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EDUCAÇÃO INFANTIL:

PRÁTICAS EDUCATIVAS VOLTADAS


A BEBÊS E CRIANÇAS PÚBLICO DA
EDUCAÇÃO ESPECIAL
ORGANIZADORAS:
Maria Fernanda Celli de Oliveira . Carolina Helena Micheli Velho . Andréa Mendes de Almeida Pereira
Valdicéia Tavares dos Santos . Maria Auristela Barbosa Alves de Miranda

Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Versão Digital e acessível em Libras


Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Organizadoras
Maria Fernanda Celli de Oliveira
Carolina Helena Micheli Velho
Andréa Mendes de Almeida Pereira
Valdicéia Tavares dos Santos
Maria Auristela Barbosa Alves de Miranda

EDUCAÇÃO INFANTIL:
PRÁTICAS EDUCATIVAS
VOLTADAS A BEBÊS E CRIANÇAS
PÚBLICO DA EDUCAÇÃO
ESPECIAL

1ª Edição
Montes Claros / MG – Brasil
Editora do IFNMG
Ano 2023
Copyright © da Editora do IFNMG
INSTITUTO FEDERAL DO NORTE DE MINAS GERAIS - IFNMG
Editor Executivo: Edinei Canuto Paiva
Editora Executiva: Andreia Pereira da Silva
Editor Executivo: Gustavo Henrique Silva de Souza
Bibliotecário(a) Responsável: Elciax Cristina de Sousa
Revisor Texto: Ana Paula Santos César
Revisão Normas Técnicas: Maria Fernanda Celli de Oliveira,
Carolina Helena Micheli Velho
Diagramação e Projeto Gráfico: Karina Carvalho de Almeida
Capa: Crianças na Janela Xilogravura de Valdério Soares da Costa

Ficha Catalográfica:

E24 Educação Infantil: práticas educativas voltadas a bebês e crianças público da educação
2023 especial / Maria Fernanda Celli de Oliveira (organizadora) et al. – Montes Claros,
MG: IFNMG, 2023.
131 p. : il., color.

ISBN DIGITAL: 978-65-88813-40-9
ISBN FÍSICO: 978-65-88813-39-3
Inclui referências.

1. Educação infantil. 2. Educação especial. I. Oliveira, Maria Fernanda Celli de (org.). II.
Velho, Carolina Helena Micheli (org.). III. Pereira, Andréa Mendes de Almeida (org.). IV.
Santos, Valdicéia Tavares dos (org.). V. Miranda, Maria Auristela Barbosa Alves de.

CDD: 371.9

Bibliotecária Elciax Cristina de Sousa - CRB/6 2065


Índice para Catálogo Sistemático
1. Educação infantil

Realizado depósito legal conforme Lei 10.994 de 14/12/2004


Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora do IFNMG
Todos os direitos desta edição reservados pela Editora do IFNMG
Tel.: (38) 3218-7326 – E-mail: proppi@ifnmg.edu.br / isbn@ifnmg.edu.br
Conheça o IFNMG: https://www.ifnmg.edu.br
CONSELHO EDITORIAL
Alfredo Costa Isadora Nogueira Arcanjo Barbosa
(IFNMG/ Campus Pirapora) (IFNMG / Campus Diamantina)
Alex Lara Martins Juliara Lopes da Fonseca
(IFNMG/ Campus Pirapora) (IFNMG/ Campus Pirapora)
Christiano Titoneli Santana Leonardo Luiz Silveira da Silva
(IFNMG/ Campus Pirapora) (IFNMG / Campus Salinas)
Eduardo Garrido Luana Aparecida Matos Leal
(IFNMG / Campus Salinas) (IFNMG / Campus Salinas)
Edmara Moreira Cerqueira Marcos Aurélio Duarte Carvalho
(IFNMG / Campus Pirapora) (IFNMG/ Campus Montes Claros)
Ednilton Moreira Gama Mariana Mapelli Paiva
(IFNMG / Campus Almenara) (IFNMG / Campus Almenara)
Eliane Macedo Sobrinho Santos Marilia Dutra Massad
(IFNMG / Campus Araçuaí) (IFNMG / Campus Salinas)
Fabrício Silveira dos Santos Ronaldo Medeiros dos Santos
(IFNMG / Campus Salinas) (IFNMG / Campus Salinas)
Hércules Otacílio Santos Tatianne Gizelle Marques Silva
(IFNMG / Campus Araçuaí) (IFNMG / Campus Salinas)

EQUIPE DE TRABALHO DO PROJETO


PROFESSORAS FORMADORAS: Juliana Maria Lima do Carmo
Alessandra Domingos de Souza Luciana Duarte da Cunha Peixoto
Carolina Helena Micheli Velho Luizélia Melo de Souza
Maria Fernanda Celli de Oliveira Marcela Daiane Pereira Durães
SECRETÁRIA DO CURSO: Maria Claudia de Oliveira
Anamaria Azevedo Lafetá Rabelo Mércia Otaviana Barbosa de Sá
SUPORTE DE ACESSO AO AMBIENTE Raquel Rodrigues Silva Camisasca
VIRTUAL DE APRENDIZAGEM: Roberta Ferreira Sandim Soares
Hércules Batista de Oliveira Roselaine Ferreira Rodrigues Pereira
TUTORES: Simone Pereira Monteiro
Ana Carolina Laureano Brandão Valéria Fiuza Nery Neves
Celina Aparecida Gonçalves de Souza EQUIPE DE ACESSIBILIDADE
Cristian Carlos Moreira Leni Aparecida Rabelo da Silva Mendes
Daniela dos Santos Landazuri Luiza Leyllane Oliveira
Francisca Medeiros Souza Fernanda Kerley Queiroz Vieira
Hasla de Paula Pacheco Evane Celestino Vieira
Tamires Almeida Bezerra Maria Leidiane Rodrigues Pereira Reis
Joelma de Oliveira Moura Nivaldo de Oliveira Boaventura Filho
Juciê de Aquino Nóbrega Nayara Barbosa de Almeida
GESTORES

PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Luiz Inácio Lula da Silva
MINISTRO DA EDUCAÇÃO
Camilo Santana
SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E
TECNOLÓGICA
Getúlio Marques Ferreira
REITORA
Joaquina Aparecida Nobre da Silva
PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO
João Leandro Cassio de Oliveira
PRÓ-REITORA DE ENSINO
Giuliana de Sá Ferreira Barros
PRÓ-REITOR DE EXTENSÃO E CULTURA
Rony Enderson de Oliveira
PRÓ-REITOR DE PESQUISA, PÓS-GRADUAÇÃO E
INOVAÇÃO
Edinei Canuto Paiva
PRÓ-REITORA DE GESTÃO DE PESSOAS
Rosemary Barbosa da Silva Moura
DIRETORA DO CENTRO DE REFERÊNCIA EM
FORMAÇÃO E EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA (CEAD)
Luciana Gusmão de Souza
DIRETORA DE ASSUNTOS ESTUDANTIS
Maria Flávia Pereira Barbosa

COORDENAÇÃO DO CURSO
Andréa Mendes de Almeida Pereira
AGRADECIMENTO
Aos nossos cursistas e a todas as mãos generosas, nas mais di-
versas instâncias, que seguraram conosco os nossos sonhos e torna-
ram possível a concretização dessa formação.
DEDICATÓRIA

A todas as crianças que merecem se desenvolver plenamente, a


partir do reconhecimento e valorização de suas especificidades
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . .
10
Capítulo 1 – Educação Inclusiva: o
desafio de não deixar ninguém para
trás . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
Capítulo 2 – Educação inclusiva nas
creches: uma discussão necessária . . . 28
Capítulo 3 – A acessibilidade em cur-
sos EAD: audiodescrição em foco . . . . 34
Capítulo 4 – A teoria da periodização
do desenvolvimento psicológico: con-
tribuições à educação escolar . . . . . . . . 42
Capítulo 5 – Desenvolvimento da
criança: algumas aproximações entre
a neurociência e a Educação Infantil . 49
Capítulo 6 – Especificidades do tra-
balho docente no currículo da educa-
ção infantil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
Capítulo7–ABaseNacionalComumCur-
ricular na prática com bebês . . . . . . . . 74
Capítulo 8 – Educação Infantil: práti-
cas pedagógicas com bebês e a forma-
ção de professores . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
Capítulo 9 – Aprendendo com as
mãos - Oficina Montessoriana . . . . . . 88
Capítulo 10 – Primeira Infância: o
brincar no psicodiagnóstico . . . . . . . . . 97
Capítulo 11 – Uma formação para
profissionais do ensino infantil na
ambiência do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do
Norte de Minas Gerais - IFNMG . . . . 106
Capítulo 12 – “Eduvivências”: nar-
rativa sobre a Tutoria a Distância no
Curso de Educação Infantil - Práticas
Educativas Voltadas a Bebês e Crian-
ças Público da Educação Especial . . . .
115
Capítulo 13 – Tutoria em EAD: perfil,
limites e possibilidades . . . . . . . . . . . . . 125
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APRESENTAÇÃO
É cada vez mais imprescindível salientar a importância de prá-
ticas pedagógicas inclusivas, que contemplem todos(as) as crianças,
visando seu desenvolvimento pleno, a partir de suas especificida-
des e peculiaridades. É nesse sentido, que este e-book objetiva levar
ao(a) leitor(a) a possibilidade de um novo e amplo olhar tangente
às práticas pedagógicas voltadas a bebês e crianças público da edu-
cação especial, a partir das experiências de agentes atuantes nesste
contexto, em suas diversas dimensões.

Esta produção é um esforço coletivo e conta com estudos mul-


tidimensionais que, abrangem a temática supracitada de maneira
articulada, elaborados a partir de vivências de sujeitos atuantes na
elaboração e execução do curso Educação Infantil: práticas educati-
vas voltadas a bebês e crianças público da Educação Especial, ofere-
cido em sua primeira versão no ano de 2023, no âmbito do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Ge-
rais - IFNMG, que traz os bebês e as crianças com deficiência para
o eixo central da formação de professoras e professores e promove
um curso inovador.

Para aguçar ainda mais o interesse na coletânea elaborada,


serão apresentados a seguir, os capítulos que compõem essa obra,
pensada e organizada com o compromisso de levar ao leitor, as
múltiplas dimensões das práticas pedagógicas que envolvem as
crianças e bebês, público-alvo da Educação Especial.

No capítulo 1, “Educação Inclusiva: o desafio de não deixar


ninguém para trás”, Liliane Garcez descreve de maneira objetiva,
o processo de construção de nosso atual arcabouço legislativo, e
as implicações em termos de mudanças nas chaves de leitura para
a efetivação de uma educação que tem como objetivo, não deixar
ninguém para trás. A autora salienta a importância da educação

10
Apresentação

inclusiva enquanto modalidade de ensino que organiza estratégias


educacionais, a partir do princípio de equidade visando contribuir
para exterminar a desigualdade educacional. Para tanto, salienta a
importância e o desafio de investir na Educação Inclusiva de ma-
neira efetiva, a partir de um movimento de reflexão e ação coletivas.

O capítulo 2, “Educação Inclusiva nas creches: uma discussão


necessária”, escrito por Daniela Cristina Araújo propõe uma breve
reflexão sobre o percurso da constituição da Educação Especial, sob
a perspectiva da Educação Inclusiva, no contexto do cotidiano das
creches que atendem o público alvo da Educação Especial. O estudo
apresentado pela autora é resultado da coleta de dados realizada em
uma instituição de ensino onde se observou-se o trabalho pedagó-
gico realizado com um aluno diagnosticado com Transtorno Espec-
tro do Autismo. Essa discussão, fundamentou-se na Lei de Diretri-
zes e Bases da Educação (Lei 9.394/96), nas Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil (Brasil, 1998) e na Política Na-
cional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva
(2008) enquanto documentos legais, buscando assim, reafirmar a
importância da formação docente especializada nas práticas peda-
gógicas oferecidas na Educação Infantil aos bebês e crianças público
alvo da Educação Especial.

No capítulo 3, Nayara Barbosa de Almeida, em seu texto “A


acessibilidade em cursos EAD: audiodescrição em foco” traz uma
discussão acerca do avanço tecnológico e as inúmeras possibilida-
des de oferta de ensino existentes na atualidade (como é o caso do
Ensino a Distância – EAD), a partir da apresentação de um relato
de experiência relacionado ao trabalho de audiodescrição realizado
no curso de Educação Infantil: práticas educativas voltadas para be-
bês e crianças público-alvo da Educação Especial. Nesse contexto, a
autora aborda a necessidade de garantir a acessibilidade das pessoas
com deficiência visual nos ambientes virtuais de ensino, conside-
rando a imprescindibilidade de realização da leitura total dos mate-

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Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

riais disponibilizados e não somente dos textos, facilitando assim, a


compreensão dos contextos.
Já no capítulo 4, “A teoria da periodização do desenvolvimen-
to psicológico: contribuições à educação escolar”, o autor Ricardo
Eleutério dos Anjos analisa a teoria da periodização histórico-cul-
tural do desenvolvimento psicológico trazendo de maneira apro-
fundada, aportes teóricos para a educação escolar. Para isso, o au-
tor centra sua análise em dois principais aspectos: a explanação das
características da periodização do desenvolvimento psicológico e
a tese de que a teoria da periodização, enquanto um plano de de-
senvolvimento humano tem como elemento central, a atividade de
trabalho. Além disso, discorre acerca da periodização do desenvol-
vimento psicológico enquanto teoria que contribui para a educação
escolar, a partir de uma abordagem pedagógica mediada, visando
evitar o psicologismo do processo educativo.
O capítulo 5, intitulado “Desenvolvimento da criança: algumas
aproximações entre neurociência e educação infantil” foi escrito por
Maria Fernanda Celli de Oliveira e tem como objetivo trazer algu-
mas primeiras aproximações acerca da neurociência e a Educação
Infantil, enquanto possibilidade de contribuição para o desenvolvi-
mento pleno da criança. Para isso, a autora apresenta inicialmente
um panorama geral acerca da neurociência, apontando algumas
aproximações com a teoria de Vigotski, propondo, em seguida, re-
flexões que podem ser estabelecidas entre a neurociência e o de-
senvolvimento infantil. Finaliza destacando a importância de refle-
tir sobre os processos de construção de conhecimento, a partir da
compreensão e valorização das especificidades e particularidades de
cada indivíduo.

O capítulo 6, “Especificidades do trabalho docente no cur-


rículo da Educação Infantil”, de Sandro Vinícius Sales dos Santos,
apresenta algumas reflexões acerca dos desafios inerentes à política
curricular da Educação Infantil, organizada no Brasil, por campos

12
Apresentação

de experiência propostos pela Base Nacional Comum Curricular,


evidenciando que esses já estavam presentes nas Diretrizes Curricu-
lares Nacionais para a Educação Infantil. Para isso, o autor propõe
uma discussão pautada em três seções: na primeira, revisa a política
curricular da Educação curricular, em seguida, apresenta um excer-
to do cotidiano vivido por ele junto a um grupo de bebês e finaliza
trazendo algumas reflexões a respeito da importância da alterida-
de da infância na produção de campos de experiências que efetiva-
mente visam o desenvolvimento da criança.
No capítulo 7, “A Base Nacional Comum Curricular na práti-
ca” com bebês, Fabiana Cristina Frigieri de Vitta, Ana Julia Ribeiro
Sgavioli e Alberto de Vitta propõem uma análise acerca da escrita
dos objetivos tangentes à organização intencional que promova, de
maneira significativa, o desenvolvimento e aprendizagem dos be-
bês, a partir da organização prevista na Base Nacional Comum Cur-
ricular. Nesse sentido, os autores visam salientar a importância do
aprofundamento de conhecimentos tangentes ao desenvolvimento
infantil e às práticas pedagógicas enquanto proposta efetiva para o
empoderamento das crianças.
Já no capítulo 8, as autoras Fabiana Cristina Frigieri de Vitta,
Thaize Fernanda Ramos Macedo e Vanilda Divina Almério Bista-
ffa trazem em seu estudo, intitulado “Educação Infantil: práticas
pedagógicas com bebês e a formação de professores” uma reflexão
acerca da formação de profissionais para atuação com bebês, nas
instituições de educação infantil, a partir de pesquisas desenvolvi-
das no âmbito do Grupo de Estudos e Pesquisa em Atividade e De-
senvolvimento Infantil – GEPADI, cujos projetos têm como objeti-
vo verificar a percepção de estudantes de graduação, auxiliares de
desenvolvimento infantil (ou de apoio, que recebem diferentes no-
mes) e professores sobre sua formação e prática com atividades de
vida diária, com música, brinquedos e equipamentos de playground
junto ao atendimento de bebês. Nesse sentido, são apresentados da-
dos que evidenciam sua relevância nas políticas educacionais e que

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Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

ao mesmo tempo, evidenciam a precariedade desse atendimento no


que se refere a essa faixa etária, desvelando a necessidade de uma
formação inicial e adequada ara o trabalho com o público-alvo su-
pracitado.
O capítulo 9, “Aprendendo com as mãos – Oficina Montesso-
riana”, de Keila Silva da Costa aborda a adaptação do método Mon-
tessori para bebês com deficiência visual, destacando a importância
da estimulação sensorial e cognitiva nesse processo, a partir da pro-
posta de uma oficina montessoriana, calcada em uma trilha de sen-
tidos que visam à experimentação das sensações por parte de bebês.
Com essa proposta prática, a autora visa propiciar experiências ri-
cas de exploração e aprendizagem, a partir da adaptação das ativi-
dades, de acordo com as habilidades, especificidades e interesses in-
dividuais, visando promover o desenvolvimento sensorial, cognitivo
e exploratório dos bebês com deficiência visual, a partir de estímu-
los adequados.
No capítulo 10, Luizelia Melo de Souza, discorre em seu texto
“Primeira Infância: o brincar no psicodiagnóstico”, acerca da infân-
cia, e as diferentes experiências a que a criança está exposta, simul-
taneamente às informações que ele coleta ao seu entorno, a partir
da exploração, o que contribui para a formação de bases indispen-
sáveis para o atendimento da criança e sua compreensão sobre o
mundo. A autora aborda de maneira reflexiva, as transformações
tangentes à infância no decorrer dos tempos, discorrendo acerca da
relevância do brincar no psicodiagnóstico, com o objetivo destacar
a importância do lúdico no desenvolvimento infantil, salientando
ainda, a importância da família nesse contexto.
O capítulo 11, escrito por Andrea Mendes de Almeida Perei-
ra, intitulado “Uma formação para profissionais do ensino infantil
na ambiência do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecno-
logia do Norte de Minas Gerais – IFNMG” traz a discussão de al-
guns aspectos tangentes à oferta de um curso de formação inicial

14
Apresentação

e continuada para profissionais da educação pública, que atuam no


atendimento educacional especializado, na área de abrangência do
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de
Minas Gerais - IFNMG. Nesse sentido, a autora apresenta o curso
que se desenvolveu em três módulos, a saber, a legislação aplicada o
atendimento educacional especializado a bebês e crianças, o desen-
volvimento infantil e as práticas pedagógicas que devem considerar
a individualidade e a participação familiar no processo de ensino-
-aprendizagem de crianças e bebês, considerando seu protagonismo
e especificidade. Com isso, a autora visou salientar a importância
da proposta na capacitação e aperfeiçoamento de profissionais que
atuam junto à Educação Infantil, primeira etapa da Educação Bási-
ca.
No capítulo 12, “Eduvivências”: narrativa sobre a Tutoria a Dis-
tância no Curso de Educação Infantil - Práticas Educativas Voltadas
a Bebês e Crianças Público da Educação Especial, Hasla de Paula
Pacheco nos agracia com um relato de experiência que tem como
objetivo refletir acerca das ações mediadoras desenvolvidas pela tu-
toria à distância do curso de formação para profissionais da Edu-
cação Infantil que atuam com crianças da Educação Especial. Para
tanto, buscou-se refletir e analisar as práticas educativas que melhor
atenderam às necessidades dos cursistas, considerando suas poten-
cialidades e os objetivos do curso ofertado na modalidade de Edu-
cação à distância (EaD), pelo Instituto Federal de Educação, Tec-
nologia e Ciência do Norte de Minas Gerais. Com isso, foi possível
identificar algumas abordagens significativas para a compreensão
da complexidade das relações tangentes à tutoria em EAD e à for-
mação continuada de profissionais da Educação Infantil.
E fechando esta obra com chave de ouro, o capítulo 13, Tuto-
ria em EAD: perfil, limites e possibilidades de autoria de Daniela
dos Santos Landazuri traz uma análise do papel do tutor no curso
Educação Infantil: Práticas educativas voltadas a bebês e crianças
público alvo da Educação Especial, oferecido pelo Instituto Federal
de Educação, Tecnologia e Ciência do Norte de Minas Gerais - IF-

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Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

NMG, a partir da identificação do perfil, das habilidades e dos as-


pectos tangentes às práticas desses profissionais. Para isso, buscou-
-se compreender como o tutor é capaz de influenciar o processo de
ensino-aprendizagem dos cursistas, a partir de uma abordagem de
pesquisa-ação, onde foi aplicado um questionário para coletar da-
dos, que trouxe, como resultados, o destaque para a importância do
trabalho do tutor no processo de construção do conhecimento dos
tutorandos.

É de suma importância que possamos destacar o papel impres-


cindível de cada colaborador(as) na construção desta coletânea que
visa trazer, além de conhecimento teórico, a oportunidade de eter-
nizar via palavra escrita, achados, princípios, diretrizes e de vislum-
brar as diferentes áreas de atuação que envolvem um mesmo objeto
de interesse e estudo, a saber, a Educação Infantil, em especial, às
práticas educativas voltadas a bebês e crianças público da Educação
Especial. Boa leitura!

Boa leitura!

Maria Fernanda Celli de Oliveira


Carolina Helena Micheli Velho

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Autora
Liliane Garcez

CAPÍTULO 1
Educação inclusiva: o desafio de não deixar
ninguém para trás
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INTRODUÇÃO
Desde a Declaração de Salamanca, temos apostado que o fato
de todos bebês, crianças, adolescentes e jovens estarem na escola,
mais perto de casa, aprendendo juntas nos desafia a ampliar nossos
repertórios de estratégias pedagógicas e também subsidia as neces-
sárias mudanças legislativas.
De lá para cá, muitas coisas aconteceram. As declarações e tra-
tados de direitos humanos elaborados, desde então, têm cumprido
sua função de influenciar as legislações e políticas públicas. Para
chegarmos à formulação do Objetivo de Desenvolvimento Susten-
tável 4, qual seja, garantir uma educação de qualidade, inclusiva e
equitativa para todas as pessoas ao longo da vida, percorremos um
extenso caminho de mobilização social no mundo todo. Como par-
te desse movimento, o alinhamento da definição de educação inclu-
siva à educação para todos, tal como estabelecido na Agenda 20301,
evidenciou a luta pelo direito à educação da parcela da população
que, no Brasil, tem direito à modalidade da educação especial. Con-
comitantemente, o estabelecimento da Convenção sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência (CDPD) pela Organização das Nações
Unidas (ONU) foi o coroamento do movimento político das pes-
soas com deficiência, fruto da luta social contra a invisibilidade des-
sa parcela da população em nosso país e no mundo. Suas diretrizes
apontam para o afastamento do modelo biomédico e consequente
alinhamento aos direitos humanos. Nela, está disposta a seguinte
definição de pessoa com deficiência:
Pessoas com deficiência são aquelas que têm
impedimentos de longo prazo de natureza fí-
sica, mental, intelectual ou sensorial, os quais,
em interação com diversas barreiras, podem
obstruir sua participação plena e efetiva na

1
A Agenda 2030 é um plano de ação para as pessoas, para o planeta e para a prosperidade. Ela busca fortalecer a paz universal
e as parcerias como ferramentas para o desenvolvimento sustentável. https://brasil.un.org/pt-br/sdgs.

18
Capítulo 1: Educação Inclusiva: o desafio de não deixar ninguém para trás

sociedade em igualdade de condições com as


demais pessoas. (Art. 1º, CDPD)

Essa perspectiva social desloca o foco do que, até então, enten-


díamos como deficiência para a relação entre impedimentos e bar-
reiras, o que é bastante transformador. O conceito induz que nossos
esforços educacionais, por exemplo, devem ser direcionados à mu-
dança do sistema educacional para que ele se torne cada vez mais
inclusivo. Em outras palavras, como as barreiras só são percebidas
na relação, posto que elas ganham concretude ao impedirem a par-
ticipação das pessoas com deficiência, só é possível reconhecê-las e
removê-las com informação e convivência.
No Brasil, a CDPD e seu Protocolo Facultativo (ONU,2006)2
foram ratificados como parte da nossa Constituição Federal entre
os anos 2008 e 20093. Alinhado com esse marco internacional
de Direitos Humanos, o Ministério da Educação formaliza tal
concepção por meio da Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI)4. Assim, pode-se
afirmar que desde 2008, ainda que, com as rupturas vivenciadas nos
últimos anos, estão sendo realizados investimentos em termos de
apoio técnico e aporte financeiro no sentido de qualificar as escolas
comuns para que elas trabalhem na perspectiva da inclusão e no
cumprimento do Plano Nacional de Educação (PNE).5
Em 2015, é promulgada a Lei Brasileira de Inclusão da
Pessoas com Deficiência (LBI) que reafirma o conceito de pessoa
com deficiência estabelecido na CDPD e traz a correspondência
entre as barreiras existentes e a acessibilidade, afastando-se do
2
O propósito da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) e seu Protocolo Facultativo é promover,
proteger e assegurar o exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as
pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente. https://www.unicef.org/brazil/convencao-sobre-
os-direitos-das-pessoas-com-deficiencia
3
No ano de 2008 foi aprovado o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo
Facultativo pelo Decreto 186/2008.
4
Em janeiro de 2008, o Ministério da Educação, por meio de sua Secretaria de Educação Especial apresenta a Política Nacional
de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva visando constituir políticas públicas promotoras de uma educação
de qualidade para todos estudantes, com foco nos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimentos e altas
habilidades / superdotação. http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf
5
Em 2014 é aprovado o Plano Nacional de Educação - PNE - Lei 13.005/2014, com vigência decenal, a contar da data de
sua publicação, com vistas ao cumprimento do disposto no art. 214 da Constituição Federal. http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13005.htm

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entendimento que relacionava os diferentes impedimentos físicos,


mentais, intelectuais e sensoriais a apoios específicos para cada um
deles, numa espécie de correspondência única.
[...] barreiras: qualquer entrave, obstáculo, ati-
tude ou comportamento que limite ou impeça
a participação social da pessoa, bem como o
gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à
acessibilidade, à liberdade de movimento e de
expressão, à comunicação, ao acesso à infor-
mação, à compreensão, à circulação com segu-
rança, entre outros.

