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Hieronymus Noldin

Avenida Higienópolis, 174, Centro AUTOR IA


86020-908 — Londrina/PR Hieronymus Noldin
editorapadrepio.org
CAPA
Klaus Bento
DIAGRAMAÇÃO
Eduardo de Oliveira
SACRA MENTAIS E EXORCISMOS
DIR EÇÃO DE CR IAÇÃO
Luciano Higuchi
© Todos os direitos desta edição
pertencem e estão reservados à EDIÇÃO E R EVISÃO
Editora Padre Pio Éverth Oliveira
TRADUÇÃO
Redempti ac vivificati Christi sanguine, nihil Christo Equipe Christo Nihil
præponere debemus, quia nec ille quidquam nobis præposuit. Præponere

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Noldin, Hieronymus, 1838-1922


Sacramentais e exorcismos [livro eletrônico] /
Hieronymus Noldin ; [tradução Equipe Christo Nihil
Præponere]. – Londrina, PR : Editora Padre Pio,
2023
PDF
Título Original: De sacramentalibus
ISBN: 978-85-52993-06-3
1. Cristianismo 2. Exorcismo 3. Igreja Católica –
Doutrinas 4. Oração – Igreja Católica 5. Sacramentos
– Igreja Católica I. Título.
23-164850 CDD-265.94

Índices para catálogo sistemático:


1. Exorcismo e possessões diabólicas : Doutrin cristã 265.94
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

SOBRE OS SACRAMENTAIS

ARTIGO I
DA NATUREZA DOS SACRAMENTAIS. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

ARTIGO II
DOS EFEITOS DOS SACRAMENTAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

ARTIGO III
SOBRE OS EXORCISMOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
APRESENTAÇÃO
Equipe Christo Nihil Præponere

Três mil anos atrás, o povo de Israel era ameaçado pelos filis-
teus. Um dentre eles, Golias, clamava dizendo: “Escolhei um
dentre vós para me enfrentar numa luta individual! Se ele con-
seguir lutar comigo e abater-me, seremos vossos escravos. Mas
se eu o vencer e o abater, então sereis vós os nossos escravos
e nos servireis” (1Sm 17, 8-9). Ouvindo isto, Saul e todos os
israelitas “ficaram consternados e cheios de medo” (v. 11). E
não sem motivo, afinal Golias tinha “seis côvados e um palmo”
— isto é, mais ou menos 3 metros de altura; “trazia na cabeça
um capacete de bronze e vestia uma couraça de escamas de
bronze, que pesava cinco mil siclos de bronze” — isto é, cerca
de 50 quilos; “a haste de sua lança era grossa como um cilin-
dro de tear e a ponta de ferro pesava seiscentos ciclos” — por
volta de 6 quilos; e ainda por cima “seu escudeiro andava à sua
frente” (v. 4-5.7).

Mas, embora o inimigo fosse tão poderoso e causasse tanto


pavor aos israelitas, Davi não temeu. Confiado no poder do
Senhor dos exércitos, “tomou seu cajado na mão, escolheu no
riacho cinco pedras bem lisas e guardou-as no seu bornal de
pastor, que lhe servia de bolsa. Depois, com sua funda na mão,
avançou contra o filisteu” (v. 40). E, com apenas uma pedra,
Davi derrubou aquele poderoso guerreiro, para que todos
conhecessem que “não é pela espada nem pela lança que o
Senhor salva” (v. 47). O que era impossível aos homens, tor-
nou-se possível com o auxílio de Deus: aquela pedrinha, que

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S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

parecia insignificante e desprezível, tornou-se instrumento da


vitória contra o inimigo.

Nesta passagem bíblica, podemos ver um símbolo da batalha


espiritual que travamos contra o demônio. Os anjos são seres
puramente espirituais, dotados de uma inteligência agudíssima
e sempre operante, e de uma vontade firmíssima e irrevogável.
Nós, porém, padecemos de todas as limitações da vida corpo-
ral: cansaço, doença, fraqueza, sono, frio, fome etc. Somos ins-
táveis, não só na busca do conhecimento, mas sobretudo nas
decisões da vontade. Comparados ao menor dos anjos decaí-
dos, somos como o jovem Davi perante Golias: humanamente
falando, nossa derrota é certa, pois, num confronto direto con-
tra um demônio, seríamos certamente destruídos.

É por isso que, no combate espiritual, devemos agir como o


jovem Davi: “Tu vens a mim com espada, lança e dardo; eu,
porém, vou a ti em nome do Senhor dos exércitos” (v. 45).

Os sacramentais da Igreja são como aquela pedra. Certamen-


te, jamais poderíamos vencer os demônios com água, sal,
óleo, medalhas etc.; mas quando estes elementos e objetos
recebem a bênção da Igreja, tornam-se instrumentos pode-
rosos, capazes de reprimir e derrotar a ação demoníaca. Eles
são algumas daquelas “armas da luz” de que falava São Paulo
Apóstolo (cf. Rm 13, 12).

Publicando este excerto da Summa Theologiæ Moralis,1 de 1

Hieronymus Noldin, desejamos não só esclarecer os fiéis sobre


a doutrina acerca dos sacramentais, mas, sobretudo, promover
o uso piedoso e constante destas armas espirituais que a Santa
Igreja põe em nossas mãos.

1. De Sacramentis. Leipzig: Typis Feliciani Rauch, 1938.

6
A p r es en tação

Traduzimos integralmente a 5.ª questão do 1.º livro. Nela, o


autor trata:

1. da natureza dos sacramentais, explicando em que eles dife-


rem dos sacramentos e das orações dos fiéis; quais os tipos
e quem são os ministros dos sacramentais.

2. dos efeitos dos sacramentais, onde expõe as graças causa-


das por eles, o modo como produzem efeitos, a ineficácia
dos ritos celebrados sem as fórmulas da Igreja etc.

3. dos exorcismos, explicando a diferença entre exorcismo


público e privado; quem pode exorcizar em nome da Igre-
ja, que tipo de exorcismo o fiel leigo pode fazer e que efi-
cácia ele tem etc.

Esperamos que este livro esclareça e revigore sua fé no poder


da Igreja e na Providência divina, que nos oferece tantos au-
xílios na luta espiritual. E que especialmente os ministros da
Igreja, lendo estas páginas, reconheçam a dignidade e o grande
poder que receberam no dia de sua ordenação sacerdotal.

7
SOBRE OS
SACRAMENTAIS
(DE SACRAMENTALIBUS)
HIERONYMUS NOLDIN
Articulus I Artigo I
DE NATURA
SACRAMENTALIUM
DA NATUREZA DOS
SACRAMENTAIS

[44]. Definitio. Sacramentale ety- [44]. Definição. Etimologicamente, a pa- 1


mologice significat omne id, quod
ad sacramentum pertinet, præsertim lavra sacramental significa tudo que
vero ceremoniam sacramentalem, pertence ao sacramento, sobretudo a ce-
quæ scilicet in sacramentorum ad-
ministrationem observatur. rimônia sacramental que é observada na
administração dos sacramentos.
Sacramentalia vero proprie et spe- Mas em sentido próprio e específico, como
cifice, prout in hac quæstione in-
telliguntur, definiri possunt: Signa são compreendidos nesta questão, os sa-
sacra (res aut actiones) ab ecclesia
ad aliquam sacramentorum imita-
cramentais podem ser definidos como:
tionem instituta, quibus ipsa uti solet sinais sagrados (coisas ou ações) instituí-
ad obtinendos ex sua impetratione
effectus præsertim spirituales (can.
dos pela Igreja segundo certa imitação dos
1144). Tria ergo sunt de ratione sa- sacramentos, que ela costuma utilizar para
cramentalium: a) ut sint signa sacra
obter, por sua impetração, principalmen-
te efeitos espirituais. Portanto, três coisas
2

são próprias aos sacramentais: a) que se-

2. Código de Direito Canônico (CDC) 1917, Cân.


1144. (Cf. CDC 1983, Cân. 1166.) Como o Código
vigente à época da publicação do referido texto era
o de 1917, as citações de cânones nele presentes são
todas do Código “pio-beneditino”, não do Código vi-
gente desde 1983, promulgado por São João Paulo II.
Todavia, de modo a mostrar a solidez dessa doutrina
e legislação, onde o texto antigo foi preservado ou só
ligeiramente modificado, fizemos constar também as
referências ao Código novo.

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S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

jam sinais sagrados instituídos pela Igre- ab ecclesia instituta; quare ipsa ea-
que sola in sacramentalia plenam
ja; porque ela, e somente ela, exerce pleno potestatem exercet: ea constituere,
poder sobre os sacramentais: e pode cons- authentice interpretari, ex eis ali-
qua abolere aut mutare potest (can.
tituí-los, autenticamente interpretá-los, 1145); b) ut effectus supernaturales
tum spirituales tum corporales pro-
alterá-los ou aboli-los; b) que produzam
3

ducant; c) ut hos effectus producant


efeitos sobrenaturais, quer espirituais, quer vi impetrationis (vel, in exorcismis,
etiam vi imperativa).
corporais; c) que produzam tais efeitos por
força da impetração (ou também por força
imperativa, como no caso dos exorcismos).
Os sacramentais, que pelos teólogos são chama- Sacramentalia, quæ a theologis di-
dos sacramentos menores, devem ser definidos de cuntur sacramenta minora, ita de-
finiri debent, ut hinc quidem a sa-
tal modo que difiram dos sacramentos, mas tam- cramentis differant, inde vero cum
bém manifestem a máxima semelhança possível sacramentis maximam, quæ admitti
com os sacramentos. possit, similitudinem exhibeant.

sinais sagrados. Todos os sacramentais são, Signa sacra: sacramentalia, quotquot


ou coisas ou ações sagradas. E todos têm em co- habentur, aut res aut actiones sacræ
sunt; omnia autem in communi
mum a razão de sinal sagrado, i.e., algo com que ratione signi sacri, quo nempe ex-
se exibe a Deus um culto externo, e que é usado ternus cultus Deo exhibetur et quo
pela Igreja para conferir efeitos sobrenaturais. Os ecclesia utitur ad effectus superna-
turales conferendos, conveniunt.
sacramentais são sinais práticos, que não apenas Sacramentalia sunt signa practica,
significam os efeitos, mas também os produzem; quæ effectus non solum significant,
contudo, não significam tais efeitos do mesmo sed etiam producunt; eos tamen non
eodem apto et determinato modo si-
modo, apto e determinado, como os sacramentos, gnificant ac sacramenta, nec eodem
nem os produzem do mesmo modo. modo producunt.

instituídos pela igreja. Os sacramentais, se- Ab ecclesia instituta: sacramentalia


gundo o modo e a forma com que são consti- secundum modum et formam, qua
reipsa habentur et peraguntur, ab
tuídos e realizados, foram instituídos pela Igreja. ecclesia instituta sunt. His solum ne-
Os sacramentais, segundo a espécie e indivi- gatur sacramentalia eodem modo in
dualmente, não foram instituídos por Cristo do specie et in individuo a Christo in-
stituta esse, quo sacramenta ab ipso
mesmo modo que os sacramentos foram insti- instituta sunt; at non negatur etiam
tuídos por ele. Contudo, é inegável que também sacramentalia duplici sensu a Chri-
os sacramentais foram instituídos por Cristo, em sto instituta esse: α) mediate, quia
ecclesia potestatem instituendi et pe-
dois sentidos: α) mediatamente, porque a Igreja ragendi sacramentalia a Christo ac-

3.CDC 1917, Cân. 1145. (Cf. CDC 1983, Cân.


