Você está na página 1de 4

A abóbada celeste...

Recostado em uma rede, olhava firmemente para o céu admirando em êxtase


a sua imensidão e toda a sua incomparável beleza. A tarde ia-se aos poucos e já
começavam a aparecer alguns sinais do anoitecer. Uma nuvem bastante nítida dava-
me a impressão de formar a figura conjunta de um compasso sobreposto a um
esquadro.
As estrelas, como artistas de um espetáculo teatral, ainda permaneciam
silenciosamente em seus camarins, aguardando o momento certo de entrarem em
cena e aos poucos, iam surgindo no firmamento, uma a uma, salpicando o céu de
detalhes de beleza indescritível. Estavam distribuídas e confortavelmente acomodadas
em todas as partes daquele imenso cenário azul celeste.
Olhando fixamente para aquela cena não muitas vezes reparadas por todos
nós, lembrei-me da letra G que sempre vem dentro do espaço a ela reservado no
conjunto composto pelo compasso e pelo esquadro, representando o Grande
Geômetra ou se preferirem, o Grande Arquiteto do Universo. No meio das nuvens ela
se desenhava quase que imperceptivelmente, mas para mim, nitidamente.
Analisando embevecido tudo ao mesmo tempo, comecei a meditar sobre
aquela cena que se desenhava lá longe, bem à minha frente e aos poucos, fui
concluindo que tudo aquilo estava relacionado com a nossa tão querida e respeitada
maçonaria. O céu representando o teto de uma Loja Maçônica, a nuvem sugerindo os
dois símbolos de maior expressão da Ordem e as estrelas, representando o incontável
número de irmãos espalhados por todo o Universo.
Emocionado, comecei a raciocinar e aceitar o quão pequeno somos em relação
àquele vasto e imensurável espaço celestial que cobre toda a terra, aquela obra divina
que esporadicamente paramos para observar, para admirar e ao mesmo tempo, para
agradecer ao nosso Deus Todo Poderoso, que respeitosamente tratamos de GADU,
pela oportunidade de poder contemplar tudo aquilo com a visão perfeita. Quantos
gostariam de poder sentir aquela agradável sensação de poder admirar essa obra
inigualável e não podem, por estarem com as suas visões encobertas pela cegueira
em todos os sentidos...
Embora não entendendo como podemos ter à nossa disposição tão grande
espaço e não sabermos explorá-lo nem sempre de forma positiva, passei a analisá-lo
conforme a lógica que sabemos ser a parte da filosofia que estuda as leis do
pensamento e as regras que devem ser observadas na exposição da verdade, como
também, como a ciência que estudando as leis, nos conduz ao raciocínio encadeado,
para a ligação das idéias e coerência entre os princípios e as conclusões.
Memorizando a Letra G, voltei-me para a Geometria, ciência que tem por
objeto a medida das linhas, superfícies e volumes, estudando a extensão do espaço
limitado. Ela nos faz lembrar que talvez a retidão e o compasso sejam muito mais
necessários em nossas ações, do que nos elementos do mundo material, porque a
humanidade pode viver, como viveu em sua origem, sem as ciências matemáticas,
enquanto os homens se devorariam entre si se não soubessem dominar a
consciência, que é a retidão no ser racional.
Diante da vastidão que se desenrolava sobre a minha cabeça, não pude
esquecer-me da astronomia como a ciência que estuda a constituição e o movimento
dos astros, suas posições relativas e as leis de seus movimentos, suas condições
físicas e o cálculo das forças que atuam sobre esses mesmos astros. Assim, entendo
que a astronomia deve ser a ciência favorita dos maçons, tendo em vista que alargou
aos olhos da humanidade o infinito, elevando a alma do homem até Deus. Foi ela, a
ciência que imortalizou Galileu, a quem a civilização deve a primeira de todas as
liberdades: a liberdade do pensamento.
Absorto em meus pensamentos naquela viagem momentânea e tão sublime,
lembrei-me que debaixo deste enorme e agasalhante teto-manto, por ser privilegiado
pela vida, algumas virtudes eu teria que colocar em prática, de forma muito lenta, para
posteriormente, poder usufruir dos seus incontáveis benefícios perante os homens e,
principalmente, junto aos meus estimados irmãos-maçons.
Dentre as inúmeras virtudes que, no meu modesto entendimento, deverão ser
exercitadas diuturnamente, selecionei quatro que serviriam para sintetizar e corroborar
