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Se somos criativos, inovadores, afetivos,

Transversalidade na Educação
racionais, interativos, curiosos, questionadores e,
ainda, sociais, políticos e históricos, a educação
deve superar a transmissão de conteúdos
disciplinares. É necessário que escola e vida
caminhem juntas, pois estudar não é reproduzir os
conteúdos definidos apenas no currículo escolar.
A educação deve permitir a relação dialógica, a
interatividade, a troca e a visão multidimensional
das coisas e das pessoas, desenvolvendo no
estudante habilidades, competências e atitudes
para que possa exercer sua cidadania, bem
como aprender a viver em harmonia com as
demandas constituídas da relação sociedade,
indivíduo e natureza. Edna Liz Prigol
Com base nessas percepções e entendendo a

Transversalidade
necessidade de mudança paradigmática na vida e
na educação, esta obra se propõe a discutir temas
relacionados à transversalidade na educação.
Embora os temas aqui tratados não sejam novos,
ainda não foram incorporados no processo
educativo. Dessa maneira, a transversalidade,
a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade
na Educação
são bases epistemológicas e metodológicas
que devem compor os saberes docentes, para
lembrar que educar está relacionado com a
vida e envolve múltiplas dimensões para o
desenvolvimento do ser, fazer, conhecer e
conviver nesse mundo planetário.

Edna Liz Prigol


Fundação Biblioteca Nacional Código Logístico
ISBN 978-85-387-6632-2

9 788538 766322 59382


Transversalidade na
Educação

Edna Liz Prigol

IESDE BRASIL
2020
© 2020 – IESDE BRASIL S/A.
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CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
P849t

Prigol, Edna Liz


Transversalidade na educação / Edna Liz Prigol. - 1. ed. - Curitiba
[PR]: IESDE, 2020.
154 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6632-2

1. Educação. 2. Abordagem interdisciplinar do conhecimento na


educação. I. Título.
CDD: 370.1
20-63579
CDU: 370.1

Todos os direitos reservados.

IESDE BRASIL S/A.


Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
Batel – Curitiba – PR
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Edna Liz Prigol Pós-doutoranda em Educação na Pontifícia
Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Doutora e
mestra em Educação, pela PUCPR, na linha de Teorias
e Práticas Educacionais e Formação de Professores.
Especialista em Educação Infantil, também pela PUCPR.
Graduada em Pedagogia pela Universidade Tuiuti
do Paraná (UTP). Gestora de instituição da educação
básica durante 25 anos. Atuação na área de Gestão de
pessoas. Coaching Educacional. Consultora Pedagógica.
Docente da educação superior desde 2001. Temas
de investigação: formação continuada, prática
pedagógica, saberes docentes, tecnologia educacional,
complexidade e transdisciplinaridade.
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SUMÁRIO
1 Educação do passado, do presente e do futuro 9
1.1 Revisitando as concepções pedagógicas 10
1.2 A visão da complexidade na educação 16
1.3 A educação do futuro 24

2 Caminhos da transversalidade na educação 31


2.1 Mas o que é transversalidade? 31
2.2 Marcos regulatórios 36
2.3 BNCC e os temas contemporâneos transversais (TCTs) 46

3 Transversalidade: metodologia de trabalho 54


3.1 A interdisciplinaridade 55
3.2 O pensamento transdisciplinar 66
3.3 Prática pedagógica intradisciplinar, interdisciplinar e
transdisciplinar 75

4 Transversalidade e currículo 84
4.1 Evolução histórica do currículo 85
4.2 Currículo e transversalidade: desafios contemporâneos 91
4.3 Transversalidade no currículo e no planejamento pedagógico 95
4.4 O currículo organizado por projetos 100

5 Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 111


5.1 Temas Contemporâneos Transversais 112
5.2 Cidadania e Civismo 116
5.3 Ciência e Tecnologia 126
5.4 Economia 128
5.5 Meio ambiente 131
5.6 Multiculturalismo 134
5.7 Saúde 137
5.8 Temas Contemporâneos Transversais no planejamento 140

Gabarito 147
APRESENTAÇÃO
A realidade atual do mundo e de nosso contexto brasileiro mostra
que vivemos em um tempo incerto, com contradições e desafios a serem
resolvidos. São tempos fluidos, sujeitos ao imprevisto, ao inesperado e com
problemas globais e locais. Essa é uma realidade complexa a qual aponta para
a necessidade de entender que os processos não se desenvolvem de maneira
linear, determinada e pautada em certezas. Então, qual é o papel da educação
diante dessa percepção?
A educação ainda está estruturada em um paradigma cartesiano
mecanicista, que incita um processo educativo pautado na disciplinaridade
e na racionalização; além disso, separou a razão do sentimento e a alma do
conhecimento. Esse modelo promove um processo de ensino e aprendizagem
no qual predomina a fragmentação dos conhecimentos e, consequentemente,
o fechamento das fronteiras disciplinares. Isso impede a interação entre as
diversas áreas e disciplinas e de se ver além delas, navegando por outros
níveis de realidade e percepção.
Se somos criativos, inovadores, afetivos, racionais, interativos, curiosos,
questionadores e, ainda, sociais, políticos e históricos, a educação deve
superar a transmissão de conteúdos disciplinares. É necessário que escola e
vida caminhem juntas, pois estudar não é reproduzir os conteúdos definidos
apenas no currículo escolar. A educação deve permitir a relação dialógica, a
interatividade, a troca e a visão multidimensional das coisas e das pessoas,
desenvolvendo no estudante habilidades, competências e atitudes para que
possa exercer sua cidadania, bem como aprender a viver em harmonia com
as demandas constituídas da relação sociedade, indivíduo e natureza.
Com base nessas percepções e entendendo a necessidade de mudança
paradigmática na vida e na educação, o primeiro capítulo possibilitará
recordar as concepções pedagógicas educacionais para entender como elas
influenciaram e ainda interferem na prática pedagógica. Serão apresentados
alguns temas fundamentais que estruturam o pensamento complexo de
Edgar Morin e auxiliam no desenvolvimento de uma educação integral.
O segundo capítulo buscará tecer conhecimentos para levar à compreensão
do significado da transversalidade, bem como dos temas transversais na
educação. Para isso, serão revisitados alguns marcos teóricos legais e autores
que discutem o tema, finalizando com a análise dos Temas Contemporâneos
Transversais da BNCC.
No Capítulo 3, propõe-se ampliar os conhecimentos acerca da
interdisciplinaridade e da transdisciplinaridade, entendendo como devem
ser usadas na construção do currículo e na prática pedagógica. Também,
serão tratadas as orientações da BNCC relacionadas às viões intradisciplinar,
interdisciplinar e transdisciplinar para organização do processo educativo.
O currículo e a transversalidade são propostos no Capítulo 4, sendo
realizada uma retrospectiva histórica para contextualizar os temas de maneira
que você possa reconhecer a importância da inovação curricular como forma de
atribuir significado às necessidades de aprendizagem na contemporaneidade.
Com o intuito de compreender a inserção da inter e da transdisciplinaridade
no processo educativo, busca-se trazer algumas informações sobre o currículo
organizado na proposta de projetos de trabalho.
No último capítulo, propõe-se navegar em cada um dos 15 Temas
Contemporâneos Transversais para ressignificar velhos conceitos e buscar
novas compreensões teórico-práticas, dando novos olhares para a construção
de propostas educativas.
Embora os temas aqui tratados não sejam novos, ainda não foram
incorporados no processo educativo. Dessa maneira, a transversalidade, a
interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade são bases epistemológicas e
metodológicas que devem compor os saberes docentes, para lembrar que
educar está relacionado com a vida e envolve múltiplas dimensões para o
desenvolvimento do ser, fazer, conhecer e conviver nesse mundo planetário.
Bons estudos!
1
Educação do passado, do
presente e do futuro
Buscando fazer uma retrospectiva relacionada às abordagens
educacionais que fundamentaram a educação no Brasil desde a
década de 1920, este capítulo revisita conceitos já conhecidos para
repensar as ações pedagógicas da atualidade.
As inquietações e indagações em relação à prática peda-
gógica estão presentes no meio educacional, desencadeando
e impulsionando reflexões sobre o agir docente na busca de
alternativas para as incoerências presentes na atuação em sala
de aula na contemporaneidade.
O professor, hoje, precisa não apenas ter domínio de con-
teúdos específicos de sua área, mas também relacionados às
questões didático-pedagógicas e ligados ao contexto local no
qual atuará. Além disso, deve ter conhecimentos globais para
que os educandos apropriem-se do conteúdo, transformando-o
em saberes a fim de que possam se preparar para agir como
cidadãos do mundo, aptos a enfrentar os desafios da socieda-
de contemporânea. Dessa maneira, faremos uma introdução,
ou revisão, sobre o pensamento complexo de Edgar Morin. O
capítulo será finalizado com um texto cujo objetivo é estimular
a reflexão sobre a educação contemporânea.

Educação do passado, do presente e do futuro 9


1.1 Revisitando as concepções pedagógicas
Vídeo As concepções educacionais e sua influência na prática pedagógica
são conhecimentos que devemos ter para que possamos compreender
o processo histórico da educação. Para isso, leia o estudo de caso a se-
guir, que demonstra a estratégia utilizada por uma professora.

Estudo de caso

Uma professora de uma turma do 3º ano do Ensino Fundamental propôs para seus alunos um desafio: Trabalhar
com a temática “reciclagem de lixo nas cidades”.
Para iniciar os estudos, ela propôs uma roda de conversa em sala de aula a fim de saber o que os alunos já
conheciam sobre o tema e, depois disso, eles fizeram uma lista de questionamentos sobre o assunto, surgindo as
seguintes perguntas: O que é lixo? Por que produzimos tanto lixo? Como funciona a coleta do lixo em seu bairro?
Curiosidade
O que é coleta seletiva? Quem é responsável pela coleta seletiva? Quanto tempo o lixo “dura”? O que é reciclagem
Com o início da Idade Moderna, de lixo? O que é reaproveitamento do lixo? Qual é a relação do lixo com o meio ambiente? Entre outras. Com esses
o conhecimento se tornou mais questionamentos, o professor solicitou aos alunos que pesquisassem sobre o assunto e coletassem informações
estruturado e voltado para a para que juntos pudessem buscar respostas.
técnica e ciência experimental,
alterando as formas de pensar Durante o bimestre, com a temática e material trazido pelos alunos, foi possível trabalhar diversos conteúdos disci-
e agir na ciência por meio de plinares. Por exemplo, durante as aulas de Português, pôde-se trabalhar com leitura, escrita, compreensão de texto,
comprovações empíricas. A par- leitura e interpretação iconográfica, tipos diferentes de textos, e sinônimo e antônimo. Na disciplina de Geografia,
tir das descobertas de Copérnico Matemática e Ciências, foram utilizados mapas, gráficos, dados quantitativos e qualitativos, imagens, infográficos,
(1473 -1543) com a Teoria do
e sites de prefeituras, de ONGs e do governo para coletar dados, dessa forma, trabalhando medidas do tempo e
Heliocentrismo; Galileu Galilei
(1546-1642) afirmando que a dinheiro, estatísticas, as quatro operações, passado, presente e futuro, fatos históricos, diferentes paisagens, noções
natureza é governada por leis de espaço, lateralidade, cidadania, reações e produtos químicos, e muitos outros conteúdos curriculares.
cujas fórmulas são matemática;
Francis Bacon (1561-1626)
Esse estudo de caso mostra uma prática docente transversal que
com o método empírico sobre o
procedimento da indução; René supera ações reducionistas, fragmentadas e lineares no processo de
Descartes (1596-1650) com o ensino e aprendizagem.
Discurso do Método e a ideia da
compartimentalização e Isaac Você já ouviu sobre a importância de superar o paradigma
Newton (1642-1727) com a Lei newtoniano-cartesiano na educação para podermos ter uma prática
da Gravidade, o conhecimento
precisou passar a ser explicado pedagógica inovadora que prepare os alunos para resolver os proble-
com exatidão por meio de mas da sociedade na contemporaneidade?
leis, sendo utilizadas técnicas
de maneira mais racional. A Esse paradigma influenciou a educação com ideias para o desenvol-
junção dessas teorias e métodos vimento de um currículo rígido com conteúdo predefinido, absoluto e
caracteriza o paradigma
inquestionável, instigou o pensamento linear e fragmentado, estimu-
newtoniano-cartesiano.
lou trabalhar com a racionalização, além do aprendizado passar a ser

10 Transversalidade na Educação
visto como um produto, priorizando a memorização dos conteúdos,
com metodologia fundamentada no “escute, leia, decore e repita”.

No entanto, o professor não pode ficar estagnado com convicções


defasadas ou voltado para ações pedagógicas geradas por pensamen-
tos incontestáveis. Para superar os obstáculos da docência é inegável
trilhar novos caminhos, dialogar com novos conhecimentos, mas para
isso é necessário rever ações, repensar paradigmas e romper com pa-
drões predominantes de um modelo estereotipado em um determina-
do contexto e tempo.

Sendo assim, é preciso se desvincular de paradigmas na maneira de


pensar, ver, sentir e agir, isto é, reformar o pensamento, como sugere
Morin (2007, p. 121-122), pois:
o pensamento simples resolve os problemas simples sem
problemas de pensamento. O pensamento complexo não re-
solve ele próprio os problemas, mas constitui uma ajuda à
estratégia que pode resolvê-los. [...] A Complexidade situa-se
num ponto de partida para uma ação mais rica, menos muti-
ladora. Creio profundamente que quanto menos um pensa-
mento for mutilador, menos mutilará os humanos. É preciso
lembrar os estragos que as visões simplificadoras fizeram,
não apenas no mundo intelectual, mas na vida. Muitos dos
sofrimentos que milhões de seres suportam resultam dos
efeitos do pensamento parcelar e unidimensional.

Sintetizando, pode-se afirmar que no paradigma conservador de


influência cartesiana impera a transmissão, a memorização, a repe-
tição, a separatividade, a exclusão, a hierarquia e o autoritarismo.
Esse paradigma incita um fazer pedagógico instrumental, mecânico
e reprodutor de verdades absolutas, dissociando os conhecimentos
escolares da realidade do mundo, impossibilitando o desenvolvi-
mento de pessoas que possam enfrentar e se adaptar aos proble-
mas emergentes, e conviver com as incertezas e situações ambíguas
e conflituosas do mundo contemporâneo.

No Brasil, esse pensamento consolidou-se na abordagem tradicional.


Dessa maneira, relembramos, no quadro a seguir, algumas característi-
cas dessa escola que ainda influencia nossa prática pedagógica.

Educação do passado, do presente e do futuro 11


Quadro 1
Características da escola tradicional

bioraven/Shutterstock
1
Para Paulo Freire, educação
bancária é quando o professor Escola Professor Aluno
conduz seus alunos à memo- É visto como espectador
rização mecânica do conteúdo, Tem um papel É o transmissor de passivo, subordinado
tornando-os recipientes que sistematizador e conteúdos. Coloca- a uma aprendizagem
serão enchidos pelo educador. a reprodução é -se como o dono da em que somente o
“Eis aí a concepção bancária identificada como um verdade irrefutável, é professor detém o saber
da educação, em que a única compromisso social que autoritário e rigoroso. A absoluto e transmite
margem de ação que se oferece prepara os alunos para relação professor-aluno o conteúdo a ser
aos educandos é a de receberem reproduzir modelos é vertical, o professor memorizado, surgindo
os depósitos e arquivá-los” prontos para viver na detém o poder de o conceito de educação
(FREIRE, 1975, p. 68). sociedade. decisão sobre o ensino. 1
bancária .

Ensino Conteúdos Avaliação


Valorizava-se como
estratégia de ensino
a aula expositiva Eram conhecimentos Predomínio de provas
e demonstrativa, de cultura universal, escritas e orais.
apresentando grande acumulados pelas
variedade e quantidade gerações adultas e
de conteúdo, tarefas repassados como
padronizadas, rotinas para verdades absolutas.
fixação dos conteúdos e
exercícios de repetição,
aplicação e recapitulação.

Fonte: Elaborado pela autora.

12 Transversalidade na Educação
É importante ressaltar que essa ação educacional estruturada
no escutar, ler, decorar e repetir mecânico do aluno é recriminada
por Morin (2008, p. 21), porque para ele “uma cabeça bem cheia
é óbvio: é uma cabeça onde o saber é acumulado, empilhado, e
não dispõe de um princípio de seleção e organização que lhe dê
sentido”. O autor defende uma cabeça bem feita, ou seja, um pro-
cesso educativo no qual o aluno é protagonista e tem autonomia
para construir seus conhecimentos.

Além da abordagem Tradicional, surgiu também a Tecnicista,


com ênfase nos anos 1970 no Brasil, a qual influenciou a escola para
que assumisse a responsabilidade de ser uma agência modelado-
ra do comportamento humano, utilizando o treino para garantir a
transmissão de conhecimentos, habilidades e atitudes. Como a escola
era responsável pela formação de mão de obra qualificada para su-
prir as necessidades da sociedade, a educação do aluno foi vinculada
a um sistema produtivo, apoiada nos princípios da eficiência, da eficá-
cia e da produtividade. Para isso, a instrução programada, o estudo di-
rigido e o microensino eram utilizados como procedimentos de ensino.

Com isso, devido aos recursos educacionais serem muito impor-


tantes, temos o surgimento de apostilas e livros pedagógicos com o
objetivo de auxiliar no processo de ensino e aprendizagem. A ava-
liação deveria permitir o controle dos resultados de maneira quan-
titativa, realizada, principalmente, por intermédio de testes e provas
exigindo a resposta exatamente como estava nas apostilas e manuais.
Os conteúdos eram organizados em pequenas unidades com sequên-
cias curtas e totalmente fragmentados.

Voltando para a década de 1930, identificamos algumas experiên- Vídeo

cias educacionais que refutavam a abordagem tradicional. Dessa ma- O vídeo D-01 – Escola
Nova, publicado pelo
neira, surge o movimento da Escola Nova, em que vários autores se canal Univesp, faz uma
destacaram, como Jean-Jacques Rousseau, Johann Heinrich Pestalozzi, excelente síntese da
abordagem da Escola
John Dewey, Maria Montessori e Friedrich Froebel. A ideia fundamen- Nova. Vale a pena assistir!
tal é de que a ênfase da educação não está nos conteúdos e sim no
Disponível em:
processo da aprendizagem, o qual deve ser permeado pela experiên- https://www.youtube.com/
cia, sendo o aluno protagonista e ativo nesse processo, defendendo watch?v=Lr5xe2LXoqs. Acesso
uma escola pragmatista. em: 2 mar. 2020.

Educação do passado, do presente e do futuro 13


Muitas foram as contribuições da Escola Nova, usadas até hoje.
Podemos ver algumas delas na figura a seguir:

Figura 1
Características da Escola Nova

Adequar as Valorizar os
necessidades individuais
conhecimentos
ao meio social,
retratando a vida por do aluno.
meio de experiências.

Aprender
Pesquisa, método de
solução de problemas, e
Escola a aprender
e aprender
estudo do meio natural Nova fazendo.
e social.

O professor com
O aluno como ator principal,
papel secundário,
centro do processo de
facilitador da
ensino e aprendizagem, e
aprendizagem.
sujeito ativo.

Biw3ds/ wavebreakmedia/goodluz/ESB Professional/ Monkey


Business Images/Tyler Olson/ Rawpixel.com/ Shutterstock

Vídeo Fonte: Elaborada pela autora.


O vídeo Seminário 20
anos do Insituto Paulo Outro grande movimento foi a abordagem Crítica (SAVIANI, 1991),
Freire, publicado pelo
também conhecida como Progressista (LIBÂNEO, 1985), representada
canal iPF.Tv, trata sobre
o legado de Paulo Freire pelas tendências das pedagogias a seguir:
para a educação.
i. A pedagogia libertadora, com Paulo Freire, acredita que a educação
Disponível em:
https://www.youtube.com/ é um ato político, uma ferramenta que busca a transformação da
watch?v=Bw8Ojkq-aS0. Acesso
sociedade.
em: 2 mar. 2020.
ii. Na pedagogia libertária voltada para a autogestão o aluno tem
Vídeo
liberdade para escolher o que e como quer estudar. O professor
No site Dia a Dia Educação,
é um orientador que ajuda o aluno e o grupo a aprender e se
da Secretaria de Educação,
você encontra uma tabela desenvolver.
que apresenta as principais
características da Tendên- iii. A pedagogia crítico-social dos conteúdos, representada por
cia Pedagógica Libertária.
Libâneo, e a pedagogia histórico-crítica, com o professor
Disponível em:
Dermeval Saviani, buscam socializar conhecimentos e saberes
http://www.gestaoescolar.
diaadia.pr.gov.br/modules/ universais como meio de instrumentalizar o indivíduo para
conteudo/conteudo.
ser um cidadão atuante.
php?conteudo=358. Acesso em:
2 mar. 2020.

14 Transversalidade na Educação
O desenvolvimento dessas abordagens, a partir da década 1980, Vídeo
proporcionou um repensar da prática pedagógica pautada na peda- O vídeo Desafios futuros,
publicado pelo canal
gogia racionalista, com predominância na transmissão, reprodução, SINPROSP, apresenta
fragmentação e disciplinaridade. A abordagem Progressista difundiu o uma fala do professor
José Carlos Libâneo
pensamento de que a instituição de ensino poderia auxiliar na trans- sobre a educação e a
formação da sociedade, uma vez que a educação deve contribuir para a função da escola.

formação de indivíduos cada vez mais humanizados, capazes, inclusive, Disponível em:
de modificar a realidade em que vivem. Observe a seguir características https://www.youtube.com/
da abordagem Progressista. watch?v=bERxLjM7G0I. Acesso
em: 2 mar. 2020.
Figura 2
Características da abordagem Progressista

Autonomia e
Autogestão

Transformação

Politicidade

Dialogicidade

Socialização
ck
rsto

do saber
Erro é um
te
hut
s/S

caminho
us

Prática
am

para o
se

emancipadora acerto

Fonte: Elaborada pela autora.


Para acompanhar as constantes mudanças atuais, a educação
deve ir além da transmissão de saberes historicamente produzi-
dos de maneira disciplinar e descontextualizada. É preciso dialogar
com pensamentos possibilitadores de uma educação que promova
a produção do conhecimento e revitalize o processo educativo e as
práticas pedagógicas.

Educação do passado, do presente e do futuro 15


1.2 A visão da complexidade na educação
Vídeo O mundo contemporâneo está em um processo de rápida trans-
formação, exigindo um novo paradigma educacional que supere
ações e pensamentos reducionistas e simplificadores, permitin-
do ultrapassar as barreiras que determinam práticas limitadas,
fragmentadoras e lineares.

Mas quais seriam os pressupostos teóricos que possibilitariam a re-


novação das práticas pedagógicas para atender aos desafios da reali-
dade atual de problemas relacionados às questões ambientais,
ecológicas, sociais, éticas, econômicas e tecnológicas?

Figura 3 Sabemos que há muitas maneiras de ver, compreender e convi-


Síntese das concepções ver, um pluralismo e uma heterogeneidade de ideias, valores,
educacionais
opiniões, hábitos e pontos de vista, influenciados por
Escola Tradicional nossas concepções. Na educação não é diferente,
como já abordado, foram muitas concepções
educacionais que fundamentaram o pro-
Tecnicismo cesso educativo, em diferentes momentos
históricos, e que ainda regem nossa ma-
neira de pensar e agir, e o modo como
Escola Nova usamos a lógica em nosso raciocínio.

Pedagogia Para exemplificar, usaremos um


histórico-crítica caso real (JOVEM..., 2020), sobre um jo-
Abordagem vem de 17 anos que estava com seus
libertadora amigos na praia e para se divertirem
resolveram fazer uma brincadeira:
enterrar um deles deixando apenas os
pés para fora. Como resultado disso, o
Concepção
libertária rapaz que ficou enterrado na areia se as-
fixiou, teve que ser resgatado pelo corpo de
bombeiros e levado ao hospital, mas não sofreu
consequências graves. Essa foi uma notícia muito di-
Fonte: Elaborada pela autora. vulgada pela imprensa nacional, levando a população a
falar e refletir sobre o ato desses jovens. Sendo assim, o que pen-
sar, o que sentir, o que deverá ser feito?

Esse caso permite fazer uma análise para identificar o que pode-
ria surgir de pensamentos nas pessoas a partir de alguns paradigmas.

16 Transversalidade na Educação
Dessa maneira, vamos olhar para isso sob perspectivas diferentes, se-
gundo o raciocínio feito por Moraes e Torre (2004):
a. Na visão do Paradigma Positivista, essa notícia seria descrita
em termos de fatos concretos, exaltando o objeto como única
realidade a ser investigada. Dessa maneira, seriam destacados:
hora e local do acidente; características da pessoa acidentada;
tipos de pessoas que se envolveram na situação; idade dos jovens
etc. A análise feita na perspectiva positivista seria de uma imagem
da situação que mostrasse concretamente o fato ocorrido, e os
itens que poderiam ser observáveis e mensurados.
b. Na visão do Paradigma Interpretativo, esse mesmo incidente
teria outra análise, avaliada com base no reflexo que a situação
produz nas pessoas afetadas, direta ou indiretamente. Aqui o
importante não é a questão quantitativa e concreta, mas o que
pensam e sentem as pessoas de acordo com o envolvimento
ou não na situação, logo, o que impera é a subjetividade. Dessa
forma, a análise seria relacionada aos sentimentos envolvidos
nos jovens que propuseram a brincadeira, o que sentem e
pensam os familiares, quais são as percepções das pessoas
que estavam no local e visualizaram o acidente, entre outros
questionamentos. Sendo assim, identificamos que podemos ter
respostas diversificadas a esses questionamentos, pois a situação
é examinada sob perspectivas e concepções pessoais.
c. Na visão do Paradigma Sociocrítico, diferentemente das
abordagens anteriores, seria feita uma análise sob o ponto
de vista do contexto sociocultural, tentando entender e
dar legitimidade ao ocorrido, identificando o impacto e
as consequências sociais do fato educativo. Logo, nesse
paradigma surgiriam os seguintes questionamentos: por que
ocorre esse tipo de situação? O que acontece para que jovens
não percebam as consequências de algumas atitudes? Qual é a
relação da sociedade com esse tipo de evento?
d. Na visão do Paradigma Complexo, a situação e suas
especificidades seriam analisadas como uma unidade global,
por ser uma ação complexa. A análise seria feita como um
sistema interativo e dinâmico, no qual as observações das
visões paradigmáticas anteriores seriam consideradas, porém
é necessária uma visão de inter-relação entre sujeito, objeto e
contexto, concebendo as relações, as conexões e as diversas

Educação do passado, do presente e do futuro 17


dimensões envolvidas para compreender o fenômeno.
Para exemplificar a visão desse acidente sob o olhar desse
paradigma, seriam feitas as seguintes questões: se tivesse
variado a hora, o tipo de areia, a posição do jovem enterrado,
será que os efeitos seriam diferentes? Se os jovens tivessem
uma educação e cultura diferentes, teriam atuado de outra
maneira? No paradigma da complexidade o importante é
ver o ocorrido de maneira global e parcial para identificar as
interações ocorridas.

Figura 4
Paradigma

Complexidade

Positivista Interpretativo Sociocrítico

Observação
Contexto
e Subjetividade
sociocultural
Mensuração

Fonte: Elaborada pela autora.

A complexidade leva o indivíduo a observar e analisar por meio de


outra lógica e outros níveis de realidade, a fim de que se possa ver
além daquilo que está sendo revelado em um primeiro momento, bus-
cando uma visão sistêmica em oposição à fragmentação. Devemos
entender como pensamento complexo tudo aquilo que é tecido junto
(MORIN; LE MOIGNE, 2000). Assim, essa teoria busca trazer construtos
que auxiliam a pensar melhor.

Mas o que seria tecer junto? Significa entender que um fenômeno


não é isolado, que para compreendê-lo é necessário substituir algumas
maneiras de raciocinar, isto é, reunir o que está separado e fragmen-
tado, respeitando a diversidade sem deixar de reconhecer a individua-

18 Transversalidade na Educação
lidade. Para Morin (2000), isso seria a relação entre o diverso e o uno.
Em outras palavras, quando pensamos no ser humano, cada indivíduo
é único, uma unidade que vive com outros humanos na diversida-
de. Mas também devemos compreender a diversidade na unidade,
o que Morin (2000, p. 55) denominou de Unitas Multiplex, ou seja,
compreender que “é preciso conceber a unidade do múltiplo, a
multiplicidade do uno”.

A seguir falaremos um pouco sobre os construtos propostos por


Morin (2000), que auxiliam na reforma do pensamento para que
possamos pensar melhor.
1. Quando isolados, uma informação, um dado ou um fato, não são
suficientes para que sejam compreendidos e tenham sentido,
sendo assim há necessidade de contextualizá-los. Veja o
exemplo da palavra manga na figura a seguir:

Figura 5
Exemplo de contextualização

Em algumas situações, é Gosto muito do sabor da


Palavra:
sempre importante ter uma manga quando está madura.
MANGA.
carta na manga.
YuriyZhuravov/A
nja W./Maks Na
rodenko/Shutt
Fonte: Elaborada pela autora. erstock

Para saber o significado da palavra manga em cada contexto é


necessário ler a frase toda e compreender seu sentido. Portanto,
a complexidade nos mostra a importância da contextualização.
2. Se olharmos, por exemplo, para uma sala de aula tentando
compreender o processo de ensino e aprendizagem, poderemos
ter uma visão parcial, pois é fundamental ampliar o campo de
percepção, isto é, saber em qual escola está localizada esta
sala, para saber como pensa a educação. Isso também seria
verdadeiro se quiséssemos conhecer o processo educativo da
escola, para tal, além de conhecer o que a instituição pensa
e faz, é necessário identificar cada movimento feito nas

Educação do passado, do presente e do futuro 19


salas de aula. Esse princípio é identificado como sistêmico ou
organizacional, que afirma a impossibilidade de conhecer as
partes sem conhecer o todo, assim como conhecer o todo sem
conhecer as especificidades que constituem as partes.

Figura 6
Princípio sistêmico ou organizacional

PARTES TODO
Salas de aula Escola

Vla
gpo

dim
in

ir N
tstu

e
nezic/S
dio/Shutterstock

hutterstock
Fonte: Elaborada pela autora.
3. Usando o mesmo exemplo anterior, podemos, ainda, dizer que
o que se faz em cada sala de aula é único, porém as ações ali
realizadas contêm a visão de educação da escola, bem como
os pressupostos teóricos metodológicos por ela definidos.
Isso foi denominado como princípio hologramático, pois em uma
organização complexa podemos identificar que não só a parte
está no todo, mas também o todo está na parte.
4. Ainda usando o exemplo da sala de aula, podemos identificar
o princípio de retroatividade, em que além da causa agir sobre
o efeito, o efeito também retroage sobre a causa de modo
informacional, possibilitando que o sistema tenha autonomia

20 Transversalidade na Educação
organizacional. Na prática seria dizer que as ações não são
lineares (causa efeito), mas sim circulares. Se o professor, por
exemplo, utiliza de uma metodologia para ensinar um conteúdo,
a resposta é a aprendizagem total, parcial ou a não aprendizagem
do conteúdo pelo aluno. Conforme a resposta do aluno/turma,
o professor poderá ou não alterar sua prática pedagógica para
alcançar o seu objetivo de ensinar o conteúdo.

Figura 7
Princípio da retroatividade

Professor
mantém
sua metodologia

Aprende

Professor Informação
Ensinar do resultado
Aluno
Uso de metodologia da ação

Não aprende
Aprende
parcialmente

Professor
modifica
sua metodologia

Fonte: Elaborada pela autora.


5. No princípio da recursividade o exemplo anterior é mantido,
porém ampliado, pois aprender ou não aprender pelo aluno é
um efeito ou um produto extremamente necessário para que
a nova ação do professor aconteça. Sendo assim, entende-se
que essa aprendizagem, ou não, é causadora e produtora do

Educação do passado, do presente e do futuro 21


próprio processo, no qual o resultado final é imprescindível para
a geração dos estados iniciais.

Figura 8
Princípio da recursividade

Professor
mantém sua
metodologia

Aprende

Professor Informação Efeitos Causadores


Ensinar Aluno do resultado ou e
Uso de da ação Produtos Produtores
metodologia

Não aprende
Aprende parcialmente

Professor
modifica sua
metodologia

Fonte: Elaborada pela autora.


6. Outro construto fundamental da complexidade é em relação ao
princípio de autonomia/dependência, que traz a ideia, por exemplo,
de que um professor é independente para ensinar e isso só
ocorre porque ele tem múltiplas dependências relacionadas a
conhecimentos específicos da sua área e associadas à questão
didático-pedagógica. Essa relação lhe dá autonomia na prática
pedagógica. Desse modo, esse princípio nos mostra que para
toda autonomia têm-se múltiplas dependências.
7. O princípio dialógico ajuda a pensar lógicas que se complementam
e se excluem, mesmo que estas sejam antagônicas, opostas ou
concorrentes. Segundo Morin (2008, p. 96), “a dialógica permite
assumir racionalmente a inseparabilidade de noções
contraditórias para conceber um mesmo fenômeno complexo”
que são complementares em sua dinâmica processual.
Se pensarmos no professor que organiza sua aula e que durante
ela surgem algumas dúvidas não previstas dos alunos, mas são
questionamentos importantes, a aula acaba sendo desestruturada

22 Transversalidade na Educação
em relação ao plano inicial, porém, com algumas ações, o
professor consegue reorganizar e finalizá-la, apesar de ter tomado
novo rumo, fundamental para a compreensão do conteúdo pelos Figura 9
alunos. Podemos sintetizar que ocorreu uma ordem/desordem/ Para compreender o
princípio dialógico
organização, entidades opostas que podem colaborar e produzir a
organização de um fenômeno. Imagem do Yin Yang,
8. Outra ideia-chave do pensamento complexo é entender que toda representado pelo feijão e pelo
arroz, possibilitando ver que
ação pode ser modificada, invertida ou até retroceder de algo dois elementos opostos podem
previamente pensado ou delimitado, ou seja, escapar se complementar.

de sua intenção inicial. Estamos falando da


ecologia da ação, a qual Morin (2003, p. 53)
explica “o fato de que toda ação, uma vez
iniciada, entra num jogo de interações e
retroações no meio em que é efetuada, que
podem desviá-la de seus fins e até levar a um
resultado contrário ao esperado”. Assim é
fundamental compreender e aprender
a enfrentar as incertezas, tanto nas
ações como no conhecimento.
9. Substituir a visão unidimensional
pela multidimensionalidade faz
entender, por exemplo, que o
ser humano é ao mesmo tempo
ck
sto
biológico, psíquico, social, afetivo, hutter
k6 0/ S
espiritual e racional. Se falarmos da fran

educação, podemos compreendê-la pelas


dimensões didáticas, históricas, filosóficas, sociológicas, políticas,
religiosas, entre outras. Isso nos mostra que a inteligência
parcelada, compartimentada, disjuntiva e reducionista enaltece
a fragmentação, fracionando os problemas, rompendo com o
complexo do mundo e, naturalmente, produzindo inúmeros
erros e ilusões, impedindo de apreender o que está tecido junto.

O breve estudo acima, sobre a complexidade, possibilita entender


a importância de transformar a maneira de pensar, sentir e agir, pois
isso auxilia o professor a ter atitudes de curiosidade que permitam dia-
logar com novas ideias e identificar a existência de caminhos diversifi-
cados que podem ser visualizados com base em percepções que levem
a aprendizagem do pensar por outra lógica.

Educação do passado, do presente e do futuro 23


É necessário que a prática pedagógica da atualidade transcenda a
visão disciplinar, elimine ideias redutoras e excludentes, bem como
busque articulações, dialogando com pensamentos que possibilitem
a diversidade, o confronto, a reconstrução, além de conhecer o outro
nível de realidade do processo do conhecimento, por meio de uma ra-
cionalidade aberta, dialógica, intuitiva e global.

1.3 A educação do futuro


Vídeo Foi a partir dos acontecimentos do Renascimento que surgiu a ins-
tituição de ensino da forma que conhecemos: dividida em áreas, com
currículo contemplando várias disciplinas, algumas com carga maior
que outras, e com prática pedagógica que considera o repasse dos con-
teúdos e a memorização pelos alunos. Isso ocorreu porque a ciência
naquela época demandava a divisão das áreas e necessitava da racio-
nalidade e da experiência para comprovar os novos conhecimentos, e
essa forma influenciou a estrutura curricular disciplinar.

Mais que nunca, necessitamos de uma nova organização da ins-


tituição de ensino para a produção do conhecimento, pois vivemos
em uma sociedade que amplia e diversifica os espaços, o tempo e
a forma para a construção do pensamento. O conhecimento precisa
ultrapassar o limite de uma área específica, é esperado o diálogo, a
troca e a interação para responder aos questionamentos que a con-
temporaneidade nos impõe.