Ao focalizar o direito ao acesso e à participação, a LBI6 dá ins-


trumentos para escapar da centralidade do laudo como definidor
da pessoa com deficiência, transtornos globais do desenvolvimen-
to, transtornos do espectro autista e altas habilidades/superdotação.
Ao mesmo tempo, nos convoca a trabalhar dentro da concepção de
funcionalidade, colocando a pessoa na frente da deficiência.
Os marcos legais brasileiros, portanto, chamam-nos a com-
preender a deficiência como característica humana e potencializar
o conceito de interseccionalidade para atuar, em nosso cotidiano,
dentro da perspectiva social da deficiência. Assim, a Educação Es-
pecial a serviço da Educação Inclusiva, como modalidade prevista
na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), passa
a ser compreendida como transversal à educação comum, o que in-
duz a construção de processos para garantir e qualificar o acesso às
oportunidades educacionais e sociais e buscar a eliminação das bar-
reiras que impedem o acesso, a permanência e a participação plena
de todas e todos os estudantes elegíveis aos serviços nela estabeleci-
dos.
Assim, organizar a educação considerando as e os estudantes
com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, trans-
6
A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), Lei 13146, foi instituída em 06
de julho de 2015, e se destina a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades
fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.

20
Capítulo 1: Educação Inclusiva: o desafio de não deixar ninguém para trás

tornos do espectro autista e altas habilidades / superdotação como


parte do alunado tem imprimido novos contornos tanto para a mo-
dalidade da Educação Especial como para todos os demais níveis,
etapas e modalidades de ensino que compõem nosso Sistema Na-
cional de Educação.

ANÁLISE E DISCUSSÃO
Os dados dos últimos anos têm sido bem diferentes daqueles
de meados dos anos 2000. No Resumo Técnico referente ao Censo
Escolar da Educação Básica7, elaborado pelo Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas (Inep), está registrado que o número de matrí-
culas e dos estudantes elegíveis à modalidade da educação especial
chegou a 1,3 milhão e que o percentual de matrículas e desses dis-
centes matriculados em classes comuns do ensino regular atingiu
93,3%. Dados a se comemorar, certamente.
GRÁFIICO 01

Fonte: Desenvolvido pelo autor

7
O Resumo Técnico do Censo Escolar da Educação Básica de 2022 é uma publicação que compõe o conjunto de instrumentos
de divulgação dos resultados do Censo Escolar e foi pensado para ser um documento de referência geral e consulta para
gestores dos sistemas de ensino; técnicos dos órgãos de gestão da política educacional no âmbito federal, estadual e municipal;
estudantes e acadêmicos de graduação e pós-graduação; pesquisadores e demais interessados. Contudo, por sua divulgação e
organização sistemáticas, também tem o potencial de orientar análises mais detalhadas sobre temas específicos relacionados
ao sistema educacional brasileiro. https://download.inep.gov.br/publicacoes/institucionais/estatisticas_e_indicadores/
resumo_tecnico_censo_escolar_2022.pdf

21
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Porém, como, segundo a Organização Mundial da Saúde


(OMS)8, entre 12% e 15% da população brasileira têm algum tipo
de deficiência e o número de crianças e adolescentes matriculados,
em nossas escolas ainda não chega a 4%, há muito a se fazer para,
no mínimo, equiparar o acesso à escola de crianças e adolescentes
com e sem deficiência.
Além disso, sabemos que estar matriculado não basta. O direi-
to de aprendizagem, quando é parcialmente implementado, de fato,
não é cumprido. Dessa maneira, os investimentos devem ser man-
tidos e ampliados para que todas as crianças, adolescentes, jovens
e adultos, quaisquer que sejam suas características ou condições,
tenham garantido o direito de serem escolarizadas em ambientes
inclusivos. Não se trata de reforçar uma cultura de tolerância à di-
ferença, em que se permite às pessoas a participação em espaços
específicos. Ao contrário, para sair do assistencialismo e romper
com o capacitismo9, é urgente e necessária a estruturação de pres-
supostos de valorização da pluralidade de corpos, sentidos e pensa-
mentos, (re)criando uma escola que respeite o direito às diferenças
humanas e que mova recursos equitativamente para a garantia do
acesso de todas as pessoas, sem deixar ninguém para trás.
Para tanto, compreender que o direto à educação dos bebês,
crianças, adolescentes e jovens com deficiência, transtornos globais
do desenvolvimento, transtornos do espectro autista e altas habili-
dades/superdotação é composto pelo acesso ao currículo que é co-
mum a todos estudantes e ao atendimento educacional especializa-
8
A OMS, em seu Relatório Mundial sobre a Deficiência de 2011, estima que mais de um bilhão de pessoas, ou cerca de
15% da população mundial, estariam vivendo com alguma deficiência, número superior às estimativas dos anos de 1970, as
quais sugeriam uma prevalência global de cerca de 10%. No Brasil, a Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência
de 2017 considera que “o dimensionamento da problemática da deficiência no Brasil, tanto em termos qualitativos quanto
quantitativos, é muito difícil em razão da inexistência quase total de dados e informações de abrangência nacional, produzidos
sistematicamente, que retratem de forma atualizada a realidade do País nesta área” e referencia seu texto na seguinte afirmação:
“A OMS estima que cerca de 10% da população de qualquer país em tempo de paz possui algum tipo de deficiência”.
9
Segundo a antropóloga Anahi Guedes de Mello, capacitismo é a discriminação ou violências praticadas contra as pessoas com
deficiência. É a atitude preconceituosa que hierarquiza as pessoas em função da adequação de seus corpos a um ideal de beleza
e capacidade funcional. Com base no capacitismo, discriminam-se pessoas com deficiência. Trata-se de uma categoria que
define a forma como pessoas com deficiência são tratadas como incapazes (incapazes de trabalhar, de frequentar uma escola de
ensino regular, de cursar uma universidade, de amar, de sentir desejo, de ter relações sexuais etc.), aproximando as demandas
dos movimentos de pessoas com deficiência a outras discriminações sociais como o sexismo, o racismo e a homofobia. O que
se chama de concepção capacitista está intimamente ligada à corponormatividade que considera determinados corpos como
inferiores, incompletos ou passíveis de reparação/reabilitação quando situados em relação aos padrões corporais/funcionais
hegemônicos. Atitudes capacitistas contra pessoas com deficiência refletem a falta de conscientização sobre a importância da
inclusão e da acessibilidade para as pessoas com deficiência.

22
Capítulo 1: Educação Inclusiva: o desafio de não deixar ninguém para trás

do, e se esse se fizer necessário, é o caminho para qualificar nosso


sistema educacional.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
O movimento para estabelecer um sistema educacional inclu-
sivo passa pela substituição do “ou” pelo “e”, pois esse “e”, quando
significa diálogo, relação, troca de experiência entre todos, garante
direitos. Para tanto, precisamos acionar algumas chaves de leitura
de mundo e da educação:
• Nosso propósito é a eliminação de barreiras: a percepção e a
eliminação das barreiras que se entrepõe entre a pessoa e o di-
reito à educação e a participação plena é o foco de nossos sabe-
res e práticas. As medidas de apoio específico podem e devem
ser adotadas como parte da inclusão escolar, para que a partici-
pação das pessoas com deficiência, e não só, seja contemplada
e valorizada. Entretanto, o fluxo dos pensamentos e das ações
educativas deve partir do geral para o específico, e não o con-
trário, de modo a escapar da falsa dicotomia entre educação
comum e especial que acaba por estabelecer ‘puxadinhos’ ou
condicionantes.
• Nossa interpretação coloca a pessoa na frente da deficiência: o
conceito atual de pessoa com deficiência explicita que as rela-
ções sociais devem considerar a diversidade humana como va-
lor positivo. A convivência nos mobiliza a ter um olhar críti-
co sobre nossas respostas diante de uma situação desafiadora,
rompendo com uma percepção capacitista e preconceituosa.
• O sentido de nossa mobilização é construir uma escola acolhe-
dora, responsiva e acessível, considerando todas e cada uma
das pessoas, pois o processo para melhorar nossos indicado-
res passa pela inclusão e pela equidade e meio da participação
e ampliação de repertório individual e coletivo. Afinal, quando
se trata de acessibilidade, a seta é sempre de mão dupla.

23
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

A partir desses pontos, a Educação Especial dentro de uma


perspectiva social da deficiência, relaciona-se à quebra de barreiras
e não a determinado componente curricular. Portanto, os esforços
para organizar o currículo não devem ser compreendidos como um
conjunto de elementos sistematizados em documentos apartados
que discorrem sobre adaptações curriculares específicas para estu-
dantes elegíveis aos serviços desta modalidade – estes são dispostos
para apoiar e favorecer o acesso ao conhecimento e a participação
plena na sala de aula comum.
Dito de outra maneira, do ponto de vista educacional, acessibi-
lidade refere-se ao direito a acessar o currículo comum por meio de
estratégias, materiais e recursos que possibilitem a participação dos
estudantes nas atividades escolares, com os apoios específicos quan-
do necessários. Afinal, ninguém pode ficar de fora de nossa inten-
cionalidade pedagógica e de nossas expectativas de aprendizagem.
Dessa forma, investir na Educação Inclusiva significa apostar
no aprimoramento do direito à Educação de todas as pessoas, sem
exceção, e na qualificação dos sistemas de ensino cuja unidade bá-
sica é a escola. As mudanças que esse modo de atuar pode propor-
cionar à sala de aula, à escola e aos sistemas de ensino são benéficas
para toda a comunidade escolar, um sucesso que extrapola o públi-
co a que se destinam.
Não há uma linha de chegada para a inclusão. Há situações
desafiadoras cotidianas e concretas que nos convocam a dialogar
a partir de princípios, que são inegociáveis, de diretrizes de políti-
cas públicas e de saberes e práticas locais. O objetivo posto é um
só: fortalecermos um projeto coletivo de sociedade que amplia nos-
sa humanidade e que, portanto, não se coaduna com deixar uma
criança sem ter acesso a conhecimentos que estabelecemos como
imprescindíveis.
Essa é a perspectiva do último Relatório da Comissão Interna-
cional sobre os Futuros da Educação – Reimaginar nossos futuros

24
Capítulo 1: Educação Inclusiva: o desafio de não deixar ninguém para trás

juntos: um novo contrato social da educação10. Segundo ele, a peda-


gogia deve ser organizada com base nos princípios de cooperação,
colaboração e solidariedade para promover as capacidades intelec-
tuais, sociais e morais dos estudantes, de maneira que trabalhem
juntos e transformem o mundo com empatia e compaixão e a ava-
liação deve refletir esses objetivos pedagógicos, promovendo cresci-
mento e aprendizagem significativos para todas as pessoas.
Para que a educação possa ajudar a transfor-
mar o futuro, ela deve primeiro se tornar mais
inclusiva e enfrentar as injustiças do passado.
Os fatores que delineiam essas desigualdades e
exclusões devem ser claramente identificados,
caso as políticas e as estratégias se destinarem a
apoiar os estudantes marginalizados, especial-
mente aqueles que vivenciam graves desvanta-
gens.

Ao incentivar o movimento de reflexão coletiva como instru-


mento potente e estratégia eficaz para uma atuação que inclui todas
as crianças no processo educacional e promove a organização de es-
tratégias com base na equidade, o que é produzido, em cada esco-
la pelas pessoas que lá convivem, torna-se central. É lá que temos
oportunidade de tomarmos decisões, sempre transitórias e aprimo-
ráveis, que têm como foco pessoas reais, relações concretas, inves-
tindo esforços para potencializar a possibilidade de êxito na orga-
nização de estratégias pedagógicas e de gestão em prol da inclusão
escolar de maneira que as pessoas com deficiência, transtornos glo-
bais do desenvolvimento, transtornos do espectro autista e altas ha-
bilidades/superdotação não precisem mais justificar suas presenças
nas salas de aulas comuns. Para o sucesso de nosso projeto de edu-
cação e de país. Conforme a Declaração de Incheon:

10
O relatório foi desenvolvido pela Comissão Internacional sobre os Futuros da Educação da Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) ao longo de dois anos e baseia-se em extensas consultas com mais de um
milhão de pessoas e propõe um novo contrato social para a educação com o intuito de reconstruir nossas relações uns com os
outros, com o planeta e com a tecnologia. unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000381115

25
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Inclusão e equidade na e por meio da educa-


ção são o alicerce de uma agenda de educação
transformadora e, assim, comprometemo-nos
a enfrentar todas as formas de exclusão e mar-
ginalização, bem como disparidades e desi-
gualdades no acesso, na participação e nos re-
sultados de aprendizagem. Nenhuma meta de
educação deverá ser considerada cumprida a
menos que tenha sido atingida por todos. Por-
tanto, comprometemo-nos a fazer mudanças
necessárias nas políticas de educação e a con-
centrar nossos esforços nos mais desfavoreci-
dos, especialmente aqueles com deficiências,
a fim de assegurar que ninguém seja deixado
para trás.

REFERÊNCIAS
ARENDT, H. Entre o Passado e o Futuro. São Paulo: Perspectiva, 2001.
BRASIL. Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil.
Brasília, 1988.
BRASIL. Lei no 9.394/1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Na-
cional. Brasília, 1996.
BRASIL/MEC. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva
da Educação Inclusiva. Brasília, 2008.
BRASIL. Decreto Legislativo no 186/2008. Aprova o Texto da Conven-
ção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo
Facultativo. Brasília, 2008.
BRASIL. Decreto no 6.949/2009. Promulga a Convenção Internacional
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Faculta-
tivo. Brasília, 2009.
BRASIL. Lei n 13.005/2014. Plano Nacional de Educação. Brasília, 2014.

26
Capítulo 1: Educação Inclusiva: o desafio de não deixar ninguém para trás

BRASIL. Lei no 13.146/2015. Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com


Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Brasília, 2015.
FREIRE, P. Pedagogia da Indignação: Cartas Pedagógicas e Outros Es-
critos. São Paulo: Unesp, 2000.
GARCEZ, L. Da construção de uma ambiência inclusiva no espaço es-
colar (Dissertação). São Paulo: Universidade de São Paulo, 2004.
GARCEZ, L. Inclusão como processo de modificação de estruturas e
atitudes: os impactos da leitura relacional nos serviços à pessoa com
deficiência na perspectiva dos Direitos Humanos. In: TUON, L.; CE-
RETTA, LB (Orgs.). Rede de Cuidado à Pessoa com Deficiência. Criciú-
ma: Universidade do Extremo Sul Catarinense, 2017.
GARCEZ, Liliane; IKEDA, Gabriela. Educação Inclusiva de Bolso: o de-
safio de não deixar ninguém para trás. São Paulo: Arco, 2021.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração Univer-
sal dos Direitos Humanos. ONU, 1948.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração de Sala-
manca: Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das Necessidades
Educativas Especiais. ONU, 1994.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Convenção sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência. ONU, 2006.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Agenda 2030 para o
Desenvolvimento Sustentável/Agenda Pós-2015. ONU, 2015.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração de In-
cheon: Educação 2030: Rumo a uma Educação de Qualidade Inclusiva
e Equitativa e à Educação ao Longo da Vida para Todos. ONU, 2015.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A
CIÊNCIA E A CULTURA. Relatório da Comissão Internacional sobre
os Futuros da Educação – Reimaginar nossos futuros juntos: um novo
contrato social da educação. UNESCO, 2022.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE (OMS). Relatório
Mundial sobre a Deficiência. OMS, 2004.

27
Autora
Daniela Cristina Araújo

CAPÍTULO 2
A Educação inclusiva nas creches: uma
discussão necessária
Capítulo 2: Educação inclusiva nas creches: uma discussão necessária

INTRODUÇÃO
A Educação Infantil, segundo o artigo 29, da Lei de Diretrizes e
Bases para a Educação, “tem como finalidade o desenvolvimento in-
tegral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psi-
cológico, intelectual e social, complementando a ação da família e
da comunidade”. Portanto, é preciso analisar como se constituem os
processos de ensino e aprendizagem no cotidiano das creches para
os alunos de 0 a 3 anos, público alvo da Educação Especial, visto
que, ainda são escassas pesquisas científicas nessa temática.
A problemática da pesquisa se desenvolve a partir da hipóte-
se de que o atendimento nas, creches, às crianças, público alvo da
Educação Especial possui viés assistencialista, focada no cuidar, en-
quanto a parte pedagógica não satisfaz os objetivos esperados para
essa etapa da educação. A partir desses pressupostos, fez-se necessá-
rio coletar dados que validasse a pesquisa através da observação do
cotidiano de um aluno diagnosticado com Transtorno do Espectro
do Autismo (TEA) de três anos, na turma do maternal II, no CESEI
Dona Imaculada Chaves, creche da rede pública municipal da cida-
de de Campos Gerais/MG.
As observações realizadas foram analisadas criticamente utili-
zando como fundamentação teórica os textos legais: Lei de Diretri-
zes e Bases da Educação (Lei 9.394/96), as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil (Brasil, 1998) e a Política Na-
cional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva
(2008). Esses documentos permitiram uma ampla visão de como se
deve realizar o atendimento aos alunos de 0 a 3 anos com necessi-
dades educacionais específicas e do quão desafiadoras são as barrei-
ras a serem superadas para se obter uma educação de qualidade.
Práticas educativas no cotidiano da creche: pontes ou muros?
Para fins de compreender o atual cenário da Educação Infantil
no Brasil, é necessária uma análise dos seus principais documentos

29
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

legais com ênfase na perspectiva da educação inclusiva e na concep-


ção de criança descrita nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil (DCNEI):
“Sujeito histórico e de direitos que, nas intera-
ções, relações e práticas cotidianas que viven-
cia, constrói sua identidade pessoal e coletiva,
brinca, imagina, fantasia, deseja, aprende, ob-
serva, experimenta, narra, questiona e constrói
sentidos sobre a natureza e a sociedade, produ-
zindo cultura.” (Brasil, 2010).

Nesse sentido, a criança é um ser social que possui característi-


cas e demandas específicas para sua faixa etária e se relaciona com o
ambiente em que vive, assimilando e produzindo cultura, indepen-
dente de suas condições físicas, cognitivas, étnico-racial, financeira
e cultural. Portanto, já na Constituição Federal de 1988, o artigo 208
fala que “o dever do Estado com a educação será efetivado mediante
a garantia de atendimento educacional especializado aos portadores
de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”.
O direito a educação especial e inclusiva representa uma vitória
histórico-cultural sob a discriminação e o preconceito para com as
pessoas com necessidades educacionais específicas. Acolher à diver-
sidade com qualidade e eficiência requer a parceria entre o Estado,
a escola e a família, visto que são muitas barreiras a serem supera-
das diariamente para que a inclusão aconteça de forma respeitosa
para com as individualidades de cada criança.
A Educação Infantil é fundamental no processo de formação
humana e, segundo as DCNEI, tem como eixos estruturantes “as
interações e as brincadeiras”. Portanto, o trabalho pedagógico reali-
zado, nas creches, deve oportunizar, constantementecondições para
que toda criança, independente de suas características específicas,
possa se relacionar com seus pares e se constituir como sujeito pro-
tagonista nas relações sociais e no seu próprio desenvolvimento.

30
Capítulo 2: Educação inclusiva nas creches: uma discussão necessária

Atualmente, as creches lutam para ultrapassar os limites histó-


ricos do assistencialismo e se firmar como instituição educativa e
muito já foi alcançado como a construção de um currículo específi-
co e a sua inserção nas políticas públicas de manutenção e financia-
mento. No entanto, apesar das Secretarias Municipais de Educação
exigirem a formação em Pedagogia ou cursos de especialização dos
profissionais em exercício, essa formação por si só, é incapaz de sa-
tisfazer as novas demandas do ensino inclusivo e da diversidade do
público.
A Secretaria Municipal de Educação de Campos Gerais abre
editais para contratar os assistentes de aluno que irão acompanhar
os alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimen-
to e altas habilidades/superdotação, nas creches, sendo necessário
que esses profissionais tenham formação em Pedagogia ou curso de
especialização em educação especial com carga horária mínima de
cento e oitenta horas. Esses profissionais acompanham o aluno em
todas as suas atividades em sala, adaptam as atividades e elaboram
seu Plano de Desenvolvimento Individual (PDI).
Essa realidade nos impulsiona a questionar se esses profissio-
nais são capazes de adaptar esses planejamentos com rigor de modo
que possam realmente proporcionar a experiência necessária, visto
que, na educação infantil, os objetivos são estabelecidos de acordo
com os campos de experiências. Outra questão de fundamental re-
levância para esse estudo é se esses profissionais estão aptos a regis-
trar as aprendizagens e desenvolvimento dos alunos com fidedigni-
dade.
De acordo com a Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva “para atuar na educação especial,
o professor deve ter como base da sua formação, inicial ou conti-
nuada, conhecimentos gerais para o exercício da docência e conhe-
cimentos específicos na área” (Brasil, 2008). Assim sendo, conside-
rando a realidade observada, verifica-se que a responsabilidade pelo
trabalho pedagógico é tanto do professor regente quanto do assis-
tente do aluno.

31
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

A Política também estabelece que


Do nascimento aos três anos, o atendimento
educacional especializado se expressa por meio
de serviços de intervenção precoce que objeti-
vam otimizar o processo de desenvolvimento e
aprendizagem em interface com os serviços de
saúde e assistência social. (BRASIL, 2008)

Mediante essa definição, em conversa com a assistente do alu-


no com TEA, sobre os desafios e as potencialidades da educação es-
pecial nessa etapa como “intervenção precoce”, ela diz:

da mesma forma que um aluno não atípico


tem um professor formado dentro da sala para
lhe ensinar, o aluno com deficiência, transtor-
nos globais do desenvolvimento e altas habi-
lidades/ superdotação, também tem o direito
de ter um assistente preparado para auxiliá-lo.
(Laís Borges, estagiária e graduanda em Peda-
gogia).

O acompanhamento das atividades adaptadas pela assistente


Laís demonstrou uma dedicação ímpar na busca pelo interesse e
participação do aluno com TEA, pois além do cuidado em tornar
todas as atividades concretas, ela lida com muita paciência com as
limitações do cotidiano. Ela sempre apresenta várias alternativas
diferentes para atingir um mesmo objetivo e ele escolhe a ativida-
de que será feita, pois ela reconhece que “é no tempo dele e não no
meu”.
As práticas educativas, nas creches, com foco na educação in-
clusiva precisam ser capazes de atender as necessidades educacio-
nais específicas dos alunos, oferecendo-lhes condições de se de-
senvolverem de forma significativa e autônoma. Nesse sentido,
destaca-se a formação continuada como um instrumento que cons-
trói pontes para que o aluno obtenha seu direito ao desenvolvimen-

32
Capítulo 2: Educação inclusiva nas creches: uma discussão necessária

to pleno e torna a diversidade com um campo de infindáveis possi-


bilidades de aprendizagem e cidadania.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa possibilitou a percepção de que uma prática edu-


cativa de qualidade com foco nas potencialidades da criança con-
tribui efetivamente para sua aprendizagem e desenvolvimento, pois
a creche é um espaço facilitador das interações e valioso na cons-
trução da autonomia, da tolerância e da diversidade. Nesse sentido,
torna-se de fundamental relevância que o corpo docente seja capa-
citado para proporcionar uma educação significativa que valorize a
criança como ser social e de direitos.
A pesquisa revelou relativa escassez de pesquisas científicas a
respeito dessa problemática, porém considerando a expansão de
matrículas de crianças público alvo da educação especial nas cre-
ches, essa realidade tende a mudar rapidamente.

REFERÊNCIAS
LDB – Lei n°9394/96, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretri-
zes e Bases da Educação Nacional. Brasília: MEC, 1996. BRASIL.

Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretrizes Cur-


riculares Nacionais para a Educação Infantil / Secretaria de Educação
Básica. – Brasília: MEC, SEB, 2010.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do


Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidente da República, [2016].

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial


(SEESP). Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva. Brasília: MEC/SEESP, 2008.

