para o 6º compasso. É importante frisar que, embora estejamos analisando a linha
do baixo, os critérios de elaboração melódica são os mesmos. Assim sendo, a nota sol é tratada
como uma nota de passagem, e não é percebida na perspectiva harmônica, o que não confi-
gura uma inversão de acorde, nem tão pouco, a possibilidade de análise com um outro acorde
naquele tempo do compasso.
Ainda no 6º compasso, temos a presença de um acorde de Bb no 3º tempo (subdomi-
nante). Este acorde não encontra-se invertido, e a linha do baixo caminha até a fundamental da
Dominante, mudando seu registro em seguida para o dó oitava abaixo, para que a resolução
fosse feita pelo movimento ascendente de 4ª justa.

É interessante notar que, a linha do baixo percorre toda a escala partindo da nota dó.

56
Proposta de Exercício

Crie uma composição com as seguintes características:

- 2 vozes
- 8 compassos
- 2 frases
- Melodia com algum trecho escrito com o retrógrado da inversão
- Cadência Suspensiva – 1ª frase
- Cadência Autêntica Perfeita – 2ª frase
- Harmonia – Tônica, Dominante e Subdominante
- Uso de inversões
- Tonalidade Maior
- Fórmula de compasso – Livre

57
IV
Unidade IV -
Análise de
Pequenas Peças
Musicais – Parte 4

Objetivos da Unidade
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta unidade, você
seja capaz de:

• Reconhecer os diversos elementos que constituem o sistema


composicional da música tonal.
• Compreender de que forma tais elementos são organizados
de maneira coerente e equilibrados em uma peça musical;
• Utilizar a análise das peças como modelos para a criação de
novas composições.
Unidade IV- Análise de Pequenas Peças Musicais – parte 4

4.1. Exemplo 12

Fórmula Harmônica

I I IV V I IV V I

Este exemplo mostra uma melodia criada com o uso de notas de passagem e bordadu-
ras mais um retardo no 4º compasso. É possível notarmos um contraste em relação ao aspecto
rítmico da 1ª com a 2ª frase, onde percebe-se uma movimentação melódica maior na 1ª e uma
melodia mais estável, praticamente fazendo um movimento ascendente por quase todas as
notas da escala.

A melodia se divide em duas frases, sendo que a 1ª termina em uma Suspensiva, e a 2ª,
em uma Cadência Autêntica Perfeita.

59
Realmente, o aspecto mais notório deste exemplo fica a cargo da construção da 2ª voz.
Analisando a 1ª frase, percebemos que a linha do baixo é escrita a partir de um movi-
mento ascendente, passando por toda a escala. Nesse caso, no 1º compasso temos uma nota
de passagem (sol), e, m seguida, o acorde de F em 1ª inversão. A melodia atinge a nota fá, já no
início da 2ª frase, e utiliza algumas ornamentações melódicas, como uma nota de passagem no
5º compasso e uma bordadura no 6º. No 7º compasso, o trecho se inicia na 3ª do acorde e faz
uma passagem melódica descendente em colcheias até a fundamental do acorde de Tônica.

Um aspecto muito importante a ser analisa nessa peça diz respeito à direção das vo-
zes. Em nenhum momento percebemos a utilização do movimento paralelo. Somente os mo-
vimentos – contrário e obliquo. A ausência de paralelismo, embora não esteja relacionada a
nenhuma regra que restrinja sua utilização – inclusive em muitos casos apresentasse como a
melhor opção – cria uma maior independência das vozes, e, de uma forma geral, minimiza as
chances de “erros” na condução das vozes.

60
4.2. Exemplo 13

Fórmula Harmônica

I I IV V I I IV V I

A melodia deste exemplo é caracterizada por seu motivo inicial, o qual é repetido no
início da 2ª frase, e que é construído por uma bordadura com a sensível da escala – nota mi. Por
se tratar da sensível alterada, proveniente da alteração do VII grau da escala menor harmôni-
ca, essa nota tem uma relação muito forte com a função Dominante, o que possibilita uma 2ª
interpretação do aspecto harmônico neste compasso, onde poderíamos supor a existência de
um acorde Dominante no 3º tempo do compasso.

Um outro detalhe interessante foi o tipo de ornamentação usada na melodia sobre o


acorde da Subdominante – Bbm. Ao relacionarmos a melodia com o acorde, é possível perce-
bermos que, as notas do acorde estão todas deslocadas nas partes fracas do tempo. Isso foi
possível pela utilização de duas apojaturas2 e uma bordadura no final do compasso.

________________________
4- Dissonância atacada em tempo forte ou parte forte do tempo que se resolve por grau conjunto, geralmente
descendente, em uma consonância.

61
Isso causa um efeito muito interessante, pois desloca a sonoridade do acorde dentro do
compasso.

Já, na 2ª frase esse deslocamento não acontece, e a melodia trabalha, basicamente, com
as notas das tríades dos acordes, utilizando somente uma dupla nota de passagem no penúlti-
mo compasso.
Na 2ª voz, como o acorde de Fm permanece ao longo de 2 compassos, utiliza-se a 1ª in-
versão do acorde no 2º compasso, com a melodia do baixo na nota lá. Para chegar a essa nota,
a melodia utilizou uma nota de passagem (sol). Caso optássemos por analisar este tempo do
compasso com a presença de um acorde Dominante – C7, o acorde estaria em 2ª inversão.
Na 2ª frase, a linha do baixo é toda construída utilizando-se um motivo rítmico de míni-
ma e semínima. Note que, sempre a figura de semínima, no terceiro tempo do compasso, cor-
responde a uma nota de passagem, possibilitando a inversão do acorde de Fm no 6º compasso,
e, também, do acorde de Bbm no 7º compasso (1ª inversão – 3ª no baixo).

62
A melodia se divide em duas frases, com Cadência Suspensiva na 1ª e Cadência Autên-
tica Perfeita na 2ª.

4.3. Exemplo 14

Fórmula Harmônica

I V I V I IV V I

Neste exemplo, podemos observar a transição de alguns elementos da composição


entre as duas vozes. É o que ocorre com o motivo inicial no 1º compasso.
Perceba que essa ideia melódica aparece alternadamente entre as vozes, ao longo de
toda a primeira frase, criando uma progressão melódica que transita entre a primeira e a se-
gunda voz.

63
Já a 2ª frase quebra essa ideia utilizando uma melodia baseada nas notas do arpejo com
uma outra proposta rítmica.
Além da bordadura utilizada no motivo principal da peça, a melodia ainda trabalha com
notas de passagem, e, no penúltimo compasso, utiliza um retardo, porém, introduzindo, antes
da resolução, uma outra nota do acorde com duração curta.

No caso da 2ª voz, a partir do 5º compasso percorre um movimento ascendente, utili-


zando notas de passagem entre a fundamental e a 3ª dos acordes.

A melodia é composta por duas frases que terminam em Cadência Suspensiva e Cadên-
cia Autêntica Perfeita, respectivamente.

4.4. Exemplo 15

Fórmula Harmônica
I V I IV V I V I V I

64
Neste exemplo na tonalidade de Ré Maior, observaremos uma outra maneira de tratar-
mos a melodia, quando trabalhamos com mais de uma voz. Observe que a melodia também
é composta de duas frases, com a primeira terminando em uma Cadência Suspensiva, e a se-
gunda, com uma Cadência Autêntica Perfeita.
Porém, a 2ª frase apresenta a melodia na voz do baixo, fazendo com que a voz mais
aguda, assuma o papel de acompanhamento.

Com relação à estruturação da melodia, não há nenhuma novidade em relação ao que


já foi visto, sendo utilizadas, basicamente, notas de passagem.

Nessa famosa melodia de J.S.Bach podemos perceber muitas das características anali-
sadas nos exemplos anteriores.
Inicialmente, o exemplo nos traz uma novidade em relação ao tipo de cadência utiliza-
da. Nesse trecho da composição, também temos a melodia dividida em duas frases. Perceba
que a primeira frase é finalizada no acorde do I grau precedido pelo acorde da Subdominante,
no caso, o acorde de C. A esse tipo de procedimento cadencial, damos o nome de Cadência
Plagal. A segunda frase termina em uma Cadência Autêntica Perfeita.

65
Outro aspecto importante neste exemplo é o uso do acorde do II grau. Note que, nas
duas vezes em que foi utilizado, precedeu o acorde Dominante, formando uma cadência II – V –
I, chamada por alguns autores de – Cadência Completa. Esse tipo de encadeamento harmônico
é muito comum por se tratar de um tipo de cadência que é a marca do Sistema Tonal, uma vez
que trabalha com as três funções principais da Harmonia.
Na construção da melodia foram utilizados diferentes tipos de ornamentação – notas
de passagem, bordaduras e apojaturas.

Na 2ª voz, também temos alguns acordes invertidos:

66
4.5. Exemplo 16

Neste exemplo, percebemos uma considerável ampliação na harmonização da melo-


dia.
Em relação ao tipo de figuração utilizada nas duas linhas melódicas, não há grandes
novidades. Em alguns momentos, a melodia utiliza notas do arpejo dos acordes, o que pode
ser visto nos compassos 1 e 5. E passagens em grau conjunto trabalhando com notas de pas-
sagem.

Um aspecto interessante é a relação entre as duas frases. Perceba que a partir do 5º


compasso, a melodia da 1ª frase passa a ser repetida, só que adequada à nova harmonia.

Mas, talvez, o aspecto mais interessante, seja a elaboração harmônica da peça.


Embora a composição esteja na tonalidade de Ré menor, a primeira frase modula para a

67
tonalidade relativa – Fá Maior. Em seguida, são escritos dois acordes diminutos, característicos
do tom de Ré menor, o que traz de volta o contexto tonal original. A frase se encerra em uma
Cadência Autêntica Perfeita na tonalidade de Ré menor.

