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JOSÉ FÉLIX DA ROCHA NETO

A DINAMIZAÇÃO DO ÔNUS DA PROVA NO PROCESSO


DO TRABALHO SOB O ENFOQUE DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS

Fortaleza – CE
2014
JOSÉ FÉLIX DA ROCHA NETO

A DINAMIZAÇÃO DO ÔNUS DA PROVA NO PROCESSO


DO TRABALHO SOB O ENFOQUE DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS

Monografia apresentada ao curso


de Direito da Faculdade Sete de
Setembro, como requisito parcial
para obtenção do grau de bacharel
em Direito.
Professor Orientador: Ms. Adriano
Pascarelli Agrello.

Fortaleza
2014
JOSÉ FÉLIX DA ROCHA NETO

A DINAMIZAÇÃO DO ÔNUS DA PROVA NO PROCESSO


DO TRABALHO SOB O ENFOQUE DOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade Sete de Setembro,


como requisito parcial para a obtenção do título de bacharel em Direito.

Aprovada em: Fortaleza,

BANCA EXAMINADORA

Assinatura: __________________________________________
Professora Ms. Adriano Pascarelli Agrello
Faculdade 7 de Setembro - Orientador

Assinatura: __________________________________________
Professor Ms. Magno Gomes de Oliveira
Faculdade 7 de Setembro - Membro

Assinatura: __________________________________________
Professor Ms. Paulo Rogério Marques de Carvalho
Faculdade 7 de Setembro – Membro
Dedico este trabalho aos que amo
incondicionalmente: meus pais, minha
esposa, meus irmãos e meus
sobrinhos. Todos, razão e força da
minha existência!
AGRADECIMENTOS

A Deus, pela dádiva de minha vida, por tudo o que operou e o que
opera nela, fazendo de mim uma pessoa acima de tudo feliz, pelas
incontáveis alegrias, por ter me carregado em seus braços nos momentos
difíceis e, acima de tudo, por me dar mais do que realmente mereço.
À minha mãe Socorro, em especial, por todo amor, carinho e
aconchego, por tudo que proporcionou aos seus filhos. A ela que sempre nos
apoiou em nossas escolhas profissionais e pessoais, e nunca nos disse uma
palavra desanimadora; que sentiu, com a mesma intensidade que nós, como
se dela fosse, nossas alegrias e tristezas. Essa espetacular mulher é a
grande responsável por todas as nossas conquistas.
Ao meu pai Edivar, in memoriam, que sempre ajudou os seus filhos
a compreenderem que o trabalho dignifica o homem. Tenho certeza de que,
onde ele estiver, a felicidade o acompanha por saber que ajudou a formar
cidadãos de bem.
À minha esposa Glícya, que compartilhou comigo todos os
momentos vividos por mim desde o início da faculdade. Agradeço pelo amor,
pela compreensão, pelo companheirismo e, acima de tudo, por me encorajar
e, muitas vezes, até me carregar pela mão quando eu julgava ser complicado
alcançar minha formação. Obrigado por me fazer enxergar a importância
dessa conquista e por contribuir para essa realização.
Aos meus irmãos Elisângela, Diva, Lívia e Inácio que sempre me
apoiaram em todas as minhas decisões.
À avó de minha esposa, dona Francy, pelo seu incentivo e por me
mostrar que o estudo é a base para a conquista de todos os sonhos.
Aos pais de minha esposa, José Maria e Edvany, por terem dado a
vida a essa pessoa maravilhosa e por todo apoio a mim prestado.
À minha família, aos tios, primos, sobrinhos e cunhados, pelos
inúmeros momentos felizes.
Aos meus colegas de trabalho, pelo prazer do convívio diário.
Ao meu colega Bruno Jurema, por ter me indicado o tema para
esta pesquisa e pelas incontáveis trocas de informação que ajudaram a
enriquecer este projeto.
Ao prof. Adriano Pascarelli, pela orientação na elaboração desse
trabalho, sem a qual ele perderia muito em técnica.
Ao prof. Pedro Jairo, por me fazer compreender que o magistério é
mais do que a mera transmissão de informações, é o repasse incondicional
do amor pelo conhecimento. A ele e a todos os professores que contribuíram
direta ou indiretamente para a minha formação acadêmica.
E por fim, mas não menos importantes, aos meus colegas de
Faculdade, pelo prazer do convívio ao longo desses cinco anos: Lorena,
Geórgia, Dheimison, Marcelino, Jeremias, Yuri, Zé Rocha, Jodiel, Rebeca,
Marcília, Molina, Helena, Ocivânia, Samila, Tarcísio e toda a turma da sala 26.
Tenho certeza que sem eles a caminhada não teria sido tão gratificante.
“O juiz do trabalho não é apenas
uma simples máquina de
subsunções lógicas. A lei
atribuições mais amplas lhe defere.
A compreensão dos problemas
econômicos, da realidade social,
das exigências da época, filtradas
através de normas, lhe determina
as soluções imperativas.”
Wilson de Souza Campos Batalha.
RESUMO

Este trabalho tem a pretensão de contribuir para o estudo acerca


de um novo tratamento dado à distribuição do ônus da prova no âmbito do
Processo Trabalhista. O modelo atual, que impõe o encargo probatório a
quem alega um direito, não supre mais as necessidades decorrentes da
evolução nas relações jurídicas em geral e muito menos nas justrabalhistas.
Esse modelo clássico, fundado em uma distribuição estática da carga
probatória, é utilizado muitas vezes como instrumento de manutenção das
desigualdades sociais, pois as partes processuais, em inúmeras situações, e
no processo trabalhista isto é mais evidente, não se encontram em paridade
substancial de armas. No Brasil, já há inúmeras decisões em que o julgador
aplica expressamente a dinamização do ônus da prova, transferindo esse
encargo da parte impossibilitada de produzir a prova para o outro litigante em
melhor condição probatória. É com a finalidade de melhor compreender a
adoção dessa nova técnica de solução dos litígios que a presente pesquisa se
desenvolve, apresentando o ponto de vista da doutrina e jurisprudência,
nacional e estrangeira, sobre o tema. Sobretudo, buscar-se-á analisar como
os direitos fundamentais processuais legitimam a aplicação da dinamização
do onus probandi nas lides trabalhistas.

Palavras-chave: Ônus da Pro va. Processo Trabalhista.


Dinamização. Direitos Fundamentais.
ABSTRACT

This paper purports to contribute to the study on a new treatment


of the distribution of the burden of proof under the Labour
Process. The current model, which imposes the evident ial burden
who claims a right, does not meet most needs arising from
developments in the legal relations in general, much less in
justrabalhistas. This classic model, based on a static distribution
of the evidentiary burden, is often used as a tool for mai ntaining
social inequalities, because the procedural parts, in many
situations, and the labor process is more evident, they are not in
substantial parity weapons. In Brazil, there are already numerous
decisions in which the judge expressly applies to the d ynamic
burden of proof, the charge of transferring part unable to produce
proof to the other litigant in better condition probative. It is in
order to better understand the adoption of this new technique to
solve the disputes that the present research is d eveloped,
presenting the point of view of doctrine and jurisprudence,
domestic and foreign, on the subject. Above all, will seek to
examine how the fundamental procedural rights legitimize the
application of dynamic burden on labor chores.

Keywords: Burden of Proof. Labour process. Dynamics burden. Fundamental


Rights .
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................... 11

1 ÔNUS DA PROVA............................................................................................... 14
1.1 Noções Gerais sobre Prova e Ônus da Prova.............................................. 14
1.1.1 Prova: conceito, objeto e finalidade........................................................ 14
1.1.2 Ônus da prova: conceito, ônus subjetivo e objetivo............................... 18
1.2 A Distribuição do Ônus da Prova.................................................................. 22
1.2.1 Teoria estática: evolução no tempo e previsão no ordenamento pátrio 22
1.2.2 Teoria dinâmica do ônus da prova......................................................... 31
1.2.2.1 Conceito....................................................................................... 31
1.2.2.2 Origem.......................................................................................... 34
1.2.2.3 Fundamentos ............................................................................... 35

2 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E A DINAMIZAÇÃO DO ÔNUS DA PROVA.. 43


2.1 Considerações iniciais................................................................................... 43
2.2 Neoprocessualismo: fundamento para a distribuição dinâmica.................... 44
2.3 Direitos fundamentais à parte processual..................................................... 46
2.3.1 Conceito de direitos fundamentais.......................................................... 50
2.3.2 Força normativa dos direitos fundamentais............................................. 53
2.3.3 Direito fundamental à ordem jurídica justa.............................................. 57
2.3.4 Direito fundamental à prova.................................................................... 60
2.3.5 Direito fundamental ao devido processo legal......................................... 62
2.3.6 Direito fundamental à igualdade substancial........................................... 66
2.3.7 Direito fundamental ao contraditório........................................................ 70

3 A DINAMIZAÇÃO NO DIREITO COMPARADO E NO PROCESSO DO


TRABALHO BRASILEIRO................................................................................... 73
3.1 A Dinamização no Direito Comparado.......................................................... 73
3.1.1 Na Argentina........................................................................................... 73
3.1.2 Na Espanha............................................................................................. 75
3.2 O Ônus Dinâmico da Prova no Processo Civil Pátrio e no Projeto do
Novo CPC....................................................................................................
80
3.3 A Dinamização do Onus Probandi no Processo do Trabalho brasileiro........ 85
3.3.1 Aspectos controvertidos: perspectiva doutrinária e jurisprudencial........ 85
3.3.1.1 Objeções à dinamização e o princípio da aptidão à prova............ 85
3.3.1.2 A inversão do ônus da prova e a distribuição dinâmica................ 99
3.3.1.3 Momento adequado para a dinamização do onus probandi......... 109

CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................…......................................... 118

REFERÊNCIAS…............................................................................................... 122
INTRODUÇÃO

O convencimento do magistrado sobre a verdade dos fatos


relevantes para a solução do litígio decorre quase que exclusivamente das
provas trazidas pelas partes. Devido a essa importância do elemento prova
para a pacificação social, a doutrina é unânime em reconhecê-la como um
dos pilares do processo de conhecimento.
Contudo, no momento de sentenciar, o juiz pode ainda se
encontrar em uma situação de absoluta incerteza em relação aos fatos
alegados pelos litigantes. Mesmo em tal circunstância, o magistrado é
obrigado a solucionar o conflito, pois o art. 5°, XXXV, da Constituição Federal
de 1988 (CRFB), veda o julgador a abster-se de decidir alegando
insuficiência de provas (non liquet). Para esses casos é que o direito
processual passou a prevê o instituto do ônus da prova.
O ônus da prova, assim, é uma imposição da ordem jurídica à parte
que tem interesse em uma prestação jurisdicional a seu favor. Não se
desincumbindo desse encargo, correrá o risco de não ver satisfeita a sua
pretensão ou exceção.
É nesse sentido que o art. 818 da Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT) e o art. 333 do Código de Processo Civil (CPC) estabelecem
rigidamente, em linhas gerais, que a prova incumbe a quem alega um direito.
Todavia, a doutrina e a jurisprudência já há algum tempo vem
reconhecendo que essa norma estática causa problemas e injustiças nas
situações concretas em que a parte onerada encontra-se impossibilitada de
provar o que alega. Enquanto isso, o outro litigante, em melhores condições
fáticas, não contribui com o processo por não estar impelido pela lei. Em tais
situações, a aplicação direta da norma legal impede o acesso efetivo do
jurisdicionado à ordem jurídica justa.
Por isso, o atual estágio de desenvolvimento processual passou a
prever técnicas de modificação da regra estática para melhor prestar a tutela
jurisdicional. Dentre elas estão a inversão do ônus da prova - positivada no
Código de Defesa do Consumidor - e a dinamização do encargo probatório
que não possui previsão legal.
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Diante de tais considerações, busca-se nesta pesquisa a resposta


ao seguinte questionamento: como a dinamização do onus probandi pode ser
aplicada pelo juiz do Trabalho sem que haja dispositivo de lei que o autorize
ou o determine?
Nesse sentido, o presente estudo tem por objetivo analisar a
viabilidade dos direitos fundamentais processuais como instrumento jurídico
capaz de legitimar a aplicabilidade da dinamização do ônus da prova no
Processo do Trabalho.
Para fins didáticos, o presente trabalho divide-se em três capítulos,
distribuídos na forma explicitada a seguir.
No primeiro capítulo, estudam-se os aspectos gerais sobre a
prova, o seu conceito, seu objeto, sua finalidade. Prossegue-se com o
tratamento do ônus da prova, seu conceito e a distinção entre ônus objetivo e
subjetivo. Por fim, apresentam-se as teorias estática e dinâmica, trazendo um
relato histórico da primeira e expondo a perspectiva da moderna doutrina
argentina sobre a teoria das cargas probatórias dinâmicas.
No segundo capítulo, mostram-se as bases constitucionais que
legitimam o emprego da dinamização do encargo probatório. Primeiramente
se esclarece a influência do Neoprocessualismo e da força normativa dos
direitos fundamentais na adoção dessa moderna técnica. Em seguida,
abordam-se os direitos fundamentais processuais intimamente relacionados
ao ônus da prova, como o direito à ordem jurídica justa, à prova, ao devido
processo legal, à igualdade substancial e ao contraditório.
Já no terceiro e último capítulo, faz-se um enfoque empírico sobre
o assunto, expondo a adoção da distribuição dinâmica pelo direito
comparado, Argentina e Espanha, e pelo Processo Civil pátrio, com estudo do
projeto do Novo CPC sobre o tema. Após isso, analisa-se a aplicação da
dinamização pela jurisprudência trabalhista nacional, comentando julgados do
Tribunal Superior do Trabalho e de alguns Tribunais regionais, dando especial
ênfase aos aspectos controvertidos da aplicação dessa teoria.
Tais aspectos referem-se, primeiramente, às objeções de parte da
doutrina à aplicabilidade da dinamização; em seguida, à distinção entre essa
técnica e a inversão do ônus da prova e, por fim, ao momento processual em
que a teoria dinâmica deve ser aplicada.
13

Esse tema tem relevância em razão do impacto social das decisões


judiciais dos magistrados trabalhistas, pois interferem tanto nas relações entre
as partes como também na confiança da sociedade no aparato estatal; e
ainda porque é um assunto, de certa forma, novo no ordenamento jurídico
brasileiro.
Cabe salientar, como fator de limitação desta pesquisa, que a
teoria dinâmica do ônus da prova ainda é bastante incipiente entre os
estudiosos do Processo do Trabalho, apesar de já há muito reconhecerem o
princípio da aptidão para a prova como fundamento para a inversão do
encargo probatório.
Em virtude disso, as bases conceituais e doutrinárias utilizadas
nesta pesquisa decorreram principalmente da doutrina processual comum e
em especial de autores argentinos, reconhecidos como os principais
disseminadores da concepção moderna da teoria dinâmica. Esse fato não
prejudica a compreensão do tema, pois o instituto do ônus da prova é comum
tanto para o Processo Civil como para o Processo do trabalho, pois possuem
suas raízes no tronco comum do Direito Processual.
1 ÔNUS DA PROVA

1.1 NOÇÕES GERAIS SOBRE PROVA ÔNUS DA PROVA

O presente capítulo tem por objetivo principal analisar o instituto do


ônus da prova e a sua distribuição.
Contudo, antes disso, é fundamental compreender o que se
entende por prova (conceito), o que deve ser provado (objeto) e para que
serve a prova (finalidade). Esses três pontos são a seguir abordados nessa
mesma sequência.

1.1.1 Prova: conceito, objeto e finalidade

O vocábulo “prova” possui diversos significados, tanto para o senso


comum (sentido amplo) como para as diversas áreas do conhecimento
humano, dentre elas, a Ciência Jurídica (sentido estrito).
Em sentido comum, conforme o dicionário jurídico Acquaviva
(2000, p.1062), a palavra “prova” advém do latim probare, que significa
“convencer, tornar crível, estabelecer uma verdade, comprovar”.
No mesmo sentido, Martins (2010, p. 307) também afirma que
“prova” deriva do verbo latino probare, mas explica que esse termo representa
os substantivos “exame, verificação, reconhecimento por experiência,
demonstração”.
Como se observa, tais conceitos tomam o substantivo “prova” pelo
verbo “provar”. Contudo, parece ser mais tecnicamente correto entender que
“prova”, em sentido comum, deriva do adjetivo latino probus, que significa
tudo aquilo que é bom, correto e verdadeiro, de acordo com as lições de
Dinamarco (2009, p.57).
Nessa perspectiva, prova é “o meio pelo qual a inteligência chega à
descoberta da verdade”(CASTRO, 1917, p. 14).
No âmbito da Ciência Jurídica, Câmara (2012, p. 100) define a
prova, metaforicamente, como “a alma do processo de conhecimento”.
Couture (1946, p. 136-137), partindo do ponto de vista do julgador,
entende que prova é um instrumento de controle das afirmações que os
litigantes apresentam em juízo. Já do ponto de vista das partes, conclui o
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processualista uruguaio que prova “é a forma de provocar a convicção do


magistrado”.
Nessa seara, Theodoro Júnior (2012, p. 437), seguindo as lições
de João Monteiro, entende que há dois sentidos para a compreensão do
termo “prova”. a) Um objetivo, que compreende a prova como instrumento ou
meio hábil, para demonstrar a existência de um fato (v.g. os documentos, as
testemunhas, a perícia etc.). b) Outro subjetivo, que percebe a prova como
certeza (estado psíquico) originada quanto ao fato, em virtude da produção do
instrumento probatório. Aparece a prova, nesse segundo sentido, como a
convicção formada no espírito do julgador em torno da verdade do fato
demonstrado.
Santos (1952, p.11-12) afirma haver não apenas duas, mas três
acepções para o vocábulo “prova”, no âmbito do Direito. A primeira acepção
refere-se à ação de provar, de fazer prova. A segunda acepção do citado
termo tem a ver com o meio de prova em si (sentido objetivo), são os
instrumentos técnicos que extraem a prova de sua fonte, como, por exemplo,
a perícia judicial. Por último, o termo “prova” é também utilizado para designar
o resultado dos atos ou meios de prova dentro da consciência do julgador
(sentido subjetivo), ou seja, é a convicção do magistrado sobre a ocorrência
concreta dos fatos alegados em juízo [destacou-se].
O termo “prova” nessas três acepções – como ação, meio e
resultado – é adotado por diversos doutrinadores, dentre eles, Baptista da
Silva (2006, p. 321) e Didier Júnior et al. (2012, p. 43).
Apesar de estes três significados da expressão “prova” serem
relevantes para o processo, o presente trabalho, seguindo as lições Azário
(2006, p.19), foca nos conceitos de prova como “ação de provar” e prova
como o convencimento do julgador, por compreender que se aplicam mais
diretamente ao instituto do ônus da prova.
Após essa análise dos conceitos de “prova”, cabe salientar que
esse termo não se confunde com o seu objeto.
Objeto de prova é tudo aquilo, relevante para o convencimento do
julgador, que deve ser provado.
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Dinamarco (2009, p. 57), acompanhado por Didier Júnior et al.


(2012, p 44) e por boa parte da doutrina moderna, entende que as alegações,
e não os fatos, é que compõem o objeto da prova.
Ainda segundo Dinamarco (2009, p.57), o objeto de prova é
apenas o conjunto de alegações [destacou-se] controvertidas, trazidas pelos
litigantes, que guarda vínculo com os fatos jurídicos relevantes para todos os
julgamentos a serem processados, não podendo ser fatos notórios nem
presumidos.
Ele vai buscar no étimo do vocábulo “prova” os fundamentos para a
definição de seu objeto. Como explicado acima, o termo “prova” deriva do
adjetivo latino probus, que significa algo bom, correto, verdadeiro, e o ato
de:

[...] provar é demonstrar que uma alegação é boa, correta


e portanto condizente com a verdade. O fato existe ou
inexiste, aconteceu ou não aconteceu, sendo portanto
insuscetível dessas adjetivações ou qualificações. As
alegações, sim, é que podem ser verazes ou mentirosas – e
daí a pertinência de prová-las, ou seja, demonstrar que são
boas e verazes” (DINAMARCO, 2009, p.57, destacou-se).

Como visto, o objeto da prova, para os mencionados autores,


refere-se apenas às afirmações trazidas pelas partes sobre os fatos ocorridos
e que exigem investigação do Estado-juiz para a solução do conflito.
Contudo, os processualistas mais antigos entendiam que apenas
os fatos é que integravam o objeto da prova. Nessa esteira, o uruguaio
Couture afirmava que “somente os fatos controvertidos são objeto de
prova.” (1946, p. 143, destaques do autor).
Corroborando tal entendimento, Pontes de Miranda (1999, p.245,
tomo IV) via a prova como uma atividade de demonstração da existência ou
não de um fato relevante. Para o jurista alagoano, a prova era um dos
desdobramentos de sua conhecida Teoria do Fato Jurídico, sendo o seu
objeto relacionado diretamente a fatos, ou seja, a elementos do suporte fático,
ao próprio suporte fático e aos fatos jurídicos que de suportes fáticos
resultam. Ele afirmava que os direitos, as pretensões, as ações e as exceções
eram efeitos dos fatos jurídicos, sendo necessária a prova dos respectivos
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fatos jurídicos para que se obtivessem por existentes aquelas consequências


jurídicas no tempo e no espaço.
Apesar do argumento de peso de Pontes de Miranda, há de se
concordar que o julgador, no momento em que conhece as provas, está
tomando ciência, quase sempre, das alegações de cada sujeito sobre os
fatos da lide (corrente moderna). Essas alegações são, na realidade, a
interpretação de cada parte sobre o fenômeno em conflito, influenciadas, em
regra, pelos próprios interesses para a solução do conflito a seu favor.
Muito raramente o magistrado irá conhecer os fatos que realmente
ocorreram. Nesse sentido, Friederich Stein lembra que apenas na “inspeção
ocular” o juiz toma conhecimento direto do fato a ser provado (apud AZÁRIO,
2006, p. 27).
Dessa forma, acredita-se que o melhor posicionamento sobre o
objeto da prova seja o de Carnelutti (2004, p. 498) que divide o objeto da
prova em objeto imediato - que são as afirmações sobre um fato a ser
verificado – e objeto mediato, que se refere ao próprio fato, sendo este último
apenas excepcionalmente conhecido pelo juiz.
É oportuno esclarecer ainda que a lei dispensa a prova das
alegações de certos fatos, embora controvertidos. Nesse sentido, o artigo 334
do Código de Processo Civil exclui da obrigatoriedade de prova os fatos
notórios, os afirmados por uma parte e confessados pela outra, os
incontroversos, além dos que militam a presunção legal de existência ou de
veracidade.
Essa exclusão legal de certos fatos da apreciação do Estado-juiz
está intimamente relacionada aos princípios constitucionais da eficiência e
celeridade processual que buscam otimizar a prestação jurisdicional.
Quanto à finalidade da prova, Santos (1952, p. 15) esclarece que
ela visa criar na mente do julgador a certeza da realidade dos fatos que
violam o direito a ser tutelado.
No mesmo sentido, Milhomens (1982, p. 5) afirma que ela objetiva
“levar ao espírito do juiz a certeza da existência ou inexistência dos fatos
alegados pelas partes: noutras palavras, convencer o magistrado”. Arremata
dizendo que essa certeza ou verdade não é absoluta, mas é a que a lei exige
como tal.
18

Dessa forma, compreende-se que a prova tem a finalidade de


formar a convicção do magistrado sobre a existência jurídica ou não dos fatos
relevantes alegados em juízo.
Diante do exposto, conclui-se que a prova é tanto a atividade de
convencimento do julgador, como os meios necessários a esse intento, bem
como próprio resultado de tal atividade. Além disso, a prova possui como
objeto de investigação, em regra, as afirmações das partes sobre os fatos
relevantes e tem como fim último formar a convicção do magistrado sobre a
existência jurídica dos fatos alegados.
Após essa breve análise dos aspectos gerais da prova, passa-se a
discorrer sobre o onus probandi, abordando o seu conceito e os seus
aspectos subjetivo e objetivo.

1.1.2 Ônus da prova: conceito, ônus subjetivo e objetivo

O ônus da prova tem fundamental importância para o processo


porque dele decorre a solução do litígio e consequentemente a pacificação
social nas situações em que não haja prova eficaz.
Isso advém do fato de que o Estado já há muito assumiu o poder
de substituição dos particulares na solução de suas contendas, restringindo
ao máximo o mecanismo da autodefesa por parte da sociedade. Situação
esta que criou também a obrigação do Poder Público de decidir o conflito
mesmo nas circunstâncias de insuficiência de provas (non liquet). Tal dever
jurisdicional fez surgir o instituto do ônus da prova como meio à disposição do
julgador para solucionar os litígios cujas provas não venham a conduzir o
magistrado ao firme convencimento dos fatos alegados. (AZÁRIO, 2006, p.
31).
Outrossim, é conveniente adiantar que a teoria dinâmica do
encargo probatório, ponto central desta pesquisa, guarda íntima relação com
as noções de ônus subjetivo e objetivo da prova. Em virtude disso, tais
assuntos serão tratados neste item, após a correta delimitação conceitual do
termo “ônus” e de sua distinção da “obrigação”.
Assim, segundo o dicionário jurídico Acquaviva (2000, p.920), a
palavra “ônus” significa obrigação, dever, encargo e “onus probandi” refere-se
19

à obrigação de provar o alegado. Significa também peso e não por acaso para
os alemães é comum a expressão “peso da prova” [Beweislaste]
(DINAMARCO, 2009, p.70).
Nessa mesma esteira, Castro (1917, p. 33), Malatesta (1960, p.
141) e Porras López (apud TEIXEIRA FILHO, 2010, p. 92) também
compreendem “ônus” como obrigação.
No entanto, a partir de Carnelutti, a expressão “ônus” passou a se
desvincular da ideia de obrigação ou de dever jurídico. Esse autor identificou
os fundamentos para a distinção entre ônus e obrigação, primeiramente, na
noção de sanção jurídica, que somente é aplicada a quem descumpre uma
obrigação e não para quem descumpre um ônus. Quem deixa de satisfazer
um ônus está apenas sujeito a não auferir os benefícios decorrentes de seu
adimplemento. (AMBRÓSIO, 2013, p. 18).
Posteriormente, como bem lembra Azário (2006, p. 32), esse jurista
italiano passou a estabelecer outro critério para a referida distinção. Ele tratou
de diferenciar ônus de obrigação pelo critério do interesse a ser tutelado.
Assim, ônus refere-se à tutela do interesse do próprio onerado e obrigação
relaciona-se à tutela de interesse alheio.
Pontes de Miranda (1999, p. 253, tomo IV) leciona também que “o
ônus é em relação a si mesmo; não há relação entre sujeitos: satisfazer é do
interesse do próprio onerado”. Vê-se, dessa forma, que o jurista alagoano
buscou em Carnelutti as bases para a sua compreensão de “ônus”.
Santos (1952, p. 94), nessa mesma ótica, sustenta que ônus não é
o mesmo que dever jurídico (obrigação), porque “não existe um direito [alheio]
que lhe seja correlato nem propriamente qualquer sanção pelo seu não
cumprimento”.
Outro critério de diferenciação entre “ônus” e “obrigação” foi
desenvolvido por Goldschimidt, baseando-se na sua teoria da situação
jurídica processual. Esse jurista alemão afirmava que “ônus” era um
imperativo do interesse próprio de cada parte, pois estava relacionado à
noção do processo como situação jurídica de caráter dinâmico, diferindo-se
da “obrigação” porque esta se referia ao direito material como relação
jurídica de caráter estático. (2009, p. 17, destacou-se).
20

Abre-se um parêntese neste ponto para esclarecer que a teoria de


Goldschimidt - de que o processo é uma situação jurídica dinâmica entre as
partes – passou a ser um dos fundamentos da concepção moderna da teoria
“Dinâmica do Ônus da Prova” sistematizada pelo argentino Jorge W. Peyrano,
tratada no item 1.2.2.3., sendo um dos assuntos nucleares deste trabalho.
Fecha-se parêntese. (PEYRANO; CHIAPPINI, 2008, p. 13-15).
Diante dessas considerações, Theodoro Júnior (2012, p. 446)
conceitua ônus da prova como a conduta processual exigida do litigante para
que a verdade dos fatos relevantes e trazidos para o magistrado seja admitida
por este. Não há que se falar em obrigação de provar, muito menos que a
parte contrária tem o direito de exigir a prova por parte do adversário.
Conclui-se, portanto, que “ônus da prova” não é uma obrigação, é
uma imposição da ordem jurídica à parte que tem interesse em uma
prestação jurisdicional a seu favor. Não se desincumbindo desse encargo,
correrá o risco de não ver satisfeita a sua pretensão.
A doutrina majoritária entende que esse ônus da prova se
manifesta sob o aspecto subjetivo (formal) e objetivo (material).
Contra esse duplo aspecto do ônus da prova e concebendo apenas
a existência de ônus objetivo, Teixeira Filho (2010, p. 95) leciona que a
objetividade decorre simplesmente do fato de o ônus estar positivado no
ordenamento, independentemente do juiz ou das partes. O olhar desse autor
está voltado para a distribuição e não para os sujeitos processuais.
Contudo, a posição desse jurista é isolada. A maioria dos
processualistas compreende existir a dimensão subejtiva e objetiva do
encargo probatório.
Dentre essa maioria, Barbosa Moreira (1988, p. 74) sustenta que o
ônus subjetivo (formal) tem a ver com a necessidade de cada litigante provar
a axistência fática das alegações que sustenta em juízo. Caso não logre êxito
no convencimento do julgador, corre-se o risco de ver frustradas suas
pretensões jurídicas. Esse ônus se relaciona diretamente à atividade das
partes.
Já o aspecto objetivo (material) do ônus da prova, conforme
Eduardo Cambi (2006, p.328), refere-se ao disciplinamento das
consequências desfavoráveis a serem suportadas pelo autor ou pelo réu
21

quando o magistrado tiver que decidir em estado de dúvida. Esse


disciplinamento advém do fato de que ao juiz é vedado abster-se de julgar
alegando insuficiência de provas (non liquet). Tal ônus refere-se à atividade
do julgador.
Ainda segundo Barbosa Moreira (1988, p. 75), o Estado-juiz
apenas deve se preocupar com quem tinha o ônus de provar e não o fez
satisfatoriamente apenas no momento da sentença, aplicando a concepção
do ônus objetivo como regra de julgamento. Para ele, o magistrado não deve
dar importância ao ônus da prova subjetivo como regra de comportamento.
Contudo, não parece ser esta a melhor solução para todas as
demandas que se impõem ao Poder Judiciário. Contrapondo-se ao
posicionamento do jurista fluminense, Azário defende que:

[...] a face subjetiva do ônus cumpre a função de indicar


desde logo às partes a quem incumbe o ônus probatório e
qual a consequência no caso de não virem a se desincumbir
de tal encargo, indicando a necessidade de que ambas se
esforcem no sentido de ou provar suas alegações ou provar
que o ônus que lhe incumbe legalmente [...] é, no caso
concreto, por demais excessivo e, até impossível de ser
atendido, situação esta que coloca a parte em flagrante
desigualdade com a outra, a quem a prova é mais acessível.
O ônus subjetivo vale, pois, como uma regra de
comportamento (2006, p. 40, destaques da autora).