1167, § 1.)

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A rt i g o I : Da n at u r ez a d o s s ac r a m en ta i s

cepit; β) in genere, quia nonnulla sal- recebeu de Cristo o poder de instituir e realizar
tem sacramentalia Christus ipse in
genere instituit et solum specificam
os sacramentais; β) em geral, porque ao menos
formam ecclesiæ determinandam alguns sacramentais o próprio Cristo instituiu
commisit. Et sane benedictiones et em geral, e confiou à Igreja tão somente deter-
exorcismos in genere Christus ipse
instituit, particulares autem benedi-
minar-lhes a forma específica. Com efeito, Cristo
ctiones et exorcismi, qui in utilita- mesmo instituiu as bênçãos e os exorcismos em
tem fidelium adhibentur, determi- geral; mas algumas bênçãos e exorcismos parti-
natam formam et modum ab ecclesia
acceperunt. Ergo plane alio modo
culares, utilizados em benefício dos fiéis, rece-
sacramentalia a potestate ecclesiæ beram da Igreja forma e modos determinados.
dependent ac sacramenta, quorum Logo, os sacramentais estão sujeitos ao poder da
specifica materia et forma ab eccle-
siæ potestate independens est.
Igreja de modo evidentemente diverso dos sa-
cramentos, cuja matéria e forma específicas são
independentes do poder da Igreja.

Ex sacramentalium statuta defini- Desta definição dos sacramentais, segue-se que


tione consequitur ad sacramenta- não devem integrar o rol dos sacramentais: α) a
lium numerum referenda non esse:
α) orationem dominicam, orationes oração do Pai-Nosso, as orações dos fiéis, o sinal
fidelium, signum crucis, eleemosy- da Cruz, a esmola, a bênção que os pais dão aos
nam, benedictionem, qua parentes filhos etc., porque não foram instituídos pela Igre-
filiis bene precantur etc., tum quia ab
ecclesia non sunt instituta, tum quia ja, e porque sua força não decorre da impetração
vim suam non habent ab impetratio- da Igreja; β) nem as orações da Igreja, as cerimô-
ne ecclesiæ; β) neque orationes eccle- nias do sacrifício eucarístico, as genuflexões, as
siæ, ceremonias sacrificii eucharistici,
genuflexiones, tunsiones pectoris etc., percussões no peito etc., porque seus efeitos não
quia effectus suos non producunt ex são produzidos pela oração da Igreja, embora te-
oratione ecclesiæ, etsi ab ecclesia sint nham sido instituídos por ela. Portanto, uma obra
instituta. Opus enim, quod peculia-
rem effectum supernaturalem, aut que produz seu efeito sobrenatural peculiar, seja
natura sua ut oratio dominica quæ por sua natureza (como o Pai-Nosso, que em ra-
ratione auctoris Deo eximie placet, zão do autor agrada sumamente a Deus), seja por
aut ex speciali promissione divina ut
eleemosyna producit, non pertinet ad especial promessa divina (como a esmola), não
sacramentalia, quæ effectus suos vi pertence aos sacramentais, que produzem seus
orationis ecclesiæ producunt. efeitos por força da oração da Igreja.

Differunt sacramentalia a sacra- Os sacramentais diferem dos sacramentos: α) em


mentis: α) ratione originis, quia sa- razão da origem, porque os sacramentos foram
cramenta a Christo, sacramentalia
ab ecclesia instituta sunt; β) ratione instituídos por Cristo, enquanto os sacramentais
effectus, sacramenta enim immediate foram instituídos pela Igreja; β) em razão do efei-
gratiam producunt et peccata pec- to, porque os sacramentos imediatamente produ-
catorumque poenam remittunt, sa-
cramentalia immediate nec gratiam zem a graça e perdoam os pecados e as penas dos
conferre nec peccata remittere pos- pecados, enquanto os sacramentais não podem
sunt; γ) ratione modi operandi, sacra- imediatamente conferir a graça nem perdoar os
menta enim effectus suos ex opere
pecados; γ) em razão do modo de operar, pois os

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S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

sacramentos produzem seus efeitos ex opere ope- operato, sacramentalia vero ex opere
(ecclesiæ) operantis producunt.
rato, enquanto os sacramentais o fazem ex opere
operantis Ecclesiæ.
4

2 [45]. Divisão. Os sacramentais são mui- [45]. Divisio. Sacramentalia magnæ


sunt multitudinis ac varietatis, adeo
tos e variados, a ponto de não ser possível ut determinato numero non conti-
reduzi-los a um número determinado. Vá- neantur. Complura, quæ antiquitus
in usu erant, iam in desuetudinem
rios deles, que eram usados antigamente, abierunt, et exigentibus temporis
caíram em desuso. Ademais, a Igreja tem adiunctis ecclesia identidem nova
instituere potest; sic recenti quoque
sempre o poder de instituir novos, confor- tempore nonnulla instituit, ut videre
me as circunstâncias do tempo; e recente- est in Rituali Romano. Ad quædam
tamen genera omnia sacramentalia
mente instituiu alguns, como se pode ver revocari possunt. Dividuntur:
no Ritual Romano. Não obstante, todos os
5

4. Sobre o significado dessas expressões latinas, de


uso já consagrado na teologia, veja-se, a seguir, o §
51 (p. 29).
5. O Ritual Romano é um dos livros litúrgicos ofi-
ciais da Igreja latina, que reúne todas as bênçãos e
ritos celebrados pelos ministros ordenados. Nele há,
dentre outras coisas: o modo de celebrar os sacra-
mentos e as exéquias; bênçãos de alimentos, ima-
gens, escapulários, crucifixos; bênçãos reservadas a
bispos ou clérigos específicos; exorcismo da água e
do sal, exorcismos de possessos etc. A primeira fonte
do Ritual são os antigos Sacramentários. Destes, vie-
ram posteriormente os Pontificais, que traziam os ri-
tos celebrados pelo bispo, enquanto os ritos propria-
mente presbiterais estavam espalhados por diversos
livros. Em 1614, Paulo V publicou o Ritual, que foi
reeditado por Bento XIV, juntamente com o Ceri-
monial dos Bispos e o Pontifical Romano, em 1752,
revisto e aumentado por São Pio X em 1913, por Pio
XI em 1925, e Pio XII em 1952 (Cf. Antônio Coelho,
Curso de Liturgia Romana, n. 16). Com a reforma
litúrgica posterior ao Vaticano II, os livros foram re-
vistos e adaptados, e publicados separadamente con-
forme os temas, v.g.: Ritual de Exorcismos, Ritual de
Bênçãos etc.

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A rt i g o I : Da n at u r ez a d o s s ac r a m en ta i s

sacramentais podem ser reduzidos a certos


gêneros. Dividem-se:
1.º Ratione obiecti: in actiones et 1.º Em razão do objeto: em ações e coi-
res, prout effectus immediate aliqua
actione, e.g., benedictione, vel me- sas, na medida em que produz os efei-
diate, scilicet mediante re benedicta, tos imediatamente com alguma ação,
producitur.
v.g., uma bênção, ou mediatamente,
i.e., mediante uma coisa abençoada.
Actiones dicuntur sacramentalia As ações chamam-se sacramentais transitórios
transeuntia et comparantur cum sa-
cramentis, quæ actione transeunte
e são comparadas aos sacramentos, os quais são
conficiuntur; res benedictæ dicuntur confeccionados por uma ação transitória. As coi-
sacramentalia permanentia et com- sas abençoadas chamam-se sacramentais perma-
parantur ss. altaris sacramento, quod
in esse permanet et usu effectum
nentes e são comparadas ao Santíssimo Sacramen-
suum producit. to do altar, que permanece existindo e produz seu
efeito através do uso.

2.º Ratione finis, sacramentalia tran- 2.º Em razão do fim, os sacramentais


seuntia dividuntur in: benedictiones
et exorcismos, prout adhibentur ad transitórios dividem-se em: bênçãos
effectum supernaturalem conferen- e exorcismos, na medida em que são
dum, aut ad potestatem dæmonis
debilitandam vel frangendam. usados para conferir um efeito sobre-
natural, ou para debilitar ou romper o
poder demoníaco.
Benedictiones iterum dividuntur: As bênçãos dividem-se novamente:
a) Ratione formæ: in verbales, in qu- a) Em razão da forma: em verbais, nas
ibus sola verba (et signa, v.g., crucis)
adhibentur; et in reales, in quibus quais são usadas apenas palavras (e
plerumque unctio adhibetur, quæ sinais, v.g., o da Cruz); e reais, nas
vocantur etiam consecrationes.
quais utiliza-se frequentemente a un-
ção, as quais também são chamadas
consagrações.
b) Ratione effectus: in constitutivas b) Em razão do efeito: em constitutivas,
(Weihesegen), quibus præter impe-
trationem auxiliorum supernatu- nas quais, além da impetração de efei-
ralium, res vel personæ ad cultum tos sobrenaturais, coisas ou pessoas
divinum deputantur et mutato statu
in esse sacro constituuntur; et invo-
cativas (Bittsegen), quibus non mu-