68
V
Unidade V -
Recursos de
Criação e
Elaboração Musical

Objetivos da Unidade
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta unidade, você
seja capaz de:

• Manipular diferentes aspectos da criação musical relaciona-


dos aos critérios harmônicos, melódicos, texturais, de dinâmica,
etc.
• Compreender de que forma tais elementos são organizados
de maneira coerente e equilibrada em uma peça musical
• Utilizar os recursos abordados nesta Unidade em estudos
composicionais
Unidade V - Recursos de Criação e Elaboração Musical

O Romantismo, período da história da música que compreende, praticamente, todo o


século 19, trouxe inúmeras inovações em relação às diversas questões relacionadas à composi-
ção musical.

“Os compositores clássicos haviam objetivado atingir o equilíbrio entre a estrutura for-
mal e a expressividade. Os românticos vieram desequilibrar a balança. Eles buscaram
maior liberdade de forma e de concepção em sua música e a expressão mais intensa
e vigorosa de sua emoção...”
(Bennett, R. Uma Breve História da Música. P.57)

Foi nesse período que a ideia da composição como o reflexo máximo da expressão do
artista se desenvolve, fazendo com que, cada vez mais, o conceito de “obra” musical se estabe-
lecesse. Isso, ao longo da história, fez com que a ideia da composição musical fosse algo reser-
vado a pessoas com grande talento musical, ou até mesmo, “gênios” da música.
O objetivo desta unidade é mostrar que, é possível identificarmos diversos elementos
técnicos que orientam uma composição, de acordo com um determinado sistema e uma esté-
tica específica. E que, a partir da compreensão e do domínio na manipulação destas técnicas,
podemos compor com uma certa facilidade peças musicais de conteúdo técnico-musical com
muita qualidade. É evidente que não existe uma pretensão em que estas composições-estudos
redefinam o paradigma estético-musical contemporâneo (o que também não é impossível!).
Mas é mostrar ao aluno que, todos somos compositores em potencial, e que, a partir do conhe-
cimento dos mecanismos de composição ao qual um determinado sistema se refere, é possí-
vel, diminuirmos esta distância que se criou entre os conhecimentos técnicos e teóricos sobre
música, e sua efetiva concretização prática.

]
70
5.1. Exemplos de Ornamentações Melódicas

Exemplo 1 - Ideia melódica principal:

Melodia desenvolvida:

a) Nesse exemplo, houve uma mudança rítmica para a inserção de uma antecipação no 1º
compasso. A antecipação se caracteriza pela presença de uma nota estranha ao acorde, que
na verdade, foi antecipada do acorde seguinte. Geralmente é atingida por grau conjunto,
mas também pode ser atingida por salto. Além disso, costuma ter um valor rítmico pequeno
e ocorrer em tempo fraco ou parte fraca do tempo.

b) Aqui, podemos observar o uso de um recurso conhecido com escapada. Basicamente,


trata-se de uma bordadura incompleta atingida por grau conjunto, geralmente ascendente,
cuja resolução se dá por salto, em uma consonância, no sentido oposto.

71
c) Nessa variação, acrescentou-se uma nota do acorde e manteve-se a antecipação.

d) Neste exemplo, acrescentou-se uma nota de passagem entre as duas notas do acorde de
F, e ainda houve a antecipação da nota sol, ainda no 2º tempo do compasso.

e) Aqui, é utilizada uma dupla bordadura para ornamentar a lá. A dupla bordadura se con-
figura pela presença de duas dissonâncias, na qual a primeira se apresenta como uma bor-
dadura inferior seguida imediatamente pela segunda bordadura superior, ou vice-versa. Na
dupla bordadura, a primeira dissonância aparece como uma bordadura incompleta (tempo
fraco ou parte fraca do tempo) e, a segunda, como uma apojatura (tempo forte ou parte
forte do tempo).

f ) Além da dupla bordadura, nessa variação, utilizou-se também, uma escapada no final do
1º compasso.

g) A partir desse exemplo, verificamos uma variação maior da melodia, com a utilização de
outras notas do acorde. Sobre o acorde de F, ainda utilizou-se o recurso da dupla bordadura,
só que no sentido oposto. Já no acorde de C, a melodia descendente foi ampliada, se ini-

72
ciando pela 7ª do acorde – reforçando sua função de Dominante e fazendo a resolução na
nota fá via a sensível da tonalidade – nota mi (3ª do acorde de C7). A nota lá, 6ª do acorde de
C, foi tratada como nota de passagem.

h) Outra possibilidade de ampliação da melodia, onde se fez uso, basicamente, de notas de


passagem.

i) Neste exemplo, sobre os acordes do 1º compasso, utilizou-se uma progressão melódica


com notas do próprio acorde. Perceba que as notas lá e sol são apoiadas nos tempos fracos
do compasso, criando uma ideia de deslocamento métrico. Já no 2º compasso, verificamos
que, ao se encerrar a melodia, faz-se uma passagem por graus conjuntos até o 5º grau da
escala e retornando à nota fá novamente.

Exemplo 2 - Ideia melódica principal:

Melodia desenvolvida:

73
a) Neste exemplo, utilizou-se uma passagem diatônica até a nota fá no 2º compasso, com o
uso de duas notas de passagem.

b) Neste exemplo, é possível verificarmos que a mesma passagem diatônica (dó-si-lá-sol) do


exemplo anterior, é utilizada aqui também, só que de maneira ornamentada. Note a utiliza-
ção de duas duplas bordaduras na ornamentação do trecho, criando, inclusive, um padrão
melódico ao longo de todo o compasso.

c) Nessa outra variação, a nota si foi tratada de duas maneiras diferentes – primeiro como
uma nota de passagem, e depois, como uma bordadura. Além disso, a nota sol, no final do
compasso, também aparece como nota der passagem.

d) Aqui, optou-se em utilizar o arpejo do acorde. Perceba que a nota sol é utilizada como
nota de passagem ascendente entre as notas fá e lá, e depois, como nota de passagem des-
cendente, da nota lá para a nota fá. Ao olharmos o contorno melódico no final do compasso,
podemos imaginar que se trata de uma bordadura entre as notas sol-lá-sol. Porém, estamos
sobre o acorde de F, e a nota lá é a consonância.

74
e) Além da variação rítmica, observamos neste exemplo o uso de uma bordadura acentu-
ada.5

f ) Mais uma vez, temos um a passagem diatônica mostrada na 1ª variação, ornamentada


com o uso de tercinas. Embora possamos interpretar as notas estranhas ao acorde como
bordaduras e notas de passagem, a progressão melódica descendente criada para cada
nota da passagem é suficiente para que tais notas assumam um papel essencialmente me-
lódico, sem que sejam percebidas no plano harmônico. Além disso, o aspecto rítmico, com
durações curtas, contribui para que isso aconteça.

g) Neste exemplo, a variação se baseou na criação de um padrão melódico de 2 tempos com


a utilização de bordaduras e notas de passagem. Além disso, no 2º compasso também hou-
ve uma reelaboração melódica utilizando-se a mudança de registro (8ª) da nota fá.

h) Aqui, além do arpejo no primeiro compasso, a resolução da melodia no 2º compasso


é atrasada pela sequência da nota nos dois primeiros tempos. Embora seja uma nota de
acorde (5ª de F), a nota dó também é a fundamental da Dominante, o que causa um efeito
de suspensão da melodia até sua finalização na nota fá que acontece no contratempo do 3º
tempo do compasso.
________________________
5- Quando ocorre em tempo forte ou parte forte do tempo. Alguns teóricos consideram a bordadura acentuada
como uma apojatura, dependendo de seu valor rítmico e de sua posição no compasso (Lima, 2010).

75
i) Mais uma vez a passagem diatônica – dó-si-lá-sol é ornamentada com a utilização de uma
progressão melódica descendente, que é quebrada no 4º tempo para a finalização da me-
lodia. É interessante perceber que, embora, toda progressão melódica possa ser utilizada
sobre o mesmo acorde sem que as notas estranhas à harmonia sejam percebidas como tal,
uma vez que, como já foi dito, a progressão sustenta o caráter, essencialmente melódico do
trecho, é possível a rearmonização do 2ª e do 4º tempo com o acorde Dominante – C7.

5.2. Outros Elementos Relacionados à Elaboração Musical

Além dos vários aspectos relacionados às possibilidades de variação melódica estuda-


dos, como, as ornamentações melódicas, as progressões ou sequências, melodia transposta,
invertida, retrógrada, retrógrada da inversão, ainda podemos citar:

a) Acréscimo de intervalos: quando são acrescentados novos intervalos a um padrão meló-


dico original:

76
b) Omissão de Intervalos: quando são excluídos alguns intervalos de um padrão melódico
original.

c) Permutação ou Interversão: Nesse caso, a variação é obtida pela mudança da ordem ori-
ginal das notas.

d) Mudança de Modo: Consiste na escrita da melodia original no modo oposto: Maior – Me-
nor / Menor – Maior

77
VI
Unidade VI -
Variações de Elementos
para a Criação e
Elaboração Musical

Objetivos da Unidade
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta unidade, você
seja capaz de:

• Manipular diferentes aspectos da criação musical relaciona-


dos aos critérios harmônicos, melódicos, texturais, de dinâmica,
etc.
• Compreender de que forma tais elementos são organizados
de maneira coerente e equilibrada em uma peça musical
• Utilizar os recursos abordados nesta Unidade em estudos
composicionais
Unidade VI– Variações de Elementos para a Criação e Elaboração Musical

6.1. Variações Relacionadas à Harmonia

Além das possibilidades de elaboração melódica estudadas, existem diversos aspectos


relacionados às características harmônicas de uma composição, que possibilitam diferentes
manipulações, ampliando as possibilidades de criação e elaboração musical.
Entenderemos por rearmonização todos os procedimentos usados com o objetivo de modifi-
car, em diversos níveis, a harmonia original de uma composição.

a) Acréscimo de Dissonâncias:
Este tipo de rearmonização parte do princípio de que cada acorde, de acordo com o grau e
função que ocupa dentro da tonalidade, possui um conjunto de notas que representam as
potencialidades harmônicas de cada acorde, as quais são chamadas de extensões do acor-
de.