Diante do mundo atual, descrito como Sociedade do Conhecimen-


to (HARGREAVES, 1995), Era da Informação (CASTELLS, 1992) ou ainda
Sociedade da Aprendizagem (POZO, 2002), em que o fluxo de informa-
ções é intenso, as barreiras de tempo e espaço não são mais estreitas
para as interações e há múltiplas possibilidades de aprender, “o conhe-
cimento ficou disponível na rede informatizada, nas redes de comuni-
cação televisadas. Portanto, o acesso ao conhecimento não está mais
localizado numa única instituição, mas sim, em toda a aldeia global”
(BEHRENS, 2005, p. 81).

O mundo tem passado por profundas transformações de manei-


ra muito acelerada. Alterações no campo social, econômico, cul-
tural e tecnológico, que têm abalado muitas certezas e levado as

24 Transversalidade na Educação
pessoas a conviverem com a provisoriedade, a mudança e a de-
sordem. Tempos de incertezas que possibilitam o surgimento de
novas tendências pelo rompimento de paradigmas que se tornam
obsoletos. Além disso, identifica-se que esse cenário incita para a
superação de práticas pedagógicas voltadas à fragmentação e à
padronização, necessitando desenvolver uma educação que cor-
responda às necessidades contemporâneas e futuras.

A tecnologia mudou a maneira de aprender, as interações não são


mais lineares e, sim, em redes, em conexões que permitem o imediatis-
mo, mas também o aprofundamento. A era digital possibilita o uso de
novos recursos tecnológicos na prática pedagógica, o que permite o en-
sino dos conteúdos de diversas formas e induz novos comportamentos
de aprendizagem, impondo novos ritmos ao ensino e à aprendizagem
e levando o professor a se atualizar permanentemente e se adaptar às
inovações tecnológicas.

As novas tecnologias e a internet são recursos importantes para mu-


dar o processo educativo e possibilitam a promoção da aprendizagem,
tanto do ponto de vista quantitativo, quanto qualitativo. As tecnologias
tornam possível o acesso de muito mais pessoas à educação, à forma-
ção e à aquisição de informação, pois permitem a superação de bar-
reiras físicas e temporais, possibilitando aprender não somente nos
espaços formais de educação, mas ampliando para outros novos, como
o lar, os locais de trabalho e lazer, os museus, os centros culturais etc.,
surgindo, assim, novos cenários educacionais. Essa potencialização
vem modificando os cenários educacionais tradicionais e, ao mesmo
tempo, viabilizando o aparecimento de novos, inclusive os relacionados
à educação a distância.

Outro ponto importante para compreender a educação do presente


e do futuro está relacionado à proposta da Unesco, quando encomen-
dou a Edgar Morin a criação de um material reflexivo que servisse como
eixo norteador para repensar a educação contemporânea, surgindo
então a obra Os sete saberes necessários à educação do futuro (MORIN,
2000). Esse livro propõe um conjunto de saberes fundamentais a se-
rem ensinados na escola, que, conforme Petraglia (2012, p. 130), “não
se trata de conteúdos disciplinares específicos; trata-se de saberes re-
levantes e necessários ao bem viver”. Esses saberes, segundo o próprio
autor, são transdisciplinares, com o propósito de religá-los, pois desa-

Educação do passado, do presente e do futuro 25


fiam os educadores a superar a visão de dualidade e religar ciência e
religião, razão e emoção, entre outras.

(1) as cegueiras do
Figura 10
conhecimento: erro e ilusão,
Síntese dos sete saberes necessários
à educação do futuro para compreender o erro como
possibilidade a outros caminhos,
não deixando a ilusão cegar;

(2) os princípios do
conhecimento pertinente,
para superar a fragmentação
e rearticular as disciplinas de
modo a religar o conhecimento;

(3) ensinar a condição


humana, compreendendo
a multidimensionalidade e
diversidade humana;

(4) ensinar a identidade terrena, atentando à


sustentabilidade e compreensão planetária;

(5) enfrentar as incertezas, que traz a


possibilidade de ir além e avançar o conhecimento;

(6) ensinar a compreensão para a tolerância,


generosidade e bem-estar comum;

(7) a ética do gênero humano, a fim de ensinar


a democracia e cidadania, resgatando a relação
indivíduo, sociedade e espécie.

Fonte: Elaborada pela autora com base em Morin, 2000.

As informações contidas nos sete saberes propostos por Morin


(2000) permitem ver a prática pedagógica e a relação dos conteúdos
por uma nova perspectiva.

26 Transversalidade na Educação
O primeiro saber é denominado as cegueiras do conhecimento:
o erro e a ilusão. Esses elementos apontam que se deve compreen-
der a natureza do conhecimento, saber de onde ele vem e por quê.
Vídeo
Esse saber mostra que qualquer conhecimento apresenta risco do erro
No vídeo Sete Saberes
e da ilusão, para isso é reforçada a questão da importância relaciona-
Necessários para Educação
da ao conhecimento do ato de conhecer, esta deve ser a primeira ne- do Futuro Edgar Morin,
publicado pelo canal Pro-
cessidade da educação. Para Morin (2000, p. 20) “o conhecimento, sob
fessor Marcos L Souza, o
forma de palavra, de ideia, de teoria, é o fruto de uma tradução/recons- Prof. Edgar de Assis faz
um breve relato sobre os
trução por meio da linguagem e do pensamento e, por conseguinte,
sete saberes necessá-
está sujeito ao erro”. O autor acrescenta ainda que “este conhecimento, rios para a educação do
futuro, por meio de uma
ao mesmo tempo tradução e reconstrução, comporta a interpretação,
linguagem bem acessível
o que introduz o risco do erro na subjetividade do conhecedor, de sua e apresenta muitos
exemplos. Vale a pena
visão do mundo e de seus princípios de conhecimento”.
assitir!
Outro saber são os princípios do conhecimento pertinente, que Disponível em: https://www.youtube.
deixa clara a importância do contexto, ou seja, de localizar e integrar as com/watch?v=Dc96Crh_wps. Acesso
em: 25 maio 2020.
partes com o todo. Esse princípio leva o professor a pensar simultanea-
mente sobre a superação da fragmentação dos conteúdos e dos conhe-
cimentos para poder preparar os alunos para enfrentar “as realidades
ou problemas cada vez mais multidisciplinares, transversais, multidi-
mensionais, transnacionais, globais e planetários” (MORIN, 2000, p. 36).

Ensinar a condição humana é o terceiro saber, que se refere ao


objetivo essencial do ensino: o sentimento de pertencer à espécie
humana, compreender que somos seres planetários, mas ao mesmo
tempo temos nossas especificidades, pois “estamos simultaneamente
dentro e fora da natureza” (MORIN, 2000, p. 48).

O quarto saber está relacionado com ensinar a identidade terre-


na, que busca mostrar sobre a importância de ensinar nossos alunos
a compreender o processo da mundialização e da globalização, para
que possamos “conceber a insustentável complexidade do mundo no
sentido de que é preciso considerar a um só tempo a unidade e a diver-
sidade do processo planetário, suas complementaridades ao mesmo
tempo que seus antagonismos” (MORIN, 2000, p. 68).

O quinto saber é enfrentar as incertezas, para compreender que


nenhum conhecimento é definitivo, pois estamos sujeitos a muitos im-
previstos que mudam o rumo dos acontecimentos, sendo surpreen-
didos pelo inesperado. Faz-se necessário aprender a conviver com as
incertezas da vida. Como afirmado por Morin (2000, p. 92):

Educação do passado, do presente e do futuro 27


na história, temos visto com frequência, infelizmente, que o pos-
sível se torna impossível e podemos pressentir que as mais ricas
possibilidades humanas permanecem ainda impossíveis de se
realizar. Mas vimos também que o inesperado torna-se possível
e se realiza; vimos com frequência que o improvável se realiza
mais do que o provável; saibamos, então, esperar o inesperado e
trabalhar pelo improvável.

Temos ainda o saber ensinar a compreensão, para que a


educação do presente e do futuro ajude os estudantes a supe-
rar a grande dificuldade do mundo, a falta de compreensão, pois
os homens despojam-se no egocentrismo e no etnocentrismo.
Buscar trabalhar a aceitação, o respeito, a amorosidade para supe-
rar as ideias arbitrárias, a autojustificação e a arrogância, que são
as causas e as consequências das piores incompreensões.

Por fim, Morin (2000) aborda a ética do gênero humano, ou


antropoética, ancorada em três elementos: o indivíduo, a sociedade e a es-
pécie. Esses elementos são, segundo o autor, inseparáveis e coprodutores
um do outro, eles se nutrem e, sendo assim, devem ser compreendidos nas
suas especificidades e na interação.

A escola deve buscar construir um ambiente visto como local de


produção de conhecimento, priorizando a reconstrução crítica, criati-
va e reflexiva. Ambientes acolhedores intelectual e emocionalmente,
permeados pelo diálogo, pelo compartilhamento e pelas trocas, permi-
tindo a pluralidade de olhares, de referências e de múltiplas leituras e
visões na busca constante de soluções aos conflitos emergentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Atualmente, a sociedade exige que os profissionais sejam autônomos,
tenham a capacidade de resolver os problemas com competência, con-
sigam trabalhar em grupo de maneira cooperativa e colaborativa, respei-
tando a individualidade, tenham a capacidade de ver o todo e as partes,
desenvolvendo a responsabilidade e a solidariedade, e ainda se aperfei-
çoem constantemente, pois o conhecimento é provisório e não está pronto
e acabado, mas sim em constante transformação. Para isso, é necessário
superar pensamentos e ações conservadoras, lineares, fragmentadas, ab-
solutas e autoritárias que impossibilitam a compreensão da complexidade
da realidade e de suas relações e inter-relações com o todo.

28 Transversalidade na Educação
Nosso estudo, neste capítulo, possibilitou compreender a impor-
tância de reformar o pensamento. Essa ação deverá superar o pen-
samento que fragmenta por um que une, possibilitando assim ter
visão e percepção ampliadas, corrigindo a rigidez da lógica linear e
unidirecional pela visão multidimensional, buscando trabalhar com
o diálogo, concebendo a diversidade, os antagonismos e as comple-
mentariedades, portanto, entendendo o todo e, também, as partes
para compreender o mundo no qual vivemos.

Para abdicar de uma docência racional, que leva muitas vezes à


fragmentação do conhecimento e da aprendizagem, é necessário reco-
nhecer que o pensamento complexo nos leva a pensar nas relações, nas
conexões e nos vínculos. Isto é, reconhecer a multidimensionalidade do
indivíduo, pois o ser humano não tem apenas pensamentos e ações ra-
cionais, mas também um raciocinar e fazer intuitivo, cognitivo e afetivo.

ATIVIDADES
1. Leia a descrição abaixo.
Mariana é uma professora formada na década de 1970 no curso
de Pedagogia. Hoje ela está aposentada do Estado e iniciando uma
nova jornada em uma escola da rede privada, em que atuará com
os primeiros anos do Ensino Fundamental. Ao chegar na escola, foi
orientada em relação à concepção educacional, que fundamenta o
processo de ensino e aprendizagem. A coordenadora explicou-lhe
que a metodologia utilizada é a Pedagogia de Projetos, que possibilita
aprender os conteúdos curriculares por meio da resolução de
problemas contemporâneos e que o uso das tecnologias é fundamental
para a realização do trabalho educativo. Mariana teve certa dificuldade,
pois sua formação tem base no paradigma newtoniano-cartesiano.
Atualmente, a professora está totalmente integrada e adaptada à
escola, desenvolvendo um excelente trabalho.

Agora, descreva duas características que ela possivelmente superou,


relacionadas ao paradigma newtoniano-cartesiano, para se tornar
uma boa professora nessa escola.

Educação do passado, do presente e do futuro 29


2. Leia a citação abaixo.
Hoje, necessita mais de um professor que tenha, além de uma
prática reflexiva e crítica, também uma escuta sensível e uma
consciência mais elaborada; um sujeito mais atento aos proces-
sos auto-organizadores de seus alunos, capaz de olhar para eles
e identificar suas necessidades básicas, de intuir suas angústias e
de converter tudo isto em subsídios para as atividades de ensino e
aprendizagem (MORAES, 2007, p. 17).

Para ser esse professor que o autor descreve é necessário ter


conhecimento de qual paradigma? Descreva dois princípios que o
regem.

3. De que maneira os saberes compreenssão e condição humana podem


ser inseridos no currículo escolar? Cite uma dica prática.

REFERÊNCIAS
BEHRENS, M. A. O paradigma emergente e a prática pedagógica. Petrópolis: Vozes, 2005.
CASTELLS, M. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1992.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1975.
HARGREAVES, A. O ensino na sociedade do conhecimento: educação na era da insegurança.
Porto Alegre: Artmed, 1995.
JOVEM soterrado após brincadeira na praia tem quadro estável. R7, 2020. Disponível em:
https://noticias.r7.com/rio-de-janeiro/jovem-soterrado-apos-brincadeira-na-praia-tem-
quadro-estavel-09012020. Acesso em: 3 mar. 2020.
LIBÂNEO, J. C. Democratização da escola pública. A pedagogia crítico-social dos conteúdos.
São Paulo: Loyola, 1985.
MORAES, M. C. A formação do educador a partir da complexidade e da transdisciplinaridade.
Revista Diálogo Educacional, Curitiba: Champagnat, v. 7, n. 22, p.13-38, set./dez. 2007.
MORAES, M.C.; TORRE, S. Sentipensar: fundamentos e estratégias para reencantar a
educação. Petrópolis: Vozes, 2004.
MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2000.
MORIN, E. Educar na era planetária: O pensamento complexo como método da
aprendizagem no erro e na incerteza humana. São Paulo: Cortez, 2003.
MORIN, E. Introdução ao pensamento complexo. 3 ed. Porto Alegre: Sulina. 2007.
MORIN, E. A cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2008.
MORIN, E.; LE MOIGNE, J. L. A Inteligência da Complexidade. São Paulo: Peirópolis, 2000.
PETRAGLIA, I. Educação e complexidade: os sete saberes na prática pedagógica. In:
MORAES, M. C.; ALMEIDA, M.C. (org.). Os sete saberes necessários para a educação do
presente: Por uma educação transformadora. Rio de Janeiro: Wak, 2012.
POZO, J. I. Aprendizes e mestres: a nova cultura da aprendizagem. Porto Alegre: Artmed,
2002.
SAVIANI, D. Pedagogia histórico crítica: primeiras aproximações. São Paulo: Autores
Associados, 1991.

30 Transversalidade na Educação
2
Caminhos da transversalidade
na educação
Transversalidade é um tema que a comunidade educativa tem
estudado há muitos anos e sobre o qual têm surgido muitas inquie-
tações, gerando dúvidas sobre como inseri-lo no currículo escolar e
trabalhá-lo na prática pedagógica.
Ao nos lembrarmos de John Dewey (1859-1952), identifica-
mos que a questão da transversalidade já era apontada nessa
época de maneira indireta, pois esse filósofo educador falava
sobre a importância da relação entre a educação, experiência e
história de vida, afinal a escola, como um espaço democrático,
possibilita o intercâmbio de pensamentos e situações de coo-
peração para o desenvolvimento integral do aluno.
John Dewey e outros educadores da Escola Nova foram muito
estudados pelos professores; suas ideias e princípios orientaram
ações pedagógicas, mas nunca se pensou que essas ideias esta-
vam relacionadas com a transversalidade.
Dessa maneira, não devemos temer, e sim buscar mais conhe-
cimentos com o objetivo de desenvolver competências para utilizar
a transversalidade e os temas transversais no processo de ensino
e aprendizagem. Assim, neste capítulo, buscamos trazer um pouco
de teoria e alguns exemplos para que você possa refletir sobre o
assunto e desenvolver sua própria concepção.

2.1 Mas o que é transversalidade?


Vídeo O paradigma newtoniano-cartesiano influenciou algumas aborda-
gens educacionais no Brasil e, consequentemente, imprimiu fortemen-
te pensamentos e ações estruturados na fragmentação, na visão linear,
na reprodução, na acriticidade e na racionalização.

Caminhos da transversalidade na educação 31


Lei
Essa maneira de conceber a educação fez com que se enaltecessem
Para saber mais sobre a
Constituição Federal no
a disciplinaridade e a propagação de conteúdos por áreas, impossibili-
que se refere ao direito tando a interação entre os conhecimentos.
à educação, recomen-
damos a leitura do texto É importante ainda lembrar que, nesse paradigma newtoniano-
dos artigos 205 a 214 na
-cartesiano, prevalecia no processo avaliativo do aluno a contagem de
íntegra.
erros e acertos daquilo que foi transmitido pelo professor e do conteú-
Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/setec/ do que deveria ser lembrado pelo estudante. A subjetividade não era
arquivos/pdf_legislacao/superior/ concebida e, desse modo, o conteúdo deveria ser decorado em vez de
legisla_superior_const.pdf. Acesso
em: 6 abr. 2020. compreendido e aplicado em um contexto específico.

Outro ponto para reflexão é o fato de o currículo disciplinar ter


favorecido algumas disciplinas em detrimento de outras. Frequen-
temente encontravam-se grades curriculares escolares compostas
Lei
de aulas de matemática e língua portuguesa diárias, mas com ape-
Para saber mais sobre a
nas alguns dias ou uma vez na semana para as demais disciplinas.
Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, O que mais importava era a difusão de uma listagem de conteúdos
Lei n. 9.394/1996, no
de cada disciplina por parte do professor, enquanto ao aluno cabia
que se refere ao direito
à educação, recomenda- a memorização, os outros temas que não faziam parte do conteúdo,
mos a leitura do texto na
geralmente, só eram trabalhados em atividades extracurriculares.
íntegra.

Disponível em: Mas por que estamos falando disso?


http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso Porque a aprendizagem escolar deve(ria) fazer parte da vida de qual-
em: 6 abr. 2020. quer indivíduo, pois é garantida pela Constituição da República Federa-
tiva do Brasil no artigo 205 e reafirmada pela Lei de Diretrizes e Bases
da Educação, Lei n. 9.394/1996, artigo 2º. Ambas as leis definem que a
educação é um direito de todas as pessoas e, para que ela aconteça, é
necessário que tanto a família como o Estado se responsabilizem por
isso, promovendo o desenvolvimento pleno do indivíduo.

Quando falamos de adquirir conhecimentos especificamente na es-


cola, referimo-nos ao que a Constituição e as leis educacionais definem
como um espaço no qual o indivíduo possa aprender para se desenvol-
ver como pessoa e profissional, nos aspectos cognitivos, afetivos, psi-
comotores, procedimentais e atitudinais, podendo, assim, viver como
cidadão ou, ainda, como cidadão planetário.

Entretanto, a escola que ainda domina a sociedade contemporânea


é aquela herdada da cultura tradicional, estruturada nos princípios de
René Descartes, enaltecendo a fragmentação de acordo com os precei-
tos do filósofo, o qual defendia: “dividir cada uma das dificuldades que
devesse examinar em tantas partes quanto possível e necessário para

32 Transversalidade na Educação
resolvê-las” (2002, p. 31), nascendo, assim, a disciplina, com a necessi-
dade de especializar cada uma das áreas do conhecimento.

Outro ponto importante do cartesianismo é o reducionismo,


pois, com base no princípio de que “conduzir por ordem os meus
pensamentos, iniciando pelos objetos mais simples e mais fáceis
de conhecer, para chegar, aos poucos, gradativamente, ao conhe-
cimento dos mais compostos” (DESCARTES, 2002, p. 32), institui-se
o método indutivo como caminho para a aprendizagem. Dessa for-
ma, acredita-se que os alunos só conseguem aprender quando par-
tem do mais simples para chegar a uma conclusão geral. Trata-se
da busca pela simplificação para alcançar a aprendizagem.

Figura 1 Conteúdo A
Representação do reducionismo; da fragmentação;
da simplificação

1º semestre Conteúdo B

Disciplina 1 ...
2º semestre

1º ano Disciplina 2

Escola 2º ano ...

...

Fonte: Elaborada pela autora.

Essa escola conteudista – transmissora de fatos, dados, princípios


e conceitos – ensina de maneira descontextualizada, e seus alunos
aprendem conteúdos soltos e isolados, enaltecendo-se a disciplinari-
dade no processo educativo e separando o que deveria ser visto de
maneira interligada (MORIN, 2008).

Uma saída para superar esse tipo de educação é trabalhar com


a transversalidade. Para Moreno (1998), essa abordagem possibi-
lita superar pensamentos e ações estruturados no mecanicismo
e na reprodução, sendo, também, um caminho para romper com
ações pedagógicas reducionistas.

Caminhos da transversalidade na educação 33


Por meio da transversalidade é possivel trabalhar os temas
transversais inseridos no curriculo escolar e na prática pedagógica,
com isso, se faz necessário analisar conceitos de alguns autores.
Assim sendo, ­iniciamos com Yus (1998, p. 17), que se posiciona afir-
mando que esses temas:
são um conjunto de conteúdos educativos e eixos conduto-
res da atividade escolar que, não estando ligados a nenhu-
ma matéria particular, pode-se considerar que são comuns
a todas, de forma que, mais do que criar novas disciplinas,
acha-se conveniente que seu tratamento seja transversal
num currículo global da escola.

Esse autor mostra didaticamente que, em relação ao currículo es-


colar, os temas transversais fazem parte do todo, não devendo ser
entendidos como mais uma disciplina ou conteúdo, mas um eixo que
atravessa todas as áreas a serem estudadas.

Continuando nossa análise, chegamos em Busquets (2000, p.13),


que apresenta uma visão bastante interessante:
Entende que os conteúdos curriculares tradicionais formam um
eixo longitudinal do sistema educacional e, em torno dessas áreas
do conhecimento, devem circular ou perpassar, transversalmen-
te, esses temas, mais vinculados ao cotidiano da sociedade.
Assim, nessa concepção, se mantêm as disciplinas que estamos
chamando de tradicionais do currículo (Matemática, as Ciências
e a Língua), mas os seus conteúdos devem ser ­impregnados com
os temas transversais.

De acordo com Busquets (2000), as disciplinas são importantes e é


fundamental que seus conteúdos sejam compreendidos; no entanto,
há a necessidade de ampliar esses conhecimentos por meio de temas
transversais.

Transferindo o conceito de Busquets para a prática, entenderíamos,


por exemplo, que, na disciplina de Ciências, o professor pode inserir no
planejamento, além dos conteúdos relacionados à sua área, um tema
diretamente relacionado com o dia a dia dos alunos. Se estamos falan-
do de uma turma de 5º ano do Ensino Fundamental, eles podem ter
dúvidas, curiosidades e dificuldades sobre o aumento da oleosidade da
pele e o aparecimento de acne, ou aumento da sudorese e dos maus
odores – temas que poderiam ser inseridos e trabalhados transversal-
mente, sendo relacionados com a puberdade, conteúdo da disciplina.

34 Transversalidade na Educação
Seguindo a análise, Gavídia (2002) nos faz entender que não existe
um conceito único de transversalidade, mas que o tempo e o contexto a
complementam e adequam conforme a necessidade.
A construção do conceito de transversalidade foi realiza-
da em pouco tempo, com contribuições diversas que foram
acrescentando significados novos ao termo. Esses significados
foram aceitos rapidamente, enriquecendo a representação
que temos hoje. Se antes transversal significava certos conteú-
dos a serem considerados nas diversas disciplinas escolares
– a higiene, o recibo de luz, a moradia, etc. –, agora representa
o conjunto de valores, atitudes e comportamentos mais im-
portantes que devem ser ensinados. (GAVÍDIA, 2002, p. 15-16)

Quando consideramos a legislação educacional brasileira, no do-


cumento Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), entendemos que
a transversalidade “diz respeito à possibilidade de se estabelecer, na
prática educativa, uma relação entre aprender na realidade e da rea-
lidade conhecimentos teoricamente sistematizados (aprender sobre a
realidade) e as questões da vida real e sua transformação (aprender
na realidade e da realidade)” (BRASIL, 1997, p. 31). Essa conceituação
permite compreender a necessidade de contextualizar os conteúdos
disciplinares, trazendo-os para o dia a dia do estudante.

Para finalizar nossa análise, trazemos o posicionamento da Base


Nacional Comum Curricular (BNCC) sobre os Temas Contemporâneos
Transversais (TCTs):
Educar e aprender são fenômenos que envolvem todas as di-
mensões do ser humano e, quando isso deixa de acontecer, pro-
duz alienação e perda do sentido social e individual no viver. É
preciso superar as formas de fragmentação do processo peda-
gógico em que os conteúdos não se relacionam, não se integram
e não se interagem. Nesse sentido, os Temas Contemporâneos
Transversais (TCTs) têm a condição de explicitar a ligação entre
os diferentes componentes curriculares de forma integrada, bem
como de fazer sua conexão com situações vivenciadas pelos es-
tudantes em suas realidades, contribuindo para trazer contexto
e contemporaneidade aos objetos do conhecimento descritos na
Base Nacional Comum Curricular (BNCC). (BRASIL, 2019)

Identifica-se claramente que, nesse documento, busca-se romper


com o paradigma cartesiano-newtoniano, procurando disseminar o en-
tendimento de que a formação do estudante deve ser integral. Dessa
maneira, as ações e os pensamentos fundamentados na fragmentação,

Caminhos da transversalidade na educação 35


na disciplinaridade, na redução e na linearidade devem ser superados
por uma educação que religue, contextualize e busque desenvolver o
indivíduo na sua integralidade.

2.2 Marcos regulatórios


Vídeo O mundo tem passado por mudanças em muitas áreas, entre elas a
educação, que é diretamente influenciada pelas questões sociais, polí-
ticas, econômicas, culturais internas e externas de cada época. Assim,
vamos fazer uma retrospectiva histórica sobre a legislação nacional
brasileira para entender quando, como e por que surgiu a transversali-
dade na educação.

Nosso ponto de partida será a elaboração da primeira Lei de Dire-


trizes e Bases da Educação (LDB), que representa a construção de uma
legislação para regulamentar o sistema educacional brasileiro.

2.2.1 Lei de Diretrizes e Bases da Educação,


Lei n. 4.024/1961
Essa lei foi pensada em 1948, quando foi encaminhado ao Congres-
so Nacional um anteprojeto de lei, no entanto, com os conflitos sociais
e econômicos, esse projeto ficou parado e foi retomado somente em
1959, sendo aprovado em 20 de dezembro de 1961.
Com relação à política, no período da Quarta República – República
Populista, referente aos anos de 1959 a 1961 –, tivemos quatro presi-
dentes. Em 1959, momento de retomada do projeto da LDB, tínhamos
como presidente Juscelino Kubitschek, que buscava a industrialização
e o desenvolvimento econômico. No momento da aprovação da lei, o
presidente era João Goulart, que tinha como bandeira política as refor-
mas de bases agrária e tributária que buscavam medidas para abran-
dar as desigualdades sociais no Brasil.
Quanto à LDB Lei n. 4.024/1961, ela já tinha sido pensada na
Constituição de 1934, no artigo 5º, que definia a elaboração de dire-
trizes nacionais da educação, e no artigo 150, que designava a fixa-
ção do plano nacional de educação. Em relação à sua filosofia, havia
a disputa entre dois grupos, estatistas e liberalistas, para definir a
base para escrever a LDB.

Quais eram as ideias desses grupos?

36 Transversalidade na Educação
Os estatistas, de partidos de esquerda, defendiam que o Estado ti-
nha responsabilidade pela educação. Sendo assim, a escola privada só
poderia existir como uma concessão do poder público.
Saiba mais
Os liberalistas, de partidos de centro e direita, defendiam os
direitos naturais do indivíduo, bem como que o Estado deveria res- Acesse o link a seguir para
poder ler o texto da LDB Lei
peitar e não impor normas sobre a educação. Desse modo, a liber-
n. 4.024/1961.
dade de escolha na educação era da família.
Disponível em:
Em boa parte do texto dessa lei, predominaram as ideias dos http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/leis/L4024.htm.
estatistas. Observe, a seguir, alguns pontos da lei, demonstrados
Acesso em: 6 abr. 2020.
também como comparação entre as ideias.

Quadro 1
Análise comparativa da Lei n. 4024/1961

Questões mais Questões menos


conservadoras conservadoras

Art. 1º. Domínio dos recursos científicos Art. 2º. Diversidade de métodos para
e tecnológicos como competências na o processo de ensino de acordo com
preparação do indivíduo para atuar na as especificidades de cada região ou
sociedade. grupo social; trata do aperfeiçoamento
da prática pedagógica por meio de
Art. 9º. Atribuições do Conselho Federal novas experiências.
de Educação sobre a incumbência dessa
área, indicando disciplinas obrigatórias Art. 22. Obrigatoriedade da educação
para o Ensino Médio e estabelecendo a física.
duração e o currículo mínimo dos cursos
do ensino superior. Art. 25. Referente à educação primária,
cuja finalidade é o desenvolvimento do
Art. 35. Refere-se ao ginasial e ao raciocínio, da expressão da criança e a
colegial, que deverão ter disciplinas sua integração nos meios físico e social.
e práticas educativas, obrigatórias e
optativas. Art. 97. Ensino religioso facultativo.

Art. 40. Descreve que os conselhos


Art. 38. Orientação para atividades
são responsáveis por organizar a
complementares de iniciação artística.
distribuição das disciplinas obrigatórias
e trata da prioridade do ensino da língua
portuguesa. Art. 39. Dispõe sobre as avaliações, que
devem ser realizadas durante o ano letivo.
Art. 38. Dá a orientação para a formação
moral e cívica. Art. 104. Trata da organização de
cursos e escolas experimentais, ou
Art. 39. Dispõe sobre as avaliações, que seja, com propostas pedagógicas
devem ser realizadas com provas e próprias, mas sua aprovação deveria ter
exames organizados pelo professor; nas autorização legal.
escolas particulares, os exames devem ter
fiscalização da autoridade competente.

Fonte: Elaborada pela autora com base no texto da Lei n. 4.024/1961.


Caminhos da transversalidade na educação 37
Como pode ser observado, a transversalidade não é apontada em
nenhum momento nessa lei. Podemos inferir, também, que existe um
leve direcionamento à busca de novos métodos, ao desenvolvimento
da expressão e da iniciação artística, aos currículos voltados para a di-
versidade de cada contexto e, ainda, a preocupação da integração do
estudante ao meio físico e social.

É relevante lembrar que essa lei foi usada tanto no final da Repú-
blica Populista como no período de ditadura militar; por isso, sabemos
que sua interpretação e sua execução consideram o contexto e as ideo-
logias de cada momento histórico.

2.2.2 Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei


n. 5692/1971
A partir de 1964, acontece um novo ciclo político no Brasil: a ditadu-
ra militar. Então, em 12 de setembro de 1969, é aprovado o Decreto-Lei
n. 869, que institui a obrigatoriedade de duas disciplinas no currículo:
Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política do Brasil. Essas
disciplinas tinham a finalidade de transmitir valores cívicos e morais em
conformidade com os valores governamentais da época.

Artigo

http://www.congressohistoriajatai.org/anais2014/Link%20(170).pdf

O artigo Disciplinar o país: formação política em livros de educação moral e


cívica, de Maria Regina dos Santos, trata dos materiais didáticos referente às
disciplinas de educação moral e cívica e organização social e política do Brasil.

Acesso em: 7 abr. 2020.

Em 11 de agosto de 1971, durante o governo do presidente Emilio


Garrastazu Médici, a Lei n. 5.692 é aprovada, estabelecendo diretrizes
para o ensino de primeiro e segundo graus, denominado, na lei ante-
rior, cursos primário, ginasial e colegial.

A finalidade dessa lei encontra-se definida no artigo 1º, que determi-


na que “o ensino de 1º e 2º grau tem por objetivo geral proporcionar ao
educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas poten-
cialidades como elemento de auto realização, qualificação para o traba-
lho e preparo para o exercício consciente da cidadania” (BRASIL, 1971).

38 Transversalidade na Educação
Outro ponto a ser destacado nessa lei diz respeito à organização
do currículo voltado à preparação do estudante para que ele atue
no mercado de trabalho. O artigo 4º afirma que “a preparação para
o trabalho, como elemento de formação integral do aluno, será obri-
gatória no ensino de 1º e 2º graus e constará dos planos curricula-
res dos estabelecimentos de ensino” (BRASIL, 1971). A preocupação
com uma educação mais técnica e profissionalizante foi acentuada
nessa reforma do ensino com a finalidade de preparar mão de obra
qualificada para o trabalho. Desse modo, educação deveria ser mais
prática, pautada no aprender fazendo.

Observe, a seguir, a figura que ilustra a organização do currículo nessa lei.

Figura 2
Organização do currículo

Faz a interseção Composta Língua


Comunicação
entre as pela disciplina: Portuguesa
e expressão
matérias
Geografia
Composta
Estudos
Composta pelas
Sociais História
por disciplinas:
matérias Organização
Educação Social e Política
Física Brasileira
Composta
Educação Matemática
Base Ciências pelas
Moral e Cívica
comum disciplinas:
Ciências
Educação
físicas e
Artística
biológicas
Programa
Currículo
de Saúde

Ensino
religioso

Parte Para atender às peculiaridades locais, aos planos dos


diversificada estabelecimentos de ensino e às diferenças individuais dos alunos
conforme as necessidades e as possibilidades concretas

Fonte: Elaborada pela autora com base na Lei n. 5.692/1971.

Destaca-se, na Figura 2, que a base comum é composta por três


matérias que representam uma grande área, e cada uma delas pos-

Caminhos da transversalidade na educação 39


sui disciplinas para a definição dos conteúdos a serem estudados.
Os Estudos Sociais, por terem uma característica mais humanística,
buscavam focar nas questões sociais. Assim, essa matéria fazia o
papel de integradora entre as demais, colocando o indivíduo como
centro do processo educativo. Essa característica é identificada no
Parecer n. 853/1971:
Com efeito, na medida em que se cogite de uma divisão do
conhecimento, e só nessa medida, os Estudos Sociais consti-
tuem um elo a ligar as Ciências e as diversas formas de Co-
municação e Expressão: têm uma abordagem mais científica
do que estas últimas, ao mesmo tempo em que para muitos
chegam a confundir-se com elas, e sobretudo colocam no
centro do processo a preocupação do Humano. [...] as maté-
rias, diretamente ou por seus conteúdos particulares, devem
conjugar-se entre si e com outras que se lhe acrescentem.
(BRASIL, 1972, p.75-76)

Identificamos, ainda, a palavra conjugar-se no sentido de que as


disciplinas, ou os conteúdos, devem se inter-relacionar e comple-
mentar, gerando um aspecto de interdisciplinaridade no processo
metodológico do ensino.
Os Estudos Sociais cujo objetivo é a integração espacio-temporal
e social do educando em âmbitos gradativamente mais amplos.
Os seus componentes básicos são a Geografia e a História, fo-
calizando-se na primeira a Terra e os fenômenos naturais refe-
ridos à experiência humana, e, na segunda, o desenrolar dessa
experiência através dos tempos. O fulcro do ensino, a começar
pelo “estudo do meio”, estará no aqui-e-agora do mundo em que
vivemos e, particularmente, do Brasil e do seu desenvolvimento.
(BRASIL, 1972, p. 80)

A transversalidade não é apontada diretamente, mas percebe-se a


intenção da interação entre os conteúdos das disciplinas para propor-
cionar uma aprendizagem mais global, situando o indivíduo no mundo.

2.2.3 Lei de Diretrizes e Bases da Educação,


Lei n. 9.394/1996
Essa Lei foi aprovada em 20 de dezembro de 1996, no período em
que Fernando Henrique Cardoso foi presidente no Brasil – momento
da Nova República com uma nova fase democrática no país.

40 Transversalidade na Educação
A Lei n. 9.394/1996, também conhecida Lei Darcy Ribeiro – em ho-
menagem ao educador político brasileiro que ajudou a elaborá-la –,
tem como pilar a Constituição Federal de 1988, que trouxe muitos
avanços aos direitos dos cidadãos brasileiros e, principalmente, à
educação. No capítulo da educação, a escolaridade é ampliada com
a incorporação da educação infantil e assegura o atendimento es-
pecializado para alunos com deficiência. Outro ponto importante é
que a educação, além de ser garantida como direito a todos, preci-
sa ser de qualidade (BRASIL, 1988).

A LDB de 1996 trouxe um novo olhar para educação, propon-


do algumas mudanças em relação às leis anteriores, com princí-
pios relacionados ao desenvolvimento integral do educando para
o exercício da cidadania, assim como prepará-lo para o trabalho
(BRASIL, 1996). O foco, nessa lei, é a construção dos conhecimentos
por meio da compreensão da cidadania, promovendo um modo
diferente de pensar a escola.

Alguns pontos importantes que a lei (BRASIL, 1996) aponta para o


processo educativo:
a. direcionamento para a liberdade de aprender;
b. compreensão da sociedade em sua multidimensionalidade;
c. valores humanos pautados na solidariedade e na tolerância
recíproca;
d. que o aprender vai além dos muros da escola, sendo desenvolvido
na família, na convivência, no trabalho, na sociedade e nas
manifestações culturais;
e. diversidade de ideias e de abordagens pedagógicas;
f. prática pedagógica que tenha a articulação com as famílias e a
comunidade;
g. disseminação de valores fundamentais ao interesse social, aos
direitos e deveres dos cidadãos, de respeito ao bem comum e à
ordem democrática.