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S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

são deputadas ao culto divino e, mu-


6
tato statu aliquod speciale bonum
impetratur.
dado seu estado, constituídas como
sagradas; e invocativas, nas quais, sem
alteração do estado, algum bem espe-
cial é impetrado.
São exemplos de bênçãos constitutivas: a primeira Constitutiva sunt, v.g., prima ton-
7
tonsura, as ordens menores, a consagração das sura, ordines minores, consecratio
virginum, benedictio abbatis, con-
virgens, a bênção de abades, a consagração de um secratio calicis, ecclesiæ, coemeterii,
cálice, duma igreja ou de um cemitério, a bênção benedictio oratorii, paramentorum,
de um oratório, dos paramentos, da água benta aquæ lustralis etc. Invocativæ sunt,
v.g., benedictio puerorum, infir-
etc. São exemplos de bênçãos invocativas: a bênção morum, novæ domus, frugum etc.
de crianças, de enfermos, da nova residência, dos Inter constitutivas quædam sunt,
frutos da terra etc. Entre as constitutivas há algu- quibus res fiunt sacramentalia per-
manentia, si benedicuntur, ut earum
mas que fazem algo ser um sacramental perma- applicatione vel usu permanenter
nente, se for abençoado para, com sua aplicação bona redundent, v.g., aqua lustralis;
ou utilização, produzir bens permanentemente, aliæ, quibus res vel personæ solum
ad cultum divinum ordinantur, qua-
v.g., a água benta. Há outras que apenas ordenam rum aliqua inserviunt ad alia sacra-
uma coisa ou pessoa ao culto divino, dentre as menta vel sacramentalia conferenda,
quais algumas servem para conferir outros sacra- ut sacra olea.

mentos ou sacramentais, como os sagrados óleos.

c) Em razão do rito: em solenes e pri- c) Ratione ritus: in sollemnes et priva-


tas, prout fiunt cum concursu populi
vadas, na medida em que são feitas et campanarum sonitu, cum cantu
com o povo e ao som dos sinos, com et ministris, vel sine his sollemnita-
tibus. (Superpelliceum et stola non
cânticos e ministros, ou sem tais sole- faciunt ritum sollemnem).
nidades. (A sobrepeliz e a estola não
tornam solene um rito).

3.º Em razão do ministro: em reserva- 3.º Ratione ministri: in reservata,


quæ solum a determinato ministro
dos, que só podem ser confeccionados confici possunt; et non reservata,

6. “Deputar”, do latim deputare, segundo o antigo


Caldas Aulete, significa “designar, destinar”.
7.Uma das quatro ordens menores (ostiariato, leito-
rato, exorcistado, acolitato) vigentes na Igreja latina
até a reforma litúrgica posterior ao Concílio Vatica-
no II, que passaram a ser chamadas de ministérios.

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A rt i g o I : Da n at u r ez a d o s s ac r a m en ta i s

quæ ab omnibus indiscriminatim por um tipo específico de ministro; e


ministris peragi possunt.
não reservados, que podem ser feitos
por todos os ministros.
a) Sacramentalia reservata, alia sunt a) Dentre os sacramentais reservados: uns
papæ reservata ut benedictio pallii,
agni Dei, rosæ aureæ etc.; alia sunt são reservados ao Papa, como a bên-
episcopis reservata, quæ duplicis ge- ção do pálio, do Agnus Dei , da rosa de
8

8. “O nome Agnus Dei refere-se a certos discos de


cera impressos com a figura de um cordeiro e aben-
çoados em épocas determinadas pelo Papa. Eles
são às vezes redondos, às vezes ovais. O cordeiro
geralmente carrega uma cruz ou bandeira, enquan-
to figuras de santos ou o nome e o brasão de armas
do Papa também são comumente impressos atrás.
Esses Agnus Dei podem ser usados ​​pendurados ao
pescoço, ou guardados como objetos de devoção.
Em virtude da consagração que recebem, são con-
siderados (como a água benta, os ramos bentos etc.)
como ‘sacramentais’. O simbolismo do Agnus Dei é
melhor deduzido das orações usadas em várias épo-
cas para abençoá-lo. Como no círio pascal, a cera ti-
pifica a carne virginal de Cristo; a cruz associada ao
cordeiro sugere a ideia de uma vítima oferecida em
sacrifício; e assim como o sangue do cordeiro pascal
antigamente protegia do anjo da morte cada famí-
lia, assim o propósito desses medalhões consagrados
é proteger aqueles que os usam, ou os possuem, de
todas as influências malignas. Nas orações de bên-
ção, faz-se especial menção aos perigos de tempes-
tade e peste, de incêndio e inundação, e também aos
perigos a que as mulheres estão expostas no parto.
Antigamente era costume em Roma acompanhar o
presente de um Agnus Dei com um folheto impresso
descrevendo suas muitas virtudes” (Herbert Thurs-
ton, “Agnus Dei”. In: The Catholic Encyclopedia. New
York: Robert Appleton Company, 1907. Acessado
em 13 jun. 2023. Disponível em <http://www.ne-
wadvent.org/cathen/01220a.htm>).

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S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

ouro etc.; outros são reservados aos


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neris sunt: α) benedictiones quædam
reales, quæ episcopis ita propriæ
bispos, e dividem-se em dois gêneros: sunt, ut sine indulto apostolico sa-
α) algumas bênçãos reais, que são de cerdoti delegari nequeant (v.g., or-
dines minores); β) benedictiones
tal modo próprias do bispo que, sem verbales, quas episcopi vel iure ordi-
nario vel delegato sacerdotibus com-
indulto apostólico, não podem ser de- mittere possunt.
legadas a um sacerdote (v.g., as ordens
menores); β) bênçãos verbais, que, por
direito ordinário ou por delegação, os
bispos podem confiar aos sacerdotes.
Convém lembrar a série de bênçãos reservadas a Memoranda est series benedictio-
num, quæ certis ordinibus religiosis
certas Ordens religiosas, que constam no Ritual
reservantur et in Rituali habentur
sob o título “Bênçãos próprias de algumas Ordens sub titulo: Benedictiones propriæ
religiosas”. nonnullorum ordinum regularium.

b) Entre os sacramentais não reservados, b) Inter sacramentalia non reser-


vata, quæ vi ordinis a quolibet sa-
que, por força [do sacramento] da Or- cerdote absque delegatione fieri
dem, podem ser confeccionados por possunt, notari debent ea, quæ sunt
de iure parochiali, ideoque ab alio
qualquer sacerdote sem delegação, de- sacerdote absque licentia parochi
ve-se notar os que são de direito paro- fieri nequeunt: benedictio nuptialis,
benedictio fontis baptismalis, bene-
quial e, portanto, não podem ser feitos dictio domorum in sabbato sancto,
por outro sacerdote sem licença do pá- benedictio agrorum et frugum, si
sollemniter fit; generatim non sunt
roco: bênção nupcial, bênção da fonte faciendæ benedictiones publice et

9. “Um ornamento precioso e sagrado feito de ouro


puro por artífices habilidosos, que os Papas estão
acostumados há séculos a abençoar a cada ano e,
ocasionalmente, conferir a igrejas e santuários ilus-
tres como sinal de especial reverência e devoção, a
reis ou rainhas católicos, príncipes ou princesas, ge-
nerais de renome ou outras personalidades ilustres,
e a governos ou cidades que se destaquem pelo seu
espírito católico e lealdade à Santa Sé, como sinal
de estima e afeto paterno” (P.M.J. Rock, “Golden
Rose”. In: The Catholic Encyclopedia. New York: Ro-
bert Appleton Company, 1909. Acesso em 28 jun.
2023. Disponível em <http://www.newadvent.org/
cathen/06629a.htm>).

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A rt i g o I : Da n at u r ez a d o s s ac r a m en ta i s

sollemniter in loco, qui alterius iu- batismal, bênção das casas no Sábado
risdictioni subest.
Santo, bênção dos campos e dos fru-
tos da terra, se feitas solenemente. Em
geral, as bênçãos não devem ser feitas
de modo público e solene num lugar
sujeito à jurisdição de outro.

[46]. Minister. Sacramentalium mi- [46]. Ministro. O ministro legítimo dos 3


nister legitimus in genere est clericus,
cui ad id potestas collata est quique sacramentais em geral é o clérigo, ao qual
ab auctoritate ecclesiæ non sit prohi- foi dado poder para tanto, e que não está
bitus (can. 1146). Pro diversa autem
dignitate sacramentalium diversi mi- impedido pela autoridade da Igreja. To- 10

nistri assignantur: davia, diferentes tipos de ministros são


designados conforme a dignidade dos sa-
cramentais:

a) Pro consecrationibus requiritur a) Para as consagrações requer-se o cará-


character episcopalis, nisi ius vel
apostolicum indultum etiam sacer-
ter episcopal, a menos que o direito ou
doti potestatem concedat. um indulto apostólico também conce-
da tal poder a um sacerdote.

b) Benedictiones dare potest quilibet b) Qualquer presbítero pode dar bên-


presbyter, nisi sint reservatæ; sed
etiam reservatæ, si dantur a presbyte-
çãos, desde que não sejam reservadas.
ro sine licentia, sunt illicitæ, non inva- Porém, mesmo as reservadas, se forem
lidæ, nisi aliud expressum sit.
dadas por presbítero sem licença, são
ilícitas, não inválidas, salvo se algo di-
ferente for expresso.
c) Diaconi et lectores illas benedi- c) Os diáconos e leitores só podem dar,
ctiones tantum valide et licite dare
válida e licitamente, aquelas bênçãos

10. CDC 1917, Cân. 1146. (Cf. CDC 1983, Cân.


1168.)

19
S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

que lhes são expressamente permiti- possunt, quæ ipsis expresse a iure
permittuntur (can. 1147).
das pelo direito. 11

d) Os ministros dos exorcismos que ocor- d) Ministri exorcismorum qui occur-


runt in baptismo et in consecrationi-
rem no batismo e nas consagrações ou bus vel benedictionibus, sunt iidem,
bênçãos, são os mesmos ministros le- qui eorundem sacrorum rituum legi-
timi ministri sunt (can. 1153).
gítimos destes sagrados ritos. 12

Portanto, os leigos não podem confeccionar os sa- Laici ergo sacramentalia conficere
cramentais. Todavia, o uso de alguns sacramen- nequeunt. Usus tamen quorundam

11. CDC 1917, Cân. 1147, § 4. (Cf. CDC 1983, Cân.


1169, § 3.) No atual Código, fala-se apenas dos diá-
conos, já que a ordem menor dos leitores foi abolida
e transformada em ministério. Até a reforma litúrgi-
ca que se seguiu ao Concílio Vaticano II, com o lei-
torato, antes mesmo de ser ordenados sacerdotes, os
varões recebiam do bispo o poder de benzer os pães
e frutos novos — muito provavelmente porque esta-
vam de posse dos livros que continham as fórmulas
para abençoar esses alimentos (Cf. Aertnys-Damen,
Theologia Moralis, t. 2. Casale: Marietti, 1958, p. 55).
12. CDC 1917, Cân. 1153. Este cânone não tem pa-
ralelo no atual Código de Direito Canônico, que só
trata do chamado exorcismo solene, ou maior, em
seu Cân. 1172. Os exorcismos de que fala essa antiga
prescrição são as orações públicas que a Igreja fazia
— e ainda faz, ainda que em menor quantidade —
sobre o catecúmeno no rito do Batismo. Como esse
sacramento era ministrado por um sacerdote, natu-
ralmente ele mesmo faria os exorcismos presentes
no rito, e não o varão que recebera a ordem menor
do exorcistado (já não mais existente na Igreja lati-
na). O Catecismo da Igreja Católica explica: “Quan-
do a Igreja exige publicamente e com autoridade, em
nome de Jesus Cristo, que uma pessoa ou objeto seja
protegido contra a influência do maligno e subtraído
a seu domínio, fala-se de exorcismo. Jesus o praticou,
é dele que a Igreja recebeu o poder e o encargo de
exorcizar. Sob uma forma simples, o exorcismo é
praticado durante a celebração do Batismo” (§ 1673).

