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Apresentação
Repertórios políticos nas lutas laborais transnacionais e novas
Elísio Estanque**
https://orcid.org/0000-0001-6992-3397
Esta base nacional tem sido fortemente desafiada pela globalização e pelo neoliberalismo.
Estados pós-fordistas (Jessop, 2013), processo de acumulação flexível (Harvey, 1989),
precarização (Standing, 2001), cadeias globais de valor (Gereffi & Korzeniewicz, 1990) e novos
regimes fabris (Nichols et al., 2004) todos lançaram mudanças importantes no domínio político
e organizacional onde o trabalho foi usado para agir e lutar. Uma nova configuração global da
produção e da procura nas economias nacionais e entre países lançou os trabalhadores e os
seus representantes numa turbulência de insegurança e desestruturação. No entanto, também
surgiram respostas globais, algumas delas ligadas ao antigo e estabelecido quadro do
sindicalismo internacional (Fairbrother & Hamer, 2005; Hyman, 2005), algumas associadas a
uma forma de activismo mais orientada horizontalmente, próxima do estilo de luta dos
movimentos sociais. ação ou constituição de diferentes tipos de coalizões possíveis (Waterman,
2001; Webster et al., 2007; Costa & Estanque, 2019).
As principais questões tratadas pela literatura acadêmica sobre este tema não são
conclusivas. A governação das cadeias de valor globais (Gereffi, Humphrey & Sturgeon, 2005)
– que inclui forçosamente o papel do trabalho – e as redes sindicais globais (McCallum, 2013)
são peças do debate relacionado com a forma como o processo de globalização pode ser regulado e
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2004; Nichols et al., 2004). Entram num debate contínuo que precisa de ser constantemente
alimentado por novas descobertas baseadas na investigação e na reflexão.
A temática deste número não gira apenas em torno de todos esses temas, mas vai além.
Mostram caminhos empíricos para se desenvolver sob as questões estabelecidas e temas já
bem circunscritos. Novas perspectivas e ângulos de ataque são experimentados.
Isto é auspicioso em todos os sentidos, independentemente da posição dentro da divisão
internacional do trabalho. No entanto, os países do Sul Global colocam desafios específicos a
uma suposta agenda comum na sociologia do trabalho. Primeiro nos lembram o problema
relacionado às diferentes temporalidades: o desenvolvimento é desigual, desigual e tem lógicas
diferentes dependendo dos fundamentos históricos dos territórios que afeta. Em segundo lugar,
o desenvolvimento não é neutro; implica uma avaliação crítica de noções como crescimento e
rendimento: nem todo o crescimento conduz ao progresso em termos de padrões sociais, assim
como nem todo o rendimento conduz a necessidades humanas e satisfatórias a serem
satisfeitas – danos ambientais e exploração laboral (por exemplo, informalidade ),
respectivamente, nos lembram que o desenvolvimento por si só não é suficiente para traçar cenários emancipatórios p
Os países latino-americanos tiveram uma rica história intelectual associada a ideias
desenvolvimentistas, com ideias originais levadas a sério pelas principais ciências sociais,
particularmente nas décadas de sessenta e setenta do século passado. Essas ideias e
percepções continuam a ser uma fonte de inquietação e desafio, uma vez que muitos dos
estrangulamentos então descobertos pelos investigadores e pensadores ainda prevalecem hoje
nessas sociedades – a pobreza e o papel da burguesia perante as classes dominantes do
centro ou o imperialismo são apenas dois deles. . Em terceiro lugar, as temporalidades desiguais
podem implicar uma abordagem dialética do antigo e do novo: muitos aspectos da “velha”
ordem industrial (digamos, a regulação fordista, incluindo uma sociedade assalariada como
norma) podem parecer atualmente de alguma forma plausíveis, enquanto a “nova” o apelo à
soberania multilateral pode soar como a incapacidade do Estado de governar as questões
nacionais. O quadro da legislação trabalhista é um bom ponto de observação: o ritmo de
mudança da influência corporativista para uma atmosfera mais pluralista é enganoso dependendo
de quando a leitura dos acontecimentos é feita – para o movimento trabalhista brasileiro, por
exemplo, a remoção completa da antiga Consolidação das Leis do Trabalho (1943) tem hoje
um significado completamente novo do que durante os tempos icônicos do “novo sindicalismo”
quando Lula chegou pela primeira vez à frente. Como resultado, o “movimento social sindical”
associado à Central Única dos Trabalhadores perdeu muito do seu fascínio pelos dias heróicos
de luta contra a ditadura. Outro ponto de observação que amplifica as temporalidades desiguais
é quando a cultura “contratualista” dentro do capital e do trabalho é transportada para o campo da luta de classes lícita
Erroneamente entendido como semelhante ao padrão “anglo-saxónico” das relações laborais,
quando perspectivas anti-sindicais e individualistas eram invocadas para marginalizar iniciativas
colectivas, o vocabulário contratualista era antes um repertório político imaginativo.
toire usado pelos sindicalistas brasileiros para chamar a atenção para a falta de democracia tanto
na base (o chão de fábrica) quanto no topo (a arena de concertação) das relações industriais
transmitido pelos líderes cortados como uma traição aos primeiros tempos socialistas. Os contratos
nacionais junto às indústrias e setores permanecem hoje no Brasil uma peça fundamental de toda
bandeira patrocinada pelo primeiro fala eloquentemente sobre a escolha (certa) feita pelos trabalhadores.