Nesse ponto, a referida autora expõe o fato de que há situações


em que a prova exigida à parte, em decorrência do ônus legal, é impossível
de ser produzida por ela e, em contrapartida, pode ser facilmente trazida ao
processo pela parte adversária que, por sua vez, não está impelida pela lei a
isso. Para essas demandas, o disciplinamento rígido do ônus da prova e sua
aplicação como regra de julgamento mostram-se insatisfatórios para uma
prestação jurisdicional alicerçada nos dieitos fundamentais, conforme
exigência constitucional. Essa perspectiva axiológica é tratada
minuciosamente no segundo capítulo desta pesquisa.
Deve-se, portanto, nessas situações, flexibilizar o ônus da prova
excepcionalmente para poder atender às novas exigências da ordem jurídica
vigente, pautada nos atuais valores do Estado Social e Democrático de
22

Direito. Contudo, ao redistribuir o encargo probatório, o magistrado deve dar


ciência (regra de comportamento) dessa mudança à parte que até então
estava desincumbida desse ônus (subjetivo). Tudo isso decorre do fato de
que o Estado deve assegurar o direito fundamental ao contraditório e à
igualdade substancial das partes, evitando decisões supresa.
Assim, o ônus subjetivo como regra de comportamento é um dos
pilares do emprego da técnica de dinamização do ônus da prova, por estar
intimamente relacionado aos direitos fundamentais das partes.
Após a análise do conceito e dos aspectos elementares mais
relevantes sobre o ônus da prova, passa-se a tratar, em pormenor, da
repartição do encargo probatório entre os sujeitos processuais.

1.2. A DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA

1.2.1 Teoria estática: evolução no tempo e previsão no


ordenamento pátrio

Antes de adentrar no modelo de distribuição estática do ônus da


prova adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro, oportuno se faz tecer
breves comentários sobre a evolução histórica das teorias explicativas desse
encargo, chegando até os art. 333 do Código de Processo Civil (CPC) e art.
818 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que tratam dessa
distribuição inflexível no Direito pátrio.
Durante os processos primitivos, segundo Chiovenda (2009, p.
931), a solução dos litígios cabia aos sacerdotes que serviam apenas como
instrumentos de manifestação da vontade dos deuses. Prevaleciam as
decisões baseadas nos juramentos das partes, pois todos temiam sofrer as
consequências maléficas decorrentes da insatisfação divina, caso
participassem de um litígio estando sem razão ou com culpa. Nessa época,
obedecer às leis era obedecer aos deuses (PLATÃO, apud COULANGES,
2004, p. 209). Por isso, Milhomens (1982, p. 54) e Alves (2007, p. 205)
afirmam que a prova, para os antigos, era considerada quase sempre um
direito do réu.
Com o tempo, a decisão das contendas deixou de basear-se nos
juramentos e passou a fundamentar-se na solução das controvérsias sob o
23

crivo do convencimento do juiz. Isto tornou necessária a análise de provas


mais robustas, fazendo com que surgisse a noção de ônus da prova.
(CHIOVENDA, 2009, p. 931).
Dessa forma, de acordo com as lições do professor
AgersonTabosa (2007, p. 349), na Roma antiga, o ônus da prova cabia a
quem afirmava um direito que possuía, independentemente do polo ativo ou
passivo da demanda. Cabia ao autor a prova dos fatos que fundamentasse a
procedência de sua ação, ao réu, a prova das respectivas exceções, caso as
fizesse e não simplesmente negasse as pretensões do autor.
Essa noção decorria da passagem atribuída ao jurisconsulto romano
Paulo que dizia: “Ei incumbit probatio, qui dicit, non qui negat,” (L, 2, e 12,
Digesto. de probat.). A mesma ideia se vê, além de outros textos, na novela
18. (CASTRO, 1917, p. 34).
Os glosadores, no período medieval, sistematizaram a distribuição
do ônus da prova com base nos ensinamentos romanos. Adotaram assim a
regra de que a afirmação não negada incumbe prová-la, a negativa não. Esse
entendimento foi traduzido da máxima: affirmanti non negant incumbit
probatio; negativa non sunt probanda.
O Direito português, nas Ordenações Filipinas, adotou essa
sistematização do ônus pelos glosadores, porém relativizaram a
desnecessidade da prova negativa contida na última parte da referida
máxima. Essa relativização ocorreu porque a doutrina logo compreendeu que
em muitas situações a prova negativa pode sim ser exigida da parte. Como,
por exemplo, quando a pessoa nega que esteve em um lugar, pode
logicamente provar que esteve em outro. (SANTOS, 1952, p. 96).
Santos (1952, p. 105) afirma que Emílio Betti formulou sua teoria -
de que ‘incumbe provar àquele que alega’ – com base no enfraquecimento
dessa regra anterior dos glosadores de que a negativa não necessitava ser
provada. A teoria de Betti foi, na verdade, um retorno à concepção de
distribuição do ônus da prova dos romanos, como bem se observa nas
palavras de Carnelutti, referindo-se à teoria de Betti: “Quem expõe uma
pretensão em juízo deve provar os fatos que a sustentam, e quem opõe uma
exceção deve, por seu lado, provar os fatos dos quais resulta; [...]”. (apud
SANTOS, 1952, p. 106).
24

Essas noções, de acordo com Airasca (2008, p.131), baseavam-se


nas posições das partes: se autor, incumbia-lhe provar os fatos criadores de
seu direito; se réu, cabia-lhe provar os fatos que excepcionavam o direito do
autor. Essa jurista da argentina afirma que Chiovenda introduziu uma nova
teoria do ônus da prova, dando prevalência aos fatos alegados pelas partes,
na tentativa de solucionar as dúvidas práticas surgidas com a teoria anterior
de Betti.
Dessa forma, Chiovenda formulou, em 1935, sua teoria da seguinte
maneira: ao autor incumbe a prova dos fatos constitutivos do seu direito e dos
fatos extintivos das obrigações de não fazer; ao réu cabe a prova dos fatos
impeditivos e extintivos das obrigações de dar ou fazer (2009, p.943).
No entanto, antes dessa “teoria dos fatos” de Chiovenda, o jurista
alemão Leo Rosenberg já havia elaborado sua “teoria das normas”
(Normentheorie), dando mais importância às normas substantivas que aos
fatos incididos por elas (AZÁRIO, 2006, p. 55). Assim, afirmava Leo
Rosenberg (1956. p. 91) que:

[...] a parte cujo pleito processual não pode ter êxito sem que
se aplique uma determinada norma jurídica, suporta o ônus
da afirmação e da prova de que as características definidoras
dessa norma estejam realizadas nos fatos (traduziu-se).1

Em outras palavras, o ônus da prova, segundo esse jurista alemão,


refere-se ao encargo de cada litigante provar os pressupostos fáticos da
norma jurídica que lhe seja favorável.
Consoante Lépori White (2008, p. 59), alguns pontos da teoria
estática das normas de Rosenberg foram recepcionados por diversos
doutrinadores, dentre os quais: Gian A. Micheli, Devis Hechandía, Redenti,
Pavanini, Calamandrei e Gentile.

__________________
1 Texto original: “la parte cuya petición processual no puede tener éxito sin que se
aplique um determinado precepto jurídico, soporta la carga de la afirmación y de la
prueba de que las características definidoras de esse precepto están realizadas
em los hechos".
25

Essa enorme influência de Leo Rosenberg levou alguns


doutrinadores brasileiros, dentre eles, Carpes (2008, p.43) e Marinoni (2013,
online), a acreditarem que o art. 333, I e II, do CPC brasileiro, que trata do
ônus da prova, fosse fruto da influência da “teoria das normas” do jurista
alemão.
Sustentando esse posicionamento, Carpes (2008, p.43) firma que:

[...] a disposição contida no art. 333 do Código de Processo


Civil brasileiro2 é semelhante àquela disposta no art. 2.697 do
Código Civil italiano3, assim como a que pode ser encontrada
no art. 377 do Código Processual Civil e Comercial da Nação
Argentina4 e no art. 342º do Código Civil português5.

Contudo, analisando-se tais dispositivos, nota-se que a regra


argentina de repartição do onus probandi é a única citada que se aproxima da
teoria das normas de Leo Rosemberg, na parte que impõe que “cada uma das
partes deverá provar o pressuposto de fato da norma ou normas que
invocarem como fundamento da sua pretensão, defesa ou exceção” (traduziu-
se).
_______________________
2 Art. 333. O ônus da prova incumbe: I – ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu
direito; II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo
do direito do autor. [...]
3 Texto original: Art. 2697. Onere della prova. Chi vuol far valere un diritto in giudizio
(Cod. Proc. Civ. 163) deve provare i fatti che ne costituiscono il fondamento (Cod.
Proc. Civ. 115). Chi eccepisce l'inefficacia di tali fatti ovvero eccepisce che il diritto
si è modificato o estinto deve provare i fatti su cui l'eccezione si fonda. Tradução:
Art. 2697 Ônus da prova. Quem quer fazer valer um direito em juízo (Código Civ.
Proc. 163) deve provar os factos que constituem o seu fundamento (Código Civ
Proc. 115). Quem argumenta a ineficácia de tais fatos ou alega que o direito é
outro ou extinto deve provar os fatos que fundamentam sua exceção.
4 Texto original: Art. 377. Incumbirá la carga de la prueba a la parte que afirme la
existencia de un hecho controvertido o de un precepto jurídico que el juez o el
tribunal no tenga el deber de conocer. Cada una de las partes deberá probar el
presupuesto de hecho de la norma o normas que invocare como fundamento de su
pretensión, defensa o excepción. Si la ley extranjera invocada por alguna de las
partes no hubiere sido probada, el juez podrá investigar su existencia, y aplicarla a
la relación jurídica materia del litigio. Tradução: Artigo 377. – Incumbirá o ônus da
prova à parte que afirma a existência de um facto controvertido ou um preceito
legal que o juiz ou tribunal não tem o dever de conhecer. Cada uma das partes
deverá provar o pressuposto de fato da norma ou normas que invocarem como
fundamento da sua pretensão, defesa ou exceção. Se a lei estrangeira invocada
por qualquer das partes não for totalmente comprovada, o juiz poderá investigar a
sua existência e aplica-la à relação jurídica material do litígio.
26

Marinoni (2013, online), na mesma perspectiva de Carpes, leciona


que o ordenamento jurídico alemão concebe o encargo probatório nos
mesmos moldes que o adotado pelo Brasil, porém sem expressa previsão
legal, decorrendo simplesmente do princípio dispositivo que norteia a atuação
das partes no processo.
No entanto, para outros doutrinadores, como Lazari e Souza (2011,
p. 100) e Ambrósio (2013, p.31), essa distribuição prévia e rígida do ônus
probatório, contida no art. 333 do CPC, foi incorporada ao ordenamento
jurídico pátrio por meio da adoção da teoria de Chiovenda.
Consoante esse entendimento, a jurista Lépori White (2008, p. 61)
leciona que referido processualista italiano também exerceu forte influência na
adoção da regra estática prevista no Art. 377 do Código Processual Civil e
Comercial da Nação Argentina, acima transcrito.
Observando tais dispositivos, conclui-se que a norma contida no
art. 333 do CPC brasileiro realmente foi elaborada com fundamento na “teoria
dos fatos” de Chiovenda e que a regra argentina comporta características
dessa teoria e da “teoria das normas” de Leo Rosemberg.
Com efeito, o art. 333 do CPC pátrio determina que o autor é
responsável por provar os fatos constitutivos do seu direito e o réu pelos fatos
impeditivos, modificativos e extintivos do direito do autor, além da contraprova
deste.
Os fatos constitutivos são os que dão origem ao direito do autor.
Em outras palavras, são os pressupostos fáticos da norma que criam certa
vantagem jurídica ao demandante. Tais fatos encontram-se no plano da
existência dos fatos jurídicos. São exemplos de fatos constitutivos na área
trabalhista: a prova da prestação do serviço, do labor em horário noturno, do
nexo de causalidade entre a doença e a função, etc.

_______________________
5 Texto original: Art. 342.° 1. Aquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos
factos constitutivos do direito alegado. 2. A prova dos factos impeditivos,
modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a
invocação é feita. 3. Em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como
constitutivos do direito.
27

Por sua vez, os fatos impeditivos são os que obstam a produção


dos efeitos jurídicos do direito almejado pelo autor. Esses acontecimentos se
enquadram no plano da validade. Exemplo de fato impeditivo ocorre na
hipótese de empregado terceirizado que presta serviço em órgão público e
que posteriormente intenta a formação de vínculo empregatício com a
Administração Pública. O fato impeditivo nessa hipótese está na não
prestação de concurso público, o que obsta a formação do vínculo (direito).
Já os fatos modificativos são os que surgem após a relação jurídica
e, portanto, não têm o condão de excluir ou impedir a formação dessa
relação, mas conseguem alterar os efeitos dela decorrentes. Esses fatos
estão vinculados ao plano da eficácia. Por exemplo, transação, novação,
compensação, etc. (SCHIAVI, 2013, p. 73).
Além desses fatos, há os extintivos, que são os que eliminam o
direito pleiteado pelo reclamante, tornando improcedente o seu pedido. Esses
fatos também integram o plano da eficácia. A prescrição e a decadência são
exemplos típicos.
Por último, a contraprova do réu é a demonstração dos “fatos que
provam a inexistência do fato provado pelo autor, de modo direto ou indireto”.
(CHIOVENDA, 2009, p. 936).
Assim, a distribuição estática do ônus da prova consiste na
compreensão de que essa repartição deve ser prévia, abstrata, geral e rígida,
de acordo não só com a posição dos litigantes no processo, mas
principalmente de acordo com a natureza dos pressupostos fáticos das
normas cujos efeitos lhe sejam favoráveis (GARCÍA REDONDO, 2010, p.15).
Outro aspecto a ser esclarecido quanto à distribuição rígida do
ônus da prova no ordenamento brasileiro refere-se à adoção supletiva da
regra do art. 333 do CPC, no âmbito do processo do trabalho.
Com efeito, o art. 818 da CLT é o único preceito normativo da
legislação trabalhista que trata do ônus da prova e tem a seguinte redação: “a
prova das alegações incumbe à parte que as fizer”. Ela é semelhante à
passagem atribuída ao jurisconsulto romano Paulo, citada no início deste
item: “Ei incumbit probatio, qui dicit, non qui negat,” (L, 2, e 12, Digesto. de
probat.).
28

Conforme visto, a doutrina sistematizou o entendimento sobre essa


máxima romana e concluiu que a regra prevista nesse preceito significa que a
cada litigante compete a prova das alegações que as fizer.
O fato é que alguns doutrinadores, como Teixeira Filho, afirmam
que o art. 818 da CLT dispõe expressa e completamente sobre o ônus da
prova, desautorizando a utilização supletiva do art. 333 do CPC supracitado
(2010, p.96).
Para outros, como Machado Júnior (apud PAULA, p. 112), os dois
dispositivos afirmam a mesma coisa. O que não se pode concordar, pois o art.
333, I e II, do CPC, ao estabelecer o ônus da prova com base na posição dos
litigantes e na natureza dos fatos a serem provados, é uma regra que vem a
calhar muito bem em um sistema de igualdade formal entre as partes
(TEIXEIRA FILHO, 2010, p. 96; CHIOVENDA, 2009, p. 934), fundado no
liberalismo individualista reinante outrora. O que não ocorre com o processo
trabalhista que tem como escopo a efetivação do direito do trabalho com
todas as suas especificidades. Por isso, o art. 818 deve ser interpretado com
base na efetivação do direito material e nos direitos fundamentais que
preveem a igualdade substancial das partes.
Nesse sentido, é a lição de Paula (2010, p. 112), para quem:

efetivamente o disposto na CLT condensa toda a matéria,


abrangendo tanto o ônus da ação quanto o ônus da exceção,
e permite as adaptações que se impõem pelas singularidades
do processo do trabalho, não havendo a vinculação
obrigatória com a forma prescrita no art. 333 do CPC, fundado
na igualdade [formal] das partes.

Esse jurista quer dizer que o juiz do trabalho encontra mais


oportunidade de assegurar a devida igualdade substancial entre reclamante e
reclamado utilizando a norma aberta do art. 818 da CLT (ônus da prova
incumbe a quem alega) que a norma restrita do art. 333 do CPC (autor
responde pela prova dos fatos constitutivos do seu direito, enquanto o réu,
pela prova dos demais fatos).
Em síntese, não há qualquer impedimento à adoção do art. 333 do
CPC de forma a complementar a interpretação do art. 818 da CLT, contanto
29

que essa adoção seja adaptada às peculiaridades do direito do trabalho e dos


direitos fundamentais que o processo trabalhista visa tutelar.
Confirmando esse entendimento, o Tribunal Superior do Trabalho
editou a súmula n. 06, VIII, a qual estabelece que “é do empregador o ônus
da prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo da equiparação
salarial”. (ex-Súmula n. 68 – RA 9/1977, DJ 11.2.1977). Observa-se, dessa
forma, nítida adoção dos termos previstos no art. 333, I e II, do CPC.
Todavia, nem a regra do art. 818 da CLT – a prova incumbe a
quem alega – muito menos a do art. 333, I e II, do CPC – o autor deve provar
os fatos constitutivos do seu direito e o réu os fatos impeditivos, modificativos
ou extintivos – estão aptas a servir de parâmetro para o magistrado
trabalhista prestar uma tutela jurisdicional efetivamente justa para todas as
lides. Isto se deve à patente desigualdade econômica e social existente entre
o trabalhador e o patrão que se refletem no processo do trabalho.
Normalmente, nesse processo, o “demandante é um trabalhador
que tem sua atividade o meio único de sobrevivência própria e de sua família,
em uma manifesta situação de desigualdade econômica e jurídica” (PAULA,
p. 115).
Essa hipossuficiência econômica, técnica e cultural do empregado
faz com que, muitas vezes, ele se encontre impossibilitado de produzir a
prova das suas alegações. Em contrapartida, o empregador quase sempre
está em uma situação favorável quanto à produção probatória, porque detém
o poder diretivo que mantém o trabalhador em uma situação de subordinação.
A fim de reequilibrar essa desigualdade fática, a doutrina e a
jurisprudência passaram a enxergar, primeiramente, o instituto da inversão do
ônus da prova como meio apto a proporcionar a devida paridade de armas
entre os litigantes.
Assim, Paula (2010, p. 113-133) alude que a inversão do encargo
probatório é o único meio viável para atingir a pacificação com justiça no
âmbito do processo do trabalho. Deve o magistrado, segundo ele, utilizar-se
do art. 6°, VIII, da Lei n. 8.078/1990 – Código de Defesa do Consumidor
(CDC), de forma a subsidiar o emprego da inversão. Esse dispositivo
consumerista prescreve:
30

Art. 6°São direitos básicos do consumidor:


[...]
VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a
inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil,
quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou
quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias
de experiências; (destacou-se)

A citada regra estabelece como requisitos para a inversão do ônus


da prova a facultatividade de ser adotada pelo magistrado, a presença da
verossimilhança das alegações (aparência de verdade) ou a hipossuficiência
da parte (não necessariamente econômica, mas vulnerabilidade para a
produção da prova).
É justamente com fundamento neste requisito da hipossuficiência
do consumidor que Mauro Schiavi (2013, p.75-76) sustenta a adoção também
dessa regra consumerista como norte para a aplicação da inversão do ônus
da prova na seara trabalhista. Isto, de acordo com esse jurista, deve-se ao
fato de a CLT não possuir qualquer dispositivo que trate dessa inversão e o
juiz do trabalho estar autorizado pelo art. 769 consolidado a utilizar norma
processual comum nos casos de omissão da CLT. Além disso, há o
argumento da nítida harmonia dessa regra do art. 6° do CDC com os
princípios que balizam o Direito do Trabalho fundado na proteção do
trabalhador, em regra vulnerável.
Outrossim, mais do que a inversão do ônus da prova fundada no
CDC, a doutrina e a jurisprudência já passaram a vislumbrar o emprego, tanto
no processo civil como no processo do trabalho, da teoria da distribuição
dinâmica do ônus da prova, incorporando lições do Direito argentino.
É justamente essa teoria que o próximo tópico se encarrega de
explicar.
31

1.2.2 Teoria dinâmica do ônus da prova

1.2.2.1 Conceito

A distribuição dinâmica do ônus da prova é o estabelecimento do


encargo probatório, caso a caso, sobre a parte que se encontra em melhores
condições profissionais, técnicas ou fáticas de produzir a prova. Essa
dinamização deve ocorrer somente quando um dos litigantes esteja
impossibilitado de produzir a prova onerada por lei, independentemente de
sua posição processual ou da espécie de fato a ser provado (constitutivo,
impeditivo, modificativo ou extintivo). Além disso, o outro litigante deve estar
em condições favoráveis para suportar o ônus dinamizado pelo magistrado,
porque, se assim não for, o Estado-juiz estará apenas transferindo o encargo
da prova diabólica de uma parte para outra, o que não é correto. Por
conseguinte, o magistrado deve valorar com cuidado as provas carreadas
pela parte melhor condicionada, porque a sua posição de domínio sobre a
prova favorece a sua manipulação ou falsificação.
Esse conceito é baseado na declaração elaborada pelos
processualistas argentinos no “XVII Congreso Nacional de Derecho Procesal”,
realizado na cidade de Termas de Rio Hondo, província de Santiago del
Estero, entre os dias 19 e 22 de maio de 1993, e que se tornou consagrada
na doutrina e na jurisprudência da Argentina, em seguida difundida para os
demais países. Referida declaração tratou a teoria dinâmica da seguinte
forma:

Constitui teoria já recebida a dos ônus probatórios dinâmicos.


A mesma importa em um desvio excepcional das normas
legais sobre a distribuição do ônus da prova, sendo somente
utilizada quando a aplicação daquelas [normas legais] gera
consequências manifestamente desvantajosas. Esse desvio
se traduz em novas regras de distribuição da imposição
probatória, conforme as circunstâncias do caso e relutantes a
enfoques apriorísticos (tipo de fato a provar, posição de autor
ou réu, etc.). Entre essas novas regras, destaca-se aquela
que consiste em fazer recair o onus probandi sobre a parte
que está em melhores condições profissionais, técnicas ou
fáticas para produzir a respectiva prova. Deve-se ter um
cuidado especial e rigoroso quando se trata de avaliar as
provas apresentadas pela parte que se encontra em melhor
32

situação para produzi-la, porque normalmente ela também


está em condições de fraudá-la ou distorcê-la em seu próprio
benefício.6 (PEYRANO, 2008, p.21, traduziu-se).

Desse conceito da teoria dinâmica do ônus da prova depreendem-


se três características importantes.
A primeira refere-se à natureza excepcional e subsidiária da
dinamização, em outras palavras, ela não exclui as regras rígidas vigentes
que continuam sendo aplicadas nas demandas ordinárias, que não se fundam
na prova diabólica (prova impossível ou muito difícil de ser produzida pela
parte onerada pela norma rígida abstrata).
A segunda característica é o aspecto subjetivo da melhor condição
profissional, técnica, cultural ou fática da parte onerada em relação à prova a
ser produzida. Essa condição favorável deve ser o único critério utilizado pelo
julgador nas contendas excepcionais em que o ônus da prova prefixado pela
lei impossibilita, in concreto, a produção da prova pelo litigante responsável
por esse encargo.
Por sua vez, a terceira característica tem a ver com o cuidado do
julgador no momento da valoração das provas produzidas pela parte onerada
dinamicamente, pois não poucas vezes tais provas poderão estar viciadas em
virtude da posição privilegiada do litigante que facilita a falsificação de tais
provas.

________________________
6 Texto original: “Constituye doctrina ya recebida la de las cargas probatorias
dinámicas.La misma importa un apartamiento excepcional de las normas legales
sobre la distribución de la carga de la prueba, a la que resulta procedente recurrir
sólo cuando la aplicación de aquélla arroja consecuencias manifiestamente
disvaliosas. Dicho apartamiento se traduce en nuevas reglas de reparto de la
imposición probatoria ceñida a las circunstancias del caso y renuentes a enfoques
apriorísticos (tipo de hecho a probar, rol de actor o demandado, etc.). Entre las
referidas nuevas reglas se destaca aquélla consistente en hacer recaer el onus
probandi sobre la parte que está en mejores condiciones profesionales, técnicas o
fácticas para producir la prueba respectiva. Se debe ser especialmente cuidadoso
y estricto a la hora de valorar la prueba allegada por la parte que se encuentre en
mejor situación para producirla porque, normalmente, la misma también está en
condiciones de desvirtuarla o desnaturalizarla en su próprio beneficio”.
33

Com efeito, essa teoria também é conhecida pela doutrina como


teoria solidária do processo e da prova (Augusto M. Morello), teoria do ônus
da prova compartilhado (PASTOR, 2008, p. 423), dinamização do ônus da
prova, distribuição dinâmica do ônus da prova, repartição dinâmica do ônus
da prova, dentre outras denominações (AMBRÓSIO, 2013, p. 50). Neste
trabalho, adotou-se a denominação “teoria dinâmica do ônus da prova” para
fazer referência ao conjunto de conhecimentos elaborados sobre o tema e a
expressão “dinamização do ônus da prova” para designar a técnica
processual dela decorrente.
Outrossim, Marinoni e Daniel Mitidiero (apud ALMEIDA SANTOS,
2012, p. 624) afirmam que essa teoria não se confunde com a técnica da
inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC. Para eles, a
dinamização é técnica de distribuição original do ônus da prova em atenção
às circunstâncias concretas da causa. Nesse caso, não há inversão porque o
ônus da prova não está previamente estabelecido.
Nesse mesmo sentido, o jurista argentino Leguisamón (2008, p.
117) leciona que a dinamização é diferente da inversão do ônus da prova
porque é técnica que atribui diretamente o peso probatório, in concreto, à
parte que se encontra em condições fáticas privilegiadas para provar, seja por
qualquer motivo for, pois o que está em relevo é a melhor situação probatória
da parte como decorrência de uma convergência de fatores circunstanciais.
Por sua vez, a inversão do ônus da prova parte da regra estática
prevista no art. 333 do CPC para transferir o encargo probatório do autor para
o réu nas relações de consumo em que o julgador identifica a presença dos
requisitos da verossimilhança da alegação do autor ou da sua
hipossuficiência.
Além disso, a “dinamização” é mecanismo aplicável a todos os
ramos do Direito e não apenas em sede de relações consumeristas. Por
último, dinamizar significa produzir provas para o processo, segundo o
princípio da comunhão das provas, e não aliviar uma das partes do encargo
que originariamente lhe cabe como ocorre com a “inversão” (LAZARI;
SOUSA, 2011, p.106).
Após essa breve análise do conceito e das denominações da
distribuição flexível da carga probatória, segue o estudo de sua origem.
34

1.2.2.2 Origem

A noção de dinamização do ônus da prova fundada na melhor


condição da parte de produzi-la não é tão nova nem surgiu na Argentina como
normalmente se pensa.
Já na Inglaterra do início do século XIX, sob a égide do liberalismo
individualista, o jusfilósofo utilitarista Jeremy Bentham inovou no tratamento
do ônus da prova e adotou um posicionamento de vanguarda em relação ao
seu tempo. Ele esboçou a viga mestra da teoria dinâmica do encargo
probatório, que é o aspecto subjetivo da melhor condição da parte para
produzir a prova. Senão veja-se:

Entre as partes contrárias, a qual delas deve-se impor a


obrigação de produzir a prova? Esta questão apresenta
inúmeras dificuldades no sistema processual técnico. Em um
regime de justiça franca e simples, em um procedimento
natural, é fácil de responder. Deve ser imposto o ônus da
prova, em cada caso concreto, àquela parte que pode
fornecer com menos inconvenientes, ou seja, com menos
atrasos, assédios e despesas.7 (BENTHAM, apud GARCÍA
GRANDE, 2005, p. 45-46, destacou-se e traduziu-se).

Como é de se observar, o citado filósofo inglês refere-se à parte


que está em melhores condições de produzir a prova relevante para a solução
da lide como aquela que pode se desincumbir desse encargo com menos
empecilho, ou seja, a base da teoria do autor é a mesma da que se credita
hoje para a teoria dinâmica adotada e sistematizada pela doutrina argentina.

_________________________
7 Texto original: “Entre las partes contrarias ¿a cual se debe imponer la obligación
de proporcionar la prueba? Esta cuestión presenta infinitas dificultades en el
sistema procesal técnico. En um régimen de justicia franca y simple, em um
procedimento natural, es muy fácil de contestar. La carga de la prueba debe ser
impuesta, em cada caso concreto, a aquella de las partes que la pueda aportar
com menos inconvenientes, es decir, com menos dilaciones, vejámenes y gastos”.
35

Outrossim, a doutrina e a jurisprudência argentinas passaram a


compreender que a distribuição prévia, abstrata e imutável do ônus da prova
não estava proporcionando, para todos os casos, uma tutela jurisdicional
condizente com os novos valores do Estado Social e Democrático de Direito.
Inicialmente restrita às ações de responsabilidade civil por ato
médico, em que nitidamente a parte autora (lesada) se encontra
impossibilitada de produzir a prova constitutiva do seu direito, a teoria
dinâmica passou a ser adotada pela jurisprudência argentina também em
ações de alimentos, responsabilidade bancária e Direito Laboral (PEYRANO,
2008, p. 85).
A teoria dinâmica do ônus da prova de Jeremy Bentham
considerava que o critério da melhor condição para a prova deveria ser a
regra geral.
Em contrapartida, a teoria dinâmica difundida pelo argentino Jorge
W. Peyrano contenta-se em ser uma exceção à regra prévia e estática
vigente, baseada na posição das partes e na natureza dos fatos a serem
provados. Esta é a distinção básica entre as duas teorias que terão seus
fundamentos a seguir analisados.