20
A rt i g o I : Da n at u r ez a d o s s ac r a m en ta i s

sacramentalium permanentium im- tais permanentes é permitido imediatamente aos


mediate ipsis laicis permittitur ut
aquæ lustralis, agnus Dei, numisma-
leigos, como a água benta, o Agnus Dei, as me-
tis benedicti etc.; alia vero sacramen- dalhas bentas etc. Outros sacramentais perma-
talia permanentia, ut cineres bene- nentes, como a cinza abençoada etc., devem ser
dicti etc., fidelibus per ministerium
sacerdotum applicari debent.
aplicados nos fiéis pelo ministério dos sacerdotes.

[47]. Subiectum. 1) Etsi subiectum [47]. Sujeito. — 1) O sujeito próximo e 4


proximum et immediatum sacra-
mentalium sit diversissimum, crea-
imediato dos sacramentais é muito varia-
tura nempe tum rationalis tum irra- do, pois compreende as criaturas racionais
tionalis, subiectum tamen remotum
et ultimum semper est homo viator, e irracionais. O sujeito remoto e último é
in cuius spiritualem utilitatem cedit sempre o homem viador, pois todo efeito
13

omnis effectus per sacramentalia


productus. produzido pelos sacramentais destina-se à
utilidade espiritual dele.

2) Benedictiones, imprimis catholicis 2) As bênçãos, que em princípio devem


impertiendæ, dari etiam possunt ca-
techumenis, immo, nisi obstet eccle-
ser conferidas aos católicos, também po-
siæ prohibitio, etiam acatholicis ad dem ser dadas aos catecúmenos. E não
obtinendum fidei lumen vel una cum
illo corporis sanitatem (can. 1149). havendo proibição da Igreja, podem ser
dadas inclusive aos não católicos, a fim
de alcançarem o lume da fé ou, junto com
este, a saúde do corpo. 14

a) Talis prohibitio ecclesiæ in iure a) Tal proibição da Igreja consta no direito: para
habetur: pro excommunicatis vitan- os excomungados vitandos e para os tolerados
dis et pro toleratis post sententiam
condemnatoriam vel declaratoriam; após sentença condenatória ou declaratória;
pro personaliter interdictis; pro ca- para os pessoalmente interditados; para os
tholicis, qui matrimonium mixtum, católicos que, sem dispensa, ousaram con-
etsi validum, sine dispensatione inire
ausi sunt; pro illis, qui poena vindi- trair matrimônio misto, embora válido; para

13. “Viador” é sinônimo de viandante, peregrino.


Vem do latim viator, i.e., que está in via, “a cami-
nho”, e “diz-se do indivíduo que anda peregrinando
na vida terrena ou transitória (em contraposição ao
que já passou à segunda vida ou vida eterna)” (Cal-
das Aulete).
14. CDC 1917, Cân. 1149. (Cf. CDC 1983, Cân. 1170.)

21
S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

os que receberam como pena vindicativa a cativa privationis sacramentalium


15 affecti sunt (can. 2260 § 1; 2275, 2;
privação dos sacramentais. 2291, 6).

b) Entre os sacramentais que podem ser da- b) Sacramentalia, quæ dari possunt
dos aos catecúmenos, deve-se compreender etiam catechumenis, intelligi de-
bent etiam sacramentalia publica, et
também os públicos; logo, os catecúmenos proinde catechumeni admitti pos-
podem ser admitidos à imposição das cin- sunt ad impositionem cinerum, tra-
zas, à entrega das velas e dos ramos.
16
ditionem candelarum et palmarum
(S.R.C., 08/03/1919).

3)Os exorcismos podem ser feitos não 3) Exorcismi fieri possunt non solum
in fideles et catechumenos, sed etiam
apenas sobre os fiéis e catecúmenos, mas in acatholicos vel excommunicatos
também sobre os não católicos ou exco- (can. 1152).

mungados. 17

15. CDC 1917, Cân. 2260, § 1; 2275, § 2; 2291, 6. O


atual Código de Direito Canônico fala da proibição
de “celebrar sacramentos ou sacramentais” apenas
para excomungados e interditos (cf. Cân. 1331, § 1,
2.º; Cân. 1132). Todavia, nada impede que, na apli-
cação de uma outra pena qualquer, o Ordinário lhe
acrescente esta mesma proibição, como se depreen-
de da leitura do Cân. 1352, § 1.
16. S. Congregatio Rituum, De benedictionibus et sa-
cramentalibus pro catechumenis, 8 mar. 1919: AAS 11
[1919], 144.
17.CDC 1917, Cân. 1152. Cânone também sem pa-
ralelo no atual Código de Direito Canônico.

22
Articulus II Artigo II
DE EFFECTIBUS
SACRAMENTALIUM
DOS EFEITOS DOS
SACRAMENTAIS

[48]. Efficacia sacramentalium. [48]. Eficácia dos sacramentais. Consta, 5


Sacramentalibus inesse specialem
vim atque efficaciam producendi pela fé da Igreja e pelo poder que lhe foi
quosdam effectus supernaturales, conferido, que há nos sacramentais uma
sive spirituales sive corporales, tum
ex persuasione ecclesiæ tum ex po- especial força e eficácia para produzir cer-
testate eidem collata constat. De his tos efeitos sobrenaturais, espirituais e cor-
effectibus declarandum est: a) qui-
nam sint; b) quæ sit potestas ecclesiæ porais. Destes efeitos, falaremos: a) quais
collata; c) quomodo producantur.
são; b) que poder foi conferido à Igreja; c)
como são produzidos.
Specialis dicitur efficacia sacramenta- Dissemos que a eficácia dos sacramentais é espe-
lium, ut distinguatur tum a vi et effi-
cacia impetrandi, quæ convenit ora-
cial, para distingui-la: da força e eficácia da impe-
tionibus fidelium, tum a vi meritoria, tração, que convém às orações dos fiéis; e da força
quæ inest bonis operibus iustorum. do mérito, que é inerente às boas obras dos justos.

Efficacia specialis sacramentalium A eficácia especial dos sacramentais não está em


non in eo consistit quod suapte
natura, quatenus signa sacra sunt,
que, por sua natureza, enquanto sinais sagrados,
pios motus excitant, quibus deinde eles provoquem movimentos piedosos, através
auxilium supernaturale ex opere dos quais posteriormente se obtém ex opere ope-
operantis obtinetur, sed in eo quod
rantis o auxílio sobrenatural; mas em que o efeito
18

ipsa actione vel ipsa re benedicta vi


collatæ benedictionis, effectus super- sobrenatural é obtido com a própria ação, ou com
naturalis obtinetur. a coisa abençoada por força da bênção conferida.

[49]. Quos effectus producant. Ef- [49]. Dos efeitos que produzem. Os efei- 6
fectus, qui a sacramentalibus pro-
ducuntur, ad quatuor potissimum tos produzidos pelos sacramentais podem
revocari possunt: ser reduzidos a quatro principais:

18. Sobre os efeitos ex opere operantis, veja-se, a se-


guir, o § 51 (pp. XXXss).

23
S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

1.º Conferir graças atuais. É o efeito pri- 1.º Collatio gratiæ actualis, quæ pri-
marius et principalis sacramenta-
mário e principal dos sacramentais. lium effectus dici debet. Sic benedi-
Assim, a bênção de um abade, a co- ctio abbatis, coronatio regis, ordines
minores prout sacramentalia sunt,
roação de um rei, as ordens menores benedictio nuptialis etc., gratias
actuales ad rite obeunda munera su-
enquanto sacramentais, a bênção nup- scepta conferunt. Gratiæ vero actua-
cial etc., conferem graças atuais para les non solum sufficientes, sed etiam
efficaces, ad effectus sacramentalium
o correto desempenho dos ofícios re- pertinere censentur.
cebidos. E dentre os efeitos dos sacra-
mentais estão não só as graças atuais
suficientes, mas também as eficazes.

2.º Perdoar o pecado venial. Todos os 2.º Remissio peccati venialis, quam
omnes theologi sacramentalibus tri-
teólogos atribuem este efeito aos sa- buunt, etsi disputent de modo quo
cramentais, embora disputem sobre peccata venialia ab eis deleantur. Sic
aqua lustralis, cineres initio quadra-
como o pecado venial é perdoado por gesimæ benedicti, Confiteor cum
eles. Assim, a água benta, as cinzas orationibus adnexis, potissimum
vim habent delendi peccata venialia.
abençoadas no início da Quaresma, o
Confiteor com as orações anexas, têm
principalmente o poder de perdoar os
pecados veniais.
Não há evidências de que os sacramentais possam Num sacramentalia vim habeant remit-
tendi poenam temporalem, non constat.
perdoar a pena temporal. E Suárez diz: “Nem vejo “Nec video”, ait Suarez, “quo fundamen-
algum fundamento válido sobre o qual se possa to sufficienti affirmari id possit” (De Sa-
19
afirmar isto”. cramentis, disp. 15, sect. 4, n. 9).

