Ficha de Leitura/Gramática 1
Ficha defonológicos
Processos Leitura/Gramática 1
Nome___________________________________ N.o _____ 12.o _____ Data ____/ ____/ ____
Avaliação ____________________ E. de Educação _____________ Professor/a ____________
TEXTO A
Lê a apreciação crítica, de Jorge Mourinha, que se segue.
★★
Mulheres à beira
de um ataque
A história verídica das Amazonas de Daomé contada
num filme escrito, dirigido e conjugado no feminino.
Um filme de ação, ou antes, uma história
de guerra, que se pretende realista, ancorada
nas histórias que se contam sobre as Agojie, 30
ou Amazonas de Daomé, imbatível corpo mili-
5 tar feminino que existiu realmente até ao início
do século XX? No papel, absolutamente nada
contra, sentia até com algum apetite ao saber
que à frente do elenco (e da produção) estava 35
a sempre excelente Viola Davis, e que uma das
10 suas guerreiras é Lashana Lynch, a agente que
«herdou» o nome de código 007 em Sem tempo
para morrer.
Na prática, A mulher rei, que é esse filme, 40
ambientado no início do século XIX e inteira-
15 mente conjugado no feminino (a maioria da
equipa técnica é feminina), é um espetáculo
eficaz e correto, mas – bizarramente – sem
alma nem garra, que Gina Prince-Bythewood 45
(A velha guarda) filma «aos solavancos».
20 O argumento de Dana Stevens, que nunca
escolhe se quer ser uma melodramática
women’s picture, uma denúncia da imoralidade
da escravatura ou um puro filme de guerra, não 50
a ajuda em nada: logo quando a história (que
25 é, diga-se, fascinante) está a ganhar embalo,
A mulher rei «trava» para prestar atenção a um
par de tramas secundárias que acabam por não
Editável e fotocopiável © Texto | Mensagens • 12.° ano
Fotografia de Ilze Kitshoff, A mulher rei, 2022.
justificar a atenção. E, se as sequências de ação
são corretas, e corretamente apresentadas, falta-
-lhes a verve, o ritmo que lhes dessem um golpe
de asa, com o todo sobrecarregado por uma par-
titura a «traço grosso» de um Terence Blanchard
que já (ou)vimos melhor. Prince-Bythewood
gere o todo com uma eficácia tarefeira que revela
também uma certa falta de personalidade.
O que sobra, então, são as atrizes – e aí não
temos razão de queixa, mesmo que já tenhamos
visto Davis muito melhor (é nas cenas mais inti-
mistas que a atriz mais brilha, mas a história não
lhes dá que chegue). Sempre que está no ecrã,
Lynch vai por aí fora e leva o filme atrás como
uma maratonista etíope, Sheila Atim e Thuso
Mbedu seguram as pontas com grande atenção.
E A mulher rei fica como um caso singular da
Hollywood contemporânea: uma história que
tinha tudo para ser um belo filme simultanea-
mente popular e inteligente (e relevante para os
nossos dias), mas que, na sua vontade de querer
ser tudo para todos, acaba por ficar aquém do
seu potencial. Vale a pena espreitar, mas con-
vém não pôr a fasquia demasiado alta.
Jorge Mourinha, in Público (texto adaptado, consultado
em https://www.publico.pt, em outubro de 2022).
115
1. Na perspetiva de Jorge Mourinha,
A. o elenco de A mulher rei não foi bem selecionado.
B. o filme A mulher rei não tem qualquer qualidade.
C. o argumento de A mulher rei é caracterizado por alguma indecisão.
D. o filme A mulher rei tem uma excelente banda sonora.

2. Antes de ver o filme, o crítico

A. tinha baixas expectativas.
B. estava com vontade de proceder ao seu visionamento.
C. encontrava-se cético, por não apreciar o trabalho da realizadora.
D. não tinha qualquer tipo de expectativas.

3. Jorge Mourinha critica, acima de tudo,

A. a fraca qualidade da história.
B. a falta de ritmo, de força e de originalidade a nível da realização.
C. o facto de a maioria da equipa técnica ser composta por mulheres.
D. o desempenho de Viola Davis.

4. A oração «que existiu realmente até ao início do século XX» (linhas 5-6) classifica-se como
subordinada
A. adjetiva relativa restritiva.
B. adjetiva relativa explicativa.
C. substantiva completiva.
D. substantiva relativa.

5. A oração «mesmo que já tenhamos visto Davis muito melhor» (linhas 37-38) classifica-se como
subordinada adverbial
A. consecutiva.
B. concessiva.
C. condicional.
D. final.