1.2.2.3 Fundamentos

A teoria dinâmica do ônus da prova – que teve origem na


Inglaterra, como visto acima – encontrou em solo argentino um terreno
propício para florescer e se propagar para os demais países.
Em virtude dessa influência argentina, os fundamentos
apresentados a seguir baseiam-se nas ideias de Peyrano e Lépori White,
principais disseminadores da concepção moderna das cargas probatórias
dinâmicas. Essa escolha decorreu de opção metodológica, por enxergar
nesses fundamentos a origem moderna dessa teoria e por entender que
abordar todos os fundamentos dessa teoria iria acarretar um afastamento
demasiado dos objetivos desta monografia.
Assim, coube a Peyrano, no fim do século XX, a sistematização e
modernização dessa teoria, por intermédio da elaboração, coordenação e
36

divulgação de trabalhos científicos que delinearam os contornos atuais da


distribuição dinâmica do ônus da prova.
Esse processualista buscou nas ideias do alemão James
Goldschmidt – que considera o processo como uma situação jurídica de
natureza dinâmica entre os litigantes – as justificativas para a “Teoria das
Cargas Probatórias Dinâmicas”. Peyrano explica que o instituto da distribuição
do ônus da prova, por ser parte do processo, deve também ter a mesma
natureza jurídica deste, ou seja, deve ser dinâmico como o processo
concebido por Goldschmidt (PEYRANO; CHIAPPINI, 2008, p. 13-15).
Esta teoria consiste, conforme já explicado no item 1.2.2.1 acima,
na atribuição do ônus da prova à parte que se encontre em melhores
condições profissionais, técnicas ou fáticas para produzir a prova do fato
controvertido.
Segundo a jurista Lépori White – acompanhada por boa parte da
doutrina argentina – a teoria dinâmica do ônus da prova tem por fundamentos
a justiça do caso concreto, o dever de atuação dirigente do juiz na
instrução probatória e os deveres das partes de agirem com probidade,
lealdade e boa-fé (2008, p. 66 - 67, destacou-se).
O primeiro fundamento da teoria dinâmica - a justiça do caso
concreto - é intimamente relacionado à ideia de igualdade das partes.
Não por acaso que o jurista alemão Gustav Radbruch refere-se à
igualdade como sinônimo de justiça (1997, p. 88).
Contudo, para que haja justiça do caso concreto, não basta o
Estado-juiz assegurar apenas a igualdade formal entre os litigantes, ele deve
tutelar, sobretudo, o embate das partes em igualdade material de condições.
Em outras palavras, o Poder Judiciário deve garantir o direito fundamental à
igualdade substancial dos jurisdicionados.
Esse direito fundamental de igualdade e sua relação com a justiça
são tratados com mais profundidade no item 2.3.6 do segundo capítulo deste
trabalho.
Continuando a análise dos fundamentos, tem-se que o segundo - o
dever de atuação dirigente do juiz - é justificado pela natureza pública do
processo que deve ser norteado pelos princípios que regem a Administração
Pública, dentre os quais a prevalência do interesse da coletividade em face da
37

vontade particular. Sendo assim, não mais se admite uma participação estéril
do magistrado frente às lutas muitas vezes desiguais entre as partes.
Nesse sentido, Lépori White (2008, p. 67-68) expõe seu
pensamento do seguinte modo:

Quando a lei processual diz, por exemplo, que o debate


judicial é dirigido pelo juiz, que deverá adotar todas as
medidas que considere adequadas ao esclarecimento dos
fatos, ou quando afirma que os juízes devem cuidar do
decoro e da ordem em juízo, do respeito à sua autoridade e
cargo e do mútuo [destaques da autora] que as partes devem
ter, não se pode inferir disso que a citada lei coloque os
magistrados com o papel semelhante ao de meros diretores
de escolas ou universidades. Eu entendo que se refere a algo
muito mais importante do que isso. É da essência da
magistratura impedir que o mais forte - ou o que esteja em
uma posição mais vantajosa, seja econômica, social ou
jurídica, tanto na relação substancial ou processual - tire
proveito disso no processo, em detrimento do mais fraco. E
para isso, a única garantia real e verdadeira é a de um juiz
interessado em sua função e ocupado para que a clareza do
processo ilumine a sentença que finalmente deve ditar. 8
(traduziu-se)

A referida jurista mostra nessa citação a importância do papel mais


ativo do juiz (princípio inquisitivo) no atual Estado Social e Democrático de
Direito, baseado na efetivação dos direitos fundamentais consagrados
constitucionalmente. Papel esse bem diferente do desempenhado no Estado
de Direito liberal e privatista do séc. XIX e início do séc. XX, voltado para uma
atuação mais neutra do magistrado (princípio dispositivo).
________________
8 Texto original: “Cuando la ley procesal dice, por ejemplo, que el debate judicial es
dirigido por el juez, quien deberá adoptar todas las medidas que estime
conducentes al esclarecimento de los hechos, o cuando afirma que los jueces
deben cuidar el decoro y orden en los jucios, el respeto a su autoridad e
investidura y el recíproco que se deben las partes, no se puede inferir de ello que
dicha ley coloque a los magistrados solamente en el papel de escuelas o
universidades. Entiendo que refiere a algo mucho más importante que eso. Hace a
la esencia de la magistratura el impedir que el más fuerte, o el que tiene una
posición más vantajosa, ya sea económica, social o jurídica, tanto en la relación
sustancial o processual, saque provecho de ello en el processo, y en detrimento
del más débil. Y para ello la única garantía real y verdadeira es la de un juez
interesado en su función y ocupado para que la claridad del proceso ilumine la
sentencia que finalmente deba dictar” .
38

É nessa perspectiva, de uma instrução probatória mais alinhada


com o princípio inquisitivo (intervenção de ofício maior do juiz em cooperação
com as partes), afastando-se do princípio dispositivo (atuação estrita das
partes), que se justifica a flexibilização do encargo probatório.
Por isso, Chiovenda, já em 1935, discorrendo sobre as chamadas
“tendências modernas sobre o ônus da prova”, afirmou que “a passo com a
tendência contrária ao princípio dispositivo na verificação dos fatos, se
manifesta [sic] uma tendência contrária à repartição legal do ônus da prova,
do que encontramos vestígios já na doutrina e mesmo nas obras legislativas
mais recentes” (2009, p. 945, destaques do autor).
Assim, na doutrina, segundo o influente jurista italiano, essa
tendência se referia à concepção moderna de Kohler, que afirmava que a
função do juiz devia estar voltada para a busca da verdade real (equidade no
caso concreto), devendo se afastar da verdade formal (equidade
aproximativa). Esta última “própria de um período ‘já sobrepassado’, como
uma derivação do sistema da prova legal”. (apud CHIOVENDA, 2009, p. 945)
Continuando sua abordagem sobre as tendências contrárias ao
ônus legal e ao princípio dispositivo, Chiovenda vai buscar na exposição de
motivos de Huber, referente ao Código Civil suíço de 1907, a informação de
que esta legislação se funda no princípio da liberdade do juiz na busca da
verdade dos fatos. Seguem as palavras de Huber (apud CHIOVENDA, 2009,
p. 946):

Se o juiz ficasse restrito a ater-se ao aporte regular e


completo das provas [pelas partes], ele teria que decidir
frequentemente contra a justiça. E, se o julgamento não é
feito de acordo com as normas resultantes da repartição do
ónus da prova, mas, provavelmente, após a descoberta da
verdade [pelo juiz], um método semelhante não tem nada de
arbitrário, corresponderia, ao contrário, ao ideal de uma lei
mais perfeita (traduziu-se).9
_____________________
9 Texto original: “Si le juge devait s'en tenir à un apport de preuves régulier e
complet, il serait obligé de décider souvent contre toute equité. Et si le jugement
n'est pas rendu selon les normes découlant de la répartition du fardeau de la
preuve, mais d'aprés probablement la verité, une semblable méthode n'aura rien
d'arbitraire; elle correspondria ou contraire à l'idéal d'un droit plus parfait”
39

Extrai-se dessa exposição de motivos do Código Civil suíço que em


1907 já havia uma legislação prescrevendo um afastamento do princípio
dispositivo, quanto ao ônus da prova, e adotando uma sistemática voltada
para a busca da verdade a ser realizada de ofício pelo juiz, baseando-se na
prevalência do princípio inquisitivo.
Com efeito, no âmbito da dinamização do encargo probatório, essa
natureza oficiosa da atividade jurisdicional manifesta-se por meio da
imposição do ônus da prova ao litigante que esteja mais bem preparado para
produzi-la, de acordo com o caso concreto e independentemente de qualquer
outro critério prefixado em lei.
Todos esses juristas citados referem-se ao emprego mais flexível
do encargo probatório no âmbito do processo civil, que busca efetivar um
direito material que, em tese, demonstra um equilíbrio entre os interessados.
Mesmo nesse ramo jurídico, pautado em regra pela paridade de armas, eles
enxergam situações de desigualdade entre as partes frente ao ônus
probatório rígido, quando as circunstâncias do caso concreto são favoráveis a
uma das partes e excessivamente contrárias à outra onerada. Por isso, esses
juristas vislumbram a adoção da dinamização do ônus da prova como forma
de corrigir essas deficiências.
Com muito mais razão a teoria da distribuição deve ser empregada
no âmbito do processo do trabalho. Isto porque o embate entre reclamante e
reclamado pauta-se, quase sempre, por uma desigualdade de armas
decorrente das enormes discrepâncias econômicas e sociais do sistema
capitalista em vigor. Portanto, a atuação do juiz do trabalho deve ser mais
ainda incentivada para o reequilíbrio de forças das partes, devendo afastar a
aplicação da norma legal, art. 818 da CLT, quando o caso concreto exigir a
dinamização do ônus da prova.
Não menos importante, os deveres dos sujeitos processuais de
agirem com probidade, lealdade e boa-fé - que a jurista argentina Lépori
White pontua como o terceiro fundamento da distribuição dinâmica –
caracterizam-se pela necessidade de uma atuação sincera, honesta e pura de
todos os atores processuais em busca da pacificação social com justiça.
40

O dever de probidade é a obrigação jurídica das partes de agirem


de forma correta, boa e verdadeira (DINAMARCO, 2009, p.57).
Esse dever de probidade assemelha-se ao de lealdade, sendo este
a imposição de agir com sinceridade e fidelidade, “o que exige não só
verdade do que se diz como também o dever de não omitir”, consoante
assinala Pontes de Miranda (1999, p. 345, tomo I).
Ainda segundo o jurista alagoano, a boa-fé seria o dever de litigar
de forma pura e sem maldades que possam prejudicar o outro sujeito
processual (1999, p.345, tomo I).
O professor Fernando Negreiros resume esses três deveres
processuais - de probidade, lealdade e boa-fé – no que ele denomina de
“princípio da probidade” (2013, p. 124).
Tais deveres são reconhecidos por Martins (2010, p. 168) e por
Bezerra Leite (2013, p. 78) como desdobramentos do “princípio da lealdade
processual”.
Por sua vez, Didier Júnior (2013, p. 75) leciona que essas
obrigações das partes podem ser sintetizadas em um único princípio
constitucional (implícito), o da boa-fé processual. Esse princípio, apesar de
não estar previsto expressamente na Carta Magna, possui a mesma
hierarquia dos demais, devendo ser respeitado por todos os sujeitos
processuais, incluindo o magistrado. É a essa noção que se filia a presente
pesquisa, pois relacionada diretamente a valores constitucionais, em especial,
aos direitos fundamentais, assunto abordado no segundo capítulo.
Afirma ainda o jurista baiano que um processo para ser devido
(legítimo) tem de ser leal. E finaliza esclarecendo que o “devido processo
leal” é a dimensão do direito fundamental ao devido processo legal de onde
se extrai o princípio da boa-fé processual (DIDIER JÚNIOR, 2013, p. 83,
destacou-se).
Além desse reconhecimento de que o princípio da boa-fé está
implícito na Constituição Federal, há uma previsão infraconstitucional desse
princípio no Art. 14, II, do CPC, in verbis:
41

Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles que de


qualquer forma participam do processo:
[...]
II – proceder com lealdade e boa‑fé;

Retira-se desse dispositivo, portanto, a noção de que o juiz


também está obrigado a atuar de forma leal e com boa-fé. Ainda mais porque
exerce uma das funções do Estado, a jurisdicional. Deve, dessa forma, pautar
sua conduta conforme os princípios reitores da Administração Pública (art. 37,
caput, da Constituição), dentre os quais o da moralidade, que é intimamente
relacionado ao princípio da boa-fé processual.
Outrossim, a citada norma obriga, além das partes e juízes, as
testemunhas, peritos e demais auxiliares da justiça. Por isso, García Redondo
(2010, p. 19) relaciona o princípio da boa-fé à visão cooperatória e publicista
do processo. Nesse aspecto, há uma necessária exigência de solidariedade
entre todos que integram a lide para que seja prestada a efetiva tutela com
justiça.
Nesse sentido, Morello (apud AZÁRIO, 2006, p. 119) entende que
o princípio da boa-fé é a raiz dos deveres de solidariedade e cooperação dos
sujeitos processuais.
Referido autor argentino utiliza esses dois deveres, de
solidariedade e de cooperação, para alicerçar sua “teoria solidária do
processo e da prova” que nada mais é que a própria teoria dinâmica
apresentada por Peyrano e Lépori White, mas com uma nova roupagem.
Devido a essa semelhança, a teoria de Morello não será tratada em
específico nesta pesquisa, pois fugiria dos objetivos deste trabalho.
Continuando a abordagem sobre o princípio da boa-fé, Didier
Júnior leciona também que este princípio pode se manifestar por intermédio
das dimensões subjetiva e objetiva (2013, p. 75).
A dimensão subjetiva refere-se ao estado psicológico de alguém
acreditar que está atuando de boa-fé, sem maldade ou malícia. É um fato da
vida.
Por sua vez, a dimensão objetiva é a própria norma de conduta que
prescreve o dever de atuação em consonância com um padrão ético de
lealdade. Em outras palavras, é o princípio da boa-fé em si, concretizado
42

através das regras do CPC que proíbem a litigância de má-fé (arts. 16 a 18), a
atuação simulada das partes (art. 129), a utilização de instrumentos
processuais para fins protelatórios (art. 538, parágrafo único), as condutas
contrárias à dignidade da justiça (art. 600), dentre outras.
Segundo o professor Fernando Negreiros (2013, p. 128), no
processo do trabalho, aplicam-se tais normas tendo em vista a CLT não tratar
diretamente dessas espécies de atuação processual maléfica e de o CPC
poder ser utilizado supletivamente pelo intérprete trabalhista (art. 769 da
CLT).
Corroborando com esse entendimento, Bezerra Leite (2013, p. 78)
alerta para o fato de haver omissão na legislação consolidada sobre as
normas que desdobram o princípio da boa-fé. Conclui afirmando que não há
qualquer incompatibilidade no emprego subsidiário do CPC ao processo do
trabalho para suprir tais lacunas.
Pelo exposto, observa-se que a proposta da doutrina argentina é
legitimar a adoção da teoria dinâmica do ônus da prova sobre fundamentos
restritos ao âmbito do próprio direito processual (justiça do caso concreto,
atuação inquisitiva do juiz e deveres das partes de agirem com boa-fé).
Apesar disso, na presente análise, foram inseridas informações
relacionadas aos direitos fundamentais das partes que não decorrem do
posicionamento argentino. Isto porque esta pesquisa busca ir um pouco além
dos alicerces processuais adotados pela doutrina daquele país. Procura-se
aqui legitimar o emprego da dinamização do ônus da prova nos atuais valores
consagrados na Constituição, em especial, nos direitos fundamentais
estudados no próximo capítulo.
2 DIREITOS FUNDAMENTAIS E A DINAMIZAÇÃO DO ÔNUS
DA PROVA

No capítulo anterior, foram tratados os aspectos conceituais e


elementares do ônus da prova e sua distribuição dinâmica como técnica
processual apta a reparar os inconvenientes decorrentes da vigente
distribuição estática.
Passa-se, a partir de agora, a analisar os direitos fundamentais
processuais que legitimam o emprego da técnica de dinamização do encargo
probatório tanto no processo comum como no processo do trabalho.

2.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Hoje, mais do que nunca, entende-se que é indispensável analisar


o processo à luz de uma perspectiva constitucional para melhor compreendê-
lo (DIDIER JÚNIOR, 2013, p.32). O processo do trabalho, por ser ramo do
Direito Processual, enquadra-se nessa mesma exigência.
Diante dessa premissa, a maneira mais correta de se buscar a
legitimidade para a aplicação da dinamização do ônus da prova no processo
do trabalho é encontrar seus alicerces na atual Carta Magna.
Assim, segundo Didier Júnior (2013, p. 28), o Direito Constitucional
sofreu diversas mudanças que passaram a influenciar o processo e, em
consequência, o ônus da prova nos últimos anos. Dentre estas inúmeras
mudanças, destacam-se o reconhecimento da força normativa dos preceitos
constitucionais e a adoção da Teoria dos Direitos Fundamentais.
O conjunto dessas transformações havidas no Direito
Constitucional, nos últimos cinquenta anos, passou a ser denominado pela
doutrina de Neoconstitucionalismo, Neopositivismo ou Pós-positivismo.
Daniel Sarmento (2012, p.24) entende que tal fenômeno trata-se de
uma nova forma de pensar tanto o Direito como o próprio Estado. Passou-se,
portanto, da mentalidade de Estado Liberal-privatista de Direito para a de
Estado Social Democrático de Direito.
44

O impacto dessas mudanças na interpretação do Direito


Processual fez com que a doutrina processualista reconhecesse esse
fenômeno pelo nome de Neoprocessualismo.
Tais transformações passaram a exigir que a regra da partição do
ônus da prova, prevista tanto no CPC quanto na CLT, seja interpretada à luz
da efetividade dos direitos fundamentais.
Nesse sentido, este capítulo se concentra no novo modo de
conceber a normatividade dos dispositivos constitucionais, mais precisamente
como a força normativa dos direitos fundamentais, na atualidade, incide sobre
o instituto da distribuição do encargo probatório no processo do trabalho e
como esses direitos norteiam a interpretação do Estado-juiz.

2.2 Neoprocessualismo: fundamento para a distribuição dinâmica

Conforme já exposto, o processo, assim como os demais ramos do


Direito contemporâneo, passa por mudanças profundas decorrentes da cada
vez maior constitucionalização das relações humanas. Entende-se que estas
mudanças é uma decorrência natural da maior constitucionalização do Direito
como um todo.
Isto significa dizer que, no âmbito processual, tanto a doutrina
como a jurisprudência passaram a compreender a relação jurídica processual
como um instrumento de efetivação da justiça verticalizado (Estado-juiz
impondo-se às partes processuais) e não mais horizontalmente considerado
(igualdade formal entre as partes processuais sem intervenção estatal na
busca da verdade de fato), como outrora fora concebido em decorrência da
mentalidade positivista liberal que influenciou a elaboração do CPC de 1973
(CARPES, 2008, p.68).
Surge, dessa forma, o conceito de Neoprocessualismo para
designar essa nova visão da realidade jurídica processual. Tudo isso
sedimentado pela contemporânea concepção da força normativa dos
princípios e regras da Constituição que veiculam direitos e garantias
fundamentais.
45

Estas normas - princípios e regras - não podem mais ser


interpretadas apenas como meros dispositivos de conteúdo programático,
mas como mandamentos com efeito vinculante e preferente em relação aos
demais comandos contidos nas normas infraconstitucionais.
Dentro desse contexto, assim se compreendem as palavras de
Eduardo Cambi (2007, p. 22):

A Constituição brasileira de 1988 ao contemplar amplos


direitos e garantias fundamentais tornou constitucional os
mais importantes fundamentos dos direitos materiais e
processuais (fenômeno da constitucionalização do direito
infraconstitucional).

O autor, com essa passagem, explicita o reconhecimento da força


normativa dos direitos fundamentais.
Essa breve consideração sobre a mudança de paradigma no
Direito Processual e a atual influência da Constituição sobre este ramo da
Ciência Jurídica visa preparar as bases para a compreensão das
modificações por que passa a cognição do instituto do “ônus da prova”.
Hoje, os estudos relacionados a esse tema giram em torno das
questões atinentes ao direito fundamental à prova, ao acesso à ordem jurídica
justa, ao devido processo legal, ao contraditório, à igualdade substancial,
dentre outros. (PIRES, 2011; CARPES, 2008; AZÁRIO, 2006, DIDER JÚNIOR
et al., 2012; CAMBI, 2006).
Está, dessa forma, havendo uma congruência de entendimentos no
sentido de que está havendo uma passagem da ideologia retrógrada do
processo fundada estritamente no princípio dispositivo, em que o magistrado
permanecia inerte frente ao embate das partes litigantes, para o princípio
inquisitivo. Neste último caso, o juiz passa a ter o poder-dever de intervir na
lide quando identificar o desequilíbrio extremo e desproporcional de forças
entre as partes litigantes, para garantir o direito fundamental à igualdade
substancial da parte até então prejudicada pela distribuição prévia e abstrata
do ônus da prova.
Sobre esse papel mais ativo do Estado-juiz na atualidade, entende-
se que deve prevalecer o interesse da sociedade - representada pelo julgador
46

- em detrimento do interesse dos litigantes, no mais das vezes. Isto porque o


processo é direito público e, assim, deve ser regido também pelos princípios
que norteiam a Administração Pública, como, por exemplo, o da supremacia
do interesse público em face do interesse privado e o da indisponibilidade do
interesse social. Esses princípios devem ser harmonizados com as normas do
direito material que o processo visa efetivar.
Com efeito, “ao magistrado interessa a busca da verdade, e, se,
casualmente, com essa busca, indiretamente, estiver favorecendo uma das
partes, isso importa nada ou muito pouco” (WAMBIER, 2011, online).
Sensíveis a estas mudanças decorrentes do Neoprocessualismo,
alguns juízes do Trabalho já passaram a adotar a teoria da distribuição
dinâmica do ônus da prova de forma subsidiária à regra estática prevista no
art. 818 da CLT e nos incisos I e II do art. 333 do CPC, estas fundadas na
posição das partes, se autor ou réu, e na natureza dos fatos da lide, se
constitutivos, impeditivos, modificativos ou extintivos.
Conforme já conceituada no item 1.2.2.1 acima, a distribuição
dinâmica consiste na atribuição do onus probandi à parte que se encontre em
melhores condições profissionais, técnicas, e fáticas de produzir a prova,
independentemente das regras preestabelecidas, atendo-se o julgador
apenas às circunstâncias do caso concreto e toda vez que o magistrado
presumir que a parte onerada pela lei esteja diante de uma prova impossível
ou complexa.
Isso posto, começa-se a discorrer sobre os direitos fundamentais
processuais que legitimam a utilização dessa nova técnica de repartição
flexível do encargo probatório e consequentemente invalidam a incidência da
distribuição estática nas situações específicas que assim exigem.

2.3 Direitos fundamentais à parte processual

Antes de investigar o conceito dos direitos fundamentais e os seus


reflexos na distribuição do ônus da prova, é necessário fazer um breve
apanhado histórico dos acontecimentos mais relevantes que deram origem à
atual forma de pensar tais direitos.
47

O Direito Constitucional sofreu diversas mudanças a partir do fim


da 2ª Guerra Mundial. Isto ocorreu porque os regimes ditatoriais nazista e
fascista cometeram inúmeras atrocidades contra minorias étnicas na Europa.
Tudo sob o manto da legalidade estrita, decorrência da mentalidade
juspositivista e liberal do Estado.
A lei, até aquele momento, para ser considerada coerente com
todo o ordenamento, bastava apenas ter sido elaborada pelo Legislativo, em
estrita obediência às regras objetivas formais previstas em norma
hierarquicamente superior (MASCARO, 2010, p.345).
O magistrado simplesmente, na hora de dirimir o litígio, tinha que
aplicar o que estava previsto na lei, não havendo qualquer margem para
interpretação com fundamento em valores que não estivessem positivados na
legislação infraconstitucional. A lei, considerada formalmente válida, devia ser
cumprida irrestritamente fosse ou não fosse o seu conteúdo justo para a
sociedade.
De acordo com Mascaro (2010, p. 340), essa era a noção de
Direito compreendida pela corrente doutrinária denominada de juspositivismo
estrito, que encontrou em Hans Kelsen seu principal expoente.
No entanto, essa forma de compreensão da Ciência Jurídica
acarretou graves problemas para a civilização ocidental. Como exemplo, pode
ser citado o extermínio de milhares de judeus e de outras minorias nos
campos de concentração nazistas, nas décadas de trinta e quarenta do
século XX, sendo que tais atrocidades eram respaldadas pela legislação
alemã da época.
Tudo isso fez com que muitos estudiosos começassem a repensar
as bases teóricas de fundamentação do Estado e do direito para evitar que
tais barbaridades viessem a ser novamente cometidas. Assim, John Rawls,
Ronald Dworkin, Robert Alexy, Jürgen Habermans, dentre outros jusfilósofos,
passaram a explicar o fenômeno jurídico com o acréscimo do elemento moral
à normatividade. A preocupação desses pensadores passou a ser não mais
tanto com a origem do direito, mas com a sua finalidade. Para esses filósofos,
“o próprio direito positivo [...] passa a ser considerado como valioso a
determinados valores éticos e sociais.” (MASCARO, 2010, p.322).
48

Como decorrência disso, as disposições previstas em uma


constituição democraticamente promulgada passaram a ser reconhecidas
pelo intérprete como instrumentos jurídicos dotados de força normativa e
destinados à realização da justiça. Em outras palavras, o conteúdo dessas
cartas políticas tornou-se capaz de impor limites tanto à atuação do
constituinte derivado como à do legislador infraconstitucional. Além disso, a
atividade do juiz deixou de ser meramente automática na aplicação da lei e
passou a ser uma atividade de interpretação da norma legal, recriando-a na
perspectiva dos ideais de justiça insculpidos na Constituição.
Outrossim, as Magnas Cartas contemporâneas passaram a abrigar
cláusulas declaratórias e assecuratórias dos direitos fundamentais. Estas
normas preveem um núcleo mínimo de bens da vida essenciais à própria
sobrevivência digna do homem em sociedade.
No Brasil, essa nova forma de conceber o Direito Constitucional
iniciou-se a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, após um
longo período sob o julgo do Regime Militar ditatorial que suprimia garantias e
restringia direitos individuais de forma totalmente arbitrária. Dessa forma,
surgiu uma nova ordem jurídica no Brasil, que passou a estabelecer novos
pressupostos de legitimidade para o sistema em vigor.
Dentre estes vários pressupostos, podem ser citados os seguintes:
passagem de um Estado legislativo para um Estado Democrático
Constitucional; reconhecimento da eficácia normativa dos princípios;
concepção do papel criativo e normativo do juiz e compreensão da força
normativa dos direitos fundamentais que passam a prever o núcleo mínimo de
condições necessárias para a satisfação dos anseios da sociedade quanto à
dignidade da pessoa humana (DIDIER JÚNIOR, 2013, p.28-29).
No atual contexto, a lei deixa de ser o centro da ordem jurídica e
cede lugar à Constituição que assume esse papel de protagonista da nova
realidade jurídica e social.
Especificamente quanto a esse aspecto, a lei hoje somente é válida
se guardar sintonia material com os direitos fundamentais. Essa situação era
totalmente inversa no Brasil antes da Constituição de 1988. Antes desta Carta
política, os direitos fundamentais dependiam da regulamentação da lei para
poder ser exigidos por seus titulares (MARINONI, 2011, p.46).
49

Nesse sentido, Cunha leciona que:

[...] já há tempos que as dinâmicas procedimentais e


decisórias desenvolvem-se levando em conta não apenas a
legislação aplicável, mas caracterizada pela busca de uma
solução sempre equitativa, razoável e aceitável, o que afasta
a atividade real dos magistrados das tradicionais concepções
que os ligavam ao afirmado pelas leis (2013, p.345).

A solução equitativa, razoável e aceitável a que o autor faz


referência é a decisão do juiz pautada nos valores consagrados na
Constituição e que se resumem na justiça do caso concreto.
Didier Júnior (2013, p.33), tratando especificamente do Direito
Processual, afirma que as normas infraconstitucionais desse ramo do Direito
passaram a ser analisadas pela doutrina como “concretizadoras das
disposições constitucionais”.
Consequentemente, as regras abstratas e rígidas de distribuição do
ônus da prova, contidas no art. 818 da CLT – a prova incumbe a quem alega
um direito – e no art. 333, I e II, do CPC – a prova dos fatos constitutivos
incumbe ao demandante e a dos demais fatos incumbe ao demandado -
devem ser interpretadas de acordo com os novos valores que a atual
sociedade consagrou como fundamentais na Constituição de 1988
(MARINONI, 2011, p. 47).
Quando o juiz do trabalho simplesmente aplica essas regras
estáticas de distribuição do ônus da prova, sem considerar as condicionantes
do caso concreto e os preceitos constitucionais, está, de fato, em
determinadas situações, negando o direito fundamental da parte onerada à
prova. Consequentemente há a negação do direito fundamental de acesso à
ordem jurídica justa e demais direitos decorrentes do devido processo legal.
Após essas ponderações sobre as causas da atual forma de
compreender o Direito Constitucional, em especial, os direitos fundamentais,
segue a conceituação desses direitos e seus efeitos sobre a repartição do
ônus da prova, objeto de estudo desta pesquisa.
50

2.3.1 Conceito de direitos fundamentais

Os constitucionalistas são unânimes em aceitar que os direitos


fundamentais podem ser compreendidos sob a perspectiva formal e material.
Contudo, essa unanimidade é desfeita quando se passa a conceituar os
direitos fundamentais dentro dessas duas perspectivas.
Assim, em sentido formal, Canotilho (2003, p.379) leciona que os
direitos fundamentais são normas positivadas na Carta Política de cada
Estado, expressamente dispostas no topo do ordenamento jurídico.
Para Robert Alexy (2012, p. 68), esse conceito formal, baseado na
expressa positivação e importância dada a esses direitos pelo constituinte
originário, é o mais conveniente para o estudo dos direitos fundamentais, pois
se trabalha em cima de objeto reconhecido consensualmente por todos,
apesar de restringir o universo desses direitos.
Tais direitos em sentido formal, na Constituição Federal de 1988,
estão previstos no inciso IV, do art. 1°, e em todo o Título II, sob a rubrica
‘Dos Direitos e Garantias Fundamentais’.
Tratando especificamente dos direitos e garantias fundamentais
relacionados à distribuição do ônus da prova, podem ser citados os seguintes
dispositivos da Magna Carta:

Art. 5o Todos são iguais perante a lei, sem distinção de


qualquer natureza, garantindo‑se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
[...]
XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito;
[...]
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens
sem o devido processo legal;
[...]
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e
aos acusados em geral são assegurados o contraditório e
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
(C.R.F.B. 88, destacou-se)
51

Por sua vez, os direitos fundamentais em sentido material, segundo


Carl Shmitt, são somente os direitos que alicerçam o próprio Estado e, como
decorrência lógica, são reconhecidos pela Constituição, mesmo que não
estejam expressos nesta (apud ALEXY, 2012, p. 66, destacou-se).
Nesse mesmo sentido e ampliando esse conceito, Canotilho (2003,
p. 379,) afirma que “o conteúdo dos direitos fundamentais [em sentido
material] é decisivamente constitutivo das estruturas básicas do Estado e da
sociedade” [destacou-se]. Esse mesmo conceito é adotado por Marinoni
(2011, p. 68-69).
Robert Alexy (2012, p. 67) critica essa conceituação material,
baseada no vinculo de critérios substanciais e estruturais do Estado. Para o
jurista alemão, o conceito de direitos fundamentais, assim entendido, é
bastante limitado, pois é intimamente relacionado à própria concepção de
Estado, o que faz com que todo direito previsto em uma determinada
constituição somente seja considerado fundamental se tiver as mesmas
características intrínsecas do Estado que integra. O problema, segundo o
autor, é que não há consenso doutrinário de que a concepção real de Estado
é a mesma concepção adotada pela Constituição, o que acaba por prejudicar
o conceito, pois excluem do rol de direitos fundamentais aqueles direitos
previstos expressamente na Carta Política, como, por exemplo, os direitos
sociais, mas não relacionados à essência de um Estado concebido como
liberal, por exemplo.
Por isso, outros autores conceituam os direitos fundamentais em
sentido material com base em um critério subjetivo, sendo este relacionado
aos bens jurídicos essenciais à própria sobrevivência digna do homem em
sociedade.
Nesse sentido, Silva (2009, p. 178) considera tais direitos como
interesses constitucionalmente tutelados sem os quais a pessoa humana não
se realiza, não convive, e, às vezes, nem mesmo sobrevive.
Dentro dessa mesma ótica, Gilmar Mendes et al. (2010, p. 313)
entendem que tais “direitos e garantias [...] são pretensões que, em cada
momento histórico, se (sic) descobrem a partir da perspectiva do valor da
dignidade humana” [destacou-se].
52

De forma mais completa, e abrangendo tanto o critério estrutural


(fundamento da ordem jurídica) como o subjetivo (dignidade humana) citados
acima, o professor George Marmelstein assim conceitua os direitos
fundamentais:

[...] são normas jurídicas, intimamente ligadas à ideia de


dignidade da pessoa humana e de limitação do poder,
positivadas no plano constitucional de determinado Estado
Democrático de Direito, que por sua importância axiológica,
fundamentam e legitimam todo o ordenamento jurídico
(2013, p. 17, destacou-se).

O critério subjetivo desse conceito, a dignidade da pessoa


humana [destacou-se], pode ser compreendido como os bens jurídicos
essenciais ao indivíduo e que se encontram enumerados no caput do art. 5°
da Constituição Federal de 1988, quais sejam: a vida, a liberdade, a
igualdade, a segurança e a propriedade (MENDES et al., p.313-315).
Segundo Canotilho, o conceito dos direitos fundamentais baseado
em tal critério subjetivo tem o inconveniente de considerar o homem apenas
em sua dimensão individual. Conclui o jurista português afirmando que esse
critério não é constitucionalmente apropriado para conceituar os referidos
direitos, “pois é a própria Constituição que inclui, expressis verbis, na
categoria de direitos, liberdades e garantias, direitos de pessoas coletivas,
designadamente direitos de organizações políticas e sociais [...]” (2003, p.
399).
Apesar dessa crítica, para fins da presente pesquisa sobre os
direitos fundamentais relacionados à dinamização do ônus da prova, utilizou-
se o conceito do professor George Marmelstein, baseado na dignidade
humana, considerando o homem em sua dimensão individual, por entender
que essa definição de direitos fundamentais está técnica e legitimamente
adequada à contemporânea forma de compreender os direitos e garantias
processuais das partes e também porque este estudo é voltado para a análise
das relações individuais de trabalho, não abrangendo as relações coletivas
que poderão ser objeto de futura pesquisa.
Cabe salientar ainda que os direitos fundamentais, em virtude do
seu sentido material, não são apenas os direitos e garantias previstos no
53

Título II da CF 88. Isso é possível por causa do art. 1°, III, da Constituição,
que prescreve o princípio da dignidade humana como fundamento do Estado,
combinado com o seu art. 5°, § 2°, que estabelece uma cláusula aberta ou o
princípio da não tipicidade dos direitos fundamentais (CANOTILHO, 2003,
p.379, destaques do autor). Ou seja, “os direitos fundamentais não se
esgotam naqueles direitos reconhecidos no momento constituinte originário,
mas estão submetidos a um permanente processo de expansão.” (PARDO,
apud MARMELSTEIN, 2013, p. 21).

2.3.2 Força normativa dos direitos fundamentais

A teoria dos direitos fundamentais mudou a forma de compreender


a própria Ciência Jurídica, porque os direitos fundamentais passaram a ser
encarados pela doutrina como o conteúdo mínimo essencial que a ordem
jurídica deve ter para poder proporcionar as condições básicas necessárias
ao homem em sociedade. Noutro sentido, os direitos fundamentais passaram
a ser, por um lado, intocados pela atuação estatal legislativa e, por outro,
maximizados pela atividade jurisdicional na sua efetivação social, tudo isso
em decorrência da aquisição de força normativa.
Essa força normativa dos direitos fundamentais foi sintetizada por
Bonavides, nas seguintes palavras: “os direitos fundamentais, em rigor, não
se interpretam; concretizam-se” (2010, p. 607, destacou-se).
Com isso, o constituinte derivado, bem como o legislador
infraconstitucional, não tem poderes ilimitados no exercício da atividade
legislativa. Devem se submeter ao mínimo ético da ordem vigente, que são os
direitos fundamentais.
Essa efetividade normativa dos direitos fundamentais pode ser
examinada por intermédio do estudo das duas dimensões jurídicas pelas
quais eles se manifestam, que são as dimensões subjetivas e objetivas.
A dimensão subjetiva refere-se à concepção dos direitos
fundamentais como situações jurídicas de vantagem que o titular tem em face
de outrem, seja este o particular ou o próprio Estado. São exemplos dessas
situações o direito fundamental ao devido processo legal, o direito de
54

igualdade etc. Assim, a relação desses direitos com o processo decorre do


fato de que este é instrumento posto à disposição do cidadão para o pleno
exercício das situações de vantagem decorrentes dos direitos fundamentais.
Por isso, o formalismo processual deve ser adequado à tutela efetiva desses
direitos (DIDIER JÚNIOR, 2013, p.40).
Já a dimensão objetiva relaciona-se ao aspecto normativo dos
direitos fundamentais. Nessa perspectiva, tais normas impõem ao Poder
Público a forma como o Direito Positivo deve ser construído. Dessa forma,
nenhuma norma infraconstitucional pode contrariar um direito fundamental
porque este é uma norma constitucional que regula a maneira como o
legislador deve desempenhar sua função. Além disso, os dispositivos
processuais devem ser interpretados pelo julgador de forma que guardem
harmonia com os direitos fundamentais (DIDIER JÚNIOR, 2013, p.40).
Outro ponto relevante para a compreensão da força normativa dos
direitos fundamentais está na distinção entre o que seja direito e o que seja
garantia constitucional.
Para Dória (1953, p. 257), não há distinção entre estes institutos no
âmbito constitucional. Com esse mesmo pensamento, Canotilho (2003, p.
396) esclarece que as garantias são tecnicamente direitos, apesar de
reconhecer a prevalência do caráter instrumental das garantias em relação
aos direitos que visa tutelar.
O constitucionalista português conclui afirmando que as garantias
manifestam-se “quer no direito dos cidadãos a exigir dos poderes públicos a
proteção dos seus direitos, quer no reconhecimento de meios processuais
adequados a essa finalidade” (CANOTILHO, 2003, p. 396).
Por outro lado, há uma corrente doutrinária que defende haver
nítida distinção entre os direitos e as garantias. Nesse sentido, Silva vai
buscar em Ruy Barbosa a preocupação com a distinção dessas duas
categorias jurídicas. Para este jurista baiano, as disposições constitucionais
meramente declaratórias, que imprimem a existência legal aos interesses
juridicamente reconhecidos, são os direitos. Já as “disposições
assecuratórias, que são as que, em defesa dos direitos, limitam o poder”,
são as garantias (apud SILVA, 2009, p.186).
55

Com semelhante concepção, Jorge Miranda assim diferencia tais


institutos:

Os direitos representam só por si certos bens, as garantias


destinam-se a assegurar a fruição desses bens; os direitos
são principais, as garantias são acessórias e, muitas delas,
adjetivas (ainda que possam ser objeto de um regime
constitucional substantivo); os direitos permitem a realização
das pessoas e inserem-se direta e imediatamente, por isso,
nas respectivas esferas jurídicas, as garantias só nelas se
projetam pelo nexo que possuem com os direitos; na acepção
jusracionalista inicial, os direitos declaram-se, as garantias
estabelecem-se (2000, p 95, tomo IV, destaques do autor).

Observa-se que esse constitucionalista português procurou fazer


um apanhado das principais distinções entre direitos e garantias, deixando
evidente o caráter instrumental destas últimas, assegurador dos direitos.
Em síntese, “as garantias constitucionais são também direitos, não
como outorga de um bem e vantagem em si, mas direitos-instrumentais,
porque destinados a tutelar um direito principal.” (SILVA, 2009, p. 417,
destaques do autor).
Pelo exposto, conclui-se que os direitos fundamentais relacionados
ao processo, como instrumento de efetivação do direito material, são
garantias constitucionais viabilizadoras da concretização dos bens e valores
reconhecidos constitucionalmente como fundamentos do próprio Estado
Democrático de Direito.
Não menos importante que reconhecer a diferença entre direitos e
garantias é compreender a relação existente entre os direitos fundamentais e
os princípios e regras previstos na CF88.
De fato, a maior parte da doutrina – J. Esser, Vezio Crisafulli,
Eberhard Grabitz, Karl Larenz, Robert Alexy e Ronald Dworkin - entende que
os princípios e as regras são espécies do gênero norma (BONAVIDES, 2010,
p. 271-272).
Há, no entanto, alguns poucos constitucionalistas, como Emílio
Betti (apud BONAVIDES, 2010, p. 269) e José Afonso da Silva (2009, p.92),
que não reconhecem o caráter normativo dos princípios.
56

Outros, porém, identificam haver não apenas duas espécies


normativas, mas três. É o que defende Humberto Ávila (2008, p.92) ao
sustentar que, além dos princípios e regras, as normas manifestam-se através
dos postulados. Estes seriam normas destinadas a disciplinar
metodicamente [destacou-se] a aplicação de outras normas. Para o referido
autor, a proporcionalidade e a razoabilidade seriam exemplos de postulados.
Nesta pesquisa, seguiu-se o entendimento majoritário de que há
apenas duas espécies normativas, os princípios e as regras.
Nesse sentido, princípios são normas jurídicas que impõem um fim
a ser alcançado. Este fim refere-se a um “estado ideal de coisas” (ÁVILA,
2008, p. 79). Por sua vez, as regras são normas imediatamente descritivas de
comportamentos e que, para serem aplicadas, “exigem a avaliação da
correspondência entre a construção factual [hipótese de incidência] e a
descrição normativa [consequência jurídica]” (ÁVILA, 2008, p. 81).
A relação que há entre os direitos fundamentais e essas duas
espécies normativas é que os princípios e as regras constitucionais são as
formas jurídicas de manifestação de tais direitos (DIDIER JÚNIOR, 2013, p.
40). Ou seja, sempre haverá a manifestação de um direito fundamental em
forma de princípio ou de regra.
No caso dos direitos fundamentais (garantias processuais), que
são tratados nos próximos itens deste capítulo, a maioria, senão todos,
objetiva atingir um fim, um “estado ideal de coisas”, isto é, são tecnicamente
princípios.
É oportuno que se esclareça também que a opção, nesta pesquisa,
pela utilização do termo “direitos fundamentais” para designar as garantias
processuais (princípios) teve o único intuito de deixar evidente a força
normativa desses direitos constitucionais, em consonância ao que preconiza
Marcelo Lima Guerra, nas seguintes palavras:

[...] o uso de terminologias como ‘garantias’ ou ‘princípios’


pode ter o inconveniente de preservar aquela concepção das
normas constitucionais, sobretudo aquelas relativas aos
direitos fundamentais, que não reconhece a plena força
positiva de tais normas, em suma a sua aplicação imediata.
Dessa forma, revela-se extremamente oportuno procurar
substituir essas expressões terminológicas pela de ‘direitos
57

fundamentais’, de modo a deixar explicitado a adoção desse


novo marco teórico-dogmático que constitui o cerne do
constitucionalismo contemporâneo, a saber, a teoria dos
direitos fundamentais” (2003, p. 100, destaques do autor).

Vê-se que o autor procura mostrar a importância da utilização do


termo “direitos fundamentais” em substituição às expressões “garantias
processuais” ou “princípios”, a fim de afirmar o caráter normativo
(concretizador) desses direitos e afastar a ideia retrógrada de mero programa
abstrato.
Diante de tais premissas, passa-se a analisar os direitos
fundamentais processuais relacionados de forma direta à dinamização do
ônus da prova.

2.3.3 Direito fundamental à ordem jurídica justa

O direito fundamental processual de acesso à ordem jurídica justa -


também conhecido como direito à inafastabilidade da tutela jurisdicional, à
prestação de tutela efetiva e direito de ação - é uma norma processual
positivada no art. 5°, XXXV, da CF88, in verbis:

Art. 5o Todos são iguais perante a lei, sem distinção de


qualquer natureza, garantindo‑se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes:
[...]
XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito; (destacou-se)

Marinoni explica que o direito fundamental de acesso à justiça é


uma manifestação evoluída do direito de ação, agora impregnado com os
valores de justiça social do atual Estado Democrático de Direito (2011, p.
190).
Esse direito fundamental tem a finalidade de assegurar a todos os
indivíduos um caminho adequado para que qualquer violação - ou tentativa de
violação - de direito subjetivo possa ser apreciada pelo Estado-juiz, detentor
do monopólio da jurisdição.
58

É de bom grado lembrar que, desde o momento em que a


sociedade politicamente organizada (Estado) assumiu o encargo da
exclusividade da prestação jurisdicional, ela tomou para si o dever de exercer
a jurisdição de forma efetiva e consentânea com os valores éticos e de justiça
arraigados na consciência social que lhe dá legitimidade. Nas lições de
Bonavides, tais valores são intimamente vinculados aos direitos fundamentais
que dão suporte à ordem democrática vigente (2010, p. 596).
Na verdade, o acesso à justiça é pressuposto necessário para a
concretização dos demais direitos fundamentais. (CAPELETTI, apud
MARMELSTEIN, 2013, p. 165). Ou seja, “[...] todas as garantias integrantes
da tutela constitucional do processo convergem a essa promessa-síntese que
é a garantia do acesso à justiça assim compreendido” (DINAMARCO, 2009, p.
118).
Nesse sentido, Mauro Schiavi (2013, p.31) afirma que, nos últimos
anos, a doutrina passou a enxergar o acesso à justiça como o ponto de
partida e a finalidade principal perseguida pelos demais direitos fundamentais
processuais. Isto porque todos os direitos dos cidadãos somente podem ser
efetivados, quando violados ou ameaçados de violação, com a proteção da
via que conduz as suas insatisfações ao Poder Judiciário para que este
reestabeleça a paz social.
Isto significa dizer que o direito fundamental de acesso à ordem
jurídica justa assegura a proteção dos demais direitos fundamentais. Como
esses direitos, segundo Nery Júnior (2009, p.21-22), estruturam o próprio
Estado Democrático de Direito, deduz-se que o direito de acesso à justiça
pode ser encarado como um dos pilares de sustentação da democracia.
No entanto, não basta apenas a Constituição prescrever o livre
acesso do cidadão às portas do Poder Judiciário para que ele veja
reconhecido, de forma justa, o seu pleito. É necessário que o Estado-juiz
tenha meios adequados para oferecer uma prestação jurisdicional
efetivamente justa e, caso não tenha esses meios de forma clara no
ordenamento vigente, exige-se que o julgador interprete os dispositivos
processuais em vigor de forma razoável e à luz dos direitos fundamentais que
deve concretizar.
59

O professor Fernando Negreiros, nesse mesmo sentido, posiciona-


se da seguinte maneira:

De fato, a mera e nominal afirmação de que todos temos o


direito de acesso à jurisdição e de que nenhuma lesão ou
ameaça de lesão a direito ficará excluída da apreciação
judicial soa simplesmente como quimera – quando não como
farsa cínica -, se não forem propiciadas as condições de
efetividade do direito fundamental de acesso à Justiça (2013,
p.62, destaques do autor).

Essas condições de efetividade que o autor menciona acima estão


relacionadas aos instrumentos processuais que devem ser adequados à
concretização em grau máximo dos direitos fundamentais, afastando o
magistrado, quando for o caso, as normas excessivamente restritivas de tais
direitos, independentemente de qualquer manifestação do titular do direito
restringido (GUERRA, 2003, p. 98).
É nesta última perspectiva que se apresenta a teoria dinâmica do
ônus da prova com o objetivo de afastar a incidência da regra estática do
ônus da prova prevista no art. 818, da CLT, e no art. 333, I e II, do CPC, nas
situações de direito material em que uma das partes vê o seu acesso a uma
tutela justa impedido por tais regras. Não custa lembrar que esses
dispositivos referem-se à imposição fixa ao reclamante do ônus de provar os
fatos que constituem o seu direito e, ao reclamado, o encargo de demonstrar
os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito alegado pelo autor.
Essa regra prévia, aplicada da forma clássica, por meio da simples
subsunção do fato à norma, mostra-se inconstitucional nas situações
concretas extremas em que cria um excepcional desequilíbrio de forças entre
os litigantes. Isso corre nas lides em que a parte que tem o ônus de provar se
apresenta impossibilitada, técnica, profissional e faticamente, de se livrar
desse encargo previsto abstratamente na lei; enquanto isso a outra parte, livre
de tal ônus legal, tem plenas condições reais e jurídicas de apresentar a
prova necessária ao convencimento do magistrado, mas não o faz porque lhe
é conveniente a inércia. Essa conveniência decorre do fato de que, nesses
casos, o julgador irá decidir em desfavor da parte que tinha o onus probandi e
60

não se desvencilhou dele, pois é vedado ao magistrado optar pelo empate no


caso de dúvida (vedação ao non liquet).
Não há, portanto, em tais situações, a formação do juízo de fato em
conformidade com os ditames constitucionais, ou seja, nega-se o direito de
acesso à ordem jurídica justa, conforme as lições de Carpes (2008, p.78-79).
Isto porque “independentemente do critério jurídico que se empregue para
definir e valorar a justiça da decisão, se (sic) pode sustentar que esta nunca é
justa se está fundada em uma determinação equivocada ou inaceitável dos
fatos” (TARUFFO, apud CARPES, 2008, p. 79).
Dessa forma, há de se reconhecer o papel fundamental do
procedimento probatório na concretização da tutela jurisdicional justa, pois é
somente através do eficiente esclarecimento dos fatos, à luz dos direitos
fundamentais, que a atividade judicial estará sendo legitimamente prestada
(CARPES, 2008, p. 80).
Com efeito, a pacificação social, fim último do processo, somente
pode ser alcançada por intermédio de uma decisão judicial que tenha
considerado o embate dialético das partes fundado nos limites do caso
concreto e sob a égide dos direitos fundamentais constitucionalmente
consagrados.
Nesse sentido, o magistrado deve adequar a regra de distribuição
do ônus da prova às peculiaridades do caso concreto, sempre visando
maximizar a concretização dos direitos fundamentais relacionados à lide
posta em juízo, utilizando-se como critério de aplicação a
proporcionalidade/razoabilidade. Tal adequação irá se refletir na dinamização
do encargo probatório.

2.3.4 Direito fundamental à prova

Conforme demonstrado acima, o direito fundamental à tutela


jurisdicional efetiva depende da correta e precisa formação do juízo de fato. O
procedimento probatório, nessa perspectiva, subsidia a convicção do
magistrado na sua tarefa. Daí a acertada afirmação, segundo Gerhard Walter,
de que o direito à prova, razão de ser da instrução probatória, constitui o
61

“núcleo essencial” do direito fundamental de acesso à ordem jurídica justa


(apud CARPES, 2008, p. 90).
Além disso, o direito à prova integra a dimensão substancial do
direito fundamental ao contraditório, por ser a base da participação ativa no
litígio, com a real possibilidade de influir na decisão do juiz (DIDIER JÚNIOR
et al., 2012, p. 18).
Para Mauro Schiavi, o direito fundamental à prova não está
previsto de forma expressa na Constituição de 1988, mas se encontra
implícito nas normas que tratam do acesso à ordem jurídica justa, nas do
contraditório (conforme explicado acima) e do devido processo legal (2013, p.
30).
O referido processualista afirma ainda que o direito fundamental à
prova não é restrito apenas às partes processuais, pois interessa a toda a
coletividade o deslinde satisfatório do litígio, com o efetivo esclarecimento dos
fatos discutidos em juízo.
Esse direito fundamental deve ser, portanto, compreendido sob a
perspectiva da garantia constitucional ao instrumento adequado à solução do
litígio (BEDAQUE, 2009, p. 23). Quer dizer, esse instrumento tem de ser
capaz de assegurar a necessária e idônea prestação jurisdicional àquele que
se socorre do poder estatal para ver satisfeito o seu direito material frente à
parte adversa, seja ele o autor ou o réu.
Nessa ótica, o direito fundamental à prova deve ser efetivado,
segundo Flávio Luiz Yarshell, por meio da atuação do Estado-juiz
resguardando:

[...] i) a admissão e produção dos meios de prova, típicos ou


atípicos, desde que moralmente legítimos, pertinentes e
relevantes; ii) a proibição das limitações probatórias que
imponham obstáculos que tornem praticamente
impossível ou restrinjam de modo não razoável a prova
dos fatos controvertidos; iii) o direito à prova contrária; iv) a
tutela contra o perigo de surpresa; v) o direito à valoração da
prova produzida.” (apud PIRES, 2011, p. 49, destaques da
autora)

Com isso, o referido autor deixa claro que o magistrado deve, além
de admitir qualquer meio idôneo de prova, afastar toda regra legal que impeça
62

a produção da prova necessária à solução do litígio, nos limites do caso


concreto e sob o enfoque dos direitos fundamentais.
Em síntese, para que seja concretizado o direito fundamental à
prova, e consequentemente o acesso à ordem jurídica justa, a distribuição do
ônus da prova deve ser realizada de forma isonômica entre as partes,
devendo recair o ônus sobre a parte que se encontra em melhores condições
reais de contribuir com o esclarecimento dos fatos. O juiz deve dinamizar o
encargo da prova a fim de otimizar adequadamente a instrução probatória,
como meio de atingir a correta formação do juízo dos fatos.

2.3.5 Direito fundamental ao devido processo legal

O devido processo legal é o direito fundamental que alicerça todos


os demais direitos (garantias) processuais (NERY JÚNIOR, 2009, p. 415).
Ele está previsto no art. 5°, LIV, da CF 88, o qual alude que a todos é
assegurado o devido processo legal nas situações em geral que a liberdade ou a
propriedade do titular esteja ameaçada.
Bezerra Leite (2013, p. 59), de forma bastante ampla, entende que
esse direito fundamental “caracteriza-se pelo trinômio vida-liberdade-
propriedade”.
Originariamente, Segundo William Stubbs (apud DIDIER JÚNIOR,
2013, p.46), o devido processo legal, como ideia de oposição à tirania do
monarca, existe desde o século XI (1037 d.C), no entanto, foi somente, em
1215 d. C., com a Magna Carta inglesa, que selou a submissão do monarca
João aos interesses dos barões feudais, que o referido direito fundamental
adquiriu força impositiva contra as arbitrariedades do rei.
Cabe neste ponto esclarecer um fato importante identificado pelo
professor Fernando Negreiros, o qual leciona que a redação original em latim
da referida Magna Carta, e não em inglês, foi uma estratégia dos barões para
afastar o restante da população inglesa da proteção conferida por essa Carta.
Ou seja, esta “destinava-se apenas à aristocracia feudal, mantendo-se
inacessível às classes reputadas inferiores – tais como mercadores, artesãos,
63

servos – exatamente para que não lhes fosse possível invocá-los” (2013, p.
68).
Esse fato demonstra a importância atual da universalidade e
concretização do direito fundamental ao devido processo legal, como base
para a manutenção da ordem democrática vigente.
Convém assinalar, outrossim, que o conteúdo do direito
fundamental a um devido processo legal é aberto, pois se trata de uma
cláusula geral, ou seja, conforme explicação de Didier Júnior (2013, p. 47), o
devido processo legal já contém um acúmulo histórico mínimo de garantias e
evolui com o passar dos anos, agregando novos direitos fundamentais.
Consequentemente, o conteúdo do que era devido no início com a
Magna Carta de 1215, não é o mesmo do que é devido hoje, com a
incorporação das conquistas sociais do século XX.
Cabe salientar, ainda de acordo com Didier Júnior, que:

A locução ‘devido processo legal’ corresponde à tradução


para o português da expressão inglesa ‘due process of law’.
Law, porém, significa Direito, e não lei (‘statute law’). A
observação é importante: o processo há de estar em
conformidade com o Direito como um todo, e não apenas em
consonância com a lei. ‘Legal’, então, é adjetivo que remete a
‘Direito’, e não a Lei. (2013, p. 45, destaques do autor).

Essa observação deste jurista baiano é relevante para afastar a


concepção juspositivista liberal ultrapassada de que o processo para ser
devido deve estar estritamente de acordo com a lei. Ao contrário disso, o
processo para ser adequado hoje deve estar em consonância com a
Constituição, mais especificamente, com os direitos fundamentais que
legitimam todo o Direito e, se a lei processual, no caso concreto, não estiver
de acordo com tais direitos constitucionais, deve ser afastada de forma
racional e fundamentada.
Com efeito, a compreensão do devido processo legal tem de levar
em consideração a dimensão formal e material com que ele se apresenta.
A dimensão formal (procedimental ou processual) compreende o
devido processo legal como a tutela de uma série de direitos relacionados à
64

validade processual. Ele é encarado, na verdade, como o ponto de partida


dos demais direitos fundamentais do processo (DIDIER JÚNIOR, 2013, p. 49).
Por conseguinte, tal dimensão garante os direitos fundamentais à
ordem jurídica justa, à prova, ao contraditório, à igualdade substancial,
tratados neste capítulo.
Ademais, o devido processo legal também se caracteriza por sua
dimensão material (substancial ou substantiva). Nessa ótica, esse direito
fundamental é a fonte “das máximas da proporcionalidade [...] e da
razoabilidade” (DIDER JÚNIOR, 2013, p. 50, destaques do autor).
Essa relação entre a proporcionalidade/razoabilidade e o devido
processo legal substantivo é criação da jurisprudência brasileira. Em verdade,
o Supremo Tribunal Federal (STF) compreende que esse direito fundamental
se manifesta ora como baliza para o legislador - devendo este evitar a edição
de leis extremamente desarrazoadas - ora como critério de interpretação e
aplicação das normas pelo Estado-Juiz.
Neste último caso, o magistrado deverá sempre analisar se a
norma individual para a solução do litígio está de acordo com os três
elementos que integram o dever de proporcionalidade, quais sejam: a
adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito.
O elemento adequação é a aptidão da norma para atingir o
resultado pretendido. Já o elemento necessidade (exigibilidade) refere-se à
não existência de outro meio igualmente eficaz e menos oneroso às partes.
Por fim, o elemento proporcionalidade strictu sensu determina o dever de o
magistrado ponderar a máxima concretização de um direito fundamental e o
mínimo de restrição de outro direito fundamental, diametralmente oposto
(MATTOS, apud DIDIER JÚNIOR, 2013, p. 51).
É nessa dimensão substantiva que o devido processo legal legitima
e serve de critério à adoção da dinamização do ônus da prova no âmbito tanto
do processo civil como principalmente no do processo do trabalho.
Explicando melhor, a distribuição do encargo probatório objetiva
levar o magistrado à convicção da verdade dos fatos alegados pelos
litigantes. Ou seja, essa distribuição somente será adequada, à luz do devido
processo legal substantivo, quando for apta ao esclarecimento correto do que
de fato aconteceu entre as partes.
65

No entanto, há situações excepcionais, no processo do trabalho,


em que a regra legal do ônus da prova – prevista no art. 818 da CLT e no art.
333, I e II, do CPC, fundada rigidamente na posição processual das partes
(autor ou réu) e na natureza dos fatos a serem provados (constitutivos,
modificativos, extintivos ou impeditivos) - torna impossível ou extremamente
difícil à parte onerada apresentar a prova que lhe cabe.
Em contrapartida, nessas mesmas situações, o outro litigante se
apresenta em condições plenamente favoráveis para expor a prova devida,
mas não é impelido legalmente para isso. Quer dizer, a regra legal estática
passa a ser inadequada em tais casos.
Assim, a técnica de partilhar o encargo probatório, de acordo com
as reais possibilidades das partes, mostra-se plenamente apta para contribuir
com o convencimento do magistrado. Isso porque ninguém melhor que a
parte que possui o domínio sobre a prova para cooperar eficazmente com o
esclarecimento da verdade. A dinamização do ônus da prova é adequada,
nesse aspecto, porque o seu emprego otimiza a formação da convicção do
julgador, cumprindo o requisito da adequação do devido processo legal
substantivo.
Além do mais, em tais circunstâncias de desequilíbrio extremo
entre o reclamante e o reclamado, não há qualquer outro meio eficaz e menos
oneroso de garantir a efetiva tutela jurisdicional que não seja a dinamização
do ônus da prova.
Alguns sustentam a aplicação da inversão do ônus da prova
prevista no art. 6º, VIII, do CDC (TEIXEIRA FILHO, 2010, p. 98; SOUTO
MAIOR, 2010, p. 74; PAULA, 2010, p. 119-130).
Todavia, consoante as lições de Ambrósio (2013, p. 66) e de
Macêdo e Peixoto (2014, p. 155), essa norma consumerista não pode ser
aplicada no âmbito do processo do trabalho porque esse sistema específico
não prevê qualquer possibilidade legal de utilização supletiva do instituto da
inversão do ônus da prova nas relações juslaborais. Dessa forma, a
legitimidade para a distribuição do ônus da prova diferente da regra estática
,prevista no art. 818, somente pode ser alcançada por meio da aplicação de
uma técnica que fundamente sua adoção nos preceitos constitucionais. Essa
técnica é a dinamização do encargo probatório. Diante desse pressuposto,
66

preenche-se o requisito da necessidade do dever de proporcionalidade, pois


não há outro meio igualmente eficaz e menos oneroso às partes para a
prestação de uma tutela efetivamente justa.
Por seu turno, o encargo probatório dinâmico também satisfaz o
requisito da proporcionalidade em sentido estrito. Isto ocorre na medida
em que o magistrado, em juízo de ponderação, maximiza a concretização do
direito fundamental à igualdade substancial das partes no processo do
trabalho, por se encontrarem em posições desiguais quanto à produção da
prova, restringindo minimamente o núcleo essencial do direito fundamental
contraposto que é o direito da parte, em melhor condição probatória, de não
produzir prova contra si. O julgador, sopesando esse direito fundamental com
o da igualdade substancial das partes, deve fazer prevalecer este último
porque o direito a não autoincriminação somente é aplicável no âmbito penal,
em que prevalece o direito fundamental à liberdade (FELICIANO, apud
AMBRÓSIO, 2013, p. 104-105).
Em virtude disso e diante da importância do direito fundamental à
igualdade substancial para o presente tema, torna-se oportuno tecer
considerações sobre mais essa garantia processual, o que se faz no próximo
item.

2.3.6 Direito fundamental à igualdade substancial

O direito fundamental à igualdade substancial está previsto


expressamente no caput do art. 5° da Constituição Federal, in verbis:

Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de


qualquer natureza, garantindo‑se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
nos termos seguintes: [...]. (destacou-se)

O professor Fernando Negreiros bem observa que este enunciado


normativo deve ser interpretado no contexto do atual Estado Democrático de
67

Direito, em que “a afirmação de que a lei não pode discriminar encerra um


equívoco elementar, se entendida em termos absolutos [formais]”. Conclui ele
que a lei muitas vezes precisa e deve tratar diferentemente quem se encontra
em situações distintas (2013, p. 59).
Não à toa que esse direito é considerado como a representação
mais emblemática da democracia (SILVA, 2009, p. 211).
Para Carpes (2008, p. 81) e Bezerra Leite (2013, p59), o enunciado
do art. 5° acima transcrito tutela as duas formas como se apresenta o direito à
igualdade, quais sejam, a igualdade formal e a substancial.
Com efeito, a igualdade formal refere-se à aplicação irrestrita do
enunciado normativo, abstratamente, a todos de forma equânime. Não há
qualquer análise dos contrastes da vida real, muito menos a harmonia desse
dispositivo com os ideais de justiça social previstos na Constituição.
Com todo respeito às opiniões desses autores, não se concebe
mais, na atual fase do Neoconstitucionalismo - explicada no item 2.1 acima –
a subsunção mecânica do fato ao texto normativo do caput do art. 5º, como
ocorre na igualdade meramente formal. Ao invés disso, seguindo as lições de
Bonavides (2010, p. 597), deve-se ter em mente que o intérprete hoje
reconstrói a norma, com base em seu enunciado normativo, incorporando os
princípios e valores constitucionais vigentes e objetivando a concretização
dos direitos fundamentais.
Portanto, a única norma que se pode extrair do caput do art. 5° da
Carta Magna é a que assegura apenas o direito fundamental à igualdade
substancial (isonomia).
Essa feição material do direito à igualdade leva em consideração
as especificidades fáticas daqueles que estão sendo comparados, devendo-
se tratar desigualmente quem se encontra em situação díspar, de modo a
estabelecer o equilíbrio jurídico entre os sujeitos. Tudo isso com vistas a um
determinado objetivo, que, no caso do processo, é a tutela jurisdicional
efetivamente justa (CARPES, 2008, p. 82).
Sobre esse assunto, Silva leciona:

Por que existem desigualdades, é que se aspira à igualdade


real ou material que busque realizar a igualização das
condições desiguais, do que se extrai que a lei geral, abstrata
68

e impessoal que incide em todos igualmente, levando em


conta apenas a igualdade dos indivíduos e não a igualdade
dos grupos, acaba por gerar mais desigualdades e propiciar a
injustiça (2009, p. 213-214, destaques do autor).

De fato, o referido autor, nesse trecho, acaba por esclarecer os


fundamentos da existência de todo um sistema protetivo do Direito do
Trabalho em favor do empregado. Esse sistema visa estabelecer certa
igualização jurídica entre aqueles - patrões e trabalhadores - que se
encontram em visível desigualdade econômica.
Isto se reflete no âmbito do processo do trabalho, como bem
esclarece Nestor de Buen. Esse autor entende haver um princípio implícito
específico do processo do trabalho que denomina de princípio da
desigualdade processual. Tal princípio decorre do fato de que “tanto o direito
substantivo como o processual intentam a realização da justiça social. Para
esse efeito, o autor estima que existe uma evidente desigualdade entre as
partes” [...] (apud NASCIMENTO, 2002, p. 111-112).
Em verdade, esse princípio da “desigualdade processual”,
mencionado pelo jurista mexicano acima, nada mais é que o direito
fundamental à igualdade substancial aplicado ao processo do trabalho.
Nesse sentido e na ótica da distribuição do ônus da prova, o direito
à igualdade material manifesta-se por intermédio de uma atuação mais
proativa do magistrado. Este deve trazer para os autos certas provas ou
dinamizar o encargo de trazê-las à parte que se encontre em condições
privilegiadas de realizar tais misteres (AZÁRIO, 2006, p.152). Intenta-se,
dessa forma, estabelecer “o equilíbrio entre os litigantes, segundo o critério de
equidade na relação processual e o dever das partes de colaborar com o
esclarecimento da verdade” (AMBRÓSIO, 2013, p. 57).
Didier Júnior, confirmando tais posicionamentos, explica que o
direito fundamental à igualdade substancial obriga o Estado-juiz a criar as
normas processuais adequadas às especificidades de cada parte processual
(2013, p. 70).
Essa observação acima não significa que as regras processuais
estejam discricionariamente à mercê dos ânimos de cada magistrado. O que
o referido autor quer deixar claro é a natureza instrumental das regras
69

processuais que devem ser interpretadas na perspectiva da concretização


dos direitos fundamentais e na tutela do direito material que visa efetivar.
Mesmo porque todas as decisões judiciais devem ser fundamentadas
racionalmente e amparadas nos ideais de justiça social, constitucionalmente
consagrados.
Em tal perspectiva, Pires (2011, p. 48) assim expõe como deve
atuar o juiz quando identificar situação de desigualdade na produção de prova
trabalhista:

Assim, na medida em que o magistrado observar que à


determinada parte cabia realizar uma prova e não o fez, por
exemplo, por questão de hipossuficiência técnica
(vulnerabilidade quanto às informações do contrato de
trabalho e seria, em razão disso, prejudicada no processo),
deverá propor um tratamento diferenciado do ônus da prova
para que não se configure ofensa ao princípio da igualdade.

Com essa passagem, a autora procura mostrar o direito à


igualdade substancial como fundamento de validade para a utilização da
dinamização do ônus probatório. Além disso, demonstra a necessidade de,
em certos casos, não se aplicar a norma rígida prevista no art. 333, I e II,
CPC, e no art. 818, da CLT, que impõe o peso da prova ao autor, quanto aos
constitutivos do seu direito, e ao réu, quanto aos fatos modificativos,
impeditivos ou extintivos do direito do autor.
No entanto, o juiz deverá, ao distribuir dinamicamente o ônus da
prova, informar antecipadamente às partes a adoção desse procedimento que
difere da previsão legal, no intuito de manter a igualdade material entre as
partes.
Essa conduta do magistrado é importante porque oportuniza o
sujeito agora onerado a desincumbir-se desse encargo, evita decisões
surpresa e assegura também o seu direito fundamental ao contraditório,
direito este analisado no item abaixo.
70

2.3.7 Direito fundamental ao contraditório

Consequência direta do devido processo legal, tratado no item


2.3.5, o direito fundamental ao contraditório hoje está previsto na
Constituição, em seu art. 5°, inciso LV.
Tal dispositivo determina que “aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Esse direito fundamental também é compreendido por intermédio da
dimensão formal e substancial.
A dimensão formal do contraditório caracteriza-se pelo direito do sujeito
processual de ser ouvido, de participar do processo (DIDIER JÚNIOR, 2013, p. 57).
Gomes de Miranda antecipa que, no Projeto do Novo CPC, esse aspecto
formal do contraditório se manifesta por meio da obrigatoriedade do magistrado
sempre ter de informar às partes quando for decidir, “inclusive sobre matérias
apreciáveis de ofício” (2013, p. 362).
Contudo, não basta à parte apenas ser informada do litígio, ela deve ter
oportunidade de influir no convencimento do Estado-juiz acerca da verdade dos fatos
para que o processo possa ser devido de acordo com os valores constitucionais
(LIMA, 2013, p. 82). Essa possibilidade de a parte influir na solução do litígio é a
dimensão substancial do contraditório.
Por isso, segundo Eduardo Couture, há as características essências de
alteridade e bilateralidade do contraditório (participação dialética de ambas as
partes) que fazem com que esse direito seja fundamento para a justiça das decisões
(1946, p. 71).
Devido a essa importância para a legitimidade da atuação do Poder
Judiciário, é que se faz imprescindível a correta compreensão do aspecto substancial
do contraditório. Essa perspectiva se refere à capacidade de o litigante influenciar,
por meio da prova, por exemplo, a convicção do magistrado sobre os fatos alegados
em juízo. É o poder da parte de contribuir com o deslinde do processo (TROCKER,
apud MARINONI, 2000, p. 260).
71

Por conseguinte, o direito fundamental à prova, analisado no item 2.3.4,


é consequência dessa dimensão substantiva do contraditório.
Outro ponto importante é o fato de a garantia da ampla defesa tratar-se
do próprio direito fundamental ao contraditório em sua feição substancial. Esse
direito de defesa nada mais é que a aptidão efetiva para poder interferir na decisão
do magistrado (DIDIER JÚNIOR, 2013, p. 61).
Pelo exposto, conclui-se que o contraditório é o direito fundamental dos
sujeitos de participar do processo e de poder influenciar o convencimento do
magistrado.
Especificamente tratando do contraditório no âmbito da distribuição do
ônus da prova, torna-se relevante falar sobre a necessidade de informar
antecipadamente a ambas as partes o emprego da dinamização desse ônus, em
substituição à regra legal, prevista no CPC e na CLT, que impõe todo o peso da prova
a quem alega.
Para Ambrósio, a prévia comunicação da parte dinamicamente
encarregada da prova evita que ela seja surpreendida com tal mudança (2013, p.66-
67). Contudo, essa comunicação deve ser feita em um momento processual que
propicie ao sujeito onerado a disponibilidade de tempo suficiente para poder
desincumbir-se desse peso. Por isso, segundo a referida autora, o magistrado deve
redistribuir o ônus da prova no início da fase de instrução, para proporcionar o
contraditório à parte.
Ou seja, a aplicação da distribuição dinâmica do encargo probatório
apenas como regra de julgamento – considerada pelo juiz somente no momento de
prolação da sentença – viola nitidamente o direito fundamental ao contraditório da
parte onerada, e consequentemente o seu direito de acesso à ordem jurídica justa.
Nesse sentido, Flávio Luiz Yarshell argumenta que o direito fundamental
ao contraditório veda qualquer tentativa de o Estado-juiz criar obstáculos que
tornem impossível ou limitem a produção de provas pelas partes, protegendo-as
também de decisão-surpresa (apud PIRES, 2011, p.49).
Assim, a adoção da distribuição dinâmica do ônus da prova - que visa
concretizar os direitos fundamentais à ordem jurídica justa, à prova, ao devido
processo legal, à igualdade substancial, acima tratados – deve também efetivar, em
72

todos os sentidos, o contraditório, garantindo às partes a disponibilidade de meios e


de tempo para contribuírem com a formação do convencimento do juiz.
Contudo, para ser legítimo o emprego da dinamização do encargo
probatório, não basta esse instituto estar apenas de acordo com os direitos
fundamentais, apesar de este ser um argumento extremamente sólido. Tal
instrumento deve também estar em consonância com o direito material que visa
efetivar.
Diante dessas considerações, torna-se necessário compreender a relação
específica dessa técnica de partilha do ônus da prova com o processo do trabalho e
com o direito material que este visa efetivar, aspecto a seguir abordado no terceiro
capítulo.
Antes disso, faz-se uma breve análise da adoção da teoria dinâmica pela
doutrina e jurisprudência da Argentina e da Espanha, demonstrando ainda a sua
recepção pelos processualistas civis pátrios e pelo Novo CPC que se encontra em vias
de aprovação.
73
3 A DINAMIZAÇÃO NO DIREITO COMPARADO E NO
PROCESSO DO TRABALHO

Nos capítulos anteriores, foram apresentados os aspectos


elementares do ônus da prova e de sua distribuição dinâmica, além dos
direitos fundamentais legitimadores da aplicação dessa teoria.
A partir de agora, apresenta-se o aspecto empírico da distribuição
dinâmica, com foco especial no processo do trabalho.
Primeiramente, analisa-se o direito comparado, em seguida, a
adoção da dinamização do ônus da prova pela ordem jurídica brasileira, com
especial enfoque na jurisprudência trabalhista nacional, dando ênfase aos
aspectos controvertidos da aplicação dessa teoria no âmbito justrabalhista.

3.1 A DINAMIZAÇÃO NO DIREITO COMPARADO

3.1.1 Na Argentina

Peyrano (2008, p. 83-84) esclarece que a teoria das cargas


probatórias dinâmicas teve uma significativa acolhida pela doutrina mais
abalizada argentina. Dentre os civilistas argentinos que defendem o emprego
da teoria dinâmica, o autor destaca Kemelmajer de Carlucci, Vázquez
Ferreira, Ghersi y Bustamante Alsina. Quanto aos processualistas, Peyrano
colaciona em sua obra uma relação bastante numerosa de defensores da
distribuição dinâmica, destacando-se Julio O. Chiappini, Augusto A. Morello,
Matilde Zavala de Gonzalez, Héctor E. Leguisamón, Inés Lépori White e
vários outros.
No âmbito da doutrina processualista do trabalho, é Vargas (2009,
p. 71-72) quem compila os doutrinadores argentinos favoráveis a essa teoria,
citando Patrícia Barbado, Daniel E. Stortini, Glória M. Pasten de Ishihara e
Emiliano A. Gabet como os principais expoentes.
Quanto ao direito positivo argentino, Vargas (2009, p. 112-113)
esclarece que há previsão expressa da teoria dinâmica do ônus da prova nos
códigos processuais civis e comerciais das províncias de La Pampa (art.
74

360°.), de Formosa (art. 374) e de Corrientes (art. 377). Além destes, o


Código Processual Civil, Comercial, Laboral, Rural e Mineiro da província de
Tierra del Fuego, de 1994, traz a doutrina da dinamização, em seu art. 375,
que segue transcrito, por se tratar de legislação aplicada ao processo do
trabalho dessa província:

Artigo 375.- Ônus da prova.


375.1. Incumbirá o ônus da prova à parte que afirme a
existência de um fato controvertido ou de um preceito jurídico
que o juiz ou o Tribunal não tenham a obrigação de conhecer.

Cada uma das partes deverá provar o pressuposto de fato da


norma ou normas que invoca como fundamento de sua
pretensão, defesa ou exceção.

375.2. A distribuição do ônus da prova não impedirá a


iniciativa probatória do Tribunal nem a sua apreciação,
conforme as regras de senso crítico, das omissões ou
deficiências de prova1. (destacou-se e traduziu-se)

Como se percebe, a referida norma amplia o poder do Estado-juiz


em relação à instrução probatória e prevê as máximas de experiência (regras
de senso crítico) como parâmetros para o emprego da dinamização nos casos
de omissão ou deficiência de prova (prova diabólica).
Também a jurisprudência nacional argentina, em matéria
trabalhista, recepciona a distribuição dinâmica do ônus da prova, como pode
ser observado no seguinte julgado citado por Baracat (2008, p. 297):

A presunção legal da existência de um trabalho subordinado


ante a demonstração do "fato da prestação de serviços"
dentro das regras do ônus dinâmico da prova permite
estabelecer a seguinte distribuição: 1) o empregado deve
provar que prestou efetivamente o serviço; 2) quem contratou
tais serviços e nega o relação, tem de provar a real natureza
ou causa juríddica da contratação.

________________________
1 Texto original: Artículo 375.- Carga de la prueba. 375.1. Incumbirá la carga de la
prueba a la parte que afirme la existencia de un hecho controvertido o de un
precepto jurídico que el Juez o el Tribunal no tenga el deber de conocer. Cada una
de las partes deberá probar el presupuesto de hecho de la norma o normas que
invocare como fundamento de su pretensión, defensa o excepción. 375.2. La
distribución de la carga de la prueba no obstará a la iniciativa probatoria del
Tribunal ni a su apreciación, conforme con las reglas de la sana crítica, de las
omisiones o deficiencias de la prueba.
75

Cabe ao empregador que nega a relação de emprego com o


autor o ônus da prova da inexistência do contrato de trabalho
ou que os serviços prestados não eram subordinados; assim,
ante a inversão da prova que rege a matéria, tem de provar
não só o que afirma, mas também aquilo que assevera em
sentido negativo.

(CNCom., Sala A, 30/06/99, "El Porvenir Coop de Seguros


Ltda s / rev Inc Por: Umerez, Leandro A. .." LL 2000-C-56, DJ
2000-2 -. 57 2. (destacou-se e traduziu-se)

O julgado acima aplica expressamente a teoria dinâmica em uma


ação que demanda o reconhecimento da relação empregatícia. A Câmara
Nacional de Apelações no Comércio entendeu que ao empregador não basta
simplesmente negar a pretensão do autor, ele tem o ônus de provar que a
relação jurídica não era empregatícia, ou seja, tem o encargo de provar o fato
negativo por se encontrar em melhores condições que o autor.

3.1.2 Na Espanha

Vargas (2009, p.88-89) cita os seguintes processualistas que


comungam a favor do emprego do ônus probatório dinâmico no Direito
espanhol: Eugenio Llamas Pombo, Juan Montero Aroca, Susana Pazos Méndez,
Ricardo de Angel Yagües, Javier Téllez Rico, Julio César Galán Cortés, Juan
Domingo Valls Lloret, Álvaro Luna Yerga, Fernando Gómez Pomar, Carolina Sanchis
Crespo, Anner Uriarte Codón, Juan F. Garnica Martin, Santiago Carretero
Sánchez, Silvia Barona Vilar e inúmeros outros.
_______________________
2 Texto original: La presunción legal de la existência de una labor subordinada ante
la demonstración del “hecho de La prestación de serviços “ dentro de las reglas de
la carga dinâmica de La prueba permite estabelecer La seguiente distribuicón: 1)
El trabajador debe probar que presta efectivamente servicios; 2) quien contrato
tales servicios y niega la relación, deberá acreditar la real naturaleza o causa
jurídica de la contratación. Corresponde al empleador que niega la relación laboral
com el actor, la carga de la prueba de la inexistência del contrato de trabajo, o que
lós servcios prestados no eram laborales; así, ante la inversión de la prueba que
rige em la matéria, debe probar no solo el que afirma sino también quien asevera
em sentido negativo. (CNCom., sala A, 30-6-99, “El Porvenir Coop. De Seguros
Ltda. s/Inc. de rev. Por: Umerez, Leandro A.” L.L. 2000-C-56, D.J.. 2000-2-57).
76

No âmbito legislativo, segundo Ambrósio (2013, p. 54), a


dinamização do encargo probatório foi expressamente incorporada ao direito
positivo da Espanha com a edição da Ley de Enjuiciamento Civil (Ley
n.1/2000- LEC). O art. 217 dessa lei assim distribui o ônus da prova:

Artigo 217 . Ônus da prova.


1. Quando, no momento de proferir a sentença ou acórdão
semelhante, o tribunal considerar duvidosos fatos relevantes
para a decisão, julgará improcedente as pretensões do autor
ou reconvinte , ou as do réu ou reconvindo , segundo
corresponda a uns ou outros o ônus de provar os fatos que
permaneçam incertos e fundamentem suas pretensões.

2. Cabe ao autor e ao réu reconvinte o ônus de provar a


certeza dos fatos que ordinariamente deles decorram,
segundo as normas jurídicas que lhes são aplicáveis, o efeito
jurídico correspondente às pretensões da demanda e da
reconvenção.

3. Incumbe ao demandado e ao autor reconvindo o ônus de


provar os fatos que, conforme as normas que lhes sejam
aplicáveis, impeçam, extingam ou modifiquem a eficácia
jurídica dos fatos a que se refere o parágrafo anterior.

4. Nos processos sobre concorrência desleal e publicidade


ilícita, caberá ao demandado o ônus da prova da exatidão e
veracidade das indicações e declarações realizadas e dos
dados materiais que a publicidade expresse, respectivamente.

5. De acordo com as leis processuais, naqueles


procedimentos em que as alegações da parte autora se
baseiem em condutas discriminatórias em razão do sexo,
caberá ao demandado provar a ausência de discriminação
nas medidas adotadas e da sua proporcionalidade.

Para os efeitos do disposto no parágrafo anterior, o órgão


judicial, a pedido de uma das partes, poderá solicitar, se for
considerado útil e relevante, relatório ou parecer dos órgãos
públicos competentes.

6. As normas previstas nos parágrafos anteriores aplicar-se-


ão sempre que uma disposição legal expressa não distribua,
com critérios especiais, o ônus de provar os fatos relevantes.
77

7. Para a aplicação do disposto nos parágrafos anteriores


do presente artigo, o tribunal deverá considerar a
disponibilidade e a facilidade probatória correspondente
a cada uma das partes do litígio3. (traduziu-se e destacou-
se)

Dessa forma, o número 7 do preceito normativo supracitado


estabelece claramente que o julgador está condicionado a analisar a aptidão
das partes (facilidade e disponibilidade) para a produção da prova, cotejando
com o ônus da prova previsto abstratamente nos números (parágrafos)
anteriores do art. 217 da referida lei. Em outras palavras, a legislação
processual espanhola prevê que a distribuição dinâmica e a estática devem
ser aplicadas em conjunto, não havendo que se falar em uma como regra e a
outra como exceção.
Jurisprudencialmente, pode-se entender, como faz Vargas (2009,
p.88), que o direito positivo espanhol nada mais fez que reconhecer o pacífico
posicionamento dos Tribunais Supremos e da Corte Constitucional da Espanha que
já há muito tempo aplicam a dinamização do ônus da prova em suas decisões.
_____________________
3 Texto original: Artículo 217. Carga de la prueba.1. Cuando, al tiempo de dictar sentencia o
resolución semejante, el tribunal considerase dudosos unos hechos relevantes para la
decisión, desestimará las pretensiones del actor o del reconviniente, o las del demandado
o reconvenido, según corresponda a unos u otros la carga de probar los hechos que
permanezcan inciertos y fundamenten las pretensiones. 2. Corresponde al actor y al
demandado reconviniente la carga de probar la certeza de los hechos de los que
ordinariamente se desprenda, según las normas jurídicas a ellos aplicables, el efecto
jurídico correspondiente a las pretensiones de la demanda y de la reconvención. 3.
Incumbe al demandado y al actor reconvenido la carga de probar los hechos que, conforme
a las normas que les sean aplicables, impidan, extingan o enerven la eficacia jurídica de
los hechos a que se refiere el apartado anterior. 4. En los procesos sobre competencia
desleal y sobre publicidad ilícita corresponderá al demandado la carga de la prueba de la
exactitud y veracidad de las indicaciones y manifestaciones realizadas y de los datos
materiales que la publicidad exprese, respectivamente. 5. De acuerdo con las leyes
procesales, en aquellos procedimientos en los que las alegaciones de la parte actora se
fundamenten en actuaciones discriminatorias por razón del sexo, corresponderá al
demandado probar la ausencia de discriminación en las medidas adoptadas y de su
proporcionalidad. A los efectos de lo dispuesto en el párrafo anterior, el órgano judicial, a
instancia de parte, podrá recabar, si lo estimase útil y pertinente, informe o dictamen de los
organismos públicos competentes. 6. Las normas contenidas en los apartados precedentes
se aplicarán siempre que una disposición legal expresa no distribuya con criterios
especiales la carga de probar los hechos relevantes. 7. Para la aplicación de lo dispuesto
en los apartados anteriores de este artículo el tribunal deberá tener presente la
disponibilidad y facilidad probatoria que corresponde a cada una de las partes del litigio.
78

Na seara trabalhista, Pires (2011, p. 116), ao tratar do presente


tema, colaciona o seguinte julgado do Tribunal Supremo ibérico:

ROJ : STS 6487/2009


Tipo de órgão : Suprema Corte . Câmara Sociais
Município : Madrid - Seção 1
Relator: JUAN SAMPER JOAQUIN
Recurso n º: 3409/2008 - Data: 23/09/2009
Tipo de Resolução : Acórdão
Resumo: Indenização por perdas e danos devido a violação
de direitos fundamentais.
[...]
SEXTO. - Certo é que, conforme o princípio geral do ônus da
prova, incumbe à parte autora provar a certeza dos fatos que
ordinariamente deles decorram, segundo as normas jurídicas,
o efeito jurídico correspondente às pretensões de sua
demanda (artigo 216.2 da Lei de Processo Civil). Todavia,
além das exceções que a própria lei estabelece para
tutelar as ações antidiscriminatórias e para a proteção
dos direitos fundamentais (artigos 96 e 179 da Lei de
Processo do Trabalho), a jurisprudência vem aplicando,
de forma excepcional, um critério alternativo de caráter
corretor, ponderando as especiais dificuldades
probatórias de certos fatos e a posição das partes
perante os meios de prova. Assim, por exemplo, em
matéria de reintegração de demitido, a nossa decisão de
06 de Outubro de 2005 (rcud. 3876/2004) aponta, seguindo
uma linha doutrinária anterior, que "a norma distributiva
do ônus da prova não corresponde a princípios
inflexíveis, mas que deve ser adaptada a cada caso,
segundo a natureza dos fatos afirmados ou negados e a
disponibilidade ou facilidade para provar que cada parte
tem. Critérios esses que na atualidade já são legalmente
consagrados, basta ver o prescrito no parágrafo 6 do tão
citado art. 217 da LEC vigente que, trazendo regras
específicas sobre o ónus da prova, estabelece que "para
aplicação do disposto nos números anteriores do presente
artigo, o tribunal deve considerar a disponibilidade e
facilidade probatória correspondente a cada uma das partes
em litígio”. Segundo este princípio, conclui-se que não há
dúvida acerca de que no caso ES Correios, e não a
trabalhadora, quem tem a maior disponibilidade dos
elementos probatórios acerca da existência ou inexistência
de determinada vaga em um momento concreto, não só
porque a seu alcance encontra-se a documentação
pertinente, mas também, porque a possível inexistência,
apesar de ser um fato negativo, pode perfeitamente ser
provada, no caso de ser definida, por quaisquer outros meios
admitidos em direito, incluindo o testemunho a cargo do
pessoal conhecedor do fato.
SÉTIMO .- No presente caso, cumpre-se as exigências para o
deslocamento do ônus da prova porque , por uma parte, é
evidente a dificuldade da trabalhadora para provar as
incidências da gestão das listas [de candidatos a uma vaga]
79

e, em particular, a qualificação dos candidatos contratados de


acordo com uma escala. Por outro lado, a posição da
empresa, quanto ao controle e disposição da prova sobre os
processos de seleção, facilita extraordinariamente seu acesso
e utilização dos instrumentos correspondentes. Por isso, o
empregador não pode simplesmente limitar-se a afirmar que
"não foi provado o direito [da autora] de ser contratada", em
atenção "aos contratos que lhe teriam correspondido "pela
ordem que ocupava nas listas [de seleção de candidatos]”. 4
(PIRES, 2011, p. 116-117, destaques da autora).

______________________
4 Texto original: ROJ: STS 6487/2009.Tipo Órgano: Tribunal Supremo. Sala de lo
Social. Município: Madrid – Sección: 1.Ponente: JOAQUIN SAMPER JUAN. N°
Recurso: 3409/2008 – Fecha: 23/09/2009.Tipo Resolución: Sentencia. Resumen:
Indemnización de daños por vulneración de drechos fundamentales.(...) SEXTO.- Es
certo que, confome al princípio general de la carga de la prueba, corresponde a la
parte actora probar la certeza de los hechos de los que ordinariamente se desprende,
según las normas jurídicas, el efecto jurídico correspondiente a las pretensiones de su
demanda (articulo 216.2 de la Ley de Enjuiciamento Civil). Pero, aparte de las
excepciones que la propia ley estabelece en orden a la tutela antidiscriminatoria
y la proteción de los derechos fundamentales (artículos 96 y 179 de la Ley de
Procedimiento Laboral), la doctrina jurisprudencial ha venido aplicando con
caráter excepcional un critério alternativo de caráter corrector, ponderando las
especiales dificultades probatorias de determinados hechos y la posición de las
partes ante los medios de prueba. Así, por ejemplo, en matéria de
reincorporación de la excedencia, nuestra sentencia de 6 de octubre de 2005
(rcud. 3876/2004) señala, continuando uma línea doctrinal anterior, que “la norma
distributiva de la carga de la prueba no responde a unos princípios inflexibles,
sino que se deben adaptar a cada caso según la naturaleza de los hechos
afirmados o negados y la disponibilidade o facilidad para probar que tenga cada
parte. Criterio éste que en la actualidad ya viene legalmente consagrado, al
estabelecer el apartado 6 del tan citado art. 217 de la LEC vigente, tras haber
suministrado determinadas reglas concretas acerca de la carga probatória, que
“para la aplicación de lo dispuesto en los apartados anteriores de este artículo, el
tribunal deberá tener presente la dispoinibilidad y facilidad probatoria que corresponde
a cada uma de las partes del litigio”. Conforme a este principio se concluye que no
cabe duda acerca de que em el caso ES Correos, y no la trabajadora, quien tiene la
mayor disponibilidade de los elementos probatorios acerca de la existencia o
inexistencia de determinada vacante en un momento concreto, no sólo porque a su
alcance se encuentra la pertinente documentación, sino además porque la posible
inexistencia, pese a tratarse de un hecho negativo, puede perfectamente probarla, en
el caso de ser cierta, por cualquiera de los demás medios admitidos en derecho, entre
ellos la testifical a cargo del personal conocedor del hecho.SEPTIMO.- En el presente
caso se cumplen las exigencias para ese desplazamiento de la carga de la prueba,
pues, por una parte, es evidente la dificultad probatória de la trabajadora para acreditar
las incidencias de la gestión de las listas y em, particular, las personas contratadas y
su calificación de acuerdo con el baremo. Por outra parte, la posición de la empresa
en orden al control y disposición de la prueba sobre los processos de selección
facilita extraordinariamente su acceso y utilización de los instrumento
correspondientes. Por ello, la entidade empleadora no puede limitarse a indicar que
“no se ha acreditado el derecho a ser contratado” en atención a “los contratos que le
hubieran correspondido “por el orden que ocupaba (sic) en las listas”.
80

O referido aresto trata de uma demanda de candidata a uma vaga


de trabalho que alega não ter logrado êxito na seleção, realizada pela
empresa ES Correios, por ter sofrido tratamento discriminatório perpetrado
pela ré.
Conforme relatado, a Corte Suprema espanhola aplicou a
dinamização do ônus da prova sopesando as dificuldades probatórias da
parte autora com a posição privilegiada da parte ré em relação aos meios de
prova, para garantir a igualdade substancial das partes. Esse Tribunal
reconheceu que a posição de vantagem do empregador, nesse caso, era uma
decorrência lógica da necessidade de este documentar o processo seletivo
dos candidatos, tendo por isso o ônus de apresentar os pressupostos fáticos
que levaram o empregador a não selecionar a candidata, provando que não
discriminou ilegalmente a trabalhadora.
Além disso, a trabalhadora estava diante de uma prova impossível,
pois não tinha com ter acesso a tais documentos. Assim, aplicaram-se os
critérios da disponibilidade e facilidade probatória, previstos no número 7 do
art. 217 da LEC espanhola, autorizadores da dinamização em questão.
Observa-se que esses critérios se resumem no princípio da
“aptidão para a prova”, adotado pela doutrina e pela jurisprudência processual
trabalhista no Brasil, assunto que é tratado nos próximos itens.

3.2 O ÔNUS DINÂMICO DA PROVA NO PROCESSO CIVIL


PÁTRIO E NO PROJETO DO NOVO CPC
No Brasil, a teoria dinâmica de distribuição do ônus da prova tem
tido boa acolhida pela maior parte dos processualistas civis modernos,
destaque para Marinoni (2013, p. 03-07), Daniel Mitidiero (2012, p. 75), Didier
Júnior et al. (2012, p. 96), Bueno (2009, p. 248), Freitas Câmara (2012, p.
397), Eduardo Cambi (2006, p. 341), Danilo Knijnik (2006, p. 942-951) Carpes
(2008), Azário (2006), Garcia Redondo (2010, p.19), Pacífico (2011, p. 301-
322), Antônio Janyr Dall’Agnol Junior, Antônio Danilo Moura de Azevedo, Miguel
Kfouri Neto (apud VARGAS, 2009, p. 73-76).
A título de ilustração segue o posicionamento de três desses
processualistas sobre a aplicação da dinamização no ordenamento pátrio.
81

Freitas Câmara (2012, p. 397), explicando a teoria dinâmica do


ônus da prova, argumenta que se trata de instrumento que possibilita ao
julgador atribuir o encargo probatório ao litigante que, in concreto, apresenta-
se em melhores condições de produzir a prova.
Complementa afirmando que somente deve ser utilizado esse
instrumento quando a parte legalmente onerada estiver diante de uma prova
impossível de ser produzida, ou seja, defende a adoção dessa teoria de forma
excepcional à regra da teoria estática prevista no art. 333, I e II, do CPC
(incumbe ao demandante o ônus da prova de fato constitutivo do direito que
alega e ao demandado a prova dos demais).
Em síntese, esse autor estabelece como requisitos para a
dinamização no processo cível a disponibilidade e a facilidade para prova, o
que ele chama de “domínio sobre prova”. Como visto alhures, ele adota os
mesmo critérios do ordenamento espanhol.
Além desses requisitos, Eduardo Cambi (2006, p. 346) sustenta
que o magistrado somente deve se valer da distribuição dinâmica se cotejá-la
com as máximas de experiência. Essas máximas seriam as presunções
hominis, “aquelas que se formam na convicção dos homens, fundadas naquilo
que comumente acontece” (SOUTO MAIOR, 2010, p. 69). Esse requisito é o
que faz com que o magistrado possa adotar a alegação verossímil da parte
como verdadeira até prova em contrário. Assim, o juiz, ao empregar a referida
técnica, deverá verificar se a parte apresentou algum indício que fundamente
a verossimilhança do seu pedido.
Nesse mesmo sentido, Marinoni (2013, p. 03-07, online), apesar de
não se referir diretamente à teoria dinâmica, sustenta que “quando se fala que
a regra do art. 333 importa para a formação do convencimento, deseja-se
dizer que ela pode ser atenuada ou invertida diante de determinadas
situações de direito substancial” (destaques do autor). Tais situações se
referem aos casos de lesões pré-natais, de seguro e relativos a atividades
perigosas. Esse autor reconhece que, nesses casos, basta o mero juízo de
verossimilhança para tirar o juiz do estado de incerteza e, consequentemente,
o legitima a inverter o ônus da prova “quando ao autor é impossível, ou muito
difícil, provar o fato constitutivo, mas ao réu é viável, ou muito mais fácil,
provar a sua inexistência”.
82

Esse processualista reconhece assim a dinamização como técnica


de inversão do encargo probatório, tendo como requisito necessário a
verossimilhança, diferindo da teoria argentina e do ordenamento espanhol
somente quanto à exigência desse requisito.
Além desses autores, há de se enfatizar o nome de Ada Pellegrini
Grinover, Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, Kazuo Watanabe e Antônio Gidi,
todos idealizadores do Anteprojeto do Código Brasileiro de Processos Coletivos
(versão 2007), que prevê em seu art. 11, § 1º, a adoção dessa teoria nos seguintes
termos:

Art. 11. Provas – São admissíveis em juízo todos os meios de


prova, desde que obtidos por meios lícitos, incluindo a prova
estatística ou por amostragem.
§ 1º Sem prejuízo do disposto no artigo 333 do Código de
Processo Civil, o ônus da prova incumbe à parte que
detiver conhecimentos técnicos ou informações
específicas sobre os fatos, ou maior facilidade em sua
demonstração.
§ 2º O ônus da prova poderá ser invertido quando, a
critério do juiz, for verossímil a alegação, segundo as
regras ordinárias de experiência, ou quando a parte for
hipossuficiente.
§ 3º Durante a fase instrutória, surgindo modificação de fato
ou de direito relevante para o julgamento da causa (parágrafo
único do artigo 5º deste Código), o juiz poderá rever, em
decisão motivada, a distribuição do ônus da prova,
concedendo à parte a quem for atribuída a incumbência
prazo razoável para sua produção, observado o
contraditório em relação à parte contrária (artigo 25,
parágrafo 5º, inciso IV).
§ 4º. O juiz poderá determinar de ofício a produção de provas,
observado o contraditório. (destacou-se)

No parágrafo primeiro acima citado, há a adoção expressa da


teoria dinâmica quando se refere à imposição do ônus da prova à parte que
estiver em melhores condições técnicas e fáticas de demonstrar seus
conhecimentos para a solução da lide.
Já o parágrafo segundo traz a técnica da inversão do ônus da
prova ope judices (“a critério do juiz”), a mesma prevista no Código de Defesa
do Consumidor (art. 6º, VIII), que estabelece os requisitos da verossimilhança
83

(máximas de experiência) ou hipossuficiência da parte como pressupostos


para o julgador aplicar a inversão.
Por sua vez, o parágrafo terceiro traz a possibilidade de
redistribuição do ônus da prova no curso da instrução probatória, decorrendo
de alteração fático-jurídica superveniente.
A jurisprudência no âmbito cível também já se mostra receptiva à
dinamização do ônus da prova, como pode ser observado no seguinte julgado
do Superior Tribunal de Justiça, de 1996:

"RESPONSABILIDADE CIVIL. MÉDICO. CLÍNICA. CULPA.


PROVA.
1. Não viola regra sobre a prova o acórdão que, além de
aceitar implicitamente o princípio da carga dinâmica da
prova, examina o conjunto probatório e conclui pela
comprovação da culpa dos réus.
2. Legitimidade passiva da clínica, inicialmente procurada
pelo paciente.
3. Juntada de textos científicos determinada de ofício pelo
juiz.
Regularidade.
4. Responsabilização da clínica e do médico que atendeu o
paciente submetido a uma operação cirúrgica da qual resultou
a secção da medula.
5. Inexistência de ofensa à lei e divergência não
demonstrada.
Recurso Especial não conhecido"
(REsp 69309/SC, Rel. Ministro Ruy Rosado de Aguiar,
QUARTA TURMA, julgado em 18/06/1996, DJ 26/08/1996, p.
29688).

Como visto, a Corte adotou a distribuição dinâmica por entender


que a clínica e o médico possuíam conhecimentos técnicos e privilégios
materiais (detenção dos documentos e prontuários do paciente) em relação
aos meios de provas, além do quê, nessa situação, o paciente que teve a
medula seccionada estava literalmente diante de uma prova diabólica para
demonstrar a responsabilidade dos réus.
Com efeito, em virtude da recepção da teoria dinâmica do ônus da
prova pela doutrina e pela jurisprudência pátrias, o projeto de Novo Código de
84

Processo Civil brasileiro, que tramita no Congresso Nacional, consagra essa


teoria nos seguintes termos:

Art. 380. O ônus da prova incumbe:


[...]
§ 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da
causa, relacionadas à impossibilidade ou à excessiva
dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à
maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário,
poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde
que o faça por decisão fundamentada. Neste caso, o juiz
deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus
que lhe foi atribuído.
§ 2º A decisão prevista no § 1º deste artigo não pode gerar
situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja
impossível ou excessivamente difícil.
[...]

Do exame desse dispositivo, observa-se, de lege ferenda, que o


legislador pátrio recepciona a distribuição dinâmica do ônus com base nos
direitos fundamentais processuais apresentados no 2° capítulo desta
pesquisa, pois estabelece expressamente o poder-dever do magistrado de
assegurar o direito fundamental das partes à igualdade substancial em
relação à prova, sem descurar da tutela do contraditório da parte que passa a
sofrer o ônus dinamizado.
Nesse sentido, o novo CPC prevê expressamente que o momento
da dinamização deve ser antes da sentença e de modo que oportunize à
parte as condições para se desincumbir desse ônus, evitando que um
instrumento voltado para assegurar uma prestação jurisdicional efetivamente
justa acabe por fomentar injustiças.
Infelizmente, fugiria do objetivo desta monografia tecer maiores
considerações sobre a aplicação da teoria dinâmica no âmbito do processo
civil, isso porque o foco principal deste trabalho é a análise da adoção dessa
teoria pela Justiça do Trabalho brasileira na perspectiva dos direitos
fundamentais processuais, o que se faz no próximo item.
85

3.3 A DINAMIZAÇÃO DO ONUS PROBANDI NO PROCESSO DO


TRABALHO BRASILEIRO

3.3.1 Aspectos controvertidos: perspectiva doutrinária e


jurisprudencial

A partir desse momento, a presente pesquisa tratará da adoção da


teoria dinâmica do ônus da prova no âmbito do processo trabalhista,
procurando analisar criticamente as principais controvérsias doutrinárias
sobre essa teoria e os seus reflexos na jurisprudência dos tribunais do
trabalho, tudo sob o enfoque dos direitos fundamentais processuais.
Com efeito, foram identificadas três controvérsias relevantes na
recepção da teoria dinâmica do ônus da prova pelos doutrinadores e que
acabam influenciando as decisões judiciais. A primeira delas tem a ver com
as objeções de parte da doutrina à adoção da teoria dinâmica e a sua relação
com o princípio da aptidão para a prova no processo do trabalho. A segunda
refere-se à existência ou não de distinção entre a técnica da dinamização do
ônus da prova e a inversão ope juidices positivada no art. 6°, VIII, do CDC. A
terceira e última controvérsia relaciona-se ao momento ideal para a
dinamização do onus probandi, se no início da instrução ou apenas na
sentença.
Tais controvérsias são analisadas nos tópicos seguintes.

3.3.1.1 Objeções à dinamização e o princípio da aptidão à prova

Garcia Grande é considerado pela doutrina argentina como o


principal crítico da teoria das cargas probatórias dinâmicas. Além dele, Foresti
Pego (2010, p. 80) é contra a adoção dessa teoria pelos tribunais trabalhistas
no Brasil.
O jurista argentino elenca duas relevantes objeções à adoção da
teoria dinâmica. Primeiramente, ele sustenta que as decisões, nos casos de
ausência de prova eficaz, devem ser proferidas com base nas presunções
legais e não na regra estática de distribuição do ônus da prova. Desse modo,
86

e de acordo com o autor, como nem a regra estática é determinante para a


solução dos litígios com insuficiência de provas, muito menos a dinamização
seria necessária, pois há as presunções legais. Já a segunda objeção desse
jurista refere-se ao fato de que haveria um conflito insuperável entre o
princípio constitucional de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si
e a dinamização que impele a parte a produzir a prova de sua inocência
(GARCÍA GRANDE, 2005, p. 99-100).
Em relação à primeira objeção, Foresti Pego (2010, p. 74) utiliza o
mesmo argumento do autor argentino para sustentar que não há dinamização
do ônus da prova no processo do trabalho. Para ele, tais dinamizações
seriam, na verdade, a aplicação da regra estática de forma indireta por meio
das presunções legais e judiciais.
Peyrano (2008, p. 92) contrapõe essa primeira crítica afirmando
que a teoria dinâmica não nega o papel fundamental das presunções legais
que, juntamente com a regra estática, resolvem os casos mais corriqueiros de
insuficiência de provas eficazes. Contudo, alguns litígios não são
solucionados a contento e de forma justa nem por essas presunções legais e
muito menos pela regra estática baseada na posição dos litigantes (autor e
réu) e na natureza dos fatos (constitutivos, impeditivos, modificativos ou
extintivos). São para esses casos extremos, cuja prova se mostra impossível
ou muito difícil de ser produzida (probatio diabolica), que a dinamização deve
ser empregada.
Comentando este ponto, Ambrósio (2013, p. 72) posiciona-se
também contra a crítica de García Grande nos seguintes termos:

[...] a teoria das cargas probatórias dinâmicas não afeta o


sistema de presunções, pois a fixação do ônus da prova
ocorre em momento posterior à identificação daquelas
presunções. Ou seja, primeiro o magistrado deve verificar se
existem presunções legais que favoreçam as partes para,
somente depois, definir a quem cabe provar os fatos que
ainda restam controvertidos, pois os acontecimentos em cujo
favor milita presunção legal de existência ou de veracidade
não dependem de prova (art. 334, IV, do CPC).

Percebe-se que a autora delimitou o momento processual de


atuação do magistrado quando da aplicação de ambas as técnicas. Primeiro
aplica-se a técnica das presunções legais; mostrando-se esta insatisfatória –
87

à luz dos direitos fundamentais da igualdade substancial, da prova, do devido


processo legal e do acesso a uma decisão justa - adota-se a dinamização do
ônus da prova, impondo esse encargo à parte que se encontra mais apta à
produção probatória.
Portanto, o equívoco da crítica de Foresti Pego acima está no fato
de que apenas as presunções legais - e não as judiciais (hominis), como
afirma o autor – podem ser consideradas como aplicação indireta da regra
estática dos arts. 818 da CLT e 333 do CPC, pois o art. 334, IV, do CPC,
somente considera provado o fato cuja presunção legal [destacou-se] de
veracidade milita a seu favor, excluindo as presunções judiciais desse rol e
que são, na verdade, balizas para a aplicação do ônus probatório dinâmico.
Portanto, as presunções legais são suficientes para solucionar os
litígios ordinários fundados em insuficiência de provas; nas lides extremas, o
julgador deve-se utilizar da dinamização, tendo como critérios a parte mais
apta à prova, as presunções judiciais (máximas de experiência) e a
ponderação dos direitos fundamentais.
Oportuno abrir um parêntese, nesse momento, para esclarecer o
que são presunções, indícios, máximas de experiência, prova prima facie e
verossimilhança, para que se possa bem compreender como os tribunais
estão aplicando a teoria dinâmica do ônus da prova.
As presunções são deduções lógicas realizadas pelo julgador que
“[...] partindo-se de um fato conhecido (indício), admite-se como verdadeira a
existência de um fato desconhecido” (PAULA, 2010, p. 67). Este último fato é
necessariamente o principal e relevante para a solução da lide.
Tais presunções podem ser de dois tipos: as legais, decorrentes de
previsão expressa do direito material, e as judiciais - também conhecidas por
simples, comuns ou de homem (hominis) -, resultantes do raciocínio do juiz
baseado em sua experiência de vida e no que normalmente ocorre (máximas
de experiência) (DIDER JÚNIR et al., 2012, p. 68).
Os indícios são os fatos secundários que necessariamente
precisam ser provados para que julgador, por meio das presunções (legais ou
judiciais), deduza a ocorrência do fato principal (desconhecido).
As máximas de experiência são regras concebidas pelo julgador
com base em conhecimentos comuns ao homem médio ou no que
88

normalmente acontece, com forte influência da bagagem cultural do


magistrado (MACÊDO; PEIXOTO, 2014, p. 85). Segundo Souto Maior (2010,
p.69), as máximas de experiência são presunções judiciais (hominis),
devendo serem aplicadas de ofício pelo julgador. São também sinônimos de
prova prima facie (CAMBI, 2006, p. 385-386).
Já a verossimilhança, conforme Santos (1955, p. 441), é a
aparência de verdade dos fatos alegados, decorrendo do raciocínio dedutivo
do juiz quando analisa tais alegações à luz das máximas de experiência.
Dessa forma, a verossimilhança é o resultado do convencimento do julgador
acerca da existência de um fato desconhecido com base em uma prova
indiciária (máximas de experiência, presunção judicial ou prova prima facie).
Diante de todo o exposto, conclui-se que a utilização das
presunções legais pelo julgador na distribuição do ônus da prova nada mais é
que a aplicação indireta da regra estática, não havendo que se falar em
dinamização ou inversão do ônus da prova nesses casos. Em contrapartida, a
teoria dinâmica somente deverá ser empregada quando o julgador puder se
utilizar das presunções judiciais (hominis), conforme lições de Souto Maior
(2010, p. 73), e também quando uma das partes estiver em melhores
condições para produzir a prova.
Nesse sentido, a Súmula 338 do TST mostra-se bastante didática
para a compreensão de como os institutos apresentados estão sendo
aplicados na prática forense trabalhista. Segue a transcrição:

338. Jornada de trabalho. Registro. Ônus da prova.


I – É ônus do empregador que conta com mais de 10 (dez)
empregados o registro da jornada de trabalho na forma do art.
74, § 2°, da CLT. A não apresentação injustificada dos
controles de frequência gera presunção relativa de veracidade
da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em
contrário.
II – A presunção de veracidade da jornada de trabalho, ainda
que prevista em instrumento normativo, pode ser elidida por
prova em contrário.
III – Os cartões de ponto que demonstram horários de entrada
e saída uniformes são inválidos como meio de prova,
invertendo‑se o ônus da prova, relativo às horas extras, que
passa a ser do empregador, prevalecendo a jornada da inicial
se dele não se desincumbir.
89

Esta Súmula espelha, nos itens I e II, a presunção legal relativa


que decorre da não apresentação dos controles de frequência pelos
empregadores que contam com mais de dez funcionários, quando requerido
pela parte ou ordenado pelo juiz. O fato de o empregador, nessas condições,
não colacionar os cartões de ponto (indício), leva o julgador a presumir que os
horários alegados pelo reclamante são verossímeis, ou seja, a lei considera
(art. 334, IV, do CPC) que o autor provou o fato constitutivo do seu direito (art.
818 da CLT e art. 333, I, do CPC). Portanto, não havia necessidade de o TST
ter sumulado isso, porque essa presunção legal é uma decorrência lógica da
interpretação do art. 74, § 2°, da CLT que impõe ao empregador, com mais de dez
funcionários, o dever de registro e guarda dos cartões de frequência deles.
Realmente, conforme assinala Foresti Pego (2010, p. 85), não há
nesse caso qualquer inversão ou dinamização do ônus da prova, é pura
aplicação da regra estática.
Todavia, esse mesmo autor sustenta que o item III é um exemplo
de inversão ilegal do ônus da prova, pois a CLT, segundo ele, não autoriza
qualquer tipo de mudança do encargo probatório (PEGO, 2010, p. 86).
Nessa mesma esteira, Michele Taruffo afirma que qualquer
modificação do encargo probatório, não prevista ou autorizada por lei, seria
uma indevida e discricionária interferência do magistrado no curso do
processo (2012, apud MACÊDO; PEIXOTO, 2014, p. 209).
Com a devida vênia, percebe-se que a compreensão de Direito
desses autores é extremamente legalista, residindo nessa concepção o
equívoco dos argumentos. De acordo com o que foi demonstrado no item 2.3
do 2º capítulo desta pesquisa, não há necessidade de previsão legal para a
modificação (dinamização) do ônus da prova, porque a própria Constituição
estabelece os parâmetros de legitimidade para o emprego dessa técnica
moderna de solução de litígios. Tais parâmetros referem-se à exigência de
efetividade na prestação jurisdicional e à concretização do direito fundamental
de acesso à ordem jurídica justa, do devido processo legal e de todos os seus
consectários que se relacionam ao ônus da prova (AMBRÓSIO, 2013, p. 87).
Esses direitos fundamentais, conforme já exposto, possuem a necessária
força normativa para garantir a justiça das decisões.
90

De acordo com Macêdo e Peixoto (2014, p. 210), hoje se tem


admitido, doutrinária e jurisprudencialmente, a aplicação direta dos preceitos
constitucionais.
Nesse ponto, não custa lembrar as palavras de Cunha (2013, p.
345) citadas no segundo capítulo:

[...] já há tempos que as dinâmicas procedimentais e


decisórias desenvolvem-se levando em conta não apenas a
legislação aplicável, mas caracterizada pela busca de uma
solução sempre equitativa, razoável e aceitável, o que afasta
a atividade real dos magistrados das tradicionais concepções
que os ligavam ao afirmado pelas leis.

Essa mudança de paradigma é uma decorrência da atual forma de


compreender o Direito, mais rente aos valores sociais do vigente Estado
Democrático de Direito.
Consoante esse entendimento, Robson Renault Godinho leciona
que:

se o cumprimento do ônus probatório pode significar a tutela


do direito reclamado em juízo, parece-nos intuitivo que as
regras que disciplinam sua distribuição afetam diretamente a
garantia do acesso à justiça. Se a distribuição do ônus da
prova se der de uma forma que seja impossível que o
interessado dele se desincumba, em última análise estará
sendo-lhe negado o acesso à tutela jurisdicional [...] como a
necessidade de inversão do ônus da prova decorre
diretamente da Constituição, não há necessidade de
integração legislativa, que, contudo, poderá existir e possuirá
um caráter pedagógico e simbólico que facilitará o acesso à
justiça (2007, p. 386, 387 e 395).

Apesar de tratar da inversão do ônus da prova, a abordagem do


autor é perfeitamente aplicável ao instituto da dinamização, pois a finalidade
desses dois mecanismos é a mesma, ou seja, assegurar a efetiva
concretização dos direitos fundamentais processuais, em especial, do direito
de acesso à justiça efetiva.
Lembrando que o magistrado, apesar de não estar
obrigatoriamente vinculado à norma legal, exerce sua atividade de forma
controlada, pois a própria Constituição o obriga a fundamentar suas decisões
91

(art. 93, IX). Essa fundamentação será tanto mais legítima quanto mais
racionalmente for justificada a decisão (MARINONI; ARENHART, 2014, p.
269). Isso só é possível através da utilização de mecanismos como as
máximas de experiência e o princípio da proporcionalidade, que devem ser
utilizados sempre como balizas para a aplicação da dinamização do ônus da
prova (SOUTO MAIOR, 2010, p. 73).
Diante de tais considerações, o item III da Súmula retrotranscrita,
que prevê hipótese de dinamização do ônus da prova, nos casos de cartões
de pontos “britânicos”, é legítimo porque assegura a efetiva tutela jurisdicional
ao empregado que tem seu direito a horas-extras ameaçado por uma possível
fraude nos controles de frequência.
O TST, nesse caso, apenas confirmou a presunção judicial,
fundada na máxima de experiência, de que um registro uniforme de entrada e
saída do reclamante deduz a sua burla por parte do empregador, tornando a
alegação de horas-extras do reclamante verossímil. Esse é um típico caso de
dinamização do ônus da prova, apesar de terem definido como inversão, pois
o julgador não se baseará nas posições das partes (autor/réu) e muito menos
na natureza dos fatos a serem provados. Pelo contrário, ele distribuirá, de
acordo com o caso concreto, o ônus da prova à parte que está em melhor
condição para a produção probatória e desconsiderará as provas nitidamente
manipuladas por este.
Em relação à segunda objeção do argentino García Grande acima,
que afirma haver uma contradição insuperável entre o princípio constitucional
de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si e a dinamização do
ônus da prova, Feliciano (apud AMBRÓSIO, 2013, p. 104-105) afirma
categoricamente que essa crítica não procede, pelo menos no ordenamento
jurídico brasileiro. Isto se deve pelo simples fato de que o princípio da não
autoincriminação (não ser obrigado a produzir prova contra si) somente é
aplicável no âmbito penal. O jurista brasileiro lembra que há apenas duas
situações em que esse princípio é aplicável no curso de processo cível, são
elas: quando a própria lei desobriga as partes de depor sobre fatos criminosos
ou torpes de que são acusadas (art. 347, I do CPC), e nas situações em que
a lei exime as testemunhas de deporem sobre acontecimentos que lhes
possam trazer sérios danos (art. 406, I, do CPC). Ou seja, as partes só podem
92

se valer do princípio da não autoincriminação para evitar consequências de


cunho penal.
Para fundamentar tal posicionamento, Feliciano sustenta que:

a ideia geral de que o réu não pode ser instado a produzir


prova contra si só faz sentido no processo penal, em que o
acusado sofre especial constrangimento (o processo-crime é
por si mesmo estigmatizante), está frequentemente em jogo a
sua liberdade pessoal e as dúvidas se resolvem sempre em
seu favor (princípio do favor rei). Nesse âmbito, o princípio da
igualdade processual ou do tratamento paritário admite
desvios estruturais em função de concessões axiológicas ao
princípio do estado de inocência e à preservação do status
libertatis (daí porque, p. ex., o sistema processual penal
brasileiro consagra recursos e ações de exclusivo proveito do
réu). Já não é assim, porém, no processo civil, em que a
igualdade formal das partes geralmente prevalece, com
algumas ressalvas em prol da igualdade substancial. (apud
AMBRÓSIO, 2013, p. 105)

Como visto, o autor utiliza como argumento a relevância do bem


jurídico discutido na esfera penal (a liberdade) e a desigualdade extrema
entre os litigantes (Estado versus acusado). Arremata dizendo que, no
processo civil, nenhum bem jurídico tem importância que se aproxime do valor
liberdade e não há, como regra, acentuada desigualdade entre as partes, por
isso não cabe o princípio da não autoincriminação como fundamento de
defesa.
Analisando-se essa questão sob o enfoque da Teoria dos Direitos
Fundamentais, percebe-se que o posicionamento do autor brasileiro é
corroborado pela técnica de ponderação de princípios. Dessa forma, quando
houver a colisão entre o direito fundamental (princípio) de liberdade e
qualquer outro direito fundamental processual, como, por exemplo, os
relacionados à teoria dinâmica do ônus da prova – estudados no 2º capítulo -
deve-se dar maior efetividade ao direito de liberdade, sem extinguir totalmente
os demais. Essa importância do direito fundamental de liberdade deve-se ao
fato de ele estar mais intimamente relacionado ao princípio da dignidade
humana que os demais, devendo por isso preponderar quando em colisão.
Trazendo para a esfera trabalhista, em que o bem jurídico
debatido (crédito trabalhista) tem natureza alimentar e influencia na
93

sobrevivência digna do trabalhador e de sua família, preponderam os direitos


fundamentais processuais sobre o direito fundamental de propriedade do
empregador. Nesses casos, deve recair o ônus da prova sobre o reclamado
quando ele estiver em melhores condições de produzir a prova eficaz, não
havendo, portanto, que se falar em direito de não produzir prova contra si,
pois não há possibilidade de lesão ao seu direito fundamental de liberdade no
âmbito trabalhista, pelo menos em regra.
Essa melhor condição de produzir a prova, na seara trabalhista, é
conhecida pela doutrina como princípio da aptidão para a prova [destacou-
se]. “Significa esse princípio que a prova deverá ser produzida por aquela
parte que a detém ou que tem acesso à mesma, sendo inacessível à parte
contrária” (PAULA, 2010, p.120).
Esse princípio já havia sido delineado por Carnelutti, em meados
do séc. XX, nos seguintes termos:

[...] do ponto de vista teleológico, levando em consideração a


finalidade do processo, é evidente que o critério tem de ser
escolhido, não mais com referência à sua idoneidade para
distinguir as partes com respeito ao fato, mas também com
referência à conveniência de estimular a prova àquela delas
que mais provavelmente esteja em condições de contribuir e,
portanto, com base em uma regra de experiência, que
estabeleça qual das partes esteja em condições melhores
para este fim. Somente assim o ônus da prova constituiria um
instrumento para alcançar a finalidade do processo, que não é
a simples composição, mas composição justa do litígio:
destarte, reage sobre a parte que pode contribuir mais
utilmente para a convicção do juiz; e por isso, quando tal
convicção tiver de se formar da falta de prova, ou seja,
quando o juiz tiver de desatender uma afirmação apenas
porque a parte não a provou, oferece a probabilidade máxima
da coincidência de tal convicção com a realidade (2004,
p.132-133, destaques do autor).

Como visto, o influente processualista italiano já estabelecia a base


do princípio da aptidão para a prova, que é a melhor condição da parte para a
atividade probatória, e também prescrevia as máximas de experiência (regras)
como critério norteador para o magistrado definir quais partes estariam em
melhores condições.
94

Teixeira Filho (2010, p. 100) leciona que o princípio da aptidão para


prova deve ser manejado de forma subsidiária à regra do art. 818, da CLT, a
partir do momento que essa norma distribuir de forma injusta o encargo
probatório no cotejo com a situação fática posta em juízo.
Paula (2010, p. 123), baseando-se nas lições de Monteiro Aroca,
estabelece como fundamentos para a aplicação desse princípio a justiça
distributiva conjugada ao princípio da igualdade e o princípio da boa-fé
[destacou-se]. Ele utiliza como critério para o emprego desse princípio a
proximidade real e a facilidade do acesso às fontes de prova.
Como se depreende dos posicionamentos acima, há uma íntima
relação entre o princípio da aptidão para a prova e a teoria dinâmica difundida
por Jorge W. Peyrano.
Por isso, Mauro Schiavi (2013, p. 45) dispõe que o princípio da
aptidão para prova é a própria teoria dinâmica recepcionada pelos
processualistas do trabalho.
Nesse sentido, alguns acórdãos do TST apresentam esse
posicionamento, como pode ser visto no aresto a seguir:

RECURSO DE REVISTA. [...] FGTS. DIFERENÇAS. ÔNUS


DA PROVA. Cancelada, por meio da Resolução 175/2011, a
OJ 301/SDI-I (-FGTS. DIFERENÇAS. ÔNUS DA PROVA. LEI
Nº 8.036/90, ART. 17. Definido pelo reclamante o período no
qual não houve depósito do FGTS, ou houve em valor inferior,
alegada pela reclamada a inexistência de diferença nos
recolhimentos de FGTS, atrai para si o ônus da prova,
incumbindo-lhe, portanto, apresentar as guias respectivas, a
fim de demonstrar o fato extintivo do direito do autor (art. 818
da CLT c/c art. 333, II, do CPC)-), entende-se que é do
empregador o ônus da prova da regularidade dos depósitos
do FGTS, independentemente de o empregado delimitar o
período no qual não teria havido o correto recolhimento -
posicionamento que se mostra em consonância com o
princípio da aptidão para prova ou da distribuição
dinâmica do ônus da prova, segundo o qual a prova deve
ser produzida pela parte que a detém ou que a ela possui
mais fácil acesso. Revista conhecida e provida, no tema.
(RR - 135900-34.2008.5.09.0022, Rel. Ministra: ROSA MARIA
WEBER, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/09/2011, DEJT
07/10/2011)

Trata-se de um recurso de revista interposto pelo reclamante


contra acórdão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT), da 9ª Região, que
95

indeferiu o pedido de diferenças do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço


(FGTS), confirmando a sentença de primeiro grau.
O tribunal a quo havia negado provimento ao recurso do autor por
entender que ainda cabia a ele provar o período no qual não havia depósito
do FGTS, ou havia em valor inferior, de acordo com a Orientação
Jurisprudencial (OJ) 301 da Seção de Dissídios Individuais I (SDI-I). Por não
ter se desincumbido desse ônus, o reclamante teve seu pedido negado pela
Corte regional.
No entanto, como houve o cancelamento desse verbete
jurisprudencial - por meio da Resolução 175/2011 do Tribunal Superior do
Trabalho (TST) - a Terceira Turma dessa Corte superior entendeu que caberia
apenas ao empregador o ônus da prova referente à regularidade dos
depósitos do FGTS e que seria desnecessário exigir do empregado a
delimitação do período dos recolhimentos incorretos. Como o empregador
não apresentou a documentação comprobatória da regularidade dos
recolhimentos ao FGTS, não se desvencilhou desse ônus. Em virtude disso, a
Turma decidiu pelo provimento do recurso do autor, acolhendo como
verdadeiras as suas alegações na inicial e deferindo as diferenças
pretendidas.
A relatora, então ministra Rosa Weber, deixou claro que a
mudança no entendimento jurisprudencial do TST era coerente com o
princípio da aptidão para a prova, afirmando, em seguida, que esse princípio
era a própria distribuição dinâmica, seguindo o posicionamento de Mauro
Shiavi (2013, p. 45).
Realmente, nesses litígios, o empregador está em melhores
condições que o trabalhador para apresentar a comprovação da regularidade
dos depósitos do FGTS. Isto se deve porque o reclamado tem obrigação legal
de manter a documentação que prova os depósitos para fins de fiscalização
do Ministério do Trabalho e Emprego e também para repassar essas
informações aos empregados, conforme determinação contida nos arts. 17 e
23, da Lei n° 8036/1990, in verbis:

Art. 17. Os empregadores se obrigam a comunicar


mensalmente aos trabalhadores os valores recolhidos ao
96

FGTS e repassar‑lhes todas as informações sobre suas


contas vinculadas recebidas da Caixa Econômica Federal ou
dos bancos depositários.
[...]
Art. 23. Competirá ao Ministério do Trabalho e da Previdência
Social a verificação, em nome da Caixa Econômica Federal,
do cumprimento do disposto nesta Lei, especialmente quanto
à apuração dos débitos e das infrações praticadas pelos
empregadores ou tomadores de serviço, notificando‑os para
efetuarem e comprovarem os depósitos correspondentes e
cumprirem as demais determinações legais, podendo, para
tanto, contar com o concurso de outros órgãos do Governo
Federal, na forma que vier a ser regulamentada.

Como se depreende desses dispositivos, há o dever de o


empregador manter em ordem e disponível para a fiscalização os documentos
referentes aos depósitos do FGTS, sendo, portanto, tais documentos comuns
ao empregador e ao empregado. Em virtude dessa imposição legal, concorda-
se com Paula (2010, p. 12), que defende ser do empregador o ônus de instruir
o processo com tais documentos sem necessidade de determinação judicial.
Por isso, agiu bem o TST em cancelar a OJ 301 SDI-I, que criava
um ônus ilegal para o empregado em ter que delimitar o período de depósito
irregular do FGTS, pois, além de a lei não estabelecer essa obrigação, a
própria legislação determina ser apenas do empregador o encargo de provar
a sua regularidade frente ao fundo garantidor.
Esse tipo de mudança de entendimento do TST, passando a
acolher a teoria dinâmica, também pode ser visto no tratamento das ações
que demandam o pagamento de indenização de vale-transporte. A título de
exemplo, segue ementa de acórdão nesse sentido:

RECURSO DE REVISTA. [...] 3. VALE-TRANSPORTE.


INDENIZAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. Este colendo Tribunal
Superior do Trabalho, por meio da Orientação Jurisprudencial
nº 215 da SBDI - 1, entendia ser ônus do empregado provar o
preenchimento dos requisitos indispensáveis à obtenção do
vale-transporte. Contudo, revendo seu posicionamento,
referida Orientação foi cancelada. Desse modo, pela própria
teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, é
notório que se apresenta mais propício ao empregador
comprovar que o empregado não satisfez os requisitos para a
concessão do vale-transporte que ao trabalhador provar que o
satisfez. Nesse contexto, incumbe à reclamada a prova de
que a reclamante não satisfazia os requisitos para concessão
97

dos vales-transporte ou que os recebeu à contento, ônus do


qual não se desincumbiu. Recurso de revista não conhecido. (
RR - 1004-18.2010.5.04.0121 , Rel. Ministro: GUILHERME
AUGUSTO CAPUTO BASTOS, QUINTA TURMA, julgado em
24/04/2013, Data de Publicação: DEJT 26/04/2013)

Esse aresto se refere ao recurso de revista interposto, desta vez


pela reclamada, contra decisão do TRT da 4ª Região, que a condenou ao
pagamento da indenização relativa aos vales-transporte da autora.
Nesse julgado, a Quinta Turma do TST entendeu que o
cancelamento da OJ n° 215, da SDI-I, que determinava caber à reclamante a
comprovação dos requisitos indispensáveis para a percepção do vale
transporte, manifesta a mudança de pensamento daquela Corte superior em
relação ao ônus da prova, agora adotando a teoria dinâmica como
pressuposto para suas decisões.
No caso em comento, o relator primeiramente sustentou, em seu
voto, que o vale-transporte, instituído pela Lei n° 7.418/85, possui dupla
dimensão jurídica. Ao mesmo tempo em que é um direito do trabalhador, é
também um dever do empregador, decorrente do contrato de trabalho.
Em seguida, especificou que, apesar de o art. 7° do Decreto n° 95.
247/87 determinar que o trabalhador deve preencher certos requisitos para
receber o vale-transporte, tal dispositivo infralegal não é idôneo para impor ao
empregado o ônus de ter que provar tais requisitos judicialmente,
especialmente nas situações em que ele esteja diante de probatio diabolica,
entendimento este que ensejou o cancelamento da OJ 215 – SDI – I,
supracitada.
Observa-se que a referida orientação jurisprudencial nunca poderia
ter sido adotada pelo TST, tendo em vista que criava inconstitucionalmente,
nos moldes da OJ 301-SDI-I acima citada, obstáculo ao exercício do direito
fundamental de acesso à ordem jurídica justa para o trabalhador.
Diante de tais considerações, a Quinta Turma aplicou
expressamente e de forma correta a distribuição dinâmica do ônus da prova,
atribuindo este encargo à reclamada por compreender, à luz das máximas de
experiência, que ela estaria em melhores condições para demonstrar que a
trabalhadora não satisfazia os requisitos para a percepção do vale-transporte.
98

Essa prova deveria ter sido feita facilmente pelo empregador, de forma pré-
constituída, com a exigência de apresentação de declaração da empregada
indicando o endereço em que reside e a utilização ou não de transporte
público.
Não se desvencilhando desse ônus, o TST negou provimento ao
recurso de revista da ré, mantendo a decisão do TRT que a condenou ao
pagamento da indenização de vale-transporte à autora.
Pelo exposto, conclui-se que o TST está admitindo a teoria
dinâmica do ônus da prova em seus julgados, aplicando-a algumas vezes
como sinônimo do princípio da aptidão para a prova.
Foi observado, durante a pesquisa jurisprudencial no sítio do TST,
que essa Corte Superior, até 28 de abril de 2010, não havia feito qualquer
menção à teoria dinâmica do ônus da prova em seus jugados. Até aquela
data, esse Tribunal se utilizava da inversão do ônus da prova com
fundamento no princípio da aptidão à prova para modificar o encargo
probatório. Desde então e até o dia 05 de abril de 2014, data da última
pesquisa, a distribuição dinâmica das cargas probatórias passou a integrar ao
todo 1650 (mil seiscentos e cinquenta) acórdãos do TST, sendo que 1580 (mil
quinhentos e oitenta) deles fazem referência direta ou indireta à expressão
“distribuição dinâmica do ônus da prova”, 69 (sessenta e nove) utilizam o
termo “teoria dinâmica” e 01 (um) julgado utiliza o verbete “cargas probatórias
dinâmicas”.
Com efeito, a dinamização do ônus da prova e o instituto da
inversão da carga probatória são instrumentos processuais distintos, sendo
necessário fazer uma análise das correntes doutrinárias que defendem o
emprego de um e de outro instituto. Além disso, é conveniente expor o
posicionamento atual do TST diante de tais mecanismos processuais.

3.3.1.2 A inversão do ônus da prova e a distribuição dinâmica

Há basicamente três correntes doutrinárias que sustentam a


modificação do ônus da prova no curso do processo.
99

A primeira delas defende que no processo só existem a inversão


do ônus da prova não positivada (aplicável às causas em geral) e a inversão
prevista no art. 6°, VIII, do CDC (aplicável às relações de consumo). São
adeptos dessa doutrina Dinamarco (2009, p. 75-76) e Marcelo Abelha (apud
DIDIER JÚNIOR et al, 2012, p. 89) no âmbito do Processo Civil; Bezerra Leite
(2014, p. 674), Teixeira Filho (2010, p. 100), Paula (2010, p. 119-130) e Souto
Maior (2009, p. 74) no Processo do Trabalho. Estes últimos fundamentam a
adoção da inversão do ônus da prova no princípio da aptidão para a prova e
defendem também a aplicação subsidiária da norma do CDC no processo do
trabalho.
Conforme exposto no tópico anterior, esse posicionamento vem
paulatinamente cedendo espaço para a segunda e terceira correntes
doutrinárias que defendem a adoção da teoria dinâmica do ônus da prova.
Consoante os defensores da segunda corrente, a inversão do ônus
da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC seria a positivação da distribuição
dinâmica. Em outras palavras, inversão e dinamização seriam sinônimos.
Esse pensamento é seguido por processualistas civis como Fredie Didie et al
(2012, p.88), Pederosa Nogueira (2009, p. 113) e Bueno (2009, p. 248). Entre
os processualistas do trabalho que aderem a essa corrente está Feliciano
(2008, p.53). Tal posicionamento pode ser observado no acórdão do TST, em
parte transcrito abaixo:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA.


RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA. CULPA IN VIGILANDO. O Tribunal Regional
decidiu a controvérsia em consonância com os artigos 186 e
927 do Código Civil, que preveem a culpa in vigilando.
Ademais, os artigos 58, III, e 67 da Lei nº 8.666/93 impõem à
administração pública o dever de fiscalizar a execução dos
contratos administrativos de prestação de serviços por ela
celebrados. No presente caso, o ente público tomador dos
serviços não cumpriu adequadamente essa obrigação,
permitindo que a empresa prestadora contratada deixasse de
pagar regularmente a seus empregados as verbas
trabalhistas as quais lhes eram devidas.
[...]
Por fim, esclareço que no caso concreto segunda
reclamada esclareceu em sua defesa que o inadimplemento
das verbas trabalhistas decorreu da falta de repasse de
numerário pelo município de Lorena, sendo que esse se
limitou a apontar a vedação legal de responder pelo débito da
100

empresa prestadora de serviço, do que se conclui a culpa


deste pelo não pagamento das verbas trabalhistas.
Aplica-se aqui a teoria da distribuição dinâmica do ônus
da prova , ou a da aptidão para a prova. A prova deve ser
feita por quem tem melhor aptidão para produzi-la. A regra
encontra previsão legal no art. 6º, VIII, do CDC [destacou-
se], com aplicação subsidiária ao processo do trabalho, nos
termos do art. 769, da CLT. Nada tendo sido comprovado,
considera-se que o município não cumpriu a obrigação de
vigiar o comportamento correto da empresa por ela
contratada.- (fls. 501/503 - grifos no original e apostos)
[...]
Agravo de instrumento conhecido e não provido.
(AIRR - 451-64.2010.5.15.0088 , Relatora Ministra: Dora
Maria da Costa, Data de Julgamento: 07/08/2012, 8ª Turma,
Data de Publicação: DEJT 10/08/2012)

O caso acima exposto trata de um agravo de instrumento em face


de decisão do vice-presidente do TRT da 15ª Região que denegou
seguimento a recurso de revista interposto pelo Município de Lorena - SP,
inconformado por ter sido condenado ao pagamento de créditos trabalhistas
de funcionário de empresa interposta.
Nesse julgado, a 8ª Turma do TST ratificou o entendimento da
Corte regional que concluiu pela responsabilidade subsidiária, por culpa in
vigilando, do Município de Lorena pelas verbas inadimplidas pela empresa
contratada prestadora do serviço. Para chegar a tal conclusão, o relator
aplicou expressamente a dinamização do ônus da prova, entendendo que a
Administração Pública deveria ter provado a efetiva fiscalização das condutas
da empresa terceirizada, por se encontrar em melhores condições que o
trabalhador para provar essa atuação. Como não se desvencilhou desse ônus
dinamizado, restou patente a responsabilidade do Município de Lorena pelas
verbas trabalhistas inadimplidas pela empresa contratada. Além disso, a
prova de má atuação da Administração Pública em tais casos é um exemplo
claro de probatio diabólica para o reclamante, pois é praticamente impossível
a ele produzir essa prova.
Na referida decisão, a Corte adotou o posicionamento da segunda
corrente, capitaneada por Fredie Didie et al. (2012, p.88), que alude para o
fato de que a distribuição dinâmica do ônus da prova teria previsão legal no
art. 6º, VIII, do CDC que estabelece a inversão ope judices e que esse
dispositivo tem aplicação subsidiária no processo do trabalho.
101

Entretanto, esse emprego da dinamização como sinônimo de


inversão do ônus da prova, quando utilizado de forma inadequada, poderá
ensejar o fenômeno da prova diabólica reversa, porque, na inversão prevista
no CDC, o julgador em regra transfere integralmente o thema probando, não
se operando sobre fato específico da lide como ocorre na concepção original
da teoria das cargas dinâmicas (MACÊDO; PEIXOTO, 2014, p. 163).
Por isso, há uma parte da doutrina que enxerga nítida diferença
entre a dinamização do ônus da prova e a inversão prevista no CDC.
Com efeito, a dinamização do ônus da prova, segundo os
processualistas argentinos, é uma técnica diferente da inversão porque atribui
diretamente o peso probatório de fato específico, caso a caso, à parte que se
encontra em melhores condições para provar, pois o que deve ser levado em
consideração é somente a situação probatória favorável da parte. Nesse
caso, o julgador poderá atribuir o ônus da prova tanto para o autor como para
o réu, sem ter como parâmetro o que a regra estática previa.
Já a inversão do ônus da prova parte da regra estática prevista no
art. 333 do CPC para transferir todo o encargo probatório do autor para o réu
nas relações de consumo, em que o julgador identifica a presença dos
requisitos da verossimilhança da alegação do autor ou da sua
hipossuficiência. Em tal situação, o julgador só poderá inverter o ônus da
prova do autor para o réu, nunca o contrário, sendo esta uma das principais
consequências da distinção de ambos os institutos.
Essa distinção de ambos os mecanismos processuais é a base da
terceira corrente que defende a aplicação da dinamização do ônus da prova e
que esta não se confunde com a inversão. Dentre inúmeros doutrinadores
que sustentam essa tese, estão os argentinos Peyrano (apud CARPES, 2008,
p. 124), Leguisamón (2008, p. 117) e Barberio (2008, p. 102). Dentre os
brasileiros, destacam-se no processo civil Eduardo Cambi (2006, p. 346),
Carpes (2008, p. 124), García Redondo (2010, p. 23), Macêdo e Peixoto
(2014, p. 155), Marinoni e Daniel Mitidiero (apud ALMEIDA SANTOS, 2012, p.
624). No processo do trabalho, alinham-se a essa corrente Mauro Schiavi
(2013, p. 75), Gabriella Mareco (2010, p. 58) e Ambrósio (2013, p. 66). Esta
última autora posiciona-se sobre o assunto nos seguintes termos:
102

A inversão do ônus da prova, tal como prevista no art. 6º, VIII,


do CDC, exige a satisfação de um dos seguintes
pressupostos: verossimilhança da alegação ou
hipossuficiência do consumidor. Ao contrário desse instituto, a
teoria das cargas probatórias dinâmicas não se fundamenta
em fato verossímil, mas apenas na aptidão probatória dos
litigantes. Por outro lado, conquanto essa aptidão probatória
possa se aproximar do outro requisito da inversão do ônus da
prova – a hipossuficiência (pois esta também abarca a
hipossuficiência probatória) -, a teoria das cargas probatórias
dinâmicas é mais abrangente e maleável, na medida em que
pode beneficiar inclusive aquele que não se apresenta
hipossuficiente na relação material, mas apenas debilitado em
sua capacidade probatória num determinado processo judicial
(AMBRÓSIO, 2013, p. 66-67).

A referida autora esclarece a principal consequência na adoção da


inversão do CDC ou da dinamização. Esta se baseia apenas na superioridade
probatória de um litigante e na debilidade do outro, aquela tem sempre como
objetivo a facilitação da defesa dos direitos do consumidor. Por isso, a
distribuição dinâmica opera sobre fatos específicos do thema probando, “a
respeito do qual se verifica a assimetria de poder probatório” entre as partes
(PACÍFICO, 2011, p. 315), enquanto que a inversão transfere integralmente o
peso da prova do autor para o réu.
Dessa forma, parafraseando um exemplo de Pacífico (2011, p.
316), a dinamização com essa abordagem pode ser observada nas ações
acidentárias em que, apesar da prova da culpa do empregador vir a ser
deslocada, atribuindo-se a ele o risco pela falta de prova da ausência de
culpa, o reclamante (acidentado) continua onerado da prova da existência da
relação empregatícia, bem como das lesões sofridas e do nexo de
causalidade. Se fosse realmente legítima a aplicação da inversão do ônus da
prova no Processo do Trabalho, como sugere a segunda corrente, o
empregador, nesse exemplo, seria impelido a provar todos os elementos do
thema probando. Em outras palavras, ele teria de provar a existência da
relação empregatícia, os danos sofridos pelo empregado, o nexo causal e a
ausência de culpa pelo acidente, com a possibilidade maior de estar diante de
uma prova diabólica reversa. Esse exemplo mostra o equívoco de considerar
o instituto da inversão como sinônimo de dinamização do ônus da prova.
103

Em virtude de tais considerações, parece mais consentânea com


os ditames constitucionais a terceira corrente porque distribui o ônus da prova
de forma mais coerente com o direito fundamental à prova e o direito à
igualdade substancial das partes, evitando a formação da prova diabólica
reversa, como geralmente ocorre com o emprego da técnica da inversão do
CDC. Além disso, a dinamização tem como critério chave a hipossuficiência
probatória de uma parte e a hipersuficiência da outra, independentemente de
serem empregado ou empregador, o que contribui para decisões mais justas.
Esse último argumento em defesa da técnica da dinamização
evidencia o problema de direcionar o ônus sempre a favor do trabalhador,
como ocorre com a inversão. Algumas vezes o empregador é um
microempresário que se encontra em igualdade ou inferioridade de condições
probatórias em relação ao trabalhador e que não terá o seu direito à
igualdade substancial e à prova assegurados, caso se adote simplesmente a
inversão do CDC, como quer a segunda corrente. De outra forma, o
reclamado, em tais condições, somente terá o seu direito fundamental de
acesso à ordem jurídica justa concretizado por meio do uso da distribuição
dinâmica do ônus da prova, que não distingue a situação econômica das
partes quando esta é irrelevante à instrução probatória.
Assim, seguem julgados do TST que se posicionam no mesmo
sentido da corrente que adota apenas a dinamização no Processo do
Trabalho:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA.


GRATIFICAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. Não configurada
violação direta e literal de preceito da lei federal ou da
Constituição da República, nem divergência jurisprudencial
válida e específica, nos moldes das alíneas -a- e -c- do artigo
896 da CLT, inviável o trânsito da revista e,
consequentemente, o provimento do agravo de instrumento.
Agravo de instrumento conhecido e não provido.
[...]
No que se refere à questão de fundo, cinge-se a controvérsia
à distribuição do ônus probatório quanto à ausência de
submissão dos reclamantes a avaliação para promoção -
requisito para o recebimento de vantagem compensatória
prevista em lei municipal.
O Tribunal Regional deu razoável interpretação aos arts. 818
da CLT e 333, II, do CPC, consabido que os dispositivos
textuais não devem ser interpretados de forma isolada, mas
104

sistemática. No caso, a solução adotada encontra-se em


consonância com princípio da aptidão para prova ou da
distribuição dinâmica do ônus da provas [destacou-se],
segundo o qual a prova deve ser produzida pela parte que a
detém ou que a ela possui mais fácil acesso, quando
inacessível ou de difícil acesso à parte contrária.
[...]
No caso, mostrava-se inviável exigir dos reclamantes a
produção da prova relativa à não realização da avaliação para
promoção, enquanto fato absolutamente negativo ou negativo
indefinido, que é, em regra, insuscetível de prova, a
demonstrar a aptidão do reclamado para prova, e, por
consequência, o seu ônus probatório, no pertinente.
[...]
Nesse contexto, não configurada violação direta e literal de
preceito da lei federal ou da Constituição, nem divergência
jurisprudencial válida e específica, nos moldes das alíneas "a"
e "c" do artigo 896 da CLT, inviável o trânsito da revista e,
consequentemente, o provimento do agravo de instrumento.
Nego provimento ao agravo de instrumento.
(AIRR - 32240-61.2007.5.05.0251 , Relatora Ministra: Rosa
Maria Weber, Data de Julgamento: 04/08/2010, 3ª Turma,
Data de Publicação: DEJT 20/08/2010)

O presente acórdão trata sobre recurso do Município de Santa


Luzia -MG que se insurge contra acórdão regional que cofirmou a sentença
condenatória ao pagamento de vantagem compensatória prevista no art. 49
da Lei nº. 1.101/2004 e que somente seria devida caso os reclamantes não
tivessem sido submetidos a avaliações para a promoção prevista na Lei nº
891/1998. Ou seja, o fato constitutivo do direito dos reclamantes seria a não
submissão ao procedimento avaliativo para promoção. Fato este não provado
pelos reclamantes por ser uma prova praticamente impossível.
A 3ª Turma do TST ratificou o entendimento da Corte Regional que
reconheceu o direito dos reclamantes à percepção da referida vantagem
compensatória decorrente da ausência de processo avaliativo. O colegiado
dinamizou o ônus da prova, sem se remeter à inversão prevista no art. 6º, VIII,
do CDC, adotando o posicionamento da terceira corrente que distingui ambos
os institutos e defende a adoção apenas da distribuição dinâmica no Processo
do Trabalho.
A relatora, ministra Rosa Weber, em seu voto, esclareceu que os
reclamantes estavam diante de uma prova diabólica porque o fato da não
submissão a processo avaliativo é indefinido no tempo e no espaço, ou seja,
é um fato negativo absoluto, sem a possibilidade de demonstração pelos
105

onerados. Aplicar literalmente o art. 818 nesse caso, exigindo que eles
provassem o impossível, seria o mesmo que lhes negar o direito fundamental
à prova.
Além disso, no outro polo processual, o Município de Santa Luzia
poderia facilmente provar o fato impeditivo do direito dos autores, qual seja, a
avaliação deles para fins de promoção, pois, caso tivessem sido realmente
avaliados, não teriam direito à verba compensatória. Como a Administração
Pública não se desincumbiu desse ônus dinamizado, acabou sofrendo as
consequências pela ausência de prova eficaz ao convencimento do julgador
sobre a veracidade dos fatos.
Em outras palavras, a utilização da distribuição dinâmica do ônus,
nesse caso, assegurou também aos reclamantes o direito fundamental à
igualdade substancial e o acesso a uma tutela jurisdicional efetivamente justa,
pois condenou quem realmente estava em melhores condições fáticas para
apresentar as provas necessárias ao descobrimento da verdade e não o fez.
Infelizmente, o TST não manifestou essa mesma preocupação com
a concretização dos direitos fundamentais processuais das partes em outros
julgados, como pode ser visto no acórdão da 6ª Turma, parcialmente
transcrito abaixo:

AGRAVO DE INSTRUMENTO DO RECLAMANTE.


PROMOÇÕES POR MERECIMENTO. ÔNUS DA PROVA.
ABONOS. INTEGRAÇÃO À REMUNERAÇÃO.
DESPROVIMENTO. Diante da ausência de violação dos
dispositivos invocados e porque não demonstrada divergência
jurisprudencial, nos termos da Súmula 337, IV, -c- do c. TST e
do art. 896, -a-, da CLT, não há como admitir o recurso de
revista. Agravo de instrumento desprovido.
[...]
Nas razões de agravo de instrumento, o reclamante reitera as
insurgências veiculadas em recurso de revista quanto às
promoções por merecimento e a integração dos abonos. Aduz
ser ônus da reclamada a comprovação de que o reclamante
não teve o desempenho esperado para o deferimento das
progressões por merecimento, nos termos da norma
regulamentar, pelo que traz arestos a cotejo jurisprudencial e
indica violação do art. 122 do CC. Em relação à integração do
abono, indica divergência jurisprudencial.

Após cuidadosa análise da matéria, a manutenção


do r. decisum agravado é medida que se impõe.
106

Quanto às progressões por merecimento, o eg. Tribunal


Regional consignou não haver nos autos qualquer
comprovação de que o reclamante tenha atendido os
requisitos fixados na norma interna. Em razão de nunca ter
alegado caber à reclamada a demonstração de que não
atingiu os padrões necessários para as promoções
pretendidas e, tampouco, ter sustentando que a empresa
deixou de realizar as avaliações, não atribuindo à reclamada
a possibilidade de produzir tal prova, o eg. TRT concluiu que
o reclamante não se desincumbiu do ônus de provar o
preenchimento dos requisitos previstos na norma empresarial,
pelo que manteve a decisão que indeferiu o pleito.

Diante de tal delimitação fática, não se vislumbra violação do


art. 122 do CC, que trata da ilicitude das condições que
privarem de todo efeito o negócio jurídico ou sujeitarem ao
puro arbítrio de uma das partes, pois o reclamante, além de
não alegar que não realizou as avaliações de desempenho,
não se insurgiu quanto à aptidão da reclamada para a
prova.
[...]
Nego provimento.