3.º Coibir o demônio. De três modos se 3.º Cohibitio dæmonis. Dominium


diaboli in homines ex peccato pro-
reconhece o domínio que, por per- veniens triplici potissimum modo ex
missão divina, o diabo exerce sobre os permissione divina se exserit: i) eo
quod hominibus eorumve bonis mala
homens como consequência do peca- physica infert; ii) eo quod interius
do: i) quando inflige males físicos aos malis tentationibus ad peccatum eos
instigat; iii) eo quod ipsa hominum
homens ou a seus bens; ii) quando os corpora obsidet. Iam ad cohibendos,
debilitandos repellendosve malignos
instiga interiormente ao pecado atra- hosce diaboli influxus, complura sa-
vés das tentações; iii) quando possui

19. De Sacramentis, disp. 15, sect. 4, n. 9.

24
A rt i g o II : D o s ef ei t o s d o s s ac r a m en ta i s

cramentalia, præsertim vero multipli- os próprios corpos dos homens. Para


ces exorcismi adhibentur.
coibir, debilitar ou repelir tais influxos
do diabo, muitos sacramentais são uti-
lizados, mas sobretudo vários tipos de
exorcismo.
Hunc effectum sacramentalia, pro Os sacramentais produzem este efeito de vários
varietate influxus diabolici, variis
modis producunt: vel enim angelos
modos, conforme a variedade do influxo diabó-
bonos movent, ut maiore vi et vir- lico: seja movendo os anjos bons para que, com
tute, malignas diaboli infestationes mais poder e força, afastem as infestações malig-
repellant; vel auxilia gratiæ confe-
runt ad tentationes facilius superan-
nas do diabo; seja conferindo os auxílios da graça
das; vel impediunt, quominus mali para superar mais facilmente as tentações; seja ex-
spiritus hominibus eorumve bonis pulsando o demônio totalmente do corpo do pos-
noceant; vel tandem dæmonem a
corporibus obsessis plane expellunt
sesso, ou ao menos enfraquecendo sua influência.
aut saltem eius influxum debilitant.
É preciso distinguir o exorcismo ordinário (nu-
Ab exorcismo ordinario, qui ad sa- merado entre os sacramentais) do carisma ex-
cramentalia numeratur, distingui de-
bet charisma extraordinarium, quo
traordinário, através do qual Deus às vezes confe-
Deus quandoque viris sanctis pote- re aos santos o poder de expulsar milagrosamente
statem confert miraculose expellendi os demônios do corpo dos possessos. Com efeito,
dæmones a corporibus obsessis. Vis
enim et efficacia exorcismi ordinarii,
embora a força e eficácia do exorcismo ordinário
etsi semper valeat ad dæmonis po- seja sempre capaz de enfraquecer o poder do de-
testatem debilitandam, non tamen mônio, contudo, não é sempre capaz de expulsá-
semper valet ad dæmonem ipsum
plene expellendum.
-lo completamente.

4.º Operatio boni temporalis, ut sani- 4.º Operar um bem temporal, como a saú-
tatis aliorumve beneficiorum. Hunc
effectum sacramentalia diversimode de ou algum outro benefício. Este efei-
producunt: eo quod, speciali Dei to é produzido de vários modos pelos
providentia, homo eiusque bona a
malis futuris præservantur; vel eo sacramentais: i) quando, por especial
quod mala præsentia auferuntur providência de Deus, o homem e seus
corporibusque sanitas restituitur; vel
eo quod temporalis prosperitas con- bens são preservados de males futu-
fertur. Sic benedictio infirmorum et
pleræque benedictiones, quæ crea-
ros; ii) ou quando males presentes são
turis irrationalibus conferuntur, hos retirados e é restituída a saúde aos cor-
effectus potissimum intendunt.
pos; iii) ou quando uma prosperidade
temporal é conferida. Assim, a bênção
dos doentes e muitas bênçãos dadas
a criaturas irracionais, destinam-se
principalmente a estes efeitos.

25
S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

5.º Certos sacramentais, como as consa- 5.º Quædam sacramentalia, conse-


crationes scilicet et benedictiones
grações e bênçãos constitutivas, pos- constitutivæ, etiam hunc effectum
habent quod huiusmodi res reveren-
suem também este efeito: ordenar que ter tractari iubentur, ad usum pro-
tais coisas sejam tratadas com reverên- fanum vel non proprium adhiberi
vetantur, etiamsi in dominio privato-
cia, proibir que sejam utilizadas para rum sint (can. 1150).
fins profanos ou impróprios, ainda
Nota 1. Non tamen singula sacra-
que estejam sob domínio privado. 20
mentalia omnes hos effectus pro-
ducunt: nam tum ex institutione
Nota 1. Nem todos os sacramentais produzem sua, tum ex modo quo peraguntur,
diversa et ad diversos fines destinata
todos estes efeitos. Isto porque vários sacramen- sunt, ideoque diversos etiam effectus
tais foram criados e para fins diversos, conforme producunt. Quosnam vero fructus
sua instituição ou o modo com que são confec- singula conferant, tum ex eorum
institutione, tum ex precibus quibus
cionados; por isso, eles também produzem efei- ecclesia ea administrat, colligi debet
tos diversos. (Cf. Amberger III 2, S. 197 ff.).

Nota 2. As bênçãos e consagrações com que pes- Nota 2. Benedictiones et consecra-


tiones, quibus res vel personæ ab
soas ou coisas são consagradas pela Igreja e depu- ecclesia consecrantur et ad cultum
tadas ao culto divino (como a consagração de uma divinum deputantur, ut consecratio
igreja, do cálice, a bênção de um abade ou abades- ecclesiæ, consecratio calicis, benedi-
ctio abbatis vel abbatissæ, prima ton-
sa, a primeira tonsura, as ordens menores etc.), são sura, ordines minores etc., eatenus
sacramentais na medida em que a consagração ou sacramentalia sunt, quatenus ipsa
o uso da coisa consagrada têm o poder de comu- consecratio vel usus rei consecratæ
vim habet conferendi effectus super-
nicar efeitos sobrenaturais; mas não que tenham naturales, non autem quatenus vim
o poder de constituir verdadeiramente a coisa ou habet constituendi rem vel personam
pessoa como sagrada e deputada ao culto divino. vere sacram et ad cultum divinum
deputatam. Ecclesia enim res et per-
Afinal, a Igreja não faz consagrações e deputações sonas non ea potestate consecrat et
permanentes de pessoas e coisas ao culto divino ad cultum divinum permanenter de-
usando seu poder de instituir e confeccionar os sa- stinat, qua sacramentalia instituit et
conficit, sed potestate, qua instructa
cramentais; ao contrário, serve-se para tanto do seu est, regendi ordinandique Dei cul-
poder de reger e ordenar o culto externo a Deus na tum externum in societate religiosa
sociedade religiosa instituída por Cristo. Sem dú- a Christo instituta. Equidem sacra-
mentalia quoque ad cultum divinum
vida, os sacramentais também estão ordenados ao ordinantur, cum suapte natura sint
culto divino, já que, por sua natureza, são atos de actus cultus divini; verum potestas
culto a Deus; mas o poder de reger o culto externo regendi cultum externum ad insti-
tuenda et conficienda sacramentalia
em ordem à instituição e confecção dos sacramen- non sufficit, nisi accedat peculiaris

20. CDC 1917, Cân. 1150. (Cf. CDC 1983, Cân.


1171.)

26
A rt i g o II : D o s ef ei t o s d o s s ac r a m en ta i s

potestas benedicendi et potestas tais, não é suficiente se faltar o poder peculiar de


cohibendi dæmones.
abençoar e o poder de coibir os demônios.

[50]. De potestate ecclesiæ. Ad in- [50]. Sobre o poder da Igreja. Para a ins- 7
stituenda et conficienda sacramen-
talia ecclesia duplici potestate in- tituição e confecção dos sacramentais, a
structa est, potestate benedicendi et Igreja foi dotada de dois poderes: i) o de
potestate cohibendi dæmones.
abençoar; ii) e o de coibir os demônios.

1) De potestate benedicendi. Hanc 1. do poder de abençoar. — Que este


potestatem apostolis, atque in iis,
ecclesiæ ministris a Christo traditam
poder foi dado por Cristo aos Após-
esse, patet ex his scripturæ verbis: tolos, e neles, a todos os ministros da
In quamcumque domum intraveritis,
primum dicite: Pax huic domui; et si Igreja, consta destas palavras da Es-
ibi fuerit filius pacis, requiescet super critura: “Em qualquer casa em que
illum pax vestra (Lc 10,5-6). Verba
enim: Pax huic domui, non exhibent entrardes, dizei primeiro: ‘A paz seja
salutationem communiter usitatam, nesta casa’. E, se ali houver algum fi-
sed benedictionem, qua bona super-
naturalia efflagitantur, ut ex sequen- lho da paz, repousará sobre ele a vos-
tibus verbis patet (Cf. Knabenbauer,
Commentarius in quattuor evang. I,
sa paz” (Lc 10, 5-6). Pois as palavras:
p. 387). “A paz seja nesta casa” não designam
uma mera saudação, mas uma bên-
ção, através da qual bens sobrenatu-
rais são suplicados, como consta das
palavras seguintes.
Christus apostolos exemplo suo do- Com seu exemplo, Cristo ensinou aos
cuit, quomodo benedicendi potesta-
tem in utilitatem hominum exercere Apóstolos que eles deveriam exercer o
deberent: ipse enim parvulis manus poder de abençoar para utilidade dos
imponens benedixit (Mc 10,19; Mt
19,15), panes et pisces postea mul- homens: pois Ele mesmo, impondo as
tiplicandos benedixit (Mc 6,41; Mt
14,19), panem in corpus suum con-
mãos, abençoou as crianças (cf. Mc 10,
vertendum benedixit (Mt 26,26), ac 19; Mt 19, 15); abençoou os pães e pei-
tandem ante suam in cælum ascen-
sionem, elevatis manibus, apostolis
xes que em seguida multiplicaria (cf.
et discipulis benedixit (Lc 24,50). Mc 6, 41; Mt 14, 19); abençoou o pão
que converteria em seu Corpo (cf. Mt
26, 26); e por fim, antes de ascender ao
Céu, com as mãos elevadas, abençoou
os Apóstolos e discípulos (cf. Lc 24, 50).