33
Autora
Nayara Barbosa de Almeida

CAPÍTULO 3
A acessibilidade em cursos EAD:
audiodescrição em foco
Capítulo 3: A acessibilidade em cursos EAD: audiodescrição em foco

INTRODUÇÃO
Atualmente encontramo-nos em uma sociedade onde o campo
tecnológico desenvolveu-se vertiginosamente, novas técnicas foram
aperfeiçoadas com o intuito de facilitar as práticas cotidianas. Tais
avanços alcançaram diversos setores da sociedade, sendo o meio
educacional um dos beneficiários desse desenvolvimento.
A Educação a distância, a EAD, por exemplo, foi impulsiona-
da a partir da utilização de tecnologias que diminuíram distâncias
espaço-temporais, promovendo uma verdadeira democratização
e flexibilização do ensino a uma população, até então, excluída do
acesso à educação presencial (DOS SANTOS, et al, 2021). Sob essa
perspectiva, o Decreto nº 5.622, de 19 de dezembro de 2005, que
regulamenta o Ensino a Distância no país, em seu artigo 1º, define,
Art. 1º Para os fins deste Decreto, caracteriza-
-se a educação a distância como modalidade
educacional na qual a mediação didático-pe-
dagógica nos processos de ensino e aprendiza-
gem ocorre com a utilização de meios e tec-
nologias de informação e comunicação, com
estudantes e professores desenvolvendo ativi-
dades educativas em lugares ou tempos diver-
sos. (BRASIL, 2005).

Desse modo, para a consolidação e oferta da Educação a Dis-


tância são utilizadas, pelas Instituições de Ensino, diversas platafor-
mas digitais. Nelas abrigam-se os Ambientes Virtuais de Aprendi-
zagem (AVA), que são normalmente organizados e equipados com
“recursos de comunicação, trabalho colaborativo, elaboração de
atividades individuais e em grupo, além do gerenciamento escolar.”
(DOS SANTOS, et al, 2021, p.2)
Em se tratando da EAD, no contexto da Educação Inclusiva, é
possível afirmar que, dada a sua dinamicidade, essa modalidade de
ensino apresenta-se com grande potencialidade para a efetivação

35
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

do direito à educação, atuando como uma importante ferramen-


ta na inclusão de pessoas com necessidades específicas. Para tanto,
devem ser observadas minimamente as condições de acessibilida-
de possíveis para esses ambientes uma vez que a acessibilidade no
meio educacional é capaz de auxiliar além das pessoas com defi-
ciência, mas também estudantes com déficit de atenção, aprendiza-
gem entre outros. (LIMA, et.al, 2018)
Nesse sentido, este resumo busca relatar a experiência da uti-
lização do recurso de audiodescrição destinado a pessoas com de-
ficiência visual no curso de Educação Infantil: práticas voltadas
para bebês e crianças - público da educação especial, ofertado na
modalidade EAD pelo Instituto Federal do Norte de Minas Gerais
e financiado pela Rede de Formação de Professores da Educação
Básica do MEC. Tem como objetivos ainda, descreveras possibilida-
des da audiodescrição nos Ambientes de Aprendizagem, estimular a
prática da audiodescrição como ferramenta de uso continuado den-
tro das instituições, refletir sobre a importância da acessibilidade
nos ambientes virtuais de ensino.

ANÁLISE E DISCUSSÃO

Considerando os artigos dispostos na Lei Brasileira de Inclu-


são (2015) sobre o acessoà informação e a comunicação nos meios
digitais das Instituições de Ensino público, torna-se necessário
compreender os aspectos legais que regem as disposições de recur-
sos de acessibilidade ou meios para se fazê-lo, sendo eles:
Art. 63. É obrigatória a acessibilidade nos sítios
da internet mantidos por empresas com sede
ou representação comercial no País ou por ór-
gãos de governo, para uso da pessoa com defi-
ciência, garantindo-lhe acesso às informações
disponíveis, conforme as melhores práticas e
diretrizes de acessibilidade adotadas interna-
cionalmente.

36
Capítulo 3: A acessibilidade em cursos EAD: audiodescrição em foco

§ 1º Os sítios devem conter símbolo de acessi-


bilidade em destaque.

Art. 67. Os serviços de radiodifusão de sons


e imagens devem permitir o uso dosseguintes
recursos, entre outros:

III - audiodescrição.

Art. 70. As instituições promotoras de con-


gressos, seminários, oficinas e demais eventos
de natureza científico-cultural devem oferecer
à pessoa com deficiência, no mínimo, os recur-
sos de tecnologia assistiva previstos no art. 67
desta Lei.

Art. 71. Os congressos, os seminários, as ofi-


cinas e os demais eventos de natureza cientí-
fico-cultural promovidos ou financiados pelo
poder público devem garantir as condições de
acessibilidade e os recursos de tecnologia as-
sistiva.

Art. 73. Caberá ao poder público, diretamente


ou em parceria com organizações da sociedade
civil, promover a capacitação de tradutores e
intérpretes da Libras, de guias intérpretes e de
profissionais habilitados em Braille, audiodes-
crição, estenotipia e legendagem.

Nota-se que a disponibilização de tais recursos de acessibili-


dade nada mais é do que o cumprimento da legislação estabelecida
para esses fins, garantindo o pleno acesso às informações e conteú-
dos ofertados pelas instituições públicas de ensino. Em se tratando
da audiodescrição, de acordo com Mota (2016), pode ser definida
como um recurso que traduz o visual em verbal, capaz de ampliar
a compreensão das pessoas com deficiência visual em todos os con-
textos ao qual estejam inseridos.

37
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

A audiodescrição pode ainda beneficiar outros públicos como


pessoas com deficiência intelectual, idosos, pessoas com déficit de
atenção, autistas disléxicos e outros. Além disso, possibilita o ple-
no acesso desse público à “cultura e informação contribuindo para a
inclusão cultural, social e escolar.” (MOTA, 2016, p.2)

No curso em questão, disponibilizou-se a audiodescrição das


imagens presentes no ambiente virtual de aprendizagem e nos ma-
teriais disponibilizados pelos professores do curso que continham
fotografias ou imagens essenciais para a compreensão do conteúdo.
Foram realizadas ainda descrições dos vídeos ao qual faziam parte
do material didático e durante as reuniões, aulas e lives ao vivo. Os
profissionais do curso e convidados eram orientados a realizarem a
autodescrição.

No início das aulas, ainda durante as reuniões de formação fo-


ram dadas breves orientações aos tutores e docentes sobre a audio-
descrição e como esta estaria presente durante o curso, as possibili-
dades da utilização dessa prática no AVA e estímulo para criação de
uma cultura de uso da audiodescrição em todos os contextos possí-
veis do curso. Em outros momentos, durante o curso, tais informa-
ções e orientações sempre eram reiteradas durante os encontros de
formação dos profissionais que nele atuavam.

No ambiente de aprendizagem, a audiodescrição era precedida


pelo símbolo oficial da audiodescrição formado pelas letras A e D
maiúsculas, ao lado, dois parênteses, todos na cor preta. Junto ao
símbolo eram sempre inseridas as seguintes identificações: Audio-
descrição ou #pratodosverem.

38
Capítulo 3: A acessibilidade em cursos EAD: audiodescrição em foco

IMAGEM 1 – Foto da tela do AVA do curso com uma imagem de


um bebê e descrição abaixo.

IMAGEM 2 – Foto da tela do AVA do curso com uma


imagem de crianças e descrição abaixo.

Nos vídeos, foram feitas as descrições de todo o contexto apre-


sentado e havendo possibilidade, foram editados e as descrições in-
cluídas no próprio vídeo durante as pausas entre as falas ou nar-
rações, através do aplicativo editor de vídeo CapCut, onde eram
inseridos os textos descritivos e feita a conversão do texto em fala
através de um sintetizador de voz disponível no próprio aplicativo.
Caso não houvesse fala ou narração, permanecia apenas a voz com
a audiodescrição. Nos vídeos em que não era possível acrescentar as
audiodescrições, estas foram realizadas em forma de texto e dispo-
nibilizadas no AVA.

39
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Para os demais conteúdos que continham fotografias ou ima-


gens, foram feitas as descrições de cada um dos itens em um docu-
mento com a identificação do conteúdo e o número da página em
que se encontrava a imagem, e disponibilizado para os alunos à par-
te na plataforma.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo em vista a importância da inclusão das pessoas com de-


ficiência nos diversos sistemas e modalidades de ensino, torna-se
estritamente necessário o devido estabelecimento de ações e práti-
cas que proporcionem o desenvolvimento e constante integralização
deste público nestas instituições de ensino. Percebe o quão neces-
sário e importante torna-se as mudanças de perspectivas e nos pa-
drões de ensino que possam dar espaço a uma nova cultura educa-
cional nestes ambientes virtuais de aprendizagem.
Assim, conclui-se que a utilização da audiodescrição nos am-
bientes de ensino podem ainda possibilitar boas experiências tanto
aos profissionais da educação quanto aos alunos com necessidades
específicas, uma vez que tais ações de inclusão proporcionam sem-
pre um constante aprendizado a todos os envolvidos.

REFERÊNCIAS
Brasil. Decreto nº 5.622, de 19 de dezembro de 2005. Regulamenta a
EAD. Brasília, 2005.

BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de


Inclusão. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015

-2018/2015/Lei/L13146.htm . Acesso em: 06 jul. 2023.

40
Capítulo 3: A acessibilidade em cursos EAD: audiodescrição em foco

DOS SANTOS, C. E. R. et al. Acessibilidade Digital em Ambientes Vir-


tuais de Aprendizagem: uma Revisão Sistemática. EaD em Foco, v. 11,
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2018. v. 4.

MOTTA, L.M.V.M. (2016). A Audiodescrição na escola: abrindo cami-


nhos para leitura de mundo. Disponível em: http://www.vercompala-
vras.com.br/pdf/a-audiodescricao-naescola.pdf Acesso em 06 de jul 2023.
http://www.vercompalavras.com.br/pdf/a-audiodescricao-naescola.pdf

SILVA, M. T. R.; VENTURA, A. C. . A democratização do ensino nos


Institutos Federais de Educação, Ciências e Tecnologia: um modelo de
análise da qualidade da Educação a Distância. CADERNOS DE CIÊN-
CIAS SOCIAIS APLICADAS (UESB), v. Ano XIV, p. 1- 15, 2017

41
Autor
Ricardo Eleutério dos Anjos

CAPÍTULO 4
A teoria da periodização do desenvolvimento
psicológico: contribuições à educação escolar
Capítulo 4: A teoria da periodização do desenvolvimento psicológico: contribuições à
educação escolar

INTRODUÇÃO
Apesar da interdependência entre Psicologia e Pedagogia, é
fundamental ressaltar que essa relação não deve anular a distinção
significativa entre essas duas áreas do conhecimento. Cada uma
possui sua própria área de estudo, e a natureza dessa relação
baseia-se na premissa de que o que é objeto de estudo de uma
dessas ciências emerge como condição na outra (RUBINSTEIN,
1976). Dessa forma, a Psicologia concentra-se no estudo do
psiquismo e de seu desenvolvimento, enquanto os processos de
ensino e aprendizagem são identificados como condições para
esse desenvolvimento. Por outro lado, a Pedagogia direciona seu
foco para o processo de ensino e aprendizagem, sendo que o
conhecimento do desenvolvimento psicológico é considerado como
condição para o trabalho educativo.
O autor supracitado defende que a Psicologia deve permane-
cer no âmbito de seu objeto de estudo e que sua contribuição para
a educação escolar será ainda mais significativa à medida que se
aprofundar no estudo do psiquismo. Assim, a Pedagogia receberá
um aporte ainda mais substancial da psicologia quando esta se de-
senvolver em seu conteúdo específico e próprio. Destarte, o objetivo
deste texto é que professores e professoras tenham em mãos aportes
teóricos que não apenas descrevam como são as crianças e os ado-
lescentes, mas, sobretudo, trazer uma reflexão sobre o vir a ser de
sua formação.
A teoria da periodização do desenvolvimento psicológico
O desenvolvimento psicológico mantém uma estreita relação
com as condições objetivas da organização social. Segundo Leon-
tiev (2014), a vida da criança exerce um papel determinante nesse
processo, uma vez que sua posição nas relações humanas é influen-
ciada pelas circunstâncias concretas que a cercam. A relação entre
a criança e a sociedade se estabelece por meio de sua atividade, tor-

43
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

nando crucial a análise do conteúdo dessa atividade e de como ela é


moldada pelas condições de vida.
Essa análise concentra-se em determinados tipos de atividades
que são especialmente relevantes para o desenvolvimento em perío-
dos específicos, conhecidas como atividades dominantes ou ativida-
des-guia. A atividade-guia não necessariamente ocupa a maior par-
te do tempo do indivíduo, mas é aquela na qual ocorrem processos
psíquicos que preparam a transição da criança para um nível mais
elevado de desenvolvimento. Com base em Leontiev (2014), essa
atividade tem três características importantes: gera novas e mais
complexas atividades, promove a organização e reorganização dos
processos psíquicos e tem um impacto significativo nas principais
mudanças da personalidade do indivíduo.
Elkonin (2012) identificou três épocas no desenvolvimento hu-
mano: primeira infância, infância e adolescência. Em cada época,
há dois períodos interligados. No primeiro período, ocorrem ati-
vidades no sistema “criança-adulto social”, com foco nos sentidos
fundamentais e na assimilação de objetivos e normas das relações
interpessoais. O segundo período envolve atividades no sistema
“criança-objeto social”, caracterizado pela assimilação de objetos e
procedimentos elaborados socialmente. Cada período é marcado
por uma atividade-guia: comunicação emocional direta, manipula-
ção objetal, jogos de papéis, atividade de estudo, comunicação ínti-
ma pessoal e atividade profissional/de estudo.
A comunicação emocional direta desempenha um papel cru-
cial no desenvolvimento psicológico durante o primeiro ano de vida
da criança. Nesse período, o adulto facilita o contato da criança com
a realidade, estimulando sua interação com os objetos e contribuin-
do para o desenvolvimento das habilidades sensoriais, motoras e
emocionais. No segundo período da primeira infância, a atividade
de manipulação objetal possibilita a redefinição da relação da crian-
ça com o ambiente, enfatizando a função social e o modo de uso
estabelecido pela sociedade. Essa atividade prepara o terreno para
a próxima atividade, o jogo de papéis, que se baseia no desenvolvi-

44
Capítulo 4: A teoria da periodização do desenvolvimento psicológico: contribuições à
educação escolar

mento anterior da criança em colaboração com os adultos (ELKO-


NIN, 2012).
Na época da infância, a criança, embora esteja exposta ao mun-
do da atividade e das relações sociais, ainda não pode participar
diretamente das atividades dos adultos. No primeiro período dessa
época, ela busca imitar as atividades dos adultos por meio do jogo
de papéis, que reflete a realidade ao seu redor. O jogo de papéis so-
ciais contribui para o desenvolvimento da personalidade, do auto-
domínio da conduta e da criatividade da criança (LEONTIEV, 2014;
ELKONIN, 2012). No segundo período dessa época do desenvolvi-
mento psicológico, a atividade de estudo caracteriza-se pela aquisi-
ção das objetivações genéricas não cotidianas, como a ciência, a arte
e a filosofia. No entanto, essa atividade pode ser alienada tanto pelo
empobrecimento dos conteúdos estudados, que ocorre nas orienta-
ções curriculares que restringem o conhecimento escolar aos limi-
tes do cotidiano naturalizado, quanto pelas estratégias educativas
adotadas, muitas vezes inspiradas pelas pedagogias do aprender a
aprender, que enfatizam negativamente as ações de ensino sistema-
tizado (DUARTE, 2013).
Quando as condições materiais favorecem a apropriação dos
conteúdos não cotidianos, elas se tornam mediações nas relações
que o adolescente estabelece com seus pares, caracterizando a ativi-
dade de comunicação íntima pessoal. Nessa atividade, surgem pers-
pectivas sobre a vida, o futuro e as relações humanas, e a autocons-
ciência se desenvolve como uma consciência social internalizada.
A partir dessa comunicação íntima pessoal, surgem novas tarefas e
motivações que se transformam em atividades direcionadas para o
futuro, como a atividade profissional/de estudo. Essa atividade con-
siste na preparação para a futura atividade de trabalho, onde a apro-
priação dos conteúdos sistematizados desempenha um papel deci-
sivo. Ao assimilar os resultados do trabalho social, o indivíduo se
prepara para sua própria atividade de trabalho.

45
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Nesse sentido, defendemos que o maior desafio da educação


escolar de adolescentes é o de conseguir, e ao mesmo tempo, prepa-
rar para a atuação no mundo do trabalho e não limitar a formação
do indivíduo a um processo de adaptação a esse mercado, à lógica
do capital e à ideologia burguesa. Limitar a educação a uma mera
adaptação ao mercado de trabalho seria abdicar da luta pela supera-
ção da sociedade capitalista, da divisão social do trabalho e da alie-
nação. Uma educação voltada ao desenvolvimento omnilateral dos
estudantes deve se posicionar criticamente em relação à lógica do
capital e criar neles a necessidade de apropriação dos conteúdos ar-
tísticos, filosóficos e científicos em suas formas mais desenvolvidas
(ANJOS, 2023).

A teoria da periodização como um plano de desenvolvimento


humano
Defendemos a tese de que a teoria da periodização é um pla-
no de desenvolvimento psicológico que tem a atividade de trabalho
como ponto de partida e ponto de chegada. No âmbito da educa-
ção escolar, o ponto de partida se refere ao trabalho educativo que
proporciona à criança e ao adolescente o acesso às atividades-guia
necessárias para a formação da atividade consciente adulta, que é o
objetivo final. A teoria da periodização é um projeto de formação
humana que oferece orientações para uma educação desenvolvente.
Nossa análise considera essa teoria como um plano de desenvolvi-
mento psicológico que tem o trabalho como fio condutor e como
o objetivo último do processo de formação omnilateral (ANJOS,
2023).
Ao defender a periodização do desenvolvimento psicológico
como uma teoria, isso quer dizer que a criança ou o adolescente não
estão em uma ou outra atividade-guia, pelo contrário, é o trabalho
educativo que deve produzir necessidades de determinadas ativida-
des que possibilitam o desenvolvimento do aluno. Essa teoria, por-
tanto, não é uma classificação para identificarmos em qual período

46
Capítulo 4: A teoria da periodização do desenvolvimento psicológico: contribuições à
educação escolar

a criança está, mas sim, um projeto de formação humana que tem


como meta a atividade de trabalho e o desenvolvimento do ser hu-
mano em suas máximas possibilidades.
Elkonin (1960) assevera que o desenvolvimento psicológico
não é um fenômeno natural, mas sim, um processo histórico deter-
minado pelas condições concretas de vida, de atividade e de edu-
cação. Dessa forma, as capacidades humanas são engendradas em
decorrência da atividade e tais estruturas podem não se formar se
certas atividades não existirem para uma determinada pessoa.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, afirmamos que a teoria da periodização
do desenvolvimento psicológico contribui para a educação escolar,
desde que seja abordada a partir da mediação com uma teoria pe-
dagógica. A elaboração de projetos político-pedagógicos, a constru-
ção de um currículo comum e a pesquisa em educação devem con-
siderar a educação como ponto de partida e de chegada. Em vez de
abordar a educação com base em critérios psicológicos, sociológi-
cos etc., é necessário avaliar as contribuições dessas diferentes áreas
a partir da problemática educacional (SAVIANI, 2013).
Os aportes teóricos da psicologia, de modo algum, devem ser
reduzidos a um receituário ou mera resolução de problemas isola-
dos atinentes aos processos pedagógicos. Destarte, a utilização da
teoria da periodização do desenvolvimento psicológico deve ser de-
pendente da natureza dos problemas enfrentados na práxis pedagó-
gica, superando, assim, o psicologismo do processo educativo.

47
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

REFERÊNCIAS
ANJOS, R. E. A teoria da periodização do desenvolvimento psicológico
e sua contribuição à educação escolar de adolescentes. In: FACCI, M.
G. D.; LEONARDO, N. S. T.; FRANCO, A. F. (Orgs.). Implicações da
periodização desenvolvimento humano para a prática pedagógica: em
destaque a psicologia histórico-cultural. Paranavaí: EduFatecie, 2023, p.
234-279.

DUARTE, N. A individualidade para-si: contribuições a uma teoria


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res Associados, 2013.

ELKONIN, D. B. Desarrollo psíquico de los niños. In: SMIRNOV, A. A.


et al. Psicología. México: Grijalbo, 1960. p. 493-559.

ELKONIN, D. B. Enfrentando o problema dos estágios no desenvolvi-


mento mental das crianças. Educar em Revista, n. 43, p. 149-172, 2012.

LEONTIEV, A. N. Uma contribuição à teoria do desenvolvimento da


psique infantil. In: VIGOTSKII, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A.
N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 13. ed. São Paulo: Íco-
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RUBINSTEIN, S. L. Problemas de psicología general. México:
Grijalbo, 1976.
SAVIANI, D. Educação: do senso comum à consciência filosófica.
19. ed. Campinas: Autores Associados, 2013.

48
Autora
Maria Fernanda Celli de Oliveira

CAPÍTULO 5
Desenvolvimento da criança: algumas
aproximações entre a neurociência e a
Educação Infantil
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

INTRODUÇÃO

É fato que o desenvolvimento infantil tem se tornado um


tema que desperta cada vez mais o interesse das pessoas, tanto
no meio educacional, quanto na sociedade em geral. As diversas
modificações na estrutura social, bem como, os impactos que
a tecnologia promove nos processos educacionais também
ganharam ainda mais espaço, sobretudo, no período durante
e pós-pandêmico. Com a necessidade de educar as crianças e
adolescentes em casa, surgiu também a iminência em compreender
o processo de desenvolvimento dos indivíduos em seus múltiplos
aspectos.
Nesse sentido, o presente estudo visa apresentar de maneira
introdutória, como a neurociência pode contribuir efetivamente
para os processos de desenvolvimento infantil de crianças em fase
de Educação Infantil, estabelecendo possíveis relações entre a neu-
rociência e a teoria da psicologia histórico-crítica desenvolvida por
Vigotski. Para isso, o trabalho bibliográfico de caráter qualitativo
(GIL, 2008), apresenta-se em três principais partes. A primeira traz
uma contextualização geral acerca da neurociência e de suas contri-
buições para a educação. A segunda fala acerca do desenvolvimento
infantil, focando na teoria histórico-cultural e primeiras aproxima-
ções com a neurociência. E a terceira, em forma de considerações
finais, busca apresentar, de maneira reflexiva, as possíveis contribui-
ções da neurociência para o desenvolvimento da criança em fase de
Educação Infantil como alternativa pertinente para pensarmos em-
prática pedagógica.

Neurociência e Educação: primeiras aproximações


Mas afinal de contas, o que é neurociência? Segundo Moraes e
Miranda (2018), a neurociência é a ciência responsável pelo estudo
do cérebro, dos nervos periféricos e da medula espinhal. Os autores

50
Capítulo 5: Desenvolvimento da criança: algumas aproximações entre a neurociência e a
Educação Infantil

supracitados citam Tabacow (2011), para afirmar que, por tratar-se


de uma vasta e complexa área de estudo, esta se divide em:
Neuropsicologia: esta parte estuda a interação
que há entre as ações dos nervos e as funções
ligadas à área psíquica. Neurociência cogniti-
va: este campo foca na capacidade cognitiva
(conhecimento) do indivíduo, como o raciocí-
nio, a memória e o aprendizado. Neurociência
comportamental: quem segue esta linha pro-
cura estabelecer uma ligação entre o contato
do organismo e seus fatores internos (emo-
ções e pensamentos) ao comportamento visí-
vel, como a forma de falar, de se postar e até
mesmos os gestos usados pela pessoa. Neuroa-
natomia: uma das partes mais complexas da
neurociência, ela tem por objetivo compreen-
der toda a estrutura do sistema nervoso. Com
isso, o estudioso precisa separar o cérebro, a
coluna vertebral e os nervos periféricos exter-
nos para analisar cada item com muita cautela
a fim de compreender a respectiva função de
cada parte e nomeá-la. Neurofisiologia: por
último, mas não menos importante, temos a
neurofisiologia, que estuda as funções ligadas
às várias áreas do sistema nervoso. (MORAES;
MIRANDA, 2018, p. 102).

Vale ressaltar que, embora essas divisões estejam todas inter-


ligadas, o que nos interessa especificamente é a neurociência cog-
nitiva, uma vez que pretendemos identificar como a neurociência
pode contribuir de maneira significativa para o desenvolvimento
do indivíduo, focando na renovação teórica que esta pode oferecer
à formação docente, calcada na compreensão da complexidade dos
processos de aprendizagem. (CARVALHO, 2010).

51
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Conforme as palavras de (RATO; CALDAS, 2010, p. 627):


[...] a neurociência dentro do processo de
aprendizagem de maneira geral estuda um cé-
rebro e como ele aprende buscando as respostas
dentro das diversas combinações neurais, que
estimulam este processo além de possibilita-lo.

Ao afirmarmos que a neurociência é a responsável pelo estu-


do do cérebro e como ele aprende (MORAES; MIRANDA, 2018;
CARVALHO, 2010; RATO; CALDAS, 2010), estamos abrindo os
olhos para novas maneiras de pensar no desenvolvimento, focando
principalmente nas inúmeras possibilidades de estímulo e respostas
que se pode obter, através do conhecimento das estruturas neurais.
Isso muda o modo como enxergamos o desenvolvimento e ajuda a
repensar a prática pedagógica, focada na especificidade e funciona-
mento cerebral de cada indivíduo.
Parece óbvio estabelecer relações entre a neurociência e a edu-
cação, uma vez que uma possibilita o estudo do processo de apren-
dizagem, e a outra tem o ensino e o aprendizado como objetos
principais de sua atuação e reflexão. Mas porque isso não foi pen-
sado antes? Na realidade foi. Segundo Rato e Caldas (2010), desde
a década de 1960 vêm se tentando estabelecer conexões entre essas
duas áreas de conhecimento. Mas, a questão ainda gera discussões
e críticas de autores mais conservadores que enxergam a relação
como prematura. Todavia, com as descobertas das novas tecnolo-
gias, a chama que vê uma ligação inerente entre a neurociência e a
educação foi reacendida e, cada vez mais, é possível encontrar estu-
dos qualificados dedicados à compreensão e contribuição que uma
ciência pode oferecer a outra.

