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O Sucateamento da saúde no governo Bolsonaro

Promessas não cumpridas, corte de verbas, falta de investimento e descaso com a


saúde pública marcaram o (des)governo de Jair.
Por Mariana Luccisano

Durante sua primeira campanha eleitoral, em 2018, entre falas extremistas e


posturas controversas, já poderíamos prever que a saúde seria uma das últimas
prioridades do então candidato à presidência da república Jair Bolsonaro (do PSL na
época). Em suas promessas, pautas ligadas a área da saúde foram citadas
brevemente em planos que pouco beneficiariam efetivamente a vida dos brasileiros.

Entre suas propostas estavam incluir profissionais de educação física no Programa


Saúde da Família, expulsar médicos cubanos, criar programa para informatizar e
interligar prontuários médicos pelo país e a criação de um 'credenciamento universal
de médicos' para atendimento no SUS. Tópicos ligados a acesso, investimentos e
incentivo a programas de saúde pública desde uma consulta de rotina até tratamentos
de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) e cirurgias de alto risco, por exemplo,
foram primordialmente negligenciados. E nós mal sabíamos o que ainda estava por
vir.

O começo do fim
Ainda no início de seu governo, Bolsonaro tratou de encerrar o programa Mais
Médicos, criado em 2013 pelo governo Dilma e amplamente criticado por ele ainda
antes de assumir o cargo. Além disso, ataques ao Sistema Único de Saúde (SUS) e a
diminuição cada vez mais expressiva de investimentos na área da saúde acarretaram
na falta de profissionais e exames, escassez de remédios e precariedade na
infraestrutura de Pronto Atendimento (UPA) e Unidades Básicas de Saúde (UBS).
Mas os danos à saúde dos brasileiros não ficaram apenas na rede pública
hospitalar. Sua nítida falta de preocupação com o que chegaria na mesa dos
brasileiros e seu interesse no expressivo inchaço de capital que o agronegócio traz
para o país fez com que ele marcasse a história do Brasil como o presidente que mais
liberou agrotóxicos por dia. Em março deste ano, 2022, com 1.158 dias de governo,
Bolsonaro já havia autorizado mais de 1.629 agroquímicos, mais de um por dia. Para
essa soma de atitudes que beiram ao escarnio, muitos destes defensivos agrícolas
tinham nomes bastante sugestivos como “Forasteiro”, “Sniper” e “Patrol”.
A pandemia
Em 2019, os rumos do mundo foram interrompidos pelo que viria a ser conhecido
como a maior crise de saúde do século, a pandemia do então novo Coronavírus. A
postura esperada de um líder de Estado frente a tamanha desordem, enfermidade e
sofrimento é que o mínimo seja feito: amparo a população e tomada de medidas
combatentes aliadas a ciência e a medicina, disseminando informações cruciais de
maneira responsável e incentivando medidas sanitárias para diminuir o contágio e
poupar o máximo de vidas possíveis, mas, como sabemos, o que nos foi entregue
foram omissões, notícias falsas, negacionismo, desrespeito e negligência.
O Brasil é um dos três países mais afetados pela pandemia, juntamente dos Estados
Unidos e da Índia, tendo mais de 660 mil mortes e 30 milhões de casos confirmados,
lidando ainda com a dúvida a respeito da confiabilidade dos dados oficiais. Segundo
relatório publicado pelo Dossiê Abrasco Pandemia de Covid-19, lançado no 13º
Congresso que a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), cai sobre o
então presidente a responsabilidade por pelo menos 75% destes números,
comparando as proporções dos mortos e infectados no Brasil com o mundo e tal culpa
vem da gestão descompassada do governo frente a crise sanitária enfrentada de 2019
a 2021. As medidas efetivas adotadas pelos países e que fizeram com que os
números se estabilizassem em determinados momentos foram dispensadas por Jair, o
que fez com que, enquanto a situação era amenizada fora do nosso território nacional,
os números internos crescessem desenfreadamente.
As ações que corroboraram para tal estatística foram incontáveis, mas podemos
destacar a baixa testagem, desestímulo ao uso de máscaras, promoção de
tratamentos ineficazes (a tão exaltada Cloroquina, por exemplo), atraso na compra de
vacinas e desestímulo a vacinação, falta de uma política única de comunicação e
desordem do Ministério da Saúde, com troca de ministros e a inexistência de um
comitê de especialistas.
Bolsonaro deu como resposta as súplicas dos familiares de vítimas da doença a
afirmação de não ser coveiro, imitações de sons do sofrimento de pessoas que
sufocaram sem oxigênio e suposições fantasiosas como insinuar que a vacina
transformaria os brasileiros em jacaré, mostrando que tínhamos a frente do país um
ser infantil e sádico de terno e gravata.