Extensões Disponíveis aos Acordes do Campo Harmônico Maior.

Campo Harmônico Maior


Acorde
Extensões Disponíveis
(Tétrade Básica)
Imaj7 6ª/13ª Maior – 2ª/9ª Maior

IIm7 2ª/9ª Maior – 4ª/11ª Justa

IIIm7 4ª/11ª Justa – 6ª/13ª menor

IVmaj7 4ª/11ª Aumentada - 6ª/13ª Maior – 2ª/9ª Maior

V7 2ª/9ª Maior – 6ª/13ª Maior

VIm7 2ª/9ª Maior – 4ª/11ª Maior

VIIm7(b5) 4ª/11ª Justa – 6ª/13ª Maior

79
Extensões Disponíveis aos Acordes dos Campos Harmônicos Menores
Campo Harmônico Menor
Acorde
Extensões Disponíveis
(Tétrade Básica)
Im7 -Im(maj7) 6ª /13ªMaior – 2ª/9ª Maior – 4ª/11ª Justa

IIm7 6ª/13ª menor – 4ª/11ª Justa

bIIImaj7 –
6ª/13ª Maior – 2ª/9ª Maior – 4ª/11ª aumentada
bIIImaj7(#5)

2ª/9ª Maior – 4ª/11ª Justa* - 4ª/11ª Aumentada** -


IVm7* – IV7**
6ª/13ª Maior

V7 9ª Maior – 9ª menor – 9ª aumentada – 6ª/13ª menor

bVImaj7 2ª/9ª Maior – 4ª/11ª aumentada – 6ª/13ª Maior

#VIIº 4ª/11ª diminuta – 6ª/13ª menor – 7ª Maior

Uma música que originalmente tem os acordes formados basicamente por tríades,
pode ser rearmonizada pelo acréscimo de dissonâncias a estes acordes. É importante ressaltar
que, a relação da melodia com estes acordes é fundamental na escolha das extensões a serem
acrescidas. Além disso, a característica estética da composição também será modificada. Ou
seja, os critérios a serem considerados nesse tipo de procedimento devem levar em considera-
ção questões de estilo, caráter, gênero, relação melódica, entre outros.

80
Exemplo:

C - F G

C7M - F7M G7

C7M/9 - F7M/9 G7/13

C6 - F6 G7/b13

C6/9 - F6/9 G7/b9

a) Substituição de Acordes de mesma função:


Outra possibilidade de reelaborarmos a harmonia de uma composição é substituirmos al-
guns acordes da harmonia original por acordes de mesma função. Pois se tratarem de acor-
des que mantêm as mesmas características funcionais e melódicas em relação à tonalidade,
tal substituição possibilita criarmos novas possibilidades de sonoridade a uma mesma me-
lodia.

Exemplo

C - F G

C Em Dm G

Em Am Dm Bm7(b5)

Am C Dm G

Além disso, podemos combinar a substituição de acordes de mesma função com o


acréscimo de dissonâncias.
81
C - F G

C7M Em7 Dm7 G7

Em7 Am7/11 Dm7/9 Bm7(b5)

Am9 C7M Dm7/11 G7/13

b) Adição de Acordes de Mesma Função:


Além da possibilidade de substituição, também podemos acrescentar novos acordes à har-
monia original. Inicialmente, veremos alguns exemplos de adição de acordes que perten-
cem às mesmas funções da harmonia original.

C - F G

C Em7 Am7 F Dm7 G7

C Em7 Am7 Dm7 G7 Bm7b5

Note que, no 2º compasso, o acorde de Am7 além de estar substituindo o acorde de


C, também pode ser entendido como um acorde adicionado, uma vez que ele não pertence à
harmonia original.

c) Adição de Acordes de função Dominante:


Os acordes de função Dominante representam uma categoria harmônica que possibilita
uma significativa expansão harmônica por se tratarem de acordes de preparação. Assim
sendo, sua utilização em processos de rearmonização é muito comum. Nesse caso, estamos
falando de todas as categorias de acordes que se enquadram nessa função – Dominantes
Secundários; Dominantes Substitutos; Diminutos de Função Dominante. Tais acordes po-
dem ser adicionados potencializando a resolução doas acordes da harmonia original.
82
Acordes Dominantes Secundários

C - F G

C7M C7 F7M G7

C7M A7 Dm7 G7

C7M E7 Am7 A7 Dm7 G7

C7M E7 Am7 A7 D7 G7

C7M E7 A7 D7 Dm7 G7

C7M A7 D7 G7

Acordes Dominantes Substitutos

C - F G

C7M Gb7 F7M G7

C7M Eb7 Dm7 G7

C7M Bb7 Am7 Eb7 Dm7 Db7

C7M Bb7 Am7 Eb7 D7 Ab7 G7 Db7

C7M Bb7 A7 D7 Ab7 G7

C7M Bb7 Eb7 Ab7 Db7

83
Note que ainda são possíveis outras várias combinações utilizando dominantes secun-
dários e substitutos.

Acordes Diminutos de função Dominante

C - F G

C7M Eº F7M G7

C7M C#º Dm7 G7

C7M G#º Am7 Dm7 G7

C7M G#º Am7 Bbº Dm7 Bº

d) Adição de Acordes de função Subdominante:


Os acordes de função Subdominante são acordes que podem ser adicionados à uma se-
quência harmônica qualquer, com a função de gerarem contraste, principalmente em mo-
mentos onde um mesmo acorde tem uma duração maior no encadeamento. Além disso,
embora não sejam acordes de preparação, criam uma sensação de movimento provocada,
justamente pelo contraste criado com outros acordes. Ou seja, o movimento é percebido
pela diferença de planos harmônicos que se estabelecem na sequência. Assim sendo, tam-
bém podem funcionar em alguns casos, como acordes de preparação.

Consideraremos todas as categorias de acordes que se enquadram nessa função – sub-


dominante principal e secundário do tom; diminuto de função subdominante; subdominante
da subdominante; subdominantes da tonalidade relativa e homônima.

84
C - F G

C7M F7M Dm7 G7

C7M Ebº Dm7 G7

C7M Am7 F7M Bb7

C7M D7 Dm7 G7

C7M Fm6 Dm7 G7

e) Adição de Acordes de função Cromática:


Nessa categoria estão todos os acordes que estabelecem uma relação de cromatismo com o
acorde de chegada. Também podem ser adicionados a uma sequência harmônica qualquer,
desde que não crie conflito harmônico-melódico com a melodia principal (assim como to-
das as outras opções já analisadas). Podemos entender sobre acordes de função cromática,
qualquer acorde que esteja meio tom acima ou meio tom abaixo do acorde de chegada, e
que possua a mesma estrutura, além dos acordes diminutos desta função. Na maioria dos
casos, estes acordes são utilizados como passagens e com breve duração.

C - F G

C7M C7M Gb F F# G

C7M Abm7 Am7 Dm7 Ab G

C7M Cº C7M F F#º G

C7M Em7 Ebm7 Dm7 G Db7M

85
f ) Adição de Acordes das tonalidades Relativas e Homônimas
Consiste em se utilizar acordes de uma mesma função, porém em outro modo. Como, do
ponto de vista tonal, as tonalidades relativas e homônimas guardam entre si características
muito próximas, os acordes gerados por essas tonalidades podem ser intercambiáveis, des-
de que respeitadas as características melódicas da composição.

C - F G

C7M Am7 Fm6 G7(b9)

C7M F7 Dm7b5 G7(b9)

C7M Eb7M Dm7 G7(b9)

C7M Eb7M Ab7M G7(b9)

C7M Eb7M Ab7M Db7M

g) Modulação
Consiste em apresentar um trecho ou toda a música, em uma nova tonalidade. Nesse caso,
esse procedimento é feito, não só no plano harmônico, mas também em relação à melodia
da composição. Muitas composições utilizam o recurso da modulação como forma de pro-
porcionar um efeito de contraste na música, gerando um maior interesse no ouvinte.
De acordo com a proximidade ou o distanciamento da nova tonalidade (ciclo de quintas), a
modulação será percebida com um maior ou menor contraste e intensidade.

C - F G

G - C D

D - G A

86
h) Ciclo Harmônico
Além dos recursos de adição de acordes apresentados anteriormente, expandiremos o
conceito de que todo acorde pode ser precedido por seu respectivo acorde dominante,
inclusive os que desempenham esta função. Como o acorde dominante encontra-se a uma
distância de 4ª justa ascendente de sua resolução, iniciamos com este processo, um ciclo de
acordes de preparação. Este ciclo de preparações pode partir tanto do acorde dominante
principal como dos dominantes secundários e substitutos. Partindo de um acorde inicial C,
o ciclo é construído da seguinte maneira:

O uso de preparações baseadas num ciclo de acordes, expande de forma significativa as


possibilidades de inserção de novos acordes à progressão original. É importante ressaltar que,
o uso de tais acordes, embora em termos de relações harmônicas seja possível, irá restringir
ao contexto musical específico, onde vários fatores incidirão sobre sua maior ou menor aplica-
bilidade. Podemos destacar como principais fatores a acomodação melódica da peça sobre a
nova harmonia, o gênero musical executado, a instrumentação do conjunto instrumental etc.

6.2. Variações Relacionadas ao Ritmo

No processo de elaboração musical, além dos aspectos que se relacionam às caracterís-


ticas harmônicas e melódicas da composição, também podemos manipular diversos elemen-
tos que se relacionam aos aspectos rítmicos da peça.

87
a)Variações agógicas – variações gradativas de andamento
b)Mudança abrupta de andamento – consiste em se alterar, de maneira súbita, sem prepa-
ração, o andamento da música.
c)Mudança de compasso - ocorre quando um trecho musical, ou toda a melodia, é adapta-
da a uma nova fórmula de compasso.

d) Deslocamento Métrico - consiste em deslocar a melodia dentro do compasso, de forma


que a relação métrica se modifique.

e) Deslocamento da acentuação - são recursos utilizados para deslocar a acentuação métri-


ca natural do compasso, como, por exemplo, o uso de sinais de acentuação, contratempos,
síncopes e hemíolas.

f ) Aumentação Rítmica - ocorre quando um trecho musical é repetido com seus valores
rítmicos aumentados. Pode ocorrer dobrando-se, triplicando-se, ou até mesmo, quadrupli-
cando-se os valores originais.