Em quarto lugar, a globalização tem uma história e a sempre invocada noção polanyiana de um
pêndulo entre as forças de mercado, por um lado, e as forças protecionistas, por outro lado, pode
estar agora a mover-se em direção ao segundo pólo. Além da tendência mais ampla, porém, a
direcção da mudança nunca pode esconder o ritmo da mudança: o momento em que as políticas
públicas e as instituições estatais são transformadas em apoio neoliberal também conta. Mais uma
vez, a impressionante resiliência demonstrada pelo Direito do Trabalho ao longo de mais de sete
décadas é um marco do peso das forças sociais que actuam através de diferentes impulsos políticos
e ideológicos.
Ligar a base histórica às linhas globais é o caminho que consideramos mais frutífero. De especial
interesse é a questão dos modelos de representação dos sindicatos locais, dos comités laborais e
das estruturas globais do sindicalismo internacional. Outro tema fascinante é a relação entre a
estrutura existente do sindicalismo e os movimentos sociais locais (Anner, 2011) – por vezes ligados
a questões verdadeiramente globais (protocolos ambientais, comércio justo, etc.) – e como eles
Pontos de intersecção com a análise tradicional do processo de trabalho (Moody, 1997; Durand,
2007), por exemplo, como se dá a busca pelo controle dos trabalhadores diante do novo cenário
gestão entre sede e filiais em todo o mundo, são especialmente desafiadoras, embora ainda exijam
muito engajamento e interesse entre os especialistas – a produção intelectual nos dias de hoje está
longe de arcar com os ricos acadêmicos anteriores sobre conflito e consentimento, autonomia e
controle, ao mesmo tempo ponto de produção. Talvez seja hora de se aventurar por esse tipo de
caminho.
trabalhadores na era da globalização tem sido motivo de controvérsia no campo dos estudos
laborais, tanto no Norte como no Sul. O internacionalismo trabalhista interpela problemas laterais e
interligados, tais como até onde o processo de modernização poderia levar e até que ponto ele deve
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A política global de classe vem para a frente. Como células orgânicas da sociedade, as forças
de trabalho estão fortemente interligadas a todas as escolhas políticas feitas pelas classes
dominantes ou pelas elites globais. As escolhas que os sindicalismos nacionais fazem
reflectem a economia política predominante em jogo nas economias nacionais: por outras
palavras, qual é o lugar reservado a estes últimos na actual divisão internacional do trabalho?
A resposta a esta questão, embora geral e de alguma forma abstracta, ajuda a compreender
as complexidades envolvidas quando as conclusões empíricas sobre as respostas sindicais
à globalização emergem da investigação. Este não é nada conclusivo. Lança mais dúvidas e
perguntas do que oferece respostas definitivas. Nas linhas abaixo este Dossiê oferece um
mapeamento contemporâneo e informado sobre como está o estado da arte do tema globalização e trabalho.
Solidariedades regionais e redes sindicais, planeamento económico global, globalizações
de transição justa, formas de organização transnacional, trabalho informal, Norte e Sul,
trabalhadores de plataformas, processos de comunicação digital são alguns dos temas
debatidos neste Dossiê, todos finamente comentados por Ronaldo Munck como contribuição
final de equilíbrio, perspectivas e ação.
Gostaríamos de agradecer ao Editor, Alexandre Massella, pelo efetivo apoio e ajuda
incansável em todas as etapas do processo de confecção deste volume. Sua visão
abrangente foi essencial.
Referências
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Abstrato
Repertórios políticos nas lutas laborais transnacionais e novas formas de governação laboral global
Apesar de as preocupações com os salários e o aumento da qualidade de vida da classe trabalhadora terem
adquirido uma centralidade histórica nos repertórios de luta desenhados a nível nacional, a ambição da
tem sempre foi um fim em você mesmo. À luz dos tempos atuais, é uma ambição que pode ser testemunhada
adequadas e organizadas, partilha de experiências, contributos para novas formas de governação global,
mais justas e dignas. E também novos resultados de aprendizagem para os protagonistas clássicos do mundo
contextos nacionais e filiações disciplinares, este dossiê cumpre este propósito de debate crítico, apoiado em
experiências concretas. Aqui o leitor pode encontrar contribuições sobre solidariedade regional e redes
sindicais, processos de regulação política, planeamento económico global, transição climática, formas de
organização transnacional do trabalho, trabalho informal, relações Norte e Sul, trabalho na economia de
Palavras-chave: Lutas trabalhistas transnacionais; Mundo de trabalho; Governação laboral global; Regulação
sociolaboral.
Resumo
trabalhista global
terem adquirido uma centralidade histórica nos reportórios de luta desenhados em escala nacional, a ambição
de solidariedade internacionalista e de emancipação das formas À luz dos de organização coletiva dos
trabalhadores constituiu sempre um fim em si mesmo. tempos atuais, trata-se de uma ambição
que pode ser testemunhada no modo como as tendências de globalização e neoliberalismo contemporâneo
reclamam respostas adequadas e organizadas, de partilha de experiências, de contributos para novas formas
de governança global, mais justas e dignificantes. E igualmente de novas aprendizagens para os protagonistas
trabalho, provenientes de distintos contextos nacionais e filiações disciplinares, este dossiê cumpre esse
propósito de debate crítico, apoiado em experiências concretas. Aqui se encontram contributos sobre
global, transição climática, formas de organização laboral transnacional, trabalho informal, relações Norte e
Regulação sociolaboral.
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Leonardo Mello e Silva is professor of sociology at the University of São Paulo. E-mail:
leogmsilva@hotmail.com.
Elísio Estanque é professor associado da Faculdade de Economia e investigador sénior do Centro
de Ciências Sociais (ces) da Universidade de Coimbra. Suas principais áreas de interesse são: