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esculpidos na pedra. Não pude, porém, decifrá-los.

E regressava para o pântano,

quando um fulgor mais rubro da Lua me fez voltar de novo os olhos para o

rochedo pardo e para os carateres; e os carateres diziam DESOLAÇÃO.

« Ergui os olhos e vi um homem de pé na ponta do rochedo; e escondi-me

entre os nenúfares para espiar o que o homem fazia. Era alto, imponente, envolto

dos ombros aos pés na toga da velha Roma. Eram indistintos os contornos do seu

vulto — as suas feições, porém, eram as feições de uma divindade; pois o manto

da noite, da neblina, da Lua e do orvalho deixava-lhe a descoberto as feições do

rosto. Tinha a fronte alta do pensador; via-se-lhe nos olhos a sombra dos

cuidados; e nas poucas rugas que lhe sulcavam as faces eu li as fábulas da dor, do

cansaço, do tédio da humanidade e um anseio de solidão.

« O homem sentou-se no rochedo, apoiou a cabeça na mão e olhou para o

ermo em volta. Olhou lá para baixo para os rumorejantes arbustos, e em seguida

ergueu os olhos para as enormes árvores primitivas, ergueu-os mais ainda para o

céu tumultuoso e para a Lua encarnada. E eu, alapado entre os nenúfares,

espiava o que o homem fazia. E o homem tremeu na solidão; — mas a noite foi

avançando, dissipou-se, por fim, e o homem sempre sentado no rochedo!

« O homem desviou os olhos do céu e pousou-os na aridez do rio Zaire, nas

águas amarelas e sinistras e nas pálidas legiões dos nenúfares. E escutou os

suspiros dos nenúfares e o murmúrio que deles se exalava. E eu, do meu

esconderijo, espiava o que o homem fazia. E o homem tremeu na solidão — mas

a noite foi avançando, dissipou-se por fim, e o homem sempre sentado no

rochedo!

« Entranhei-me então no seio do pântano, meti-me por entre a imensidão

dos nenúfares e chamei pelos hipopótamos que se acoitavam nos recessos do


pântano. E os hipopótamos ouviram o meu apelo e, soltando feroz e medonhos

rugidos, avançavam com o behemoth até o sopé do rochedo.

« E eu, do meu esconderijo, espiava o que o homem fazia. E o homem

tremeu na solidão; — mas a noite foi avançando, dissipou-se por fim, e o homem

sempre sentado no rochedo!

« Amaldiçoei então os elementos com o anátema do tumulto; e no céu,

onde até aí não soprava vento, estralejou temerosa tempestade. O céu pôs-se

lívido com a violência da tormenta — a chuva açoitava a cabeça do homem — o

rio espumava em torrentes caudalosas—os nenúfares gritavam nos seus leitos —

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