Com relação ao currículo, essa lei aponta a necessidade de integra-


ção entre os conteúdos para a compreensão do todo, bem como de
estudá-los em suas especificidades. De maneira geral, ela traz infor-
mações relacionadas aos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia;
ao estudo da língua portuguesa e da matemática; ao conhecimento do

Caminhos da transversalidade na educação 41


mundo físico e natural e da realidade social e política; ao ensino da arte
e da educação física; ao ensino da história do Brasil com sua diversi-
dade cultural e étnico-racial; ao estudo das múltiplas linguagens: artes
visuais, dança, música e teatro; aos conteúdos referentes aos direitos
humanos e à prevenção de todas as formas de violência contra a crian-
ça e o adolescente; à educação alimentar e nutricional.

Essa lei aponta, também, a transversalidade na educação, na


qual “a integralização curricular poderá incluir, a critério dos sis-
temas de ensino, projetos e pesquisas envolvendo os temas trans-
versais de que trata o caput” (BRASIL, 1996, art. 26). Entende-se que
o processo de ensino e aprendizagem deve utilizar temas trans-
versais, apontando para a organização da prática pedagógica por
meio de um eixo unificador, com a finalidade de que as disciplinas
não trabalhem seus conteúdos de modo descontextualizado e pro-
movendo o rompimento das fronteiras disciplinares.

2.2.4 Parâmetros Curriculares Nacionais


Um ano após a promulgação da Lei n. 9.394/1996, são apresenta-
dos os Parâmetros Curriculares Nacionais, documento que auxilia na
elaboração do projeto pedagógico da escola e do plano curricular. Os
Parâmetros são compostos por 10 volumes, sendo eles:
•• Introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais;
•• Língua Portuguesa;
•• Matemática;
•• Ciências Naturais;
•• História e Geografia;
•• Arte;
•• Educação Física;
•• Apresentação dos Temas Transversais e Ética;
•• Meio Ambiente e Saúde;
•• Pluralidade Cultural e Orientação Sexual.

Os temas transversais estão organizados nos três últimos volumes;


aquele referente à Apresentação dos Temas Transversais e Ética traz toda
informação sobre como deve ser entendida a transversalidade na edu-
cação, apontando que as disciplinas são importantes, pois são compos-

42 Transversalidade na Educação
tas de conhecimento socialmente acumulado pela humanidade, mas
que sozinhas não conseguem trabalhar com o eixo estruturador da
educação escolar. Esse eixo foi definido, na Lei n. 9.394/1996, pela cida-
dania, tema que possibilita desenvolver, no indivíduo, as competências
essenciais a um cidadão atuante.

Os temas transversais foram acrescentados não como novas


disciplinas, mas enquanto um conjunto de assuntos que devem ser
transversalizados nos diferentes campos do conhecimento. São te-
mas que possibilitam uma aprendizagem significativa sobre e na
realidade, desenvolvendo um indivíduo preparado para interferir
nela, transformando-a.

A transversalidade incita para a superação da prática pedagógica


cartesiana, volta-se a ações didáticas que desenvolvam integralmente
os alunos para o exercício da cidadania. A fragmentação e a disciplina-
ridade devem ser substituídas pela interação; assim, a relação entre os
temas transversais e as áreas deve possibilitar uma aprendizagem que
agregue sentido, superando o aprender apenas pela necessidade esco-
lar. Sendo assim, “os temas passam a ser partes integrantes das áreas e
não externos e/ou acoplados a elas, definindo uma perspectiva para o
trabalho educativo que se faz a partir delas” (BRASIL, 1997, p. 32).

De maneira geral, como são caracterizados os temas transversais


definidos nos PCNs?

Na área da Ética, busca-se trabalhar com o respeito mútuo, a justiça,


o diálogo e a solidariedade, conteúdos que conduzem às reflexões sobre
as condutas humanas no sentido de pensar como agir com o outro.

O tema transversal Meio Ambiente busca a compreensão de que


o ser humano e a Terra estão interligados e são interdependentes,
logo é importante estudar os ciclos da natureza, a sociedade, as re-
lações socioeconômicas e o meio ambiente, o manejo, o equilíbrio e
a conservação ambiental.

Na Saúde, o foco são as questões sobre autocuidado, vida co-


letiva e formação dos cidadãos para uma vida saudável, visando
à transformação dos estudantes em protagonistas capacitados a
valorizar a saúde e a vida saudável.

Na área da Pluralidade Cultural, busca-se aprender a viver de-


mocraticamente em uma sociedade plural, portanto é necessário

Caminhos da transversalidade na educação 43


respeitar a diversidade e entender a questão etnocultural dos gru-
pos e das pessoas que a constituem.

A Orientação Sexual foi organizada de modo que se possa discutir, re-


fletir e pensar sobre questões relacionadas à sexualidade, incluindo pos-
turas, crenças, tabus e valores a ela associados. Três eixos foram definidos
Atenção para nortear a intervenção do professor: Corpo Humano; Relações de Gê-
A interdisciplinaridade, nero; e Prevenção às Doenças Sexualmente Transmissíveis/AIDS.
que já tinha surgido na Lei
Por fim, os Temas Locais estão diretamente vinculados à realidade de
n. 5.692/1971, foi intensificada
na Lei n. 9.394/1996 e definida cada escola, pois é previsível que determinadas questões ganhem rele-
como base epistemológica na vância em uma determinada região e, assim, precisem ser trabalhadas.
educação para se trabalharem os
Temas Transversais nos PCNs. Mas como se dá a aplicação dos temas transversais na realidade?
Como é organizada a prática pedagógica?

As orientações didáticas dos PCNs apontam que a organização dos


conteúdos utilizando projetos proporciona a articulação de contribui-
Glossário
ções de diversos campos de conhecimento. O trabalho com projetos
Epistemológica: crenças, incentiva a visão epistemológica interdisciplinar do conhecimento,
valores, concepções e conheci-
mentos sobre um objeto. possibilitando a compreensão de um tema ou problema sob diversas
áreas, rompendo, dessa forma, com a disciplinaridade.

Figura 3
Representação da transversalidade e interdisciplinaridade

Temas Transversais

Língua
Portuguesa Plu
ral
Língua
ida
Matemática
Estrangeira
de
Cu
ca

ltu
Éti

ral

Educação Interdisciplinaridade Ciências


Física Naturais
Me

e
io

úd
Am

História
Sa

Arte
bie
nte

Geografia

Orientação Sexual

Fonte: Elaborada pela autora.

44 Transversalidade na Educação
A Figura 3 ilustra que o tema transversal envolve todas as disciplinas
curriculares e mostra como a interdisciplinaridade tem o papel de fazer
a interação entre as disciplinas de modo que possam ser trabalhados
os conteúdos e os temas transversais.

Para colocar na prática toda essa teoria, retiramos dos PCNs um


exemplo que demonstrará a transversalidade e a interdisciplinaridade.
Para se saber o que é saúde e como esta se preserva, é preciso ter
alguns conhecimentos sobre o corpo humano, matéria da área de
Ciências. É também preciso ter conhecimentos sobre Meio Am-
biente, uma vez que a saúde das pessoas depende da qualidade
do meio em que vivem. Conhecimentos de Língua Portuguesa e
Matemática também comparecem: questões de saúde são temas
de debates na imprensa, informações importantes são veicula-
das por meio de folhetos; a leitura e a compreensão de tabelas
e dados estatísticos são essenciais na percepção da situação da
saúde pública. Portanto, o tema Saúde tem como especificidade o
fato de, além de conhecimentos inerentes a ele, nele convergirem
conhecimentos de áreas distintas. (BRASIL, 1997, p. 30)

Figura 4
Ilustração do exemplo do tema Saúde
qvist/Shutterstock

Questões de A leitura e a
saúde são temas compreensão
de debates na de tabelas e dados
imprensa, informações estatísticos são essenciais
importantes são veiculadas na percepção da situação
por meio de folhetos: da saúde pública:
conhecimentos de conhecimentos da
Língua Portuguesa. Matemática também
Qualidade do
comparecem.
meio em que vive:
conhecimentos sobre
Meio Ambiente.

Corpo humano:
anttoniart/Shutterstock
matéria da área de TaLaNoVa/Shutterstock
Ciências.

Man As Thep/Shutterstock

Fonte: Elaborada pela autora.

Caminhos da transversalidade na educação 45


Trabalhar com a transversalidade e a interdisciplinaridade exige
que o professor domine sua disciplina. Além disso, com sua autonomia,
deve selecionar as temáticas e integrá-las ao seu planejamento de ma-
neira sistemática e continua, buscando o aprofundamento dos temas.
Nos PCNs, a proposta de transversalidade leva o docente a pensar e
propor uma prática pedagógica voltada para a educação de valores e o
desenvolvimento da cidadania.

2.3 BNCC e os temas contemporâneos


transversais (TCTs)
Vídeo
Analisando as finalidades definidas na Constituição, nas LDBs
e nos PCNs, identificamos que a educação tem se voltado para a
liberdade, a solidariedade e a cidadania como princípios-guias do
processo educativo.

Figura 5
Nuvem de palavras referentes às finalidades da educação de acordo com as legislações
nacionais brasileiras

Fonte: Elaborada pela autora.

Essa nuvem de palavras elaborada com base nos textos das legis-
lações anteriormente citadas permite identificar que o conjunto dos
vocábulos aponta para questões sociais, princípios que têm orientado
o currículo escolar ao longo dos anos.

Os Temas Transversais, como já vimos, tiveram sua primeira in-


serção de maneira indireta na Lei n. 5.692/1971, portanto não é uma

46 Transversalidade na Educação
proposta pedagógica inédita, mas, com a homologação da BNCC em
dezembro de 2017 para a Educação Infantil e o Ensino Fundamental –
complementada em dezembro de 2018 para o Ensino Médio –, trouxe
uma nova abordagem para esse tema, alinhando-se aos desafios do
mundo moderno por meio dos TCTs.

Assim como nos Temas Transversais dos PCNs, os TCTs tiveram


uma preocupação em relação à maneira como esses temas deveriam
ser incorporados no currículo escolar, uma vez que o foco foi direcio-
nado à formação do cidadão, preparando-o para a “construção de uma
sociedade mais justa, igualitária e ética” (BRASIL, 2018, p. 3).

Dessa forma, o que se ensina e se aprende na escola deve estar


diretamente ligado à realidade vivida; os conteúdos devem ir além do
que cada disciplina propõe e é necessário que eles possam contribuir
para o desenvolvimento do indivíduo crítico, habilitando-o a transfor-
mar a realidade. Essa ideia, que é reforçada por Morin (2008, p. 65), ao
afirmar que “a educação deve contribuir para a autoformatação da pes-
soa (ensinar a assumir a condição humana, ensinar a viver) e ensinar
como se tornar cidadão. Um cidadão é definido, em uma democracia,
por sua solidariedade e responsabilidade em relação a sua pátria”.

O paradigma cartesiano trouxe muitas contribuições, mas sua base


científica – fundamentada na fragmentação, na visão linear, na simpli-
ficação, na decomposição para que as coisas fossem explicadas rigo-
rosamente – possibilitou o surgimento de leis, princípios e conceitos a
serem seguidos e reproduzidos, fazendo surgir a racionalização e, con-
sequentemente, a separação entre razão e emoção, entre o científico
e o empírico, e assim por diante. Essa visão orientou a educação insti-
tuindo a fragmentação das áreas para serem estudas, o que formatou
disciplinas e seus conteúdos, bem como o distanciamento entre elas.

Com a evolução do mundo, essa organização não consegue mais


resolver os problemas que são locais e globais. É fundamental, então,
romper com esse paradigma e buscar um processo pedagógico que
religue o que está fragmentado, que possibilite “aprender a pensar a
partir de outra lógica, aprender a perceber e a sentir a partir do que
acontece em outros níveis de realidade, aprender a dialogar com as
emergências” (MORAES, 2012, p. 77). Assim, faz-se necessário dialogar
com os diversos tipos de pensamentos, identificando que existe uma
heterogeneidade de ideias, conceitos e conhecimentos.

Caminhos da transversalidade na educação 47


Por meio dessa explanação, é possível entender a finalidade dos
TCTs, que foram desenvolvidos para fazer a religação entre os dife-
rentes componentes curriculares, bem como possibilitar a contextua-
lização dos diversos conteúdos. Uma das palavras-chave dos TCTs é
a contextualização, a possibilidade de se trabalhar o conteúdo de
maneira integrada e colocar o estudante como protagonista, utilizan-
do também suas experiências no processo de aprendizagem e prepa-
rando-o para que ele atue na sociedade em que vive e seja cidadão
planetário.

Outro termo destacado é a contemporaneidade. Como com os


temas transversais da BNCC busca-se superar o ensino de conteú-
dos descontextualizados, a intenção é possibilitar que o estudante
aprenda para a vida, o que significa entender, por exemplo, “como
utilizar seu dinheiro, como cuidar de sua saúde, como usar as no-
vas tecnologias digitais, como cuidar do planeta em que vive, como
entender e respeitar aqueles que são diferentes e quais são seus
direitos e deveres” (BRASIL, 2018, p. 7). Podemos relacionar esse
pensamento com as ideias de Morin (2008, p. 76) quando nos alerta
para percebermos que “precisamos doravante aprender a ser, vi-
ver, dividir e comunicar como humanos do planeta Terra, não mais
somente pertencer a uma cultura, mas também ser terrenos”.

Para que tudo isso aconteça, é necessária a transversalidade,


isto é, utilizar temas e assuntos que não são conteúdos específicos
de nenhuma área/disciplina, mas que perpassam todas elas por fa-
zerem parte de conhecimentos fundamentais ao desenvolvimento
integral do estudante.

O texto do Parecer n. 7, de 7 de abril de 2010 (BRASIL, 2010, p. 24),


do Conselho Nacional de Educação (CNE), possibilita que se amplie o
conceito de transversalidade com algumas ideias:
•• Aprender conhecimentos teoricamente sistematizados (aprender
sobre a realidade) e questões da vida real (aprender na realidade
e da realidade).
•• Proposta didática que proporcione o tratamento dos conheci-
mentos escolares de maneira integrada.
•• Os sujeitos são agentes da arte de problematizar e interrogar e bus-
cam procedimentos interdisciplinares capazes de acender a chama
do diálogo entre diferentes sujeitos, ciências, saberes e temas.

48 Transversalidade na Educação
Entre os PCNs (1997) e os TCTs da BNCC (2017), temos resoluções
que estabeleceram orientações para alguns temas contemporâneos,
como mostra o quadro a seguir.

Quadro 2
Resumo das resoluções voltadas para os Temas Contemporâneos

Documento Descrição Pontos relacionados com os TCTs


Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Educação das Relações Étnico-Raciais
Resolução n. 4, de 13 de julho
São normas obrigatórias para a Edu- e para o Ensino de História e Cultura
de 2010
cação Básica que orientam o plane- ­Afro-Brasileira e Africana.
Diretrizes Curriculares Nacio-
jamento curricular das escolas e dos Diretrizes Nacionais para a Educação em
nais Gerais (DCNs) para a Edu-
sistemas de ensino. Direitos Humanos.
cação Básica
Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação Ambiental.
Resolução CNE/CP n. 1/2004 Normas para promover a educação
Diretrizes Curriculares Nacio- de cidadãos atuantes e conscientes Esse parecer busca mostrar para a escola a
nais para a Educação das Re- no seio da sociedade multicultural e importância de se trabalhar com a educa-
lações Étnico-Raciais e para o pluriétnica do Brasil, buscando rela- ção das relações étnico-raciais e identidade
Ensino de História e Cultura ções étnico-sociais positivas rumo à negra
Afro-Brasileira e Africana construção de nação democrática.

O objetivo central é ensinar e aprender


Resolução CNE/CP n. 1/2012 Documento estruturado em um ca- para a vida e para a convivência, exercen-
Diretrizes Nacionais para a Edu- derno que busca divulgar e difundir a do os Direitos Humanos tanto na realidade
cação em Direitos Humanos educação em direitos humanos. em que o indivíduo vive como de maneira
global.
Documento que define princípios e
Resolução CNE/CP n. 2/2012 objetivos da educação ambiental e Como marco legal, a Educação Ambiental
Diretrizes Curriculares Nacio- orienta para a inserção no currículo foi instituída em todos os níveis e modali-
nais para a Educação Ambiental escolar, bem como na formação de dades de ensino.
professores.

Fonte: Elaborado pela autora com base na BNCC (Brasil, 2017).

Observamos que os temas educação das relações étnico-raciais,


identidade negra, direitos humanos e educação ambiental tiveram
marcos legais para que fossem incorporadas ao currículo escolar.
Dessa forma, com a homologação da BNCC em 2017, temas que
conduzam à reflexão sobre assuntos de cunho social e relaciona-
das com cidadania foram denominados, nesse documento, Temas
Contemporâneos Transversais:
Assim como as escolas, em suas respectivas esferas de au-
tonomia e competência, incorporar aos currículos e às
propostas pedagógicas a abordagem de temas contempo-
râneos que afetam a vida humana em escala local, regional e

Caminhos da transversalidade na educação 49


global, preferencialmente de forma transversal e integrado-
ra. (­B RASIL, 2017, p. 19, grifos do original)

Esses temas foram organizados em seis macroáreas temáticas, e


para cada uma delas foram definidos temas contemporâneos:
•• Cidadania e civismo

•• Vida familiar e social


•• Educação para o trânsito
•• Educação para os direitos humanos
•• Direito da criança e do adolescente
•• Processo de envelhecimento, respeito e valorização ao idoso
•• Ciência e tecnologia

•• Ciência e tecnologia
•• Economia

•• Trabalho
•• Educação financeira
•• Educação fiscal
•• Meio ambiente

•• Educação ambiental
•• Educação para o consumo
•• Multiculturalismo e saúde

•• Diversidade cultural
•• Educação para a valorização do multiculturalismo nas matrizes
históricas e culturais brasileiras
•• Saúde

•• Saúde
•• Educação alimentar e nutricional
É importante ressaltar as mudanças entre os PCNs (1997) e os TCTs
da BNCC (2017):

BNCC: Temas Contemporâneos Transversais


PCNS (1997)
(2017)
Temas Transversais Temas Contemporâneos Transversais
Seis temáticas Seis macroáreas temáticas e mais 15 temas
Recomendação facultativa Obrigatoriedade
Interdisciplinar Intra, inter e transdisciplinar

50 Transversalidade na Educação
A escola tem autonomia para trabalhar com os TCTs, e muitos
são os caminhos metodológicos que podem orientar a prática pe-
dagógica do professor, pois eles devem ser vistos como eixos inte-
gradores que darão mais significado aos conteúdos disciplinares. O
documento chama atenção para:
a orientação de que os TCTs não devem ser trabalhados em blo-
cos rígidos, em estruturas fechadas de áreas de conhecimento,
mas, sim, que eles sejam desenvolvidos de um modo contextua-
lizado e transversalmente, por meio de uma abordagem intradis-
ciplinar, interdisciplinar ou transdisciplinar (preferencialmente).
(BRASIL, 2017, p. 19)

A intenção com os TCTs é incitar possibilitar uma educação voltada para


a construção da cidadania e da participação ativa da vida em sociedade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este capítulo permitiu compreender que a concepção de transversa-
lidade e a forma como ela é aplicada na educação têm se modificado ao
longo do tempo para superar o paradigma tradicional, que conduz para
a disciplinaridade no processo educativo, descontextualizando os conteú-
dos e promovendo o distanciamento social.
A transversalidade vai além de ser uma ponte entre o conhecimen-
to científico acadêmico e o senso comum; ela é uma maneira de ajudar
a compreender e conectar as realidades natural e social e os interesses
dos alunos, uma vez que os Temas Transversais no currículo escolar pro-
porcionam o entendimento da realidade e a instrumentalização dos estu-
dantes para que eles estejam aptos a enfrentar e resolver os problemas
emergentes da contemporaneidade.
Uma breve retrospectiva histórica sobre a legislação nacional brasileira
permitiu identificar que a transversalidade é um tema que tem mais de 50
anos e que, ainda hoje, busca-se adaptar essa ideia ao processo educativo
na Educação Básica.
Os temas transversais possibilitam o desenvolvimento integral do
estudante, buscando conectar a escola com a vida, em uma educação
pautada por valores e com o fomento de um espírito crítico para en-
tender a sociedade, bem como possibilitando analisar e solucionar os
problemas locais e globais. A interdisciplinaridade e a transdisciplina-
ridade ajudam a formar o tripé do processo educativo como maneiras
de estabelecer relações e interações entre as diversas disciplinas, su-
perando a fragmentação do conhecimento.

Caminhos da transversalidade na educação 51


ATIVIDADES
1. Após compreender o que é transversalidade, o desafio é criar algo
visual (imagem, ícone, desenho, infográfico etc.) que represente seu
entendimento sobre esse tema. Então use sua criatividade e represente
seu conceito do que é transversalidade ou Temas Transversais.
Importante: sua criação deve ser autoexplicativa.

2. Escolha um Tema Transversal dos PCNs e proponha uma atividade para


os alunos. Para realizar a atividade, preencha todos os itens a seguir:

Tema Transversal:
Nível:
Ano:
Disciplina:
Conteúdo da disciplina:
Explique a relação do tema transversal escolhido com o conteúdo
da disciplina:
Descrição da atividade:

3. Faça uma pesquisa para buscar conceitos para as palavras:


Contextualização, Cidadania e Transversalidade. Além disso, você
deve usar três tipos de fontes diferentes, podendo ser: livro, artigo
científico (Google Acadêmico), dissertações, teses, sites confiáveis,
blogues de autores conhecidos nacionalmente. Por fim, elabore
uma tabela de acordo com o modelo a seguir.

Contextualização Cidadania Transversalidade

Citação

Escreva com suas palavras


o que você entendeu da
citação

Referência

52 Transversalidade na Educação
REFERÊNCIAS
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em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=79611-
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BRASIL. Resolução n. 8, de 1º de dezembro de 1971. Rev. Bras. Enferm., Brasília , v. 25,
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YUS, R. Temas transversais: em busca de uma nova escola. Porto Alegre: Artmed, 1998.

Caminhos da transversalidade na educação 53


3
Transversalidade:
metodologia de trabalho
Sabemos que vivemos em um mundo incerto – sujeito a impre-
vistos e com necessidades de transcendência – no qual os seres
humanos ainda estão começando a aprender sobre como enfren-
tar esses desafios.
Como percebemos, os problemas educacionais não estão se-
parados dos problemas emergentes do mundo contemporâneo.
Assim, identificamos que os alunos estão mais interconectados, ex-
postos às redes sociais e acompanhando todo o desenvolvimento
científico-tecnológico que vem ocorrendo. Não podemos ser omis-
sos em relação às questões de globalização e mundialização, as
quais estão alterando, entre outras coisas, a maneira de se cons-
truir e de se relacionar com os conhecimentos.
Diante desses fatos, faz-se necessário: repensar o processo
educativo, pois a crise paradigmática afeta a maneira de pensar e
fazer a educação; construir novas estruturas de pensamento, por-
que uma inteligência cega estimula a disjunção e a reprodução; e
desenvolver um pensamento capaz de religar e de experimentar
novas maneiras de conhecer e de integrar os diferentes saberes,
de trabalhar com as incertezas e de valorizar a lógica do sensível, a
intuição e a imaginação.
Neste capítulo, fazemos um convite para que você conheça so-
bre alguns princípios essenciais que auxiliam a superar a educação
pautada no paradigma newtoniano-cartesiano, para isso tratare-
mos da interdisciplinaridade, da transdisciplinaridade e da sua apli-
cação prática, revisitando orientações do documento dos Temas
Contemporâneos Transversais na BNCC (BRASIL, 2019).

54 Transversalidade na Educação
3.1 A interdisciplinaridade
Vídeo Abordaremos esse tema fazendo, primeiramente, uma análise.
Para isso, leia a atividade proposta para os alunos do oitavo ano do
Ensino Fundamental:

O surto ocorre quando acontece um aumento inesperado do número de casos de


determinada doença em uma região específica.
A pandemia é definida quando uma doença se estende a vários países e continentes.
Entendendo essas diferenças, faça uma análise comparativa relacionada às mudan-
ças que ocorrem no nível local e mundial.

Como podemos perceber, os alunos e o professor terão muito o


que estudar. Porém, se o desafio for estudado por alguma disciplina
específica, dentro da abordagem tradicional da educação, os estu-
dos estarão reduzidos à área de conhecimento da matéria e serão
trabalhados de maneira objetiva. Isso significa que o professor irá
ministrar suas aulas com a finalidade de passar dados, informações,
conceitos e princípios, para que os alunos estudem e possam resol-
ver a atividade, reproduzindo os conteúdos.

Nessa visão educacional, a disciplinaridade leva a Saiba mais


estudar especificamente sua área, fundamentada na Dedutivo: a razão leva ao
transmissão de conhecimentos resultantes de sabe- conhecimento, sendo assim, ela
res provenientes do passado. parte da generalização para o
particular;
O conservadorismo é bastante acentuado, uma Indutivo: o conhecimento pro-
vez que as metodologias valorizadas são aquelas vém da experimentação, dessa
maneira, ele parte do particular
baseadas na razão e ou na experimentação, sen- para a generalização;
do utilizado o raciocínio dedutivo, indutivo e/ou o Hipotético-dedutivo: a lógica
hipotético-dedutivo. mais a experimentação levam
ao conhecimento, assim, com
É a lógica clássica que trabalha com apenas um base em hipóteses formula-
nível de realidade, isto é, identificando apenas dois das, deduz-se a solução de
problemas.
valores contrastantes, o falso e o verdadeiro, o certo
e o errado. Estuda-se os conteúdos em uma sequên-
cia lógica, linear, fragmentada, instituindo fronteiras disciplinares que
não são ultrapassadas, para que o conteúdo ou o tema em estudo não
entre em outra área/disciplina.

Transversalidade: metodologia de trabalho 55


Mas se a aula está sendo realizada por um professor que tem uma
visão educacional mais crítica, progressista e de perspectiva sistêmica, a
condução do processo de ensino e aprendizagem toma outro caminho.

Mesmo que de uma disciplina específica, esse professor, prova-


velmente, conduzirá os alunos a pensar na multidimensionalidade
da atividade, sendo assim, eles poderão analisar questões da saúde,
mas também da política e da economia, revisitar a história, identi-
ficar questões geográficas, pensar nos pontos filosóficos, culturais,
utilizar o raciocínio lógico matemático para pensar questões relacio-
nadas com dados quantitativos, enfim, um leque de áreas necessá-
rias para resolver a atividade.

Talvez o professor trabalhe com seus alunos revisitando outras


áreas ou possa trabalhar colaborativamente com outros docentes. Essa
visão educacional rompe com a disciplinaridade, modelo do paradigma
da racionalidade técnica, que delimita o conhecimento à autoridade de
uma área específica.

Podemos identificar, nessa prática pedagógica, o movimento da in-


terdisciplinaridade, que possibilita a articulação dos saberes entre as
diferentes áreas, tornando mais flexíveis as fronteiras disciplinares.

3.1.1 Marcos históricos da educação


Agora, vamos abordar alguns marcos históricos para entender o
percurso da interdisciplinaridade.

Iniciamos com o filósofo francês Georges Gusdorf que, em 1953,


escreveu o livro La parole, considerado uma obra importante para
entender a interdisciplinaridade. Na década de 1960, ele elaborou
um projeto, este tinha como estudo a pesquisa interdisciplinar nas
ciências humanas, buscando respostas para a renovação paradig-
mática fundamentada na fragmentação e no reducionismo, pro-
posta que foi apresentada à Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Ainda na década de 1960, começaram a ocorrer alguns movimen-


tos estudantis na França, questionando a organização do ensino em
torno de disciplinas científicas, fechadas em seus próprios territórios e
estruturadas com saberes incomunicáveis, guiados por éticas e regras

56 Transversalidade na Educação
próprias. Exatamente em 1968, em Paris, os estudantes universitários
fizeram protestos demandando reformas no setor educacional, con-
centradas, principalmente, em cursos nos quais os docentes eram con-
servadores ou reacionários, conforme estudo de Thiollent (1998, p. 72),
que assim descreveu:
era necessário superar qualquer didática centrada na transmis-
são de um conhecimento preestabelecido. Nas universidades,
o curso magistral e o ensino centrado na leitura apareceram
como métodos de transmissão oral ou livresca, insuficientes
para desencadear uma verdadeira comunicação pedagógica.
[...] Além disso, houve, naquela época, um movimento favorável
a uma pedagogia de abertura ao mundo exterior. Tratava-se de
sair da sala de aula para mostrar as situações no mundo real,
os ghettos, por exemplo.

Outra referência sobre a interdisciplinaridade é o parecer do Centro


para a Pesquisa e Inovação do Ensino (CERI), filiado à Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que buscou escla-
recer a questão terminológica criando quatro níveis: multidisciplinar,
pluridisciplinar, interdisciplinar e transdisciplinar.

O Seminário sobre pluridisciplinaridade e interdisciplinaridade nas


universidades, também conhecido como Congresso de Nice, promovi-
do em 1970, na França, teve a participação de 21 pesquisadores es-
pecialistas de várias nacionalidades e membros da OCDE, como Heinz
Heckhausen, Jean Piaget, Erich Jantsch, Marcel Boisot, Georges Gusdorf,
Andre Lichnerowicz, Asa Briggs, Leo Apostel. Esse evento não possibi-
litou a delimitação de um único consenso sobre as terminologias, mas
os desdobramentos permitiram a continuidade de pesquisas na busca
de esclarecer as bases do diálogo entre as disciplinas científicas.

Evidenciamos, aqui, a percepção de Piaget, que afirmou ser fundamen-


tal ir além das fronteiras disciplinares, das interações ou reciprocidades,
buscando um estágio superior. Dessa maneira, a interdisciplinaridade,
para ele, seria um caminho para chegar à transdisciplinaridade.

Destacamos, também, a coletânea organizada por Leo Apostel,


em 1983, denominada de Interdisciplinariedad y ciencias humanas.
Tendo como editora a Unesco, contou com a participação de gran-
des pesquisadores, como Edgar Morin, Jean-Marie Benoist, Juan
Uitz, Massimo Piattelli-Palmarini, Mikel Dufrenne, Stanislav Niko-
laevich Smirnov e Wolfgang H. Mommsen. No material em questão,

Transversalidade: metodologia de trabalho 57


são apresentadas discussões sobre a interdisciplinaridade e a sua
relação com as ciências humanas.

Muitos foram os eventos e produções textuais feitos, a partir da


década de 1960, para propor uma nova forma de conhecimento, que
pudesse dar conta dos problemas complexos cada vez mais presentes
na sociedade contemporânea. Buscou-se debates a respeito da inter-
disciplinaridade na tentativa de compreender o seu papel no processo
educativo, levando a identificar que ela “apresenta inúmeras facetas
que necessitam ser exploradas para que os sentidos atribuídos a ele
possam ser compreendidos” (FURLANETTO, 2011, p.58-59).

No Brasil, temos alguns pesquisadores pioneiros que se dedicaram a


estudar a interdisciplinaridade, entre eles, destacam-se Hilton Japiassu
e Ivani Fazenda. Japiassu, em 1976, escreveu o livro Interdisciplinaridade
e patologia do saber, apresentando os principais problemas e dificulda-
des relacionados às conceituações e metodologias interdisciplinares. Já
Fazenda estudou a interdisciplinaridade por sua pesquisa de mestrado,
em 1970, momento em que também acontecia, no Brasil, a reforma
educacional. Essa autora é muito importante nacionalmente, pois rea-
lizou estudos e escreveu obras fundamentais para a compreensão da
interdisciplinaridade e da didática.

Elaboramos o quadro a seguir para podermos observar a exis-


tência da diversidade de terminologias utilizadas para apresentar
as relações entre as disciplinas.

Quadro 1
Diferentes terminologias da interdisciplinaridade

G. Michaud H. Heckhausen M. Boisot E. Jantsch


Disciplinaridade Disciplinaridade
Multidisciplinaridade Multidisciplinaridade
Interdisciplinaridade
Interdisciplinaridade
heterogênea Pluridisciplinaridade
restritiva
Pseudo-interdisciplinaridade
Interdisciplinaridade linear; Interdisciplinaridade auxiliar; Interdisciplinaridade
Interdisciplinaridade
cruzada; auxiliar estrutural complementar; unificadora linear; estrutural
Transdisciplinaridade Transdisciplinaridade

Fonte: Elaborado com base em Japiassu, 1976, p. 78.

58 Transversalidade na Educação
Com base nesse quadro e no que vimos nessa seção, podemos in-
ferir que não existe um conceito único para as relações disciplinares.

3.1.2 Terminologias
Como observamos, dos autores selecionados (Quadro 1), muitas são
as terminologias criadas, pois as pesquisas realizadas em contextos e
tempos diferenciados produzem compreensões diversas. Vamos expli-
car, agora, um pouco sobre essas terminologias.

A disciplinaridade é como se estabelece e se organiza uma área do


conhecimento, que é dividida em disciplinas, as quais contêm suas es-
pecificidades quanto ao conteúdo e à metodologia para que possam ser
estudadas. Podemos notar que a disciplina é muito importante, pois ela
possibilita a especialização do conhecimento de uma área, porém, sozi-
nha, ela não consegue resolver os problemas, que são complexos e preci-
sam de uma visão multidimensional e multirreferencial do conhecimento.

Figura 1
Representação da disciplinaridade

Disciplina B Disciplina A

Disciplina C Disciplina D

Fonte: Elaborada pela autora.

A multidisciplinaridade se define quando um tema, ou assunto,


pode ser simultaneamente estudado por várias disciplinas, ou seja, são
recortes específicos e de maneira hierarquizada. Aqui não irá ocorrer
nenhum tipo de interferência entre as áreas, usa-se apenas o conhe-
cimento de cada uma para explicar o que está sendo trabalhado, não
ocorrendo nenhuma contribuição, alteração, reorganização e/ou am-
pliação das áreas envolvidas.

Transversalidade: metodologia de trabalho 59


Figura 2
Representação da multidisciplinaridade

Disciplina B
pode ser
Tema
complementado
Conteúdo referente a Disciplina A Disciplina C
com fragmentos
Assunto
de estudos na
Disciplina D

Fonte: Elaborada pela autora.

Um exemplo prático de multidisciplinaridade é, na disciplina de His-


tória, estudar o tema os antigos habitantes do Brasil. Para a explicação,
o professor poderá usar: a Geografia para situar os habitantes nas di-
ferentes regiões brasileiras; a Matemática para trabalhar as questões
quantitativas, mostrando porcentagem e quantidade de pessoas em
cada região ou por etnia; a Arte, apresentando obras que represen-
tem os habitantes mais antigos; a Literatura para ilustrar com textos
ou obras que abordem o tema, entre outras. Como podemos notar, na
multidisciplinaridade, as disciplinas são usadas para complementar um
item do tema/conteúdo, como nesse exemplo da disciplina de História.

Já na pluridisciplinaridade, ocorre algum tipo de cooperação entre


as disciplinas, isto é, o estudo de um tema, conteúdo ou assunto é ana-
lisado pelo ângulo de cada disciplina ao mesmo tempo, de maneira
complementar ou intuitiva. Nessa concepção, o conhecimento ainda é
fragmentado e a contribuição não chega ao nível de fusão.

Figura 3
Representação da pluridisciplinaridade
Disciplina B

Tema que
é analisado pelo
Conteúdo referente a Disciplina A Disciplina C complementam
ângulo da o estudo
Assunto

Disciplina D

Fonte: Elaborada pela autora.

Usando o mesmo exemplo (a disciplina de História, com o tema os


antigos habitantes do Brasil) a prática na pluridisciplinaridade teria uma
pequena alteração. A primeira pergunta que o professor faria seria

60 Transversalidade na Educação
quais disciplinas podem auxiliar a compreender melhor esse tema e
os conteúdos que o envolvem. Sendo assim, nem todas as disciplinas
poderão ser usadas, mas somente aquelas que realmente complemen-
tam os objetivos do ensino do tema em questão. Se fizermos um recor-
te, observaremos que um dos povos habitantes antigos do Brasil são
os indígenas, desse modo, a Geografia poderia ser usada no sentido de
mostrar a localização das tribos, para que se possa compreender as di-
ferenças culturais de cada uma, outra disciplina que complementaria a
História e a Geografia seria a Ciência, evidenciando que cada tribo tem
seu modo de vida, de acordo com a natureza que a envolve.

Identificamos que, tanto na multi como na pluridisciplinaridade, a


clausura disciplinar ainda é mantida, a ação didática é estruturada no
pensamento unidimensional e no fracionamento do estudo.

Já na interdisciplinaridade ocorre a interação entre duas ou mais


disciplinas. Ela se refere à transferência de procedimentos de uma dis-
ciplina para outra, estabelecendo vínculos, com o objetivo de produzir
um conhecimento mais amplo, diverso e unificado. Segundo Nicolescu
(1999), ela pode ser trabalhada em três níveis:
a. Grau de aplicação, isto é, os métodos de uma disciplina podem
ser usados ou transferidos para outra disciplina, possibilitando que
esta desenvolva algo novo ou solucione problemas específicos.