Desenvolvimento infantil típico e atípico: algumas considerações


Ao aprofundarmo-nos na teoria de Vigotski, identificamos em
sua abordagem, a análise complexa acerca do desenvolvimento hu-

52
Capítulo 5: Desenvolvimento da criança: algumas aproximações entre a neurociência e a
Educação Infantil

mano, apoiado nos aspectos histórico-culturais que o indivíduo se


apropria durante os processos de aprendizagem. Nesse contexto, os
conceitos desenvolvidos pelo autor servem como base para a prá-
tica de inúmeros(as) educadores(as) que veem a prática pedagógi-
ca como uma apropriação histórica e cultural dos conhecimentos
aprendidos e transmitidos pela humanidade, em outras palavras,
em uma dialética constante com o meio, sendo as formas superiores
do pensamento, internalizadas nas relações sociais e na acumulação
desses conhecimentos. (EMILIANO; TOMÁS, 2015; SILVA, 2012).
Diante dessa conjuntura, identificamos a utilização das obras
de Vigotski em muitos estudos da área da Pedagogia e da Sociolo-
gia, porém, o autor possui um arcabouço teórico que pode se cote-
jar à teorização da emoção e do cérebro e ainda, sobre a base ma-
terial da consciência, relacionando-os ao seu objeto de estudo, ou
seja, à Psicologia histórico-cultural permeada pelo materialismo
histórico-dialético. (SILVA, 2012).
Nesse sentido, propor uma relação entre a neurociência e a
psicologia histórico-cultural de Vigotski, apesar de ousada, confi-
gura-se como plausível, sobretudo, ao considerarmos os estudos já
realizados anteriormente pelo autor e seus colaboradores, conforme
salientado por Silva (2012, p. 24):
A proposta de que as funções psíquicas não se
localizam em áreas cerebrais estanques, mas
atuam muito mais como uma rede, envolven-
do a contribuição de diversas áreas cerebrais
de forma sistêmica, foi proposta por Vigotski
e desenvolvida por Luria.

Vale salientar que tanto Luria, quanto Leontiev, ambos perten-


centes ao grupo de Vigotski, salientaram a prevalência “[...] da ori-
gem social do psiquismo humano sobre o legado biológico” (SILVA,
2012, p. 24), o que implica dizer que, embora considerem as ques-
tões apontadas pela neurociência como plausíveis e pertinentes, en-
xergam nas relações com o meio e no conhecimento historicamente

53
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

construído, os pontos principais para o desenvolvimento do indiví-


duo. Mas como aproximar definitivamente essas duas teorias? Por
tratar-se de um texto com primeiras aproximações, seria impensá-
vel trazer respostas concluídas, mas o que se pode oferecer são al-
guns caminhos para permear algumas reflexões instigantes. Primei-
ro, pensar em uma dialética entre corpo biológico e interferência
cultural humana a partir de relações estabelecidas com a neurociên-
cia, é no mínimo, intrigante, sobretudo, se pensarmos especifica-
mente em crianças em fase de Educação Infantil, cujo desenvolvi-
mento apresenta um ritmo intenso e acelerado. E em segundo - não
menos importante e também não apresentada como questão final –
levando-se em consideração que a plasticidade neural se modifica à
medida que se desenvolvem novos conhecimentos (CARVALHO et
al., 2021), quais seriam as interferências e possibilidade que o meio,
ou seja, que as experiências dialéticas da criança com o conheci-
mento histórico-cultural poderiam oferecer?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base no exposto, é evidente destacar as inúmeras possi-


bilidades que a neurociência pode trazer à educação, em especial,
à Educação Infantil, sobretudo, quando pensamos no desenvolvi-
mento infantil como solo fértil para confirmações acerca de como o
cérebro aprende. Todavia, vale ressaltar que este trabalho traz algu-
mas questões iniciais, com o objetivo de propor novas discussões e
investigações que visem fomentar a relevância e concreta contribui-
ção da neurociência para a educação. As aproximações com a teoria
de Vigostski são uma provocação ao(a) leitor(a), com o objetivo de
pensar e estabelecer conexões que possam ser favoráveis ao desen-
volvimento das crianças, considerando dialeticamente seus aspectos
biológicos, históricos, culturais e sociais.

54
Capítulo 5: Desenvolvimento da criança: algumas aproximações entre a neurociência e a
Educação Infantil

De qualquer modo, não podemos deixar de afirmar que tanto


a educação quanto a neurociência possuem uma ligação indispen-
sável, sobretudo, no que se refere à necessidade de repensar a práti-
ca pedagógica, focada nos processos de desenvolvimento da crian-
ça, não somente respeitando suas peculiaridades e especificidades,
mas, além disso, valorizando-as, principalmente ao buscarmos no-
vas maneiras de ensinar e aprender todas as crianças consideran-
do a aprendizagem típica e atípica. Esse é o compromisso que nós,
educadores(as) devemos ter: sempre buscar meios de compreender
efetivamente os processos de aprendizagem, com o objetivo de pro-
piciar às nossas crianças, sem exceções, as melhores condições para
o seu desenvolvimento pleno e saudável.

REFERÊNCIAS
CARVALHO, Aline dos Santos Moreira de; FERREIRA, Liliane Musu-
meci; OLIVEIRA, Marta Martins de; PEREIRA, Pedro Carlos Pereira.
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55
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São


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MORAES, Elisangela Figueiredo; MIRANDA, Carlos Roberto. A neuro-


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2023.

56
Autor
Sandro Vinicius Sales dos Santos

CAPÍTULO 6
Especificidades do trabalho docente no
currículo da Educação Infantil
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

INTRODUÇÃO

O presente texto tem como objetivo apresentar algumas refle-


xões sobre os desafios inerentes à política curricular da Educação
Infantil que, no Brasil, organiza-se por campos de experiência. Nas
linhas que se seguem, gostaria de ressaltar duas características des-
se currículo: os direitos e os desejos de aprendizagem das crianças,
desde a mais tenra idade. Acredito que essa interface possa fornecer
elementos importantes para a docência com bebês, crianças bem
pequenas.
Para a realização dessa tarefa, apresento uma conhecida pas-
sagem de um texto de Jorge Larrosa, pedagogo e filósofo espa-
nhol, no qual afirma que as crianças são “seres estranhos dos quais
nada se sabe, esses seres selvagens que não entendem nossa língua”
(LARROSA, 2010, p. 183). As palavras de Jorge Larrosa, apesar de
soarem estranhas, parecem fazer algum sentido, pois ainda que
tenhamos um amplo acúmulo de saberes, de tecnologias e de con-
ceituações que nossa racionalidade historicamente produziu sobre
as crianças, o processo de institucionalização das infâncias, cada vez
mais acentuado e precoce, põe à prova algumas verdades didático-
-pedagógicas do campo da educação. Jorge Larrosa (2010) nos ins-
pira a olhar, pensar e tratar a infância e as crianças de outro modo,
por outros ângulos – inspiração essa presente na epígrafe, mas que
prosseguirá por toda a extensão do texto.
As discussões recentes sobre a implementação da Base Na-
cional Comum Curricular para a Educação Infantil (BNCC) têm
desvelado a nossa pouca compreensão sobre a proposição de um
currículo mais aberto e integrado ao contexto de vida das crian-
ças. As tensões em torno desse debate exemplificam como boa
parte do conhecimento produzido e difundido no campo pe-
dagógico sobre as infâncias é questionado, a partir do momen-
to em que a área da Educação da Criança de Zero a Seis Anos

58
Capítulo 6: Especificidades do trabalho docente no currículo da educação infantil

definiu, em diálogo com as instâncias governamentais responsáveis


pela educação brasileira, que o currículo de creches e pré-escolas
organizar-se à por campos de experiência.
É preciso considerar que a versão da BNCC, homologada
em 2017, apresentou inúmeras contradições e, sobremaneira,
desconsiderou o processo de construção coletiva que envolveu
profissionais, militantes, pesquisadores e intelectuais da área – o
que também não é de todo uma novidade, pois isso tem se tornado
comum na construção histórica da política curricular para a
Educação Infantil de nosso país.
Despeito dessas questões, ainda que tais incongruências
estejam presentes no texto da Base, no caso de creches e pré-escolas,
os campos de experiências constituem, ao mesmo tempo, o grande
diferencial e o grande desafio imposto pela construção de um cur-
rículo nacional. E mais: ainda que a política curricular de Educação
Infantil tenha sido “deturpada” por setores conservadores e com-
prometidos com o mercado econômico, a compreensão dos cam-
pos de experiência que constituem a Base pode se configurar como
estratégia de resistência em defesa dos direitos das crianças. Assim,
perceber a criança enquanto sujeito de experiências se configura
como um enigma a ser, pedagogicamente, decifrado.
De partida, precisamos considerar que, em nosso país, os estu-
dos sobre Educação Infantil, imbuídos do desejo de compreender e
sistematizar saberes e fazeres no âmbito da educação das crianças
de até seis anos, vem progressivamente construindo um campo teó-
rico que visa, dentre outras questões, desvelar enigmas em torno da
infância e de sua educação – que, em nossos tempos, a área da Edu-
cação da Criança de Zero a Seis Anos convencionou chamar de Pe-
dagogias da Infância e da Educação Infantil (ROCHA, 1999).
Diferentemente de outros campos do saber pedagógico, tais pe-
dagogias não tomam os conteúdos escolares como centro da ação
educativa, tampouco o fazer docente, mas as crianças e a integra-

59
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

lidade de seus processos de desenvolvimento que se tornam o foco


dessa Pedagogia (e desse currículo). Ou seja, enquanto campo de
produção de significados – premissa fulcral das teorias curriculares
– as Pedagogias da Infância produzem modos de subjetivação que
acabam por fabricar sujeitos do processo pedagógico, nesse caso, a
criança – sujeito histórico e cidadão de direitos – e o/a professor da
Educação Infantil – que atua na perspectiva de produzir uma ação
pedagógica, pautada na indissociabilidade entre o cuidado e a edu-
cação de modo a criar situações favoráveis ao desenvolvimento de
meninos e meninas, tendo como eixos transversais dessa proposta
as brincadeiras e demais interações de meninos e meninas.
Meu argumento é o de que, por mais que as instituições de
Educação Infantil estejam empenhadas em implementar a Base
Nacional Comum Curricular, por mais que os/as professores/as ex-
pressem preocupações no que concerne à reorganização dos tem-
pos, dos ambientes e das experiências a serem ofertadas às crianças
em função da BNCC – pouco avançaremos se, enquanto profissio-
nais de Educação Infantil, não produzirmos modos de nos aproxi-
mar, compreender e partilhar das experiências das crianças, desde
bebês. Dito de outro modo, é por meio da alteridade da infância
que produziremos campos de Experiência que possam, deveras,
contribuir para o desenvolvimento pleno das crianças. E mais: é por
meio da alteridade da infância que nos constituímos docentes de
bebês, crianças bem pequenas.
Feito esse preâmbulo, o texto está dividido em três seções. Na
primeira, busco revisitar a política curricular da Educação Infantil
como forma de evidenciar que não há muita novidade na proposta
dos campos de experiência, pois ela já estava presente nas Diretrizes
Curriculares nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 2009).
Em um segundo momento, apresentarei um excerto de cotidiano
vivido por mim na companhia de um grupo de bebês com pouco
mais de um ano de idade em uma instituição de Educação Infantil
de Belo Horizonte, Minas Gerais, como forma de apresentar uma

60
Capítulo 6: Especificidades do trabalho docente no currículo da educação infantil

inflexão para o campo: não temos de nos preocupar a priori com


os campos de experiências que devem (ou não) guiar as práticas de
cuidado e educação. Por meio da alteridade da infância, precisamos
construir formas de compreender os direitos e desejos de aprendi-
zagem das crianças. No epílogo, apresento algumas considerações
finais.

A política de Currículo da Educação Infantil

Em nosso país, o debate sobre a proposição de um currículo


para as instituições de Educação Infantil surge a partir da inserção
de creches e pré-escolas nos sistemas de ensino, processo concate-
nado com a emergência de uma nova doutrina jurídica em relação à
criança que, desde então, passa a concebê-la como cidadã de direi-
tos, desde o nascimento (CRAIDY, 2001). É a partir da Carta Cons-
titucional de 1988 que, no plano político, as crianças passam a ser
consideradas sujeitos que agem no e sobre o mundo, construindo
modos peculiares de apropriação da cultura.
Embora possa parecer que a discussão sobre o currículo da
Educação Infantil surge com a Base Nacional Comum Curricular,
existe um percurso de mais de vinte anos em que a área da Edu-
cação Infantil vem discutindo as possibilidades, ou não, de adoção
de uma proposta curricular condizente com as especificidades do
atendimento educacional de bebês e crianças pequenas em creches
e pré-escolas, hoje, instituições pertencentes ao campo da educação.
O debate sobre a proposição de um currículo nacional, para
creches e pré-escolas, começa a ser delimitado no Brasil, em 1994,
envolvendo o governo, a sociedade civil organizada e a comunidade
epistêmica da área. Os debates desse período ocorriam com
foco na elaboração de propostas curriculares para creches e pré-
escolas, sendo que, havia uma preocupação expressa pelo campo
de investigação sobre Educação Infantil em definir, dentre outras
questões, formas curriculares mais condizentes com o nível de
desenvolvimento das crianças. A título de exemplo, duas situações

61
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

são elucidativas do processo de construção coletiva que marca esse


período: uma delas é a série de documentos oficiais que discorre
sobre o tema em questão, os famosos “cadernos das carinhas” e a
outra é a pesquisa nacional sobre as propostas curriculares de
creches e pré-escolas das capitais dos estados brasileiros.
Essa pesquisa evidenciou que, apesar de as instituições
preterirem o termo currículo (assumindo outras nomenclaturas
para a organização do cotidiano: propostas pedagógicas, projeto
político pedagógico; grades de trabalho; plano de ação) já havia
uma preocupação da área com a organização das práticas de
cuidado e educação, mas que superasse a antiga dicotomia tutela
e/ou antecipação da escolarização. Isso demonstra que a área
da Educação Infantil, ao mesmo tempo em que reconhecia a
legitimidade de organização cotidiana das práticas de cuidado e
educação, buscava fazê-lo se afastando das visões historicamente a
elas associadas: as abordagens preparatórias/compensatórias e ou
assistencialistas (BRASIL, 2006).
Todo esse processo culmina, em 1998, na primeira tentativa
de construção de um currículo nacional para a Educação Infantil.
Na esteira da proposição dos PCNs (destinados aos Ensinos
Fundamental e Médio), de modo unilateral, não considerando
as discussões realizadas até aquele momento, o Ministério da
Educação (MEC) tentou por meios populistas, instituir um
currículo nacional para o trabalho com as crianças por meio da
publicação do Referencial Curricular Nacional da Educação Infantil
(RCNEI) – populista, pois, além de não considerar os pareceres
que a comunidade epistêmica vinha apresentando sobre o referido
documento, o ministério imprimiu e distribuiu uma tiragem
expressiva, espalhando esse documento por todos os rincões desse
país. Tal documento foi alvo de críticas por parte de intelectuais
e pesquisadores da área da Educação Infantil que apresentaram
pareceres contrários à sua publicação em função de seu caráter
conteudista e escolarizante. Isso fez com que o Conselho Nacional

62
Capítulo 6: Especificidades do trabalho docente no currículo da educação infantil

de Educação (CNE) publicasse o RCNEI como documento


consultivo e não como documento normativo – processo que
evidenciou uma descontinuidade na produção dos documentos
legais até então publicados pelo governo, que primavam pela
construção coletiva.
No final de 1998, o CNE apresentou as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) e, no início do ano
seguinte, aprovou a Resolução CEB n.º 1, de 7 de abril de 1999. É
preciso registrar que os movimentos em defesa da creche já eram
atuantes em nosso país desde o fim da década de 1960, no fim
dos anos de 1990, tais movimentos, diante do campo de ação que
aquele momento impunha, tiveram de se reorganizar, pois se antes
a luta era pelo reconhecimento do direito das crianças à creches e
pré-escolas, ao término dos anos de 1990, a luta era para que as
políticas educacionais implementadas não desconsiderassem
tais conquistas. É nesse momento que os fóruns de EI, até então
existentes, organiza-se nacionalmente e outros fóruns começam a
emergir, formando o MIEIB: Movimento Interfóruns de Educação
Infantil do Brasil.
Assim, após uma década de discussão coletiva que contou,
inclusive, com os movimentos sociais organizados em defesa da
Educação Infantil, as DCNEI foram ampliadas e revistas, sendo
republicadas em 2009. A revisão das Diretrizes possibilitou avançar
conceitualmente na compreensão do currículo para a Educação
Infantil, definindo-o como “[...] um conjunto de práticas que
buscam articular as experiências e os saberes das crianças com os
conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural, artístico,
científico e tecnológico” (BRASIL, 2009, p. 06). Esse documento
já previa que as propostas curriculares da Educação Infantil
poderiam se estruturar em “eixos, centros, campos ou módulos de
experiências” que devem evitar a mecanização e o enrijecimento
das rotinas das crianças (BRASIL, 2009, p.16).
Já nos anos de 2010, o processo de implementação da Base
Nacional Comum Curricular para a Educação Infantil (BNCC)

63
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

apresentou outro percurso tortuoso no que concerne à proposta


curricular para creches e pré-escolas. De um amplo processo de
debate e construção coletiva que se inicia em 2014, um grupo de
pesquisadores apresenta uma versão preliminar em 2015. Após
processo de consulta pública, no qual profissionais e militantes
puderam contribuir com o texto, uma nova versão acrescida
dessas contribuições foi apresentada em 2016. Contudo, após o
golpe impetrado contra Dilma Rousseff, em abril de 2017, uma
terceira versão foi apresentada pelo MEC que, ao desconsiderar o
processo de construção coletiva das versões anteriores, evidenciava
a intervenção de setores conservadores e comprometidos com o
mercado, com a pretensa desculpa de “corrigir” os rumos do que
vinha sendo feito e adequar a BNCC aos interesses ideológicos
dos novos ocupantes do ministério (CAMPOS e DURLI, 2020).
Importa considerar que a quarta versão da BNCC da Educação
Infantil foi homologada em 2018 se tornando proposta curricular
oficial, radicalizando, inclusive, as alterações da versão anterior e
rendendo-se ao mercado educacional.
Assim, as transformações presentes, nas quatro versões da
BNCC para a Educação Infantil, demonstram um compromisso
exacerbado das últimas gestões do MEC com concepções de currí-
culo e de educação derivadas de tendências tecnicistas e preparató-
rias. Desse modo, os direitos de aprendizagem têm dado lugar para
a noção de competências que se encontram diluídas “nos objetivos
de aprendizagem definidos para cada campo de experiência e faixas
etárias” (CAMPOS e DURLI, 2020, p. 257).
A despeito desse percurso tortuoso, paradoxalmente, a inser-
ção do currículo da Educação Infantil, na BNCC, é um avanço para
a área, pois ratifica a concepção de currículo prevista nas DCNEI
(BRASIL, 2009), definindo, de modo mais propositivo, a organiza-
ção de propostas curriculares que tomem o cotidiano como mote
do planejamento de situações que contribuam para o desenvolvi-
mento das crianças em sua integralidade. Assim, o texto da Base,

64
Capítulo 6: Especificidades do trabalho docente no currículo da educação infantil

dando forma ao que já havia sido preconizado pelas DCNEI consi-


dera que o currículo da Educação Infantil deve ser organizado por
Campos de Experiência, que são compreendidos como “[...] um ar-
ranjo curricular adequado à educação da criança de 0 a 5 anos e 11
meses quando certas experiências, por ela vivenciadas, promovem
a apropriação de conhecimentos relevantes” (BRASIL, 2016, p. 62).
Tal organização preconiza o contexto de vida das crianças, as
situações com as quais elas se deparam no cotidiano considerando-
-as molas propulsoras para novas experiências, desde que tal currí-
culo respeite as especificidades da infância. Compreende-se, assim,
que os campos não podem ser tratados como divisões de áreas ou
componentes curriculares, já que eles colocam as ações e relações
das crianças no centro do projeto educativo, levando em considera-
ção a continuidade e interatividade constitutivas das relações sociais
de meninos e meninas, enigma ainda a ser desvendado pelas pe-
dagogias da Infância, parafraseando novamente Jorge Larrosa. Ou
seja, os modos de vida das crianças, as situações que elas enfren-
tam e as trocas que estabelecem com “tudo aquilo que as rodeia no
cotidiano pode ser constituidor de experiências. Para tanto, é pre-
ciso que seja organizado e sistematizado um currículo que otimize
as descobertas e as construções infantis, respeitando as crianças em
suas especificidades” (CARVALHO e GUIZZO, 2018, p. 786).
Entretanto, as alterações da quarta versão da BNCC que tende
a substituir os direitos de aprendizagem, quais sejam: conviver,
brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se direitos estes
centrados nas crianças, por objetivos de aprendizagem, pautados na
ação docente, torna vaga e dúbia a noção de campos de experiência.
Por um lado, se esse conceito evidencia as especificidades das
aprendizagens das crianças, por outro, as mudanças recentes no
texto curricular parecem indicar modos de organizar conteúdos
disciplinares, tal como nas demais etapas da Educação Básica.
A partir disso, não se pode desconsiderar que, nas duas
primeiras versões da BNCC, os campos indicavam particularidades

65
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

dos modos como as crianças se apropriam do mundo ao seu redor.


O que já é algo inovador para o contexto educacional brasileiro
e, nesse sentido, demandaria de muito estudo e reflexão dos
profissionais que atuam em creches e pré-escolas – no texto final da
Base, prevaleceu uma visão praxiológica na qual as experiências são
equivocadamente consideradas como decorrentes da ação docente
e não das vivências das crianças, já que podem ser organizadas
a princípio, expressando também resultados das aprendizagens,
previstos previamente (CAMPOS e DURLI, 2020).

Crianças, alteridade e currículo: para além das prescrições do


texto curricular

Apesar desse processo tortuoso, de avanços e retrocessos


no que diz respeito ao currículo da Educação Infantil, é preciso
considerar que a noção de campos de experiência pode e deve ser
considerada como uma potente proposta curricular para creches
e pré-escolas. Há que se considerar, todavia, que, se as DCNEI e
a BNCC avançam do ponto de vista conceitual, compreendendo
que o currículo de creches e pré-escolas se constitui a partir de um
conjunto de práticas que se articulam aos saberes e experiências
das crianças, o mesmo ainda está distante de acontecer quando
voltamos nosso olhar para o cotidiano das instituições de Educação
Infantil, pois, faz-se necessário reconhecer as particularidades das
relações que as crianças estabelecem com o mundo que as circunda,
compreendendo os sentidos que elas atribuem às suas experiências
(SANTOS, 2018).
Em cursos de formação continuada ou em conversas com
profissionais de Educação Infantil percebe-se muita imprecisão,
insegurança e incertezas nos debates e nas reflexões relativas à
implementação do currículo por campos de experiência. Muitas
vezes, os profissionais têm se preocupado em compreender
questões do tipo: quais campos de experiências se encaixam em

66
Capítulo 6: Especificidades do trabalho docente no currículo da educação infantil

determinadas situações que organizamos previamente para as


crianças? Ou ainda: que objetivos de aprendizagens se relacionam
com aquelas experiências que eu, professora/or de Educação Infantil,
estou pensando em apresentar para as crianças? – o que parece
decorrer das mudanças de rota das alterações realizadas pelo
MEC, na versão homologada da BNCC, compromissada com o
mercado econômico e com grupos conservadores. Assim, percebe-
se que que, talvez seja necessário mudar as perguntas orientadoras
dos debates em torno dos limites e possibilidades de organização
do currículo a partir das experiências. É necessário refletir que,
enquanto profissionais e pesquisadores/as da infância, devemos
nos perguntar: quais os desejos de aprendizagem das crianças na
educação infantil? A partir desses desejos, ao organizar a experiência
educativa, que direitos de aprendizagem conseguimos articular?
As alterações, nas perguntas, apresentam muito mais que uma
mudança de rota da construção do currículo, e pois evidenciam,
uma virada epistemológica na proposição de um arranjo curricular
que tenha como centro as crianças e suas experiências. Para
evidenciar esse argumento, faz-se necessário ilustrar com uma
situação vivenciada nos tempos de docência da educação infantil:
Em certa ocasião, o professor de referência
da turma de um ano de idade preparou uma
atividade com blocos de montar. Importante
destacar que havia uma preocupação com a
integridade dos bebês e das crianças pequenas
naquela instituição e, nesse sentido os blocos
eram maiores com cerca de vinte centíme-
tros de comprimento, aproximadamente uns
oito centímetros de altura e doze centímetros
de largura – o que não permitia que as peças
fossem engolidas pelos pequenos. O objeti-
vo daquela situação planejada pelo professor
consistia em brincar com os blocos, embora o
docente soubesse que as crianças poderiam ex-

67
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

plorar o brinquedo de diferentes formas: pelo


tamanho das peças, por suas cores e pelas va-
riadas combinações de encaixe que os blocos
proporcionam, ampliado assim a criatividade
dos bebês. No entanto, os bebês conseguiram
ir além do que fora inicialmente previsto pelo
professor. A brincadeira começou como plane-
jado, com o professor incentivando os bebês
a encaixarem as peças. Já os pequenos, entre
tentativa e erros, acabavam ressignificando o
que havia sido inicialmente proposto. Em dado
momento da brincadeira, uma das crianças
joga um bloco para o alto que cai no chão pro-
duzindo um barulho um pouco mais alto. Al-
gumas crianças, que presenciaram o ocorrido
repetiram a ação do colega e, a partir de então,
passaram a explorar o som das peças caindo no
chão. E o faziam em meio a gargalhadas e sorri-
sos, palmas e pulinhos trocados entre eles/as –
o que não passou despercebido pelo professor.
Percebendo o interesse dos bebês pelos sons
dos objetos, o docente entrou na brincadeira
com eles: gradativamente o professor auxiliava
os bebês a empilhar os blocos e incentivando-
-os a derrubar a pilha. De modo progressivo, o
professor ia aumentando o tamanho da pilha
de blocos, o que, proporcionalmente, aumen-
tava o barulho da queda. Chegou um momen-
to em que a pilha de blocos ficou mais alta que
o próprio professor. A brincadeira transcorreu
assim por um bom momento: com o professor
auxiliando os bebês a fazer a pilha de blocos de
encaixe e eles a derrubando para ouvir o som.
Num dado momento, o docente encorajou os
bebês a criarem suas próprias pilhas de blocos
de encaixe, quando ele deixou-lhes brincan-

68
Capítulo 6: Especificidades do trabalho docente no currículo da educação infantil

do autonomamente e foi organizar os banhos


e trocas de fraldas. (Relato de prática de um
professor de Educação Infantil que atuou na
RME-BH entre os anos de 2004 e 2014).