27
S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

2. do poder sobre os demônios. — 2) De potestate in dæmones. Hanc


potestatem apostolis et discipulis, at-
Que este poder foi dado aos Apóstolos que in iis, ecclesiæ ministris traditam
e discípulos, e neles, aos ministros da esse hisce scripturæ verbis demon-
stratur: Convocatis autem duodecim
Igreja, demonstram-no estas palavras apostolis, dedit illis virtutem et pote-
statem super omnia dæmonia (Lc 9,1;
da Escritura: “Convocados os doze Coll. Mt 10,1; Lc 10,17).
apóstolos, deu-lhes poder e autorida-
de sobre todos os demônios” (Lc 9, 1;
Mt 10, 1; Lc 10, 17).
Nota. A Igreja exerce este poder que recebeu de Nota. Ecclesiam traditam sibi a
Christo potestatem per sacerdotes
Cristo principalmente pelo ofício dos sacerdotes;
suos potissimum exercere ex ipso
o que consta e é expresso com as palavras que ela sacerdotum munere iam constat et
utiliza na consagração do presbítero: “Dignai-vos, expresse significatur verbis, quibus
ipsa in ordinatione presbyteri utitur:
Senhor, consagrar estas mãos… para que tudo
Consecrare digneris, Domine, manus
quanto abençoarem, seja abençoado, tudo quan- istas… ut quæcumque benedixerint,
21
to consagrarem, seja consagrado e santificado”. benedicantur, et quæcumque conse-
craverint, consecrentur et sanctificen-
E embora a Igreja, na ordenação ao exorcistado,
tur. Et quamvis clericis in ordinatio-
confira aos clérigos o poder de impor as mãos so- ne exorcistarum conferat potestatem
bre os possessos e, pela imposição da mão, de coibir imponendi manus super energumenos
et per impositionem manus coercen-

21. Antes da reforma litúrgica, o bispo ungia as mãos


do ordinando com o óleo dos catecúmenos, e dizia:
Consecrare et sanctificare digneris, Domine, manus
istas per istam unctionem, et nostram benedictionem.
Amen. — “Dignai-vos, Senhor, consagrar e santifi-
car estas mãos, por esta unção e pela nossa bênção.
Amém”. Depois, traçava o sinal da Cruz sobre as
mãos do ordinando, e dizia: Ut quæcumque benedi-
xerint, benedicantur, et quæcumque consecraverint,
consecrentur, et sanctificentur in nomine Domini
nostri Iesu Christi — “Para que tudo quanto aben-
çoarem, seja abençoado, e tudo quanto consagrarem,
seja consagrado e santificado em nome de nosso Se-
nhor Jesus Cristo”. — No atual rito, o bispo unge com
o santo crisma as mãos do ordinando, e diz: “O Se-
nhor Jesus Cristo, a quem o Pai ungiu pelo Espírito
Santo e seu poder, te guarde para santificares o povo
cristão e ofereceres a Deus o sacrifício”.

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A rt i g o II : D o s ef ei t o s d o s s ac r a m en ta i s

di spiritus immundos, hac potestate os espíritos imundos, contudo, só permite que os


tamen uti non licet nisi sacerdotibus 22
(can. 1153; S. C. Prop. 11/09/1799). sacerdotes utilizem este poder.

[51]. Quomodo effectus producant. [51]. Como produzem os efeitos. Os sa- 8


Sacramentalia effectus producunt ex
vi impetratoria ecclesiæ, (vel etiam
cramentais produzem efeitos pela força im-
imperativa in exorcismis) quæ, dum petratória da Igreja (ou imperativa, no caso
sacramentalia per ministros suos
conficit, Deum ipsa deprecatur pro dos exorcismos). Pois, quando confecciona
iis, quibus sacramentalia admini- os sacramentais através de seus ministros,
strantur vel qui postea eis utuntur.
Ad quæstionem, utrum sacramen- a Igreja mesma roga a Deus por aqueles aos
talia effectum producant ex opere quais os sacramentais são administrados
operato an ex opere operantis, ita
dicendum videtur: ou que posteriormente os utilizam. Sobre a
questão: se os sacramentais produzem efei-
to ex opere operato ou ex opere operantis,
resolvemo-la assim:
a) Non ex opere operantis: hoc nam- a) Nem ex opere operantis, pois este ter-
que termino significatur effectum
pendere a sanctitate ministri vel a mo indica que o efeito depende da
dispositione subiecti; sed sacramen- santidade do ministro ou da dispo-
talia vim et efficaciam suam non
habent ex sanctitate et devotione mi- sição do sujeito; no entanto, a força e
nistri neque ex dispositione subiecti, eficácia dos sacramentais não vem da
sed ex vi impetratoria ecclesiæ.
santidade e devoção do ministro nem
da disposição do sujeito, mas da força
impetratória da Igreja.
Si quandoque legimus sacramenta- Se às vezes lemos que os sacramentais produzi-
lia uberiores et propemodum miros ram efeitos mais abundantes e até quase miracu-
effectus produxisse, ubi a viris san-
ctis peragerentur, id non ordinariæ losos, quando eram confeccionados por homens
sacramentalium efficaciæ, sed sin- santos, não devemos atribuí-lo à eficácia ordinária
gulari charismati determinatæ per- dos sacramentais, mas a um carisma singular, que
sonæ intuitu sanctitatis a Deo col-
lato tribuendum est. His tamen non Deus conferiu àquela pessoa santa determinada.
negatur sacramentalium ordinarium É inegável, porém, que o efeito ordinário dos sa-
effectum, etiam dempto speciali cha- cramentais possa ser aumentado, e de fato o seja,
rismate, ex merito ministri qui Deo
eximie placet, augeri posse et reipsa pelo mérito de um ministro sumamente agradável
augeri, quemadmodum fructus mis- a Deus, mesmo na ausência de um carisma espe-

22. CDC 1917, Cân. 1153.

29
S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

cial — como se dá com os frutos da Santa Missa, sæ intuitu sanctitatis ministri offe-
rentis quandoque augentur.
que às vezes são mais abundantes em razão da
santidade do ministro oferente.

Para a recepção dos efeitos dos sacramentais re- Ad percipiendos sacramentalium


quer-se a adequada disposição do sujeito, assim effectus debita subiecti dispositio
requiritur, quemadmodum ad per-
como é necessária a devida disposição para re- cipiendos fructus sacramentorum
ceber os frutos dos sacramentos. Portanto, ad- debita dispositio necessaria est. Hinc
mitimos que tanto mais abundante é o efeito dos concedendum est effectum sacra-
mentalium eo uberiorem esse, quo
sacramentais, quanto mais perfeita é a disposição perfectior est dispositio seu san-
ou santidade, fé e devoção do sujeito; contudo, a ctitas, fides et devotio subiecti; vis
força para produzir tais efeitos é inerente à impe- autem hos effectus producendi inest
impetrationi ecclesiæ.
tração da Igreja.

b) Nem ex opere operato, pois este ter- b) Neque ex opere operato: hoc enim
termino significatur effectum pro-
mo significa que o efeito é produzido duci vi institutionis divinæ, adeo ut
por força da instituição divina, de tal ipsum signum, vi huius institutionis,
efficax sit ad producendos effectus;
modo que o próprio sinal [sacramen- sacramentalia autem non vi institu-
tionis, sed vi orantis et impetrantis
tal], por força desta instituição, é efi- ecclesiæ efficacia sunt.
caz para produzir efeitos. Todavia,
os sacramentais são eficazes não por
força da instituição, mas por força da
oração e impetração da Igreja.

c) Mas ex opere operantis Ecclesiæ. O c) Sed ex opere operantis ecclesiæ.


Modus, quo sacramentalia ope-
modo de operação dos sacramentais rantur, in eo convenit cum modo
convém com o dos sacramentos na operandi sacramentorum, quod eo-
rum efficacia non pendeat a merito
medida em que sua eficácia não de- ministri neque a sanctitate subiecti;
sed in eo differt a modo operandi
pende do mérito do ministro nem da sacramentorum, quod eis efficacia
santidade do sujeito; mas difere, na non competat vi institutionis, sed
vi impetrationis ecclesiæ (vel etiam
medida em que sua eficácia não ad- imperii) sacramentalia peragentis.
vém da força da instituição, mas da Quamvis ergo vere affirmari possit,
sacramentalia agere ex opere opera-
força impetratória (ou imperativa)
da Igreja que realiza os sacramentais.
Portanto, embora possamos verdadei-
ramente afirmar que os sacramentais
agem ex opere operato, se considerar-

30
A rt i g o II : D o s ef ei t o s d o s s ac r a m en ta i s

to, si huius termini sola vis negativa mos apenas a força negativa desta ex-
consideretur, aptius tamen sacra-
mentalia effectus producere dicuntur pressão, contudo, é mais correto dizer
ex opere operantis ecclesiæ, ut modo
singulari, quo sacramenta operantur,
que os sacramentais produzem efeitos
etiam singularis terminus ex opere ex opere operantis Ecclesiæ; pois assim
operato reservetur.
reservamos um termo singular (ex
opere operato) para o modo singular
com que os sacramentos operam.

[52]. Efectus sacramentalium di- [52]. O efeito dos sacramentais é infalível. 9


cendus est infallibilis. Effectus enim
producitur deprecatione ecclesiæ; Afinal, o efeito é produzido pela depreca-
sed ecclesiæ orationes semper au- ção da Igreja; mas as orações da Igreja são
diuntur. Si tamen effectus qui inten-
ditur ex administratione vel ex usu sempre ouvidas. Logo, se de fato o efeito
sacramentalium reipsa non semper pretendido com a administração ou uso
provenit, id ex duplici condicione
potissimum explicari debet, a qua dos sacramentais nem sempre acontece,
infallibilis efficacia omnium oratio-
num dependet. Si enim bona tem-
isto se deve principalmente às duas con-
poralia efflagitantur, ut sanitas cor- dições das quais depende a eficácia infalí-
poris, abundantia frugum etc., fieri
potest ut eorum largitio ad salutem
vel de todas as orações. Se forem pedidos
animæ non conducat; et si bona su- bens temporais, como a saúde do corpo,
pernaturalia petuntur, fieri potest ut
eorum concessio ordini divinæ pro- uma colheita abundante etc., pode ser que
videntiæ et prædestinationis non sit a concessão deles não conduza à salvação
conformis.
da alma; e se forem pedidos bens sobrena-
turais, pode ser que a concessão deles não
esteja em conformidade com a ordem da
Providência e predestinação divinas.
Ex his conficitur illa sacramentalia
Disto, conclui-se que os sacramentais, sem o
(qua sacramentalia) nihil valere, qu-
ibus non assistit impetratio ecclesiæ; auxílio da impetração da Igreja, nada valem en-
hæc autem illis non assistit, quæ non quanto sacramentais. Ora, a Igreja não assiste aos
peraguntur cum ea materia et forma,
sacramentais que não são confeccionados com
quam ipsa præscribit. Sacramentalia
ergo, in quorum confectione vel usu a matéria e a forma que ela mesma prescreve.
non observantur condiciones ab ec- Logo, os sacramentais em cuja confecção ou uso
clesia designatæ, nullum effectum
não são observadas as condições designadas pela
habent. Et in hac re neque ignoran-
tia inculpabilis nec bona fides qui- Igreja, nenhum efeito produzem. E isto, nem a ig-
dquam supplere possunt: tota enim norância inculpável nem a boa-fé podem suprir:
benedictionum ecclesiasticarum vis,
“pois toda a força das bênçãos eclesiásticas”, como
ait Gardellini, posita est in oratione et
invocatione ecclesiæ, quæ fit per suos diz Gardellini, “reside na oração e invocação da

31
S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

Igreja, que se dá por seus ministros, os quais não ministros, qui non aliis uti verbis aut
formulis debent, quam iis, quæ ab ec-
devem usar outras palavras ou fórmulas senão as clesia sunt constituta. Et can. 1148 § 2
23
que foram estabelecidas pela Igreja”. E o [Código hæc habet: Consecrationes et bene-
de Direito Canônico de 1917, no] cânon 1148, § dictiones sive constitutivæ sive invo-
cativæ invalidæ sunt, si adhibita non
2º, afirma o seguinte: “As consagrações e bênçãos, fuerit formula ab ecclesia præscripta.
constitutivas ou invocativas, são inválidas se não
24
for utilizada a fórmula prescrita pela Igreja”.