6. O constituinte «por aí fora» (linha 41) desempenha a função sintática de

A. complemento oblíquo.
B. modificador (do grupo verbal).
C. complemento do nome.
D. complemento do adjetivo.

116 Editável e fotocopiável © Texto | Mensagens • 12.° ano

 TEXTO B
Lê a apreciação crítica, de António Guerreiro, que se segue
e a nota.
★★★★★
Herberto Helder.
Entre a alegria e o terror
Apresentação do rosto forneceu matéria para
outros livros, de prosa e de poesia, de Herberto
Helder. Como os afluentes, ele foi diluir-se
(mas apenas parcialmente) em correntes prin-
5 cipais, tais como Os passos em volta e
Photomaton
& Vox. Para a história deste livro, importa sa-
ber que foi publicado pela editora Ulisseia em
maio de 1968, que foi imediatamente apreen-
10 dido pela polícia política, sem outra razão que
não fosse a de ostentar nalgumas passagens
uma linguagem que, não sendo abertamente
obscena, ofendia ainda assim o puritanismo
das autoridades. Nas circunstâncias da época,
15 era um livro apto a suscitar desconfianças.
E certamente não apenas as da PIDE.
O autor nunca o republicou. Ele reapare-
ce agora, por decisão da viúva de Herberto
Helder, Olga Lima, que, segundo uma nota de
20 edição, seguiu «o texto da publicação original,
corrigindo diversos lapsos e erros tipográfi-
cos assinalados pelo autor num exemplar de
trabalho». Quanto a eventuais dúvidas que se
levantem acerca da legitimidade de republicar
25 um livro que o autor manteve na gaveta, diga-
-se que a sua leitura é muito jubilante e proveitosa
para quem, na condição de estudioso
ou de simples leitor, se aproximou da obra de
Herberto Helder. Não há nada nele que venha
30 manchar a grandeza do poeta, do escritor.
O título traz a indicação implícita de que se
trata de um texto autobiográfico. E o incipit,
a frase de abertura, segue os protocolos da
autoapresentação, como num sketch em que o
35 ator vem à boca de cena e se dirige ao públi-
co: «Sou o Autor, diz o Autor, e aproxima-se
das pessoas que estão simplesmente a assistir e
lhe deixam, a ele, a solidão incólume». Talvez
seja pertinente lembrar que o contexto teó-
rico-ideológico em que este livro surgiu não era
Editável e fotocopiável © Texto | Mensagens • 12.° ano
40 propriamente muito favorável à figura e à categoria
do autor. Nesse tempo, estava muito
mais em voga a textualidade impessoal.
Apresentação do rosto é, pois, um livro au-
tobiográfico. Mas, desiludam-se os pescadores
45 de anedotas, a escrita da sua própria vida – a
auto-bio-grafia – nunca foi nem nunca seria
para Herberto uma sucessão de acontecimen-
tos, de pessoas, de datas e de lugares. Não é
que ele recorra aos conhecidos processos que
50 consistem em ficcionar ou romancear os fac-
tos de uma vida (dos quais resulta um híbrido
que tem tanto de ficção como de biográfico).
É antes porque ele se situa num plano de in-
tensidades em que a mimese1, a representação,
55 não é a das convenções narrativas do género
autobiográfico. Para termos uma ideia do que
isto significa, basta dizer que em todo o livro
surgem apenas dois nomes próprios, de dois
escritores, Edgar Allan Poe e Michel Deguy,
60 não há datas nem nomes de lugares. Mas há de
facto um lugar identificável, «uma ilha em for-
ma de cão sentado» que transitou, tal e qual,
para Photomaton & Vox.
Todo este discurso autobiográfico é atraído
65 para um centro que ocupa páginas e páginas:
a morte da mãe, quando a criança tem oito
anos. Digamos que essa morte percorre uma
longa parte do livro, até à declaração defini-
tiva: «O fundo era de água – como direi? – água
70 de uma alegria trágica. / Depois disseram:
morreu» (p. 73). Temos aqui uma espécie de
cena originária, para utilizarmos a linguagem
da psicanálise. Quem conhece a obra de Her-
berto Helder sabe que esta cena originária tem
75 um poder fortíssimo e irradia em muitas di-
reções. É um dos núcleos autobiográficos em
torno dos quais o poeta construiu toda a sua
obra poética. Outra cena originária, que se
117
 projeta também na sua poesia, é a descober-
80 ta do sangue menstrual das irmãs da criança.
Acrescente-se, aliás, que neste universo auto-
biográfico só há mulheres. E toda a mediação
com o mundo é da ordem do feminino. Em
suma: a leitura desta Apresentação do rosto
85 elucida-nos bastante sobre os mecanismos e a
matéria de que é feita a obra poética do autor
(ou melhor, do Autor): essa matéria é eminen-
temente autobiográfica, é em grande medida
uma expansão desta «apresentação do rosto».
90 É portanto uma matéria obsessiva, sempre em
movimento e em estado de enlouquecimen-
to. Baudelaire quis levar a poesia ao estado de
apoteose; Herberto Helder leva a poesia (e a
prosa) ao estado de enlouquecimento.

António Guerreiro, in Público (texto adaptado, consultado

em https://www.publico.pt, em novembro de 2022).

1
Mimese: reprodução artística da realidade.

1. A obra Apresentação do rosto

A. nunca chegou a ser publicada.
B. foi apreendida pela polícia política.
C. foi recentemente republicada, por iniciativa da viúva do autor.
D. não faz jus, pela sua qualidade, à restante obra de Herberto Helder.

2. De acordo com António Guerreiro, esta obra

A. é uma autobiografia, no sentido mais clássico do termo.
B. surgiu num contexto em que o texto autobiográfico estava em voga.
C. é uma autobiografia, apesar de não seguir as normas convencionais deste género literário.
D. é marcada pela ficcionalização dos factos da vida do autor.

3. A utilização do pronome «ele» (linha 3) contribui para a coesão textual

A. lexical.
B. gramatical referencial.
C. gramatical interfrásica.
D. gramatical temporal.

4. A oração «que neste universo autobiográfico só há mulheres» (linhas 81-82) classifica-se como
subordinada
A. adjetiva relativa restritiva.
B. adverbial consecutiva.
C. substantiva completiva.
D. adjetiva relativa explicativa.

118 Editável e fotocopiável © Texto | Mensagens • 12.° ano