88
g) Diminuição Rítmica - é o oposto do exemplo acima. Nesse caso, o trecho é reapresentado
com uma figuração rítmica correspondente à metade, um terço ou até um quarto do valor
original.

h) Desdobramento rítmico - é quando ocorre a divisão dos valores rítmicos de um determi-


nado trecho musical.

i) Retrógrado Rítmico - Assim como foi visto com o retrógrado melódico, acontece quando
os valores rítmicos são apresentados de trás para frente.

(Fonte: Mattos, F. L. – Apostila de Análise. Universidade Federal do Rio Grande do Sul)

89
6.3. Variações Relacionadas à Intensidade

a) Mudanças gradativas de intensidade – mudança gradual de dinâmica


b) Mudança abrupta de intensidade – mudança súbita da dinâmica de um trecho musical
c) Deslocamentos da acentuação – são acentos ‘artificiais’ que enfatizam tempos que são
geralmente secundários na métrica convencional. São sempre indicados pelo sinal > sobre
ou sob o corpo da nota.

6.4. Variações Relacionadas a Timbre

a) Variações na instrumentação: substituição de instrumento – ocorre quando uma melodia


é tocada, inicialmente, por um instrumento e, posteriormente, por outro, gerando mudança
de sonoridade.
b) Troca das funções dos instrumentos – consiste na repetição de um segmento musical
com os instrumentos realizando diferentes funções das exercidas na primeira vez. Em um
quarteto de cordas, a apresentação de um tema pode ser realizada com o primeiro violino
realizando a melodia principal, o segundo e a viola realizam algum padrão de acompanha-
mento e o violoncelo, o baixo. Em uma variação posterior, a viola poderia realizar o tema e
os dois violinos, o acompanhamento.
c) Acréscimo de instrumentos – este é um recurso característico de orquestração quando o
compositor deseja criar um adensamento vertical da sonoridade.
d) Omissão de instrumentos – este procedimento gera maior rarefação da densidade verti-
cal.
(Fonte: Mattos, F. L. – Apostila de Análise. Universidade Federal do Rio Grande do Sul)

6.5. Variações Relacionadas à Textura

Textura é a forma como o tecido sonoro se entrelaça, através da combinação entre as

90
diversas partes que soam simultaneamente, gerando a sonoridade de um segmento musical.

Os principais tipos de textura musical são:

a) Monofonia – é a textura musical constituída por somente um elemento, uma única linha
melódica.

C. Debussy, Syrinx (la flûte de Pan).

b) Polifonia – é a superposição de diversas linhas melódicas independentes entre si.

J. S. Bach, Prelúdio e Fuga em Dó Maior BWV 545, Fuga.

91
c) Homofonia – é o resultado da superposição de linhas melódicas interdependentes que
formam um todo coeso e homogêneo. Este tipo de textura coloca em primeiro plano a har-
monia.
M. Moussorgsky, Quadros de uma Exposição, I.

d) Melodia acompanhada – é um tipo de homofonia em que a melodia se destaca do acom-


panhamento, seja pelo timbre (violino e piano), pela figuração rítmica, pelo registro ou pela
utilização de padrões típicos de acompanhamento (basso di Alberti).

e) Heterofonia – termo criado pelos musicólogos para descrever a música trovadoresca da


Idade Média europeia, em que os instrumentistas (jograis) realizavam variações em torno
da melodia cantada pelo menestrel. Este conceito também se aplica à música vocal de ou-
tras épocas e regiões em que os instrumentos realizam versões ornamentadas da parte vo-
cal. Por ampliação, o conceito de heterofonia também é utilizado para descrever texturas
da música ocidental dos séculos XIX e XX em que há entrelaçamentos contrapontísticos
complexos entre as partes, ou quando ocorrem planos sonoros distintos simultaneamente,
como acontece na peça Ununswered Question de C. Ives. Um tipo característico de acom-
panhamento na música do século XIX é o acompanhamento heterofônico em que o acom-
panhamento move-se independente e paralelamente à linha melódica, como ocorre no
Prelúdio Op. 28, n.º 4 de F. Chopin.

92
6.6. Variações Relacionadas à Articulação

a) Diferentes tipos de ataque – são as repetições de um trecho musical com diferentes ata-
ques (tenuto, martelato, sfz, etc.).
b) Mudança de fraseado – consiste na repetição de um segmento melódico com diferente
fraseado (legato, non legato, staccato, etc.).
c) Diferentes sonoridades do mesmo instrumento – através da utilização de vibrato, tremo-
lo, etc.

(Fonte: Mattos, F. L. – Apostila de Análise. Universidade Federal do Rio Grande do Sul)

93
VII
Unidade VII -
Análise Harmônica de
Peças do Repertório da
Música Popular

Objetivos da Unidade
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta unidade, você
seja capaz de:

• Compreender os principais encadeamentos harmônicos en-


contrados no repertório da Música Popular e como se relacio-
nam com a tonalidade em questão.
• Reconhecer aspectos relacionados à rearmonização, a partir
da análise das diversas categorias de acorde que não estão dire-
tamente relacionados ao tom principal.
• Utilizar os recursos abordados nesta Unidade em estudos
composicionais
Unidade VII - Análise Harmônica de Peças do Repertório da Música Popular

A partir desta Unidade, nossos estudos de análise se voltarão ao repertório da Música


Popular, mais especificamente para o Jazz norte americano e peças do repertório da Música
Popular Brasileira.
Basicamente, o foco será a análise harmônica, o que condiz com o conceito já citado de
que, na prática da Música Popular, o interprete tem uma maior liberdade na execução da peça,
em relação à melodia, ao acompanhamento e, inclusive, sobre a própria harmonia, desde que
os caminhos harmônicos essenciais estejam claramente definidos.
Assim sendo, compartilharemos da ideia proposta por Aragão, onde, “dada essa dificul-
dade na delimitação do “original”, talvez o mais correto seja considerar que a música popular
não tem um original, ao menos no sentido em que o tem a música clássica. A melhor alterna-
tiva seria considerar que, na música popular, a “instância original” de que falamos seja virtual,
pelo menos em um plano teórico e ideal de análise. Deste modo, qualquer execução de obra
popular prescindiria necessariamente de um arranjo, o que parece outorgar ao arranjo a con-
dição de processo inerente a essa música”.

7.1. Músicas que utilizam acordes de um mesmo Campo Harmônico

Após termos estudados diversos aspectos relacionados à análise da construção de di-


ferentes melodias, assim como suas estruturas formais, passaremos agora a algumas análises
harmônicas de peças relacionadas ao repertório da Música Popular, de diferentes gêneros.
O objetivo é compreendermos os vários caminhos possíveis de harmonizarmos uma mesma
melodia, assim como, entender a relação melódica com acordes que não estejam diretamente
relacionados ao centro tonal principal.
As análises harmônicas abaixo, apresentam encadeamentos harmônicos baseados, es-
sencialmente, nos acordes encontrados no próprio Campo Harmônico:

95
Killing Me Softly – Música: Charles Fox / Letra: Norman Gimbel
TOM: Ab

96
Fly Me To The Moon – Bart Howard
TOM: C

97
Caçador de Mim – Sérgio Magrão e Luís Carlos Sá
TOM: Bb

Somos Quem Podemos Ser – Humberto Gessinger


TOM: G

98
Por Enquanto – Renato Russo
TOM: Db

Beautiful Love – Victor Young


TOM: Dm

99
My Funny Valentine – Rodgers & Hartz
TOM: Cm

A Noite do Meu Bem – Dolores Duran


TOM: Gm

100
A Volta do Boêmio – Adelino Moreira
TOM: Am

101
Manhã de Carnaval – Luiz Bonfá
TOM: Am

102
Músicas que utilizam acordes Dominantes Secundários

All of Me – Simon & Marks


TOM: C

*II – Este acorde, embora possa parecer um acorde de função Dominante, trata-se de um acor-
de “emprestado” da tonalidade relativa (Lám). Nessa tonalidade representa o IV originado das
alterações da escala menor melódica. Sua função é de Subdominante.

103
Unidade VIII -

VIII
Análise Harmônica de Peças do
Repertório da Música Popular
com cadência II V I

Objetivos da Unidade
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta unidade, você
seja capaz de:

• Compreender os principais encadeamentos harmônicos en-


contrados no repertório da Música Popular e como se relacio-
nam com a tonalidade em questão.
• Reconhecer aspectos relacionados à rearmonização, a partir
da análise das diversas categorias de acorde que não estão dire-
tamente relacionados ao tom principal.
• Utilizar os recursos abordados nesta Unidade em estudos
composicionais
Unidade VIII- Análise Harmônica de Peças do Repertório da Música Popular
com cadência II V I

8.1. A Cadência II - V

Na música popular, de uma forma geral, o uso de cadências II – V – I é um eficiente re-


curso de preparação para outros acordes do mesmo Campo Harmônicos, ou para encaminhar
a harmonia para diferentes centros tonais. Muitos autores buscam relacionar tais acordes, sem-
pre à tonalidade principal. Em muitos casos, esse tipo de análise gera explicações e análises
muito complexas, o que, na grande maioria dos casos, afasta o estudante de uma compreensão
que esteja próxima, efetivamente, de aspectos práticos-composicionais dessa música.
Em princípio, muitas das análises podem parecer simplificadas, haja vista a quantidade de ca-
dências II – V – I que as mesmas apresentam. Mais isso, de forma alguma, desqualifica a análise.
Do ponto de vista tonal, o meio de preparação usado para se chegar a um determinado acorde
ou centro tonal acaba importando menos do que, para qual região tonal a música está se en-
caminhando, e qual a relação dessa nova tonalidade com a tonalidade principal. Assim sendo,
mais importante que reconhecer uma cadência II – V – I, é reconhecer a relação existente entre
a nova tonalidade e o tom original.
Assim sendo, sempre que estivar fazendo uma análise harmônica desse tipo de repertó-
rio, ao se deparar com um acorde menor com sétima – Xm7, seguido de um acorde maior com
sétima – X7, é bem provável que se trata de uma cadência II – V.

105
8.2. Análise de Cadências II – V – I

Bluesette – Toots Thielmans


TOM: B

106
• Am7b5 – D7 – Gm
• Gm7 – C7 – F/Fm
• Fm7 – Bb7 – Eb
• Ebm7 – Bb7 – Db
• Dbm7 – Gb7 – Cb
• Cm7 – F7 – Bb

All The Things You Are


Tom: Ab

107
• Bbm7 – Eb7 – Ab
• Fm7 – Bb7 – Eb
• Am7 – D7 – G
• F#m7 – B7 – E

How High the Moon


Tom: G

• Gm7 – C7 – F
• Fm7 – Bb7 – Eb
• Am7 – D7 – G
• Am7b5 – D7 – Gm

108
Afternoon in Paris
Tom: C

• Cm7 – F7 – Bb
• Bbm7 – Eb7 – Ab
• Dm7 – G7 – C

109
Giant Steps – John Coltrane

• Am7 – D7 – G
• Fm7 – Bb7 – Eb
• C#m7 – F#7 – B

110
Análises envolvendo acordes Diminutos e Dominantes Substitutos

My Romance – Richard Rodgers


TOM: C
bIIIº - Diminuto de função Subdominante

111
Avarando – Caetano Veloso
TOM: A

Iº - Diminuto de função cromática

Discussão - Tom Jobim e Newton Mendonça


TOM: C

112
bIIIº - Diminuto de função subdominante
#IIº - Diminuto de função Cromática
*bIIIº - como a harmonia está se dirigindo para o acorde de Gm, esse diminuto assume a função
dominante.

Body and Soul - Green


TOM: Db

113
IX
Unidade IX -
Análise Harmônica
de Transcrições

Objetivos da Unidade
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta unidade, você
seja capaz de:

• Compreender os principais recursos utilizados pelo intérpre-


te na reelaboração harmônica e melódica das peças analisadas.
• Utilizar os exemplos estudados como modelos para serem
aplicados em situações similares.
• Utilizar os recursos abordados nesta Unidade em estudos
composicionais
Unidade IX - Análise Harmônica de Transcrições

Nesta última unidade deste Guia de Estudos, serão mostradas algumas análises de
transcrições musicais, que podem exemplificar, de maneira prática, muitos dos conteúdos e
procedimentos composicionais estudados nas unidades anteriores. Os exemplos escolhidos
têm como base importantes estruturas formais da Música Popular, como é o caso do Blues e
do Rhythm Changes. Embora as transcrições sejam de interpretações realizadas na guitarra
ou no violão, os conceitos analisados em cada situação podem ser transpostos para, de uma
forma geral, para diversos outros instrumentos. Além disso, não se trata de uma análise técnica
específica de um instrumento, e sim, de procedimentos musicais tais como – rearmonização,
improvisação, arranjo, etc.

9.1. Análise de Rearmonizações de harmonias de Blues

O Blues tem uma importância expressiva na Música Popular do século XX. Gênero musi-
cal cujas origens se remetem aos cantos de trabalho dos negros norte-americanos, influenciou
de forma significativa o jazz e a Música Popular Brasileira. No que tange à sua estrutura harmô-
nica, apesar do Blues, tradicionalmente, possuir um encadeamento baseado em apenas três
acordes, foi desenvolvida uma enorme potencialidade de rearmonizações, bem como novas
combinações harmônicas que transformaram esta música em um dos principais modelos de
reestruturação harmônica na Música Popular.
O exemplo abaixo traz uma transcrição do comping de 1 chorus de Blues em Fá maior,
tocado pelo guitarrista americano Barry
Galbraith. Nascido em 1919, Galbraith foi um dos principais guitarristas de estúdio de
Nova York nos anos 50 e 60. Como líder, aparentemente, gravou apenas um disco, chamado
Guitar and the Wind. Ficou conhecido por sua excepcional leitura musical e habilidades como
músico acompanhante.
Esta transcrição foi tirada do livro “Guitar Comping” que traz uma série de transcrições

115
de acompanhamentos tocados por Barry Galbraith em algumas peças importantes do repertó-
rio jazzístico.

• Progressão Harmônica Tradicional do Blues:

II: F7 I % I % I % I

I Bb7 I % I F7 I % I

I C7 I Bb7 I F7 I C7 : II

• Progressão de Blues Rearmonizada:

II: F7 I Bb7 I F7 I Cm7 F7 I

I Bb7 I Bº I F7 I D7 I

I Gm7 I C7 I F7 D7 I Gm7 C7 :II

______________________________________________
6 O termo comping se refere a um tipo de acompanhamento onde se estabelece uma relação mais íntima entre
seção rítmica e solistas. O músico acompanhante tem por objetivo estimular o solista, ritmicamente e harmo-
nicamente. Originalmente, se tratava de uma forma de acompanhamento em que os acordes eram colocados
nos espaços deixados pela melodia, estabelecendo-se assim, um diálogo entre solista e seção rítmica (comp =
complemento). A técnica do comping envolve um grande conhecimento de aberturas de acordes, desenvoltura
rítmica e a necessidade de estar sempre atento ao solista para que se possa criar um diálogo entre as idéias apre-
sentadas por ambos no discurso musical. LEVINE, Mark. The Jazz Piano Book. Petaluma, CA: Sher Music Co., 1989.
AEBERSOLD, Jamey. Rhythm Section Work-Out. New Albany : Jamey Aebersold, 1984, Vol. 30.

7 Termo usado pra nos referirmos à estrutura formal da composição.

8 AEBERSOLD, Jamey. Guitar Comping. New Albany, IN: Aebersold Publications, 1986.

116
• Harmonia tocada por Barry Galbraith:

Obs. As cifras abaixo representam as tônicas e as extensões da harmonia original, e não


das tétrades escritas.

Sobre o acorde F7, Galbraith utilizou uma tétrade de F7 em 3ª inversão substituindo a


5ª do acorde – nota dó – pela 13ª – nota ré, dando origem a uma tétrade de F7/13 em 3ª inver-
são – nota mi bemol no baixo. Para gerar mais movimento harmônico, baseado na relação de
preparação e resolução entre os acordes, proporcionou dentro do mesmo compasso, um mo-
vimento tônica-dominante, utilizando uma tétrade de Emaj7b5 (mi-sol#-sib-ré#), em estado
fundamental, para substituir os principais acordes de preparação de F7, os acordes C7 – domi-
nante principal e Gb7 – dominante substituto. Como esta tétrade não possui a fundamental do
acorde em ambos os casos, podemos entendê-lo tanto do ponto de vista de C7 como de Gb7.
No primeiro caso, as notas ré# e sol # representariam, respectivamente, os intervalos de 9ª au-
mentada e 5ª aumentada de C. O acorde resultante seria de C7(#9/#5). Já no segundo caso, as

117
mesmas notas representariam as extensões 13ª maior e 9ª maior do acorde de Gb resultando,
assim, no acorde Gb7(13/9). Levando em consideração que este comping foi extraído de uma
gravação onde a seção rítmica era composta por baixo, bateria e guitarra, uma análise exata no
sentido de descobrir qual acorde foi substituído necessitaria da transcrição da linha melódica
do baixo. Porém, para o presente estudo, ela é desnecessária já que, como em ambos os casos
a função do acorde é a mesma – preparar a volta ao acorde F7. Tanto o acorde de C7 como Gb7,
cumprem essa função e, em ambos os casos, as dissonâncias acrescidas aos acordes respeitam
as possíveis extensões harmônicas de cada um. É importante ressaltar que esta preparação não
é resolvida, o que não desqualifica a função do acorde.

Compasso 2:

Neste compasso, observa-se um tipo de rearmonização muito comum no blues, carac-


terizada pelo uso do acorde do IV grau já no segundo compasso. Aqui, Galbraith fez uso de duas
tétrades diferentes para substituir o acorde Bb7. No primeiro caso, utilizou a tétrade de Dm7b5
(ré-fá-láb-dó), resultando em um acorde de Bb7/9 sem fundamental. Em seguida, explorou a
sonoridade da tétrade Abmaj7b5 (láb-dó-mibb-sol) que gera uma abertura de Bb7/9/13, sem
fundamental. Vale notar que ao encadear estas duas tétrades, foi possível um acréscimo grada-
tivo das extensões do acorde. Primeiro com a 9ª e em seguida a 13ª.

Compasso 3: Idem compasso 1.

118
Compasso 4:

Observa-se, neste compasso, a resolução ao acorde F7 cujo processo de preparação foi


descrita no compasso 1. Em seguida, um outro procedimento comum de rearmonização no
Blues pode ser notado. Como no compasso seguinte (compasso 5), a harmonia dirige-se para
o IV grau da tonalidade, pode-se preparar a chegada a este acorde. Já que o acorde dominante
correspondente do IV grau (dominante secundário) é o próprio F7 , torna-se necessário que
este assuma a função de dominante. Para isso, Galbraith aumentou o seu grau de dissonância
utilizando uma tétrade de Ebmaj7b5 (mi-sol-sibb-ré) em 2ª inversão – nota lá (sibb enarmoni-
zada) no baixo. O uso desta tétrade sobre F7 resulta em um acorde de F7/9/13. Porém, para que
o grau de dissonância fosse ainda maior, Galbraith substituiu a 9ª maior (sol) pela 9ª aumen-
tada. No mesmo compasso, empregou ainda a tétrade Am7b5 em estado fundamental, origi-
nando um acorde de F7/9. O encadeamento destes dois acordes valorizou a linha melódica das
notas agudas das tétrades.

Compasso 5:

______________________________________________
9 Por se tratar de um I grau blues, o acorde F7, apesar de se configurar em um acorde maior com sétima menor,

não possui função dominante.