Figura 4
Exemplo de interdisciplinaridade no grau de aplicação

levam

ao aparecimento
Os métodos da de novos
para a medicina
física nuclear tratamentos para
o câncer.
transferidos

Fonte: Elaborada pela autora com base em Nicolescu, 1999, p. 45.

Ainda com o exemplo da disciplina de História com o tema os antigos


habitantes do Brasil, a postura do professor seria emprestar estraté-
gias ou metodologias de outras áreas para auxiliar na compreensão do
estudo. Sendo assim, o professor de História poderia se apropriar de
alguns princípios da Matemática, da Ciência e da Geografia para enten-

Transversalidade: metodologia de trabalho 61


der o porquê de os indígenas serem nossos primeiros habitantes. Isso
levaria o professor a compreender e ensinar o conteúdo não apenas
pelo olhar histórico, mas, principalmente, sob outros aspectos mais
globais e integrados.

b. Grau epistemológico é quando uma disciplina consegue produzir


novas análises, fazer a elaboração, a construção e a interpretação
do conhecimento na sua área por meio da apropriação ou
empréstimo relacionado à sua maneira de pensar/construir seu
conhecimento de outra(s) disciplina(s).

Figura 5
Exemplo de interdisciplinaridade no grau epistemológico

produzem
análises
Os métodos da para o campo interessantes na
lógica formal do direito epistemologia do
direito.
transferidos

Fonte: Elaborada pela autora com base em Nicolescu, 1999, p. 45.

Novamente, retomaremos o mesmo exemplo, especificamente


sobre os povos indígenas. Se o professor emprestar, da Filosofia, os
conhecimentos da base do racionalismo, ele irá produzir análises, es-
tudando o tema no sentido de ter um olhar voltado apenas para as
questões da razão, eliminando as sensações e os sentimentos. Dessa
maneira, só valeriam os conhecimentos, sobre o tema estudado, que
fossem comprovados.

c. Grau de geração de novas disciplinas é quando métodos,


conhecimentos e pressupostos, de duas ou mais disciplinas, são
imbicados dando possibilidade de criação de uma disciplina ainda
não existente. Esse nível não é utilizado na prática pedagógica.

62 Transversalidade na Educação
Figura 6
Exemplo de interdisciplinaridade no grau de geração de novas disciplinas

Disciplina A

+ Nova disciplina

Disciplina B

Fonte: Elaborada pela autora com base em Nicolescu, 1999, p. 46.

Agora apresentaremos algumas definições de interdisciplinaridade,


para verificarmos que não existe um único conceito, mas que cada um
deles pode produzir reflexões importantes, as quais possibilitam pensar
a prática pedagógica. González de Gómez (2003, p. 6), sobre a interação
entre as disciplinas e a busca da superação das fronteiras, afirma:
geração de conhecimentos através de diferentes modalida-
des de interação visando à integração de conceitos, métodos,
dados, ou as abordagens epistemológicas de múltiplas disci-
plinas em torno de uma ideia, problema, tema, ou questão
em particular; A interdisciplinaridade se desenvolveria den-
tro do campo científico, buscando a superação e reformula-
ção das fronteiras paradigmáticas.

O conceito clássico de Jantsch (1972, apud JAPIASSU, 1976, p. 73)


afirma que a interdisciplinaridade supera a pluridisciplinaridade, pois é
“uma axiomática comum a um grupo de disciplinas conexas e definida
no nível hierárquico imediatamente superior à pluridisciplinaridade, com
objetivos múltiplos e uma coordenação procedendo do nível superior”.

Japiassu (1976, p. 96) também aborda a interação em diferentes ní-


veis, pois a interdisciplinaridade é um:
método de pesquisa e de ensino susceptível de fazer com que duas
ou mais disciplinas interajam entre si, esta interação podendo ir da
simples comunicação das ideias até a integração mútua dos concei-
tos, da epistemologia, da terminologia, da metodologia, dos proce-
dimentos, dos dados e da organização da pesquisa.

Transversalidade: metodologia de trabalho 63


Já Zabala (2002, p. 33) trata de transferência de leis, sendo assim,
descreve a interdisciplinaridade como sendo “a interação entre duas
ou mais disciplinas, que podem implicar transferência de leis de uma
disciplina a outra, originando, em alguns casos, um novo corpo discipli-
nar, como [...] a bioquímica ou a psicolinguística”.

Observando essas citações, encontramos palavras comuns que


ajudam a entender melhor o conceito de interdisciplinaridade de
maneira mais global.

Figura 7
Nuvem de palavras retirada das citações dos autores

Fonte: Elaborada pela autora.

Percebemos que a interdisciplinaridade busca a superação da fron-


teira que existe na visão disciplinar e, para isso, são necessárias a inte-
gração, a cooperação e a interação entre as disciplinas, possibilitando
a transferência e/ou a troca de metodologias, procedimentos e epis-
temologias para a construção de um nível superior do conhecimento.

Na visão do pensamento complexo de Morin (2001), a interdiscipli-


naridade aponta para a colaboração. O autor faz uma analogia inteli-
gente para que se possa compreender, de maneira simples, o conceito
de interdisciplinaridade, evidenciando que várias disciplinas “colocadas
em volta de uma mesa, como diferentes nações se posicionam na ONU,
sem fazerem nada além de afirmar, cada qual, seus próprios direitos na-
cionais e suas próprias soberanias em relação às invasões do vizinho”
(MORIN, 2001, p. 115). O autor faz uma reflexão crítica para mostrar que
é importante ir além da interação entre as disciplinas para que se possa
compreender melhor sobre o processo de produção do conhecimento.

Por fim, D’Ambrosio (2005, p. 72) faz uma analogia para explicar a
interdisciplinaridade. Ele afirma que as disciplinas:

64 Transversalidade na Educação
são verdadeiras gaiolas epistemológicas: quem está dentro da
gaiola só voa dentro da gaiola, e não mais do que isso. Somos
pássaros tentando voar em gaiolas disciplinares. Surgem, obvia-
mente, as deficiências desse conhecimento, e começamos a per-
ceber fenômenos e fatos que não se encaixam em nenhuma das
gaiolas. [...] Aí estamos dando um passo para a interdisciplinari-
dade, onde encontramos com outros e, nesse encontro, juntos,
misturando nossos métodos, misturando nossos objetivos, mes-
clando tudo isso, acabamos criando um modo próprio de voar.
E nascem as interdisciplinas. Essas interdisciplinas acabam crian-
do suas próprias gaiolas. [...] As disciplinas vão se amarrando,
criando padrões epistemológicos próprios, e a gaiola vai ficando
muito maior. Podemos voar mais, mas continua sendo gaiola.
Acho que não é demais querermos voar mais, fora das gaiolas,
sermos totalmente livres na busca do conhecimento. [...] A inter-
disciplinaridade é um passo muito difícil, sem o qual não se pode
dar qualquer passo seguinte.

Com essa explanação sobre a interdisciplinaridade, é possível


descrever algumas ações que podem fazer parte do processo de en-
sino e aprendizagem:

Professor:
•• Conhecer muito bem sua disciplina para que possa fazer a articula-
ção com os saberes de outras disciplinas/áreas.
•• Estar aberto para inovar, buscando conhecer novos métodos, estra-
tégias pedagógicas e usos das tecnologias.
•• Ter postura de diálogo, cooperação e colaboração, trabalhando em
parceria com outros professores.
•• Ser pesquisador.
•• Ser criativo e buscar conhecer novas experiências didático-pedagógicas.

Aluno:
•• Ter autonomia e ser ativo no processo de ensino e aprendizagem.
•• Aprender a aprender.
•• Ser corresponsável pela aprendizagem.
•• Ser parceiro, participativo e não ouvinte domesticado.

(Continua)

Transversalidade: metodologia de trabalho 65


Prática Pedagógica
•• Transgredir e romper com as limitações.
•• Ter uma aula organizada com atividades que estimulem a análise e
a argumentação com fundamentação.
•• Promover ações didáticas que levem os alunos a serem desafiados
a resolver problemas.
•• Ser estruturada com atividades individuais e coletivas.
•• Criar espaços de compartilhamento na sala, com a escola e com a
comunidade;
•• Relacionar teoria e prática.

Abordamos apenas algumas características para um processo de


ensino e aprendizagem com base na interdisciplinaridade, apontan-
do que a prática pedagógica deve promover o pensamento articulado,
criativo, cooperativo, reflexivo e autorregulador, possibilitando, a todos
os agentes envolvidos no processo educativo, desenvolver novas ma-
neiras para interpretar e agir na sociedade e no mundo.

3.2 O pensamento transdisciplinar


Vídeo Os princípios do pensamento complexo auxiliam a compreender a
transdisciplinaridade, pois ela nos conduz para a reforma do pensa-
mento (MORIN, 2008), de modo que é possível transformarmos o pro-
cesso educativo, reinventando diferentes maneiras de pensar e agir e
superando a educação simplificadora, mutilante e linear.

A complexidade nos ensina que é necessário aprender a considerar


a heterogeneidade, a incerteza, as contradições, a complementarieda-
de, a provisoriedade, a transição e a subjetividade como caminho para
transcender a fragmentação e as perspectivas limitadoras e unidimen-
sionais do processo de construção do conhecimento, por ações e pen-
samentos que auxiliem a realizar as intersecções de ideias e a inclusão
de outros tipos de pensamentos.

A disciplina é um conjunto sistematizado de conhecimentos es-


pecíficos de uma área, representa uma fração do conhecimento
científico e tem sua própria metodologia, dessa maneira infere-se

66 Transversalidade na Educação
que a disciplina é muito importante, pois possibilita o conhecimento
especializado de uma determinada área. O que devemos superar é a
disciplinaridade, pois uma única disciplina não consegue responder à
complexidade do mundo.

Quando se trata de transdisciplinaridade, é importante entendermos


que ela não elimina a disciplina nem as diferentes modalidades do co-
nhecimento, sendo assim, a prática transdisciplinar pode ter momentos
de justaposição (multidisciplinaridade), de cooperação (pluridisciplinari-
dade) e ainda de interação/interlocução (interdisciplinaridade) com uma
ou mais disciplinas. A transdisciplinaridade busca o diálogo, a integração
do conhecimento, a visão global, a religação das partes com o todo. Ela:
é complementar à abordagem disciplinar; [...] faz emergir do
confronto das disciplinas novos dados que as articulam entre
si; [...] nos oferece uma nova visão da natureza da realidade.
A transdisciplinaridade não busca o domínio de várias disci-
plinas, mas a abertura de todas elas àquilo que as atravessa
e as ultrapassa (NICOLESCU, 1999, p. 3)

A Transdisciplinaridade identifica que não existe a dualidade –


certo e errado –, mas favorece a racionalidade aberta, a pluralidade de
olhares, linguagens, recursos, reconhecimento dos espaços e do tem-
po, a complementaridade dos processos na busca constante de solu-
ções aos problemas e conflitos contemporâneos.
1

3.2.1 O caminho da abordagem Transdisciplinar A lógica aristotélica é a maneira


de pensar em que por meio da
1 razão só existe um posiciona-
A transdisciplinaridade busca superar a lógica aristotélica e os mento, ou ele é verdadeiro ou
princípios cartesianos da compartimentalização dos conhecimentos ele é falso.
que ainda orientam a forma de produzir os saberes, o modo de ser e
Saiba mais
de pensar das pessoas e a organização do processo de ensino e apren-
dizagem. Sua proposta é buscar uma nova maneira de pensar e de Niels Bohr foi um físico que ga-
nhou o Prêmio Nobel em 1922,
compreender os fenômenos complexos, propondo a lógica do terceiro comprovando que onda e partí-
termo incluído em substituição à lógica clássica constituída apenas por cula são dimensões integrantes
um nível de realidade, valorizando a visão binária, aquela que só tem da mesma realidade, o Princípio
da Complementaridade explica a
duas posições, o verdadeiro e o falso, e eliminando a contradição. dualidade partícula/onda.
Os princípios que sustentam a lógica da transdisciplinaridade
e, também, da complexidade apoiam-se em vários estudos cien-
tíficos, principalmente naqueles relacionados com a física quânti-
ca. Entre eles, destacamos o Princípio da Complementaridade dos

Transversalidade: metodologia de trabalho 67


Opostos de Bohr, que conseguiu evidenciar, com suas pesquisas, a
existência de uma terceira possibilidade de representação lógica,
introduzindo, assim, a não contradição.
Saiba mais O princípio da Incerteza, de Werner Heisenberg, consegue evidenciar
Werner Heisenberg foi um físico a possibilidade de superar a noção de causa e efeito, linearidade, estabi-
alemão que ganhou o Prêmio
lidade, determinação e previsibilidade da ciência clássica, para a noção
Nobel em 1932, e foi o criador
da mecânica quântica. de movimento circular ou espiralado. Ele identificou que o comporta-
mento das partículas é imprevisível, pois sofre a intervenção do sujeito
no objeto observado, ocorrendo, assim, uma certa desorganização, alte-
rando a medição e, consequentemente, a velocidade das partículas.
Glossário O matemático austríaco Kurt Gödel demonstrou que qualquer sis-
Sistema axiomático: várias tema axiomático pode estar incompleto ou inconsistente, pois quan-
verdades que se complementam
do se observa um sistema fechado, identifica-se que ele sozinho não
em relação a algo.
consegue se explicar, sempre dependendo de algo externo para se va-
lidar, surgindo, assim, o Teorema da Incompletude.

Para entender esse teorema, é necessário pensar em um objeto e


aqui vamos imaginar um livro. Se o colocarmos dentro de um círcu-
lo para delimitá-lo, identificamos que, para explicar a existência des-
se livro, é necessário buscar informações externas ao círculo, no caso,
quem o escreveu, a editora que o publicou, dados e informações que
serviram para construir o texto. Portanto, para explicar esse livro, são
necessárias informações que estão fora do círculo. O livro não pode
explicar a si mesmo.

Para provar seu teorema, Gödel criou o paradoxo do mentiroso. Por


meio da afirmação “eu estou mentindo”, ele conseguiu provar que toda
afirmação necessita de um observador externo, já que ela não conse-
gue sozinha provar que é verdadeira, pois se uma pessoa afirma “eu
estou mentindo”, se isso é verdade, ela não é uma mentirosa, e se é
mentira, ela está falando a verdade.

Essa descoberta vai além da Matemática, pois também ajuda todas


as áreas da ciência, da lógica e do conhecimento. Nicolescu (1999) utili-
zou a estrutura gödeliana para explicar sobre o terceiro termo incluído,
especificamente quando se passa de um nível de realidade e percepção
para outro, conforme explicado adiante.

Outro percurso interessante, que possibilita conhecer um pouco


mais sobre a transdisciplinaridade, são os eventos e documentos,
os quais se tornaram referências teóricas e que permitem um apro-

68 Transversalidade na Educação
fundamento no tema. Dessa maneira, observe a linha do tempo a
seguir, a qual aponta alguns aspectos de cada um dos documentos
que surgiram a partir de eventos sobre a transdisciplinaridade.

Figura 8
Resumo dos principais eventos e documentos sobre a transdisciplinaridade

1970
Resultou na obra clássica:
I Seminário
L’interdiciplinarité: problemes
Internacional sobre a
Pluridisciplinaridade e
d’enseignement et de recherche 1986
dans les universités (Interdiscipli-
Interdisciplinaridade
naridade: problemas de ensino e Originou a Declaração de Veneza.
Colóquio A Ciência
pesquisa nas universidades). Esse documento aponta que a trans-
das Fronteiras do
Nesse evento, Jean Piaget fala disciplinaridade pode ser a passagem
Conhecimento, organizado
da interdisciplinaridade como para superar a visão mecanicista e
pela Unesco, com apoio da
caminho para se alcançar a trans- cartesiana, e aponta para novas ma-
Fundação Giorgio Cini.
disciplinaridade. neiras de produzir o conhecimento,
por meio do diálogo e da interação

1991 entre as ciências exatas, humanas, a


arte e a tradição.

Congresso Ciência e Gerou o documento intitulado


Tradição: Perspectivas Ciência e Tradição.
Transdisciplinares para o Destacam-se as ideias: avanços da
física quântica para ampliação da
século XXI
visão clássica; busca pela intera- 1994
tividade e pensamentos abertos;
sugestão da atitude transdiscipli- Produziu o documento chamado Carta
nar apoiada na arte, na poesia, na da Transdisciplinaridade.
I Congresso Mundial da
filosofia, no pensamento simbólico, Esse documento contém um con-
Transdisciplinaridade
na ciência e na tradição. junto de princípios básicos e bases
teórico-epistemológicas, para subsi-
diar o pensamento e a definição de
1997 uma metodologia transdisciplinar.

Congresso Internacional Gerou a Declaração de Locarno.


com o tema Que Ressaltamos, desse documento, o
Universidade para o aspecto relacionado à metodologia
amanhã? da pesquisa transdisciplinar por
meio de três pilares: os níveis de 2000
realidade, a Lógica do Terceiro
Incluído e a complexidade. Estabeleceu a Declaração intitulada
Uma visão mais ampla de Transdiscipli- Conferência
naridade. Transdisciplinar

2005 Destaca-se a preocupação com uma


educação integral do ser humano.
Internacional

Produziu o documento Mensagem


II Congresso Mundial da de Vila Velha e Vitória.
Transdisciplinaridade Busca reafirmar os preceitos da
Carta da Transdisciplinaridade
(1994) e aprofundar a discussão
dos três pilares definidos no Con-
gresso de Locarno (1997), sugerin-
do a introdução de novos pilares.

Fonte: Elaborada pela autora com base em Alvarenga, Sommerman e Alvarez, 2005.

Transversalidade: metodologia de trabalho 69


Artigo

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902005000300003

O artigo Congressos internacionais sobre transdisciplinaridade: reflexões sobre


emergências e convergências de ideias e ideais na direção de uma nova ciência
moderna, de Alvarenga, Sommerman e Alvarez apresenta e faz uma reflexão
sobre eventos e documentos referentes à transdisciplinaridade.

Acesso em: 8 abr. 2020.

Como estudamos, a transdisciplinaridade possui uma trajetória que


engloba muitos eventos, documentos e estudiosos de diferentes áreas
do conhecimento, envolvidos em elaborar e difundir ideias, não somen-
te com o intuído de superar o paradigma simplificador e fragmentador,
2
mas igualmente na investigação de novas formas de conhecimento.
Postulados são princípios
que Nicolescu definiu sobre Nesse caminho de fazer o percurso da construção da transdisci-
a transdiciplinaridade, mas
plinaridade, não podemos deixar de citar o físico teórico e professor
que, naquele momento, não
poderiam ser demonstrados. Basarab Nicolescu que, em 1996, escreveu a obra O manifesto da trans-
Quando consegue provar que disciplinaridade, considerada um documento clássico, pois publica os
tais princípios são verdadeiros,
três pilares da metodologia da transdisciplinaridade, apresentando-os
ele os transforma em axiomas.
2
como postulados em 2002 e como axiomas a partir de 2005.
Figura 9 Transdisciplinaridade
Axiomas da Possui três axiomas sendo eles
Transdisciplinaridade
Axioma ontológico

1
Há, na natureza e no nosso
conhecimento da natureza,
diferentes níveis de realidade e,
correspondentemente, diferentes níveis
de percepção.

Axioma lógico
A passagem de um nível de realidade
para outro é assegurada pela lógica do
terceiro incluído. 2
Axioma da complexidade

3
A totalidade dos níveis de realidade ou
percepção é uma estrutura complexa:
cada nível é o que é, porque todos os
níveis existem ao mesmo tempo.

Fonte: Elaborada pela autora com base em Nicolescu, 1999.

70 Transversalidade na Educação
O axioma ontológico trata de níveis de realidade e de percepção. Para
explicar esse pilar, vamos fazer o exercício de olhar a imagem a seguir.

Figura 10
Exemplo de axioma ontológico

Peter Hermes Furian/ Shutterstock


O que você percebeu primeiro e por quê? Após identificar a primeira
imagem, conseguiu ver mais coisas nela, teve outra percepção? Você já
conhecia essa imagem?

As respostas de quem fez esse exercício devem variar, por muitas


razões, relacionadas à realidade e à percepção de cada um. Essa é uma
maneira de se aproximar da compreensão desse axioma, não sendo a
única, mas possibilitando esclarecê-lo de maneira básica.

O axioma lógico apresenta a lógica do terceiro termo incluído, para


isso é importante fazer uma análise comparativa entre a lógica clássica
e a lógica da transdisciplinaridade.

Quadro 2
Comparação entre a lógica clássica e a transdisciplinar

Lógicas
Axiomas
Clássica Transdisciplinaridade
1º Axioma da identidade AéA AéA
2º Axioma da não contradição A não é não A A não é não A
Excluído: não existe um ter- Incluído: existe um terceiro
3º Axioma do terceiro termo T ceiro termo T que é ao mes- termo T que é ao mesmo tem-
mo tempo A e não A. po A e não A.

Fonte: Elaborado pela autora com base em Nicolescu, 1999.

Transversalidade: metodologia de trabalho 71


Observando o quadro, identificamos que, no mesmo nível de reali-
dade, os 1º e 2° axiomas são equivalentes. Já referente ao 3º axioma é
possível notar que:
•• se permanecemos em um único nível de realidade, toda manifes-
tação aparece como uma luta entre dois elementos contraditó-
rios. A projeção de T sobre um único nível de realidade produz a
impressão de pares antagônicos.
•• quando identificamos a existência de um outro nível de reali-
dade, o 3º axioma mostra que aquilo que aparentemente está
desunido, está de fato unido, e o que parece contraditório é per-
cebido como não contraditório. Para isso, deve ser considerado
um outro nível de realidade e percepção e, assim, surge um ter-
ceiro termo T, que é, ao mesmo tempo, A e não A. Aqui, a lógica
seria representada por A, não A e T, essa tríade promove uma
unidade mais ampla que os inclui, sendo assim, eles coexistem
ao mesmo tempo.

Para ilustrar o terceiro termo T incluído, observe o exemplo utilizan-


do as cores branca, preta e outra cor.
1. Quando falamos na identidade da cor branca, dizemos que é
branco, ou seja, branco é branco (A é A);
2. Quando falamos da não contradição, dizemos que branco não é
preto, pois preto não é branco, ou seja, branco não é não branco
(preto) (A não é não A);
3. Quando passamos para um novo nível de realidade e de
percepção, branco e preto, que parecem ser opostos, irão formar
uma outra cor, mas nem por isso serão excluídos ou deixarão
Figura 11
Representação do terceiro de existir, eles coexistiram ao mesmo tempo, surgindo o terceiro
termo T incluído. termo incluído.
Níveis de Realidade – NR Níveis de Percepção – NP

NR2 T2outra cor (branco A2 preto N-A2) NP2 T2outra cor (branco A2 preto N-A2)

NR1 T1outra cor (branco A1 preto N-A1) NP1 T1outra cor (branco A1 preto N-A1)

NR0 branco A0 preto N-A0 NP0 branco A0 preto N-A0

Fonte: Elaborada pela autora com base em Nicolescu, 1999.

72 Transversalidade na Educação
É importante ressaltar que a lógica do terceiro incluído não anula
a lógica do terceiro excluído, ela busca estabelecer sua área de va-
lidade para situações simples, por exemplo, “a circulação de veícu-
los em uma estrada: ninguém pensa em introduzir, em uma estrada,
um terceiro sentido em relação ao sentido permitido e ao proibido”
(NICOLESCU, 1999, p. 40). Entretanto, em situações complexas essa
percepção pode ser prejudicial tomando como verdadeira apenas
uma lógica, como analisar uma manifestação política utilizando so-
mente uma única lógica e um único nível de realidade e percepção.

O axioma da complexidade evidencia que a transdisciplinaridade


não pode ser vista como uma simples soma das partes, ela resulta da
multidimensionalidade e da multirreferencialidade, sem que essas di-
mensões e realidades sejam superiores umas às outras. O que ocorre é
um encadeamento dinâmico: a retroatividade (rompe com a linearida-
de) e a recursividade (produtos e efeitos são, eles próprios, produtores
e causadores daquilo que os produz) permitem a modificação do ob-
jeto/ação constituindo uma estrutura aberta, pois os pares de binários
(A e não A), que se contrapõem em outros novos níveis de realidade e
percepção, possibilitam uma nova teoria, a qual não será completa e
fechada em si mesma, senão temporariamente.

O conhecimento transdisciplinar decorre da dinâmica complexa


que pressupõe movimento, buscando o pensamento plural e abolindo
o singular. Na explicação de Nicolescu (1999, p. 44-45, grifos nossos),
“o prefixo ‘trans’ diz respeito àquilo que está ao mesmo tempo entre
as disciplinas, por meio das diferentes disciplinas e além de qualquer
disciplina. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente, para o
qual um dos imperativos é a unidade do conhecimento”.

Essa compreensão, levada para a sala de aula, possibilita que o pro-


fessor identifique que o estudo de um determinado conteúdo/tema
pode ser compreendido de maneiras diferentes, uma vez que temos
vários alunos em sala de aula e, consequentemente, os níveis de per-
cepção, realidade, consciência e compreensão podem variar. Assim, a
prática pedagógica e a relação com o aluno nunca será a mesma.

A transdisciplinaridade busca religar o que está separado e favore-


ce a ecologia das ideias “reconhecendo a existência de conhecimentos
plurais e o diálogo entre os saberes científicos e humanísticos, entre
os saberes acadêmicos e os saberes populares, leigos, tradicionais,

Transversalidade: metodologia de trabalho 73


campesinos, provenientes de outras culturas” (MORAES; NAVAS, 2015,
p. 83). A transdisciplinaridade supera o racionalismo clássico e recupe-
ra o diálogo, a interação, as emoções, a intuição, a ética, a criatividade,
isto é, reconquista aquilo que está fragmentado e isolado.

3.2.2 Indicadores de uma prática pedagógica


transdisciplinar
A educação transdisciplinar promove a educação integral do indiví-
duo, pois reconhece que sua natureza é multidimensional, dotada de
diferentes capacidades. Não privilegia somente a inteligência cognitiva,
mas também as emocionais, espirituais, artísticas, estéticas, psicológi-
cas, biológicas e suas habilidades, competências, sensibilidades, intui-
ções, humor, compaixão e talentos.

Reconhece também a multirreferencialidade, pois, além dos conhe-


cimentos relacionados aos conteúdos disciplinares, o indivíduo é envol-
to pelas relações sociais, afetivas, culturais e históricas do seu contexto,
as quais interferem no processo educativo. Para isso, o professor deve
ter uma pluralidade de olhares, linguagens e percepções para dar con-
ta dos desafios da educação do mundo contemporâneo, tornando ela
adequada à condição humana, atendendo às demandas atuais.

O ambiente escolar deve ser pensado e organizado de maneira que


possibilite ao estudante criar, refletir, expressar, manifestar seus ta-
lentos, valores e capacidades, nutrido por relações de amor, cuidado,
respeito e escuta ativa (MORAES; NAVAS, 2015). Promover o autoco-
nhecimento, para que o indivíduo conheça sua potencialidade e fragili-
dade, possibilitando a ele estabelecer uma relação aberta com o outro
e também com o objeto de aprendizagem. Deve estar presente, nesse
ambiente, a cooperação, a colaboração, a solidariedade, a diversidade
e as múltiplas linguagens, tornando possível identificar os diferentes
níveis de realidade e percepção de cada um dos alunos.

74 Transversalidade na Educação
3.3 Prática pedagógica intradisciplinar,
interdisciplinar e transdisciplinar
Vídeo
O documento dos Temas Contemporâneos na BNCC (2019) tem como
principal finalidade recomendar o desenvolvimento de procedimentos
metodológicos no processo educativo, proporcionando ao estudante uma
aprendizagem significativa dos conteúdos disciplinares e transversais,
possibilitando, assim, um desenvolvimento integral. Esse documento evi-
dencia alguns meios de organização dos componentes curriculares, para
que professores e demais profissionais da escola possam planejar a práti-
ca pedagógica fundamentada nos princípios de uma educação contempo-
rânea: colaboração, criatividade, inovação, interação, interconexão.

Com o intuito de inserir os Temas Contemporâneos Transversais


(TCTs) no processo educativo, foram definidos quatro pilares que de-
vem orientar a construção do currículo, das propostas pedagógicas e
das práticas docentes, sendo eles:
1. Problematização da realidade e das situações de aprendizagem
2. Superação da concepção fragmentada do conhecimento para
uma visão sistêmica
3. Promoção de um processo educativo continuado e do conheci-
mento como uma construção coletiva
4. Integração das habilidades e competências curriculares à resolu-
ção de problemas (BRASIL, 2019, p. 8, grifos nossos)

Para que o processo educativo seja sustentado na visão sistêmi-


ca e utilize a problematização como princípio para uma educação
que supere a fragmentação, o reducionismo e a reprodução, é ne-
cessária uma base epistemológica fundamentada no pensamento
complexo, na interdisciplinaridade e na transdisciplinaridade, que
possibilite novos arranjos, pois isso amplia a capacidade de percep-
ção, de visão e de compreensão do processo educativo. São teorias
que auxiliam a promover sínteses integradoras e a perceber as con-
vergências entre os diversos conhecimentos, superando, assim, as
fronteiras disciplinares de modo que o indivíduo esteja mais prepa-
rado para compreender melhor a realidade local e global.

Transversalidade: metodologia de trabalho 75


Com essa base epistemológica, é possível compreender que a trans-
versalidade é um caminho que pode desencadear novas metodologias
e, consequentemente, promover novas estratégias educacionais que
consigam intensificar os diálogos entre os diversos conhecimentos, re-
ligando o que estava desconexo.

Para entender a proposta dos TCT, é importante relembrar que a


BNCC é um documento que normatiza e determina um conjunto de
aprendizagens fundamentais, que os estudantes de todas as idades
devem desenvolver e aprimorar durante seus estudos na Educação Bá-
sica (BRASIL, 2018). Alguns pontos que destacamos:

1. Dez competências gerais que permeiam todos os níveis da


Educação Básica;
2. Cada nível da Educação Básica tem suas especificidades
relacionadas aos objetivos de aprendizagem e desenvolvimento
(Educação Infantil); competências específicas de áreas;
competências específicas de componentes compostas por
unidades temáticas, objetos de conhecimentos e habilidades
(Ensino Fundamental e Médio);
3. Temas Contemporâneos Transversais.

Para trabalhar com os TCTs, foram definidos três níveis crescentes


de complexidade: intradisciplinar, interdisciplinar e transdisciplinar. Es-
tes níveis devem, também, ser base para o desenvolvimento dos currí-
culos, projetos pedagógicos (PPs) e planos de aula.

O professor, para trabalhar a transversalidade na sua prática


pedagógica, deverá seguir as orientações do currículo e do proje-
to pedagógico de sua escola, que também deverão ser elaborados
seguindo as orientações das abordagens intradisciplinar, interdis-
ciplinar e transdisciplinar.

De acordo com as orientações do documento dos TCTs na BNCC


(BRASIL, 2019), é possível trabalhar a abordagem intra e interdisciplinar
nos Anos Finais do Ensino Fundamental. A seguir, foi elaborado um
esquema apresentando um caminho para se colocar em prática os TCTs.

76 Transversalidade na Educação
Figura 12
Representação da intradisciplinaridade no plano de aula

Plano do módulo de aprendizagem integrada –


intradisciplinaridade no plano de aula
identificação dos
para iniciá-lo, deve-se escolher um
conhecimentos prévios
Diagnóstica para dos estudantes.
que devem ser
auxiliam a
TCT dele elaboram-se os objetivos atividades avaliadas de
definir as
duas maneiras verificar o
Formativa para aproveitamento
ajudam a definir dois desenvolvidas dos estudantes no
desenvolver da atividade,
utilizando diferentes
Componentes bimestralmente instrumentos.
(disciplinas)

componente 1 componente 2

selecionar 1 ou mais

habilidades de cada
componente.

Fonte: Elaborada pela autora com base em Brasil, 2019.

Para iniciar a elaboração de um plano intradisciplinar, deve-se escolher


um dos TCTs (BRASIL, 2019), sendo eles:
•• Cidadania e Civismo: Vida familiar e social; Educação para o
trânsito; Educação para os direitos humanos; Direito da criança
e do adolescente; Processo de envelhecimento, respeito e valo-
rização ao idoso.
•• Ciência e Tecnologia
•• Economia: Trabalho; Educação Financeira; Educação Fiscal.
•• Meio Ambiente: Educação Ambiental; Educação para o Consumo.
•• Multiculturalismo e Saúde: Diversidade Cultural; Educação para
a valorização do multiculturalismo nas matrizes históricas e cul-
turais brasileiras.
•• Saúde: Saúde; Educação Alimentar e Nutricional.

Depois dessa escolha, devem ser definidos os objetivos a serem al-


cançados e as atividades. O próximo passo é escolher dois componen-
tes (disciplinas) que se aproximam do TCT e dos objetivos já definidos.

Transversalidade: metodologia de trabalho 77


Quadro 3
Áreas de conhecimento e seus respectivos componentes

Áreas de conhecimento Componentes curriculares


Língua Portuguesa (Redação)
Língua Estrangeira Moderna (Inglês)
Linguagens
Arte
Educação Física
Matemática Matemática
Ciências da Natureza Ciências
História
Ciências Humanas
Geografia
Ensino Religioso Ensino Religioso

Fonte: Elaborada pela autora com base em Brasil, 2018.


Leitura Após, são definidas uma ou mais habilidades para cada um dos
Os componentes curricu- componentes.
lares e suas habilidades
devem ser pesquisados Dessa maneira, conseguimos trabalhar a interação entre disciplinas e
no documento BNCC,
o TCT. A avaliação das atividades deve ter função diagnóstica, buscando
elaborado pelo Ministério
da Educação. identificar os conhecimentos prévios dos alunos referentes ao tema. O
Disponível em: acompanhamento durante o desenvolvimento da proposta é fundamen-
http://basenacionalcomum. tal para identificar as necessidades de ajustes no plano, bem como para
mec.gov.br/images/BNCC_EI_
EF_110518_versaofinal_site.pdf. identificar as necessidades individuais e coletivas com relação às ativida-
Acesso em: 3 abr. 2020. des. Para isso, o professor pode utilizar-se de diferentes recursos.

Observe, a seguir, um exemplo prático.


Quadro 4
Exemplo prático da intradisciplinaridade em um plano de aula para o sétimo ano do
Ensino Fundamental

TCT Objetivos Prática Avaliação


A atividade consiste em:
• realizar debates para entender sobre a Diagnóstica: aplicar
Promover discussões sobre a um questionário
importância de estudar a educação finan-
importância de se realizar um para identificar o
ceira na escola;
planejamento financeiro; que os alunos sa-
• realizar pesquisas sobre o processo de in-
Discutir sobre a influência da bem sobre a edu-
dustrialização, inovação tecnológica e consu-
mídia no consumo desenfreado; cação financeira.
Educação Finan- mo;
Analisar o comportamento das Formativa: todas
ceira • fazer entrevistas ou aplicar questionários
pessoas frente ao consumismo; as atividades rea-
para saber sobre a educação financeira;
Conscientizar sobre a impor- lizadas serão ava-
• elaborar relatório produzindo gráficos e liadas para iden-
tância de poupar, objetivando a
fluxogramas referente aos dados coletados tificar avanços e
realização de sonhos de curto,
nas pesquisas; dificuldades dos
médio e longo prazo.
• socializar com a turma e a escola os resul- alunos.
tados da pesquisa.
(Continua)
78 Transversalidade na Educação
Componentes Habilidades
(EF07GE08) Estabelecer relações entre os processos de industrialização e inovação tecnológica com
as transformações socioeconômicas do território brasileiro.
Geografia
(EF07GE10) Elaborar e interpretar gráficos de barras, gráficos de setores e histogramas, com base
em dados socioeconômicos das regiões brasileiras.
(EF07MA37) Interpretar e analisar dados apresentados em gráfico de setores divulgados pela mídia
e compreender quando é possível ou conveniente sua utilização.
Matemática
(EF07MA07) Representar por meio de um fluxograma os passos utilizados para resolver um grupo
de problemas.

Fonte: Elaborado pela autora e com base em Brasil, 2018 e Brasil, 2019.

É importante ressaltar que, nos Anos Finais, as aulas são ministradas


por professores especialistas, dessa maneira é fundamental a união e
a colaboração entre dois docentes para a elaboração da proposta e
identificação de um tempo/horário para ser aplicado.

A leitura do esquema permite identificar que esse plano de aula é


como uma proposta de atividades para ser desenvolvida ao longo de um
bimestre, e, ao elaborá-lo além de um plano de aprendizagem integra-
da e o distribuir ao longo do ano letivo utilizando o máximo possível de
componentes (disciplinas), entende-se que o trabalho alcança a aborda-
gem interdisciplinar, conforme ilustração a seguir.

Figura 13
Representação da interdisciplinaridade no plano de aula

1º Bimestre 2º Bimestre 3º Bimestre 4º Bimestre


• Componente 1 + • Componente 3 + • Componente 5 + • Componente 7 +
• Componente 2 • Componente 4 • Componente 6 • Componente 8
• TCT – A • TCT – B • TCT – C • TCT – D

Fonte: Elaborada pela autora com base em Brasil, 2019.

Para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental, o documento dos


TCTs na BNCC de 2019 evidencia que a abordagem a ser utilizada é a
transdisciplinar, pela possibilidade de trabalhar todos os componen-
tes curriculares com um TCT. Essa facilidade se dá pelo fato de que
essa etapa, geralmente, é ministrada por um docente e, dessa ma-
neira, é possível integrar com mais facilidade os TCTs na sua prática
pedagógica. A seguir, observe um esquema apresentando o percurso
para se elaborar um projeto transdisciplinar no plano de aula.

Transversalidade: metodologia de trabalho 79


Figura 14
Representação do projeto transdisciplinar no plano de aula
Projeto
transdisciplinar no
plano de aula

para iniciá-lo, deve ser


deve-se escolher um bimestralmente
desenvolvido

Tema dele, para habilidades


componente selecionar define- prática para cada
Contemporâneo elabora- objetivos cada de cada
(disciplina) 1 ou mais -se a componente
Transversal -se os componente
deve(m) estar que deve ser avaliada de
diretamente duas maneiras:
relacionado(as)
com o formativa diagnóstica

para para

verificar o
aproveitamento identificação dos
dos estudantes no conhecimentos
desenvolver da atividade, prévios dos
utilizando diferentes estudantes.
Fonte: Elaborada pela autora com base em Brasil, 2019. instrumentos.

De acordo com o esquema, para elaborar um projeto transdiscipli-


nar no plano de aula, deve-se iniciar com a escolha de um TCT, definir
os objetivos a serem atingidos e, para cada componente curricular, se-
lecionar as habilidades que estão correlacionadas com o TCT escolhido.
A diferença aqui é que as atividades serão planejadas para cada uma
das habilidades. A avalição segue as mesmas orientações anteriores já
explicitadas. A seguir observe uma atividade prática.

Quadro 5
Exemplo prático da transdisciplinaridade em um plano de aula para o terceiro ano do
Ensino Fundamental

TCT Objetivos Avaliação


Desenvolver a consciência a respeito da importância de Diagnóstica: Fazer uma roda de con-
respeitar as normas de trânsito; versa, na qual os alunos deverão res-
ponder, oralmente, a vários pontos
Identificar quais são os principais motivos pelos quais os aci-
relacionados com a educação para o
dentes de trânsito acontecem e como podem ser evitados;
Educação para trânsito.
Construir valores e comportamentos que impactam a
o trânsito Formativa: todas as atividades serão
vida das pessoas, como a paciência, a solidariedade, a
avaliadas pelo professor, alunos e
tolerância e o respeito, de modo a melhorar a convivên-
grupo de alunos, para identificar as
cia das pessoas no trânsito;
dificuldades e avanços dos estudan-
Explorar quais são as atitudes seguras para os pedestres. tes.
(Continua)

80 Transversalidade na Educação
Componentes Habilidades Atividades
(EF03MA27) Ler, interpretar e comparar dados apresen-
tados em tabelas de dupla entrada, gráficos de barras
Fazer pesquisas sobre os principais
ou de colunas, envolvendo resultados de pesquisas sig-
motivos de acidentes no trânsito, e
Matemática nificativas, utilizando termos como maior e menor fre-
elaborar e produzir tabelas e gráficos
quência, apropriando-se desse tipo de linguagem para
para representá-los.
compreender aspectos da realidade sociocultural signi-
ficativos.
(EF03CI01) Produzir diferentes sons por meio da vibra- Fazer um levantamento do barulho
Ciências ção de variados objetos e identificar variáveis que in- no trânsito e sua influência no res-
fluem nesse fenômeno. peito às normas.
(EF03GE01) Identificar e comparar aspectos culturais Identificar questões sobre o trânsito
Geografia dos grupos sociais de seus lugares de vivência, seja na em diferentes locais, também na ci-
cidade, seja no campo. dade e no campo.
Fazer pesquisas e realizar entrevis-
(EF03HI02) Selecionar, por meio da consulta de fontes de
tas para identificar o que as pessoas,
História diferentes naturezas, e registrar acontecimentos ocorri-
ao longo do tempo, pensam sobre o
dos ao longo do tempo na cidade ou região em que vive.
trânsito.
(EF35EF01) Experimentar e fruir brincadeiras e jogos
Realizar brincadeiras e jogos sobre o
populares do Brasil e do mundo, incluindo aqueles de
Educação física trânsito, relacionado a regras, com-
matriz indígena e africana, e recriá-los, valorizando a im-
portamentos e acidentes.
portância desse patrimônio histórico cultural.
(EF15AR04) Experimentar diferentes formas de expres-
são artística (desenho, pintura, colagem, quadrinhos,
dobradura, escultura, modelagem, instalação, vídeo, Produzir materiais diversificados
fotografia etc.), fazendo uso sustentável de materiais, usando as diferentes formas de ex-
Artes instrumentos, recursos e técnicas convencionais e não pressão artística, para apresentar os
convencionais. resultados dos estudos e pesquisas
(EF15AR24) Caracterizar e experimentar brinquedos, realizadas sobre o trânsito.
brincadeiras, jogos, danças, canções e histórias de dife-
rentes matrizes estéticas e culturais.

Fonte: Elaborado pela autora em Brasil, 2018 e Brasil, 2019.

É importante lembrar que apesar de o documento Temas Contempo-


râneos Transversais na BNCC (BRASIL, 2019) fornecer orientações, cada
escola, equipe e docente tem suas próprias compreensões e autonomia
para implementar essas diretrizes. O fundamental é abrir possibilidades
para novas estratégias de ensino e experiências que estimulem o aluno
a aprender mais e melhor, desenvolvendo-o para ser cidadão do mundo.

Transversalidade: metodologia de trabalho 81


CONSIDERAÇÕES FINAIS
A visão simplificada e fragmentada das disciplinas não possibilita edu-
car para a complexidade da vida e conhecer a realidade do mundo. O
currículo estruturado em disciplinas distancia o estudante, proporcionan-
do uma visão unilateral do conhecimento e a clausura disciplinar funda-
mentada na objetividade e em pensamentos e ações, que não permitem
religar os diferentes saberes e as diversas dimensões da vida.
Este capítulo nos permitiu compreender que o tripé da educação –
transversalidade, interdisciplinaridade e transdisciplinaridade – é como
regente do processo educativo, possibilitando transgredir e ultrapassar
as fronteiras disciplinares existentes, e identificar as possibilidades de es-
paços de troca e colaborações de conhecimentos, metodologias e expe-
riências para superar visões parciais da realidade.

ATIVIDADES
1. Você deverá criar sua frase sobre a interdisciplinaridade escolar.
Primeiro, selecione um artigo científico e retire dele duas citações
sobre interdisciplinaridade. Depois, com base nas citações e em seus
conhecimentos, crie sua própria frase.

2. Descreva duas características do professor transdisciplinar. Para


realizar esta atividade, você deverá:
a) Ler o item ‘Implicações da transdisciplinaridade na
educação’ do artigo “Transdisciplinaridade e educação”, de
Maria Cândida Moraes. Disponível em: http://www.rizoma-
freireano.org/transdisciplinaridade-e-educacao--maria-
candida-moraes. Acesso em: 9 abr. 2020.
b) Retirar desse artigo duas frases.
c) Após sua interpretação das frases, descreva, para cada uma
delas, uma característica do professor transdisciplinar.
d) Elaborar um quadro seguindo o modelo abaixo.

Minha descrição de uma característica


Frase do artigo
do professor transdisciplinar

82 Transversalidade na Educação
3. Elabore um plano intradisciplinar, para isso, utilize o modelo a seguir.

Ano do Ensino Fundamental (Anos Finais):


TCT Objetivos Prática Avaliação
Diagnóstica (descreva uma ação)
Formativa (descreva uma ação)

Componentes Habilidades
1-
2-

Para a elaboração do seu plano, consulte a BNCC.

REFERÊNCIAS
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transdisciplinaridade: reflexões sobre emergências e convergências de idéias e ideais na
direção de uma nova ciência moderna. Saude soc., São Paulo, v. 14, n. 3, p. 9-29, dez.
2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-
12902005000300003&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 7 abr. 2020.
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: Ministério da Educação, 2018.
Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_EF_110518_
versaofinal_site.pdf. Acesso em: 7 abr. 2020.
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Contexto histórico e pressupostos pedagógicos, DF: MEC/SEB, 2019. Disponível em:
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/implementacao/contextualizacao_
temas_contemporaneos.pdf. Acesso em: 7 abr. 2020.
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GONZÁLEZ DE GÓMEZ, M. N. Os vínculos e os conhecimentos: pensando o sujeito da
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ZABALA, A. Enfoque globalizador e pensamento complexo. Porto Alegre: Artmed, 2002.

Transversalidade: metodologia de trabalho 83


4
Transversalidade e currículo
O currículo estruturado no paradigma cartesiano mecanicis-
ta deve ser superado, uma vez que a contemporaneidade exige
uma educação que estimule diferentes sentidos no indivíduo,
além dos aspectos cognitivos. Dessa maneira, a transversali-
dade, a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade são ca-
minhos que permitem trabalhar a multidimensionalidade do
estudante e dos objetos a serem estudados, possibilitando uma
rede integrada de aprendizagem.
Neste capítulo, introduzimos alguns fatos sobre a evolução
histórica do currículo, bem como as abordagens educacionais
que orientaram as suas teorias nas vertentes tradicional, críti-
ca e pós-crítica.
Também fazemos uma breve explanação sobre a globali-
zação e o desenvolvimento da tecnologia, como maneira de
contextualizar a utilização da transversalidade no currículo es-
colar, e exploramos o planejamento educacional e escolar para
entender a elaboração do currículo.
Navegamos pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC)
para entender como devem ser incorporados os Temas
Contemporâneos Transversais (TCTs) no currículo escolar. E, por
fim, buscamos desenvolver algumas ideias sobre projetos como
um caminho para se trabalhar os conteúdos escolares, a trans-
versalidade e as bases da produção do conhecimento sustentado
pela inter e transdisciplinaridade.

84 Transversalidade na Educação
4.1 Evolução histórica do currículo
Vídeo Na atualidade, pensar o conceito de currículo é superar a visão de
que ele é composto apenas por uma lista de disciplinas e conteúdos a
serem ensinados para o estudante. Esse momento é complexo e neces-
sita de pessoas preparadas para enfrentar os desafios do presente, o
qual se encontra globalizado e caracterizado por profundas mudanças
em diferentes níveis e aspectos. Com isso, é fundamental ampliar a
concepção de currículo. Sacristán (1999, p. 61) nos conduz a uma re-
flexão quando afirma que o currículo deve ser visto como uma “ligação
entre a cultura e a sociedade exterior à escola e à educação; entre o
conhecimento e cultura herdados e a aprendizagem dos alunos; entre
a teoria (ideias, suposições e aspirações) e a prática possível, dadas de-
terminadas condições”.

Segundo Vasconcelos (2009, p. 133, grifo nosso), o termo em estudo


“vem do latim curriculum (do verbo currere = correr). Refere-se tanto
à proposta feita pela instituição quanto ao caminho, ao trajeto, que o
discente percorre no período de sua formação escolar”, um percurso
educacional organizado com experiências e situações de aprendiza-
gem realizadas na instituição da educação formal.

É necessário compreender que as condições e transformações so-


ciais, políticas, econômicas e culturais, de cada tempo e espaço, modifi-
cam o conceito de currículo, dando-lhe novas ressignificações.

A necessidade de ensinar conhecimentos ao ser humano é mui-


to antiga. A maiêutica do filósofo Sócrates, no século IV a.C., é um
exemplo disso, pois, por meio do diálogo com seus interlocutores,
Sócrates fazia perguntas para que a pessoa respondesse de acor-
do com os conhecimentos dela própria. Posteriormente, Sócrates
procurava fazer a pessoa refletir e duvidar desse conhecimento e,
depois disso, essa pessoa estaria pronta para reconstruir seu en-
tendimento do assunto tratado de maneira mais complexa e, conse-
quentemente, identificando um novo saber.

Transversalidade e currículo 85
Para a construção de uma sociedade, é fundamental que os cidadãos
tenham acesso ao conhecimento. Sendo assim, os governantes sempre
tiveram a preocupação de definir o que deveria ser ensinado ao povo, e
as decisões sobre o que e como seria ensinado envolviam diferentes con-
cepções de mundo e sociedade, bem como teorias sobre o conhecimento.

Artigo

https://siaiap32.univali.br/seer/index.php/rc/article/view/135/115

O artigo A evolução histórica do currículo: dos primórdios à atualidade, de Verônica Gesser,


publicado em 2002, resgata historicamente os vários movimentos em torno do currículo.

Acesso em: 27 abr. 2020.

Currículo não é um assunto novo ou um tema desconectado de nosso


passado. Uma retrospectiva histórica nos permite identificar que, a par-
tir do século XVI, ideias do Iluminismo, da Reforma Protestante e do Re-
nascimento pretenderam evidenciar que o ensinar não deveria mais ser
centrado apenas nos conhecimentos enciclopédicos, mas necessitaria ser
ampliado para experiências, observações e conhecimentos da vida.

4.1.1 Teorias do currículo


Abordar o currículo é compreender que ele envolve relações de po-
der e reflete o contexto no qual está inserido, um campo permeado
de ideologia e cultura. A ideologia é a veiculação de ideias do modo
de organização da sociedade e dos interesses das classes sociais que
influenciam ou não a educação. A cultura de uma sociedade é rela-
cionada a um espaço-tempo, o qual determina concepções, valores
e percepções, e constitui a base da maneira como certa sociedade se
organiza e pensa, determinando padrões de um corpo social. Moreira
e Silva (2001, p. 7) corroboram com esse pensamento ao afirmarem
que “o currículo é considerado um artefato social e cultural. O currículo
transmite visões sociais particulares e interessadas, o currículo produz
identidades individuais e sociais particulares”.

Mas por que estamos tratando disso?

Porque existem inúmeros conceitos de currículo, e de cada um deles


emergem caminhos diferenciados para a construção de uma proposta
curricular escolar. As teorias de currículo tiveram seu início no século XX,
nos Estados Unidos, momento histórico de grande desenvolvimento da

86 Transversalidade na Educação
industrialização e das tecnologias. A partir daí surge um processo de mas-
sificação da escolarização, com a finalidade de capacitar muitas pessoas
gerando mão de obra qualificada, circunstância que resultou na organiza-
ção sistemática do processo educativo.

Existem várias concepções para apresentar as teorias curriculares,


aqui, abordaremos as definidas por Silva (2015) que as organiza por:
tradicionais, críticas e pós-críticas.

Figura 1
Teorias do Currículo e seus pressupostos

Teorias tradicionais Teorias críticas: Teorias pós-críticas:


• emergiram a partir • emergiram a partir • emergiram a partir
da década de da década de 1960; da década de 1970;
1920; • enfocam: • enfocam:
• enfatizam: ensinar, ideologia, diversidade,
avaliar, método, reprodução subjetividade e
planejamento, cultural e social, multiculturalismo.
objetividade, conscientização,
eficiência e emancipação e
eficácia. libertação.

Fonte: Elaborada pela autora com base em Silva, 2015.

As teorias tradicionais do currículo podem ser relacionadas por


meio da obra The curriculum (1918), do educador americano Franklin
John Bobbitt, o qual se fundamentou nas teorias da administração cien-
tifica de Taylor, também conhecidas como Taylorismo, as quais busca-
vam a padronização e um ambiente produtivo na indústria, utilizando a
divisão de áreas e atividades, com um trabalho repetitivo para a inten-
sificação da produção em massa.

Dessa concepção, surge a lógica mecanicista, que orienta as teorias


curriculares tradicionais, burocratizando o processo educativo no qual
os conteúdos, objetivos, metodologias e avaliação deveriam ser seve-
ramente planejados e executados pelo professor. O currículo foi asso-
ciado ao processo de racionalização, impondo a padronização e uma
lógica linear de disciplinas e conteúdo, que deveriam ser ensinados e
controlados rigorosamente, pelo professor, por meio dos resultados da
aprendizagem, e os alunos teriam a função de reproduzir para alcançar
a eficiência e a eficácia no aprendizado.

Transversalidade e currículo 87
As teorias críticas buscaram superar a visão das teorias tradicio-
nais, por meio das concepções da sociologia crítica de Pierre Bourdieu,
da filosofia marxista de Louis Althusser, dos ideários dos autores da
Escola de Frankfurt, como Max Horkheimer e Theodor Adorno; ainda
na sociologia, temos Michael Apple e Henry Giroux, e não poderíamos
deixar de citar, no Brasil, a influência de Paulo Freire nas concepções
emancipadora e libertadora do conhecimento.

Tais teorias procuram mostrar que o currículo não é neutro, mas,


sim, um controle social, instrumento capitalista que incita para a legiti-
mação das desigualdades sociais. Dessa maneira, o currículo escolar é
a reprodução dos interesses das classes dominantes, não consideran-
do as necessidades e o contexto dos demais grupos sociais.

As teorias críticas mostram que o currículo deveria ser mais do que


um conjunto de normas e regras definindo a seleção e a sequencia-
ção de disciplinas e conteúdo, mas deveria ser também um documento
que possibilitasse a libertação e a criticidade, levando a uma educação
dialógica, para que o estudante possa adquirir conhecimentos que o
permitam conhecer o mundo e, sobretudo, perceber que pode inter-
ferir e transformar sua realidade. Nesse sentido, “as teorias críticas de
currículo, ao deslocar a ênfase dos conceitos simplesmente pedagógi-
cos de ensino e aprendizagem para os conceitos de ideologia e poder,
por exemplo, permitiram-nos ver a educação de uma nova perspectiva”
(SILVA, 2015, p. 17), como um espaço-tempo que possibilite às classes
não dominantes se emanciparem e se libertarem de aprender o currí-
culo estruturado na cultura dominante.

As teorias pós-críticas do currículo surgiram a partir da década


de 1970, fundamentadas no pós-estruturalismo, buscando superar
a visão tradicional do currículo e ir além das concepções das teorias
críticas. Dessa maneira, os pós-críticos buscaram fazer rupturas e
mudanças, apontando para a abertura e a transgressão do currículo
fechado e linear, visando enfatizar a importância da cultura, do gê-
nero, da etnia e da diversidade.

Um currículo voltado ao multiculturalismo “nos faz lembrar que


a igualdade não pode ser obtida simplesmente através da igualdade
de acesso ao currículo hegemônico existente” (SILVA, 2015, p. 90),
sendo necessária uma real transformação curricular, valorizando a
diferença e o multiculturalismo crítico e não a hierarquia e as dife-
renças entre as culturas.

88 Transversalidade na Educação
A formação da identidade e as questões relacionadas à subjetivida-
de são princípios estruturantes da teoria pós-crítica, que busca o cons-
tante questionamento e não a certeza absoluta, que procura articular
as diferenças, trabalhar com as complementaridades e superar a visão
de um conhecimento único e inquestionável, uma vez que este deve
considerar a contextualização histórica para sua construção.

4.1.2 As dimensionalidades do currículo


O currículo implica relações de poder, uma vez que determina uma
trajetória a ser seguida, delimitando conteúdos, saberes, objetivos,
princípios e metodologias a serem trabalhadas. Dessa maneira, en-
tende-se que é um instrumento que organiza o trabalho educacional
escolar e “com base nele é que as escolhas, os caminhos, os percursos
de várias gerações são traçados e vivenciados no cotidiano escolar”
(MORAES, 2012, p. 176).

Entendendo que o mundo é complexo, global, plural, conectado por


diferentes tipos de redes e influenciado pela revolução tecnológica –
que possibilita a autonomia, a capacidade de reflexão e o pensamento
crítico no indivíduo, para que este possa produzir seu próprio conheci-
mento –, revela-se que existem várias maneiras e locais para ensinar e
aprender, ampliando as dimensões do currículo.

Dessa forma, é possível entender que a escola é um espaço social


e de transformação, o qual possibilita o diálogo, a troca e a interação
capazes de religar os diferentes conhecimentos, viabilizando a aprendi-
zagem além do currículo formal.

A prática de sala de aula possibilita o desenvolvimento de pelo me-


nos três dimensões de currículo: formal, real e oculto.
•• Currículo formal é um documento que contém informações so-
bre o que deve ser ensinado nos diferentes níveis e modalidades
de ensino, orientadas pelas legislações educacionais (nacionais,
estaduais e municipais) e pelo projeto político de cada escola.
Dele, saem as disciplinas, os conteúdos, as metodologias e as
avaliações que orientam o planejamento do professor.
•• Currículo real pode ser conceituado pelo que efetivamente
ocorre dentro de sala de aula, em uma relação tetralógica a qual
contextualiza o currículo formal: a interação entre professor e
alunos, o conteúdo do Projeto Político Pedagógico (PPP) da esco-

Transversalidade e currículo 89
la, o planejamento do professor e a prática do ensino, possibili-
tando a real aprendizagem.

Figura 2
Representação do currículo real

Interação entre
Disciplina x conteúdo
professor e alunos

Relação
tetralógica que
ocorre em sala
de aula para o
desenvolvimento
do currículo real.

Planejamento do professor Prática de ensino

Fonte: Elaborada pela autora.

O currículo real é adaptável, podendo ser adequado conforme as


necessidades para aprendizagem dos alunos.
•• Currículo oculto é aquele que não foi previamente planejado
pelo professor, não consta na proposta curricular, mas emerge
do conhecimento do aluno e das interações que ocorrem em
sala de aula, os quais naturalmente afetam as aprendizagens dos
conteúdos. Ele surge das vivências diárias de sala de aula, das
atitudes, dos comportamentos, das reações, das percepções em
grupo ou individuais, está relacionado à cultura, à religião, aos
valores, reproduzindo seus interesses e, muitas vezes, ocorre de
maneira inconsciente, contribuindo com temas/conteúdos que
ampliam para a compreensão prática dos conhecimentos.

Tratar de currículo é compreender a sua complexidade, a qual en-


volve, principalmente, questões epistemológicas e metodológicas que
a escola define como fios condutores para o processo educacional.
Sendo assim, deve ser considerada a multidimensionalidade do pro-
cesso em sua construção, envolvendo questões políticas, culturais, so-
ciais, econômicas e as legislações que norteiam os pensamentos e as
ações de quem está diretamente envolvido no processo educativo.

90 Transversalidade na Educação
O currículo em sala de aula ganha vida, a interação entre professo- Glossário
res, alunos e comunidade, os conhecimentos tácitos, as experiências, Conhecimentos tácitos:
conhecimentos adquiridos pelo
as necessidades e a interpretação são movimentos que possibilitam
aluno durante sua vida e suas
recursividades e retroações que permitem a ampliação, a modificação vivências específicos dele.
e complementaridades na construção do conhecimento.

4.2 Currículo e transversalidade:


desafios contemporâneos
Vídeo Mas por que é importante trabalhar com a transversalidade no cur-
rículo escolar?

Para responder a essa questão, vamos iniciar abordando o mundo


contemporâneo, marcado por fatos históricos que trouxeram grandes
transformações. Com a queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra
Fria, o mundo tomou novos rumos, como a internacionalização das in-
formações e da tecnologia.

A partir de 1989, entramos no que se denomina quarta fase da glo-


balização, fenômeno do modelo econômico capitalista, que possibilitou
o encurtamento das distâncias e a aceleração do tempo. Ele foi movido
principalmente pelos avanços tecnológicos e desenvolvimento dos sis-
temas de comunicação que, além da ampliação da rede telefônica e do
transporte, acrescentou a informática, a internet e os satélites, proces-
so conhecido como a Terceira Revolução Industrial ou como Revolução
Técnico-Científico-Informacional.

É necessário compreender que estamos na era planetária. A globa-


lização, relacionada aos aspectos, sociais, políticos e econômicos, e a
mundialização, associada aos aspectos culturais, modo de viver e pen-
sar, conduzem o ser humano a pensar na unidade e na diversidade.
Morin (2000, p. 67) alerta que precisamos desenvolver a identidade e
a consciência terrena, entendendo que fazemos parte da nossa socie-
dade, mas que também pertencemos ao planeta Terra, assim, “o mun-
do torna-se cada vez mais um todo. Cada parte do mundo faz, mais e
mais, parte do mundo e o mundo, como um todo, está cada vez mais
presente em cada uma de suas partes”. Essa percepção é para todas as
nações, povos e para cada ser humano compreender e vivenciar.

Transversalidade e currículo 91
Com essa contextualização, podemos listar alguns fatos, benéficos e
maléficos, que têm ocorrido na contemporaneidade em consequência
da internacionalização do mundo capitalista:

Pontos positivos Pontos negativos

• Trocas entre as diferentes


sociedades que habitam o globo;
• Produtos comercializados entre
os países; • Crescimento crônico do
• Possibilidade de viajar longas desemprego;
distâncias em um curto espaço • Aumento da pobreza;
de tempo; • Alastramento e aprofundamento
• Trocas culturais mais frequentes de males espirituais e morais,
entre sociedades totalmente como o egoísmo, o cinismo e a
diferentes; corrupção;
• Diferentes países conectados de • Adesão desenfreada aos
alguma forma e desenvolvendo comportamentos competitivos;
relações comerciais, políticas e • Desigualdade no ritmo e no
culturais entre si; direcionamento dos fluxos de
• A sociedade passa a se articular informações;
em redes; • Alastramento de doenças.
• Evolução dos meios
tecnológicos e maior difusão do
conhecimento.

Identificamos que o global afeta o local e vice-versa, interferindo no


modo como as sociedades e as pessoas vivem; são muitas mudanças e
possibilidades que acontecem com assustadora rapidez. Tudo se torna
novo e instável ao mesmo tempo, nesse sentido decorre a existência de
uma realidade complexa, difusa e não linear, que nos leva a explorar a
possibilidade da existência de outros níveis de conhecimento e pontos
de vista diferentes do nosso. Tudo isso modifica nossa forma de viver e
conviver, precisando ser nutrida não apenas pela razão, mas atrelando
o emocional, o espiritual e o intuitivo para auxiliar na nossa maneira de
compreender o mundo que nos rodeia.

Outro ponto para responder à questão inicial relaciona-se direta-


mente com a tecnologia, que está entre as inúmeras demandas e trans-
formações do século XXI. Quando falamos em tecnologias, algumas
palavras nos vêm à mente, observe a nuvem de palavras a seguir.

92 Transversalidade na Educação
Figura 3
Nuvem de palavras sobre a tecnologia

Fonte: Elaborada pela autora.

Palavras que fazem parte do nosso cotidiano e são conhecidas por


todos, mas que ainda precisam ser desmistificadas para que fiquem a
serviço da educação.

Vamos abordar, agora, alguns avanços, invenções e descobertas


que influenciaram a tecnologia científica, desencadeando algumas re-
voluções, entre elas:
•• Revolução da inteligência, que permite controlar coisas pelo com-
putador ou pelos smartphones, a chamada Internet das Coisas.
•• Revolução biogenética, que revoluciona o modo de viver e o tem-
po de vida do ser humano;
•• Revolução quântica, que possibilita a manipulação da estrutura atô-
mica e, consequentemente, a transformação de uma coisa em outra.

Um cenário com muitas referências e informações, que mudam em


Figura 4
uma grande velocidade e de maneira radical. Relações planetárias

ImageFlow/Shutterstock

Transversalidade e currículo 93
Além dessas revoluções, existe aquela referente às relações sociais,
econômicas e políticas realizadas nas redes, no mundo virtual, de ma-
neira síncrona e assíncrona, que rompem fronteiras e apontam para
uma nova maneira de socialização. Cria-se o espaço cibernético – o
ciberespaço –, o qual possibilita a comunicação, a expressão e a intera-
ção entre pessoas e rompe com a barreira da territorialidade física para
acontecer de maneira virtual. A internet aproximou pessoas e nações,
e acelerou as relações comerciais – e-commerce –, uma realidade que
mudou a relação entre consumidor, produto e fornecedor. As relações
1
políticas também foram afetadas, permitindo a conexão direta entre as
Fake news são notícias ou
conteúdos falsos, mentiras que
pessoas e os políticos.
são divulgadas como verdades,
Surgem novas relações com o conhecimento, possibilidades de ob-
como se fossem informações
reais, utilizando veículos de co- ter dados e informações em abundância e a qualquer momento, desde
municação e tecnologias digitais. que se tenha acesso à internet. No entanto, com essa proliferação de
informações, surgem também usos negativos da tecnologia, como as
1 2
2 fake news e o cyberbullying .

Cyberbullying é uma espécie de Diante de todo esse cenário, é possível entender a necessidade da
ação violenta praticada contra transversalidade no currículo escolar, uma vez que a proposta curricular,
alguém, de maneira a intimidar,
hostilizar, difamar, insultar ou a pratica pedagógica e o professor não podem mais deixar de reconhe-
atacar covardemente, utilizando cer que os adventos sociais, econômicos, políticos, culturais e o desen-
a internet ou outras tecnologias
relacionadas ao mundo virtual. volvimento tecnológico geram, em grande velocidade e quantidade,
informações e dados que precisam fazer parte do processo educativo.

O currículo deve ser aberto e flexível para que possa facilitar o fluxo
de ideias e informações, permitindo a construção e desconstrução de
conceitos e teorias, de modo que se possa instrumentalizar o estudan-
te a melhor observar a realidade, a refletir e a se posicionar diante dela.

O currículo e a prática pedagógica docente devem ser abertos à vida


e contextualizados, para explorar o desconhecido, acolher o inespera-
do, identificar as emergências e buscar fazer as transcendências para ir
além do planejado e do esperado. E não devem ignorar os conflitos, os
desequilíbrios, as contradições e a provisoriedade, para que se possa
superar fronteiras disciplinares, no sentido de buscar diversidade de ca-
minhos e alternativas para o processo de ensino e aprendizagem.

94 Transversalidade na Educação
4.3 Transversalidade no currículo e no
planejamento pedagógico
Vídeo A proposta pedagógica da escola, na atualidade, deve propor um
processo educativo para que se possa construir o conhecimento de ma-
neira interativa e colaborativa entre os sujeitos envolvidos, promovendo
a educação para a cidadania planetária. Entendendo, em linhas gerais,
que o currículo escolar é um documento que contém informações sobre
os conteúdos, objetivos e avaliação, relacionados às diferentes áreas de
conhecimento, que devem ser aprendidos pelos estudantes ao longo do
seu percurso educativo e têm como finalidade o desenvolvimento inte-
gral do aluno, devemos considerar que, na educação formal, a proposta
pedagógica e o currículo refletem as políticas educacionais e, portanto,
devem se orientar pelas diretrizes da legislação e do planejamento edu-
cacional nos níveis nacional, estadual e/ou municipal.
Toda instituição de ensino faz o seu planejamento escolar, o qual
abrange as dimensões administrativas, financeiras, de recursos huma-
nos e pedagógicos, com a finalidade de definir a organização e o fun-
cionamento da escola para assegurar a excelência do ensino ofertado.
Na dimensão do planejamento pedagogico, é elaborado o Projeto
Politico Pedagógico (PPP), que é diretamente influenciado pelas demais
dimesnsões, auxiliando na elaboração e na estrutura do documento de
maneira sistêmica. Pela especificidade do aspecto projeto, entende-se
que são elaboradas propostas de ação concreta que serão realizadas
em um determinado tempo. Político é a parte do documento que asse-
gura a formação de cidadãos para atuarem na sociedade e no mundo,
bem como a participação da comunidade escolar e da comunidade ex-
terna na reflexão e construção da educação escola. E o pedagógico defi-
ne a abordagem e a concepção educacional e filosófica, que servirão de
base para orientar a metodologia, as atividades e o processo avaliativo
tanto do ensino quanto da aprendizagem.
O PPP é a base para a construção do planejamento curricular, um
processo que permite, aos profissionais da escola, tomar decisões para
a elaboração do currículo, documento que tem todas as informações e
orientações para a efetivação da ação educativa da escola, contendo a
proposta geral das experiências de aprendizagem que a escola ofertará
ao estudante ao longo de sua vida escolar.

Transversalidade e currículo 95
96
Figura 5

Transversalidade na Educação
Planejamento do Sistema
Planejamento da Educacional
Escola ou Escolar
Caminho para a construção do currículo

ocorre nas dimensões ocorre em nível

financeira administrativa Recursos pedagógica nacional Leis e


elabora
Humanos Documentos
desse nível é
que faz o planejamento elaborando o como LDB
realizado o
ofertam planejamento
Projeto Político diretrizes PCN
é a base Pedagógico (PPP) para a
Planejamento elaboração estadual BNCC
DCN
para a
de Ensino dele elabora-se a ou avaliação
elaboração surge o documento
documentos DCN
que possibilita, ao do(a) definem
proposta curricular que orientam
seus Temas
professor, elaborar seu currículo as escolas
Contemporâneos
deve contemplar a municipal Transversais
plano de aula
para ser integrado nos
transversalidade orientam para a
intradisciplinar, por meio de PPP
interdisciplinar e 3 níveis de Currículo
transdisciplinar complexidade Plano de aula
tar, de maneira visual, o caminho para a construção do currículo escolar.
professor elabora seu plano de aula, documento que orienta sua prática pedagógica.

Fonte: Elaborada pela autora.


Para ilustrar o que descrevemos acima, elaboramos um esquema, que busca apresen-
dagógico para a efetivação do processo de ensino e aprendizagem. Desse planejamento, o
jamento de ensino, isto é, sobre a atuação dos professores relacionada ao seu trabalho pe-
O Projeto Curricular e o PPP são documentos fundamentais para a realização do plane-
O projeto curricular da escola, para ser elaborado, deve considerar
as diretrizes de alguns documentos oficiais que fazem parte do plane-
jamento do sistema educacional brasileiro, sendo eles:
•• Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), de 1996, é um do-
cumento estruturado por disciplinas, as quais dão diretrizes não
obrigatórias e definem parâmetros para orientar a elaboração ou
revisão do currículo escolar. Composto de seis volumes por área
de conhecimento e três referentes aos temas transversais.
•• Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) são um conjunto orgâ-
nico, sequencial e articulado de normas obrigatórias, que orientam
e contribuem para assegurar a formação básica comum nacional,
estimulando a reflexão crítica para a elaboração ou reformulação
do PPP da escola. São compostas por:

•• Educação infantil, em 2009;


•• Ensino Fundamental de nove anos, em 2010;
•• Geral para a Educação Básica, em 2010;
•• Ensino Médio, em 2012;
•• Novas Diretrizes Curriculares da Educação Básica, em 2013.
•• Base Nacional Comum Curricular (BNCC), de 2018, é um docu-
mento normativo que apresenta um conjunto orgânico e progres-
sivo de aprendizagens essenciais, as quais todos os alunos devem
desenvolver ao longo das etapas e modalidades da educação.
A BNCC é organizada em dez competências gerais que orientam
para o desenvolvimento de habilidades e na formação de cida-
dãos mais críticos. Ela não é um currículo, mas sim um orientador
da proposta curricular na escola. Apresenta estrutura específica
para cada nível de ensino, como: eixos estruturantes, campos de
experiências, áreas de conhecimento, componentes curriculares,
unidades temáticas, objetos de conhecimento e habilidades. Na
BNCC, são apresentados os temas contemporâneos para serem
integrados de maneira transversal nos currículos e nas propostas
pedagógicas da escola, possibilitando, assim, aprender sobre as-
suntos que estão diretamente relacionados com a vida, seja ela
na dimensão local ou global.

A BNCC e as DCN são documentos complementares, sendo as Diretrizes a


estrutura e a Base o detalhamento de conteúdos e competências.

Transversalidade e currículo 97
Em nível estadual e ou municipal, cada instância tem seus próprios
departamentos que elaboram documentos orientadores ou reguladores
para a elaboração da proposta pedagógica e para o currículo escolar.

Para compreender a proposta de inserção da transversalidade


no Currículo Escolar e na Proposta Pedagógica, é necessário en-
tender as orientações contidas no documento dos TCTs na BNCC
(BRASIL, 2019).

Os TCTs podem ser trabalhados no plano de aula em três níveis


de complexidade: intradisciplinar, interdisciplinar e transdisciplinar. A
ideia na proposta pedagógica e no currículo não é muito diferente.

Para organizar o currículo de maneira intradisciplinar, isto é, rela-


cionando a disciplina com o tema contemporâneo transversal, é ne-
cessário, para cada ano do ensino, definir uma disciplina, na sequência
escolhe-se uma unidade temática e os objetivos e habilidades, estas
apontam para uma ou mais TCT e assim definem-se as atividades.

Figura 6
Explicação do currículo intradisciplinar

Define um ano de Escolhe um Escolhe uma


Define Objetivos Escolhe as
escolaridade Componente/ Unidade
de Conhecimento Habilidades
Disciplina Temática

define a prática
contextualizada

para depois
escolher
um ou mais
TCT

Fonte: Elaborada pela autora com base em Brasil, 2019.