Saúde mental
A COVID deixou marcas que o tempo vem tendo dificuldade em apagar e as
sequelas deixadas pelo luto e o isolamento no psicológico da população apenas
evidenciou a negligência gritante do tratamento que questões de saúde mental
recebem no Brasil. Transtornos de depressão e ansiedade arrebataram um número
expressivo de pessoas. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, o Brasil é
o país com mais casos de transtorno de ansiedade no mundo, com cerca de 18,6% da

população brasileira sofrendo com esse distúrbio.


Entre idosos e adultos, as crianças e adolescentes representam um aumento
extremamente preocupante. Em 2021, estima-se que, apenas na capital paulista,
houve um aumento de 120% comparado a 2018 de jovens diagnosticados com
doenças psicológicas, segundo a Secretaria Municipal da Saúde. Além disso, o abuso
de drogas lícitas e ilícitas como fuga da realidade e busca por algum tipo de conforto
fez com que milhares de brasileiros desenvolvessem dependência química durante o
pico da pandemia, escancarando assim a perversa política de Bolsonaro para tratar da
saúde mental: a volta aos manicômios e a estigmatização dos doentes.
O governo resumiu os tratamentos a encarceramento, fechamento de serviços,
criminalização de condutas, “higienização” dos centros urbanos e escoamento de
recursos a comunidades terapêuticas. O desmonte da rede de atenção psicossocial
fez com que surgissem redes quase que manicomiais a partir da falta de investimento
nesses serviços e assim, o direito dos que necessitam de auxílio e tratamento
psicológico é brutalmente violado, indo na contramão da política de saúde mental da
reforma psiquiátrica trazida pela Lei 10.216, que completou 20 anos em 2021.

ISTs
O desmonte não poupou programas que distribuem medicamentos para tratamento
de Aids, Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) e hepatites. O Ministério da
Saúde sofreu um corte de 12 programas no governo de Bolsonaro. Os números são
assustadores: as perdas chegam a R$ 3,3 bilhões. A justificativa dada a de reservar
dinheiro para o orçamento secreto em 2023. O "Atendimento à População para
Prevenção, Controle e Tratamento de HIV/AIDS, outras Infecções Sexualmente
Transmissíveis e Hepatites Virais Total" pertence ao SUS e o dinheiro é usado para a
produção, distribuição e compra de medicamentos para pessoas com HIV.

Os dados do Boletim Epidemiológico Especial HIV/Aids de 2021 mostram os


registros de 13.501 no ano passado, o que indica uma diminuição de casos nos
últimos anos, embora exista a suspeita de subnotificação devido a pandemia. O
Boletim de Monitoramento do Orçamento da Saúde diz que se não houver reversão
nos cortes, ações fundamentais o Sistema único de Saúde (SUS) poderão ser
gravemente prejudicadas. Entre os cortes, destacam-se: Implementação de Políticas
de Promoção à Saúde e Atenção a Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT)
(R$ 3,8 milhões), Programa Médicos pelo Brasil (R$ 366 milhões) e Pesquisa,
Desenvolvimento Tecnológico e Inovação em Saúde (R$ 297 milhões).
Além disso, segundo o Boletim Epidemiológico HIV/Aids, publicado em 2020, revelou
um aumento expressivo de ISTs entre os jovens, de 64,9% das Infecções
Sexualmente Transmissíveis (IST) entre jovens de 15 a 19 anos e de 74,8% para os
de 20 a 24 anos, entre 2009 e 2019. Com seus discursos contra educação sexual nas
escolas, podemos concluir que há alguma relação nisso tudo.

Bolsonaro deixa como legado todo o seu descaso, irresponsabilidade, desrespeito e


negligência com a população, fomentando o ódio e enaltecendo políticas que
assassinam e destroem famílias. E ainda há muito a ser escancarado, estejamos
prontos para lidar com toda a sujeira que sairá de baixo do tapete.

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