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SASSEN, Saskia. Expulsões - Brutalidade e Complexidade na Economia Global.

São
Paulo: Paz e Terra, 2016.

Saskia Sassen em seu livro traz o conceito de expulsão além da desigualdade


econômica produzida pelo capitalismo atual, destacando novas lógicas de expulsão e
brutalidades que sociedades capitalistas criam. Essas expulsões variam de local, conteúdo e de
caráter, segundo Sassen elas podem atravessar estratos sociais e condições fiscais no mundo
de diferentes formas. Essa exclusão acaba maquiando problemas maiores que são vistos
superficialmente em discussões e teorias como, a desigualdade, a compra de terras, o mercado
financeiro, entre outros. Na atual tendência capitalista uma grande empresa e um indivíduo
rico não conseguem acumular e concentrar suas riquezas sozinhos, porém como os
mecanismos de acumulação se reinventam, as inovações técnicas, o mercado e finanças
aliados a permissão governamental somam uma ajuda sistêmica colaborando para essa
estrutura contemporânea de acumulação.

No primeiro capítulo Economias em contração, expulsões em expansão, a autora


destaca duas mudanças profundas a partir da década de 1980, a primeira é a transformação
material área que favorece operações econômicas com produções industriais com baixa
regulação e baixos custos, já a segunda é caracterizada por uma ascensão do mercado
financeiro em cidades globais que permitem securitizar processos e entidades cada vez mais.
O capitalismo tradicional perde o lugar para um mais avançado, com essa complexidade do
capitalismo atual, as pequenas burguesias e as nacionais perdem o seu valor social, além
disso, os consumidores – classe trabalhadora tem desempenhado um papel cada vez menor
nos lucros. As indústrias desempenharam um papel crucial na criação de condições
econômicas para a formação e expansão da classe média, com altos níveis salariais, benefícios
e possibilidade de uma organização sindical para reivindicação de direitos. Mas expulsões,
nesse caso de desindustrialização, criaram uma barreira para a massa trabalhadora –
oprimidos, reivindicarem os seus direitos, cobrando o sistema.

Hoje na era moderna a brutalidade capitalista e sua reestruturação fazem com que haja
um desaparecimento das barreiras fiscais e surjam espaços para a terceirização do trabalho,
onde prevalecem espaços de produção padronizada como os call centers, por exemplo. Essa
nova configuração privilegia a economia global, a qual concentra infraestruturas e ambientes
específicos para atenderem o mercado mundial. Países reduzem os impostos corporativos e
aumentam os impostos individuais, segundo Sassen, nesses períodos há um crescente
endividamento governamental, o qual é possível identificar pelo FMI e OCDE através da
porcentagem do PIB nos países desenvolvidos, como a Alemanha e os Estados Unidos. A
globalização aumentou a complexidade das indústrias e dos serviços para a valorização das
economias avançadas, em consequência desse favorecimento, os governos apresentam uma
dívida maior do que seus credores do setor privado.

A desindustrialização e o desemprego, em consequência, agravaram mais a


desigualdade de renda no mundo, nações com baixas tradições de desigualdade como
Alemanha, Finlândia e Suécia a partir dos anos 2000 aumentaram significadamente os níveis
de desigualdade. Essa tendência incomum mostra que há uma forte exploração no espaço
econômico para que ocorra reestruturação capitalista, mesmo com um baixo crescimento
econômico e alto desemprego nos países. Os resultados dessa tentativa de recuperação
econômica geram adversidades no espaço econômico, como, condições extremas de emprego;
novos padrões de mobilidade geográfica – emigração; dívidas hipotecárias – despejos de
pessoas; pobreza, com altas taxas de inadimplência e, um significativo deslocamento ao redor
do mundo por diversos motivos, indo de deslocamentos por problemas financeiros a
mudanças climáticas catastróficas, como aumento do nível do mar, desertificação, ciclos e
enchentes.

Ainda no primeiro capítulo, Sassen salienta o encarceramento como forma de expulsão


de excedentes da população trabalhadora localizada no norte global. Esta forma de exclusão
apresenta uma forte ligação com capitalismo moderno, já nos Estados Unidos, por exemplo,
usa-se os serviços carcerários para fins lucrativos. De acordo com a autora esse fenômeno de
utilização da mão de obra dos encarcerados ocorre na virada do século XXI, com a
privatização dos presídios é possível entender que os presidiários vendem sua força de
trabalho barata para formação de lucros de empresas privadas que investem em corporações
responsáveis pelo sistema penal e, que estimulam cada vez mais a expansão da população
encarcerada.