com essa nossa preocupação. A primeira delas seria a prudência, que significa uma
hábil discrição e é considerada como a mais elevada qualidade de um filósofo, pois,
quando se atinge as verdades sublimes, é que temos maior necessidade de agir com
prudência. Como maçons, temos todos nós o dever de nos conduzir sempre com
prudência, orientando e esclarecendo os homens, procurando colocá-los a salvo da
ignorância e do orgulho.
A segunda virtude por nós escolhida é a tolerância, mola-mestra de todo o
comportamento maçônico. Ela nos ensina a ter paciência com os nossos semelhantes,
sabendo suportar os defeitos de nossos irmãos, lembrando-nos que por meio dela,
entenderemos que cada um é um ser único, movido pelas mãos de Deus, e todos
dentro de uma cadência e de um ritmo próprios que não podemos modificar por meio
da intolerância tão combatida em nosso meio. Mesmo assim, percebemos ainda quão
intolerantes somos.
A terceira virtude que vem compondo esta relação é a bondade que tem como
sinônimos a ternura, a suavidade, a brandura e a serenidade, qualidades excelsas que
adornam o espírito daquele que sabe suportar a adversidade. Aceitando as provações
necessárias à nossa evolução espiritual, segundo a lei do Karma poder-se-á chegar a
resultados os mais sublimes por caminhos estreitos. Isto traduzido representa que
ninguém alcança o triunfo sem vencer graves e infindáveis formas de dificuldades,
fazendo assim com que o homem possa se aproximar da Luz Divina. Podemos afirmar
então, que a filosofia e a bondade são inseparáveis porque, enquanto a filosofia torna
o homem bom, a bondade o torna sábio.
Por último, selecionei a Justiça como quarta virtude a ser exercitada por nós,
por entender que ela, a justiça e a retidão constituem a base de toda virtude. A justiça
nos impele a ir buscar nas trevas, aqueles que não tiveram a dádiva Divina de
conhecer a verdadeira Luz, para mostrar-lhes a beleza daquilo que é justo e bom. No
entanto, ela, a justiça, deve estar e caminhar sempre intimamente ligada à Caridade,
uma vez que a aplicação da lei com rigor absoluto, inevitavelmente, poderá nos
conduzir ao cometimento da injustiça. Resumidamente poder-se-ia dizer que “no
excesso de justiça, fatalmente ocorrerá o excesso de injustiça”.
Para a maçonaria, a Justiça representa a verdade em ação, e nunca uma
faculdade abstrata; deve ser sempre uma atitude ativa e construtora, em defesa do
direito natural, que se sobrepõe ao direito escrito, porque aquele é eterno e este,
apenas transitório.
Diante de tudo isso que vivenciei, quando pude elevar e transportar os meus
pensamentos para bem alto, fazendo com que ele atingisse cada uma daquelas
estrelas lá no firmamento, me foi dado concluir com absoluta certeza, que
experimentei a nítida sensação de estar sendo assistido pelo manto protetor de uma
obra maçônica. Durante breves instantes, simbolicamente, convivi com o compasso e
com o esquadro, com a letra G e com milhares de irmãos espalhados pela superfície
da terra.
Por ser uma obra divina, a abóbada celeste, podemos afirmar que cobre a
todos no universo da mesma maneira, proporcionando aos seres humanos todo tipo
de oportunidades, oferecendo-lhes a justiça terrena, cobrando-lhes os deveres, em
todos os sentidos, e significando ainda a igualdade que deve haver e reinar entre
todos os filhos de Deus.
Naquela noite fui dormir muito mais tranqüilamente do que em todas as outras
anteriores, pois estava convicto de que hoje vira um céu maçônico com o qual interagi
de modo bastante íntimo e de forma enternecedora... Em sonho passaram pela minha
mente todas aquelas imagens que nela ficaram registradas e gravadas de maneira
indelével, e como um paradoxo quantas estrelas daquelas que já se foram povoaram a
minha mente. Irmãos que já se foram e viraram estrelas luminosas, clareando sempre
os nossos piores dias e nos dando forças para sobrepor os obstáculos naturais que
possam estar presentes na vida de cada um que aqui está me ouvindo.
As figuras que compunham aquele conjunto de um céu azul claro, além de
muita beleza, pareciam nos conclamava a repensar as nossas atitudes, visando um
mundo mais humano e mais fraterno onde possa reinar eternamente a verdadeira paz
e a harmonia entre os homens...

Você também pode gostar