O próximo modelo apresenta a abordagem da interdisciplinaridade


no currículo. Ele altera o modelo da abordagem anterior, no que se re-
fere à escolha das habilidades, em que são acrescentados pelo menos
dois componentes para defini-las.

98 Transversalidade na Educação
Figura 7
Explicação do currículo interdisciplinar
do
relacionado a
componente
escolhido

Escolhe um Escolhe uma de pelo


Define um ano Define Objetivos Escolhe as
Componente/ Unidade menos
de escolaridade de Conhecimento Habilidades
Disciplina Temática mais dois
componentes

relação
define a prática interdisciplinar
contextualizada
para

escolher um ou
mais TCT
Fonte: Elaborada pela autora com base em Brasil, 2019.

Por fim, o modelo da abordagem transdisciplinar busca navegar en-


tre e além das disciplinas, trabalhando o conhecimento em outros ní-
veis de realidade e percepção. Assim, o questionamento, as perguntas
e os problemas é que orientarão a organização do currículo, que de-
verá fazer interconexões com disciplinas, habilidades e competências
transversalizadas pelos TCTs.

Figura 8
Explicação do currículo transdisciplinar

Escolhe um Escolhe uma


Define um ano Define Objetivos Escolhe as
Componente/ Unidade
de escolaridade de Conhecimento Habilidades
Disciplina Temática

Quais outros
Quais TCT podem Prática contextualizada Definir as
componentes/disciplinas
serem trabalhados Realizar habilidades de
podem auxiliar na prática
transversalmente? Perguntas – Questões Problemas cada componente/
contextualizada?
disciplina

Escolher as Competências

Específica do componente Gerais da BNCC

Fonte: Elaborada pela autora com base em Brasil, 2019.

Transversalidade e currículo 99
A intra, a inter e a transdisciplinaridade, como princípios epistemo-
lógicos e metodológicos, possibilitam a construção e a aplicação do
currículo, de maneira a superar a fragmentação, a linearidade e a não
contextualização do pensamento do paradigma cartesiano mecanicis-
ta, que, por muitos anos, orientou o processo educativo. São caminhos
que rompem com as barreiras disciplinares, possibilitando construir
conhecimentos de maneira mais profunda e global.

O currículo possibilitador de trocas, diálogos, colaborações e inte-


rações supera a racionalização da disciplinaridade, porém sem negar
a importância da disciplina que tem suas especificidades e relevância
para a construção do conhecimento. A elaboração do currículo na visão
da transversalidade, da interdisciplinaridade e da transdisciplinaridade
possibilita a exploração de territórios ainda pouco explorados, a união
de diferenças, a identificação das incertezas e das possibilidades de
complementaridades, a aceitação do diferente e a exploração de novas
formas de aprender.

4.4 O currículo organizado por projetos


Vídeo As abordagens educacionais da contemporaneidade buscam evi-
denciar que a educação deve promover o desenvolvimento do indiví-
duo de modo que ele seja capaz de compreender o mundo em que vive
e saiba como buscar, analisar, interpretar e dar sentido à informação e
como transformá-la em saberes visando estar preparado para enfren-
tar os desafios impostos pelo mundo globalizado.

Essa compreensão de educação afirma a necessidade de trans-


cender a disciplinaridade estruturada pelo paradigma cartesiano me-
canicista, de superar posturas centralizadoras e monopolizadoras do
conhecimento, de ultrapassar metodologias e estratégias de ensino
que promovem a transmissão fragmentada e dissociada da realidade,
e de transcender práticas padronizadas e insensíveis que reduzem o
trabalho educativo somente no desenvolvimento cognitivo.

Busca-se propostas pedagógicas que proponham um processo de


ensino e aprendizagem mais elaborado, criativo e inovador de modo a ir
além dos limites curriculares e conseguir alcançar os desafios delineados
pelo Sistema Nacional de Educação Brasileira, o qual aponta que:

100 Transversalidade na Educação


no novo cenário mundial, reconhecer-se em seu contexto histó-
rico e cultural, comunicar-se, ser criativo, analítico-crítico, par-
ticipativo, aberto ao novo, colaborativo, resiliente, produtivo e
responsável requer muito mais do que o acúmulo de informa-
ções. Requer o desenvolvimento de competências para aprender
a aprender, saber lidar com a informação cada vez mais disponível,
atuar com discernimento e responsabilidade nos contextos das
culturas digitais, aplicar conhecimentos para resolver problemas,
ter autonomia para tomar decisões, ser proativo para identificar
os dados de uma situação e buscar soluções, conviver e aprender
com as diferenças e as diversidades (BRASIL, 2017, p. 14).

Para encontrar caminhos que auxiliem a alcançar esses desafios, é


necessário realizar uma retrospectiva histórica para relembrar que o
filósofo americano John Dewey apontou a possibilidade de o processo
de ensino e aprendizagem ter base no aprender fazendo, no qual o alu-
no, como coparticipante do processo educativo, é ativo e responsável
pela sua aprendizagem. A ênfase está na construção do conhecimento
por meio de uma aprendizagem ativa, estimulando o aluno a experien-
ciar. Com isso, os interesses dos estudantes são considerados na ação
didática, estimulando o questionamento e a capacidade de pensar e
refletir para resolver situações reais.

William Kilpatrick (1970), fundamentado nas ideias de Dewey,


desenvolve o Método de projetos, como procedimento didático es-
truturado no princípio de que para aprender é necessário vivenciar
as situações, isto é, atuar e reagir, possibilitando, assim, a aprendi-
zagem que ocorre pela ação do indivíduo, considerando seus co-
nhecimentos e experiências anteriores. Ele fez críticas no processo
educativo de sua época, que fragmentava as áreas e os conteúdos,
os quais eram distanciados da vida. Leitura

A busca por um processo de ensino e aprendizagem que supere a O documento Educação:


um tesouro para descobrir,
transmissão dos conteúdos pelo professor e a reprodução deles pelo relatório para a Unesco
aluno já dura mais de 100 anos. A utilização da metodologia de projeto da Comissão Internacional
sobre Educação para o
possibilita que o aluno seja ativo no processo de ensino e aprendiza- Século XXI apresenta, no
gem, o conteúdo não é mais tratado de maneira fragmentada, mas sim capítulo 4, os quatros
pilares da educação.
contextualizada. Ocorre a substituição da reprodução pela construção
Disponível em:
utilizando o questionamento e a pesquisa e, também, a relação entre https://unesdoc.unesco.org/
conhecimentos escolares e a vida, possibilitando, assim, o desenvolvi- ark:/48223/pf0000109590_por.
Acesso em: 27 abr. 2020.
mento integral do indivíduo.

Transversalidade e currículo 101


4.4.1 Explorando as características da metodologia
de projetos
Muitas são as propostas – por exemplo, Project Based Learning (PBL)
ou aprendizagem baseada em projetos, projetos didáticos, trabalho
com projetos, projeto de trabalho – que buscam uma aprendizagem
pautada nas quatro dimensões propostas pela Unesco (DELORS, 2001),
consideradas essenciais no processo educativo. As dimensões são:
aprender a conhecer (conhecimentos, sabedoria, aprofundamento),
aprender a fazer (habilidades, procedimentos, estratégias), aprender
a ser (autoconhecimento, autonomia, competências, solidariedade) e
aprender a conviver (cidadania, democracia, empatia, convivência). Elas
orientam para o desenvolvimento integral do indivíduo, indicando ca-
minhos para a educação do século XXI.

Para trabalhar com projetos, é importante entender alguns princí-


pios relacionados, como professor, aluno e metodologia:
•• Relacionado ao papel do professor: ele deve ser um me-
diador que trabalha colaborativamente, estando aberto para
aprender com o processo, sendo um eterno aprendiz. Tra-
balha com a escuta ativa, isto é, ouve o que os alunos têm a
dizer e os conduz para fazerem o mesmo. O diálogo e a troca
devem ser ações que permeiam todo o processo educativo
estruturado no projeto e na pesquisa.
•• Relacionado à ação do estudante: ele é copartícipe do processo
de construção, execução e avaliação do projeto, dessa maneira,
Glossário necessita reconstruir a informação, aprendendo a dialogar com
o autor, a ler e a contraler para transformar tais informações
contraler: colocar o seu
entendimento acima daquilo em sabedoria. Deve ser criativo, crítico, reflexivo objetivando ter
que o autor escrever, para não consciência sobre suas ações e pensamentos.
aceitar apenas o que foi dito,
mas ser crítico e entender, e não •• Possibilidades metodológicas: o percurso não precisa ser fixo e
apenas reproduzir. seguir rigorosamente alguns passos, mas deve ser um fio condu-
tor para orientação da ação educativa, permitindo desenvolver
atitudes investigadoras. A ideia é fazer conexões, interações para
buscar diferentes tipos e níveis de informação. É necessário ter
um tema ou um problema para ser estudado, devendo este ter
uma aproximação com as disciplinas e conteúdos curriculares.

102 Transversalidade na Educação


O trabalho com projetos em sala de aula possibilita uma apren-
dizagem significativa, pois as ações realizadas durante o percurso
são permeadas de sentido e envolvem os estudantes diretamen-
te em resolução de problemas que, de algum modo, estão rela-
cionados com a vida, permitindo a flexibilidade, a criatividade, a
imaginação e a autonomia para a reelaboração do caminho a ser
percorrido e para a realização das atividades.

Quando se opta pela utilização de projetos como metodologia de


trabalho em sala de aula, é necessário compreender a respeito da pes-
quisa escolar, um dos recursos utilizados nessa proposta. A pesquisa
possibilita ao aluno adquirir novas habilidades, mudar comportamen-
tos, ver as coisas de maneira diferente e construir conhecimentos de
forma prazerosa por meio da interação, cooperação, criatividade e au-
tonomia. E ainda a investigação possibilita ao aluno:
•• refletir sobre as atividades realizadas e os resultados obtidos de
modo que ele possa construir novos conhecimentos;
•• construir conhecimentos e transformar saberes precedentes do
senso comum;
•• ter contato com as mais diferentes fontes de informação (livros,
revistas, jornais, artigos, músicas, fotos, entre outros) e com os
mais diversificados ambientes informativos (biblioteca, ciberes-
paço, ambientes profissionais), com pessoas da comunidade e
especialistas sobre o tema que está estudando;
•• substituir a reprodução dos conteúdos por atividades operató- Vídeo

rias: selecionar, organizar, comparar, analisar, correlacionar da- O vídeo Educar pela
pesquisa Prof Pedro
dos e informações; Demo, publicado pelo
canal Laboratorio
•• fazer inferências, levantar hipóteses, comprová-las, reformulá-las
Bioprocessos, fala sobre
e chegar a conclusões mesmo que provisórias; educar pela pesquisa,
explorando o papel do
•• produzir documento próprio; professor e do aluno.
Aborda, também, a prá-
•• socializar resultados obtidos por meio de estratégias diferencia-
tica pedagógica e o que
das, que contemplem os estilos, ritmos e preferências de apren- realmente é a pesquisa
dizagem dos alunos, bem como as inteligências múltiplas. escolar.

Disponível em:
Demo (2004) afirma que o uso da pesquisa na escola, além de dar https://www.youtube.com/
um caráter científico às atividades de aprendizagem, é altamente edu- watch?v=IRhoBE_ZrC0. Acesso
em: 27 abr. 2020.
cativo, pois o aluno torna-se corresponsável pelo seu aprendizado,

Transversalidade e currículo 103


deixando de ser ouvinte repetidor de conteúdos e passando a agir e
refletir com consciência crítica diante dos conteúdos aprendidos. Esse
autor afirma que a utilização da pesquisa efetiva o processo reconstru-
tivo do conhecimento, pois o questionamento contínuo e a investiga-
ção levam o aluno à busca do saber.

Muitos documentos e leis brasileiras da educação buscam mostrar


que o processo educativo necessita de bases epistemológicas e meto-
dológicas. Por meio delas é possível à escola transformar as estratégias
pedagógicas, curriculares e métodos de ensino atuais em processos
mais coerentes e eficazes no sentido de melhor atender às necessida-
des educativas para o desenvolvimento integral do indivíduo.

Dessa maneira, a educação, nutrida pela interdisciplinaridade e pela


transdisciplinaridade, é o princípio que conduz à produção do conheci-
mento e da aprendizagem, promovendo um pensamento que não mais
dissocia e reduz os conhecimentos e a realidade.

Trabalhar com projetos em sala de aula possibilita integrar di-


ferentes dimensões do conhecimento (interdisciplinaridade) e ver
por outros níveis de realidade, possibilitando novas percepções
e articulando as dimensões racionais e emocionais do indivíduo
(transdisciplinaridade) e os conteúdos escolares com os conheci-
mentos da vida por meio da transversalidade.

Existe uma pluralidade de enfoques para trabalhar com o projeto.


A seguir apresentamos alguns passos básicos orientadores para a efe-
tivação na prática pedagógica.

104 Transversalidade na Educação


Figura 8
Passos básicos orientadores para a execução do projeto

Tema ou Tema Contemporâneo


Transversal – BNCC

definir o
pergunta que deverá ser
problema
respondida ao final do projeto

fazer a
chuva de
ideias – trocar conhecimentos sobre o problema.
relacionar os
brainstorming Momento para a realização da avaliação
componentes
diagnóstica.
e disciplinas e
definir os
seus objetivos
e habilidades
da BNCC objetivos Definir o que será pesquisado.
que serão
envolvidos na Pode ser individual Ações que
estrutura a momento de
pesquisa ou coletiva Fazer envolvem as
pesquisa/ cronograma aquisição e
investigação dimensões inter
Identificar e definir elaboração de novos
e transdisciplinar
as fontes para a conhecimentos.
para a
coleta de dados construção do
fazer a
discussão momento de identificar as conhecimento.
dos dados convergências, complementaridades, Momentos para
coletados ser realizada
antagonismos dos materiais coletados.
a avaliação
fazer a processual

resolução do
síntese dos conhecimentos.
Problema
produzir o

sistematização dos conhecimentos.


fazer a material Momento que pode ser feita a avaliação final .

Criar redes de conhecimento presencial ou virtual


divulgação
para apresentação do projeto a comunidade.

Fonte: Elaborada pela autora.

Transversalidade e currículo 105


É importante superar qualquer formalismo didático que não flexibi-
liza os procedimentos metodológicos para a execução do projeto, pois
como aponta Demo (2004), as práticas instrucionistas são assentadas
nas ações de ler, escutar e reproduzir. Sendo assim, é necessário rom-
per com o conservadorismo e buscar o diálogo, a visão sistêmica, o
pensamento articulado e criativo, os ambientes de aprendizagem mais
dinâmicos e flexíveis, a colaboração e a parceria que enriqueçam as
experiências em sala de aula, para a construção do conhecimento e o
desenvolvimento de alunos que sejam cidadãos planetários.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A proposta pedagógica e o plano curricular são bases fundamentais
para o desenvolvimento do processo educativo em uma instituição es-
colar, dessa maneira sua base epistemológica e metodológica necessita
superar o paradigma que orienta o processo de ensino e aprendizagem
fechado nos princípios da linearidade, fragmentação, reprodução, discipli-
naridade, visão unidimensional, dualismos, racionalização etc.
A transversalidade, a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade são
conceitos desafiadores para a organização da proposta pedagógica e do
currículo, os quais necessitam responder aos desafios do mundo contem-
porâneo. A escola precisa se abrir para a vida, reconhecer a importância
de interação entre o conhecimento escolar e os conhecimentos adquiri-
dos espontaneamente pelos alunos, por meio de suas experiências na
realidade em que vivem, obtidos de maneira assistemática e relacionados
diretamente com a sociedade e mundo.
Outro ponto estudado, neste capítulo, é que a escola precisa romper
com o distanciamento entre áreas, disciplinas e conhecimentos, pois eles
devem ser fundidos em um mesmo processo de aprendizagem, para que
se possa dar novos significados ao currículo escolar.
A transversalidade, a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade são
temas polêmicos e ainda não bem resolvidos no âmbito educacional, uma
vez que prevalece a visão compartimentada da cultura por meio das dis-
ciplinas. A renovação pedagógica permite refletir sobre a quebra de para-
digma e a busca de uma reforma do pensamento que possibilite a todos
os profissionais da educação pensar em um processo educativo que incite
para a humanização escolar.

106 Transversalidade na Educação


ATIVIDADES
1. Descreva uma ação na sala de aula que caracterize a inserção do
currículo oculto. Para isso, você deverá consultar a BNCC e usar
sua criatividade e conhecimentos. Elabore uma tabela, utilizando
o modelo a seguir.
Perguntas Respostas
Ano
Componente /Disciplina
Escolha uma Unidade Temática
Escolha uma Habilidade
Descreva a ação de sala de aula que
caracterize a inserção do currículo oculto

2. Selecione um(a) reportagem/artigo/vídeo, que esteja ligado à


globalização ou às tecnologias, e justifique por que ele(a) pode ser
usado(a) de maneira transversal em uma aula. Para isso, você deverá
consultar a BNCC e usar sua criatividade e conhecimentos. Elabore
uma tabela, utilizando o modelo a seguir.

Perguntas Respostas
Ano
Cite dois Componentes/Disciplinas que
podem ser envolvidos
Tema(s) Contemporâneo Transversal
Título da reportagem
Síntese da reportagem
Link da reportagem
Justifique por que ela pode ser usada de
maneira transversal em uma aula

3. Leia o projeto abaixo.

Projeto: por um planeta sadio eu mudo o mundo

O projeto completo está disponível em: http://www.ppd.net.br/projeto-


por-um-planeta-sadio-eu-mudo-o-mundo/. Acesso em: 27 abr. 2020.

Foi um projeto realizado com alunos do quarto ano de uma escola


estadual da zona urbana da Mata Mineira. A preocupação com as
questões ambientais levou as professoras e a turma a pensar o uso

Transversalidade e currículo 107


e descarte das sacolas descartáveis, seu uso indiscriminado no
comércio e a poluição que causam. O projeto teve alcance além dos
muros da escola, sendo trabalhado com a comunidade local. Foram
realizadas muitas atividades em sala de aula, envolvendo várias
áreas, com base em estudos e pesquisas que levaram a muitas
descobertas, entre elas: a importância do comprometimento com a
preservação do meio ambiente; a percepção de direitos e deveres; a
consciência da importância de cada um como cidadão participativo
construtor de um mundo melhor; o uso de sacolas retornáveis; o
conhecimento e a valorização dos recursos naturais renováveis e
não renováveis; o despertar do senso de cidadania; o incentivo ao
hábito da pesquisa informativa; a valorização e o resgate da memória
cultural/ambiental dos alunos e de suas famílias; o conhecimento
do prejuízo causado pelo excesso das sacolas plásticas e o incentivo
ao uso das ecológicas retornáveis.
Além disso, foram realizadas atividades como:

• Leituras de diversos textos e fontes;


• Aulas de campo em uma usina de compostagem e em uma
fazenda de criação de porcos;
• Entrevistas com os pais e com os comerciantes relacionadas ao
uso das sacolas plásticas;
• Elaboração de relatórios utilizando gráficos;
• Produção de cartazes;
• Participação em uma rádio para apresentar o projeto à
comunidade;

108 Transversalidade na Educação


• Confecção de camisas para fazer uma campanha sobre o uso
das sacolas retornáveis.
Durante o projeto, os estudantes foram avaliados pelo professor, o
qual utilizou todas as produções e ações executadas para essa análise.

Para responder às questões abaixo, você deverá utilizar a BNCC. Ago-


ra, elabore uma tabela utilizando o modelo:

Perguntas Respostas
Qual Tema Contemporâneo Transversal, na sua opi-
nião, foi usado nesse projeto?
Qual disciplina foi base para o projeto?
Selecione uma Unidade Temática dessa disciplina.
Selecione pelo menos uma Habilidade dessa temá-
tica que corresponda ao projeto.
Qual outra disciplina você acha que auxiliou no de-
senvolvimento do projeto?
Selecione uma Unidade Temática dessa disciplina.
Selecione pelo menos um Habilidade dessa temáti-
ca que corresponda ao projeto.
Identifique, nas atividades realizadas no projeto, a
que corresponde a essa segunda Disciplina/Unida-
de Temática e Habilidade.
Você acha que foi usado a interdisciplinaridade nes-
se projeto? Justifique sua resposta.
Você acha que foi usado a transdisciplinaridade
nesse projeto? Justifique sua resposta.

Transversalidade e currículo 109


REFERÊNCIAS
BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: Ministério da Educação, 2017. Disponível
em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=79611-
anexo-texto-bncc-aprovado-em-15-12-17-pdf&category_slug=dezembro-2017-
pdf&Itemid=30192. Acesso em: 8 maio 2020.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: Ministério da
Educação, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_EI_
EF_110518_versaofinal_site.pdf. Acesso em: 24 abr. 2020.
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VASCONCELOS, M. L. C. A formação do professor do ensino superior. Niterói: Intertexto; São
Paulo: Xamã, 2009.

110 Transversalidade na Educação


5
Os Temas Contemporâneos
Transversais na prática pedagógica
Este capítulo foi estruturado com o objetivo de explorar cada um
dos Temas Contemporâneos Transversais (TCTs), definidos pela Base
Nacional Comum Curricular (BNCC): Ciência e Tecnologia, Direitos da
Criança e do Adolescente; Diversidade Cultural; Educação Alimentar e
Nutricional; Educação Ambiental; Educação para valorização do mul-
ticulturalismo nas matrizes históricas e culturais Brasileiras; Educação
em Direitos Humanos; Educação Financeira; Educação Fiscal;
Educação para o Consumo; Educação para o Trânsito; Processo de
envelhecimento, respeito e valorização do Idoso; Saúde; Trabalho; e
Vida Familiar e Social.
Entender o que pode ser trabalhado em cada um dos 15 temas e
identificar as aproximações, os distanciamentos e as complementa-
riedades entre os assuntos são as principais finalidades desse capí-
tulo. O texto traz muitas informações, mas, ao mesmo tempo, incita
o leitor a querer ir além do que foi escrito, estimulando-o a fazer
novas pesquisas para aprofundar itens que foram citados.
Os temas abordados mostram que não é possível trabalhar
com a transmissão de conhecimentos e apontam para a neces-
sidade de construir saberes de maneira coletiva e colaborativa.
Com o aluno como copartícipe do processo educativo, prepa-
rando-o para ser um cidadão ativo, crítico e participativo na
sociedade e no mundo.
A consolidação dos TCTs como parte do currículo escolar, tra-
balhados transversalmente e estruturados pelos princípios da inter
e da transdisciplinaridade, possibilita superar a fragmentação dos
conhecimentos, religando os diversos saberes e as diferentes di-
mensões da vida e identificando a dinâmica das partes com o todo
e vice-versa, contribuindo para a formação integral do estudante.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 111


5.1 Temas Contemporâneos Transversais
Vídeo São mais um recurso que vem para ser integrado e para complemen-
tar o processo educativo, nesse sentido, não podem ser considerados
como disciplinas ou conteúdos, mas como assuntos que possibilitam ao
estudante compreender o conteúdo curricular além da visão da espe-
cialização de cada área, rompendo com as fronteiras disciplinares. São
temas que visam ser integrados ao currículo de maneira a possibilitar
a compreensão das partes (disciplina e conteúdos) e do todo (contexto,
mundo, planeta), proporcionando a religação dos acontecimentos, das
ocorrências, dos processos e dos fatos para não fragmentar a realidade
e para proporcionar a construção de conhecimentos mais complexos,
que fazem parte da vida.

É importante entender que a transversalidade é um meio de orga-


nizar o processo educativo que possibilita conhecimentos sobre e na
realidade, a respeito das questões sociais, utilizando eixos condutores
que podem ser usados em todas as disciplinas. Para trabalhar a trans-
versalidade na prática pedagógica, a interdisciplinaridade é um ca-
minho que possibilita fazer a interação e o diálogo entre as disciplinas,
superando a compartimentalização dos conhecimentos, enquanto a
transdisciplinaridade conduz para ir além das disciplinas, identifican-
do que existem outros níveis de realidade para construir conhecimen-
tos por meio da razão, da emoção, da intuição e da subjetividade.

Os TCTs da BNCC foram agrupados em seis grandes eixos, que es-


truturam 15 subtemas (Figura 1).

112 Transversalidade na Educação


Figura 1
Temas Contemporâneos Transversais

Cidadania e Civismo
Ciência e Tecnologia Economia
• Vida Familiar e Social;
• Ciência e Tecnologia. • Trabalho;
• Educação para o
• Educação Financeira;
Trânsito;
• Educação Fiscal.
• Educação em Direitos
Humanos;
• Direitos da Criança e do
Adolescente;
• Processo de
envelhecimento, respeito
e valorização ao Idoso.

Multiculturalismo e Saúde Meio Ambiente Saúde


• Diversidade Cultural; • Educação Ambiental; • Saúde;
• Educação para Educação para o • Educação Alimentar e
a valorização do Consumo. Nutricional.
multiculturalismo nas
matrizes históricas e
culturais brasileiras.

Fonte: Elaborada pela autora com base em Brasil, 2019.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 113


No documento Temas Contemporâneos Transversais (TCTs) na BNCC:
contexto histórico e pressupostos pedagógicos (2019) a escolha dos temas
foi subsidiada em necessidades sociais do país e por marcos legais,
com a influência de alguns definindo a maioria dos temas.

5.1.1 Lei de Diretrizes e Bases da Educação


A Lei n. 9.394, de 1996 (segunda edição, atualizada em 2018), é um
documento que contém vários assuntos educacionais, que possibilitam
organizar a estrutura da educação brasileira. Alguns pontos específicos
da LDB subsidiaram a escolha e a definição dos TCTs, como:

•• O art. 3º, inciso XII, cita especificamente a diversidade étnico-ra-


cial, um princípio que deve ser considerado na educação.
•• O art. 12 direciona às instituições algumas funções, entre elas a
prevenção e o combate à violência, o fomento à cultura de paz,
a necessidade de ofertar um ambiente escolar seguro, principal-
mente no que se refere às drogas.
•• O art. 13 é direcionado aos professores e entre as responsabili-
dades instituídas a eles está a integração, no processo educativo,
entre escola, família e comunidade.
•• O art. 26 define que, além da base comum, deve haver disciplinas
que contemplem necessidades regionais e locais da sociedade e
dos educandos. Especifica, ainda, a necessidade de incluir Temas
Transversais relacionados a direitos humanos, violência contra a
criança e o adolescente e educação alimentar e nutricional; além
disso, é reforçado o estudo da história e cultura afro-brasileira,
indígena, africana e europeia, conforme o nível de escolaridade.
•• O art. 27 aponta os conteúdos curriculares que devem contem-
plar os direitos e deveres dos cidadãos.
•• O art. 28 esclarece sobre as adaptações necessárias da educação
para os alunos da zona rural.
•• O art. 32 é direcionado para o Ensino Fundamental dos nove
anos, que deve ter uma educação voltada à formação do cida-
dão. Assim, é fundamental que se compreenda sobre: o ambien-
te natural e social, o sistema político, a tecnologia, as relações
interpessoais e os símbolos nacionais.

114 Transversalidade na Educação


A LDB, como lei educacional, aponta sobre vários assuntos, entre
eles os relacionados com questões do dia a dia, que, quando incor-
porados ao processo educativo, possibilitam à escola desenvolver
o aluno em sua integralidade e com habilidades, competências e
conhecimentos para atuar como cidadão; são esses princípios que
ajudaram na construção dos TCTs na BNCC.

5.1.2 Parecer CNE/CEB n. 11, aprovado em 7 de julho


de 2010
Esse documento fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Fundamental de nove anos. Entre outras especificações, ele aponta a
necessidade de que todos os indivíduos tenham acesso à educação e ao
conhecimento, buscando mostrar que uma educação com qualidade so-
cial colabora com o ingresso e a permanência do aluno na escola, levan-
do-o a estudar e a se desenvolver e subtraindo as questões de evasão e
das distorções de idade/ano/série. O documento reforça a transversali-
dade no currículo escolar como meio para ampliar o conhecimento do
educando, conforme pode ser identificado no texto do artigo 16:
Os componentes curriculares e as áreas de conhecimento devem
articular em seus conteúdos, a partir das possibilidades abertas
pelos seus referenciais, a abordagem de temas abrangentes e
contemporâneos que afetam a vida humana em escala global,
regional e local, bem como na esfera individual. Temas como:
saúde, sexualidade e gênero, vida familiar e social, assim
como os direitos das crianças e adolescentes, de acordo com o
Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), preserva-
ção do meio ambiente, nos termos da política nacional de edu-
cação ambiental (Lei nº 9.795/99), educação para o consumo,
educação fiscal, trabalho, ciência e tecnologia; diversidade
cultural, devem permear o desenvolvimento dos conteúdos da
base nacional comum e da parte diversificada do currículo. § 1°
Outras leis específicas que complementam a Lei nº 9.394/96 de-
terminam que sejam ainda incluídos temas relativos à condição
e direitos dos idosos (Lei nº 10.741/2003) e à educação para o
trânsito (Lei nº 9.503/97). (BRASIL, 2010, p. 6, grifos nossos)

As DCNs fazem recomendações de temas fundamentados em mar-


cos legais que auxiliaram os TCTs, pois indicam que os eixos temáticos
contribuem para a colaboração entre os indivíduos.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 115


5.1.3 Resolução CNE/CP n. 2, de 22 de dezembro de
2017
Institui e orienta a implantação da BNCC, a ser respeitada obrigato-
riamente ao longo das etapas e das respectivas modalidades no âmbito
da Educação Básica. No artigo 8º, fala-se sobre a necessidade de ade-
quação das propostas pedagógicas e dos currículos, de acordo com as
diretrizes da BNCC, mas que cada escola deve identificar suas necessi-
dades e especificidades.

O parágrafo 1º se refere à abordagem transversal e integradora,


que deve orientar o processo educativo observando a legislação, as
normas específicas e os temas contemporâneos para promover “práti-
cas educativas ancoradas no interculturalismo e no respeito ao caráter
pluriétnico e plurilíngue da sociedade brasileira” (BRASIL, 2017, p.7).

5.1.4 Parecer CNE/CEB n. 5/2011, aprovado em 4 de


maio de 2011
De maneira sintetizada, esse documento trata sobre a abordagem
transversal e integrada com conteúdo e temas contemporâneos que
passam por todo o currículo, reforçando que o tratamento metodo-
lógico deve ser permeado pela contextualização, pela inter e pela
transdisciplinaridade. Além disso, deve ser considerada a multidimen-
sionalidade do conhecimento e do indivíduo para que as aprendiza-
gens possibilitem o desenvolvimento de habilidades, competências e
atitudes, que auxiliem a resolver “as demandas complexas da vida co-
tidiana, do exercício da cidadania e da atuação no mundo do trabalho”
(BRASIL, 2018, p. 4).

5.2 Cidadania e Civismo


Vídeo A macro área temática Cidadania e Civismo procura mostrar que é
fundamental superar a simples ideia de construção do indivíduo para
conhecer e exercer a cidadania por meio da compreensão de seus di-
reitos e deveres, bem como superar a ideologia imposta no velho mo-
delo do regime militar, com a tendência homogeneizante buscando a
reprodução e a cultuação aos símbolos nacionais e o desenvolvimento
de uma identidade nacional única.

116 Transversalidade na Educação


Objetiva-se educar para a liberdade, formando cidadãos críticos e
autônomos, pois na “democracia, o indivíduo é cidadão, pessoa jurídi-
ca e responsável; por um lado, exprime seus desejos e interesses, por
outro, é responsável e solidário com sua cidade” (MORIN, 2000, p. 107),
devendo desenvolver o sentimento patriótico para entender sobre o
país, o continente e o planeta em que habita.

Nesse contexto, é importante compreender que o indivíduo margi-


nalizado é aquele excluído socialmente, sendo fundamental que todos
os sujeitos possam ser cidadãos, a fim de que sejam incluídos e tenham
a capacidade de exercer a cidadania e de ajudar na transformação da
comunidade local e global.

Educar para a Cidadania e o Civismo é levar o estudante a ser crítico,


consciente, reflexivo e ativo e a saber falar, ouvir e argumentar, sendo
comprometido consigo mesmo e com a sociedade, adquirindo compe-
tências para exercer seus deveres e compreendendo a existência da
diversidade cultural e de valores para que rejeite toda e qualquer for-
ma de violência e discriminação. Assim, educa-se para compreender a
complexidade do mundo, para que cada indivíduo possa:
intervir na sociedade, participar de sua gestão, exercer a demo-
cracia, atuar para transformar, viver em uma cultura solidária,
respeitar os demais, defender os mais fracos, responsabilizar-se
pelos demais seres humanos, compreender a si mesmo, às de-
mais pessoas e ao mundo social e natural, adaptar-se às mudan-
ças, aprender a aprender etc. (ZABALA, 2002, p. 58)

A área temática Cidadania e Civismo foi composta por cinco


subáreas: Vida Familiar e Social; Educação para o Trânsito; Educação
em Direitos Humanos; Direitos da Criança e do Adolescente; e, por fim,
Processo de envelhecimento, respeito e valorização do Idoso. Na se-
quência, falaremos um pouco sobre cada uma das subáreas.

5.2.1 Vida Familiar e Social


A educação voltada à cidadania necessita de conhecimentos rela-
cionados a aprender a ser e a conviver com o outro; dessa maneira, os
ensinamentos adquiridos no seio familiar possibilitam compreender a
convivência social, uma vez que a família pode ser considerada o pri-
meiro grupo social com o qual a criança tem contato.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 117


Vida Familiar e Social é um tema que possibilita discutir sobre as
mudanças que têm ocorrido ao longo de tempo e que influenciam a
constituição da família e da sociedade, bem como a maneira de com-
preender e viver a vida. Aprender com as incertezas, com a diversidade,
com a complementaridade e com os antagonismos é um verdadeiro
exercício para o desenvolvimento pessoal e social do indivíduo no
mundo contemporâneo.

A família e a sociedade podem ser instituições que auxiliam a cons-


truir os alicerces e o sentimento de pertencimento. Podem ser tanto
potencializadoras de pessoas saudáveis, emocional e eticamente, con-
solidando a construção de um cidadão, como atuar no desvio de pa-
drões comportamentais, prejudicando o desenvolvimento cognitivo,
social, moral e pessoal.

A criança e o adolescente naturalmente terão que conviver com pes-


soas que não são de sua família e frequentar espaços que não são suas
casas; para isso, eles necessitam de muitos conhecimentos. Assim, a fa-
mília passa a ser a principal interlocutora de códigos, símbolos, tradições
e costumes, que serão bases para o desenvolvimento do cidadão, e a es-
cola tem a função de ser a sistematizadora desses conhecimentos, pro-
movendo a reflexão e propiciando experiências e trocas entre os alunos.

5.2.2 Processo de envelhecimento, respeito e


valorização do Idoso
A trajetória natural dos seres humanos é passar por algumas etapas
– infância, juventude, idade adulta e velhice –, sendo que em cada uma
delas se enfrentam conquistas, frustrações e desafios, característicos
de cada fase da vida e de cada indivíduo, os quais têm sua especifi-
cidade relacionada com os contextos familiares, sociais, econômicos,
políticos, espirituais, afetivos e culturais que os caracterizam.

Todo cidadão idoso deve ser respeitado e, para isso, devemos su-
perar a visão de que em uma “sociedade em que o mito é a juventude,
a beleza e a força física, ser velho é, contrastivamente, ser feio, fraco
e, principalmente, improdutivo” (MEDEIROS, 1998, p. 7). Entendemos
a necessidade de estudar o tema processo de envelhecimento, respeito
e valorização do idoso no currículo escolar, para que os estudantes te-
nham embasamento teórico para entender e respeitar os mais velhos,

118 Transversalidade na Educação


superando paradigmas sustentados pelos valores dominantes do capi-
talismo, que maximizam o arquétipo de beleza e de juventude.

É importante entender que já existem muitos marcos legais que dão Leitura
suporte ao idoso e que devem ser de conhecimento de quem ensina e Confira o documento “A
pessoa idosa: educação
de quem aprende, sendo eles: e cidadania” para saber
mais sobre alguns mar-
•• Lei n. 8.842, de 4 de janeiro de 1994: dispõe sobre a Política Nacio- cos legais relacionados
nal do Idoso (PNI), cria o Conselho Nacional do Idoso e dá outras ao idoso.
providências. É um conjunto de normas e diretrizes que compõem Disponível em: http://www.
as políticas do idoso. Foi regulamentada pelo Decreto n. 1.948, de desenvolvimentosocial.sp.gov.br/
a2sitebox/arquivos/documentos/
3 de julho de 1996, com o objetivo de garantir os direitos sociais do biblioteca/publicacoes/volume7_
idoso – pessoa maior de 60 anos de idade –, buscando desenvolver Educacao_e_cidadania.pdf . Acesso
em: 6 maio 2020.
autonomia, integração e participação na sociedade.
•• Portaria n. 2.528, de 19 de outubro de 2006: aprova a Política Na-
cional de Saúde da Pessoa Idosa, documento que define e regu-
lamenta serviços e ações para a organização da saúde de acordo
com as necessidades dos idosos.
•• Lei n. 10.741, de 1 de outubro de 2003: considerada Estatuto do
Idoso, é o documento que consolida os direitos das pessoas ido-
sas para que a família, o Poder Público e a sociedade garantam a
cidadania, isto é, para que possam ser respeitados e protegidos
de toda e qualquer forma de discriminação ou preconceito.
•• Decreto n. 9.893, de 27 de junho de 2019: Dispõe sobre o Conse-
lho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa (CNDI), órgão que tem
a finalidade de auxiliar nas questões relacionadas com a política
nacional do idoso.