119
A mesma ideia apresentada no compasso 1, sobre gerar movimento harmônico basea-
do na relação de preparação e resolução entre os acordes, aparece agora no compasso 5 sobre
o IV grau. Neste caso, verifica-se novamente o uso da tétrade Dm7b5 substituindo o acorde
Bb7 e a utilização da tétrade de Amaj7b5 em 2ª inversão, substituindo os possíveis dominantes
de Bb7 – F7, dominante secundário e B7, dominante substituto. Como neste caso, as tétrades
também não abrigam as fundamentais dos acordes, pode-se interpretar esta substituição tan-
to do ponto de vista de F7, como de B7. No primeiro caso teremos como extensões as notas
dó# e sol#, respectivamente 5ª e 9ª aumentadas. Se analisarmos as alterações sobre o acorde
B7, as mesmas notas representarão a 9ª maior e 13ª maior do acorde.

Compasso 6:

A preparação gerada no compasso anterior é resolvida, voltando-se ao acorde Bb7,


substituído pela tétrade de Dm7b5. Em seguida promove-se a volta ao acorde do I grau por
meio da tétrade de Bº em 3ª inversão, nota sol# no baixo. O uso do #IVº é um recurso de pre-
paração originário do Blues o qual predispõe a volta ao I grau da tonalidade. Este recurso pode
ser observado em outras composições que não se caracterizam na forma Blues. O uso deste
acorde em 3ª inversão valoriza a condução melódica da linha do baixo dos acordes a qual se dá
por movimento cromático ascendente já que, no compasso seguinte, Galbraith volta ao I grau
com uma tétrade de Am7b5 em estado fundamental.

Compasso 7 e 8:

120
Verifica-se aqui a resolução no I grau promovida pelo acorde diminuto no compasso anterior.
Logo em seguida, Galbraith, visando como ponto de chegada o acorde Gm7 no compasso 8,
promove uma progressão de acordes que resultará no acorde de D7, dominante secundário de
Gm7. Partindo de Am7b5, utilizou em seguida as tétrades de Ab7(b5) em estado fundamental
e Dbmaj7b5 em 2ª inversão. O uso destas três tétrades originou um importante procedimento
harmônico caracterizado pela presença de uma nota comum aos acordes, nota pedal, neste
caso localizada na “ponta dos acordes”, ou seja, na voz mais aguda.

Compassos 9 e 10:

Neste compasso inicia-se a cadência IIm7-V7-I, já no final do chorus. Para representar o


acorde Gm7 (II grau) foi utilizada a tétrade de G7sus4, resultando em um acorde de Gm7/11,
sem terça. Embora este acorde esteja incompleto do ponto de vista estrutural, o uso deste
acorde sobre o II grau é facilmente observado. Neste caso a condução melódica entre o II e
V7 graus garante a presença deste acorde sem terça, pois o próximo acorde traz no baixo a
nota sib, 7ª de C7 (V7) e 3ª menor de Gm7. A tétrade usada neste caso foi a de Bbma7(b5) em
estado fundamental na posição fechada, o que resulta em um acorde de C7/9/13. Em seguida,
Galbraith ainda utiliza duas aberturas de acordes “sus” antes da resolução em F. No primeiro,
para originar o acorde C9sus4, valeu-se da tétrade de Bbm7(#5) em 3ª inversão em drop3. No
segundo acorde, também C9sus4, foi utilizada a a mesma tétrade de Bbmj7(#5) só que agora
em posição drop2. A cadência termina na tétrade de Dm7 em estado fundamental – drop2,
dando origem a um acorde de F6.

Compassos 11 e 12:

121
Os dois últimos compassos são dedicados aos acordes do turnaround¹. Aqui, obser-
va-se também a utilização da nota pedal na “ponta dos acordes”. A cadência harmonizada é
representada pela sequência dos graus VI – II – V. No primeiro acorde, o uso da tétrade de Ab7
em 3ª inversão, sem 5ª e com 13ª, acrescenta ao acorde do VI grau, as extensões 7ª, #9 e #11
(D7/#9/#11). No próximo acorde, a tétrade de Fº(maj7) sobre o acorde do II grau, transforma-o
em um acorde de G7/b9/13. E finalmente, sobre o acorde do V grau, é empregada a tétrade de
Emaj7(b5), originando o acorde C7/#9/#5. Nestes três acordes, a nota mais aguda sempre foi a
nota lá bemol, 11ª aumentada, 9ª menor e 5ª aumentada respectivamente.

9.2. Considerações sobre a análise.

Pôde-se verificar, por meio da análise, a utilização das tétrades na harmonização de


todo o chorus do Blues. Importantes recursos de rearmonização foram empregados, desde a
substituição de acordes com o intuito de se alcançar determinadas extensões não encontradas
na estrutura básica do acorde, até a utilização de acordes estranhos à harmonia original da
peça. As formas encontradas por Barry Galbraith para gerar maior movimento harmônico, a
maneira encontrada para preparar o acorde do II grau nos compassos 7 e 8, as ideias de subs-
tituição de tétrades, e os encadeamentos com nota pedal, são exemplos que podem e devem
ser empregados em situações harmônicas similares.

122
X
Unidade X - Análise de
Rearmonizações para
harmonia de
Rhythm Changes

Objetivos da Unidade
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta unidade, você
seja capaz de:

• Compreender os principais recursos utilizados pelo intérprete


na reelaboração harmônica e melódica das peças analisadas.
• Utilizar os exemplos estudados como modelos para serem
aplicados em situações similares.
• Utilizar os recursos abordados nesta Unidade em estudos
composicionais
Unidade X - Análise de Rearmonizações para harmonia de Rhythm Changes

O termo Rhythm Changes10 tem origem no fim da década de 40 para designar um tipo
de composição jazzística cuja forma e estrutura harmônica são similares à música “I Got Rhy-
thm” do compositor americano George Gershwin (1898-1937). Composta para o musical da
Brodway “Girl Crazy”11 (1930), esta composição despertou o interesse de importantes músicos
do Bebop , como Charlie Parker, Dizzy Gillespie, Thelonius Monk, Sonny Rollins entre outros,
por sua interessante e desafiadora estrutura harmônica, na qual poderiam desenvolver novas
possibilidades de improvisação melódica. Possui 32 compassos e é estruturada na forma AABA.
Esta composição serviu de modelo para o surgimento de inúmeras novas melodias
compostas sobre sua estrutura harmônica, prática que se difundiu amplamente entre as dé-
cadas de 40 e 50, e que foi chamada de Contrafact11 pelo músico americano e pedagogo do
jazz David Baker. O Rhythm Changes é considerado o segundo principal contrafact na Música
Popular, ficando atrás somente do Blues.
Assim como o Blues, o Rhythm Changes também é passível de inúmeras reestrutura-
ções harmônicas que podem ser encontradas em diferentes gêneros de composição da Música
Popular.
A seguinte transcrição também faz parte da série de transcrições do guitarrista Barry
Galbraith, encontradas em seu livro “Guitar Comping”.

Harmonia Original de “I Got Rhythm”.

______________________________________________
10Rhythm Changes – O termo faz referencia à composição “I Got Rhythm” do compositor americano George
Gershwin, onde o termo “Changes”, significa a seqüência harmônica da peça, os acordes da composição. Daí a
expressão – Changes de I Got Rhythm – Seqüência Harmônica de I Got Rhythm.
11 Período da História do Jazz iniciado na década de 40.
BERENDT, Joachin E. O Jazz do Rag ao Rock. São Paulo. Editora Perspectiva, 1987.
12BAKER, David. How to Learn Tunes. New Albany, IN. Jamey Aebersol Jazz, Inc, 1997.

124
Transcrição do comping tocado por Barry Galbraith:

125
Compasso 1:

Na harmonia original da música, os quatro primeiros compassos são caracterizados por


uma sequência harmônica I-VIm7-IIm7-V7. A abertura escolhida no início da peça é um acorde
de Bbmaj7 em estado fundamental – posição drop2.A primeira modificação efetuada pelo gui-
tarrista se dá no acorde do VI grau que é transformado em um acorde dominante secundário
do II grau – G7, e, em seguida, substituído pela tétrade de Bº. O acorde de Bº é formado pelas
notas si-ré-fá-láb, que sobrepostas à tônica G, transformam este acorde em uma Dominante
com 9ª menor – G7(b9).

Compasso 2:

A resolução acontece no II grau com o acorde Cm7 em estado fundamental – posição


drop2 e mais uma vez, o acorde diminuto, neste caso C#º, aparece preparando a chegada, no
terceiro compasso, da tétrade de Dm7 também de função tônica.

126
Compassos 3 e 4:

Com a resolução na tétrade de Dm7, é importante notar que, ao substituir os acordes


dominantes por tétrades diminutas, Galbraith criou uma linha melódica cromática no baixo
dos cinco primeiros acordes, favorecendo a condução melódica entre eles. A partir daí, o gui-
tarrista escolhe novas tétrades para harmonizar a mesma seqüência VI7 – IIm7 – V7 – I. Para o
dominante secundário do II grau, usou a tétrade de G7(#5) em 3ª inversão – posição drop2. Sua
resolução se deu mais uma vez na tétrade de Cm7 em estado fundamental – posição drop2, e
em seguida, representou o acorde dominante com a tétrade de F7 em 3ª inversão, substituindo
a 5ª pela 13ª.

Compassos 5 e 6:

Neste momento a harmonia começa a se dirigir para o IV grau da tonalidade (Eb). As-
sim, a resolução promovida pelo acorde F7, no compasso anterior, acontece no acorde de Bb7,
dominante secundário do IV grau. Galbraith aproveitou a mesma abertura de acorde usada an-
teriormente, só que agora sobre a tônica Bb. A resolução se deu na tétrade de Ebmaj7/9, onde,
partindo-se de uma tétrade de Ebmaj7 em estado fundamental – drop2, substitui-se a quinta
pela 3ª, e a 3ª pela 9ª.