Essa situação revela nuances importantes sobre o currículo


da Educação Infantil e, consecutivamente, nos permite pensar nas
exigências que esse arranjo curricular impõe à profissionalidade
docente. Aqui, é possível identificar formas de construção de
um currículo a partir das questões que os bebês desejavam
compreender sobre aspectos do mundo natural ou social, no
tocante a exploração do som dos blocos de encaixe, o que ratifica
a compreensão das Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Infantil que afirmam que o currículo de creches e pré-
escolas deve surgir do encontro das experiências e dos saberes
das crianças com os conhecimentos historicamente acumulados
(BRASIL, 2009).
Importante destacar que as ações das crianças foram motivadas
pelo desejo que elas expressam de diferentes formas como, por
exemplo, de explorar o som dos blocos ao jogá-los para cima e
deixá-los cair no chão; os sorrisos, os pulinhos, a imitação dos
atos dos colegas. Todos esses elementos devem ser considerados
como indícios da relevância daquele tema para a organização de
um currículo a partir do desejo (e da experiência de meninos e
meninas); um currículo emergente e não estabelecido a priori. E
mais: evidenciam a necessidade de um olhar sensível, uma escuta
atenta e um poder de reorganizar o planejamento – este concebido
sempre de modo flexível, por parte dos profissionais que atuam em
creches e pré-escolas.
Walter Benjamin, filósofo alemão, em sua crítica da cultu-
ra, afirma que as crianças “são especialmente inclinadas a bus-
carem todo local de trabalho onde a atuação sobre as coisas se dê
de maneira visível” (BENJAMIN, 1984, p. 77). Isso nos permite
compreender que na atividade de brincar com os blocos de encai-

69
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

xe, diferentes formas de exploração eram revistas (tamanho, cores,


formas), mas naquela situação, os bebês desejaram explorar os sons
dos objetos.
Outro fator importante a ser considerado e que é revelado pelo
episódio acima diz respeito à preocupação do docente de não cum-
prir uma rotina fixa, já que ele identifica, percebe e reestrutura seu
fazer a partir do reconhecimento da significância de determinados
temas para os bebês. É preciso considerar que o desejo de conhecer
mais sobre os sons dos objetos com os quais os bebês brincavam se
manifesta nos enunciados não ditos, mas expressos nas ações da-
quele grupo. Naquele momento, as ações dos bebês, de algum modo
expressam o desejo de explorar de outras formas os sons dos blocos
de encaixe. Importante destacar que, para DELEUZE (1996, p. 16),
o desejo pode manifestar-se de diferentes modos, seja pela via da
oralidade ou pela via do próprio agenciamento (PARAÍSO, 2009).
Desse modo, produzir um currículo por meio dos desejos
daqueles bebês, permite pensar um conjunto de situações e expe-
riências de aprendizagem reunidas em torno do inusitado, do ines-
perado e incerto que tangencia o cotidiano do berçário. E aqui,
Jorge Larrosa (2010) se torna uma referência importante, pois ele
compreende que a infância, enquanto algo concebido pelo olhar
do adulto, é sempre um outro, na medida em que a sua diferença
compreende um fator que “inquieta a segurança de nossos sabe-
res, questiona o poder de nossas práticas e abre um vazio em que
se abisma o edifício bem construído de nossas instituições de aco-
lhimento” (LARROSA, 2010, p. 184). Para esse autor, a alteridade
da infância constitui a chave de leitura pela qual se torna possível
desvelar a heterogeneidade que a caracteriza. Assim, considerar a
alteridade da infância, na proposição de um currículo para as insti-
tuições de Educação Infantil, não está relacionado com a busca por
enquadrar os bebês e as crianças em nossa racionalidade, em nossas
práticas e ou nas lógicas de ação que regeram, até então, nossas ins-
tituições educativas. Para Larrosa (2010), trata-se de algo mais radi-
cal: reconhecer e evidenciar sua total heterogeneidade, sua absoluta

70
Capítulo 6: Especificidades do trabalho docente no currículo da educação infantil

diferença em relação a nós adultos e aos nossos modos de ser e estar


no mundo. E ao pensar o bebê como o outro do processo pedagógi-
co – que tanto ensina quanto aprende – vemos emergir o currículo
por campos de experiência.
Desse modo, a potencialidade do currículo por campos de ex-
periência não reside, a princípio, em sua organização prévia, mas
na possibilidade de o/a professor/a observar, registrar, interpretar
e dialogar, no âmbito do planejamento, com as experiências que as
crianças, desde a mais tenra idade, vivenciam no contexto social
mais amplo. Ao fazê-lo, o/a professor/a defronta-se com as especi-
ficidades da docência em creches e pré-escolas, fato que contribui
para a compreensão da identidade sociopolítica e pedagógica da
Educação Infantil.
Alteridade da infância como princípio fundante do currículo por
campos de experiência
O currículo da educação infantil, ao propor uma organização
por campos de experiência, isto é, a partir das situações vivenciadas
pelas crianças no cotidiano, demanda muito mais que a proposição
de uma política curricular nacional, tal como a BNCC. Demanda
mais que a organização cotidiana pensada a partir e para as crian-
ças. Demanda, outrossim, que a alteridade da infância seja um prin-
cípio fundante do trabalho pedagógico.
A função sociopolítica e pedagógica da Educação Infantil não
se resume à preparação das crianças para escolarização futura,
mas consiste em auxiliá-las no processo de desenvolvimento como
sujeitos socioculturais, tendo as interações e as brincadeiras como
meios fortuitos de apropriação da cultura, fator que precisamos
considerar se desejamos criar práticas pedagógicas direcionadas
a elas. Assim, o processo de produção de um currículo, por
campos de experiência, demanda muito mais um movimento de
deslocamento dos(as) professores(as) acerca de seus saberes, fazeres
e certezas pedagógicas, do que das próprias crianças. Demanda
decifrar os enigmas que a institucionalização precoce de bebês e

71
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

crianças pequenas nos impõe, para retomar a epígrafe de Jorge


Larrosa que abre o texto.
Em suma, enquanto profissionais de creches e pré-escolas,
somente conseguiremos nos aproximar e compreender as
experiências das crianças, na medida em que nos conscientizarmos
que, tão importante quanto currículos organizados para as crianças,
seria organizarmos currículos com as crianças, por meio de seu
reconhecimento como o outro do processo educativo. Ou seja, é
por meio da alteridade da infância que produziremos campos de
experiência que possam, efetivamente, comprometer-se com o
desenvolvimento holístico das crianças.

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Paulo: Summus, 1984.

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Brasília, DF: MEC, 2016. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.
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União: seção 1, Brasília, DF, n. 242, p. 18-19, 18 dez. 2009.

CAMPOS, Roselane Fátima; DURLI, Zenilde. BNCC PARA A EDUCA-


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CARVALHO, Rodrigo Saballa de; GUIZZO, Bianca Salazar. Políticas de


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72
Capítulo 6: Especificidades do trabalho docente no currículo da educação infantil

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n. 66, p. 771-791, 2018. DOI: http://dx.doi.org/10.29286/rep.v27i66.4563

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Paulo: Ed. 34, 1996

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verdadeiro. In: LARROSA, Jorge. Pedagogia Profana: danças, piruetas
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PARAÍSO, Marlucy Alves. Currículo, Desejo e Experiência. Educação e


Realidade. n.º 34, v. 2: mai/ago 2009, p. 277-293.

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SANTOS, Sandro Vinicius Sales dos. Currículo da Educação Infan-


til - considerações a partir das experiências das crianças. Educação
em Revista, Belo Horizonte, v. 34, e188125, 2018. DOI: http://dx.doi.
org/10.1590/0102-4698188125

73
Autores
Fabiana Cristina Frigieri de Vitta
Ana Julia Ribeiro Sgavioli
Alberto de Vitta

CAPÍTULO 7
A Base Nacional Comum Curricular na
prática com bebês
Capítulo 7: A Base Nacional Comum Curricular na prática com bebês

INTRODUÇÃO

Vários estudos (CRUZ, SIGOLO, VITTA, 2020; SGAVIOLI,


2020; NOVAES, 2019; SCARLASSARA, 2019, MOURO, 2021) fo-
ram realizados com o objetivo de analisar atividades educativas a
serem desenvolvidas junto a bebês para estimular seu desenvolvi-
mento integral, mostrando que os profissionais de Educação Infan-
til que atuam com bebês entre zero e um ano e seis meses, confor-
me define a Base Nacional Comum Curricular - BNCC (BRASIL,
2017), têm pouco conhecimento para a formulação de atividades
educativas (CRUZ, SIGOLO, VITTA, 2020). Esse tema é pouco
tratado nos cursos de formação em pedagogia e há pouca bibliogra-
fia que analise, discuta e proponha soluções para o cotidiano esco-
lar dos bebês, considerando a relação entre cuidado e educação, in-
dispensável nesse contexto.
Na educação infantil, o atendimento a bebês merece atenção,
uma vez que há necessidade de ultrapassar o contexto assistencial,
respeitando e integrando o educacional. Para isso, precisamos capa-
citar os profissionais para melhor organizar o espaço, tempo e re-
cursos materiais das atividades (VITTA, CRUZ, SCARLASSARA,
2018). Conhecendo as características da criança, a análise e organi-
zação das atividades que serão indicadas e executadas, no ambiente
em questão, auxiliarão para o sucesso de tais práticas. Na proposi-
ção das atividades, é imprescindível pensar nos objetos que serão
usados, como serão dispostos no ambiente, como a criança e o gru-
po estarão e os objetivos. Com isso, não queremos dizer que as ati-
vidades devem ser dirigidas, mas que devem ser planejadas, permi-
tindo sua avaliação, reorganização, reapresentação para que atinja
os objetivos traçados. A avaliação de cada situação permite conhe-
cer e verificar o desenvolvimento e aprendizagem das crianças, pos-
sibilitando que novas atividades sejam propostas intencionalmente.

75
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

A BNCC e as atividades com bebês


As atividades devem ser propostas de acordo com os campos
de experiência e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento da
BNCC. Para isso, é importante que os profissionais saibam usar esse
documento no planejamento das atividades que acontecerão na
rotina da instituição educacional, considerando que atuam na fase
educacional de bebês.
A partir dos campos de experiência - “o eu, o outro e o nós”;
“corpo, gestos e movimentos”; “traços, sons cores e formas”; “escu-
ta, fala, pensamento e imaginação” e “espaços, tempos, quantida-
des, relações e transformações” - e da faixa etária correspondente,
são apresentados os objetivos de aprendizagem e desenvolvimento.
Abaixo apresenta-se um exemplo de como fazer a análise de um ob-
jetivo da BNCC, elaborado pelos autores.

Figura 1: Exemplo A - Campo de experiências “O eu, o outro e o nós”

Para facilitar a compreensão, é preciso detalhar cada parte do


objetivo, isto é, pensar no verbo de ação, no objeto que o acompa-
nha e para que, onde ou quando deve ser utilizado na prática (com-
plementos).
Nessa análise, um problema é óbvio: o verbo. Vejamos a Figura
1, que apresenta um exemplo. Como é possível verificar se as crian-
ças percebem? O uso de verbos imensuráveis (que não é possível
medir) atrapalha na organização das atividades e, principalmente,

76
Capítulo 7: A Base Nacional Comum Curricular na prática com bebês

na avaliação relativa ao sucesso das mesmas para atingir o objeti-


vo traçado. Os verbos perceber, compreender, entender, saber, notar,
dentre outros não devem ser usados para traçar objetivos.

Figura 2. Exemplo B - Campo de experiências


“Traços, sons, cores e formas”

O mesmo ocorre com explorar, que apresenta diferentes defini-


ções no dicionário, tais como: analisar, examinar, realizar descober-
tas, tornar conhecido, revelar, pesquisar. Considerando a Figura 2,
como o professor verifica se atingiu o objetivo?
Outro problema refere-se à colocação de diferentes objetos e
complementos. No primeiro exemplo, o objetivo poderia ser pen-
sado de duas formas: perceber que suas ações têm efeitos em outras
crianças e perceber que suas ações têm efeitos em outros adultos, já
que os efeitos são diferentes quando se pensa nos diferentes públi-
cos. Já no segundo, explorar sons produzidos com o próprio corpo e
explorar sons produzidos com objetos do ambiente que necessitam de
atividades diferentes para serem trabalhados com as crianças.
Os professores precisam saber diferenciar e reescrever os ob-
jetivos elencados na BNCC pensando de duas formas: os objetivos

77
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

serão usados na definição de comportamentos que se quer que a


criança adquira ou nas atividades? Quando definimos os objeti-
vos considerando a criança como sujeito do verbo na programação
do bimestre, por exemplo, a frase deve ser: “ao final do bimestre a
criança deve ser capaz de”... Ao pensarmos na atividade como sujei-
to do verbo na programação da rotina de um dia, a frase deve ser: “a
atividade deve possibilitar que a criança”. Os sentidos mudam quan-
do pensamos dessa forma. Vejamos nos dois exemplos apresenta-
dos.
No exemplo A, o objetivo parece estar mais relacionado à
criança: ao final do bimestre o bebê deverá ser capaz de perceber
que suas ações têm efeitos em outras crianças. Para avaliar se as ati-
vidades oferecidas estão sendo coerentes, será necessário (já que o
verbo não ajuda) fazer um comparativo da evolução de certos com-
portamentos da criança ao longo do bimestre, sendo que tais com-
portamentos devem ser muito bem definidos, permitindo uma ava-
liação fidedigna do trabalho realizado.
Já no exemplo B, o objetivo parece relacionar-se à atividade.
Vamos a um modelo: a organização de uma atividade com colheres
de pau para acompanhar a música “Sopa do Palavra Cantada” (gru-
po musical) deve possibilitar que a criança explore sons produzidos
com objetos do ambiente (neste caso, escolhemos colheres de pau,
podendo ser outros objetos, desde que previamente definidos).
Claramente, ambas situações, devem estar presentes o tempo
todo no planejamento da educação infantil, ou seja, os professores
devem ter claros os objetivos para cada bebê, preferencialmente bi-
mestrais ou mensais e, a partir deles, planejar e organizar atividades
intencionalmente. Com isso, a criança poderá aprender e desenvol-
ver diferentes habilidades e comportamento responsáveis por sua
independência e autonomia.
Nessa análise, devemos pensar nas características particula-
res de cada instituição (espaço, materiais) e nos recursos humanos
(profissionais, professores e administração), que interferem nos
componentes de cada atividade, isto é, verificar o material, o espaço,

78
Capítulo 7: A Base Nacional Comum Curricular na prática com bebês

o tempo necessários para organizar o ambiente e a participação das


crianças e dos professores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, é preciso que tenhamos entendimento de como esses


objetivos se encaixam nas etapas do desenvolvimento infantil para
planejar e organizar atividades que propiciem à criança o uso de ha-
bilidades já adquiridas, a aprendizagem de novas e resultados que a
estimulem na repetição e continuidade da atividade, mostrando a
ela sua capacidade de aprendizagem e adaptação.
A atividade pode ser livre para o bebê, mas não para o profes-
sor, que é o responsável por analisá-las, organizá-las, planejá-las in-
tencionalmente com base nos objetivos definidos na BNCC, consi-
derando a realidade na qual está inserido. A Educação Infantil deve
empoderar a criança para que ela possa, aos poucos, fazer e ser res-
ponsável por suas escolhas, melhorando a qualidade de suas expe-
riências e de seu futuro.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular.
Secretaria de Educação Básica. Brasília: MEC, SEB, 2017.
CRUZ, G. A.; SIGOLO, S. R. R. L., VITTA, F. C. F. O uso de atividades
educacionais com bebês: percepção de estudantes de pedagogia. Revis-
ta Humanidades e Inovação, v. 7, n. 8, p. 36-53, 2020.
MOURO, M. M. O que os futuros pedagogos pensam a respeito da mú-
sica e o desenvolvimento da criança de 0 a 18 meses de idade. Disserta-
ção (Mestrado em Educação Escolar), 2021. 104f. Universidade Estadual
Paulista Júlio Mesquita Filho, Araraquara, 2021.

79
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

NOVAES, C. F. M. Os playgrounds nas creches na visão de graduandos


de pedagogia. Dissertação (Mestrado em Educação Escolar), 2019. 137f.
Universidade Estadual Paulista Júlio Mesquita Filho, Araraquara, 2019.
SCARLASSARA, B. S. Percepções de graduandos em pedagogia sobre
as atividades de vida diária na creche sobre as atividades de vida diária
na creche. Dissertação (Mestrado em Educação Escolar), 2019. 107f. Uni-
versidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Araraquara, 2019.
SGAVIOLI, A. J. R. O brinquedo na creche na visão de graduandos de
pedagogia. Dissertação (Mestrado em Educação Escolar), 2020. 95f. Uni-
versidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Araraquara, 2020.
VITTA, F. C. F.; VITTA, A. Promoção do desenvolvimento da criança
no contexto educacional: o berçário. In: ZANIOLO, L. O.; DALL’AC-
QUA, M. J. C. Inclusão escolar: Pesquisando políticas públicas, forma-
ção de professores e práticas pedagógicas. Jundiaí: Paco Editorial, 2012.
p. 141-162.
VITTA, F. C. F.; CRUZ, G. A.; SCARLASSARA, B. S. A Base Nacional
Comum Curricular e o berçário. Revista Horizontes, Universidade São
Francisco, v. 36, n 1, p. 64-73, 2018.

80
Autoras
Fabiana Cristina Frigieri de Vitta
Thaize Fernanda Ramos Macedo
Vanilda Divina Almério Bistaffa

CAPÍTULO 8
Educação Infantil: práticas pedagógicas com
bebês e a formação de professores
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

INTRODUÇÃO
Grupo de Estudos e Pesquisa em Atividade e Desenvolvimen-
to Infantil – GEPADI, ligado ao Departamento de Educação e De-
senvolvimento Humano, conta com discentes dos cursos de Tera-
pia Ocupacional e Pedagogia, envolvidos em projetos de extensão
e pesquisa. É vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educa-
ção Escolar da Faculdade de Ciências e Letras (UNESP/Araraqua-
ra), desenvolvendo projetos de pesquisa de Mestrado e Doutorado,
da linha Formação do professor, trabalho docente e práticas peda-
gógicas. O objeto focado nos projetos é a relação entre as atividades
desenvolvidas no contexto educacional e a aquisição de habilidades
e comportamentos importantes para a relação autônoma da criança,
especialmente os bebês, com o ambiente.
Nesse texto, objetivamos refletir sobre aspectos que embasam
essas pesquisas, assim como parte dos resultados encontrados.
Primeiramente, precisamos explicar nossa escolha em optar
por analisar os bebês como foco dos nossos estudos. A primeira in-
fância é um período crítico para o desenvolvimento de diferentes
habilidades que serão responsáveis por aprendizagens que permiti-
rão que essas crianças façam escolhas a respeito de seu futuro. Du-
rante essa fase, elas experimentam um rápido crescimento e apren-
dizado, estabelecendo as bases para seu desenvolvimento cognitivo,
emocional, social e físico ao longo da vida. Para tanto, a educação
desempenha um papel importante na promoção da qualidade de
vida e na prevenção de atrasos no desenvolvimento infantil, pois é
nessa fase que está está altamente receptiva a estímulos e experiên-
cias do ambiente ao seu redor. Associada a essas tarefas, interessa-
-nos a ideia de que a Educação Infantil tem o importante papel de
empoderar a criança para escolhas críticas no futuro.
Vitta e Vitta (2012) definem que o desenvolvimento do ser
humano se dá pela relação com o ambiente no qual se insere. “As-
sim, toda experiência interfere no modelo que o indivíduo faz de si
mesmo e será responsável por interpretações futuras de suas novas

82
Capítulo 8: Educação Infantil: práticas pedagógicas com bebês e a formação de professores

vivências” (p. 151). Diante da complexidade dessa fase, o trabalho


com bebês nas instituições de educação infantil, tem sido um desa-
fio para os educadores que têm enfrentado diversos problemas rela-
cionados à precariedade em que as instituições de Educação Infantil
se encontram, assim como a falta de conteúdos essenciais relaciona-
dos à primeira infância na formação inicial de professores.
No Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB nº
9.394/1996 define e regulariza a organização da educação brasileira
com base nos princípios presentes na Constituição Federal de 1988.
Segundo essa legislação, a Educação Básica é formada pela Educa-
ção Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, sendo a Educa-
ção Infantil a etapa inicial, que contempla a faixa etária de zero a
cinco anos de idade (BRASIL, 1996). Em 2014, foi instituído o Pla-
no Nacional de Educação - PNE, com vigência de dez anos a partir
desse ano, que estabelece diretrizes, metas e estratégias de execução.
A primeira meta prevê a universalização da Educação Infantil até o
ano de 2016 para crianças de quatro e cinco anos de idade na pré-
-escola e a expansão da oferta de vagas nas creches para, no míni-
mo, de 50% para crianças de zero a três anos de idade até o final de
2024 (BRASIL, 2014).
Em 2017, o Ministério da Educação publicou a Base Nacional
Comum Curricular - BNCC (BRASIL, 2017), no qual a educação
para primeira infância ganha visibilidade na definição dos objetivos
de aprendizagem e desenvolvimento para Educação Infantil, con-
templando três grupos: bebês (zero a um ano e seis meses), crianças
bem pequenas (um ano e sete meses a três anos e 11 meses) e crian-
ças pequenas (quatro anos a cinco anos e 11 meses).
Todas essas mudanças permitiram um avanço no entendimen-
to da educação infantil, mas a fase dos bebês continua vinculada às
necessidades assistenciais e das famílias, desviando o olhar da ga-
rantia do direito da criança desde zero anos à educação de qualida-
de. O atendimento, que ainda ocorre com características assisten-
cialistas, não exige formação dos profissionais que trabalham com
os bebês, que acaba sendo precária, não considerando as especifici-

83
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

dades de seu desenvolvimento, e as atividades que devem contem-


plar educar e cuidar. Nesse contexto, a formação inicial de profes-
sores, a organização e a capacitação da equipe de profissionais da
escola são fatores que devem ser priorizados na discussão para uma
educação de qualidade.
Ainda, considerando o quadro da Educação Infantil no Brasil,
precisamos assumir que há um grande grupo de crianças em vul-
nerabilidade social assim, as intistuições escolares acabam por as-
sumir um papel importante, assistencial, suprindo as necessidades
básicas para que as crianças possam ter condições mínimas que
garantam sua inserção social na educação básica. Essas práticas po-
dem confundir o papel das instituições educacionais, reforçando o
assistencialismo.
Diante desse quadro, nossa preocupação, nas pesquisas desen-
volvidas, refere-se à forma como as atividades são pensadas e orga-
nizadas para proporcionar aos bebês experiências que promovam a
aprendizagem motora, percepto-cognitiva, social e emocional. Elas
objetivam verificar a percepção de estudantes de graduação, auxilia-
res de desenvolvimento infantil (ou de apoio, que recebem diferen-
tes nomes) e professores sobre sua formação e prática com ativida-
des de vida diária (higiene, alimentação e vestuário), com música,
brinquedos e equipamentos de playground junto à educação de be-
bês. As variáveis tratadas, nas questões, referem-se às concepções e
conceitos, conteúdos e objetivos, planejamento em relação aos ma-
teriais usados, espaço e tempo, participação da criança e do profes-
sor.
Os resultados mostram que o conceito sobre educação de be-
bês tem mudado, mas ainda prioriza a necessidade da família e não
da criança, contrariando os documentos oficiais vigentes, que não
conseguem garantir que os cursos de formação inicial e a prática vi-
gente cumpram sua responsabilidade com os bebês e crianças bem
pequenas, oferecendo experiências baseadas em objetivos educacio-
nais.