23. Aloisii Gardellini, Decreta Authentica Congrega-


tionis Sacrorum Rituum. Romæ: Typis S. C. de Prop.
Fide, 1857, p. 178.
24. O novo Código de Direito Canônico limita-se a
ordenar o seguinte, sem entrar no mérito da validade
ou não das bênçãos e consagrações: “Na realização
ou administração dos sacramentais observem-se
cuidadosamente as fórmulas aprovadas pela autori-
dade da Igreja” (Cân. 1167, § 2).

32
Articulus III Artigo III
DE EXORCISMIS SOBRE OS
EXORCISMOS

[53]. Notio et divisio. Nomine exor- [53]. Noção e divisão. O termo exorcismo 10
cismi significatur: cohibitio impera-
tiva dæmonis (sæpe coniuncta cum significa: coibição imperativa do demônio
adiuratione). (frequentemente acompanhada de adju-
ração). 25

Est ergo non mera oratio vel impe- Portanto, não é uma simples oração, ou mera im-
tratio gratiarum, quibus vis dæmonis
frangi possit, etsi talis impetratio no-
petração de graças com as quais se possa reprimir
mine ecclesiæ fiat (potestas indirecta o poder demoníaco, ainda que tal impetração seja
in dæmones); sed est verum impe- feita em nome da Igreja (poder indireto sobre os
rium, quod utique solius Dei nomine
fieri potest (potestas directa); inde
demônios). Ao contrário, é de fato uma ordem,
patet hanc potestatem solum a mi- que certamente só pode ser feita em nome de Deus
nistris per ecclesiam ordinatis fieri (poder direto); logo, é evidente que este poder com-
posse.
pete apenas aos ministros ordenados pela Igreja.

Exorcismus qui nomine et auctori- Chama-se exorcismo público, aquele feito


tate ecclesiæ a ministris deputatis
fit, quique est sacramentale, vocatur por ministros deputados, em nome e com a
publicus; secus dicitur privatus. autoridade da Igreja, e que é um sacramen-
tal. Do contrário, chama-se privado.

25. Em teologia, “adjuração” (do latim adiuratio, “ju-


ramento”) é o termo técnico que designa a invocação
de uma coisa sagrada, pela qual a pessoa adjurada,
por império ou súplica, é induzida a fazer ou omitir
alguma coisa. Os dicionários comuns de língua por-
tuguesa trazem a palavra simplesmente como sinô-
nimo de “exorcismo”.

33
S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

O exorcismo público divide-se em solene, Publicus exorcismus est aut sollem-


nis, qui fit ad expellendos dæmones
que é feito para expulsar os demônios de ex obsessis; aut simplex, qui solum
pessoas possuídas; e simples, que é usado fit ad virtutem dæmonis compescen-
dam, ne personis vel rebus noceat,
apenas para reprimir o poder do demônio, v.g., exorcismi in benedictione salis
et aquæ, vel in ritu baptismatis.
para que não cause dano a pessoas ou coi-
sas, v.g.: os exorcismos feitos na bênção do
sal e da água, ou no rito do Batismo.
O exorcismo é dirigido propriamente ao demônio, Exorcismus proprie dirigitur in
dæmonem, qui imperative adiuratur,
que é adjurado imperativamente para que saia do ut a corporibus obsessis recedat; sed
corpo do possesso. Contudo, às vezes é dirigido quandoque dirigitur etiam in perso-
também a pessoas ou coisas, v.g.: animais nocivos, nas vel in res ut in animalia nociva,
in aquam, in sal, ne ipsæ vel earum
água, sal, para que elas mesmas ou o seu uso não usus hominibus noceant. Cum enim
causem dano aos homens. Pois, como todas as omnes creaturæ etiam irrationales
criaturas, mesmo as irracionais, estão sujeitas à maledicto peccati ideoque dæmonis
potestati subsint, ecclesia simplici
maldição do pecado e, consequentemente, ao po- exorcismo dæmonem passim repellit
der do demônio, a Igreja frequentemente afasta o eiusque influxum prohibet.
demônio com o exorcismo simples e impede sua
influência.

11 [54]. Conclusões. — 1) O exorcismo so- [54]. Asserta. 1) Exorcismus sollem-


nis a solis ecclesiæ sacerdotibus fieri
lene só pode ser feito pelos sacerdotes da potest, atque id supposita expressa
Igreja, e com expressa licença do Ordiná- Ordinarii licentia: peragitur enim
nomine ecclesiæ; ecclesia autem
rio; pois é feito em nome da Igreja, e a Igre- prohibet, ne ullus sacerdos sive
sæcularis sive regularis id faciat sine
ja proíbe que qualquer sacerdote, secular licentia.
ou religioso, faça isto sem licença.
Os clérigos recebem o poder de exorcizar com a Potestatem exorcizandi accipiunt cle-
rici per ordinem exorcistatus; sed eo-
ordenação ao exorcistado. Contudo, seu poder é
rum potestas impedita est, quia iuxta
impedido, porque, segundo a disciplina atual da præsentem ecclesiæ disciplinam ea
Igreja, não podem utilizá-lo. Com efeito, não é lí- uti non possunt: etenim exorcismus
sollemnem peragere non licet absque
cito fazer o exorcismo solene sem especial licença;
speciali licentia; hæc licentia autem,
mas, para evitar abusos, esta licença só é concedi- ad præcavendus abusus, non conce-
da aos sacerdotes. ditur nisi sacerdotibus.

A lei universal que exige a licença do bispo é esta: Lex universalis, quæ licentiam epi-
scopi exigit, hæc est: Exorcismos in
“Ninguém pode legitimamente proferir exorcis-
obsessos nemo proferre legitime po-
mos sobre possessos se não tiver recebido licença test, nisi ab Ordinario peculiarem et

34
A rt i g o III : S o b r e o s exo rc i s m o s

expressam licentiam obtinuerit. Quæ peculiar e expressa do Ordinário. Esta licença só


concedenda non est, nisi sacerdoti
pietate, prudentia ac vitæ integritate
deve ser concedida a um sacerdote dotado de pie-
26
prædito (can. 1151). dade, prudência e integridade de vida”.

Formula exorcismi sollemnis conti- A fórmula do exorcismo solene está no Ritual


netur in Rituali Romano (tit. XI, c. Romano (título XI, capítulo 2), onde também
2), ubi etiam habentur præcepta in
usu exorcismi sollemnis servanda.
se encontram as regras a serem observadas no
Cavetur ibi (c. 1, n. 14), ne exorcista uso do exorcismo solene. O § 14 (c. 1) adverte o
curiosos et inutiles sermones cum exorcista a não trocar conversas curiosas e inú-
dæmone obsidente misceat; unam 27

tamen alteramve inutilem interro-


teis com o demônio obsidente; contudo, fazer
gationem facere veniale non excedit. uma ou duas vezes uma pergunta inútil, não pas-
sa de pecado venial.

2) Exorcismus sollemnis adhibendus 2) O exorcismo solene só deve ser usado


non est, nisi de facto obsessionis certo
constet (can. 1151). se houver certeza da possessão. 28

26. CDC 1917, Cân. 1151. O atual Código de Direito


Canônico prescreve praticamente o mesmo, no Cân.
1172, §§ 1-2: “Ninguém pode legitimamente exor-
cizar os possessos, a não ser com licença especial e
expressa do Ordinário do lugar”; “Esta licença so-
mente seja concedida pelo Ordinário do lugar a um
presbítero dotado de piedade, ciência, prudência e
integridade de vida”.
27. Os adjetivos “obsidente” e “obsessor” vêm do
verbo latino obsideo, obsidere, cujo sentido próprio é
“estar sentado ou instalado diante, ocupar um lugar”.
Na linguagem militar, o termo significa “acampar
diante de uma praça forte para sitiar”, ou o próprio
ato de “sitiar, bloquear”. Daí lhe advêm, por extensão,
os significados de “investir, atacar, invadir”, ou ainda,
em sentido figurado, “apoderar-se de, dominar” (cf.
Ernesto Faria, Dicionário Latino-Português. 2. ed.
Belo Horizonte: Garnier, 2020, p. 663).
28. CDC 1917, Cân. 1151. Esta advertência não
consta no atual Código de Direito Canônico, mas
o Catecismo da Igreja Católica a registra em seu §
1673: “O exorcismo visa expulsar os demônios ou
livrar da influência demoníaca, e isto pela autori-
dade espiritual que Jesus confiou à sua Igreja. Bem
diferente é o caso de doenças, sobretudo psíquicas,

35
S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

Considerando os testemunhos do Evangelho, Etsi factum obsessionis dæmoniacæ


propter evangeliorum testimonia
não é possível negar o fato da possessão demo- citra peccatum hæresis negari non
níaca sem cometer heresia. No entanto, é forçoso possit, id tamen concedi debet,
admitir que as possessões são muito mais raras obsessiones nunc temporis multo
rariores esse; immo complura phæn-
em nosso tempo. Ademais, muitos fenômenos omena, quæ antiquitus pro signis
que antigamente eram considerados sinais de obsessionis habebantur, non dæm-
possessão, devem ser atribuídos não ao demô- oni, sed morbis naturalibus tribuen-
da esse. Quare in diiudicandis factis
nio, mas a doenças naturais. Por isso, é preciso obsessionis magna cautela et discre-
ter muita cautela e discernimento para avaliar os tione opus est.
casos de possessão.