Os documentos elencados permitem, entre outras coisas, entender


a importância dos direitos dos idosos, referentes a uma velhice digna,
à saúde de qualidade e alimentação saudável, à educação, a aprender,
a conhecer, à moradia e ao lazer, ou seja, a ser feliz.

Educar para a compreensão humana exige reconhecer e identificar


propostas e ações que não são assistencialistas ou paternalistas, mas
que promovam as práticas cidadãs do idoso, tanto aquelas realizadas
pelo Estado quanto as organizadas por diferentes grupos e instituições
representativas da sociedade civil.

Quando se fala do idoso, deve-se reconhecer que existe uma ex-


periência acumulada por anos de vida, histórias que possibilitam co-
nhecer o passado e entender o futuro por uma lógica que vai além de
conhecimentos científicos acadêmicos.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 119


Esta relação, entre escola e idosos, possibilita ao estudante entender
o envelhecimento e a velhice para compreender sobre: fragilidade, sub-
missão, ausência de autonomia, abuso, maus tratos, agressões (verbais
e físicas), desrespeito, combate ao preconceito e à violência, passivida-
de x indivíduos ativos, bem-estar físico e mental, doenças e a promoção
da saúde. Pode envolver, também, aspectos biopsicossociais, atividades
corporais e comportamentais, desejos e necessidades; enfim, conceitos
e conhecimentos para ressignificar a forma de olhar, sentir, pensar e agir,
respeitando as singularidades do idoso e do processo de envelhecimento.

5.2.3 Direitos das crianças


Você sabia que ainda existem 17 milhões de crianças brasileiras po-
bres que não recebem nenhuma assistência do Governo Federal? No
Brasil existem políticas direcionadas à proteção de crianças vulneráveis
e que vivem em extrema pobreza, buscando soluções para questões
básicas como saúde, alimentação e educação; porém, nem todas as
crianças estão cadastradas nesses programas sociais. O sistema de
proteção social foi implementado para realizar um cadastro único, uni-
ficando e integrando os programas sociais; dessa maneira, é bem pro-
vável que esse sistema tenha incluído todas as 17 milhões de crianças
e melhorado suas condições de vida (IPEA, 2019).
Mr.Cheangchai Noojuntuk

120 Transversalidade na Educação


Segundo o Ipea (2019), existem vários problemas com as crianças e
os adolescentes no Brasil, sendo muitos deles relacionados a questões
socioeconômicas dos que vivem em extrema pobreza. Alguns desses
problemas são conhecidos como: trabalho infantil, baixa ou nenhu-
ma escolaridade, deficiências na saúde, maltrato, tráfico de crianças,
prostituição, envolvimento com drogas, problemas psicológicos e emo-
cionais, evasão escolar, abuso sexual, bullying, entre outros que desres-
peitam os direitos fundamentais do ser humano.

Essas e outras questões relacionadas a crianças e adolescentes já


foram preocupação de muitos governantes, que identificaram a neces-
sidade de formalizar os direitos fundamentais por meio de leis e docu-
mentos, que pudessem ser conhecidos por todos e, assim, conseguir
fazer a proteção desses menores.

Um documento internacional que buscou proteção e cuidados es-


peciais para a criança e o adolescente foi a Declaração dos Direitos da
Criança de Genebra, do ano de 1924, realizada pela Liga das Nações.
Somente em 1959, a Organização das Nações Unidas (ONU) constituiu
a Declaração Universal dos Direitos da Criança, contendo dez pontos
fundamentais relacionados com os direitos. O texto definitivo para
cumprimento desses direitos obrigatórios foi apresentado na Conven-
ção sobre os Direitos da Criança, em 20 de novembro de 1989, data que
se tornou o Dia Internacional da Criança. No ano seguinte, 195 países
aderiram ao tratado que reúne os direitos para a criança em diversas
dimensões (econômica, social, cultural, civil e política) e, também, as
responsabilidades do Estado, da família e de pessoas ligadas à criança
e ao adolescente.

No Brasil, a Constituição Federal de 1988, no artigo 227, contempla


e prioriza os princípios instituídos na Declaração Universal dos Direitos
da Criança, abrindo caminho para a elaboração do Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA). A seguir, a reprodução desse artigo.
É dever da família, da sociedade e do estado assegurar à criança,
ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito
à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profis-
sionalização, à cultura, à dignidade, Ao respeito, à liberdade e a
convivência familiar e comunitária, além de coloca-la a salvo de
toda forma de negligencia, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão. (BRASIL, 1988)

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 121


Leitura
A Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, dispõe sobre o Estatuto
No site da Câmara dos
da Criança e do Adolescente. Esse documento busca assegurar para
Deputados, é possível
acessar uma versão do a população infanto-juvenil os direitos fundamentais para garantir a
ECA ilustrado, permitindo
proteção integral, relacionada com a manutenção da vida digna, o de-
que a criança conheça
o documento de uma senvolvimento pessoal e social, a educação de qualidade e a garantia
maneira mais lúdica.
da respeitabilidade física, emocional e moral.
Disponível em:
https://plenarinho.leg.br/index. A leitura desse documento possibilita realizar profundas discussões
php/2018/07/estatuto-da-crianca- e pesquisas na escola, de maneira que os alunos possam refletir sobre
e-do-adolescente/. Acesso em: 6
mai. 2020. os assuntos nele abordados, fazer análises críticas para compreender
melhor os direitos das crianças e dos adolescentes, bem como identifi-
Site car o que realmente é colocado em prática.
Para saber mais sobre o O Conselho Tutelar é um órgão municipal, criado com base no ECA,
Fundo das Nações Unidas
para a infância, acesse
que busca zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do ado-
o site oficial dessa institui- lescente, por meio de seus membros eleitos pela comunidade local,
ção, Unicef, no Brasil.
atuando no aconselhamento de pais e responsáveis.
Disponível em:
https://www.unicef.org/brazil/ Para finalizar, é importante citar o Fundo das Nações Unidas para a
situacao-das-criancas-e-dos-
Infância (Unicef), órgão do sistema da ONU, que ajuda a defender, pro-
adolescentes-no-brasil. Acesso em:
6 mai. 2020. teger e criar oportunidades para a manutenção e execução dos direitos
da criança e do adolescente.

5.2.4 Educação em Direitos Humanos


Trabalhar com a Educação em Direitos Humanos é buscar funda-
mentos teóricos e práticos para possibilitar aos estudantes a refle-
xão sobre aspectos relacionados à humanização, a qual, ao longo do
tempo, vem tendo seu conceito e sua prática modificados de acordo
com cada cultura e contexto. Os direitos precisam ser debatidos,
difundidos e vivenciados, por todos os indivíduos, para serem imple-
mentados na sociedade.

O que te lembra o período entre 1939 e 1945?

Se você respondeu Segunda Guerra Mundial, acertou. Dos estudos


realizados ou das histórias contadas pelos nossos bisavôs ou avôs, lem-
bramos dos horrores ocorridos nesse período, que refletia a ideolo-

122 Transversalidade na Educação


gia nazista representada pelo militarismo da Alemanha. Isso levou ao
desrespeito e a atos bárbaros, que culminaram na morte de muitos
soldados e civis e na perseguição e extermínio de judeus, ciganos e
homossexuais. Na dimensão econômica, muitos países foram prejudi-
cados, criando problemas sociais, principalmente relacionados com a
produção industrial, e deixando inúmeras pessoas na pobreza.
Saiba mais
Nesse caos, em 1948, algumas nações elaboraram a Declaração
Para saber mais, acesse
Universal do Direitos Humanos (DUDH), um marco histórico que tinha
o relatório das Diretrizes
como finalidade delinear um novo caminho, instituindo princípios para Nacionais para a Educa-
ção em Direitos Huma-
a paz, o respeito, a democracia e o fortalecimento dos Direitos Huma-
nos, um texto completo
nos e, ainda, estabelecendo a proteção e a divulgação universal para a que possibilita entender a
finalidade e os pressu-
recuperação da dignidade humana e dos diretos alicerçados na liber-
postos didáticos para
dade e na justiça, para superar a tirania e a opressão. a inserção no processo
educativo.
No Brasil, temos o decreto n. 7.037, de 21 de dezembro de 2009,
Disponível em: http://
que aprova o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). portal.mec.gov.br/index.
Esse documento busca difundir nacionalmente a cultura de Direi- php?option=com_docman&vie-
w=download&alias=10389-pcp-
tos Humanos para promover a construção de uma sociedade de- 008-12-pdf&category_slug=mar-
mocrática, estimulando a cooperação interna e externa, bem como co-2012-pdf&Itemid=30192 .
Acesso em 6 maio 2020.
a elaboração de programas, projetos e pesquisas na área da Educa-
ção em Direitos Humanos, para também incentivar a inclusão desse
tema no programa escolar.

A resolução n. 1, de 30 de maio de 2012, que estabelece Diretrizes


Nacionais para a Educação em Direitos Humanos, e o Parecer CNE/CP
n. 8, de 6 de março de 2012, que aprovou as Diretrizes Nacionais para
a Educação em Direitos Humanos, são documentos que conseguem,
oficialmente, reposicionar os objetivos da nação para a formação de
pessoas, tendo seus direitos e responsabilidades para contribuírem na
consolidação da democracia e no desenvolvimento da cidadania. Dessa
maneira, a escola é um meio para a Educação em Direitos Humanos,
formando crianças, jovens e adultos para uma educação integral – que
independe de suas origens, valores, culturas, faixa etária e identidade
de gênero – e para que possam superar qualquer forma de discrimi-
nação e violência, buscando a educação para a compreensão humana.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 123


5.2.5 Educação para o Trânsito
Observe a imagem.

Ryan DeBerardinis/Shutterstock
Seja na zona rural ou urbana, na cidade grande ou pequena, as pes-
soas se locomovem o tempo todo – necessidade intrínseca do homem.
Dessa maneira, é fundamental que isso seja feito de modo seguro, tan-
to para o pedestre quanto para o motorista, o carona, o passageiro e,
ainda, para qualquer pessoa que esteja usando outro tipo de recurso
para se locomover, além do veículo motorizado.

Preservação da vida e segurança é o que se busca quando o assun-


to é trânsito. Segundo dados do relatório Global Status Report on Road
Safety (OMS, 2018), da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2017,
o Brasil foi o quarto país do mundo com maior número de mortos no
trânsito. Essa consequência afeta diretamente a saúde pública, pois as
vítimas de acidentes são atendidas em prontos-socorros e hospitais,
provocando a sobrecarga no sistema. Outra grave consequência das
imprudências no trânsito são as lesões, as sequelas físicas e emocio-
nais e os óbitos, que fazem muitas famílias sofrerem.

124 Transversalidade na Educação


Como vemos, a Educação para o Trânsito nas escolas é um tema Saiba mais
fundamental, uma vez que o convívio social é algo que precisa ser en- No documento “Educar
para o trânsito”, você terá
tendido pelo indivíduo, que, como cidadão, deve compreender sobre
acesso a uma apostila
direitos e deveres, regras e normas e ética e valores, para que possa que, de maneira muito
didática, apresenta temas
saber conviver com outras pessoas.
importantes para a
O que é necessário, então, para que o indivíduo possa se locomover educação para um trân-
sito seguro. Vale a pena
sem desrespeitar as normas de convívio social e do trânsito? conferir.

Podemos elencar alguns princípios, porém nunca serão suficientes Disponível em:
http://www.educacaotransito.
para responder a essa questão; por isso a necessidade de trabalhar, pr.gov.br/arquivos/File/arquivos/
no processo educativo, a Educação para o Trânsito. Seguem algumas Comunidade/Educar%20para%20
o%20Transito.pdf. Acesso em: 6
ideias importantes: mai. 2020.
•• entender sobre conduta e circulação;
•• perceber as semelhanças e diferenças entre a individualidade e
a coletividade;
•• ter bom relacionamento interpessoal para entender sobre situa-
ções conflitantes e harmoniosas;
•• compreender sobre a coletividade e convivência;
•• ter atitudes de tolerância, paciência, respeito, cooperação e
solidariedade;
•• dominar a linguagem visual, gestual e sonora.

Muitos são os assuntos que podem ser trabalhados na Educação para


o Trânsito. Devemos buscar realizar, com os alunos, estudos, pesquisas,
investigações e observações que os levem a entender sobre segurança
no trânsito, além de ações educativas, que devem transcender a aprendi-
zagem de regras, normas, leis, atitudes e valores, buscando o desenvolvi-
mento integral para o convívio social e, assim, colaborando na construção
da cidadania e no respeito aos direitos humanos.

Os alunos, ao se deslocarem até a escola, seja a pé ou utilizando


algum meio de transporte, devem compreender sobre as normas, sím-
bolos, sinais e comportamentos que orientam para a locomoção com
segurança, de maneira a preservar a vida e o patrimônio público e o
privado. Esses, entre outros assuntos, podem ser tratados na Educação
para o Trânsito dentro das instituições de ensino.

É importante que o estudante e o educador tenham conheci-


mento de algumas leis e documentos; entre esses destacamos a Lei
n. 9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trân-

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 125


sito Brasileiro. Por meio dessa lei foi possível desenvolver projetos e
ações educativas sobre o trânsito, principalmente nas escolas, uma
vez que o artigo 76 estabelece a Educação para o Trânsito alcançan-
do toda a Educação Básica.

Práticas transversais

Em Portugal, as escolas participaram do Projeto “A maior lição do mundo”, realizado pela Unicef, que tinha
como objetivo desenvolver uma proposta para o ODS4, a de educação de qualidade, e para o ODS16, que
consistia em paz, justiça e instituições eficazes. As escolas foram desafiadas a desenvolver projetos para uma
educação de qualidade e a promoção da paz e da justiça. O documento apresenta 15 projetos, que foram
realizados no ano letivo de 2018/2019, da Educação Infantil ao Ensino Médio, expondo uma síntese e os
resultados alcançados.

Disponível em: https://www.unicef.pt/media/2741/livro_amlm_2019.pdf. Acesso em: 6 maio 2020.


Já pensou que os jogos podem ser uma boa solução para trabalhar conteúdos e os Temas Transversais?
No site MultiRio você encontra vários jogos on-line para usar em sala de aula.

Disponível em: http://www.multirio.rj.gov.br/index.php/interaja/jogos-educativos/15086-nossa-cidade. Acesso em: 6 maio 2020.


O Programa Mais Educação desenvolveu uma série de cadernos pedagógicos, entre eles o de Direitos
Humanos em Educação. O material é estruturado em uma parte de fundamentação teórica sobre o as-
sunto, para que o professor se aprofunde no tema, e, após a página 30, apresenta planos com subtemas
relacionados ao Direitos Humanos.

Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=12331-direitoshumanos-pdf&Itemid=30192.


Acesso em: 6 maio 2020.

5.3 Ciência e Tecnologia


Vídeo Você já ouviu falar sobre o Prêmio Jovem Cientista?

Esse é um empreendimento do Conselho Nacional de Desenvolvi-


mento Científico e Tecnológico (CNPq), que conta com a parceria da
Fundação Roberto Marinho e a chancela da Fundação Grupo Boticário
e do Banco do Brasil.

Site Esse projeto procura incentivar a pesquisa na educação, buscando


O site do Prêmio Jovem descobrir novos pesquisadores, que sejam criativos e inovadores, com
Cientista, além de falar o desafio de resolver os problemas emergentes da sociedade.
sobre esse projeto, é
estruturado com diversos Como vemos, trabalhar com Ciência e Tecnologia na educação é
tipos de materiais que au-
xiliam os alunos a buscar algo necessário, mas, para que isso ocorra, deve-se superar a visão de
novos conhecimentos. transmissão, reprodução e memorização de conteúdos disciplinares,
Disponível em: http://estatico.cnpq. pois essa forma de educação dificilmente leva o estudante a utilizar
br/portal/premios/2018/pjc/pre-
mio.html. Acesso em: 6 maio 2020.
o que aprendeu em sua vida e a ajudar a solucionar os problemas
complexos da sociedade na contemporaneidade. A ciência na escola é

126 Transversalidade na Educação


vista como um componente das Ciências Naturais e das disciplinas de
Química, Física e Biologia, todas estruturadas no currículo escolar, com
um conjunto vasto de conteúdos para ser repassado aos alunos, sendo
dividido pelo grau de complexidade para cada nível de escolarização.

É necessário incentivar os alunos para o mundo da ciência e da tec-


nologia, com uma educação voltada a conhecimentos que os preparem
para os desafios do mercado do futuro e deem a eles a possibilidade
de melhorar a sociedade, com atitudes sustentáveis, pensando na pro-
teção do planeta. Proporcionar uma educação científica e tecnológica,
Glossário
que possibilite ao indivíduo pensar, refletir, criar, inovar e pesquisar,
cultura maker: faça você
para que possa ser protagonista de boas ações e produtor de conheci- mesmo; é um movimento
mentos, capaz de apreender problemas locais, globais e fundamentais, incorporado pela escola, no
superando o conhecimento fragmentado que o impede de ver o contex- qual os alunos colocam a
mão na massa, possibilitando
to, o conjunto, as partes e, por fim, o todo (MORIN, 2000). criar, montar e consertar por
meio de atividades práticas,
Também é preciso construir um processo de ensino e aprendiza-
participando de projetos de
gem com métodos e metodologias que permitam estabelecer relações maneira prática.
mútuas e ver sob novas perceptivas, identificando outros níveis de rea- metodologias ativas: é
lidade. Para isso, a aula expositiva, na qual apenas o professor repassa um modo de ensinar, no qual é
fundamental a autonomia e parti-
os conteúdos, deve ser substituída por diálogo, pesquisa, cultura ma- cipação ativa do aluno no processo
ker, metodologias ativas, Steam, ensino, pesquisa e uso da robótica de ensino e aprendizagem. Alguns
e das tecnologias em sala de aula. exemplos são: a aprendizagem
baseada em problemas, project
O aluno deve ser colocado como protagonista, para que possa ob- based learning (PBL), e aprendiza-
gem baseada em projetos.
servar, interagir e experimentar, desenvolvendo seu espírito investiga-
Steam: da sigla em inglês para
tivo e crítico e aproximando, assim, a ciência e a tecnologia. Faz, ainda, Science, Technology, Engineering,
aproximações com todas as áreas, com o intuito de que seu processo Arts and Math (Ciência,
de aprendizagem possibilite construir conhecimentos de modo que es- Tecnologia, Engenharia, Artes e
Matemática), é uma maneira de
tejam relacionados com o seu cotidiano e as suas necessidades. organizar o processo de ensino e
aprendizagem utilizando quatro
Para educar para a ciência e tecnologia, é necessário mudar a
áreas simultaneamente, para que
maneira de ensinar e aprender; por isso a necessidade de superar os alunos resolvam problemas
o paradigma que não possibilita pensamentos divergentes, iden- por meio de etapas, que são:
investigar, descobrir, conectar,
tificar as contradições, perceber a viabilidade da complementari-
criar e refletir.
dade e aprender com o erro. A problematização e a resolução de robótica: um recurso
problemas possibilitam aos alunos pensar e buscar soluções que lúdico e desafiador usado em
vão além do conteúdo de uma disciplina, instigando a produção ambientes de aprendizagem,
utilizando de sucatas ou kits
própria do aluno, fazendo-o elaborar análises e sínteses, pensar prontos que possibilitam ao
em novos questionamentos e buscar estebelecer novas relações aluno aprender a programar
algo para funcionar.
para responder às demandas e exigências da contemporaneidade.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 127


5.4 Economia
O indivíduo é um capital humano muito importante de uma socie-
Vídeo
dade, dessa maneira é necessário que ele tenha uma educação de qua-
lidade que o possibilite desenvolver os conhecimentos, reconhecendo
sua amplitude, seja na sua multidimensionalidade ou na multirreferen-
cialidade. Os estudantes devem aprender conhecimentos “científicos,
técnicos, tecnológicos, de pensamento político, social e econômico, de
desenvolvimento cultural, para que sejam capazes de pensar e gestar
soluções” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2005, p. 97), estando, assim, prepa-
rados para atuar como profissionais e como cidadãos capacitados para
enfrentar os desafios e os problemas da sociedade contemporânea.

Educar para a economia é possibilitar ao estudante que entenda


sobre como administrar recursos, produzir e adquirir bens e serviços e
como estes podem ser distribuídos na sociedade. O tema contemporâ-
neo transversal Economia foi estruturado em três subtemas: Trabalho,
Educação financeira e Educação fiscal.

5.4.1 Trabalho
Quando o estudante está cursando a Educação Básica – Educação In-
fantil ao Ensino Médio – geralmente não está inserido no mundo do traba-
lho, mas o aprendizado que está adquirindo e construindo nesse período
é fundamental para o seu futuro profissional e também como cidadão.

A finalidade da educação é possibilitar que os estudantes aprendam


conhecimentos científicos, tecnológicos e atitudinais, para que desen-
volvam habilidades e competências para usar com sabedoria.

A sociedade, na contemporaneidade, exige um novo perfil de pro-


fissional para atuar no mercado de trabalho: é necessário que se tenha
autonomia e iniciativa para buscar o constante aperfeiçoamento inte-
lectual e emocional.

Exige-se, ainda, que seja criativo, saiba trabalhar de maneira co-


laborativa, tenha conhecimentos múltiplos tendo competência para
resolver problemas complexos, devendo superar a visão e a per-
cepção unidimensional do pensamento cartesiano mecanicista, de
modo a entender o que ocorre além do espaço de trabalho e identi-
ficar que a mudança e a imprevisibilidade são condições presentes
no mundo o tempo todo.

128 Transversalidade na Educação


É necessário ser competitivo, avançar, ter novas percepções, ser Site
capaz de apontar novos caminhos, ultrapassar fronteiras, limitações No site do Ipea, você terá
acesso a uma coletânea
e os reducionismos, para poder desenvolver-se cada vez mais, po-
de artigos da publicação
rém esse desenvolvimento não pode ser prejudicial na vida das pes- Rede de Pesquisa, For-
mação e Mercado de Tra-
soas e no meio ambiente.
balho (coordenado pelo
ABDI e Ipea), os quais
É cobrado desse profissional que seja responsável, solidário e sus-
possibilitam compreen-
tentável. Que esteja preparado para o mercado o qual desenvolve no- der, de maneira mais
ampla, sobre formação
vos conceitos em uma velocidade extraordinária a partir do advento
profissional e mercado de
da internet e da Indústria 4.0, da inteligência artificial e da robótica. Os trabalho.

processos no trabalho cada vez mais serão automatizados, exigindo Disponível em:
menos intervenção humana. http://www.ipea.gov.br/portal/
index.php?option=com_
Esse perfil do profissional de hoje será alterado em breve, no en- content&view=article&id=24233.
Acesso em: 12 maio 2020.
tanto é difícil determinar, com exatidão, quais serão as profissões do
futuro e como exatamente ele deverá ser. Mas os novos e futuros de-
safios apontam para a necessidade de um processo educacional que
prepare os estudantes hoje para entender a complexidade do mundo
futuro, cada vez mais conectado, com mais comunicação e informação
gerada a cada segundo, dando um salto qualitativo e quantitativo no
desenvolvimento social, político, cultural e econômico, influenciando a
nossa maneira de ver, analisar e proceder.

Os ambientes educacionais devem ser permeados de diálogos a fim


de que possa ocorrer, permanentemente, o compartilhamento, possi-
bilitando a construção crítica e reflexiva dos conhecimentos, identifi-
cando que não existem certezas absolutas, mas, sim, a pluralidade de
olhares, percepções e referências para compreender o mundo.

5.4.2 Educação financeira


Para educar e preparar os alunos aos grandes desafios da vida, por
que não trabalhar com conceitos da educação financeira? Assim, pre-
parando as crianças e os jovens para o uso correto de suas economias,
com o propósito de saberem poupar e entenderem sobre finança sau-
dável, responsabilidade e ética (FERREIRA, 2013).

Esse tema induz ao aprendizado da organização e do planejamento


de modo a saber lidar com o dinheiro. Para isso, é necessário, além de
conhecimentos matemáticos, gestão financeira, economia doméstica,
autonomia para tomar decisões, entendimento sobre desperdício e

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 129


consumo, estabelecimento de prioridades, gastos equilibrados e incen-
tivo ao uso consciente dos recursos financeiros.

Um dos documentos orientadores para a educação financeira


é o Decreto n. 7.397, de 22 de dezembro de 2010, o qual institui
a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF). Essa associa-
ção – composta pelo Comitê Nacional de Educação Financeira (CO-
NEF), em que participam nove órgãos e entidades governamentais
e quatro organizações da sociedade civil – produziu documentos e
materiais que auxiliam os professores para o desenvolvimento da
educação financeira e o fortalecimento da cidadania.

5.4.3 Educação fiscal


A Portaria MF/MEC n. 413, de 31 de dezembro de 2002, implementa
o Programa Nacional de Educação Fiscal (PNEF), que busca o combate
à sonegação, conscientizando o cidadão sobre seus direitos e deveres.
Para esse programa, a educação fiscal deve ser entendida como:
uma abordagem didático-pedagógica capaz de interpretar as
vertentes financeiras da arrecadação e dos gastos públicos, es-
timulando o cidadão a compreender o seu dever de contribuir
solidariamente em benefício do conjunto da sociedade e, por
outro lado, estar consciente da importância de sua participação
no acompanhamento da aplicação dos recursos arrecadados,
Leitura com justiça, transparência, honestidade e eficiência, minimizan-
do o conflito de relação entre o cidadão contribuinte e o Estado
O documento Educação
Fiscal no Contexto Social arrecadador. A Educação Fiscal deve tratar da compreensão do
é um material pedagógico que é o Estado, suas origens, seus propósitos e da importância
sobre Educação Fiscal,
do controle da sociedade sobre o gasto público, através da parti-
composto por quatro
cadernos, sendo que aqui cipação de cada cidadão, concorrendo para o fortalecimento do
você terá acesso ao ca- ambiente democrático. (BRASIL, 2008, p. 27)
derno 1: Educação Fiscal
no Contexto Social, e, nas Esse programa busca mostrar que o currículo escolar pode abordar
páginas 38 e 39, poderá
o tema de educação fiscal transversalmente, de maneira que contribua
saber um pouco mais
sobre atividades que para uma educação na qual o estudante entenda seu papel de cidadão
podem ser desenvolvidas
participativo e consciente na sociedade em que vive, compreendendo
com esse tema.
sobre a função, a importância e a aplicação dos tributos.
Disponível em:
http://www.gestaoescolar.diaadia. Algumas atividades que podem ser desenvolvidas em sala de aula são:
pr.gov.br/arquivos/File/pdf/
def_caderno_1.pdf. Acesso em: 12 •• Leitura e interpretações de textos e documentos sobre tributos,
maio 2020.
como o Código do Consumidor.

130 Transversalidade na Educação


•• Visitas e entrevistas em órgãos públicos como: Câmara de Verea-
dores, Secretaria de Fazenda ou Finanças e Receita Federal.
•• Análise de notas fiscais e identificação dos tributos cobrados.
•• Pesquisa sobre algumas contribuições existentes como: Cofins,
IPI, IOF, ISS, entre outros, e identificação de como elas são rever-
tidas em benefícios para a sociedade.

A aprendizagem sobre os recursos financeiros é relevante para o


estudante entender que na sua casa e na sua escola são recolhidos
impostos e que o pagamento destes é obrigatório; identificando que
esses tributos recolhidos pelo governo federal, estadual e municipal
devem ser investidos para a melhoria da qualidade de vida da popula-
ção; tendo uma educação que busque desenvolver cidadãos críticos,
conscientes, responsáveis, com visão global e com competência para
intervir e modificar a realidade social e a vida pessoal.

Práticas transversais

O projeto educação financeira Saúde Financeira Não Tem Preço! é um material


didático que oferece muitas informações e atividades sobre o tema, que pode ser
adaptado para o Ensino Médio.

Disponível em: https://www.bb.com.br/docs/pub/inst/dwn/EducacaoFinanceira.pdf. Acesso em: 12 maio 2020.


A Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF) é uma organização do governo
federal que promove ações para a educação financeira. De maneira gratuita ela dis-
ponibiliza livros on-line que são muito interessantes e visualmente convidativos para
serem explorados. Vale a pena conferir.

Disponível em: https://www.vidaedinheiro.gov.br/. Acesso em: 12 maio 2020.

5.5 Meio ambiente


Vídeo Quando tratamos de meio ambiente, logo en-
Curiosidade
tendemos que ele está relacionado com tudo que
A Organização Mundial de Saúde
existe no e sobre o planeta Terra, e que, de algu- (OMS) estabeleceu, em 1972, o
ma forma, pode influenciar positivamente ou não dia 5 de junho como sendo o Dia
no que acontece a ele. do Meio Ambiente.

Educação para o meio ambiente é cuidar e se


preocupar em preservar o planeta na sua totalidade, compreendendo,
principalmente, sobre educação e consumo e Educação Ambiental.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 131


5.5.1 Educação e consumo
A Lei n. 13.186, de 11 de novembro de 2015, se refere a uma política
de educação para estimular práticas de consumo sustentável e técnicas
de produção que sejam ecologicamente sustentáveis, um marco muito
importante para educação e consumo.

O consumo de mercadorias e de prestação de serviços são necessi-


dades do homem na contemporaneidade, modificadas de acordo com
a cultura, costume e questões socioeconômicas de cada sociedade.
Mas estamos na sociedade do consumo, a qual é demarcada pelo con-
sumismo, caracterizado pela geração de necessidade e de marketing
que estimula e manipula a compra impulsiva, qualidade de um mode-
lo de estrutura econômica fundado no capitalismo, em que prevalece
muito mais o ter do que o ser.

O consumo pode ser consciente quando o indivíduo adquire bens


e serviços necessários para sua existência evitando excessos e aten-
tando-se às condições de produção e distribuição, de maneira que não
tenha nenhum impacto ambiental. Esse indivíduo pode se tornar um
consumidor sustentável que, além desses cuidados, busca pelo reapro-
veitamento e descarte de resíduos do que foi adquirido de modo a não
influenciar negativamente a natureza. Outro ponto está relacionado a
quem produz mercadorias e faz prestação de serviços, que também
deve ter postura de sustentabilidade.

Falar em consumo consciente, por exemplo relacionado com a água


e a energia, é pensar no desperdício e, dessa forma, ser um consumidor
preocupado com ações que preservem a fonte natural desses recursos
para que não falte para outras pessoas e para as gerações futuras.

Essas são algumas questões que podem ser trabalhadas em sala de


aula de maneira que se possa desenvolver indivíduos críticos, criativos
e desejosos de preservar o planeta Terra.

5.5.2 Educação Ambiental


Abordar a Educação Ambiental é bastante complexo, pois não se
pode restringir à preservação, proteção, poluição e extinção, mas deve
considerar o ambiente na sua multidimensionalidade. Sendo assim,
além das questões ecológicas e naturais, deve-se pensar nas questões

132 Transversalidade na Educação


políticas, econômicas, culturais e sociais que envolvem os problemas
ambientais e a preservação do meio ambiente.

Deve-se desenvolver a consciência crítica nos estudantes, a sen- Vídeo


sibilidade e o respeito, modificando atitudes para promover a cons- Assista ao vídeo do proje-
to Educa mais Brasil que
cientização ecológica, buscando o equilíbrio entre as necessidades do faz uma reflexão sobre o
homem e do ambiente. desenvolvimento tecnoló-
gico e o desequilíbrio do
A Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA), Lei n. 9795/1999, meio ambiente.

no seu art. 1º, define Educação Ambiental como “processos por meio dos Disponível em:
https://www.educamaisbrasil.com.br/
quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimen- enem/biologia/educacao-ambiental.
tos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do Acesso em: 12 maio 2020.

meio ambiente” (BRASIL, 1999). Assim, a escola tem o papel fundamental


de provocar a mudança de hábitos e atitudes nos alunos para que esses
se capacitem para contribuir com ações e pensamentos que busquem a
melhoria da qualidade de vida e a preservação do meio ambiente.

Alguns marcos teóricos auxiliaram na definição do subtema Educa-


ção Ambiental, entre elas:
•• Lei n. 9.795/1999, Parecer CNE/CP n. 14/2012. A PNEA: tece
diretrizes políticas e pedagógicas para a Educação Ambiental e
esclarece sobre conceitos e objetivos que devem auxiliar os pro-
fissionais da educação.
•• Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981: dispõe sobre a Política Na-
cional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação
e aplicação. O objetivo dessa Lei está voltado para projetos e po-
líticas para a preservação, melhoria e recuperação da qualidade
ambiental, assegurando os interesses do estado considerando a
proteção da vida humana
•• Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentá-
veis e Responsabilidade Global: mostra a importância da edu-
cação para a formação de valores e atitudes de maneira que se
possa pensar na sustentabilidade para a proteção do planeta.
•• Carta da Terra: busca trazer reflexões elencando alguns prin-
cípios fundamentais para a construção de um pensamento
global que busque a proteção ambiental, o desenvolvimento
de uma comunidade sustentável, a responsabilidade compar-
tilhada e o incentivo para uma cultura da paz, com o propósi-
to de respeitar a natureza.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 133


•• Resolução n. 422, de 23 de março de 2010: estabelece diretrizes
para campanhas, ações, projetos, programas e comunicação so-
bre a Educação Ambiental, no âmbito da educação formal e não
formal, de instituições públicas, privadas e da sociedade civil.

O conhecimento sobre o tema possibilita o desenvolvimento de


projetos e atividades na escola que trabalhem com as questões
locais e prioritárias do contexto no qual a escola e os alunos estão
envolvidos, bem como a sensibilização para um olhar mais amplo e
a percepção das necessidades para a preservação do meio ambien-
te em nível planetário.

Práticas transversais
O Ministério do Meio Ambiente (MMA) tem a plataforma virtual EducaRES, a qual
apresenta mais de 200 experiências sobre educação ambiental.

Disponível em: http://educambiental.mma.gov.br/index.php/ver-praticas?search=&sort=&order=asc&offset=-


10&limit=10&page=null. Acesso em: 6 maio 2020.
O Projeto Salas Verdes é uma iniciativa do MMA, no qual se encontram vários
projetos desenvolvidos em diversas escolas brasileiras e que mostra, em detalhes, as
atividades desenvolvidas.

Disponível em: http://salasverdes.mma.gov.br/category/novidades/acontece/. Acesso em: 6 maio 2020.


O Departamento de Educação Ambiental desenvolveu o Coleciona. São fichários
temáticos que fornecem informações, textos, experiências e ações na área de Educa-
ção Ambiental. O link a seguir contém um desses fichários, que, a partir da página 49,
apresenta vários projetos.

Disponível em: https://mma.gov.br/images/arquivo/80219/volume13_especialedfam-agricfamiliar_jun2015.pdf.


Acesso em: 6 maio 2020.

5.6 Multiculturalismo
Vídeo Quando olhamos para o contexto no qual vivemos, identificamos
uma heterogeneidade nas pessoas relacionada a gênero, raça, padrões
culturais e políticos, religião, identidade e classe social, mas a não com-
preensão dessa diversidade pode gerar muitos conflitos sociais, de-
senvolvimentos de preconceitos e discriminações que não contribuem
para a aproximação entre os povos.

134 Transversalidade na Educação


Figura 2
Palavras relacionadas com o multiculturalismo

Fonte: Elaborada pela autora.

O multiculturalismo é “um movimento legítimo de reivindicação dos


grupos culturais dominados no interior daqueles países para terem
suas formas culturais reconhecidas e representadas na cultura nacio-
nal” (SILVA, 2005, p. 85), e pode ser caracterizado como um movimento
social o qual busca a equidade na e pela vida de qualquer indivíduo e a
compreensão de que vivemos em um mundo globalizado e internacio-
nalizado, com rompimento de fronteiras que possibilitam a interação
entre diferentes povos de todos os continentes.

Para entender o multiculturalismo, é necessário que a educação


seja voltada para a compreensão. Nesse sentido, Morin (2000) propõe
algumas reflexões relacionadas a cuidados com os ruídos na transmis-
são da informação e no entendimento sobre a cultura que expressa os
usos, os valores, as crenças de uma etnia ou de uma nação, sugerindo a
superação da ignorância relacionada com os ritos e costumes do outro
e vários obstáculos de incompreensões alusivos ao que seja diferente
do contexto em que se vive.

