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Aula 12 – 4 de Setembro de 2023

Prof. Antonio Caminha M. Neto

Transformações lineares
A utilidade de Álgebra Linear aparece ao estudarmos as funções (chamadas
aqui de transformações) entre espaços vetoriais que preservam as operações
dos mesmos. Começamos, portanto, definindo tais objetos.
Definição 1. Sejam V e W espaços vetoriais sobre K. Uma transformação
linear de V em W é uma aplicação f : V → W compatı́vel com as operações
de V e W , no seguinte sentido:
(a) T (u + v) = T (u) + T (v), ∀ u, v ∈ V .
(b) T (αu) = αT (u), ∀ α ∈ K, ∀u ∈ V .
De acordo com a definição acima, note que só faz sentido considerarmos
uma transformação entre espaços vetoriais sobre um mesmo corpo. Assim,
por exemplo, em um certo contexto podemos considerar transformações li-
neares T : Rn → Cn , contanto que consideremos Cn como espaço vetorial
real.
Se V e W forem espaços vetoriais sobre K e T : V → W for uma trans-
formação linear, veja que
T (0) = T (2 · 0) = 2T (0) ⇒ T (0) = 0
e
T (u − v) = T (u + (−1)v)) = T (u) + (−1)T (v) = T (u) − T (v).
Mais geralmente, dados k ∈ N, α1 , . . . , αk ∈ K e u1 , . . . , uk ∈ V , repetidas
aplicações dos itens (a) e (b) da definição fornecem
k
X  Xk
T αi ui = αi T (ui ). (1)
i=1 i=1
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No que segue, reunimos alguns exemplos de transformações lineares. Mui-


tos outros serão vistos ao longo destas notas.
Exemplo 2. São exemplos de transformações lineares:
(a) A transformação nula 0 : V → W , tal que 0(u) = 0, para todo u ∈ V .
(b) A transformação identidade de V , isto é, a aplicação IdV : V → V ,
tal que IdV (u) = u, para todo u ∈ V .
(c) A homotetia de razão α ∈ K em V , isto é, a aplicação Hα : V → V
tal que Hα (u) = αu, para todo u ∈ V .
(d) A inclusão ι : W → V , de um subespaço W de V em V , dada por
ι(u) = u, para todo u ∈ W .
Exemplo 3. Dada A ∈ M (m×n; K), definimos TA : K n → K m por TA (u) =
Au, o produto da matriz A por u ∈ K n , visto como matriz n × 1. (Observe
que Au é uma matriz m × 1, que identificamos como um elemento de K m ,
da mesma maneira que identificamos u ∈ K n com uma matriz n × 1.)
A aplicação TA é uma transformação linear, denominada a transforma-
ção linear induzida pela matriz A. De fato, dados u, v ∈ K n , como a
matriz n × 1 correspondente a u + v é a soma das matrizes n × 1 correspon-
dentes a u e a v, temos
TA (u + v) = A(u + v) = Au + Av = TA (u) + TA (v).
Analogamente, para α ∈ K, temos
TA (αu) = A(αu) = αAu = αTA (u).
Sempre que considerarmos uma transformação linear T : V → V , de um
espaço vetorial em si mesmo, diremos que T é um operador linear em
V . Assim, em relação ao exemplo 2, as transformações lineares dos itens
(b) e (c) são operadores lineares; da mesma forma, nas notações do exemplo
anterior,se m = n, então TA é um operador linear em K n .
Um corpo K pode ser visto como espaço vetorial sobre si mesmo; a soma
de vetores sendo a soma em K e a multiplicação de vetores por escalares
sendo a multiplicação de K. Portanto, se V for um espaço vetorial sobre K,
podemos considerar transformações lineares de V em K, as quais são deno-
minadas funcionais lineares, sendo em geral denotadas por letras latinas
minúsculas, como f : V → K.
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Exemplo 4. Fixado v ∈ Rn , se f : Rn → R é a função dada por f (u) = u·v,


então f é um funcional linear. De fato, para α ∈ R e u, u1 , u2 ∈ Rn , as
propriedades do produto escalar de Rn fornecem

f (αu) = (αu) · v = α(u · v) = αf (u)

e
f (u1 + u2 ) = (u1 + u2 ) · v = u1 · v + u2 · v = f (u1 ) + f (u2 ).

Exemplo 5. Sejam V um espaço euclidiano (real ou complexo) e W um


subespaço de V de dimensão finita. A aplicação

πW : V −→ W
u 7−→ ProjW (u)

é uma transformação linear, denominada a projeção ortogonal de V em


W.

Prova. Sendo u ∈ V e {e1 , . . . , en } uma base ortonormal para W , vimos no


teorema da melhor aproximação que
n
X
πW (u) = hu, ei iei .
i=1

Portanto, para u1 , u2 ∈ V e α ∈ K, temos


n
X n
X 
πW (u1 + u2 ) = hu1 + u2 , ei iei = hu1 , ei i + hu2 , ei i ei
i=1 i=1
n
X n
X
= hu1 , ei iei + hu2 , ei iei
i=1 i=1
= πW (u1 ) + πW (u2 )

e
n
X n
X n
X
πW (αu) = hαu, ei iei = αhu, ei iei = α hu, ei iei = απW (u).
i=1 i=1 i=1
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Exemplo 6. Para k ≥ 0, o conjunto C k ([a, b]), das funções f : [a, b] → R de


classe C k , é um subespaço vetorial de F([a, b]; R). Para k ≥ 1, a aplicação
que a cada f ∈ C k ([a, b]) faz corresponder sua derivada f 0 pode ser vista como
uma transformação linear D : C k ([a, b]) → C k−1 ([a, b]). Realmente, para
f ∈ C k ([a, b]) temos f ∈ C k−1 ([a, b]); por outro lado, para f, g ∈ C k ([a, b]) e
α ∈ R, as regras de derivação de funções dão

D(αf ) = (αf )0 = αf 0 = αD(f )

e
D(f + g) = (f + g)0 = f 0 + g 0 = D(f ) + D(g).

Exemplo 7. Podemos ver a operação de integração indefinida em C 0 ([a, b])


Rcomo uma transformação linear I : C 0 ([a, b]) → C 1 ([a, b]), tal que I(f )(x) =
x
a
f (t)dt, para toda f ∈ C 0 ([a, b]) e todo x ∈ [a, b]. De fato, note primeira-
mente que, pelo Teorema Fundamental do Cálculo, a função
Z x
x ∈ [a, b] 7→ f (t)dt
a

é realmente de classe C 1 , de sorte que I é uma função bem definida. Por


outro lado, para f, g ∈ C 0 [a, b] e x ∈ [a, b], temos
Z x Z x Z x
I(f + g)(x) = (f + g)(t)dt = f (t)dt + g(t)dt
a a a

= I(f )(x) + I(g)(x) = I(f ) + I(g) (x),

logo, I(f + g) = I(f ) + I(g). Por fim, provamos analogamente que I(αf ) =
αI(f ), para todos α ∈ R, f ∈ C 0 ([a, b]).

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