O Ritual Romano apresenta os seguintes sinais de Rituale Romanum (c. 1, n. 3) hæc


possessão: “dizer muitas palavras de língua des- signa obsessionis recenset: “ignota
lingua loqui pluribus verbis vel lo-
conhecida, ou entender quem assim fala; revelar quentem intelligere; distantia et oc-
coisas distantes e ocultas; manifestar forças acima culta patefacere; vires supra ætatis seu
de sua idade ou condição natural, e outras deste condicionis naturam ostendere, et id
genus alia”. Hæc tamen et eiusmodi
gênero” (cap. 1, § 3). Todavia, estes fatos e outros non sunt signa certa obsessionis, sed
semelhantes, não são sinais certos de possessão; monente ipso Rituali, quædam indicia,
mas, como adverte o mesmo Ritual, são certos quæ eo maiora sunt quo plura simul
occurrunt: sunt enim morbi naturales,
indícios, mais convincentes quando aparecem em præsertim hysteria et dæmonomania,
maior quantidade e simultaneamente. Com efeito, in quibus eiusmodi phænomena cer-
há muitas doenças naturais, especialmente a his- nuntur (Cf. Offers, Pastoralmedizin
29 S. 128 ff. Heyne, Über Besessenheit-
teria e a demonomania, nas quais aparecem es- swahn [Paderborn. Schöningh, 1904]).
tes fenômenos. Na dúvida, convém consultar um In dubio de facto obsessionis, expedit
médico experiente e bom católico, que não negue consulere medicum peritum et probe
catholicum, qui non a priori ipsum
a possibilidade da possessão. factum obsessionis reiiciat.

Ainda que a probabilidade da possessão seja em Etsi ad exorcismum licite peragen-


dum probabilitas obsessionis per se
si suficiente para realizar licitamente o exorcismo,
sufficiat, nunc tamen solum exsisten-
atualmente ele só deve ser usado se houver cer- te morali certitudine adhibendus est.
teza moral. Isto é necessário seja pelo escândalo, Id exigit “tum scandalum, quod ho-
die facilius enasci solet ob impiorum
que hoje costuma surgir mais facilmente, com as
irrisiones, tum ipsius exorcizandi

cujo tratamento depende da ciência médica. É im-


portante, pois, verificar antes de celebrar o exorcis-
mo se se trata de uma presença do maligno ou de
uma doença”.
29. “Demonomania”, diz-nos o antigo Caldas Aulete,
é a “variedade de alienação mental na qual o doente
se julga possesso do demônio”.

36
A rt i g o III : S o b r e o s exo rc i s m o s

salus, cui exorcizatio præsertim cre- zombarias dos ímpios; seja pela saúde do próprio
brior plurimum nocere poterit, si re-
apse morbo tantum naturali laborat”
exorcizando, ao qual a exorcização, sobretudo se
(Génicot I n. 300, 3). Id exigit etiam reiterada, pode causar muito dano se ele na ver-
canon citatus. dade sofre apenas de uma doença natural. Isto
também é exigido pelo cânon citado.

3) Exorcismus simplex peragi potest 3) O exorcismo simples pode ser feito por
ab omnibus potestatem ad id haben-
tibus, i.e., a sacerdotibus; exorcismos todos os que possuem poder para tanto,
autem qui occurrunt in baptismo et i.e., pelos sacerdotes. Os exorcismos que
in consecrationibus vel benedictio-
nibus peragere possunt qui eorun- ocorrem no Batismo e nas consagrações
dem sacrorum rituum legitimi mini-
tri sunt (can. 1153).
ou bênçãos, podem ser feitos pelos que são
legítimos ministros destes sagrados ritos. 30

Ergo diaconus legitime baptizans Portanto, um diácono que batize legitimamente,


potest exorcismos in ritu contentos pode fazer os exorcismos contidos no rito; mas
peragere; non autem exorcismos
contentos in benedictione salis, quia não os exorcismos contidos na bênção do sal, por-
sal benedicere diacono non licet. que ao diácono não é lícito abençoar o sal.

4) Exorcismus privatus, quia vero 4) O exorcismo privado, como não é um


non est sacramentale, peragi potest
ab omnibus fidelibus: etenim ad
sacramental, pode ser feito por todos os
tentationes aut vexationes dæmonis fiéis. Afinal, para repelir as tentações ou ve-
avertendas quilibet per Deum aut
per Iesum Christum dæmoni impe- xações do demônio, qualquer fiel pode, por
rare potest, ne sibi vel aliis noceat. Deus ou por Jesus Cristo, ordenar ao demô-
nio a não lhe causar dano a si ou aos outros.
Effectus huius exorcismi non deriva- O efeito deste exorcismo não provém da autorida-
tur ab auctoritate et precibus eccle-
siæ, cum non fiat nomine ecclesiæ,
de e das orações da Igreja (porque não é feito em
sed ex virtute nominis Dei et Iesu nome da Igreja), mas do poder do nome de Deus
Christi. “Dæmones enim”, ait Pesch e de Jesus Cristo. “Porque os demônios”, como diz
(Prælectiones Dogmaticæ, t. 6, Apen-
dix, prop. XXXIV), “naturaliter hor-
Christiano Pesch, “naturalmente odeiam os mis-
rent mysteria fidei, quibus se victos térios da fé, pois sabem que foram derrotados por
esse sciunt; ideo viso signo crucis et eles; por isso, perante o sinal da Cruz ou o nome de
audito nomine Iesu aliisque simili-
bus, torquentur et fugiunt”.
Jesus e coisas similares, são atormentados e fogem”.

Nota 1. Usus sacramentalium nullibi Nota 1. Ninguém é obrigado a usar os sacramen-


quidem præcipitur, enixe tamen hor- tais. Todavia, os fiéis devem ser assiduamente exor-
tandi sunt fideles, ut ea frequenter
ac devote usurpent ad multiplices tados a utilizarem-nos com frequência e devoção, a

30. CDC 1917, Cân. 1153.

37
S AC RA M EN TA I S E EXO RC I S M O S

fim de receberem seus múltiplos efeitos. Portanto, eorum effectus percipiendos. Ideo
animarum pastores sacramentalium
que os pastores de almas ensinem aos fiéis a natu- naturam fidelibus exponant et recto
reza dos sacramentais, orientando-lhes quanto ao eorum usu eos apte instruant, ut ii,
seu uso correto, para que os que se julgam sábios qui sapientiores sibi videntur, ea non
contemnant, rudiores vero non su-
não desprezem os sacramentais, e os mais rudes perstitioso modo iis utantur.
não os utilizem de modo supersticioso.

Nota 2. Lembrem-se os sacerdotes que a própria Nota 2. Sacerdotes meminerint


bênção sacerdotal é um sacramental, cujo uso ipsam benedictionem sacerdotalem
esse sacramentale, quod privatim
é permitido em qualquer lugar, especialmente nota formula: Benedictio Dei om-
com as fórmulas conhecidas: “Que a bênção de nipotentis etc., vel: Benedicat te etc.,
Deus todo-poderoso etc.”, ou: “Abençoe-te etc”. passim adhibere licet. Potestas bene-
dicendi in ipsa ordinatione una cum
Na própria ordenação, a Igreja confere o poder potestate consecrandi ab ecclesia sa-
de abençoar e o poder de consagrar aos sacerdo- cerdotibus confertur, qui usu huius
tes, os quais, usando este poder, podem afastar potestatis multa mala ingruentia
ab hominibus avertere et uberem
dos homens muitos males e derramar sobre eles benedictionem in ipsos diffundere
uma bênção copiosa; principalmente sobre as possunt, præsertim vero in infantes
crianças e os enfermos, aos quais o divino Salva- atque infirmos, quibus divinus Salva-
tor sæpe ex corde benedixit. Effectus
dor muitas vezes abençoou de coração. O efeito benedictionis sacerdotalis eo copio-
da bênção sacerdotal será tanto mais abundante, sior erit, quo firmior est fides et fidu-
quanto mais firme for a fé e a confiança do sacer- cia sacerdotis benedicentis.

dote que abençoa.

Nota 3. Aos ministros da Igreja, é muito aconse- Nota 3. Valde suadendum est eccle-
lhável que façam com muita frequência o exor- siæ ministris, ut exorcismum simpli-
cem sæpius peragant memores verbi
cismo simples, recordando a palavra do Senhor: Domini: In nomine meo dæmonia
“Expulsarão os demônios em meu nome”. Mas de eiicient; præsertim vero super eos,
modo especial sobre: i) os que estão atormentados qui vehementi tentatione vexantur,
et super pænitentes, quos advertunt
por uma tentação veemente, ii) e sobre os peni- difficultates experiri in eliciendo do-
tentes que manifestam dificuldade em fazer o ato lore et proposito de peccatis, vel in
de contrição e o propósito de não pecar, ou em de- peccatis suis sincere manifestandis.
Uti possunt hac vel simili formula:
clarar sinceramente seus pecados. Podem utilizar In nomine Iesu præcipio tibi, spiritus
esta ou outra fórmula semelhante: “Em nome de immunde, ut recedas ab hac creatura
Jesus, eu te ordeno, espírito imundo, que te afastes Dei. Similiter commendandus est
exorcismus iussu Leonis XIII editus,
desta criatura de Deus”. É também recomendável cuius formula exstat in Rituali (tit.
o exorcismo publicado por ordem de Leão XIII, XI, c. 3).
cuja fórmula encontra-se no Ritual (tit. XI, c. 3).
31

31. Este exorcismo só pode ser recitado pelos bispos e


por sacerdotes que receberam autorização do bispo.

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A rt i g o III : S o b r e o s exo rc i s m o s

Tal restrição já constava no Ritual de 1952, que trazia


a seguinte rubrica antes do rito: Sequens exorcismus
recitari potest ab Episcopis, necnon a Sacerdotibus qui
ab Ordinariis suis ad id auctoritatem habeant — “O
seguinte exorcismo pode ser recitado pelos bispos, e
pelos sacerdotes que receberam autorização de seus
Ordinários”. Ademais, segundo a Associação Inter-
nacional de Exorcistas, o ritual reformado continua
restringindo a utilização desta fórmula (Cf. Diretri-
zes para o Ministério do Exorcismo à luz do ritual
vigente. Brasília: Edições CNBB, 2022, pp. 128-129).

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