Em O novo mercado global de Terras, a autora evidencia o crescimento exponencial


de aquisição de terras por estrangeiros, os quais compram terras e destroem a economia de
pequenos agricultores locais. Segundo Sassen, as terras adquiridas por estrangeiros são
grandes extensões, nelas há uma forte agricultura familiar reconhecidas pelo Estado ou não. A
agricultura de subsistência utilizada geralmente por comunidades tradicionais tem como
principal regra a tentativa de um manejo de solo correto, preservando a flora e fauna, já que a
terra os ajuda a sobreviver, criando uma relação simbiótica entre natureza e comunidade. Com
a aquisição estrangeira ocorre uma expulsão de fauna e flora e das regras tradicionais criadas,
além disso, a estrutura política e legal é abandonada, a autoridade e soberania do Estado sobre
o território é reduzida, deixando os governos cada vez mais enfraquecidos e os pequenos
agricultores obrigados a se deslocarem, caracterizando uma expulsão de pessoas , de
economias locais, resultado da destruição da biosfera e da facilitação por meio do poder
executivo em contratos que aumentam a aquisição de terras violentas por estrangeiros que
violam direitos humanos, justiça social e mudanças climáticas.

Em As finanças e suas capacidades: a crise como lógica sistêmica, Saskia Sassen traz
os impactos causados pelas firmas financeiras no mundo, alertando o perigo causado por sua
capacidade de aumentar o seu próprio valor, já que o sistema de finanças é diferente do
sistema bancário tradicional. Segundo a autora, os bancos tracionais vendem o dinheiro que
está sob sua posse, ao contrário da firma financeira que vende algo que não tem, sendo assim,
as finanças têm capacidades para securitizar quase tudo em economia, portanto, a
securitização faz a captação de recursos que financiam empreendimentos e projetos através da
venda de títulos para investidores, os quais podem ser comprados e vendidos inúmeras vezes.

Posto isso, o poder das finanças aumenta o seu valor, mesmo enquanto economias e
governos perdem. A crise atual é consequência do capitalismo financeirizado, uma vez que as
finanças extraem valores de diversos setores da economia, portanto, quanto mais setores
econômicos financeirizados mais suscetíveis se tornarão a uma crise financeira, visto que há
uma grande instabilidade nos mercados financeiros – fator característico da crise. O capital
financeiro, de acordo com Sassen, por décadas faz investimentos extremamente especulativos
que servem para continuar enriquecendo empresas ricas e destruírem empresas consideradas
saldáveis, ao invés dessa economia destruidora, a autora propõe instituições financeiras com
capacidade de criar e distribuir capital de forma eficiente – reorientação do capital financeiro
para responder uma grande variedade de necessidades mundiais como a fome, questões
climáticas, a pobreza que colocam em risco a nossa própria existência.

O último capítulo - Terra morta, água morta aponta histórias e geografias que
aceleram a destruição em grande escala do nosso planeta por ações humanas no meio
ambiente, marcados pelo antropoceno. A separação da paisagem natural e da paisagem
geopolítica é uma logica que domina o mundo, a urbanização nos trouxe a sensação de não
pertencermos mais a natureza, o homem não faz mais parte da biosfera, nos minimizamos os
problemas climáticos e ambientais, é como se eles não fizessem parte do nosso dia a dia. Para
tentar reduzir as mudanças climáticas a solução encontrada no mundo capitalista foi a venda
de carbono, portanto, há um comércio até da poluição, empresas que reduziram suas emissões
ganham créditos de carbono, sendo assim, é possível entender que além da comercialização da
terra, do ar e da água, também temos a financeirização das mercadorias extraídas.

Neste capítulo, Sassen busca trazer brevemente problemas ambientais em diversos


países, evidenciando que a poluição mesmo que em diferentes continentes criam problemas
iguais porque contaminam lugares da mesma maneira. O avanço da tecnologia e de técnicas
trouxe para os seres humanos a possibilidade de regeneração ambiental, porém, em muitos
casos não foi possível a recuperação de algumas zonas. Por exemplo, a terra que antes era
uma excelente área agrícola, hoje não é mais pela degradação sofrida, a curto prazo é
praticamente impossível a recuperação de uma dada localidade, as tecnologias somente
conseguirão “consertar” a longo prazo, mas ainda com incertezas.

Os resíduos industriais causam uma destruição extrema na terra e contaminam pessoas


ao redor do mundo. Além da contaminação da terra, gases mortais são lançados no ar em que
respiramos, acidentes nucleares expulsão cidadãos da uma cidade, como o famoso caso de
Chernobyl na Ucrânia. Esse é um dos exemplos ao redor do mundo, há diversos crimes
ambientais, os quais vão dos países pobres aos ricos.

Por fim, a autora faz um questionamento importante sobre o esforço de alguns Estados
na redução da destruição global, salientando a grande relevância dessa tentativa em reparar os
danos, porém são pequenas em comparação a destruição causada em escala global. A
aniquilação de biosferas ao redor do mundo promove expulsões de nativos e, apesar de ser
diferente das expulsões como o encarceramento, ainda sim envolvem uma situação político-
econômica similar, pois muitos cidadãos têm a sua saúde e prosperidade roubados.

Pode-se concluir que o mundo tem diversas e expulsões e consequente expulsos que
migram de cidades ou de países, na maioria das vezes essas locomoções são arriscadas e
perigosas, Sassen, questiona quais são os espaços dos expulsos numa sociedade com estados
modernos, apresentando um limite sistêmico de expulsões e não de inclusão e participação
constitutiva.

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