84
Capítulo 8: Educação Infantil: práticas pedagógicas com bebês e a formação de professores

Em relação às atividades, temos verificado que há dificuldade


no seu entendimento como parte do contexto educacional, que de-
vem ser pensadas, planejadas e adaptadas para atender aos objetivos
definidos na BNCC. Para essa faixa etária, considerando suas ne-
cessidades pessoais e sociais, ou seja, sua proposição deve ser inten-
cional. Essa intencionalidade deve garantir que as atividades sejam
significativas para a criança, coerentes com a sua cultura, mas que
expandam seu repertório, possibilitando que ela conheça as diferen-
tes formas de expressão cultural. Isso é empoderamento, é possibi-
litar escolhas críticas, baseadas na reflexão e no reconhecimento de
seus direitos e deveres como cidadão.
Quanto a cada tipo de atividade, as com equipamentos de play-
ground são mais difíceis de serem organizadas com os bebês, en-
quanto aquelas com brinquedos e músicas, na percepção dos parti-
cipantes, são educacionais e inerentes à escola, mas há dificuldade
no entendimento da necessidade de serem planejadas e vinculadas
aos objetivos da BNCC.
As atividades de vida diária (higiene, alimentação e vestuário)
são consideradas parte da rotina escolar dos bebês, já que as carac-
terísticas e necessidades dessa população exigem que aconteçam em
muitos momentos da rotina. O grande problema, que identificamos
e que está claramente presente na formação de professores e na prá-
tica existente, é a mecanização dessas atividades, que acontecem a
partir de fundamentos assistenciais e não educacionais, refletindo
uma prática histórica junto a essa faixa etária. Mas, como lembra
Campos (2018) não podemos deixar o senso comum sustentar o
trabalho docente nas instituições educacionais que atendem os be-
bês.
Por um lado, como mostra a história e a trajetória da Educa-
ção Básica no Brasil, observamos os avanços nas legislações ao in-
cluir as creches na educação básica e estabelecer diretrizes para o
atendimento para esta faixa etária. No entanto, a prática adotada, na
maioria das vezes, mostra um atendimento assistencialista, que não

85
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

contempla o cuidar e educar como uma tarefa indissociável e evi-


dencia a precariedade das instituições de ensino.
A respeito da formação de professores que atuam no berçário,
faz-se necessário que esses profissionais saibam acerca do desen-
volvimento e aprendizagem do bebê, como as atividades se organi-
zam por meio das interações e brincadeiras para atingir os objetivos
que são propostos pela BNCC. Para tanto, é primordial a intencio-
nalidade na prática pedagógica desse profissional (VITTA; CRUZ;
SCARLASSARA, 2018).
O trabalho de pesquisa na área de educação com bebês, sobre-
tudo por meio de grupos atuantes na produção de estudos que res-
pondem a necessidades existentes na prática, contribui para a aná-
lise da formação inicial e continuada dos profissionais que atuam
com essa faixa etária, com resultados baseados na ciência, auxilian-
do na proposição de diferentes temas relevantes e que se baseiem na
experiência do profissional de educação que conhece as diferentes
realidades brasileiras.
O oferecimento de uma educação eficiente e de qualidade nessa
fase da vida é uma estratégia para a redução dos custos sociais futu-
ros, impulsionando o sucesso na escola e na vida.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Lei n. 13.005 - Plano Nacional de Edu-
cação - PNE. Brasília: INEP, 2014. Disponível em: http://fne.mec.gov.br/
images/doc/pne-2014-20241.pdf. Acesso em: 03 set. 2014.

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular.


Secretaria de Educação Básica. Brasília: MEC, SEB, 2017.

BRASIL. Ministério de Educação e Cultura. LDB - Lei n. 9394/96, de 20


de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da Educação Na-
cional. Brasília: MEC, 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso em: 24 ago. 2022.

86
Capítulo 8: Educação Infantil: práticas pedagógicas com bebês e a formação de professores

CAMPOS, M. M. Questões sobre a formação de professores de educa-


ção infantil. Laplage em Revista (Sorocaba), v.4, n.esp., p.9-22, set./dez.
2018. Disponível em: https://laplageemrevista.editorialaar.com/index.
php/lpg1/article/view/409. Acesso em: 25 ago. 2022.

VITTA, F. C. F.; VITTA, A. Promoção do desenvolvimento da criança


no contexto educacional: o berçário. In: ZANIOLO, L. O.; DALLÁC-
QUA, M. J. C. Inclusão escolar: Pesquisando políticas públicas, forma-
ção de professores e práticas pedagógicas. Jundiaí, Paco Editorial: 2012.
p.141-162.

VITTA, F. C. F.; CRUZ, G. A.; SCARLASSARA, B. S. A Base Nacional


Comum Curricular e o berçário. Horizontes, v. 36, n. 1, p. 64-73, jan./
abr. 2018. Disponível em: https://revistahorizontes.usf.edu.br/horizontes/
article/view/584. Acesso em: 24 ago. 2022.

87
Autora
Keila Silva da Costa

CAPÍTULO 9
Aprendendo com as mãos - Oficina
Montessoriana
Capítulo 9: Aprendendo com as mãos - Oficina Montessoriana

INTRODUÇÃO

A Educação Infantil é uma etapa fundamental na formação


das crianças, pois é, nessa fase, que se desenvolvem as habilidades
e competências cognitivas, sociais, emocionais e motoras que serão
fundamentais para a vida escolar e pessoal das crianças. Para bebês
e crianças público-alvo da Educação Especial, essa importância é
ainda maior, já que muitas vezes eles possuem necessidades especí-
ficas que precisam ser atendidas de forma adequada para que pos-
sam se desenvolver plenamente.
A Educação Infantil, em especial para as crian-
ças de zero a três anos, é uma etapa crucial do
desenvolvimento humano e uma oportunida-
de de promover a igualdade de oportunidades,
reduzindo as desigualdades sociais e econômi-
cas existentes.” (ARAÚJO; ALMEIDA; SOU-
ZA,2018)

Práticas pedagógicas direcionadas a bebês e crianças da Educa-


ção Especial são fundamentais para garantir uma educação inclusi-
va e de qualidade. Essas práticas devem ser adaptadas às necessida-
des individuais de cada criança, respeitando suas particularidades e
promovendo seu desenvolvimento de forma personalizada. É essen-
cial que sejam embasadas em uma perspectiva inclusiva, que reco-
nheça e valorize a diversidade, proporcionando igualdade de opor-
tunidades a todas as crianças.

Profissionais capacitados, como professores e pedagogos es-


pecializados, devem ser responsáveis pelo desenvolvimento dessas
práticas pedagógicas. Eles devem possuir conhecimento específico
sobre as necessidades das crianças com deficiência e sobre as estra-
tégias pedagógicas mais adequadas para estimular seu crescimento
e desenvolvimento.

89
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

A Educação Infantil desempenha um papel crucial na forma-


ção das crianças público-alvo da Educação Especial, proporcionan-
do-lhes uma educação de qualidade desde os primeiros anos de
vida. Isso permite o desenvolvimento de suas habilidades e com-
petências, promovendo sua inclusão social e sua participação plena
na sociedade. Além disso, as práticas pedagógicas voltadas a essas
crianças contribuem para sua formação como indivíduos críticos,
reflexivos e autônomos, capacitando-as a enfrentar os desafios da
vida escolar e pessoal com segurança e confiança.
O panorama histórico das práticas pedagógicas para a Edu-
cação Infantil e seu impacto no desenvolvimento das crianças pú-
blico-alvo da Educação Especial é caracterizado por diferentes
concepções e abordagens educacionais que evoluíram ao longo do
tempo. No início do século XX, a Educação Infantil no Brasil era
focada principalmente na formação moral e física das crianças, com
uma abordagem disciplinadora e higienista. No entanto, a partir da
década de 1960, influenciada pelas teorias construtivistas e pela va-
lorização do brincar como uma atividade essencial para o desenvol-
vimento infantil, surgiram novas práticas pedagógicas que busca-
vam estimular a criatividade e a autonomia das crianças.
Ao longo da história, a Educação Infantil pas-
sou por diversas transformações e avanços,
com a ampliação do acesso e a valorização da
infância como uma fase crucial do desenvolvi-
mento humano. No entanto, as crianças com
deficiência foram historicamente excluídas
desse processo, sendo vistas como incapazes e
desprovidas de potencialidades. (BAPTISTA;
BELO, 2018)

A partir da década de 1990, com a promulgação da Lei de Di-


retrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a Educação Infantil
passou a ser reconhecida como uma etapa fundamental da educa-
ção básica, com a valorização do papel da escola na promoção do

90
Capítulo 9: Aprendendo com as mãos - Oficina Montessoriana

desenvolvimento infantil. Nesse contexto, surgiram novas práticas


pedagógicas que buscavam a inclusão das crianças com necessida-
des educacionais especiais, com a oferta de atendimento educacio-
nal especializado e a adoção de estratégias pedagógicas diferencia-
das.
A inclusão de crianças com deficiência na Edu-
cação Infantil foi reconhecida legalmente no
Brasil a partir da Constituição de 1988 e da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de
1996, mas ainda é um desafio na prática, devi-
do à falta de formação adequada dos professo-
res e à ausência de recursos e didáticos adapta-
dos.” (BORGES; VASCONCELOS, 2018)

Atualmente, as práticas pedagógicas na Educação Infantil e


seu impacto no desenvolvimento de crianças e bebês público-alvo
da Educação Especial são guiados pela valorização da inclusão e da
diversidade. Essas práticas buscam adotar estratégias pedagógicas
que respeitem as particularidades de cada criança e promovam seu
desenvolvimento pleno. É essencial que tais abordagens sejam fun-
damentadas em uma perspectiva inclusiva, que reconheça e valorize
a diversidade, garantindo igualdade de oportunidades para todas as
crianças, independentemente de suas necessidades educacionais es-
peciais. Para isso, é necessário que sejam implementadas por profis-
sionais capacitados, que possuam conhecimentos específicos sobre
as necessidades das crianças com deficiência e estejam familiariza-
dos com as estratégias pedagógicas mais adequadas para estimular
seu desenvolvimento.
Justificativa
Ressalta a importância de oferecer experiências sensoriais en-
riquecedoras para bebês com deficiência visual. Devido à falta de
acesso à informação visual, eles dependem de outros sentidos para
explorar e compreender o mundo ao seu redor. Ao proporcionar es-
tímulos texturizados, sonoros, aromas e sabores variados, os bebês

91
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

com deficiência visual são expostos a uma variedade de estímulos


que os ajudam a compreender o ambiente em que vivem. Essas ex-
periências sensoriais também contribuem para o desenvolvimento
de suas habilidades motoras e cognitivas, melhorando sua capacida-
de de aprendizado e comunicação.
Além disso, as experiências sensoriais desempenham um pa-
pel importante na conexão das crianças com deficiência visual com
seus cuidadores e o mundo ao seu redor. Adaptar o ambiente de
aprendizado às suas necessidades específicas e oferecer oportuni-
dades para essas experiências estimulam seu desenvolvimento, pro-
porcionando uma base sólida para seu crescimento e aprendizado
significativo.
Objetivo

Oferecer experiências sensoriais enriquecedoras para bebês


com deficiência visual, pois eles dependem de outras modalidades
sensoriais para explorar e compreender o mundo sem o sentido da
visão. Isso contribui para promover sua inclusão social, permitindo
que participem de atividades com outras crianças e interajam com o
ambiente de maneira mais ampla.
Desenvolvimento da oficina
A oficina de textura foi projetada para proporcionar experiên-
cias sensoriais enriquecedoras para bebês com deficiência visual.
Utilizando uma variedade de materiais e objetos, como tecidos com
texturas diferentes, materiais de diferentes densidades e elementos
naturais e artificiais, os bebês tiveram a oportunidade de explorar
e sentir as texturas por meio do toque, usando suas mãos, pés e ou-
tras partes do corpo. Os adultos facilitadores da atividade auxilia-
ram os bebês na identificação e descrição das texturas, criando uma
experiência estimulante.
Além do estímulo sensorial, a oficina de textura teve outros
benefícios. Ela promoveu a inclusão, adaptando-se às necessidades

92
Capítulo 9: Aprendendo com as mãos - Oficina Montessoriana

individuais de cada bebê e valorizando a diversidade. Também con-


tribuiu para o desenvolvimento da coordenação motora fina, já que
os bebês manipularam os materiais. A atividade estabeleceu víncu-
los afetivos entre os bebês e os adultos responsáveis e estimulou a
aprendizagem lúdica, despertando a curiosidade e imaginação das
crianças.
A oficina de textura desempenha um papel significativo na
promoção de práticas pedagógicas que reconhecem e favorecem o
desenvolvimento de crianças com deficiência visual. Ela contribui
para a inclusão, o desenvolvimento sensorial, a coordenação motora
fina, o estabelecimento de vínculos afetivos e a aprendizagem lúdi-
ca.

Materiais e métodos
A oficina de textura envolve o uso de vários materiais e méto-
dos. Os materiais incluem papelão ondulado, papel crepom, algo-
dão, areia, massa de modelar, tintas de textura, tecidos com dife-
rentes texturas, pedaços de papel com diferentes texturas, sementes,
penas, pedras, conchas, esponjas, entre outros.
Os métodos utilizados na oficina são caixas surpresas, pintura
com textura, modelagem e exploração livre. Na caixa surpresa, os
materiais são colocados em caixas fechadas para que as crianças ex-
plorem através do tato. Na pintura com textura, as crianças usam
tintas com textura e podem pintar com as mãos ou outros materiais.
Na modelagem, as crianças criam formas e texturas com massinha
de modelar ou argila. Na exploração livre, as crianças têm liberdade
para explorar os materiais sem interferência do adulto. É importan-
te considerar a idade, habilidades e interesses das crianças ao esco-
lher os materiais e métodos, além de garantir a supervisão de um
adulto capacitado. Os materiais devem ser higienizados e seguros
para as crianças manipularem.

93
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Referencial teórico
Os artigos destacam a importância das atividades sensoriais na
educação de bebês e crianças com deficiência visual, evidenciando
os benefícios dessas práticas para o desenvolvimento motor, cogni-
tivo e sócio emocional desses indivíduos. Os autores também enfa-
tizam a importância da participação dos educadores e da família na
promoção de práticas pedagógicas inclusivas que valorizem a diver-
sidade e as habilidades de cada criança.
Vygotsky, em sua concepção dialética de desenvolvimento,
ressalta a relevância da interação social e cultural para o desenvol-
vimento humano. Ele destaca três conceitos fundamentais: indivi-
dualidade, conhecimento e linguagem. A individualidade refere-se
às características únicas de cada pessoa e desempenha um papel im-
portante no estabelecimento de relações sociais e construção de ex-
periências individuais. O conhecimento é construído coletivamente
por meio das interações sociais e culturais ao longo do desenvolvi-
mento, e a linguagem desempenha um papel essencial como ferra-
menta de comunicação, compartilhamento de ideias e organização
do pensamento.
Na concepção de Vygotsky, a individualidade, o conhecimen-
to e a linguagem estão interligados no processo de desenvolvimento
humano, sendo construídos por meio das interações sociais e cultu-
rais ao longo da vida.
Análise e discussão

A aplicação da oficina sensorial trouxe resultados positivos


para o desenvolvimento das crianças. Os principais benefícios ob-
servados incluem estimulação sensorial, desenvolvimento motor,
comunicação e socialização, autonomia e independência, além do
estímulo à curiosidade e criatividade. Os bebês puderam explorar
diferentes texturas, odores e temperaturas, desenvolver habilidades
motoras finas, estabelecer novas relações e experimentar diferentes
formas de expressão, além de adquirir autonomia e independência

94
Capítulo 9: Aprendendo com as mãos - Oficina Montessoriana

na exploração do ambiente. A participação em atividades sensoriais


estimulou a curiosidade e a criatividade dos bebês. É importante
ressaltar que os resultados podem variar de acordo com cada bebê,
a frequência e intensidade das oficinas. No entanto, de forma geral,
as atividades sensoriais contribuem para uma educação mais inclu-
siva e diversificada para crianças com deficiência visual.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concluímos que oferecer experiências sensoriais ricas para be-
bês com deficiência visual é de extrema importância para o desen-
volvimento cognitivo, emocional e social dessas crianças. A Edu-
cação Infantil e as práticas pedagógicas voltadas a bebês e crianças
público-alvo da Educação Especial são fundamentais para promo-
ver um ambiente educacional inclusivo e adequado às necessidades
dessas crianças.
As oficinas sensoriais, como a de texturas, têm um papel im-
portante na articulação
do trabalho de promoção de práticas pedagógicas que reconhe-
çam e favoreçam o desenvolvimento das crianças e bebês com de-
ficiência. Além disso, a concepção dialética de desenvolvimento de
Vygotsky nos mostra que o desenvolvimento humano é um proces-
so construído a partir das interações sociais e culturais, que envol-
vem conceitos de individualidade, conhecimento e linguagem.
Portanto, é essencial que haja um investimento em programas
de educação e práticas pedagógicas que reconheçam as especifici-
dades e necessidades das crianças com deficiência, promovendo um
ambiente educacional inclusivo e adequado ao desenvolvimento in-
tegral dessas crianças.

95
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

REFERÊNCIAS
ARAÚJO, T. F.; ALMEIDA, C. A.; SOUZA, C. A. A importância da Edu-
cação Infantil na redução das desigualdades sociais e econômicas. Re-
vista Eletrônica Ludomedia, v. 2, n. 3, p. 31-44, 2018.

BAPTISTA, Cláudia; BELO, Daniela. A Educação Infantil e as crianças


com deficiência: uma história de exclusão. Revista de Educação PUC-
-Campinas, v. 23, n. 2, p. 11-20, 2018.

BORGES, J. L. L.; VASCONCELOS, M. M. A inclusão de crianças com


deficiência na Educação Infantil no Brasil: avanços e desafios. Revista
Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento, v. 3, n. 7, p. 119-135,
2018.
CARVALHO, M.A. A importância das atividades sensoriais na educa-
ção de crianças cegas.Revista Brasileira de Educação Especial, v. 15, n. 1,
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GALLAHUE, D.L.; OZMUN, J.C.; GOODWAY, J.D. Understanding mo-
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Graw-Hill, 2011.
SOUZA, L. M. A. Inclusão escolar de crianças com deficiência: desafios
e possibilidades. Revista de Educação, Ciência e Tecnologia, v. 1, n. 1, p.
43-58, 2014.
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cia do desenvolvimento sensorial para a aprendizagem. Revista Brasi-
leira de Educação Especial, v. 20, n. 2, p. 329-344, maio-ago. 2014.
SISTO, F.F.; VASCONCELOS, F.A.G. de; FERNANDES, F.D.M. Interven-
ções sensoriais em bebês com deficiência visual: revisão integrativa.
Revista Brasileira de Educação Especial, v. 25, n. 3, p. 409-422, set.-dez.
2019.

96
Autora
Luizelia Melo De Souza

CAPÍTULO 10
Primeira infância: o brincar no
psicodiagnóstico
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

INTRODUÇÃO
A importância do contexto familiar para que o indivíduo atin-
ja a maturidade emocional atribui um peso grande à família como
formadora e propiciadora de um desenvolvimento afetivo saudável
ao ser humano (WINNICOTT, 2005).
Quando há desenvolvimento emocional saudável, o self tem
sua origem como potencial do recém-nascido, a partir de um am-
biente suficientemente bom. É importante fazer a distinção entre
um self verdadeiro, de onde surge a espontaneidade, a criatividade
e as ideias propriamente pessoais e um falso self, defensivo, organi-
zado para atender demandas do social, artificial (FRANCO, 2003).
Levando em consideração a relevância do suporte do ambien-
te, desde o início da vida do bebê, é possível pensar que, quando o
ambiente familiar não é capaz de atender às necessidades da criança
e lhe oferecer um provimento suficientemente bom, a criança dá si-
nais de que algo não vai bem.
A ludicidade auxilia nos desafios, pois propicia o trabalho com
diferentes linguagens, o que facilita a significação de conceitos e a
criança é capaz de construir seu próprio conhecimento. Durante a
brincadeira a criança tem a oportunidade de aprender e se desen-
volver, experimentar e interagir com outras pessoas. Sendo assim,
o conteúdo deste trabalho deu-se através de pesquisa bibliográfica
tendo como tema primeira infância: “o brincar no psicodiagnósti-
co”, sendo o objetivo principal analisar a importância do brincar no
trabalho com psicodiagnóstico infantil.
Na visão de Vigotsky et al. (1998) “O jogo simbólico é como
uma atividade típica da infância e essencial ao desenvolvimento in-
fantil, ocorrendo a partir da aquisição da representação simbólica,
impulsionada pela imitação”. Dessa maneira, o jogo pode ser consi-
derado uma atividade muito importante, pois através dele a criança
cria uma zona de desenvolvimento proximal, com funções que ain-
da não amadureceram, mas que se encontram em processo de ma-
turação, ou seja, o que a criança irá alcançar em um futuro próximo.

98
Capítulo 10: Primeira Infância: o brincar no psicodiagnóstico

Este trabalho de pesquisa enfoca o conceito da brincadeira, a


contribuição do brincar e das brincadeiras no processo de desenvol-
vimento das crianças, tanto no aspecto cognitivo quanto nos aspec-
tos da imaginação e da criatividade.
Segundo Santos (2002, p.12) a ludicidade é:
(...) uma necessidade do ser humano em qual-
quer idade e não pode ser vista apenas como
diversão. O desenvolvimento do aspecto lúdi-
co facilita a aprendizagem, o desenvolvimento
pessoal, social e cultural, colabora para uma
boa saúde mental, prepara para um estado in-
terior fértil, facilita os processos de socializa-
ção, comunicação, expressão e construção de
conhecimento.

Ao brincar livremente, a criança é capaz de organizar sua com-


petência de analisar e desenvolver valores, princípios e regras. Daí
a importância da valorização por parte do seu cuidador quanto ao
brincar nos primeiros anos de vida da criança

Primeira infância: o brincar no psicodiagnóstico


As transformações da sociedade, cultura e economia foram
fundamentais para a divisão entre adultos e crianças.
Segundo Ariès (1981), o sentimento de infância que se aproxi-
ma mais da modernidade se deu a partir do século XVIII, quando
houve uma segmentação do mundo adulto com o da criança. Até
então, na família medieval, a infância não tinha um foco significa-
tivo. As crianças eram consideradas como mini adultos. Na socie-
dade medieval, o público e o privado fundiam-se nas relações fami-
liares, no trabalho, nas relações sociais. As brincadeiras não eram
distintas, mas comum aos dois mundos. Não havia espaços desti-
nados às crianças, assim, logo que desmamadas, eram inseridas nos
afazeres do dia a dia dos adultos, ou seja, não havia clareza quanto
aos espaços e papéis de cada um.

99
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

A evolução da primeira infância é um recurso multidimensio-


nal em que o progresso em um domínio muitas vezes atua como
um estimulante para o avanço em outros domínios. Por outro lado,
os atrasos em uma determinada área de desenvolvimento podem
igualmente ser catalizadores de atrasos em outras áreas (YOUNG,
2010).
As crianças que chegam ao final da primeira infância deve-
riam estar se desenvolvendo bem física, cognitiva, linguística e so-
cioemocionalmente, para poderem usufruir plenamente das várias
oportunidades nos setores da educação e da saúde e tornar-se mem-
bros bem produtivos da sociedade. As crianças carentes ou desfavo-
recidas têm menos probabilidade de atingir patamares importantes,
porque estão muitas vezes expostas aos efeitos cumulativos de múl-
tiplos fatores de risco, entre os quais a falta de acesso aos serviços
básicos de água e saneamento, e a serviços de saúde de qualidade;
nutrição inadequada; pais com baixos níveis de escolaridade e falta
de acesso a creches e pré-escolas de qualidade (NAUDEAU, 2011).
Priorizar a infância, no conjunto de muitas outras necessida-
des, é uma tática inteligente para obter ganhos sociais e econômicos
superiores aos gerados por qualquer outro investimento. No entan-
to, para as crianças, mais importante do que preparar o futuro é vi-
ver o presente.
Elas precisam viver agora e na forma mais justa, plena e fe-
liz. Se a infância, segundo Mello e Neumann (2010), apud Péguy
(1914) é “o tempo das silenciosas preparações”, uma vez que “a
criança é o pai do homem”, ela é, igualmente, o agora.
Descreve Mello e Neumann (2010) apud Mistral (1945), que
para elas (crianças) não podemos dizer ‘amanhã’: seu nome é “hoje”.
Desde o dia, 8 de março de 2016, o Brasil possui uma das leis
mais avançadas do mundo sobre políticas públicas para crianças
de até seis anos de idade: a Lei Federal Nº 13.257, conhecida como
o Marco Legal da Primeira Infância (BRASIL, 2016).

100
Capítulo 10: Primeira Infância: o brincar no psicodiagnóstico

A lei é baseada em evidências científicas, não só em aspectos


de educação e saúde, mas até na questão de segurança (BRASIL,
2016).
Com a nova legislação, foi estabelecida ainda a divisão igualitá-
ria de direitos e responsabilidades entre pais, mães e responsáveis,
além da atenção especial a mães que optam por entregar seus filhos
à adoção e gestantes em detenção (BRASIL, 2016).
Com a publicação da lei, o Brasil se tornou o primeiro país
da América Latina a reconhecer a importância da primeira fase da
vida.
O Marco Legal da Primeira Infância trouxe alterações no pró-
prio Estatuto da Criança e do Adolescente. O Marco Legal também
reforça a importância do atendimento domiciliar, especialmente
para crianças de famílias em condições de vulnerabilidade social.
O psicodiagnóstico é o processo de avaliação psicológica que
ocorre no contexto clínico. Como a avaliação psicológica é função
privativa do psicólogo é fundamental que este profissional busque
compreender minimamente todos os fatores que estão envolvidos
nessa atuação. Basicamente, o psicodiagnóstico tem como objetivo
identificar forças e fraquezas do funcionamento psicológico do su-
jeito, com enfoque nos aspectos psicopatológicos (AGUIAR, 2005).
O psicodiagnóstico é determinado no tempo. Há, dessa manei-
ra, algumas etapas básicas desse processo, sendo elas: o enquadre,
em que são realizados os acordos com paciente como os valores, os
prazos, objetivos, entre outros (AGUIAR, 2005).
O psicodiagnóstico infantil é um processo complexo e de di-
fícil realização, particularmente pela patologia da criança estar re-
lacionada à vivência e dinâmica familiar. No psicodiagnóstico com
crianças, existem algumas especificidades a serem consideradas. A
criança deve ser sempre compreendida como parte de seu contexto,
assim o profissional que trabalha com crianças jamais deve ignorar
sua família (KISHIMOTO, 2010).