A diversidade cultural e a educação para valorização do multicultu-


ralismo nas matrizes históricas e culturais brasileiras são subtemas que
a BNCC definiu para estudar sobre o multiculturalismo.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 135


Leitura
5.6.1 Diversidade cultural
A palavra diversidade quer dizer “diferença, dessemelhança, de si-
Para saber mais, confira
o material do MEC para militude, divergência, contradição, oposição” (FERREIRA, 2004, p. 485),
a formação docente apontando para a heterogeneidade.
referente ao tema
diversidade na sala de Conceituar cultura não é uma tarefa muito fácil, pois existe uma
aula. Ele contém muitas
informações e atividades multiplicidade de usos, termos e interpretações, mas, de modo mais
práticas. amplo, pode-se entender que está relacionada com o modo de vida e a
Disponível em: identidade de um povo, etnia ou nação.
http://portal.mec.gov.
br/seesp/arquivos/pdf/ Com relação à diversidade cultural, entende-se que é a compreen-
educarnadiversidade2006.pdf.
Acesso em: 12 maio 2020.
são de um conjunto de diferenças que devem ser vivenciadas inte-
gradamente, superando a discriminação e buscando o respeito aos
diferentes grupos e culturas de uma sociedade.

A Declaração Universal sobre Diversidade Cultural (UNESCO, 2020),


no seu artigo 2º, aponta sobre a necessidade de as pessoas se inter-
-relacionarem harmônica e pacificamente respeitando a pluralidade de
culturas existentes na sociedade e de as políticas possibilitarem a inclu-
são e a participação de todos os cidadãos na sociedade.

Com o esclarecimento desses pontos é possível entender sobre


educar para a diversidade cultural. A sala de aula é um espaço pri-
vilegiado, nela, encontram-se estudantes com muitas diferenças
(tamanhos, interesses, atitudes, cognição, comunicação, saberes,
hábitos, etc.), com as quais pode-se iniciar a educação para a diver-
sidade cultural, oportunizando a convivência para entender como
respeitar as individualidades e construir saberes em diferentes ní-
veis de percepção para buscar a educação e a paz.

5.6.2 Educação para valorização do


multiculturalismo nas matrizes históricas e
culturais brasileiras
Quando olhamos para o Brasil, identificamos que sua população é
composta por uma mistura de raças, povos e diferentes etnias. Antes
de 1500, o território brasileiro era habitado por povos nativos, como
os guaranis, os kaingang, os pataxós, os tupinambás, os yanomami, os
tikuna, os akuntsu e os awá.

136 Transversalidade na Educação


Esses povos possuíam suas próprias características, viviam nas flo-
restas, caçavam, pescavam, cultivavam plantas, utilizavam os recursos
da vegetação para construir suas moradias, entre outras questões re-
lacionadas à sua cultura. Com o passar do tempo, eles sofreram in-
fluências de outros povos e enfrentaram muitas violências, entre elas a
perda de suas terras e direitos. A Fundação Nacional do Índio (Funai) é
um órgão oficial responsável pela política indigenista do Estado brasi-
leiro que protege e promove os direitos dos povos indígenas.

Outros povos que formam a população brasileira são aqueles que


foram trazidos posteriormente para o trabalho escravo, especialmen-
te os africanos. Podemos citar ainda os imigrantes portugueses, espa-
nhóis, italianos, alemães, japoneses, sírios e libaneses.

A globalização possibilitou a abertura e a conquista de fronteiras


em grande escala e criou novos significados na maneira de ser, vi-
ver e relacionar-se. O desenvolvimento da organização da sociedade
multicultural não privilegia uma raça, uma etnia ou uma nação, mas
pretende desenvolver um ambiente pluralista, o qual possibilita a coe-
xistência e a convivência entre os homens pacificamente com cons-
ciência cidadã planetária.

Dessa maneira, o conhecimento histórico da formação da po-


pulação brasileira e o estudo do mundo contemporâneo permitem
identificar a multiculturalidade aqui existente, o que possibilita en-
tender as identidades nacionais brasileiras as quais ainda estão em
constante transformação.

5.7 Saúde
Vídeo O ensino de Saúde para que se desenvolvam atitudes para uma vida
saudável e sustentável é um desafio a ser superado no processo edu-
cacional, uma vez que envolve a questão de hábitos e atitudes de cada
indivíduo e está relacionado, também, com as questões sociais, políti-
cas, econômicas e culturais.

Educar para saúde é pensar no bem-estar físico, emocional e social


de cada indivíduo, na condição de lidar com a doença crônica ou de-
ficiência, na capacidade de lidar com as moléstias e continuar partici-
pando das atividades sociais e profissionais, para isso é necessário um
trabalho educativo contextualizado de maneira a refletir as necessida-
des individuais e coletivas.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 137


5.7.1 Educação alimentar
A alimentação está diretamente relacionada com a saúde das crian-
ças e dos adolescentes, por isso é tão importante no currículo escolar,
sendo uma maneira de discutir sobre o tema e entender sobre a im-
portância de se ter uma alimentação saudável, balanceada respeitando
as necessidades e as possibilidades financeiras de cada indivíduo. De
acordo com a Unicef (CARREIRO, 2019), “uma em cada três crianças,
com menos de 5 anos, está desnutrida. No Brasil, uma em cada três
crianças de 5 a 9 anos está acima do peso, entre os adolescentes, 17,1%
estão com sobrepeso e 8,4% são obesos”.

Cuidar da alimentação é uma necessidade básica do indivíduo,


ela influencia na capacidade de estudar, raciocinar, interagir e rea-
lizar tarefas na prevenção de doenças e na qualidade de vida, nas
diferentes fases da vida.
Curiosidade Alimentação está relacionada com a cultura, dessa maneira o que,
Você sabia que existe o Dia como e por que se come estão diretamente ligados com nossas cren-
Nacional da Alimentação nas ças e o modo de vida de cada indivíduo. As sensações e o estilo de vida
Escolas? Ele é comemorado no
dia 21 de outubro, data escolhi- influenciam nos hábitos alimentares que podem incidir em ocorrên-
da para ressaltar a importância cias opostas a uma saúde saudável, surgindo doenças crônicas, como
das ações voltadas à educação excesso de peso, diabetes, pressão alta e distúrbios cardiovasculares.
alimentar e nutricional dos
estudantes de todas as etapas da A escola como ambiente que possibilita a convivência, a troca de
Educação Básica.
experiências e a construção de conhecimentos é um espaço que per-
mite o desenvolvimento e a formação de crianças e adolescentes para
aprender não apenas os conteúdos escolares, mas estudar de maneira
crítica, criativa e reflexiva sobre a alimentação para uma vida saudável.

Para complementar o estudo sobre o tema educação alimentar, é


necessário ter conhecimento sobre alguns marcos legais que são base
para o desenvolvimento desse tema, entre eles destacam-se:
•• Lei n. 11.947, de 16 de junho de 2009: dispõe sobre o atendi-
mento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na
Escola aos alunos da educação básica.
•• Lei n. 12.982, de 28 de maio de 2014: altera a Lei n. 11.947 para
determinar o provimento de alimentação escolar adequada aos
alunos portadores de estado ou de condição de saúde específica.
•• Portaria Interministerial n. 1.010, de 08 de maio de 2006: ins-
titui as diretrizes para a promoção da alimentação saudável nas

138 Transversalidade na Educação


escolas de Educação Infantil, Fundamental e nível Médio das re-
des públicas e privadas, em âmbito nacional.
•• Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE): oferece
alimentação escolar e ações de educação alimentar e nutricional
a estudantes de todas as etapas da Educação Básica pública.

Esses marcos legais possibilitam identificar, ao longo do tempo


e da história, as principais preocupações e urgências relacionadas
à alimentação, para, dessa maneira, compreender juridicamente as
necessidades nessa área.

5.7.2 Saúde
O Decreto n. 6.286, de 5 de dezembro de 2007, institui o Programa
Saúde na Escola (PSE). Entre suas orientações, destaca-se a promoção
da saúde e o desenvolvimento da cultura para a paz, de maneira que
se possa assegurar a formação integral dos educandos, a cidadania
e os diretos humanos. Ele aborda a interação da escola com as uni-
dades de saúde como meio de assegurar e monitorar o bem-estar
do estudante, e indica a inserção do tema saúde no projeto político
pedagógico das escolas.

Esse documento apresenta algumas ações que devem ser reali-


zadas na saúde, mas que podem auxiliar na composição de subte-
mas para serem inseridos no currículo escolar, entre eles: nutrição,
alimentação saudável, saúde e higiene bucal, vacinas, questões rela-
cionadas com a audição e a visão, acidentes e violências, consumo do
álcool, uso de drogas, tabagismo, câncer, saúde sexual e reprodutiva,
prática de atividades físicas.

A esses temas ainda poderiam ser acrescentadas, na educação para


a saúde, atividades relacionadas com o desenvolvimento inter e intra-
pessoal, a educação emocional, a identificação de situações de risco, a
conscientização para buscar uma vida saudável e a promoção da saúde.

Compreende-se que a escola é um excelente ambiente para o


desenvolvimento de um programa de educação para a saúde, pois
possibilita a construção dos conhecimentos por meio de práticas peda-
gógicas que incitam o questionamento, a pesquisa, a reflexão e a aná-
lise. Esse processo se dá pela inter-relação entre os saberes científicos
das diversas áreas do conhecimento, trazidos pelos estudantes sobre

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 139


Leitura suas experiências, crenças e valores culturais, os saberes associados
Para saber mais, acesse ao contexto sociocultural no qual a escola está inserida, os difundidos
Cadernos de Atenção Bási-
ca do setor de Educação pelas tecnologias de comunicação e informação e os alusivos das expe-
e do setor de Saúde, que riências e conhecimentos dos docentes.
apresenta conceitos e
práticas para a promoção Essa dinâmica cultural escolar é fundamental para que o aluno se
da saúde escolar.
sinta confiante para participar de experiências significativas de apren-
Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ dizagem intelectual e de socialização. Se entendermos que a “escola
publicacoes/cadernos_atencao_ é considerada por alguns como o espaço de transição entre o mundo
basica_24.pdf. Acesso em: 12
maio 2020. da casa e o mundo mais amplo” (BRASIL, 2009, p.15), ela configura um
espaço que justifica o desenvolvimento de um projeto sobre a saúde.

5.8 Temas Contemporâneos


Transversais no planejamento
Vídeo
Inserir a transversalidade no planejamento escolar não é uma tarefa
fácil e transformar esse plano em ação didática é mais complexo ainda.
Mas isso não é impossível para quem deseja ofertar uma educação inte-
gral, de maneira que o estudante tenha suas competências e habilidades
desenvolvidas e construa seu próprio conhecimento, dando-lhe autono-
mia para enfrentar os desafios impostos pela sociedade contemporânea.

A postura pedagógica é que possibilita um processo educativo


pautado na transversalidade, na interdisciplinaridade e na transdis-
ciplinaridade. Para isso, a base epistemológica deve superar a visão
cartesiana mecanicista que incita para a metodologia do transmitir,
escutar, copiar e reproduzir.

A compreensão do pensamento complexo (MORIN, 2007) possibilita


compreender que dois termos antagônicos não são necessariamente ex-
cludentes, mas podem se complementar. Essa ideia permite, ao profes-
sor, entender a importância de trabalhar com diferentes áreas e autores,
mesmo que tenham ideias, conceitos e princípios opostos. Essa percep-
ção e ação facilita o diálogo entre diferentes teorias, bem como trabalhar
com a diversidade rompendo com a fragmentação do conhecimento.

Outro ponto fundamental da base epistemológica complexa é


compreender que cada experiência realizada na produção do conhe-
cimento em sala de aula é única e intransferível, dessa maneira sua
reprodução em um outro contexto poderá trazer resultados diferentes

140 Transversalidade na Educação


e até opostos do planejado. Essa concepção possibilita ao professor
entender que não existe uma receita de estratégias metodológicas que
garanta o sucesso na aprendizagem do aluno, mas a reflexão, a criação,
a contextualização e a reconstrução de fundamentações teórico-práti-
cas é que permite o alcance de bons resultados no processo educativo.

Os ambientes educativos devem ser dinâmicos, flexíveis e abertos,


possibilitando que os alunos se aproximem com o intuito de trocar expe-
riências, realizar atividades práticas e se reunir em pequenos grupos, le-
vando-os a dialogar, pesquisar, elaborar e construir seus conhecimentos.

Ainda com relação ao ambiente, ele deve incitar para que ocorra a
interação entre os indivíduos permeada de respeito, generosidade, co-
laboração, companheirismo, compreensão e entendimento sobre as di-
ferenças de ideias e opiniões. A relação entre professor e aluno deve ser
horizontal, de modo que possam dialogar, compartilhar ideias, e deve
ser permeada pela escuta sensível, pela afetividade e pela amorosidade;
também, permitir a expressão, a criticidade, a curiosidade, a criatividade
e o fluxo de ideias a fim de que os alunos exercitem sua autonomia.

A aprendizagem não é mecânica e não acontece pelo fato de o


professor ministrar sua aula e transmitir conteúdos. Como afirma
Freire, “em lugar de comunicar-se, o educador faz comunicados e
depósitos, que os educandos, meras incidências, recebem paciente-
mente, memorizam e repetem”, a isso o autor denominou de “con-
cepção bancária da educação em que a única margem de ação que
se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos e arquivá-
-los” (1975, p. 68). Pensando nisso, o planejamento deve propor es-
tratégias didáticas que possibilitem ao aluno participar ativamente e
não apenas realizar as atividades planejadas.

O encaminhamento metodológico mais adequado para trabalhar


os conteúdos curriculares e os Temas Transversais integradamente é
pensar nas bases teóricas da transversalidade, da interdisciplinaridade
e da transdisciplinaridade. Com esses conhecimentos, o professor deve
identificar que o mais indicado é trabalhar com as técnicas da meto-
dologia ativa que possibilita o protagonismo do aluno e o desenvolvi-
mento de sua autonomia a partir do momento que este é desafiado
a buscar informações para resolver problemas ou situações reais ou
relacionadas com o seu contexto.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 141


O principal objetivo desse modelo de ensino é incentivar os alunos a
aprender de modo autônomo e participativo, por meio de problemas e
situações reais. A proposta é que o estudante esteja no centro do pro-
cesso de aprendizagem, participando ativamente e sendo responsável
pela construção do conhecimento.

Algumas ideias para o uso da metodologia ativa no processo de en-


sino e aprendizagem são:
•• Trabalho com a ludicidade: propor atividades que permitam
trabalhar ao mesmo tempo com a razão e a emoção. Para isso
os jogos, a gamificação, storytelling, as brincadeiras, as paró-
dias, a música, a dança/movimento e a arte possibilitam uma
aprendizagem significativa.
•• Trabalho em grupo em sala de aula: várias são as técnicas e
estratégias que possibilitam o trabalho em equipe, estimulando o
desenvolvimento de competências cognitivas e socioemocionais,
entre elas podemos citar a rotação por estações, painel integra-
do, autódromo, aprendizagem em espiral, design thinking, giro co-
laborativo, tempestade de ideias etc.
•• Participação ativa do aluno: atividades que possibilitem aos
alunos trabalhar individual ou coletivamente instigando a pensar,
refletir, questionar, criar, executar. Entre elas: debates, solicitar
exemplos, descrever experiências, solicitar explicações mais deta-
lhadas, incentivar o aluno a fazer perguntas, trocar de ideias, trazer
para sala de aula reportagens, fazer síntese do que aprendeu no
final da aula, cada aluno ou pequenos grupos devem elaborar seus
objetivos relacionados com o tema e conteúdo da aula, levantar
hipóteses, representar suas ideias utilizando recursos visuais etc.
•• Aprendizagem além dos muros da escola: propor atividades
que os alunos possam ao mesmo tempo se divertir aprendendo
e ter contato com a comunidade, podendo ser: visita a lugares
de acordo com o tema/conteúdo estudado (museus, parques,
comércio, indústria etc.), entrevistas, participação em palestras,
cursos, oficinas fora da escola, ida ao teatro ou cinema.
•• Resolução de problemas X pesquisa: atividades que permitem
trabalhar individualmente, em grupos ou com a turma toda, rea-
lizando pesquisas e estudos para resolver um problema, entre
as técnicas destacam-se: a aprendizagem baseada em problemas
(PBL), o estudo de caso e a aprendizagem baseada em projetos.

142 Transversalidade na Educação


•• Autonomia e responsabilidade: a sala de aula invertida (flipped
classroom) possibilita que o aluno estude e pesquise, por meio de
atividades pré-planejadas, dessa forma ele vem para sala instru-
mentalizado de informações para participar da aula.
•• Aplicativos na educação: o uso de tecnologias digitais possibilita a
realização de pesquisas e a construção de materiais dos estudos reali-
zados, entre eles destacam-se: Storyboard, Pixton, Meograph, UTellS-
tory, Piktochart , Pictovia, Mapas mentais (Mind Meister, Free Mind,
Coggle), Nuvem de palavras (Wordclouds, Tagul, Word Clouds for
Kids, Word Cloud Generator) e Mapas conceituais (Cmaptools, Canva).

Com essas ideias e conceitos o professor pode planejar o processo


de ensino aprendizagem. Para isso, observe o mapa mental a seguir:

Figura 3
Dicas para o planejamento
Identifique qual(ais) disciplina(s)/
Selecione um ou mais Temas
conteúdo(s) pode(m) ser
Contemporâneos Transversais
trabalhado(s) conjuntamente

Defina quais habilidades, competências e objetivos quer atingir

Verifique com os alunos

o que eles gostariam de quais ideias que têm para


o que já sabem sobre o
saber mais sobre esse tema estudar esse tema e conteúdos.
tema e conteúdos.
e conteúdos.

Com essas
Importante: essa etapa informações Planeje também como será o
tem que ser flexível, se for desenhe os acompanhamento da aprendizagem
necessário, revise. passos/etapas pelos alunos e pelo grupo.
para serem Nessa etapa é fundamental usar
realizados(as) das metodologias ativas e das
tecnologias.
Pense como os conhecimentos
construídos podem ser sistematizados e
comunicados em sala de aula, na escola e
para a comunidade.

Fonte: Elaborada pela autora. Avalie o processo e o produto final.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 143


Como você pode observar, são ideias básicas que podem aju-
dar na elaboração do planejamento para trabalhar com os Temas
Transversais fundamentados nas concepções da interdisciplinari-
dade e da transdisciplinaridade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Estudar sobre os TCTs e sua inserção na prática pedagógica é um
grande desafio para os profissionais da educação, pois ainda há al-
gumas dificuldades epistemológicas e metodológicas que impedem
o rompimento com o paradigma cartesiano mecanicista que ainda
fundamenta a elaboração e muitos processos educativos nas escolas.
Planejar e executar exatamente o que foi pensado é um alívio, pois
proporciona a certeza de que o conteúdo será ministrado no tempo defi-
nido e o planejamento será executado.
Mas essa não é a realidade da educação e da sociedade atual. A ideia
é desenvolver alunos críticos e autônomos capazes de produzir seus pró-
prios conhecimentos, ter habilidades, conhecimentos e atitudes para en-
frentar os desafios propostos pela sociedade globalizada e exercer seu
papel como cidadão planetário.
Com os temas aqui abordados e a maneira como foram apresenta-
dos, buscou-se, além de trazer informações teóricas práticas, instigar o
leitor a buscar mais informações para que possa ter autonomia didáti-
ca pedagógica para inserir os TCTs na sua prática pedagógica.

ATIVIDADES
1. Assista ao vídeo O Idoso.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=SfXx597JQyA&t=2s.
Acesso em: 12 maio 2020.

Elabore um texto apresentando uma ideia de como você


trabalharia, na sua turma/disciplina, a temática Cidadania e Direitos
Humanos dos Idosos.

2. Para aprofundar os conhecimentos teóricos sobre um TCT, realize as


seguintes etapas:
a) Escolha um TCT.
b) Faça uma pesquisa na internet sobre ele e copie o link.
c) Apresente a ideia principal de sua pesquisa que amplie seu
conhecimento sobre o TCT escolhido.

144 Transversalidade na Educação


3. Pesquise um projeto ou um plano de aula sobre algum tema
contemporâneo transversal.
a) Escolha um TCT.
b) Faça uma pesquisa na internet e copie o link.
c) Faça uma síntese do projeto ou plano de aula.

REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição Federal (1988). Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 5 out.
1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm.
Acesso em: 14 maio 2020.
BRASIL. Lei n. 9.795, de 27 de abril de 1999. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília,
DF, 28 abr. 1999. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9795.htm.
Acesso em: 13 maio 2020.
BRASIL. Programa Nacional de Educação Fiscal. Educação fiscal no contexto social. 3.
ed. Brasília: ESAF, 2008. (Série Educação Fiscal. Caderno 1). Disponível em: http://www.
gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/def_caderno_1.pdf. Acesso em: 13 maio
2020.
BRASIL. Saúde na escola. Brasília: Ministério da Saúde, 2009. (Cadernos de Atenção Básica)
BRASIL. Ministério da Educação. Temas contemporâneos transversais na BNCC – contexto
histórico e pressupostos pedagógicos, DF: MEC/SEB, 2019. Disponível em: http://
basenacionalcomum.mec.gov.br/images/implementacao/contextualizacao_temas_
contemporaneos.pdf. Acesso em: 14 maio 2020.
CORDEIRO, N. V. Temas contemporâneos e transversais na BNCC: as contribuições da
transdisciplinaridade. Brasília, 2019. Dissertação (mestrado em Educação) – Universidade
Católica de Brasília.
CARREIRO, J. Má alimentação prejudica a saúde de milhões de crianças em todo o mundo.
Estadão, 2019. Disponível em: https://emais.estadao.com.br/blogs/comida-de-verdade/
ma-alimentacao-prejudica-a-saude-de-milhoes-de-criancas-em-todo-o-mundo/. Acesso
em: 13 maio 2020.
FERREIRA, A. B. de H. Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa. 3. ed. Curitiba: Positivo,
2004.
FERREIRA, R. Educação financeira das crianças e adolescentes. Portugal, Lisboa: Escolar
Editora, 2013.
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1975.
IPEA. Fusão de programas sociais vai incluir 17 milhões de crianças sem proteção no Brasil.
IPEA, 2 set. 2019. Dsiponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_
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MEDEIROS, S. A. R. Editorial. Revista Kairós: gerontologia, v. 1, n. 1, 1998.
MORIN, E. Os Sete Saberes necessários à educação do futuro. Cortez, 2000.
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Horizonte: Autêntica, 2005.

Os Temas Contemporâneos Transversais na prática pedagógica 145


SILVEIRA, N. D. R. A pessoa idosa: educação e cidadania, São Paulo: Secretaria Estadual
de Assistência e Desenvolvimento Social: Fundação Padre Anchieta, 2009. Disponivel em:
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YUS, R. Temas Transversais: em busca de uma nova escola. Porto Alegre: ArtMed, 1998.
ZABALA, A. Enfoque Globalizador e Pensamento Complexo: uma proposta para o currículo
escolar. Porto Alegre: ArtMed, 2002.

146 Transversalidade na Educação


GABARITO
1 Educação do passado, do presente e do futuro
1. Como a formação dessa professora teve a base no paradigma
newtoniano-cartesiano, possivelmente ela estudou as bases da escola
tradicional e ou da escola tecnicista.
Com relação à escola tradicional, ela deve ter superado a questão
metodológica, que era fundamentada na aula ministrada pelo
professor, sendo este o único detentor do conhecimento; a relação
entre professor e aluno, que era horizontal, sem aproximação afetiva e
emocional; o conteúdo, que era passado como verdade absoluta e de
maneira fragmentada; e a avaliação, que privilegiava a prova escrita e/
ou oral na qual o aluno deveria reproduzir os conteúdos.

Com relação à escola tecnicista, ela deve ter superado a questão de


metodologia, que era estruturada em técnicas instrucionais para
manter o controle do ensino; o papel do aluno, que era de expectador
e executor de tarefas delegadas pelo professor; o papel do professor,
considerado um técnico responsável pelo aprendizado do aluno; e os
recursos, que davam ênfase aos materiais didáticos e apostilas.

2. O professor deve ter conhecimento do Paradigma da complexidade,


que tem como construtos: o princípio retroativo, que supera a relação
causa e efeito, rompendo com a causalidade linear; o princípio do
circuito recursivo ou da auto-organização, em que os produtos e os
efeitos são eles mesmos, produtores e causadores daquilo que os
produz; o princípio dialógico, que une dois aspectos ou noções que,
em geral, se apresentam excluindo-se reciprocamente, mas que
são indissociáveis; o princípio hologramático, não apenas a parte
está no todo, mas o todo está na parte; e o princípio de autonomia/
dependência, que mostra que para toda ação ou pensamento
autônomo há múltiplas dependências para chegar a essa autonomia.

3. Em relação aos saberes compreensão e condição humana, o professor


poderá, por meio de levantamento de questões, instigar os alunos a
pensarem sobre quem somos, de onde viemos, onde vivemos, para
que estamos aqui, entre outros questionamentos existenciais que os
façam refletirem sobre si, sobre o outro e o planeta. Tipos de atividades
que podem ser utilizadas são debates, leitura e análises de imagens e
interpretações de reportagens.

Gabarito 147
2 Caminhos da transversalidade na educação
1. Resposta pessoal. O aluno deve criar algo inédito, não podendo buscar
nada pronto. Uma sugestão de resposta é elaborar um mapa conceitual
explicando sobre a transversalidade e os Temas Transversais.

2. Resposta pessoal. Uma sugestão de resposta é:

Tema: Meio ambiente

Nível: Ensino Fundamental – anos iniciais

Ano: 5º ano

Disciplina: Ciências

Conteúdo da disciplina: Poluição do ar

Explique a relação do tema transversal escolhido com o


conteúdo da disciplina: Um dos temas da disciplina de Ciências no 5º
ano do Ensino Fundamental é a poluição do ar. Por isso, será proposto
trabalhar de maneira interligada a questão do meio ambiente com a
compreensão de que o ser humano e o planeta Terra fazem parte do
mesmo sistema, proporcionando estudar a poluição também como
equilíbrio ambiental.

Descrição da atividade: Após ter trabalhado os conteúdos


curriculares sobre a poluição, será solicitado que cada aluno traga
uma reportagem sobre esse tema. Em sala de aula, os alunos irão se
reunir em pequenos grupos de acordo com o tema da reportagem, ou
seja, se é relacionada à poluição da água, do solo ou do ar. Após ler as
reportagens, cada equipe deverá construir um cartaz apresentando
soluções para o problema encontrado nas leituras. Os cartazes serão
expostos e, depois, faremos um grande debate com a turma.

148 Transversalidade na Educação


3. Resposta pessoal. Uma sugestão de resposta é:

Contextualização Cidadania Transversalidade


Utilizando a transversalidade,
os textos didáticos têm nova
A cidadania é o conjunto de
O conhecimento das infor- roupagem na medida em que
direitos e deveres exercidos
mações ou dos dados iso- o professor toma um caso real
por um indivíduo que vive em
ladamente é insuficiente. É para exemplificar aquele pará-
sociedade, no que se refere ao
Citação preciso situar as informações grafo. Assim, pode ser iniciado
seu poder e grau de interven-
e os dados em seu contexto um diálogo permanente em sala
ção no usufruto de seus espa-
para que eles adquiram sen- de aula e fora dela, no qual pro-
ços e na sua posição de poder
tido. fessores, estudantes e comu-
nele intervir e transformá-lo.
nidade criam um ambiente de
educação conjunta.
Quando trabalhamos um
conteúdo, devemos situá-lo,
Escreva com Que a cidadania permite ao
isto é, mostrar uma situa-
suas palavras indivíduo atuar na sociedade, Que a transversalidade permite
ção específica para ilustrar
o que você mas, para isso, ele deve conhe- ir além dos espaços escolares e
que, ali, esse conteúdo tem
entendeu da cer e exercer seus direitos e compreender melhor a vida.
especificidades diferentes
citação deveres.
se fosse analisado em outro
contexto.
LORDELO, J. M.; SANTOS, C. A. B.
A inserção da transversalidade e
da interdisciplinaridade na edu-
PENA, R. F. A. O que é cidada-
cação ambiental no ensino bási-
MORIN, E. Os Sete Saberes nia?. Brasil Escola. Disponível
co. Revista Atlante: Cuadernos de
necessários à educação do fu- em: https://brasilescola.uol.
Referência Educación y Desarrollo, mar. 2019.
turo. São Paulo: Cortez, 2004. com.br/o-que-e/geografia/o-
Disponível em:
p. 36 -que-e-cidadania.htm. Acesso
https://www.eumed.net/rev/
em: 23 mar. 2020.
atlante/2019/04/educacao-
ambiental-escola.html. Acesso
em: 7 abr. 2020.

Gabarito 149
3 Transversalidade: metodologia de trabalho
1.
OLIVEIRA, E. B.; SANTOS, F. N. 5 Pressupostos e de-
finições em interdisciplinaridade: diálogo com al-
Referência guns autores. Interdisc., São Paulo, n. 11, p. 01-151,
out. 2017.
Minha frase:
Evidenciamos que Japiassu (1976) se opõe ao
A interdisciplinaridade é um caminho
estudo compartimentalizado e defende que o
para a superação da prática pedagógica
Citação 1 conhecimento não acontece de forma isolada na
cartesiana, mas para isso é fundamental
qual exista a necessidade de sintetizar em partes
que o professor acredite nessa aborda-
cada vez menores o objeto de estudo. (p.75)
gem para colocá-la em prática.
Evoca, ainda, que não poderá acontecer por imposi-
ção ou por forma de Lei, mas por atitude, postura, ou
Citação 2 seja, esse posicionamento da autora aponta para a
necessidade de transformação do sujeito. (p.77)

2.

Minha descrição de uma característica do


Frases do artigo
professor transdisciplinar
Valoriza os processos críticos, criativos, dialógicos e re- O professor deve entender que a aprendizagem é
cursivos, reconhecendo a autonomia relativa do sujeito um processo de corresponsabilidade, sendo assim o
aprendente e a responsabilidade individual e coletiva. aluno deve ter suas responsabilidades.
Isto pressupõe também a necessidade de se trabalhar a
multidimensionalidade humana a partir de estratégias de O professor deverá organizar uma prática pedagógi-
aprendizagem que envolvam não apenas os aspectos ra- ca, que possibilite, ao mesmo tempo, trabalhar o ra-
cionais, técnicos e simbólicos, mas também os aspectos cional e o emocional, promovendo o desenvolvimen-
intuitivos, mítico, mágico, afetivo, as múltiplas linguagens to integral do estudante.
que dão sentido e significado a existência humana.

3.

Ano do Ensino fundamental (Anos Finais): 6º. Ano


TCT Objetivos Prática Avaliação
Diagnóstica: aplicar um
Fazer pesquisas e entrevistas questionário com vários
Identificar a necessidade de para entender sobre a educação pontos relacionados à
se ter uma alimentação sau- alimentar e nutricional. educação alimentar e
Educação Ali- dável e adequada, incluindo Produzir materiais diversificados, para o trânsito
mentar e Nutri- o uso de diversos alimentos usando as diferentes formas de Formativa: todas as ati-
cional seguros, que respeitem a cul- expressão artística, para apre- vidades serão avaliadas
tura, as tradições e os hábitos sentar os resultados dos estudos pelo professor, alunos
alimentares. e pesquisas realizadas sobre a e grupo de alunos, para
educação alimentar e nutricional. identificar as dificuldades
e avanços dos alunos.
(Continua)

150 Transversalidade na Educação


Ano do Ensino fundamental (Anos Finais): 6º. Ano
Componentes Habilidades
(EF69AR05) Experimentar e analisar diferentes formas de expressão artística (desenho,
Arte pintura, colagem, quadrinhos, dobradura, escultura, modelagem, instalação, vídeo, foto-
grafia, performance etc.)

(EF06GE11) Analisar distintas interações das sociedades com a natureza, com base na distri-
Geografia buição dos componentes físico-naturais, incluindo as transformações da biodiversidade local
e do mundo.

4 Transversalidade e currículo
1.
Perguntas Respostas
Ano 5º ano
Componente /Disciplina Geografia
Escolha uma Unidade Temática Mundo do trabalho
(EF05GE06) Identificar e comparar transformações dos meios
Escolha uma Habilidade
de transporte e de comunicação.
Durante uma conversa com os alunos em sala de aula, sobre
as transformações dos meios de transporte, uma aluna rela-
Descreva a ação de sala de aula que
tou que, com todas as mudanças ocorridas na cidade onde a
caracterize a inserção do currículo
avó dela mora, não existe metrô como em São Paulo, lá as coi-
oculto
sas ainda andam meio devagar e é muito comum a utilização
de carroças como meio de transporte.

2.

Perguntas Respostas
Ano 9º ano
Cite dois Componentes / Disciplinas que
Ciências e Matemática.
podem ser envolvidos
Tema(s) Contemporâneo(s) Transversal(is) Saúde e Gestão Financeira.
Título da reportagem Como o avanço da tecnologia beneficia a Medicina?
Reportagem que trata do uso da tecnologia para ser usada na saúde
Síntese da reportagem
para melhorar a vida das pessoas.
https://exame.abril.com.br/negocios/dino_old/como-o-avanco-da-
Link da reportagem
-tecnologia-beneficia-a-medicina/. Acesso em: 24 abr. 2020.
Porque a reportagem trata da tecnologia e da saúde, e as rela-
Justifique por que ela pode ser usada de ciona com dados quantitativos na recuperação dos pacientes e
maneira transversal em uma aula na eficiência da gestão administrativa mostrando os benefícios para
gestor e paciente.

Gabarito 151
3.

Perguntas Respostas
Qual Tema Contemporâneo Transversal, na sua opinião,
Meio Ambiente – Educação Ambiental
foi usado nesse projeto?
Qual disciplina foi base para o projeto? Ciências
Selecione uma Unidade Temática dessa disciplina. Matéria e energia
(EF04CI02) Testar e relatar transformações nos materiais
Selecione pelo menos uma Habilidade dessa temática
do dia a dia quando expostos a diferentes condições
que corresponda ao projeto.
(aquecimento, resfriamento, luz e umidade).
Qual outra disciplina você acha que auxiliou no
Matemática
desenvolvimento do projeto?
Selecione uma Unidade Temática dessa disciplina Probabilidade e estatística
(EF04MA27) Analisar dados apresentados em tabelas
simples ou de dupla entrada e em gráficos de colunas
Selecione pelo menos uma Habilidade dessa temática
ou pictóricos, com base em informações das diferentes
que corresponda ao projeto.
áreas do conhecimento, e produzir texto com a síntese
de sua análise.
Identifique, nas atividades realizadas, qual delas corres-
Confecção de gráficos e relatórios com o resultado das
ponde a essa segunda Disciplina/Unidade Temática e
entrevistas.
Habilidade.
Sim, pois houve necessidade de interagir com outras
Você acha que foi usado a interdisciplinaridade nesse áreas para resolver algumas questões, como utilizar os
projeto? Justifique sua resposta. conteúdos da Matemática para elaborar dados quantita-
tivos das entrevistas.
Sim, em muitos momentos. Um exemplo é nas descober-
tas relacionadas com o valorizar e resgatar a memória
Você acha que foi usado a transdisciplinaridade nesse
cultural/ambiental dos alunos e de suas famílias, nesse
projeto? Justifique sua resposta.
momento foi além das disciplinas e resgatou as questões
emocionais.

152 Transversalidade na Educação


5 Os Temas Contemporâneos Transversais na
prática pedagógica
1. Sugestão de atividade: Apresentar o vídeo aos alunos e, depois, pedir
para que cada um deles:
a) escolha um idoso da sua família ou de sua relação;
b) faça um bate-papo com essa pessoa para identificar por quais
dificuldades ela passa fora de casa;
c) faça uma roda de conversa para relatar as informações coletadas;
d) elabore um documento com as dificuldades dos idosos e, após,
sugira ideias para solucionar esses problemas.
2. Aprofundar os conhecimentos teóricos sobre um TCT. Para isso,
realizar as seguintes etapas.
a) Escolha um TCT: Direitos Humanos.
b) Faça uma pesquisa na internet e copie o link: (Sugestão: http://
www.sociologia.seed.pr.gov.br/arquivos/File/direitos_humanos/
diferentes_diferencas_mec.pdf).
c) Indique a ideia principal de sua pesquisa, que amplie o
conhecimento sobre o TCT que você escolheu, e apresente mais
dados reais sobre a desigualdade, falando sobre os diferentes
e suas diferenças.
3. Pesquisar um projeto ou um plano de aula sobre algum Tema
Contemporâneo Transversal.
a) Escolha um TCT: Educação para o Trânsito.
b) Faça uma pesquisa na internet e copie o link: (sugestão: https://
escolaeducacao.com.br/projeto-transito/).
c) Faça uma síntese do projeto ou plano de aula: Projeto Trânsito
na Escola, para desenvolver a conscientização das crianças a
respeito do trânsito mais seguro.

Gabarito 153
Transversalidade na Educação
Edna Liz Prigol

Transversalidade
na Educação

Edna Liz Prigol


Fundação Biblioteca Nacional Código Logístico
ISBN 978-85-387-6632-2

9 788538 766322 59382

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