(AIRR - 739-15.2011.5.05.0004 , Relator Ministro: Aloysio


Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 11/12/2013, 6ª Turma,
Data de Publicação: DEJT 13/12/2013)

Esse agravo de instrumento trata da insurgência do Reclamante,


funcionário da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, contra decisão
que denegou seu pleito às promoções por merecimento e a integração dos
abonos.
A 6ª Turma do TST ratificou o posicionamento da Corte Regional
que não vislumbrou o direito do obreiro à promoção, porque entendeu que o
trabalhador não havia provado os fatos constitutivos do seu direito. Estes
fatos seriam os padrões mínimos para alcançar as promoções desejadas.
Tanto o colegiado regional como o Tribunal Superior entendeu que
era inaplicável a dinamização do ônus da prova, nesse caso, porque o
reclamante não afirmou que a reclamada era a única que teria condições de
provar o preenchimento ou não dos requisitos para a promoção pleiteada.
Tais requisitos seriam o desempenho ótimo, bom ou regular previstos na
norma empresarial.
Contudo, o critério primordial para a aplicação da dinamização do
ônus da prova é a melhor condição profissional, técnica ou fática de uma
parte em relação à atividade probatória, segundo as peculiaridades do caso
107

concreto e do direito material em jogo (conforme tópico 1.2.2.1 acima). Não


havendo a necessidade de o autor ter de informar que apenas o réu é apto a
produzir a prova essencial, como desejavam os colegiados.
Quando as circunstâncias reais, à luz das máximas de experiência,
demonstram claramente que o demandado tem pleno domínio sobre a prova,
o magistrado deve dinamizar o encargo probatório, mesmo sem requerimento
da parte adversa, bastando que haja um desequilíbrio acentuado entre as
partes (SOUTO MAIOR, 2010, p.73). Isso decorre do seu poder de direção do
processo com vistas à busca de uma decisão justa de acordo com os valores
constitucionais. A concretização do direito fundamental de igualdade
substancial impõe a dinamização de ofício.
Não há que se falar em imparcialidade do julgador nesses casos,
porque o objetivo da mudança do ônus da prova não é simplesmente
desonerar a parte mais debilitada para a prova, mas buscar a justiça do caso
concreto com uma decisão mais próxima à verdade real. Além disso, o juiz
somente decidirá contra a parte onerada dinamicamente caso esta não
comprove o que lhe cabe, provando que o direito do reclamante não se
sustenta, o magistrado decide contra este.
Na situação em questão, até uma análise superficial das
circunstâncias concretas deixa claro que o empregador tinha melhores
condições para apresentar os documentos que comprovavam, caso
existissem, a insuficiência de desempenho do trabalhador, fato este extintivo
do direito à promoção por merecimento. Isso é uma decorrência lógica do
processo avaliativo dos funcionários de qualquer empresa que possui um
Plano de Cargos, Carreiras e Salários, como a reclamada.
É notório que o empregador, para poder realizar as promoções por
merecimento dos funcionários, municia-se de documentos em que constam
as avaliações de desempenho realizadas pelos chefes imediatos de cada
trabalhador e que necessariamente devem fazer parte dos seus
assentamentos individuais.
Ainda que a norma empresarial pudesse prever a obrigatoriedade
de o empregador fornecer uma cópia de tais documentos para o obreiro, é
ingenuidade presumir que o trabalhador seja apto a carrear tais comprovantes
quando vir a demandar judicialmente a sua promoção só por causa dessa
108

regra. Isso pelo simples fato de que a Empresa, valendo-se do privilégio da


posse de tais avaliações, pode facilmente descumprir a norma coletiva e não
repassar essas informações ao empregado.
Ora, se o empregador muitas vezes descumpre normas de higiene,
saúde e segurança do trabalho, que são objetos de uma maior fiscalização
por parte do Poder Público, é bastante inadequado supor que ele cumprirá
fielmente uma regra negocial que lhe traz uma desvantagem jurídica e que
não é, de certa forma, prioridade para os auditores do trabalho.
Portanto, exigir que o reclamante indicasse na inicial que o
empregador estaria em melhores condições de produzir a referida prova para
poder dinamizar o ônus probatório é desconhecer os critérios para a aplicação
dessa técnica e impedir o exercício do seu direito fundamental à prova, além
de negar-lhe a prestação de uma tutela jurisdicional efetivamente justa.
Diante de tais considerações, concorda-se com Danilo Knijnik
(2006, p. 947) que estabelece, para justificar a aplicação da dinamização,
apenas o requisito material da verificação de que a parte onerada pela lei
esteja diante de uma prova diabólica [destacou-se], sem necessidade de
requerimento dessa parte e muito menos da afirmação de que o outro litigante
esteja em melhores condições. Contudo, a fim de evitar o uso abusivo dessa
técnica, tal situação de impossibilidade probatória deve advir
necessariamente das seguintes circunstâncias:
a) hipossuficiência probatória [destacou-se], decorrente de uma posição
mais favorável do adversário, por dispor de conhecimento técnico ou por
estar na posse de documentos ou objetos relevantes para lide;
b) inacessibilidade da prova, advinda de conduta culposa ou desleal (falta de
cooperação) do adversário.
Além desse requisito material, alinha-se aqui, ainda com o referido
jurista, quanto ao requisito formal. Esse critério trata-se de a necessidade da
decisão, que dinamiza o ônus da prova, ser prévia e fundamentada,
proporcionando à parte onerada as condições adequadas para se
desincumbir desse novo encargo. Evita-se com isso a prova impossível
reversa (KNIJNIK, 2006, p. 947, destacou-se).
Esse requisito formal está intimamente relacionado à última
controvérsia doutrinária e jurisprudencial sobre a adoção da teoria dinâmica.
109

Tal querela refere-se ao momento processual mais adequado para a


aplicação da dinamização do ônus da prova. Nesse aspecto, a doutrina
diverge entre os que defendem a aplicação dessa técnica somente na
sentença e os que preconizam a adoção em momento anterior. Esses
posicionamentos são esclarecidos no próximo tópico.

3.3.1.3 Momento adequado para a dinamização do onus probandi

Antes de iniciar a análise do objeto central deste tópico, é


recomendável esclarecer que a distinção, apresentada acima, entre a
dinamização do ônus da prova e a inversão do CDC perde a importância
quando o assunto é o momento para a modificação do encargo probatório.
Isso porque a consequência jurídica da aplicação de um ou de outro instituto,
sob a ótica temporal, é a mesma, qual seja, a alteração do onus probandi.
Por isso, serão feitas referências tanto aos processualistas que
defendem a inversão da carga da prova como aos que defendem a
dinamização, sem haver qualquer comprometimento da análise do assunto.
A discussão sobre a ocasião processual mais adequada para a
modificação do ônus da prova refere-se aos que defendem que ela deva
ocorrer somente na sentença e aos que sustentam que a alteração deva ser
feita em momento anterior. Ou seja, um grupo de doutrinadores encara a
decisão que dinamiza ou inverte o ônus como regra de julgamento, a ser
utilizada apenas na sentença para se evitar o non liquet; outro grupo
reconhece tal ato como uma regra de procedimento, a orientar as partes
durante a fase instrutória.
Os autores que defendem a dinamização ou inversão como regra
de julgamento são os que entendem haver apenas a dimensão objetiva desse
encargo. “Assim, afirma-se que somente após a valoração do conjunto
probatório o magistrado seria capaz de analisar ou não as regras de
distribuição do ônus da prova e esse momento ocorreria apenas na sentença”
(MACÊDO;PEIXOTO, 2014, p. 186).
Nesse sentido e se referindo ao mecanismo de inversão previsto
no CDC, Dinamarco afirma que:
110

[...] a efetiva inversão só acontecerá no momento de julgar a


causa, pois antes ainda não se conhecem os resultados mais
conclusivos ou menos conclusivos a que a instrução
probatória conduzirá; a própria verossimilhança das
alegações do consumidor, eventualmente sentida pelo juiz em
algum momento inicial do procedimento, poderá ficar
prejudicada em face das provas que vierem a ser produzidas
e alegações levantadas pelo adversário (2009, p.83).

Para esse autor, o magistrado somente teria condições de se


convencer ou não da verdade dos fatos no momento de prolatar a sentença.
Segundo Grinover et al. (2007, p. 814), decidir pela inversão em
momento anterior à valoração das provas ensejaria um prejulgamento da
causa.
Paula, também defende que o momento para a inversão do ônus
da prova seja no julgamento da lide (2010, p. 131).
Peyrano (2008, p. 23), na Argentina, alinha-se a esse grupo de
forma contundente. Afirma o autor que a adoção do ônus dinâmico, no
momento da sentença, não gera qualquer prejuízo ao direito de defesa da
parte onerada nem é decisão surpresa - como alguns opositores sustentam –
porque as partes já estariam antecipadamente cientes da possível aplicação
dessa técnica, em virtude dela já ser amplamente recepcionada pela doutrina
e pelos tribunais daquele país.
Na jurisprudência brasileira, o TST ainda não se manifestou sobre
o momento adequado para a dinamização do ônus da prova. Apenas alguns
tribunais do trabalho já se posicionaram sobre o assunto, mas de forma ainda
bastante tímida, conforme ementa abaixo exposta do TRT da 7ª Região (CE):

HORAS EXTRAS. ÔNUS DA PROVA. REGRA DE


JULGAMENTO. A aplicação dos efeitos [do] ônus da prova é
regra de julgamento, e não de procedimento, à luz do
princípio da distribuição dinâmica do ônus probatório
[destacou-se]. É dizer, o ônus da prova deve ser, em regra,
aplicado no momento de decidir, quando não houver prova a
referendar a matéria em questão. Recurso Ordinário
conhecido e provido.
(RO - 0000006-35.2011.5.07.0023. TRT 7ª Região (CE) -
Relator: Desembargador José Antônio Parente, Data de
Julgamento: 05/10/2011, 1ª Turma, Data de Publicação: DEJT
20/10/2011)
111

O caso acima apresentado trata-se de pedido de pagamento de


horas suplementares. A empresa, contando com mais de dez funcionários,
não colacionou os cartões de frequência que poderiam demonstrar a
inexistência do direito alegado pelo autor, conforme previsão contida na
Súmula 338, I, do TST. Para suprir a falta desses comprovantes, o reclamado
apresentou prova testemunhal que foi inconclusiva quanto a essas horas
extras.
Contudo, o juiz de primeiro grau decidiu pelo não reconhecimento
das horas extras do autor, pois entendeu que a prova testemunhal, apesar de
inconclusiva, havia suprido a exigência de prova contida na Súmula 338.
A decisão do juízo a quo foi reformada pela 1ª Turma, com toda
razão, pois o fato de a prova testemunhal não ter sido decisiva para a
convicção do juiz sobre as horas extras fazia com que ainda permanecesse
com o reclamado o ônus de apresentar prova extintiva do direito do autor.
Contudo, como não se desincumbiu desse encargo, foi condenado ao
pagamento das horas suplementares.
Apesar de o resultado desse acórdão ter sido justo, na ótica da
efetividade da tutela jurisdicional e dos direitos fundamentais processuais, não
se pode deixar de criticar o uso da técnica da dinamização para fundamentar
a aplicação da Súmula 338, I, do TST.
Isso porque, conforme posição adotada no tópico 3.3.1.1, a referida
súmula trata de aplicação indireta da regra estática do art. 818 da CLT e não
de distribuição dinâmica. Explicando novamente, a não apresentação dos
cartões de ponto pelo empregador gera uma presunção legal relativa de
veracidade das afirmações do autor sobre as horas suplementares, em
decorrência do dever do reclamado de registrar e guardar dos cartões de
frequência (art. 74, § 2°, da CLT).
A par dessas considerações, o exemplo da citada ementa é
oportuno porque o voto do relator, desembargador José Antônio Parente,
seguiu a corrente acima tratada que afirma ser a dinamização do ônus da
prova regra de julgamento, a ser aplicada somente na sentença.
Todavia, a despeito da autoridade dos que defendem esse
posicionamento, não parece ser na sentença o melhor momento para
112

determinar a modificação o ônus da prova, de acordo com os direitos


fundamentais processuais.
Isso se deve pelo fato de que a mudança das “regras do jogo”
operada apenas no momento da sentença afronta principalmente o direito
fundamental da parte ao contraditório em sua dimensão subjetiva, conforme
visto no tópico 2.3.7. Em outras palavras, o sujeito onerado dinamicamente
perde a oportunidade de influir no convencimento do julgador (FELICIANO,
2008, p. 51).
Por isso, há doutrinadores que entendem que o momento mais
propício para a dinamização da carga probatória deva ser anterior à sentença
e de forma que a parte possa se desvencilhar desse novo ônus.
Seguindo essa linha, Didier Júnior et al. (2012, p.101-102) dispõe
que:

[...] essa repartição casuística e dinâmica do ônus da prova


deve ser feita pelo magistrado antes da fase instrutória, em
tempo de a parte onerada desincumbir-se do encargo, sob
pena de se comprometer a segurança jurídica das partes e o
seu direito fundamental à prova [...]. Trata-se portanto de
regra de atividade e, não, de julgamento”.

Pelo exposto, esse jurista baiano aponta que a dinamização na


sentença afronta o princípio da segurança jurídica e o direito fundamental à
prova, pois cria para o sujeito a prova diabólica reversa. Esse fato é repudiado
pela própria teoria dinâmica, conforme visto nos requisitos materiais para a
sua aplicação, tópico 3.3.1.2. Em outras palavras, de que adiantaria a parte
onerada dinamicamente estar em melhores condições para produzir a prova
eficaz se o julgador não lhe der oportunidade para trazê-la aos autos.
Nessa esteira, Souto Maior (2010, p. 76-77) e García Redondo
(2010, p. 21) dispõem que o momento adequado para a modificação do ônus
da prova é no saneamento do processo do trabalho que é na audiência inicial,
em decisão fundamentada.
Alinhando-se também a essa corrente, Mauro Schiavi (2013, p. 75)
alude que a decisão que dinamiza o ônus da prova é uma regra de
procedimento e deve ocorrer antes da audiência de instrução, sempre de
forma fundamentada.
113

Cabe salientar, entretanto, que a dinamização não pode ficar


restrita ao momento que antecede a instrução, como sustentam os juristas
acima citados. Ela “também deve ser aplicada sempre que se apresentar
possível o seu cumprimento pelo litigante dinamicamente onerado sob pena
de se impor a este um encargo muito difícil ou impossível” (AMBRÓSIO, 2013,
p. 87).
Quanto às críticas daqueles que defendem a corrente anterior, há
quem afirme que modificar o ônus da prova antes da sentença ensejaria
prejulgamento da causa (GRINOVER et al.,2007, p. 814). Além disso, que o
juiz não estaria plenamente em condições de avaliar a aptidão para a prova
das partes na fase de saneamento (DINAMARCO, 2009, p.83).
Em relação à primeira objeção, o prejulgamento da causa não
ocorre com a dinamização antes da fase instrutória simplesmente porque ela
apenas determina a quem passará a caber o risco pela ausência de prova
eficaz e não a antecipação do resultado final. Em outras palavras, não há
qualquer condenação prévia da parte com encargo dinamizado, pois ela
continua com plenas condições de influir a seu favor durante a fase
instrutória. Se fosse prejulgamento, não teria essa possibilidade (MACÊDO;
PEIXOTO, 2014, p. 190).
Já a segunda crítica, que dispõe sobre a impossibilidade do
julgador saber quem está em melhores condições probatórias no
saneamento, é rebatida pelo fato de que a dinamização não deve necessária
e exclusivamente ser realizada antes da fase instrutória, como se defende
neste trabalho. Caso o magistrado não possa identificar os critérios para
dinamizar o ônus nessa fase, não deve fazê-lo; mas nem por isso estará
impedido de adotar essa técnica posteriormente quando diante de fatos
supervenientes (AMBRÓSIO, 2013, p. 67).
Antes da instrução probatória é a ocasião ideal para distribuir
dinamicamente o ônus da prova, mas não a única, podendo ocorrer durante
ou depois desse momento, até mesmo em fase recursal, bastando que o
julgador esteja diante de uma circunstância concreta que demonstre estar
uma parte mais apta para a prova que a outra (MACÊDO; PEIXOTO, 2014, p.
191). “Se, no momento da prolação da sentença, o juiz [...] constatar uma
situação fática que recomendaria a distribuição dinâmica do ônus da prova,
114

deverá reabrir a instrução processual e atribuir novo encargo probatório às


partes” (AMBRÓSIO, 2013, p. 68), assegurando sempre o direito fundamental
da parte ao contraditório e à prova.
Embora também de forma acanhada, a jurisprudência trabalhista já
andou proferindo decisões alinhadas à tese da dinamização como regra de
procedimento, conforme a ementa a seguir:

EMENTA
HORAS EXTRAS. MOTORISTA DE CAMINHÃO.
RASTREAMENTO VIA SATÉLITE. Ocorrência de
fiscalização da jornada, mesmo indireta, a afastar o disposto
no artigo 62, inciso I, da CLT, sendo devidas horas extras
pela jornada arbitrada.
Recurso ordinário interposto pela reclamada a que se nega
provimento no item.
[...]
Assim, no caso de ações trabalhistas vige a distribuição
estática do ônus da prova, nada impedindo que, no caso
concreto, a fim de se evitar a chamada prova diabólica, possa
o juiz distribuir de forma diversa o ônus probatório. O caso em
tela, todavia, não trata de prova diabólica, porquanto o
reclamante possuía todas as condições para provar o direito
que alega lhe pertencer.
Pelo exposto, descabe cogitar em inversão do ônus da
prova, o qual, caso aceito fosse, deveria se dar durante a
instrução (e não quando do julgamento como quer o
reclamante). Note-se que a inversão do ônus da prova é
regra de instrução (e não de julgamento), devendo a
decisão judicial que determiná-la ser proferida
preferencialmente na fase de saneamento do processo ou,
pelo menos, assegurar à parte a quem não incumbia
inicialmente o encargo a reabertura de oportunidade para
manifestar-se nos autos. Tal interpretação encontra-se
afinada com os valores processuais constitucionais,
sobretudo quanto ao contraditório e ampla defesa.
(destacou-se)
Assim, nega-se provimento ao recurso ordinário interposto
pelo reclamante no item.
(RO - 0001136-04.2012.5.04.0801.TRT 4ª Região (RS) -
Relator: Desembargador João Alfredo Borges Antunes de
Miranda, Data de Julgamento: 25/03/2014, 9ª Turma, Data de
Publicação: DEJT 30/04/2013)
115

O caso acima trata de demanda por horas extras de motorista


submetido a controle de jornada por meio de celular e de rastreamento
remoto de carga transportada ao exterior (Argentina). Em primeiro grau, o juiz
admitiu parcialmente o pleito do reclamante, pois realizou uma inspeção
judicial na aduana (Urugaiana/RS) e constatou, in loco, que as horas
suplementares requeridas eram maiores que as demonstradas pela prática
dos caminhoneiros entrevistados no local. Em virtude disso e pela
impossibilidade de fixar a real jornada, arbitrou um período laboral inferior,
conforme as regras de experiência observadas na prática e os relatos das
testemunhas.
Inconformado, o autor impugnou a decisão alegando que deveria
ter sido aplicada a inversão do ônus da prova e, por conseguinte, deveriam ter
sido consideradas verdadeiras a jornada indicada na inicial, pois o réu não
havia logrado provar a efetiva jornada dele.
Entretanto, a 9ª Turma do TRT da 4ª Região entendeu não se tratar
de inversão porque o autor estaria apto a provar a sua real jornada de
trabalho. Dessa forma, negou provimento ao recurso do reclamante.
Discorda-se das razões do acórdão da Corte regional. Na verdade,
pela análise do aresto, a prova era impossível tanto para o autor como para o
réu. Por isso, agiu corretamente o juiz de piso ao arbitrar a jornada com base
em informações colhidas durante a inspeção judicial na aduana, não negando
o direito do autor a uma tutela jurisdicional adequada (conforme as exigências
do caso concreto) nem impondo uma condenação desarrazoada ao réu.
Concorda-se com o Tribunal apenas quanto à denegação do pedido de
inversão do trabalhador, pois esta não pode ser utilizada para transferir uma
prova diabólica de uma parte para a outra.
Apesar de não se tratar de caso de aplicação da técnica de
inversão do ônus da prova, o relator do acórdão, desembargador João Alfredo
Borges Antunes, explicitou sua aderência à corrente que defende a
modificação do encargo probatório como regra de instrução. Em seu voto, ele
deixou claro que a fase mais propícia para essa mudança é na de
saneamento (audiência inicial), mas podendo ocorrer em outra, desde que
seja sempre assegurado o contraditório à parte onerada, conforme as lições
de Ambrósio (2013, p.68) acima.
116

Esse entendimento também pode ser observado no aresto abaixo:

INVERSÃO DO ONUS DA PROVA. MOMENTO


PROCESSUAL. Nos precisos dizeres do professor Fredie
Didier Junior “A regra de inversão do ônus da prova é regra
de processo, que autoriza o desvio de rota; não se trata de
regra de julgamento, como a que distribui o ônus da prova.
Assim, deve o magistrado anunciar a inversão antes de
sentenciar e em tempo do sujeito onerado se desincumbir
do encargo probatório... pois ‘se fosse lícito ao
magistrado operar a inversão do ônus da prova no exato
momento da sentença, ocorreria a peculiar situação de,
simultaneamente, se atribuir um ônus ao réu, e negar-lhe
a possibilidade de desincumbir-se do encargo que antes
inexistia” [destaques do autor]. Nulidade da r. sentença que
se declara, com a determinação de reabertura da instrução
processual e orientação para que o D. Juízo a quo dispense
urgência ao feito, em atenção ao preceito contido na CF, art.
5º, LXXVIII (princípio da razoável duração do processo).
(RO - 0001136-0000832-10.2012.5.15.0086.TRT 15ª
(Campinas - SP) Relator: Desembargador Carlos Augusto
Escanfella, Data de Julgamento: 19/11/2013,7ª Câmara, 4ª
Turma, Data de Publicação: DEJT 24/11/2013)

Trata-se de demanda relativa à gratificação de exercício de cargo


comissionado, movida por autor que alega ter exercido tal atividade após a
empresa pública ré ter publicado a portaria de “descomissionamento”.
Em sede de primeiro grau, o magistrado julgou procedente o
pedido do reclamante, com base na inversão do ônus da prova contra o
reclamado, por entender que este teria maiores condições para provar que o
empregado efetivamente não havia exercido o cargo no período em questão.
Saliente-se que o julgador somente se manifestou sobre a inversão na
sentença.
Em sede de recurso ordinário, o TRT da 15ª Região, de Campinas
– SP, anulou todos os atos decorrentes da instrução, inclusive a sentença, por
entender que a inversão do ônus da prova é regra de procedimento, não
podendo ser aplicada no momento de prolação da sentença. O relator
fundamentou sua decisão no princípio do devido processo legal.
Dessa forma, o posicionamento do referido colegiado coaduna-se
com o defendido neste trabalho e com a previsão contida no art. 380, § 1º, do
117

projeto do Novo CPC em relação à técnica da dinamização do encargo


probatório. Assim, deve esta modificação ser adotada mediante decisão
racionalmente fundamentada, segundo as peculiaridades do caso concreto e
das máximas de experiência, preferencialmente na audiência inicial ou em
momento que assegure à parte a concretização do direito fundamental ao
contraditório e à prova.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ônus da prova não é uma obrigação, é uma imposição da ordem


jurídica à parte que tem interesse em uma prestação jurisdicional a seu favor.
Não se desincumbindo desse encargo, correrá o risco de não ver satisfeita a
sua pretensão.
Este ônus se manifesta por meio dos aspectos subjetivo e objetivo.
O primeiro refere-se diretamente à atividade das partes, sendo a necessidade
de cada litigante provar a existência fática das alegações que sustenta. O
segundo é voltado para a atuação do juiz e determina as consequências
desfavoráveis a serem suportadas pelo autor ou pelo réu quando o
magistrado tiver que decidir em estado de dúvida. Ambos são importantes
para o processo, sendo que o encargo subjetivo relaciona-se diretamente ao
contraditório e o direito das partes à prova.
A norma estática prevista no art. 818 da CLT e no art. 333 do CPC
não é apta a servir de parâmetro para o magistrado trabalhista prestar a
efetiva tutela jurisdicional em todas as situações. Isto se deve à patente
desigualdade econômica e social existente entre o trabalhador e o patrão, que
se reflete no processo do trabalho, pois muitas vezes esse desiquilíbrio
econômico gera um desequilíbrio de forças quanto à produção das provas.
Para reequilibrar a paridade de armas entre os litigantes, o atual
estágio de desenvolvimento do Direito Processual passou a prever a
inaplicabilidade da regra estática e a adoção da teoria dinâmica do ônus da
prova de forma excepcional e subsidiária à norma legal.
Essa teoria dinâmica, difundida mundialmente pelo argentino Jorge
W. Peyrano, determina que o ônus da prova deve recair, caso a caso, sobre a
parte que se encontra em melhores condições profissionais, técnicas ou
fáticas de produzir a prova.
Deve essa técnica ser adotada somente quando um dos litigantes
esteja impossibilitado de produzir a prova onerada pela lei,
independentemente de sua posição processual ou da natureza do fato a ser
provado. Além disso, o outro litigante deve estar necessariamente em
condições favoráveis para suportar o ônus dinamizado pelo juiz, porque, se
119

assim não for, o magistrado estará apenas transferindo o encargo


da prova diabólica de uma parte para outra, o que não é justo.
A teoria das cargas dinâmicas probatórias encontra legitimidade
nos atuais valores consagrados na Constituição brasileira, em especial, nos
direitos fundamentais processuais.
Dessa forma, o direito fundamental de acesso à ordem jurídica
justa assegura a proteção dos demais direitos fundamentais. Entretanto, não
basta apenas a Constituição prescrever o livre acesso do cidadão às portas
do Poder Judiciário para que ele veja reconhecido, de forma justa, o seu
pleito. É necessário que o Estado-juiz tenha meios adequados para oferecer
uma prestação jurisdicional efetivamente justa e, caso não tenha esses meios
de forma clara no ordenamento vigente, exige-se que o julgador interprete os
dispositivos processuais em vigor de forma razoável e à luz dos direitos
fundamentais que deve concretizar.
Nesse sentido, o magistrado deve adequar a regra de distribuição
do ônus da prova às peculiaridades do caso concreto, sempre visando
maximizar a concretização dos direitos fundamentais relacionados à lide
posta em juízo, utilizando-se como critério de aplicação a
proporcionalidade/razoabilidade e as máximas de experiência. Tal adequação
irá ensejar na dinamização do encargo probatório.
Diante dessa perspectiva, compreende-se que o direito
fundamental à prova integra a dimensão substancial do direito ao
contraditório, por ser a base da participação ativa no litígio, com a real
possibilidade de influir na convicção do juiz acerca da verdade dos fatos.
Para que aquele direito seja efetivado, a distribuição do ônus da prova deve
ser realizada de forma equânime entre as partes, devendo recair o ônus sobre
a parte que se encontra em melhores condições reais de contribuir com o
esclarecimento dos fatos.
Por sua vez, o direito fundamental à igualdade substancial é a
garantia que as partes têm de serem tratadas de forma isonômica, ou seja,
levando-se em consideração as circunstâncias fáticas em que se encontram
diante da instrução probatória. Assim, o juiz deve tratar desigualmente quem
se encontra em situação díspar, de modo a estabelecer o equilíbrio jurídico
entre os sujeitos.
120

Esse direito ganha contornos ainda maiores no processo do


trabalho, porque a desigualdade econômica entre patrão e empregado reflete-
se necessariamente no processo. Por isso, o magistrado deve, sempre que as
circunstâncias fáticas exigirem, reequilibrar a paridade de armas entre os
litigantes e uma das formas de realizar isso é através da técnica de
dinamização do encargo probatório.
Apesar de o magistrado não estar obrigatoriamente vinculado à
norma legal, ele exerce sua atividade de forma controlada, pois a própria
Constituição impõe a fundamentação das decisões (art. 93, IX). No caso da
decisão que dinamiza o onus probandi, esta deve ser racionalmente
justificada com base na ponderação dos direitos fundamentais das partes em
litígio, tendo como balizas o princípio da proporcionalidade, as máximas de
experiência e as exigências do caso concreto.
Com efeito, em virtude da recepção da teoria dinâmica do ônus da
prova pela doutrina e pela jurisprudência pátrias, o projeto de Novo Código de
Processo Civil brasileiro, que tramita no Congresso Nacional, consagra essa
teoria, prevendo expressamente que o momento processual para a sua
adoção deve ser antes da sentença e de modo que oportunize à parte as
condições para se desincumbir do ônus dinamizado.
Os processualistas do trabalho e a jurisprudência do TST vêm
entendendo que a distribuição dinâmica é o próprio princípio da aptidão para
a prova, mas sob outros fundamentos, não mais apenas vinculado à previsão
da inversão do CDC.
Apesar de não ser pacífico este posicionamento, entende-se que a
dinamização do ônus da prova é distinta da inversão do CDC.
Primeiro, porque a distribuição dinâmica atribui o encargo de
acordo com a superioridade probatória de um litigante e a debilidade do outro,
sem se ater à regra estática, podendo até haver a transferência do peso da
prova do empregador para o empregado, desde que este esteja em melhores
condições que aquele; já a inversão parte da regra legal para transferir
sempre o ônus do autor para o réu.
Segundo, porque a dinamização atua sobre fatos específicos do
thema probando; a inversão, por sua vez, atua sobre toda a questão
probatória.
121

Assim, diante do direito fundamental à igualdade substancial das


partes em matéria de prova, o posicionamento mais coerente com os valores
constitucionais é o que reconhece serem distintos ambos os institutos e que
deve somente ser adotada a técnica da dinamização na lides trabalhistas,
apesar de as decisões do TST divergirem quanto a esse aspecto.
Propõe-se que seja adotado como requisito material para a
aplicação da distribuição dinâmica apenas a situação fática de que o litigante
onerado pela lei esteja diante de prova diabólica, decorrente das seguintes
circunstâncias: posição favorável do adversário ou conduta desleal ou culposa
deste. Podendo ser aplicada de ofício.
Além disso, defende-se que o requisito formal seja a necessidade
de decisão prévia e fundamentada para dinamizar o onus probandi, em
momento que oportunize à parte o exercício do seu direito fundamental ao
contraditório. Apesar de também essa questão não ser pacífica na
jurisprudência trabalhista.
Em virtude disso, entende-se que a dinamização é regra de
instrução, devendo ser adotada preferencialmente antes da instrução
probatória, podendo ser em outro momento, mas sempre de forma que a
parte onerada possa se desvencilhar ônus da prova adequadamente. Esse
entendimento é confirmado, de lege ferenda, pelo art. 380, §1º, do Novo CPC
projetado, que passa a trazer em seu bojo o dever de o magistrado assegurar
o contraditório da parte onerada dinamicamente.
Diante de tais considerações, torna-se oportuno informar que a
presente monografia não tem pretensão de esgotar o tratamento do tema. O
intuito aqui é expor, organizada e criticamente, a teoria dinâmica do ônus da
prova, como técnica legítima de solução dos litígios trabalhistas, e possibilitar
bases para projetos acadêmicos futuros.
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