101
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Não se pode falar em psicodiagnóstico infantil sem se conside-


rar uma avaliação lúdica. Entende-se que a brincadeira e o brincar,
na terapia com crianças, ajudam na compreensão do modo como
esse público interage consigo e com o mundo. Nesse sentido, o
brincar tem papel de regulação da saúde emocional e das relações
interpessoais (AGUIAR, 2005).
Gouvêa e Souza (2010) destacam o brincar como uma expe-
riência fundamental na constituição de si mesmo, partindo da con-
cepção de que todo indivíduo se estabelece na coexistência e no re-
conhecimento mútuo com os demais.
Sabendo que objetivo central da psicoterapia é “auxiliar a crian-
ça a tomar consciência e si mesma e da sua existência em seu mun-
do” (RODRIGUES; NUNES, 2010, p. 191).
O profissional deve entender que, ao brincar com a criança,
não pode esquecer ou confundir seu papel, nem se comportar como
uma criança. Ele deve utilizar essa técnica como meio para atingir
os objetivos da psicoterapia, uma vez que a mesma possibilita as
potencialidades e habilidades do cliente. O brincar possibilita que a
criança perceba o mundo e descubra como este funciona.
Para Aguiar (2005, p.198):
Algumas crianças o simples fato de poder
brincar em um espaço seguro, permissivo e
confirmador com aquilo que ela queria esco-
lher, da forma como ela escolher, já é suficiente
para promover as reconfigurações necessárias
ao bem-estar e ao resgate de um funcionamen-
to saudável na sua interação com o mundo.

É por meio das brincadeiras que a criança emerge no processo


de aprendizagem, facilitando a construção da autonomia, reflexão
e criatividade. Dessa forma, a criança se desenvolve integralmen-
te, abrangendo os âmbitos sociais, afetivos, culturais, cognitivos,

102
Capítulo 10: Primeira Infância: o brincar no psicodiagnóstico

emocionais e físicos. Portanto, as brincadeiras são vitais para o de-


senvolvimento infantil. Quando as crianças brincam, assumem di-
ferentes papéis. Assim, elas criam mecanismos para agir diante da
realidade, substituindo ações cotidianas pelas ações cumpridas pelo
papel assumido. É por meio das brincadeiras que a criança estabele-
ce contato com o mundo físico e social (AGUIAR, 2005).
Através de jogos com regras, as crianças aprendem também a
controlar o comportamento impulsivo. Portanto, de acordo com
cada jogo, a criança desenvolve competências para adaptar seu
comportamento. Dados os objetivos e a estrutura do jogo, a criança
desenvolve sua capacidade de pensar e refletir sobre seus próprios
atos, fazendo uma autoavaliação de seu progresso, habilidades e de
seu comportamento moral.
Não há fórmula mágica: cada criança possui um desenvolvi-
mento singular. Cabe aos adultos estimularem a imaginação dos pe-
queninos, questionando-os e incentivando-os a encontrar soluções
para os problemas que surgirão (FRANCO, 2003).
Brincar é uma forma de expressão das emoções. Através do
jogo do faz-de-conta, a criança expressa suas próprias vivências,
corrigindo-as, revivendo prazeres e resolvendo conflitos, ou seja,
completa a realidade pelo uso da ficção. Através das histórias, é pos-
sível se ter uma forma de as crianças encenarem os seus medos, de
se resguardarem das suas tristezas. Brincar é, por si mesmo, uma es-
pécie de terapia de fácil acesso (FRANCO, 2003).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O brincar sugere sua importância para o processo terapêutico
infantil, o lúdico contribui para o funcionamento saudável da crian-
ça. Assim, considera-se o brincar como uma atividade essencial à
criança, demonstrando ser a forma de ela estar no mundo.

103
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

É importante observar o brincar como uma ferramenta


essencial para o trabalho psicoterapêutico com crianças. Não
há um padrão fixo de tratamento para as crianças, não se pode
determinar uma única forma de intervenção uma vez que há várias
possibilidades de intervenção a partir do brincar.

Brincar desempenha um papel fundamental no processo de so-


cialização da criança, pois permite que se integre e adapte ao mun-
do social. É no brincar e no jogar que a criança aprende a se comu-
nicar, a relacionar-se com os outros e a adquirir um sentimento de
pertencimento em relação ao grupo de convivência.
Deve-se considerar a criança como um ser ativo que busca o
equilíbrio e que é capaz de produzir mudanças. A partir, de suas re-
lações e de suas constantes trocas criativas com o meio, respeitando
sempre as suas limitações e capacidades.

REFERÊNCIAS
AGUIAR, L. Gestalt-terapia com crianças: teoria e prática. Livro Pleno.
Campinas: 2005.

ARIÈS, P. História Social da Criança e da família. 2ª ed. Rio de Janeiro:


Guanabara, 1981.

BRASIL. Presidência da República - Secretaria-Geral - Subchefia para


Assuntos Jurídicos. Lei 13.257, de 8 de março de 2016. Dispõe sobre as
políticas públicas para a primeira infância e altera a Lei nº 8.069, de 13
de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), o Decreto-Lei
nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), a Conso-
lidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452,
de 1º de maio de 1943, a Lei nº 11.770, de 9 de setembro de 2008, e a Lei nº
12.662, de 5 de junho de 2012. Disponível em http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13257.htm. Acesso em 19 de abr.2023.

104
Capítulo 10: Primeira Infância: o brincar no psicodiagnóstico

FRANCO, S. de G. O brincar e a experiência analítica. Janeiro de 2003.


disponível em<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pi-
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MELLO, T. de; NEUMANN, Z. A. Plano Nacional pela primeira infân-


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NAUDEAU S. et all. Como Investir na Primeira Infância: Um Guia para


a Discussão de Políticas e a Preparação de Projetos de Desenvolvimento
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RODRIGUES, P.; NUNES, A. L. Brincar: um olhar gestáltico. 2010. Dis-


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SANTOS, S. M. P. dos. O lúdico na formação do educador. 5 ed. Vozes,


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da_Primeira_Infancia%20ao_Desenvolvimento_Humano.pdf>. acessado
em: 15 maio 2023.

105
Autora
Andréa Mendes de Almeida Pereira

CAPÍTULO 11
Uma formação para profissionais do ensino
infantil na ambiência do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de
Minas Gerais - IFNMG
Capítulo 11: Uma formação para profissionais do ensino infantil na ambiência do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais - IFNMG

INTRODUÇÃO
Os Institutos Federais foram criados pela Lei 11.892, de 29 de
dezembro de 2008, mesma norma que instituiu a Rede Federal de
Educação Profissional, Científica e Tecnológica.
Presentes em todos os estados da federação, os institutos, nos
termos da lei, têm, como finalidade primeira, ministrar ensino pro-
fissional e tecnológico, nas várias modalidades da educação básica
e superior, com vistas a formar indivíduos aptos a contribuir para o
desenvolvimento socioeconômico local, regional e nacional.
Na esteira desse propósito, dentre os objetivos institucionais,
consta a oferta de cursos de formação inicial e continuada de traba-
lhadores (BRASIL, 2008). Os IFs pretendem, em sua proposta po-
lítico-pedagógica, contribuir para o aperfeiçoamento dos arranjos
produtivos, orientando uma formação contextualizada, analítica,
que compreenda e intervenha, propositiva e construtivamente, no
mundo do trabalho (PACHECO, 2011, p. 13).
No escopo da educação profissional, a formação inicial e conti-
nuada, centrada nos trabalhadores, objetiva a atualização de saberes
e práticas (NETO e PASSOS, p. 31, 2013). Quando idealizados para
professores, os cursos podem refletir os contextos escolares e auxi-
liar na constituição de novas metodologias pedagógicas, aperfeiçoa-
das e efetivas, capazes de renovar o processo de ensino-aprendiza-
gem, repercutindo na comunidade escolar e na sociedade.
Nessa linha, os profissionais da área da formação infantil, por
atuarem nesses primeiros níveis, são, por excelência, agentes de
desenvolvimento, com função estratégica, considerando o caráter
transformador e emancipatório da educação.
Nas letras da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacio-
nal, “[a] educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem
como finalidade o desenvolvimento integral da criança de zero a
cinco anos de idade, em seus aspectos físico, afetivo, intelectual, lin-

107
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

guístico e social, complementando a ação da família e da comuni-


dade” (BRASIL, 1996). A interação com a escola e seus agentes, au-
xiliará na condução dos primeiros passos da criança, em várias das
dimensões que farão parte de sua vida, de seu autoconhecimento e
de sua relação com o mundo.
A Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2009, fixa as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Pela DCNEI,
A proposta pedagógica das instituições de
Educação Infantil deve ter como objetivo ga-
rantir à criança acesso a processos de apropria-
ção, renovação e articulação de conhecimen-
tos e aprendizagens de diferentes linguagens,
assim como o direito à proteção, à saúde, à li-
berdade, à confiança, ao respeito, à dignidade,
à brincadeira, à convivência e à interação com
outras crianças. (BRASIL, 2009).

À escola caberá, então, intermediar o contato da criança


com práticas e conteúdos que a instrumentalizem para elaborar
suas interações sociais, devendo ser a ela, no processo, garantidos
os direitos que preservem seu bem estar, e respeitem sua
individualidade e seu acesso à brincadeira e ao convívio com seus
pares.
Para consecução da proposta pedagógica, o DCNEI orienta
quanto à organização do espaço, do tempo e dos materiais (BRA-
SIL, 2009). Dentre as diretrizes, é trabalhado o conceito de uma
educação integral, que prime pelo cuidado, pela visão da criança
como um todo, em suas expressões, especificidades e vivências, da
valorização dos saberes e da cultura de seu meio. É defendida tam-
bém a importância de se criar relações entre crianças de mesma fai-
xa etária e também de idades diferentes. Nesse percurso, os infantes
percorrem amplamente o espaço escolar, em trabalhos dirigidos que
propiciam reflexões, reelaboração e apropriação de um conheci-

108
Capítulo 11: Uma formação para profissionais do ensino infantil na ambiência do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais - IFNMG

mento copioso e entrelaçado: histórico, geográfico, científico e hu-


mano.
Todo esse processo deve levar em conta e garantir a participa-
ção plena das crianças com deficiência, transtornos globais de de-
senvolvimento e altas habilidades/ superdotação. Nessa perspectiva,
a formação inicial e continuada, dirigida para os profissionais da
educação que atendem bebês e crianças, alvo da educação especial,
vão fortalecer as políticas públicas que patrocinam a educação in-
clusiva.
Neste trabalho, discutiremos alguns aspectos da oferta de um
curso FIC, para profissionais da educação pública, que atuam no
atendimento educacional especializado, na área de abrangência do
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de
Minas Gerais - IFNMG.

Análise e discussão .
O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do
Norte de Minas Gerais (IFNMG) é composto por onze campi, nos
municípios de Almenara, Araçuaí, Arinos, Diamantina, Janaúba,
Januária, Montes Claros cidade que também sedia a Reitoria, Pira-
pora, Porteirinha, Salinas e Teófilo Otoni. A abrangência do IFN-
MG agrega 176 municípios, das mesorregiões Norte e Noroeste de
Minas e Vales do Jequitinhonha e Mucuri, cobrindo quase toda a
metade norte do estado (MATOS, 2018, p. 44).

Pela primeira vez, desde a sua criação, o IFNMG oferta para a


sociedade um curso de formação inicial e continuada voltada para
profissionais que atuam no atendimento educacional especializado
para bebês e crianças. Um olhar menos atento poderia considerar a
proposta como estranha aos objetivos institucionais, considerando
que a instituição é principalmente reconhecida pelos cursos técni-
cos associados ao ensino médio e também pelos cursos de gradua-
ção.

109
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

No entanto, a missão institucional, explicitada já na lei de sua


gênese, e reiterada, depois, nos documentos que constituem as suas
diretrizes, diz da necessidade de um olhar mais amplo para o mer-
cado de trabalho. Nesse sentido, as formações elaboradas para a ca-
pacitação profissional possibilitam que o contexto de um labor seja
observado, de modo que as lacunas concernentes ao serviço sejam
socialmente identificadas.
O curso “Educação Infantil - Práticas voltadas para bebês e
crianças público da educação especial” recebeu recursos, por meio
de Termo de Execução Descentralizada, da SEMESP - Secretaria
de Modalidades Especializadas de Educação, no Programa de For-
mação de Profissionais da Educação Básica em Educação Espe-
cial. Atualmente, com a reestruturação da pasta da educação, os
ativos da SEMESP foram absorvidos pela SECADI - Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Seca-
di). O objetivo da entidade é fomentar políticas educacionais volta-
das para temas sensíveis, como educação ambiental, alfabetização e
educação especial.
No IFNMG, o curso foi ofertado na ambiência da Diretoria de
Assuntos Estudantis. Os recursos liberados, junto ao SIMEC - Siste-
ma Integrado de Monitoramento e Controle, permitiram o custeio
de bolsas para 20 (vinte) tutores e três professores pesquisadores,
selecionados via edital, publicado pelo instituto. A equipe contou
ainda com uma professora formadora e uma supervisora, ambas
idealizadoras da formação. No curso, atuaram também um audio-
descritor, três intérpretes de Libras, um técnico para auxiliar no
acesso ao ambiente de ensino e uma secretária, também seleciona-
dos por edital. Todos esses profissionais auxiliaram na concretiza-
ção da formação, desenvolvida na modalidade à distância, com uso
do Ambiente Virtual de Aprendizagem do Instituto.
Foram disponibilizadas 600 vagas para cursistas e a divulgação
aconteceu, principalmente, junto às prefeituras dos municípios lo-
calizados na abrangência da instituição. O edital recebeu 959 mani-

110
Capítulo 11: Uma formação para profissionais do ensino infantil na ambiência do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais - IFNMG

festações, sendo os candidatos classificados pela ordem de inscrição


(MONTES CLAROS, 2022).
Entendemos a grande procura como um indicativo de que o
curso contempla uma necessidade de formação dos profissionais da
educação básica, pública, que trabalham com o atendimento espe-
cializado a bebês e crianças. Consideramos ainda que a possibilida-
de de orientação dos estudos, em ambiente totalmente virtual, por
favorecer o acesso ao conteúdo, também contribuiu para aumentar
o interesse dos cursistas pela formação.

Organizado em três módulos, o curso foi ofertado no primei-


ro semestre de 2023. Na etapa inicial, o estudo se voltou para a le-
gislação aplicada ao atendimento educacional especializado. Na se-
gunda, cuidou de discutir a evolução infantil, associando a atuação
familiar e destacando a criança como protagonista de seu desen-
volvimento. O terceiro módulo trouxe a perspectiva da inclusão no
sistema educacional, considerando as adequações da infraestrutura,
bem como dos aspectos pedagógicos, tanto teóricos quanto meto-
dológicos; além de tratar da avaliação na Educação Infantil e apro-
fundar a discussão sobre a participação da família no ambiente es-
colar e no processo de formação.

A relevância da prática pedagógica permeou e se articulou ao


debate, nos três módulos do curso, denotando a preocupação da
formação em contribuir para a reflexão sobre o desenvolvimento
infantil e a elaboração de ações propositivas no sentido de pensar o
ambiente escolar como espaço orientado para uma educação verda-
deiramente democrática, com vistas a promover o desenvolvimento
autônomo e inclusão social dos bebês e crianças atendidos.

Divididos em 20 turmas, cada uma acompanhada por um tu-


tor, os cursistas desenvolveram trabalhos de leitura, análise e dis-
cussão de textos. Participaram de aulas síncronas, transmitidas no

111
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

canal do Youtube do IFNMG, desenvolveram um diário de bordo e


realizaram demais atividades orientadas pelos professores pesquisa-
dores, durante as 180 (cento e oitenta horas) de duração do curso.

Dados obtidos no SIMEC, demonstram que, ao final da for-


mação, contávamos com 587 cursistas, devido a algumas evasões.
Constatamos uma queda na participação, no terceiro módulo. Con-
cluíram o curso, com êxito, 296 alunos, distribuídos entre os muni-
cípios atendidos. Consideramos o número expressivo e entendemos
que é grande o potencial de repercussão da formação, na elaboração
de novas práticas pedagógicas dos profissionais que atuam no aten-
dimento educacional especializado a crianças e bebês. Os fatores
relacionados às evasões e às reprovações serão alvo de estudos a se-
rem realizados oportunamente. Tais dados serão importantes para
planejarmos as próximas ofertas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Desenvolvido na pasta da Diretoria de Assuntos Estudantis,


o curso “Educação Infantil - Práticas voltadas para bebês e crian-
ças público da educação especial” foi pensado para profissionais
do atendimento educacional especializado das escolas públicas dos
municípios contemplados na área de atuação do IFNMG. A forma-
ção, a primeira no IFNMG idealizada para esse público, identificou
uma demanda reprimida, considerando o grande número de inscri-
ções recebidas. Ademais, também atendeu aos objetivos governa-
mentais de fomento da formação continuada em educação especial,
na intenção aperfeiçoar os processos de ensino-aprendizagem.
O curso propôs o estudo da legislação aplicada ao atendimen-
to educacional de bebês e crianças com deficiência, transtorno do
espectro autista e altas habilidades/superdotação, à luz das etapas e
especificidades do desenvolvimento infantil, considerado como um

112
Capítulo 11: Uma formação para profissionais do ensino infantil na ambiência do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais - IFNMG

todo. Além disso, tratou da participação da família no processo, em


suas singularidades, contribuindo para as discussões concernentes
ao direito de todos à educação, a partir de práticas efetivamente in-
clusivas.
No contexto de sua missão institucional, o IFNMG ofereceu
aos profissionais a oportunidade de se capacitarem e se aperfeiçoa-
rem no exercício de sua função. Sendo a Educação Infantil a pri-
meira etapa da educação básica, projetos e ações voltados para as
potencialidades desse público, a partir da reelaboração das práticas
pedagógicas a ele dedicadas, é meio pelo qual a instituição se sinto-
niza, ainda, com os projetos progressistas de desenvolvimento so-
cial.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei N.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Dire-
trizes e Bases da Educação e dá outras providências. Brasília, DF: Diá-
rio Oficial da União, 1996.

BRASIL. Lei Nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede


Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os Ins-
titutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e dá outras provi-
dências. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 2008.

BRASIL, Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câ-


mara de Educação Básica. Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2009.
Fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil.
Brasília, DF: Diário Oficial da União, 2009.

MATOS, E. F. Transparência Ativa dos Institutos Federais de Educa-


ção, Ciência e Tecnologia e o papel do Contador Público. Dissertação
(Mestrado em Administração Pública) - Programa de Pós Graduação em
Administração Pública, Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha
e Mucuri. Teófilo Otoni, p. 95. 2018.

113
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

MONTES CLAROS (MG). Edital 413 - Processo Seletivo para Ingresso


na Turma 001/2022 do Curso Educação Infantil: Práticas Educativas
Voltadas a Bebês e Crianças Público da Educação Especial, na Moda-
lidade Educação à Distância, no Âmbito do Instituto Federal do Norte
de Minas Gerais – IFNMG. Resultado Final das Inscrições. Montes Cla-
ros: Reitoria do IFNMG, Diretoria de Assuntos Estudantis, 23 nov. 2022.
Disponível em: <https://ifnmg.edu.br/editais-daec>. Acesso em 20 set.
2023.

PACHECO, Eliezer. Os Institutos Federais: uma revolução na educação


profissional e tecnológica. In: PACHECO, Eliezer. Institutos federais
uma revolução na educação profissional e tecnológica. São Paulo: Mo-
derna, 2011. p. 13-32.

NETO, José Tavares da Silva Neto; PASSOS, Guiomar de Oliveira. OS


INSTITUTOS FEDERAIS de educação, ciência e tecnologia no desen-
volvimento brasileiro: entre o mercado e os excluídos. Informe Eco-
nômico, Piauí, Universidade Federal do Piauí, v. 29, 1, p. 31-34, abril.
2013. Disponível em: <https://periodicos.ufpi.br/index.php/ie/article/
view/1799/1627>, acesso em: 20 set. 2023.

114
Autora
Hasla De Paula Pacheco

CAPÍTULO 12
“Eduvivências”: narrativa sobre a tutoria a
distância no curso de educação infantil -
práticas educativas voltadas a bebês e crianças
público da Educação Especial
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

INTRODUÇÃO
A narrativa é uma poderosa forma criativa utilizada por pes-
soas, autores de textos científicos e cidadãos que percorrem o mun-
do real para compartilhar sua biografia e experiências acadêmica,
profissionais, sociais, revelando-se ao mundo de maneira única
e pessoal (Clandinn e Connelly, 2011). É através da narrativa que
as pessoas constroem e comunicam suas histórias, permitindo que
outros compreendam e se conectem com suas vidas e obras.
Ao me propor a construir um texto empregando a narrativa, trans-
mito por meio dos meus relatos de experiência não apenas eventos,
acontecimentos, mas também perspectivas e reflexões pessoais so-
bre o objeto do relato. Essa forma de expressão possibilita que se-
jam contadas histórias complexas e enriquecedoras, que capturam
a essência das experiências vividas e proporcionam uma compreen-
são mais profunda do mundo e das pessoas. (Paiva, 2010).
Seja em textos científicos, nos quais os pesquisadores narram
suas descobertas e contribuições para o conhecimento, ou nas vi-
vências cotidianas dos cidadãos, nas quais se compartilham expe-
riências de vida e aprendizados, a narrativa desempenha um papel
fundamental na comunicação e na construção de identidades indi-
viduais e coletivas.
Por meio da narrativa sobre minha experiência na função de
tutora a distância do curso Educação Infantil: Práticas educativa
voltadas a bebês e crianças público da Educação especial, tenho a
oportunidade de me expressar, compartilhar perspectivas e apren-
dizados construídos ao longo do curso.

Uma breve contextualização normativa da Educação Infantil e a


relação com a Educação Especial/Inclusiva

A legislação da Educação Infantil, no Brasil passou por diversas


transformações ao longo dos anos. Em 1946, a Constituição Federal
previu a obrigatoriedade do ensino primário, mas não mencionou

116
Capítulo 12: “Eduvivências”: narrativa sobre a Tutoria a Distância no Curso de Educação
Infantil - Práticas Educativas Voltadas a Bebês e Crianças Público da Educação Especial”

a Educação Infantil. Foi somente, em 1988, com a promulgação da


atual Constituição Federal (Brasil,1998), que a Educação Infantil foi
reconhecida como a primeira etapa da Educação Básica.
Em 1990, foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educa-
ção Nacional (LDB), que estabeleceu as bases da Educação Infantil
no país. A LDB definiu a Educação Infantil como a primeira etapa
da Educação Básica, voltada para crianças de até 5 anos de idade, e
estabeleceu que essa etapa de ensino deveria ser oferecida em cre-
ches e pré-escolas.
Em 1996, o Ministério da Educação (MEC) publicou as Dire-
trizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, que defini-
ram as orientações para a elaboração dos currículos dessa etapa de
ensino em todo o país. Tais Diretrizes Curriculares foram atualiza-
das em 2010, e trouxeram importantes mudanças em relação à con-
cepção de infância e ao papel da Educação Infantil na formação das
crianças.
Atualmente, a Educação Infantil no Brasil é regulamentada
pela Lei nº 13.005/2014, que estabelece o Plano Nacional de Educa-
ção (PNE) e define as metas para a melhoria da qualidade da Edu-
cação Básica no país. O PNE estabelece a meta de universalizar, até
2016, o atendimento escolar da população de 4 e 5 anos, e ampliar
a oferta de Educação Infantil em creches para atender, no mínimo,
50% das crianças de até 3 anos até 2024. (Brasil, 2014)
A Educação Infantil tem uma relação importante com a Educa-
ção Inclusiva, uma vez que essa etapa de ensino é o início da traje-
tória educacional das crianças e é essencial para o desenvolvimento
cognitivo, social, emocional e físico dos pequenos. Por sua vez, a
Educação Inclusiva tem como objetivo garantir o acesso, a partici-
pação e o aprendizado de todos os alunos, sem exceção, valorizando
a diversidade e respeitando as diferenças individuais. Nessa medida,
na Educação Infantil é fundamental que essa perspectiva inclusiva
esteja presente desde o início, para que as crianças aprendam desde
cedo a conviver com a diversidade e a respeitar as diferenças. (Bra-
sil, 2009)

117
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Nesse sentido, a Educação Infantil deve estar preparada para


receber todas as crianças, independentemente de suas característi-
cas pessoais, sociais, culturais ou biológicas. Isso implica em uma
série de ações e medidas que visam garantir a inclusão de todos,
como a oferta de espaços e materiais pedagógicos acessíveis, a for-
mação de professores capacitados para atender às necessidades es-
pecíficas dos alunos e a criação de um ambiente acolhedor e inclusi-
vo.
Além disso, é importante destacar que a Educação Infantil deve
estar em consonância com a Política Nacional de Educação Especial
na Perspectiva da Educação Inclusiva, que orienta a oferta de edu-
cação especial na rede regular de ensino e a promoção de práticas
inclusivas desde o início da trajetória educacional dos alunos. As-
sim, a Educação Infantil deve ser planejada e desenvolvida de forma
a atender às necessidades de todos os alunos, garantindo a igualda-
de de oportunidades e o respeito às diferenças.
A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da
Educação Inclusiva foi instituída, em 2008, por meio do Decreto nº
6.571, de 17 de setembro de 2008, que tem como objetivo garantir
o acesso, a participação e o aprendizado de todos os alunos, inde-
pendentemente de suas características pessoais, sociais, culturais ou
biológicas. Em 2011, foi revogado pelo Decreto nº7.611, de 2011.
Essa política se baseia nos princípios da inclusão, da equidade, do
respeito às diferenças, da valorização da diversidade e do direito à
educação. Ela busca promover a transformação das práticas peda-
gógicas, para que sejam mais inclusivas e que garantam o atendi-
mento às necessidades educacionais especiais dos alunos, sem dis-
criminação e com a oferta de recursos e estratégias adequadas.
Tal política prevê a criação de salas de recursos multifuncio-
nais, que são espaços equipados com recursos pedagógicos e tecno-
lógicos para o atendimento educacional especializado dos alunos,
e a oferta de serviços de apoio pedagógico especializado, como o
atendimento educacional especializado e o acompanhamento do
processo de inclusão.Dessa forma, a Política Nacional de Educação

118
Capítulo 12: “Eduvivências”: narrativa sobre a Tutoria a Distância no Curso de Educação
Infantil - Práticas Educativas Voltadas a Bebês e Crianças Público da Educação Especial”

Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva tem como objetivo


promover a inclusão de todos os alunos na rede regular de ensino,
garantindo o respeito às diferenças e o direito à educação de quali-
dade para todos evidenciam a importância da formação continuada
e do apoio pedagógico especializado no trabalho com bebês e crian-
ças da educação especial. Além disso, ressaltam a necessidade de
um planejamento educacional inclusivo, que considere as diferenças
individuais e ofereça oportunidades equitativas de aprendizado.