Compassos 7 e 8:

127
De acordo com a harmonia original, a seqüência harmônica nestes compassos é Imaj7
– VIm7 – IIm7 – V7. Porém, os acordes tocados são Ab7(b5) – G7(#5) – Gb7(b5) – B9. Mais uma
vez, o conceito de preparação e resolução se mostra eficaz para compreender o raciocínio har-
mônico de Barry Galbraith. Partindo do princípio de que diferentes acordes de um Campo Har-
mônico podem ser preparados por seus respectivos dominantes, o I grau foi substituído pelo
acorde D7, dominante secundário de G7 (VI grau) que por sua vez também foi substituído por
seu SubV7 13
– Ab7(b5) em estado fundamental – posição drop3. Logo após a resolução no
acorde do VI grau, também caracterizado em dominante secundário pela tétrade G7(#5) em
estado fundamental – drop3, nota-se o mesmo raciocínio sobre o acorde do II grau. Aqui, o
II grau também aparece estruturado na função dominante e é substituído por seu respectivo
SubV7 secundário – Gb7(b5). Para finalizar esta cadência caracterizada pelo uso recorrente de
acordes SubV7, o Dominante Principal – F7 - também é trocado por seu SubV7, o qual aparece
estruturado em um acorde de B7/9 em posição fundamental, sugerindo um movimento de
fundamentais cromático na resolução no acorde de Bbmaj7.

Compassos 9 e 10:

______________________________________________
13 SubV7 – neste caso, o acorde SubV7 assume a função de Dominante Substituto Secundário, por se relacionar,
não ao dominante principal da tonalidade, mas a um acorde dominante secundário.

128
Inicia-se a repetição da sequência apresentada nos primeiros quatro compassos. A ideia
de substituição dos acordes dominantes por tétrades diminutas se mantém nestes compassos.
Porém, ao invés de tétrades diminutas, Galbraith utiliza a sonoridade da tétrade diminuta com
sétima maior. Para o acorde G7, utilizou a tétrade de Abº(maj7). Na preparação do acorde Dm7,
foi usada a tétrade de Bbº(maj7).

Compassos 11 e 12 :

A principal observação nestes compassos é a continuação do uso da tétrade diminuta


com sétima maior (segundo acorde do compasso 11), agora proporcionando ao acorde do-
minante novas possibilidades de extensões. A tétrade escolhida é a de Bº(maj7) que ao so-
brepor-se à tônica G, gera o acorde de G7/#9. Após a resolução no acorde de Cm7 em estado
fundamental – drop3, o acorde de F7 é substituído pela tétrade de Dbmaj7(b5) em 2ª inversão
– posição drop2, gerando o acorde de F7/9/13.

Compassos 13 e 14:

Novamente a harmonia caminha para a região da Subdominante com uma cadência


IIm7 – V7 de Eb – IV grau da tonalidade. Sobre o acorde do II grau secundário, Galbraith usou a
tétrade de Abmaj7 substituindo sua 3ª (nota dó) pela 9ª (nota sib). Vale lembrar que esta tétra-
de foi sobreposta ao acorde de Fm7. Logo, a 3ª real deste acorde é a nota láb. Para chegar ao
acorde de Bb7, o guitarrista simplesmente desceu a nota mib meio tom abaixo, transforman-

129
do-a em uma tétrade de Bb7 em 3ª inversão sem 5ª e com 13ª. O compasso 14 é caracterizado
por um importante clichê harmônico que pode ser entendido como uma espécie de prepara-
ção para a tônica, o IV grau menor , no caso Ebm. Normalmente, este acorde aparece em situa-
ções em que o centro tonal se transfere para a região da subdominante e serve de ponte para
o retorno ao centro tonal principal. Para harmonizar este trecho, Galbraith aproveitou a idéia
usada anteriormente na cadência IIm7 – V7, entretanto optou em tocar apenas as notas guias
dos acordes (notas solb e réb, 3ª e 7ª respectivamente). Como na cadência anterior, ao abaixar
a notar réb (7ª menor de Eb) meio tom abaixo – nota dó, o intervalo formado pelas notas solb e
dó pode ser entendido como 7ª menor e 3ª maior do acorde de Ab7, ou 3ª menor e 6ª maior de
Ebm6. Em ambos os casos, a função dos acordes é similar. O acorde de Ebm6 pode ser entendi-
do como uma possível extensão do acorde de Ab7, onde mib é a 5ª de láb, solb a 7ª menor, sib
a nona, e dó a 3ª maior.

Compassos 15 e 16:

Embora a sequência original nestes dois compassos seja a mesma progressão I – VIm7 –
IIm7 – V7, no compasso 17 inicia-se a parte B da composição. Sendo assim, Galbraith antecipa
a conclusão em Bb ainda no compasso 16. O recurso usado também pode ser considerado uma
espécie de clichê harmônico, onde o I grau dirige-se para o III, ambos de função tônica, pas-
sando pelo II grau, e, acrescentando uma passagem cromática entre os graus II e III. É possível,
dessa forma, ocasionar movimento harmônico sem se afastar da região da tônica. A principal
observação se dá na estrutura dos acordes usados pelo guitarrista. Partindo de tétrades em
estado fundamental – posição drop2, Galbraith omite a 5ª dos acordes.

130
Compassos 17 e 18:

A partir do compasso 17 inicia-se a parte B da composição cuja estrutura harmônica se


tornou uma das principais particularidades da forma Rhythm Changes. Baseia-se em um ciclo
de acordes dominantes separados por intervalos de quarta justa ascendente, iniciado sobre o
III7 da tonalidade e encerrado sobre o Dominante Principal. Neste trecho, Barry Galbraith uti-
liza o conceito de que “todo acorde dominante pode ser precedido por seu respectivo II grau
cadêncial”, e introduz diferentes aberturas de acorde para harmonizar cada um dos acordes do
ciclo. No primeiro caso, precede o acorde D7 com o acorde Am7, e utiliza as tétrades de A7sus4
em estado fundamental – drop2, resultando no acorde Am7/11 e Cmaj7 em 2ª inversão, tam-
bém em drop2, resultando no acorde de Am9. Ainda utiliza uma passagem cromática por meio
do acorde Dbmaj7 em 2ª inversão – drop2 para conectar estes dois acordes. A tétrade usada
sobre D7 foi a de F#m7(b5) em estado fundamental – drop2, introduzindo a 9ª maior ao acorde
(D7/9).

Compassos 19 e 20:

Nestes dois compassos a harmonia está sobre o acorde de G7. Assim como nos com-
passos anteriores, Galbraith precede o acorde dominante por seu respectivo II grau cadencial
– Dm7. No compasso 19 são usadas duas tétrades para harmonizá-lo. A primeira é uma tétrade
de Fmaj7, onde o guitarrista substituiu a 3ª, nota lá, pela 9ª, nota sol. Vale lembrar que este
acorde está sobreposto à tônica ré. Dessa forma, ao substituir a nota lá pela nota sol, o guitarris-
131
ta adiciona a 11ª ao acorde, em detrimento de sua 5ª. Além disso, a tétrade de Fmaj7 acrescenta
ao acorde de Dm7, sua 9ª maior. Em seguida, usa a tétrade de Dm7 em estado fundamental –
drop2. Para o acorde de G7, as tétrades usadas foram as de G7 em estado fundamental – drop3,
substituindo a 5ª pela 13ª maior, e em seguida, a tétrade de Bm7(b5), gerando um acorde de
G7/9.
Cabe aqui uma importante observação quanto à condução melódica dos acordes nos
quatro primeiros compassos da parte B. A partir do acorde Am7/11, inicia-se uma linha meló-
dica descendente em graus conjuntos na voz aguda dos acordes. (ré-do-si-lá-sol-fá-mi-ré). Essa
relação melódica entre os acordes foi de grande importância para que todas as rearmoniza-
ções promovidas pelo guitarrista não comprometessem a harmonia original da composição.

Compassos 21 e 22:

Observa-se aqui a repetição da idéia apresentada no compasso 17. Neste caso a harmonia se
encontra sobre o acorde de C7 que é precedido pelo acorde Gm7 com as tétrades G7sus4 em
estado fundamental, gerando um acorde de Gm7/11 e Bbmaj7 em 2ª inversão e ocasionando
um Gm7/9. Essas duas tétrades são conectadas por uma passagem cromática da tétrade de
Bbmaj7 em 2ª inversão. No compasso 22, Galbraith ainda explora um pouco mais os recursos
da aproximação cromática, finalizando o compasso em um acorde de Gb7/9 que será resolvido
no acorde de F7/9 no compasso seguinte.

Compassos 23 e 24:

132
Compassos 25 e 26:

O principal mecanismo de rearmonização nestes compassos é o emprego de acordes


Dominantes Substitutos – SubV7 - sobre os graus VI7 e V7. Sobre o acorde G7, Galbraith utilizou
a tétrade de Db7 em estado fundamental, posição drop3, substituindo a 5ª pela 13ª. E, sobre o
acorde de F7, a tétrade de B7 em estado fundamental, posição drop3, também sem 5ª com 13ª.

Compassos 27 e 28:

A progressão I – VI7 – IIm7 – V7 é apresentada agora com as seguintes tétrades:


Sobre o I – G7sus4 em 2ª inversão – posição drop2, resultando em Bb6/9;
Sobre o VI7 – G7(#5) em 3ª inversão – posição drop2, resultando em G7(#5);
Sobre o IIm7 – Cm7 em 2ª inversão – posição drop2, resultando em Cm7;
Sobre o V7 – Ebmaj7(b5) em 2ª inversão – posição drop2, resultando em F7/9/13.
Ainda no compasso 28 Galbraith antecipa o acorde de Bb7, usando a tétrade de Bb7 em
3ª inversão, sem 5ª com 13ª.

Compassos 29 a 32:

133
Após a pausa no compasso 29 que estaria sobre a região da subdominante, o acorde de
Bb é atingindo por meio de uma cadência IIm7 – V7, representada pelas tétrades de Cm7 em
2ª inversão sobre o II grau e Gº sobre o V7. Sobre o I grau é tocada a tétrade de Gm7 em estado
fundamental, resultando no acorde de Bb6.

10.1. Considerações sobre a análise:

Apesar de, em alguns momentos, Galbraith abrir mão do uso de tétrades na harmoni-
zação de determinados acordes, pode-se perceber facilmente a predominância desta estrutura
ao longo de todo o chorus.
Com relação aos mecanismos de rearmonização utilizados, merecem destaque, o uso
recorrente do III grau na função de Tônica e a conexão do I grau a este acorde por meio de té-
trades diminutas, valorizando a linha melódica do baixo. Além disso, a sonoridade dos acordes
Dominantes Substitutos é bastante explorada.
É importante ressaltar que a condução melódica entre os acordes neste comping foi
fundamental para garantir que as elaborações harmônicas aqui apresentadas não prejudicas-
sem a estabilidade tonal da peça, proporcionando uma maior fluidez na mudança dos acordes.
As próximas duas transcrições que se seguem, na verdade, não são de gravações de guitarris-
tas, e sim de violonistas brasileiros. Apesar de o trabalho se tratar de um estudo aplicado à gui-
tarra elétrica, na Música Popular Brasileira, o violão, merece o reconhecimento de instrumento
típico deste gênero. Sendo assim, a tradição violonística de acompanhamento, foi assimilada
pelos guitarristas e incorporada à linguagem do instrumento.
Este primeiro exemplo traz a transcrição tocada pelo violonista carioca Oscar Castro
Neves na introdução da música “Brigas Nunca Mais” (Tom Jobim e Vinícius de Moraes), no anto-
lógico disco Elis e Tom de 1974 – Philips. Oscar Castro Neves foi um importante representante
do movimento bossa-novista na década de 50, ao lado de Tom Jobim, João Gilberto, Carlos
Lyra, Roberto Menescal, Nara Leão, entre outros.

134
Bb6/9 Ebm6/9 Bb6/9 Ebm6/9

Bb6/9 Eb6/9 Dm7b5(9) G7#5(b9)

Cm7/11 G7#5(#9) Cm7/11 F7/13

Compassos 1 e 2:

Na tonalidade de Bb maior, a introdução começa sobre uma progressão harmônica bas-


tante encontrada na Música Popular e caracterizada pela seqüência I – IVm. Ao explorar a re-
gião aguda do instrumento, Castro Neves utiliza a tétrade de G7sus4 em 2ª inversão – posição
drop2 sobre Bb, gerando o acorde de Bb6/9. Em seguida, antecipando o acorde de Ebm, ainda
no primeiro compasso, emprega a tétrade de Gbmaj(b5) em 2ª inversão – drop2, acrescentan-
do assim, as extensões 6ª Maior e 9ª Maior a este acorde. A idéia é repetida nos compassos 3 e
4.

135
Compassos 5 e 6:

No compasso 5, Oscar Castro Neves ainda utiliza a tétrade de G7sus4 para harmonizar o
acorde de Bb. A novidade se dá sobre o acorde de Ebm que agora é antecipado por uma tétra-
de de F7sus4 em 2ª inversão – drop2. Neste acorde o violonista substitui a 7ª da tétrade (nota
mib) e dobra sua fundamental. Como esta tétrade está sobreposta à tônica Eb, este acorde
passa a configurar-se como Eb6/9.

Compassos 7 e 8:

Os compassos 7 e 8 são caracterizados pela presença da cadência IIm7(b5) – V7 do II


grau da tonalidade, ou seja, uma cadência II – V secundária. Para harmonizar estes acordes o
violonista utilizou a tétrade de E7(#5) em 3ª inversão – drop2, sobre o acorde Dm7(b5), acres-
centando, assim, a 9ª maior a este acorde. Já o acorde de G7, foi harmonizado usando a tétrade
de Fm7(b5) em estado fundamental – drop2, gerando o acorde de G7#5(b9).

Compassos 9 e 10:

A cadência dos compassos anteriores é resolvida sobre o acorde de Cm7, usando-se

136
a tétrade de Ebmaj7 sem 3ª com 9ª maior. Esta sobreposição gera o acorde de Cm7/11. Logo
em seguida, o acorde G7 (dominante secundário do II grau) é novamente apresentado com 9ª
aumentada pela tétrade de Bmaj7(b5) em 2ª inversão – drop2.

Compassos 11 e 12:

Os dois últimos compassos da introdução são dedicados à cadência IIm7-V7 principal.


Para o acorde de Cm7, Castro Neves utilizou a mesma tétrade do compasso 9 (Ebmaj7 sem 3ª
com 9ª). Já para o acorde do V grau, utilizou a tétrade de F7 em 3ª inversão – drop2, substituin-
do a 5ª do acorde pela 13ª. Para chegar a este acorde, partindo do acorde anterior, o violonista
simplesmente abaixou em meio tom a 7ª do acorde de Cm7 – nota sib- para a nota lá, 3ª maior
do acorde de F7.

Exemplo 4
Esta transcrição mostra a introdução do arranjo gravado pelo violonista Baden Powell,
um dos grandes representantes da Música Popular Brasileira, da música “Samba do Avião” (Tom
Jobim), gravada no disco “Baden Powell à Vontade” de 1963 – Elenco.
O exemplo mostra como o violonista explora a sonoridade da tétrade 7sus4 em 2ª in-
versão – posição drop2, sobreposta a um baixo constante sobre a nota Lá.

137
Ao posicionar esta tétrade em diferentes posições ao longo do braço do instrumento,
Baden Powell consegue criar uma linha melódica na voz aguda dos acordes, fazendo uso sem-
pre da mesma abertura de acorde. É importante notar que a distribuição das notas na tétrade
“7sus4” em 2ª inversão – drop2 é bastante peculiar. Suas notas são separadas por intervalos de
4ª justa. Ou seja, durante a introdução do arranjo, o violonista privilegia a sonoridade da har-
monia quartal15 .

______________________________________________
Harmonia Quartal – Caracteriza-se pela presença de acordes, cujas notas estejam dispostas em intervalos de quarta. Acordes
em drop2 possuem cinco possibilidades de aberturas. Tomando como exemplo a fundamental dó:
1 – Quartas Justas em todas as vozes: C – F – Bb – Eb = F7sus4 em 2ª inversão;
2 – Um trítono entre as vozes: C – F# - B – E = Cmaj7(b5) em estado fundamental;
3 - Um trítono entre as vozes: C – F – B – E = Fmaj7(#11) em 2ª inversão;
4 - Um trítono entre as vozes: C – F – Bb – E = Fm(maj7)11 em 2ª inversão;
5 – Dois trítonos entre as vozes: C – F# - B – E# = D13(#9) em 3ª inversão.
A sonoridade criada por estas estruturas de acorde pode ser escutada em temas de jazz da década de 50, como, por exemplo,
“So What” – Miles Davis (Kind of Blue – 1959, Columbia) e Impressions – John Coltrane (Impressions – 1963, Impulse).

138
Os conteúdos abordados ao longo deste Guia de Estudos po-
dem ser direcionados às mais diferentes áreas de atuação do músico e/
ou educador musical.
Por exemplo, em relação ao estudo realizado sobre as estrutu-
ras harmônicas do repertório da Música Popular, um músico que traba-
lhe com este tipo de repertório, estará apto a criar diferentes rearmonizações para o seu
repertório, elaborar arranjos, desenvolver aspectos relacionados à improvisação, etc.
A partir das análises das pequenas peças a duas vozes, um educador musical será
capaz de criar pequenas composições didáticas, que poderão ser utilizadas em sala de
aula visando objetivos específicos de acordo com a faixa etária da turma.
A partir das análises na unidade 4, você poderá criar um vocabulário de procedi-
mentos harmônicos que serão utilizados em situações musicais similares, como é o caso
dos exemplos de acompanhamento analisados sobre estruturas de Blues.

139
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANTUNES, Jorge. Uma poética musical brasileira e revolucionária. Brasília: Sistrum, 2002.

CURIA, Wilson. Harmonia Moderna e Improvisação. São Paulo: Fermata, 1990.

SCHAFER, R. Murray. O Ouvido Pensante. Tradução Marisa Fonterrada. São Paulo: Unesp,
1991.

AVARES, I. M. Linguagem da música. Curitiba: Editora IBPEX, 2008. (Biblioteca virtual)

ZAGONEL, B. Brincando com música na sala de aula: jogos de criação musical usando a voz,
do corpo e o movimento. Curitiba: Editora IBPEX, 2011. (Biblioteca virtual)

ILARI, Beatriz Senoi. Música na Infância e na Adolescência - Um Livro para Pais, Professores e
Aficionados. Curitiba: Editora IBPEX, 2009. (Biblioteca virtual)

MATEIRO, T. ; ILARI. B. (Org.). Pedagogias em educação musical. Curitiba: Ibepex, 2011. (Biblio-
teca virtual)

MATTOS, F. L . Apostila de Análise. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, IA 2006.

CORREA, A. F. O Sentido da Análise Musical. Revista Opus 12, 2006.

FRANCISCHINI, A. Seis Obras Referenciais – Análise Musical. São Paulo - Ed. Unesp 2009.

BENNETT, R. Forma e Estrutura na Música. Rio de Janeiro: Zahar Ed., 1986.


CHEDIAK, A. Harmonia e Improvisação. Volumes I e II. Rio de Janeiro: Lumiar Editora, 1989.

FREITAS, S. P. R. - Teoria da Harmonia da Música Popular: Uma Definição das Relações de


Combinação Entre os Acordes na HarmoniaTonal. Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Artes da Universidade Estadual Paulista.

HINDEMITH, P. Harmonia Tradicional. SãoPaulo: Vitale, 1949.

SCHOENBERG, A. Harmonia. São Paulo: Editora da UNESP, 2002

SCHOENBERG, A. Fundamentos da Composição Musical. Tradução de Eduardo Seineman -


São Paulo: Edusp 1996.

Você também pode gostar