Eduvivências: a tutoria a distância na prática


O relato de experiência acerca da atuação de tutora a distância,
em um curso de educação a distância, com temática em Educação
Infantil e práticas educativas é uma oportunidade valiosa para o
aprimoramento profissional e a troca de saberes entre educadores
e, a própria, tutoria. O Curso de “Educação Infantil: Práticas Edu-
cativas Voltadas a Bebês e Crianças Público da Educação Especial”
abordou a temática do desenvolvimento infantil típico e atípico,
bem como a legislação relacionada à Educação Infantil e à Educa-
ção Especial. Seu objetivo geral foi compreender esses aspectos para
contribuir no planejamento e construção do trabalho pedagógico
voltado para o atendimento de bebês e crianças público da educa-
ção especial, com o intuito de promover seu desenvolvimento e in-
clusão educacional e social plena. (Projeto do Curso,2022)
Durante o curso de aperfeiçoamento, foram discutidas diversas
estratégias e práticas pedagógicas para a Educação Infantil, consi-
derando a importância do desenvolvimento cognitivo, social, emo-
cional e físico das crianças. Foram apresentados conceitos sobre as
teorias da aprendizagem, métodos de ensino e avaliação, além de
serem abordadas questões sobre a inclusão e a diversidade na Edu-
cação Infantil.
Os participantes do curso também tiveram a oportunidade de
compartilhar suas experiências e práticas educativas, por meio de
relatos nos fóruns, e também na elaboração do Diário de Bordo, o

119
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

que enriqueceu o debate e possibilitou a troca de ideias e sugestões


para aprimoramento do trabalho em sala de aula.
Na atividade de elaboração do Diário de Bordo, atividade que
perpassou por todo o curso nos seus três módulos, foi possível co-
nhecer seus posicionamentos e reflexões sobre aspectos normativos,
conceituais, e práticos sobre as diferentes metodologias e aborda-
gens pedagógicas utilizadas pelos professores, assim como desafios
e dificuldades enfrentados no cotidiano escolar. Ao final do curso,
os participantes puderam ampliar seus conhecimentos sobre a Edu-
cação Infantil e práticas educativas, além de terem adquirido novas
habilidades e competências para aplicar em sala de aula. Minha ex-
periência em conduzir o trabalho, por meio da tutoria desse curso
de educação a distância com temática em Educação Infantil e prá-
ticas educativas foi enriquecedora e fundamental para o aprimora-
mento da prática pedagógica em ambiente de aprendizagem virtual
junto aos educadores participantes.
Como tutora, meu papel era auxiliar, mediar, induzir a reflexão
dos participantes do curso em sua jornada de aprendizagem, forne-
cendo suporte e orientação em relação aos conteúdos, atividades e
metodologias utilizadas no curso. Para isso, utilizei diversas ferra-
mentas de comunicação, como por exemplo, os fóruns de discussão;
para estar sempre disponível para esclarecer dúvidas e orientar os
participantes em relação às atividades e tarefas do curso. Além dis-
so, também realizei feedbacks individuais e coletivos, com o objeti-
vo de auxiliar os participantes no aprimoramento de suas habilida-
des e competências.
Entendo que a oportunidade de participar dessa proposta for-
mativa evidenciou o quanto é importante a tutoria e a construção
da identidade docente no contexto da EaD (Cavalcante Filho, Sales
e Alves, 2020). Esses autores abordam a tutoria como um elemen-
to central na EAD, ressaltando seu papel na mediação do processo
de ensino e aprendizagem entre professores e estudantes. Eles enfa-
tizam que, embora a tutoria seja fundamental, muitas vezes é uma

120
Capítulo 12: “Eduvivências”: narrativa sobre a Tutoria a Distância no Curso de Educação
Infantil - Práticas Educativas Voltadas a Bebês e Crianças Público da Educação Especial”

área pouco explorada e reconhecida no contexto da EAD. Por isso,


acredito que relatos sobre as ações desenvolvidas na tutoria podem
enriquecer os contextos acadêmicos e pedagógicos.
Minhas funções, na tutoria, diziam respeito a minha atuação
na mediação do processo de ensino e aprendizagem, articulando,
sendo elo entre os cursistas e o conteúdo; entre cursistas e nos do-
centes que pensaram os conteúdos, toda essa articulação desempe-
nhada exige habilidades específicas e competências pedagógicas e
relacionais. (Behar, 2013).
Ao longo do curso, é importante dominar competências téc-
nicas e organizacionais (Tecchio et al, 2010). É importante salien-
tarque a atuação, no curso, ajudou-me a pensar na didática, no am-
biente virtual, nos modos de interação, na necessidade da empatia,
no espaço das relações afetivas. Dimensões importantes e necessá-
rias para a formação do tutor. Evidencio que o desempenho do meu
papel e dos demais tutores foi crucial no estímulo à participação
ativa dos estudantes, na promoção da autonomia e no apoio indivi-
dualizado.
Um dos maiores desafios que encontrei como tutora a distân-
cia foi a necessidade de estar sempre atualizada e preparada para li-
dar com as diferentes demandas dos participantes, inclusive sobre o
conteúdo desenvolvido. Cada um deles tinha suas próprias necessi-
dades e ritmos de aprendizagem, o que exigiu de mim muita flexibi-
lidade e adaptabilidade.
No entanto, essa experiência também me proporcionou muitas
oportunidades de aprendizado e crescimento profissional. Como
tutora a distância, pude aprimorar minhas habilidades de comuni-
cação, mediação e gestão de tempo, além de desenvolver a capacida-
de de trabalhar em equipe, mesmo a distância.
Tal jornada formativa foi muito gratificante ver o progresso dos
participantes e como pude contribuir para sua jornada de apren-
dizagem. Como tutora a distância, sinto que pude fazer parte do
processo de formação continuada desses profissionais da educação

121
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

infantil, proporcionando-lhes conhecimento e oportunidades de


crescimento pessoal e profissional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O campo da pesquisa, acerca da tutoria na educação a distân-
cia, envolve, em sua essência, um ambiente colaborativo, o qual
possibilita a conexão entre os diferentes participantes do curso. A
Plataforma Virtual de Aprendizagem, lugar de aprender com dife-
rentes formas de organização e metodológicas de ensino e apren-
dizagem, proporcionou a formação continuada para os que atuam
na Educação Infantil, uma vez que esta é uma etapa fundamental
na formação das crianças, e é necessário estar sempre atualizado e
aprimorar constantemente as práticas pedagógicas.
O curso prevaleceu a educação on-line, proporcionando ativi-
dades assíncronas e aula síncronas na plataforma YouTube. Nesse
modelo de organização, os cursistas puderam assistir às aulas das
pelos professores como parte das estratégias de aprendizagem. A
formação continuada proporciona aos educadores o acesso a novos
conhecimentos, metodologias e práticas pedagógicas, que possibi-
litam uma atuação mais efetiva e qualificada na Educação Infantil.
Além disso, a formação continuada tem o objetivo de contribuir
para o desenvolvimento de novas habilidades e competências, bem
como para o aprimoramento da reflexão crítica e da prática reflexi-
va.
Nessa perspectiva, como opção de curso de formação, curso na
modalidade a distância, ao escolher escrever sobre minha atuação,
penso sobre a referida experiência, buscando questionamentos, ava-
liações, posicionando-me nesse processo de formação continuada.
Com a formação continuada, os educadores podem aprimorar
suas técnicas de ensino, ampliar seus conhecimentos sobre o desen-
volvimento infantil e sobre as teorias da aprendizagem, bem como

122
Capítulo 12: “Eduvivências”: narrativa sobre a Tutoria a Distância no Curso de Educação
Infantil - Práticas Educativas Voltadas a Bebês e Crianças Público da Educação Especial”

se atualizar em relação às políticas públicas e à legislação que regu-


lamenta a Educação Infantil. Isso possibilita uma prática pedagó-
gica mais efetiva e eficiente, que contribui para o desenvolvimento
cognitivo, social, emocional e físico das crianças.
Em relação à narrativa autobiográfica, eu enquanto pesquisa-
dora elaborei a narrativa sobre mim mesma durante o processo de
(re) escrita da experiência de educação vivida. Dessa forma, tal es-
tudo possibilitou a construção de uma compreensão mais profun-
da do meu desenvolvimento por meio das histórias de suas vidas.
Embora compartilhe semelhanças com os depoimentos da história
oral, este relato não focalizou apenas em fatos ou eventos, mas sim
na revelação dos próprios sujeitos. Os fatos e eventos recordados
acabam sendo subprodutos da minha narrativa. De acordo com
Mignot et al (2008), as autobiografias possibilitam uma maior com-
preensão das dinâmicas entre ensino e aprendizado, das identidades
profissionais, do perfil de tutor, dos estágios de vida e de outros as-
pectos.
Em suma, a formação continuada é essencial para o fortaleci-
mento da identidade profissional dos educadores, que se sentem
mais valorizados e reconhecidos em sua prática. A formação conti-
nuada pode ser realizada por meio de cursos, palestras, seminários,
workshops, entre outras atividades, e deve ser vista como um inves-
timento na qualidade da Educação Infantil.

REFERÊNCIAS:
BEHAR, P. A. Competências em Educação a Distância. Porto Alegre:
Penso, 2013.

BRASIL. Lei N.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Dire-


trizes e Bases da Educação e dá outras providências. Brasília, DF, 1996.
BRASIL. Decreto nº6.571/2008.Estabelece sobre o atendimento educacio-
nal especializado. Brasília, 2008.

123
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

BRASIL. Lei N.º 13.257/2016. Marco Legal da Primeira Infância. Brasí-


lia, 2017.

BRASIL. Resolução CEB n.1 de 07 de abril de 1999. BRASIL. Minis-


tério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Base Nacional Co-
mum Curricular. Brasília, DF, 2017.

BRASIL, Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câ-


mara de Educação Básica. Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2009.
Fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil.
Brasília, 2009

BRASIL. Decreto nº7.611/2011.Dispõe sobre a educação especial, o aten-


dimento educacional especializado. Brasília, 2011.

CAVALCANTE FILHO, A.; SALES, V. M. B.; ALVES, F. C. Tutoria e


identidade docente na educação a distância. Práticas Educativas, Me-
mórias e Oralidades - Rev. Pemo, [S. l.], v. 2, n. 1, p. 1–15, 2020. DOI:
10.47149/pemo. v 2i1.3632. Disponível em: https://revistas.uece.br/index.
php/revpemo/article/view/3632. Acesso em: 3 jul. 2023.

CLANDININ, D. Jean. CONELLY, F. Michael. Pesquisa narrativa: expe-


riências e história na pesquisa qualitativa. Tradução: Grupo de Pesquisa
Narrativa e Educação de Professores ILEEL/UFU. Uberlândia: EDUFU,
2011.

MIGNOT, A,C.V (org). Histórias de vida e formação de professores. Rio


de Janeiro:Quartet:FAPERJ,2008.

PAIVA, Vera Lúcia Menezes de Oliveira e. A pesquisa narrativa: uma in-


trodução.2010. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbla/a/gPC5BsmL-
qFS7rdRWmSrDc3q/?format=pdf. Acesso em 10/05/2023.

TECCHIO, E. L.; NUNES, T. S.; MORETTO, S. M.; DALMAU, M. B.;


Melo, P. A. Competências fundamentais ao tutor de ensino a distância.
Colabor@ -Revista Digital da CVA-RICESU, v. 6, n. 21, 2010.

124
Autora
Daniela dos Santos Landazuri

CAPÍTULO 13
Tutoria em ead: perfil, limites e
possibilidades
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

INTRODUÇÃO

Com o surgimento da Educação a Distância e o avanço tecno-


lógico, a Internet passou a oportunizar pessoas, dos mais variados
níveis de instrução e dos mais longínquos lugares do país, acesso
a todo e qualquer tipo de conhecimento. Essa nova concepção de
Educação, também vem sendo usada na formação continuada, pos-
sibilitando aos docentes aperfeiçoar e ampliar seu conhecimento, de
forma mais facilitada.
Nessa nova modalidade de Educação, a EAD, surgem vários
novos atores e um deles é o tutor, um profissional que despertou a
curiosidade de investigação dessa pesquisadora, que atua com a tu-
toria há mais de 15 anos. Nesse resumo, buscou-se identificar quem
é esse tutor e analisar que habilidades são essenciais no desempe-
nho de suas ações pedagógicas.
O texto limitou-se a analisar e compreender quem é e qual é
o papel do tutor, no processo de ensino aprendizagem, dos cursis-
tas do curso FIC: Educação: Práticas Voltadas a Bebês e Crianças
Público da Educação Especial, oferecido pelo Instituto Federal do
Norte de Minas Gerais - IFNMG. O curso em questão é de Forma-
ção Continuada e teve como público alvo profissionais e estudantes
de licenciatura e pedagogia, que atuassem na Educação Infantil. Seu
edital de seleção de tutores previu a contratação de 20 tutores a dis-
tância e esse é o universo de tutores que esse trabalho se destinou.
Inicialmente, buscou-se subsídios teóricos nos documentos ofi-
ciais, mais especificamente, na Resolução nº 1 do Conselho de Edu-
cação Superior, documento do Conselho Nacional de Educação, de
11 de março de 2016, que estabelece as diretrizes e normas nacio-
nais para a oferta de programas e cursos de educação na modalida-
de a distância e no Parecer do CNE/CES nº 564/2015, que Dispõe
sobre as Diretrizes e Normas Nacionais para a oferta de Programas
e Cursos de Educação Superior na Modalidade a Distância.

126
Capítulo 13: Tutoria em EAD: perfil, limites e possibilidades

Na referida resolução, o tutor é o profissional de nível superior,


que atua na área de conhecimento de sua formação, como suporte
às atividades dos docentes e na mediação pedagógica junto aos es-
tudantes. A resolução remete que o tutor é a ponte entre professores
e cursistas, sanando dúvidas, estimulando a participação e interação
entre todos.
O Parecer explicita ainda que os tutores desempenham impor-
tante papel no processo educacional e, especialmente, na mediação
didático-pedagógica do ensino e aprendizagem e que são eles que
ficam em contato direto com os estudantes por meio do acompa-
nhamento pedagógico e formativo. Para isso, o referido documen-
to enfatiza que esses profissionais devem ter formação específica e
qualificada para atuar na tutoria e também 1 ano de experiência no
magistério.
De acordo com Pallof e Pratt(2002), o tutor é aquele que propi-
cia, aos cursistas, um ambiente social estimulador da aprendizagem,
utilizando recursos didáticos disponíveis pela mediação. No caso do
curso FIC, os tutores contaram com o Ambiente Virtual de Apren-
dizagem, o AVA, o e-mail e os grupos de WhatsApp como fontes
de comunicação e interação com cursistas, professores formadores
e coordenação.
A partir das reflexões de Dantas e Troleis(2013), é possível de-
finir que um tutor é aquele que favorece processos formativos, coor-
dena e orienta a aprendizagem. Sendo assim, pode-se afirmar que
ser tutor é estar interessado em promover a aprendizagem, indepen-
dente de lugar hora ou ocasião. Cabe a ele, mediar a aprendizagem,
independente da interação face a face do cursista com o professor,
estimulando a participação nas atividades e a interação entre a tur-
ma.
Metodologia

Com a intenção de conhecer o perfil desse novo profissional da


Educação, o tutor, e buscar elencar as principais habilidades e prá-
ticas desempenhadas por ela que, optou-se por aplicar um questio-

127
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

nário aos tutores do curso FIC Educação: Práticas Voltadas a Bebês


e Crianças Público da Educação Especial, oferecido pelo Instituto
Federal do Norte de Minas Gerais, e para isso, foi realizada uma
pesquisa de natureza qualitativa, utilizando-se um formulário com
perguntas estruturadas, abertas e fechadas. O mesmo foi elaborado
por meio do Google Formulários, tendo como pressuposto investi-
gar as questões norteadoras desse trabalho.
O formulário era composto por 12 questões pertinentes ao
tema, foi enviado por meio do WhatsApp, sendo disponibilizado
para todos os 20 tutores do curso. Estabeleceu-se o prazo de 10 dias
para o retorno e o mesmo foi respondido por 14 colaboradores.
A primeira parte do levantamento buscou traçar o perfil dos
tutores e constatou-se que todos os tutores são graduados e pos-
suem pós graduação lacto sensu. Destaca-se que 54% dos colabora-
dores possuem mestrado nas diversas áreas da Educação. Esses da-
dos mostram que os tutores são profissionais preocupados com sua
formação profissional.

Análise e discussão
Posteriormente, passou-se a indagar sobre a vida profissional
dos tutores e pode-se perceber que os indivíduos analisados pos-
suem experiência na Educação, já que 54% responderam que pos-
suem mais de 10 anos na Educação e na função de tutor. Aproxi-
madamente 60% dos tutores alegaram ter mais de 5 anos de tutoria.
Um fato que despertou a curiosidade desta pesquisadora, foi que
dos 14 colaboradores, apenas um alegou estar atuando como docen-
te durante a tutoria do curso FIC. Todos os demais, alegaram estar
atuando na direção, coordenação ou na parte pedagógica.
Passou-se então a se enveredar sobre as habilidades e práticas
de tutoria dos colaboradores e dentre as habilidades e práticas men-
cionadas, destacou-se as duas mais mencionadas: a mediação e a
humanização.

128
Capítulo 13: Tutoria em EAD: perfil, limites e possibilidades

Dentre as habilidades e práticas necessárias ao tutor, todos os


colaboradores destacaram a mediação como essencial para o bom
desempenho de suas funções. Mas o que é mediação pedagógica?
Buscou-se em MASETTO (2000), a definição dessa prática:
Mediação pedagógica é uma a atitude ou o
comportamento do professor, que se promove
o papel de incentivador ou motivador no
processo de ensino e aprendizagem, enfatizando
o diálogo, a troca de experiências, o debate e
a provocação de situações, vivenciadas pelos
educandos (MASETTO, 2000, )

Sendo assim, percebe-se que a mediação pedagógica deve ser o


principal papel do tutor EAD, pois cabe a ele a tarefa de estimular o
interesse e a participação dos cursistas, auxiliando o processo de de-
senvolvimento da aprendizagem. O tutor deve estimular e garantir
que a interatividade. Verdadeiramente aconteça, fazendo com que
os cursistas não se sintam isolados ou desamparados e consequen-
temente, facilitando, também, a compreensão de conteúdos
Vale destacar que esse processo requer habilidades de um tu-
tor mediador, além de sua formação acadêmica, como maturidade
emocional, capacidade de liderar, nível cultural adequado, capaci-
dade de empatia, cordialidade e saber ouvir de seus alunos. Não se
pode deixar de mencionar que, para isso, é necessário que o tutor
saiba utilizar e tenha domínio de todas as tecnologias que estão ao
seu dispor, para subsidiar e incentivar a aprendizagem dos alunos.
Os colaboradores mencionaram a importância do tutor ser o
humanizador da modalidade, uma vez que além de investir cons-
tantemente na realização das atividades, cabe a ele a interação com
os sujeitos de aprendizagem, sendo o elo de ligação entre a coor-
denação, professores e cursistas. A humanização, ouvir, tentar com-
preender e auxiliar os cursistas são ações fundamentais para que ele
se sinta acolhido e entendido.

129
Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

Destaca-se que de acordo com os pensamentos de Vygot-


sk(1984), que considera o homem como um ser social, que se
constitui a partir das relações que estabelece com o outro e com o
mundo, desempenhando simultaneamente o papel de produto e
produtor dessas relações sociais em um processo sócio histórico,
que o aprendizado é resultante das relações sociais estabelecidas pe-
los indivíduos. Na EAD, essas relações sociais são essenciais para o
êxito do curso, e cabe ao tutor, ser a “ponte” entre cursista, professor
formador e aprendizagem,
Assim, as ideias dos autores acima mencionados se completam
e cabem ser referidos nesse trabalho, uma vez que nos apresentam
que o papel do tutor é de mediar a aprendizagem, de forma huma-
nizada, motivando-os e ajudando-os no desenvolvimento da auto-
nomia e consequentemente, na construção do conhecimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O ensaio teve como objetivo analisar o papel do tutor do cur-
so FIC: Educação: Práticas Voltadas a Bebês e Crianças Público da
Educação Especial, oferecido pelo Instituto Federal do Norte de
Minas Gerais - IFNMG, identificando o perfil, as habilidades desse
profissional e os aspectos mais relevantes de sua prática pedagógica.
Os resultados elencados, nesta pesquisa, apresentaram que os
tutores analisados são graduados e pós-graduados, onde mais da
metade possui mestrado, o que representa um perfil de profissio-
nais qualificados e preocupados com sua formação, para desempe-
nhar as práticas, que segundo eles, são essenciais na tutoria: media-
ção e humanização.
O estudo permitiu identificar que o tutor tem um papel de
suma relevância na EAD, uma vez que cabe a ele, ser o mediador,
dentro do ambiente virtual de aprendizagem, o AVA, estimulando
a participação, sanando as dúvidas, de modo a garantir que todos
tenham entendido a matéria, podendo assim, cumprir as atividades
propostas pelo professor formador.

130
Capítulo 13: Tutoria em EAD: perfil, limites e possibilidades

Sendo assim, pode-se se dizer que o objetivo desse trabalho foi


atingido e a expectativa é que este estudo possa contribuir para a
educação a distância, no surgimento de novas pesquisas, debates,
discussões e publicações científicas. E que as práticas dos tutores
possam ser motivo de reflexão e ação por parte do tutor e da gestão
em EaD.

REFERÊNCIAS
ALMEIDA, R. N.; SANTOS, E. P.; LAMARCA, I. C. S. A. MEDIAÇÃO
PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: um relato de experiên-
cia. TICs & EaD em Foco. São Luís, v. 5, n. 1, jan./jun. 2019. Disponível
em: https://www.uemanet.uema.br/revista/index.php/ticseadfoco/article/
download/419/308/912. Acesso em: 05 dez. 2023.
BRASIL, Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CES nº 1, de
11 de março de 2016. Define as Diretrizes e Normas Nacionais para a
Oferta de Programas e Cursos de Educação Superior na Modalidade a
Distância. Brasília: Diário Oficial da União, 11/mar, 2016. Disponível em:
<Https://normativasconselhos.mec.gov.br/normativa/view/CNE_RES_
CNECESN12016.pdf?query=EaD>. Acesso em 17/06/2023.
CNE — CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO/MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO. Parecer CNE/CES Nº: 564/2015 – Dispõe sobre as Di-
retrizes e Normas Nacionais para a oferta de Programas e Cursos de
Educação Superior na Modalidade a Distância. Brasília: MEC, 2016.
Disponível em: <Http://www.sead.ufba.br/sites/sead.ufba.br/files/pare-
cer_cne_ces_564_15.pdf>. Acesso em: 20/-6/2023.
DANTAS, E. M.; TROLEIS, A. L. Entre rosas e espinhos, a avaliação e a
educação a distância. Holos: Revista de Divulgação Científica e Tecnoló-
gica do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Gran-
de do Norte, ano 29, v. 1, p. 256-267, 2013. Disponível em: http://www2.
ifrn.edu.br/ojs/index.php/HOLOS/article/view/1026/655. Acesso em 15
jun. 2023.
MASETTO M. T.; BEHRENS, M. A. Novas tecnologias e mediação pe-
dagógica. São Paulo: Papirus, 2000. p. 133-173.

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Cursos FIC
FormaçãoInicial e Continuada

PALLOFF, R.; PRATT, K. Construindo comunidades de aprendizagem


no ciberespaço. Porto Alegre: Artmed, 2002.
VYGOTSKY, Lev S. A formação social da mente. O Desenvolvimento
dos Processos Psicológicos Superiores. São Paulo: Martins Fontes, 1984.

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